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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CÂMPUS MACAÉ
CURSO DE GRADUAÇÃO EM MEDICINA

Ana Beatriz Pacheco da Silva


Artur Ferrer
David Richer
Estevão Fonseca
Gilmar Aleixo
Tiago Rubim Caetano

SÍNDROME DOS OVÁRIOS POLICÍSTICOS

Macaé
2018
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CÂMPUS MACAÉ
CURSO DE GRADUAÇÃO EM MEDICINA

Ana Beatriz Pacheco da Silva


Artur Ferrer
David Richer
Estevão Fonseca
Gilmar Aleixo
Tiago Rubim Caetano

SÍNDROME DOS OVÁRIOS POLICÍSTICOS

Trabalho apresentado como requisito


parcial para aprovação na disciplina de
Saúde da Mulher I, do curso de
graduação em Medicina, da
Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
Sumário
1. Introduçāo. ................................................................................................. 1
2. Epidemiologia ............................................................................................ 2
3. Etiologia...................................................................................................... 3
4. Revisão de Fisiologia ................................................................................ 5
5. Fisiopatologia ............................................................................................ 6
a. Modelo explicativo para instalação e manutenção da SOP ................ 6
b. Anormalidades dos Compartimentos na Fisiopatologia da SOP ....... 7
i. Compartimento Hipotálamo-Hipófise ................................................ 7
ii. Compartimento Ovariano ................................................................... 8
iii. Compartimento Adrenal ..................................................................... 9
iv. Compartimento Periférico .................................................................. 9
c. Papel da Obesidade na Fisiopatologia da SOP ................................... 9
d. Papel da Resistência à Insulina e Hiperinsulinismo na Fisiopatologia
da SOP ........................................................................................................... 9
6. Manifestações clínicas ............................................................................ 10
7. Diagnóstico .............................................................................................. 14
a. Conceito e Aspectos Gerais da Síndrome de Ovários Policísticos
(SOP) ............................................................................................................ 14
b. Exames laboratoriais para o diagnóstico de SOP ............................. 18
c. Exames para exclusão de diagnósticos diferenciais ........................ 20
d. Exames para Estratificação e Acompanhamento .............................. 21
8. Tratamento ............................................................................................... 23
a. Estilo de vida ........................................................................................ 24
b. Tratamento dos distúrbios metabólicos ............................................ 24
c. Tratamento antiandrogênico ............................................................... 25
i. Anticoncepcionais combinados (ACO) ........................................... 25
ii. Espironolactona: ............................................................................... 26
iii. Acetato de Ciproterona: ................................................................... 26
iv. Finasterida: ........................................................................................ 26
d. Tratamento dos distúrbios menstruais .............................................. 27
e. Tratamento da infertilidade.................................................................. 27
i. Citrato de Clomifeno (CC) ................................................................ 27
ii. Inibidores da aromatase ................................................................... 28
iii. Gonadotrofinas.................................................................................. 28
iv. Técnica de Reprodução Assistida (TRA) ........................................ 29
v. Coagulação Laparoscópica Ovariana (CLO) .................................. 29
9. Referências bibliográficas ...................................................................... 30
SÍNDROME DOS OVÁRIOS POLICÍSTICOS

1. Introduçāo.
A Síndrome dos ovários policísticos (SOP), anovulação crônica,
hiperandrogênica ou policistose ovariana é considerada um distúrbio endócrino
complexo, é uma das endócrinonopatias mais comuns, que dependendo dos
critérios de diagnostico podem acometer de 1 em cada 5 mulheres em idade
reprodutiva.
Segundo a Sánchez et al. (2017), historicamente essa síndrome foi
descrita em meados do século XIX por Cereal e Rokitansky, mas o
conhecimento foi mais aprofundado a partir dos estudos de Irving Stein e
Michael Leventhal, em 1935, cerca de 90 anos depois, onde repararam uma
relação entre amenorreia, hirsutismo e obesidade nas mulheres e cujos ovários
tinha aspecto policístico. A descrição desses ovários era que eles eram
aumentados de volume bilateralmente, com capsulas espessadas e
esbranquiçadas e com múltiplos cistos sendo a maioria subcapsular e isso
associado a um estroma denso e hipertrófico. Com o decorrer dos estudos
anatomopatológicos e histológicos eles perceberam que as características
clinicas eram heterogêneas e que se caracterizava como uma Síndrome e nāo
uma doença, sendo nomeada como “Síndrome dos ovários policísticos”. Com a
evoluçāo da tecnologia no mundo e na area médica acrescentaram outros
critérios para se investigar a doença e dar um diagnóstico, onde o que antes
eram apenas avaliados critérios clínicos e anatômicos, com a evolução
passaram a utilizar e investigar critérios bioquímicos e ultrassonográficos
(Marcondes et al., 2013).
Segundo Marcondes et al, (2013), a definição dessa síndrome pode ser
dada como: A SOP é um distúrbio no eixo neuro-endócrino-reprodutor,
associado a alterações morfológicas ovarianas e produção androgênica
elevada. Onde a característica mais evidente e que deve ser ressaltada é o
hiperandrogenismo associado ao estado de anovulação crônica, que vai ter um
reflexo na saúde cardiovascular da mulher a longo prazo.
Sobre a nomenclatura desta síndrome, segundo Escobar-Morreale
(2018), a SOP pode ser tudo exceto policística. A aparência do ovário

1
policístico achada nas paciente é causada pela acumulaçāo de folículos
ovarianos em diferentes estágios de maturaçāo e/ou atresia. E esses folículos
ovarianos nāo sāo cistos e sim um agregado de células que contem um único
oócito. Já o cisto, em termos médicos, são sacos membranosos ou cavidades
de caráter anormal contendo fluido, sendo assim o nome da síndrome do
ovário policístico é considerado um “misnomer” ou um equívoco. De acordo
com o Workshop em SOP do Instituto Nacional do Escritório de Saúde
Patrocinado pela Prevençāo na Metodologia Baseada na Evidencia de 2012
recomendou que um novo nome deveria ser posto na SOP, sendo essa
proposta apoiada fortemente por alguns associações de profissionais,
organizações de saúde da mulher e um grupo de suporte ao paciente com SOP
da Austrália, pois precisa de um nome que englobe e reconheça a síndrome
seus padrões complexos, entretanto, com falta de evidências concretas sobre
sua etiologia e fisiopatologia, os nomes propostos até o momento nāo
contemplam a síndrome em sua totalidade.
Segundo Sanchez et al. (2017), comumente associada a obesidade
(50% das pacientes), resistência insulínica (RI) (cerca de 50% a 90% das
pacientes), aumentando assim o risco de diabetes melito (DM), risco
cardiovascular, hipertensão arterial, dislipidemia, e associando a obesidade,
diabetes melito e a dislipidemia, essas pacientes tem mais risco a síndrome
metabólica. Além de ter um acometimento psicossocial, onde ha componentes
como depressão, ansiedade, baixa auto-estima, desordens alimentares e
disfunção psicosexual. Por conta dessas manifestações sistêmicas a SOP nao
pode ser considerada nem avaliada apenas como um acometimento
ginecológico, mas precisa de uma abordagem sistemática e detalhada,
especialmente em pacientes obesas. (Kakoly et al., 2018).

2. Epidemiologia
Marcondes et al., (2013) destaca que a prevalência da síndrome do
ovário policístico varia entre 6 a 8% da populaçāo feminina durante o período
reprodutivo. Outros estudos epidemiológicos feitos na Grécia, Estados Unidos
da America e Espanha indicaram que a prevalência da SOP é estimada entre 4
a 8% das mulheres. Por terem muitos consensos de critérios diagnósticos sua
prevalência pode aumentar ou diminuir de acordo com o critério utilizado.

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Recentemente um estudo epidemiológico, utilizando os critérios diagnósticos
do Consenso de Rotterdam (presença de 2 dos 3 critérios: Oligoanovulaçāo ou
anovulaçāo; Hiperandrogenismo clínico e/ou bioquímico; ovários policísticos)
avaliou uma prevalência de 18%, sendo que 70% das mulheres nāo tinham
diagnostico prévio de SOP. Neste estudo ainda correlacionaram SOP com
obesidade, onde se viu uma prevalência de SOP em 28% das mulheres obesas
que não foram selecionadas para o estudo e apenas 5% das mulheres magras.
A SOP é considerada a maior causa de hirsutismo, a principal causa de
hiperandrogenismo e anovulação nas mulheres em idade reprodutiva. Além
disso, Marcondes et al., (2013), realça que há evidencias de comprometimento
precoce do sistema vascular, apresentando aterosclerose subclínica. Em
alguns estudos recentes foi demonstrado que as pacientes no período pós-
menopausa com história pregressa de SOP apresentam no exame de
cateterismo coronário um número maior de lesões e um pior prognóstico no
período pós-cateterismo.

3. Etiologia
A etiologia da SOP ainda nāo é totalmente esclarecida. Há evidências
de que a SOP é uma síndrome com herança genética que é poligênica e
multifatorial. Essa herança genética se da por haver evidências descritas da
SOP em familiares, māes e irmās. Há estudos que indicam genes que podem
ser transmitidos para ambos os sexos. Apesar de haver algumas evidências
ainda nāo há um gene determinado, necessitando de mais esforços na
tentativa de identificar.
Baseado no estudo de Escobar-Morreale (2018), há algumas hipóteses
para a etiologia da SOP, discutiremos duas delas que são: a hipótese pela
perspectiva evolucionista e a hipótese da segregaçāo familiar.
Na perspectiva evolucionista, houve uma origem evolucionária comum
baseada na sobrevivência, baseando a genética para a obesidade e a diabetes
melitos e também para SOP. Segundo essa teoria, nos tempos dos nossos
ancestrais, os humanos eram expostos a muitas advertidas e a um ambiente
hostil e extremamente estressante, onde havia muita atividade física, dieta rica
em carboidratos complexos e proteínas e pobre em gordura, além de haver
períodos de fome, trauma e infecções. Nessas condições houve uma seleçāo

3
genética para o genótipo “thrifty” e seus fenótipos deveriam auxiliar na
sobrevivência e selecionar esse genótipo durante a evoluçāo. Com o passar
dos anos, entretanto, esse ambiente hostil se dissipou e nāo há mais fome em
muitos países, diminuiu drasticamente o número de traumas e infecções e a
expectativa de vida aumentou. Sendo assim, o mecanismos de defesa do
genótipo “thrifty” e seus fenótipos já nāo sāo mais necessários e nem
benéficos, levando, assim, a um aumento dramático da prevalência da
obesidade, diabetes melitos e doenças cardiovasculares. Escobar-Morreale
(2018) pontua que a resistência à insulina deve ter tido um papel importante no
genótipo e fenótipo “thrifty”. Além disso, há a hipótese de ter ocorrido uma
cosegregaçāo de genótipos insulinoresistentes com aqueles relacionados com
a SOP e isso explicaria essa frequente associaçāo. Entretanto, para ser uma
hipótese relevante e aceitável os genes da SOP deveriam ter fornecido
vantagens de sobrevivência durante aquele tempo.
A SOP, quando se considera a etiologia, é uma desordem multigênica,
onde variantes genéticos predisponentes e de proteção interagem com as
influencias do ambiente e assim resultam nos diferentes fenótipos da SOP.
Pode-se listar alguns fatores ambientais como fatores influenciadores, como
dieta e estilo de vida, que fazem grande impacto e que são influenciados pela
raça e/ou etnia, pois os genes isolados em algumas populações com SOP
diferente de outras estudas. Há a hipótese de que essa agregaçāo familial da
SOP seja por certos fatores presentes dentro da familia que nao estejam
presentes em mulheres nao afetadas, sendo um mecanismo epigenético, uma
alteraçāo no cromossomo sem alterar a sequência do DNA. Escobar-Morreale
(2018) aponta que esse mecanismo epigenético inclui alterações fetais e
durante o desenvolvimento na infância como exposição a químicos ambientais,
certas drogas, o processo de envelhecimento e a dieta, são os fatores que se
mostram mais contribuintes para o desenvolvimento da SOP. Lista-se outros
fatores epigenéticos que são prevalentes e importantes, como intercorrências
na gravidez como hipertensao, diabetes, tabagismo, levando assim a um
crescimento intrauterino retardado. Esse crescimento retardado vem sido
estudado e é proposto que há induçāo do fenótipo “thrifty” nos bebês PIG’s
(pequenos para idade gestacional), sendo eles predispostos a ter resistencia à
insulina e a ter sobrepeso na infância. Essa criança vai estar predisposta a

4
desenvolver hipertensāo arterial sistêmica, intolerância a glicose, hiperatividade
androgênica e do eixo da adrenal com excesso relativo de cortisol, sendo um
hiperandrogenismo funcional ou até mesmo desenvolver SOP mais
tardiamente, especialmente quando o indivíduo é exposto a um estilo de vida
sedentário e uma dieta rica em gordura saturada.

4. Revisão de Fisiologia
Uma breve passagem pelo ciclo menstrual feminino e ovários é muito
importante para que seja melhor a compreensão do tema. Parte do sistema
genital feminino se situa na parte inferior do tronco, no interior da cavidade
pélvica. A grande estrutura óssea confere proteção a esses órgãos faz com
que o acesso cirúrgico a eles só pode ser feito pela abertura inferior, através do
períneo, ou pela abertura superior, através da parede abdominal ântero-lateral.
O ovário, na mulher nulípara, ocupa a fossa ovárica (de Waldayer), fossa
peritoneal de formato triangular, limitada pela artéria ilíaca interna, pelo ureter e
pela inserção do ligamento largo na parede lateral da cavidade pélvica. Ele é
mantido nesta fossa, em suspensão, por três ligamentos (ligamento suspensor
do ovário, o ligamento próprio do ovário (útero-ovárico), o ligamento de
coadaptação, e o mesovário. Os ovários estão constituídos por um estroma,
com duas regiões bem definidas: uma no centro do órgão, camada medular, e
uma periférica, camada cortical, revestida por um epitélio, camada germinativa.
Os folículos primordiais, que se encontravam latentes desde o início da vida
intra-uterina, quando selecionados, reassumem a divisão celular a partir da
meiose, ocorrendo a extrusão do primeiro corpúsculo polar. Em torno do sexto
dia, inicia-se a produção de líquido folicular que se acumula entre as células da
granulosa, determinando a formação de uma cavidade, o antro. Já denominado
secundário ou antral, o folículo inicia a produção de estrogênios, através da
interação do FSH nas células da granulosa e do LH nas células da teca. Com o
decorrer do ciclo, a concentração de receptores de FSH, e posteriormente de
LH, aumenta. Com o aumento do folículo antral ocorrem, então, a ovulação e a
formação do corpo lúteo. Os outros folículos selecionados não se desenvolvem
e sofrem atresia. No ciclo endometrial, os estrogênios estimulam o crescimento
endometrial (do estroma e das glândulas), e a progesterona o modifica,
transformando-o em secretor, além de bloquear as mitoses estimuladas pelos

5
estrogênios. As alterações histológicas do endométrio, durante o ciclo
menstrual, podem ser divididas em duas fases principais: A fase proliferativa ou
folicular, que decorre da ação dos estrogênios secretados pelos folículos
ovarianos, e a fase secretora ou lútea, que está sob influência predominante da
progesterona, secretada pelo corpo lúteo após a ovulação. Do ponto de vista
prático, podemos entender a menstruação como a descamação do endométrio
previamente estimulado pelos estrogênios e que fora modificado pela
progesterona, não havendo fecundação e havendo involução do corpo lúteo
(que secreta este hormônio). Analisando a via de síntese desses hormônios, a
progesterona é produzida nas células da granulosa e da teça, porém o
estrogênio necessita de ação da aromatase nas células da granulosa para que
seja este formado a partir de androgênios produzidos nas células da teca. Uma
vez que outros fatores hormonais influenciam nos ciclos (como a via bioquímica
de síntese de androgênios ser a mesma da glândula adrenal, hormônios da
tireóide terem influência também na função sexual, e a ação do hipotálamo e
prolactina na inibição da liberação de gonadotrofinas), distúrbios relacionados a
estes sistemas neuroendócrinos entram em diagnósticos diferenciais na
Síndrome dos Ovários Policísticos.

5. Fisiopatologia
Embora a fisiopatologia da Síndrome dos Ovários Policísticos ainda não
esteja plenamente compreendida, atribui-se ao hiperandrogenismo o seu papel
central. Este, por sua vez, está provavelmente relacionado à desregulação
enzimática da síntese de androgênios nas adrenais e nos ovários (citocromo
P450c17 - CYP 17). Acredita-se que o compartimento ovariano é o colaborador
mais consistente desse processo. Mais 3 compartimentos podem estar
afetados e influenciar na apresentação da SOP (hiperandrogenismo e
anovulação crônica): compartimento ovariano, adrenal, hipotálamo-hipófise e
periférico).

a. Modelo explicativo para instalação e manutenção da SOP


Alterações na pulsatilidade de GnRH podem aumentar a razão LH:FSH,
feito que leva à estimulação da síntese de androgênios ovarianos (aumento do
LH), como também à redução da conversão de androgênio em estradiol, devido
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à queda relativa de FSH, que deixa de estimular adequadamente a aromatase
de dentro das células da granulosa.
Níveis elevados de androgênios, no meio intrafolicular, levam a atresia
folicular. Já na circulação sanguínea, levam a anormalidades no perfil lipídico
dos pacientes, que também pode repercutir em hirsutismo e acne. Observar
que também pode ter origem na glândula adrenal. Os níveis séricos elevados
de androgênios são convertidos a estrogênios na periferia, principalmente no
tecido adiposo, o que leva, em obesas, a elevados níveis de estrogênio. Essa
retroalimentação crônica do hipotálamo e da hipófise, sem oposição (como
seria o caso das rápidas flutuações fisiológicas de estradiol), pode resultar em
hiperplasia endometrial.
A resistência insulínica, instalada geneticamente e/ou devido ao
aumento de tecido adiposo em pessoas obesas, contribui para o
desenvolvimento de atresia folicular e para anormalidades cutâneas, como a
acantose nigricans.
Atresia folicular leva à anovulação, com oligomenorreia e amenorreia.
Lembrando que a SOP pode ter origem em qualquer órgão do sistema.
Como exemplo, o hiperandrogenismo pode ocorrer devido à anormalidade
intrínseca na produção enzimática e/ou estimulação hipotálamo-hipofisária
anormal por LH ou FSH.

b. Anormalidades dos Compartimentos na Fisiopatologia da


SOP

i. Compartimento Hipotálamo-Hipófise
Alterações na pulsatilidade de GnRH levam a uma liberação maior de LH
em detrimento de FSH. Atualmente não se sabe se essa desregulação é causa
da SOP ou consequência do feedback anormal dos esteroides. Em qualquer
uma das situações, o LH aumenta, o que é observado em cerca de 50% das
mulheres afetadas.
A hipersecreção de LH estimula as células do estroma ovariano e da
teca (hiperplasia), aumentando a produção de testosterona e androstenediona.
Estes esteroides são também convertidos pela aromatase em estrogênio, o que
explica o hiperestrogenismo observado nas pacientes. O hiperestrogenismo

7
também suprime a liberação de FSH, o que também contribui ao aumento da
relação LH:FSH, podendo ser maior que 2 em cerca de 60% das pacientes.

ii. Compartimento Ovariano


Os ovários são as principais fontes de androgênios na SOP, embora
também possa haver produção aumentada de androgênios pelas adrenais. O
mecanismo central da SOP, como já mencionado, pode ser por desregulação
enzimática da enzima formadora de androgênios nas adrenais e nos ovários
(citocromo P450c17 ou CYP 17), mas também já foram documentadas
desregulação de outras enzimas, como a 5-alfa-redutase e aromatase. O efeito
imediato desse aumento de androgênios é a redução da liberação de FSH. O
hiperandrogenismo também desregula a pulsatilidade da liberação de GnRH, o
que eleva a liberação de LH. Ambos os fatores contribuem para a elevação da
razão LH:FSH nessas pacientes. Lembrando que o LH estimula as células da
teca ovariana a produzirem mais androgênios. O FSH suprimido, por sua vez,
não realiza a sua adequada função em estimular o desenvolvimento folicular,
fazendo com que os folículos atrofiados acumulem-se abaixo da albugínea,
conferindo ao ovário um aspecto policístico. Os folículos atrésicos são ricos em
inibina B, a qual também inibe a secreção hipofisária de FSH.
Os androgênios em excesso não sofrem aromatização pela falta de FSH
e repercutem a nível ovariano e sistêmico. A nível ovariano, há espessamento
da albugínea (por proliferação fibroblástica) e aceleração da atresia folicular;
além disso, nessas pacientes, a seleção do folículo dominante está alterada. A
nível sistêmico, observam-se os efeitos do hiperandrogenismo (hirsutismo,
acne, perfil lipídico anormal e demais consequências).
Inibidores do FSH (como o sistema IGF) parecem ser os responsáveis pela
redução da atividade da aromatase ovariana nas células da granulosa de
folículos pequenos.
O microambiente androgênico ovariano é, então, um ponto fundamental da
SOP, que contribui para o processo de atresia folicular.

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iii. Compartimento Adrenal
Também participa do desenvolvimento da SOP. Embora a enzima CYP
17 hiperfuncionante coexista tanto nos ovários como nas adrenais, o SDHEA
aumentado só é encontrado em aproximadamente 50% das pacientes com
SOP.

iv. Compartimento Periférico


Pele e tecido adiposo. Além da ação elevada dos androgênios pelo
hiperandrogenismo, esta pode ocorrer devido ao aumento na sensibilidade,
disponibilidade e no clearance dos androgênios na periferia. Foram
encontradas alterações na ação da aromatase e da 5 alfa-redutase.
Os androgênios na periferia são convertidos em estrona (maior
aromatização periférica dos androgênios; existência de um estado
hiperestrogênico crônico, com inversão da relação estrona:estradiol (E1>E2).
Em excesso, eles tendem à 5-alfarredução, com a formação de di-
hidrotestosterona (o androgênio mais potente, não mais aromatizado em
estrogênio; determinam em grande parte a presença ou ausência de
hirsutismo). Esses metabólicos em excesso inibem a aromatase ovariana e a
produção de estradiol.

c. Papel da Obesidade na Fisiopatologia da SOP


Comumente encontrada nas pacientes com SOP, pode interferir no
processo ovulatório por: aumento da aromatização periférica dos androgênios
em estrogênios (estrona); inibição da síntese hepática de SHBG -> aumento da
fração livre de estradiol e testosterona; aumento dos níveis de insulina, que
atua de forma sinérgica com as gonadotrofinas -> síntese aumentada de
androgênios pelas células da teca do estroma ovariano. Obs. importância da
obesidade é confirmada na SOP pela regularização dos ciclos e até concepção
após redução ponderal superior a 5%.

d. Papel da Resistência à Insulina e Hiperinsulinismo na


Fisiopatologia da SOP
Embora a RI seja encontrada com mais frequência em pacientes
obesas, acredita-se que o mecanismo envolvido na SOP não faça relação com
o fator obesidade, podendo ser encontrada tanto em pacientes obesas quanto

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em não obesas. A RI e a hiperinsulinemia fazem parte da disfunção
esteroidogênica ovariana na SOP, influenciando de forma independente das
gonadotrofinas a ovulação (receptores de insulina e do IGF-1 estão presentes
nas células estromais ovarianas). A hiperinsulinemia compensatória produz
várias ações sobre os tecidos, que levam ao aumento do nível de testosterona
livre. Dentre estas ações, destacam-se: acantose nigricans na pele, aumento
da reatividade endotelial e a diminuição da quantidade de SHBG secretada
pelos hepatócitos.
Estudos demonstram que a RI precede o aumento nos androgênios, e
não teriam relação com a hiperandrogenemia.
A insulina atua, juntamente com os IGF, em receptores de IGF-1 e IGF-2
no estroma ovariano. Quando estimulados, estes receptores determinam maior
produção de androgênios neste setor (androstenediona e testosterona),
levando à atresia acelerada. A conversão periférica de androgênios em estrona
se mantém e, como a SHBG está diminuída, há maior concentração de
estrona, que eleva os níveis de LH, consequentemente estimulando as células
tecais, fechando um ciclo de estímulo hiperandrogênico.
Além da RI, ocorre uma disfunção nas células beta-pancreáticas
semelhantes ao que ocorre no DM 2, com insulina basal elevada e secreção
diminuída no período pós-prandial.

6. Manifestações clínicas
A síndrome do ovário policístico tem uma diversidade de manifestações
clínicas. Classicamente, os sinais e sintomas se tornam evidentes alguns anos
após puberdade.
São eles:
1) Irregularidade menstrual:
Varia de amenorreia (ausência de fluxo menstrual por pelo menos três
meses) a oligomenorreia (ciclos com intervalos longos) até sangramento
uterino disfuncional episódico (menometrorragia), que pode cursar com
anemia.
a) Oligomenorreia / amenorreia
Como há um estado anovulatório persistente e ausência de formação
de corpo lúteo, não há produção de progesterona e, por isso, não

10
ocorre a queda da progesterona que desencadeia a menstruação,
levando assim à oligomenorreia ou amenorreia. A maioria das
pacientes só menstrua com a utilização do teste de progesterona ou
com o uso de anticoncepcionais hormonais.
b) Sangramento uterino disfuncional
Pela falta de produção de progesterona pela anovulação, as
pacientes com SOP podem se apresentar com sangramento intenso
e imprevisível. O que ocorre é um estímulo estrogênico no
endométrio não antagonizado pela progesterona, com estimulação
proliferativa mitogênica constante. Essa instabilidade do endométrio
espessado resulta em sangramento com padrão imprevisível. A
longo prazo pode produzir hiperplasia endometrial e, até mesmo,
carcinoma.
2) Hiperandrogenismo
Manifesta-se geralmente na forma de hirsutismo, acne e/ou alopecia
androgênica.
a) Hirsutismo
A SOP é responsável por cerca de 80% dos casos de hirsutismo. É
preciso lembrar que uma grande quantidade de medicamentos pode
causar hirsutismo e, portanto, seu uso deve ser investigado.
O hirsutismo se caracteriza pelo crescimento de pelos grossos e
pigmentados (pelos terminais) em regiões onde não deveriam existir
na mulher (face, tórax e abdome), ou seja, se apresentam como um
padrão masculino.
Deve ser distinguido da hipertricose, que consiste no aumento
lanuginoso generalizado, ou seja, corresponde à presença de pelos
macios e ligeiramente pigmentados associado ao uso de alguns
medicamentos e malignidades.
Especialmente para fins de pesquisa, a quantificação do grau de
hirsutismo é feita com base no sistema de pontuação de Ferriman e
Gallwey. É uma escala própria que estipula um somatório de pontos
para partes específicas do corpo como face, tórax, abdome, genitália,
dorso e raiz da coxa. São atribuídos pontos para cada região e,

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quando a pontuação é maior que oito, confirma-se a presença de
hirsutismo.
b) Alopecia frontal
Tipicamente masculina, é um sinal mais raro de hiperandrogenismo
em mulheres com SOP. A perda de cabelos evolui lentamente e se
caracteriza por afinamento difuso na coroa, com preservação do
contorno frontal do couro cabeludo. No entanto, devem ser excluídas
outras causas como tireoidopatias, anemia e outras afecções.
c) Acne vulgar e seborreica
Pode-se observar o desenvolvimento de pele oleosa, com formação
de acne vulgar facial e seborreica.
3) Obesidade
É definida por índice de massa corporal (IMC) maior que 30. Estudos
mostraram que ela ocorre em mais de 50% das pacientes com SOP. A
obesidade abdominal é a mais característica, que é fator de risco para
doença cardiovascular e diabetes mellitus.
4) Resistência à insulina
Embora a obesidade seja um dos fatores que agravam a resistência
insulínica, evidências científicas mostraram que tanto mulheres magras
como obesas com SOP apresentam taxas elevadas de RI e DM tipo 2,
em comparação com controles de mesmo peso sem SOP.
a) Acantose nigricans ou acantose nigricante
É um sinal clássico da resistência insulínica. A RI leva à
hiperinsulinemia que provavelmente estimula o crescimento de
queratinócitos e fibroblastos dérmicos, produzindo mudanças
características na pele. A avaliação histológica revela hiperaceratose
e papilomatose. É uma lesão cutânea espessa, pigmentada e
aveludada, que pode estar presente nas axilas, nuca, abaixo das
mamas, face interna das coxas e vulva.
5) Intolerância à glicose e diabetes mellitus tipo 2
Mulheres com SOP apresentam maior risco de intolerância à glicose e
DM tipo 2. Estudos demonstram disfunção das células beta
pancreáticas, independente da presença de obesidade, em pacientes
com SOP.

12
6) Dislipidemia
O perfil lipoproteico aterogênico clássico na SOP se caracteriza por
níveis elevados de lipoproteína de baixa densidade (LDL), níveis
elevados de triglicerídeos, níveis reduzidos de lipoproteína de alta
densidade (HDL) e aumento na razão entre colesterol total e HDL.
7) Hipertensão arterial sistêmica
Há um aumento da incidência de HAS que chega a aproximadamente
40% na perimenopausa.
8) Síndrome metabólica
Caracteriza-se por resistência à insulina, obesidade, dislipidemia
aterogênica e hipertensão arterial. Associa-se a um aumento no risco de
doença cardiovascular (DCV) e DM tipo 2.
Os critérios diagnósticos para síndrome metabólica pela I Diretriz
Brasileira de Diagnóstico e Tratamento da Síndrome Metabólica são:
circunferência abdominal maior que 88 cm para mulheres e 102 cm para
homens; pressão arterial igual ou maior que 130 ou 85 mmHg;
triglicerídeos maior que 150 mg/dl; HDL-colesterol menor que 50 mg/dl
em mulheres e menor que 40 mg/dl em homens e glicemia de jejum
maior ou igual a 100 mg/dl.
9) Infertilidade
É uma das queixas mais frequentes das pacientes com SOP e resulta de
ciclos anovulatórios.
10) Abortamento precoce
Mulheres com SOP que engravidam apresentam taxa elevada (30 a
50%) de abortamento precoce, em comparação com a taxa média de
aproximadamente 15% para a população geral. Alguns autores sugerem
que a insuficiência lútea seja a causa. Outros sugeriram que a
resistência insulínica esteja relacionada aos abortamentos nessas
mulheres.
11) Complicações na gravidez
Várias complicações gestacionais e neonatais foram associadas à SOP.
Estudos demonstram que mulheres com SOP apresentam risco duas ou
três vezes maior de diabetes gestacional, DHEG, parto prematuro e
mortalidade perinatal. Cabe salientar que mulheres com SOP requerem,

13
por vezes, o uso de indutores da ovulação ou de fertilização in vitro para
engravidar.
12) Apneia obstrutiva do sono
Provavelmente está relacionada com obesidade central e resistência à
insulina. Há dois tipos de SOP, isto é, com ou sem apneia do sono.
Cabe salientar que o tipo associado à AOP tem risco muito maior de DM
e doença cardiovascular.
13) Distúrbios psicológicos
Mulheres com SOP podem se apresentar com diversos problemas
psicossociais como ansiedade, depressão, baixa autoestima, redução da
qualidade de vida e imagem corporal negativa.

Exame físico
Durante o exame físico é recomendável:
-Medida da pressão arterial;
-Índice de massa corporal (IMC): 25-30: sobrepeso; acima de 30:
obesidade.
-Relação cintura-quadril: acima de 0,72: anormal, risco cardiovascular
elevado.
-Presença de sinais de hiperinsulinemia ou resistência à insulina
(acantose nigricans).
-Presença de sinais de hiperandrogenismo como acne, hirsutismo,
alopecia.

7. Diagnóstico

a. Conceito e Aspectos Gerais da Síndrome de Ovários


Policísticos (SOP)
Identificada como uma entidade sindrômica em 1935, a Síndrome de
Ovários Policísticos (SOP) foi primeiramente descrita por Stein e Leventhal
como uma associação entre anovulação crônica, obesidade, hisutismo e
diferentes graus de aumento ovariano. Com o advento de exames laboratoriais
e de imagem capazes de fornecer novos dados sobre as características
hormonais e morfológicas da SOP, posteriormente foram estabelecidos

14
critérios diagnósticos que consideravam aspectos bioquímicos e
ultrassonográficos além das alterações clínicas e anatômicas. (SIRMANS e
PATE, 2014)
Atualmente, três entidades propõem critérios diagnósticos para a SOP.
O primeiro deles, elaborado pelo National Institutes of Health (NIH), de 1990,
considera que:

a SOP seria consequente a um quadro de anovulação crônica


hiperandrogênica, devendo ser definida pela presença de
disfunção menstrual e excesso androgênico, que pode ser de
ordem clínica (hiperandrogenismo) ou laboratorial
(hiperandrogenemia). (MARCONDES, BARCELOS e ROCHA,
2011, p. 07)

Deste modo, para o Consenso de NIS, o diagnóstico de SOP deveria


incluir todos os seguintes critérios, em ordem de importância: primeiramente o
hiperandrogenismo e/ou a hiperandrogenemia, em segundo lugar a disfunção
menstrual e, por fim, a exclusão de outras desordens que pudessem causar um
excesso de androgênios.
O segundo grupo que se propôs a definir as bases diagnósticas para a
SOP foi a associação entre a European Society for Human Reproduction and
Embryology e a American Society for Reproductive Medicine (ESHRE/ASRM),
os quais, em 2004, elaboraram o consenso de Rotterdam que incorporam
achados de imagem em seus critérios (FERRIANI, 2004). Para este consenso,
o paciente possui SOP se apresenta dois dos seguintes:
1. Hiperandrogenismo clínico e/ou bioquímico, excluindo-se outras
etiologias de hiperandrogenismo;
2. Presença de ciclos anovulatórios ou oligoovulatórios;
3. Achado de ovários policísticos à ultrassonografia, isto é, presença de
12 ou mais folículos medindo entre 2-9mm ou volume ovariano
aumentado (>10 cm3).

Por considerar que a síndrome em questão pode manifestar-se por


fenótipos amplos e exigir apenas dois dos critérios citados acima, o consenso
de Rotterdam permite enquadrar mulheres sem hiperandrogenemia ou
hiperandrogenismo clínico no diagnóstico de SOP. Assim, mulheres com

15
disfunção ovulatória e presença de ovários policísticos, mas sem evidência de
hiperandrogesnismo são consideradas portadoras da síndrome. A principal
ressalva quanto a esta inclusão ocorre porque estudos demonstram que 23%
das mulheres apresentam múltiplos cistos em seus ovários ao exame
ultrassonográfico, mas apenas 5-10% delas apresenta os sintomas clássicos
de SOP (LEE e RAUSH, 2012). Além disso, o consenso de Rotterdam não
exige como critério diagnóstico a disfunção menstrual, alegando que distúrbios
ovulatórios subclínicos podem ocorrer em mulheres com menstruação regular
(SIRMANS e PATE, 2014)). Trata-se, portanto, de um critério mais amplo se
comparado com o de NIH (1990), que pode levar a um aumento significante da
população considerada afetada (AZZIZ et al. 2009).
Por fim, em 2006 a Androgen Excess and PCOS Society (AE-PCOS
Society) elaborou o mais recente critério diagnóstico para SOP, a partir da
concordância de que a síndrome é fundamentalmente uma desordem por
excesso de androgênios que gera características clínicas que, em conjunto,
apresentam riscos para anormalidades metabólicas e resistência a insulina.
Para este posicionamento, é fundamental que o hiperandrogenismo clínico ou
laboratorial esteja presente e associado com anovulação ou com ovários
policísticos. Assim, segundo a AE-PCOS (2006, apud Azziz et al. 2009), um
paciente pode ser diagnosticado com SOP se apresentar todos os seguintes:
1. Oligo e/ou anovulação ou ovários policísticos à ultrassonografia;
2. Evidências clínicas ou laboratoriais de excesso androgênico.

Apesar das diferenças supracitadas, os três consensos sobre o assunto


consideram a SOP um diagnóstico de exclusão, sendo necessário descartar
outras doenças que possam mimetizar seu fenótipo, como a forma não clássica
de hiperplasia adrenal congênita, disfunções tireoidianas, neoplasias
virilizantes da adrenal e do ovário, síndromes de resistência severa à insulina e
hiperprolactinemia, as quais podem responder por 5% a 10% das síndromes de
excesso androgênico. Contudo, não há consenso sobre quais doenças devem
ser rastreadas e excluídas para o diagnóstico de SOP. (MARCONDES,
BARCELOS e ROCHA, 2011)
O Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (2007) recomenda
que todas as mulheres com suspeita de SOP sejam avaliadas quanto sua

16
função tireoidiana, quanto aos níveis de prolactina sérica, de testosterona livre
e ao índice androgênico livre. Assim, apenas no caso de mulheres que
apresentam amenorreia e fenótipos mais severos, deve-se realizar o rastreio
de outras condições causadoras de hiperandrogenismo. Nesses casos, Legro
et al. (2013) sugerem a pesquisa de tumores secretores de androgênios,
amenorreia hipotalâmica, gravidez, insuficiência ovariana primária, acromegalia
e síndrome de Cushing. A definição de quais exames laboratoriais para afastar
os diagnósticos diferenciais deve, contudo, basear-se na história e nos
achados clínicos de cada paciente, de modo individualizado.
É importante ressaltar que como a SOP está associada a várias
alterações metabólicas e fatores de risco cardiovascular como obesidade
central, resistência à insulina, dislipidemia, hipertensão arterial, intolerância à
glicose, diabetes mellitus tipo 2 (DM2), síndrome metabólica, doença renal ou
vascular. Portanto, é relevante a avaliação metabólica de todas as pacientes
com suspeita de SOP, para fins de elaboração de prognóstico. A figura a seguir
exemplifica o papel dos exames laboratoriais e complementares no diagnóstico
da SOP.
TODAS AS PACIENTES APENAS ALGUMAS PACIENTES

+ Em caso de
Suspeição clínica

17
Outro aspecto importante é o diagnóstico de SOP em adolescentes, pois
alguns sinais e sintomas da síndrome, tais como acne e oligo ou amenorreia
são achados fisiológicos desta faixa etária, principalmente em seu início. Nesse
sentido, Carmina e cols. (2010, apud MARCONDES, BARCELOS e ROCHA,
2011) sugerem ser necessário a presença de todos os critérios de Rotterdam
(2004) para diagnosticar seguramente SOP na adolescência. Além disso, a
oligomenorreia só deve ser valorizada se ocorrer por mais de dois anos, de
modo que o hirsutismo passa a ser o único sinal aceito como indicador de
excesso androgênico.
Por fim, embora não seja comum, é possível identificar ovários
policísticos em ultrassonografias de mulheres na perimenopausa e climatério.
Como não existem critérios diagnósticos de SOP voltados para este público, o
The Endocrine Society Clinical Practice Guideline (LEGRO, 2013) sugere que o
diagnóstico de SOP dessas mulheres seja baseado em uma história clínica
bem documentada de oligomenorreia e hiperandogenismo durante seus anos
reprodutivos.

b. Exames laboratoriais para o diagnóstico de SOP


Os exames laboratoriais de base sugeridos pelo Royal College of
Obstetricians and Gynaecologists (2007) e pelo The Endocrine Society Clinical
Practice Guideline (LEGRO, 2013) para todas as pacientes com suspeita de
SOP consistem em:
- Avaliação da função tireoidiana: conforme descrito acima, as
desordens da tireoide possuem um profundo impacto nos níveis dos hormônios
sexuais femininos e consequentemente em seu ciclo menstrual e saúde
reprodutiva. Redmond (2004) demonstrou que estados de hiperfunção
tireoideana (hipertireoidismo) elevam os níveis da globulina ligadora de
hormônios sexuais e de LH, aumentando os níveis totais de estrogênio (em 2 a
3 vezes) e de testosterona. Já o hipotireoidismo, diminui as globulinas ligadoras
de hormônios sexuais, aumenta os níveis de LH e de estradiol e testosterona
livres. Assim, ambas podem desencadear alterações menstruais e hirsutismo
leve. Por isso, deve-se dosar os níveis de TSH e de T4 livre.
- Dosagem da Prolactina sérica: A hiperprolactinemia é uma causa
frequente de amenorreia e de infertilidade, uma vez que está associada com a

18
produção excessiva de androgênios adrenais, mecanismo este, que pode
promover hiperandrogenismo. Na prática clinica, percebe-se que
hiperprolactinemia apresenta sinais mais leves de hiperandrogenismo, se
comparada a SOP. Contudo, como esta última possui um espectro amplo de
fenótipos, os níveis de prolactina sérica devem sempre ser dosados.
- Testosterona e Indice Androgênico Livre: O rastreio da
hiperandrogenemia através da dosagem sérica de testosterona total e do
cálculo do Índice Androgênico Livre (IAL) deve ser realizado em todas os
pacientes com suspeita de hiperangrogenismo, isto é, hirsutismo associado a
distúrbio menstrual, infertilidade, obesidade central, acanthosis nigricans;
hirsutismo moderado a grave; ou hirsutismo de início súbito e progressão
rápida. A mensuração da testosterona total deve ser realizada na fase folicular,
preferencialmente entre os dias 3-5 do ciclo de mulheres com ciclo menstrual
regular. É necessário atentar-se para o uso de fármacos que possam interferir
nas concentrações da testosterona. Se este for o caso, os testes devem ser
realizados no mínimo 30 dias após a retirada desses fármacos. Contudo,
somente a testosterona total não é suficiente para caracterizar a
hiperandrogenemia, pois as concentrações de testosterona total variam com o
gênero, índice de massa corpórea (IMC), idade, etnia, uso de medicações
(contraceptivos hormonais, metformia, atorvastatina, cetoconazol, dentre
outros) e durante o dia. Assim, a faixa de normalidade é ampla e os métodos
foram padronizados para o sexo masculino. Como consequência, ainda não
existem valores de normalidade padronizados para a população feminina de
nosso país. Por esta razão, o índice androgênico livre (IAL), calculado pela
fórmula de Vermeulen, é “utilizado na prática clínica diária por ser considerado
um método sensível para avaliação de hiperandrogenismo e da bioatividade da
testosterona” (PONTES e FILHO, 2016, p. 11).

𝑡𝑒𝑠𝑡𝑜𝑠𝑡𝑒𝑟𝑜𝑛𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 (𝑛𝑚𝑜𝑙 ⁄𝑚𝐿) 𝑥 100


𝐼𝐴𝐿 =
𝑆𝐻𝐵𝐺 (𝑛𝑚𝑜𝑙 ⁄𝑚𝐿)
* SHBG = Globulina ligadora de hormônios sexuais
* IAL superior a 8 indica hiperandrogenemia

19
- Dosagem da 17α-hidroxiprogesterona: As apresentações clínicas da
forma não clássica da Hiperplasia Adrenal Congênita (HAC-NC) consistem em
oligo-amenorreia, hisrustismo, hiperandrogenemia, acne e infertilidade, ou seja,
são as mesmas da SOP. Outros sinais sugestivos da HAC-NC são o aumento
do clitóris, baixa estatura e pubarca precoce, mas estes são inespecíficos. Ela
também pode apresentar níveis elevados de LH e ovários policísticos ao USG,
sendo necessária sua devida exclusão laboratorial para o correto diagnóstico
de SOP. A HAC-NC é uma desordem na biossíntese do colesterol em que a
diminuição deste hormônio acarreta na perda do feedback negativo do mesmo
sobre o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, levando a um aumento na secreção
de ACTH, que por sua vez estimula a produção adrenal de androgênios. A
forma mais comum da HAC é a deficiência da enzima 21-hidroxilase (21-OH),
sem a qual ocorre o acúmulo de 17 α-hydroxiprogesterona (17-HP), seu
principal substrato. Deste modo, elevados índices de 17-HP são indicativos de
HAC-NC e excluem SOP.

c. Exames para exclusão de diagnósticos diferenciais


De acordo com o The Endocrine Society Clinical Practice Guideline
(LEGRO, 2013), em caso de sinais e sintomas sugestivos de dúvida, os
diagnósticos diferenciais descritos a seguir devem ser descartados para o
correto diagnóstico de SOP.
- Gravidez: deve ser sempre descartada em casos de amenorreia
associada a outros sinais como cólicas abdominais e dores nos seios, através
da dosagem sérica ou urinária do hCG.
- Amenorreia hipotalâmica: presença de amenorreia e baixo peso (IMC),
associados a prática excessiva de exercícios físicos, poucos sinais de excesso
androgênico e presença ou não de ovários multifoliculares. A dosagem de FSH
e LH. Cursa com níveis baixos de FSH, LH e estradiol séricos.
- Insuficiência ovariana primária: combinação de amenorreia e sintomas
de deficiência de estrogênio, como alterações urogenitais e ondas de calor.
Suspeitar em mulheres na perimenopausa. Apresenta altos níveis de FSH e
baixos de estradiol.

20
- Tumores secretores de Androgênios: sintomas virilizantes de início
abrupto, incluindo a mudança no timbre da voz, alopecia androgênica de
padrão masculino e aumento do clitóris. Em caso de suspeita, dosar os níveis
de testosterona sérica e sulfato de dehidropiandrosterona (DHEAS), os quais
podem apresentar-se marcadamente elevados. Se isto ocorrer, deve-se
realizar o rastreio dos tumores com RNM de adrenais e USG de ovários.
- Síndrome de Cushing: a SOP e a Síndrome de Cushing possuem
muitos sintomas em comum, como obesidade, presença de gordura
dorsocervical, intolerância a glicose, dentre outros. Contudo, a síndrome de
Cushing apresenta outros sintomas característicos que permitem sua
diferenciação: estrias violáceas, pletora, fáscies característica, dentre outros. O
diagnóstico laboratorial da síndrome de Cushing se faz através da dosagem do
Cortisol (urinária de 24h, salivar ou resposta ao teste de supressão com
dexametasona), o qual deve estar aumentado.
- Acromegalia: a presença de oligomenorreia concomitante a alterações
de pele, como hirsutismo, hiperidrose, acne e espessamento podem ser
sugestivos tanto de SOP quanto de acromegalia. A diferença é que este último
cursa também com perda de visão periférica, macroglossia, aumento dos ossos
frontal e mandibular, aumento dos pés e mãos. A detecção da acromegalia se
faz com dosagem de IGF-1 livre elevado, que indica o rastreio de massas
hipofisárias com RNM.

d. Exames para Estratificação e Acompanhamento


Apesar de não ser necessária para o diagnóstico, a avaliação do perfil
metabólico dos pacientes com suspeita de SOP é importante para uma
classificação detalhada da síndrome e também para avaliação de riscos,
principalmente em pacientes obesas. Tem importância, portanto, para a
elaboração do prognóstico e para a terapêutica das possíveis complicações.
PONTES e FILHO, 2016 sugerem os seguintes exames para estratificação e
acompanhamento de pacientes com SOP:
- Cálculo do IMC
- Medida da circunferência abdominal
- Pressão Arterial

21
- Perfil lipídico: Deve ser realizado o cálculo do LDL e do Colesterol Não-
HDL (Colesterol Não-HDL = Colesterol Total – HDL)
- Glicemia de jejum
- Teste Oral de Tolerância a Glicose (TOTG)

A partir desses exames, as pacientes com SOP podem ser estratificadas


de acordo com o risco para desenvolvimento de doenças cardiovasculares
(DCV), sendo divididas em pacientes com risco e pacientes com alto risco. (AE-
PCOS, 2006 apud Azziz et al. 2009)

RISCO para DCV ALTO RISCO para DCV


- Obesidade - Síndrome Metabólica
- Tabagismo - Diabetes Mellitus tipo 2
- Hipertensão - Sobreposição de doenças
- Dislipidemia (aumento do LDL e/ou vasculares, renais ou
diminuição do HDL) cardiovasculares
- Doença vascular subclínica - Apneia Obstrutiva do Sono.
- Intolerância a glicose
- História familiar de doença
cardiovascular prematura (<55 anos
em homens e < 65 em mulheres)

e. Exames de Imagem
No que diz respeito aos exames de imagem, a ultrassonografia (USG) é
o padrão ouro para detecção das alterações características da síndrome.
Entretanto, é vale ressaltar que os ovários policísticos são achados bastante
comuns na prática ultrassonográfica ao mesmo tempo em que apenas 75-80%
das mulheres com SOP apresentam múltiplos cistos em seus ovários. Deste
modo, apesar de darem nome à síndrome em questão, os ovários policísticos
não são patognomônicos da SOP. Assim, a importância dos exames de
imagem reside na possibilidade de identificar e documentar a presença de
ovários policísticos em pacientes com evidências de excesso androgênico.

22
Tanto a junta de Rotterdam (2003) quanto o Consenso da AE-PCOS
(2009), e posteriormente os protocolos do American College of Obstetricians
and Gynecologists, consideram o volume ovariano e o número de folículos
como base para o diagnóstico da SOP. De acordo com essas entidades (apud
LEE e RAUSH, 2012), a presença de ao menos um dos critérios abaixos é
suficiente para confirmar a presença de ovários:
1. Um ou ambos os ovários apresentam 12 ou mais folículos medindo
entre 2-9 mm de diâmetro; ou
2. O volume de um ou de ambos os ovários ultrapassa 10 cm.

Dentre os tipos de USG realizados, a transvaginal é mais indicada,


principalmente em pacientes obesos, porque proporciona uma melhor
visualização das estruturas internas dos ovários. Contudo, em pacientes que
nunca tiveram relações sexuais ou que se recusam a realizar o exame, o USG
transabdominal torna-se a opção de escolha. É importante ressaltar que para o
USG transabdominal a bexiga deve estar cheia, mas não demasiadamente a
ponto de comprimir os ovários e dificultar a sua mensuração.
Além disso, de acordo com o Consenso de Rotterdam, o USG deve ser
realizado na fase folicular precoce do ciclo, sempre que possível, isto é, entre
os dias 3-5 do ciclo menstrual de mulheres que apresentam regularidade no
mesmo. Já em pacientes com oligo ou amenorreia o USG pode ser realizado
aleatoriamente ou após 3-5 dias de fluxo menstrual induzido pela administração
de progesterona.

8. Tratamento
Segundo o Ministério da Saúde (2013), o tratamento da SOP baseia-se
nos sintomas, na prevenção e no controle de alterações metabólicas e na
redução de fatores de risco cardiovasculares relacionados com resistência
insulínica, quando houver. Existem várias condutas terapêuticas de acordo com
o quadro apresentado, sendo que algumas constituem opções para inúmeras
manifestações. Sánches et al. (2017) destacam que devem ser abordados itens
como modificações do estilo de vida, tratamento do fenótipo (irregularidade
menstrual e hiperandrogenismo), correção dos distúrbios metabólicos e desejo
de concepção.

23
a. Estilo de vida
Segundo o ACOG Practice Bulletin (2009), há evidências crescentes de
que mulheres com SOP podem ser beneficiadas pela adoção de dietas com
restrição glicêmica, com alívio do quadro de hiperinsulinemia e suas
consequências metabólicas. Aceita-se que também a perda ponderal de 5% a
7%, associada à atividade física, amenize as manifestações de
hiperandrogenismo, reduza a hiperinsulinemia e favoreça o retomo de ciclos
ovulatórios em 75% dos casos, com ocorrência de gravidez espontânea em
algumas pacientes

b. Tratamento dos distúrbios metabólicos


Sánches et al. (2017) pontuam que a resistência à insulina é con-
siderada o principal ou um dos principais mecanismos envolvidos na etio-
patogenia da SOP. Assim, sua correção assume grande importância na
abordagem terapêutica do problema.
Reis et al. (2009) explicam que a metformina é um hipoglicemiante da
classe das biguanidas de segunda geração, que atua primariamente na
supressão da gliconeogênese hepática e na recaptação periférica da glicose.
Pode ser usada em mulheres com RI, obesas ou com intolerância a glicose,
associada às mudanças de estilo de vida. A metformina leva a melhores
resultados nas taxas de ovulação quando comparados ao placebo em
mulheres com SOP e sua manutenção na gravidez parece ser benéfica na
prevenção de aborto no primeiro trimestre.
A dose recomendada é de 850 mg a 2.500mg/dia (dividida em duas a
três vezes), sendo habitualmente iniciada em doses menores, que podem ser
aumentadas de acordo com acompanhamento clínico. (SÁNCHES et al., 2017)
As estatinas têm recebido apoio emergente na literatura para um
benefício cardiovascular e endócrino em mulheres com SOP, mas seus
efei¬tos em longo prazo na prevenção de doenças cardiovasculares em
mulheres jovens ainda são incertos, assim como o são as consequências do
uso durante a gestação (ACOG Practice Bulletin, 2009).

24
Butterworth, Deguara e Borg (2016) destacam que a gastrectomia
(cirurgia bariátrica) também pode trazer benefícios a mulheres que possuem
SOP e IMC superior a 35 Kg/m2, contribuindo para a melhora da irregularidade
menstrual e do hirsutismo, entre outras manifestações desta símdrome.

c. Tratamento antiandrogênico
O tratamento clínico tem como objetivo a supressão da produção
ovariana ou adrenal de androgênios, ou o bloqueio de sua ação na pele. A
resposta terapêutica costuma ser lenta, devendo o tratamento ser feito por um
período mínimo de seis a nove meses no caso de hirsutismo, e cerca de três
meses no caso de acne, observando-se recorrência caso o tratamento seja
interrompido Somente tratamentos de remoção de pelo de longa duração, como
eletrólise e remoção a laser podem ser recomendadas para um melhor
resultado estético (LIZVENNA et al., 2016).

i. Anticoncepcionais combinados (ACO)


Sánches et al. (2017) destacam que promovem a supressão do
hormônio luteinizante (LH), resultando em inibição da biossíntese de
androgênios, estimulação da SHBG (que leva à diminuição dos androgênios
livres, que são biologicamente ativos) e moderada redução na síntese
androgênios adrenais. Os anticoncepcionais combinados de estrogênio e
progestágeno são a primeira linha de tratamento de hirsutismo moderado e
acne.
Os derivados progestínicos com menor atividade androgênica
(gestodeno, desogestrel) ou maior atividade anti-androgênica (ciproterona,
drospirenona) têm um perfil metabólico e biológico mais favorável, dando-se
preferência às combinações que contenham ciproterona e drospirenona,
embora por embasamento apenas teórico, visto que ainda não há dados que
sustentem essa hipótese (REIS et al., 2009).
Contudo, Marcondes, Barcellos e Rocha (2013) pontuam que constituem
contraindicações ao uso de CHO, tabagismo, hipertensão (PAS > 160 e PAD >
100 mmHg), história prévia ou atual de tromboembolismo, história prévia ou
corrente de acidente vascular cerebral ou infarto agudo do miocárdio, doença

25
hepática em atividade, câncer de mama, diabetes descompensado com
nefropatia, retinopatia ou neuropatia, cefaleia com sintomas neurológicos
focais, doença valvular cardíaca grave, lúpus eritematoso sistémico ou
presença de mutações de fatores trombogênicos (como proteína C e s).

ii. Espironolactona:
Tem ação antiandrogênica causada pelo aumento do clearance dos
androgênios (inibição da síntese de aldosterona), inibição da atividade da 5a-
redutase e da síntese de andro¬gênios ovarianos e adrenais, elevação da
SHBG e pelo bloqueio receptores androgênicos específicos da pele. Sendo
considerado como primeira linha para pacientes obesas e segunda linha para
aquelas que apresentam hirsutismo moderado a severo. A dose inicial é
100mg/dia, mas pacientes obesas usualmente requerem 200-300/dia.
Geralmente, há necessidade de associá-la aos ACO na presença de
irregularidade menstrual e não costuma melhorar a acne isoladamente; a
gestação não deve ocorrer durante o uso da espironolactona (SÁNCHES et al.
2017)

iii. Acetato de Ciproterona:


É um antiandrogênico potente, que também age sobre a 5a-redutase,
evitando a conversão de testosterona em diidrotestosterona, destaca Bachelot
et. al. (2010).
É considerado como primeira linha para tratamento de hirsutismo mo-
derado a severo. A dose padrão 50mg/ dia - começando com 12,5mg/dia e au-
mentada progressivamente - durante 20 dias por mês, associado com
estrogênio em baixas doses, que nestes casos melhora sensivelmente a acne.
Pode ser utilizado com ACO, mesmo que este já contenha ciproterona. A
gestação não deve ocorrer durante o uso da ciproterona (LIZVENNA et al.,
2016).

iv. Finasterida:
E um potente inibidor da isoenzima tipo 2 da 5a-redutase; a dose
recomendada é de 2,5 a 7,5 mg/dia, mas seu uso deve ser restrito a casos

26
selecionados, pelos diversos riscos, como de teratogenicidade, hepatotoxidade
e pelo efeitos colaterais. A gestação não deve ocorrer durante o uso da
finasterida. (LIZVENNA et al., 2016).

d. Tratamento dos distúrbios menstruais


ACOG Practice Bulletin (2009) destaca que a correção do distúrbio
menstrual primário pode ser feita com uso de ACO. Recomenda-se ACO com
baixa dosagem de etinilestradiol (20 ou 30 mg). Não há evidências suficientes
para determinar a combinação de ACO mais eficaz no controle de distúrbios
menstruais em pacientes com SOP.
O progestogênio oral isolado ou o sistema intrauterino contendo
levonogestrel (SIU-LNG) também podem ser utilizados, porém estão
associados com sangramento uterino anormal em 50 a 89% das usuárias . A
prevenção de câncer endometrial em mulheres com SOP através do uso em
regime cíclico de progestágenos orais ou de SIU-LNG ainda é desconhecida
(ACOG Practice Bulletin, 2009).

e. Tratamento da infertilidade
Caso as medidas para perda ponderal e a terapêutica para correção dos
distúrbios metabólicos não tenham sucesso na correção do distúrbio ovulatório,
ou a mulher com SOP não tenha aderido ao tratamento e esteja com IMC
abaixo de 30 Kg/m2, é recomendada a terapêutica farmacológica
(CONSENSUS ON INFERTILITY TREATMENT RELATED TO POLYCYSTIC
OVARY SYNDROME, 2008).

i. Citrato de Clomifeno (CC)


O CC é um modulador seletivo de receptor de estrogênio (SERM) e
exibe atividade estrogênica (agonista) e antiestrogênica (antagonista). Sendo,
segundo o Consensus on infertility treatment related to polycystic ovary
syndrome (2008) a primeira opção terapêutica para mulheres com infertilidade
por SOP. Procura-se utilizar a menor dose possível a fim de evitar o efeito
antiestrogênico sobre o endométrio, administrando-se de 50-150mg/dia durante
cinco dias, iniciando-se do 3°-5° dia de fluxo menstrual. Aproximadamente 80%

27
das pacientes ovulam após uso do CC, mas a gravidez acontece em apenas
20-40% dos casos e a gravidez múltipla menor que 10%. De maneira geral, o
tratamento é limitado a seis ciclos, com taxa cumulativa de nascido vivo de 50-
60%.
Sánches et al. (2017) pontuam que o acompanhamento
ultrassonográfico não é mandatório para determinar o sucesso do tratamento,
mas considera-se adequada a prática de monitorar os ciclos estimulados, para
ajuste da dose e prevenção de hiperestímulo ovariano, além confirmação da
resposta ovariana a cada evento.
A adição de metformina em pacientes com SOP melhora as taxas de
gravidez e nascidos vivos. Observaram-se também resultados superiores
naquelas clomifeno-resistentes, mas não foi possível identificar quanto tempo
de uso de metformina antes do uso do CC seria necessário para otmizar essa
resposta (FARQUHAR et al., 2009).
Farquhar et al., 2009 também destacam que a adição de dexametasona
ao CC parece promissora, mas ainda necessita de estudos controlados. Trata-
se de uma medicação efetiva e caracterizada por baixo custo, poucos efeitos
colaterais e simplicidade de administração.

ii. Inibidores da aromatase


O mais utilizado é o letrozole, que se apresenta como alternativa na
indução de ovulação em pacientes que tem o endo- métrio comprometido
quando usado o CC. A dose inicial é de 2,5 mg/ dia por 5 dias, podendo
aumentar até 7,5 mg dia, se não houver ovulação, iniciando do terceiro ao
quinto dia do ciclo ou após sangramento provocado com progesterona
(AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGISTS,
2016).

iii. Gonadotrofinas
Segundo o Consensus on infertility treatment related to polycystic
ovary syndrome (2008), nos casos em que não se consegue resposta
terapêutica com o uso do CC, no intuito de promover a indução da ovulação
para as mulheres com SOP, toma-se imperioso o uso de gonadotrofmas para
essas mulheres - segunda linha. A dose inicial recomendada de gonadotrofmas
é de 37,5 a 50,0 UI/dia. É necessário o monitoramento ovariano para reduzir as

28
complicações, como a síndrome de hiperestímulo ovariano ou gestação
múltipla. Recomenda-se que o tratamento não exceda a seis ciclos ovulatórios.

iv. Técnica de Reprodução Assistida (TRA)


Mulheres com SOP podem ser tratadas com técnicas de reprodução
assistida - fertilização in vitro (FIV) ou injeção intracitoplasmática de es-
permatozóides (ICSI) - quando ocorre falha na tentativa de gravidez com a
indução da ovulação para coito programado ou inseminação intrauterina, ou
quando o casal tem outra causa de infertilidade associada, como fator tubo
peritoneal (obstrução tubária, endometriose moderada e grave) e/ou fator
masculino. Atualmente, prefere-se utilizar protocolo antagonista, fazer a
maturação oocitária com agonista do GnRH e vitrificar óvulos ou embriões,
para programar transferência em outro momento, diminuindo o risco de
Síndrome de Hiperestimulação Ovariana. Alguns autores recomendam o uso
de metformina concomitante. A transferência de um menor número de
embriões também está associada a menores riscos de gestação múltipla.
(ACOG Practice Bulletin, 2009); (AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS
AND GYNECOLOGISTS, 2016).

v. Coagulação Laparoscópica Ovariana (CLO)


Sánches et al. (2017) explicam que a CLO ou drilling ovariano, que
consiste em realizar pequenas perfurações nos ovários através de eletrodo
pontiagudo monopolar, bipolar ou laser, é uma alternativa terapêutica à indução
com gonadotrofmas para mulheres com SOP, resistente ao citrato de
clomifeno. É considerada terapia de segunda linha para anovula- doras com
SOP. Este tipo de procedimento é efetivo em menos de metade das mulheres e
a indução com gonadotrofmas pode ser requerida. A indução da ovulação pós-
cirurgia ovariana, em geral, está associada a altas taxas de ovulação e o baixo
risco de gravidez múltipla são seus pontos positivos. Deve-se ter cautela na
indicação deste tipo de cirurgia, principalmente no que diz respeito aos riscos
de destruição de tecido ovariano e formação de aderências, com possíveis
sequelas sobre a reserva ovariana e fertilidade destas mulheres, embora não
haja número de estudos suficientes para uma conclusão definitiva.

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9. Referências bibliográficas

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