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PNA 2020

comentada
Versão
 

1. Uma mulher de 59 anos vem à consulta hospitalar por cansaço fácil, perda de peso não quantificada,
náuseas, anorexia, parestesias nas mãos e pés e prurido cutâneo disperso com quatro meses de evolução.
Menciona ainda episódios frequentes de dejeções líquidas. A história médica revela hipertensão arterial.
A medicação habitual inclui valsartan, hidroclorotiazida, bisoprolol e omeprazol. É fumadora de 30 UMA
e nega hábitos etílicos. Os antecedentes familiares incluem doença policística do rim. Os sinais vitais são
temperatura 36°C, frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca 90/min e pressão arterial 169/98
mm Hg. Ela mede 162 cm de altura e pesa 68 kg; IMC 26 kg/m². Ao exame físico apresenta palidez da
pele e mucosas. A auscultação pulmonar revela crepitações bibasais e verifica-se edema das mãos e pés.
A auscultação cardíaca encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelaram:

Soro: Creatinina 4,9 mg/dL; Azoto ureico 45 mg/dL; Glucose 101 mg/dL; Sódio 132 mEq/L; Potássio 6,1
mEq/L; Cloro 111 mEq/L.

Sangue: Hemoglobina 9,7 g/dL.

A ecografia renal revela rins de dimensões aumentadas, com múltiplos nódulos de natureza quística.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado na gestão desta doente?

(A) Referenciar para diálise.


(B) Solicitar análise dos genes PKD1 e PKD2.
(C) Solicitar biópsia renal.
(D) Solicitar ecocardiograma.
(E) Solicitar TC renal.

Resposta correta: A

Comentário
A doente do caso clínico apresenta um quadro com vários achados que poderão ser
sugestivos de uma doença renal crónica em estadio terminal no contexto de uma
doença poliquística autossómica dominante, tais como: o edema periférico e aparente
estase pulmonar (alteração da volémia), HTA (complicação cardiovascular mais
frequente), anemia (complicação hematológica), anorexia (alteração gastrointestinal) e
prurido (complicação cutânea mais frequente). Analiticamente destaca-se a retenção
azotada importante (creatinina 4,9 mg/dL) associada a hipercaliémia (6,1 mEq/L). O
aumento dos rins pelos quistos renais é também uma caraterística desta doença.
Atendendo aos diversos achados do enunciado, a resposta mais correta seria a A). Não
está indicado nesta situação, que se prevê terminal e dada a história familiar positiva,
a realização de estudo genético (resposta B incorreta). Não está igualmente indicada a
realização de biópsia renal (resposta C incorreta), uma vez que a causa da doença renal
é conhecida e a presença de quistos renais é em si uma contraindicação para a
realização de biópsia renal. O ecocardiograma poderá ser útil, mas não será um exame
primordial tendo em conta que as alterações da volémia são secundárias à DRC
(resposta D incorreta). A TC renal também não estaria recomendada (resposta E
incorreta).
 

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª edição, parte 9 (doenças do rim e trato urinário), capítulo 305 (doença
renal crónica) e 306 (diálise na insuficiência renal).

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Consideramos que esta pergunta se encontra mal formulada, faltando elementos que
julgamos cruciais para melhor aferir o quadro e evolução clínica da doente. Em primeiro
lugar, a sintomatologia é reportada como tendo 4 meses de evolução, contudo, não são
providenciados valores prévios de retenção azotada para o aluno poder comparar e
percecionar o agravamento. Além disso, não há referência à diurese da doente, o que tem
implicações importantes relativamente à melhor abordagem, incluindo a otimização
diurética versus iniciar terapêutica substitutiva da função renal antes de outras medidas
médicas. De igual modo, a hipercaliémia da doente poderia ser gerida inicialmente com
terapêutica expoliadora de potássio antes de ser considerada a necessidade de diálise.

 Harrison 20ª edição, parte 9 (doenças do rim e trato urinário), capítulo 305 (doença
renal crónica): “Clear indications for initiation of renal replacement therapy for
patients with CKD include uremic pericarditis, encephalopathy, intractable muscle
cramping, anorexia, and nausea not attributable to reversible causes such as peptic
ulcer disease, evidence of malnutrition, and fluid and electrolyte abnormalities,
principally hyperkalemia or ECFV overload, that are refractory to other measures”.
 

2. Três dias após um enfarte agudo de miocárdio, um homem de 62 anos desenvolve subitamente bradipneia
aguda, sem sinais de edema pulmonar. Os sinais vitais são frequência cardíaca 160/min e pressão arterial
110/60 mm Hg. O eletrocardiograma revela taquicardia supraventricular.

Qual dos seguintes fármacos é o mais adequado administrar por via endovenosa, neste momento?

(A) Digoxina.
(B) Diltiazem.
(C) Dopamina.
(D) Furosemida.
(E) Nitroglicerina.

Resposta correta: A

Comentário
Com base na informação de que estamos perante uma Taquicardia Supraventricular, e
assumindo que se trata de uma taquicardia de complexos estreitos e com R-R regulares
(o que pode corresponder a Taquicardia auricular, Flutter auricular, TRNAV ou TRAV), o
nosso objetivo passará por reduzir a ativação ventricular, bloqueando o nó AV (o que
poderá inclusivamente terminar a arritmia). Para este efeito, quer a Digoxina quer o
Diltiazem poderiam ser escolhas a considerar. Relativamente às restantes opções, a
Furosemida sendo um diurético e a Nitroglicerina sendo um vasodilatador, não têm
qualquer efeito bradicardizante e não iriam contribuir para a interrupção da
taquicardia. A Dopamina é um fármaco com efeito catecolaminérgico, potenciando a
taquidisritmia, pelo que só iria agravar o quadro. Partindo do princípio que
desconhecemos o mecanismo e circuito subjacente à arritmia, uma vez que essa
informação não é veiculada, e estando o doente hemodinamicamente estável, quer as
recomendações da Sociedade Europeia de Cardiologia, quer a 20ª edição do Harrison’s
Principles of Internal Medicine, referem os bloqueadores dos canais de cálcio não-
diidropiridínicos (Diltiazem e Verapamil ev) como uma das primeiras opções a adotar
neste tipo de arritmias (a par da adenosina ev, que não surge como uma opção de
resposta). Se considerarmos a particularidade de se tratar de um doente pós-EAM, a
20ª edição do Harrison’s Principles of Internal Medicine refere que “arritmias comuns
neste grupo [pós-EAM] são o flutter auricular e a fibrilhação auricular” e que “a digoxina
é normalmente o tratamento de eleição nas taquicardias supraventriculares na
presença de insuficiência cardíaca”, mas que “na ausência de insuficiência cardíaca, os
beta-bloqueantes, o verapamil ou o diltiazem são alternativas adequadas para controlar
a frequência, uma vez que também ajudam a controlar a isquemia”. Sendo mencionada
no enunciado a ausência de edema pulmonar, poder-se-ia extrapolar para ausência de
insuficiência cardíaca e pensar no Diltiazem como a opção mais adequada. Contudo,
face à ausência de informação sobre a fração de ejeção do doente, o fármaco mais
seguro será efetivamente a Digoxina (opção A).
 

Referências bibliográficas

 Guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia “Abordagem do paciente com


Taquicardia Supraventricular” (2019) – página 671, figura 4: “Algoritmo de
terapêutica aguda de taquicardia de complexos estreitos”.
 Documento de consenso da Associação Europeia do Ritmo Cardíaco sobre a
“Abordagem de Arritmias Supraventriculares” (2017) - página 483, “Acute therapy”,
linha 1; página 487, linha 3; página 491, “Acute” linha 13; página 493, “Acute
therapy”, linha 12.
 Harrison’s Principles of Internal Medicine, 20ª edição, página 1743, figura 244-6:
“Algoritmo de Tratamento para pacientes hemodinamicamente estáveis com
Taquicardia Supraventricular Paroxística”.
 Harrison’s Principles of Internal Medicine, 20ª edição, página 1882, “Arrhythmias -
Supraventricular Arrhythmias”, linhas 8-12.

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Trata-se de uma pergunta refutável, pela omissão de informação importante na escolha


da melhor opção terapêutica para o doente, como a Fração de Ejeção do VE, a duração do
QRS e o intervalo R-R. O grupo das Taquicardias supraventriculares engloba um conjunto
de taquidisritmias com mecanismos e circuitos muito diferentes e, consequentemente,
com abordagens terapêuticas diferentes. A utilização de Digoxina só é referida nas
diversas fontes bibliográficas no caso de Fibrilhação Auricular ou Flutter auricular e no
enunciado não nos é fornecida informação para identificar convictamente qualquer uma
destas arritmias. Outra lacuna identificada é a ausência de informação sobre a fração de
ejeção do ventrículo esquerdo ou a classe Killip-Kimball em que o doente evoluiu no
contexto pós EAM. Apesar de o Diltiazem ser contra-indicado na presença de Insuficiência
Cardíaca, não existe no enunciado qualquer dado que nos indique que é esse o caso. Pelo
contrário, é mencionada a ausência de edema pulmonar, o que induz a inferência de que
o doente não apresenta IC e que, por isso, o Diltiazem poderia ser utilizado com
segurança. Por fim, a informação sobre duração do QRS (estreito vs. largo) seria
essencial para excluir TRAV antidrómica ou Taquicardia auricular/Flutter auricular pré-
excitados, situações em que são desencorajados quaisquer fármacos que atrasem a
condução pelo nódulo AV (potenciando a condução por uma via acessória), o que
inviabilizaria a utilização quer de Diltiazem quer de Digoxina.
 

3. Uma mulher de 30 anos é trazida ao serviço de urgência devido a ferida por facada no hemitórax direito,
4.° espaço intercostal na linha médio-clavicular. Os sinais vitais são temperatura 37°C, frequência
respiratória 14/min, frequência cardíaca 80/min e pressão arterial 120/70 mm Hg. Ao exame físico
apresenta-se sem sinais de dificuldade respiratória. Os sons respiratórios estão presentes e são simétricos
bilateralmente. Verifica-se uma laceração de 3 cm no hemitórax direito, sem hemorragia ativa. O restante
exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual dos seguintes é o exame de diagnóstico inicial mais adequado?

(A) Cintigrafia de ventilação-perfusão pulmonar.


(B) Ecografia do tórax.
(C) Lavagem peritoneal.
(D) Raio-X do tórax.
(E) TC do tórax.

Resposta correta: D

Comentário
A pergunta remete para a avaliação de um traumatismo torácico com arma penetrante.
Seguindo o protocolo de avaliação de um doente politraumatizado (onde são abordados
os traumatismos torácicos), conseguimos perceber pelo enunciado que avaliação
primária ABCDE se encontra sem nenhuma alteração. Não existe compromisso da via
aérea (“A"), a doente não tem dificuldade respiratória e tem sinais respiratórios
presentes e simétricos (“B”), não tem hemorragia ativa (“C”) e o restante exame físico é
normal (“D” e “E”). Desta forma, deve-se passar para a avaliação secundária que inclui
a radiografia de tórax na suspeita de traumatismo torácico, antes de qualquer outro
exame mais específico – resposta D) correta.

Referências bibliográficas

 American College of Surgeons. Initial assessment and management. ATLS Advanced


Trauma Life Support Student Course Manual. 10th ed. Chicago: American College of
Surgeons; 2018. p. 2-18.
 

4. Um rapaz de 8 anos, com síndrome de Down, é trazido novamente ao consultório médico pela mãe por
febre e disúria persistente e recusa alimentar. Ele tinha sido observado, há três dias, por vómitos, febre e
disúria. Nessa altura, a tira-teste de urina foi francamente positiva para esterase leucocitária. O exame
cultural de urina está em curso. Ele foi medicado com trimetoprim-sulfametoxazol. Hoje, a mãe está muito
ansiosa e pergunta «O meu menino vai ficar bem? Ele nunca ficou assim tão doente antes, quando teve
uma infeção da bexiga».

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Alterar para outro antibiótico oral.


(B) Colher amostra de urina por punção suprapúbica.
(C) Continuar com o regime antibiótico em curso e tranquilizar a mãe.
(D) Internar para terapêutica antibiótica EV.
(E) Realizar cistouretrografia miccional.

Resposta correta: D

Comentário
O caso clínico descreve uma criança com queixas iniciais de vómitos, febre e disúria,
com uma tira teste positiva para esterase leucocitária. É assim possível fazer um
diagnóstico de provável ITU. Foi iniciada antibioterapia empírica e ficou com urocultura
em curso - contudo, não existe melhoria das queixas após 3 dias, mantendo febre,
disúria persistente e recusa alimentar. Esta persistência (e até ligeiro agravamento) do
quadro, constitui critério de internamento e a melhor abordagem passa pelo pelo início
de antibioterapia por via endovenosa (opção D correta). Uma vez que ainda não está
disponível o resultado da urocultura, não se deve alterar o antibiótico oral em
alternativa ao internamento (opção A errada). A colheita de urina por punção supra-
púbica apenas deve ser ponderada em crianças sem controlo de esfíncteres,
especialmente menores que 12 meses (opção B errada). A cistoureterografia
retrógrada pode ser ponderada posteriormente, em ambulatório, caso haja suspeita de
alguma malformação do sistema excretor, mas não seria o próximo passo a realizar
(opção D errada).

Referências bibliográficas

 NOC ITU, pág. 2, ponto 9 e pág. 5 pontos S e T.


 La Paz, pág. 1462, tabela 152-6: “Criterios de ingreso hospitalario”.
 

5. Uma mulher de 39 anos vem a consulta hospitalar por lombalgia com seis meses de evolução, associada
a rigidez matinal de várias horas e elevação da velocidade de sedimentação eritrocitária em análises
iniciais. A dor obriga a doente a levantar-se de noite e a caminhar um pouco até melhorar. Faz etoricoxib
em SOS quando tem dor mais intensa. Neste período, teve um episódio de uveíte anterior do olho direito,
da qual recuperou após ciclo de prednisolona prescrito no serviço de urgência. Ela não tem antecedentes
patológicos de relevo e é nuligesta. Fuma 25 cigarros por dia desde há 15 anos. Os sinais vitais são
temperatura 36°C, frequência cardíaca 89/min e pressão arterial 116/78 mm Hg. Ela tem 169 cm de altura
e pesa 61 kg; IMC 21 kg/m². Ao exame físico não tem gânglios palpáveis e não apresenta alterações
cutâneas. Tem boa expansão torácica e a auscultação cardíaca e pulmonar encontra-se dentro dos
parâmetros de normalidade. Apresenta dor à palpação das apófises espinhosas da coluna vertebral lombar
e na palpação das linhas sacroilíacas, bilateralmente. O restante exame musculoesquelético não mostra
alterações.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 1,1 mg/dL; Azoto ureico 35 mg/dL; AST 23 U/L; ALT 35 U/L; Fosfatase alcalina 120
U/L; Proteína C reativa 130 mg/L; Sódio 135 mEq/L; Potássio 4,0 mEq/L.

Sangue: Hemoglobina 11,5 g/dL; HCM 31 pg/célula; VGM 95 fL; Leucócitos 5100/mm³; Neutrófilos,
segmentados 61 %; Linfócitos 25%; Plaquetas 98 x 10^9/L; Velocidade de sedimentação eritrocitária 58
mm/1ª hora.

Qual dos seguintes estudos é o mais adequado para confirmar o diagnóstico etiológico mais provável?

(A) Colonoscopia.
(B) Densitometria óssea.
(C) Doseamento de anticorpo antinuclear.
(D) Doseamento de fator reumatoide.
(E) RM das articulações sacroilíacas.

Resposta correta: E

Comentário
A doente provavelmente apresenta uma espondiloartropatia (lombalgia de ritmo
inflamatório associada a elevação de parâmetros inflamatórios - VS e PCR - e uveíte
não infeciosa). O estudo mais adequado para o diagnóstico das espondiloartropatias,
dentro dos descritos, é a RMN das sacroilíacas, que documentará edema medular ósseo
associado (ou não), a irregularidades da interlinha articular com erosões e pontes
ósseas.
 

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª edição capítulo 355 The spondyloarthritides. TABLE 355-1 ASAS
Criteria for Classification of Axial Spondylarthritis: Sacroiliitis on imaging (Active
(acute) inflammation on MRI highly suggestive of SpA-associated sacroiliitis and/or
definite radiographic sacroiliitis according to modified New York criteria) plus ≥1 SpA
feature.
 Harrison 20ª edição capítulo 355 The spondyloarthritides. Pag 2566: MRI is thus
much more useful for the timely diagnosis of ax-SpA. Active sacroiliitis is best
visualized by dynamic MRI on tilted coronal slices with fat saturation, either T2-
weighed turbo spin-echo sequence or short tau inversion recovery (STIR) with high
resolution, or T1-weighted images with contrast enhancement. These techniques
identify early intraarticular inflammation, cartilage changes, and underlying bone
marrow edema in sacroiliitis.
 

6. Uma mulher de 44 anos vem pela primeira vez ao consultório médico, referindo episódios frequentes de
perda hemática genital intermenstrual em quantidade escassa (tipo spotting) e de hemorragia após o coito,
desde há três meses. A mulher refere que a sua última avaliação ginecológica foi há pelo menos 10 anos.
O exame físico ginecológico revela uma lesão cervical vegetante, friável e facilmente sangrante.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado nesta mulher?

(A) Biópsia cervical.


(B) Colposcopia.
(C) Ecografia pélvica.
(D) Histeroscopia.
(E) TC abdominal.

Resposta correta: A

Comentário
As lesões pré-malignas ou malignas do colo do útero podem ser assintomáticas
inicialmente e em fases mais tardias manifestarem-se sob a forma de hemorragia
uterina anormal com hemorragia intermenstrual irregular e coitorragias, entre outros
sintomas. Perante estas queixas é obrigatória a realização de um exame ginecológico
completo. Na fase inicial da patologia maligna do colo do útero à observação com
espéculo pode visualizar-se um colo sem lesões macroscópicas e em fases mais tardias
pode identificar-se uma lesão ulcerada, exofítica e superficial do exocérvix ou uma
lesão infiltrativa do endocérvix. Perante uma lesão suspeita do colo do útero, como a
retratada no caso clínico, o primeiro passo deverá ser a realização de biópsia para que
o diagnóstico histológico seja conhecido o mais precocemente possível. Pacientes que
embora sintomáticas não apresentem lesões macroscópicas aparentes ou que se
apresentem com alterações nos exames de rotina de rastreio do cancro do colo do útero
devem realizar colposcopia e deverá fazer-se biópsia dirigida de acordo com os
achados identificados. A abordagem posterior do cancro do colo útero e a eventual
necessidade de realização de ecografia e/ou TC abdominal será feita com base no
exame ginecológico e no resultado da biópsia da lesão, pelo que não devem ser
considerados como abordagem inicial.
 

Referências bibliográficas

 Obstetrics and Gynecology 7th edition, Beckmann: chapter 34 Gynecologic


Procedures “Indications for cervical biopsy include chronic cervicitis, suspected
neoplasm, and ulcer”.
 Uptodate - Invasive cervical cancer: Epidemiology, risk factors, clinical
manifestations, and diagnosis, consulta a 30/11/2020: “The diagnosis of cervical
cancer is established by biopsy. Symptomatic patients without a visible lesion and
those who have only abnormal cervical cytology should undergo colposcopy with
directed biopsy and, if necessary, diagnostic conization”, “Cervical biopsy may be
performed as part of an initial evaluation or along with a full staging procedure,
depending on the level of suspicion of malignancy and the patient's access to health
care.” “A pelvic examination should be performed in any patient with symptoms
suggestive of cervical cancer. Visualization of the cervix upon speculum examination
may reveal a normal appearance or a visible cervical lesion; large tumors may
appear to replace the cervix entirely. Any lesion that is visible should be biopsied
regardless of previous benign cervical cytology results [67]. The only visible lesions
that do not require biopsy are Nabothian cysts and only when this diagnosis is
confirmed by an experienced examiner.”
 

7. Uma menina de 25 meses é trazida ao consultório médico pelo pai para consulta de vigilância. A criança
tem sido seguida por si desde os 12 meses, quando a família se mudou para esta cidade. No último ano,
tem mantido uma evolução estatural e ponderal no percentil 10 e de perímetro cefálico no percentil 25.
Tem o programa nacional de vacinação atualizado, mas não efetuou vacina pneumocócica conjugada. Ela
teve um episódio de convulsão febril 24 horas após a 4ª dose de vacina DTPa, nove meses antes. Do ponto
de vista de desenvolvimento, consegue correr, desenhar uma linha horizontal e usar a colher. Ela diz «ba
ba», «da da» e outros sons repetitivos com consoantes, mas ainda não verbaliza palavras de forma clara.
Questiona o pai se tem alguma preocupação acerca da filha. Ele encolhe os ombros e diz «Penso que não,
mas ela teve muitas constipações nos últimos meses». O exame físico encontra-se dentro dos parâmetros
de normalidade.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Défice auditivo.


(B) Desenvolvimento normal.
(C) Fibrose quística.
(D) Hipotiroidismo adquirido.
(E) Perturbação do espectro do autismo.

Resposta correta: A

Comentário
A criança em questão apresenta um desenvolvimento dentro do normal e expectável
para a idade (corre, usa a colher e faz linha horizontal), à exceção da componente
linguística, em que seria de esperar a utilização de várias palavras e construção de
frases curtas (opção B errada). A principal causa de atraso da linguagem isoladamente
é o défice auditivo, pelo que deve sempre ser excluído na avaliação de um atraso desta
capacidade (opção A correta). A fibrose quística (FQ) apresenta-se com vários outros
achados em termos de história médica além dos descritos, estando associada a um
atraso estaturo-ponderal e também a infeções recorrentes (habitualmente mais graves
que as “constipações” que o pai refere neste caso - opção C errada). O hipotiroidismo
pode ser uma causa de surdez, apesar de rara, e consequentemente levar a um atraso
de linguagem, mas o diagnóstico “em si” seria o de défice auditivo (opção D errada). A
perturbação do espectro do autismo, apesar de provocar, com frequência, atrasos da
linguagem, tem vários outros sinais de alarme, especialmente a nível do
comportamento e interação social, que não são descritos, por isso não seria o primeiro
diagnóstico a considerar (opção E errada).

Referências bibliográficas

 La Paz: Pag. 62 secção “Desarrollo del lenguaje”.


 Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil, pág. 65, 66 e 67.
 

8. Um homem de 65 anos vem ao serviço de urgência, acompanhado pela esposa, por episódios intermitentes
de aperto torácico relacionado com atividades como subir escadas ou tomar um duche desde há uma
semana. Refere ainda tosse seca ocasional nos últimos dois meses. No último ano, refere dispneia de
esforço de agravamento progressivo. Ele diz «Há um ano, era capaz de transportar o meu saco de golfe,
quando faço o meu percurso de 18 buracos, mas desde há um par de meses que tenho tido de contratar
um caddy, para carregá-lo. Agora, tenho estado com tanta falta de ar que até alugo um carro de golfe».
Nega dispneia de repouso ou dispneia noturna. Ele não tem antecedentes patológicos de relevo e não faz
medicação habitual. Fumou 20 cigarros por dia, durante 35 anos, até há um ano. Os sinais vitais são
temperatura 36,6°C, frequência respiratória 26/min, frequência cardíaca 84/min e pressão arterial 138/76
mm Hg; SpO2 92 % (ar ambiente). Ele tem 173 cm de altura e pesa 69 kg; IMC 23 kg/m². A pressão
venosa jugular está normal. A auscultação cardíaca encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade e
a auscultação pulmonar revela crepitações nas bases. O exame das extremidades mostra hipocratismo
digital, sem cianose ou edemas. O raio-X do tórax mostra acentuação do retículo intersticial bilateral.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Carcinoma do pulmão.


(B) Doença pulmonar obstrutiva crónica.
(C) Fibrose pulmonar idiopática.
(D) Insuficiência cardíaca congestiva.
(E) Tuberculose.

Resposta correta: C

Comentário
O caso clínico é altamente sugestivo de fibrose pulmonar idiopática (FPI). A dispneia
progressiva e tosse seca são compatíveis. A etiologia é idiopática, mas muitos têm
exposição ao tabaco. As crepitações bibasais são frequentes e o hipocratismo digital é
comum. A acentuação do retículo intersticial bilateral é o achado mais comum da
radiografia do tórax destes casos, embora não específico. A maior dúvida neste caso
seria com a doença pulmonar obstrutiva crónica. Contudo, a ausência de expetoração
e, principalmente, a presença de hipocratismo digital torna tal alternativa diagnóstica
bastante menos provável. A ausência de sintomas constitucionais é contra o diagnóstico
de carcinoma do pulmão. A ausência de edemas e a pressão venosa jugular normal é
contra o diagnóstico de insuficiência cardíaca congestiva. A ausência de febre e os
achados imagiológicos também não sugerem tuberculose.
 

Referências bibliográficas

 Harrison, 20ª ed, Cap 287 “Intersticial Lung Disease”, pg 1999, tabela 287-1.
 Harrison, 20ª ed, Cap 286 “Chronic Obstructive Pulmonary Disease”, pg 1995, “The
three most common symptoms in COPD are cough, sputum production, and
exertional dyspnea. (…) In patients with more severe disease, the physical
examination of the lungs is notable for a prolonged expiratory phase and may include
expiratory wheezing. (...) Clubbing of the digits is not a sign of COPD, and its presence
should alert the clinician to initiate an investigation for causes of clubbing.”
 

9. Uma mulher de 76 anos é admitida no hospital para hidratação endovenosa após história de diarreia
aquosa desde há dois dias. Apresentou, nesse período, 10 dejeções líquidas sem sangue. Refere sentir-se
febril e com tonturas e tem tido pouco apetite. Não tem náuseas nem vómitos. Antes destes sintomas, era
saudável e muito ativa. Não toma medicação habitualmente. Regressou recentemente de um cruzeiro com
o seu companheiro. Os sinais vitais são temperatura 37,8°C, frequência respiratória 12/min, frequência
cardíaca 112/min e pressão arterial 100/62 mm Hg em pé e 120/70 mm Hg deitada; SpO2 96 % (ar
ambiente). Ao exame físico observa-se orofaringe com mucosas desidratadas. O abdómen está mole e
indolor à palpação e os ruídos intestinais estão presentes. A pesquisa de sangue oculto nas fezes é negativa.
As coproculturas e a pesquisa de ovos e parasitas nas fezes ainda não estão disponíveis.

Qual das seguintes alternativas é a causa mais provável da diarreia da doente?

(A) Diarreia fictícia.


(B) Giardíase intestinal.
(C) Hipertiroidismo.
(D) Infeção por rotavírus.
(E) Uso excessivo de laxantes.

Resposta correta: D

Comentário
Trata-se de uma doente com uma diarreia do viajante, referindo uma viagem de
cruzeiro recente. Dentro das várias causas de diarreia do viajante as principais são a E.
Coli enterotoxigénica e a Giardia lamblia. Outra causa possível de diarreia do viajante é
o rotavírus, sendo mais prevalente nas crianças. De realçar que a prevalência de
diarreia por rotavírus está a aumentar nas crianças entre os 6 e 16 anos e nos idosos
acima dos 70 anos de idade desde o início da vacinação. Havendo evidência de infeção,
com temperatura subfebril não se trata de diarreia fictícia. O hipertiroidismo está mais
associado a hiperdefecação e não a dejeções líquidas, sendo que o sintoma
gastrointestinal mais frequente nesta situação seria a perda de peso. Por fim, não há
história de consumo de laxantes (além da temperatura subfebril).

Referências bibliográficas

 Harrison’s principles of internal medicine, 19th ed. – capítulo 119 pág. 895 “Except
for giardiasis (Chap. 224), parasitic infections are uncommon causes of TD in short-
term travelers-”; capítulo 128 pág. 962 Tabela 128.3: “rotavirus particularly common
among children”; capítulo 224 pág. 1615 “Giardiasis is one of the most common
parasitic diseases in both developed and developing countries worldwide, causing
both endemic and epidemic intestinal disease and diarrhea.” “Waterborne
transmission accounts for episodic infections (e.g., in campers and travelers)”.
 Cecil - capítulo 356 after the implementation of vaccines, the epidemiology of
rotavirus disease has changed, with, for example, the peak incidences in
nonvaccinated children in Finland now occurring between 6 and 16 years of age and
in the elderly over 70 years of age.
 

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Consideramos que a opção B devia ser considerada correta pois estamos perante uma
doente com uma diarreia do viajante, com uma viagem de cruzeiro recente. Dentro das
várias causas de diarreia do viajante as principais são a E. Coli enterotoxigénica e a
Giardia lamblia. Outra causa possível de diarreia do viajante é o rotavírus, no entanto é
mais prevalente nas crianças, como é repetidamente referido ao longo da bibliografia
recomendada. O vírus que surge repetidamente associado a viagens de cruzeiro na
bibliografia recomendada é o noravirus.

 Harrison – capítulo 119 pág. 895 “Except for giardiasis (Chap. 224), parasitic
infections are uncommon causes of TD in short-term travelers-”; capítulo 128
pág. 962 Tabela 128.3: “rotavirus particularly common among children”; capítulo
224 pág. 1615 “Giardiasis is one of the most common parasitic diseases in both
developed and developing countries worldwide, causing both endemic and
epidemic intestinal disease and diarrhea.” “Waterborne transmission accounts
for episodic infections (e.g., in campers and travelers)”.
 Cecil cap 131: North American travelers to developing countries and travelers on
airplanes and cruise ships are at high risk for acute infectious diarrhea. Common
causes of traveler’s diarrhea (Chapter 270) include norovirus, enterotoxic or
enteroaggregative E. coli, Shigella, and giardiasis.
 

10. Uma mulher de 82 anos, acamada, é trazida ao serviço de urgência por desenvolvimento progressivo de
vómitos, paragem da emissão de fezes e distensão abdominal desde há dois dias. A história médica revela
diabetes mellitus tipo 2, insuficiência cardíaca e acidente vascular cerebral aos 76 anos. A medicação
habitual inclui metformina, furosemida, digoxina, gabapentina e opioide transdérmico por dor crónica. O
exame físico revela marcada distensão abdominal, timpanismo, ausência de ruídos peristálticos e discreta
dor à palpação abdominal, sem sinais de irritação peritoneal.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 3,5 mg/dL; Proteína C reativa 30 mg/L; Sódio 130 mEq/L; Potássio 3,0 mEq/L; Cálcio
total 8,2 mg/dL.

Sangue: Hemoglobina 12 g/dL; Leucócitos 11 000/mm³.

O raio-X abdominal simples em decúbito mostra distensão marcada do cólon direito e do colón transverso.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Prescrever fluidoterapia endovenosa.


(B) Prescrever neostigmina oral.
(C) Solicitar colonoscopia.
(D) Solicitar retosigmoidoscopia rígida.
(E) Solicitar TC abdominal com contraste.

Resposta correta: A

Comentário
O caso clínico apresenta um quadro de oclusão numa doente idosa, acamada e
polimedicada, associado a alteração da função renal (creatinina 3,5 mg/dL).
Clinicamente, a distensão abdominal e a presença de timpanismo são compatíveis com
um quadro de obstrução, havendo distensão a montante. Nestes casos, a causa mais
provável do quadro oclusivo é uma causa médica e não uma causa obstrutiva mecânica.
Assim, deve-se iniciar tratamento conservador com fluidoterapia endovenosa e
colocação de sonda nasogástrica na tentativa de reversão do quadro.

Referências bibliográficas

 Harrison’s principles of internal medicine, 19th ed. cap. 323 pág 2298.
 

11. Um homem de 66 anos vem ao consultório médico por fraqueza generalizada e câimbras desde há três
meses. Ele não tem antecedentes patológicos de relevo e não toma medicação ou suplementos dietéticos.
Os sinais vitais são temperatura 37,2°C, frequência respiratória 18/min, frequência cardíaca 82/min e
pressão arterial 110/64 mm Hg. Ele mede 178 cm de altura e pesa 72 kg; IMC 23 kg/m². O exame físico
revela perda de massa muscular. O exame neurológico revela fasciculações nos membros inferiores, com
reflexos hiperativos. A sensibilidade é normal. O estado mental encontra-se dentro dos parâmetros de
normalidade.

Qual das seguintes complicações desta condição é a mais provável de ocorrer?

(A) Cegueira.
(B) Demência.
(C) Disfagia.
(D) Disfunção intestinal e vesical.
(E) Neoplasia secundária.

Resposta correta: C

Comentário
Caso típico de esclerose lateral amiotrófica (ELA): o doente recorre por fraqueza
generalizada e cãimbras; ao exame objetivo constatam-se sinais de afetação do
primeiro neurónio motor (reflexos hiperativos) e do segundo neurónio motor (perda de
massa muscular e fasciculações). A afetação bulbar na ELA é típica, com aparecimento
de disfagia, disfonia e disartria. A broncoaspiração decorrente da disfagia é uma das
principais causa de morte nos doentes com ELA.

Referências bibliográficas

 Harrison’s principles of internal medicine, 19th ed. , página 3142.


 

12. Um homem de 70 anos vem ao serviço de urgência, acompanhado pela sua mulher, por dispneia e fraqueza
progressiva desde há 12 horas. O doente diz «sinto falta de ar». Os sintomas começaram com sensação
de dor e fraqueza nas mãos e pés, que progrediu até à região dorsal e membros inferiores, esta manhã.
Neste momento, não é capaz de andar devido a fraqueza. Tem sentido mal-estar geral nos últimos sete
dias, logo após uma infeção das vias aéreas superiores, na semana anterior. A história médica revela
diabetes mellitus tipo 2, tratada com exercício físico e dieta. Não faz medicação habitual e não fez
nenhuma vacina nos últimos seis meses. Os sinais vitais são temperatura 38°C, frequência respiratória
18/min, frequência cardíaca 96/min e pressão arterial 140/90 mm Hg (em supinação) e 100/60 mm Hg
(sentado); SpO2 88 % (ar ambiente). Ao exame físico não apresenta erupções cutâneas. O abdómen é
mole, revelando massa na região suprapúbica. Os reflexos osteotendinosos estão ausentes nos membros
superiores e inferiores. Apresenta paralisia flácida nas extremidades inferiores e movimento mínimo nas
extremidades superiores.

Qual dos seguintes é o diagnóstico mais provável?

(A) Esclerose lateral amiotrófíca.


(B) Esclerose múltipla.
(C) Polimialgia reumática.
(D) Síndrome de Eaton-Lambert.
(E) Síndrome de Guillain-Barré.

Resposta correta: E

Comentário
A combinação de quadro agudo de debilidade ascendente e arreflexia, precedido por
um quadro infecioso, orienta-nos para um quadro de síndrome de Guillain-Barré. Além
disso, o doente tem insuficiência respiratória (afetação dos músculos respiratórios) e
sinais de disautonomia (hipotensão ortostática, provável globo vesical), as duas
manifestações que mais supõem risco vital para o doente nesta patologia.

Referências bibliográficas

 Harrison’s principles of internal medicine, 19th ed., página 3225.


 

13. Um homem de 79 anos é trazido ao serviço de urgência por dispneia agravada (em repouso), mal-estar
geral e dificuldade em articular palavras desde há um dia. Refere ainda tosse mucopurulenta desde a
última semana. Segundo a filha que o acompanha, o doente «sofre de doença cardíaca e de bronquite». A
medicação habitual inclui salmeterol + mometasona, salbutamol (em SOS), furosemida, clopidogrel,
valsartan e hidroclotiazida. É fumador de 40 UMA. Os sinais vitais são temperatura 38,2°C, frequência
respiratória 24/min, frequência cardíaca 101/min e pressão arterial 164/98 mm Hg; SpO2 90% (ar
ambiente). Ele tem 165 cm de altura e pesa 82 kg; IMG 30,1 kg/m². As mucosas estão coradas e
desidratadas. Apresenta sinais de dificuldade respiratória por utilização dos músculos acessórios da
respiração, cianose labial e turgescência venosa jugular de 1 cm na posição sentada. A auscultação
cardíaca revela taquicardia, sem outras alterações. A auscultação pulmonar mostra sons respiratórios
globalmente reduzidos, sibilos dispersos bilateralmente e crepitações discretas na base esquerda. Os
resultados dos estudos analíticos realizados de imediato revelam:

Gases: PO2 55 mm Hg; PCO2 69 mm Hg: pH 7,29; Bicarbonato 22 mEq/L; Lactatos 1,2 mmol/L.

Qual dos seguintes é o diagnóstico mais provável?

(A) Agudização de doença pulmonar obstrutiva crónica.


(B) Derrame pleural.
(C) Enfarte agudo do miocárdio.
(D) Neoplasia pulmonar.
(E) Tromboembolia pulmonar.

Resposta correta: A

Comentário
O caso clínico é sugestivo de uma agudização de doença pulmonar obstrutiva crónica.
Esta agudização define-se pelo agravamento da dispneia, volume e/ou purulência da
expetoração. A presença de sinais de dificuldade respiratória (cianose labial ou
periférica, uso de musculatura acessória da respiração e discurso entrecortado) são
típicos e, se falarmos de sinais vitais, a febre, taquicardia, taquipneia e dessaturação
periférica são certamente expectáveis. Outro achado sugestivo é a presença de uma
acidemia por acidose respiratória. Um derrame pleural justificaria a ausência de
murmúrio vesicular no local do derrame. Um enfarte agudo do miocárdio associar-se-
ia mais a angina de peito e geralmente o doente não tem febre. A neoplasia pulmonar
descreveria um quadro constitucional mais prolongado. O tromboembolismo pulmonar
teria um aparecimento mais súbito e alcalose respiratória.
 

Referências bibliográficas

 Harrison, 20ªed, Cap 286 “Chronic Obstructive Pulmonary Disease”, pg 1997-1998,


“Exacerbations are a prominent feature of the natural history of COPD. Exacerbations
are episodic acute worsening of respiratory symptoms, including increased dyspnea,
cough, wheezing, and/ or change in the amount and character of sputum. They may
or may not be accompanied by other signs of illness, including fever, myalgias, and
sore throat. (…) The physical examination should incorporate an assessment of the
degree of distress of the patient. Specific attention should be focused on tachycardia,
tachypnea, use of accessory muscles, signs of perioral or peripheral cyanosis, the
ability to speak in complete sentences, and the patient’s mental status. (…) The
presence of hypercarbia, defined as a Pco2 >45 mmHg, has important implications
for treatment (discussed below). (…) The chest examination should establish the
presence or absence of focal findings, degree of air movement, presence or absence
of wheezing, asymmetry in the chest examination (suggesting large airway
obstruction or pneumothorax mimicking an exacerbation), and the presence or
absence of paradoxical motion of the abdominal wall.”
 

14. Um jovem de 15 anos é trazido ao serviço de urgência por aumento da intensidade de dor abdominal, nas
últimas 12 horas. A dor iniciou-se na área periumbilical e neste momento está localizada no quadrante
inferior direito. Ele vomitou duas vezes. A história médica inclui hemofilia A. Ele não tem antecedentes
cirúrgicos. Os sinais vitais são temperatura 38°C, frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca
85/min e pressão arterial 140/60 mm Hg. O exame físico revela dor no ponto de McBurney, com defesa
e sinal de Rovsing presente. Foi agendada cirurgia.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Sangue: Hemoglobina 12,6 g/dL; Leucócitos 12 500/mm³; Tempo de protrombina 11 segundos; Tempo
de tromboplastina parcial ativada 24 segundos.

Qual das seguintes alternativas constitui o tratamento mais relevante a realizar no pré-operatório?

(A) Fator VIII.


(B) Fator IX.
(C) Fator XII.
(D) Fator de von Willebrand.
(E) Plaquetas.

Resposta correta: A

Comentário
A hemofilia A é uma coagulopatia hereditária com transmissão ligada ao cromossoma
X e marcada por uma diminuição dos níveis circulantes de fator VIII. Assim, tem um
impacto clínico mais exuberante homens, uma vez que nas mulheres ocorre lionização
do cromossoma X. Ainda que o estudo pré-operatório esteja normal, desconhecendo-
se a técnica (laparoscopia versus laparotomia) para a apendicectomia, será previsível
a ocorrência de algum desafio hemostático, pelo que a administração profilática de
fator VIII está recomendada.

Referências bibliográficas

 Kasper DL, Fauci AS, Hauser S, et al, editors. Harrison’s principles of internal
medicine, 19th ed. New York: The McGraw-Hill Companies, Inc., Capítulo 141.
 L Goldman, DA Ausiello, AI Schafer. Goldman-Cecil Medicine, 26th edition. 2019.
Elsevier; Capítulo 174.
 

15. Uma mulher de 32 anos recorre ao serviço de urgência por ptose palpebral à esquerda e diplopia binocular
com vários meses de evolução e agravamento progressivo. Refere que as queixas se agravam no final do
dia e menciona ainda astenia e ligeira dispneia. A história médica revela hipertensão arterial moderada e
a medicação habitual inclui perindopril. É fumadora de 30 cigarros por dia desde há 10 anos. O exame
oftalmológico revela acuidade visual bilateral de 20/20 em ambos os olhos. Verifica-se aumento da ptose
palpebral no olhar forçado para cima e enfraquecimento na oclusão palpebral. Os reflexos pupilares e os
exames biomicroscópico e fundoscópico encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Doença de Graves.


(B) Miastenia gravis.
(C) Oftalmoplegia externa progressiva crónica.
(D) Paralisia do terceiro par craniano.
(E) Síndrome de Kearns-Sayre.

Resposta correta: B

Comentário
O quadro clínico apresentado é típico de Miastenia gravis: mulher jovem que recorre
por diplopia e ptose palpebral com duas características fundamentais: flutuação
(agrava-se no final do dia) e fatigabilidade (aumento da ptose palpebral no olhar forçado
para cima e enfraquecimento na oclusão palpebral). Além da afetação ocular, a doente
também refere astenia e dispneia ligeira, sugerindo que existe uma afeção generalizada
(musculatura respiratória e das extremidades).

Referências bibliográficas

 Harrison’s principles of internal medicine, 19th ed., página 3232.


 

16. Uma recém-nascida de 2 semanas de vida vem ao centro de saúde para exame periódico de saúde. A
gestação foi vigiada e de termo, sem complicações. O parto foi eutócico, sem intercorrências, e o índice
de Apgar foi de 8 e 10 ao 1.º e 5.º minutos, respetivamente. O exame físico na alta da maternidade,
mostrava cefalohematoma, sem outras alterações. Às 48 horas de vida, apresentava bilirrubina total de
5,5 mg/dL. Na presente consulta, encontra-se sob aleitamento materno exclusivo, com mamadas a cada
2-3 horas, 10 minutos em cada mama, com pausa noturna de 6 horas, apresentando dejeções diárias e
micções em todas as mudas de fralda. Os sinais vitais encontram-se dentro dos parâmetros de
normalidade. Ao exame físico observa-se icterícia marcada da pele e mucosas. As pupilas são isocóricas
e isorreativas, com reflexo vermelho presente. A fontanela anterior está normotensa e normopulsátil. A
sucção é vigorosa e o abdómen é mole, sem massas palpáveis. A auscultação cardíaca e pulmonar e as
extremidades encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual dos seguintes é o exame de diagnóstico mais adequado neste momento?

(A) Doseamento sérico de bilirrubina total e conjugada.


(B) Doseamento sérico de transaminases, GGT e LDH.
(C) Hemocultura.
(D) Hemograma com contagem diferencial e reticulócitos.
(E) Prova de Coombs direta e indireta.

Resposta correta: A

Comentário
Na icterícia que se mantém para além dos 14 dias de vida, denominada icterícia
prolongada, a causa mais frequente é a icterícia do leite materno, no entanto é
necessária a exclusão de outras causas. O primeiro passo da abordagem de uma
icterícia prolongada passa sempre pelo doseamento da bilirrubina total e direta para
se documentar se a hiperbilirrubinémia ocorre à custa da bilirrubina direta ou indireta,
orientando a investigação futura. Posteriormente, essa investigação pode exigir os
exames que constituem as outras opções de resposta, mas já são exames direcionados
a causas específicas de hiperbilirrubinémia.

Referências bibliográficas

 La Paz, pág. 206, 2º ponto.


 

17. Um lactente de 11 meses é trazido ao serviço de urgência por se encontrar sem micções nas últimas oito
horas e estar menos ativo do que habitualmente. A mãe refere febre com três dias de evolução, associada
a vómitos (dois a três episódios/dia), recusa alimentar importante e dejeções diarreicas (seis a oito
dejeções líquidas diárias, sem sangue ou muco). Observa o menino no colo da mãe, que dirige o olhar e
sorri, mas mantendo a cabeça sobre o ombro da mãe. A pele e mucosas estão pálidas, os lábios secos e os
pés frios ao toque.

Qual das seguintes alternativas é a alteração mais provável de encontrar no exame físico?

(A) Frequência cardíaca de 152/min.


(B) Frequência respiratória de 18/min.
(C) Pressão arterial de 40/23 mm Hg.
(D) Saturação periférica de O2 de 88%.
(E) Tempo de repreenchimento capilar de cinco segundos.

Resposta correta: A

Comentário
O caso refere-se a um lactente com desidratação que, pelos dados fornecidos, se
classificaria em moderada (pele e mucosas pálidas, lábios secos e pés frios). Nesta
pergunta pretende-se que o examinando seja capaz de reconhecer os sinais de choque.
Assim, entre as alterações esperadas num caso como o referido com desidratação
moderada, incluem-se perda de peso de 5-10%, ligeira taquicardia (intervalo normal
para um lactente de 11 meses entre 90-170 bpm), atraso do tempo de reperfusão
capilar entre 3-5 segundos, tensão arterial normal ou baixa (normal para a idade 95/53
mmHg), FR normal ou ligeiramente aumentada (normal para a idade ~24 cpm), mucosas
secas, fontanela deprimida, olhos encovados, turgecência cutânea reduzida,
extremidades frias, baixo débito urinário e irritabilidade. Pelo apresentado, à exceção
da opção A, todas as outras opções seriam de esperar numa criança já em choque.

Referências bibliográficas

 La Paz, Pág. 178, tabela 13.2-1.

 
 

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Na pergunta em questão, em nenhum momento no capítulo de choque do livro de


referência são referidos os valores de referência para sinais vitais em diversas idades.
Ao contrário do que se passa nos adultos, os sinais vitais em doentes pediátricos variam
com a idade e são sobretudo variáveis nos primeiros anos de vida, como é o caso da
criança apresentada. Para conseguir efetuar o raciocínio necessário à resolução do caso
apresentado, é fundamental o conhecimento dos valores de referência para frequência
respiratória, frequência cardíaca e tensão arterial ajustados para a idade. Assim, dada a
ausência de referência a estes valores no capítulo sobre o tema em questão na
bibliografia recomendada, assim como a ausência da presença dos valores normais no
enunciado da prova, consideramos que, aos examinandos não foi dada informação vital
para a base do raciocínio que permitiria chegar à resposta certa. Com base nisto,
consideramos que esta pergunta deve ser considerada impugnável.
 

18. Um homem de 21 anos vem à consulta por tosse produtiva com expetoração amarelada com quatro dias
de evolução. Ele não tem febre, falta de ar, hemoptises ou dor torácica. Não tem antecedentes patológicos
de relevo e não faz medicação habitual. É alérgico à penicilina, que lhe provoca erupção cutânea. É
estudante e trabalha em part-time num hospital próximo; recentemente, ajudou a cuidar de um paciente
que fez tratamento por pneumonia. Nega consumo de álcool, tabaco ou drogas. Não é sexualmente ativo.
A história familiar inclui fibrose quística num dos seus irmãos, que faleceu com 5 anos. Os sinais vitais
são temperatura 38°C, frequência respiratória 18/min, frequência cardíaca 90/min e pressão arterial
120/70 mm Hg; SpO2 96 % (ar ambiente). Ele tem 183 cm de altura e pesa 73 kg; IMC 22 kg/m².
Apresenta-se calmo. A orofaringe não mostra alterações e não há linfadenopatias cervicais palpáveis. O
restante exame físico, incluindo a auscultação cardíaca e pulmonar, encontra-se dentro dos parâmetros de
normalidade.

Qual dos seguintes é o antibiótico mais adequado para a condição do doente?

(A) Ceftriaxone.
(B) Doxiciclina.
(C) Eritromicina.
(D) Levofloxacina.
(E) Nenhum antibiótico está recomendado.

Resposta correta: E

Comentário
O quadro clínico é sugestivo de pneumonia (febre, tosse produtiva e contacto próximo
com doente com pneumonia). No entanto, a ausência de achados à auscultação pode
apontar para outra etiologia para a febre ou, até, sugerir uma infeção vírica.

Referências bibliográficas

 Harrison capítulo 121: pág 911 – tema diagnóstico pneumonia.

 
 

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Consideramos que esta pergunta deve ser impugnada, pela possibilidade de resposta
correta com as alíenas B) e D). O quadro clínico é sugestivo de pneumonia (febre, tosse
produtiva e quadro epidemiológico com contacto próximo com doente com pneumonia).
Trata-se de um doente com alergia à penicilina (erupção cutânea). Segundo o Harrison
(pág 913, tabela 121.5, legenda) em caso de doentes com alergia à penicilina deve ser
usada uma fluoroquinolona respiratória (levofloxacina ou moxifloxacina). Contudo, de
acordo com a norma da DGS (nº045/2011), em caso de intolerância deverá ser usada em
substituição um macrólido, entre os quais a azitromicina, claritromicina ou doxicilcina (os
macrólidos deverão ser sempre usados com cautela). Em segunda linha a estes
fármacos, poderão ser utilizadas fluroquinolonas.

 Harrison (capítulo 121, pág 913, tabela 121.5, legenda); A respiratory


fluoroquinolone should be used for penicillin-allergic patients.
 Harrison (capítulo 121, pág 911) Unfortunately, the sensitivity and specificity of the
findings on physical examination are less than ideal, averaging 58% and 67%,
respectively.
 Norma da DGS (nº045/2011): “se houver intolerância à amoxicilina e/ou epidemia
por Mycoplasma pneumoniae: azitromicina, 500mg por dia ou claritromicina, 500mg
12/12 horas ou Doxiciclina, 200mg dose inicial, depois, 100mg 12/12 horas.”
 

19. Um homem de 75 anos, reformado, vem ao consultório médico por cefaleia, prurido após o banho e
agravamento da hipertensão arterial prévia. É ex-fumador de 40 UMA desde há 10 anos. Os sinais vitais
são frequência cardíaca 84/min e pressão arterial 166/98 mm Hg. Ele tem 170 cm de altura e pesa 79 kg;
IMC 27 kg/m². Ao exame físico apresenta ligeira injeção conjuntival.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Sangue: Hemoglobina 19,9 g/dL; Hematócrito 53%; Leucócitos 13 500/mm³; Neutrófilos, segmentados
58%; Linfócitos 37%; Plaquetas 385 x 10^9/L.

Foi pedido estudo da mutação JAK2 V617F, cujo resultado é positivo.

Qual das seguintes alternativas melhor suporta o diagnóstico?

(A) Aumento de desidrogenase láctica.


(B) Contagem de leucócitos > 11 000/mm³.
(C) Diminuição da eritropoietina sérica.
(D) Diminuição da fosfatase alcalina leucocitária.
(E) Diminuição da vitamina B12 sérica.

Resposta correta: C

Comentário
Trata-se de um caso suspeito de policitemia vera (PV) – presentemente não fumador e
sem menção a doença pulmonar estrutural que avente provável poliglobulia
secundária. A recordar, o diagnóstico de PV é feito quando são cumpridos os critérios
de diagnóstico de doença (3 critérios major ou 2 critérios major + critério minor). Assim,
vem que pelos critérios da OMS de 2016, são considerados critérios major: *1. Aumento
dos níveis séricos de hemoglobina (Hb > 16,5 g/dL em homens; > 16,0 g/dL em
mulheres) ou do hematócrito (Htc > 49% em homens e > 48% em mulheres) – cumprido
neste caso; *2. Biópsia de medula óssea evidenciando mieloproliferação trilinear e
megacariócitos pleomórficos; *3. Presença de mutação JAK2-V617F ou mutação do
exão 12 da JAK2 – cumprido no enunciado. *É critério minor para diagnóstico de PV a
presença de nível baixo de EPO. *Logo, pelo enunciado serão satisfeitos os critérios de
PV, desde que sendo cumpridos 2 critérios major, haja também a presença de critério
minor.

Referências bibliográficas

 Kasper DL, Fauci AS, Hauser S, et al, editors. Harrison’s principles of internal
medicine, 19th ed. New York: The McGraw-Hill Companies, Inc.; Capítulo 131.
 Swerdlow, S., Campo, E., Harris, N., Jaffe, E., Pileri, S., Stein, H. and Thiele, J. WHO
Classification Of Tumours Of Haematopoietic And Lymphoid Tissues. 2017. Lyon:
International Agency for Research on Cancer.
 

20. Uma mulher de 50 anos é trazida ao serviço de urgência porque o marido, durante a noite, achou que a
mulher «não estava bem». Tentou acordá-la sem sucesso. A história médica revela diabetes mellitus,
medicada com metformina e gliclazida. A doente consome três cervejas diariamente. Os sinais vitais são
temperatura 36,5°C, frequência respiratória 22/min, frequência cardíaca 110/min e pressão arterial 120/90
mm Hg; SpO2 96 % (ar ambiente). Ao exame físico apresenta-se em coma não-reativo e respira sem
dificuldade. O exame físico, incluindo a auscultação cardíaca e pulmonar e o exame do abdómen,
encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade. A lateralização motora é difícil de avaliar pelo estado
neurológico.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Administrar naloxona.


(B) Administrar tiamina.
(C) Determinar glicemia.
(D) Realizar punção lombar.
(E) Realizar TC do crânio.

Resposta correta: C

Comentário
Perante um coma não reativo numa doente diabética que está medicada com um
antidiabético oral com risco de induzir hipoglicemias, como é o caso da gliclazida
(classe farmacológica: sulfonilureias), é sempre perentório fazer uma pesquisa de
glicemia. Trata-se de uma manobra simples, rápida e eficaz para detetar se o coma se
deve a uma hipoglicemia (causa de coma tratável rapidamente depois de identificada) -
resposta C correta. Não parece haver contexto aparente para intoxicação por opióides
(resposta A errada); o défice grave de tiamina pode estar na origem de uma
encefalopatia de Wernicke, mas esta geralmente está associada a queixas de confusão
e não a coma. Além disso, surge em pessoas com hábitos etílicos muito marcados e
maus hábitos nutricionais (resposta B errada); a punção lombar é um procedimento
laborioso e que não deve ser feito numa primeira abordagem de um coma onde a
atuação célere pode fazer a diferença (resposta D errada); A TC de crânio seria uma boa
opção, mas há que descartar causas rapidamente reversíveis primeiro, nomeadamente
hipoglicemia (resposta E errada).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª Edição: capítulo 397, página 2866.


 

21. Uma mulher de 37 anos, de origem africana, vem ao centro de saúde para consulta de vigilância. Ela está
preocupada porque a sua mãe teve diagnóstico de cancro da mama antes da menopausa, aos 47 anos. Ela
não tem outros familiares com o mesmo diagnóstico. Nega consumo de álcool ou tabaco e não faz
medicação habitual. A citologia cervicovaginal realizada anteriormente é normal. Há dois anos, surgiu
um cisto volumoso na mama direita, que foi confirmado por ecografia e mamografia e que resolveu
espontaneamente. Os sinais vitais e exame físico encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é o método mais adequado para o rastreio de cancro de mama nesta
mulher?

(A) Análise imediata do gene BRCA-1.


(B) Ecografia mamária anual.
(C) Exame físico mamário bianual.
(D) Mamografia anual a partir dos 40 anos.
(E) RM mamária.

Resposta correta: D

Comentário
As indicações para pesquisa gene BRCA são as seguintes: mulheres com cancro da
mama com ≤ 40 anos; mulheres com cancro do ovário, peritoneu ou trompas de Falópio,
seroso de alto grau independentemente da idade; cancro da mama bilateral; mulheres
com cancro da mama com ≤ 50 anos e um familiar próximo com cancro da mama com
≤ 50 anos; mulher com cancro da mama, independentemente da sua idade se tiver dois
ou mais familiares próximos com cancro da mama (independentemente da idade
destes); mulher com cancro da mama com ≤ 50 anos e descendência judaica Ashkenazi;
mulher não afetada por cancro da mama, mas com familiar que cumpra algum dos
requisitos previamente descritos. A utente descrita no enunciado não cumpre nenhum
dos requisitos pelo que não tem indicação para pesquisa imediata do gene BRCA-1, o
que exclui a hipótese A. Quanto Às opções (B) e (E): a ecografia mamária e a ressonância
magnética não estão recomendadas como métodos isolados para o rastreio de cancro
da mama, devendo ser utilizados como métodos adjuvantes. A ressonância magnética
está indicada em conjunto com mamografia em apenas alguns casos específicos,
nomeadamente: mulheres com mutação BRCA 1 ou 2 conhecida, familiar em 1º grau
com mutação BRCA 1 ou 2, risco para a vida de cancro da mama ≥ 20/25%, radiação
torácica entre os 10-30 anos e mulheres com antecedentes de hiperplasia atípica
lobular ou ductal e de carcinoma lobular in situ, o que não se identifica no caso descrito.
Assim, é possível excluir as alíneas (B) e (E). Relativamente ao nosso caso clínico, trata-
se de uma mulher com um familiar direto com cancro da mama com menos de 50 anos.
Após introdução dos dados para cálculo do risco de desenvolvimento do cancro da
mama, estamos perante uma mulher com risco ligeiramente aumentado de cancro da
mama (segundo norma da DGS e Recomendações da Associação Portuguesa de
Médicos de Medicina Geral) com risco de desenvolvimento de cancro da mama durante
a vida inferior a 20% e inferior a 1,7% nos próximos 5 anos (calculadora de risco:
https://bcrisktool.cancer.gov/), pelo que deverá ser realizado rastreio habitual ou
eventualmente mais cedo. Em Portugal o rastreio habitual é realizado com mamografia
e eventual ecografia mamária a cada dois anos a partir dos 50 anos. No entanto segundo
as guidelines do NCCN (National Comprehensive Cancer Network) e do American
 

College of Obstetricians and Gynecology o rastreio do cancro da mama deve ser


realizado com mamografia anual a partir dos 40 anos. A resposta mais correta parece
ser a (D) no entanto é controverso dado que os timings de rastreio variam entre os
diversos países e sociedades científicas adotadas.

Referências bibliográficas

 Rastreio cancro da mama – norma Direção Geral da Saúde.


 Recomendações da Associação Portuguesa de Médicos de Medicina Geral para
rastreio de cancro da mama (norma Direção Geral da Saúde).
 Página 513 Schwartz.
 ESMO Guidelines.
 Obstetrics and Gynecology 7th edition Beckmann. Chapter 2 – The Obstetrician –
Gynecologist’s Role in Screening and Preventive Care – Breast Cancer: “Ultrasound
and magnetic resonance imaging (MRI) have no current role in screening women at
average risk but are used as adjunctive tests. These imaging modalities are used for
the assessment of palpable masses. MRI is also recommended, in addition to yearly
mammography, for women at very high risk (greater than 20% lifetime risk
according to family history risk assessment or who have a first-degree relative with
BRCA1 or BRCA2 gene mutation)”.
 Breast Cancer Screening and Diagnosis – NCCN Clinical Practice Guidelines in
Oncology version 1.2019

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Pergunta potencialmente impugnável porque as orientações para rastreio do cancro da


mama divergem muito entre si e entre as diversas sociedades internacionais. A idade
recomendada para o início de mamografia de rastreio é também controversa. Em
Portugal e na Europa a idade recomendada é a partir dos 50 anos, mas a maioria das
sociedades americanas preconiza a disponibilização de mamografias de rastreio anuais
a partir dos 40 anos. Como se trata de uma mulher com risco ligeiramente aumentado de
cancro da mama as normas Portuguesas consideram que o rastreio deverá ser realizado
a cada dois anos a partir dos 50 anos ou eventualmente poderá ser iniciado mais cedo.
Perante as alíneas a única opção possivelmente correta seria a D, no entanto se
considerarmos as normas de orientação vigentes em Portugal esta opção também não
está totalmente correta.
 

22. Uma mulher de 32 anos recorre a consulta de medicina geral e familiar por obstrução nasal e rinorreia
purulenta desde há 12 dias. Nega febre, cefaleia ou anosmia. Fez tratamento com paracetamol, com alívio
temporário das queixas. A história médica não revela antecedentes patológicos. Os sinais vitais são
temperatura 36,7°C, frequência respiratória 13/min, frequência cardíaca 75/min e pressão arterial 125/70
mm Hg. Ao exame físico apresenta rinorreia posterior e halitose. A rinoscopia anterior, auscultação
pulmonar e exame neurológico encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é o tratamento mais adequado neste momento?

(A) Prescrever amoxicilina + ácido clavulânico oral.


(B) Prescrever desloratadina oral.
(C) Prescrever fenilefima nasal.
(D) Prescrever mometasona nasal.
(E) Não é recomendado mais nenhum tratamento.

Resposta correta: A

Comentário
A história apresentada cumpre critérios clínicos (obstrução nasal e rinorreia com
menos de 12 semanas de duração) para rinossinusite aguda. O facto de apresentar
rinorreia purulenta poderia apontar para uma etiologia bacteriana, pelo que o
antibiótico de primeira linha é a amoxicilina + ácido clavulânico.

Referências bibliográficas

 European Position Paper on Rhinosinusitis and Nasal Polyps 2020 (páginas 53, 81,
85, 87, 89).

Caso seja impugnável (comentário + referências)

A doente apresentada cumpre critérios clínicos para uma rinossinusite aguda pós-viral
(sintomas persistentes há mais de 10 dias e menos de 12 semanas), mas não para uma
rinossinusite bacteriana - teria de apresentar pelo menos 3 dos seguintes 5: rinorreia
mucopurulenta, dor local, febre, aumento da PCR ou VS e double sickening; mas
apresenta apenas rinorreia purulenta. Perante este diagnóstico, o único tratamento
recomendável (entre os apresentados) é o corticóide nasal, não estando recomendada a
terapêutica com antibioterapia.

 European Position Paper on Rhinosinusitis and Nasal Polyps 2020 (páginas 53, 81,
85, 87, 89).
 

23. Uma mulher de 30 anos, atleta de alta competição de atletismo, vem ao consultório médico por episódios
recorrentes de icterícia após corrida de 10 000 m. Os sinais vitais são temperatura 36,8°C, frequência
cardíaca 78/min e pressão arterial 120/55 mm Hg. Ao exame físico apresenta-se com excelente estado
geral e com icterícia da pele e mucosas.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: AST 27 U/L; ALT 27 U/L; Bilirrubina: Total 4 mg/dL; Direta 1 mg/dL; Sódio 132 mEq/L; Potássio
4,0 mEq/L.

Sangue: Hemoglobina 11,4 g/dL.

Qual dos seguintes mecanismos mais provavelmente desempenha um papel primário no desenvolvimento
deste quadro?

(A) Hemólise com o esforço físico intenso.


(B) Hemólise microangiopática.
(C) Redução da atividade da UGT1A1.
(D) Redução do metabolismo da lipofuscina no tecido hepático.
(E) Stress emocional.

Resposta correta: C

Comentário
O júri considerou a redução da actividade da UGT1A1 como causadora primária do
quadro.

Referências bibliográficas

 Kasper DL, Fauci AS, Hauser S, et al, editors. Harrison’s principles of internal
medicine, 19th ed. New York: The McGraw-Hill Companies, Inc.; Capítulo 129.

 
 

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Consideramos que esta questão é passível de impugnação. Mulher jovem que após
períodos de marcha extensa (10 Km) apresenta icterícia, associada a hiperbilirrubinemia
(essencialmente à custa da bilirrubina indirecta), com achado laboratorial de anemia (Hb
de 11.4 g/dL), sem evidência de citólise. Não há menção no enunciado a doseamentos de
LDH, nem de haptoglobina. Referido que icterícia sucede o esforço vigoroso da marcha,
mas não há inferência de latência temporal exacta (quer de forma directa, quer
presumida por achados bioquímicos). O perfil paroxístico da icterícia e a sua associação
com a marcha tornam pouco provável uma redução da actividade da UGT1A1/síndrome
de Gilbert como papel primário no surgimento do quadro (o síndrome de Gilbert, também
designado por icterícia familiar não hemolítica está associado a uma redução da
actividade da UGT1A1 responsável pela glicurono-conjugação da bilirribina, tornando-a
mais solúvel e possibilitando a sua excreção na bílis - ainda que a icterícia nestes doentes
seja agravada por situações de maior stress fisiológico, fenotipicamente os mesmos
apresentam tipicamente um status subictérico que em nenhum momento é mencionado
no enunciado). Ainda que o stress mecânico da marcha com hemólise potencie a
hiperbilirrubinemia à custa da bilirrubina indirecta com subsequente icterícia (por
deficiente glicurono-conjugação) num contexto de diminuição da actividade da UGT1A1,
o evento primário será sempre a hemólise exacerbada por stress físico/mecânico da
marcha. Do exposto, considerámos a hipótese mais provável ser o surgimento de um
quadro de hemólise com o esforço físico intenso (evento primário) - que até possa
eventualmente ser exacerbado mediante redução da actividade da UGT1A1. No entanto,
se sem esforço não havia icterícia conforme subentendido no enunciado, apenas a
hemólise aumentada por stress mecânico pode ser enquadrada como trigger primário
para manifestação do quadro (independentemente do contexto fisiopatológico
subsequente para instalação do mesmo).
 

24. Uma mulher de 18 anos vem a consulta hospitalar por anemia e pequena esplenomegalia detetada em
ecografia abdominal. Não refere outros sintomas associados. Ela não tem antecedentes patológicos de
relevo e é nuligesta. Os antecedentes familiares incluem história paterna de anemia crónica,
esplenomegalia e colecistectomia por litíase biliar. Os sinais vitais são temperatura 36°C, frequência
cardíaca 78/min e pressão arterial 104/78 mm Hg. Ao exame físico apresenta-se com mucosas descoradas
e hidratadas, sem hematomas ou outras alterações cutâneas. A auscultação cardíaca e pulmonar encontra-
se dentro dos parâmetros de normalidade. O abdómen é mole e depressível, com a ponta do baço palpável
no final da inspiração. Sem edemas periféricos.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: AST 35 U/L; ALT 22 U/L; Fosfatase alcalina 85 U/L; Bilirrubina: Total 3 mg/dL; Direta 0,2 mg/dL;
Desidrogenase láctica (LDH) 173 U/L.

Sangue: Hemoglobina 10 g/dL; VGM 98 fL; Eletroforese de hemoglobinas Normal.

Qual das seguintes alternativas é a explicação mais provável para as alterações observadas?

(A) Ausência de síntese de cadeias beta da hemoglobina.


(B) Mutação do gene da desidrogenase da glucose-6-fosfato.
(C) Mutação do gene da espectrina.
(D) Presença de anticorpo antieritrocitário.
(E) Substituição do ácido glutâmico pela valina no gene da beta globina.

Resposta correta: C

Comentário
Quadro marcado pela presença de antecedentes familiares de anemia crónica,
associada a esplenomegalia e necessidade de colecistectomia por litíase biliar. A
presença de anemia normocítica, com a presença de electroforese de hemoglobinas
normal, exclui talassemia e síndromes falciformes. A elevação da LDH acima dos
valores de referência e a hiperbilirrubinemia (à custa da bilirrubina indirecta) com
esplenomegalia associada apontam para um aumento do turnover da série eritróide –
contexto de membranopatia com hemólise patente. Dentro das membranopatias que
determinam uma hemólise por aprisionamento de eritrócitos deformados no sistema
reticulo-endotelial do baço, a mais comum é a esferocitose hereditária, com um padrão
de transmissão autossómico dominante e associado às mutações da anquirina, banda
3, proteína 4.2 e espectrina beta.

Referências bibliográficas

 L Goldman, DA Ausiello, AI Schafer. Goldman-Cecil Medicine, 26th edition. 2019.


Elsevier; capítulo 161.
 

25. Uma grávida de 27 anos recorre ao serviço de urgência por desconforto lombar bilateral e sensação de
pressão hipogástrica desde há dois dias. A gestação tem 29 semanas e foi complicada por bacteriúria
assintomática, detetada nas análises do 2.º trimestre, tendo sido medicada com amoxicilina. Os
antecedentes obstétricos são gesta 2 e para 1 (parto vaginal espontâneo às 33 semanas de gestação, há
dois anos, recém-nascido com 2100 g de peso, vivo e saudável). Refere perceção de movimentos fetais,
com maior frequência após as refeições. Os sinais vitais são temperatura 36,8°C, frequência respiratória
14/min, frequência cardíaca 80/min e pressão arterial 116/67 mm Hg. A altura uterina é de 27 cm. Ao
exame com espéculo apresenta corrimento abundante e inespecífico; ao toque vaginal, o colo está
amolecido, intermédio, com 2 cm de dilatação, 30 % extinto (apagado), apresentação pélvica acima das
espinhas isquiáticas (plano -3). A tira-teste de urina não mostra alterações. A cardiotocografia realizada
(velocidade do papel a 1 cm/min) mostra linha de base com frequência cardíaca fetal de 140/min,
conforme o seguinte traçado:

Qual dos seguintes é o próximo passo mais adequado na gestão desta grávida?

(A) Atitude expectante.


(B) Prescrever dexametasona intramuscular.
(C) Prescrever heparina de baixo peso molecular.
(D) Prescrever misoprostol intravaginal.
(E) Prescrever progesterona intramuscular.

Resposta correta: B

Comentário
O cardiotocograma revela um traçado tranquilizador com registo de contractilidade
regular numa gestação pré-termo (29 semanas), sendo que a avaliação cervical
descreve um colo amolecido com 2 cm de dilataçao e 30% de apagamento, compatível
 

com um índice de Bishop favorável, numa grávida com queixas álgicas com dois dias de
evolução e antecedentes de um parto pré-termo (PPT) espontâneo às 33 semanas de
gestação. A associação destes fatores pode indicar o desenrolar de um início de
trabalho de parto e, consequentemente, presta-se a atuação obstétrica. A maturação
pulmonar com dexametasona revela-se pertinente, tendo em conta a idade gestacional.
A indução do trabalho de parto com misoprostol vaginal está desaconselhada, não só
por se tratar de uma gravidez pré-termo de 29 semanas, como também por estarmos
perante um feto em apresentação pélvica. A administração continuada de progesterona
vaginal pode ser recomendada enquanto fator preventivo em grávidas com antedentes
de PPT espontâneo, desde uma fase mais precoce da gravidez, mas não de
administração intramuscular.

Referências bibliográficas

 Beckmann 7th edition, Pag 178 , “PRETERM LABOR”, 4º parágrafo, linha 1-2,4-5.;”
Factors Improving Outcomes”, 1º parágrafo, linhas 4-6, pag 179, 1º parágrafo, linhas
1-2 ; p180 “Prevetion” 1º parágrafo, linhas 3-6; P181 “MANAGEMENT OF PRETERM
LABOR” 1º parágafo, linha 1; P182 “Corticosteroids” linha 1-3.
 

26. Um homem de 50 anos, casado, vem a consulta de medicina geral e familiar pedir para que a sua esposa,
de 42 anos, seja submetida a laqueação tubar bilateral. Ela tem antecedentes de síndrome antifosfolipídico
e de enfarte agudo de miocárdio há dois meses. Atualmente está medicada com carvedilol, sinvastatina e
ácido acetilsalicílico. O casal tem um filho em comum, com 10 anos. O parto foi eutócico, às 36 semanas
de gravidez. O parto foi eutócico, às 36 semanas de gravidez.

Qual das seguintes atitudes é a mais adequada?

(A) Convocar a mulher para consulta.


(B) Programar colocação de dispositivo intrauterino de cobre.
(C) Programar colocação de dispositivo intrauterino com levonorgestrel.
(D) Prescrever de imediato progestativo oral.
(E) Referenciar para laqueação tubar bilateral.

Resposta correta: A

Comentário
De acordo com o princípio da autonomia da mulher que determina que devemos ouvir,
saber aceitar e respeitar as suas escolhas, a atitude correta seria sempre convocar a
própria e nunca tomar decisões apenas com base na informação prestada pelo seu
marido e com base nos desejos do mesmo. Só após discussão e apresentação dos
métodos contracetivos disponíveis, de acordo com as necessidades, expectativas e
historial médico da utente seria ético e aceitável propor e iniciar um método
contracetivo.

Referências bibliográficas

 Obstetrics and Gynecology 7th edition Beckmann. Chapter: Ethics, Liability and
Patient Safety in Obstetrics and Gynecology: “Principle-based clinical management
is based on systematic review of the case using four ethical principles: Beneficience,
Autonomy, Nonmaleficience and Justice (…) Respect for patient autonomy
acknowledges an individual’s primary right to hold views, make choices, and take
actions based on her beliefs or values independent of those of the physician, medical
care system, or society as well as free of extrinsic controlling influences and limited
understanding”.
 

27. Uma mulher de 26 anos, primigesta, vem ao consultório médico, às 30 semanas de gestação, por tosse
noturna e pieira desde há aproximadamente cinco semanas. A doente refere agravamento dos sintomas de
manhã. A tosse é ocasionalmente produtiva com muco transparente e por vezes associa-se a rouquidão e
irritação na orofaringe. Ela não tem tido febre. A gravidez tem decorrido sem complicações até ao
momento, referindo apenas dispepsia ocasional que tipicamente alivia com antiácidos de venda livre. Está
medicada com polivitamínico pré-natal. Deixou de fumar quando engravidou. Refere história familiar de
atopia na mãe e no irmão, com sintomatologia típica de febre dos fenos, e que, enquanto criança, ela
própria teve alguns episódios de pieira. Desde há dois anos que tem dois cães em casa. Ela trabalha como
rececionista num consultório pediátrico. Os sinais vitais são temperatura 37°C, frequência respiratória
14/min, frequência cardíaca 86/min e pressão arterial 108/62 mm Hg. A auscultação pulmonar revela
sibilos expiratórios e roncos de timbre rude.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado nesta doente?

(A) Elevar a cabeceira da cama.


(B) Pedir testes de função pulmonar.
(C) Referenciar para gastroenterologia.
(D) Referenciar para imunoalergologia.
(E) Repetir auscultação pulmonar de manhã, altura em que os sintomas são mais acentuados.

Resposta correta: A

Comentário
A apresentação de tosse, rouquidão e irritação na orofaringe é compatível com doença
do refluxo gastroesofágico. O alívio da dispepsia com antiácidos também suporta tal
diagnóstico. O facto de estar grávida é um fator de risco/desencadeante desta patologia,
dada a diminuição do tónus do esfíncter esofágico inferior provocado pela progesterona
e aumento da pressão intra-abdominal causada pelo aumento do tamanho do útero
gravídico e horizontalização do estômago. A pirose é um sintoma frequente durante a
gestação e o tratamento consiste, numa primeira instância, na aplicação de medidas
básicas, como a elevação da cabeceira da cama, e na modificação de hábitos
alimentares.
 

Referências bibliográficas

 Beckmann 7th edition “Generalized smooth muscle relaxation by progesterone


produces lower esophageal sphincter tone, decreased GI motility, and impaired
gallbladder contractility. (…) Additionally, the imbalance between the lower
esophageal sphincter tone, leads to gastroesophageal reflux. However,
appropriately changing the maternal recumbent position may ameliorate
pregnancy-associated mild gastroesophageal reflux.”
 Harrison, 20ªed, Cap 34 “Cough”, pg 231-232, “Retrosternal burning after meals or
on recumbency, frequent eructation, hoarseness, and throat pain may be indicative
of gastroesophageal reflux. Nevertheless, reflux may also elicit minimal or no
symptoms. (…) Antacids, histamine type 2 (H2) receptor antagonists, and proton-
pump inhibitors are used to neutralize or decrease the production of gastric acid in
gastroesophageal reflux disease; dietary changes, elevation of the head and torso
during sleep, and medications to improve gastric emptying are additional therapeutic
measures.”
 Beckmann 7thed, pg 236, “Asthma”, 2º paragrafo, linhas 1-3; P62 “Respiratory
system” Fig 5.2.
 Medicina Materno-Fetal, Luis Mendes da Graça, Cap 50 “Patologia
gastroenterológica da gravidez”, pg 488-489.

Caso seja impugnável (comentário + referências)

O caso clínico é bastante discutível. A descrição é altamente sugestiva de asma, mais


especificamente de asma mal controlada. A descrição de pieira e tosse (nalguns casos,
produtiva) é típica. A apresentação de sintomas em criança é bastante frequente. Uma
parte importante dos pacientes fica assintomática na adolescência, mas depois
reaparece em alguma fase na vida adulta. A atopia é o principal fator de risco. A gravidez
é um dos desencadeantes de asma. Os achados ao exame físico são tipicamente
expiratórios. O mais correto, de facto, perante um caso como o descrito, seria iniciar
tratamento para a asma. Contudo, tal não é uma das alternativas de resposta. O que se
sabe é que os estudos da função respiratória nas grávidas são úteis para monitorização
da doença e, na verdade, está aconselhado que sejam feitos por rotina. A utilização para
fins de diagnóstico não é recomendada, dado que o sistema respiratório, durante a
gravidez, altera-se para aumentar a oxigenação, provocando alterações fisiológicas nas
capacidades e volumes pulmonares. Contudo, é de tal maneira importante a introdução
do tratamento da asma num caso destes, dado que a sua ausência tem efeitos deletérios
comprovados para o bebé e para a mãe, que se torna discutível que a alínea considerada
correta não seja, pelo menos, no sentido do diagnóstico mais importante.

 Harrison, 20ª ed, Cap 281 “Ashtma”, pg 1958-1963, “Asthma can present at any
age, with a peak age of 3 years. (…) many with asthma become asymptomatic
during adolescence but that asthma returns in some during adult life, particularly
in those with persistent symptoms and severe asthma. (…) Atopy is the major risk
factor for asthma, (…) The characteristic symptoms of asthma are wheezing,
dyspnea, and coughing, which are variable, both spontaneously and with therapy.
(…) There is increased mucus production in some patients, (…) Typical physical
 

signs are inspiratory, and to a greater extent expiratory, (…) The diagnosis of
asthma is usually apparent from the symptoms of variable and intermittent
airways obstruction, but must be confirmed by objective measurements of lung
function.”
 GINA 2020, pg 29, “Pregnant women and women planning a pregnancy should be
asked whether they have asthma so that appropriate advice about asthma
management and medications can be given (see Chapter 3: Managing asthma in
special populations or settings, p.89). If objective confirmation of the diagnosis is
needed, it would not be advisable to carry out a bronchial provocation test or to
step down controller treatment until after delivery.”
 GINA 2020, pg 89+90, “Asthma control often changes during pregnancy; in
approximately one-third of women asthma symptoms worsen, in one-third they
improve, and in the remaining one-third they remain unchanged. Exacerbations
are common in pregnancy, particularly in the second trimester. Exacerbations
and poor asthma control during pregnancy may be due to mechanical or hormonal
changes, or to cessation or reduction of asthma medications due to concerns by
the mother and/or the health care provider. Pregnant women appear to be
particularly susceptible to the effects of viral respiratory infections, including
influenza. Exacerbations and poor symptom control are associated with worse
outcomes for both the baby (pre-term delivery, low birth weight, increased
perinatal mortality) and the mother (pre-eclampsia). If asthma is well controlled
throughout pregnancy there is little or no increased risk of adverse maternal or
fetal complications.”
 

28. Um homem de 56 anos vem ao consultório médico por aumento da frequência da tosse e expetoração de
coloração mais amarelada desde as últimas três semanas. Nega dispneia, febre ou outras queixas. No seu
estado habitual de saúde, tosse frequentemente desde há cinco anos e, por períodos, acompanha-se de
expetoração vigorosa que até agora «ia resolvendo por si». Tem a perceção que não lhe altera, até ao
momento, a qualidade de vida e nunca foi investigado. A história médica revela tuberculose pulmonar
aos 20 anos e obesidade. Não faz medicação habitual. Refere consumo excessivo de tabaco dos 25 aos 50
anos. Os sinais vitais são temperatura 36°C, frequência cardíaca 89/min e pressão arterial 131/89 mm Hg;
SpO2 97 % (ar ambiente). Ele tem 169 cm de altura e pesa 89 kg; IMC 31 kg/m². Ao exame físico não
tem gânglios palpáveis. A auscultação pulmonar revela raros roncos bilateralmente, sem alteração dos
tempos respiratórios ou outras alterações. O exame do abdómen mostra obesidade central. O exame
neurológico e musculoesquelético encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual dos seguintes estudos clínicos é o mais adequado para confirmar o diagnóstico etiológico mais
provável?

(A) Broncofibroscopia.
(B) Endoscopia digestiva alta.
(C) Estudo microbiológico de expetoração.
(D) TC do tórax de alta resolução.
(E) Teste de libertação de interferão gama (IGRA).

Resposta correta: D

Comentário
O caso clínico é sugestivo de bronquiectasias, de modo que o diagnóstico é estabelecido
por TC do tórax de alta resolução. A tosse produtiva persistente é a apresentação mais
comum, cuja expetoração é tipicamente espessa e viscosa. A tuberculose pulmonar é
uma das etiologias de bronquiectasias. O diagnóstico é estabelecido pela associação
entre a anamnese atrás descrita e achados radiográficos consistentes. A TC tórax é
mais específica para bronquiectasias e é o melhor meio complementar para confirmar
o diagnóstico.

Referências bibliográficas

 Harrison, 20ªed, Cap 284 “Bronchiectasis”, pg 1984, “The most common clinical
presentation is a persistent productive cough with ongoing production of thick,
tenacious sputum. Physical findings often include crackles and wheezing on lung
auscultation, and some patients with bronchiectasis exhibit clubbing of the digits.
The diagnosis is usually based on presentation with a persistent chronic cough and
sputum production accompanied by consistent radiographic features. Although
chest radiographs lack sensitivity, the presence of “tram tracks” indicating dilated
airways is consistent with bronchiectasis. Chest CT is more specific for
bronchiectasis and is the imaging modality of choice for confirming the diagnosis.”
 

29. Uma lactente de 4 meses é observada em consulta pela 3.ª vez no último mês por episódios frequentes de
vómitos. O ganho de peso tem sido adequado e, segundo a mãe, o trânsito intestinal tem sido regular, com
dejeções moles, sem alteração das características habituais. A mãe refere que, desde o início do quadro,
foram tentadas várias fórmulas à base de leite de vaca e soja, sem melhoria na sintomatologia.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Determinar a concentração sérica de IgE específica para alfa-lactoalbumina e beta-


lactoglobulina.
(B) Determinar a concentração sérica de IgE específica para caseína.
(C) Determinar a concentração sérica de IgE total.
(D) Iniciar fórmula láctea hipoalergénica.
(E) Realizar um teste cutâneo de hipersensibilidade com fórmula à base de leite de vaca.

Resposta correta: D

Comentário
A pergunta refere-se ao tema de Alergia à Proteína do Leite de Vaca (APLV), descreve
um lactente com vómitos com início aos 3 meses, mas boa evolução ponderal, que já
fez várias mudanças de leite (vaca e soja). Os leites de soja apenas estão indicados a
partir dos 6 meses de vida e podem gerar uma reação alérgica em cerca de 10-14% dos
casos. A sua recomendação limita-se a familias vegetarianas ou que não têm
capacidade económica para adquirir leites hipoalergénicos. Quer isto dizer que, um leite
à base de soja não só não resolve o problema, como pode ser um confundidor. Quando
apresentados com uma história clínica e exame físico compatíveis com suspeita
diagnóstica de APLV, desde que a apresentação não seja de anafilaxia (quadro não IgE-
mediado), o primeiro passo será iniciar uma dieta de evicção de PLV com utilização,
numa criança alimentada com leite artificial, de uma fórmula hidrolizada ou elementar
(leites hipoalergénicos - opção D correta). As determinações da IgE estão indicadas nos
casos de reacção grave e/ou tipo imediato, o que não é o caso (opções A e B erradas).
Os testes cutâneos não estão indicados (opção E errada).

Referências bibliográficas

 La Paz, pág. 1111 e 1112


 

30. Um homem de 21 anos é conduzido ao serviço de urgência pelos familiares por alterações de
comportamento. Relatam que o jovem passou o último ano isolado no quarto e, apesar de parecer estudar,
não conseguiu aprovação em nenhuma das disciplinas. É frequente não comer e não tomar banho.
Encontram-no a falar sozinho, como se respondesse a perguntas. Chora inconsolavelmente afirmando que
os agentes do FBI se preparam para o eliminar, o que sente como injusto. Agrediu recentemente um colega
da residência universitária alegando que este era na realidade um agente norte-americano que o vigiava
através do computador para controlar os seus pensamentos. A história médica revela dislipidemia mista e
a medicação habitual inclui atorvastatina, que tem cumprido. É natural da Guiné-Bissau e está a residir
em Portugal há dois anos. A história familiar revela perturbação afetiva bipolar na mãe e avó materna.

Qual das seguintes alternativas é o tratamento inicial mais adequado?

(A) Aripiprazol, 10 mg/dia, por via oral.


(B) Clozapina, 25 mg/dia, por via oral.
(C) Haloperidol, 25 mg/dia, por via oral.
(D) Olanzapina, 5 mg/dia, por via oral.
(E) Palmitato de paliperidona, 75 mg/mês, por via intramuscular.

Resposta correta: A

Comentário
Neste caso clínico, estamos perante um provável primeiro episódio psicótico,
provavelmente de esquizofrenia, com sintomatologia depressiva secundária aos
sintomas psicóticos. A pergunta remete essencialmente para o tratamento. No
tratamento de um primeiro episódio psicótico devemos ter em consideração 4 pontos:
A eficácia dos antipsicóticos é globalmente sobreponível, à excepção da clozapina que
é o único em que está demostrada maior eficácia, no tratamento dos sintomas positivos;
A clozapina não é utilizada como tratamento de primeira linha, por razões de segurança
hematológica; É o perfil de efeitos adversos, e as características específicas, de cada
antipsicótico que juntamente com o perfil do doente (nomeadamente comorbilidades)
que ditam a escolha do antipsicótico; Deve-se começar com um antipsicótico
administrado por via oral, no limite inferior da dose prevista no RCM. Assim, logo à
partida podemos excluir a clozapina, porque esta não deveria ser utilizada como
primeira linha. Podemos também excluir o haloperidol, porque a ser utilizado como
primeira linha teria de ser iniciado com uma dose entre 2 e 10 mg/dia. O palmito de
paliperidona 75 mg, também é excluído porque se inicia a terapêutica com um
antipsicótico oral. Por outro lado, até para iniciar o palmito de paliperidona é necessário
primeiro fazer alguns dias de paliperidona ou risperidona oral. Assim, ficamos apenas
com o aripiprazol e a olanzapina. A escolha correcta é o aripiprazol pelas
características do doente, nomeadamente, por ser portador de uma dislipidémia mista.
A olanzapina é um dos antipsicóticos mais associados a aumento do peso e síndrome
metabólica, incluindo dislipidémia (de tal maneira que já é sugerido que deve ser
evitada como 1ª linha no primeiro episódio psicótico) ao contrário do aripiprazol que é
dos mais seguros no que concerne o perfil metabólico. Assim, pelo perfil de efeitos
adversos do aripiprazol, que melhor corresponde às necessidade e particularidades
deste doente, e uma vez que 10 mg/dia é uma dose correcta para inicio da terapêutica,
é esta a opção correcta.
 

Referências bibliográficas

 NOC da DGS “Utilização Clínica dos Antipsicóticos”


 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição: Capítulo 11 “Schizophrenia”, pág
286-292; Capítulo 25 “ Drugs and Other Physical Treatments”, pág 727.
 

31. Um homem de 35 anos, professor, vem ao serviço de urgência por cefaleia com início há uma hora e
meia. Descreve a dor como sensação de facada, ou ardor, no lado esquerdo da cabeça. Ele diz que tem
tido episódios semelhantes desde há seis meses. Ocasionalmente, tem lacrimejo do olho esquerdo durante
estes episódios. Nega distúrbios visuais, febre, náuseas ou sintomas neurológicos. As cefaleias ocorrem
geralmente ao fim do dia, pouco tempo após o regresso do trabalho, duram de alguns minutos a algumas
horas e não aliviam com o uso de ibuprofeno. Não toma outra medicação. A mãe e irmão mais velho
também têm história de cefaleias. Ele bebe três chávenas de café por dia e uma limonada ocasionalmente,
ao almoço. Ingere comida chinesa aproximadamente três vezes por mês. Nega consumo de álcool, tabaco
ou drogas. Os sinais vitais são temperatura 37°C, frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca
72/min e pressão arterial 125/70 mm Hg. Ele tem 185 cm de altura e pesa 97 kg; IMC 28 kg/m². A
auscultação cardíaca revela um sopro protossistólico, grau 1/6, mais audível no ápex, que ele refere ter
desde a infância. O restante exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é a opção terapêutica mais adequada neste momento?

(A) Administração endovenosa de uma dose única de metilprednisolona.


(B) Administração endovenosa de verapamil e subcutânea de ergotamina.
(C) Administração intratecal de lidocaína.
(D) Administração oral de ibuprofeno em conjunto com massagem.
(E) Administração subcutânea de sumatriptano e de oxigénio por via nasal.

Resposta correta: E

Comentário
Homem jovem com episódios recorrentes de cefaleia unilateral com sinais trigémino-
autonómicos (lacrimejo) que duram entre minutos e horas, uma vez ao dia. O primeiro
é reconhecer que estamos dentro do grupo de cefaleias trigémino-autonómicas. Logo,
devemos prestar atenção à frequência e à duração. Dentro deste grupo de cefaleias, a
cefaleia de salvas é mais prolongada (de 15 a 180 minutos) e tem uma frequência
menor. A hemicraniana paroxística e as cefaleias neuralgiformes não chegam a durar
uma hora e ocorrem mais de 5 vezes ao dia. Além disso, ao contrário que nas outras
cefaleias primárias, a cefaleia em salvas é mais frequente entre os homens. O
tratamento de primeira escolha para abortar a dor são os triptanos (lembre-se que
devem ser subcutâneos para conseguir um efeito mais rápido) junto a oxigênio por via
nasal. O verapamil é o tratamento preventivo de primeira escolha, associando
inicialmente corticoides até que o prévio comece a fazer efeito.

Referências bibliográficas

 P31: Harrison, página 3105, May et al, 2006. EFNS guidelines on the treatment of
cluster headache and other trigeminal-autonomic cephalalgias
 Robbins et al, 2016. Treatment of Cluster Headache: The American Headache Society
Evidence‐Based Guidelines
 

32. Um menino de 15 meses é trazido ao centro de saúde para consulta de vigilância e administração de
vacinação. A mãe diz «Ele parece saudável, mas não se comporta como os outros meninos». Refere que
geralmente reage com irritabilidade ou indiferença ao contacto físico e à estimulação afetiva, faz muitas
birras e acorda muitas vezes durante a noite. Ainda não verbaliza palavras e a mãe está preocupada com
a possibilidade de défice auditivo. O programa nacional de vacinação está atualizado. Ele tem 77 cm de
comprimento (percentil 25) e pesa 10 kg (percentil 25). Os sinais vitais são temperatura 37,1 °C,
frequência respiratória 24/min e frequência cardíaca 98/min. Ao exame físico apresenta ligeira hipotonia
e olhar vago. O exame audiológico não mostra alterações.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Atrasar a administração da vacina contra o sarampo, papeira e rubéola.


(B) Prescrever metilfenidato.
(C) Referenciar a consulta de pediatria do desenvolvimento.
(D) Referenciar para avaliação intelectual.
(E) Tranquilizar a mãe quanto ao desenvolvimento da criança (variante do normal).

Resposta correta: C

Comentário
A ausência de verbalização, a falta de interesse pelo outro com olhar vago, a
irritabilidade e indiferença à estimulação afetiva, e hipotonia constituem sinais de
alarme no que respeita ao desenvolvimento esperado para uma criança de 15 meses.
Perante multiplos sinais de alarme no respeitante ao desenvolvimento psico-motor,
deve-se sempre orientar a criança para uma consulta de desenvolvimento. As
alterações do desenvolvimento não constituem contra-indicação para a vacinação, o
metilfenidato está aconselhado em crianças com PHDA após estar estabelecido o
diagnóstico, a avaliação intelectual não é passível de realizar nesta faixa etária.

Referências bibliográficas

 La Paz, Pág. 2022, tabela 199-1. Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil,
quadro 2 “Sinais de Alarme: 1 – 12 M”
 

33. Um homem de 54 anos é trazido ao serviço de urgência em ambulância, quinze minutos depois de a sua
filha o ter encontrado inconsciente e sem responder a estímulos deitado no sofá de sua casa. O médico da
equipa de emergência extra-hospitalar reporta que a glicemia no local era de 21 mg/dL, que melhorou
após administração de dextrose a 30 % endovenosa. A filha diz que a última vez que viu o pai foi há dois
dias, e nessa altura referia estar com uma gastrenterite com náuseas, vómitos e diarreia. A história médica
revela diabetes mellitus tipo 2, hipertensão arterial e hipertrofia benigna da próstata. A medicação habitual
inclui glibenclamida, metformina e lisinopril. Bebe quatro copos de vinho por dia e fuma um cigarro
diariamente. Ele tem 172 cm de altura e pesa 80 kg; IMC 27 kg/m². Os sinais vitais são temperatura
37,7°C, frequência respiratória 20/min, frequência cardíaca 122/min e pressão arterial 94/60 mm Hg;
SpO2 96 % (ar ambiente). O doente aparenta estar clinicamente mal. Está letárgico, move todos os
membros espontaneamente. As pupilas medem 3 mm de diâmetro e são reativas à luz e à acomodação.
As mucosas estão secas e a pele está fria e húmida. A auscultação pulmonar encontra-se dentro dos
parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelaram:

Soro: Creatinina 5,2 mg/dL; Azoto ureico 98 mg/dL; Glucose 27 mg/dL; Sódio 130 mEq/L; Potássio 5,6
mEq/L; Cloro 99 mEq/L; Bicarbonato 17 mEq/L.

Qual das seguintes alternativas é a explicação mais provável para o quadro clínico descrito?

(A) Aumento do metabolismo da glicose, em contexto de sépsis.


(B) Depleção dos depósitos de glicogénio hepático, induzida pelo álcool.
(C) Diminuição da depuração do secretagogo da insulina.
(D) Inibição da gluconeogénese hepática, induzida por medicamentos.
(E) Secreção descontrolada da insulina, devido a tumor endócrino.

Resposta correta: C

Comentário
Trata-se de um doente com clínica de gastrenterite aguda e com um estudo analítico
que indica uma lesão renal aguda importante, compatível com provável desidratação
induzida pelo quadro infecioso. É encontrado em coma e verifica-se uma hipoglicemia
(cumpre Tríade de Whipple), sendo um diabético medicado com um fármaco
potencialmente indutor de hipoglicemias – glibenclamida (classe: sulfonilureias). O
mais provável é que com o prejuízo agudo da função renal, a clearance renal da
glibenclamida tenha ficado compromotida, o que aumentou o tempo em circulação
deste fármaco, potenciando a hipoglicemia – resposta C correta. Geralmente, nos
quadros séticos infeciosos ocorre hiperglicemia de stress e não hipoglicemia (opção A
incorreta); apesar de o doente ter hábitos etílicos moderados não parece haver contexto
para aumento recente da ingestão ou binge drinking, que justificariam a hipoglicemia
(opção B incorreta); a inibição da gluconeogénese hepática é induzida pela metformina
mas este fármaco não se associa a hipoglicemias (opção D incorreta); não existe
contexto de episódios recorrentes de hipoglicemias ou de ganho ponderal, que nos
façam pensar em insulinoma (opção E incorreta).
 

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª Edição: capítulo 397, página 2866


 

34. Um homem de 64 anos, construtor civil, vem à consulta por artralgias dos joelhos, mais intensas à direita,
de evolução progressiva nos últimos três meses. Refere ainda claudicação da marcha e incapacidade para
desempenhar a sua atividade laboral. A história médica revela neoplasia gástrica há 10 anos, tratada com
resseção gástrica. Ele não faz medicação e nega consumo de tabaco. Tem hábitos etílicos marcados (80
g/dia). Os sinais vitais são temperatura 36°C, frequência respiratória 14/min, frequência cardíaca 73/min
e pressão arterial 138/72 mm Hg. Ao exame físico apresenta dor de intensidade 6/10 na mobilização
ântero-posterior do joelho direito e 4/10 no joelho esquerdo. O restante exame físico e resultados dos
estudos analíticos encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade. O raio-X dos joelhos mostra
diminuição da interlinha interarticular, afilamento da camada perióstica, esclerose subcondral e
osteofitose da superfície articular, bilateralmente.

Qual das seguintes alternativas é a explicação mais provável para as alterações radiológicas?

(A) Artrite reativa.


(B) Condromalácia.
(C) Lesões metastáticas.
(D) Osteoartrose.
(E) Osteoporose.

Resposta correta: D

Comentário
Este doente parece apresentar uma gonartrose uma vez que apresenta dor articular de
instalação lenta e progressiva, ao longo de anos/meses (3 meses no caso), com
claudicação e incapacidade funcional que agrava com a mobilização. Além disso, não
apresenta sintomas sistémicos, não apresenta sinais inflamatórios exuberantes, e tem
um estudo analítico normal (os parâmetros inflamatórios de fase aguda são
habitualmente normais na osteoartrose). A pergunta não deixa dúvidas porque o raio-
x é muito sugestivo de gonartrose, com sinais característicos como a diminuição da
interlinha articular (perda do espaço articular), esclerose subcondral, osteofitose da
superficie articular (osteofitos - projeções ósseas nos topos articulares).
 

Referências bibliográficas

 Harrison capítulo 364 pag 2628 “The pathologic sine qua non of disease is hyaline
articular cartilage loss, present in a focal and, initially, nonuniform manner. This is
accompanied by increasing thickness and sclerosis of the subchondral bony plate,
by outgrowth of osteophytes at the joint margin, by stretching of the articular
capsule, by variable degrees of synovitis, and by weakness of muscles bridging the
joint. In knees, meniscal degeneration is part of the disease… OA is the most common
cause of chronic knee pain in persons aged >45 .”
 Cecil capítulo 83 pag 807 “The characteristic radiographic features of osteoarthritis
include joint space narrowing as a surrogate for cartilage loss; osteophytes and
subchondral sclerosis as an indicator of new bone formation, which is characteristic
of osteoarthritis; and sub- chondral cysts as a manifestation of myxoid or fibrous
degeneration of subchondral bone. Bone attrition and subchondral bone remodeling
may result in changes in bone shape. “
 

35. Um homem de 72 anos é admitido no hospital por dor localizada na base do pulmão esquerdo,
desencadeada com a inspiração, com agravamento progressivo desde há quatro dias. Classifica a dor com
intensidade 9/10, não controlada com a toma de paracetamol + tramadol, iniciada há 48 horas. Há seis
semanas, o doente teve dor na mesma localização, secundária a quadro identificado como pleurisia da
base esquerda. Na altura, a dor melhorou com a toma de anti-inflamatório não esteroide. A radiografia do
tórax então realizada não revelou alterações. Os sinais vitais são temperatura 37,8°C, frequência
respiratória 18/min, frequência cardíaca 110/min e pressão arterial 160/94 mm Hg; SpO2 88 % (ar
ambiente); IMC 26 kg/m². Ao exame físico o doente apresenta-se com o tronco fletido pela dor. Apresenta
macicez à percussão na base do hemitórax esquerdo e atrito no andar médio do pulmão esquerdo. A
auscultação cardíaca encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Sangue: Leucócitos 9 200/mm³; Neutrófilos, segmentados 58 %; Basófilos 1 %; Linfócitos 35 %;


Monócitos 6 %.

O raio-X do tórax obtido na admissão mostra a presença de líquido livre, ocupando o terço inferior do
campo pulmonar esquerdo.

Qual dos seguintes é o exame de diagnóstico mais adequado?

(A) Broncoscopia.
(B) Doseamento do antigénio carcinoembrionário.
(C) Ecocardiograma.
(D) TC do tórax.
(E) Toracocentese.

Resposta correta: E

Comentário
O caso clínico é sugestivo de um derrame pleural (em contexto mais provável de
tuberculose - predomínio de linfócitos, pleurisia), o que justifica a toracocentese como
abordagem diagnóstica mais adequada, de modo a distinguir entre transudado e
exsudado, numa primeira instância. A dor, tipicamente unilateral, tem características
pleuríticas. Algumas vezes, o derrame justifica mesmo o desenvolvimento de
insuficiência respiratória. A macicez à percussão e a presença de líquido livre no terço
inferior do campo pulmonar (esquerdo) são altamente sugestivos de derrame pleural.
A toracocentese é indispensável na distinção entre transudado e exsudado, a qual tem
impacto na abordagem do derrame.
 

Referências bibliográficas

 Cecil, 26ªed, Cap 92 “Diseases of the diaphragm, chest wall, pleura and
mediastinum”, pg 607, “Patients with pleural effusions may be asymptomatic,
experience dyspnea, or have pleuritic chest pain that is generally unilateral and
sharp. At times, effusions may be sufficiently large to contribute to respiratory
failure. Physical findings include dullness to percussion in the area of the effusion,
along with diminished breath sounds and absent tactile fremitus.”
 Harrison, 20ª ed, Cap 288 “Disorders of the Pleura”, pg 2006, “The first step is to
determine whether the effusion is a transudate or an exudate. (…) Transudative and
exudative pleural effusions are distinguished by measuring the lactate
dehydrogenase (LDH) and protein levels in the pleural fluid.”
 

36. Um homem de 54 anos vem ao consultório médico por dor na deglutição e tosse produtiva com
expetoração mucopurulenta de início súbito, com um dia de evolução. A dor acordou-o durante o sono.
A história médica revela infeção VIH e hepatite C crónica e a medicação habitual inclui antirretroviral e
bupropiom. Os sinais vitais são temperatura 38,3°C, frequência respiratória 15/min, frequência cardíaca
92/min e pressão arterial 122/78 mm Hg. Ao exame físico apresenta-se com ar cansado. A orofaringe está
ligeiramente hiperemiada e sem exsudados. A auscultação pulmonar revela crepitações no terço inferior
do campo pulmonar posterior à direita.

Qual das seguintes alternativas melhor fundamentaria o uso de antibiótico neste doente?

(A) Exame de urina com 1-2 bactérias e 15 células escamosas por campo.
(B) Leucocitose com 50 % de linfócitos.
(C) Leucocitose com 65 % de neutrófilos segmentados e 5 % de neutrófilos em banda.
(D) Raio-X do tórax com infiltrado pulmonar.
(E) Teste de monospot positivo.

Resposta correta: D

Comentário
Considerando que o doente tem sinais sugestivos de pneumonia (tosse produtiva, febre
e crepitações no terço inferior do campo pulmonar posterior à direita) e o diagnóstico
de uma pneumonia deve-se basear na clínica e Raio-X; um Raio-X com infiltração
pulmonar justificaria iniciar antibiótico. O exame sumário de urina não tem alterações.
A existência de leucocitose com linfocitose e/ou neutrofilia não é indicativa por si só de
infeção, podendo estar associada a infeções autoimunes e neoplasias pelo que não deve
ser usada como critério único para início de antibioterapia. Teste de monospot
(anticorpos heterófilos - Paul-Bunnell) é utilizado para o diagnóstico de mononucleose
por EBV.

Referências bibliográficas

 Harrison: capítulo 121, pág 911: secção diagnóstico. Capítulo 60, pág 399 – tabela
60-2.
 

37. Uma mulher de 36 anos, de origem asiática, vem ao consultório médico por cefaleia intensa associada a
náusea e vómitos nos últimos três dias. Ela notou também uma erupção cutânea ligeira no tronco e
membros superiores. Não tem antecedentes médicos de relevo. É doméstica e não viajou recentemente.
Os sinais vitais são temperatura 39,6 , frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca 88/min e
pressão arterial 100/66 mm Hg. Ao exame físico aparenta estar moderadamente desconfortável. Está com
cefaleia intensa e náusea intratável. Está vígil, orientada no tempo e espaço. A observação da pele revela
uma erupção maculopapular não pruriginosa do tronco e raízes dos membros. O exame ocular revela
fotofobia moderada e fundoscopia normal. Não tem rigidez da nuca. O restante exame físico, incluindo
neurológico, encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos são:

Sangue: Hemoglobina 11,4 g/dL; Leucócitos 8 400/mm³; Linfócitos 55%; Plaquetas 141 x 10^9/L.

O exame da urina é normal e o teste de gravidez é negativo.

Qual das seguintes alternativas é a mais provável de encontrar na TC do crânio?

(A) Desvio das estruturas da linha média para a direita.


(B) Hidrocefalia.
(C) Sangue no espaço subaracnoide.
(D) Ventrículos em fenda.
(E) Nenhuma alteração.

Resposta correta: E

Comentário
Estamos perante uma doente com quadro compatível com meningite (cefaleia intensa,
náuseas, vómitos, fotofobia, febre e erupção cutânea maculopapular não pruriginosa no
tronco e raízes dos membros). As meningites não cursam habitualmente com
alterações imagiológicas, pelo que a resposta é nenhuma alteração seria encontrada
na TC de crânio.

Referências bibliográficas

 Harrison capítulo 133 (pág 1001): MRI abnormalities (other than meningeal
enhancement) are not seen in uncomplicated bacterial meningitis. MRI is preferred
over CT because of its superiority in demonstrating areas of cerebral edema and
ischemia. In patients with bacterial meningitis, diffuse meningeal enhancement is
often seen after the administration of gadolinium. Meningeal enhancement is not
diagnostic of meningitis but occurs in any CNS disease associated with increased
blood-brain barrier permeability
 

38. Um homem de 52 anos, serralheiro, vem a consulta de oncologia para seguimento de carcinoma
epidermoide da laringe, tratado radicalmente com quimiorradioterapia há dois anos. Nega queixas de
novo. A história médica revela doença pulmonar obstrutiva crónica, não medicada. É fumador de 60
UMA. Ele tem 174 cm de altura e pesa 72 kg; IMC 24 kg/m². Apresenta bom estado geral. O restante
exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes é a medida mais adequada no contexto de prevenção secundária?

(A) Autopalpação cervical.


(B) Cessação tabágica.
(C) Consumo de dieta equilibrada.
(D) Prática regular de exercício físico.
(E) Vacina contra o papilomavírus humano.

Resposta correta: B

Comentário
O carcinoma epidermoide (pavimento-celular) do trato aero-digestivo superior, em que
se inclui o carcinoma epidermóide da laringe, tem como principal fator de risco o
tabagismo. São também fatores de risco o álcool e condições sociais precárias.
Atendendo à elevada carga tabágica deste doente (60 UMA), o tabaco será o principal
agente etiológico da sua neoplasia. Se perpetuar o consumo de tabaco estará a
contribuir para a carcinogénese de campo, pelo que a cessação tabágica será a medida
mais importante a ser tomada como prevenção secundária, em comparação com
autopalpação cervical, dieta equilibrada e prática regular de exercício físico. O HPV
(papilomavírus humano) é também um importante agente carcinogénico nos tumores
da orofaringe (não da laringe), pelo que a vacinação contra o HPV não seria uma medida
adequada, nem está recomendada como prevenção secundária destes tumores.

Referências bibliográficas

 HPIM 20th – página 533


 

39. Um homem de 64 anos vem ao serviço de urgência após notar, desde há uma hora, fraqueza do braço
esquerdo e dificuldade em falar. A história médica revela hipertensão arterial. Os sinais vitais são
temperatura 37°C, frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca 80/min e pressão arterial 180/70
mm Hg. Ao exame físico o doente está acordado e alerta, mas o discurso é arrastado. Ao exame
neurológico apresenta força muscular grau 2/5 no membro superior esquerdo e 5/5 nos restantes membros.
O exame de sensibilidade não mostra alterações. O restante exame físico encontra-se dentro dos
parâmetros de normalidade. Ele não tem sangue oculto nas fezes. A TC do crânio realizada de imediato
não mostra alterações.

Qual das seguintes alternativas é o tratamento inicial mais adequado?

(A) Alteplase.
(B) Aspirina.
(C) Heparina de baixo peso molecular.
(D) Heparina não fracionada.
(E) Varfarina.

Resposta correta: A

Comentário
Doente com história de hipertensão arterial que recorre por quadro de défice
neurológico brusco, consistente em paresia braquial e disatria. TC de crânio sem
achados. Indicam que não tem sangue oculto nas fezes para eliminar possíveis
contraindicações do tratamento fibrinolítico. Estando dentro da janela terapéutica de
<4.5h de evolução, e depois de afastar hemorragia na TC, devemos indicar tratamento
com fibrinolise endovenosa (alteplase).
 

40. Um homem de 67 anos vem ao consultório médico por dispneia progressiva com dois dias de evolução e
tosse não produtiva com agravamento desde há cinco dias. Ele diz que teve de dormir com a cabeceira
elevada na última noite, por causa destes sintomas. A história médica revela hipertensão arterial tratada
com bisoprolol. Fuma 20 cigarros por dia desde há 45 anos e bebe seis caixas de cerveja semanalmente.
Os sinais vitais são temperatura 38,1°C, frequência respiratória 24/min, frequência cardíaca 110/min e
pressão arterial 92/56 mm Hg; SpO2 86 % (ar ambiente). Ele tem 169 cm de altura e pesa 86 kg; IMC 30
kg/m². A auscultação cardíaca mostra taquicardia e sons apagados, sem murmúrio apreciável, e a
auscultação pulmonar revela roncos e crepitações bilaterais. O raio-X do tórax revela infiltrado pulmonar
bilateral e alargamento da silhueta cardíaca. O ecocardiograma revela fração de ejeção de 0,30.

Qual das seguintes alternativas mais provavelmente reduz o risco de mortalidade a longo prazo?

(A) Aspirina.
(B) Digoxina.
(C) Furosemida.
(D) Lisinopril.
(E) Nitroglicerina.

Resposta correta: D

Comentário
Trata-se de um doente com IC com Fração de Ejeção reduzida (30%), possivelmente
descompensada em contexto de infeção. O facto de nos questionarem sobre a redução
do “risco de mortalidade a longo prazo” remete-nos para as terapêuticas modificadoras
de prognóstico com impacto na mortalidade a longo prazo destes doentes que, de
acordo com as guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia, incluem os Beta-
Bloqueantes, os IECA/ARA/ARNI, e os Antagonistas dos receptores dos
Mineralocorticóides. Deste modo, o Lisinopril é a única resposta correta. A digoxina,
apesar de poder reduzir a taxa de rehospitalização, não mostrou ter impacto na
mortalidade. Os diuréticos (Furosemida) contribuem para o alívio sintomático, o
aumento da capacidade funcional e podem reduzir o risco de hospitalização, mas não
têm impacto na mortalidade. Os vasodilatadores (Nitroglicerina) têm um impacto
limitado ao controlo de sintomas . Por fim, não existe qualquer evidência de benefício
de anti-agregantes plaquetares (Aspirina) em doentes com ICFEr sem evidência de
doença arterial coronária.

Referências bibliográficas

 Guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia “Diagnóstico e Tratamento da


Insuficiência Cardíaca Aguda e Crónica (2016)” - página 2149, figura 7.1: “Algoritmo
terapêutico para um paciente com ICFEr sintomática”; página 2151, tabela: “Outros
tratamentos farmacológicos recomendados em pacientes selecionados com ICFEr
sintomática”.
 

41. Um homem de 60 anos, gestor de empresas, recorre a consulta de medicina geral e familiar para
reavaliação de queixas de ejaculação precoce, que apresenta desde há dois anos. O doente tem
antecedentes de diabetes mellitus tipo 2, controlada com medidas dietéticas, e toma aspirina diariamente.
Na consulta anterior, o doente tinha sido referenciado para consulta de psicologia, para terapia
comportamental. No entanto, ele está desiludido com os resultados deste tratamento, pelo facto de ser
necessária a participação da sua parceira sexual. Desde o divórcio, há dois anos, o doente tem mantido
atividade sexual com várias mulheres e gostaria de saber se há alguma medicação que o poderá ajudar
com os seus problemas sexuais. Os sinais vitais e exame físico encontram-se dentro dos parâmetros de
normalidade. A glicemia capilar é 128 mg/dL.

Qual das seguintes alternativas é o tratamento mais adequado para este doente?

(A) Alprostadil.
(B) Sertralina.
(C) Sildenafil.
(D) Tansulosina.
(E) Testosterona.

Resposta correta: B

Comentário
O caso clínico é sobre uma disfunção sexual, nomeadamente a ejaculação prematura
ou precoce, nomeadamente o seu tratamento. O tratamento varia consoante se
identifique uma causa subjacente (tratar a causa de base) ou não. Nest último caso,
pode-se optar por uma conjugação de terapia comportamental e farmacoterapia. De
entre os fármacos utilizados inclui-se: a Dapoxetina (inibidor do transportador de
serotonina), Lidocaina ou Prilocaina spray (anestésicos locais), Sertralina ou Paroxetina
(inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS). Acredita-se que a ação destes
fármacos se relacione com a fisiopatologia de base da doença, onde há uma disfunção
serotoninérgica. Deste modo, a resposta correta seria Sertralina. Convém também
recordar, que um dos principais efeitos adversos dos ISRS é precisamente a disfunção
sexual, nomeadamente anorgasmia, sendo efeitos utilizados a favor do doente na
ejaculação precoce. O Alprostadil ou Prostaglandina E1 é usado no tratamento da
disfunção erétil. O Sildenafil é um inibidor da 5-fosfodiesterase também usado no
tratamento da disfunção erétil. A Tansulosina é um alfa-bloqueante utilizado, entre
outros, na hiperplasia benigna da próstata. A Testosterona pode ser administrada como
hormona exógena no tratamento do hipogonadismo.

Referências bibliográficas

 Guidelines da European Association of Urology 2020 sobre Sexual and Reprodutive


Health (fluxograma da página 71).
 Harrison’s Principles of Internal Medicine 20th Ed (versão inglesa) – Parte 12 –
Secção 2 “Medicina baseada no sexo e no género” – Capítulo 390 “Disfunção Sexual”
– Página 2862 - 3º parágrafo.
 

42. Uma mulher de 20 anos vem ao consultório médico por agravamento de perda ponderal (5 kg) nos últimos
meses. Menciona ainda diarreia frequente de fezes semipastosas, parecendo ter aumento da quantidade
de gordura. Não tem anorexia. Tem antecedentes de magreza (nunca pesou mais de 50 kg) e anemia, não
sabendo precisar o tipo. Os sinais vitais são temperatura 36,5°C, frequência cardíaca 78/min e pressão
arterial 122/52 mm Hg. Ela tem 157 cm de altura e pesa 44 kg; IMC 18 kg/m². Apresenta-se emagrecida.
O restante exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade. As endoscopias digestivas
alta e baixa não revelam alterações macroscópicas. A biópsia do intestino delgado mostra infiltrado
linfocitário e plasmocitário e zonas de achatamento das vilosidades.

Qual dos seguintes mecanismos melhor explica este quadro clínico?

(A) Colonização luminal infeciosa.


(B) Intolerância ao glúten.
(C) Isquemia intestinal.
(D) Perda de proteínas em excesso pelo intestino.
(E) Presença de Tropheryma whippelii nos macrófagos intestinais.

Resposta correta: B

Comentário
Trata-se de uma doente jovem (20 anos) que apresenta sintomas de perda de peso,
diarreia com fezes gordurosas, o que torna implícito a existência de insuficiência
pancreática. Apresenta ainda má evolução ponderal "tem antecedentes de magreza".
Na forma clássica da doença celíaca é frequente existirem sintomas e sinais de
síndrome de mal absorção como diarreia crónica e deficiência de micronutrientes (ex.:
ferro conduzindo a anemia ferropénica). Um terço sofre de insuficiência pancreática
aguda no diagnóstico. Esta condição tem origem na possível redução das hormonas
pancreáticas, como resultado da lesão da mucosa, levando a uma alteração na digestão
das gorduras. Por fim, a biopsia do duodeno é característica, apesar de não ser
patognomónica, mostra um padrão típico de enteropatia sensível ao glúten, onde são
visíveis um infiltrado linfoplasmocitário com zonas de achatamento das vilosidades-
atrofia vilositária.
 

Referências bibliográficas

 Cecil Essentials – Capítulo 33 Página 155 “The diagnosis of celiac disease is


confirmed by characteristic abnormalities seen on duodenal biopsies and improving
when a gluten-free diet is instituted” (….) Characteristic features found on intestinal
biopsy include blunted or absent villi, crypt hyperplasia, increased intraepithelial
lymphocytes, and infiltration of the lamina propria with plasma cells and
lymphocytes. In some individuals, the only abnormal biopsy finding is increased
intraepithelial lymphocytes.”
 Harrison– Capítulo 318 pagina 2253 “The diagnosis of celiac disease requires the
detection of characteristic histologic changes on small-intestinal biopsy together
with a prompt clinical and histologic response after the institution of a glutenfree
diet.”(…) The classic changes seen on duodenal/jejunal biopsy are restricted to the
mucosa and include (1) an increase in the number of intraepithelial lymphocytes; (2)
absence or a reduced height of villi, which causes a flat appearance with increased
crypt cell proliferation resulting in crypt hyperplasia and loss of villous structure,
with consequent villous, but not mucosal, atrophy.
 Rubio-Tapia A, Hill ID, Kelly CP, et al. ACG clinical guidelines: diagnosis and
management of celiac disease. Am J Gastroenterol 2013; 108:656.
 

43. Uma menina de 6 anos é trazida ao serviço de urgência por dor abdominal e vómitos incoercíveis com 24
horas de evolução. A mãe refere emagrecimento no último mês (cerca de 2 kg) e noção de polidipsia. A
história médica não revela antecedentes patológicos. Os sinais vitais são temperatura 36,8°C, frequência
respiratória 42/min, frequência cardíaca 102/min e pressão arterial 110/68 mm Hg; SpO2 99 % (ar
ambiente). Ao exame físico apresenta-se colaborante, mas lentificada, com ar doente, lábios secos e olhos
encovados. O abdómen é mole e depressível, não doloroso à palpação superficial ou profunda. O restante
exame físico, incluindo auscultação cardíaca e pulmonar, encontra-se dentro dos parâmetros de
normalidade. A glicemia capilar mostra a expressão «HIGH» e a cetonemia capilar é de 6 mmol/L (N <
1 mmol/L).

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Glicose 430 mg/dL; Sódio 129 mEq/L; Potássio 3,4 mEq/L; Cloro 108 mEq/L.

Gases (venoso): PCO2 28 mm Hg; pH 7,18; Bicarbonato 8 mEq/L; Anion gap 14.

Qual das seguintes alternativas é a opção terapêutica mais adequada neste momento?

(A) Bólus de bicarbonato de sódio 8,4 %.


(B) Bólus de NaCl 0,9 %.
(C) Bólus de NaCl 20 %.
(D) Insulina rápida subcutânea.
(E) Perfusão de NaCl 0,9 % para necessidades basais e défice.

Resposta correta: E

Comentário
Trata-se de um caso de provável diabetes inaugural numa criança, que se apresenta
em cetoacidose diabética (hiperglicemia + acidemia metabólica com aumento do anion
gap + hiperventilação compensatória + cetonemia alta). Nas crianças a primeira
abordagem deve ser instituir perfusão com NaCl a 0,9% segundo cálculo das
necessidades basais e do défice hídrico (resposta E correta), e, uma hora depois, iniciar
perfusão endovenosa de insulina (resposta D errada). A fluidoterapia é feita em
perfusão e não em bólus (respostas B e C erradas) e o bicarbonato só de administra se
pH venoso < 6,9 pelo risco de indução de hipocalémia (resposta A errada).

Referências bibliográficas

 Protocolo de Cetoacidose Diabética da Sociedade Portuguesa de Pediatria.


 

44. Um lactente de 10 meses vem ao centro de saúde para consulta de vigilância. Apresentou evolução
estatural e ponderal no percentil 85 até aos 6 meses, altura em que se verificou cruzamento descendente
de 2 percentis de peso e estatura. Do ponto de vista alimentar, esteve sob aleitamento materno exclusivo
até aos 5 meses, altura em que iniciou diversificação alimentar com papa sem glúten, papa de fruta e
fórmula de transição (em substituição do leite materno). Aos 6 meses iniciou papa com glúten e caldo de
legumes com carne e peixe. Aos 9 meses foi introduzido leite de vaca em natureza gordo, com vómitos
ocasionais desde então. Ele não tem antecedentes patológicos de relevo. Os antecedentes familiares
incluem asma (mãe). Ao exame físico apresenta boa vitalidade, mucosas hidratadas e pálidas. O
desenvolvimento psicomotor e restante exame físico, incluindo auscultação cardíaca e pulmonar,
encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Alergia às proteínas do leite de vaca.


(B) Doença celíaca.
(C) Fibrose quística.
(D) Infeção urinária.
(E) Refluxo gastroesofágico.

Resposta correta: B

Comentário
Na infância, a doença celíaca apresenta-se habitualmente na sua forma clássica. Assim,
a apresentação clínica com atraso estaturo-ponderal, associada a vómitos e palidez
(provavelmente por défice de ferro por má absorção), associada temporalmente à
introdução do glúten, pode ser justificada pela presença de doença celíaca. Um quadro
de APLV não condicionada atraso do desenvolvimento estatural, o atingimento do
desenvolvimento ponderal seria de esperar num quadro exuberante além de que seria
expectável que o aparecimento dos sintomas fosse mais precoce. Relativamente à
fibrose quística, seria de esperar que se acompanhasse de infeções de repetição.

Referências bibliográficas

 La Paz, pág. 1070 e tabela 110.1-3 (pág. 1071).


 

45. Uma mulher de 37 anos vem ao consultório médico por dificuldade progressiva em caminhar, dormência
nos membros inferiores e incontinência urinária desde há duas semanas. Refere ter sido saudável até
então, mas lembra-se de um episódio de visão turva do olho esquerdo há três anos, que durou
aproximadamente uma semana. Reporta também um episódio de dormência da face, um ano antes, que
durou vários dias. Ela não faz medicação habitual. Os sinais vitais encontram-se dentro dos parâmetros
de normalidade. A acuidade visual, com lentes de correção, é de 20/20 no olho direito e 20/100 no olho
esquerdo. A fundoscopia do olho esquerdo mostra disco óptico pálido e defeito aferente papilar. O tónus
muscular nos membros inferiores está aumentado. A força muscular é de 4/5 nos membros inferiores,
bilateralmente, e os reflexos osteotendinosos profundos 2+ nos membros superiores e 3+ nos membros
inferiores. O sinal de Babinsky está presente bilateralmente. A marcha é rígida e de base alargada. A
sensibilidade dolorosa e vibratória está diminuída abaixo do nível T6.

Qual das seguintes alternativas é a mais adequada para confirmar o diagnóstico etiológico?

(A) Potenciais evocados auditivos do tronco cerebral.


(B) Potenciais evocados visuais.
(C) Punção lombar para exame de líquido cefalorraquidiano.
(D) RM cerebral.
(E) Teste de medição dos campos visuais.

Resposta correta: D

Comentário
Mulher jovem com história de dois episódios prévios de défice neurológico focal com
vários dias de duração. O primeiro, visão turva, é sugestivo de neurite ótica devido aos
achados atuais no exame (disco ótico pálido e defeito aferente pupilar). O segundo,
dormência em face, poderia corresponder-se a afetação do núcleo do trigémio no
tronco-encéfalo. Recorre agora por novo episódio de défice neurológico, com
dificuldade em caminhar, sinais de atingimento de primeiro neurónio motor
(espasticidade e Babinski), atingimento sensitiva abaixo de T6 e distúrbio de esfíncteres,
o que sugere afetação medular. Surtos de défice neurológico em diferentes topografias
numa mulher jovem sugerem uma esclerose múltipla. Para confirmar o diagnóstico
devemos demostrar disseminação em espaço e tempo, ou disseminação em espaço
mais bandas oligoclonais positivas no liquor. Se podemos escolher unicamente uma
das provas propostas, a única que permitiria levar-nos sozinha ao diagnóstico é a RMN
cerebral. Devemos lembrar que no estudo de uma doente com suspeita de esclerose
múltipla está sempre indicado realizar também RMN de coluna cervical. Neste caso,
incluiríamos também uma ressonância de coluna dorsal, pois o surto atual parece
afetar a medula dorsal.

Referências bibliográficas

 Harrison, página 3191; Consensus Recommendations for the Diagnosis and


Treatment of Multiple Sclerosis: 2019 revisions to The MENACTRIMS Guidelines.
 

46. Um lactente de 3 meses é referenciado à consulta de nefrologia pediátrica por apresentar diagnóstico pré-
natal de dilatação pielocalicial esquerda e estudo cistouretrográfico com refluxo vesico-ureteral estadio
III à esquerda (passivo). A história médica revela episódio de infeção urinária febril aos 2 meses (por
Escherichia coli), tratado com cefotaxima, com boa resposta clínica. O exame físico encontra-se dentro
dos parâmetros de normalidade.

Na próxima reavaliação clínica, daqui a seis meses, qual dos seguintes é o exame de diagnóstico mais
adequado?

(A) Cintigrafia renal com DMSA.


(B) Cistoureterografia miccional retrógrada.
(C) Doseamento de microalbuminúria.
(D) Doseamento sérico de ureia e creatinina.
(E) Ecografia renal.

Resposta correta: E

Comentário
No caso de um lactente com 3 meses como o apresentado com hidronefrose
diagnosticada no período pré-natal com RVU grau III, deve manter-se avaliação seriada
com ecografia renal para avaliar o desenvolvimento renal até aos 2 anos de idade. A
repetição da CUMS está aconselhada apenas se presença de cicatrizes renais, apenas
a cada 3 anos. A realização de DMSA apenas se ITU atípica, recorrente ou alterações no
exame de imagem

Referências bibliográficas

 La Paz, pág. 1736 e 1737.


 

47. Uma mulher de 65 anos vem ao serviço de urgência por cansaço e disestesia dos membros inferiores, com
intensidade crescente nas últimas cinco semanas. A família refere alterações recentes de comportamento
com agitação e confusão noturna. A história médica revela pirose que cede a pantoprazol (SOS). Nega
hábitos alcoólicos ou consumo de tabaco. Os sinais vitais são temperatura 36,2°C, frequência respiratória
15/min, frequência cardíaca 108/min e pressão arterial 128/68 mm Hg. Ao exame físico apresenta
mucosas descoradas, língua despapilada e eritematosa. O exame neurológico mostra redução da
sensibilidade propriocetiva e vibratória bilateral e distal nos membros inferiores.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 1,1 mg/dL; Sódio 131 mEq/L; Potássio 3,9 mEq/L; TSH 2,5 microU/mL; Folato 20
mmol/L [N = 11-82 mmol/L]; Vitamina B12 220 ng/mL [N = 211-911 ng/mL].

Sangue: Hemoglobina 7,2 g/dL; VGM 125 fL.

Com base nestes achados, a condição deste doente é mais provavelmente atribuível a uma alteração de
qual dos seguintes parâmetros?

(A) Ácido metilmalónico.


(B) Ácido úrico.
(C) Bilirrubina total.
(D) Homocisteína.
(E) LDH.

Resposta correta: A

Comentário
O quadro apresentado é concordante com uma síndrome de Lichtheim, decorrente das
alterações neurológicas marcadas pelo défice de B12 e caracterizadas pela
degenerescência combinada subaguda dos cordões postero-laterais da medula espinal.
*Em boa verdade, o metabolismo da vitamina B12 depende do seu carrier, a
transcobalamina, sendo que a isoforma transcobalamina II (sintetizada nos
macrófagos, endotélio e íleo) apresenta uma afinidade adequada favorecendo a sua
entrada nos tecidos, enquanto a transcobalamina I, por exemplo, se liga com maior
afinidade à B12 e dificulta a sua entrega aos tecidos. Algumas situações patológicas
(neoplasias mieloproliferativas, entre outros...) podem aumentar os níveis circulantes
das isoformas com maior afinidade para a cianocobalamina e assim sobrestimar pelo
seu doseamento sérico e subestimar o seu aporte aos tecidos. Ainda que no enunciado
a vitamina B12 se encontre dentro dos valores de referência, está próximo do limite
inferior da normalidade (potencial défice funcional), e enquadrando semiologicamente,
na presença de sintomatologia neuropsiquiátrica + anemia macrocítica + língua
despapilada e eritematosa, havia que duvidar da presença de défice funcional. Outros
parâmetros bioquímicos podem ser usados para estimar com maior grau de certeza o
défice de B12, visto que a mesma é co-factor em variadas reacções enzimáticas (a
elevação do ácido metilmalónico é um deles – por contraponto à homocisteína que
também se encontra aumentada no défice de folato). A acumulação de ácido
metilmalónico associado ao défice de B12 (que é co-factor da metil-malonil CoA mútase)
é fisiopatologicamente responsável por parte das manifestações neurológicas do
 

défice. Após catabolismo de alguns ácidos gordos e aminoácidos de cadeia ramificada,


gera-se ácido metil-malónico que sob a acção da metilmalonil CoA-mútase mitocondrial
(que tem a B12 como co-factor) origina succinil CoA que em condições fisiológicas
prosseguiria para o ciclo de Krebs gerando ATP. No défice de B12 a reacção torna-se
limitada e ocorre acumulo a montante de ácido metilmalónico.

Referências bibliográficas

 L Goldman, DA Ausiello, AI Schafer. Goldman-Cecil Medicine, 26th edition. 2019.


Elsevier; Capítulo 164.
 Kasper DL, Fauci AS, Hauser S, et al, editors. Harrison’s principles of internal
medicine, 19th ed. New York: The McGraw-Hill Companies, Inc.; Capítulo 128.
 

48. Uma mulher de 29 anos vem ao consultório médico por estar preocupada com a possibilidade de vir a
sofrer de incontinência urinária. Os antecedentes obstétricos incluem uma gestação complicada por
diabetes gestacional (controlada com dieta) e um parto vaginal a termo auxiliado por forceps há quatro
meses, complicado por laceração perineal do 3.º grau com infeção e retenção urinária durante três dias e
que resolveu com as medidas habituais. Neste momento está a amamentar o filho e faz contraceção com
implante subcutâneo. Ela tem episódios esporádicos de rinite alérgica e refere obstipação desde o parto,
com fezes muito duras. Pratica natação duas vezes por semana. A sua mãe, de 55 anos, foi recentemente
submetida a cirurgia de correção de incontinência urinária. Ela mede 163 cm e pesa 56 kg; IMC 21 kg/m².
Os sinais vitais e exame físico encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes medidas é a mais adequada para reduzir o risco de incontinência urinária de esforço
nesta doente?

(A) Alterar a modalidade desportiva.


(B) Alterar o método contracetivo.
(C) Correção da obstipação.
(D) Instituir dieta hipocalórica.
(E) Suspender a amamentação,

Resposta correta: C

Comentário
Têm sido descritos alguns fatores de risco para a ocorrência de incontinência urinária,
como por exemplo: a idade, a obesidade, a paridade, a pós-menopausa, o tipo de parto
e a presença de comorbilidades associadas a aumento da pressão intra-abdominal
nomeadamente a tosse crónica e a obstipação crónica, entre outros. Inúmeros estudos
têm relatado a existência de uma associação forte entre obstipação e o
desenvolvimento de incontinência urinária. Apesar de não estar provado que a correção
da obstipação possa melhorar as queixas de incontinência urinária está recomendado
o uso de medidas dietéticas, comportamentais e/ou farmacológicas para a correção de
obstipação em adultos com queixas de IU. (A) Atividades de grande impacto como
correr ou saltar têm sido implicadas na incontinência urinária de esforço. Pelo
contrário, alguns estudos sugerem que exercício de baixo impacto (por exemplo a
natação) possa ser protetor relativamente à incontinência urinária, pelo que a alteração
na modalidade desportiva não está aconselhada. (D) A obesidade é um dos principais
fatores de risco associado a incontinência urinária. A redução ponderal tem sido
associada a melhoria e resolução da incontinência urinária pelo que deve ser
recomendado a mulheres com excesso de peso e obesidade. No caso previamente
descrito estamos perante uma mulher com IMC normal, de 21 Kg/m2 pelo que não está
recomendado redução ponderal inicial. (B) e (E) A amamentação e o uso de contraceção
reversível de longa duração como o implante não são fatores de risco para incontinência
urinária, pelo que a sua suspensão para prevenção da mesma não está aconselhada.
 

Referências bibliográficas

 Consenso Nacional Uroginecologia de 2018 - páginas 8 e 36.


 European Association of Urology – Guidelines on Urinary Incontinence: “There is a
consistent association between a history of constipation and the development of UI
and POP.” “Adults with UI who also suffer from constipation should be given advice
about bowel management in line with good medical practice”.
 

49. Uma mulher de 28 anos vem ao consultório médico por múltiplas vesículas na vulva. Refere febre, dores
musculares e ardor ao urinar nos últimos dois dias. Menciona ainda ter tido a sua primeira relação sexual
há quatro semanas. A medicação habitual inclui anticoncecional oral. A temperatura atual é 38,2°C.

Qual das seguintes alternativas é a alteração mais provável de se encontrar no exame físico?

(A) Corrimento cervical mucopurulento.


(B) Dor no ângulo costovertebral.
(C) Lesões papulares vermelhas das mãos.
(D) Linfadenopatias inguinais.
(E) Úlceras da boca.

Resposta correta: D

Comentário
As vesículas vulvares podem ser de etiologia infeciosa ou não infeciosa. As mais
comuns são as infeciosas e dentro destas a causa mais comum é o herpes genital. Este
manifesta-se predominantemente sob a forma de múltiplas úlceras bilaterais
dolorosas. A infeção primária é na maioria das vezes mais exuberante que as
recorrências e pode manifestar-se também sob a forma de sintomas sistémicos
nomeadamente: febre, mialgias, cefaleias, disúria e linfadenectomia inguinal dolorosa.
As queixas descritas no caso clínico são sugestivas de infeção primária a herpes genital
pelo que seria provável a presença de linfadenopatias inguinais (alínea D). (A) Apesar
da presença de febre, não é descrita a presença de dor pélvica, hemorragia uterina
anormal e/ou de dispareunia pelo que o quadro descrito não é compatível com uma
doença inflamatória pélvica, pelo que a presença de corrimento cervical mucopurulento
não seria um provável achado no exame objetivo da paciente descrita. (B) Apesar da
presença de febre e de queixas urinárias a presença de múltiplas vesículas vulvares
não é compatível com um quadro de pielonefrite, pelo que a presença de dor no ângulo
costovertebral não seria um achado provável no exame objetivo da paciente descrita. A
suspeita de herpes genital explica toda a sintomatologia enunciada incluindo febre e
queixas urinárias. (C) As principais causas de úlceras vulvares são infeciosas e dentro
destas o herpes genital e a sífilis são as causas mais comuns. A úlcera vulvar da sífilis
primária é habitualmente uma úlcera única e não dolorosa, passando muitas vezes
despercebida, pelo que o quadro descrito não é sugestivo de infeção por sífilis, pelo que
a presença de lesões papular vermelhas das mãos não seria um provável achado no
exame objetivo da paciente descrita. (E) A doença Behçet é caracterizada pela presença
de úlceras orais recorrentes e manifestações sistémicas como a presença de úlceras
genitais e oculares, entre outros sintomas. O quadro previamente descrito é mais
sugestivo de infeção por herpes genital pelo que a presença de úlceras orais não seria
um provável achado no exame objetivo da paciente descrita.
 

Referências bibliográficas

 Consensos Vulvovaginites 2012 – Sociedade Portuguesa de Ginecologia. Capítulo 2


Úlceras vulvares páginas 28, 31 e 36
 Obstetrics and Gynecology 7th edition Beckmann. Chapter 29 – Sexually transmitted
infections. Genital Herpes; Uptodate, consulta a 30 de novembro de 2020:
Epidemiology, clinical manifestations, and diagnosis of genital herpes simplex virus
infection: Clinical features of primary infection e Approach to the patient with genital
ulcers. “The number of lesions as well as their appearance may suggest one
diagnosis over the other. As an example, infection due to HSV or H. ducreyi
(chancroid) typically presents as multiple ulcers, whereas syphilis usually presents
as a single lesion” “The syphilitic chancre is classically a single, indurated, well-
circumscribed painless ulcer” “Inguinal lymphadenopathy is commonly seen in
patients with infectious causes of genital ulcers.”
 

50. Um lactente de 8 meses é trazido pela equipa de emergência pré-hospitalar após episódio de «paragem
respiratória» enquanto estava em casa. À chegada da equipa de emergência pré-hospitalar, o lactente
encontra-se alerta e a chorar. Segundo a mãe «Ele estava na cama sossegado. Peguei nele para lhe dar de
comer. Ele escorregou-me do colo e caiu, embatendo com a face no solo. Inicialmente não chorou e parou
de respirar. Havia sangue a sair da boca. Levei-o para o quarto de banho e lavei-lhe a cara, mas como
continuava sem respirar, chamei o 112». A criança tem história de herniorrafia bilateral aos 4 meses e
equimoses fáceis frequentes. Durante a observação, a criança aparenta estar letárgica e vomita,
apresentando área purpúrica na fronte e região parietal direita.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Crise convulsiva.


(B) Doença de von Willebrand.
(C) Hematoma subdural.
(D) Hemofilia B.
(E) Púrpura trombocitopénica idiopática.

Resposta correta: C

Comentário
O caso clínico mostra uma criança que sofreu um acidente resultante de uma queda do
colo da mãe, o que levou à ocorrência de um traumatismo cranioencefálico (TCE). O TCE
é definido como a lesão física ou deterioração funcional das estruturas cranianas
decorrente de intercâmbios de energia mecânica. Este caso representa um TCE num
lactente de 8 meses, de uma altura elevada (colo da mãe), e, portanto, com um
mecanismo de alta energia. São mencionados vários fatores de risco para
desenvolvimento de uma lesão intracraniana pós-traumática: perda de consciência > 1
minuto, vómitos persistentes, saída de sangue pelo nariz e doente com potencial
coagulopatia (dado a descrição de ”equimoses frequentes”). Assim, tendo em conta os
fatores de risco e a clínica descrita, parece estarmos perante uma hemorragia
intracraniana, nomeadamente subdural, dado a deterioração importante do nível de
consciência desde o momento do trauma. *Não obstante a presença de comorbilidades
que poderão ter aumentado a probabilidade de este hematoma se ter formado (ou
aumentado o seu volume), como as patologias mencionadas nas opções B e D, o
diagnóstico principal, neste momento e com esta clínica, é o de hematoma subdural
(opção C correta).

Referências bibliográficas

 Manual de Diagnostico y Terapeutica en Pediatria” (6ª edição) - PARTE IV - Capítulo


36 - Página 484 (9º parágrafo) e página 486 (tabela 36-1)
 

51. Um homem de 46 anos vem ao serviço de urgência por dois episódios de ligeiro desconforto epigástrico
e subesternal, com irradiação para o pescoço, com início hoje, após uma discussão com a sua mulher.
Refere que teve episódios semelhantes de forma intermitente nos últimos três meses, com a duração de
dois a cinco minutos, e resolução espontânea. Ele sente ansiedade e dificuldade respiratória durante estes
episódios, que descreve como uma sensação de queimadura na face anterior do tórax. Os sintomas
parecem estar associados a stress emocional, ou quando acelera o passo, sem associação com a ingestão
de alimentos. Ele não tem antecedentes patológicos de relevo e não faz medicação habitual. Fuma 40
cigarros por dia, desde os últimos 15 anos, e bebe bebidas alcoólicas ocasionalmente. Conduz um trator
no trabalho e faz pouco exercício. Ele relata stress recentemente, causado por dificuldades financeiras.
Foi adotado ainda na infância e desconhece-se a história familiar. Os sinais vitais são temperatura 37,2°C,
frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca 80/min e pressão arterial 130/82 mm Hg; SpO2 97 %
(ar ambiente). Ele tem 178 cm de altura e pesa 95 kg; IMC 30 kg/m². O exame físico encontra-se dentro
dos parâmetros de normalidade. A concentração sérica de enzimas cardíacas está dentro dos parâmetros
de referência. O raio-X do tórax e os ECG seriados não mostram alterações. Ele não teve mais episódios
de desconforto torácico desde a sua entrada no serviço de urgência.

Qual dos seguintes é o exame de diagnóstico adicional mais adequado?

(A) Angio-TC torácico.


(B) Cintigrafia cardíaca de stress.
(C) Ecocardiograma.
(D) Endoscopia digestiva alta.
(E) Raio-X baritado do esófago.

Resposta correta: B

Comentário
Trata-se de um doente com múltiplos fatores de risco para doença coronária (sexo
masculino, tabagismo, obesidade, sedentarismo), que se apresenta com clínica de
desconforto epigástrico/substernal, sobreponível a episódios já previamente
presentes, e com caracteristicas sugestivas de etiologia isquémica: irradiação cervical
e desencadeados por stress emocional ou esforços (acelerar o passo). Apesar da
localização atípica e de se caraterizar como um “ardor”, este desconforto não tem
qualquer relação com a ingestão de alimentos, o que corrobora a nossa hipótese.
Adicionalmente, verificamos que estes sintomas estão presentes há mais de 2 meses,
têm sempre curta duração (2-5 minutos) e têm resolução espontânea, permitindo-nos
caracterizá-los como uma Angina Estável (Síndrome coronário crónico). Sendo um
doente com probabilidade pré-teste intermédia de doença arterial coronária, existe
indicação para a realização de um teste de isquemia funcional não invasivo, com intuito
diagnóstico, sendo a Cintigrafia de Perfusão Miocárdia a única opção adequada neste
contexto.
 

Referências bibliográficas

 Guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia “Diagnóstico e Abordagem das


Síndromes coronárias crónicas” (2019) – página 424, figura 4: ”Principais
estratégias diagnósticas em doentes sintomáticos com suspeita de doença arterial
coronária”; página 426, 1ª tabela: “Utilização de testes diagnósticos de imagem na
abordagem diagnóstica inicial de pacientes sintomáticos com suspeita de doença
arterial coronária”.
 

52. Um homem de 70 anos vem ao consultório médico por massa no pescoço que notou há um mês. Ele pensa
que a massa está a aumentar. O exame físico mostra aumento dos lobos da tiroide e múltiplos gânglios
linfáticos cervicais com 1 cm a 2 cm de diâmetro.

Qual dos seguintes é o diagnóstico mais provável?

(A) Bócio nodular.


(B) Carcinoma medular da tiroide.
(C) Doença de Graves.
(D) Cisto do canal tireoglosso.
(E) Tiroidite de Hashimoto.

Resposta correta: B

Comentário
Apesar da parca informação clínica que o enunciado faculta, atendendo à idade e ao
sexo de doente, a hipótese explicativa que parece mais plausível para explicar estes
achados seria o Carcinoma medular (resposta B correta). O bócio nodular e a tiroidite
de Hashimoto não se associam tipicamente a adenomegalias (resposta A e E
incorretas); o cisto do canal tireoglosso não se associa a bócio nem a adenomegalias
(resposta D incorreta); a doença de Graves, apesar de raramente poder estar associada
a adenomegalias e de explicar o bócio com aparente evolução aguda, não é tão típica da
idade do doente (resposta B incorreta).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª Edição: Capítulo 378, página 2721

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Neste caso clínico, não dispomos de qualquer informação clínica - não sabemos se o
doente tem sintomas ou sinais de tirotoxicose (o que seria compatível com Doença de
Graves), não sabemos antecedentes pessoais ou familiares de doença tiroideia ou de
tumores de outras glândulas endócrinas (pensando nos MEN e carcinoma medular). O
carcinoma medular assentaria bem na demografia do doente e eventual apresentação
com adenomegalias cervicais, mas trata-se de um quadro agudo (aparecimento e
agravamento em um mês) e com bócio, que não é muito típico desta patologia (o
carcinoma medular não cursa com aumento dos dois lobos da tiroide – apenas com
nódulo palpável). A doença de Graves costuma dar este tipo de bócio rapidamente
progressivo e pode eventualmente, embora não seja frequente, apresentar-se com
adenomegalias cervicais. Acresce que não dispomos de dados semiológicos que nos
façam apontar mais numa resposta em detrimento da outra. Penso ser impugnável
porque não se alvitram diagnósticos perante tamanha incerteza clínica.
 

53. Uma mulher de 32 anos é referenciada pelo médico assistente para o serviço de urgência por suspeita de
gravidez ectópica. Apresenta-se em amenorreia de sete semanas. Os antecedentes obstétricos incluem
uma gestação e uma cesariana segmentar transversal há 15 meses. Refere ter estado a amamentar até há
dois meses, pelo que não fazia contraceção. A mulher é emigrante em França, para onde regressará de
carro daqui a quatro dias. Não tem antecedentes pessoais ou familiares de relevo e não faz medicação. Os
sinais vitais são temperatura 36,9°C, frequência respiratória 14/min, frequência cardíaca 94/min e pressão
arterial 106/68 mm Hg. Ela mede 162 cm de altura e pesa 59 kg; IMC 23 kg/m². O exame ginecológico
revela perda hemática escassa pelo orifício cervical externo e toca-se tumefação dolorosa na região
anexial direita. O restante exame físico está dentro dos parâmetros de normalidade. Na ecografia pélvica
transvaginal observa-se endométrio com 8 mm de espessura, sem sinais de gravidez intrauterina e com
pequena quantidade de líquido no fundo de saco de Douglas. Deteta-se ainda imagem sugestiva de saco
gestacional com 32 mm na trompa direita, sem embrião visível.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 0,8 mg/dL; AST 18 U/L; ALT 24 U/L; beta-hCG 4 350 UI/L [N < 5 UI/L].

Sangue: Eritrócitos 3,6 x 10^9/L; Hemoglobina 11,3 g/dL; Leucócitos 6 430/mm³; Plaquetas 221 x
10^9/L; Hematócrito 39%.

Qual dos seguintes fatores presentes nesta mulher favorece o tratamento cirúrgico em detrimento do
tratamento com metotrexato?

(A) Amamentação recente.


(B) Dimensão do saco gestacional.
(C) Duração da amenorreia.
(D) Necessidade de viajar.
(E) Valor da hemoglobina

Resposta correta: D

Comentário
O diagnóstico de gravidez ectópica é feito com recurso a ecografia transvaginal e
doseamentos seriados de bhcg. O tratamento da (GE) pode ser médico ou cirurgico,
além da abordagem expectante em casos selecionados. São candidatas a terapêutica
médica com metotrexato, mulheres hemodinamicamente estáveis, na ausência de dor
pélvica intensa, com função hepática e renal normal, com valores de bhcg entre os 1500
e os 5000 mUL/mL, com uma GE com dimensões inferiores a 3-4cm, com embrião sem
batimentos cardíacos e que compreendam e adirão à vigilância em ambulatório. Antes
de iniciar tratamento com MTX é, pois, essencial avaliar contraindicações para a
realizaçao da terapêutica, realizar uma avaliação analítica prévia, com hemograma,
função hepática e renal e avaliar se existem condições de vigilância em ambulatório. O
tratamento cirúrgico fica reservado para mulheres hemodinamicamente instáveis, com
valores de bhcg >5000mUL/mL ou que tenham contraindicações para tratamento com
MTX ou em caso de falência do mesmo.
 

Referências bibliográficas

 Beckmann 7th edition, Pag 205, “Management”;”Medical management”; 4º paragrafo,


linha 3.
 

54. Uma mulher de 42 anos, costureira, recorre a consulta de medicina geral e familiar por perda de peso
correspondente a 13 % do peso corporal em quatro meses. Menciona ainda astenia e anorexia. Nega outros
sintomas. A história médica revela «depressão crónica grave», não medicada, doença hemorroidária,
colecistectomia por litíase e histerectomia. É fumadora de 30 UMA. Os sinais vitais são temperatura
36,5°C, frequência cardíaca 76/min e pressão arterial 130/85 mm Hg. O exame físico revela abdómen
indolor, sem organomegalias e com aorta abdominal palpável.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Glucose 87 mg/dL; AST 32 U/L; ALT 35 U/L; Proteínas: Albumina 3 g/dL.

Sangue: Hemoglobina 10 g/dL; VGM 69 fL; Leucócitos 5 500/mm³; Plaquetas 350 x 10^9/L.

Qual dos seguintes é o exame de diagnóstico adicional mais adequado?

(A) Colonoscopia total.


(B) Colonoscopia virtual.
(C) Ecografia abdominal.
(D) Pesquisa de sangue oculto nas fezes.
(E) Sigmoidoscopia.

Resposta correta: A

Comentário
Esta doente apresenta um quadro clínico constitucional de perda de peso superior a
10% em 4 meses, com astenia e anorexia. Não apresenta outras queixas ou alterações
no exame objetivo. Em avaliação analítica apresenta anemia microcítica e
hipoalbuminemia. Devem ser pesquisadas causas de anemia microcítica e também de
síndrome constitucional. A principal causa de anemia microcítica nas mulheres pré-
menopausa são perdas hemáticas de causa menstrual, porém esta doente tem história
de histerectomia. Assim devem ser procuradas outras causas de perdas hemáticas,
como hemorragia do trato digestivo e que também possam justificar a síndrome
constitucional, como uma neoplasia, com exames endoscópicos. Assim, dos MCDTs
referidos, o mais indicado é a colonoscopia total, que permite simultaneamente
observar todo o intestino grosso (em detrimento da sigmoidoscopia e pesquisa de
sangue oculto nas fezes) e se necessário realizar biópsia ou na presença de um pólipo,
por exemplo excisar (em detrimento de colonoscopia virtual e pesquisa de sangue
oculto nas fezes). A ecografia abdominal não é útil para avaliação do trato GI.
 

Referências bibliográficas

 Harrison Capítulo 43 Perda de Peso Involuntaria. Página 271 “Age, sex, and risk
factor–specific cancer screening tests, such as mammography and colonoscopy,
should be performed”
 AGA Clinical Practice Guidelines on the Gastrointestinal Evaluation of Iron Deficiency
Anemia - Tabela 3
 Norma DGS Prescrição de Colonoscopia Norma 002/2014
 

55. Um homem de 53 anos, professor de fotografia, volta ao consultório médico, acompanhado pela sua
mulher, para seguimento de quadro de fadiga e insónia com cinco meses de evolução. A mulher está
preocupada porque ele está a perder a memória e não se consegue manter acordado. Refere que adormece
quando vê filmes, quer em casa, quer na escola. Está preocupada com o facto de o marido poder perder o
emprego. Recentemente, ele esteve envolvido num acidente de viação. Está convencida que a sonolência
é resultado da exposição aos venenos dos produtos químicos que usa no processamento de fotografias na
sua câmara escura. Ele fez uma prova de esforço há quatro semanas, que foi negativa para doença
isquémica coronária.

Os resultados dos estudos analíticos realizados nessa altura revelaram:

Soro: Glucose 97 mg/dL; Colesterol LDL 176 mg/dL; Triglicerídeos 119 mg/dL.

Todos os outros resultados laboratoriais obtidos na mesma altura encontram-se dentro dos parâmetros de
normalidade.

Hoje, os sinais vitais são temperatura 36,9°C, frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca 62/min
e pressão arterial 140/88 mm Hg. Ele tem 178 cm de altura e pesa 95 kg; IMC 30 kg/m². O exame físico
não mostra alterações e é idêntico ao exame efetuado há dois meses.

Qual das seguintes alternativas melhor explica o quadro atual do doente?

(A) Apneia obstrutiva do sono.


(B) Epilepsia do lobo temporal.
(C) Hipoglicemia.
(D) Narcolepsia.
(E) Toxicidade hepática.

Resposta correta: A

Comentário
O caso clínico é sugestivo de uma apneia obstrutiva do sono. A ausência de roncopatia
não descarta o diagnóstico. O sintoma diurno mais comum é a hipersonolência, por
vezes identificada pela incapacidade do doente de se manter alerta. A dificuldade em
adormecer e em manter o sono são caracteristicas dos distúrbios de insónia, mas
também podem acontecer na apneia obstrutiva do sono. A obesidade e o sexo masculino
são fatores de risco significativos na apneia obstrutiva do sono.
 

Referências bibliográficas

 Harrison, 20ªed, Cap 288 “Disorders of the Pleura”, pg 2006, “The major risk factors
for OSAHS are obesity and male sex. (…) Snoring is the most common complaint;
however, its absence does not exclude the diagnosis, (…) The most common daytime
symptom is excessive sleepiness, identified by a history of difficulty maintaining
alertness or involuntary periods of dozing. (…) Other symptoms include a dry mouth,
nocturnal heartburn, diaphoresis of the chest and neck, nocturia, morning
headaches, trouble concentrating, irritability, and mood disturbances. Although
difficulty falling sleep and maintaining sleep are characteristics of insomnia
disorders, they also may occur with OSAHS, especially in women. (…) The predictive
ability of a questionnaire can be enhanced by a consideration of whether the patient
is male or has risk factors such as obesity or hypertension.”
 

56. Uma mulher de 34 anos é observada no internamento por hemorragia vaginal abundante e queixas de
tonturas cerca de uma hora após o parto eutócico. A gravidez decorreu sem intercorrências. O recém-
nascido pesa 4250 g e o índice de Apgar foi de 8 e 10 ao 5.º e 10.º minutos, respetivamente. Os
antecedentes obstétricos incluem quatro gestações e três partos vaginais prévios. Os sinais vitais são
temperatura 36,8°C, frequência cardíaca 112/min, frequência respiratória 16/min e pressão arterial 100/60
mm Hg. Ao exame físico está pálida.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado na gestão desta doente?

(A) Colocar a utente na posição de Trendelenburg.


(B) Pesquisar lacerações vaginais.
(C) Solicitar ecografia pélvica.
(D) Solicitar hemograma.
(E) Verificar o tónus uterino.

Resposta correta: E

Comentário
As principais causas de hemorragia pós-parto (HPP) são a atonia uterina, as lacerações
do canal de parto, a retenção de restos placentares e a presença de coagulopatia. A
atonia uterina é a causa mais frequente de hemorragia pós-parto precoce (cerca de 80%
dos casos) e está associada a alguns fatores de risco, nomeadamente, a multiparidade
e um elevado peso do RN ao nascer. Perante a suspeita diagnóstica é essencial, como
primeiro passo, identificar a causa pois o tratamento será dirigido à mesma, promover
o controlo da hemorragia e estabilizar a puérpera. Tendo em conta que a atonia uterina
é a causa mais frequente de (HPP), a abordagem deve iniciar-se pela avaliaçao do tónus
uterino. Além disso, deve ser realizada uma avaliação do canal de parto com eventual
correção de lacerações visíveis, revisão manual da cavidade/ecografia para exclusão
da presença de restos placentares, e pesquisa de coagulopatia.

Referências bibliográficas

 Beckmann 7th edition, Pag 158 , “GENERAL MANAGEMENT OF PATIENTS”; pag 160
“MAJOR CAUSES AND THEIR MANAGEMENT”, Uterine Atony
 

57. Uma mulher de 48 anos vem a consulta de seguimento. Tem história de lúpus eritematoso sistémico com
atingimento inicial dermatológico, articular e hematológico, diagnosticado 10 anos antes. Tem estado
assintomática. A história médica inclui ainda hipertensão arterial e dislipidemia. A medicação inclui
hidroxicloroquina, prednisolona (5 mg/dia), cálcio, vitamina D, ramipril e fotoproteção UV. Os sinais
vitais são temperatura 36°C, frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca 89/min e pressão arterial
149/95 mmHg (membro superior direito) e 153/97 mm Hg (membro superior esquerdo); SpO2 98 % (ar
ambiente). Ela tem 169 cm de altura e pesa 67 kg; IMC 23,5 kg/m². Apresenta bom estado geral, sem
gânglios palpáveis. Observa-se pele bem, sem rash, algumas lesões cicatriciais malares. O abdómen
encontra-se mole e depressível, sem organomegalias. O restante exame físico, incluindo a auscultação
cardíaca e pulmonar, encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelaram:

Soro: Creatinina 1,9 mg/dL; Ureia 45 mg/dL; Glucose 109 mg/dL; HbAlc 5,9 %; AST 45 U/L; ALT 34
U/L; Bilirrubina total 1,1 mg/dL; Fosfatase alcalina 90 U/L; Colesterol: HDL 56 mg/dL; LDL 145 mg/dL;
Triglicerídeos 116 mg/L; Sódio 131 mEq/L; Potássio 4,5 mEq/L; Proteína C reativa 5 mg/L.

Sangue: Hemoglobina 11,8 g/dL; VGM 90 fL; Leucócitos 4 500/mm³; Neutrófilos, segmentados 67%;
Linfócitos 24%; Plaquetas 120 x 10^9/L; Velocidade de sedimentação eritrocitária 28 mm/1ª hora.

Urina 24 horas: Proteínas 1,4 g.

O estudo imunológico revelou:

ANA — 1/160 com ENA + anti-RNP 3 U (N < 1,0 U) e anti-Smith 7 U (N < 1,0 U).

AntiDNA de dupla hélice — 145 IU/L (N < 25 IU/L).

C3 — 65 mg/dL (N 83-177 mg/dL).

C4 — 5 mg/dL (N 16-47 mg/dL).

A análise da urina revelou eritrócitos dismóficos e proteínas (restante negativo).

Qual dos seguintes mecanismos melhor explica a etiologia da lesão renal aguda de novo, neste momento?

(A) Glomerulonefrite.
(B) Necrose tubular aguda.
(C) Nefrite intersticial.
(D) Nefrite intersticial alérgica.
(E) Nefropatia por cristais.

Resposta correta: A
   
 

Comentário
Pergunta fácil, relacionada com a abordagem ao doente com alterações urinárias.
Apresentam-vos um caso de uma mulher com história de LES com 10 anos de evolução.
Na exploração física o único achado que chama à atenção é a hipertensão arterial (já
conhecida e sob tratamento com ramipril). Os resultados analíticos revelam uma
insuficiência renal (creatinina 1,9 mg/dL), pré-diabetes (HbA1c de 5,9%) e dislipidemia
(LDL 145 mg/dL). O estudo imunológico revela uma hipocomplementemia de C3 e C4
(compatível com o diagnóstico de LES da doente), assim como ANAs e anti-DNA
positivos. Na análise de urina encontramos proteinúria não nefrótica (1,4g/24h) e
hematúria de caracteristicas GLOMERULARES (eritrócitos dismórficos). O facto de a
doente apresentar eritrócitos dismórficos é claramente indicativo de lesão glomerular,
motivo pelo qual teríamos que marcar a opção A (Glomerulonefrite) como correta. Isto,
em conjunto com a história da doente, seria indicativo de nefrite lúpica (neste caso, com
insuficiência renal, hematúria e proteinúria estaríamos perante uma classe
histopatológica III/IV). Não nos dão dados de hipoperfusão para pensar numa necrose
tubular aguda (resposta B incorreta); também não nos indicam que a doente tenha
leucocitúria e proteinúria de Tamm-Horsfall para pensar numa nefrite intersticial
(resposta C incorreta). Para pensar numa nefrite intersticial alérgica deveriam
mencionar, por exemplo, terapêutica recente com antibióticos, assim como
leucócitos/eosinófilos na urina, rash cutâneo e/ou febre. A opção D) também não é
correta já que a hematúria não teria caracteristicas glomerulares e a doente teria
antecedentes de litíase conhecidos, ou dados analíticos como hipercalcemia ou
hiperuricemia.

Referências bibliográficas

 Kasper D, Fauci A, Stephen H. Harrison. Principles of internal medicine. 20 ed. New


York. McGraw Hill. 2018. Capítulo 308.
 Omar A, Sharon A, et al. KDIGO Clinical Practice Guideline for glomerulonephritis.
Kidney International. 2012; 2 (2):221-32.
 

58. Uma mulher de 28 anos é trazida ao serviço de urgência pela mãe por ter feito cortes superficiais dos
punhos com uma faca de plástico há oito horas, após uma discussão com o namorado. Encontrava-se
embriagada nessa altura. Esta é a 5.ª vez que a doente tem este tipo de comportamento nos últimos cinco
anos. Ela nega qualquer ideação suicida no momento atual e refere que se sentia «bem» antes da discussão
com o namorado. A mãe corrobora a descrição da doente e refere que habitualmente não tem ideias de
suicídio. A mãe irá ficar com a doente nesta noite. A doente é seguida em consulta de psiquiatria por
perturbação depressiva major recorrente e tem uma consulta agendada para o dia seguinte. Aos 16 anos
foi internada por intoxicação medicamentosa voluntária com cinco comprimidos de metoprolol do pai. A
história médica revela traumatismo cranioencefálico fechado no contexto de um acidente de viação aos
17 anos. A medicação habitual inclui fluoxetina e trazodona. Os sinais vitais encontram-se dentro dos
parâmetros de normalidade. À observação encontra-se sóbria e com cortes superficiais em ambos os
punhos. O restante exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade. O estudo toxicológico
do sangue é negativo para a presença de álcool e o estudo toxicológico da urina é negativo.

Qual dos seguintes é o próximo passo mais adequado?

(A) Dar alta à doente na companhia da mãe.


(B) Iniciar tratamento com carbonato de lítio.
(C) Internar a doente compulsivamente no serviço de psiquiatria.
(D) Pedir TC cerebral.
(E) Prescrever flucloxacilina oral durante uma semana.

Resposta correta: A

Comentário
Este caso clínico remete para um comportamento autolesivo aparentemente SEM
intenção suicida. Foi um acto levado a cabo impulsivamente, reativamente a uma
discussão, e facilitado pela intoxicação alcoólica. O método utilizado tinha um risco
associado desprezível (cortes nos punhos com faca de plástico). Apesar da doente ser
seguida por perturbação depressiva recorrente, não parece, pela informação fornecida
no caso clínico, verificar-se a presença de sintomatologia depressiva recente. A doente
não tinha ideação suicida nos últimos tempos e à observação não apresentava ideação
suicida, nem tão pouco incorreu numa tentativa de suicídio, mas sim comportamento
auto lesivo. A doente é seguida em consulta de Psiquiatria, tem consulta de Psiquiatria
no dia seguinte e temos a garantia de que vai estar acompanhada pela mãe até lá.
Assim, a única opção que faz sentido, face às disponíveis, seria dar alta à doente na
companhia da mãe. A doente não tem, nem tinha, ideação suicida, incorreu num
comportamento auto lesivo impulsivo de baixo risco e letalidade, não parece ter
sintomatologia depressiva relevante, vai à consulta de Psiquiatria no dia seguinte e não
vai ficar sozinha até lá. Não fazia sentido iniciar lítio, porque este está indicado,
habitualmente, na doença bipolar (que não há evidência que a doente tenha) ou como
tratamento adjuvante na depressão resistente (que a doente também não parece ter).
Aliás, tendo a doente consulta com o psiquiatra assistente no dia seguinte, não faria
sentido “mexer” na medicação nesta situação. O internamento compulsivo implica que
se verifiquem três critérios (e têm de estar todos presentes): Presença de anomalia
psíquica grave (mais frequentemente psicótica, embora haja excepções), que a doente
não tem nesta fase; Recusa de cumprimento do plano terapêutico proposto (e não temos
 

qualquer evidência que a doente recuse); Existência de risco para a integridade física
ou património da própria ou terceiros decorrente da perturbação mental (que a doente
também parece não ter). Ou seja, esta doente não cumpre qualquer um dos três
necessários pressupostos para internamento compulsivo (nem sequer teria grande
indicação para internamento voluntário). Não há indicação para fazer TC cerebral neste
caso, uma vez que não se verifica psicopatologia ou sintomatologia neuropsiquiátrica
ou história de TCE recente que o justifique. Finalmente, sendo os cortes superficiais, e
pela informação que temos disponível no enunciado, não faria sentido iniciar
flucloxacilina.

Referências bibliográficas

 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição capítulo 21 “Suicide and Deliberate


Self Harm”
 Lei de Saúde Mental, Procuradoria Geral da República, http://www.pgdlisboa.pt/
leis/lei_mostra_articulado.php?nid=276&tabela=leis&so_miolo=;
 

59. Um homem de 66 anos vem ao consultório médico por disfagia progressiva para sólidos. Fuma 20 cigarros
por dia desde há 20 anos e consome seis copos de vinho tinto maduro por dia desde há 40 anos. Ele tem
171 cm de altura e pesa 53 kg; IMC 18 kg/m². Ao exame físico apresenta um nódulo de consistência duro-
elástica, com 3 cm de maior diâmetro, no lobo direito da tiroide, e discretos edemas compressíveis dos
membros inferiores. A auscultação pulmonar revela roncos bilaterais.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 1,1 mg/dL; Glucose 105 mg/dL; AST 40 U/L; ALT 39 U/L; Fosfatase alcalina 100 U/L;
Proteína C reativa 30 mg/L; Albumina 2 g/dL; gamma-glutamil transferase (GGT) 180 U/L.

Sangue: Hemoglobina 10 g/dL; VGM 79 fL; Leucócitos 11 000/mm³; Plaquetas 180 x 10^9/L.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Carcinoma epidermoide do esófago.


(B) Carcinoma indiferenciado da tiroide com invasão do esófago.
(C) Divertículo de Zenker.
(D) Estenose péptica do esófago.
(E) Tumor do estroma do esófago.

Resposta correta: A

Comentário
Este doente apresenta disfagia progressiva para sólidos, o que sugere que possa ter
uma alteração estrutural do esófago, com aumento progressivo do grau de obstrução.
Devido à dificuldade na alimentação com disfagia progressiva, apresenta um IMC baixo
e tem hipoalbuminemia. É fumador (20 UMA) e tem um alcoolismo moderado (pelo
menos 60g/álcool/dia há 40 anos), ambos fatores de risco para carcinoma epidermóide
do trato aero-digestivo superior. Pelas queixas e também pelos fatores de risco, o
diagnóstico mais provável a ser considerado é o carcinoma epidermóide do esófago
(carcinoma pavimento celular), devendo ser o primeiro a ser excluído. No entanto este
doente apresenta um nódulo de consistência duro-elástica na tiróide, que embora seja
um achado relativamente frequente na população geral, devido às queixas de disfagia
este deve ser caracterizado por ecografia e se houver suspeição, deve ser alvo de
caracterização histológica. Embora a neoplasia da tiróide com invasão do esófago possa
ocorrer, é menos provável que o carcinoma do esófago, sobretudo com o contexto
epidemiológico referido de alcoolismo e tabagismo crónicos. Os ligeiros edemas
compressivos dos membros inferiores podem ser justificados pela hipoalbuminemia e
os roncos bilaterais devido a provável fenómeno de aspiração secundário à disfagia.

Referências bibliográficas

 HPIM 20th: páginas 566 (epidemiology and etiology) e 567 (clinical features)
 

60. Um homem de 60 anos vem a consulta de medicina geral e familiar por queixas de astenia, anorexia e
emagrecimento de 5 kg em três meses. A história médica revela infeção por VHC com diagnóstico há 20
anos. Refere hábitos alcoólicos de cerca de 100 g por dia desde os 20 anos, com interrupção do consumo
há cinco anos.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Alfa-fetoproteína 250 ng/ml [N ≤ 8,5 ng/ml].

A TC do abdómen com contraste endovenoso revela um fígado cirrótico com um nódulo de 4 cm,
hipervascular na fase arterial e com «washout».

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Adenoma hepático.


(B) Carcinoma hepatocelular.
(C) Cistadenoma hepático.
(D) Hamartoma biliar.
(E) Hemangioma.

Resposta correta: B

Comentário
O caso clínico retrata um homem de 60 anos com sintomas constitucionais com 3 meses
de evolução, incluindo perda ponderal, o que é um alerta para patologia orgânica. O
enunciado refere a história de consumos alcoólicos abusivos ~100g/dia e infeção por
VHC com 20 anos de evolução. Ambos são fatores de risco para doença hepática crónica
e para o desenvolvimento de neoplasias, entre elas o carcinoma hepatocelular (CHC).
Embora o desenvolvimento de CHC seja mais frequente no estadio de cirrose
(desconhecemos se o doente tem ou não) também pode ocorrer antes do seu
desenvolvimento. Além disso, a presença de fatores de risco em simultâneo aumenta
ainda mais o risco. A elevação do marcador tumoral alfa-fetoproteína está associada à
presença de CHC, embora possa estar elevada em outras neoplasias (tumores células
germinativas). A caracteristica radiológica típica e que é suficiente para afirmar o
diagnóstico desta entidade é a hipercaptação de contraste na fase arterial e o ”washout”
precoce na fase tardia.

Referências bibliográficas

 European Association for the Study of the Liver. EASL Clinical Practice Guidelines on
the management of benign liver tumours 2016
 European Association for the Study of the Liver. EASL Clinical Practice Guidelines:
Management of hepatocellular carcinoma 2018; Harrison 20th Edition – Chapter 78
Tumors of the Liver and Biliary Tree p581-p582
 

61. Um homem de 72 anos é trazido a consulta de medicina geral e familiar pela sua esposa para uma consulta
de vigilância. Ele tem tido perda progressiva de memória e das capacidades de planeamento ao longo dos
últimos quatro anos. A esposa refere ainda que o doente tem perdido capacidades nos autocuidados, nos
últimos seis meses, após um episódio transitório e breve de incapacidade de mover o braço direito, de que
recuperou sem défices físicos residuais. Ele refere que não se sente triste e que continua a retirar muita
satisfação em assistir a jogos de futebol e em visitar os seus netos. Tem antecedentes de diabetes mellitus
tipo 2 controlada com insulina e hipertensão arterial tratada com lisinopril. Foi fumador durante 40 anos,
tendo deixado de fumar há 10 anos. Ele tem excesso de peso e apresenta-se com uma postura cordial e
energética. Ao exame físico apresenta fraqueza bilateral e simétrica dos membros superiores e inferiores.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Demência vascular.


(B) Demência de Alzheimer.
(C) Doença de Parkinson.
(D) Doença de Pick.
(E) Episódio depressivo major com características atípicas.

Resposta correta: A

Comentário
Homem de 72 anos com um quadro progressivo de alterações em múltiplos domínios
cognitivos (memória, planeamento, autocuidado). Até este ponto, a demência de
Alzheimer seria a opção mais provável por prevalência. Porém, devemos prestar
atenção ao detalhe de que o início da perda de capacidade de autocuidado ocorre
coincidindo temporalmente com um episódio de debilidade transitória do braço direito.
Este detalhe, num doente com múltiplos fatores de risco vascular, deve levantar a
suspeita de uma demência vascular, onde vemos um agravamento gradual do défice
cognitivo associado a eventos cerebrovasculares.

Referências bibliográficas

 T Erkinjuntti, 1994. Clinical criteria for vascular dementia: the NINDS-AIREN criteria
 

62. Um homem de 60 anos vem ao consultório médico por palpitações, fadiga progressiva com esforço e
intolerância ao frio com um mês de evolução. Refere ainda tosse noturna e aumento da dificuldade
respiratória quando em posição de decúbito. Foi submetido a resseção transuretral da próstata há dois
anos. Não faz medicação habitual e não tem alergias. Os sinais vitais são temperatura 37,1°C, frequência
respiratória 20/min, frequência cardíaca 90/min e pressão arterial 138/82 mm Hg; SpO2 94 % (ar
ambiente). A auscultação pulmonar revela crepitações inspiratórias bilaterais e auscultação cardíaca com
acentuação de S2.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Prescrever indapamida.


(B) Prescrever lisinopril.
(C) Programar cateterismo cardíaco imediato.
(D) Referenciar ao hospital para tratamento com heparina.
(E) Solicitar ecocardiograma

Resposta correta: E

Comentário
Trata-se de um homem com sintomas (típicos e menos típicos) de Insuficiência
Cardíaca, como fadiga progressiva, ortopneia, palpitações e tosse noturna, que
levantam esta suspeita diagnóstica. A presença de crepitações inspiratórias e de
alterações na auscultação cardíaca reforçam esta hipótese. Assim sendo, e de acordo
com o algoritmo diagnóstico preconizado pelas Guidelines de IC da Sociedade Europeia
de Cardiologia, o próximo passo seria o doseamento de péptidos natriuréticos (hipótese
não disponível nas respostas) ou a progressão direta para a realização de
Ecocardiograma Transtorácico. Este exame é que nos permitirá avaliar a fração de
ejeção do VE e definir em que categoria se encontra (ICFEr, ICFEi, ICFEp), para
posteriormente definir qual a terapêutica indicada (o inicio de IECA neste doente só faria
sentido se ICFEr).

Referências bibliográficas

 Guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia “Diagnóstico e Tratamento da


Insuficiência Cardíaca Aguda e Crónica (2016)” - página 2141, figura 4.1: “Algoritmo
diagnóstico de insuficiência cardíaca”.
 

63. Um homem de 27 anos vem ao consultório médico por episódios recorrentes de palpitações, xerostomia,
cefaleias e dores musculares com nove meses de evolução. Estes sintomas tiveram início pouco tempo
depois de ter perdido o seu emprego anterior. Apesar de rapidamente ter conseguido encontrar novamente
trabalho, refere que está preocupado com a possibilidade de ser despedido mais uma vez. Sente-se
persistentemente assustado com a possibilidade de que algo negativo possa ocorrer consigo ou com a sua
família. Tem tido dificuldade em adormecer e tendência para comer mais do que o habitual. Mais
recentemente, tem-se sentido triste pelo facto de não conseguir poupar o suficiente para «fazer um pé-de-
meia […] ter uma alternativa para sustentar os meus filhos se ficar outra vez sem emprego […] chego a
chorar quando estou a matutar sobre estes problemas à noite». À observação apresenta-se vígil e
colaborante. O discurso é espontâneo, está organizado e tem fluxo normal. O humor é ansioso. Não
apresenta atividade delirante ou alucinatória. Foi observado recentemente em consulta pelo seu médico
assistente, tendo sido requisitados estudos analíticos e eletrocardiograma, que se encontram dentro dos
parâmetros de normalidade.

Atendendo à descrição clínica efetuada, qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Episódio depressivo major.


(B) Perturbação de adaptação de tipo ansioso.
(C) Perturbação de adaptação de tipo depressivo.
(D) Perturbação de ansiedade generalizada.
(E) Perturbação de pânico.

Resposta correta: D

Comentário
Neste caso clínico temos um doente que apresenta desde há 9 meses ansiedade e
preocupação excessivas, com ruminações ansiosas sobre vários assuntos (ficar sem
emprego, acontecer algo de negativo a si ou à sua família, etc) que contribuem para
insónia inicial, verificando-se também tensão muscular (evidente pelas cefaleias e
dores musculares) e ainda hiperatividade autonómica (evidente pelas palpitações e
xerostomia). Apresenta alguma sintomatologia de linha depressiva (tristeza e choro
fácil) que parece ser completamente condicionada e precipitada pelas ruminações e
preocupações de foro ansioso. Finalmente, o humor é ansioso. Assim, estão cumpridos
os critérios diagnósticos de Perturbação de Ansiedade Generalizada, considere-se o
DSM 5 ou o ICD-10. Apesar de se verificar, como já referido, a presença de sintomas
depressivos, estes não são os principais neste caso clínico, e não se verifica humor
deprimido (mas sim ansioso), nem temos evidência de anedonia, que seriam sintomas
necessários ao diagnóstico de episódio depressivo. A perturbação de adaptação (seja
tipo ansioso ou depressivo), deve ser considerada: Se não se cumprirem critérios para
o diagnóstico de uma perturbação psiquiátrica major (Depressão; Perturbação de
Ansiedade Generalizada; etc); Habitualmente até 6 meses depois de extinto o evento
precipitante e suas consequências. Neste caso, independentemente do tempo que
passou do evento que poderia ser considerado precipitante (perda de emprego) estão
cumpridos critérios para o diagnóstico de perturbação de ansiedade generalizada, pelo
que não se colocaria um diagnóstico de perturbação de adaptação. Para o diagnóstico
de perturbação de pânico seria necessário a presença de pelo menos duas crises de
pânico, e posteriormente preocupação constante, com impacto no dia a dia, com a
 

possibilidade de voltar a ter um episódio semelhante. Não se verifica nenhuma destas


condições necessárias para este diagnóstico.

Referências bibliográficas

 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Anxiety and Obsessive-


Compulsive Disorders”, secção “Generalized Anxiety Disorder”, pág 163-169
 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Anxiety and Obsessive-
Compulsive Disorders”, secção “Panic Disorder”, pág 180-183
 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Reactions to Stressful
Experiences”, secção “Adjustment Disorders”, pág 149-151
 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Depression”, secção
“Clinical Features”, pág 193-198;
 

64. Um menino de 11 meses é trazido ao serviço de urgência por períodos de choro intenso e irritabilidade
alternados com períodos de acalmia, com seis horas de evolução. A mãe refere que o quadro parece estar
a agravar. Teve dois episódios de vómitos alimentares antes da admissão e não teve dejeções no dia
anterior. Na semana anterior apresentou rinorreia serosa e febre durante dois dias. A mãe nega
traumatismo. Os sinais vitais são temperatura timpânica 37,1°C, frequência respiratória 22/min,
frequência cardíaca 107/min e pressão arterial 96/52 mm Hg. Ao exame físico observa-se uma criança
irritável, sem outras alterações de relevo.

Qual dos seguintes é o exame mais adequado para estabelecer o diagnóstico mais provável?

(A) Ecografia abdominal.


(B) Exame sumário da urina.
(C) Ionograma e gasimetria.
(D) Punção lombar.
(E) Raio-X abdominal simples.

Resposta correta: A

Comentário
A invaginação intestinal é mais frequente em crianças entre os 4 e os 12 meses e a sua
apresentação típica é a de períodos de choro intenso e irritabilidade, com posição
antálgica, palidez e sudorese que duram cerca de 10-15 min., alternados com perídos
sem queixas. Cursa ainda com um quadro pseudo-obstrutivo e, em uma percentagem
pequena de casos, pode estar presente a tríade clássica de vómitos, dor abdominal e
retorragia. O exame de primeira linha é a ecografia abdominal onde se observa o ”sinal
de donut”.

Referências bibliográficas

 La Paz, pág. 216


 

65. Um homem de 38 anos de idade é admitido no internamento após orquiectomia. Tinha notado tumefação
dolorosa no testículo direito há dois meses e a ecografia testicular revelou massa sugestiva de neoplasia.
Não tem antecedentes patológicos e não faz medicação habitual. O estudo anatomopatológico é
compatível com carcinoma seminomatoso do testículo.

Qual dos seguintes é o exame de estadiamento mais adequado?

(A) Alfa-fetoproteína.
(B) Cintigrafia óssea.
(C) PET scan.
(D) RMN cerebral.
(E) TC torácica, abdominal e pélvica.

Resposta correta: E

Comentário
Pergunta relativamente ao estadiamento das Neoplasias do Testículo. A TC torácica,
abdominal e pélvica é o principal exame de estadiamento e deve ser realizada ou antes
de orquidectomia ou após a confirmação histologica do diagnóstico de neoplasia.
Permite identificar os principais locais de metastização como os pulmões, gânglios
pélvicos e retroperitoneais e o osso. A alfa-fetoproteína é um dos marcadores tumorais
utilizados na avaliação do tumor do terstículo juntamento com a beta-HCG e com a LDH.
Estes marcadores têm um elevado número de falsos e baixa sensibilidade, sendo que
são bons marcadores de follow up para identificação de recidiva tumoral. A PET scan e
a cintigrafia óssea geralmente não são utilizados no estadiamento do tumor do
testículo. A Ressonância Magnética Cerebral está indicada em casos específicos (ex:
metástases pulmonares múltiplas ou níveis elevados de beta-HCG).

Referências bibliográficas

 Guidelines da European Association of Urology 2020 sobre Testicular Cancer


(página 16)
 Schwartz’s Principles of Surgery 11th Ed. (versão inglesa) – Capítulo 40 “Urologia” –
página 1772 – coluna da esquerda, segundo parágrado, linha 10.
 

66. Um homem de 21 anos, estudante de medicina, vem ao consultório médico por queixas de isolamento
desde há seis meses. Ele conta que sente medo de ser agressivo com outras pessoas, em particular crianças,
pelo que tem evitado sair de casa, especialmente para locais onde as possa encontrar. Descreve imagens
mentais de agressividade que causam grande ansiedade. A história médica revela asma brônquica até ter
entrado para a faculdade. Consome bebidas alcoólicas em contexto social; não é fumador e nega consumo
de substâncias ilícitas. À observação apresenta humor ansioso, não se apurando a presença de atividade
delirante ou alucinatória.

Qual das seguintes alternativas constitui a afirmação mais adequada para transmitir ao doente neste
momento?

(A) «Compreendo o seu sofrimento. Procure-me quando tiver estes pensamentos.»


(B) «Estes pensamentos causam sofrimento porque ocorrem contra a sua vontade.»
(C) «Não se preocupe com esses pensamentos. Vão passar com o tempo.»
(D) «Quando tiver estes pensamentos tente distrair-se com qualquer coisa agradável.»
(E) «Talvez seja melhor evitar o contacto com crianças sem estar acompanhado.»

Resposta correta: B

Comentário
Este doente apresenta uma perturbação obsessiva compulsiva (POC) com fobia de
impulso e imagens intrusivas, incoercíveis e egodistónicas. No fundo a pergunta remete
mais para a relação médico-doente e empatia do médico que para a gestão específica
da POC. A hipótese B é a única afirmação concomitantemente empática e
cientificamente correcta das 5 afirmações disponíveis. As hipóteses C, D e E devem ser
excluídas, porque o conteúdo dessas afirmações não está correcto tendo em conta a
hipótese diagnóstica mais provável (POC): Na verdade, muito dificilmente, sem
tratamento (farmacológico ou psicológico) os pensamentos “vão passar com o tempo”
(C); A natureza da sintomatologia obsessiva compulsiva faz com que seja praticamente
impossível o doente “distrair-se com qualquer coisa agradável”, até porque isso poderia
gerar/reforçar o desenvolvimento de compulsões (D); Na fobia de impulso
habitualmente os doentes não incorrem no impulso que tanto temem, até porque o que
eles têm é o medo de ter o impulso e não resistir, e não necessariamente o impulso em
si. Assim, evitar o contacto com crianças não faz sentido e só vai contribuir para
reforçar a POC (E). Em relação à opção A, não faz sentido, porque se o médico realmente
compreender o seu sofrimento, saberá que não é preciso os pensamentos “voltarem”
ou estarem a ocorrer à sua frente para tomar uma ação terapêutica. Por isso, mais uma
vez, a opção B é a única em que o médico tem uma afirmação verdadeiramente
empática, honesta, psicoeducativa, e cientificamente correta tendo em conta o
diagnóstico que mais provavelmente se configura.

Referências bibliográficas

 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Anxiety and Obsessive-


Compulsive Disorders”, secção “Obsessive-Compulsive Disorder”, pág 184-190
 

67. Uma mulher de 57 anos, de origem sueca, vem ao consultório médico por fadiga progressiva, palpitações,
dispneia de esforço e sensação de frio nas últimas semanas. Ela não tem antecedentes patológicos de
relevo. Os sinais vitais encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade, à exceção de frequência
cardíaca de 105/min. Ao exame físico tem aparência pálida, mas normonutrida.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Sangue: Eritrócitos 2,7 x 10^9/L; Hemoglobina 7,6 g/dL; Leucócitos 8 700/mm³.

Fezes: Pesquisa de sangue oculto Positivo.

Qual dos seguintes é o exame de diagnóstico adicional mais adequado?

(A) Colonoscopia.
(B) Doseamento do ferro sérico.
(C) Medulograma.
(D) Retosigmoidoscopia flexível
(E) Trânsito do intestino delgado.

Resposta correta: A

Comentário
Trata-se de uma mulher de 57 anos, com sintomatologia constitucional (fadiga
progressiva) e com sinais de taquicardia, palpitações e dispneia de esforço. Apresenta
anemia e uma PSOF positiva. Perante um maior esforço no aporte de O2 aos tecidos
resultante da gravidade da anemia, antendendo a uma PSOF positiva, as NOCs indicam
que deverá ser efectuado um estudo endoscópico (diagnóstico e com eventual intuito
terapêutico) para excluir perda hemática pelo tudo digestivo (alínea A – colonoscopia).
As NOCs são inequívocas quando mencionam “Perante um teste imunoquímico positivo
deve ser prescrita uma colonoscopia total (Nível de Evidência I, Grau de Recomendação
A)”. Não obstante, será necessário após descoberta e tratamento de eventual foco de
perda hemática por estudo endoscópico, oportunamente corrigir também a ferropenia
(nesse contexto a cinética de ferro será também sempre necessária). A identificação
por parâmetros laboratoriais de ferropenia poderá entrar no limiar da futilidade
terapêutica se não se identificar causa/foco das perdas hemáticas pelo tubo digestivo.

Referências bibliográficas

 Schwartz página 1208, Manual Digestivo Capítulo 40.4


 NOC 0003/2014 Rastreio oportunístico do cancro do cólon e recto)
 Harrison Capítulo 44 Hemorragia GAstrointestinal Página 275 “Positive Fecal Occult
blood test :Fecal occult blood testing is recommended only for colorectal cancer
screening, beginning at age 50 in average-risk adults. A positive test necessitates
colonoscopy. If evaluation of the colon is negative, further workup is not
recommended unless iron-deficiency anemia or GI symptoms are present.”
 

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Ainda assim, do ponto de vista conceptual, as informações laboratoriais veiculadas são


ambíguas. Trata-se de uma mulher nórdica, de 57 anos. Quando à data se dispõe de uma
PSOF, salvo achado inaugural no decurso de rastreio oportunístico, será expectável
possuir também já uma cinética de ferro (e eventual doseamento de B12 e ácido fólico –
às quais não há qualquer menção no enunciado). Ainda que altamente improvável pela
ausência de informações, não seria de todo de excluir de se tratar de uma anemia
perniciosa (associada a hipotiroidismo de etiologia auto-imune que poderia agravar a
anemia, a fadiga e sensação hipotérmica; com eventual presença de anticorpos anti
células-parietais e anti-FI – aos quais não há menção; o que dificultaria a absorção de
ferro pela acloridria e a de B12 por diminuição do factor intrínseco) – recordar que a
anemia perniciosa é prevalente em mulheres na sexta década de vida, nórdicas e
associada epidemiologicamente a neoplasias gástricas. No entanto, nada no enunciado
nos aponta inequivocamente nesse sentido e o mesmo parte de antemão para a PSOF
(salto propositado de etapas), que sendo positiva, mesmo apesar da baixa sensibilidade
e especificidade, obrigará à luz das orientações actuais a estudo endoscópico – perda
hemática pelo tubo digestivo é a principal causa de anemia ferropénica (tendencialmente
condicionante de anemia microcítica) em mulheres em idade não fértil.
 

68. Um homem de 58 anos vem ao consultório médico para mostrar exames pedidos na consulta anterior por
palpitações. É portador de uma prótese mecânica em posição aórtica desde há 10 anos e está anticoagulado
com varfarina. O ecocardiograma revela um ventrículo esquerdo de dimensões normais com boa função
sistólica global e hipertrofia ventricular esquerda ligeira. O registo Holter de 24 horas deteta, pela primeira
vez, um episódio de fibrilhação auricular paroxística.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Sangue: INR 3,0.

Qual das seguintes alternativas é a opção terapêutica mais adequada neste momento?

(A) Adicionar aspirina.


(B) Adicionar inibidor direto da trombina.
(C) Ajustar a dose de varfarina dentro dos limites do INR indicados.
(D) Encerrar o apêndice auricular esquerdo por via percutânea.
(E) Suspender varfarina e prescrever inibidor direto da trombina.

Resposta correta: C

Comentário
Em doentes com fibrilhação auricular e portadores de próteses valvulares mecânicas,
a anticoagulação deve ser realizada com antagonistas da vitamina k (varfarina ou
acenocumarol). O INR alvo recomendado deve ser 2.0-3.0, com um ” time in therapeutic
range” >70%.

Referências bibliográficas

 Guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia “(Manejo de) Fibrilhação Auricular”


(2020) – página 36, figura 12 ; página 36-37, tabela “Recomendações para a
prevenção de eventos tromboembólicos na FA”
 Harrison’s Principles of Internal Medicine, 20ª edição, Tabela da Página 1748
 

69. Uma mulher de 73 anos, professora aposentada, vem à consulta de psiquiatria acompanhada pela filha
por «esquecimentos» desde há seis meses. A filha refere que tem notado que a mãe se esquece com
facilidade dos seus compromissos, tem dificuldade em acompanhar as conversas entre ambas e por vezes
não encontra as palavras certas para utensílios de uso comum. A doente não parece valorizar as queixas
descritas pela filha, mas acaba por se mostrar chorosa quando falam sobre o facto de estar agora a viver
em casa da filha. A história médica revela hipertensão arterial e hipercolesterolemia e a medicação
habitual inclui lisinopril e sinvastatina. Não é fumadora nem consome álcool habitualmente. Os sinais
vitais são temperatura 36,8°C, frequência respiratória 15/min, frequência cardíaca 70/min e pressão
arterial 125/80 mm Hg. Ela tem 169 cm de altura e pesa 71,5 kg; IMC 25 kg/m². Está globalmente
lentificada, participando pouco na consulta e respondendo muito brevemente às questões colocadas. O
humor é eutímico e os afetos reativos. Sem atividade delirante ou alucinatória. Na prova do relógio
desenhou corretamente o contorno, não colocou os números no local certo e omitiu o desenho dos
ponteiros. A TC do crânio realizada um mês antes da consulta revela atrofia cortical global, superior ao
esperado para a idade. Os resultados dos estudos analíticos encontram-se dentro dos parâmetros de
normalidade.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado na orientação desta doente?

(A) Iniciar medicação com donepezilo.


(B) Iniciar medicação com sertralina.
(C) Iniciar suplementação com ácido fólico.
(D) Não iniciar terapêutica e reavaliar em seis meses.
(E) Referenciar para terapia cognitiva e comportamental.

Resposta correta: A

Comentário
Mulher de 73 anos com quadro progressivo de pelo menos 6 meses de evolução de
distúrbios de múltiplos domínios cognitivos (memória e linguagem pela anamnese, e
viso-espacial pela prova do relógio). Além disso, vemos que há repercussão socio-
funcional, pois agora a doente precisa de viver na casa da filha. Quando há repercussão
socio-funcional, já estamos numa fase de demência (não é apenas uma deterioração
cognitiva) e o tratamento com Donepezilo está indicado, considerando a doença de
Alzheimer como principal suspeita.Especificam que não há dados sugestivos de
distúrbios afetivos e, portanto, uma pseudo-demência (distúrbio cognitivo por quadro
depressivo) parece pouco provável. Neste sentido, a sertralina e a terapia cognitiva-
comportamental não estariam indicadas. A suplementação com ácido fólico não tem
cabimento já que afirmam normalidade dos estudos analíticos.

Referências bibliográficas

 Harrison, página 3111


 

70. Um homem de 59 anos, internado após resseção anterior do reto laparoscópica por adenocarcinoma aos
7 cm da margem anal (estádio cT3N+M0), inicia quadro de dor abdominal difusa e diarreia no 5.° dia
pós-operatório. A intervenção cirúrgica decorreu sem intercorrências, após curso de radioquimioterapia
neoadjuvante. No 2.° dia pós-operatório o dreno abdominal colocado no decurso da intervenção cirúrgica
foi removido e ao 3.° dia iniciou dieta líquida, que tolerou. A história médica revela artrite reumatoide
medicada com prednisolona. Os sinais vitais são temperatura 38°C, frequência respiratória 18/min,
frequência cardíaca 110/min e pressão arterial 110/60 mm Hg; SpO2 97 % (ar ambiente). Ao exame físico
apresenta discreta distensão abdominal e dor ligeira à palpação dos quadrantes inferiores.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Proteína C reativa 150 mg/L.

Sangue: Hemoglobina 12 g/dL; Leucócitos 14 000/mm³; Plaquetas 380 x 10^9/L.

O raio-X do abdómen mostra níveis hidroaéreos escassos.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Colite isquémica.


(B) Colite pseudomembranosa.
(C) Enterite rádica.
(D) Fístula da anastomose coloretal.
(E) Gastroenterite aguda.

Resposta correta: D

Comentário
No caso de cirurgia abdominal com confeção de anastomose, a principal complicação
ao final do 5º-7º dia pós-operatório é a deiscência anastomótica. Neste caso, o doente
tem dois fatores de risco para deiscência anastomótica: tratamento neoadjuvante com
radioquimioterapia e sexo masculino.

Referências bibliográficas

 Capítulo 29 Schwartz, Manual Digestivo Capítulo 47.1


 

71. Uma mulher de 78 anos recorre ao serviço de urgência por vómitos de coloração acastanhada e dor na
região inguinocrural de início súbito, com seis horas de evolução. Refere ainda um desconforto ocasional
na raiz da coxa esquerda. A história médica revela histerectomia por miomatose. Ela tem 168 cm de altura
e pesa 51 kg; IMC18 kg/m². Os sinais vitais são temperatura 36,9°C, frequência respiratória 24/min,
frequência cardíaca 95/min e pressão arterial 100/70 mm Hg. Ao exame físico o abdómen está distendido
e apresenta tumefação na região inguinal esquerda.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 1,4 mg/dL; Proteína C reativa 110 mg/L.

Sangue: Hemoglobina 14,0 g/dL; Leucócitos 12 000/mm³; Sódio 151 mEq/L; Potássio 3,0 mEq/L.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Hérnia crural encarcerada.


(B) Hérnia do obturador encarcerada.
(C) Hérnia inguinal direta encarcerada.
(D) Hérnia inguinal indireta encarcerada.
(E) Oclusão intestinal por bridas.

Resposta correta: A

Comentário
O caso clínico apresenta uma mulher idosa com tumefação inguinal associada a um
quadro oclusivo o que corresponde mais provavelmente ao encarceramento de uma
hérnia com provável conteúdo intestinal a condicionar a obstrução. Uma vez que o caso
se refere a doente do sexo feminino, a causa mais provável é ser uma hérnia
crural/femoral encarcerada.

Referências bibliográficas

 Capítulo 37 Schwartz, Manual Digestivo Capítulo 44


 

72. Um homem de 43 anos vem ao consultório médico por queixas recorrentes de pirose e regurgitação desde
há seis meses. Não tem antecedentes patológicos de relevo. Os sinais vitais são temperatura 36,5ºC,
frequência respiratória 20/min, frequência cardíaca 60/min e pressão arterial 130/75 mm Hg. Ele tem 171
cm de altura e pesa 94 kg; IMC 32 kg/m². O exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de
normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 0,6 mg/dL; Sódio 146 mEq/L; Potássio 4,3 mEq/L.

Sangue: Hemoglobina 13 g/dL; Leucócitos 8 000/mm³.

A endoscopia digestiva alta revela a presença de hérnia do hiato com sinais de esofagite distal.

Qual das seguintes alternativas é a causa subjacente mais provável do quadro clínico descrito?

(A) Aumento da pressão do esfíncter esofágico inferior.


(B) Desenrolamento das fibras do esfíncter esofágico inferior, causando migração intra-
abdominal do esófago distal.
(C) Diminuição da pressão basal do esfíncter esofágico inferior e do comprimento da porção
intra-abdominal do esófago distal.
(D) Encerramento progressivo do ângulo de His.
(E) Hipersecreção ácida gástrica.

Resposta correta: C

Comentário
A porção distal do esófago está ancorada ao diafragama pela membrana
frenoesofágica. A fisiopatologia da hérnia do hiato consiste no desgaste desta
membrana com deslizamento da porção distal do esófago para o andar superior do
diafragma. Associado a isto, na doença de refluxo gastroesofágico há uma diminuição
da pressão basal do esfíncter esofágico inferior. A obesidade é um dos fatores que
facilita a sua ocorrência.

Referências bibliográficas

 Schwartz capítulo 25, Manual digestivo Capítulo 24.3, Cap 30.3


 

73. Um homem de 74 anos recorre ao serviço de urgência, pelas 8 horas da manhã, por incapacidade de urinar
desde há 12 horas, associada a dor hipogástrica. Refere ainda hesitação urinária, jato interrompido,
polaquiúria e noctúria (três a quatro micções noturnas) com cinco anos de evolução. Realizou estudo
analítico recente, com ureia e creatinina normais e PSA total de 2,5 ng/mL (N 0,0-4,0 ng/mL). A história
médica revela diabetes mellitus tipo 2 e dislipidemia e a medicação habitual inclui metformina, ezetimibe
e atorvastatina. Os sinais vitais são temperatura 36,6°C, frequência respiratória 19/min e frequência
cardíaca 95/min. O exame físico revela tumefação hipogástrica com macicez à percussão. Ao toque retal,
verifica-se próstata indolor, com volume superior a 70 cm3 bem delimitada, de consistência elástica e
sem nódulos identificáveis. Não há lesões endoluminais palpáveis na ampola retal; o tónus esfincteriano
é adequado e a luva não mostra presença de sangue.

Os resultados dos estudos analíticos realizados no serviço de urgência revelam:

Soro: Creatinina 2,1 mg/dL.

Sangue: Hemoglobina 13,5 g/dL; Leucócitos 5 400/mm³; Neutrófilos 45%; Linfócitos 38%.

Qual das seguintes alternativas é a causa mais provável do quadro clínico?

(A) Cancro da próstata.


(B) Hiperplasia benigna da próstata.
(C) Neoplasia do sigmoide.
(D) Neoplasia vesical.
(E) Prostatite.

Resposta correta: B

Comentário
Estamos perante um quadro clínico ilustrativo de retenção urinária aguda, traduzido
pela incapacidade de urinar, associado a dor supra-púbica e globo vesical. O doente
apresenta também antecedentes de Lower Urinary Tract Symptos (LUTS) de
esvaziamento e armazenamento sugestivos de uma barragem infravesical, como a
HBP. Para além disto, a HBP é a causa mais comum de retenção urinária aguda nos
homens. A hipótese de cancro da próstata é pouco provável associado a um PSA <4
ng/mL. O quadro de prostatite também é pouco provável num doente apirético, sem dor
perineal ou dor ao toque retal.

Referências bibliográficas

 Schwartz’s Principles of Surgery 11th Ed. (versão inglesa) – Capítulo 40 “Urologia” –


página 1768 – Subcapítulo “Emergências” e “Retenção Urinária Aguda”, primeira
linha.
 

74. Um homem de 50 anos é admitido no hospital por febre, dor abdominal e contagem de leucócitos
aumentada. A história médica revela cirrose alcoólica. O exame físico revela ausência de ruídos
hidroaéreos intestinais e dor à descompressão abdominal. A paracentese revela > 1000 granulócitos/mm³
e a coloração de Gram confirma a presença de microrganismos gram-negativos.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado na gestão deste doente?

(A) Antibioterapia.
(B) Laparoscopia.
(C) Laparotomia.
(D) Shunt venoso-peritoneal.
(E) Vigilância.

Resposta correta: A

Comentário
O caso clínico retrata um paciente com 50 anos com cirrose hepática com queixas de
febre e dor abdominal, confirmadas no exame físico. Analiticamente apresenta
leucocitose. A contagem celular do líquido ascítico mostrou >1000
granulócitos(PMN)/mm3 ). Com estes dados podemos afirmar que o doente apresenta
uma peritonite bacteriana espontânea (diagnóstico se >250PMN/mm3), uma das
complicações mais frequentes nos doentes com cirrose e ascite. Perante este
diagnóstico está indicado iniciar antibioterapia e administrar albumina (1.5g/kg no 1º
dia e 1g/kg no 3º dia).

Referências bibliográficas

 European Association for the Study of the Liver.EASL Clinical Practice Guidelines for
the management of patients with decompensated cirrhosis. 2018
 Harrison 20th Edition – Chapter 337 Cirrhosis and Its Complications p2412-2413
 

75. Uma mulher de 53 anos recorre a consulta de medicina geral e familiar por surdez flutuante progressiva
associada a zumbidos à direita com dois anos de evolução. Ela diz «Custa-me cada vez mais entender as
outras pessoas, principalmente na missa». A história médica revela sinusite crónica, há dois anos,
hipertensão arterial e diabetes mellitus tipo 2. A medicação habitual inclui ramipril, alprazolam,
metformina e cetirizina. Os sinais vitais encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade. A otoscopia
revela placas de timpanosclerose. O restante exame físico é normal.

Qual dos seguintes achados é o mais provável de encontrar na acumetria desta doente?

(A) Condução aérea melhor do que condução óssea.


(B) Condução óssea melhor do que condução aérea.
(C) Lateralização da condução óssea para a direita.
(D) Lateralização da condução óssea para a esquerda.
(E) Sem lateralização da condução óssea.

Resposta correta: A

Comentário
É-nos descrito um caso que sugere uma perda neurossensorial do ouvido direito - a
surdez flutuante é característicamente neurossensorial (doenças auto-imunes, D.
Meniere, etc.), tal como as queixas de “custa-me cada vez mais entender as outras
pessoas” (característico da surdez que afeta as altas frequências, tipo presbiacusia). O
teste de Weber (prova acumétrica descrita nas hipóteses C, D e E) compara a condução
óssea dos dois ouvidos. No caso de uma surdez neurossensorial unilateral, a via óssea
desse lado está afetada, pelo que o Weber lateralizaria ao ouvido contralateral.

Referências bibliográficas

 Basic Otorhinolatyngology: a step-by-step learning guide (pg.167-169)

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Esta pergunta parece-nos impugnável por vários motivos:

1. É-nos descrito um quadro de “surdez flutuante progressiva associada a zumbidos à


direita”. Nós aqui não percebemos se as queixas de surdez são bilaterais e o zumbido é
que afeta unicamente o ouvido direito ou se ambas as queixas dizem respeito ao ouvido
direito.

2. A surdez flutuante é característicamente neurossensorial (doenças auto-imunes, D.


Meniere, etc.), tal como as queixas de “custa-me cada vez mais entender as outras
pessoas” (característico da surdez que afeta as altas frequências). A timpanosclerose (ou
miringosclerose, como devia ser referido) pode eventualmente estar associada a uma
surdez de condução. Portanto, pelo enunciado ficamos em dúvida relativamente à
qualidade do quadro de surdez apresentado. Parece-nos, no entanto, tratar-se de uma
surdez neurossensorial.
 

3. “A otoscopia revela placas de timpanosclerose” - a otoscopia deve sempre discriminar


o ouvido a que se refere. Se os achados são comuns aos dois ouvidos, isso tem de ser
claro.

4. As alíneas A e B (aparentemente referentes ao teste de Rinne) têm obrigatoriamente


de especificar o ouvido a ser testado.

5. Por fim, e cremos que este ponto será o decisivo, para qualquer quadro de surdez
possível (surdez de condução, neurossensorial ou mista do ouvido direito), existem
sempre duas alíneas corretas. Se for uma surdez de condução, B e C são corretas. Se for
neurossensorial, A e D são corretas.
 

76. Uma mulher de 78 anos, gestora reformada, é trazida ao consultório médico pela filha para uma primeira
avaliação de alterações do comportamento e dificuldades de memória, desde há quatro meses. A filha
refere «Isto está cada vez pior... agora vê coisas». A doente sussurra que não percebe o motivo pelo qual
vem à consulta. Após ser pressionada pela filha, a doente descreve que todos os dias recebe visitas de
crianças que lhe pedem comida. A filha explica que mais ninguém consegue ver estas crianças, mas a
doente insiste que são reais. Descreve também que a doente prepara frequentemente um prato de bolachas
e um copo de leite para «as crianças». Ela não tem antecedentes patológicos de relevo, não toma
medicação e não consome bebidas alcoólicas. Os sinais vitais são frequência cardíaca 70/min e pressão
arterial 120/80 mm Hg. O exame físico revela sopro cardíaco sistólico de grau 1, fraqueza muscular ligeira
e simétrica, e ligeira diminuição das sensibilidades à vibração, ao toque superficial e à estimulação com
alfinete, na extremidade distai das pernas.

Qual dos seguintes é o exame de diagnóstico mais adequado neste momento?

(A) Ecodoppler carotídeo.


(B) Estudo toxicológico de urina.
(C) Eletromiografia.
(D) Inventário multifásico de personalidade de Minnesota.
(E) TC do crânio.

Resposta correta: E

Comentário
Mulher de 78 anos com problemas de memória e de conduta, progressivos e com 4
meses de evolução. Destaca-se também a presença de alucinações visuais recorrentes,
complexas e bem formadas (crianças que precisam de ser alimentadas) que sugere
uma demência com corpos de Lewy como principal suspeita. Além da anamnese e dos
testes neuropsicológicos, a abordagem diagnóstica deve incluir uma imagem do crânio
(TC ou RMN cerebral). A neuroimagem permite afastar causas tratáveis e pode apoiar a
suspeita diagnóstica já que, ao contrário da Doença de Alzheimer, as estruturas do lobo
temporal medial (hipocampo) estão preservadas na demência com corpos de Lewy.

Referências bibliográficas

 McKeith et al, 2017. Diagnosis and management of dementia with Lewy bodies:
Fourth consensus report of the DLB Consortium
 

77. Um homem de 61 anos vem ao consultório médico por dor no hálux direito, intensa, intermitente, e com
edema associado desde as últimas 24 horas. Não tem tido seguimento regular nos últimos dois anos.
Refere que tem tido episódios semelhantes, com dor de menor intensidade, nos últimos 12 meses e que
vai tratando, com sucesso, com naproxeno. Nega história de trauma. A história médica revela hipertensão
arterial, controlada com amlodipina. Os sinais vitais são temperatura 37,3°C, frequência cardíaca 88/min
e pressão arterial 138/90 mm Hg. Ao exame físico apresenta-se com ar desconfortável, com eritema
marcado, calor, edema e dor sobre a primeira articulação metatarsofalângica direita. Tem múltiplos
nódulos subcutâneos, surgidos nos últimos um a dois anos, nas extremidades de vários dedos dos pés e
nos 3.° e 4.° dedos da sua mão esquerda.

Qual das seguintes alternativas é a explicação mais provável para as queixas recorrentes do doente?

(A) Artrite gotosa.


(B) Artrite psoriática.
(C) Artrite reumatoide.
(D) Artrite séptica.
(E) Pseudogota.

Resposta correta: A

Comentário
A presença de sinais inflamatórios no hálux deve levantar logo a suspeita de artrite
gotosa, especialmente quando associado a episódios intermitentes prévios, a melhoria
com AINE e a nódulos subcutâneos nos dedos (prováveis tofos gotosos).

Referências bibliográficas

 Harrison 20 ed capitulo 365 pag 2631-2632: “Gout is a metabolic disease that most
often affects middle-aged to elderly men and postmenopausal women… The
metatarsophalangeal joint of the first toe often is involved, but tarsal joints, ankles,
and knees also are affected commonly… The first episode of acute gouty arthritis
frequently begins at night with dramatic joint pain and swelling. Joints rapidly
become warm, red, and tender, with a clinical appearance that often mimics that of
cellulitis. Early attacks tend to subside spontaneously within 3–10 days, and most
patients have intervals of varying length with no residual symptoms until the next
episode.”
 

78. Uma mulher de 42 anos vem ao consultório médico por aumento indolor do volume abdominal desde há
cinco dias. A história médica revela cirrose hepática desde há três anos. Os sinais vitais encontram-se
dentro dos parâmetros de normalidade. O exame físico sugere ascite.

Qual dos seguintes é o exame de diagnóstico adicional mais adequado?

(A) Cintigrafia hepática e esplénica com radionuclídeo


(B) Ecografia abdominal.
(C) Raio-X abdominal em pé.
(D) RM abdominal.
(E) TC abdominal.

Resposta correta: B

Comentário
A causa mais frequente de ascite é a cirrose hepática. Além disso, perante um doente
com cirrose hepática, a ascite é a complicação mais frequente. Geralmente a ascite
pode ser detetada através do exame físico quando ultrapassa cerca de 1500ml. O seu
diagnóstico é efetuado pela percussão: macicez dos flancos e timpanismo no
mesogastro em decúbito dorsal; em decúbito lateral a macicez mobiliza para a zona
inferior e o timpanismo para a zona superior. O exame complementar mais sensível
para a sua deteção é a ecografia abdominal, detetando quantidades mínimas (a partir
de 15ml). Pela sua fácil disponibilidade, acessibilidade e ausência de radiação ionizante
é preferível a outros métodos imagiológicos (nomeadamente TC).

Referências bibliográficas

 European Association for the Study of the Liver. EASL Clinical Practice Guidelines for
the management of patients with decompensated cirrhosis. 2018
 Harrison 20th Edition: Chapter 46 Abdominal Swelling and Ascites p283-285 + 337
Cirrhosis and its complications p2412
 

79. Um rapaz de 11 anos, de origem africana, é referenciado pelo médico de família ao serviço de urgência
por queixas de dor persistente na coxa direita desde há dois meses. A dor acorda-o frequentemente durante
a noite, sem alívio após a toma de analgésicos. Refere ainda claudicação da marcha por dor desde há um
mês. Na última semana teve febre intermitente, com temperatura máxima de 38°C. Os sinajs vitais são
temperatura 37,5°C, frequência cardíaca 90/min, frequência respiratória 17/min e pressão arterial 103/63
mm Hg. Ao exame físico apresenta discreta palidez cutânea, sem alterações à mobilização passiva ou
ativa dos membros inferiores, mas com dor à palpação da coxa direita. O restante exame físico, encontra-
se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado na gestão deste doente?

(A) Iniciar antibioterapia com flucloxacilina


(B) Iniciar ibuprofeno e reavaliar após uma semana.
(C) Pedir cintigrafia óssea.
(D) Pedir raio-X simples da região coxofemoral direita.
(E) Pedir RMN da coxa direita.

Resposta correta: D

Comentário
Estamos perante uma criança de 11 anos, com etnia africana, que apresenta dor
persistente desde há 2 meses na coxa direita, que o acorda durante a noite, claudicação
por dor desde há 1 mês, febre intermitente (máximo 38ºC) desde há 1 semana, com
palidez ao exame objetivo e dor à palpação na coxa direita, sem alteração da mobilidade
da anca. A palidez e o facto de ter etnia africana aumentam a probabilidade de esta
criança ter uma anemia de base, nomeadamente anemia falciforme ou drepanocitose.
Numa criança com provável drepanocitose e que se apresente com queixas de dor
localizada a um membro, devemos ter sempre em mente o diagnóstico de crise
drepanocítica vaso-oclusiva. Apesar de não ser comum uma clínica tão arrastada, é
possível que aconteça e, nesta fase, teria evoluído para uma necrose assética, apoiando
a clínica apresentada. Poderíamos também ponderar uma etiologia infeciosa – a
drepanocitose aumenta o risco de osteomielite e, apesar de a idade do doente não ser
a típica (osteomielite é mais comum na 1ª década de vida, especialmente até aos 3-4
anos), a clínica também apoia este diagnóstico. Para efetuar este diagnóstico
diferencial, e tendo em conta que temos 2 meses de evolução, poderíamos pedir uma
radiografia simples da coxa direita. A ressonância magnética poderia ser uma opção,
mas consideramos que será mais plausível numa 2ª fase. Uma cintigrafia poderia fazer
sentido à posteriori na suspeita de osteomielite.

Referências bibliográficas

 Manual de Diagnostico y Terapeutica en Pediatria” (6ª edição) - capítulo 18.2, página


260 (tabela 18.2-1); capítulo 111, página 1129 (2 últimos parágrafos) e página 1130
(1º e 2º parágrafos); capítulo 154, página 1480 (3º parágrafo) e página 1481 (8º e 9º
parágrafos)
 

80. Uma mulher de 50 anos vem ao serviço de urgência por dor abdominal tipo cólica, náuseas e vómitos
fecaloides com 24 horas de evolução. Refere que não tem tido emissão dé gases ou fezes nas últimas 48
horas. A história médica revela histerectomia há sete anos devido a hemorragia uterina anómala por
miomas uterinos. Apresenta sensibilidade significativa à palpação dos quadrantes inferiores do abdómen.
O exame físico revela distensão abdominal e a auscultação abdominal revela ruídos intestinais hipoativos
de tom metálico.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Pedir colaboração do serviço de gastrenterologia


(B) Preparar a doente para exploração cirúrgica.
(C) Requisitar ecografia abdominal.
(D) Requisitar estudo baritado do trânsito esófago-gastro-duodenal.
(E) Requisitar sigmoidoscopia fibroendoscópica.

Resposta correta: B

Comentário
Neste caso clínico estamos perante uma mulher com antecedentes cirúrgicos
(histerectomia) que se apresenta com um quadro de dor abdominal tipo cólica,
distensão abdominal, vómitos fecalóides e paragem de emissão de gases e fazes,
podemos assim suspeitar como diagnóstico mais provável uma oclusão intestinal por
bridas. Clinicamente, a distensão abdominal e timpanismo é compatível com obstrução
com distensão a montante. Os vómitos fecalóides são explicados pelo sobrecrescimento
bacteriano. Quanto ao tratamento inicial, dado tratar-se de uma obstrução completa, a
doente tem indicação cirúrgica, devendo assim ser nossa prioridade preparar a doente
para exploração cirúrgica, com fluidoterapia, reposição electrolítica e descompressão
intestinal (com a colocação de uma sonda nasogástrica).
 

Referências bibliográficas

 Harrison, capítulo 323, página 2295 - “Open operations of the lower abdomen,
including appendectomy and colorectal and gynecologic procedures, are especially
likely to create adhesions that can cause bowel obstruction (Table 323-2).” “The
cardinal signs are colicky abdominal pain, abdominal distention, emesis, and
obstipation. More intraluminal fluid accumulates in patients with distal obstruction,
which typically leads to greater distention, more discomfort, and delayed emesis.
This emesis is feculent when there is bacterial overgrowth. Patients with more
proximal obstruction commonly present with less abdominal distention but more
pronounced vomiting. Elements of the history that might be helpful include any prior
history of surgery, including herniorrhaphy, as well as any history of cancer or
inflammatory bowel disease.” “Classically, many patients with early small-bowel
obstruction will have high-pitched, “musical” tinkling bowel sounds and peristaltic
“rushes” known as borborygmi. Later in the course of disease, the bowel sounds may
be absent or hypoactive as peristaltic activity decreases.” “Nasogastric tube suction
decompresses the stomach, minimizes further distention from swallowed air,
improves patient comfort, and reduces the risk of aspiration. Urine output should be
assessed using a Foley catheter. In some cases, for example, in patients with cardiac
disease, central venous pressures should be monitored. The use of antibiotics is
controversial, although prophylactic administration may be warranted if operation is
anticipated. Complete bowel obstruction is an indication for intervention.”
 Harrison cap. 323 pág 2298 - “In most circumstances, early consultation with a
surgeon is prudent when there is concern about strangulation obstruction or other
abnormality that needs to be addressed urgently. Deterioration signifies a need for
intervention.”
 

81. Uma menina de 3 anos é trazida ao serviço de urgência por claudicação da marcha com noção de limitação
da mobilização da anca esquerda nos últimos dois dias, associada a febre (máximo 39°C). O pai nega
trauma recente e refere episódio de varicela há duas semanas. Ao exame físico apresenta-se colaborante,
corada e hidratada, com várias lesões em crosta dispersas, algumas nos membros inferiores com rubor
perilesional e exsudado amarelado associado. As ancas não apresentam sinais inflamatórios e existe
limitação à flexão passiva e ativa da anca esquerda. O restante exame físico, incluindo a auscultação
cardíaca e pulmonar e o exame abdominal, encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual dos seguintes agentes microbiológicos é a causa mais provável deste quadro clínico?

(A) Escherichia coli.


(B) Kingella kingae.
(C) Pseudomonas aeruginosa.
(D) Staphylococcus aureus.
(E) Streptococcus agalactiae

Resposta correta: D

Comentário
A presença de claudicação na marcha associada a limitação da mobilização da anca
deve-nos fazer pensar em patologia articular. O facto de ser uma monoartrite aguda
associada a febre deve levantar a suspeita de artrite séptica. A ausência de sinais
inflamatórios na anca não exclui artrite séptica uma vez que a articulação coxofemural
é profunda e dificilmente serão perceptíveis os sinais inflamatórios ao exame fisico. O
agente mais provável da artrite séptica é o Staphylococcus aureus e a existência de
lesões cutâneas em crosta com rubor perilesional e exsudado amarelo corrobora a
hipótese de impetigo associado ao Staphylococcus aureus.

Referências bibliográficas

 Harrison 20 ed capítulo 125 Infectious Arthritis Pag 939-940 In infants, group B


streptococci, gram-negative enteric bacilli, and S. aureus are the most common
pathogens. Since the advent of the Haemophilus influenzae vaccine, the predominant
causes among children <5 years of age have been S. aureus, Streptococcus
pyogenes (group A Streptococcus), and (in some centers) Kingella kingae.
 

82. Uma primigesta de 23 anos vem ao consultório médico, às oito semanas de gestação, para a 2.ª consulta
de vigilância pré-natal. Os resultados das análises laboratoriais ao sangue, solicitados na consulta anterior
de há quatro semanas, são normais, exceto para o antigénio de superfície da hepatite B, que é positivo.

Qual dos seguintes é o passo mais adequado para a prevenção de hepatite neste feto?

(A) Administrar imunoglobulina à mãe, neste momento.


(B) Administrar imunoglobulina e vacina contra a hepatite B ao recém-nascido, na altura do
parto.
(C) Iniciar o programa de vacinação contra a hepatite B à mãe, neste momento.
(D) Não fazer nada; não é necessário nenhum tratamento porque a mãe tem anticorpos.
(E) Recomendar não fazer aleitamento materno a este recém-nascido.

Resposta correta: B

Comentário
O recém nascido deve fazer imunoprofilaxia e iniciar o esquema de vacinação HBV.
Perante uma grávida com Ag Hbs positivo, deve ser pedido o estudo serológico
completo, carga viral VHB, provas de função hepática e coagulação. A vacinação não
está contraindicada na gravidez mas apenas está indicada em gravidas com Ag Hbs e
Ac anti-Hbs negativos e fatores de risco (profissional de saúde, diabetes, consumo de
drogas, múltiplos parceiros sexuais ou infeção sexualmente transmissível
recentemente diagnosticada. Apesar da presença do Ag Hbs no leite materno, a
amamentação não está contraindicada.

Referências bibliográficas

 Beckmann 7th edition, P153 “Immunizations”, 2º paragrafo; P250 “Hepatitis” 1º


paragrafo linhas 6-8, 2º paragrafo
 

83. Uma mulher de 33 anos vem ao consultório médico por cervicalgia, acompanhada ocasionalmente por
diminuição da sensibilidade e parestesias no braço esquerdo. A doente esteve envolvida num pequeno
acidente de viação num parque de estacionamento duas semanas antes. Foi pedida uma RM cervical e no
dia desse exame, o médico é contactado pelo técnico de radiologia, que indica que a doente «enlouqueceu»
dentro do equipamento de RM e recusa completar o estudo. A doente exige falar com o médico e refere:
«Não aguento estar fechada. Entrei em pânico e não consigo fazer isto! Tem de me dar alguma coisa para
eu conseguir relaxar.» Quando o médico sugere reagendar o exame, a doente começa a chorar e explica
que o marido faltou ao trabalho para ficar a tomar conta dos filhos, que a irmã veio de longe para a trazer
ao exame e que seria impossível regressar noutro dia.

Qual dos seguintes é o plano mais adequado neste momento?

(A) Administrar alprazolam oral.


(B) Administrar morfina intramuscular.
(C) Administrar propofol endovenoso.
(D) Cancelar a RM e pedir uma TC.
(E) Informar a doente que a sedação em ambulatório não é segura.

Resposta correta: A

Comentário
Neste caso clínico não nos é fornecida informação suficiente para dizer que a doente
teve uma crise de pânico, nem para saber se já teria, por exemplo, fobia a espaços
fechados ou sem janelas (antiga “claustrofobia”). No entanto parece claro que a doente
apresentou um pico de ansiedade que a própria descreve como pânico, grave o
suficiente para interromper o exame. Tendo em conta que a doente se mostra disponível
para fazer o exame caso seja administrada algum tipo de terapêutica ansiolítica, e que
por uma questão de logística pessoal da própria o ideal seria fazer já o exame, não há
razão para não agir conforme o desejo da doente e de maneira a conseguir fazer o
exame complementar de diagnóstico, ainda para mais quando fica subentendido no
enunciado que a doente não veio a conduzir - “(…) a irmã veio de longe para a trazer ao
exame” - e portanto não há contra-indicação para fazer uma terapêutica que possa ter
efeitos secundários sedativos. Dentro das hipóteses sugeridas, aquela que tem menos
efeitos adversos, é mais fácil de administrar e é menos invasiva é o alprazolam, que
mesmo no grupo das benzodiazepinas, tem um perfil particularmente pouco sedativo,
apesar da sua elevada potência ansiolítica. Outra vantagem do alprazolam é a rapidez
com que se começa a verificar a sua ação e ter um tempo de semi vida curto. Tanto o
propofol EV, como a morfina IM, exigem outro tipo de via de administração e
monitorização, que dificultaria a sua utilização nesta situação em específico ou em
situações semelhantes. Na suspeita de patologia herniária discal a RMN é o estudo mais
indicado. Em casos de contraindicação absoluta pode-se fazer TC em vez de RMN, o que
não é o caso, uma vez que é uma situação contornável. Por outro lado, nada nos garante
que a doente não fique tambem bastante ansiosa na TC. Na verdade, a sedação com
alprazolam por exemplo, é bastante segura, principalmente tendo em conta que a
doente veio acompanhada.
 

Referências bibliográficas

 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Anxiety and Obsessive-


Compulsive Disorders”, secção “Panic Disorder”, pág 182
 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Psychiatry and Medicine”,
secção “Psychiatric Services in Medical Settings”, pág 659;
 

84. Um homem de 59 anos, motorista, vem ao consultório médico por ter dejeções diárias de fezes moles
(média de 5/dia), com seis meses de evolução. Adicionalmente teve emagrecimento de 12 % do peso
corporal nesse período. A história médica inclui pancreatite crónica, de etiologia alcoólica. Consome
cinco bebidas alcoólicas por dia e fuma (40 UMA). Os sinais vitais são temperatura 36,5°C, frequência
cardíaca 76/min e pressão arterial 130/85 mm Hg. Ao exame físico observa-se edemas ligeiros dos
membros inferiores. O abdómen é indolor à palpação. O restante exame físico encontra-se dentro dos
parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Glicemia 110 mg/dL; AST 78 U/L; ALT 35 U/L; Albumina 2,7 g/dL.

Sangue: Hemoglobina 13 g/dL; VGM 100 fL.

Qual das seguintes alternativas é a explicação mais provável para a condição deste doente?

(A) Causa osmótica.


(B) Causa secretória.
(C) Esteatorreia.
(D) Inflamação crónica.
(E) Neuropatia visceral.

Resposta correta: C

Comentário
O caso clínico ilustra um paciente com o diagóstico de pancreatite crónica de provável
etiologia tóxica (fatores de risco/etiológicos: álcool e tabagismo). As queixas de diarreia
geralmente ocorrem numa fase avançada em que há ~90% de destruição do tecido
pancreático. O défice de enzimas, nomeadamente da lipase leva à deficiente absorção
de gorduras que acabam excretadas nas fezes sob a forma de ESTEATORREIA (a má
absorção de hidratos de carbono é menos frequente devido á ação da amilase salivar).
A diarreia, quando intensa (este doente tem um curso prolongado de cerca de
5dejeções/dia), está associada a perda ponderal e desnutrição, como é o caso deste
paciente. Os edemas dos membros inferiores são justificados pela hipoalbuminemia.

Referências bibliográficas

 Harrison 20th Edition Chapter 341 Acute and Chronic Pancreatitis p2446-2447 + 42
Diarrhea and Constipation p264
 

85. Um lactente de 5 meses é trazido ao consultório médico pela mãe, para orientação acerca do início da
diversificação alimentar, uma vez que vai reiniciar o trabalho. Tem estado sob aleitamento materno
exclusivo desde o nascimento, com evolução estaturo-ponderal adequada. Não tem antecedentes pessoais
de relevo. Os antecedentes familiares incluem asma e rinite alérgica nos pais e irmã mais velha.

Até à próxima reavaliação em 15 dias, qual das seguintes recomendações é a mais adequada?

(A) Iniciar caldo de legumes com carne.


(B) Iniciar fórmula infantil extensamente hidrolisada.
(C) Iniciar fórmula infantil parcialmente hidrolisada.
(D) Iniciar iogurte sem lactose.
(E) Iniciar papa de cereais.

Resposta correta: E

Comentário
Este caso fala de um lactente que vai à consulta, levado pela mãe, para obter
orientações acerca da diversificação alimentar. A diversificação alimentar pode ocorrer
entre os 4 meses e 1 semana e os 6 meses e 1 semana. O 1º grupo de alimentos que
poderá ser introduzido é o dos hortofrutícolas ou o dos cereais, ou seja, o creme de
legumes, a fruta ou a papa (opção E). A proteína animal não láctea, como a carne, deve
ser introduzida ao 6º mês (opção A errada). O iogurte poderá ser introduzido a partir
dos 8 - 9 meses (opção D errada). A fórmula infantil extensamente hidrolisada reserva-
se para lactentes com alergia às proteínas do leite de vaca (opção B errada).

Referências bibliográficas

 Alimentação Saudável dos 0 aos 6 anos – Linhas De Orientação Para Profissionais E


Educadores (DGS, 2019) - Capítulo 4.3, página 58 (2º parágrafo), 64 (1º parágrafo) e
65 (1º parágrafo).
 Hydrolyzed Formulas for Allergy Prevention (ESPGHAN 2014) - página 13, 1º
parágrafo.

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Apesar de o caso clínico dizer que o objetivo da mãe é obter orientações acerca do início
da diversificação alimentar, o guia da DGS para alimentação dos 0 aos 6 anos é claro nas
suas recomendações de 2019: “(…) o leite materno ou, na sua ausência, uma fórmula
infantil para lactente, suprem, em exclusivo, as necessidades nutricionais da maioria dos
lactentes saudáveis até aos 6 meses de vida (WHO, 2002; ESPGHAN)” (ponto 4.3, página
58). Portanto, das opções apresentadas, a mais correta seria a opção C, uma fórmula
infantil parcialmente hidrolisada, dado o lactente ter familiares em 1º grau com doença
atópica. Seria também desejável que existisse uma opção de resposta que incentivasse
e informasse a mãe acerca de como manter o aleitamento materno em exclusivo mesmo
reiniciando o trabalho, dado ser o melhor alimento para o bebé até aos 6 meses.
 

86. Um homem de 48 anos é avaliado no domicílio por quadro de dor, distensão abdominal e obstipação com
sete dias de evolução. Refere ainda anorexia intensa, mas com tolerância alimentar. Tem diagnóstico de
carcinoma do pâncreas metastizado, sob tratamento sintomático, e está acamado e dependente nas
atividades da vida diária. A medicação habitual inclui fentanilo transdérmico, fentanilo sublingual,
meloxicam, metoclopramida, pregabalina, mirtazapina, omeprazol e lactulose. Os restantes antecedentes
pessoais são irrelevantes. Os sinais vitais são temperatura 36°C, frequência respiratória 16/min,
frequência cardíaca 70/min e pressão arterial 96/60 mm Hg; SpO2 98 % (ar ambiente). Ele tem 176 cm
de altura e pesa 45 kg; IMC 14 kg/m². Ao exame físico encontra-se acamado; observa-se caquexia com
palidez cutânea e ligeiramente desidratado. A auscultação cardíaca e pulmonar não revela alterações. O
abdómen encontra-se distendido e timpanizado, com desconforto à palpação profunda, sem sinais de
irritação peritoneal. Os ruídos hidroaéreos encontram-se diminuídos em intensidade e frequência.

Qual das seguintes é a causa mais provável para o quadro abdominal recente do doente?

(A) Carcinomatose peritoneal.


(B) Diminuição do aporte alimentar.
(C) Hipocaliemia.
(D) Hipomagnesemia.
(E) Iatrogenia medicamentosa.

Resposta correta: E

Comentário
O doente apresenta quadro clínico de distensão abdominal desde há 7 dias com
abdómen timpanizado e desconforto à palpação profunda. Como antecedentes
relevantes tem neoplasia do pâncreas em estádio IV em estratégia sintomática,
atualmente com estado geral muito debilitado (acamado, dependente nas atividades de
vida diárias e com caquexia) e a realizar terapêutica com opioides (fentanilo). Um dos
principais efeitos secundários da terapêutica opioide é a obstipação (ate 60% dos
doentes), que ocorre por diminuição do peristaltismo. Na prescrição de um opioide deve
prescrever-se concomitantemente terapêutica laxante e avaliar a necessidade do seu
ajuste. De entre as opções indicadas, a iatrogenia medicamentosa pelos opioides é a
mais provável, uma vez que o doente apresenta obstipação, com diminuição de
peristaltismo, o que contribui para timpanização e diminuição dos ruídos hidroaéreos.
A carcinomatose peritoneal é também uma causa possível, embora esta apresente com
maior frequência fenómenos suboclusivos /oclusivos, associada a náuseas e vómitos,
podendo por vezes constatar-se implantes peritoneais na palpação abdominal,
cursando frequentemente também com ascite. A diminuição do aporte alimentar e
restantes distúrbios eletrolíticos, se presentes, também podem contribuir de alguma
forma para obstipação, mas perante o quadro clínico não devem ser as primeiras a ser
consideradas.
 

Referências bibliográficas

 Diagnosis, assessment and management of constipation in advanced cancer: ESMO


Clinical Practice Guidelines. 2018; HPIM 20th página 513 (intestinal obstruction) -
para diagnóstico diferencial com carcinomatose peritoneal
 

87. Um homem de 55 anos recorre ao serviço de urgência queixando-se de olho vermelho doloroso
acompanhado de fotofobia e diminuição da visão. Os sintomas iniciaram há dois dias tendo agravado
progressivamente. Adicionalmente, o doente refere xerostomia e dores articulares difusas não específicas.
A história médica inclui transplante de córnea no olho direito há 20 anos e diabetes mellitus tipo 2
diagnosticada há 10 anos. Ao exame oftalmológico apresenta uma acuidade visual de 5/10 no olho direito
e de 10/10 no olho esquerdo, anisocoria com miose no olho direito. Após aplicação local de midriático
observa-se dilatação irregular da pupila do olho direito. A oftalmoscopia encontra-se dentro dos
parâmetros de normalidade em ambos os lados. Os resultados dos estudos analíticos revelaram velocidade
de sedimentação eritrocitária 10 mm/1.ª hora, hemoglobina A1C 6,2 % e hemograma dentro dos
parâmetros de normalidade.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Conjuntivite virusal


(B) Falência de transplante corneano.
(C) Glaucoma agudo.
(D) Úlcera corneana neurotrófica.
(E) Uveíte anterior.

Resposta correta: E

Comentário
A opção correta é a E - uveíte anterior. A uveíte anterior, também designada de irite ou
iridociclite, cursa com um olho vermelho doloroso, fotofobia e diminuição da acuidade
visual. Geralmente, os doentes apresentam-se com uma miose hiporreativa e podem
apresentar sinéquias posteriores (adesões da íris à face anterior do cristalino). Quando
procedemos à dilatação pupilar, algumas destas adesões podem desfazer-se e outras
manter-se, levando a uma dilatação pupilar irregular, como descrito no caso.
Adicionalmente, é referido que o doente tem antecedentes de patologia potencialmente
auto-imune (xerostomia e dores articulares difusas), que pode igualmente ser
associada a quadros de uveíte. A opção A está incorrecta porque a conjuntivite viral
geralmente não se associa a dor, fotofobia, nem diminuição da acuidade visual (a não
ser que estejam presentes infiltrados subepiteliais). Por outro lado, não nos falam de
secreções serosas ou seromucosas, reação folicular, nem de adenopatia pré-auricular,
que nos fariam suspeitar deste diagnóstico. Embora a opção B, de falência do
transplante corneano, possa cursar com olho vermelho, redução da acuidade visual e
dor, é mais comum que seja diagnosticada num doente assintomático num exame de
rotina. Por outro lado, nada nos dizem relativamente à transparência corneana, à
presença de infiltrados queráticos ou de outros sinais de falência do enxerto. De referir
também que na falência do transplante corneano, não é característico ocorrer miose
nem dilatação pupilar irregular. A opção C (glaucoma agudo), apesar de estar associada
a hiperemia ocular e dor, por vezes muito exuberante, acompanha-se de uma midríase
pupilar arreativa e não de miose. Por outro lado, não é feita qualquer referência à subida
de pressão intra-ocular, característica de um quadro de glaucoma agudo. A úlcera
corneana neurotrófica (opção D), é uma úlcera estéril, que se associa à falta de
sensibilidade corneana. As queratoplastias, como o transplante de córnea, podem
predispor a este tipo de úlceras. No entanto, o facto de referirem um olho vermelho
 

doloroso e de não fazerem referência a qualquer úlcera ou defeito epitelial da córnea,


faz-nos excluir este diagnóstico.

Referências bibliográficas

 The Wills Eye Manual, 7th Edition -Capítulo 12.1 (Uveítes Anteriores), parágrafo 1
(sintomas agudos) e 7 (outros sintomas); Capítulo 5.1 (Conjuntivites agudas),
parágrafo 2 (conjuntivite viral) ; Capítulo 4.28 (Rejeição de Transplante), parágrafos
1, 2 e 3 ; Capítulo 9.4 (Glaucoma agudo), parágrafos 1 e 2 ; Capítulo 4.6 (Queratopatia
neurotrófica), parágrafos 1,2 e 3
 

88. Um homem de 59 anos é trazido ao serviço de urgência por colúria, acolia e prurido generalizado com 10
dias de evolução. Menciona ainda dorsolombalgia desde há um mês. A história médica revela diabetes
mellitus diagnosticada há dois meses e a medicação habitual inclui metformina. É fumador de 20 UMA e
menciona consumos diários de álcool, num total de cerca de 80 g por dia. Ao exame físico apresenta
icterícia cutâneo-mucosa, lesões dispersas de coceira e telangiectasias faciais. O abdómen é indolor à
palpação e apresenta submacicez nos flancos. Sem hepatoesplenomegalia palpável. A vesícula biliar é
palpável e indolor.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Carcinoma hepatocelular.


(B) Colangiocarcinoma perihilar.
(C) Neoplasia do pâncreas.
(D) Pancreatite autoimune
(E) Quisto da via biliar tipo V.

Resposta correta: C

Comentário
O caso clínico aborda um paciente com história provável de pancreatite crónica
associada a consumos alcoólicos abusivos e tabagismo (dor abdominal dorsolombar e
diabetes mellitus). O aparecimento recente de icterícia, colúria, acolia e prurido é a favor
de icterícia obstutiva. A presença de uma vesícula palpável e indolor sugere
malignidade (sinal de Courvoisier). Os doentes com pancreatite crónica têm um risco
aumentado de neoplasia pancreática. O diagnóstico de um adenocarcinoma da cabeça
do pâncreas justifica a clínica apresentada pelo doente. A ascite poderá ser de etiologia
maligna ou associada a hepatopatia crónica. A presença de um colangiocarcinoma peri-
hilar poderia estar associado a icterícia obstrutiva mas não justificaria o sinal de
Courvoisier (a obstrução seria proximal à junção entre o ducto cístico e colédoco). Os
fatores de risco / hábitos do paciente tornam menos provável a etiologia da pancreatite
crónica ser auto-imune (não esquecer que em 2/3 dos casos a pancreatite auto-imune
pode apresentar-se com icterícia obstrutiva).

Referências bibliográficas

 Harrison 20th Edition – Chapter 79 Pancreatic Cancer p593


 

89. Um rapaz de 7 anos é trazido ao consultório médico pela mãe por hematúria na 1.ª micção da manhã, há
quatro horas. Ele não teve febre ou outros sintomas. A mãe refere infeções respiratórias superiores
frequentes, a mais recente há cerca de duas semanas, com resolução espontânea em alguns dias. Ele não
tem antecedentes patológicos de relevo e não faz medicação habitual. O programa nacional de vacinação
está atualizado. Está a evoluir no percentil 50 de peso, altura e IMC. Os sinais vitais são temperatura
37,2°C, frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca 84/min e pressão arterial 124/84 mm Hg. Ao
exame físico apresenta edema periorbitário bilateral, sem outras alterações.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: C3 48 mg/dL (N = 88-155); C4 20 mg/dL (N = 12-32); TASO 600 unidades Todd (N < 200).

Urina: Densidade 1 015 (N = 1 003-1 029); pH 7,0; Proteínas 3+; Glucose Negativo; Cetonas Negativo;
Sangue 4+; Nitritos Negativo; Eritrócitos Numerosos (impossível contabilizar); Leucócitos 0-2/cga;
Cilindros Positivo.

Qual das seguintes alternativas é a consequência a longo prazo mais provável neste contexto clínico?

(A) Doença renal crónica.


(B) Edema intermitente.
(C) Hipertensão arterial.
(D) Odinofagia recorrente.
(E) Ausência de sequelas.

Resposta correta: E

Comentário
O quadro descrito aponta para uma glomerulonefrite pós-estreptocócica: criança, com
quadro de infecção respiratória recente (período de latência de 2 semanas) e
actualmente com sinais sugestivos de síndrome nefrítico (proteinúria e hematúria,
embora não forneçam valores de função renal), consumo de C3 e TASO positivo. Esta é
uma entidade frequente nas crianças e o prognóstico é bastante favorável, com
resolução do quadro após tratamento sintomático (mecanismo imunomediado), não se
prevendo complicações a longo prazo (resposta E correcta).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª edição, parte 9 (doenças do rim e trato urinário), capítulo 308 (doenças
glomerulares), páginas 5189-5190.
 

90. Uma mulher de 28 anos vem ao serviço de urgência por astenia marcada desde há sete dias, após quadro
febril não investigado. Ela não tem antecedentes patológicos de relevo. Os sinais vitais são frequência
cardíaca 64/min e pressão arterial 100/60 mm Hg. Ela tem 168 cm de altura e pesa 58 kg; IMC 21 kg/m².
Ao exame físico apresenta petéquias e equimoses nos membros inferiores, palidez da pele e mucosas e
escleróticas subictéricas.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 1,0 mg/dL; Azoto ureico 17 mg/dL; AST 75 U/L; Bilirrubina total 2,1 mg/dL;
Desidrogenase láctica (LDH) 185 U/L.

Sangue: Hemoglobina: 8,2 g/dL; VGM 100 fL; Leucócitos 7 500 mm³; Neutrófilos, segmentados 62%;
Linfócitos 30%; Monócitos 7%; Plaquetas 28 × 10^9/L; Tempo de protrombina 11 segundos; Tempo de
tromboplastina parcial ativada 25 segundos.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Anemia hemolítica imune.


(B) Coagulação intravascular disseminada.
(C) Deficiência em vitamina B12.
(D) Leucemia monocítica aguda.
(E) Púrpura trombótica trombocitopénica.

Resposta correta: E

Comentário
Trata-se de uma doente jovem que se apresenta com um quadro de
petéquias/equimoses, febre, anemia, trombocitopenia e hiperbilirrubinemia, devendo
fazer suspeitar da uma PTT (resposta E correta), apesar da LDH estar normal e da
aparente ausência de um quadro neurológico e renal. Não nos é dado o resultado do
teste de Coombs para podermos afirmar que se trata de uma anemia hemolítica imune
(resposta A incorreta) e as provas de coagulação estão normais, excluindo uma
coagulação intravascular disseminada (resposta B incorreta). Apesar do VGM
aumentado não se pode afirmar tratar-se de uma deficiência da vitamina B12 sem
excluir outras causas e sem ser dado o valor da vitamina B12 (resposta C incorreta). De
igual forma, a leucemia monocítica aguda é pouco provável dada a ausência de
alterações do leucograma (resposta D incorreta).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª edição, parte 4 (oncologia e hematologia), secção 3, capítulo 111


(distúrbios das plaquetas e da parede vascular), páginas 2177-2180.
 

91. Uma mulher de 59 anos vem ao consultório médico por dor e diminuição da sensibilidade do membro
superior direito com agravamento nas últimas duas semanas. Ela tem tido dificuldade no uso do membro
superior direito, especialmente quando se penteia. Ao exame físico apresenta fraqueza dos músculos do
ombro direito e do bicípite direito. Ao exame neurológico os reflexos bicipitais e tricipitais direitos estão
ausentes. Os movimentos da coluna cervical são normais.

Qual dos seguintes é o diagnóstico mais provável?

(A) Espondilose cervical.


(B) Rotura da coifa dos rotadores.
(C) Rotura do bicípite.
(D) Tendinite do bicípite.
(E) Tendinite do supraespinhoso.

Resposta correta: A

Comentário
Trata-se de uma paciente com clínica motora e sensitiva de membro superior direito.
Se bem que a dor e a fraqueza muscular ao pentear-se são relativamente inespecíficas,
a diminuição de sensibilidade e alterações dos reflexos só pode indicar uma lesão de
características neurológicas (e não musculares). Desta forma, descartam-se as opções
B, C, D e E, todas elas referentes a lesões exclusivamente musculo-tendinosas. Além
disso, o território afectado depende da função de raizes nervosas provenientes da
região cervical, pelo que, das opções apresentadas, somente a A - Espondilose cervical
- poderia ser compatível com o quadro clínico apresentado pela paciente.

Referências bibliográficas

 Harrison 20 ed Capítulo 14 Back and Neck Pain pág. 100, tabela 14-4. Typical
patterns of reflex, sensory, and motor changes that accompany cervical nerve root
lesions are summarized in Table 14-4. CERVICAL SPONDYLOSIS: Osteoarthritis of
the cervical spine may produce neck pain that radiates into the back of the head,
shoulders, or arms, or may be the source of headaches in the posterior occipital
region…Osteophytes, disk protrusions, or hypertrophic facet or uncovertebral joints
may alone or in combination compress one or several nerve roots at the
intervertebral foramina
 Cecil Capítulo 111 Headache, Neck and Back Pain and Cranial Neuralgias, Pag 1000.
”Patients with root irritation (cervical radiculopathy) complain of pain and
paresthesias radiating down the arm roughly in the dermatomal distribution of the
affected nerve root. More typically, the pain radiates in a myotomal pattern, whereas
numbness and paresthesias follow a dermatomal distribution. Discrete sensory loss
is uncommon and less prominent … Objective neurologic findings may be limited to
reflex asymmetry because weakness may be obscured by pain.”
 

92. Um homem de 44 anos recorre ao serviço de urgência por dispneia intensa com agravamento desde há
três horas. Refere mialgias, febre (temperatura máxima de 38,5°C), tosse seca e dores na «garganta» desde
há três dias. A história médica revela hipertensão arterial, medicada com lisinopril e hidroclorotiazida. Os
sinais vitais são temperatura 38,5°C, frequência respiratória 26/min, frequência cardíaca 110/min e
pressão arterial 160/100 mm Hg. Ao exame físico tem ar angustiado. A auscultação pulmonar revela
crepitações bilaterais em todos os campos. A auscultação cardíaca encontra-se dentro dos parâmetros de
normalidade. O abdómen apresenta discreta distensão, sem outras alterações. Os membros inferiores não
têm edemas.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 1,0 mg/dL; Glucose 90 mg/dL; Proteína C reativa 36 mg/L.

Sangue: Hemoglobina 14 g/dL; Leucócitos 6 000/mm³; Plaquetas 150 x 10^9/L;

Gases (FiO2 80 %): PO2 50 mm Hg; PCO2 25 mm Hg; pH 7,46; Bicarbonato 18 mEq/L; PaO2/FiO2
62,5.

O raio-X do tórax, tirado na maca no serviço de urgência, está representado na imagem:

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado na avaliação diagnóstica deste doente?

(A) Broncofibroscopia.
(B) Cateterismo das artérias coronárias.
(C) Colheita de secreções para microbiologia.
(D) Ecocardiograma.
(E) TC do tórax.

Resposta correta: D
 

Comentário
O caso clínico é sugestivo de um síndrome de dificuldade respiratória aguda. O
diagnóstico é estabelecido pela presença de uma lesão de início agudo (neste caso,
parece tratar-se de uma infeção respiratória, dadas a dispneia intensa, tosse seca,
odinofagia, mialgias, febre e o aumento da PCR), hipoxemia e infiltrados difusos
bilaterais. A única alternativa com interesse diagnóstico perante um SDRA é o
ecocardiograma, de modo a excluir edema pulmonar cardiogénico.

Referências bibliográficas

 Harrison, 20ªed, Cap 294, “Acute Respiratory Distress Syndrome”, pg 2030-2031,


”Acute respiratory distress syndrome (ARDS) is a clinical syndrome of severe
dyspnea of rapid onset, hypoxemia, and diffuse pulmonary infiltrates leading to
respiratory failure. ARDS is caused by diffuse lung injury from many underlying
medical and surgical disorders. The lung injury may be direct, as occurs in toxic
inhalation, or indirect, as occurs in sepsis (Table 294-1). The clinical features of
ARDS are listed in Table 294-2. (…) If no ARDS risk factor is present, then some
objective evaluation is required (e.g., echocardiography) to exclude a cardiac etiology
for hydrostatic edema.”

Caso seja impugnável (comentário + referências)

A pergunta é bastante questionável. A verdade é que o ecocardiograma é a única


alternativa apresentada com interesse diagnóstico para ARDS (a colheita de secreções
para microbiologia teria interesse, mas para a etiologia da lesão primária). Contudo, o
ecocardiograma, de acordo com os critérios de Berlin, apenas está indicado no
diagnóstico de SDRA na ausência de um fator de risco identificável para SDRA, pelo que,
neste caso, é discutível se seria necessário.

 Critérios de Berlin para SDRA.


 Harrison, 20ªed, Cap 294, “Acute Respiratory Distress Syndrome”, pg 2031, “If no
ARDS risk factor is present, then some objective evaluation is required (e.g.,
echocardiography) to exclude a cardiac etiology for hydrostatic edema.
 

93. Um homem de 46 anos, padeiro, recorre ao serviço de urgência, pelo seu pé por dor no flanco direito, tipo
cólica, com uma hora de evolução. Não tem antecedentes patológicos de relevo. Os sinais vitais são
temperatura 37,1°C, frequência respiratória 14/min, frequência cardíaca 70/min e pressão arterial 120/75
mm Hg. Ele tem 179 cm de altura e pesa 103 kg; IMC 32 kg/m². Ao exame físico apresenta-se pálido e
diaforético, em ansiedade extrema. O abdómen está distendido, sem sinais de irritação peritoneal.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Sangue: Leucócitos 11 500/mm³; Neutrófilos 58 %; Linfócitos 27 %. Urina: Eritrócitos 28/cga.

A ecografia abdominal mostra hidronefrose, com bacinete de 17 mm, à direita.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Colecistite aguda.


(B) Dissecção da aorta abdominal.
(C) Litíase urinária obstrutiva.
(D) Neoplasia renal.
(E) Neoplasia urotelial alta.

Resposta correta: C

Comentário
Este caso clínico ilustra o diagnóstico diferencial de dor abdominal. A história clínica é
sugestiva de uma cólica renal direita: dor a nível lombar/flanco, muito intensa, sem
posição de alívio e com início súbito. Os exames complementares de diagnóstico
mostram uma discreta leucocitose associada ao processo inflamatório e uma
hidronefrose, sugestiva da presença de um obstáculo ureteral, sendo mais provável um
cálculo litiásico. A colecistite aguda traduz-se geralmente por uma dor mais localizada
ao hipocôndrio direito e apresenta achados imagiológicos sugestivos na ecografia
abdominal, tal como o espessamento parietal da vesícula. A disseção da aorta
manifesta-se tipicamente por uma dor súbita e intensa no dorso, associado a
diminuição da pressão arterial e taquicardia. As neoplasias, devido ao seu crescimento
lento podem causar um obstáculo ureteral, no entanto, dado o processo de acomodação
à dilatação a dor não é tão intensa como na litíase urinária obstrutiva.

Referências bibliográficas

 Harrison’s Principles of Internal Medicine 20th Ed (versão inglesa) – Parte 9 –


Capítulo 312 “Nefrolitíase” – Página 2169 – coluna da direira, último parágrafo.
 

94. Uma lactente de 12 meses é trazida ao consultório médico por palidez. A mãe refere que a criança recusa
todos os alimentos sólidos e cospe as vitaminas. Encontra-se sob aleitamento materno exclusivo desde o
nascimento. O desenvolvimento psicomotor é adequado à idade e a criança parece saudável. Tem o
programa nacional de vacinação atualizado. Ela mede 75 cm (percentil 50) e pesa 10 kg (percentil 75). A
auscultação pulmonar encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade. A auscultação cardíaca mostra
sopro sistólico de ejeção, grau 2/6.

Os resultados dos estudos analíticos realizados revelam:

Soro: Chumbo 9 pg/dL [rec ≤ 9 pg/dL].

Sangue: Hemoglobina 9,5 g/dL [N = 10,5-14,0 g/dL]; VGM 68 microm³ [N = 72-88 microm³].

Qual dos seguintes é o diagnóstico mais provável?

(A) Anemia fisiológica.


(B) Anemia por deficiência de ferro.
(C) Esferocitose hereditária.
(D) Intoxicação por chumbo.
(E) Traço alfa-talassémico.

Resposta correta: B

Comentário
Depois dos seis meses de idade, uma alimentação exclusivamente láctea não supre, por
si só, as necessidades energéticas e em alguns micronutrientes (especialmente o ferro),
tornando-se necessária a introdução de outros alimentos. Ora, este caso clínico fala-
nos de uma criança em aleitamento materno exclusivo aos 12 meses, que não tolera
alimentos sólidos nem vitaminas – ou seja, uma criança com alto risco de carências
nutricionais, especialmente de ferro. Os achados laboratoriais também apoiam esse
diagnóstico - mostram uma anemia microcítica, típica da anemia ferropénica.

Referências bibliográficas

 Alimentação Saudável dos 0 aos 6 anos – Linhas De Orientação Para Profissionais E


Educadores “ (DGS, 2019) Capítulo 4.3, página 58
 Manual de Diagnóstico y Terapéutica en Pediatría (6ª edição) - PARTE VIII, Capítulo
111, página 1125
 

95. Uma mulher de 18 anos, caucasiana, vem ao centro de saúde para consulta de vigilância. Ela esteve a
viver com a família em Angola, desde os 5 anos de idade, e regressou a Portugal há seis meses. A história
médica revela amigdalectomia aos 8 anos. Os antecedentes ginecológicos incluem menarca aos 12 anos,
ciclos irregulares (28 a 35 dias) e cataménios de 6 dias. A coitarca ocorreu há seis meses e utiliza o
preservativo como método contracetivo. Mantém o mesmo parceiro sexual desde essa altura. Não tem
antecedentes familiares de relevo. Os sinais vitais são temperatura 36,8°C, frequência respiratória 14/min,
frequência cardíaca 65/min e pressão arterial 102/60 mm Hg. Ela mede 163 cm e pesa 58 kg; IMC 22
kg/m². O exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes medidas preventivas é a mais adequada nesta mulher?

(A) Realizar colheita para citologia cervicovaginal.


(B) Confirmar a toma de vacina contra o papilomavírus humano (HPV).
(C) Sugerir realização de autopalpação mamária mensalmente.
(D) Solicitar teste de rastreio não treponémico (VDRL).
(E) Solicitar doseamento de triiodotironina sérica.

Resposta correta: B

Comentário
Analisando cada opção de resposta: (B) A administração da vacina contra o HPV
constitui um método de prevenção primária contra o HPV estando indicada para a
prevenção de lesões pré-cancerosas e cancros do colo do útero, da vulva, da vagina, do
ânus e condiloma acuminado, causados pelos tipos de HPV. Dadas as inúmeras
vantagens que oferece, qualquer consulta de ginecologia deverá ser vista como uma
oportunidade para confirmar que esta foi realizada e incentivar o seu uso caso não
tenha sido administrada previamente. Apesar de já ser sexualmente ativa continua a
ser recomendada a administração da vacina (eficácia da vacina já documentada em
mulheres até aos 45 anos). (A) O rastreio do cancro do colo do útero não está
recomendado em mulheres com menos de 21 anos independentemente da idade de
início das relações sexuais, pelo que a alínea A não está correta. (C) As mulheres devem
ser estimuladas a desenvolver uma autoconsciência mamária de forma a poderem
identificar possíveis alterações de forma mais precoce, no entanto em mulheres sem
fatores de risco nesta faixa etária não estão descritos nem sugeridos timings mensais
de follow-up para autopalpação mamária, como sugerido na alínea C. (D) Trata-se de
uma jovem sexualmente ativa, mas que refere uso regular de preservativo pelo que não
está recomendado como abordagem inicial o rastreio de sífilis. (E) Trata-se de uma
jovem saudável sem antecedentes pessoais ou familiares a destacar com ciclos
menstruais descritos como irregulares 28-35 dias, sem critérios de oligomenorreia e
sem indicação para doseamento inicial de triiodotironina sérica.
 

Referências bibliográficas

 Obstetrics and Gynecology 7th edition Beckmann. Chapter 2: The Obstetrician–


Gynecologist’s Role in Screening and Preventive Care. “Although obstetrician–
gynecologists do not routinely care for girls in this age group, they are in a unique
position to advocate for the use of the vaccine for females ages 13 to 26 years (the
catch-up vaccination period). During a health care visit with a girl or a woman in the
age range for vaccination, an assessment of the patient’s HPV vaccine status should
be conducted and documented in the patient record. The HPV vaccine is most
effective when given before any exposure to HPV infection, but sexually active
women who were exposed to HPV prior to vaccination can receive and benefit from
the vaccine”
 Obstetrics and Gynecology 7th edition Beckmann. Chapter 1 The Woman’s Health
Examination and Women’s Health Care Management: “Breast self-examination is not
universally recommended; instead, breast self-awareness is to be encouraged and
supported by physicians”.
 Consenso Nacional sobre Vacina contra o HPV de 2018 – Sociedade Portuguesa de
Ginecologia
 

96. Uma mulher de 43 anos, casada, vem ao consultório médico por prurido vulvar intenso, disúria,
dispareunia e corrimento vaginal com cheiro desagradável desde há três semanas. Refere três episódios
semelhantes no último ano, que resolveram com antibiótico. Os antecedentes obstétricos incluem uma
gestação e um parto vaginal há 13 anos, a termo e sem complicações. Faz contraceção com dispositivo
intra-uterino de cobre introduzido há um ano. A história médica revela hipertensão arterial controlada
com enalapril. Não tem antecedentes familiares de relevo. Os sinais vitais encontram-se dentro dos
parâmetros de normalidade. Ela tem 169 cm de altura e pesa 89 kg; IMC 31 kg/m². Ao exame físico a
vulva apresenta-se com edema e eritema. O exame com espéculo revela corrimento vaginal amarelo-
esverdeado e arejado. O colo uterino tem aspeto em «framboesa».

Para além do tratamento do quadro agudo da mulher, qual das seguintes atitudes é a mais adequada para
a prevenção de um novo episódio nesta mulher?

(A) Prescrever azitromicina ao casal.


(B) Prescrever clindamicina ao parceiro sexual.
(C) Prescrever cotrimoxazol à doente, após o coito.
(D) Prescrever fluconazol ao parceiro sexual.
(E) Prescrever metronidazol ao parceiro sexual.

Resposta correta: E

Comentário
A infeção por tricomoníase pode ser assintomática ou originar alguns dos seguintes
sintomas: prurido vulvar, corrimento vaginal amarelado/esverdeado normalmente com
odor e arejado, disúria, dispareunia e pode levar a coitorragias. Ao exame objetivo
poderá identificar-se eritema e edema dos genitais externos bem como a presença em
alguns dos casos de um colo com petéquias mais conhecido por “colo em framboesa”
(na observação com espéculo). Assim, o quadro clínico descrito é sugestivo de uma
vulvovaginite a tricomoníase. Esta é uma infeção sexualmente transmissível obrigando
ao tratamento da própria e do parceiro e este deve ser feito com metronidazol ou
tinidazole. Assim a resposta correta será a (E). A terapêutica com azitromicina e
clindamicina não está recomendada para o tratamento da tricomoníase. A alínea (C) não
está correta porque o quadro descrito não é sugestivo de uma infeção fúngica (que se
manifesta por corrimento vaginal branco grumoso e espesso sem cheiro e não arejado,
ardor, prurido vulvar e por vezes com dispareunia. Não se encontra associado ao colo
em “framboesa”) pelo que o tratamento com clotrimazol não está recomendado. A
alínea D também não está correta porque o fluconazol é utilizado no tratamento das
candidíases e não está recomendado, por rotina, o tratamento do parceiro sexual nestas
situações.
 

Referências bibliográficas

 Consensos de infeções vulvovaginais de 2012 – Sociedade Portuguesa de


Ginecologia página 46. Obstetrics and Gynecology
 7th edition Beckmann. Chapter 28: Vulvovaginitis: “Symptoms of Trichomonas
infection vary from mild to severe and may include vulvar itching or burning, copious
discharge with rancid odor, dysuria, and dyspareunia. Although not present in all
women, the discharge associated with Trichomonas infections is generally “frothy,”
thin, and yellow-green to gray in color, with a pH above 4.5. Examination may reveal
edema or erythema of the vulva. Petechiae, or strawberry patches, are classically
described as present in the upper vagina or on the cervix but are actually found in
only about 10% of affected patients (…) Treatment of Trichomonas infections is with
oral metronidazole or tinidazole. Treating sexual partners of women with
trichomoniasis is recommended.”
 

97. Uma mulher de 48 anos recorre a consulta de medicina geral e familiar devido a problemas de sono, com
início há três meses, após um conjunto de assaltos na sua vizinhança. Diz que não tem dificuldades em
adormecer, mas que fica acordada por períodos durante a noite, dormindo apenas superficialmente.
Descreve intensificação gradual das queixas e atualmente, na maior parte das noites, dorme de forma
contínua apenas da meia-noite até às 4 da manhã. O último período menstrual terminou há três semanas.
Não apresenta história médica de relevo. Fuma desde há 20 anos e bebe regularmente quatro a cinco cafés
por dia. Não consome bebidas alcoólicas nem drogas ilícitas. Os sinais vitais são temperatura 35,7°C,
frequência respiratória 12/min, frequência cardíaca 70/min e pressão arterial 120/80 mm Hg. Ela tem 169
cm de altura e pesa 80 kg; IMC 28 kg/m². Os exames físico e do estado mental encontram-se dentro dos
parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado na avaliação da doente?

(A) Avaliar a resposta a diazepam.


(B) Avaliar a resposta a uma dose baixa de mirtazapina.
(C) Requisitar doseamento dos níveis de FSH.
(D) Requisitar uma polissonografia.
(E) Solicitar um diário de sono para a próxima consulta.

Resposta correta: E

Comentário
Neste caso clínico, com a informação disponível, é difícil definir qual a hipótese
diagnóstica mais adequada, em primeiro lugar no diagnóstico diferencial entre insónia
primária e insónia secundária, e em segundo lugar admitindo a hipótese de insónia
secundária, no diagnóstico diferencial das suas etiologias. Assim, é muito importante
ter uma minuciosa história clínica, com detalhada história do sono, que poderá ser
obtida, sem custos, através de um diário de sono. Por outro lado, considera-se
habitualmente como 1ª linha para o tratamento de insónia, para além do tratamento da
eventual causa subjacente, medidas não farmacológicas, nomeadamente medidas de
higiene de sono, psicoterapia cognitivo comportamental e terapia de restrição de sono
por exemplo. Para aplicar estas medidas não farmacológicas é, mais uma vez, essencial
a elaboração de um diário de sono. Assim, a opção correta seria a E. O diazepam não
está na lista de benzodiazepinas com indicação no tratamento a curto prazo da insónia
nas NOCS da DGS. A mirtazapina poderia ser uma opção a ter em conta, principalmente
se se verificasse a presença concomitante de sintomatologia depressiva e/ou ansiosa,
o que não é sugerido pelo caso. Para além disso, a doente apresenta excesso de peso,
pelo que, tendo em conta o perfil da mirtazapina, que está muito associada a aumento
de peso, esta deveria ser evitada. Finalmente, habitualmente a 1ª linha no tratamento
de insónia são medidas não farmacológicas. O doseamento de FSH neste caso não está
recomendado porque estamos perante uma mulher de 48 anos que ainda menstrua. A
polissonografia (PSG) deve ser reservada para situações em que a história clínica e
diário de sono não são suficientes para o diagnóstico diferencial e tratamento da
insónia, ou quando se suspeita de patologias especificas, como por exemplo SAOS, o
que não é o caso. No fundo numa primeira abordagem, não se parte desde logo para
uma PSG.
 

Referências bibliográficas

 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Eating, Sleep, and Sexual
Disorders”, secção “Sleep Disorders”, pág 324-327
 NOC da DGS “Tratamento Sintomático da Ansiedade e Insónia com Benzodiazepinas
e Fármacos Análogos”
 Luís Filipe CAVADAS et al, Abordagem da insónia do adulto nos Cuidados de Saúde
Primários, Acta Med Port. 2011; 24(1):135-144
 Riemann, D., Nissen, C., Palagini, L., Otte, A., Perlis, M. L., & Spiegelhalder, K. (2015).
The neurobiology, investigation, and treatment of chronic insomnia. The Lancet.
Neurology, 14(5), 547–558. https://doi.org/10.1016/S1474-4422(15)00021-6;
 

98. Um estudante de 18 anos vem ao consultório médico para avaliação para a prática desportiva. Ele não
tem antecedentes patológicos de relevo e não faz medicação habitual. Não fuma nem bebe bebidas
alcoólicas. Os sinais vitais são temperatura 36,7°C, frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca
60/min e pressão arterial 140/88 mm Hg. Ele tem 185 cm de altura e pesa 76 kg; IMC 22 kg/m². A
auscultação cardíaca revela sopro sistólico grau 2/6, audível no ápex e no bordo esquerdo do esterno, que
aumenta na posição ortostática e diminui quando se agacha. O restante exame físico encontra-se dentro
dos parâmetros de normalidade.

Qual dos seguintes é o diagnóstico mais provável?

(A) Cardiomiopatia hipertrófica.


(B) Estenose aórtica.
(C) Foramen ovale patente.
(D) Prolapso da válvula mitral.
(E) Regurgitação tricúspide.

Resposta correta: A

Comentário
A presença de um sopro sistólico grau II/VI, melhor audível no apex e bordo esternal
esquerdo, que diminui com agachamento e aumenta com ortostatismo apenas poderia
corresponder a cardiomiopatia hipertrófica (CMH). O diagnóstico diferencial poderia
fazer-se com o prolapso da válvula mitral (PVM) uma vez que é também melhor audível
no ápex e apresenta um comportamento semelhante ao anterior em resposta às
manobras provocatórias. Contudo, o PVM é mais prevalente em mulheres longilíneas,
não há no enunciado referência a um clique mesossistólico que geralmente acompanha
o sopro, e carateristicamente a manobra de ortostatismo aumenta a duração do sopro
apesar de também poder aumentar a intensidade. O sopro de estenose aórtica é um
ruído mesossistólico melhor audível no 2º espaço intercostal direito e
carateristicamente com irradiação carotídea. É raro ouvir um sopro associado à
presença de Foramen ovale patente, apenas se shunt espontâneo e de grandes
dimensões. O sopro de regurgitação tricúspide é um ruído mesossistólico melhor
audível no bordo esquerdo do esterno, cuja intensidade aumenta com a inspiração.

Referências bibliográficas

 Harrison’s Principles of Internal Medicine 20ª edição, página 1674, tabela 234-1
 

99. Uma mulher de 48 anos vem ao consultório médico por poliartralgias generalizadas, persistentes, nos
últimos oito meses, com localização mal definida, mais acentuadas na região cervical, lombar, ombros e
mãos, às vezes muito intensas, com incapacidade para o trabalho. Refere ainda cansaço marcado,
irritabilidade e cefaleias e sente-se muito deprimida. A história médica revela tendinites dos membros
superiores, síndrome do canal cárpico bilateral, hipotiroidismo e dislipidemia. A medicação habitual
inclui paracetamol, tramadol, levotiroxina e bromazepam. Os sinais vitais são temperatura 36°C,
frequência respiratória 14/min, frequência cardíaca 73/min e pressão arterial 138/72 mm Hg. Ao exame
físico apresenta dor em 6 dos 19 pontos dolorosos, com intensidade 9/10 na escala de dor. O restante
exame físico, estudos analíticos e exames radiológicos da coluna vertebral, ombros e mãos encontram-se
dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Prescrever duloxetina.


(B) Prescrever fisioterapia.
(C) Recomendar dieta com reforço de cálcio.
(D) Solicitar ecografia da tiroide.
(E) Solicitar RM da coluna vertebral.

Resposta correta: A

Comentário
Esta doente possui mais provavelmente fibromialgia - dor generalizada (especialmente
ao nível da região cervical, lombar, ombros e mãos) associada a astenia, irritabilidade,
cefaleias, depressão marcada e exame físico, analítico e radiológico sem alterações. A
presença de 11 pontos dolorosos ou mais em 19 corrobora o seu diagnóstico, no entanto
a inexistência deste critério não permite excluir esta patologia. O tratamento de
primeira linha da fibromialgia são os SNRI (onde se inclui a duloxetina) e SSRI,
associada a analgesia com tramadol, relaxantes musculares como a ciclobenzaprina,
psicoterapia e treino cognitivo-comportamental. O hipotiroidismo que a doente
apresenta poderia justificar as queixas álgicas da doente, no entanto, é descrito na
pergunta como estando a realizar suplementação com levotiroxina e que o estudo
analítico está normal (depreende-se que a função tiroideia esteja normal), pelo que não
se justifica pedir ecografia tiroideia.

Referências bibliográficas

 Harrison 20 ed capítulo 366 Fibromyalgia Pag 2636-2638


 

100. Um menino de 8 meses é trazido ao consultório médico para consulta de saúde infantil. A mãe refere que
a criança não tem tido dejeções espontâneas nos últimos três meses, necessitando de estimulação com
sonda de supositório de glicerina (sem conteúdo) para manter dejeções diárias. Nos últimos dois meses,
iniciou dieta rica em fibras e laxante osmótico, sem noção de melhoria. Após o nascimento, houve
eliminação de mecónio ao 3.ª dia de vida. Esteve sob aleitamento materno exclusivo até aos 6 meses,
altura em que iniciou diversificação alimentar. Ao exame físico apresenta má evolução ponderal,
distensão abdominal e ampola retal sem fezes ao toque retal. O desenvolvimento psicomotor é adequado
à idade.

Qual dos seguintes é o exame mais adequado para estabelecer o diagnóstico mais provável?

(A) Ecografia abdominal.


(B) Estudo analítico com função tiroideia.
(C) lmunoglobulinas e anticorpos antitransglutaminase.
(D) Manometria anorretal.
(E) Radiografia abdominal simples em pé.

Resposta correta: D

Comentário
O caso clínico descreve-nos um lactente com atraso na eliminação de mecónio, má
evolução ponderal, uma obstipação refatária a laxantes osmóticos e ampola retal vazia
no toque retal - vários sinais de alarme para uma obstipação secundária, com etiologia
orgânica. Apesar de a lista de diagnósticos diferenciais ser extensa, esta conjugação de
sintomas e sinais (especialmente o atraso na emissão de mecónio e a ampola retal
vazia) remetem-nos para a Doença de Hirchsprung. Apesar de o diagnóstico definitivo
ser feito através de biópsia retal, a manometria anorretal também pode ser utilizada,
pois confirma a ausência de reflexo inibitório anorretal (opção D correta)

Referências bibliográficas

 “Manual de Diagnostico y Terapeutica en Pediatria” (6ª edição) - PARTE VII, capítulo


104, página 994 (tabela 104-2), página 995 (tabela 104-3) e página 998 (1º
parágrafo).
 

101. Um homem de 46 anos vem ao consultório médico por disfagia parcial para sólidos de novo e
agravamento de pirose, desde há duas semanas. Realizou uma endoscopia digestiva alta há três meses
para estudo da pirose, que revelou hérnia do hiato e erosão esofágica. Está medicado com omeprazol 40
mg/dia desde então. Refere melhoria inicial, mas agora nota que não está bem. Refere que não tem feito
restrições alimentares, uma vez que estava medicado, e tem aproveitado para fazer «jantaradas» com os
amigos. Nega toma de anti-inflamatórios neste período. Refere ingestão de dois copos de vinho por dia e
uma bebida branca de manhã. Ele não tem antecedentes patológicos ou familiares de relevo. O exame
físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Sangue: Hemoglobina 12,9 g/dL; HCM 30 pg/célula; VGM 105 fL.

Para além do aconselhamento sobre os hábitos alimentares, qual das seguintes alternativas é o próximo
passo mais adequado?

(A) Repetir endoscopia digestiva alta.


(B) Solicitar ecografia cervical.
(C) Solicitar manometria esofágica.
(D) Solicitar pHmetria esofágica.
(E) Solicitar TC cervical e do tórax.

Resposta correta: A

Comentário
Trata-se de um caso de um doente que apresenta agravamento da disfagia. Na
endoscopia realizada há três meses foi encontrada uma hérnia do hiato e erosão
esofágica. Foi-lhe prescrito IBP com melhoria inicial dos sintomas e posterior
agravamento. Apresenta ainda anemia (Hemoglobina de 12,9). De acordo com a norma
da DGS sobre ”Diagnóstico e Tratamento da Doença de Refluxo Gastro Esofágico no
Adulto” as indicações para a realização de endoscopia digestiva alta na DRGE devem
ser (Nível de Evidência B, Grau de Recomendação I): Persistência, recidiva ou
agravamento de sintomas sugestivos de DRGE durante o tratamento médico. Neste caso
o doente já tinha realizado o trial com IBP e houve um agravamento dos sintomas. Neste
doente temos de excluir uma complicação da esofagite que poderá complicar com
estenose péptica e justificar a disfagia de novo que o doente apresenta, bem como
agravamento da pirose. Para tal, o próximo passo mais adequado é a realização de uma
endosocpia digestiva alta.
 

Referências bibliográficas

 Norma nº 019/2017 Diagnóstico e Tratamento da Doença de Refluxo Gastro


Esofágico no Adulto: “As indicações para a realização de endoscopia digestiva alta
na DRGE devem ser (Nível de Evidência B, Grau de Recomendação I) 3 : a)
Persistência, recidiva ou agravamento de sintomas sugestivos de DRGE durante o
tratamento médico nos termos da presente Norma.
 Harrison Capitulo 316: Doença do esófago Página 2215
 

102. Uma mulher de 65 anos recorre ao serviço de urgência por epistaxe bilateral e cefaleia com uma hora de
evolução. A história médica revela diabetes mellitus tipo 2, hipertensão arterial e histerectomia há 20
anos. A medicação habitual inclui metformina, lisinopril e ácido acetilsalicílico. Tem 165 cm de altura e
pesa 85 kg; IMC 31 kg/m². Os sinais vitais são temperatura 36,9°C, frequência cardíaca 90/min,
frequência respiratória 15/min e pressão arterial 180/110 mm Hg.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Avaliar sinais meníngeos.


(B) Efetuar compressão nasal.
(C) Prescrever nifedipina sublingual.
(D) Requisitar glicemia.
(E) Suspender ácido acetilsalicílico.

Resposta correta: B

Comentário
Perante uma epistáxis bilateral ativa deve se feita, o mais rápido possível, compressão
do 1/3 inferior do nariz por pelo menos 5 minutos, a fim de conter a hemorragia.
Durante o período de compressão são medidos os sinais vitais, de modo a otimizar o
doente do ponto de vista hemodinâmico e metabólico. Nesta fase, já com controlo da
hemorragia ativa, proceder-se-ia ao controlo tensional com anti-hipertensor sublingual
e medição das glicémias. Na ausência de hemorragia “life-threatening” deve ser feito o
controlo da hemorragia com intervenções de primeira-linha, antes de qualquer
suspensão ou reversão de terapêutica antiagregante/anticoagulante. Após controlo de
hemorragia ativa e controlo hemodinâmico, deverá ser feita a restante avaliação do
doente, nomeadamente exame neurológico com avaliação de sinais meníngeos.

Referências bibliográficas

 Clinical Practice Guideline: Nosebleed (Epistaxis) da American Academy of


Otolaryngology - Head and Neck Surgery, 2020
 

103. Um homem de 57 anos volta novamente ao consultório médico para falar sobre os resultados de provas
hepáticas feitas em jejum e obtidas 10 dias antes. As análises foram feitas previamente ao início da toma
de atorvastatina. O doente refere que se tem sentido bem, não tem tido febre nem dor abdominal ou
músculo-esquelética. Não toma nenhuma outra medicação. Os sinais vitais encontram-se dentro dos
parâmetros de normalidade. Ele tem 178 cm de altura e pesa 95 kg; IMC 30 kg/m². O exame físico revela
perda auditiva neurossensorial bilateral. A tíbia direita está arqueada.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Fosfatase alcalina 365 U/L; Cálcio total 9,4 mg/dL.

Os restantes resultados encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Em qual dos seguintes estudos adicionais é mais provável a existência de alterações neste doente?

(A) Antigénio específico da próstata.


(B) Ecografia abdominal.
(C) Eletroforese das proteínas séricas.
(D) Estudo da condução nervosa no membro inferior esquerdo.
(E) Raio-X do crânio.

Resposta correta: E

Comentário
O caso descreve um homem de 57 anos, sem sintomas e sem medicação, que fez
análises das provas de função hepática (nota: o início de atorvastatina foi após a
colheita). Os únicos valores disponíveis no enunciado são uma fosfatase alcalina
elevada e um cálcio normal. A fosfatase alcalina tem várias isoformas (óssea, hepato-
biliar, placentária, intestinal e renal). As patologias ósseas geralmente cursam com
alteração dos valores séricos do cálcio: raquitismo cursa com valores baixos; Mieloma
múltiplo e metástases ósseas com valores elevados. As hipóteses A, C e E investigam
algumas destas hipóteses (Rx crânio - Doença de Paget [documentação de imagem
sugestiva de crânio pagético], Eletroforese – mieloma múltiplo, doseamento PSA –
neoplasia da próstata metastizada). O cálcio normal faz com que estas hipóteses sejam
menos prováveis, à excepção da D. Paget que geralmente cursa com cálcio normal.
Perante uma elevação da fosfatase alcalina a colestase é uma hipótese diagnóstica a
considerar. Uma elevação simultânea da GGT seria útil para confirmar a sua origem
hepática, no entanto não nos é fornecido esse dado. A informação de tíbia arqueada
aponta para as deformidades ósseas associadas à Doença de Paget (Tíbia em sabre).
Além disso, a Doença Paget é a causa mais frequente de elevação isolada da fosfatase
alcalina em adultos e pode também cursar com hipoacúsia por envolvimento dos ossos
do ouvido. A hipótese D não se enquadra neste caso clínico pelo que fica excluída da
discussão.
 

Referências bibliográficas

 Harrison 20th Edition Chapter 405 Paget’s Disease and Other Dysplasias of Bone
p2960-2961
 

104. Uma mulher de 55 anos vem ao consultório médico, acompanhada pelo marido, por apresentar tendência
crescente para se isolar ao longo das últimas seis semanas. A doente foi submetida a tumorectomia com
esvaziamento axilar e radioterapia, por cancro da mama localizado (estádio I), diagnosticado há três
meses. Ela não consegue deixar de se preocupar com o futuro e refere «qualquer pessoa a lutar contra um
cancro vai sentir-se desta maneira». O marido diz que a doente parece triste a maior parte do tempo. Passa
cada vez mais tempo na cama e não retomou os passatempos que tinha anteriormente. Tem tido
dificuldade em concentrar-se, diminuição de energia e de apetite. Não apresenta pensamentos
significativos de menos-valia ou de culpa. Nega intenção ou plano de suicídio, mas admite que, por vezes,
deseja não acordar. A medicação habitual inclui tamoxifeno. Ao exame físico a ferida cirúrgica está
integralmente cicatrizada e não é causa de qualquer tipo de desconforto.

Qual das seguintes alternativas é a explicação mais provável para o sofrimento emocional da doente?

(A) Depressão induzida por fármacos.


(B) Episódio depressivo major.
(C) Perturbação de adaptação com humor deprimido.
(D) Perturbação de ansiedade generalizada.
(E) Tiroidite induzida por radiação.

Resposta correta: B

Comentário
Neste caso clínico a grande dúvida recai entre o diagnóstico de perturbação de
adaptação e o diagnóstico de episódio depressivo major. Sobre este diagnóstico
diferencial importa saber que: segundo a bibliografia recomendada, o Shorter Oxford
Textbook of Psychiatry 7a edição, “Stressful life events may precipitate depression,
anxiety, schizophrenia and other psychiatric disorders. For this reason, the diagnosis of
adjustment disorder is not made when diagnostic criteria for another psychiatric
disorder are met. In practice, therefore, the diagnosis is usually made by excluding an
anxiety or depressive disorder.” (Cap. 7 “Reactions to Stressful Experiences”; pág. 150);
ainda citando a bibliografia recomendada, “Adjustment disorders following a stressor
often present with depressed mood, together with tearfulness and feelings of
hopelessness. However, the full diagnostic criteria for major depression are not met.”
(Cap. 9 “Depression”; pág. 203). Nos critérios DSM-5, um dos critérios necessário para
o diagnóstico de Perturbação de Ajustamento (Adaptação), é o critério C “A perturbação
relacionada com stress não preenche os critérios para outra perturbação mental e não
é meramente uma exacerbação de uma perturbação mental preexistente” (DSM-5, ed.
portuguesa, “Perturbação de Ajustamento”; pág 343). Assim sendo, a resolução desta
pergunta define-se na presença ou não de critérios para episódio depressivo major, e
estes estão reunidos quer segundo o DSM-5 quer segundo a ICD-10. Para diagnosticar
uma perturbação depressiva major segundo o DSM-5 é necessária a presença de pelo
menos 5 sintomas, de um total de 9, dos quais pelo menos 1 tem de ser humor
deprimido ou anedonia. Para além disso é necessário verificar-se impacto no
funcionamento. Esta doente apresenta, aparentemente há 6 semanas: I) Humor
deprimido - “(…) O marido diz que a doente parece triste a maior parte do tempo.”.
Relembramos que o critério de humor deprimido do DSM-5, refere especificamente
“Humor deprimido durante a maior parte do dia (…) indicado pelo relato subjetivo (...) ou
pela observação pelos outros (…)” (DSM-5, ed. portuguesa, “Perturbação Depressiva
 

Major”; pág 190); - Critério A1. II) Anedonia, isto é, diminuição do interesse ou prazer
nas suas atividades - “Passa cada vez mais tempo na cama e não retomou os
passatempos que tinha anteriormente”. Relembramos, que segundo o DSM-5 “(…) O
indivíduos podem declarar sentir-se menos interessados nos seus passatempos (…)”
(DSM-5, ed. portuguesa, “Perturbação Depressiva Major”; pág 193);- Critério A2. Iii)
Diminuição da capacidade de concentração. Relembramos que segundo o critério A8 do
DSM-5 a “diminuição da capacidade de pensar ou de concentração” pode ser inferida
“pelo relato subjetivo ou pela observação de outros”, sendo no nosso caso pelo relato
subjetivo da doente. (DSM-5, ed. portuguesa, “Perturbação Depressiva Major”; pág
190);- Critério A8. IV) Diminuição de energia, cumprido assim o critério A6 do DSM-5
“Fadiga ou perda de energia quase todos os dias”. (DSM-5, ed. portuguesa, “Perturbação
Depressiva Major”; pág 190);- Critério A6. V) Diminuição de apetite, cumprindo assim o
critério A3. (DSM-5, ed. portuguesa, “Perturbação Depressiva Major”; pág 190);- Critério
A3. VI) Pensamentos de morte recorrentes, quando refere que “(…) deseja não acordar
(…)”. Relembramos que segundo o DSM-5, relativamente ao critério A9, “Pensamentos
de morte, ideação suicida ou tentativas de suicídio são comuns (critério A9). Eles podem
variar desde o desejo passivo de não acordar de manhã ou a crença (…)” (DSM-5, ed.
portuguesa, “Perturbação Depressiva Major”; pág 194;- Critério A9. A estes elementos
junta-se o facto de se verificar um progressivo isolamento da doente com clinofilia
(passar muito tempo na cama) o que certamente deve ser interpretado como um
prejuízo do funcionamento. Assim, uma vez que a doente apresenta 6 dos 9 sintomas
necessários para o diagnóstico de depressão, nomeadamente os 2 nucleares (humor
deprimido e anedonia), há mais de 2 semanas, com impacto no funcionamento,
configura-se o diagnóstico de episódio depressivo major, segundo o DSM-5, excluindo-
se assim a perturbação de adaptação ou ajustamento. Segundo o ICD-10, para
diagnosticar um episódio depressivo major, devem verificar-se durante 1 mês pelo
menos 2 dos 3 seguintes: humor deprimido; perda de interesse e prazer; Diminuição de
energia e diminuição da atividade. Devem-se verificar também pelo menos 2 dos
seguintes: diminuição da concentração; diminuição da autoestima; ideias de culpa;
ideias auto lesivas; distúrbio do sono; diminuição do apetite. A doente cumpre os 3
principais critérios (humor deprimido, anedonia e diminuição da energia) e pelo menos
2 dos outros (diminuição da concentração e diminuição do apetite). Assim, também pelo
ICD-10, verifica-se o diagnóstico de depressão, reforçando que a opção correta é a B.
Em relação à opção A não há evidência suficiente, neste caso clínico, de relação
temporal entre o início de tamoxifeno e desenvolvimento da sintomatologia depressiva.
Em relação à opção D, não há sintomatologia que sugira o diagnóstico de perturbação
de ansiedade generalizada.

Referências bibliográficas

 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Cap. 7 “Reactions to Stressful


Experiences”; pág. 150
 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Cap. 9 “Depression”; pág. 193; 194;
195; 203
 DSM-5, ed. portuguesa, “Perturbação Depressiva Major”; pág 190-195
 

105. Uma mulher de 45 anos recorre ao serviço de urgência por mal-estar geral, cansaço, dor abdominal e
noção de diminuição do débito urinário desde há dois dias. Está medicada com azitromicina e ibuprofeno
desde há cinco dias por amigdalite. A história médica revela litíase urinária e lúpus eritematoso sistémico,
em remissão. A medicação habitual inclui hidroxicloroquina, metotrexato e omeprazol. Os sinais vitais
são temperatura 36,5°C, frequência respiratória 32/min, frequência cardíaca 89/min e pressão arterial
104/79 mm Hg. O débito urinário desde a admissão (há 18 horas) é de 230 mL. O exame físico, incluindo
a auscultação cardíaca e pulmonar, encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 2.2 mg/dL; Azoto ureico 34 mg/dL; Sódio 138 mEq/L; Potássio 4.3 mEq/L.

Sangue: Hemoglobina 12,4 g/dL; Leucócitos: 5 100/mm³; Plaquetas 150 x 10^9L.

A ecografia renal não mostra alterações estruturais.

Qual dos seguintes mecanismos melhor explica a oligoanúria?

(A) Azotemia pós-renal.


(B) Azotemia pré-renal.
(C) Concentração elevada de agentes nefrotóxicos.
(D) Diminuição da perfusão renal.
(E) Glomerulonefrite por imunocomplexos.

Resposta correta: C

Comentário
Trata-se de uma mulher com diagnóstico de LES bem controlado (dizem que está em
remissão) e litíase urinária. Também nos indicam que a doente está sob terapêutica
com azitromicina e ibuprofeno por uma amigdalite desde há cinco dias. O exame físico
é normal e destaca-se uma diurese de 230 mL em 18 horas. Nos estudos analíticos o
único que chama a atenção é uma lesão renal com Cr de 2,2 mg/dL. Assumimos que é
uma lesão renal aguda já que não nos indicam história prévia de insuficiência renal.
Realizam ecografia renal que não mostra alterações estruturais (ou seja, descarta-se
uropatia obstrutiva; opção A falsa). Chegados a este ponto estamos perante o
diagnóstico diferencial de uma lesão renal aguda, onde se exclui uropatia obstrutiva. O
primeiro que temos que ver é a exploração física da doente; nada nessa exploração nos
parece indicar uma lesão renal pré-renal; além disso apresentam duas opções de
resposta que são semelhantes: azotemia pré-renal e diminuição da perfusão renal,
motivo pelo qual podemos excluir as opções B e D. Com tudo isto teremos de escolher
entre a C e a E. Sem análise de urina o diagnóstico diferencial torna-se complicado, no
entanto nada no enunciado nos indica que a doente possa ter uma glomerulonefrite por
imunocomplexos. Pelo contrário, fornecem-nos um antecedente “chave” para a
resposta a esta pergunta, que é o facto da paciente estar sob terapêutica com
azitromicina e ibuprofeno; ambos com potencial nefrotóxico. Devido a tudo o exposto
anteriormente, consideramos que a resposta "mais correta" é a C - concentração
elevada de agentes nefrotóxicos.
 

Referências bibliográficas

 Kasper D, Fauci A, Stephen H. Harrison. Principles of internal medicine. 20 ed. New


York. McGraw Hill. 2018. Capítulo 304.
 Omar A, Sharon A, et al. KDIGO Clinical Practice Guideline for Acute Kidney Injury.
Kidney International. 2012; 2 (1):19-36.
 

106. Uma mulher de 24 anos, operadora de call center, vem a consulta de medicina geral e familiar porque
pretende engravidar. Os antecedentes ginecológicos e obstétricos são menarca aos 12 anos, ciclos
regulares de 28 dias com 5 dias de fluxo menstrual; nuligesta. A data da última menstruação foi há sete
dias. Faz contraceção com estroprogestativo oral desde os 17 anos, quando iniciou a vida sexual. Tem
antecedentes de asma, medicada com salbutamol em SOS. Nega outra medicação habitual. Os
antecedentes familiares incluem mãe histerectomizada aos 45 anos por leiomiomas uterinos. Os sinais
vitais são temperatura 36,5°C, frequência respiratória 12/min, frequência cardíaca 75/min e pressão
arterial 130/70 mm Hg. Ela mede 164 cm de altura e pesa 55 kg; IMC 20 kg/m². O exame físico, incluindo
o ginecológico, encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade. A citologia cervicovaginal efetuada
há seis meses não apresentava alterações patológicas. O grupo sanguíneo é A Rh+.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Glucose 85 mg/dL; Teste de Coombs indireto Negativo; Anticorpo para rubéola – IgM Negativo;
Anticorpo para rubéola – IgG Negativo; Anticorpo para toxoplasmose – IgM Negativo; Anticorpo para
toxoplasmose – IgG Negativo; Antigénio HBs Negativo; VDRL Não reativo; VIH 1 e 2 Negativo.

Urina: Exame microbiológico Negativo.

Sangue: Hemoglobina 12,1 g/dL.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado na gestão desta mulher?

(A) Realizar prova de tolerância oral à glicose.


(B) Realizar serologia para citomegalovírus.
(C) Solicitar grupo sanguíneo do companheiro.
(D) Suplementar com sulfato ferroso.
(E) Vacinar para a rubéola.

Resposta correta: E

Comentário
Na consulta pré-concecional, as mulheres jovens suscetíveis, devem ser vacinadas
para a rubéola. A prova de tolerância da glicose oral está recomendada como parte das
rotinas analíticas do 2º trimestre da gestação. O rastreio serológico por rotina do
citomegalovirus (CMV) não está recomendado, tendo em conta a ausência de vacina ou
tratamento eficaz para infeções maternas ou fetais por CMV. A suplementação da
gravidez deve iniciar-se no período pré-concecional com uma dose diária de ácido fólico
de 400μg/ dia. Não existe consenso que a suplementação universal e sistemática da
mulher grávida com ferro melhore os desfechos maternos e neonatais; inclusivamente
estudos recentes indicam que a suplementação desnecessária com ferro se associa a
um risco aumentado de desfechos adversos, como parto pré-termo, baixo peso do
recém-nascido ao nascer e diabetes gestacional. Em mulheres sem anemia, pode ser
recomendada a suplementação em grávidas com ferritina <30 ng/mL, através da
administração diária por via oral de pelo menos 60 mg de ferro elementar.
 

Referências bibliográficas

 Norma da DGS n.º37/2011 de 30 de Setembro (atualizada a 20/12/2013).


 Beckmann 7ª edição, P 78 “PRECONCEPTION COUNSELING AND CARE”, 3º paragrafo
linha 1; P250 “screening”, 1º paragrafo linhas 1-5; P254 “CYTOMEGALOVIRUS”, 3º
paragrafo linhas 1-2.
 NORMAS DE ORIENTAÇÃO CLÍNICA SPOMMF, “Anemia na Gravidez e no Puerpério”
2019.
 

107. Uma mulher de 75 anos recorre ao serviço de urgência por mal-estar precordial desde ontem, com
ansiedade marcada. Refere ainda dispneia de esforço mais acentuada nas últimas sete semanas, com
agravamento súbito desde ontem e com queixas atuais em repouso. A história médica revela doença -
pulmonar obstrutiva crónica e síndrome de apneia obstrutiva do sono [a fazer CPAP (pressão positiva -
contínua nas vias aéreas)]. Não tem antecedentes de hipertensão arterial ou doença coronária. Os sinais
vitais são temperatura 36°C, frequência respiratória 29/min, frequência cardíaca 116/min e pressão
arterial 110/70 mm Hg. A auscultação cardíaca revela taquicardia, sem sopros.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Gases (ar ambiente): PO2 55 mm Hg; PCO2 32 mm Hg.

O raio-X do tórax não apresenta alterações de novo no parênquima pulmonar.

Qual das seguintes alternativas é a explicação mais provável para o quadro clínico descrito?

(A) Agudização da doença pulmonar obstrutiva crónica.


(B) Ataque de pânico.
(C) Insuficiência cardíaca.
(D) Pneumotórax.
(E) Tromboembolismo pulmonar.

Resposta correta: E

Comentário
O caso clínico é bastante sugestivo de tromboembolismo pulmonar: agravamento súbito
da dispneia (em doente com doença pulmonar obstrutiva crónica), dor torácica,
taquicardia e taquipneia, hipoxemia e hipocapnia.

Referências bibliográficas

 2019 ESC Guidelines for the diagnosis and management of acute pulmonary
embolism developed in collaboration with the European Respiratory Society (ERS):
The Task Force for the diagnosis and management of acute pulmonary embolism of
the European Society of Cardiology (ESC), Cap 4.1 “Clinical presentation”: “The
clinical signs and symptoms of acute PE are non-specific. In most cases, PE is
suspected in a patient with dyspnoea, chest pain, pre-syncope or syncope, or
haemoptysis. (…) In patients with pre-existing heart failure or pulmonary disease,
worsening dyspnoea may be the only symptom indicative of PE. Chest pain is a
frequent symptom of PE and is usually caused by pleural irritation due to distal
emboli causing pulmonary infarction. Hypoxaemia is frequent, (...) Hypocapnia is also
often present. (...) in milder cases, the only abnormality may be sinus tachycardia,
present in 40% of patients.”
 

108. Um lactente de 6 meses, nascido às 36 semanas de gestação, vem ao consultório médico para consulta de
vigilância. Não tem antecedentes patológicos de relevo. Ao exame físico apresenta somatometria
adequada à idade gestacional.

Qual das seguintes alternativas é expectável observar na avaliação do neurodesenvolvimento deste


lactente?

(A) Aponta com o indicador para pedir.


(B) Apresenta bom controlo cefálico.
(C) Diz «papá»/«mamã» sem intenção.
(D) Fica sentado sem apoio.
(E) Sorri ao ver a sua imagem num espelho.

Resposta correta: B

Comentário
Estamos perante um lactente com uma idade gestacional de 36 semanas (prematuro).
Assim, a nível de desenvolvimento, devemos fazer a avaliação de acordo com a idade
corrigida – neste caso, cerca de 5 meses. Analisando agora as várias opções de
resposta, que relatam várias etapas do desenvolvimento psicomotor da criança: A – a
partilha da atenção conjunta através do “apontar” está presente, habitualmente, a partir
dos 9 meses de idade (motricidade fina); B – o bom controlo cefálico deve estar presente
a partir dos 4 meses de idade (motricidade global); C – a emissão de palavras
dissilábicas sem clara associação está presente a partir dos 6-9 meses (linguagem); D
- a posição sentada deve ser adquirida entre os 6 e os 9 meses, aumentando
gradualmente a sua estabilidade (motricidade global); E – o sorriso perante a imagem
refletida no espelho é característico a partir dos 6 meses de idade (interação social);
Assim, a única opção que tem de estar presente neste lactente com 5 meses de idade
corrigida é a opção B.

Referências bibliográficas

 “Manual de Diagnostico y Terapeutica en Pediatria” (6ª edição) - PARTE II, capítulo


6.3, página 58 (tabela 6.3-1).
 

109. Uma mulher de 60 anos é trazida ao serviço de urgência pelo sobrinho, referindo «Acho que estou a ter
uma trombose. O lado esquerdo da minha cara está a cair». Duas horas antes, ela notou alteração da sua
aparência quando se viu ao espelho. Está agora incapaz de fechar o seu olho esquerdo. A história médica
revela hipertensão arterial e enxaqueca. A medicação habitual inclui indapamida, aspirina e sumatriptano
em SOS. Voluntariou-se recentemente num grupo que limpa trilhos pedonais. Teve consulta de vigilância
no médico assistente há dois meses. Os sinais vitais são temperatura 36,7°C, frequência respiratória
12/min, frequência cardíaca 82/min e pressão arterial 160/78 mm Hg. Ao exame físico o lado esquerdo
da face está flácido, incluindo a testa. Os movimentos musculares extraoculares estão normais. A língua
está na linha média. A força e tónus dos braços e pernas estão normais, bilateralmente. O restante exame
físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é a evolução natural mais provável de acontecer no curso desta doença?

(A) Formação de vesículas nas áreas afetadas, nas horas seguintes,


(B) Progressão para envolvimento dos músculos da deglutição, nos dias seguinte
(C) Progressão para fraqueza do lado esquerdo do corpo, nas horas seguintes.
(D) Progressão para uma doença do movimento ocular.
(E) Resolução espontânea nos próximos meses.

Resposta correta: E

Comentário
Doente com debilidade de uma hemiface que inclui também a testa. Além disso, tem
dificuldade em fechar o olho, o que confirma o atingimento do andar superior da
hemiface. Não há outros défices no exame neurológico. O atingimento da hemiface
incluindo andares superior e inferior é indicativo de paralisia facial periférica. A causa
mais provável é a idiopática, a paralisia de Bell. O surgimento de vesículas no canal
auditivo interno é infrequente e indica um herpes zóster como causa da paralisia. Não
é expectável uma afetação dos músculos da deglutição, dos movimentos oculares nem
das extremidades, pois a suspeita principal é uma paralisia facial de Bell. A grande
maioria dos casos evoluem a uma resolução espontânea completa.

Referências bibliográficas

 Baugh et al, 2013. Clinical Practice Guideline: Bell’s Palsy


 

110. Um homem de 72 anos é trazido ao serviço de urgência pelos bombeiros por estar em coma desde hoje
de manhã. A filha refere poliúria intensa, diminuição do apetite e perda de peso de cerca de 10 kg nas
últimas semanas e letargia e confusão há 48 horas. A história médica revela obesidade, hipertensão arterial
e diabetes mellitus tipo 2. A medicação habitual inclui metformina, sitagliptina, ramipril, bisoprolol,
furosemida, ácido acetilsalicílico e lorazepam, em posologia que a filha não recorda. Os sinais vitais são
temperatura 36°C, frequência respiratória 18/min, frequência cardíaca 78/min e pressão arterial 108/78
mm Hg; SpO2 97 % (ar ambiente). Ao exame físico está em coma (escala de coma de Glasgow = 5). As
mucosas estão desidratadas e anictéricas. A auscultação cardíaca e pulmonar encontra-se dentro dos
parâmetros de normalidade. O abdómen é mole e depressível. Não tem edemas.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Glucose: 854 mg/dL; Sódio 140 mEq/L; Potássio 4,6 mEq/L; Magnésio 2 mEq/L; Bicarbonato 24
mEq/L; Cálcio ionizado 1,3 mmol/L [N= 1,17-1,32]; Fósforo sérico 2,9 mg/dL.

Gases: PO2 89 mm Hg; PCO2 34 mmHg pH 7,4.

Qual dos seguintes parâmetros é o mais prioritário corrigir neste momento?

(A) Calcemia.
(B) Caliemia.
(C) Fosfatemia.
(D) Magnesiemia.
(E) Volemia.

Resposta correta: E

Comentário
Este caso clínico é altamente sugestivo de um estado hiperglicémico hiperosmolar –
trata-se de um homem idoso, com diabetes mellitus tipo 2, encontrado comatoso e com
uma glicemia >600 mg/dL. A principal prioridade terapêutica perante este diagnóstico
é hidratar o doente, corrigindo a volémia (opção E correta). A calcemia, caliemia,
fosfatemia e magnesemia estão normais, não carecendo de correção (todas as outras
opções estão incorretas).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª Edição: Capítulo 397, página 2871


 

111. Uma mulher de 56 anos vem ao serviço de urgência por primeiro episódio de defecação com fezes
envoltas em sangue. Os sinais vitais são temperatura 36,8°C, frequência cardíaca 86/min e pressão arterial
120/55 mm Hg. O exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: AST 23 U/L; ALT 39 U/L; Fosfatase alcalina 67 U/L; Proteínas: Albumina 4,5 g/dL.

Sangue: Hemoglobina 8,7 g/dL; Tempo de protrombina 13 segundos.

Após preparação intestinal, realizou colonoscopia que mostrou escassos divertículos na zona do sigmoide,
sem outras alterações.

Para além de medicar com ferro, qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado na
gestão deste doente?

(A) Enviar para cirurgia de resseção do sigmoide.


(B) Prescrever omeprazol.
(C) Solicitar angioTC abdominal.
(D) Solicitar enteroscopia por videocápsula.
(E) Não estão indicadas mais intervenções no momento.

Resposta correta: E

Comentário
O caso clínico ilustra uma mulher de 56 anos com episódio inaugural de hematoquézias
sem repercussão hemodinâmica. Analiticamente apresenta anemia (Hg 8.7g/dl). A
hemorragia digestiva baixa apresenta inúmeras etiologias, variando consoante o grupo
etário. Nos adultos (excluindo patologia anorretal) a hemorragia diverticular é a causa
mais comum de hematoquézias, sendo na maioria dos casos auto-limitada (~80% dos
casos). Apesar da hemorragia diverticular ser mais comum no cólon direito, também
pode ocorrer no cólon esquerdo. Neste caso a colonoscopia mostrou divertículos
apenas no cólon sigmóide. A realização de angio-TC pode ser útil para deteção da
localização da hemorragia, no entanto a colonoscopia tem clara vantagem visto que
permite realização de terapêutica caso seja encontrado o divertículo responsável pela
hemorragia. Em casos de hemorragia continuada, que não cessa, a resseção cirúrgica
pode ser uma alternativa à realização de colonoscopias seriadas na tentativa de
encontrar o divertículo responsável pela hemorragia. A realização de enteroscopia por
cápsula não teria utilidade uma vez que a colonoscopia já identificou a causa mais
provável para a hemorragia. Neste caso apenas está descrito um episódio único de
hematoquezias sem gravidade associada pelo que de momento é dispensável um
estudo ou intervenção adicional.

Referências bibliográficas

 Harrison 20th Edition – Chapter 44 Gastrointestinal Bleeding p273 e 321 Diverticular


Disease and Common Anorectal Disorders p2283-2284
 

112. Um homem de 60 anos vem ao serviço de urgência por dispneia de esforço com agravamento progressivo.
Refere que aumentou 3 kg no último mês e que nos últimos 10 dias tem apresentado dispneia após breves
trajetos a caminhar. Nega dor torácica, dispneia ao despertar, tosse ou febre. A história médica revela
diabetes mellitus tipo 2, hipertensão arterial e osteoartrose desde longa data. Foi-lhe diagnosticada
insuficiência cardíaca há dois anos. A medicação habitual inclui insulina, glibenclamida, captopril,
furosemida (e naproxeno em automedicação). Andou a tomar chá de hipericão para alterações do humor.
Na última consulta com o médico de família, há quatro meses, tinha 160/100 mm Hg de pressão arterial,
ureia e creatinina séricas dentro de valores normais, e hemoglobina A1c de 9,5 %. Nessa altura foram
prescritos insulina e captopril, foi interrompido o atenolol e a dose de furosemida foi aumentada. Hoje,
os sinais vitais são temperatura 36,8°C, frequência respiratória 14/min, frequência cardíaca 80/min,
regular, e pressão arterial 170/110 mm Hg. A auscultação pulmonar revela crepitações inspiratórias em
ambas as bases pulmonares. Apresenta edema dos membros inferiores (2+). O restante exame físico
encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 2,7 mg/dL; Azoto ureico 50 mg/dL; Glucose 143 mg/dL; Colesterol Total 235 mg/dL.

Sangue: Hemoglobina 13.2 g/dL; Hemoglobina A1c 7.2 %. Urina: Glicose 1+.

Qual das seguintes alternativas melhor explica o aumento na creatinina sérica, sugerindo possível estenose
bilateral da artéria renal?

(A) Aumento da dose de furosemida.


(B) Interrupção do atenolol.
(C) Início do captopril.
(D) Início de insulina.
(E) Início de chá de hipericão.

Resposta correta: C

Comentário
No caso apresentado, o aumento da creatinina sérica sugerindo estenose bilateral da
artéria renal apenas poderia ser justificado pelo início recente de captopril. Uma das
contra-indicações clássicas para a utilização de IECAs é exatamente a presença de
estenose bilateral da artéria renal ou estenose unilateral se rim único, pelo risco de
agravamento da função renal. Nenhuma das outras opções terapêuticas justificaria a
lesão renal.

Referências bibliográficas

 Guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia “Manejo da hipertensão arterial”


(2018) - Página 3057, tabela 20
 

113. Um homem de 78 anos vem ao consultório médico pela primeira vez para exame de vigilância de saúde.
Há 10 anos, reformou-se de maquinista numa fábrica de munições, onde a sua função incluía o polimento
de peças metálicas. Tem sido genericamente saudável, mas tem vindo a notar dificuldade em respirar com
evolução progressiva no último ano. Diz que, inicialmente, a falta de ar era desencadeada pelo esforço,
mas recentemente tem vindo a ocorrer em repouso. A medicação inclui aspirina diariamente e
suplementos vitamínicos. Não fuma e bebe um copo de uísque todas as noites. O raio-X de tórax ântero-
posterior e perfil revela campos pulmonares reduzidos com discretas alterações intersticiais. A
espirometria revela redução da capacidade vital e do volume expiratório forçado no 1.° segundo.

Qual dos seguintes é o exame de diagnóstico adicional mais adequado neste momento?

(A) Biópsia pulmonar.


(B) Broncoscopia.
(C) Cintigrafia pulmonar de ventilação-perfusão.
(D) TC do tórax.
(E) Tomografia do tórax por emissão de positrões.

Resposta correta: D

Comentário
O caso clínico é sugestivo de uma pneumoconiose, uma doença pulmonar intersticial de
causa conhecida, dadas as alterações imagiológicas e espirométricas associadas à
exposição descrita. Contudo, as mesmas não são suficientemente específicas de uma
patologia em particular, de modo que se torna necessário uma melhor caracterização
imagiológica. A TC do tórax é, neste momento, considerada o standard of care da
avaliação inicial de um paciente com suspeita de uma doença pulmonar intersticial.

Referências bibliográficas

 Harrison, 20ªed, Cap 287 “Intersticial Lung Disease”, pg 2001, “Chest CT High
resolution chest CT (HRCT) imaging is now con- sidered to be standard of care in the
initial evaluation of a patient with a suspected ILD. HRCT can be diagnostic for some
ILDs (e.g., IPF) in right clinical context and may preclude the need for, and spare the
patient the risk of, a lung biopsy. HRCT also helps to define the extent of the ILD, the
presence of more concerning features suggestive of advanced disease (e.g.,
honeycombing), can provide information on coexisting diseases (e.g., emphysema
and lung cancer), and when not diagnostic, can help to provide the most useful
locations for obtaining lung biopsy specimens.
 

114. Um homem de 78 anos, reformado, é trazido pela vizinha ao serviço de urgência por tonturas intensas e
desequilíbrio com cinco dias de evolução. Ele refere mal-estar geral e diz «fiquei deitado na cama, sem
conseguir comer». O homem vive só. A vizinha, por não o avistar há três dias, foi a casa dele e encontrou-
o prostrado e ligou para o 112. Ele nega antecedentes patológicos de relevo. A vizinha não sabe indicar a
medicação habitual. Os sinais vitais são temperatura 36°C, frequência respiratória 26/min, frequência
cardíaca 110/min e pressão arterial 90/70 mm Hg; SpO2 97% (ar ambiente). Ao exame físico apresenta-
se prostrado, com as mucosas coradas e desidratadas. Responde a perguntas de forma orientada, mas com
dificuldade, pelo facto de a língua estar muito seca. A urina é escassa desde a admissão, há duas horas, e
é laranja escuro. O restante exame físico, incluindo auscultação cardíaca e pulmonar, palpação abdominal
e exame da pele, encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é a mais adequada na avaliação inicial deste utente?

(A) Ecocardiograma
(B) Ecografia renal
(C) Raio-X abdominal simples
(D) TC do crânio.
(E) Toque retal.

Resposta correta: B

Comentário
A pergunta encontra-se mal formulada, uma vez que não são providenciadas análises
que nos permitam enquadrar melhor o caso clínico. Não é boa prática clínica requisitar
um exame de imagem sem ter antes uma avaliação analítica que nos ajude a orientar o
diagnóstico. Apesar disso, tendo em consideração as diversas alíneas consideramos
como ”verdadeira” a resposta B, partindo do princípio que o doente apresenta uma LRA,
sendo necessário excluir uma causa obstrutiva dada a referência a redução do débito
urinário, muito embora a oligúria possa ser facilmente explicada pelo quadro de
desidratação.

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª edição, parte 9 (doenças do rim e trato urinário), capítulo 304 (lesão
renal aguda), páginas 5105-5124.

 
 

Caso seja impugnável (comentário + referências)

A pergunta encontra-se mal formulada, uma vez que não são providenciadas análises
que nos permitam enquadrar melhor o caso clínico. Não é boa prática clínica requisitar
um exame de imagem sem ter antes uma avaliação analítica que nos ajude a orientar o
diagnóstico. No que respeita a realização de ecografia renal em particular, tendo em
conta o enunciado e a avaliação clínica, o doente aparenta sinais de desidratação, com
redução da diurese muito provavelmente nesse contexto, pelo que a ecografia renal teria
muito pouco valor diagnóstico.

 Harrison 20ª edição, parte 9 (doenças do rim e trato urinário), capítulo 304 (lesão
renal aguda), página 5118: “Imaging of the urinary tract with renal ultrasound or CT
should be undertaken to investigate obstruction in individuals with AKI unless an
alternate diagnosis is apparent”.
 

115. Uma mulher de 55 anos recorre ao serviço de urgência por dor epigástrica intensa de início súbito há cerca
de quatro horas. Refere que a dor iniciou após a ingestão de vários cocktails e costeleta de porco ao jantar.
Desde então, sente náuseas e teve vários episódios de vómitos, sem sangue. Ela nega episódios anteriores
semelhantes. A história médica revela cirurgia por gravidez ectópica há 30 anos. Os sinais vitais são
temperatura 38,5°C, frequência cardíaca 100/min, frequência respiratória 14/min e pressão arterial 100/60
mm Hg. A auscultação cardíaca e pulmonar encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade. A
palpação abdominal revela dor e espasmo muscular na região epigástrica. Não se auscutam ruídos
hidroaéreos. O raio-X abdominal em pé mostra uma pequena quantidade de ar livre sob o hemidiafragma
direito.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Avaliar as concentrações séricas de amilase e lipase.


(B) Avaliar os valores de hemoglobina e hematócrito.
(C) Preparar para endoscopia digestiva alta.
(D) Referenciar para observação por um cirurgião geral.
(E) Solicitar trânsito gastrointestinal com gastrografina.

Resposta correta: D

Comentário
Trata-se de um caso de perfuração do esófago. Podemos interpretar este caso como
uma perfuração do esófago por ruptura espontânea na JGE devido a vómito
forçado/esforço para vomitar - sindrome de Borhaave em que ocorre um aumento
abrupto da pressão esofágica com pressão intratoracica negativa. Apresenta dor
epigástrica intensa, febre e uma frequência cardiaca aumentada que nos levanta a
suspeita de ter uma perfuração e ao referirem que o Raio X abdominal em pé apresenta
uma pequena quantidade de ar livre sob o hemidiafragma direito confirma-nos tratar-
se de uma perfuração. Assim sendo, dever-se-á referenciar para observação por
cirurgia geral.

Referências bibliográficas

 Brauer RB, Liebermann-Meffert D, Stein HJ, et al. Boerhaave's syndrome: analysis of


the literature and report of 18 new cases. Dis Esophagus 1997; 10:64.
 Curci JJ, Horman MJ. Boerhaave's syndrome: The importance of early diagnosis and
treatment. Ann Surg 1976; 183:401.
 

116. Uma mulher de 60 anos vem ao consultório médico por cansaço, mialgias, sintomatologia dispéptica uma
a duas vezes por semana e obstipação com três meses de evolução. Ela não tem antecedentes patológicos
de relevo e não faz medicação habitual. No entanto, refere valores elevados de cálcio sérico nas análises
que fez para o seguro de vida, há dois anos. Os sinais vitais são temperatura 37°C, frequência respiratória
18/min, frequência cardíaca 60/min e pressão arterial 135/75 mm Hg. Ela tem 171 cm de altura e pesa 73
kg; IMC 25 kg/m². Ela parece ansiosa, mas sem sinais de sofrimento agudo. O exame físico encontra-se
dentro dos parâmetros de normalidade e a palpação dos músculos não revela dor.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Sódio 140 mEq/L; Potássio 3,5 mEq/L; Cloro 100 mEq/L; Bicarbonato 25 mEq/L; Cálcio total 11,1
mg/dL; TSH 4,0 microU/mL; Hormona paratiroidea (PTH) 50 pg/mL [N = 10-55].

Sangue: Hemoglobina 13,0 g/dL; Hematócrito 36 %; Leucócitos 10 000/mm³.

Qual das seguintes alternativas é a causa subjacente mais provável para o quadro clínico?

(A) Hiperparatiroidismo.
(B) Hiperpituitarismo.
(C) Hipertiroidismo.
(D) Hipoparatiroidismo.
(E) Hipotiroidismo.

Resposta correta: A

Comentário
O caso clínico fala-nos de uma doente com história de hipercalcemia e quadro
compatível com a mesma. Analiticamente, apresenta um cálcio total elevado com uma
PTH próxima do limite superior da normal. A única hipótese plausível das apresentadas
é hiperparatiroidismo (resposta A correta). O hipertiroidismo também poderia provocar
hipercalcemia, mas esta doente tem uma TSH normal (resposta C errada). O
hiperpituitarimo, hipoparatiroidismo e hipotiroidismo geralmente não cursam com
hipercalcemia (respostas B, D e E são incorretas).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª Edição, páginas 2927-2928.


 

117. Um homem de 28 anos é admitido no serviço de urgência por fraqueza generalizada, febre, dor no flanco
direito e hematúria com cinco dias de evolução. No dia da admissão, de manhã, iniciou calafrios. O doente
refere episódios prévios de hematúria, durante os últimos três anos, que atribui a um programa de
exercício físico intenso. Refere também que teve «infeções no rim» tratadas no serviço de urgência. A
história médica revela hipertensão arterial, para a qual recusou tratamento. Refere que alguns dos seus
familiares biológicos precisaram de fazer diálise, e tem ideia de que o pai biológico morreu jovem devido
a «hemorragia cerebral». Na urgência iniciou antibiótico endovenoso e fluidos. Os sinais vitais são
temperatura 38,5°C, frequência respiratória 24/min, frequência cardíaca 96/min e pressão arterial 162/92
mm Hg. O exame físico revela percussão dolorosa do flanco direito. Os exames cardiopulmonar e retal
encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 2,0 mg/dL; Azoto ureico 25 mg/dL.

Urina: Proteínas Vestígios; Sangue 1+.

Sangue: Leucócitos 12 500/mm³.

Qual das seguintes alternativas é a causa subjacente mais provável da condição do doente?

(A) Doença poliquística renal.


(B) Feocromocitoma.
(C) Obstrução congénita da junção uretero-pélvica.
(D) Rim esponjoso medular.
(E) Síndrome de Goodpasture.

Resposta correta: A

Comentário
O caso clínico descreve um doente jovem com antecedentes familiares de doença renal
com necessidade de realização de diálise e episódios de infeções e hematúria
macroscópica recorrentes, sendo compatível com uma doença renal poliquística
autossómica dominante (doença congénita renal mais frequente) – resposta A correta.
É igualmente fornecido um dado relevante sobre o pai que terá falecido na sequência
de uma hemorragia cerebral; na doença poliquística uma das manifestações
extrarrenais são os aneurismas intracranianos, favorecendo a suspeita diagnóstica. As
restantes alíneas não são prováveis tendo em conta a história: faltam dados
importantes para que possamos suspeitar de feocromocitoma (resposta B incorreta) e
relativamente à obstrução da junção uretero-pélvica não há dados ecográficos que
suportem esta suspeita e não costuma levar nem a HTA nem a fenómenos de hematúria
macroscópica (resposta C incorreta); de igual forma, o rim esponjoso medular não se
encontra habitualmente associado a casos familiares e apenas raramente causa
doença renal crónica e HTA (resposta D incorreta); finalmente, os quadros recorrentes
de hematúria e ITU não são compatíveis com um quadro de lesão renal rapidamente
progressiva observada no Síndrome de Goodpasture (resposta E incorreta).
 

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª edição, parte 9 (doenças do rim e trato urinário), capítulo 309 (doença
renal poliquística e outras doenças hereditárias tubulares), páginas 5216-5221
 

118. Uma mulher de 45 anos vem ao consultório médico por dor cervical persistente desde há oito meses, após
acidente de viação. Pede prescrição para medicação analgésica. Refere que, desde o acidente, toma
diazepam diariamente, com frequência múltiplos comprimidos por dia. Não consegue deixar de pensar
no mesmo, tem pesadelos recorrentes sobre o sucedido e evita sair de casa «porque tudo me faz lembrar
aquele dia e já não aguento mais». Pela necessidade de se apresentar em tribunal, optou por interromper
o diazepam no dia anterior, «para conseguir pensar mais claramente». Desde que interrompeu a medicação
sente-se mais ansiosa e com mais dores. Ela não tem antecedentes patológicos de relevo e não toma mais
nenhuma medicação. Na última consulta de rotina, há um ano, estava assintomática. A observação está
agitada e chorosa. Quando questionada acerca do acidente, a doente mostra-se ainda mais agitada e pede
para não ter de falar sobre esse assunto.

Qual dos seguintes mecanismos mais provavelmente desempenha um papel primário no desenvolvimento
deste quadro?

(A) Atrofia global do córtex temporal.


(B) Aumento do volume do hipocampo.
(C) Diminuição da atividade do córtex pré-frontal.
(D) Hiperatividade mesolímbica.
(E) Inibição da atividade da amígdala.

Resposta correta: C

Comentário
Esta doente apresenta uma perturbação de stress pós-traumático (exposição a evento
com potencial traumático + pesadelos recorrentes cujo conteúdo está relacionado com
o evento + lembranças do evento recorrentes e incoercíveis + evitamentos (incluindo
evitando falar do evento) + alterações do humor desde o evento + abuso de substâncias
secundário). Alguns dos mecanismos neurobiológicos associados à Perturbação de
Stress Pós-Traumático, evidenciados através de RMN e RMN funcional são: volume dos
hipocampos diminuído, hiperatividade da amígdala, diminuição da atividade no córtex
cingulado anterior e diminuição da atividade no córtex pré-frontal. Esta última é a única
disponível nas opções, sendo por isso a opção C a correta

Referências bibliográficas

 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Reactions to Stressful


Experiences”, secção “Post-Traumatic Stress Disorder”, pág 142 e 143; Box 7.5, pág
145
 

119. Um homem de 30 anos, solteiro, advogado, recorre ao serviço de urgência por palpitações, dispneia e
intensa ansiedade que se iniciou subitamente quando estava a dormir. O quadro resolveu espontaneamente
ao fim de 15 minutos. Por achar que estava a ter um «ataque cardíaco», acionou os serviços de emergência
médica. No registo clínico, há referência a um episódio semelhante há seis semanas, tendo sido efetuado
estudo analítico e eletrocardiograma que se revelaram dentro dos parâmetros de normalidade. O
ecocardiograma, nessa data, revelou prolapso da válvula mitral, sem regurgitação. O doente conta que,
apesar dos resultados dos exames, não ficou tranquilo, tendo ficado desde essa altura com medo de «ter
um ataque de coração». Pratica exercício físico duas vezes por semana. Nega consumo de álcool, tabaco
ou outras drogas. Os sinais vitais são frequência respiratória 19/min, frequência cardíaca 110/min e
pressão arterial 145/85 mm Hg. Apresenta-se vígil e colaborante, com humor ansioso e sem atividade
delirante nem alucinatória. A auscultação cardíaca revela sopro sistólico grau 2/6 no ápex. O
eletrocardiograma encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado para o tratamento do quadro que traz o
doente ao serviço de urgência?

(A) Aconselhar aumento da frequência de exercício físico.


(B) Explicar a relação com prolapso mitral e recomendar vigilância cardíaca.
(C) Explicar que foi um episódio autolimitado que não requer intervenção.
(D) Prescrever diazepam em titulação até 5 mg/dia.
(E) Prescrever sertralina em titulação até 50 mg/dia.

Resposta correta: E

Comentário
Trata-se de um homem que vem ao SU com uma crise de ansiedade, provavelmente de
pânico. Verifica-se intensa ansiedade de início súbito, duração de 15 minutos, sem
precipitante, enquanto o doente estava a dormir, com remissão espontânea,
acompanhado de palpitações e dispneia e medo de estar a ter um “ataque de coração”.
Percebe-se pelo enunciado que teve, pelo menos, mais uma crise sobreponível há 6
semanas. Portanto temos duas prováveis crises de pânico. Desde a primeira, há 6
semanas, verifica-se que o doente mantém medo de ter uma nova crise ou das suas
consequências, verificando-se a presença de humor ansioso mesmo após a remissão
da crise. Assim, configura-se um diagnóstico de Perturbação de Pânico, sendo assim a
opção mais adequada, das fornecidas, a sertralina titulada até aos 50 mg, uma vez que
na perturbação de pânico, a primeira linha no tratamento psicofarmacológico são os
inibidores seletivos da recaptação de serotonina. Não faria sentido aconselhar o
aumento da frequência de exercício físico nesta fase, porque o exercício físico até pode
desencadear uma crise de pânico. Em relação ao prolapso da válvula mitral, uma
eventual vigilância cardíaca não impediria o aparecimento de novas crises nem
remitiria a ansiedade inter-episódica. Convém relembrar ainda assim, que é comum a
coexistência de perturbação de pânico e prolapso da válvula mitral, tendo já estas sido
várias vezes associadas (provável substrato genético comum). Não foi um episódio
isolado, uma vez que já houve um anteriormente, e mais importante do que isso é o
receio do doente em ter novos episódios ou das suas consequências, sendo por isso que
requer intervenção. A primeira linha no tratamento, psicofarmacológico, de
 

perturbação de pânico são os SSRI´s, não as benzodiazepinas, que podem ser usadas
em SOS, por exemplo.

Referências bibliográficas

 Shorter Oxford Textbook of Psychiatry 7a edição Capítulo “Anxiety and Obsessive-


Compulsive Disorders”, secção “Panic Disorder”, pág 180-183.
 

120. Um homem de 49 anos vem a consulta de oncologia para seguimento de carcinoma epidermoide da
cavidade oral, tratado com cirurgia e quimiorradioterapia adjuvante há 12 meses. Trabalhou como pintor
anteriormente, mas está desempregado desde há 10 anos. É fumador de 50 UMA e era consumidor de
bebidas alcoólicas (120 g/dia) até há um ano. Tem ainda antecedentes de abuso de heroína e cocaína
fumadas até há cinco anos.

Qual das seguintes alternativas é o efeito adverso secundário à radioterapia mais provável de encontrar
neste doente?

(A) Alopécia
(B) Mucosite
(C) Parestesias
(D) Sialorreia
(E) Xerostomia

Resposta correta: E

Comentário
Este doente foi tratado a um carcinoma epidermóide da cavidade oral com cirurgia e
posteriormente com quimiorradioterapia. Os potenciais efeitos secundários da
radioterapia são locais. A mucosite surge em fase aguda pela irradiação durante o
tratamento, mas devido ao alto turnover celular e capacidade de regeneração das
mucosas, existe recuperação semanas após a radioterapia. A alopécia também ocorre
em fase aguda durante o tratamento e apenas há queda capilar nas áreas irradiadas.
Nos tumores da cavidade oral, apenas os folículos da barba ficam no campo de
irradiação e após o tratamento há reversão da alopécia local. A xerostomia tem
instalação inicialmente aguda devido à irradiação das glândulas salivares, que irá
originar falência deste órgão e assim perpetuar a incapacidade de produção adequada
de saliva. Atendendo que este doente está a ser avaliado em consulta de seguimento 12
meses após o tratamento com quimiorradioterapia, dos sintomas descritos, o mais
provável de encontrar que seja secundário à radioterapia, será a xerostomia. As
parestesias poderão ocorrer como efeito secundário de quimioterapia e não da
radioterapia. A sialorreira não é um efeito secundário da radioterapia, mas sim a
xerostomia.

Referências bibliográficas

 HPIM 20th: página 675; tabela 91-1


 

121. Um homem de 64 anos vem ao consultório médico por mal-estar e fadiga com três meses de evolução.
Ele diz que durante este período não conseguiu terminar um jogo de golfe. Perdeu o apetite e tem estado
nauseado nas duas últimas semanas. Há 30 anos que não vai ao médico porque geralmente se sente bem.
A história médica revela ferimento de bala no abdómen, no seguimento de trauma em combate, há 34
anos. Não faz medicação habitual e não tem história de alergias. É fumador de 20 cigarros por dia nos
últimos 40 anos. Nega consumo de álcool ou uso de drogas recreativas. Os sinais vitais são temperatura
37°C, frequência respiratória 20/min, frequência cardíaca 110/min e pressão arterial 105/70 mm Hg. Ao
exame físico aparenta estar emagrecido e cansado, mas sem sinais de sofrimento agudo. O restante exame
físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 0,5 mg/dL; Azoto ureico 13 mg/dL; Glucose 195 g/dL; Sódio 116 mEq/L; Potássio 4,8
mEq/L; Cloro 82 mEq/L; Bicarbonato 26 mEq/L; Osmolaridade 239 mOsmol/kg H2O.

Sangue: Eritrócitos 5,0 x 10^6/mm³; Hemoglobina 13,5 g/dL; Hematócrito 41 %; Plaquetas 250 x 10^9/L.

Qual das seguintes alternativas é a alteração ao exame físico mais provável de encontrar neste doente?

(A) Aumento do tamanho da tiroide.


(B) Candidíase oral.
(C) Gânglios linfáticos supraclaviculares.
(D) Nódulo da próstata
(E) Sopro diastólico.

Resposta correta: C

Comentário
Este doente apresenta hiponatrémia grave, que dada a ausência de sintomas
neurológicos, sugere uma instalação subaguda/crónica, compatível com as queixas de
mal-estar, fadiga náuseas e perda de apetite que refere desde há vários meses.
Apresenta como antecedentes relevantes tabagismo com 40 UMA e no exame objetivo
está emagrecido, devendo ser considerada como possível hipótese a existência de
eventual síndrome consumptivo. A patologia tiroideia que habitualmente causa
hiponatrémia é o hipotiroidismo, não sendo favorecida pela existência de
emagrecimento e taquicardia. A candidíase oral é pouco provável na ausência de
queixas locais. A existência de adenopatias supraclaviculares pode sugerir neoplasia
do pulmão, cabeça e pescoço (também apoiadas pela carga tabágica de 40UMA) ou
neoplasias gastrointestinais, que podem originar SIADH como síndrome paraneoplásico
e também justificar o quadro consumptivo. A patologia prostática não cursa
habitualmente com hiponatrémia.

Referências bibliográficas

 HPIM 20th página 664


 

122. Uma mulher de 45 anos vem à consulta para «saber se tem diabetes». Não tem queixas. A história médica
revela dislipidemia medicada com atorvastatina. A mãe e a irmã têm diabetes mellitus tipo 2 com
complicações oftalmológicas múltiplas, o que tem causado receio de também desenvolver doença. Os
sinais vitais são frequência cardíaca 86/min e pressão arterial 130/70 mm Hg. Ela mede 160 cm de altura
e pesa 85 kg; IMC 33 kg/m². O exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Tendo em conta a preocupação desta mulher, qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais
adequado?

(A) Manter apenas vigilância clínica.


(B) Realizar teste de glicemia capilar duas horas após a refeição.
(C) Recomendar restrição de hidratos de carbono.
(D) Requisitar glicemia em jejum.
(E) Requisitar prova de tolerância oral à glucose.

Resposta correta: D

Comentário
Trata-se de uma doente com história familiar de Diabetes mellitus tipo 2 e com risco
para desenvolver esta doença (obesidade). O primeiro exame a pedir, dos apresentados,
seria o doseamento de uma glicemia em jejum, que entra nos critérios de diagnóstico
da diabetes (opção D correta). Manter apenas vigilância clínica não responderia à dúvida
da doente, já que a diabetes tipo 2 é muitas vezes clinicamente silenciosa (opção A
incorreta). A glicemia capilar não faz diagnóstico (Opção B incorreta). A restrição de
hidratos de carbono, que poderá ser um bom conselho para a doente, não aliviaria a sua
preocupação com o diagnóstico (opção C incorreta). A prova de tolerância oral à glicose
poderia fazer diagnóstico, mas é um teste mais laborioso, pelo que geralmente não é
uma primeira opção (opção E incorreta).

Referências bibliográficas

 Standards of Medical Care in Diabetes 2020: Capítulo 2, Páginas 15-16


 

123. Uma mulher de 88 anos é trazida ao consultório médico pela filha por se encontrar sonolenta durante o
dia desde há quatro dias. Estes períodos alternam com outros em que está agitada e chorosa, chamando
pelo seu marido, falecido há já várias décadas. Adicionalmente, desde há duas semanas apresenta insónia
inicial, choro fácil e queixas de «estar só», telefonando frequentemente à filha e pedindo que lhe venha
fazer companhia. Na última semana, a filha tomou a iniciativa de administrar amitriptilina, utilizada por
uma colega de trabalho, para a mãe «dormir melhor e não telefonar durante a noite». Quando entrevista a
doente esta diz que o ano é «1920» e pensa estar em sua casa. Não se apuram outros sintomas de novo.
Ela vive só e a história médica revela defeito cognitivo ligeiro por doença de Alzheimer. Não apresenta
outros antecedentes patológicos de relevo.

Qual das seguintes alternativas melhor explica o quadro atual da doente?

(A) Agravamento de doença de Alzheimer induzida pela amitriptilina.


(B) Antagonismo da neurotransmissão colinérgica pela amitriptilina.
(C) Potenciação da neurotransmissão gabaérgica pela amitriptilina.
(D) Sintomas cognitivos de estado depressivo, sem resposta à amitriptilina.
(E) Toxicidade cardíaca mediada por bloqueio adrenérgico alfa-2.

Resposta correta: B

Comentário
Mulher de 88 anos com história prévia de defeito cognitivo ligeiro. Após início de
amitriptlina começa com um quadro sugestivo de delirium: alterna momentos de
sonolência e agitação e apresenta desorientação temporo-espacial. Nos casos de
delirium, devemos sempre procurar um desencadeante, sendo as causas mais
frequentes as infeções, os distúrbios electrolíticos e as alterações farmacológicas. A
amitriptilina é um antidepressivo tricíclico que atua fazendo bloqueio da recaptação de
serotonina e noradrenalina. Além disso, é um antagonista de recetores de acetilcolina,
o que pode provocar agravamento cognitivo em doentes com defeito cognitivo prévio.

Referências bibliográficas

 Karlsson, 1999. Drugs that induce delirium


 

124. Um homem de 52 anos, pescador, é admitido para biópsia excisional de lesão pigmentada no calcanhar
direito, com aumento progressivo. A história médica revela dislipidemia e excesso de peso e a medicação
habitual inclui sinvastatina. É fumador de 60 UMA. O exame anátomo-patológico revela alterações
compatíveis com melanoma maligno e a biópsia de gânglio sentinela não apresenta sinais de metastização
ganglionar. Os exames de estadiamento são negativos para metastização à distância. Prepara o processo
clínico para apresentação em consulta de grupo de oncologia.

Qual dos seguintes dados anátomo-patológicos é mais relevante para o estadiamento?

(A) Coloração.
(B) Diâmetro máximo.
(C) Espessura.
(D) Foco de hemorragia.
(E) Necrose.

Resposta correta: C

Comentário
Estamos perante um caso clínico de melanoma maligno, sem metastização ganglionar
ou à distância. Nestes casos de doença localizada, o principal fator de prognóstico é a
espessura do tumor, isto é, o Índice de Breslow

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª edição: capítulo 105 (cancro de pele) - Melanoma – Factores de


prognóstico (página 496)
 

125. Uma mulher de 18 anos, estudante universitária, vem ao consultório médico por odinofagia, tosse e
adenopatias desde há três dias. Tem estado a tomar medicamentos para a tosse sem prescrição médica,
paracetamol e descongestionantes e nenhum tem aliviado os sintomas. Vive num dormitório universitário
onde mais ninguém se encontra doente. Ela refere também dor abdominal ligeira. Os sinais vitais são
temperatura 38,2°C, frequência respiratória 16/min e pressão arterial 112/74 mm Hg. Ela tem 173 cm de
altura e pesa 104 kg; IMC 35 kg/m². Ao exame físico observa-se uma doente obesa que aparenta estar
bem. A observação da orofaringe revela exsudados nos pilares amigdalinos. A palpação do pescoço revela
gânglios aumentados de tamanho nas cadeias anteriores e posteriores, bilateralmente. A auscultação
pulmonar e o exame do coração não revelam alterações patológicas. Observa-se abdómen volumoso e o
fígado e o baço conseguem ser palpados. O restante exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de
normalidade.

Qual dos seguintes diagnósticos é o mais provável?

(A) Amigdalite exsudativa.


(B) Faringite estreptocócica.
(C) Mononucleose.
(D) Peri-hepatite.
(E) Tuberculose ganglionar.

Resposta correta: C

Comentário
Estamos perante uma mononucleose infeciosa. O quadro desta doença é caracterizado
por febre predominantemente baixa, adenopatias cervicais e odinofagia. A
linfadenopatia atinge frequentemente as cadeias cervicais posteriores. Pode estar
associada a tumefação das amígdalas, com exsudado que tornam indistinguíveis da
faringite estreptocócica. A esplenomegalia pode ocorrer, ainda que seja mais frequente
entre a 3ª e 4ª semana e os exames hepáticos estão alterados em >90% dos casos. A
peri-hepatite está mais associada a quadros de doença inflamatória pélvica, podendo
ter alterações abdominais, mas não é habitualmente associada a patologia da
orofaringe. A tuberculose ganglionar é geralmente um quadro mais prolongado, com
linfadenopatia unilateral (escrófula, que pode fistulizar).
 

Referências bibliográficas

 Harrison – capítulo 189 (página 1358): Most EBV infections in infants and young
children either are asymptomatic or present as mild pharyngitis with or without
tonsillitis. In contrast, ~75% of infections in adolescents present as infectious
mononucleosis. A prodrome of fatigue, malaise, and myalgia may last for 1–2 weeks
before the onset of fever, sore throat, and lymphadenopathy. Fever is usually low-
grade and is most common in the first 2 weeks of the illness; Lymphadenopathy and
pharyngitis are most prominent during the first 2 weeks of the illness, while
splenomegaly is more prominent during the second and third weeks.
Lymphadenopathy most often affects the posterior cervical nodes but may be
generalized. Pharyngitis, often the most prominent sign, can be accompanied by
enlargement of the tonsils with an exudate resembling that of streptococcal
pharyngitis.
 

126. Um homem de 67 anos é trazido ao serviço de urgência por agravamento do seu padrão habitual de
dispneia de médios para pequenos esforços e ortopneia marcada desde há três dias. Refere ainda aumento
do edema dos membros inferiores até ao nível do joelho. Desconhece febre, nega tosse ou outros sintomas.
A história médica revela insuficiência cardíaca isquémica, enfarte agudo do miocárdio há oito anos e
hipertensão arterial. A medicação habitual inclui mononitrato de isossorbida, carvedilol, amlodipina,
aspirina, furosemida, lisinopril e pantoprazol. É ex-fumador de 30 UMA desde há oito anos. Os sinais
vitais são temperatura 36,8°C, frequência respiratória 23/min, frequência cardíaca 102/min e pressão
arterial 159/98 mm Hg; SpO2 95 % (com cânula nasal a 3 L/min). Ele tem 174 cm de altura e pesa 82 kg;
IMC 27 kg/m² Ao exame físico apresenta-se polipneico na posição sentada, com desconforto e referindo
«falta de ar». Existe turgescência venosa jugular de 8 cm a 45° e apresenta as extremidades frias, com
tempo de preenchimento capilar de dois segundos. O pulso radial é de moderada amplitude, rítmico e
simétrico. A auscultação cardíaca mostra ritmo galope. A auscultação pulmonar revela crepitações
inspiratórias bilaterais, aumento do tempo expiratório e diminuição dos sons respiratórios e da transmissão
vocal na base pulmonar direita. O abdómen é globoso, mole e depressível. Apresenta edemas marcados
dos membros inferiores, simétrico bilateralmente.

Qual dos seguintes é o próximo passo mais adequado na abordagem deste doente?

(A) Amiodarona intravenosa.


(B) Digoxina oral.
(C) Enoxaparina subcutânea.
(D) Furosemida intravenosa.
(E) Indapamida oral.

Resposta correta: D

Comentário
O quadro apresentado corresponde a insuficiência cardíaca aguda perfil C (wet and
cold) atendendo à presença de sintomas congestivos (dispneia e ortopneia de
agravamento progressivo, crepitações inspiratórias, edema dos membros infeirores e
turgescência jugular) mas também de baixo débito (extremidades frias, aumento do
tempo de perfusão capilar e pulso radial de moderada amplitude). Perante o cenário
apresentado, e na ausência de hipotensão, os principais fármacos a utilzar seriam
diuréticos e vasodilatadores.

Referências bibliográficas

 Guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia “Diagnóstico e tratamento da


insuficiência cardíaca aguda e crónica” (2016) - Página 2178, Figura 12.3
 

127. Um recém-nascido é observado às 4 horas de vida por ter sido notado sopro cardíaco. A mãe tem 30 anos
e esta foi a sua primeira gravidez, que não foi vigiada. O parto vaginal decorreu sem intercorrências. O
índice de Apgar foi de 9/9 ao 1.° e 5.° minutos. Ele tem 46 cm de comprimento (percentil 3) e pesa 2200
g (< percentil 3); o perímetro cefálico é 32 cm (percentil 3). Os sinais vitais são temperatura 36,9°C,
frequência respiratória 40/min e frequência cardíaca 140/min. Ao exame físico apresenta sopro cardíaco,
grau 3/6, mais audível no ápex. É notada hepatoesplenomegalia na palpação abdominal. O recém-nascido
não passa no teste de otoemissões acústicas.

Qual das seguintes alternativas é a causa congénita mais provável para a situação clínica descrita?

(A) Herpes simplex.


(B) Infeção VIH.
(C) Rubéola.
(D) Sífilis.
(E) Toxoplasmose.

Resposta correta: C

Comentário
O caso clínico descreve um recém-nascido com restrição de crescimento intra-uterino
(peso à nascença < P3), fruto de uma gestação não vigiada, com um sopro cardíaco grau
III/VI presente às 4h de vida e uma hepatoesplenomegalia, com provável surdez
neurossensorial (não passa no teste de otoemissões acústicas). Ora, a associação de
RCIU com hepatoespleno, remete-nos para uma provável infeção TORCH (opção B
errada). Dentro das infeções TORCH, a que associa cardiopatia (++ persistência do canal
arterial ou estenose da artéria pulmonar) com surdez neurossensorial é a rubéola
congénita (opção C correta) - caso também fosse descrita a presença de catarata,
teríamos a tríade de Gregg completa (característica desta patologia).
Quanto às outras opções: A infeção congénita por herpes simples (opção A) é
caracterizada por presença de cicatrizes ou vesículas à nascença, sinais oculares
(coriorretinite, queratoconjuntivite) e alterações no desenvolvimento do SNC
(microcefalia, hidrocefalia). A sífilis congénita (opção D) é maioritariamente
assintomática ao nascimento, mas se tiver manifestações precoces é caracterizada
pela presença característica de rinite infecciosa e alterações cutâneas (exantema
maculo-papular ou bulhoso com envolvimento palmo-plantar, que evolui para
descamação nalgumas semanas). A toxoplasmose (opção E) é caracterizada pela
tétrade de sabin: coriorretinite (presente em mais de 90% dos recém-nascidos),
hidrocefalia, calcificações intracranianas e convulsões.

Referências bibliográficas

 Protocolos de Diagnóstico e Terapêutica em Infecciologia Perinatal (2007), Secção


de Neonatologia da SPP - página 27.
 Manual de Diagnostico y Terapeutica en Pediatria” (6ª edição) - PARTE XI, Capítulo
184.
 

128. Um menino de 4 anos é trazido ao serviço de urgência por febre com três dias de evolução (temperatura
máxima de 39,2°C). A mãe refere ainda tosse produtiva, dificuldade respiratória e recusa alimentar
parcial. Ele não tem antecedentes pessoais ou familiares de relevo. Os sinais vitais são temperatura
37,8°C, frequência respiratória 35/min, frequência cardíaca 100/min e pressão arterial 120/69 mm Hg;
SpO2 95 % (ar ambiente). A auscultação pulmonar revela crepitações na base direita. O restante exame
físico, incluindo a auscultação cardíaca, encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade. O raio-X
do tórax mostra imagem de condensação na base direita.

Qual das seguintes alternativas constitui a terapêutica antibiótica mais adequada?

(A) Amoxicilina, por via oral.


(B) Amoxicilina + ácido clavulânico, por via oral.
(C) Ampicilina, por via endovenosa.
(D) Azitromicina, por via oral.
(E) Cefriaxone, por via endovenosa.

Resposta correta: A

Comentário
O caso clínico descreve a apresentação típica de uma pneumonia adquirida na
comunidade – febre, tosse e dificuldade respiratória, com crepitações localizadas na
auscultação pulmonar. Dada a ausência de critérios de internamento, a nossa opção
terapêutica seria um antibiótico oral (opções C e E erradas). Dentro dos vários
antibióticos orais, a escolha de 1ª linha é a amoxicilina em dose alta (80 – 100mg/kg/dia)
- opção A correta. A azitromicina reserva-se para suspeita de pneumonia atípica
(crianças com >4-5 anos, com sintomas mais sistémicos (ex: cefaleia, mialgias) e
auscultação com crepitações e/ou sibilos uni ou bilaterais). A amoxicilina com ácído
clavulânico pode ser considerada em lactentes com menos de 12 meses ou com
vacinação incompleta (opção B errada).

Referências bibliográficas

 Norma nº 019/2012, de 26/12/2012. Diagnóstico e Tratamento da Pneumonia


Adquirida na Comunidade em Idade Pediátrica - páginas 7 a 8 (ponto I) e página 15
(quadro 4)
 

129. Uma mulher de 32 anos vem ao consultório médico para uma consulta de vigilância. A história médica
revela diabetes mellitus, hipertensão arterial e obesidade. A medicação habitual inclui metformina,
gliclazida, insulina de ação intermédia, lisinopril, diltiazem e furosemida. Ela refere estar preocupada com
a possibilidade de a glucose estar demasiado baixa, por ter tido dois episódios de perda breve de
consciência após exercício na semana passada, testemunhados pela sua família. Nas consultas prévias,
realizadas nos últimos 12 meses, reportou dispneia, que foi atribuída a descondicionamento físico e um
aumento progressivo de fadiga. É auxiliar de enfermagem, mas suspendeu a atividade laboral há três
meses por fadiga. Os sinais vitais são frequência respiratória 18/min, frequência cardíaca 120/min e
pressão arterial 162/100 mm Hg. Ela tem 170 cm de altura e pesa 104 kg; IMC 36 kg/m². Os resultados
dos estudos analíticos realizados há três meses revelaram HgA1c de 9,2%. Hoje, a auscultação cardíaca
revela S2 aumentado no foco pulmonar e murmúrio sistólico de novo que aumenta com inspiracão. A
auscultação pulmonar encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade. Existe ingurgitamento venoso
na base do pescoço e edema depressível (2+) até aos joelhos.

Qual das seguintes alternativas melhor explica os sinais encontrados no exame físico?

(A) Cor pulmonale.


(B) Doença pulmonar restritiva.
(C) Falência cardíaca esquerda.
(D) Falência renal.
(E) Mixedema.

Resposta correta: A

Comentário
Os achados descritos de síncopes ocasionais (mal atribuídas a hipoglicémia, conforme
se se depreenderá pela HbA1c muito elevada), dispneia e astenia marcada (forçando
mesmo ao abandono da atividade profissional), hiperfonese de S2 no foco pulmonar,
murmúrio sistólico de novo que aumenta com a inspiração (por provável insuficiência
tricúspide - sinal de Carvallo), turgescência venosa jugular e edema periférico sugerem
hipertensão pulmonar, com insuficiência cardíaca direita avançada, o que exclui as
alíneas D e E. Ficando, assim, com as alíneas A, B e C como respostas possíveis,
precisamos agora de interpretar qual o mecanismo causal mais provável para esta
hipertensão pulmonar. Ora, uma manifestação tão exuberante neste grupo
epidemiológico tão típico (mulher jovem) sugere claramente hipertensão arterial
pulmonar idiopática (grupo 1 da classificação WHO). Note-se que o chamado cor
pulmonale implica, em regra, doença parenquimatosa (e não vascular) pulmonar, seja
ela obstrutiva ou restritiva (grupo 3 da classificação WHO), o que não é provável neste
caso clínico específico, muito embora a obesidade se associe a restrição pulmonar. No
entanto, o problema é que a designação cor pulmonale é já antiga, mal definida, e, por
isso, errónea; aliás, não aparece em nenhuma ocasião no capítulo de hipertensão
pulmonar da 20ª versão do Harrison nem nas guidelines de hipertensão pulmonar da
ESC, de 2015 (as mais atuais). Ou seja, bastará os examinadores incluírem a patologia
vascular pulmonar como parte do cor pulmonale para se assumir a resposta A. Por fim,
e apesar de estar presente uma síndrome metabólica, inclusivamente com Diabetes
mellitus descompensada, e de essa circunstância ser um fator de risco reconhecido
para envolvimento patológico do ventrículo esquerdo (grupo 2), por múltiplos
 

mecanismos, nenhum dos achados físicos traduz insuficiência deste ventrículo (atente-
se, por exemplo, na auscultação pulmonar inocente). Assim, estes dados estavam
presentes na pergunta apenas para despistar.

Referências bibliográficas

 Harrison’s Principles of Internal Medicine, 20th edition. Página 1939, primeiros 3


subcapítulos

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Trata-se de uma pergunta potencialmente impugnável, estando esta situação


dependente da definição de cor pulmonale utilizada pelos examinadores. No entanto,
como o termo é impreciso (e, por isso, nem deveria ter sido usado em primeira instância
no exame), creio que eles conseguem contra-argumentar com a tese deles.
 

130. Uma mulher com 36 anos, caucasiana, é observada na consulta de revisão puerperal. A gravidez decorreu
sem intercorrências. Teve um parto vaginal a termo, não complicado, sem episiotomia, há seis semanas.
O recém-nascido tinha 3100 g de peso ao nascimento e é saudável. Amamentou durante quatro semanas,
até há duas semanas. Ainda não reiniciou a atividade sexual. Os antecedentes obstétricos incluem uma
gestação e um parto. Ela não tem antecedentes patológicos de relevo. Toma habitualmente um suplemento
vitamínico. É fumadora de 15 cigarros por dia desde há 10 anos. Nega consumo de álcool ou de drogas
ilícitas. Os antecedentes familiares incluem história paterna de diabetes mellitus tipo 1 e a irmã mais velha
teve um tromboembolismo pulmonar espontâneo aos 32 anos. Os sinais vitais são frequência respiratória
12/min, frequência cardíaca 70/min e pressão arterial 122/81 mm Hg. Ela tem 163 cm de altura e pesa 64
kg; IMC 24 kg/m². O restante exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual dos seguintes fatores contraindica a escolha de um contracetivo estroprogestativo nesta doente?

(A) Hábitos tabágicos


(B) História familiar de diabetes mellitus tipo 1.
(C) História familiar de tromboembolismo.
(D) Idade.
(E) Índice de massa corporal.

Resposta correta: A

Comentário
O uso de contraceção hormonal combinada associada ao tabaco aumenta o risco de
doença cardiovascular principalmente de enfarte agudo do miocárdio e este risco está
diretamente relacionado com o número de cigarros por dia. Assim, segundo os critérios
de elegibilidade da Organização de Mundial de Saúde de 2015 para aconselhamento
contracetivo a utente previamente citada por ter mais de 35 anos e por fumar pelo
menos 15 cigarros dia deverá ser desaconselhada a utilizar contraceção hormonal
combinada (categoria 4 – condição que represente um risco de saúde inaceitável se
contraceção hormonal combinada for utilizada). (B) A história familiar de Diabetes
mellitus tipo 1 não contraindica o uso de contraceção hormonal combinada. (C), (D) e (E)
Segundo os critérios de elegibilidade da Organização Mundial de Saúde de 2015 a
presença de familiares em primeiro grau com antecedentes de tromboembolismo
venoso não constitui contraindicação para o uso de contraceção hormonal combinada
(categoria 2 - condição em que as vantagens do uso de contraceção hormonal
combinada superam os riscos teóricos e/ou provados). Apesar de alguns estudos
relatarem que o risco de TEV é superior em mulheres obesas utilizadoras de
contraceção hormonal combinada quando comparado com mulheres obesas não
utilizadoras de CHC, este risco continua a ser baixo e a obesidade não é por si só
contraindicação ao uso de contraceção hormonal combinada (categoria 2). Neste caso
estamos perante um índice de massa corporal normal o que não constitui nenhuma
contraindicação ao uso de contraceção hormonal. A idade, por si só, não é
contraindicação ao uso de contraceção hormonal combinada (<40 anos -> categoria 1 e
≥ 40 anos -> categoria 2).
 

Referências bibliográficas

 Medicial eligibility criteria for contraceptive use fifth edition 2015 - páginas 112, 114,
115 e 117.
 Consensos sobre Contraceção de 2020 – Sociedade Portuguesa de Contraceção.
 Obstetrics and Gynecology Beckmann 7th edition. Chapter - Contraception BOX 26.2.
 

131. Um homem de 68 anos, agricultor, vem a consulta de seguimento por mieloma múltiplo diagnosticado
recentemente (há quatro semanas). Iniciou quimioterapia e corticoterapia em dose alta há duas semanas.
A história médica revela hipertensão arterial e hipercolesterolemia e a medicação habitual inclui
amlodipina e atorvastatina. Ele tem 175 cm de altura e pesa 70 kg; IMC 23 kg/m². Os sinais vitais são
temperatura 37°C, frequência respiratória 14/min, frequência cardíaca 78/min e pressão arterial 120/70
mm Hg. O exame físico revela palidez difusa e equimoses dispersas nos membros superiores e inferiores.
O exame cardíaco e pulmonar não apresenta alterações.

Os resultados dos estudos analíticos (realizados cinco dias antes da consulta) revelam:

Soro: Creatinina 1,0 mg/dL; Azoto ureico 20 mg/dL; Acido úrico 10,0 mg/dL; Proteína C reativa 80 mg/L;
Cálcio 12,8 mEq/L.

Sangue: Hemoglobina 9,0 g/dL; Hematócrito 28%; Leucócitos 3 500/mm³; Plaquetas 100 x 10^9/L;
Velocidade de sedimentação 30 mm/1ª hora.

Urina: Proteína Bence-Jones 6 g/24 horas [N=0]; beta 2 microglobulina 10 mg/dL [N < 0,2].

Qual das seguintes está contraindicada neste doente?

(A) Vacina antipneumocócica.


(B) Vacina antitetânica.
(C) Vacina contra a gripe sazonal.
(D) Vacina contra a hepatite B.
(E) Vacina contra o herpes zóster.

Resposta correta: E

Comentário
Nos doentes imunodeprimidos há aspetos a ter em conta antes da vacinação, estando a
vacina para o herpes zoster contraindicada. A vacinação para a gripe, tétano,
pneumocócica e hepatite B são recomendadas.

Referências bibliográficas

 Harrison - capítulo 118, pág 886 (tabela 118.1 - secção imunodeprimidos sem VIH)
 

132. Um jovem de 16 anos vem ao serviço de urgência por perdas hemáticas tipo hematoquecia com dois dias
de evolução, associadas a tonturas. A história médica revela apendicectomia aos 12 anos e hernioplastia
de hérnia inguinal esquerda aos 10 anos. Os sinais vitais são temperatura 36,7°C, frequência respiratória
24/min, frequência cardíaca 120/min e pressão arterial 90/80 mm Hg. Ao exame físico apresenta marcada
palidez da pele e as mucosas estão descoradas.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: AST 90 U/L; ALT 80 U/L; LDH 150 U/L; gamma-glutamil transferase (GGT) 150 U/L; Proteína
C reativa 50 mg/L.

Sangue: Hemoglobina 8,9 g/dL; Leucócitos 11 000/mm³; Plaquetas 400 x 10^9/L.

Qual das seguintes alternativas é a causa mais provável da hemorragia?

(A) Divertículo de Meckel.


(B) Diverticulose cólica.
(C) Invaginação intestinal.
(D) Polipose cólica familiar.
(E) Úlcera péptica duodenal.

Resposta correta: A

Comentário
A causa mais frequente de hemorragia digestiva baixa, clinicamente significativa, em
crianças/adolescentes é o diverticulo de Meckel, embora a sua frequência diminua com
o avançar da idade. Este caso clínico é sugestivo deste diagnóstico pela presença de
hemorragia digestiva baixa com repercussão hemodinâmica num jovem de 16 anos. A
hemorragia digestiva baixa por hemorragia diverticular é a causa mais frequente nos
adultos, principalmente >60 anos. A invaginação intestinal é mais frequente em
crianças, ocorrendo ~90% dos casos em idade < 2 anos de idade (embora esteja descrito
em idades mais tardias, incluindo adultos). A presença de pólipos no cólon, mesmo em
doenças hereditárias, raramente cursam com hemorragia manifesta (excepto
hemorragia pós-polipectomia). A doença ulcerosa péptica ocorre em idadaes mais
tardias, visto que a sua prevalência aumenta com a idade e na presença de fatores de
risco (infeção por H. pylori - prevalência aumenta com idade, consumo de AINEs, etc).

Referências bibliográficas

 Harrison 20th Edition - 44 Gastrointestinal Bleeding p273, 321 Diverticular Disease


and Common Anorectal Disorders p2883
 

133. Uma mulher de 78 anos é admitida no hospital por febre e confusão notada há três horas pelo vizinho da
doente. O vizinho, que acompanhou a doente ao hospital, refere que a doente parecia bem até há três ou
quatro dias, última vez em que falaram. A doente vive só e é independente em todas as atividades de vida
diária. A história médica revela polimialgia reumática e diabetes mellitus tipo 2. A medicação habitual
inclui metformina e prednisolona. Os sinais vitais são temperatura 39,2°C, frequência respiratória 16/min,
frequência cardíaca 108/min e pressão arterial 96/65 mm Hg; SpO2 89 % (ar ambiente). Ao exame físico
a doente parece confusa, não presta atenção às perguntas e adormece facilmente. O exame torácico
evidencia macicez à percussão, crepitações na base esquerda do pulmão e S4 à auscultação cardíaca. O
exame abdominal não mostra alterações.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 0,9 mg/dL; Azoto ureico 13 mg/dL; Glucose 99 mg/dL; Sódio 123 mEq/L; Potássio 5,3
mEq/L; Cloro 95 mEq/L; Bicarbonato 20 mEq/L.

Sangue: Hemoglobina 13,4 g/dL; Hematócrito 39%; Leucócitos 14000/mm³; Neutrófilos, segmentados
82%; Basófilos 1 %; Linfócitos 19%; Plaquetas 275 x 10^9/L; Hemoglobina A1c 6,8 %.

O raio-X do tórax mostra consolidação da base esquerda, consistente com pneumonia. O


eletrocardiograma revela taquicardia sinusal.

Após iniciar terapêutica para pneumonia adquirida na comunidade, qual das seguintes é a terapêutica
adicional mais apropriada?

(A) Broncodilatador.
(B) Dose elevada de hidrocortisona.
(C) Enema de resinas permutadoras de potássio.
(D) Solução salina hipertónica.
(E) Rifampicina.

Resposta correta: B

Comentário
O enunciado descreve um caso clínico de uma mulher admitida por quadro de febre e
confusão, a quem é diagnosticada uma pneumonia. Acresce que é uma doente que faz
corticoterapia crónica (embora desconheçamos a dose) por polimialgia reumática. Ela
apresenta uma hipotensão e analiticamente tem hiponatremia e hipercalémia. Isto deve
fazer-nos suspeitar de uma insuficiência suprarrenal – neste caso, admitindo que pelo
quadro confusional a doente pode ter omitido toma habitual crónica de prednisolona
existe a possibilidade de instalação de uma insuficiência suprarrenal secundária (eixo
frenado pela toma crónica de prednisolona) com afeção da linhagem glucocorticóide e,
eventualmente, mineralocorticoide. Na dúvida se há ou não insuficiência suprarrenal,
deve medicar-se empiricamente já que se trata de uma situação que pode pôr em risco
a vida da doente - a hidrocortisona em dose elevada tem ação tanto gluco quanto
mineralocorticoide (resposta B correta).
 

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª edição, capítulo 379, página 2736


 

134. Uma mulher de 27 anos é admitida no hospital por oscilação da temperatura corporal entre 37°C e 40,6°C
desde há três dias. Neste período refere igualmente tremores intensos e sudorese, cefaleias frontais,
náuseas e «dores no corpo». Nega exantema. Uma semana antes regressara de uma viagem a África. Antes
da mesma, realizou todas as vacinas recomendadas. Os sinais vitais são temperatura 40,3 °C, frequência
respiratória 14/min, frequência cardíaca 100/min e pressão arterial 100/60 mm Hg. Ela tem 160 cm de
altura e pesa 63 kg; IMC 25 kg/m². O exame físico revela pele seca e com pouca turgescência. As
conjuntivas estão anictéricas. As fossas nasais estão patentes. Apresenta eritema ligeiro na faringe
posterior. Não tem adenopatias cervicais palpáveis. A auscultação cardíaca e pulmonar encontra-se dentro
dos parâmetros de normalidade. O abdómen é ligeiramente doloroso à palpação no quadrante superior
direito, sem defesa ou organomegalias. O exame das extremidades não revela limitação da mobilidade ou
edemas. Os pulsos estão presentes bilateralmente.

Qual dos seguintes agentes microbiológicos é a causa mais provável deste quadro clínico?

(A) Bartonella henselae.


(B) Leishmania donovani.
(C) Leptospira interrogans.
(D) Plasmodium falciparum.
(E) Rickettsia rickettsii.

Resposta correta: D

Comentário
Numa doente com febre (particularmente febre oscilante) que regressa de África deve
ser sempre excluída malária. O quadro é compatível com infeção por Plasmodium
falciparum, com febre oscilante entre 37-40,6ºC, tremores intensos e sudorese,
cefaleias frontais, náuseas e mialgias. Não temos história de picada de artrópedes ou
exposição a ratos, urina de ratos ou águas contaminadas que nos sugiram outra causas.

Referências bibliográficas

 Harrison capítulo 219, pág 1578 secção clinical features (Malaria is a common cause
of fever in tropical countries).
 

135. Um homem de 28 anos está internado há três dias para tratamento de pneumonia estreptocócica com
cefotaxima endovenosa e azitromicina oral. A história médica revela imunodeficiência comum variável.
Antes da admissão, a medicação habitual incluía imunoglobulina mensal, mas o doente admitiu ter faltado
ao tratamento nos últimos três meses. Os sintomas melhoraram nas primeiras 24 horas após o início do
tratamento antibiótico, mas hoje refere dor no joelho esquerdo, com intensidade 9/10. Os sinais vitais são
temperatura 38°C, frequência respiratória 20/min, frequência cardíaca 84/min e pressão arterial 108/58
mm Hg; SpO2 94 % (ar ambiente). Ao exame físico a auscultação pulmonar revela crepitações e egofonia
no campo pulmonar esquerdo, na região posterior. O joelho esquerdo está quente, edemaciado e doloroso
à palpação direta e à flexão. O raio-X do joelho esquerdo não mostra alterações.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Sangue: Hemoglobina 13,0 g/dL; Hematócrito 39 %; Leucócitos 16 200/mm³; Neutrófilos, segmentados


93 %; Linfócitos 5 %; Monócitos 2 %; Plaquetas 543 x 10^9/L; Velocidade de sedimentação eritrocitária
71 mm/1ª hora.

Qual das seguintes alternativas é a causa mais provável da dor no joelho esquerdo?

(A) Artrite séptica.


(B) Gota.
(C) Osteoartrose.
(D) Pseudogota.
(E) Rotura de quisto de Baker.

Resposta correta: A

Comentário
Trata-se de um homem jovem com uma pneumonia estreptocócica e imunodeficiência
comum variável que desenvolve uma monoartrite aguda do joelho associada a febre,
sinais inflamatórios e elevação de parâmetros inflamatórios. O diagnóstico mais
provável é uma artrite séptica (por disseminação hematogénica). Outras possíveis
causas de monoartrite aguda são a gota e a pseudogota, mas o doente é muito jovem
para desenvolver qualquer uma destas patologias. A osteoartrose não tem esta
apresentação, sendo que se manifesta por dor crónica sem sinais inflamatórios, com
parâmetros inflamatórios normais e alterações radiográficas diminuição do espaço
articular, esclerose subcondral, osteófitos...). A rotura do quisto de Baker manifesta-se
por dor na região gemelar e não se associa a alterações da mobilidade articular do
joelho ao exame físico, nem a sinais inflamatórios e os parâmetros inflamatórios são
habitualmente normais.

Referências bibliográficas

 Harrison 20 ed capítulo 125 Infectious Arthritis Pag 939-940


 

136. Uma mulher de 53 anos vem ao serviço de urgência por dor intensa a nível lombar que irradia ao longo
do membro inferior esquerdo com seis horas de evolução. Tem tido, por diversas vezes, esta dor a nível
lombar, embora menos intensa e sem irradiação para o membro inferior. A toma de ibuprofeno
habitualmente alivia a dor, mas hoje não sentiu melhoria. Neste momento classifica a dor como 10/10.
Descreve-a como localizada na coxa, nádega e região posterior do membro inferior esquerdo. Refere
retenção urinária desde o aparecimento da dor. Não se lembra de ter tido traumatismo. Trabalha num
armazém onde tem de carregar pesos ligeiros durante todo o dia, mas refere que não caiu nem fez nenhum
esforço. Ela não tem história de alergias. Os sinais vitais são temperatura 37,2°C, frequência respiratória
18/min, frequência cardíaca 98/min e pressão arterial 144/72 mm Hg. Ela tem 170 cm de altura e pesa 75
kg; IMC 26 kg/m². Ao exame físico aparenta estar desconfortável e apresenta distensão vesical. A coluna
vertebral não apresenta alterações à inspeção. Não consegue realizar a flexão anterior do tronco, devido
a espasmo dos músculos paravertebrais esquerdos. O exame retal revela tónus esfincteriano normal. Na
flexão do membro inferior sobre a coxa surge dor radicular. O reflexo aquiliano está diminuído.

Qual dos seguintes achados melhor diferencia um problema cirúrgico agudo de um problema médico?

(A) Diminuição do reflexo aquiliano.


(B) Dor radicular.
(C) Espasmo muscular paravertebral.
(D) Fraqueza muscular.
(E) Sintomas urinários.

Resposta correta: E

Comentário
A retenção urinária sugere a presença de síndrome da cauda equina e o tratamento
desta patologia consiste em cirurgia urgente para descompressão das raízes nervosas
envolvidas. A dor irradiada pelo membro inferior, sinal de Lasègue positivo e reflexo
aquiliano diminuído sugere compressão da raiz nervosa de L5-S1 que, por si só,
também justificaria cirurgia descompressiva mas não em contexto agudo de urgência,
podendo ser orientado para cirurgia eletiva.

Referências bibliográficas

 Harrison 20 ed Capítulo 14 Back and Neck Pain pág. 93-94; Treatment Low Back Pain
With Radiculopathy pág. 99
 

137. Um homem de 80 anos é admitido no hospital para intervenção cirúrgica a fratura da anca. O filho do
doente, que o acompanha, diz que o pai vive só e cozinha os alimentos que consome. Manifesta
preocupação porque lhe parece que o pai não se alimenta adequadamente e raramente come fruta fresca
ou vegetais. O doente não vai ao médico há 15 anos. Tem várias feridas que diz não cicatrizarem. Ao
exame físico as gengivas estão friáveis e edemaciadas e sangram facilmente. Os dentes têm muita
mobilidade.

Qual das seguintes alterações ao exame físico é mais provável encontrar neste doente?

(A) Hemorragias perifoliculares.


(B) Hiperpigmentação cutânea.
(C) Lábios secos com fissuras.
(D) Nistagmo horizontal.
(E) Rosário raquítico no tórax.

Resposta correta: B

Comentário
Trata-se de um doente alcoólico e com maus hábitos nutricionais e por isso com risco
de carência de vitaminas hidrossolúveis. Apresenta dificuldade de cicatrização de
feridas e manifestações hemorrágicas, nomeadamente gengivorragias, que são
achados sugestivos de escorbuto por défice de vitamina C. Uma das manifestações
hemorrágicas igualmente típica do défice de vitamina C são as hemorragias
perifoliculares (opção A correta). As restantes manifestações não são tão típicas deste
défice nutricional (restantes opções incorretas).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª Edição: Capítulo 326, Página 2313

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Esta pergunta é considerada impugnável pois a hiperpigmentação (resposta correta


segundo a chave da prova) não é uma manifestação associada ao escorbuto. Já as
hemorragias perifoliculares, segundo a bibliografia recomendada (Harrison 20ª Edição:
Capítulo 326, Página 2313) são achados típicos desta doença: “In addition to generalized
fatigue, symptoms of scurvy primarily reflect impaired formation of mature connective
tissue and include bleeding into the skin (petechiae, ecchymoses, perifollicular
hemorrhages); inflamed and bleeding gums; and manifestations of bleeding into joints,
the peritoneal cavity, the pericardium, and the adrenal glands”.
 

138. Um casal, com ambos os elementos de 24 anos, vem ao consultório médico para aconselhamento por não
conseguirem engravidar desde há três anos, apesar de manterem atividade sexual regular sem contraceção.
A mulher refere vigilância ginecológica anual sem alterações e tem ciclos menstruais regulares. Ambos
referem ser saudáveis e que não têm dificuldades no ato sexual. Negam hábitos tabágicos, alcoólicos ou
consumo de drogas ilícitas. Ambos estão empregados e exercem trabalho administrativo. Nenhum tem
antecedentes familiares de relevo.

Qual das seguintes alternativas é o passo inicial mais adequado?

(A) Medir a concentração sérica da hormona folículo estimulante e da hormona luteinizante na


mulher
(B) Realizar o exame físico completo ao marido.
(C) Recomendar à mulher o registo diário da sua temperatura corporal e a anotação da data e
horários da atividade sexual do casal.
(D) Referenciar a mulher para um especialista em infertilidade.
(E) Solicitar um teste pós-coital.

Resposta correta: B

Comentário
Estamos perante um caso de infertilidade, uma vez que o casal está a tentar engravidar
sem sucesso após 12 meses de relações sexuais regulares e desprotegidas. Perante
isto, a abordagem inicial de um casal infértil deve sempre incluir a abordagem
simultânea de ambos os elementos e não de apenas o sexo feminino, pelo que a alínea
D está incorreta. O registo da temperatura basal poderá representar um meio simples
e económico para avaliação da função ovulatória, uma vez que nos ciclos ovulatórios se
regista uma típica curva bifásica da temperatura. No entanto, é de difícil registo e
interpretação e não deve ser considerada como um método fidedigno para estudo da
função ovulatória, o que exclui a alínea C. A realização do teste pós-coital apresenta
uma utilidade diagnóstica e terapêutica muito limitada, pelo que já não é atualmente
considerada exame a realizar na abordagem inicial do casal infértil, o que exclui a alínea
E. A avaliação inicial do casal infértil deve incluir, entre outros, a análise da função
ovulatória. No caso clínico relatado estamos perante um elemento feminino com ciclos
menstruais regulares, pelo que a probabilidade de estarmos perante uma infertilidade
por ciclos anovulatórios é muito baixa, uma vez que nestes casos as mulheres
apresentam-se com queixas de oligomenorreia/amenorreia. No entanto, por vezes as
alterações do ciclo menstrual em caso de disfunção ovulatória podem ser muito subtis
pelo que está recomendado estudo hormonal. O primeiro passo passa pela confirmação
da existência de ovulação através do doseamento de progesterona na altura certa do
ciclo ou através do doseamento de LH. Se suspeitarmos de uma disfunção ovulatória
devemos excluir todas as causas com doseamento de FSH, estradiol, TSH e prolactina
nos primeiros dias 2-4 do ciclo menstrual. Portanto, a alínea A também não está correta.
Tal como explicado inicialmente um problema de infertilidade é uma situação clínica
que deve ser abordada enquanto casal. Assim, a abordagem inicial do elemento
masculino passa pela realização de uma história clínica completa e detalhada e pela
realização de um espermograma. Se houver antecedentes relevantes que possam
apontar para uma causa de infertilidade masculina (o que não nos é dito no caso clínico
apresentado) e/ou se houver alterações do espermograma este deverá ser
 

posteriormente encaminhado para avaliação por urologista ou especialista em


infertilidade masculina. O exame físico completo ao sexo masculino deste caso poderá
ser realizado, juntamente com uma anamnese detalhada.

Referências bibliográficas

 DIAGNOSIS AND TREATMENT OF INFERTILITY IN MEN: AUA/ASRM GUIDELINE 2020:


 1.1 “For initial infertility evaluation, both male and female partners should undergo
concurrent assessment.”
 1.2 “Initial evaluation of the male for fertility should include a reproductive history.
Initial evaluation of the male should also include one or more semen analyses
(Strong Recommendation). Men with one or more abnormal semen parameters or
presumed male infertility should be evaluated by a male reproductive expert for
complete history and physical examination as well as other directed tests when
indicated.”
 2. Diagnostic evaluation of the infertile male: a committee opinion Practice
Committee of the American Society for Reproductive Medicine American Society for
Reproductive Medicine 2015;
 2.1 “A thorough evaluation by a urologist or other specialist in male reproduction,
including a complete medical and reproductive history and physical examination,
should be performed if the initial screening evaluation reveals an abnormal male
reproductive history or demonstrates abnormal semen parameters.”
 3. Diagnostic evaluation of the infertile female: a committee opinion Practice
Committee of the American Society for Reproductive Medicine American Society for
Reproductive Medicine 2015;
 3.1 “Serial basal body temperature (BBT) measurements provide a simple and
inexpensive method for evaluating ovulatory function (…) The BBT test cannot
reliably define the time of ovulation and can become tedious. Consequently, this
assessment is no longer considered the best or preferred method for evaluating
ovulatory function for most infertile women”
 3.2 “Diagnostic evaluation for infertility should include assessment of ovulatory
function, structure, and patency of the female reproductive tract, and semen
analysis”
 3.3 “Methods for evaluating ovulatory function may include any of the following:
Menstrual history may be all that is required. In most ovulatory women, menstrual
cycles are regular and predictable, generally occurring at intervals of 21–35 days
(…) Serum progesterone determinations provide a reliable and objective measure of
ovulatory function as long as they are obtained at the appropriate time in the cycle
(…) Other evaluations aimed at defining the best choice of treatment may be indicated
for anovulatory infertile women. Serum thyroid-stimulating hormone (TSH) and
prolactin determinations can identify thyroid disorders and/or hyperprolactinemia,
which may require specific treatment. In women with amenorrhea, serum follicle-
stimulating hormone (FSH) and estradiol measurements can distinguish women with
ovarian failure (high FSH, low estradiol), who may be candidates for oocyte donation,
from those with hypothalamic amenorrhea (low or normal FSH, low estradiol)”
 

 4. Obstetrics and Gynecology Beckmann 7th edition. Chapter 42 Infertility. Male


infertility.
 4.1 “If the results of the semen analysis are abnormal, the test should be repeated
in 1 to 2 weeks. Persistent abnormalities in the semen necessitate further
investigation. The male partner should be evaluated by a urologist or reproductive
endocrinologist who specializes in male infertility”
 4.2 “The postcoital test originally used to assess the viability of sperm contained in
ovulatory cervical mucus is now considered of limited diagnostic and therapeutic
usefulness”

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Estamos perante um caso de infertilidade, uma vez que o casal está a tentar engravidar
sem sucesso após 12 meses de relações sexuais regulares e desprotegidas. Nesta
pergunta é inquirido qual a atitude inicial a tomar perante este caso de infertilidade. A
abordagem inicial do casal infértil deve sempre incluir a abordagem simultânea de
ambos os elementos e não de apenas o sexo feminino, pelo que a alínea, alínea (D) está
incorreta (referência bibliográfica 1.1). A avaliação inicial do elemento feminino deve
incluir, entre outros, a análise da função ovulatória. No caso clínico relatado estamos
perante um elemento feminino com ciclos menstruais regulares, pelo que a
probabilidade de estarmos perante uma infertilidade por ciclos anovulatórios é muito
baixa, uma vez que nestes casos as mulheres apresentam-se com queixas de
oligomenorreia/amenorreia. No entanto, por vezes as alterações do ciclo menstrual em
caso de disfunção ovulatória podem ser muito subtis pelo que está recomendado estudo
hormonal. O primeiro passo passa pela confirmação da existência de ovulação através
do doseamento de progesterona na altura certa do ciclo ou através do doseamento de
LH. Se suspeitarmos de uma disfunção ovulatória devemos excluir todas as causas com
doseamento de FSH, estradiol, TSH e prolactina nos primeiros dias 2-4 do ciclo
menstrual. Portanto, a alínea A também não está totalmente correta. Por sua vez, a
abordagem inicial do elemento masculino passa pela realização de uma história clínica
completa e detalhada e pela realização de um espermograma. Se antecedentes
relevantes que possam apontar para uma causa de infertilidade masculina com base na
história clínica (o que não se verifica no caso clínico apresentado) e/ou se alterações do
espermograma este deverá ser posteriormente encaminhado para avaliação por
urologista ou especialista em infertilidade masculina. O exame físico completo ao sexo
masculino deste caso poderá ser realizado, mas não como atitude inicial, o que exclui a
alínea (B) (referências bibliográficas número 1.2 e 2.1 acima citadas). O registo da
temperatura basal poderá representar um meio simples e económico para avaliação da
função ovulatória uma vez que nos ciclos ovulatórios se regista uma típica curva bifásica
da temperatura. No entanto, é de difícil registo e interpretação e não deve ser
considerada como um método fidedigno para estudo da função ovulatória, o que exclui a
alínea (C) (referência bibliográfica 3.1). A realização do teste pós-coital apresenta uma
utilidade diagnóstica e terapêutica muito limitada, pelo que já não é atualmente
considerada exame a realizar na abordagem inicial do casal infértil, o que excluir a alínea
(E) (referência bibliográfica 4.1). Em suma, de acordo com a informação previamente
prestada, consideramos que nenhuma das opções está totalmente correta, pelo que
acreditamos que esta pergunta é potencialmente impugnável.
 

139. Uma mulher de 24 anos teve um parto vaginal complicado por atonia uterina e hemorragia há 12 horas.
Neste momento está hemodinamicamente estável, não apresenta hemorragia ativa e está assintomática. O
hemograma revela hemoglobina de 7,2 g/dL; o tempo de protrombina é de 14,1 segundos; o tempo de
tromboplastina parcial e a contagem de plaquetas são normais.

Qual das seguintes alternativas é a medida mais adequada na gestão desta doente?

(A) Iniciar transfusão de glóbulos vermelhos para elevar a hemoglobina a 10 g/dL.


(B) Iniciar transfusão de plasma fresco congelado.
(C) Iniciar transfusão de sangue total para elevar a hemoglobina a 8 g/dL.
(D) Não fazer transfusão e prescrever ferro por via intramuscular.
(E) Não fazer transfusão e prescrever suplemento de ferro por via oral.

Resposta correta: E

Comentário
A anemia no periodo puerperal é definida por valores de hemoglobina < 10g/dL. O uso
parcimonioso dos componentes sanguíneos na abordagem da anemia na gravidez e no
período puerperal é importante. O principal componente da terapêutica transfusional é
o concentrado eritrocitário (ao invés da transfusão de sangue total), sendo os restantes
componentes (plasma, crioprecipitado, plaquetas) utilizados de acordo com as
necessidades e dependendo da clínica e das alterações analíticas da doente. A
transfusão de concentrado de eritrócitos está recomendada em situações de anemia
grave (Hb ≤7 g/dL) ou anemia com sintomatologia, e situações de hemorragia aguda
com compromisso hemodinâmico. Tendo em conta que a grávida em questão é jovem e
que se encontra assintomática e hemodinamicamente estável, sem novos episódios de
hemorragia, o ferro oral pode ser a terapêutica de reposição aconselhada. A
administração de ferro por via intramuscular não deve ser considerada por rotina.

Referências bibliográficas

 NORMAS DE ORIENTAÇÃO CLÍNICA SPOMMF, “Anemia na Gravidez e no Puerpério”


 Beckmann 7th edition, P159, 1º paragrafo

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Em grávidas com anemia moderada a grave (Hb 7-9 g/dL) está recomendada terapêutica
com ferro endovenoso ou inclusivamente a transfusão de concentrado eritrocitário,
dependendo do valor da Hb pré-parto, traduzindo a verdadeira perda hemorrágica
durante o parto - está recomendada a intervenção precoce enquanto meio de prevenção
de uma eventual coagulopatia.

 NORMAS DE ORIENTAÇÃO CLÍNICA SPOMMF, “Anemia na Gravidez e no


Puerpério”
 Beckmann 7th edition, P159, 1º paragrafo
 

140. Um homem de 70 anos vem ao serviço de urgência por dor súbita e intensa na perna direita que alivia
com o membro pendente quando sentado na cama desde há duas horas. Nos últimos tempos refere
sensação de cansaço e dor localizada à região gemelar bilateral quando percorre mais de 80 m, o que o
obriga a parar. A história médica revela diabetes mellitus, enfarte agudo do miocárdio aos 62 anos e
artrose dos joelhos. A medicação habitual inclui metformina, propanolol e lisinopril. É fumador de 50
UMA. Os sinais vitais são frequência cardíaca 98/min e pressão arterial 140/80 mm Hg. Ele tem 163 cm
de altura e pesa 85 kg; IMC 32 kg/m². O exame físico mostra perna direita fria e pálida; o pulso pedioso
direito não é palpável. O restante exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Creatinina 1,2 mg/dL; Glucose 105 mg/dL; Proteína C reativa 9 mg/L; Colesterol Total 199 mg/dL.

Sangue: Hemoglobina 13,5 g/dL; Leucócitos 10 000/mm³.

Qual das seguintes alternativas é a causa mais provável do quadro clínico do doente?

(A) Compressão radicular de S1.


(B) Oclusão arterial.
(C) Rutura muscular.
(D) Síndrome do compartimento.
(E) Trombose venosa profunda.

Resposta correta: B

Comentário
Note-se a presença de 3 dos “Ps” da isquémia aguda do membro: pain, pallor e
pulselessness. A presença de claudicação intermitente, diabetes mellitus, hábitos
tabágicos ativos e doença aterosclerótica noutro território vascular (coronário, pelo
antecedente de enfarte agudo do miocárdio) torna muito provável a existência de
doença arterial periférica do membro inferior, pelo que o caso descrito corresponde a
uma isquémia “acute on chronic”, provavelmente por um mecanismo de trombose local,
por oposição ao de embolia.

Referências bibliográficas

 Harrison’s Principles of Internal Medicine, 20th edition. Página 1926 - Subcapítulo


“Manifestações clínicas”.
 

141. Um lactente de 8 semanas de vida é trazido ao serviço de urgência pela mãe por vómitos após todas as
mamadas e urina de cheiro mais intenso nos últimos dois dias. A gestação foi vigiada e de termo, o parto
decorreu sem complicações e o período neonatal sem intercorrências. Esteve sob aleitamento materno
exclusivo até às 6 semanas de vida, altura em que iniciou fórmula antirrefluxo por episódios de
regurgitação frequentes. Os sinais vitais são temperatura timpânica 36,9°C, frequência respiratória
21/min, frequência cardíaca 115/min e pressão arterial 95/53 mm Hg. Ao exame físico apresenta discreta
palidez cutânea, lábios secos, sucção vigorosa na chupeta e fontanela ligeiramente deprimida. O abdómen
é mole e depressível, aparentemente confortável à palpação. O peso e comprimento estão no percentil 50
para a idade. Verifica-se perda ponderal de 50 g relativamente ao peso da semana anterior. O restante
exame físico, incluindo auscultação cardíaca e pulmonar, encontra-se dentro dos parâmetros de
normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Gases: pH 7,49; Bicarbonato 29 mEq/L; Sódio 135 mEq/L; Potássio 3,1 mEq/L; Cloro 91 mEq/L.

Qual das seguintes alternativas é a mais adequada para confirmar o diagnóstico mais provável?

(A) Ecografia abdominal.


(B) Endoscopia digestiva alta.
(C) Exame sumário de urina.
(D) pHmetria esofágica.
(E) Raio-X abdominal simples.

Resposta correta: A

Comentário
Este caso clínico remete-nos para o diagnóstico diferencial de vómitos num lactente
com cerca de 2 meses de vida. Na história clínica mencionam apenas vómitos após
todas as mamadas (sem menção desde há quanto tempo), com descrição de episódios
de ”refluxo” desde as 6 semanas de vida (fica a dúvida se já seriam episódios de
vómitos). Ao exame objetivo, temos vários sinais de desidratação (lábios secos,
fontanela deprimida, ligeira perda ponderal), o que traduz já alguma gravidade.
Contudo, o elemento claramente diferenciador deste diagnóstico diferencial é dado pela
gasimetria, que nos mostra uma alcalose (pH 7,49) metabólica (HCO3 aumentado)
hipoclorémica (Cl 91mEq/L) e hipocaliémica (K 3,1mEq/L) - típico da estenose
hipertrófica do piloro. É verdade que o quadro clínico descrito não é o mais típico - os
vómitos costumam ter início pelas 2-4 semanas de vida, ”falta” a menção de vómitos
em jato abundantes e noção persistente de fome e irritabilidade - mas esta gasimetria
é fortemente sugestiva desta etiologia. Tendo este diagnóstico em mente, o exame
complementar mais adequado para confirmar a patologia seria a ecografia abdominal,
que mostraria um piloro com camada muscular >4mm e longitude >15mm.
 

Referências bibliográficas

 Manual de Diagnostico y Terapeutica en Pediatria” (6ª edição) - Capítulo 26, página


353 (1º e 2º parágrafos).
 

142. Um homem de 43 anos vem ao consultório médico por dor torácica, retrostemal, com irradiação ao
pescoço e dorso, recorrente ao longo do último ano e meio. A dor é acompanhada por disfagia para sólidos
e líquidos e regurgitação pós-prandial. Menciona ainda perda ponderal (total de 10 kg) e dois episódios
de infeção respiratória, tratadas com antibióticos, em ambulatório, no mesmo período de tempo. Não tem
anorexia. Por este motivo, realizou previamente exame radiológico com ingestão de papa baritada, tendo
sido diagnosticado com dilatação esofágica pelo médico radiologista. Os sinais vitais são frequência
cardíaca 72/min e pressão arterial 120/77 mm Hg. Ele tem 175 cm de altura e pesa 71 kg; IMC 23,2 kg/m².
O exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Qual das seguintes alternativas é a causa subjacente mais provável para a condição do doente?

(A) Alastramento de gastrite crónica ao esfíncter esofágico inferior.


(B) Aumento do peristaltismo esofágico.
(C) Ausência de efeito inibitório no esfíncter esofágico inferior.
(D) Esofagite péptica.
(E) Espasmo difuso da parede esofágica.

Resposta correta: C

Comentário
Trata-se de um caso de acalásia, doença motora do esófago. São fornecidas várias
pistas que nos apontam para este diagnóstico: presença de dor retroesternal, presença
de disfagia para sólidos e líquidos (sugestiva de causa motora). Por fim, descrevem no
exame radiolóico uma dilatação esofágica compatível com a alteração morfológica da
doença de acalásia. Nesta condição existe ausência do efeito inibitório do esfíncter
esofágico inferior, bem como aperistalse (pressão basal do corpo aumentada com
contrações espásticas).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª Edição Capitulo 316 Doenças do esófago Pagina 2213 “Long-standing
achalasia is characterized by progressive dilatation and sigmoid deformity of the
esophagus with hypertrophy of the LES. Clinical manifestations may include
dysphagia, regurgitation, chest pain, and weight loss. Most patients report solid and
liquid food dysphagia. *Endoscopic management of gastrointestinal motility
disorders European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Guideline
 

143. Um homem de 25 anos, jogador de ténis, nascido no Brasil, recorre a consulta do viajante por viagem
agendada para o Bangladesh dentro de cinco dias, onde irá participar num torneio. Atualmente existe um
foco epidémico de hepatite A nesse país. A história médica inclui tiroidite autoimune. Ele desconhece o
seu estado de vacinação anterior.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: Anticorpo anti-VHA Negativo; Anticorpo anti-HBc Negativo; Anticorpo anti-HBs Negativo;
Antigénio HBs Negativo; VIH 1 e 2 Negativo.

Qual das seguintes é a medida mais adequada para prevenção?

(A) Imunoglobulina de cobertura dupla (hepatites A e B).


(B) Vacina contra a hepatite A.
(C) Vacina contra a hepatite A + imunoglobulina contra a hepatite A.
(D) Vacina contra a hepatite B + imunoglobulina contra a hepatite A.
(E) Vacina contra as hepatites A e B.

Resposta correta: E

Comentário
Trata-se de um jovem sem imunidade para a hepatite A ou B com uma viagem dentro
de dias ao Bangladesh, onde está a decorrer um surto de hepatite A. Assim deve ser
vacinado para a hepatite A e para a hepatite B (tendo em conta a ausência de anticorpos
e o desconhecimento da vacinação anterior).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª Edição capítulo 33: Hepatitis A vaccines are approved for use in persons
who are at least 1 year old and appear to provide adequate protection beginning 4
weeks after a primary inoculation. If it can be given within 4 weeks of an expected
exposure, such as by travel to an endemic area, hepatitis A vaccine is the preferred
approach to preexposure immunoprophylaxis. For preexposure prophylaxis against
hepatitis B in settings of living in or traveling extensively in endemic areas;

 
 

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Esta pergunta é impugnável já que a opção C) também está correta. Trata-se de um jovem
sem imunidade para a hepatite A ou B com uma viagem ao Bangladesh, onde está a
decorrer um surto de hepatite A. Assim, não dispõe de tempo suficiente para realizar a
vacina para a hepatite A e obter daí imunidade. Em contexto de surto e sendo a sua
estadia breve (torneio de ténis) deve fazer toma de imunoglobulina juntamente com a
primeira toma da vacina.

 Harrison capítulo 33: Hepatitis A vaccines are approved for use in persons who are
at least 1 year old and appear to provide adequate protection beginning 4 weeks after
a primary inoculation. If it can be given within 4 weeks of an expected exposure, such
as by travel to an endemic area, hepatitis A vaccine is the preferred approach to
preexposure immunoprophylaxis. If travel is more imminent, IG (0.02 mL/kg) should
be administered at a different injection site, along with the first dose of vaccine.
 

144. Um homem de 63 anos recorre à consulta de medicina geral e familiar por agravamento de disfunção
erétil, já previamente tratada. Ele nega sintomas do trato urinário baixo. É sedentário, fumador de 20
UMA e refere hábitos etílicos de 220 g de álcool por semana. A história médica revela
hipercolesterolemia, diabetes mellitus e gonartrose bilateral. A medicação habitual inclui tadalafil,
metformina e sinvastatina. Ao toque retal apresenta próstata de 50 cm3, simétrica, sem nódulos e de
consistência elástica. O restante exame físico encontra-se dentro dos parâmetros de normalidade.

Os resultados dos estudos analíticos revelam:

Soro: PSA: Total 17 ng/mL [N < 4 ng/dL]; Livre 1,0 ng/mL.

A ecografia prostática transretal evidencia próstata homogénea de 55 cm3, bem delimitada e simétrica.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Efetuar biópsia prostática


(B) Reavaliar PSA total em seis meses.
(C) Solicitar ecografia vesical e prostática suprapúbica.
(D) Solicitar TC pélvica.
(E) Solicitar urofluxometria e medição de resíduo pós-miccional.

Resposta correta: A

Comentário
Apesar de estarmos perante um doente com um toque retal de características benignas,
os valores de PSA estão muito elevados. Sabemos que um valor superior a 10ng/mL
tem indicação para realização de uma biópsia prostática. Apesar da ecografia prostática
estar normal, este exame tem pouca sensibilidade para deteção de nódulos prostáticos
com características malignas, pelo que é prioritário realizar uma avaliação histológica
para confirmar o diagnóstico. Desta forma a ecografia não deve ser usada nem para
diagnóstico nem para rastreio do cancro da próstata.

Referências bibliográficas

 NOC DGS (atualização 13/07/2017) - Prescrição e Determinação do Antigénio


Específico da Próstata - PSA – página 2 – alínea D.
 Schwartz’s Principles of Surgery 11th Ed. (versão inglesa) – Capítulo 40 “Urologia” –
página 1774 – Subcapítulo “Cancro da Próstata” – coluna da esquerda, terceiro
parágrafo, linha 1.

 
 

Caso seja impugnável (comentário + referências)

No enunciado é mencionado que o valor de PSA Total é de 17ng/mL, no entanto, entre


parêntesis têm os valores de referência com unidades diferentes (<4ng/dL). O valor de
PSA total do doente continua a ser superior ao limite de referência, no entanto, a mudança
de unidades laboratoriais pode dificultar a interpretação do caso. A interpretação APNA
é que as unidades apresentadas correspondem a uma gralha do exame e que a solução
correta deverá ser a A.
 

145. Um homem de 52 anos vem ao consultório médico por andar mais ansioso desde que ficou desempregado,
há dois meses. Anda mais irritado com a família, mas tem dormido bem. Queixa-se de azia, desde há
vários anos e quando come alimentos mais ácidos. Apresenta fezes mais moles do que o habitual, que
associa ao facto de andar mais ansioso. Nega diminuição do jato urinário ou disúria. Nega ainda humor
depressivo. Não tem antecedentes patológicos de relevo. Os antecedentes familiares revelam história
paterna de neoplasia do cólon aos 62 anos, operada. Os sinais vitais são temperatura 36,5°C, frequência
cardíaca 81/min e pressão arterial 132/84 mm Hg. A auscultação cardíaca e pulmonar e a palpação
abdominal encontram-se dentro dos parâmetros de normalidade. O toque retal é insuspeito.

Para além de iniciar um ansiolítico por um curto período, qual das seguintes alternativas é o estudo de
diagnóstico mais adequado neste doente?

(A) Ecografia abdominal.


(B) Colonoscopia total.
(C) Ecografia prostática transretal.
(D) Ecografia renal e vesical.
(E) Não são necessários outros exames.

Resposta correta: B

Comentário
Trata-se de um caso clínico que nos apresenta um homem de 52 anos com alterações
do trânsito intestinal “fezes mais moles que o habitual” com história de uma familiar de
primeiro grau com neoplasia do cólon. Assim sendo, dada a presença de sinais de
alarme (idade + alteração do trânsito intestinal + história familiar) temos de excluir
patologia orgânica e para tal, o melhor exame de diagnóstico é a colonoscopia total. São
descritas várias características que nos apontam para uma patologia do foro funcional
(recentemente ficou desempregado, “anda mais ansioso”, dorme mal), contudo dada a
presença de sinais de alarme teremos de avançar com exames auxiliares de
diagnóstico para despiste de patologia que justifique o quadro. Segundo a NOC relativa
ao rastreio oportunístico do cancro do cólon e do reto, doentes com idades
compreendidas entre os 50-74 anos de idade com sinais/sintomas sugestivos de
patologia do cólon ou reto, antecedentes pessoais de adenoma ou cancro do cólon ou
reto e familiares de 1º grau com cancro do cólon ou reto, com síndromes hereditárias
do cancro do cólon ou reto ou com doença inflamatória intestinal devem ser submetidos
a colonoscopia total.

Referências bibliográficas

 Norma DGS 003/2014 - RASTREIO OPORTUNÍSTICO DO CANCRO DO CÓLON E RETO


 

146. Um homem de 56 anos, pedreiro, vem ao centro de saúde por dor abdominal, progressivamente mais
constante desde os últimos três meses. Ele teve dois episódios de vómitos nos últimos dois meses, durante
os quais notou uma pequena quantidade de sangue. Ele diz «Eu acho que a minha úlcera voltou». Ele
descreve dispepsia intermitente com 15 anos de evolução, para a qual toma ranitidina. Há três anos fez
antibióticos para o tratamento de úlcera gástrica. Ele toma aspirina regularmente por osteoartrose. Os
sinais vitais são temperatura 36,8°C, frequência respiratória 12/min, frequência cardíaca 76/min e pressão
arterial 110/70 mm Hg. Ele tem 178 cm de altura e pesa 72 kg; IMC 23 kg/m². Ele perdeu 4,5 kg nos
últimos dois meses. O exame físico revela abdómen mole, não doloroso e sem massas palpáveis. Palpa-
se um gânglio supraclavicular à esquerda e existem adenopatias inguinais bilaterais. A pesquisa de sangue
oculto nas fezes é positiva.

Qual das seguintes alternativas é a explicação mais provável para o agravamento dos sintomas?

(A) Carcinoma gástrico.


(B) Esofagite erosiva.
(C) Gastrite.
(D) Infeção recorrente por Helicobacter pylori.
(E) Úlcera gástrica.

Resposta correta: A

Comentário
Este caso clínico é muito sugestivo de carcinoma gástrico. O doente apresenta como
antecedentes uma úlcera gástrica e teve episódios de vómitos, podendo a neoplasia já
estar a causar algum grau de obstrução gástrica. Descrevem ainda uma ligeira
hematemese. Além disso apresenta perda de peso e adenopatias palpáveis. Descrevem
ainda a existência de um Nódulo de Virchow (adenopatia supraclavcular esquerda) que
é o achado mais típico ao exame físico na doença já metastática. Assim sendo, a
explicação mais provável para o agravamaento da dor abdominal será a presença de
carcinoma gástrico.

Referências bibliográficas

 Harrison 20th Edition : Capítulo 76 Cancro do Trato Digestivo Superior Página 560 ”
As the tumor becomes more extensive, patients may complain of an insidious upper
abdominal discomfort varying in intensity from a vague, postprandial fullness to a
severe, steady pain. Anorexia, often with slight nausea, is very common but is not the
usual presenting complaint. Weight loss may eventually be observed, and nausea
and vomiting are particularly prominent in patients whose tumors involve the
pylorus; ” (....)“Metastases to intraabdominal and supraclavicular lymph nodes occur
frequently” (…) Gastric ulcers identified at the time of such endoscopic procedure
may appear benign but merit biopsy in order to exclude a malignancy. Malignant
gastric ulcers must be recognized before they penetrate into surrounding tissues,
because the rate of cure of early lesions limited to the mucosa or submucosa is
>80%.
 

147. Um homem de 40 anos, sem abrigo, é trazido ao consultório médico por um assistente social do albergue
onde está a pernoitar desde há duas noites. Parece estar confuso com o ambiente em que se encontra, em
particular durante a noite. Os funcionários do albergue notaram que tem com frequência fezes líquidas e
um exantema. Tem antecedentes conhecidos de síndrome de dependência do álcool, mas não se conhecem
outros antecedentes médicos. Os sinais vitais são temperatura 37.1 °C, frequência respiratória 24/min,
frequência cardíaca 85/min e pressão arterial 120/80 mm Hg. O doente parece estar letárgico e está
desorientado no tempo e no espaço. Tem uma área de liquenificação hiperpigmentada nos antebraços e
no pescoço. É administrado tratamento apropriado e o exantema desaparece nas duas semanas seguintes.

Assumindo que não ocorrem novamente consumos de álcool, qual das seguintes alternativas é uma
sequela crónica expectável da condição descrita?

(A) Diarreia crónica.


(B) Esplenomegalia.
(C) Queratose senil.
(D) Telangiectasia.
(E) Nenhumas anomalias adicionais.

Resposta correta: E

Comentário
Trata-se de um doente alcoólico e com prováveis maus hábitos alimentares
(descrevem-nos um contexto de sem-abrigo) e, por isso, com risco para ter carência de
vitaminas hidrossolúveis. O quadro apresentado (diarreia + dermatite + demência) é
típico de um défice de vitamina B3 (Niacina) - Pelagra. Com a reposição desta vitamina,
é expectável que todas as manifestações da Pelagra regridam (opção E correta,
restantes opções incorretas).

Referências bibliográficas

 Harrison 20ª Edição: Capítulo 326, Páginas 2311-2312


 

148. Uma mulher de 67 anos é trazida ao serviço de urgência pelos amigos após ter «perdido os sentidos»
enquanto estava a assistir a um evento desportivo. A doente refere que «estava muito calor». Os amigos
confirmam não ter havido atividade de tipo convulsivo. Tem estado bem de saúde. A história médica,
revela diabetes mellitus controlada com dieta e hipertensão arterial controlada com captopril. Os sinais
vitais são temperatura 37°C, frequência respiratória 16/min, frequência cardíaca 84/min e pressão arterial
120/78 mm Hg. Ela tem 165 cm de altura e pesa 77 kg; IMC 28 kg/m². Ao exame físico não apresenta
alterações em relação a exames anteriores.

Qual das seguintes alternativas é o próximo passo mais adequado?

(A) Realizar eletrocardiograma.


(B) Requisitar ecodoppler carotídeo
(C) Requisitar eletroencefalograma.
(D) Requisitar TC do crânio.
(E) Tranquilizar a doente e dizer que não precisa de realizar mais nenhum exame.

Resposta correta: A

Comentário
Apesar da anamnese sugerir um mecanismo por mediação neural do tipo vasovagal
para a síncope, a idade de 67 anos, em conjunto com os antecedentes de 2 fatores de
risco cardiovascular (diabetes mellitus e hipertensão arterial) deve implicar o rastreio
de causa cardíaca, no mínimo através da realização de um ECG.

Referências bibliográficas

 Guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia para abordagem da síncope, de


2018. Página 1893, figura 4 – “Flow diagram for the initial evaluation and risk
stratification of patients with syncope “.
 

149. Um recém-nascido de 4 dias de vida é trazido ao consultório médico pela mãe. Ela diz «Os olhos dele
parecem infetados». A mãe notou o aparecimento dos sintomas ontem e refere progressão rápida das
secreções oculares, sem outras queixas associadas. A gravidez não foi vigiada e o parto ocorreu por via
vaginal, cerca de 24 horas após rotura de membranas. Ao exame físico apresenta injeção conjuntival
bilateral com exsudado esverdeado abundante.

Qual das seguintes alternativas é o exame de diagnóstico inicial mais adequado?

(A) Coloração Giemsa do raspado conjuntival


(B) Coloração Gram do exsudado ocular.
(C) Observação da córnea em lâmpada de fenda.
(D) Serologias maternas do grupo TORCH.
(E) Teste Tzanck do exsudado.

Resposta correta: B

Comentário
Este caso clínico descreve uma conjuntivite neonatal com início no 3º dia de vida e
progressão rápida, com exsudado purulento abundante. O diagnóstico diferencial das
conjuntivites neonatais costuma ser entre as seguintes etiologias principais: Chlamydia
trachomatis, Neisseria gonorrhoeae, vírus do Herpes simplex (sobretudo do tipo 2) ou
outras bactérias (estafilococos, estreptococos ou estirpes Gram negativas). Perante o
quadro descrito, o mais provável é estarmos perante uma conjuntivite gonocócica -
tipicamente hiperaguda, com secreção purulenta abundante e início entre o 3º e 4º dias
de vida. A conjuntivite por Chlamydia (conjuntivite de inclusão) aparece tipicamente
entre a primeira e segunda semanas de vida e provoca hiperemia conjuntival e
secreções mucopurulentas em quantidade moderada. A conjuntivite herpética
apresenta-se habitualmente associada a uma opacidade difusa da córnea, com ou sem
úlcera dendrítica, com injeção conjuntival e lacrimejo. Perante a hipótese mais provável
de Neisseria gonorrhoeae, a melhor forma de confirmar o diagnóstico de forma rápida
é realizar uma avaliação de Gram, para pesquisar diplococos Gram negativos
intracelulares (opção B correcta). A coloração com Giemsa serve para pesquisar
corpúsculos de inclusão intracitoplasmáticos (típicos da Chlamydia) e o teste de Tzank
serve para pesquisar células gigantes multinucleadas, sugestivas de infeção herpética.
Por esta razão, as opções A e E estão incorretas. As serologias TORCH não teriam
grande aplicação, pois não existe suspeita desses agentes (opção D incorreta). Quanto
à opção C, está menos correta porque a opção B permite um diagnóstico dirigido à nossa
suspeita etiológica. A observação na lâmpada de fenda, pelo contrário, seria um bom
exame inicial perante a ausência de suspeita de um agente etiológico em particular.

Referências bibliográficas

 The Wills Eye Manual, 7th Edition - Capítulo 8.9 (Ophthalmia neonatorum), parágrafos
1 (sinais), 6-10 (etiologia) e 11-13 (work-up).
 Manual de Diagnostico y Terapeutica en Pediatria” (6ª edição) - PARTE IX, capítulo
135, página 1320 (parágrafos 4, 6 e 7)
 

Caso seja impugnável (comentário + referências)

Consideramos que esta pergunta pode ser impugnável e que a resposta assinalada como
certa poderá ser a opção C - avaliação na lâmpada de fenda. Independentemente da
etiologia mais provável, e visto que a pergunta se dirige ao exame de diagnóstico INICIAL
mais adequado, a marcha diagnóstica passa, primeiro, pela realização de um exame
objetivo dirigido, realizado através da observação na lâmpada de fenda. O facto de se
tratar de um bebé, que obviamente não pode ser avaliado numa lâmpada de fenda fixa,
não anula esta alternativa, visto que é possível uma avaliação com lâmpada de fenda
portátil. Tal como referido na secção "Work-up" do capítulo 8.9 (Ophthalmia neonatorum)
da bibliografia de referência, a abordagem destes casos passa por, primeiro, fazer uma
anamnese dirigida e, logo em segundo lugar, fazer uma avaliação ocular, com recurso a
fluoresceína, para avaliar o envolvimento da córnea. Esta avaliação ocular pode ser feita
com recurso à lâmpada de fenda ou a outra fonte de luz, preferencialmente com filtro
azul Cobalto, como o oftalmoscópio direto. Apenas em terceiro lugar na marcha
diagnóstica aparecem os raspados conjuntivais para coloração com Gram e Giemsa. Por
último, de acordo com a bibliografia de referência, o exame corado com Gram deve ser
do raspado conjuntival (“conjunctival scraping”) e não do exsudado ocular, tornando a
hipótese B incorreta.
 

150. Observa uma primigesta de 23 anos que está na sala de observações do serviço de urgência desde há 24
horas por suspeita de início de trabalho de parto. A gestação tem 39 semanas, foi vigiada e não teve
complicações. A grávida refere episódios esporádicos de sensação de barriga dura desde há uma semana.
Desde há 36 horas que estes episódios se tornaram mais frequentes, rítmicos (a cada 5 minutos) e
dolorosos, com aumento gradual da intensidade da dor (atingindo 6 numa escala até 10), motivo pelo qual
recorreu ao serviço de urgência. O toque vaginal de há 24 horas revelou um colo amolecido, intermédio,
50 % extinto (apagado) e com 2 cm de dilatação, apresentação cefálica no plano -4 e membranas íntegras.
Ela não tem antecedentes pessoais ou familiares de relevo. Neste momento, as contrações uterinas são
mais dolorosas (8 em 10), com irradiação para o abdómen inferior e lombar. O toque vaginal revela um
colo 60 % extinto (apagado) e com 3 cm de dilatação. A altura uterina é de 36 cm. Os sinais vitais são
temperatura 36,8°C, frequência respiratória 12/min, frequência cardíaca 77/min e pressão arterial 128/72
mm Hg. Ela tem 162 cm de altura e, previamente à gravidez, pesava 64 kg (aumentou 12 kg durante a
gravidez). A cardiotocografía revela um traçado normal e regista uma contração uterina a cada 3 minutos.

Com os dados clínicos apresentados, qual dos seguintes é o diagnóstico mais provável nesta grávida?

(A) Contrações de Braxton Hicks.


(B) Fase latente prolongada.
(C) Paragem do trabalho de parto na fase ativa.
(D) Paragem do trabalho de parto na fase latente.
(E) Trabalho de parto arrastado no 2.° estadio.

Resposta correta: B

Comentário
A fase latente do trabalho de parto é aquela que decorre desde o início das contrações
regulares até ao momento em que o colo está completamente apagado e com cerca de
3 cm de dilatação. A duração da fase latente de trabalho de parto é variável; contudo,
numa nulípara, pode ser de até 20 horas, durante as quais o colo vai diminuindo
progressivamente de consistência e comprimento e tem início a dilatação. A fase ativa
de trabalho de parto inicia-se com o colo apagado a 3cm e dura até se atingir a dilatação
completa; o colo dilata-se a um ritmo de cerca de 1-2 cm/hora iniciando-se
concomitantemente a descida da apresentação fetal no canal de parto. O 2º estadio de
trabalho de parto, também designado de período expulsivo, é aquele que se inicia na
dilatação completa do colo e termina com a expulsão do feto. A distócia corresponde a
uma evolução anormalmente lenta do trabalho de parto devido a fenómenos patológicos
que interferem com a dilatação cervical e com a progressão do feto no canal de parto.
Em termos de distócia dinâmica, mais concretamente das anomalias do trabalho de
parto, podemos estar perante uma fase latente prolongada, uma fase ativa prolongada,
uma progressão da apresentação prolongada, uma paragem secundária da dilatação
ou, relativamente ao 2º estadio de trabalho de parto, ausência de progressão da
apresentação. O diagnóstico de uma fase latente prolongada baseia-se na constatação
de uma excessiva demora em atingir uma dilatação cervical de 3-4cm (mais de 20 horas
para as nulíparas e mais de 14 horas para as multíparas).
 

Referências bibliográficas

 Beckmann 7th edition, P 128, tabela 9.1, “First-Stage Disorders” 1º parágrafo.


 Medicina Materno-fetal, Luis Mendes da Graça 5º edição, Capitulo 26 “Anomalias de
trabalho de Parto” P233 “Fase latente prolongada”

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