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ISSN 1413-3555

Rev. bras. fisioter. Yol. 9, No. 2 (2005), 117-122


©Revista Brasileira de Fisioterapia

SÍNDROME DO TÚNEL DO CARPO

Karolczak, A. P. B., 1 Vaz, M. A., 1 Freitas, C. R.' e Medo, A. R. C. 2


1
Escola de Educação Física, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
2
Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, RS, Brasil
Correspondência para: Ana Paula Barcellos Karolczak, Laboratório de Pesquisa do Exercício (ESEF-UFRGS), Rua
Felizardo, 750, CEP 90690-200, Porto Alegre, RS, e-mail: anapbk@pop.com.br
Recebido: 30/1/2004- Aceito: 14/4/2005

RESUMO
Introdução: A síndrome do túnel do carpa (STC) é a neuropatia de maior incidência no membro superior e consiste na compressão
do nervo mediano no interior do túnel do carpa. Atualmente, essa alteração neuromuscular tem atingido um número de pessoas
cada vez maior, principalmente trabalhadores que desempenham atividades de intensa movimentação do punho. Uma série de estudos
tem procurado investigar a fisiopatologia, o diagnóstico e o tratamento para a STC. No entanto, os mecanismos neuromusculares
envolvidos em seu desenvolvimento ainda não são totalmente compreendidos, o que dificulta um diagnóstico mais sensível e capaz
de detectar inclusive a presença de dupla compressão (coluna cervical e túnel do carpa), assim como o tratamento adequado. Objetivos:
Em função disso, os objetivos desta revisão de literatura são revisar os principais estudos que descrevem a fisiopatologia da STC,
os principais métodos de seu diagnóstico e as principais formas de seu tratamento e apontar possíveis lacunas nessa área de estudo
e os aspectos que ainda necessitam de um maior aprofundamento.
Palavras-chave: síndrome do túnel do carpo, fisiopatologia, diagnóstico, tratamento.

ABSTRACT
Carpa) tunnel syndrome
Background: Carpa] tunnel syndrome is the most common neuropathy of the upper limbs, and consists of compression of the median
nerve within the carpa! tunnel. This neuromuscular disorder is affected increasing numbers of people, especially workers who perform
activities with repetitive wrist movements. Many studies have sought to investigare the pathophysiology, diagnoses and treatment
for this syndrome. However, the neuromuscular mechanisms involved in its development are still not fully understood. Diagno-
sis that is more sensitive and also capable of detecting the presence of double compression (cervical column and carpa! tunnel),
along with appropriate treatment, is thus made difficult. Objective: To review the principal studies in the literature that have de-
scribed the pathophysiology of this syndrome; to review the principal diagnostic methods and types of treatment; and to indicate
possible gaps in this field of study and the aspects of this condition that still require deeper investigation.
Key words: carpa! tunnel syndrome, pathophysiology, diagnosis, treatment.

INTRODUÇÃO incidência. Ela consiste na compressão do nervo mediano


quando passa pelo túnel do carpo. 2 •3.4
O homem é o produto de três características funda- Os principais sintomas relacionados à STC são dor
mentais: um grande cérebro, a postura ereta e as mãos noturna com queimação, parestesia e atrofia tênar. Como
manipulativas. A mão tomou-se o principal instrumento por
1
conseqüência, têm-se limitação de atividade e incapacidade
meio do qual o homem atua e transforma o mundo à sua volta. para o trabalho.
Para cumprir esse papel, a mão apresenta uma estrutura O diagnóstico preciso é difícil e consiste em exame
complexa, responsável por atividades que requerem precisão físico, 5 em que são avaliados os sinais e sintomas (costuma-
e fazem com que ela esteja sujeita a lesões que podem levar se observar a presença de dor noturna e o teste de Tine]
à incapacidade funcional. positivo), e teste eletroneuromiográfico (ENMG). O critério
Dentre as lesões que podem atingir o membro superior, ENMG é baseado na demonstração de redução ou bloqueio
a síndrome do túnel do carpa (STC) é a neuropatia de maior da condução nervosa. No entanto, 10%-50% de todos os
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pacientes com sintomas típicos podem apresentar valores um dia simulado de trabalho, com pico de FBF em torno
de condução nervosa e motora normais quando esse método de quatro horas após movimentos repetitivos submáximos.
é utilizado. 6 Entretanto, a FBF não permaneceu até o dia seguinte, fato
Em relação ao tratamento, há duas opções: o tratamento que foi associado à carga de trabalho muito reduzida. 14
conservador" ou o cirúrgico. 7 Embora a literatura favoreça Também foi observada a existência de FBF em exercícios
a cirurgia, 8 ela geralmente não está indicada em casos de repetitivos de flexão de punho durante um dia simulado de
lesão por esforço repetitivo (LER)/distúrbio osteomuscular trabalho, com queda de 54 + 19% no índice da FBF, compa-
relacionado ao trabalho (DORT). rado ao valor inicial. O índice de FBF permaneceu abaixo ,.
A comunidade científica tem concordado que as dos níveis de controle 16 horas após encerrado o dia simulado
alterações musculoesqueléticas, quando relacionadas ao de trabalho, demonstrando que a FBF ainda estava presente
trabalho, têm alcançado proporções epidêmicas. 9 Dentre essas no início do segundo dia. O acúmulo da FBF no dia seguinte
alterações pode-se destacar a STC. Tendo em vista a incapa- pode ser prejudicial e, após cinco dias, pode resultar em
cidade gerada por essa síndrome e suas conseqüências sobrecarga sobre os tecidos, fator de risco para o
socioeconômicas, torna-se fundamental seu estudo. Os estabelecimento dos DORTs de membro superior. 15
objetivos deste trabalho são revisar a literatura específica Posturas estáticas e atividade muscular sustentada têm
sobre a fisiopatologia, seu diagnóstico e seu tratamento e sido referidas como as mais importantes contribuições para
apontar possíveis lacunas e direções futuras. os DORT entre usuários de computadores, 16 em razão do fato
de as atividades exercidas não estarem relacionadas a cargas
Fisiopatologia da Síndrome do Túnel do Carpo pesadas, mas com cargas leves ou moderadas, porém repetitivas.
Estudos epidemiológicos identificaram os fatores de Foram descritos cinco possíveis mecanismos envolvidos
risco para STC. Apesar de não haver consenso, estes são no processo da STC: (1) a "hipótese Cinderela", (2)
predominantes: sexo feminino, obesidade, índice de massa microrrupturas de fibras musculares, (3) aumento da pressão
corporal (IMC) alto, idade acima de 30 anos, atividade motora interna do túnel do carpo, (4) redução do fluxo sangüíneo
repetitiva (correlação não completamente estabelecida) e e (5) alterações metabólicas. 17
algumas patologias sistêmicas. 10 •11 A "hipótese Cinderela" propõe que o desenvolvimento
Entre as causas clínicas citadas podem ser encontradas da dor muscular crônica está baseado no excesso de uso das
alterações que justificam o aumento de volume das estruturas fibras de contração lenta, uma vez que estas são ativadas
presentes no interior do túnel do carpo, o qual é responsável primeiro e mantidas durante toda a contração. Algumas
pela compressão nervosa. evidências no sentido de acometimento de um tipo de fibra
Além dos aspectos abordados, a STC pode ser muscular em pacientes com DORT foram descritas, sugerindo
classificada como ocupacional quando o trabalho é considerado uma relação com a proporção de fibras musculares rápidas
um fator de risco, principalmente em trabalhadores que e lentas. 18 Em indivíduos com mialgia foram encontradas
executam movimentos repetitivos. 9· 12 Uma interação entre dois fibras rápidas danificadas (sugerindo dano mitocondrial) no
ou mais desses fatores pode levar ao desenvolvimento da STC. músculo trapézio superior, fibras lentas também danificadas,
O processo de instalação da STC por trabalho repetitivo mas em maior quantidade, e níveis reduzidos de adenosina
pode ocorrer em decorrência de lesões agudas e crônicas trifosfato (ATP) e adenosina difosfato (ADP). A hipótese
no sistema musculoesquelético. A lesão aguda pode ser de aumento na incidência de fibras lentas e de atrofia de fibras
traumática ou por instalação de fadiga muscular, que ocorre rápidas pode ser decorrente de uma resposta muscular à
quando o nível de força aplicada é baixo, mas considerado circulação prejudicada. Essa hipótese tem suporte no reduzido
acima da capacidade adaptativa do sistema muscular. As conteúdo de ATP e ADP na mialgia.
lesões crônicas são conseqüências de sobrecargas musculoes- No entanto, em contrações isométricas do músculo bíceps
queléticas a longo prazo. 13 braquial, sustentadas em I 0% da contração voluntária máxima
Uma nova visão sobre o desencadeamento dos DORTs (CVM), ocorre uma "rotatividade" de unidades motoras (UMs),
foi proposta como sendo relacionada a um tipo especial de sugerindo um mecanismo protetor do organismo. Assim, a
fadiga chamado fadiga de baixa freqüência (FBF), que parece hipótese de ativação contínua das UMs de contração lenta
acometer as fibras de contração lenta (ou tipo 1). Há evidências não está totalmente validada: é preciso saber se há UMs capazes
de uma relação entre movimentos repetitivos e a instalação de serem ativadas por tempo suficiente para lesionar as fibras
de FBF, uma vez que foi demonstrada a existência de FBF musculares e que permaneçam ativadas em diferentes posturas
em exercícios repetitivos de desvio ulnar do carpo durante e movimentos. 19
Vol. 9 No. 2, 2005 Síndrome do túnel do carpo 119

UMs no músculo extensor comum dos dedos (ECD), distribuição é variável, uma vez que foi verificado, mediante
durante contração voluntária realizada por longo período de questionário, que 21% dos pacientes relataram parestesia
tempo e com baixo nível de esforço, permanecem continua- e dor no antebraço; 13,8%, dor no cotovelo; 7,5%, dor no
mente ativadas por, no mínimo, 25 minutos. Apesar das braço; 6,3%, dor no ombro; e 0,6%, dor na região cervical.
freqüentes substituições de UMs, foram observadas UMs Os sintomas em regiões mais proximais provavelmente estão
ativas durante todas as fases dos movimentos. Porém, esses relacionados ao fato de a compressão mecânica afetar o nervo
resultados não permitem rejeitar a "hipótese Cinderela" para mediano distalmente e proximalmenteY
.. o músculo ECD. 18
A conseqüência direta da "hipótese Cinderela" é a
Alguns sinais freqüentemente utilizados para diagnóstico
de STC: teste de Phalen, teste de Tinel-Hofmann, compressão
instalação de fadiga, que caracteriza o primeiro sinal de uma do nervo mediano e sinal de fraqueza do músculo abdutor
hipersolicitação muscular. 20 A força mecânica que incide sobre curto do polegar. 5
a UM pode levar à ruptura de miofibrilas e à liberação de Esses sinais não parecem ser muito precisos, embora
substâncias químicas, induzindo a uma resposta inflamatória. 17 sejam aceitos para detecção da STC, sendo recomendado
A STC crônica resulta de uma inflamação que atinge os seu uso, exceto dos testes de compressão do nervo mediano
tendões dos músculos flexores dos dedos e/ou a bainha e Tinel-Hofmann, os quais têm boa especificidade mas pobre
sinovial, aumentando o volume no interior do túnel, 1921 apesar sensibilidade. 5 Em outras palavras, esses testes produzem
de nem sempre ser observada inflamação quando feita a alto número de resultados falso-positivos e falso-negativos,
biópsia. o que os torna limitados como sinais clínicos 24 e devem ser
O segundo mecanismo proposto está relacionado às utilizados em associação ao sintoma de dor noturna e ao teste
forças passivas presentes durante as contrações excêntricas. ENMG. Em um estágio mais avançado dessa patologia,
Quando essas forças excedem a capacidade de resistência manifestações como alterações musculares e proprioceptivas
dos tecidos e o trabalho é mantido podem manifestar-se também podem ocorrer. Por esse motivo, testes de força
microrrupturas de fibras musculares. 17 muscular bilaterais são indicados na avaliação. 3
Os três últimos mecanismos estão inter-relacionados A hipotrofia tenar é característica das compressões
e podem ocorrer simultaneamente. O aumento da pressão crônicas. Nota-se, nesses casos, redução das forças de
interna, gerada pelo aumento de volume das estruturas preensão palmar e de pinça polegar-indicador. 22 Dentre as
anatômicas, pode acarretar atrito entre os diferentes tecidos, alterações motoras, ocorrem mudanças na propriocepção,
além de compressão nervosa com alterações estruturais na redução da força muscular e perda do equilíbrio da relação
região do nervo. A redução do fluxo sangüíneo deve-se ao agonistalantagonista. Essas alterações estão justificadas em
bloqueio mecânico que impede a irrigação de chegar até o casos crônicos, nos quais outras estruturas estão envolvidas.
local acometido. Em conseqüência, ocorre acúmulo de Havendo comprometimento motor, pode-se avaliar a
produtos metabólicos, que pode contribuir para a fadiga atrofia tenar, a dificuldade ou a impossibilidade de rotação
muscular e para a permanência do processo inflamatório. 17 dos polegares (mãos entrelaçadas, rodar um dedo em volta
Durante a compressão nervosa, as respostas fisiológicas do outro) e a diminuição de força de pinça polegar-indicador. 20
das fibras nervosas periféricas lesionadas são redução da Para o diagnóstico mais preciso é utilizada a ENMG,
velocidade de condução neural seguida por bloqueio da na qual é verificada a velocidade de condução nervosa por
condução. As conseqüências desse bloqueio envolvem efeitos eletrodos de inserção. Esse teste é considerado padrão-ouro
sobre as fibras nervosas eferentes (fasciculação) e aferentes para STC 3 e mostra a saúde fisiológica do nervo mediano
(dor e parestesia). Três são os estágios descritos para a lesão através do túnel do carpo. Os parâmetros utilizados nessa
isquêmica em neuropatias compressivas: (1) aumento da avaliação são latência motora distai, latência sensitiva distai,
pressão interna dos tecidos na região afetada, (2) lesão capilar latência sensitiva da palma até o punho, estimulação seriada
com formação de edema e (3) obstrução do fluxo arterial.' ·por meio do punho, comparação de latências sensitivas entre
os nervos mediano e ulnar e entre mediano e radial;
Diagnóstico da Síndrome do Túnel do Carpo comparação de latências sensitivas entre mediano e ulnar
O histórico do paciente é o aspecto mais importante no dedo anular e eletromiografia. 24
a ser avaliado durante o exame físico. O quadro inicial da O diagnóstico dá-se por meio da comparação da função
STC caracteriza-se por queixas sensitivas, 22 como sensação do nervo mediano, quando ele passa pela região do punho,
de formigamento intermitente, geralmente acompanhada de com outro segmento do nervo ou com outro nervo, como
dor. o radial ou o ulnar. O nervo é ativado mediante estimulação
A distribuição da dor e da parestesia manifesta-se na elétrica transcutânea, induzindo um potencial de ação e
região inervada pelo nervo mediano. No entanto, essa despolarização. Os sinais gerados pela estimulação são
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comparados com os valores normais tomados de outra região. 3 A indicação de órteses é uma das formas mais eficazes
Há fatores que podem levar a um resultado falso-positivo, de tratamento da STC e seu princípio está baseado na redução
como idade, sexo, obesidade, diâmetro do dedo, patologia dos movimentos extremos da articulação do punho, 28 medida
sistêmica associada e temperatura. 25 que pode resultar na diminuição da pressão no interior do
A STC apresenta grande variedade de sintomas túnel. A posição aproximada mais indicada para redução
decorrentes de a associação de trauma mecânico e lesão da pressão é 2 ± 9° de extensão e 2 ± 6° de desvio ulnar. 29
isquêmica. Apesar de a confirmação da STC ser feita por A prescrição desse equipamento está indicada em casos
meio da ENMG, os achados desta revisão sugerem que ela moderados, com pequeno bloqueio de condução nervosa.
não apresenta total confiabilidade, daí a necessidade de

Deve ser usado sempre à noite e durante o trabalho, caso
associá-la aos sinais e sintomas. Além disso, essa técnica os sintomas sejam induzidos durante esse período, 30 embora
é invasiva e envolve grande desconforto e dor para o paciente. os efeitos observados com o uso durante todo o dia também
As técnicas sensórias, como os testes provocativos, também sejam positivos. 31
não parecem ser as formas mais adequadas de diagnóstico, Tem sido realizada a associação de exercícios com a
sendo necessárias novas pesquisas. administração de medicamentos, como antiinflamatórios não-
esteróides, diuréticos, vitamina B6 e infiltrações de corticóide,
Tratamento da Síndrome do Túnel do Carpo mas não há confirmação de sua eficáciaY O tratamento com
O tratamento proposto para STC é dividido em injeções de corticóides oferece risco de infecção, ruptura de
conservador e cirúrgico. 20 O tratamento conservador consiste tendões, aumento da lesão nervosa e distrofia simpático reflexa. 8
em fisioterapia e uso de medicamentos. Durante a fisioterapia Conforme mencionado anteriormente, a STC pode ser
são realizadas cinesioterapia e eletroterapia, além de tratada por método conservador ou cirúrgico. A cirurgia é
prescrição de órteses pelo médico. Todas essas medidas devem recomendada quando tratamentos prévios, incluindo
estar associadas a mudanças nas atividades de vida diária, medicamentos e injeções de esteróides intratúnel, falham.
bem como daquelas realizadas no ambiente de trabalho. Os critérios de inclusão são os seguintes: parestesia constante
Raros são os estudos sobre o uso da eletroterapia em ou intermitente ao longo do trajeto do nervo mediano, teste
pacientes com STC. No entanto, foi encontrado um estudo de Phalen positivo, distúrbios sensoriais e condução nervosa
sobre o uso de ultra-som para recuperação da condução anormal. Os critérios de exclusão são: cirurgia prévia para
nervosa em um modelo experimental com coelhos. Após liberação do túnel, fratura prévia e lesões duplas, como
as aplicações, a amplitude do potencial de ação do músculo radiculopatia cervical e polineuropatia. 7 De modo geral, a
abdutor do polegar obteve aumento significativo, indicando literatura favorece o tratamento cirúrgico, como pode ser
que a recuperação foi facilitada pelo tratamento. Todavia, demonstrado na comparação da eficácia, em curto e longo
os benefícios dessa técnica ainda necessitam ser estudados prazos, entre órtese e cirurgia para tratamento da STC. Os
em modelos clínicos. 26 pacientes foram avaliados clínica e eletrofisiologicamente
A mensuração da pressão do túnel do carpo (mediante e a liberação cirúrgica resultou em melhor progresso. 33
o acoplamento de um cateter a um transdutor de medida de Quanto à realização do procedimento cirúrgico, a
pressão arterial no interior do túnel do carpo por processo decisão deve ser tomada preferencialmente pelo paciente.
cirúrgico) mostra que ela diminui após I minuto de exercícios Porém, caso os sintomas e sinais indiquem perda axonal
e mantém-se abaixo da pressão de repouso por mais de 15 (como formigamento por mais de um ano) e de sensibilidade,
minutos de medida contínua após o período de exercício. atrofia muscular ou fraqueza, a cirurgia deve ser indicada. 34
Os exercícios de movimentação ativa intermitente do punho Na liberação tradicional, o cirurgião faz uma incisão
e dos dedos reduzem a pressão no interior do túnel do carpo, 2 de 5 a 6 em, estendida longitudinalmente em relação à prega
indicando uma vantagem para a prescrição de exercícios. formada pelo punho, e realiza a liberação do ligamento
A execução de exercícios proporciona a resolução dos transverso do carpo sob visualização direta. 34 A liberação
sintomas por alongamento da aderência no túnel carpal. Isso do ligamento também pode ser feita por via endoscópica,
provoca redução da pressão no interior do túnel, do edema esse procedimento apresenta maior risco de lesionar o nervo
e da área de contato do nervo mediano com o ligamento mediano, porém o alívio dos sintomas é similar ao procedi-
transverso, assim como um incremento do retomo venosoY mento aberto e os pacientes retomam ao trabalho mais cedo. 35
O efeito de exercícios de punho e dedos comparado Os valores de força de preensão palmar de pacientes
ao uso de órteses foi avaliado em indivíduos com STC. Ao submetidos à cirurgia tradicional retomam aos níveis do pré-
final do estudo, os dois grupos obtiveram melhora operatório após três meses da cirurgia e melhoram
significativa, não comprovando a eficácia do protocolo de consideravelmente no período de dois anos após o
exercícios em relação ao uso de órtese. 4 procedimento cirúrgico. 34
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Na avaliação da velocidade de condução nervosa de tativa, o déficit de força, como, por exemplo, dinamômetros
indivíduos com STC que passaram por cirurgia aberta ocorre de preensão em pinça. Além de tomarem as avaliações clínicas
melhora clínica e neurofisiológica, entretanto, algum grau menos subjetivas, esses instrumentos de medida podem ser
de déficit motor e/ou sensório permanece presente após seis úteis para a determinação de padrões normativos indicadores
meses nos casos mais avançados. 36 de lesão.

Direções Futuras CONSIDERAÇÕES FINAIS


De acordo com a literatura, um dos principais problemas
enfrentados por indivíduos acometidos por STC é a perda A STC pode ser considerada, além de um problema de
de força muscular, conforme evidenciado mediante a revisão saúde, também um problema social, tendo em vista os
da literatura. 234 A perda de força muscular e a capacidade transtornos físicos e psíquicos decorrentes dela.
reduzida de ativação elétrica dos músculos afetados pela STC Os sintomas e sinais musculoesqueléticos não são as
podem ser evidenciadas por algumas técnicas não-invasivas, únicas conseqüências dos desequilíbrios vivenciados pelos
como a mecanomiografia (MMG) e a eletromiografia (EMG). trabalhadores. Outros problemas de saúde estão associados
A MMG é uma técnica não-invasiva que vem sendo a essa condição. O trabalho repetitivo pode estar na origem
utilizada nas últimas três décadas para o estudo da função de alguns transtornos psíquicos ou vice-versa, de forma que
muscular. Ela tem a vantagem, em relação à EMG, de detectar fatores biomecânicos e psicossociais interagem na formação
informações relativas tanto ao comportamento mecânico do e na evolução do fenômeno musculoesquelético.
músculo quanto à sua ativação elétrica. A técnica da MMG Embora haja vários estudos sobre STC, como foi
é potencialmente utilizada como indicadora de força e as descrito neste trabalho, ficou evidente que há necessidade
mudanças nos sinais MMG, durante a atividade, são de um maior número de investigações, inclusive utilizando
dependentes da força de contração e das diferentes estratégias novas técnicas de pesquisa e abordando a possibilidade de
de recrutamento de UMs utilizadas para manter os diferentes dupla compressão (coluna cervical e túnel do carpo), que
níveis de força. 37 possam esclarecer todos os mecanismos envolvidos nessa
Apesar de os sons/vibrações musculares terem sido patologia e, dessa forma, auxiliar na melhora da qualidade
utilizados com diferentes propósitos, pouco se sabe sobre de vida desses indivíduos.
as alterações que ocorrem nesses sons em decorrência das
diferentes condições patológicas. 39 Raros foram os REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
experimentos que utilizaram a MMG no estudo de lesões
musculoesqueléticas. Esses poucos trabalhos, no entanto, 1. Birdsell JB. Human evolution. 2ª ed. Chicago: Rand Mc.Nally
College Publishing Company; 1975. p. 582.
já indicam haver diferenças no sinal MMG em músculos de
indivíduos portadores de lesões musculoesqueléticas ou 2. Seradge H, Jia Y, Owens W. In vivo measurement of carpa!
neuromusculares. Em um desses estudos foi detectado que tunnel pressure in the functioning hand. J Hand Surg (AM)
1995; 20A: 855-9.
o pico de freqüência dos sons musculares produzidos por
contrações de músculos com algum tipo de desordem 3. Werner RA, Andary M. Carpal tunnel syndrome:
pathophysiology and clinicai neurophysiology. Clin
neuromuscular é significativamente mais baixo do que o pico
Neurophysiol 2002; 113: 1373-81.
de freqüência dos sons produzidos por contrações de músculos
saudáveis. 39 Outro experimento sugere que o registro dos 4. Akalin E, El O, Peker O, Senocak O, Tamci S, Gülbahar S,
Çakmur R, et ai. Treatment of carpa! tunnel syndrome with
sons musculares produzidos em resposta à estimulação elétrica
nerve and tendon gliding exercises. Am J Phys Med Rehabil
artificial pode ser útil no diagnóstico de denervação em estágio 2002; 81: 108-13.
precoce. Esses autores verificaram que as amplitudes dos
5. Kuhlman KA, Hennessey WJ. Sensitivity and specificity of
sons musculares de pacientes com lesões no nervo perifé- carpa! tunnel syndrome signs. Am J Phys Med Rehabil 1997;
rico foram menores quando comparadas com aquelas de 76(6): 451-57.
pacientes com os músculos contralaterais não-afetados pela 6. Resende LAL, Adamo ASV, Bononi AP, Castro HAL, Kimaid
lesão. 40 PAT, Fortinguerra CH, et ai. Test of a new technique for the
Apesar de as evidências na literatura apontarem para diagnosis of carpa! tunnel syndrome. J Electrom Kinesiol 2000;
a MMG como uma ferramenta não-invasiva de fácil utilização 10: 127-33.
e que pode vir a ajudar no diagnóstico de alterações na função 7. Uchiyama S, Toriumi H, Nakagawa H, Kamimura M, Ishigaki
muscular decorrentes de patologias, não foi encontrado, na N, Miyasaka T. Postoperative nerve conduction changes after
literatura, nenhum estudo sistemático que tenha utilizado essa open and endoscopic carpa! tunnel release. Clin Neurophysiol
técnica com portadores de STC. 2002; 113: 64-70.
Associados a essa técnica, sugere-se o desenvolvimento 8. Kouyoumdjian JA. Síndrome do túnel do carpo: aspectos atuais.
de sistemas de medição capazes de detectar, de forma quanti- Arq Neuropsiquiatr 1999; 57(2-B): 504-12.
122 Karolczak, A. P. B. et ai. Rev. bras. fisioter.

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