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GUANABARA, Ricardo. Visões Alternativas Do Direito No Brasil PDF
GUANABARA, Ricardo. Visões Alternativas Do Direito No Brasil PDF
Ricardo Guanabara
Introdução
Definindo os alternativos
Nola: Este trabalho foi rt.!alizado a partir das discussôcs travadas no curso "'Direitos d.... is no BrasW,
ministrado por José Murilo de Carvalho no IUPERJ no primeiro semestre de 1995.
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o direito alternativo no Brasil, por sua vez, busca, de certa forma, uma
subversão do ordenamento jurídico existente, seja a partir de dentro do Estado,
seja a partir de fora, com a mobilização de selares organizados da sociedade.
Assim, a proposta do "uso alternativo do direito", de reconhecida influência
européia, parte da própria prática judicial e coloca a magistratura no centro do
movimento. Vários magistrados utilizam-se do direito oficial vigente para colocar
a justiça "ao lado dos oprimidos". A segunda perspectiva, de matriz latino-ameri
cana, coloca não os juízes mas as próprias comunidades como atores principais
na luta pelos seus direitos, reivindicando um maior grau de educação para os
segmentos populares para que possam demandar soluções para seus problemas.
Uma procura adaptar as normas jurídicas existentes às necessidades dos setores
populares, acreditando que a neutralidade do Poder judiciário é um "mito". A
outra propõe-se prestar serviços jurídicos aos trabalhadores, conscientizando as
classes populares através da educação "legal" e "política", enfatizando a neces
sidade da criação de um direito "insurgente" das classes oprimidas, a ser gestado
fora do Estado.2 Trata-se, como bem ressalta Luciano Oliveira, de uma escola
que procura "inscrever novos direitos a partir da perspectiva dos próprios domi
nados".3
São, portanto, visões distintas acerca das possibilidades do quadro
institucional vigente, embora a maioria de seus praticantes compartilhe da
adesão ao marxismo como crítica do direito.
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Rio Grande do Sul, onde se encontrava outro grande líder do movimento, o juiz
e professor Sérgio Gischow PereiraIO
Embora não possam manter vínculos partidários, por determinação da
própria Lei Orgânica da Magistratura, a maioria dos juízes "alternativos" declara
votar no PT e, não raro, faz aftrmações que provocam críticas contundentes
vindas dos mais importantes juristas do país. Independentemente da produção
acadêmica do grupo, que tem crescido nos últimos anos, e das decisões judiciais,
as aftrmações de certos integrantes são também bastante polêmicas, sobretudo
porque quase sempre questionam a estrutura de funcionamento do Poder
Judiciário no Brasil. São usuais as críticas aos rituais do cotidiano dos tribunais
e propostas para modificá-los. Um dos juízes - Márcio Puggini - chegou a propor
mudanças no mobiliário dos tribunais: "Nós queremos serrar os pés da mesa
,,
para ficarmos na mesma altura das pessoas. 11 Com ele concordaria Amilton
Bueno de Carvalho: "Olhar as pessoas de cima nos deixa numa posição
,,
ridícula. 12
Também as declarações poUtizadas "à esquerda" provocam indignação
em alguns círculos jurídicos brasileiros. A maioria dos juízes alternativos
questiona a idéia de Justiça e muitos não hesitam em redefini-la. Tal é o caso
de Arnilton Bueno quando afirma: "Eu ensino a usar o direito para a emanci
pação da classe trabalhadora", ou "O justo está no compromisso com a maioria
do povo, que obviamente, no regime capitalista, é explorada".13
Não se pode dizer que os juízes alternativos se preocupem apenas em
expor suas posições por meio de declarações. Há um esforço de fundamentação
e difusão acadêmicas. Além de publicações - livros e periódicos -, desde o
início dos anos 90, centenas de debates e inúmeros congressos foram reaUzados
em todo o Brasil, entre eles o I Encontro Internacional de Direito Alternativo,
realizado no estado de Santa Catarina em setembro de 199114
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Jurisprudência "alternativa"
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Conclusão
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poder à democracia. Abordamos aqui neste trabalho duas propostas que visam
à sua democratização. A primeira, a do "uso alternativo" do direito, sugere uma
mudança "a partir de dentro e pelo alto" do quadro jurídico no Brasil, com a
utilização do instrumental e das instituições já existentes de fOlIna a servir aos
segmentos mais desfavorecidos da sociedade. Interpretar a lei visando a proteger
o mais fraco socialmente parece ser o guia de ação desses magistrados,
sobretudo gaúchos, que se aproveitam das lacunas e contradições do direito,
mas não se furtam a, se for preciso, julgar contra os textos legais para "fazer
justiça".
A segunda proposta sugere uma mudança jurídica mais profunda, já
que valoriza, não os textos e instituições legais vigentes, mas os relacionamentos
jurídicos não oficiais praticados diariamente pelas comunidades, associações
profissionais, de moradores etc. Como representantes dessa proposta estão
juristas adeptos do "direito achado na rua" ou "direito insurgente". Todos, de
certa forma, abrigam-se sob o rótulo "direito alternativo". Todos também criticam
fortemente os textos legais em vigor no Brasil e propõem sua substituição por
um "novo direito", ignorando esforços feitos no Brasil dos últimos anos para
dotar O país de leis garantidoras da liberdade e da integridade individual.
Pelo que aqui foi dito, tudo indica que os "alternativos" têm um desafio
quase intransponível a vencer, já que as faculdades de direito, em geral, e os
tribunais, acabam por reforçar o direito positivista dos códigos.
Porém, se o estrito positivismo pode não ser "saudável", convém
recordar Luciano Oliveira, que adverte para a importância de certos formalismos
legais e sugere cautela ao se condenar O arcabouço jurídico do país.
No t a s
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29. Amilton Bueno de Carvalho, Direito o direito", in José Geraldo de Souza Jr.
alten1atiuo na jurisprudência, op. cit., (org.), Introdução critica ao direito,
p.25. Brasília, Ed. UnB, 1993, p.l6.
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49. Rossana Bissol, UDialética social do 52. Luciano Oliveira, op. cit., p.2.
direito", in José Geraldo de Souza Jr.
53. Idem, ib., pA.
(org.), op. cit., p.36.
54. Idem, ib.
50. Antônio Alberto Machado e Marcelo
Pedroso Goulart, Ministério Público e 55. Idem, ib., p.7.
direito alternativo, São Paulo,
Acadêmica, 1992, pAI.
(Recebido para publicação em
51. Idem, ib., pA2 . janeiro de 1997)
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