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Olá, desejamos as boas-vindas ao curso “Aspectos Jurídicos da Atuação Policial”!

O curso é composto por três módulos. A divisão dos assuntos foi elaborada para facilitar o aprendizado
e os conhecimentos serão apresentados gradativamente, mantendo correlação lógica entre as aulas e os
módulos. A todo o instante, a proposta é buscar ligação entre os aspectos jurídicos e as experiências vivenciadas
pelo aluno no cotidiano policial, possibilitando o desenvolvimento dos objetivos gerais e específicos traçados.
Para que você tenha uma ideia do caminho a ser percorrido, observe os objetivos estabelecidos para o
curso, traçados de acordo com a percepção de que sua aprendizagem deve servir de base para sua atuação
profissional.

Objetivo do curso

Ao final do curso, você será capaz de:

• Apontar os requisitos legais indispensáveis à realização da abordagem pessoal, domiciliar e


veicular;
• Reconhecer o valor e respeitar os direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, na
atividade da Segurança Pública;
• Identificar os principais ilícitos penais correlacionados ao tema, eventualmente praticados por
pessoas abordadas pela polícia;
• Identificar os principais ilícitos penais correlacionados ao tema, eventualmente cometidos por
policiais;
• Identificar as implicações de ordem civil e administrativa durante uma abordagem mal sucedida;
• Conhecer quais são as tendências das principais decisões do Poder Judiciário sobre a atuação
policial;
• Identificar os critérios e fundamentos para realização da abordagem policial;
• Entender quais as motivações que levam ao policial a realizar uma abordagem (prevenção,
orientação geral ao público, fundada suspeita, momento de atuação).

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Estrutura do curso

Este curso abrange os seguintes módulos:

• Módulo 1 – Aspectos constitucionais e normas internacionais aplicados à atuação policial;


• Módulo 2 – Atuação policial: da prevenção às ações de resgate da paz social e instrução criminal;
• Módulo 3 – Implicações penais, civis e administrativas sobre a abordagem policial: responsabilidade
do cidadão e do agente policial.

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MÓDULO
ASPECTOS CONSTITUCIONAIS E NORMAS

1 INTERNACIONAIS APLICADAS À SEGURANÇA


PÚBLICA

Apresentação do módulo

Na Constituição de 1988 se encontram os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil,


dentre eles o de construir uma sociedade livre, justa e solidária, bem como o de promover o bem de todos.
Essa norma fundamental traça a estrutura essencial desse Estado, em especial no âmbito da segurança
pública, conferindo-lhe atribuições (ex.: preservar a ordem pública, que consiste em manutenção e
reestabelecimento; proteger pessoas e bens), assim como metas e limites para o cumprimento de suas tarefas
e o exercício do poder.
Dentro desse contexto, destaca-se a dignidade da pessoa humana, além de um catálogo de
direitos e garantias fundamentais.
Ao lado disso, é importante lembrar que o Brasil, nas suas relações internacionais, segue alguns
princípios, dentre os quais destacam-se: a prevalência dos direitos humanos, a defesa da paz e a solução
pacífica dos conflitos e a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade.
Normalmente essas relações são firmadas por meio de acordos, tratados, convenções, dentre outros
atos, regulados pelo Direito Internacional.
Assim, considerando a atuação no âmbito da segurança pública, é importante destacar que você
estudará algumas normas internacionais que possuem reflexo na atuação policial, bem como garantias não
expressas na Constituição Brasileira, e que vinculam sua atividade ou recomendam a observação de algumas
medidas, podendo ser ou não adotados pelo Brasil, por seu estado ou município.

Neste módulo, você estudará as principais normas constitucionais e os atos normativos internacionais
que cuidam das atividades de preservação da ordem pública e da proteção de pessoas e bens.

Objetivo do módulo

Ao final do módulo, você será capaz de:

• Descrever o que é dever da sua instituição: identificar as normas constitucionais que tratam das
ações de segurança pública, seus órgãos e atribuições;

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• Identificar quais normas amparam suas atribuições: identificar as normas constitucionais, bem
como os princípios relacionados aos direitos e garantias fundamentais que delimitam a atuação dos
profissionais de segurança pública;
• Compreender a necessidade de sua atuação (estatal) como instrumento de promoção da
harmonia no seio da comunidade;
• Nomear as restrições legais aos direitos humanos fundamentais;
• Reconhecer as limitações constitucionais da sua atuação policial e as consequências dos desvios
desses limites na extensão da responsabilidade;
• Reconhecer o poder que o Estado dá a seus agentes para realizar abordagem; e,
• Conhecer as normas internacionais que cuidam das ações policiais, com seus efeitos e alcance.

Estrutura do Módulo

Este módulo abrange as seguintes aulas:

• Aula 1 – Visão constitucional sobre o papel dos órgãos policiais;


• Aula 2 – Restrições constitucionais sobre a atuação policial;
• Aula 3 – Reflexos das normas internacionais na atividade policial.

Aula 1 – Visão constitucional sobre o papel dos órgãos policiais

Como profissional, você sabe que a atividade policial integra as ações de segurança pública, e de acordo
com os ensinamentos do professor Lazzarini (1999, p. 52), constitui-se como um aspecto da ordem pública, ao
lado da tranquilidade e da salubridade pública. Tudo isso é concebido dentro de uma estrutura estatal para
garantir uma convivência harmoniosa entre as pessoas.
Quem de nós, profissionais de segurança pública, nunca disse “Estou aqui para garantir a ordem
pública!”, quando na verdade nos referimos à segurança pública.

Mas, no que a ordem pública difere de segurança pública? Não seriam a mesma coisa?

1.1 Segurança pública e ordem pública


Uma explicação usual diz que, em linhas gerais, a segurança pública é causa da ordem pública, que se
traduz em um estado antidelitual, livre, portanto, da violação dos bens e valores mais importantes para a
coletividade (vida, integridade física, liberdade, patrimônio, etc.) e, por isso, tutelados pelas leis, que regulam o
comportamento de todos.
Nesse sentido, existe ordem pública, e, consequentemente, segurança pública, quando, por exemplo,
no dia-a-dia o cidadão tem a liberdade para ocupar espaços públicos, transitar nas ruas a qualquer hora, sem
sofrer qualquer tipo de prejuízo, violação ou dano (ex.: furto, roubo, sequestro, lesão corporal, homicídio etc.).
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Para enriquecer essa noção, de acordo com Meirelles (Apud LAZZARINI, 1999, 93), ordem pública é:

[…] a situação de tranquilidade e normalidade que o Estado assegura – ou deve


assegurar – às instituições e a todos os membros da sociedade, consoante às normas
jurídicas legalmente estabelecidas [...] abrange e protege também os direitos
individuais e a conduta lícita de todo o cidadão, para coexistência pacífica de toda a
comunidade. Tanto ofende a violência contra a coletividade ou contra as instituições
em geral, como os atentados aos padrões éticos e legais de respeito à pessoa
humana [...] é situação fática de respeito ao interesse da coletividade e aos direitos
individuais que o Estado assegura, pela Constituição e pelas leis, a todos os membros
da comunidade.

Nas palavras, de Moreira Neto (Apud LAZZARINI, 1999, P. 52) a segurança pública é resultado de um
conjunto de ações dos órgãos especializados do Estado, precedido por escolhas feitas pela sociedade e
reguladas por normas jurídicas (leis), tudo com a finalidade de garantir a ordem pública, sendo esta objeto
daquela. É neste ponto em que nós, profissionais de segurança pública, devemos amparar nossas ações.
Dentro dessa concepção, a preservação da ordem pública é feita pelos agentes públicos de segurança,
por meio da manutenção e quando quebrada, do reestabelecimento da ordem pública.

Importante!
O agente público de segurança trabalha preventivamente pela manutenção e repressivamente pelo
reestabelecimento da ordem pública e da paz na sociedade.

Essa afirmação de Moreira Neto (1999), se consolida com a leitura do Capítulo (III), “Da segurança
pública”, no Título V, da CF/88, que cuida “Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas”. Em especial, o
artigo 144 estabelece que o poder público, dentro de suas atribuições, tem a incumbência de promover a
preservação da ordem pública e garantir a incolumidade das pessoas e do patrimônio:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos,


é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares

Dito isso, não custa reforçar a ideia de que as atividades desenvolvidas pelos órgãos policiais são
consubstanciadas em procedimentos específicos, aptos a alcançar suas finalidades.

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Importante!
As ações dos profissionais de segurança são construídas para garantir e resguardar uma situação de paz
social, um ambiente de normalidade almejada pela coletividade, protegendo os bens mais caros para a
sociedade, consoante às normas jurídicas vigentes, estabelecendo um grau adequado de coexistência
pacífica entre as pessoas.

Saiba mais...
Considerando o objetivo de estudo desse curso, destaca-se aqui o papel de cada órgão policial citado
no artigo acima, sendo de suma importância a leitura dos parágrafos do Art. 144. que versam sobre esta
questão.

1. Prevenção e Repressão
Para facilitar a compreensão do momento em que cada um dos órgãos policiais, citados anteriormente,
deve agir, para preservar a ordem pública, proteger pessoas e bens, faça o exercício a seguir:
Imagine o momento em que ocorre um evento da natureza (emergências, desastres, catástrofes, etc.)
ou uma conduta humana – ação/omissão (crime/delito, contravenção penal, etc.).
Diante de situações assim, o que se busca é assegurar um ambiente social livre de riscos e perigos,
através de ações de prevenção ou de repressão (imediata e mediata) realizadas pelos os órgãos policiais, seja
em razão dos acontecimentos da natureza, seja em função do comportamento do ser humano.

Importante!
Dentro dessa concepção, importa salientar que o Estado é o detentor do uso da força e por isso,
quando a ordem pública é quebrada, seus agentes públicos de segurança, protocolam ações, muitas
delas com o emprego de força por meio da repressão imediata, para o reestabelecimento da ordem.

As ações desenvolvidas pelos órgãos policiais buscam promover o controle social no sentido de evitar
(prevenir) a perturbação da ordem pública, a mácula da paz social, a violação dos bens jurídicos tutelados (vida,
integridade física, patrimônio, etc.).
Quando essa prevenção não funciona, surgem os procedimentos de resgate da ordem pública e da paz
social, mediante ações de repressão imediata, socorrendo a vítima, isolando o local do evento, prendendo o
autor da conduta, instaurando procedimentos (ex.: inquérito policial) para esclarecer os fatos e colher elementos
preliminares (autoria, materialidade e circunstâncias) para instruir eventual responsabilização (administrativa,
civil ou penal).
A repressão mediata consolida os atos complementares da colheita de informações, seja promovendo
a oitiva do autor dos fatos, vítima ou de testemunhas, que não foram identificados no momento dos eventos,
seja realizando diligências, perícias complementares, dentre outros, a fim de instruir a persecução penal
instaurada e/ou responsabilização nas esferas administrativa e civil.

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O quadro, a seguir, mostra a relação dos órgãos de segurança pública com as ações de prevenção e
repressão, de acordo com o art.144 da CF/88

Ações de Ações de
Órgão Ações de Prevenção Repressão Repressão
imediata mediata

Polícia Federal (§1º, incisos II e III) (§1º, incisos I e IV) (§1º, incisos I e IV)

Polícia Ferroviária
Federal e Polícia (§§ 2º e 3º) (§§ 2º e 3º) ___
Rodoviária Federal

Polícias Civis ___ (§ 4º) (§ 4º)

Polícias Militares (§ 5°) (§ 5°)

Quadro 1 – Relação dos órgãos de segurança pública com o exercício das ações de prevenção e repressão – Art.
144 da CF/88
Fonte: Elaborado a partir das informações do conteudista

As polícias militares, ao lado dos corpos de bombeiros militares, devido ao regime jurídico peculiar,
exercem ainda a atividade de polícia judiciária militar, regulada pelo Código de Processo Penal Militar, com
natureza de repressão imediata e mediata.
Observe que as instituições de segurança pública recebem atribuições diversificadas, que abrangem
desde o controle social, regulando as relações interpessoais com o emprego da força, o socorro, assistência
às populações carentes, apoio às atividades comunitárias, reforço aos demais órgãos nas atividades de
saúde, fiscalização tributária, sanitária, dentre outras (COSTA, 2004, p. 35-36).
E como estas ações são desempenhadas? Como se define onde os órgãos de segurança pública
atuarão?

1.2.1 Ações preventivas e repressivas


As ações preventivas e de repressão imediata são desempenhadas através de procedimentos de
distribuição de efetivo em locais em que, após o devido planejamento, guardem algum potencial para a
ocorrência de fatos que venham a abalar a paz social, a ordem pública e quando ocorrem crimes, adoção de
medidas para prisão em flagrante e atos complementares (LAZZARINI, 1998). Normalmente isso ocorre com o
emprego do policiamento ostensivo, direcionado essencialmente para a realização de procedimentos
destinados a evitar que pessoas e bens estejam em risco (SKOLNICK; BAYLEY, 2006, p. 97), seja em razão de um
evento da natureza ou de um comportamento humano.

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No âmbito das ações de repressão imediata e mediata, evidenciam-se as atividades de polícia judiciária,
exercidas pelas polícias federal e civil, mediante colheita de informações sobre a autoria e materialidade de uma
infração penal (crimes/delitos e contravenções), bem como o cumprimento de determinações das autoridades
judiciárias (juiz de 1° grau, desembargador, ministros do STJ e do STF), como no mandado de prisão, na busca
e apreensão de bens, na realização de perícias, etc.
Seus atos, em regra, são documentados em inquéritos policiais, Autos de Prisão em Flagrante (APF) e
Termos Circunstanciados de Ocorrência (TCO) que, uma vez encaminhados para a justiça, tem por finalidade
subsidiar o exercício da ação penal por seus titulares (na ação penal pública, o Ministério Público, através da
denúncia; na ação penal privada, o ofendido/vítima ou representante legal, através da queixa-crime), ao apontar
indícios de autoria e materialidade. Portanto, tipicamente, a polícia judiciária exerce suas atribuições após a
ocorrência do fato-crime. De outro lado, é possível que eventualmente haja uma atuação preventiva, através da
orientação ao público em geral, ou em cumprimento a um mandado de prisão/busca e apreensão, no qual a
simples presença do profissional inibe a ocorrência de um crime.
Assim, vale ressaltar que também no exercício da atividade de polícia judiciária são realizadas
ações de busca pessoal, veicular ou domiciliar, pois constituem procedimentos aptos a instruir a colheita de
informações sobre a materialidade e autoria de uma infração penal (crime/delito, contravenção penal), quando
instaurado um inquérito policial ou ainda para cumprir uma determinação judicial, no sentido de subsidiar uma
instrução criminal, após a instauração de um processo penal.

1.2.2 Ações dos Corpos de bombeiros militares, guardas municipais, órgãos ou entidades
executivos de trânsito
Conforme você estudou anteriormente, as instituições de segurança pública recebem atribuições
diversificadas. No caso em apreço, cumpre destacar as ações de socorro, fiscalização de trânsito, segurança
viária, assistência às populações, reforço aos demais órgãos nas atividades de saúde, fiscalização tributária,
sanitária, dentre outras.
Os corpos de bombeiros militares exercem atividades de defesa civil, buscas, salvamento, socorros,
prevenção e combate ao incêndio. Tais ações são desenvolvidas em caráter preventivo, repressivo imediato e
repressivo mediato, sendo estas realizadas em casos de incêndio, através da perícia.
Às guardas municipais cabem a proteção de bens, serviços e instalações dos municípios, na forma da
lei (CF/88, ART. 144, § 8°). Em 08 de agosto de 2014 entrou em vigor a Lei n° 13.022.

Saiba Mais...
A referida lei tem caráter de norma geral, editada no âmbito do Congresso Nacional, podendo cada
município, através de suas respectivas câmaras de vereadores, editar normas específicas, a fim de criar guardas
municipais, observando a norma geral em destaque.

Quanto à fiscalização de trânsito e à segurança viária, põe-se em destaque a entrada em vigor da


Emenda Constitucional n° 82/2014, conferindo preocupação do tema à segurança pública:

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Art. 144. ...
[...]
§ 10. A segurança viária, exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do seu patrimônio nas vias públicas: (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 82, de 2014)
I - compreende a educação, engenharia e fiscalização de trânsito, além de outras
atividades previstas em lei, que assegurem ao cidadão o direito à mobilidade urbana
eficiente; e (Incluído pela Emenda Constitucional nº 82, de 2014)
II - compete, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aos
respectivos órgãos ou entidades executivos e seus agentes de trânsito, estruturados
em Carreira, na forma da lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 82, de 2014)

Aula 2 – Restrições constitucionais sobre a atuação policial

Você já deve ter ouvido bastante sobre a violência policial. Então, aqui vai uma pergunta: a polícia é
violenta?

2.1 Autorização social para o exercício da violência legítima em benefício da paz social
Porto (apud OLIVEIRA; SANTOS E SILVA, 2001, p. 33) destaca a ideia de Max Weber (1968) no sentido
de que o Estado, por seus agentes policiais, detém o monopólio da violência legítima.

Violência: Do latim, violência remete a vis, que significa força, vigor, emprego de força física, recursos
do corpo para exercer a sua força vital, seja para dominar a natureza, outra pessoa ou grupo de pessoas
(FOUCAULT, 2004).

Para que você possa compreender o termo violência legítima, imagine as situações a seguir:
Situação 1 – Imagine...
...uma situação em que você tem que efetuar uma abordagem e mesmo depois de exaustiva negociação
o autor da conduta resiste fisicamente à sua legítima atuação, a ponto de querer ofender sua integridade física,
exigindo a prisão.
Você conseguiria cumprir sua função sem usar a força?
Assim, para que o Estado cumpra o papel de promover o bem comum, a violência (uso da força) legítima
surge como instrumento que tem o objetivo precípuo de estabelecer ou preservar uma sociedade pacificada, o
controle social. Na verdade, a conotação dada a essa violência (uso da força) é a de que ela se legitima na
autorização dada pelo corpo social, através das normas jurídicas (constituição, leis, etc.), tão somente “para

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impedir a livre circulação da violência” entre os indivíduos “e inibir sua existência de forma difusa e/ou
privatizada pelo conjunto da sociedade”.
[...] trata-se do domínio de procedimentos fundados no direito racional, guiados por
normas e regras impessoais, de caráter mais universalistas. Descumpridas essas
condições, abre-se espaço para se falar em violência legítima, como características
que podem indicar, além do mais, processos de desconcentração e de privatização
dessa violência (Porto, 2000).

É dentro dessas condições que se desenvolve a concretização da atuação policial, mediante o uso
diferenciado da força, como elemento essencial para assegurar a ordem pública, a paz social (BITTNER, 2003,
p. 128).

Situação 2 – Imagine...
Imagine a situação na qual seja irradiada pela Central de Operações uma denúncia de que três
indivíduos, em um veículo automotor, estejam praticando vários roubos em comércio de uma região, mediante
uso de uma arma de fogo. Em dado momento, uma viatura se depara com um veículo com as exatas
características transmitidas pela Central.

O que você, profissional de segurança faria? Abordaria? E como faria isso?


Agora, partindo das situações anteriormente apresentadas, reflita sobre as questões a seguir.
Os excessos na atuação policial, frequentemente, são objetos de severas críticas que, invariavelmente,
vinculam-nos à falta de preparação.

De outro lado, empregando o adágio


“a polícia é uma presença que incomoda, mas, principalmente, uma ausência sentida”
Sabe-se que o uso da força, a abordagem, ou a efetivação de uma prisão, constituem procedimentos
necessários para se alcançar os objetivos dos órgãos policiais, para proteger pessoas e bens, assegurando um
ambiente social livre de riscos e perigos.
Pensando na sua realidade e experiência profissional, qual sua ideia a respeito?
Você acredita que seja possível minimizar e até eliminar as críticas sobre a legitimidade de uma
intervenção policial?

Quando alguma ação policial é considerada ilegítima, fora dos parâmetros do uso legítimo da força,
tem-se como incompatível com o estado democrático de direito. Mas, as perguntas que você pode querer fazer
são:
Quais seriam esses parâmetros? O que é legítimo e o que deixa de ser em uma atuação policial?
Como você estudou, a Constituição Federal estabelece as normas de organização e estruturação do
Estado, de seus poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e de seus órgãos, para que possam alcançar a
finalidade pública e atender os interesses da coletividade. Também certamente teve a oportunidade de ver que

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a Carta Magna de 1988 traçou os direitos e garantias fundamentais com o intuito de limitar a atuação estatal
evitando as arbitrariedades de quem ocupa o poder.

2.2 Natureza e distinção entre direitos e garantias fundamentais


Muitas vezes, quando em atuação, os profissionais de segurança pública escutam o seguinte
comentário sobre direitos e garantias individuais:
Mas onde estão escritos?
Para saber identificar o que realmente é direito e o que é mera alegação infundada, a partir de agora
você estudará as bases do tema direitos e garantias fundamentais. Por meio delas, espera-se criar condições
para que você possa compreender a razão pela qual tanto se fala em limitações constitucionais à atuação policial
e o porquê de sua existência.
Importante!
É importante que você, profissional de segurança pública, conheça as regras que envolvem suas ações
para que ninguém, além da lei, diga o que você deve e o que não deve fazer. A lei é quem traça suas
ações.

Toda vez que você, policial, agente aplicador da lei, for realizar algum procedimento, precisará observar
que seu comportamento se vincula ao atendimento dos limites legais.
Empregando os ensinamentos do Professor Paulo Gonet Branco (2008), é bom dizer que os direitos e
garantias fundamentais constituem um núcleo, um conjunto de regras e princípios que visam proteger a
dignidade da pessoa humana.
De uma forma bem geral, pode-se dizer que:
Os direitos representam por si bens, isto é, algo que pertence ao patrimônio (material ou imaterial) de
alguém ou tem como objeto imediato um bem específico da pessoa (vida, honra, liberdade, integridade física,
etc.).
As garantias correspondem a instrumentos postos à disposição dos indivíduos para assegurar os
direitos e limitar os poderes do Estado (habeas corpus, habeas data, mandado de segurança, direito de petição).

Você conhece as regras diretamente ligadas à nossa atuação? Por que não posso mais “prender” uma
pessoa e levar à delegacia para averiguação, se a minha intuição diz que contra ela pode existir um mandado
de prisão expedido? O delegado precisa do mandado de prisão para recolhê-la? Onde exatamente está escrito
isto? Todos sabem que aquela pessoa é criminosa e cometeu ato delituoso grave em que o autor ainda não
havia sido preso. Posso abordá-la na rua e levá-la para casa?

Saiba Mais...
Vários são os dispositivos contidos no art. 5º da Constituição que comportam as definições estudadas
por você anteriormente, sendo de suma importância a leitura, entendimento e aplicação durante o exercício das
ações de segurança.

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Uma curiosidade se destaca em face do conteúdo do caput do art. 5º. Releia o trecho a seguir:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:

Observe que, em um primeiro momento, ele dá a entender que os destinatários da proteção jurídica e
material são apenas os brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil. Porém, é bom que fique claro que os
estrangeiros em trânsito no território nacional também são beneficiários dessa tutela estatal brasileira.
Esse entendimento decorre da interpretação dada aos artigos 1°, 3°e 4°da Constituição, de onde se destacam a
dignidade da pessoa humana, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a promoção do bem
comum, sem preconceitos de origem raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação e, em
especial, a prevalência dos direitos humanos nas suas relações internacionais.
A existência de direitos e garantias fundamentais na Constituição tem sua razão de ser centrada na
magnitude (dimensão) dos valores mais caros da existência humana que, por isso, devem estar resguardados
em um documento jurídico supremo e com força vinculante máxima, tornando-se imune aos temperamentos
ocasionais de quem ocupa o centro do poder, bem como das instabilidades políticas, religiosas, econômicas e
sociais.
E para que essa concepção seja efetiva, os direitos fundamentais na Constituição vinculam a atuação
do Estado, de seus Poderes e de seus órgãos. Circunstância que impede a interpretação de que constituem
simples limitações dos poderes, passíveis de serem alterados ou suprimidos ao talante desses, sob o mero
argumento de vigorar o interesse do Poder Público na consecução de seus fins.

Então, pode-se concluir que:


Os órgãos públicos que constituem a administração pública (dentre eles, os da segurança pública) estão
vinculados às normas de direitos e garantias fundamentais, pelo que seus agentes devem agir, interpretar e
aplicar as leis segundo ao que se dita.

Em outras palavras, a atividade do poder público não pode deixar de respeitar os limites que lhe acenam
os direitos e garantias fundamentais. Em especial, destacam-se as atividades discricionárias da administração,
cuja margem de liberdade abre um leque de possibilidades na atuação do agente público, de acordo com os
juízos de oportunidade (agora ou depois) e conveniência (bom ou ruim), como ocorre na abordagem policial,
pautada eventualmente na fundada suspeita.

2.2.1 Direito de ir, vir e permanecer


No texto de contextualização, disponível na apresentação, você leu o questionamento:
É certo dizer que as pessoas não podem ficar nas esquinas sem fazer nada até tarde da noite? Será que
é isso mesmo?

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Para responder a essas questões, é necessário verificar que um dos direitos fundamentais mais afetados
com a intervenção estatal, em especial, por meio da atuação dos órgãos de segurança pública, durante uma
busca pessoal, no exercício do dever-poder de polícia (vide Módulo 2), é o direito de ir, vir e permanecer.
Isso porque a CF/88 em seu art. 5º, inciso XV, foi clara ao dizer que: “é livre a locomoção no território
nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair
com seus bens”. Com efeito, não havendo flagrante delito nem outra restrição legal, é perfeitamente possível a
permanência das pessoas nas esquinas até tarde da noite.
Você tem ideia da magnitude, da importância e do relevo que contorna esse direito fundamental?
A resposta perece simples, mas na prática não o é. Perceba que com a liberdade a pessoa pode
desenvolver-se em várias dimensões (física, espiritual, educacional, religiosa, política, etc.). E um dos aspectos
dessa liberdade é o direito de locomoção (direito de ir, vir e permanecer), que permite ao cidadão a
possibilidade de movimentar-se por todos os espaços públicos e privados na busca de integrar-se com sua
sociedade, com sua família, com o poder público, seja para emprego, educação, saúde ou lazer, dentre outros
aspectos da vida em sociedade.
Vale lembrar que isso tudo faz parte da dignidade da pessoa humana, ponto de partida desse estudo,
que na Constituição de 88, ao Estado compete proteger e estimular o seu pleno exercício, porque para isso foi
concebido.
Dessa forma, considerando os aspectos fáticos, a abordagem policial deve ser realizada no tempo
estritamente necessário para que seja verificada eventual suspeita. Assim, caso não haja nada que vincule o
cidadão abordado a algum fato considerado crime, este deve ser liberado imediatamente, desde que não haja
outra providência a ser adotada (orientação geral, notificação de trânsito, etc.).
De outro lado, caso criança ou adolescente não estejam acompanhadas de seus pais, normalmente
após às 22h00 (depende da decisão judicial da vara da infância ou legislação local), devem ser
encaminhadas para as respectivas residências e apresentadas aos pais ou responsáveis e, na ausência
destes, ao Conselho Tutelar.

2.2.2 Súmula vinculante e atuação policial


Outras questões comentadas no meio policial, são as que se referem ao emprego de algemas e acesso
aos autos do inquérito policial por advogado. As questões chegaram a um nível de discussão, ao ponto de serem
sumuladas pela Corte Máxima Brasileira, o Supremo Tribunal Federal. E aí fica a indagação:
Por que tenho que cumprir a súmula do STF sobre uso das algemas ou a que se refere ao acesso aos
autos de um procedimento apuratório por advogado?
Para responder a esta pergunta, basta promover a leitura do art. 103-A da CF/88:

Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação,


mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre
matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa
oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à
administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal,
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bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em
lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Vide Lei nº 11.417, de
2006).
§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas
determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou
entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e
relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004)
§ 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou
cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a
ação direta de inconstitucionalidade. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de
2004)
§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou
que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que,
julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial
reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da
súmula, conforme o caso. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Com especial atenção ao exercício dos procedimentos de abordagem policial, em 13 de agosto de 2008
o STF aprovou no Plenário o enunciado de Súmula Vinculante nº 11, que discorre sobre o uso de algemas:

Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou


de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros,
justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar,
civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato
processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

Outra questão que merece ser estudada é aquela que trata do acesso aos autos do inquérito policial,
conforme previsto na Súmula Vinculante nº 14, que diz respeito às ações de repressão imediata e mediata
no âmbito da polícia judiciária:

É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos


de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão
com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de
defesa.

Como se vê, cumpre destacar que esse direito é dirigido apenas ao defensor, advogado inscrito na
Ordem dos Advogados do Brasil, devidamente constituído pelo representado.

2.2.4 Relatividade dos direitos e garantias fundamentais


Lembra-se do que está previsto no caput do art. 144 da Constituição de 1988?

15
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos,
é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio, através dos seguintes órgãos:
Até aqui já está mais do que claro o porquê a segurança pública ser dever do Estado. Mas, e a frase...
“Responsabilidade de todos”? O que isso significa dizer?

Em algum momento de seus ensinamentos durante um curso de formação, de aperfeiçoamento,


especialização ou em qualquer outro, você já deve ter ouvido falar do chamado contrato social. Trata-se de
uma teoria construída por diversos pensadores (Thomas Hobbes, John Locke, Jacques Rousseau) a qual explica
os caminhos pelos quais os membros de uma sociedade se unem para formar um Estado, a fim de atingir um
bem comum.
Dentro dessa concepção são estabelecidas uma ordem, um conjunto de regras, um regime político
(no Brasil, a democracia), um governante, a concessão e o reconhecimento da autoridade do Estado, de seus
Poderes e de seus órgãos.
Naturalmente, como em todo e qualquer contrato, em que se fixam cláusulas para se alcançar uma
finalidade, as partes estabelecem direitos, deveres, encargos, obrigações, responsabilidades. Não é diferente no
contrato social, firmado, geralmente através de uma constituição escrita e da legislação regulamentar. Assim,
para se fazer parte desse contrato social, com benefícios que lhes são assegurados, cada indivíduo deve abrir
mão de certas liberdades para que o Estado ou autoridade delegada tenha condições de estabelecer a ordem
social.

Importante!
O importante é que você compreenda a relatividade dos direitos e garantias fundamentais, como parte
dos deveres, encargos, obrigações e responsabilidades de cada indivíduo que compõe a sociedade,
reconhecendo e se submetendo à autoridade estatal, para que seja alcançado o bem comum.

Assim, você deve saber que os direitos e garantias fundamentais não tem feição absoluta, nem são
considerados intangíveis ou intocáveis a todo o momento.
Isso porque, pelo Brasil ser um Estado de Direito, todos os membros da sociedade se submetem à lei,
não podendo, dessa feita, se valer de direitos e garantias fundamentais para a prática de ilícitos, bem como se
esquivar de uma eventual responsabilidade pecuniária, civil ou penal. Do contrário, os princípios estatuídos nas
normas constitucionais estariam relevados à extinção material, uma verdadeira ruína, de anos de evolução da
história humana.

Refletindo...
Pense na hipótese em que todas as pessoas não abrissem mão de suas liberdades e viessem a praticar
condutas sem limites, como conduzir veículo aonde bem quisesse ou invadir a residência de qualquer pessoa

16
sem o consentimento do morador. Uma reação em cadeia, geraria conflitos sem precedentes, culminando com
a extinção de cada pessoa.

Para o bem da humanidade, você sabe que não é assim que funciona. Até hoje o ser humano existe
porque o direito impõe limites na prática de condutas, nas relações sociais, enfim, no exercício de direitos. A
isso Moraes (2007) chama de princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas, traduzindo, em
suma, a ideia de que os direitos e garantias fundamentais consagrados na Constituição de 1988 não são
ilimitados, encontrando restrições nos demais direitos estatuídos nessa Lei Maior.
Daí porque o Estado assume a posição de regulador de condutas em sociedade, notadamente no
campo da segurança pública. Ética, valores morais, bom senso, direitos e deveres previstos na Constituição e
nas leis.

Importante!
Aqui importa destacar o dito popular: “o seu direito acaba onde começa o dos outros”. Vida, liberdade,
integridade física, patrimônio, honra, etc. Em outras palavras, cada pessoa ao ser detentora de direitos,
deve ter a consciência de que os exercerá observando a ética, valores morais, o bom senso, em especial,
os direitos dos outros. Em Direito Constitucional chama-se a isso de eficácia horizontal dos direitos
fundamentais.

2.2.3 Dignidade da pessoa humana


Diversas vezes você ouviu falar sobre a dignidade da pessoa humana. E lógico, já deve ter se
perguntado:
O que seria isso?
Não é a preocupação aqui estabelecer a exata definição dessa expressão, “dignidade da pessoa
humana”, devido a imprecisão que os estudiosos apontam, já que existem diversas discussões sobre o tema,
com diferentes opiniões e teorias. Mas, não se pode fugir da necessidade de se ter uma noção geral e comum
a seu respeito.
Trata-se de um princípio base do sistema jurídico pátrio, previsto no Pacto de São José da Costa Rica
(Convenção Americana de Direitos Humanos) e consagrado pela Constituição de 1988, no qual o Estado, Poderes
e órgãos devem plena observância. Em suma, sua ideia central consiste na possibilidade de se assegurar o
mínimo existencial à pessoa humana, sob o aspecto moral e material.
Mas, você deve estar se perguntando: então, quando se considera que o princípio da dignidade da
pessoa humana é respeitado?
Uma resposta aceitável é aquela em que a atuação estatal defere respeito aos valores morais e éticos,
à liberdade, intimidade, proporcionando ainda a garantia de assistência material mínima (moradia,
alimentação, educação, saúde, segurança, lazer, etc.) e essencial à satisfação das necessidades básicas de
cada pessoa. Em suma, essa é a ideia por trás dos direitos e garantias fundamentais contidos na Constituição
Federal de 1988.

17
A nós, profissionais de segurança pública, cabe exatamente a parcela que diz que respeito à segurança
e, nisto, temos fundamento para nossa existência.

2.2.4 Conflito entre o cumprimento do dever e o respeito aos direitos fundamentais – princípio
da proporcionalidade (ponderação de valores)
Um debate que se levanta normalmente é o que diz respeito ao conflito durante o exercício da atividade
de controle social pela polícia e a observância dos direitos em um regime de domínio político do povo -
democracia (SKOLNICK,1994, p. 6). Ao pesquisar sobre o tema, Costa (2004, p. 37) lembra que Skolnick chamou
a isso de dilema entre a lei e a ordem.
Em outras palavras, trata-se de verdadeira “tensão entre emprego da força e respeito aos direitos
individuais e coletivos” (LEMGRUBER; MUSUMECI; CANO, 2003, p. 23). Ou seja, um conflito entre o dever que as
polícias têm de manter estáveis as relações e o comportamento dos indivíduos em sociedade, empregando o
seu poder coercitivo, e a observância ao conjunto de leis e códigos de conduta da instituição policial.
É nesse momento que entra a discussão sobre a atuação discricionária (juízo de oportunidade e
conveniência), no cumprimento do dever de preservar a ordem, proteger pessoas e bens, em especial
durante abordagem policial, com eventual uso da força. A questão é crucial.

Refletindo...
Pense na hipótese em que duas posições defendidas pelos direitos fundamentais entram em choque.
De um lado o direito de ir e vir e de outro a incolumidade pública. Nesse sentido, o Professor Paulo Gonet (2008)
indaga:
Pode uma prostituta invocar o direito de ir e vir para justificar pedido de salvo conduto que lhe assegure
fazer o trottoir* ?
*o caminhar que as prostitutas fazem quando ficam a espera do cliente

Tendo por base essa questão, o profissional de segurança pública, diante de eventual conflito de
direitos fundamentais, deve promover um juízo de valor, principalmente frente a uma fundada suspeita,
ou seja, uma ponderação de valores que se assenta sobre o princípio da proporcionalidade, que abrange três
critérios:
- A adequação exige que as medidas interventivas, adotadas pelo policial, sejam aptas a atingir os
objetivos pretendidos.
- A necessidade, também conhecida por exigibilidade, diz respeito à escolha, dentre os vários meios
existentes, do menos gravoso para o indivíduo sujeito à atuação estatal.
- A proporcionalidade em sentido estrito constitui um juízo definitivo da medida sobre o resultado
a ser alcançado, ponderando-se a intervenção e os objetivos perseguidos, sobre o fundamento do equilíbrio
entre um e outro. Essa análise deve ser formulada no caso concreto. É preciso verificar os fatos, suas variáveis.

Para facilitar a compreensão do que você está estudando, faça o exercício a seguir:

18
Imagine uma situação em que um indivíduo subtrai a bolsa de uma mulher. A polícia é acionada e ao
chegar no local recebe informações de que o indivíduo poderia estar em um shopping center.
O que você faria? Fecharia todo o shopping e abordaria todas as pessoas?
Volte e reflita sobre os parâmetros da proporcionalidade. Agora busque aplicá-los a este caso.
Lembra-se daquela ocorrência acima irradiada pela Central de Operações e o veículo avistado pela
guarnição? Considerando o que foi apresentado até aqui, você já tem ideia de como responder aos
questionamentos? E aí, há fundamento para a abordagem?

Não restam dúvidas quanto ao dever de agir, a fim de cumprir o papel constitucional de dar segurança
à população. Dentro desse contexto, ao avaliar, os acontecimentos que exijam uma intervenção policial, com
todo seu rigor técnico, o desenvolvimento das ações, mesmo que alimentado pela discricionariedade, deve ser
feita uma ponderação, isto é, responder aos quesitos da necessidade, adequação e proporcionalidade. Agindo
assim, a legitimidade das atividades será alcançada, assegurando a todos os cidadãos um agir eficiente do
aparato da segurança pública, mostrando-se compatível com a dignidade da pessoa humana, com o devido
respeito aos direitos e garantias fundamentais.
Sobre a regulação da discricionariedade no âmbito dos órgãos de segurança pública, através da
ponderação, é importante destacar o que estabelece a lei que fala sobre o emprego dos instrumentos de menor
potencial ofensivo que no art. 2º estabelece (Lei nº 13.060, de 22 de dezembro de 2013):

Art. 2o Os órgãos de segurança pública deverão priorizar a utilização dos


instrumentos de menor potencial ofensivo, desde que o seu uso não coloque em
risco a integridade física ou psíquica dos policiais, e deverão obedecer aos seguintes
princípios:
I - legalidade;
II - necessidade;
III - razoabilidade e proporcionalidade.
Parágrafo único. Não é legítimo o uso de arma de fogo:
I - contra pessoa em fuga que esteja desarmada ou que não represente risco
imediato de morte ou de lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros; e
II - contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, exceto quando
o ato represente risco de morte ou lesão aos agentes de segurança pública ou a
terceiros.

2.2.5 Responsabilidade do Estado decorrente da atuação policial


O profissional de segurança pública, para agir, tem que observar todas as regras já mencionadas e ainda
assim estará sujeito a um controle do Estado.
Por que isto ocorre? Por que o ministério público e as Corregedorias atuam? O que acontece se eu,
profissional de segurança pública, ou um familiar meu for vítima de excessos de um agente do Estado, que não
entendeu ou simplesmente violou os limites de sua ação?
Em um regime democrático, o controle sobre as atividades das polícias é consentâneo com suas
diretrizes, na busca de atingir um equilíbrio entre o emprego da força e o respeito aos direitos individuais e
19
coletivos. Então, põem-se em evidência os instrumentos de controle da atividade policial, como forma de
participação da sociedade civil nas decisões sobre a maneira de atuação dos órgãos de segurança pública, de
acordo com suas necessidades e anseios.
Tais instrumentos são voltados para vigilância, orientação e correção da atuação dos policiais, visando
confirmá-la ou desfazê-la, conforme seja ou não legal, conveniente, oportuna e eficiente, seja nas ouvidorias
dos Estados, seja no âmbito do Ministério Público, Poder Judiciário, ou órgãos de defesa dos direitos humanos,
organismos não governamentais ou nas casas legislativas (LEMGRUBER; MUSUMECI; CANO, 2003, p. 121).
Dentro desse contexto surge a responsabilização, ao lado da transparência e do controle como
mecanismos de accountability (COSTA, 2004, p. 63) da atividade policial, destinados a prevenir ou superar a
eventuais desvios praticados por seus agentes durante a atuação.
Com efeito, na atuação estatal eventualmente, o agente público pode exceder nos limites de
suas atribuições, causando danos às pessoas ou à sociedade em geral. Nesse sentido, quando não são
observados os direitos e garantias fundamentais, quando o juízo de ponderação de valores (adequação,
necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) não se cumpre, gerando danos morais e/ou materiais às
pessoas, o Estado, por seus agentes, pratica ato ilícito (CF/88, art. 37, § 6º; Código Civil, arts. 43, 186, 187 e 927).

2.2.6 Responsabilidade do agente público na prática de atos ilícitos


Das ideias discorridas anteriormente, uma indagação surge:
Não seria injusto para a sociedade suportar os prejuízos de uma responsabilidade civil, quando foi o
agente público quem deu causa de forma intencional ou sem a observância dos cuidados mínimos exigidos?
Sim, seria. Por isso o art. 37, § 6º, da CF/88, garante o direito de regresso sobre o servidor público, ou
seja, se ele praticou ato ilícito de forma dolosa ou culposa, resultando na responsabilidade civil do Poder Público,
e esse venha a arcar com os prejuízos, o Estado poderá buscar as medidas cabíveis para repassar esse encargo
àquele que deu causa, assegurando, assim, a justiça.
Cabe salientar que o direito de regresso não comporta prazo prescricional (perda da possibilidade de
se cobrar o prejuízo em face do decurso do tempo), conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça –
STJ no Resp. nº 328.391 – DF, julgado em 08.10.2002 e publicado no DJ de 02/12/2002.
Por fim, é possível ainda que o servidor público, além de responder diante de uma ação regressiva, de
natureza cível, venha a ser submetido a um processo por ato de improbidade, processo administrativo
disciplinar ou criminal, por ter excedido em suas atribuições, sem que isso importe em dupla punição (bis in
idem), a qual somente ocorre na mesma esfera, conforme você estudará no Módulo 3.

Aula 3 – Reflexos das normas internacionais na atividade policial

Dentro da concepção que você estudou até aqui, cabe dizer que o Estado brasileiro é regido nas suas
relações internacionais, dentre outros:
• Pelos princípios da prevalência dos Direitos humanos;

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• defesa da paz;
• solução pacífica dos conflitos;
• repúdio ao terrorismo e ao racismo;
• cooperação entre os povos para o progresso da humanidade.

Assim, os direitos e garantias fundamentais expressos na Constituição não excluem outros decorrentes
do regime e dos princípios por ela adotados, ou contidos em tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte (CF/88, art. 5º, § 2º). Sendo possível, ainda, os tratados e convenções internacionais
sobre direitos humanos, aprovados no Congresso Nacional, assumirem o status de emendas
constitucionais, i.e., acima das demais leis, desde que observe os requisitos fixados no §3º, art. 5º, da CF/88.

Pesquise para prosseguir...


Você sabe o que são: Tratados internacionais? Convenções? Atos internacionais em geral?
Antes de prosseguir, visite a página do Ministérios das Relações Exteriores e busque as respostas
paras essas perguntas.

Feita a pesquisa recomendada, você deve ter chegado à conclusão de que tais tratados, convenções,
dentre outros atos internacionais, devidamente aprovados passam a integrar o conjunto de normas do Brasil,
devendo, portanto, serem observados por todos, inclusive pelos profissionais de segurança pública durante o
exercício de suas atribuições.
Veja, a seguir, alguns desses principais documentos.

 Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) - Pacto de São José da Costa Rica
A Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) é fruto de um acordo internacional firmado em
22 de novembro de 1969 durante a Conferência Especializada Interamericana de Direitos Humanos, entre os
países que compõem a Organização dos Estados Americanos (OEA), da qual o Brasil faz parte. Esse acordo foi
subscrito na cidade de San José da Costa Rica, razão pela qual também é conhecido por Pacto de São José da
Costa Rica.
Como fundamento do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, a CADH entrou em
vigor em 18 de julho de 1978. Entretanto, somente em 09 de novembro de 1992 passou a integrar a ordem
jurídica brasileira, através do Decreto n° 678, após ter sido aprovada pelo Senado Federal em 26 de maio de
1992, através do Decreto-Legislativo n° 27. Com efeito, o Pacto de São José da Costa Rica vincula as ações dos
órgãos policiais no Brasil.
Ao realizar a leitura de seus 81 artigos, você pode verificar que o Pacto de São José da Costa Rica
contém cláusulas que reconhecem direitos fundamentais da pessoa humana, tais como o direito à vida, à
liberdade, à dignidade, à integridade pessoal e moral, à educação, dentre outros de mesma natureza. Destacam-
se as garantias judiciais, reconhecimento da liberdade de pensamento e expressão, proibição da servidão
humana, reconhecimento da liberdade de consciência e religião, bem como da liberdade de associação e de
proteção à família.

21
Cabe salientar que, dentro do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, diante de
eventual omissão ou abusos violadores aos Direitos Humanos, o Pacto de São José prevê que os Estados Partes
podem ser julgados e condenados perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos. O Brasil foi condenado
nos seguintes casos:
 Ximenes Lopes vs. Brasil, de 4 de julho de 2006;
 Escher e outros vs. Brasil, de 6 de julho de 2009;
 Garibaldi vs. Brasil, de 23 de setembro de 2009; e,
 Gomes Lund e outros vs. Brasil, de 24 de novembro de 2010.
Diante disso, é importante deixar claro que toda e qualquer ação praticada por um profissional de
segurança pública, violadora dos direitos humanos, pode resultar na Condenação do Brasil, como ocorreu nos
casos acima elencados.

 Documentos internacionais produzidos no âmbito da ONU sobre a atuação policial


No Estado democrático vivenciado no Brasil, atualmente é possível perceber que o povo exige muito
mais do Estado do que uma simples prestação de serviços, em especial no âmbito da segurança pública. Em
outras palavras, cada pessoa espera que o Poder Público satisfaça suas necessidades de acordo com suas
expectativas e o faça de maneira correta, sem causar danos nem transtornos desnecessários.
Essa questão ultrapassou as fronteiras dos países, tendo sido objeto de atenção no âmbito
internacional. Nesse sentido, destaca-se o reconhecimento das Organizações das Nações Unidas (ONU) sobre a
natureza do trabalho policial na sociedade, no sentido de ser difícil e delicado, já que interferem em assuntos
de alta sensibilidade durante o controle social, tais como a vida, liberdade, integridade física, patrimônio. E por
isso expressam a preocupação com as condições de trabalho do policial e, por consequência, com a repercussão
sobre o uso da força.
Com efeito, a ONU considera necessária a adoção de uma série de medidas por parte dos países para
disponibilizar aos agentes aplicadores da lei instrumentos adequados no exercício de suas funções, incluindo
mecanismos que controlem o emprego desnecessário e excessivo da força na solução de conflitos sociais.
Dentro desse contexto, veja, a seguir, alguns Documentos internacionais produzidos pela ONU sobre a
atuação policial. Vale ressaltar que eles não têm natureza de tratado, convenção ou pacto. Na verdade,
constituem atos que elencam recomendações sobre a atuação no campo da segurança, que podem ser adotados
pelos países.
- Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo
Em 07 de setembro de 1990, durante o 8° Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime
e o Tratamento de Infratores, foram elaborados Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo.
Vale ressaltar que ele inspirou a edição da Portaria interministerial n° 4.226, de 31 de dezembro de
2010, ao dispor sobre o uso diferenciado da força no Brasil.

22
Saiba mais...
A SENASP, através da Rede Nacional de Ensino a Distância (EaD), dispõe em sua plataforma de um
curso que trata especificamente sobre a questão do uso da força. Vale a pena, matricule-se no próximo ciclo e
confira. Você voltará a estudar sobre este tema no Módulo 2.

 Código de conduta para os agentes responsáveis pela aplicação da lei


Quem de nós chegou a um hospital ou posto de saúde e deixou de receber o tratamento que esperava
do profissional que nos atendeu?
O profissional aferiu nossa pressão, ministrou os remédios necessários, mas sempre com nítida má
vontade e grosseria em suas ações e lida com o paciente. O serviço foi prestado, mas não ficamos satisfeitos
pela forma com que fomos tratados.
Assim, é possível concluir, que a forma como os servidores desenvolvem suas funções é tão importante
quanto o trabalho em si. Nesse sentido, no caso dos profissionais de segurança pública, também é essencial que
a conduta seja adequada e em conformidade com as leis e os atos que disciplinam as suas atividades.
No que diz respeito às atividades dos órgãos policiais, essa questão merece especial distinção, pois,
conforme já estudado nesse curso, seus profissionais possuem um alto grau de discricionariedade no exercício
de suas tarefas (diferente do exemplo da saúde acima mencionado), com destaque para a privação da liberdade
de um indivíduo, através de uma busca pessoal, podendo ensejar o uso da força.
Nesse cenário, a Assembleia Geral das Nações Unidas editou um instrumento, através da Resolução n°
34/169, de 17 de dezembro de 1979, denominado Código de conduta para os agentes responsáveis pela
aplicação da Lei. Por meio desta resolução, o Código de Conduta foi transmitido aos governos com a
recomendação de que uma consideração favorável fosse dada no que se refere à sua utilização dentro da
estrutura da legislação ou prática nacional como um conjunto de princípios a serem observados pelos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei. Não é um tratado, mas pertence à categoria dos instrumentos
que proporcionam normas orientadoras aos governos sobre questões relacionadas com direitos humanos e
justiça criminal. Vale a pena conferir seus artigos:

Artigo 1.º Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem cumprir, a todo
o momento, o dever que a lei lhes impõe, servindo a comunidade e protegendo
todas as pessoas contra atos ilegais, em conformidade com o elevado grau de
responsabilidade que a sua profissão requer.
Artigo 2.º No cumprimento do seu dever, os funcionários responsáveis pela
aplicação da lei devem respeitar e proteger a dignidade humana, manter e apoiar os
direitos fundamentais de todas as pessoas.
Artigo 3.º Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei só podem empregar a
força quando tal se afigure estritamente necessário e na medida exigida para o
cumprimento do seu dever.

23
Artigo 4.º As informações de natureza confidencial em poder dos funcionários
responsáveis pela aplicação da lei devem ser mantidas em segredo, a não ser que o
cumprimento do dever ou as necessidades da justiça estritamente exijam outro
comportamento.
Artigo 5.º Nenhum funcionário responsável pela aplicação da lei pode infligir,
instigar ou tolerar qualquer ato de tortura ou qualquer outra pena ou tratamento
cruel, desumano ou degradante, nem invocar ordens superiores ou circunstanciais
excepcionais, tais como o estado de guerra ou uma ameaça à segurança nacional,
instabilidade política interna ou qualquer outra emergência pública como
justificação para torturas ou outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou
degradantes.
Artigo 6.º Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem assegurar a
proteção da saúde das pessoas à sua guarda e, em especial, devem tomar medidas
imediatas para assegurar a prestação de cuidados médicos sempre que tal seja
necessário.
Artigo 7.º Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei não devem cometer
qualquer ato de corrupção. Devem, igualmente, opor-se rigorosamente e combater
todos os atos desta índole.
Artigo 8.º Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem respeitar a lei
e o presente Código. Devem, também, na medida das suas possibilidades, evitar e
opor-se vigorosamente a quaisquer violações da lei ou do Código.
Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei que tiverem motivos para
acreditar que se produziu ou irá produzir uma violação deste Código, devem
comunicar o facto aos seus superiores e, se necessário, a outras autoridades com
poderes de controle ou de reparação competentes.

 Regras Mínimas para o Tratamento de Presos

As Regras Mínimas para o Tratamento de Presos (RMTP) foram adotadas pelo Primeiro Congresso das
Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Genebra em 1955,
e aprovadas pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas através das suas resoluções 663 C (XXIV), de
31 de Julho de 1957 e 2076 (LXII), de 13 de Maio de 1977, Resolução 663 C (XXIV) do Conselho Econômico e
Social.
Trata-se de ato internacional que discorre sobre os vários instrumentos relativos à detenção de pessoas,
delimitando a atuação dos agentes responsáveis pela segurança, a fim de garantir a tutela dos direitos humanos,
sem descuidar do papel de promover a ordem.

Finalizando...

Neste módulo, você estudou que:


24
 A segurança pública é causa da ordem pública, que se traduz em um estado antidelitual, livre,
portanto, da violação dos bens e valores mais importantes para a coletividade (vida, integridade física, liberdade,
patrimônio, etc.) e, por isso, tutelados pelas leis, que regulam o comportamento de todos.
 As ações desenvolvidas pelos órgãos policiais buscam promover o controle social no sentido de
evitar (prevenir) a perturbação da ordem pública, a mácula da paz social, a violação dos bens jurídicos tutelados
(vida, integridade física, patrimônio, etc.).
 Quando essa prevenção não funciona, surgem os procedimentos de resgate da ordem pública e
da paz social, mediante ações de repressão imediata. A repressão mediata consolida os atos complementares
da colheita de informações.
 As ações preventivas e de repressão imediata são desempenhadas através de procedimentos de
distribuição de efetivo em locais em que, após o devido planejamento, guardem algum potencial para a
ocorrência de fatos que venham a abalar a paz social, a ordem pública (LAZZARINI, 1998).
 Quando alguma ação policial é considerada ilegítima, fora dos parâmetros do uso legítimo da
força, tem-se como incompatível com o estado democrático de direito. É importante que você, profissional de
segurança pública, conheça as regras que envolvem suas ações para que ninguém, além da lei, diga o que você
deve e o que não deve fazer. A lei é quem traça suas ações.
 Os órgãos públicos que constituem a administração pública (dentre eles, os da segurança pública)
estão vinculados às normas de direitos e garantias fundamentais, pelo que seus agentes devem agir, interpretar
e aplicar as leis segundo ao que se dita.
 O profissional de segurança pública, para agir, tem que observar todas as regras já mencionadas
e ainda assim estará sujeito a um controle do Estado.
 o Estado brasileiro é regido nas suas relações internacionais pelos princípios da prevalência dos
direitos humanos, defesa da paz, solução pacífica dos conflitos, repúdio ao terrorismo e ao racismo, cooperação
entre os povos para o progresso da humanidade, dentre outros.
 Os tratados, convenções, dentre outros atos internacionais, devidamente aprovados passam a
integrar o conjunto de normas do Brasil, devendo, portanto, serem observados por todos, inclusive pelos
profissionais de segurança pública durante o exercício de suas atribuições.

Exercícios

1. De que modo os direitos e garantias fundamentais podem exercer influência em uma atuação
policial?

2. Todos os órgãos policiais, observadas as atribuições típicas elencadas no art. 144 da


Constituição Federal, realizam atividades de repressão imediata. De acordo com o previsto na CF marque
com um “X” no quadro abaixo, indicando se estes órgãos exercem ações de prevenção e/ou de repressão
imediata/mediata. No campo em que o órgão não atua, preencha o espaço com um traço ( - ):
25
Órgãos de segurança pública Prevenção Repressão Imediata Repressão Mediata

Polícia Federal

Polícia Ferroviária Federal

Polícia Civil

Polícia Militar

3. Tendo em vista a edição de súmulas vinculantes pelo Supremo Tribunal Federal,


considerando as ações de segurança pública, assinale a alternativa INCORRETA:

a. Não existe nenhuma súmula editada pelo STF sobre ações de segurança pública, na medida em
que os direitos e garantias fundamentais podem ser objeto de supressão em procedimentos policiais, a fim de
garantir a preservação da ordem social.
b. De acordo com o Supremo Tribunal Federal, o uso de algemas somente é lícito em casos de
resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso
ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal
do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da
responsabilidade civil do Estado.
c. É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova
que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia
judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.
d. A súmula editada pelo STF com efeito vinculante obriga aos demais órgãos do poder judiciário e
à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, a sua observância, sob pena
de anulação do ato administrativo ou a cassação da decisão judicial.

4. Lei atentamente a notícia veiculada na mídia:

Flagrante de roubo e cárcere privado: crime contra o patrimônio

A Polícia frustrou um sequestro relâmpago e realizou flagrante de roubo no Setor Central. O fato
ocorreu ao meio dia de quarta-feira, próximo a uma Igreja. O Comandante da guarnição, responsável pela
atuação da Corporação, foi informado por populares que dois adultos subtraíram bens de uma senhora,
empregando de violência. Após empreender patrulhamento nas imediações no local de fuga, a polícia percebeu
que os agentes privaram esta pessoa de sua liberdade, mediante sequestro e cárcere privado. Os policiais

26
conseguiram fazer a interceptação dos autores da infração penal com a cessação do cárcere privado. O flagrante
foi registrado na delegacia de polícia.

a. Levando em consideração o fato que você leu e o que estudou sobre e Direitos Humanos, Direitos e
Garantias Fundamentais, marque “V” para as alternativas “VERDADEIRAS” e “F” para as alternativas “FALSAS”:
[ ] A atuação da guarnição recaiu sobre um dos direitos humanos, relativo à liberdade, direitos que
protegem o indivíduo em face das arbitrariedades do poder público.
[ ] A privação da liberdade deve observância ao devido processo legal. Nesse sentido, o fato deve ser
processado pela autoridade competente, assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos
a ela inerentes. A pena será cumprida em estabelecimento distinto, de acordo com a natureza do delito, a idade
e o sexo do apenado. Caso os agentes forem do sexo feminino, às presidiárias serão asseguradas condições
para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação.
[ ] Para assegurar a devida responsabilização e o resgate da ordem pública, a família do preso não
será informada sobre a prisão dos agentes nem do local onde eles se encontram, sob pena de prejudicar a
instrução do processo.
[ ] Os presos tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão, sendo-lhes asseguradas a
assistência da família e de advogado.

b. Ainda considerando o fato lido, marque a alternativa correta:

a. No caso em apreço, considerando que houve o ingresso dos acusados com a vítima no interior
do domicílio de um deles, durante o período noturno, a prisão efetivada pelos policiais militares somente será
considerada legítima se houver ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente para que
efetuam a prisão flagrante no interior da citada residência.
b. A ação regressiva de que trata o art. 37, § 6º, da CF/88, prescreve em 10 (dez) anos, a contar do
ato praticado pelo policial ou da decisão judicial que condena o Estado a ressarcir o cidadão, nos casos de
indenização por violência policial.
c. O Pacto de São José da Costa Rica não tem efeito nenhum sobre as ações de segurança pública.
d. A Lei nº 13.060, de 22/12/2014, que “disciplina o uso dos instrumentos de menor potencial
ofensivo pelos agentes de segurança pública, em todo o território nacional”, traz expressamente em seu corpo
a previsão de observância ao princípio da proporcionalidade, durante as ações de segurança pública.

27
Gabarito

1. Orientação de resposta: O Estado, através de seus órgãos, recebe poderes como verdadeiros
instrumentos para atingir suas finalidades, como o uso da força, para estabelecer o controle social. Tais poderes
delegados pelo povo não são absolutos, encontrando limitações nos direitos e garantias fundamentais. Então,
toda vez que você, profissional de segurança pública, agente aplicador da lei, for realizar algum procedimento,
precisará observar que seu comportamento se vincula ao atendimento desses limites.

2. Resposta Correta:

Órgãos de segurança pública Prevenção Repressão Imediata Repressão Mediata

Polícia Federal X X X

Polícia Rodoviária Federal X X -

Polícia Ferroviária Federal X X -

Polícia Civil - X x

Polícia Militar X X -

3. Resposta Correta: Letra A


4. Resposta Correta: a. V-V-F-V
b. Letra D

28
MÓDULO
ATUAÇÃO POLICIAL: DA PREVENÇÃO ÀS AÇÕES

2
DE RESGATE DA PAZ SOCIAL E INSTRUÇÃO
CRIMINAL

Apresentação do módulo

Ao se falar em abordagem, normalmente, se pensa na intervenção policial com o fim de se promover


uma busca em uma pessoa suspeita de praticar uma infração penal.
O que ampara a realização de uma busca pessoal durante um evento esportivo, intensificação de
policiamento ou uma manifestação, sendo que não há notícia de crime ocorrendo?
Neste módulo você terá a oportunidade de estudar os principais instrumentos previstos na legislação
infraconstitucional brasileira que fundamentam o procedimento da atuação policial, englobando a busca
pessoal, veicular e domiciliar.
Ao aproveitar os ensinamentos do Módulo I, que cuidou dos aspectos constitucionais e dos atos
internacionais aplicados à atuação policial, a intenção agora é agregar e fazer uma ligação com os princípios e
regras de direito administrativo, de direito processual penal e legislação correlata que disciplinam as atividades
acima mencionadas, seja para preservar a ordem pública, seja para proporcionar às pessoas um ambiente social
livre de riscos e perigos ou ainda subsidiar uma instrução criminal, com o objetivo de resgatar a paz social.

Objetivo do módulo

Ao final do módulo, você será capaz de:

• Identificar as principais normas administrativas, processuais e demais atos legais que tratam das
ações de preservação da ordem pública, incolumidade das pessoas e do patrimônio;
• Compreender o sentido e o alcance do ato administrativo e de seus elementos nas ações de
segurança pública;
• Compreender o sentido e o alcance do dever-poder de polícia e de seus atributos nas ações de
segurança pública;
• Apontar os fundamentos para a realização da atuação policial como fator de prevenção,
justificando a busca pessoal e veicular, independente da existência de uma infração penal em concreto;
• Aplicar os fundamentos objetivos da fundada suspeita, que justifiquem a realização de uma busca
pessoal;
• Identificar os elementos da busca veicular e domiciliar para fins de prevenção e repressão;
• Reconhecer quando há necessidade em abordar;

29
• Saber explicar o porquê da abordagem.

Estrutura do Módulo

Este módulo abrange as seguintes aulas:

• Aula 1 – Breves apontamentos sobre o regime de Direito Administrativo no âmbito da segurança


pública;
• Aula 2 – O exercício do dever-poder de polícia na segurança pública;
• Aula 3 – Atuação policial como estratégia de prevenção à violência urbana, resgate da paz social
e instrumento para instrução criminal.

Aula 1 – Breves apontamentos sobre o regime de Direito


Administrativo no âmbito da segurança pública

Para iniciar seus estudos, neste módulo é oportuno retomar algumas perguntas formuladas no início
desse curso:
Está errado o policial interferir no trânsito? Ou deveria somente agir para prender bandido? O policial
pode abordar qualquer pessoa e quando quiser? Quem define quando o policial deve abordar? Segurança
pública é coisa de polícia e não caberia ao cidadão dar a sua opinião?

Bem, como outra questão:


Você sabe de onde surgiu a ideia de que a palavra do policial de trânsito “vale mais do que a do
autuado”?
Além das perguntas, também é interessante que você resgate as noções básicas estudadas do Módulo
1 a respeito da finalidade do estado brasileiro, em especial quanto ao papel da segurança pública dentro daquela
ideia de contrato social, firmado dentro da sociedade brasileira, a fim de criar a República Federativa do Brasil.
Para que isso ocorra, o poder público se submete a um conjunto de princípios e regras, que são
alicerçados em dois pilares: prerrogativas e sujeições (DI PIETRO, 2011, p. 61). Isso porque, para cuidar do
interesse público, o Poder Público não pode se valer das regras de direito privado, com primazia na igualdade
de condições entre os indivíduos.
Conheça, a seguir, um pouco mais a respeito desses pilares:

O que fundamenta as prerrogativas é o fato de que a supremacia do interesse público deve prevalecer
sobre os interesses do particular. Isso pode acontecer através da autoexecutoriedade, autotutela, poder de

30
expropriação, requisição de bens, ocupação temporária de bens, aplicação de sanções administrativas e, em
especial, imposição de medidas policial.
As sujeições constituem limites, como o de praticar atos desde que estejam previstos em lei
(legalidade), já que, em um estado democrático de direito a vontade do povo é expressa nesse instrumento,
respeitando ainda a dignidade da pessoa humana, bem como os direitos e garantias fundamentais, a fim de
evitar abusos ou arbitrariedades. Daí a ideia de interesse público. Nesse sentido, para que se verifique o
cumprimento dessa vontade, o ato deve ser transparente, deve ser submetido a uma prestação de contas e a
um controle, podendo ser revisto ou anulado, se não atingir o interesse público.
Ou seja...
A atuação policial tem que estar de acordo com essas regras para que seus agentes não cometam
abusos ou arbitrariedades e com isso a situação seja revertida contra eles, apontando responsabilidades destes
atos arbitrários. Nesse sentido, caso isso ocorra, o policial poderá responder criminalmente pela prática de abuso
de autoridade (Lei n° 4.898/1965), além ser submetido a eventual responsabilização na esfera disciplinar. Esse
ponto será tratado no Módulo 3, com maiores detalhes.

1.1 Ato administrativo (comportamento do Poder Público)


Fala-se, assim, no regime jurídico de direito administrativo, do qual se destaca a prática de atos
administrativos, para o exercício da função administrativa, tendente a atingir o interesse público. Considerando
que todo profissional da área de segurança pública corresponde a um agente público e pratica atos
administrativos, sendo responsável pelas suas consequências, nada mais adequado do que estudá-lo, entender
sua importância e significado. Isso porque, dessa forma, você compreenderá que seu comportamento
profissional tem respaldo na ordem jurídica.

E por falar nisso, o que você entende por ato administrativo?


Ato administrativo é uma manifestação de vontade (comportamento) proferida pelo Estado e
externado por agente público, ou por quem lhe faça às vezes, a fim de criar, modificar ou extinguir direitos,
perseguindo o interesse público.
Vale dizer, essa manifestação de vontade (comportamento) está sujeita ao regime jurídico público,
não tendo a mesma força da lei, sendo inferior e complementar à previsão legal. Para aferir sua legitimidade,
pode se sujeitar ao controle do poder judiciário, no que diz respeito à legalidade, o qual determina a anulação,
nos casos em que descumprido o interesse público.
Essa manifestação de vontade muitas vezes cumpre uma determinação legal, sendo, portanto,
vinculada. Em outras palavras, abre-se um leque de opções para se realizar a manifestação de vontade,
abarcando a discricionariedade. E dentro desse contexto, surge o exercício do dever-poder de polícia,
conforme você estudará mais a frente.

31
1.2 Elementos ou requisitos do ato administrativo
São elementos ou requisitos do ato administrativo:
Competência (Sujeito): trata-se da capacidade do agente público de praticar o ato, conforme definido
em legislação. Não havendo lei conferindo essa capacidade, o ato praticado é passível de nulidade. Nesse
sentido, destaca-se a tarefa para realizar busca pessoal durante as ações de segurança pública. Em outras
palavras, a lei confere aos agentes policiais essa atividade, não sendo admissível outro agente do Estado exercê-
la.
Forma: cuida-se da exteriorização da manifestação de vontade ou do comportamento. Em regra, é por
escrito, salvo quando a lei autorizar de outra forma (ex.: gestos do agente de trânsito, gestos do policial durante
uma intervenção).
Motivo: para que o ato seja aperfeiçoado exige-se a exposição/demonstração dos fundamentos de
fato (acontecimentos do dia-a-dia) e de direito (conforme previsto na ordem jurídica). Dentro da ideia de
controle, o cidadão precisa saber das razões em que se basearam o comportamento do agente público, a fim
de aferir o grau de cumprimento do interesse comum, como ocorre nas razões da realização de uma intervenção
policial, seja para abordar ou para prender. Pode ser vinculado (conforme determina a lei) ou discricionário*.
*sobre o tema, vide: “discricionariedade das ações de segurança pública”, neste módulo.
Objeto: trata-se do conteúdo do ato, ou seja, aquilo sobre o que o comportamento dispõe (ex.:
fiscalização, proteção de pessoas e bens).
Finalidade: é o bem jurídico objetivado pelo comportamento do agente público (ex.: proteção de um
bem da vida).

1.3 Atributos ou características do ato administrativo


São atributos ou características do ato administrativo:
Presunção de legitimidade: Considerando que o agente público tem o dever de praticar um ato
conforme determina a lei (ex.: notificação de trânsito, busca pessoal, prisão), paira a presunção de legalidade,
bem como a presunção de veracidade. Essa presunção é relativa porque admite prova em contrário, a ser
demonstrada pelo destinatário do ato (cidadão), seja administrativamente (ex.: recurso contra notificação de
infração de trânsito) ou judicialmente (ação de danos morais e materiais em função de uma abordagem policial
ou prisão).
Autoexecutoriedade: Devido a necessidade de se garantir continuidade à prestação de serviços em
áreas essenciais (segurança, saúde, educação, etc.) de forma célere e imediata, o agente público, para praticar
uma conduta, não tem a necessidade de provocar a manifestação do poder judiciário. Do contrário, pense na
hipótese de se aguardar a posição da justiça para a realização das ações preventivas de segurança pública ou
nos casos de resgate da paz social (ações de repressão – imediata e mediata). Mais a frente neste curso, você
estudará sobre dever-poder de polícia e o tema voltará a ser tratado.
Imperatividade: O atendimento pelo cidadão ou administrado ao ato praticado pelo agente policial é
obrigatório ou coercitivo – sob pena do uso legítimo da força. Em suma, o destinatário deve se submeter a ele,
podendo contestá-lo, de acordo com os recursos previstos em lei (reclamação, requerimento, direito de petição,

32
ação judicial, etc.). Caso contrário, se submeterá à responsabilização penal (ex.: desacato, resistência,
desobediência), como você estudará Módulo 3.
Tipicidade: O comportamento administrativo deve ser descrito na ordem jurídica, isto é, as ações dos
profissionais de segurança são veiculadas na legislação para fins de aplicação (ex.: fiscalização de ordem policial,
busca veicular, busca domiciliar, realização de prisão, etc.).

Saiba Mais...
Os temas acima foram apresentados de forma resumida. Caso tenha alguma dúvida, você pode
aprofundar os conhecimentos com uma doutrina de Direito Administrativo, pois o assunto é vasto e não se
esgota com esta rápida abordagem.

Aula 2 – O exercício do dever-poder de polícia na segurança


pública

Na aula anterior você estudou que o poder público, para cumprir a tarefa de promover o bem
coletivo, pratica atos respaldado em prerrogativas e é submetido a sujeições, como forma de evitar desvios
ao interesse público. Dentro desse contexto, você também teve a oportunidade de estudar
sobre o ato administrativo, com seus elementos e atributos.
Ao dar mais um passo no processo de construção dos fundamentos jurídicos da atuação policial,
nesta aula você estudará o dever-poder de polícia e seus atributos (características).

2.1 O que é dever-poder de polícia


Ao se deparar com o título, é possível que você tenha percebido algo diferente: “dever-poder de
polícia”.
Mas, não seria poder de polícia? De onde surgiu esse dever? E por que ele vem na frente do poder?
A explicação é simples. A doutrina clássica fala em poder de polícia. Dentro da tendência de
especialização e cientifização, de acordo com Celso Antônio Bandeira de Melo (2011), o Estado, antes de tudo,
tem obrigações, encargos e deveres. E para tanto lhes foram disponibilizados poderes (autoridade,
capacidade, domínio, faculdade, força, meios, recursos) como instrumentos para alcançar a finalidade pública.
É dentro dessa linha de raciocínio que se funda o dever-poder de polícia, consistente na imposição de
limitações ao exercício da liberdade e dos elementos da propriedade (usar, gozar, fruir e reaver a posse ou
detenção – Código Civil, art. 1.228) para que os membros da coletividade se mantenham ajustados aos padrões
compatíveis com os objetivos do bem comum. Vale dizer, o Estado cumpre seu papel de defensor e propagador
dos interesses gerais, coibindo os excessos e prevenindo as perturbações ilícitas à ordem jurídico-social
(MEIRELLES, 1997, p. 115).

33
Sobre o tema, Carvalho Filho (2007, p. 37) leciona que:

O poder administrativo representa uma prerrogativa especial de direito público


outorgada aos agentes do Estado. Cada um desses terá a seu encargo a execução
de certas funções. Ora, se tais funções foram por lei cometidas aos agentes, devem
eles exercê-las, pois que seu exercício é voltado para beneficiar a coletividade. Ao
fazê-lo, dentro dos limites a que a lei traçou, pode dizer-se que usaram normalmente
os seus poderes.

Assim, dentro das cláusulas do contrato social, o dever-poder de polícia corresponde à permissão
social dada à administração pública para restringir o exercício de direitos individuais em benefício de
toda a sociedade. Empregado com responsabilidade, trata-se de verdadeiro instrumento posto à disposição do
poder público para disciplinar o exercício desses direitos e liberdades ou ainda de contê-los, diante de eventuais
excessos ou da necessidade de se disciplinar determinadas relações (ex.: interdição de via pública para promoção
das ações de segurança). Lembre-se que normalmente esse dever-poder estabelece condições, ou impõe
restrições e limitações.
Dentro desse contexto, é muito comum os profissionais de segurança, durante a realização de suas
atribuições exercer o dever-poder de polícia para realizar detenções, seja porque ocorreu um flagrante delito,
seja porque a justiça expediu um mandado de prisão decorrente de uma condenação criminal.

Aí você pergunta, onde encontro esse dever-poder? Em qual lei? Em qual norma ou regulamento? Ou
não precisa estar escrito? Estaria implícito?
Vale ressaltar que você está estudando aqui o conceito desse instrumento de maneira ampla. Assim,
para conferir clareza, precisão e ordem lógica, a matéria deve ser tratada de acordo com a atribuição de cada
órgão policial. Com efeito, normalmente esse dever-poder vem descrito no ordenamento jurídico, como nos
Códigos (de Trânsito, Penal, Processo Penal), legislação ambiental, de direito administrativo, ou ainda nas leis
que dispõem sobre a organização de cada instituição.
A título de exemplo, no exercício da atividade de policiamento ostensivo, essa previsão genérica do
dever-poder de polícia é estabelecida no Decreto-Lei nº 667, de 02 de julho de 1969:

Art. 3º - Instituídas para a manutenção da ordem pública e segurança interna nos


Estados, nos Territórios e no Distrito Federal, compete às Polícias Militares, no
âmbito de suas respectivas jurisdições: (Redação dada pelo Del nº 2010, de
12.1.1983)
a) executar com exclusividade, ressalvas as missões peculiares das Forças Armadas,
o policiamento ostensivo, fardado, planejado pela autoridade competente, a fim de
assegurar o cumprimento da lei, a manutenção da ordem pública e o exercício dos
poderes constituídos; (Redação dada pelo Del nº 2010, de 12.1.1983)

34
b) atuar de maneira preventiva, como força de dissuasão, em locais ou áreas
específicas, onde se presuma ser possível a perturbação da ordem; (Redação dada
pelo Del nº 2010, de 12.1.1983)
c) atuar de maneira repressiva, em caso de perturbação da ordem, precedendo o
eventual emprego das Forças Armadas; (Redação dada pelo Del nº 2010, de
12.1.1983)
d) atender à convocação, inclusive mobilização, do Governo Federal em caso de
guerra externa ou para prevenir ou reprimir grave perturbação da ordem ou ameaça
de sua irrupção, subordinando-se à Força Terrestre para emprego em suas
atribuições específicas de polícia militar e como participante da Defesa Interna e da
Defesa Territorial; (Redação dada pelo Del nº 2010, de 12.1.1983)
[...]

No âmbito da polícia judiciária, destaca-se o Decreto Federal nº 73.332, de 19/12/1973, que “define a
estrutura do Departamento de Polícia Federal”:

Art. 1º Ao Departamento de Polícia Federal (DPF), com sede no Distrito Federal,


diretamente subordinado ao Ministério da Justiça e dirigido por um Diretor-Geral,
nomeado em comissão e da livre escolha do Presidente da República, compete, em
todo o território nacional:
I - executar os serviços de polícia marítima, aérea e de fronteiras;
II - exercer a censura de diversões públicas;
III - executar medidas assecuratórias da incolumidade física do Presidente da
República, de diplomatas estrangeiros no território nacional e, quando necessário,
dos demais representantes dos Poderes da República;
IV - prevenir e reprimir:
a) crimes contra a segurança nacional e a ordem política e social;
b) crimes contra a organização do trabalho ou decorrentes de greves;
c) crimes de tráfico e entorpecentes e de drogas afins;
d) crimes nas condições previstas no artigo 5º do Código Penal, quando ocorrer
interesse da União;
e) crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência
militar;
f) crimes contra a vida, o patrimônio e a comunidade silvícola;
g) crimes contra servidores federais no exercício de suas funções;
h) infrações às normas de ingresso ou permanência de estrangeiros no País;
i) outras infrações penais em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou
de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, assim como aquelas cuja
prática tenha repercussão interestadual e exija repressão uniforme, segundo se
dispuser em lei;
V - coordenar, interligar e centralizar os serviços de identificação datiloscópica
criminal;

35
VI - selecionar, formar, treinar, especializar e aperfeiçoar o seu pessoal, mediante
orientação técnica do Órgão Central do Sistema de Pessoal Civil da Administração
Federal;
VII - proceder a aquisição de material de seu exclusivo interesse;
VIII - prestar assistência técnica e científica, de natureza policial, aos Estados, Distrito
Federal e Territórios, quando solicitada;
IX - proceder a investigação de qualquer outra natureza, quando determinada pelo
Ministro da Justiça;
X - integrar os Sistemas Nacional de Informações e de Planejamento Federal.

Essa previsão legal é complementada com o Código de Processo Penal:

Art. 6o Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade


policial deverá:
I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e
conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; (Redação dada pela Lei
nº 8.862, de 28.3.1994) (Vide Lei nº 5.970, de 1973)
II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos
peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas
circunstâncias;
IV - ouvir o ofendido;
V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo
III do Título VII, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas
testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura;
VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações;
VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a
quaisquer outras perícias;
VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível,
e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes;
IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar
e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do
crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a
apreciação do seu temperamento e caráter.

Existem normas que disciplinam questões específicas envolvendo a tranquilidade pública, segurança,
ordem, costumes, exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do poder
público, ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos, dentre outros.

36
De olho na realidade...
Realize uma pesquisa no conjunto de leis de sua cidade ou Estado a fim de identificar aquelas que
dispõem sobre o exercício do dever-poder de polícia. Como sugestão, grave todas essas normas em uma pasta
de seu computador para estudo e consulta.

Importante!
É através do dever-poder de polícia que a lei confere a você, profissional de segurança pública,
mecanismos para disciplinar a conduta das pessoas em sociedade. É dentro desse contexto que se
fundamenta a atuação policial, instrumento que lhe permite alcançar um grau de ordem pública, de
paz social, que se exige no cumprimento de seu mister (ocupação profissional, trabalho ou ofício).

Considerando essas diretrizes, no campo prático, o dever-poder de polícia confere ao policial o


momento ideal para realizar a abordagem, bem como aquilo que ele pode ou não fazer. Para tanto, é preciso
avançar nos estudos para entender como isso acontece, por meio dos atributos do dever-poder de polícia.

2.2 Atributos do Dever-Poder de Polícia


Para que o deve-poder de polícia seja plenamente exercido, de acordo com Meirelles (2011, p. 121), é
preciso identificar três atributos ou características:
• a discricionariedade;
• a autoexecutoriedade e
• a coercibilidade.

Estude, a seguir um pouco a respeito cada um deles.

2.2.1 Discricionariedade das ações de segurança pública


No dia-a-dia da intervenção policial, considerando o juízo de quando se deve ou não empregar a força,
realizar uma abordagem, algemar (STF, Súmula Vinculante nº 11) ou prender (CPP, art. 301 e 302), percebe-se
uma larga margem de medidas para se alcançar um objetivo. Pensando nisso, você já deve ter ouvido falar ou
teve a oportunidade de constatar que, ao cumprir seu dever, nenhuma ocorrência é igual a outra, ainda que
envolva a mesma pessoa, o mesmo lugar, o mesmo horário, dentre outros fatores. Cada caso deve ser tratado
de acordo com as circunstâncias. Isso também ocorre durante o planejamento das ações de segurança.
Por isso que a previsão legal e regulamentar do dever-poder de polícia é abrangente, permitindo ao
profissional de segurança pública escolher as medidas oportunas e convenientes para se atingir o fim público.
Daí porque se fala em mérito do ato discricionário, alcançado sob:

• o juízo da oportunidade - elemento motivo: favorável, tempestivo, que vem em tempo; e

37
• conveniência - elemento objeto: respeita as regras, apropriado, atende as expectativas, traz benefícios
(GASPARINI, 2007, p. 893).

Como se vê, discricionariedade traduz-se na liberdade de ação dentro dos limites legais para se
concretizar o interesse público, fundada num juízo de oportunidade e conveniência. Nesse sentido, Gasparini
(2007, p. 893) aduz que:

Todas as atividades, discricionárias ou vinculadas da Administração Pública estão


subordinadas à lei (CF, art. 37). Sendo assim, é natural que a Administração Pública
não possa ir além da competência e dos limites traçados pelas normas pertinentes
a cada caso ou situação que se lhe apresente. O agir da Administração Pública não
se “juridiciza” na ausência da lei. Ademais, há de conter-se na orientação e lindes
tracejados pela lei. Qualquer ação estatal sem o correspondente calço legal ou que
exceda o âmbito demarcado pela lei é injurídica e expõe-se à anulação.

Entretanto, essa discricionariedade é objeto de severas críticas, em função da baixa capacidade de


avaliação do policial, frente aos recursos que lhes são disponibilizados. Esse entendimento ressalta que as
decisões dos policiais acerca de quando se deve ou não usar a força não encontra meio termo, adquirindo
contornos dramáticos quando se decide pelo uso letal da força. Por isso que se considera que nem toda ação
policial é compatível com o estado democrático de direito, estando fora dos casos de legítima defesa, estrito
cumprimento do dever legal ou exercício regular de direito. Com efeito, constata-se, não raras vezes, o uso
indiscriminado da força, seja em face de indivíduos que praticam crimes, seja em face de pessoas consideradas
suspeitas, mas sem histórico de envolvimento em delitos (RAMOS; MUSUMECI, 2005).
Dentro dessa discussão, é importante lembrar-se da aula do Módulo 1, na qual você estudou a respeito
dos princípios básicos sobre o uso da força e armas de fogo, adotados no Oitavo Congresso das Nações Unidas
sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes. Para relembrar, leia o item 2 das disposições
gerais do anexo:

Os governos e entidades responsáveis pela aplicação da lei deverão preparar uma


série tão ampla quanto possível de meios e equipar os responsáveis pela aplicação
da lei com uma variedade de tipos de armas e munições que permitam o uso
diferenciado da força e de armas de fogo. Tais providências deverão incluir o
aperfeiçoamento de armas incapacitantes não-letais, para uso nas situações
adequadas, com o propósito de limitar cada vez mais a aplicação de meios capazes
de causar morte ou ferimentos às pessoas.
Com idêntica finalidade, deverão equipar os encarregados da aplicação da lei com
equipamento de legítima defesa, como escudos, capacetes, coletes à prova de bala
e veículos à prova de bala, a fim de se reduzir a necessidade do emprego de armas
de qualquer espécie.

38
Inspirada nesse ato internacional, a Portaria Interministerial nº 4.226, de 31 de dezembro de 2010,
ao dispor sobre o uso diferenciado da força no Brasil, estabelece o emprego de armas e equipamentos de menor
potencial ofensivo.
Ao lado disso, põem-se em destaque os seguintes dispositivos da Lei nº 13.060/2014, também
estudada no Módulo 1:

Art. 3° Os cursos de formação e capacitação dos agentes de segurança pública


deverão incluir conteúdo programático que os habilite ao uso dos instrumentos não
letais.
Art. 5° O poder público tem o dever de fornecer a todo agente de segurança pública
instrumentos de menor potencial ofensivo para o uso racional da força.

Vale lembrar-se da ponderação de valores, do emprego do princípio da proporcionalidade com seus


requisitos de adequação, necessidade e razoabilidade ou proporcionalidade em sentido estrito, conforme
tipificado no art. 2º da Lei nº 13.060/2014 e estudado no Módulo 1.

Importante!
“Discricionariedade não se confunde com arbitrariedade. Discricionariedade é liberdade de agir dentro
dos limites legais; arbitrariedade é ação fora ou excedente da lei, com abuso ou desvio de poder”. O
ato arbitrário é sempre ilegítimo e inválido, portanto nulo, passível de responsabilização do agente
público (MEIRELLES, 2011, p. 121). Vale destacar que, perante a arbitrariedade, o profissional de
segurança está passível de ser responsabilizado, conforme já aventado anteriormente, e conforme você
estudará no Módulo 3 (ex.: abuso de autoridade, tortura, improbidade administrativa etc.).

2.2.2 Autoexecutoriedade da atuação policial


Autoexecutoriedade é a capacidade de se praticar uma ação diretamente, por seus próprios meios, sem
o acionamento do poder judiciário. Para tanto, tendo em vista a necessidade de se atingir o fim público
prontamente, a ordem jurídica estabelece as medidas que os órgãos de segurança deverão implementar.
Assim, na hipótese em que o policial se depara com uma ocorrência, e precisa intervir, seja para alertar,
seja para abordar, prender ou adotar outra medida prevista na legislação, com o intuito de preservar a ordem,
proteger pessoas e bens, ele o fará de imediato, sem a necessidade de se dirigir a um juiz solicitando
uma decisão que fundamente sua atuação.
Cumpre ressaltar que, embora respaldado pelos atributos do ato administrativo, dentre eles o da
presunção de legalidade e de veracidade, o comportamento do poder público pode sofrer controle judicial, a
ser provocado pelo administrado, isto é, a pessoa que foi submetida à medida policial (CF/88, art. 5º, XXXV).

2.2.3 Coercibilidade do dever-poder de polícia


Resgatando o fundamento do contrato social, no qual o cidadão abre mão de suas liberdades para se
beneficiar da proteção estatal (mitigação do exercício da justiça com as próprias mãos), a coercibilidade constitui
um elemento que integra essa relação entre o poder público e os indivíduos. Com efeito, cada pessoa se

39
submete ao poder do Estado, em benefício do bem comum, através da imposição coativa das medidas adotadas
pelos órgãos estatais.
Em outras palavras, determinadas ações do poder público possuem caráter impositivo, de observância
obrigatória pelos destinatários. É dizer, a coercibilidade se opera com o constrangimento (legal) no sentido de
se obrigar alguém a se submeter a uma determinação de ordem policial (legal, clara e objetiva), sob pena do
uso (legítimo) da força e demais medidas cabíveis (vide Módulo 3). Com efeito, todo o ato de polícia é dotado
de imperatividade, obrigatório para seu destinatário, admitindo até o emprego da força (legítima) a fim de se
obter o seu cumprimento, em especial, quando resistido pelas pessoas.

Nessa linha de raciocínio, Meirelles (2011, p. 121) argumenta:

O atributo da coercibilidade do ato de polícia justifica o emprego da força física


quando houver oposição do infrator, mas não legaliza a violência desnecessária ou
desproporcional à resistência, que em tal caso pode caracterizar o excesso de poder
e abuso de autoridade nulificadores do ato praticado e ensejadores das ações civis
e criminais para reparação do dano e punição dos culpados.

Valendo-nos ainda de seus ensinamentos (MEIRELLES, 2011, p. 122), “Não há ato de polícia facultativo
para o particular, pois todos eles admitem a coerção estatal para torná-los efetivos, e essa coerção também
independe de autorização judicial”. Assim, é o próprio policial, representante do Estado, que determina e faz
executar as medidas necessárias para se preservar a ordem e a paz social.
Uma correlação interessante é aquela na qual considera que a coercibilidade é indissociável da
autoexecutoriedade. É dizer, o ato de polícia só é autoexecutório porque é dotado de força coercitiva. É a
necessidade de se ver as medidas adotadas pela administração por meio dos meios de coerção. Assim, sem
coerção não há como se efetivar uma ação policial para proteger pessoas e bens.
Diante disso tudo, Moreira Neto (1987, p.11) arremata a abordagem a respeito do dever-poder de
polícia, dizendo que a discricionariedade, a executoriedade e a coercibilidade constituem o tripé do direito
administrativo da segurança pública.

Aula 3 – Atuação policial como estratégia de prevenção à


violência urbana, resgate da paz social e instrumento para instrução
criminal

Nesta aula você estudará a atuação policial por meio da abordagem, seja para as ações de prevenção,
mantendo um ambiente livre de riscos e perigos à vida e aos bens (sensação de segurança), ou para ações de
repressão (imediata e mediata), nos casos de resgate da paz social e de instrução de um processo criminal.

40
Talvez você não tenha notado, mas normalmente a abordagem pode ser empregada para fins
educativos ou instrutivos, na medida em que o agente busca promover a orientação do público a respeito de
determinados aspectos de comportamento, de acordo com as regras de ordem pública, seja no trânsito, em vias
públicas, parques, praças, meio ambiente, dentre outros.
Essa atividade tem natureza estritamente preventiva. Por sua vez, Araújo (2008, p. 17) destaca que:

As pessoas podem aparecer de diferentes maneiras, ora como vítimas, ora como
agressores, ora como espectadores diretos ou indiretos, outras vezes como parceiros
ou adversários, às vezes necessitando de auxílio e proteção, mas todos com o
objetivo de ter seus direitos resguardados pelos agentes de aplicação da lei.

As ações de polícia são desenvolvidas mediante relações interpessoais, isto é, por meio do contato com
a sociedade, em diversas situações. Dentro desse contexto, observe as situações a seguir.

Situação 01: Profissionais de segurança pública planejaram ações específicas para um evento
esportivo, ocorrido nos últimos 10 anos. Nesse período, houve registros de roubo, furto, lesão corporal,
tentativa de homicídio e homicídio consumado. Umas das estratégias adotadas na edição atual foi a de
intensificar as atividades de busca em pessoas e veículos, em barreiras pré-determinadas, observada a mancha
criminal. Após a realização do evento não houve registro de homicídio, nem de tentativa de homicídio. Houve
sensível redução nos números de roubo, furto e lesão corporal.

Situação 02: Uma viatura policial recebeu informações detalhadas, via Central de Operações, sobre
um grupo de três pessoas armadas com pistolas, efetuando assaltado em uma padaria no centro da cidade. Ao
chegar no local, a equipe obteve a confirmação da ocorrência com o proprietário do estabelecimento, o qual
forneceu novas informações sobre os autores do fato, que se evadiram. Durante o patrulhamento, os policiais
identificaram 03 (três) pessoas, cujas descrições e comportamento indicaram uma semelhança de
características com os autores do roubo à padaria, conforme informações transmitidas pela Central de
Operações e pela vítima.

Diante dessas distintas situações, não restam dúvidas de que você, como agente policial, deve adotar
uma providência, que normalmente passa pela abordagem policial. Perceba que na primeira hipótese não há a
notícia de que esteja ocorrendo um crime, diferente do que acontece na segunda hipótese.

Entretanto, considerando o aspecto jurídico...


O que justifica a intervenção policial na primeira hipótese? Como obrigar o cidadão a se submeter a
uma abordagem em um evento, quando não há um crime ocorrendo? E o que justifica as demais atuações? São
os mesmos fundamentos? Pense a respeito, pois tais questões serão tratadas pontualmente mais a frente.

41
Vale dizer, a resposta adequada a estas indagações revela o preparo do profissional de segurança,
principalmente quando instado a expor os motivos de sua atuação perante os órgãos de controle interno
(Corregedoria) e externo (Ministério Público, Poder Judiciário, Comissão de Direitos Humanos etc.).

Importante!
O policial, representante do Estado, protetor dos bens mais caros para a sociedade, deve ter o domínio
sobre o que acontece no mundo dos fatos, a realidade das ruas. O policial deve empregar a técnica
adequada durante sua atuação (necessária e razoável) e observar os fundamentos da ordem jurídica.
Com esse ciclo, o seu comportamento será considerado legítimo.

3.1 Abordagem - conceito


Considerando o que foi apresentado até aqui, incluindo os estudos do Módulo 1, você tem condições
de explicar que, como profissional de segurança pública, a sua tarefa consiste em oferecer à sociedade a
proteção suficiente para que todos estejam livres de riscos e perigos. E, para tanto, como representante do
Estado, você detém o dever-poder de polícia, que lhe confere a capacidade de intervir nas liberdades individuais,
respeitando os limites, sendo necessário submeter as pessoas ao procedimento de revista pessoal, a fim de
garantir a segurança da comunidade, inclusive a da própria pessoa.

Mas... O que seria a tão falada abordagem policial? Ela somente existe em casos de crimes e de fundada
suspeita?
Como todo bom pesquisador, é sempre conveniente buscar o significado das palavras em um
dicionário.
Abordar é o ato de aproximar, alcançar, chegar, estar encostado, achegar-se em uma pessoa, com o
propósito de lhe sondar a opinião ou tratar de qualquer assunto, começar a tratar de alguma coisa.
Olhando para o conceito técnico, a abordagem policial constitui o procedimento de aproximação a
uma pessoa, ou a um grupo de pessoas, ou ainda a um veículo ou residência, com o fim de confirmar um fato,
a evidência de uma infração penal, bem como investigar, orientar, advertir, prender, assistir.

3.2 Critérios para realização da abordagem


Normalmente a busca em pessoas, veículos ou domicílios é realizada em função da necessidade de se
identificar a existência de algum objeto que constitua corpo de delito (Código de Processo Penal, art. 244). Mas,
pela definição construída anteriormente, é importante deixar bem claro que essa intervenção policial não
somente ocorre diante da existência de uma infração penal. Vale dizer, a abordagem pode ser realizada também
com o objetivo de orientar, advertir, assistir. Dentro dessa ideia, conforme já discutido acima, ela pode ser
empregada também como critério de prevenção, sem que exista fundada suspeita, como você estudará a seguir.
Ao se debruçar sobre o estudo da abordagem policial, Tânia Pinc (2007) identificou o significado de
abordagem, por meio da leitura dos trabalhos de pesquisa de Ramos e Musumeci:

42
[...] abordagem representa um encontro entre a polícia e o público e os
procedimentos adotados pelos policiais variam de acordo com as circunstâncias e
com a avaliação feita pelo policial sobre a pessoa com quem interage, podendo estar
relacionada ao crime ou não.
Essa é uma ação policial proativa, que ocorre durante as atividades de policiamento,
cujos procedimentos preveem a interceptação de pessoas e veículos na via pública
e a realização de busca pessoal e revista veicular, com o objetivo de localizar algum
objeto ilícito, como drogas e armas de fogo. A decisão de agir é exclusiva do policial
e é respaldada por lei.

Nesse contexto, cumpre destacar que a realização dessa atividade deve adotar critérios para seleção de
pessoas, veículos e residências, resguardados no dever-poder de polícia, incluindo aí “a possibilidade de escolha
pela omissão, ou seja, deixar de adotar algum procedimento, realizá-lo de forma parcial ou adiar a execução,
conforme eventuais conveniências” (GOLDSTEIM, 2003, p. 107).
Como profissional de segurança pública você já sabe que a abordagem adequada segue uma atuação
técnica e tática, de acordo com os procedimentos descritos em manuais, instruções normativas, procedimentos
operacionais padrão, resoluções, dentre outros. Os critérios de atuação técnica da abordagem policial são
desenvolvidos nas corporações, observando as normas de atribuição de cada uma delas e de acordo com cada
situação fática.

Quem nunca ouviu os princípios da ABORDAGEM: segurança, surpresa, rapidez, ação vigorosa e
unidade de comando?
Dentro desse contexto, ainda destacam-se as fases da abordagem:
• Motivação;
• Planejamento mental;
• Plano de ação;
• Execução; e
• Desfecho da abordagem.

3.3 Abordagem policial para fins de prevenção


Lembra-se da 1ª situação descrita no início dessa aula? Pois bem, ali não há existência de um crime
ocorrendo. Certo?
Voltando à pergunta: Qual o fundamento legal que legitima submeter alguém a uma busca pessoal
naquelas condições?
Do ponto de vista fático, ficou evidenciado, através da análise criminal, a necessidade de preservar a
ordem pública, assim como de prevenir a ocorrência de roubos, furtos, lesão corporal, tentativa de homicídio e
homicídio. Do ponto de vista jurídico, você já deve ter pensado logo no dever-poder de polícia. E a resposta
está correta.

43
Mas, considerando a primazia da liberdade de locomoção em um regime democrático, como o adotado
pelo Brasil (CF/88, art. 5º) é preciso haver norma legal que estabeleça de forma específica essa possibilidade. E,
nesse caso, até em função do histórico de violência, o Estatuto do Torcedor, veiculado pela Lei n° 10.671, de 15
de maio de 2013, prevê o seguinte:

Art. 13-A. São condições de acesso e permanência do torcedor no recinto esportivo,


sem prejuízo de outras condições previstas em lei: (Incluído pela Lei nº 12.299, de
2010).
[...]
II - não portar objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou
possibilitar a prática de atos de violência; (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).
III - consentir com a revista pessoal de prevenção e segurança; (Incluído pela Lei nº
12.299, de 2010).
IV - não portar ou ostentar cartazes, bandeiras, símbolos ou outros sinais com
mensagens ofensivas, inclusive de caráter racista ou xenófobo; (Incluído pela Lei nº
12.299, de 2010).
[...]
VI - não arremessar objetos, de qualquer natureza, no interior do recinto
esportivo; (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).
VII - não portar ou utilizar fogos de artifício ou quaisquer outros engenhos
pirotécnicos ou produtores de efeitos análogos; (Incluído pela Lei nº 12.299, de
2010).
[...]
X - não utilizar bandeiras, inclusive com mastro de bambu ou similares, para outros
fins que não o da manifestação festiva e amigável. (Incluído pela Lei nº 12.663, de
2012).
Parágrafo único. O não cumprimento das condições estabelecidas neste artigo
implicará a impossibilidade de ingresso do torcedor ao recinto esportivo, ou, se for
o caso, o seu afastamento imediato do recinto, sem prejuízo de outras sanções
administrativas, civis ou penais eventualmente cabíveis. (Incluído pela Lei nº 12.299,
de 2010).

Eis, então, o fundamento legal que autoriza a busca pessoal, sem que haja a notícia de uma infração e
uma fundada suspeita.

3.4 Fundada suspeita


Agora você irá identificar as nuances que envolvem a sua atuação quando se deparar com uma
ocorrência semelhante à da segunda situação descrita anteriormente.

Lembra-se do assalto à padaria do centro da cidade?


Leia novamente o texto e as indagações.
44
Conforme já apontado, a primeira coisa que vem à mente de um policial sobre a justificativa para se
realizar uma abordagem é a chamada fundada suspeita. Ao se empregar os significados de um dicionário, a
fundada suspeita seria o juízo de valor formulado sobre o comportamento de uma pessoa, ou sobre algo, com
base (fundado) em elementos prévia e solidamente identificados, que levam a concluir sobre a existência de um
ato irregular, ilícito e/ou criminoso. De imediato o fundamento legal citado é o do Código de Processo Penal:

Art. 240. A busca será domiciliar ou pessoal.


§ 1º Proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem para:
[...]
b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;
[...]
f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando
haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação
do fato;
[...]
h) colher qualquer elemento de convicção.
§ 2o Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém
oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a f e letra h do
parágrafo anterior.

Ao analisar a expressão fundada suspeita contida nos artigos citados, Nucci (2005, p. 493) ensina:

Suspeita é uma desconfiança ou suposição, algo intuitivo e frágil, por natureza, razão
pela qual a norma exige fundada suspeita, que é mais concreto e seguro. [...] sendo
crucial destacar que a autoridade encarregada da investigação ou seus agentes
podem – e devem – revistar pessoas em busca de armas, instrumentos do crime,
objetos necessários à prova do fato delituoso, elementos de convicção, entre outros,
agindo escrupulosa e fundamentadamente.

Interessante observar que esses dispositivos fazem parte no CPP do Capítulo XI, que disciplina a busca
e a apreensão. Por sua vez, esse Capítulo está inserido no Título VII – Da Prova, instrumento processual
empregado para convencer a autoridade judiciária sobre a existência de um crime, a fim de que ele possa aplicar
a medida penal adequada.
Entretanto, a busca, como instrumento processual, também é empregada em atos fora da instrução
criminal (ato processual praticado em juízo), tendo em vista o sentido e o alcance que decorre dos artigos
anteriormente citados, seja para as ações de prevenção, seja para os procedimentos de repressão imediata e em
especial para os de repressão mediata, todos estudados no Módulo 1. Como se vê, o CPP não fala em
abordagem, mas em busca domiciliar ou pessoal, a qual será realizada independentemente de mandado judicial.
Do ponto de vista legal ainda, Júlio César Rodrigues de Araújo (2008, p. 18) lembra que a abordagem
também se vale do que está contido no art. 239 do CPP, que trata dos indícios: “Considera-se indício a
circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência

45
de outra ou outras circunstâncias”. Ou seja, se em um patrulhamento o profissional de segurança se depara com
uma situação que induz um ilícito penal, estará ele autorizado a promover a intervenção aqui estudada.
Contudo, várias são as críticas sobre a formação da fundada suspeita. Quem nunca ouviu a famosa
pergunta sobre o que seria a fundada suspeita. Aqui reside grande parte da controvérsia sobre o emprego da
discricionariedade do policial. Júlio César (2008, p. 19) cita a ideia formulada por Ramos:

Outro aspecto que chama a atenção na pesquisa junto à PM é a pobreza do discurso


sobre a suspeita. Não só não conseguimos localizar um único documento que
definisse parâmetros para a constituição da “fundada suspeita” (expressão usada
reiteradamente por policiais, mas sem qualquer sentido preciso), como encontramos
nas falas de oficiais, antigos ou jovens, de alta ou baixa patente, uma articulação tão
precária a respeito desse tema quanto a observada na “cultura policial de rua”
expressa pelas praças de polícia.
É surpreendente, para não dizer espantoso, que a instituição não elabore de modo
explícito o que os próprios agentes definem como uma das principais ferramentas
do trabalho policial (a suspeita); que não focalize detidamente esse conceito nos
cursos de formação, nas documentações e nos processos de qualificação, nem o
defina de modo claro e objetivo, deixando a mercê do senso comum, da “intuição”,
da cultura informal e dos preconceitos correntes. (Ramos, 2005, p. 54).”

Embora haja essa discussão, é bom que se diga que o problema não reside no suposto grau de
discricionariedade ou na ausência de definições sobre o que seria a expressão “fundada suspeita”. Mas, na
maioria das vezes, o problema encontra-se na correta aplicação das normas aqui discorridas, ou a dificuldade
de se interpretar os fatos e o uso da técnica adequada ao caso concreto.
Conforme já demonstrado, a vida em sociedade é dinâmica, e disciplinar toda essa complexa malha
de interação entre os indivíduos em uma norma legal seria inviável e no caso da abordagem, “torna-se
impossível e impróprio enumerar todas as possibilidades autorizadoras de uma busca” (NUCCI, 2005, p. 493),
razão pela qual o legislador prevê determinadas cláusulas gerais que devem ser complementadas por normas e
atos regulamentares*, destinadas a detalhar as ações a serem desenvolvidas no dia-a-dia pelo agente público,
observando aí os critérios de proporcionalidade e atingimento do interesse público.
*lembra-se do ato administrativo que complementa a lei, conforme estudado nesse Módulo?

Assim, para que seja assegurada uma convivência harmoniosa, um ambiente livre de riscos e perigos,
o legislador conferiu aos policiais, independente de autorização judicial, a possibilidade de se realizar
abordagens em pessoas, veículos e domicílios, bastando indício associado à fundada suspeita de que a
pessoa esteja portando um objeto que esteja vinculado a uma infração penal. Daí surgem os manuais, os
procedimentos operacionais, instruções, resoluções, que buscam detalhar e definir os critérios de atuação do
profissional, isto é, complementando a cláusula geral da lei sobre indícios e fundada suspeita.
Nesse sentido, a Polícia Militar do Estado de São Paulo estabeleceu os seguintes critérios para orientar
a atuação de seus integrantes (PINC, 2006, p. 33):
46
Atitude(s) suspeita(s): todo comportamento anormal ou incompatível com o horário
e o ambiente considerados, praticado por pessoa(s), com a finalidade de encobrir
ação ou intenção de prática delituosa. Alguns exemplos: a. Pessoa que desvia o olhar
ou o seu itinerário, bruscamente quando reconhece ou avista um policial; b.
condutor ou ocupantes de um veículo que olha(m) firmemente para frente na
condição de rigidez, evitando olhar para os lados, para o policial ou para a viatura,
que naturalmente chamam a atenção do público em geral;
c. pessoa(s) que, ao ver(em) ou reconhecer(em) um policial ou uma viatura, iniciam
um processo de fuga, como correr, desviar caminho abruptamente etc.; d. pessoa(s)
parada(s) defronte a estabelecimentos comerciais, bancários, escolas, filas etc., por
tempo demasiado e sem motivo aparente; e. pessoa que mantém seu veículo parado
e em funcionamento defronte a estabelecimentos bancários, demonstrando
agitação, nervosismo, ansiedade etc.; f. veículo excessivamente lotado, cujos
ocupantes demonstram temeridade em seu comportamento; g. táxi ocupado por
passageiro, contudo, apresentando luminoso aceso; h. uso de vestes incompatíveis
com o clima, possibilitando ocultar porte ilegal de armas ou objetos ilegais.”

Assim, é de vital importância que você tenha fácil acesso ao manual de sua corporação. Faça uma detida
leitura. Se você achar interessante, participe e contribua com seu aperfeiçoamento. Vale ressaltar que, anos de
atuação na atividade operacional, acrescentado do contato com atos de controle interno e externo, bem
como das atividades de ensino e da constante pesquisa acadêmica, conferem uma carga de experiência aos
profissionais de segurança pública, permitindo-lhes criar habilidades suficientes para identificar irregularidades
num simples olhar sobre o comportamento de uma pessoa, veículo ou ambiente. Normalmente chamam a isso
de tirocínio policial. Com efeito, essa capacidade constitui elemento de grande importância na área de
segurança pública, em especial quanto à atualização das técnicas e critérios de abordagem.
Entretanto, a experiência do policial não pode servir de único elemento que justifique uma abordagem.
Na atuação diária, é necessária a identificação de dados concretos sobre a existência de um ilícito, de um crime,
conforme se verifica na doutrina pátria:

Suspeita é uma desconfiança ou suposição, algo intuitivo e frágil, por natureza, razão
pela qual a norma exige fundada suspeita, que é mais concreto e seguro. Assim,
quando um policial desconfiar de alguém, não poderá valer-se, unicamente, de sua
experiência ou pressentimento, necessitando, ainda, de algo mais palpável, como a
denúncia feita por terceiro de que a pessoa porta o instrumento usado para o
cometimento do delito, bem como pode ele mesmo visualizar uma saliência sob a
blusa do sujeito, dando nítida impressão de se tratar de um revólver (NUCCI, 2005,
p. 493).

Pode ser realizada por qualquer PM com ou sem o respectivo mandado. Isto não
significa que seja lícito ao PM revistar indiscriminadamente todo cidadão, o que
caracteriza uma atitude despropositada, além de ilegal, considerando que cada

47
cidadão tem o direito de ir e vir sem ser molestado. […] Postulamos que a fundada
suspeita não pode encontrar morada apenas na presunção, mas exige algo além,
como um comportamento suspeito (acelerar o veículo ao avistar o policial militar
em serviço, desviar o olhar, executar manobra de modo a não passar por bloqueio
etc.). (ASSIS, 2006, p. 50-51)

No mesmo sentido, o poder judiciário manifestou-se conforme os seguintes precedentes:

EMENTA: HABEAS CORPUS. TERMO CIRCUNSTANCIADO DE OCORRÊNCIA


LAVRADO CONTRA O PACIENTE. RECUSA A SER SUBMETIDO A BUSCA PESSOAL.
JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL RECONHECIDA POR TURMA RECURSAL DE
JUIZADO ESPECIAL. [...] A “fundada suspeita”, prevista no art. 244 do CPP, não pode
fundar-se em parâmetros unicamente subjetivos, exigindo elementos concretos que
indiquem a necessidade da revista, em face do constrangimento que causa.
Ausência, no caso, de elementos dessa natureza, que não se pode ter por
configurados na alegação de que trajava, o paciente, um “blusão” suscetível de
esconder uma arma, sob risco de referendo a condutas arbitrárias ofensivas a direitos
e garantias individuais e caracterizadoras de abuso de poder. Habeas corpus
deferido para determinar-se o arquivamento do Termo. (STF, HC 81305,
Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Primeira Turma, julgado em 13/11/2001, DJ 22-02-
2002 PP-00035 EMENT VOL-02058-02 PP-00306 RTJ VOL-00182-01 PP-00284) (sem
grifos no original)

PROCESSUAL PENAL. BUSCA PESSOAL. ARTS. 240, § 2º, E 244, CPP. AUSÊNCIA DE FUNDADA
SUSPEITA. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE CRITÉRIO OBJETIVO JUSTIFICADOR DO ATO. PRISÃO
EM FLAGRANTE DECORRENTE DA BUSCA PESSOAL. ILEGALIDADE. ARBITRARIEDADE. DIREITOS E GARANTIAS
INDIVIDUAIS DESRESPEITADOS. 1. “Fundada suspeita” é requisito essencial e indispensável para a realização da
busca pessoal, consistente na revista do indivíduo (Guilherme de Souza Nucci). 2. A busca pessoal sem mandado
deve assentar-se em critério objetivo que a justifique.
Do contrário, dar-se-á azo à arbitrariedade e ao desrespeito aos direitos e garantias individuais. 3. A
suspeita não pode basear-se em parâmetros unicamente subjetivos, discricionários do policial, exigindo, ao
revés, elementos concretos que indiquem a necessidade da revista, mormente quando notório o
constrangimento dela decorrente (STF – HC 81.305-4/GO, Rel. Ministro Ilmar Galvão). 4. Recurso em sentido
estrito não provido. (TRF 1. 3ª Turma. RCCR 200733000111970, Rel.: Des. Federal Tourinho Neto, 04/07/2008).
(sem grifos no original)

Saiba Mais...
Antes de prosseguir, recomenda-se aprofundar esse estudo com a leitura do artigo “aspectos jurídicos
da busca pessoal”

48
Disponível em: http://jus.com.br/artigos/9491/aspectos-juridicos-da-busca-pessoal

3.5 Abordagem policial durante intensificação de policiamento


Um aspecto de grande importância diz respeito ao emprego da abordagem policial realizada durante
a intensificação de policiamento, com o objetivo de reduzir os índices criminais. Em princípio, aqui não há a
notícia de que uma infração penal tenha ocorrido imediatamente, mas, conforme descrito na situação nº 01,
há um histórico de violência urbana em determinado local, envolvendo alguns tipos penais, subsidiando a
identificação de uma mancha criminal, que precisa ser diluída mediante ações de prevenção.
Conforme alerta Chiba (1998, p. 53), os dispositivos do Código de Processo Penal anteriormente citados
são insuficientes para legitimar a realização de abordagem em situações em que não há fundada suspeita após
a ocorrência imediata de um crime. É dizer, as ações de prevenção transcendem ao que estabelecem os artigos
240 e 244 do CPP.
Durante essa intensificação de policiamento, regulado por ordem de missão, ordem de serviço, dentre
outros, normalmente se estabelecem pontos de bloqueio ou um itinerário para que equipes de policiais
percorram realizando busca pessoal ou veicular, a fim de evitar a ocorrência de determinados tipos penais. Sobre
essa atuação não pode pairar nenhuma arbitrariedade, abuso de poder ou excesso de discricionariedade.
Trata-se de cumprir o texto constitucional (art. 144) no sentido de oferecer segurança à população.
Repita-se, um ambiente livre de riscos e perigos. O fundamento então começa com esse dispositivo
constitucional, associado ao exercício do dever-poder de polícia, com seus atributos e previsão legal (conforme
estudado nesse Módulo) e, no caso concreto, a existência dos fenômenos criminais que alimentam a violência
urbana, perturbadora da paz social. A isso, associam-se os critérios técnicos veiculados nos manuais,
procedimentos operacionais padrão (POP’s), resoluções, dentre outros atos regulamentares, como o do Estado
de São Paulo.
Nesse sentido, cita-se o seguinte precedente do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais:

EMENTA: Constitucional. Processo Penal. Direito de livre locomoção. Busca forçada.


Revista. Possibilidade, quando no interesse da segurança coletiva. O direito
individual à liberdade deve ser combinado com medidas preventivas de defesa da
incolumidade pública e da paz social. A revista, ante suspeita séria de irregularidade
que possa causar distúrbio à vida, à saúde ou à segurança das pessoas, é defensável
quando efetivada em estado de necessidade coletiva. (TJMG. Processo nº
1.0000.00.283122-0/000(1). Relator: ALMEIDA MELO Data do
Julgamento: 27/11/2002. Data da Publicação: 14/02/2003).

Saiba Mais...
Leia o relevante artigo “A busca pessoal e as suas classificações”, que nos traz uma discussão sobre
o tema. Faça a leitura e reflita a respeito do que é apresentado.
Munido dessas informações, associando-as ao conhecimento técnico e ao constante treinamento,
você, profissional de segurança pública, estará apto a desenvolver suas atribuições nas ruas com qualidade e
eficiência, destacando-se positivamente perante a comunidade em que servir, proporcionando-lhes um serviço
49
digno, conforme preceituado no contrato social citado no Módulo 1, a Constituição da República Federativa do
Brasil.

3.6 Busca pessoal em mulheres


Não é demais lembrar que o CPP, em seu artigo 249, estabelece “A busca em mulher será feita por
outra mulher, se não importar retardamento ou prejuízo da diligência.”
Assim, recomenda-se que a busca em mulher seja realizada por uma agente policial e, não sendo
possível, o policial do sexo masculino poderá fazê-lo, dentro dos critérios já trabalhados até aqui. Pense no
seguinte exemplo: há uma forte suspeita de que uma mulher esteja portando arma de fogo sob suas vestes.
Entretanto, no turno de serviço não há equipe composta por policial feminina. Nesse caso, é perfeitamente viável
a realização da abordagem por policial masculino. É importante que isso seja devidamente registrado na
ocorrência e feita de maneira profissional, sem qualquer ênfase de brincadeira ou de desrespeito à mulher
abordada.
Fazendo nova leitura do artigo citado, não se identifica restrição quanto à busca feita por policial
feminina em homens, porém essa medida deve ser analisada com bom senso, em especial, quanto aos aspectos
da técnica de abordagem no caso concreto.

3.7 Busca domiciliar


Do catálogo de direitos e garantias fundamentais, que você estudou no Módulo 1, importa destacar a
inviolabilidade de domicílio, contida no inciso XI do art. 5º da CF/88: “a casa é asilo inviolável do indivíduo,
ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre,
ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.
Para as medidas de abordagem, perceba que essa inviolabilidade pode ser superada nos casos de:
• Consentimento do morador, à noite ou durante o dia;
• Em caso de flagrante delito, à noite ou durante o dia;
• Mediante mandado, isto é, ordem escrita do juiz competente, durante o dia.

Em uma concepção de dignidade da pessoa humana, o termo casa é muito abrangente. O legislador
teve a intenção de tutelar um ambiente espacial privado, um compartimento não aberto ao público, no qual
determinada pessoa tem a garantia de desenvolver os seus direitos essenciais, buscar segurança, descanso, um
mínimo existencial, manter uma relação familiar. Aqui também cabe a noção de que a pessoa pode exercer sua
profissão ou atividade.
Essa proteção é realizada pelo Código Penal, que considera crime a invasão de domicílio. Aqui é
oportuno verificar o que é considerado casa:
Art. 150 Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita
de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências:

[...]

50
§ 4º A expressão "casa" compreende:
I - Qualquer compartimento habitado;
II – Aposento ocupado de habitação coletiva; e
III - Compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou
atividade
§ 5º - Não se compreendem na expressão "casa":
I – Hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto aberta,
salvo a restrição do nº II do parágrafo anterior; e
II – Taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.

No caso de um hotel, os quartos são utilizados como moradia, logo, também merecem a proteção
anteriormente citada. De outro lado, os corredores e o saguão não são abrangidos por essa tutela. O domicílio
que se exige aqui não é o fixo, que exige ânimo de residência. Nesse sentido, destaca-se o seguinte julgado:

EMENTA: Prova Penal. Banimento constitucional das provas


ilícitas.[…] Busca e apreensão de materiais e equipamentos realizada, sem mandado
judicial, em quarto de hotel ainda ocupado. Impossibilidade. Qualificação jurídica de
espaço privado (quarto de hotel, desde que ocupado) como “casa”, para efeito da
tutela constitucional da inviolabilidade domiciliar. Garantia que traduz limitação
constitucional ao poder do Estado e tema de persecução penal, mesmo em sua fase
pré-processual.
Conceito de “casa” para efeito da proteção constitucional (CF, art. 5º, XI e CP, art.
150, § 4º, II). Amplitude dessa noção conceitual, que também compreende os
aposentos de habitação coletiva (por exemplo, os quartos de hotel, pensão, motel e
hospedaria, desde que ocupados): necessidade em tal hipótese, de mandado judicial
(CF, art. 5º, XI). Impossibilidade de utilização pelo Ministério Público, de prova obtida
com transgressão à inviolabilidade domiciliar. Prova ilícita. Idoneidade jurídica.
Recurso ordinário provido […] (STF, 2ª Turma, RHC nº 90.376/RJ. Rel.: Min. Celso de
Melo. Julgado em 03 abr. 2007).

A busca domiciliar realizada durante o dia, com determinação judicial, exige o cumprimento de
determinados protocolos, previstos na legislação, como o de se ler o conteúdo do mandado, sob pena de
nulidade dos atos. Havendo resistência e quando a diligência importar risco aos agentes policiais, o uso da força
será empregado para que a medida judicial seja cumprida. Nesses casos, o policial apresentará e lerá o mandado,
logo que for possível.
A lei autoriza o arrombamento da porta em caso de desobediência. Na hipótese de ausência dos
moradores, caberá a você acionar um dos vizinhos para acompanhar a revista do domicílio. Cabe alertar que, ao
concluir essa medida, você deverá fechar e lacrar o imóvel.
É interessante que sempre haja duas testemunhas não policiais (maiores e capaz) para que
acompanhem a diligência, agindo assim estará dando maior lisura ao seu ato.

51
Outro ponto que merece atenção, principalmente para evitar constrangimentos, é o procedimento de
solicitar que o morador e/ou testemunha acompanhe a diligência em cada cômodo da residência, juntamente
com os policiais.
Ao concluir as buscas, o policial que cumprir o mandado fará relatório contendo todos os detalhes,
registrando, inclusive, algo de ilícito que foi encontrado, precisando em qual lugar do imóvel estava. O relatório
tem que ser assinado pelo agente, pelo morador e pelas testemunhas.

Importante!
Recomenda-se que seja mencionado no relatório a preservação de bens e da residência submetida à
busca, e, se houver dano, descrever o motivo, bem como se foi necessário o uso da força ou outra
medida adotada. Por fim, o relatório será encaminhado à autoridade competente que determinou o
procedimento.

Mas... Seria extensão do termo casa? E o carro? Seria ele acobertado pela inviolabilidade
constitucional?

3.8 Busca veicular


Existem hipóteses em que o veículo pode ser considerado a extensão do lar e, portanto, atrai a
inviolabilidade domiciliar prevista na CF/88, por exemplo:
• Quando o carro estiver na garagem da casa;
• Quando for um veículo tipo trailer, enquanto parado;
• Quando for uma embarcação; e
• Eventualmente a cabine de um caminhão, no qual, assim como nos dois casos citados
anteriormente, o proprietário se estabeleça com ânimo de moradia.
Com efeito, fora dessas hipóteses, o veículo não é considerado extensão do domicílio, não atraindo a
tutela constitucional, conforme já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça - STJ:

EMENTA HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ARMA ENCONTRADA


NO INTERIOR DE CAMINHÃO. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE
POSSE ILEGAL DE ARMA. IMPOSSIBILIDADE. ABOLITIO CRIMINIS. INAPLICABILIDADE.
PLEITO SUPERADO. ORDEM DENEGADA. 1. Não se pode confundir o delito de posse
irregular de arma de fogo com o de porte irregular de arma de fogo. 2. Caracteriza-
se o delito de posse irregular de arma de fogo quando ela estiver guardada no
interior da residência (ou dependência desta) ou no trabalho do acusado,
evidenciado o porte ilegal se a apreensão ocorrer em local diverso. 3. O caminhão,
ainda que seja instrumento de trabalho do motorista, não pode ser considerado
extensão de sua residência, nem local de seu trabalho, mas apenas instrumento de
trabalho. 4. In casu, o paciente foi surpreendido com a arma "em sua cintura", e não
guardada no interior do caminhão. Assim sendo, à medida que a arma estava presa
à cintura do paciente fica evidente que ele portava, efetivamente, a arma de fogo,
52
que estava ao seu alcance, possibilitando a utilização imediata. 5. Ante a
impossibilidade de desclassificação do crime de porte de arma para o delito de
posse, está superada a irresignação no tocante à incidência de abolitio criminis
temporária, situação que ocorre apenas quanto à conduta relacionada ao crime de
posse de arma de fogo, acessórios e munição. 6. Ordem denegada. (STJ. 5ª Turma.
Habeas Corpus Nº 172.525 – MG. Rel.: Min. Adilson Vieira Macabu. Julgado em 12
jun. 2012).

Assim, vale ressaltar que é lícita a abordagem em veículos, desde que preenchidos os requisitos para
essa atividade, conforme estudado acima, ainda que o condutor não permita.

3.9 Direitos, garantias e prerrogativas decorrentes do exercício da profissão ou função


Uma questão interessante é a que trata sobre a atuação policial em face das pessoas que exercem a
profissão de advocacia. Para tanto, o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (Lei n°
8.906/1994) estabelece um conjunto de direitos, do qual cumpre promover a leitura dos seguintes dispositivos:

Art. 7º São direitos do advogado:


[...]
II – a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus
instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e
telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia; (Redação dada pela Lei nº
11.767, de 2008)
[...]
IV - ter a presença de representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo
ligado ao exercício da advocacia, para lavratura do auto respectivo, sob pena de
nulidade e, nos demais casos, a comunicação expressa à seccional da OAB;
V - não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala
de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas
pela OAB, e, na sua falta, em prisão domiciliar; (Vide ADIN 1.127-8)
§ 2º O advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou
desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade,
em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos
excessos que cometer. (Vide ADIN 1.127-8)
§ 3º O advogado somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício
da profissão, em caso de crime inafiançável, observado o disposto no inciso IV deste
artigo.§ 6o Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por
parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da
inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada,
expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser
cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese,
vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a

53
clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho
que contenham informações sobre clientes. (Incluído pela Lei nº 11.767, de 2008)
§ 7o A ressalva constante do § 6o deste artigo não se estende a clientes do advogado
averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou
coautores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da
inviolabilidade. (Incluído pela Lei nº 11.767, de 2008)

Com efeito, fora do exercício de sua profissão o advogado se submeterá às regras gerais sobre a
atuação policial, conforme apresentado nos Módulos 1, 2 e 3.
Também é de suma importância identificar e conhecer sobre os direitos, garantias e prerrogativas dos
membros do ministério público (art. 18 da Lei Complementar n° 75/1993; arts. 40 e 41 da Lei n° 8.625/1993),
magistrados (art. 33 da Lei Complementar n° 35/1993), parlamentares (CF/88, art. 53; §1° do art. 27; inciso VIII
do art. 29), diplomatas (arts. 27, 29 a 41 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, promulgada pelo
Decreto n° 56.435/1965) e cônsules (arts. 34-36; 41 a 45 da Convenção de Viena sobre Relações Consulares,
promulgada pelo Decreto n° 60.078/1967).
Nesse contexto, considerando outras autoridades ou pessoas (Ministros e Secretários de Estado,
sacerdotes, etc.), vale destacar que direitos, prerrogativas e garantias são disciplinadas na ordem jurídica. Vale a
pena conferir. Além disso, leia os dispositivos em tela e compartilhe sua experiência profissional com seus
colegas e com o tutor.

Finalizando...
Neste Módulo, você estudou que...

 O poder público, para cumprir a tarefa de promover o bem coletivo, pratica atos respaldado em
prerrogativas e é submetido a sujeições, como forma de evitar desvios ao interesse público.
 O ato administrativo é uma manifestação de vontade (comportamento) proferida pelo Estado e
externado por agente público, ou por quem lhe faça às vezes, a fim de criar, modificar ou extinguir direitos,
perseguindo o interesse público.
 O dever-poder de polícia corresponde à permissão social dada à administração pública para
restringir o exercício de direitos individuais em benefício de toda a sociedade.
 O dever-poder de polícia confere ao policial o momento ideal para realizar a abordagem, bem
como aquilo que ele pode ou não fazer. Para tanto, é preciso avançar nos estudos para entender como isso
acontece, através dos atributos do dever-poder de polícia.
 Para que o dever-poder de polícia seja plenamente exercido, de acordo com Meirelles (2011, p.
121), é preciso identificar três atributos ou características: a discricionariedade; a autoexecutoriedade e a
coercibilidade.
 O policial, representante do Estado, protetor dos bens mais caros para a sociedade, deve ter o
domínio sobre o que acontece no mundo dos fatos, a realidade das ruas. O policial deve empregar a técnica

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adequada durante sua atuação (necessária e razoável) e observar os fundamentos da ordem jurídica. Com esse
ciclo, o seu comportamento será considerado legítimo.
 A abordagem policial constitui o procedimento de aproximação ... ou ainda a intervenção a um
veículo ou ingresso em uma residência, com o fim de confirmar um fato, a evidência de uma infração penal, bem
como investigar, orientar, advertir, prender, assistir.
 Como profissional de segurança pública você já sabe que a abordagem adequada segue uma
atuação técnica e tática, de acordo com os procedimentos descritos em manuais, instruções normativas,
procedimentos operacionais padrão, resoluções, dentre outros. Os critérios de atuação técnica da abordagem
policial é desenvolvida nas corporações, observando as normas de atribuição de cada uma delas e de acordo
com cada situação fática.

Exercício

1. Considerando o conteúdo abordado neste módulo, responda:

a. Para cumprir seu papel no sentido de proporcionar o bem comum, o Estado se vale de prerrogativas
e sujeições. Diante disso, discorra sobre o exercício do dever-poder de polícia como instrumento destinado à
preservação da ordem pública e à garantia de um ambiente livre de riscos e perigos à comunidade.
b. Quando você se depara com uma ocorrência, qual o atributo do dever-poder de polícia que lhe
autoriza exercer uma intervenção sem a necessidade de provocar o poder judiciário? Justifique.
c. A coercibilidade, ao lado da discricionariedade e da autoexecutoridade, constitui o tripé do dever-
poder de polícia. Justifique a existência da coercibilidade nas ações de segurança pública.
d. O que justifica a realização de uma abordagem nos casos de intensificação de policiamento?
e. É possível realizar uma busca pessoal em eventos esportivos, sem que haja a existência de uma
infração penal? Justifique.

2. Considerando os atributos ou características do ato administrativo, correlacione a primeira


coluna com a segunda:

(1) Presunção de legitimidade


(2) Autoexecutoriedade
(3) Imperatividade
(4) Tipicidade

( ) o atendimento pelo cidadão ou administrado ao ato praticado pelo agente policial é obrigatório ou
coercitivo – sob pena do uso legítimo da força. Em suma, o destinatário deve se submeter a ele, podendo
contestá-lo, de acordo com os recursos previstos em lei (reclamação, requerimento, direito de petição, ação
judicial, etc.). Caso contrário, se submeterá à responsabilização penal (ex.: desacato, resistência, desobediência).

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( ) considerando que o agente público tem o dever de praticar um ato conforme determina a lei (ex.:
notificação de trânsito, busca pessoal, prisão), paira a presunção de legalidade, bem como a presunção de
veracidade. Essa presunção é relativa porque admite prova em contrário, a ser demonstrada pelo destinatário
do ato (cidadão), seja administrativamente (ex.: recurso contra notificação de infração de trânsito) ou
judicialmente (ação de danos morais e materiais em função de uma abordagem policial ou prisão).
( ) o comportamento administrativo deve ser descrito na ordem jurídica, isto é, as ações dos
profissionais de segurança são veiculadas na legislação para fins de aplicação (ex.: fiscalização de ordem policial,
busca veicular, busca domiciliar, realização de prisão, etc.).
( ) devido a necessidade de se garantir continuidade à prestação de serviços em áreas essenciais
(segurança, saúde, educação, etc.) de forma célere e imediata, o agente público, para praticar uma conduta, não
tem a necessidade de provocar a manifestação do poder judiciário. Do contrário, pense na hipótese de se
aguardar a posição da justiça para a realização das ações preventivas de segurança pública ou nos casos de
resgate da paz social (ações de repressão – imediata e mediata).

3. Leia atentamente os seguintes casos:


Situação n° 01: A Central de Operações acionou uma equipe de policiais para averiguar uma ocorrência
de roubo a um estabelecimento comercial da periferia da cidade, praticado por um grupo de três pessoas
armadas. Ao chegar no local a equipe obteve a confirmação da ocorrência com o proprietário do
estabelecimento, o qual forneceu novas informações sobre os autores do fato, que se evadiram. Durante o
patrulhamento, os policiais identificaram algumas pessoas, cujas descrições e comportamento indicaram uma
semelhança com os autores do roubo. Ao avistarem a viatura policial 02 (duas) pessoas correram e entraram em
uma residência.

Situação n° 02: Grandes eventos esportivos serão realizados na cidade: campeonato de vôlei, futebol e
futsal. A Secretaria de Segurança Pública acionou os órgãos para realizar ações de prevenção com o objetivo de
proporcionar aos torcedores espetáculos seguros.

Agora, considerando as situações apresentadas, marque “V” para as alternativas “VERDADEIRAS” e


“F” para as alternativas “FALSAS”:

a. A abordagem ao grupo de pessoas pode ser baseada exclusivamente no tirocínio policial, na


experiência de ocorrências semelhantes, principalmente quando os indivíduos trajam um “kit peba”.
b. A “fundada suspeita”, prevista no art. 244 do CPP, não pode fundar-se em parâmetros unicamente
subjetivos (tirocínio policial, baseado na experiência), exigindo elementos concretos que indiquem a
necessidade da revista.
c. São condições de acesso e permanência do torcedor em evento esportivo, sem prejuízo de outras
condições previstas em lei, o consentimento da realização de revista pessoal de prevenção e segurança.

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d. O dever-poder de polícia corresponde à permissão social dada à Administração Pública para
restringir o exercício de direitos individuais em benefício de toda a sociedade. Empregado com
responsabilidade, trata-se de verdadeiro instrumento posto à disposição do Poder Público para disciplinar o
exercício desses direitos e liberdades ou ainda de contê-los, diante de eventuais excessos ou da necessidade de
se disciplinar determinadas relações (ex.: interdição de via pública para promoção das ações de segurança).

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Gabarito

1. Orientação de resposta:
a. Durante as ações de segurança pública algumas medidas interventivas são realizadas no sentido
de limitar as liberdades individuais, como o direito de ir e vir, durante a abordagem policial (busca à pessoa ou
veicular). Nesse contexto, o dever-poder de polícia constitui instrumento necessário para que seja
proporcionado à população um ambiente social livre de riscos e perigos.
b. As ações de segurança pública envolvem os bens mais caros para a sociedade (vida, liberdade,
integridade física, patrimônio, etc.). Diante disso, considerando o atributo da autoexecutoriedade, o agente
policial deve praticar as ações necessárias para promover a ordem pública e a proteção de pessoas e bens, sem
a necessidade de se aguardar uma posição do Judiciário, sob pena de se perder as condições necessárias para
cumprir aquela finalidade.
c. Na coercibilidade registra-se a possibilidade de se obrigar uma pessoa a cumprir a determinação
do policial, sob pena do uso da força, dentre outras medidas policiais (ex.: prisão). Trata-se de instrumento
necessário para a promoção da segurança da comunidade, posto que em determinadas situações,
inevitavelmente a força é o único meio para proteger pessoas e bens.
d. Embora não haja notícia concreta de que um crime esteja ocorrendo, a abordagem policial
realizada durante a intensificação de policiamento se justifica em função da necessidade de se prevenir a
ocorrência de crimes em determinados locais, cujo registro estatístico e análise criminal, apontam a necessidade
de se promover ações de segurança pública, como forma de garantir um ambiente social livre de riscos e perigos.
Dentro desse contexto, juridicamente falando, o dever-poder de polícia fundamenta esta ação, na medida em
que as limitações aos direitos são levadas a efeito em benefício do bem comum.
e. O Estatuto do Torcedor, art. 13-A, estabelece uma série de ações para garantir ao torcedor a
segurança no âmbito de um evento esportivo, como a busca pessoal, ainda que não haja a notícia de que um
crime esteja ocorrendo. A ideia é de que, com essa medida, haja um ambiente livre de riscos e perigos.

2. Resposta Correta: 3-1-4-2


3. Resposta Correta: F-V-V-V

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MÓDULO IMPLICAÇÕES PENAIS, CIVIS E ADMINISTRATIVAS
SOBRE A ABORDAGEM POLICIAL:
3 RESPONSABILIDADE DO CIDADÃO E DO AGENTE
POLICIAL

Apresentação do módulo

Todo profissional de segurança pública, já disse ou já ouviu algum colega dizer: “Fui xingado e não
admito. Isto é desacato! E ainda resistiu à minha ordem legal de entrar na viatura estando preso por desacato.
Então, prendi por desacato, desobediência e resistência”.

Mas, será que este desdobramento de uma abordagem pode trazer consequências penais para o
abordado e/ou para o profissional de segurança pública?
A resposta certamente é positiva, não precisando de qualquer auxílio técnico para isto. Por esse motivo,
é que neste módulo, você estudará as implicações penais em função do comportamento das pessoas
submetidas a uma abordagem policial (desobediência, desacato, resistência, etc.), bem como as
consequências penais que podem recair sobre o agente policial em razão da eventual inobservância das
regras e limites jurídicos (constrangimento ilegal, violação de domicílio, abuso de autoridade, tortura etc.).
Além disso, ao final do Módulo serão abordados alguns aspectos de processo disciplinar e improbidade
administrativa, ligados a eventuais responsabilizações nestas esferas em razão da atuação policial.

Objetivo do módulo

Ao final do módulo, você será capaz de:

• Identificar as implicações penais relacionadas ao comportamento das pessoas submetidas a uma


abordagem policial (desobediência, desacato, resistência, etc.);
• Reconhecer as consequências penais que podem recair sobre o profissional de agente policial em
razão da eventual inobservância das regras e limites jurídicos (constrangimento ilegal, violação de domicílio,
abuso de autoridade, tortura etc.).

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Estrutura do Módulo

Este módulo contempla as seguintes aulas:

• Aula 01 – Da responsabilidade penal do cidadão frente a uma atuação policial


• Aula 02 – Da responsabilidade penal dos agentes policiais na realização de uma abordagem
• Aula 03 – Implicações de ordem disciplinar ao policial
• Aula 04 – Da responsabilização por ato de improbidade administrativa ao policial

Aula 1 – Da responsabilidade penal do cidadão frente a uma


atuação policial

1.1 Breve introdução sobre a razão da tutela dos bens jurídicos pelo Direito Penal
Você estudou que para a existência de um Estado é necessário que os integrantes da sociedade firmem
um contrato social, abrindo mão de suas liberdades para obter benefícios e proteção do Poder Público. Para
tanto, nesse ambiente, as pessoas se submetem à autoridade estatal, que estabelece um conjunto de regras, as
quais ordenam as relações em sociedade para atingir o bem comum. Dentro desse cenário, considerando a
segurança, destaca-se o dever do Estado de preservar a ordem pública e promover um ambiente social livre de
riscos e perigos, seja em função da hostilidade da natureza ou do comportamento lesivo de outras pessoas.
Nessa relação entre os indivíduos que compõem a sociedade e o poder público, como forma de garantir
o seu perfeito funcionamento, algumas regras são impostas para regular a interação entre uns e outros. Vale
dizer, que os indivíduos cumprem sua parte ao respeitar e cumprir o conjunto de regras impostas pelo poder
público, sob pena de se submeterem à responsabilização nas esferas cível, administrativa ou penal, conforme o
caso.
Em termos penais, encontra-se a afirmação de que a norma penal tutela “valores fundamentais para a
subsistência do corpo social, tais como a vida, a saúde, a liberdade, a propriedade etc., denominados bens
jurídicos” (CAPEZ, 2011, p. 19). Normalmente as regras de Direito Penal surgem como tábua de salvação, na
medida em que os demais ramos do Direito não foram suficientes para proteger esses bens, isso porque a
resposta penal costuma ser mais severa, recaindo sobre a liberdade e os bens do autor de uma infração, dentre
outras medidas.
Assim, para resgatar equilíbrio na sociedade (paz social), quando uma pessoa, com seu comportamento,
ofende a um bem jurídico penalmente tutelado, instaura-se o que se chama de persecução penal (jus puniendi).
Em outras palavras, quando alguém pratica uma infração penal (crime/delito ou contravenção penal), seja em
flagrante delito (CPP, arts. 301 e 302 ou CPPM, arts. 243 e 244), seja após o indiciamento decorrente de inquérito
policial comum ou militar ou em um termo circunstanciado (art. 69 da Lei n° 9.099/1995), o Estado exercerá o
direito de punir (jus puniendi), após o devido processo legal (CF/88, art. 5°, LV)

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Boa parte das persecuções penais se origina durante a atuação dos profissionais de segurança pública,
abrangendo aí o emprego da busca pessoal, domiciliar ou veicular.
Lembra-se daquela operação em que você teve que realizar uma abordagem, oportunidade em que
encontrou armas de fogo, entorpecentes, objetos oriundos de roubo e furto, dentre outros?
É dela que estamos falando!

Vale dizer, várias são as ocorrências em que, no momento da abordagem, determinadas pessoas
reagem à atuação do agente policial. Dentre elas destacam-se:
Desobediência: quando o indivíduo não cumpre ou não atende à determinação legal;
Desacato: quando o indivíduo desrespeita, desprestigia ou ofende o policial;
Resistência: quando o indivíduo se opõe à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça;
Corrupção ativa: quando o indivíduo oferece ou promete vantagem indevida a fim de provocar a
omissão ou retardamento de ato de ofício;
Contravenção penal: quando o indivíduo se recusa a fornecer dados sobre a própria identidade ou
qualificação.

Importante!
Vale lembrar também que o profissional, aplicando as técnicas adequadas, respaldado nos aspectos
jurídicos desse procedimento (vide Módulos 1 e 2), passa a refletir sobre as eventuais providências a
serem adotadas em face desse comportamento.

Estude a seguir cada uma das infrações penais apresentadas anteriormente.

1.1 Da desobediência
O Código Penal – CP estabelece em seu artigo 330 o seguinte:

Art. 330. Desobedecer a ordem legal de funcionário público:


Pena — detenção, de quinze dias a seis meses, e multa.

De acordo com a doutrina (LENZA, 2011, p. 749), trata-se de comportamento intencional (doloso) em
que a pessoa deixa de cumprir ou não atende à ordem (legal) do policial.
Da leitura desse dispositivo, depreende-se que, para a configuração do crime, é indispensável que
sejam preenchidos os seguintes requisitos:

Existência de uma ordem


Significa determinação, mandamento. Assim, quando a pessoa deixa de atender um simples pedido ou
uma solicitação não há o crime.

61
Legalidade da ordem
Pelo princípio da legalidade (CF/88, art. 37, caput), a determinação dada pelo agente deve estar
prevista em uma norma. Se não houver regra que determine a pessoa a fazer ou deixar de fazer algo (CF/88,
art. 5°, inciso II), não há o crime em tela, principalmente em se tratando da imposição de restrição de direitos e
garantias fundamentais. Qualquer do povo pode prender, o policial deve!

Profissional de segurança pública com competência para a prática do ato


Um dos elementos para que o ato administrativo seja aperfeiçoado é a competência do servidor para
prática do ato, conforme previsão legal (ex.: notificação de trânsito, abordagem policial).
Tais requisitos costumam ser citados no âmbito da justiça, como ocorreu no seguinte precedente:

Para a configuração do delito de desobediência, imprescindível se faz a cumulação


de três requisitos, quais sejam, desatendimento de uma ordem, que essa ordem seja
legal e que emane de funcionário público. Não há norma jurídica que determine que
a conduta mencionada no art. 330 do CP somente possa ser praticada por particular.
Recurso provido. (STJ. 5ª Turma. Resp. 491.212- RS. Rel. Min. José Arnaldo da
Fonseca. Julgado em 07 out 2003, DJU 10.11.2003, p. 205.)

Em termos práticos, o exemplo que se pode construir é o das condições de acesso e permanência do
torcedor no recinto esportivo, conforme citado no Módulo 2 (Lei 10.671/2003 - Dispõe sobre o Estatuto de
Defesa do Torcedor, art. 13-A):

Art. 13-A. São condições de acesso e permanência do torcedor no recinto esportivo,


sem prejuízo de outras condições previstas em lei: (Incluído pela Lei nº 12.299, de
2010).
I - estar na posse de ingresso válido; (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).
II - não portar objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou
possibilitar a prática de atos de violência; (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).
III - consentir com a revista pessoal de prevenção e segurança; (Incluído pela Lei nº
12.299, de 2010).
IV - não portar ou ostentar cartazes, bandeiras, símbolos ou outros sinais com
mensagens ofensivas, inclusive de caráter racista ou xenófobo; (Incluído pela Lei nº
12.299, de 2010).
V - não entoar cânticos discriminatórios, racistas ou xenófobos; (Incluído pela Lei nº
12.299, de 2010).
VI - não arremessar objetos, de qualquer natureza, no interior do recinto
esportivo; (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).
VII - não portar ou utilizar fogos de artifício ou quaisquer outros engenhos
pirotécnicos ou produtores de efeitos análogos; (Incluído pela Lei nº 12.299, de
2010).

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VIII - não incitar e não praticar atos de violência no estádio, qualquer que seja a sua
natureza; e (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).
IX - não invadir e não incitar a invasão, de qualquer forma, da área restrita aos
competidores. (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).
X - não utilizar bandeiras, inclusive com mastro de bambu ou similares, para outros
fins que não o da manifestação festiva e amigável. (Incluído pela Lei nº 12.663, de
2012).
Parágrafo único. O não cumprimento das condições estabelecidas neste artigo
implicará a impossibilidade de ingresso do torcedor ao recinto esportivo, ou, se for
o caso, o seu afastamento imediato do recinto, sem prejuízo de outras sanções
administrativas, civis ou penais eventualmente cabíveis. (Incluído pela Lei nº 12.299,
de 2010).

Observações:
- Pela leitura da norma penal secundária do crime de desobediência (sanção penal de detenção, de
quinze dias a seis meses, e multa), na forma do art. 61 da Lei n° 9.099/1995 (Lei dos Juizados Especiais) , o
delito é de menor potencial ofensivo, exigindo lavratura de termo circunstanciado, desde que preenchidos os
requisitos do art. 69 dessa lei.
- Configura resistência se a recusa do agente for realizada com violência ou ameaça contra o policial.
- A recusa no fornecimento de identificação caracteriza a contravenção do art. 68 da Lei das
Contravenções Penais – Decreto-Lei n° 3.688, de 03/10/1941.
- Prefeitos que, imotivadamente, não cumprem ordem de autoridade judiciária praticam o crime de
desobediência contido no art. 1º, XIV, do Decreto-Lei n° 201/67*.
*Dispõe sobre a responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores, e dá outras providências.)
- Alguns precedentes judiciais consideram que, se uma norma civil ou administrativa fixar punição para
um ato de mesma natureza (desobedecer), e não prever a cumulação com a sanção penal, não restará
configurado o crime em apreço (ex.: o art. 195 do Código de Trânsito Brasileiro prevê multa àqueles que
desrespeitam ordens dos agentes de trânsito - de parada, por exemplo, mas não ressalva a aplicação autônoma
do crime de desobediência (STF. 2ª Turma. HC 88.452-1-RS. Rel. Min. Eros Grau. Julgado em 02 mai. 2006, DJU
19 mai. 2006, p. 43.)

1.2 Do desacato
Esse tipo está previsto no artigo 331 do Código Penal:

Art. 331. Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela:


Pena — detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

Trata-se de conduta dolosa, na qual o agente ofende, desprestigia ou desrespeita o profissional de


segurança pública. A prática pode ser efetivada por qualquer meio de execução: vias de fato, palavras, gestos,
dentre outros. São casos comuns os sinais ofensivos de empurrão ou de xingamentos ao policial durante uma
63
abordagem. Há ainda a reação de amassar, rasgar e jogar no chão um mandado de intimação. Tocar
ofensivamente o rosto do policial com a mão ou retirar-lhe a cobertura. Jogar lata de cerveja no policial.
O desacato pode ser praticado quando dirigido ao policial de serviço (escalado), ou quando estando
de folga, se referir às suas atribuições. É importante que fique claro o meio de execução empregado para
desacatar, realizado na presença do profissional de segurança, constando inclusive o emprego de palavras
obscenas e grosseiras no momento de sua prática. Caracteriza o crime mesmo que o servidor não se julgue
ofendido, na medida em que a norma penal tem o fim de tutelar o cargo e não a pessoa.

Observações:
- Considerando que a sanção penal é de detenção, de seis meses a dois anos e multa, o delito é de
menor potencial ofensivo (art. 61 da Lei n° 9.099/1995), exigindo lavratura de termo circunstanciado, desde que
preenchidos os requisitos do art. 69 dessa lei.
- Caso a ofensa seja realizada na ausência do servidor, haverá o crime de injúria qualificada (CP, art.
140, combinado com o art. 141, II).
- Não se exige que o ofensor e o policial estejam cara a cara, podendo estar em recintos diferentes,
mas próximos, sendo possível o próprio profissional de segurança ouvir o comentário ou perceber a reação.
- A divulgação não é requisito do crime, razão pela qual restará configurado mesmo se não for
presenciado por outras pessoas.
- Será resistência, e não desacato, se a agressão tiver o objetivo de impedir o cumprimento de um
procedimento policial.

1.3 Da resistência
O crime de resistência está previsto no art. 329 do CP, com o seguinte conteúdo:

Art. 329 - Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a


funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio:
Pena - detenção, de dois meses a dois anos.
§ 1º - Se o ato, em razão da resistência, não se executa:
Pena - reclusão, de um a três anos.
§ 2º - As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à
violência.

Como se pode ver, o delito citado existirá quando uma pessoa utilizar de violência ou ameaça (não
precisa ser grave) para impedir ou obstruir um procedimento legal, realizado pelo profissional de segurança
pública competente, por exemplo, para evitar uma prisão ou uma reintegração de posse.

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Observações:
- O crime previsto no caput é de menor potencial ofensivo (art. 61 da Lei n° 9.099/1995), porquanto a
sanção penal é de detenção, de dois meses a dois anos, exigindo lavratura de termo circunstanciado, desde que
preenchidos os requisitos do art. 69 dessa lei. O que não ocorre com o § 1°, na medida em que a pena é de
reclusão, de um a três anos.
- A violência tem significado de uso da força física, um ato indevido de agressão física. Tem que ser
dirigida contra a pessoa do policial ou do terceiro que o auxilia (Ex.: investigador de polícia vai cumprir mandado
de prisão e é ajudado por alguém que acaba agredido). Se a violência for dirigida contra uma coisa (ex.: viatura
policial, poste de iluminação, porta, parede, etc.), pode configurar o delito de dano qualificado.
- Não haverá o crime se a resistência for passiva, isto é, aquela em que não há emprego de violência
ou ameaça. Lembre-se do clássico exemplo da pessoa que se segura em um poste para não ser levado à
delegacia. Ou ainda sai correndo ou se joga no chão para não ser detido: “A simples fuga do infrator, ao ser
preso, não configura o delito de resistência, que exige para sua caracterização a presença dos requisitos da
violência ou ameaça contra funcionário”. (TJSP. Tacrim-SP. Rel.: Mattos Faria, Jutacrim 10/249.)
- A ameaça pode ser escrita ou verbal, não precisando ser grave. O procedimento praticado pelo policial
deve ser legal quanto ao conteúdo e à forma (modo de execução). Sendo ordem ilegal, a violência ou ameaça
empregada contra ela não configura a resistência, como ocorre nos casos de detenção para averiguação: “Um
dos elementos caracterizadores da resistência é a oposição a uma ordem legal. Ora, se esta é abusiva, portanto,
antijurídica, não se pode falar na existência do delito em questão”. (TJSP. Tacrim-SP. Rel.: Camargo Aranha. RT
461/378.)
- A resistência só ocorre se a violência ou a ameaça forem empregadas contra a prática do
procedimento policial. Assim se empregadas após a prisão ou a reintegração, não há o crime de resistência, mas
o delito de lesão corporal (art. 129) ou de ameaça (art. 147).
- Se a violência for empregada para proporcionar um ato de fuga, após a prisão ter sido realizada, não
haverá resistência, mas o crime de evasão mediante violência contra a pessoa (CP, art. 352).
- Não há resistência se o agente policial for incompetente para determinar a ordem ou realizar o
procedimento, por exemplo, para que a pessoa desocupe terreno invadido, mas não tem documento judicial
ordenando a retirada.

1.4 Da corrupção ativa


O art. 333 do Código Penal veicula o crime de corrupção ativa nos seguintes termos:

Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para


determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº
10.763, de 12.11.2003)
Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou
promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo
dever funcional.

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Na maioria das vezes essa infração penal é cometida de forma oral. Contudo, é possível que a oferta
ou a promessa de vantagem indevida sejam feitas por escrito ou com gestos (estender o dinheiro ou abrir um
talão de cheques). Como se vê, a norma penal busca sancionar a iniciativa do particular de praticar essas
condutas, a fim de obter benefícios com a ação ou omissão de um policial. Ao oferecer, o agente disponibiliza
imediatamente dinheiro ou valores ao profissional de segurança pública (ex.: para evitar notificação de trânsito,
uma pessoa entrega furtivamente ao policial uma quantia em dinheiro). Ao prometer, o cidadão garante a
entrega de uma vantagem ao policial.
Sobre esse delito, a doutrina construiu as seguintes variações:

Conduta do Agente Conduta do Policial Delito Configurado

Oferece a vantagem indevida Recusa-se Corrupção ativa

Oferece a vantagem indevida Recebe Corrupção ativa e corrupção


passiva
Promete a vantagem indevida Não aceita Corrupção ativa

Promete a vantagem indevida Aceita Corrupção ativa e também


passiva
Concorda ou não Solicita a vantagem Corrupção passiva

Quadro 1 – Variações de Corrupção Ativa


Fonte: LENZA, 2011, p. 759

Na corrupção ativa, o autor da oferta ou promessa visa o seguinte:


- Para que um delegado de polícia demore a concluir um inquérito policial, para que aconteça a
prescrição.
- Para que o policial não preencha a notificação de trânsito.
- Autoridade de trânsito emite Carteira de Habilitação a quem não passou no exame (nesse caso, há
também crime de falsidade ideológica).

Observações:
- Se a pessoa se dirige insistentemente verbalizando ao policial para “dar um jeitinho” ou “quebrar o
galho”, não há a corrupção ativa, porque não houve a oferta nem a promessa de vantagem indevida. De outro
lado, caso o policial dê “o jeitinho” e não pratica o ato que deveria, responderá por corrupção passiva
privilegiada (CP, art. 317, §2 º), tendo o particular como partícipe, em razão do induzimento. Agora, caso o
funcionário público não dê “o jeitinho”, o fato é atípico.
- Não há crime de corrupção ativa se o particular oferece a vantagem para evitar que o profissional de
segurança pratique contra ele algum ato ilegal.

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- No período eleitoral, a corrupção praticada para obter voto configura o delito previsto no art. 299 do
Código Eleitoral (Lei n. 4.737/65).
- A corrupção ativa de testemunhas, peritos, tradutores ou intérpretes, não oficiais, constitui o crime do
art. 343 do Código Penal.

1.5 Recusa de dados sobre própria identidade ou qualificação


Trata-se de contravenção penal, tipificada no art. 68 do Decreto-Lei n° 3.688, de 03/10/1941:

Art. 68. Recusar à autoridade, quando por esta justificadamente solicitados ou


exigidos, dados ou indicações concernentes à própria identidade, estado, profissão,
domicílio e residência:
Pena — multa.
Parágrafo único. Incorre na pena de prisão simples, de 1 (um) a 6 (seis) meses, e
multa, se o fato não constitui infração penal mais grave, quem, nas mesmas
circunstâncias, faz declarações inverídicas a respeito de sua identidade pessoal,
estado, profissão, domicílio e residência.

A título de exemplo, imagine aquela situação na qual o cidadão impõe algumas dificuldades para a
realização da abordagem policial, dentre elas a de não informar nome, local de residência, identidade, profissão
etc. Sabe-se que não há nenhuma norma que obrigue as pessoas a portarem carteira de identidade, razão
pela qual você não poderá exigi-la da pessoa (CF/88, art. 5°, II), sob pena de incorrer em abuso de autoridade
ou constrangimento ilegal, conforme o caso. Mas a pessoa deve lhe dizer os dados solicitados, ou incorrerá na
contravenção do art. 68 da LCP.
Como se vê, o tipo penal tem o objetivo de proibir condutas que criem obstáculos à identificação ou
qualificação das pessoas pelas autoridades (judiciária, policial ou administrativa). A identidade é o “conjunto de
dados que tornam uma pessoa diferente das demais. Identidade civil: nome, data e lugar de nascimento, filiação
etc. Identidade física: estatura, cor, sexo etc.” (DAMÁSIO, 2010, p. 133).
No caso em que o abordado esteja sem qualquer identificação, contudo informa seus dados sem
apresentar documento para confirmar, o policial pode conduzi-lo até a delegacia pela contravenção?
Seria possível ao policial ao menos conduzir a pessoa até a delegacia para confirmar seus dados?
Ou o policial incorreria em abuso de autoridade?

Observações:
- Em razão das penas cominadas, trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo (art. 61 da Lei
n° 9.099/1995), exigindo lavratura de termo circunstanciado, desde que preenchidos os requisitos do art. 69
dessa lei.
- A contravenção só existe se o policial estiver no exercício de suas atribuições por ocasião da solicitação
ou exigência, do contrário, o fato é atípico.
- Se a pessoa abordada se recusa num primeiro momento e em seguida presta as informações sua
identidade, não haverá a contravenção penal.

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- Se houver o crime de uso de documento falso, a contravenção de recusa de identificação fica
absorvida (RF, 317:328 e 309:235).

Você sabe apontar a diferença entre o art. 307 do Código Penal e o art. 68 da Lei das Contravenções
Penais?

No art. 307 do CP, ao recusar o fornecimento de dados identificadores, o autor do crime busca
vantagem para si. Por exemplo, seria o caso daquele que, por constar como “procurado” da Justiça, fornece ao
policial documento de seu irmão, passando-se por ele, para não ser preso.
Já na contravenção penal a recusa não traz benefício algum para o sujeito passivo. Lembre-se, não há
lei que obrigue as pessoas a portarem documento que as identifique. Entretanto, há obrigação para que se a
forneça os dados que possibilitem a identificação de alguém.
De outro lado, cabe reforçar que, de acordo com o § 1° do art. 159 do Código de Trânsito Brasileiro –
CTB, se alguém estiver na direção de um veículo automotor, é obrigatório portar a Carteira Nacional de
Habilitação ou a Permissão para Dirigir.
Como se vê, verifica-se que, ao realizar uma abordagem legítima, você sabe que diante da recusa do
cidadão em identificar-se, no mínimo existe uma contravenção penal.
Até aqui foram abordados os tipos penais mais comuns ocorridos durante uma abordagem policial,
que podem ser praticados por qualquer pessoa. Assim, a depender da conduta, é possível que outros crimes
existam, exigindo de você a adoção de providências cabíveis.

Aula 2 – Da responsabilidade penal dos agentes policiais na


realização de uma abordagem

No exercício das atribuições o agente policial eventualmente pode se exceder nos limites do uso da
força, e seu comportamento pode caracterizar um ilícito penal. Dentro desse contexto, você terá a
oportunidade de identificar os tipos penais de maior ocorrência durante uma abordagem policial, na qual o
profissional poderá ser responsabilizado.

Quando você iniciou os estudos desse curso, algumas perguntas foram lançadas. Lembra-se? A
abordagem policial somente pode ser realizada diante de uma fundada suspeita? É certo dizer que as pessoas
não podem ficar nas esquinas sem fazer nada até tarde da noite? Quem define quando o policial deve
abordar? O policial pode abordar qualquer pessoa e quando quiser? Para garantir a segurança de todos, o
policial pode fazer o que quiser?

Tendo em vista o que estudamos nos dois primeiros módulos, a essa altura você já teve ter condições
de discutir sobre cada uma dessas perguntas.
68
No Módulo 01 você estudou sobre o papel do Estado no âmbito da segurança pública, várias vezes
repetidas durante o curso, assim como os direitos e garantias fundamentais e as convenções internacionais
com reflexo na atividade policial. Percebeu no Módulo 02 que, para cumprir esse papel, o poder público
recebe prerrogativas, através do uso legítimo da força, concretizado principalmente através do exercício do
dever-poder de polícia. Entretanto, a fim de evitar os desvios, abusos e as arbitrariedades no uso desse poder,
existem limites, estipulados. Num primeiro momento, através dos direitos e garantias fundamentais (Módulo
01), num segundo momento, através das sujeições (Módulo 02 - prestação de contas, atendimento do
interesse público, proporcionalidade das ações, etc.).

Mas, e se...
O policial intervier de forma equivocada, cerceando a liberdade de uma pessoa de maneira indevida?
E se ele ingressar em um domicílio desrespeitando o que estabelece o texto constitucional? E se ele atentar
indevidamente contra a integridade física de alguém? Qual a consequência?

2.2 Analisando o abuso de autoridade

2.2.1 Aspectos gerais


Ao tratar do tema, Silvio Maciel (2010, p. 15) faz menção à lição de Montesquieu, no sentido de que
todo homem tem a tendência de abusar do poder que detém. E isso ficou comprovado com a história
humana. De outro lado, para evitar os desvios no uso desse poder, algumas regras foram definidas para limitá-
lo (direitos e garantias fundamentais - vide Módulo 1, art. 5º da CF/88).
Assim, uma das normas que busca garantir o cumprimento dos direitos e garantias fundamentais é a
Lei n° 4.898/1965, objeto de nosso estudo, que “regula o Direito de Representação e o processo de
Responsabilidade Administrativa Civil e Penal, nos casos de abuso de autoridade”. Nela se evidencia que o ato
do abuso de autoridade enseja uma responsabilização em três esferas: administrativa (disciplinar), civil
(danos morais e materiais) e penal, sem prejuízo da responsabilização do Estado (CF/88, art. 37, §6°).
Normalmente o abuso de autoridade é noticiado através de uma representação realizada pela pessoa
interessada (vítima/ofendido, representante legal, etc.), seguindo os requisitos do art. 2º da Lei nº 4.898/1965.
Essa representação pode ser dirigida à autoridade administrativa superior do agente policial, assim como
registrada em uma delegacia ou direcionada ao ministério público.

Agora e se não houver representação? O crime pode deixar de ser apurado e o autor do fato ficar
impune?
De acordo com a Lei n° 5.249, de 9 de dezembro de 1967, “a falta de representação do ofendido, nos
casos de abuso previstos na Lei n. 4.898, de 9 de dezembro de 1965, não obsta a iniciativa ou o curso de ação
pública”. Portanto, tomando conhecimento sobre a ocorrência do fato, a autoridade competente deverá
adotar as medidas necessárias para sua apuração. Até porque se trata de ação penal pública incondicionada,
na forma do art. 12 da Lei n° 4.898/1965.

69
Nesse sentido, a apuração da conduta pode ser realizada por procedimento administrativo em geral,
sindicância, inquérito policial, procedimento administrativo no âmbito do ministério público, etc. Daí advém a
responsabilização nas esferas acima citadas.
De um lado, a Lei tem por objetivo proteger o normal funcionamento da administração pública,
tomada em sentido amplo. Em outras palavras, busca garantir que o serviço público seja prestado em
condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade. De outro lado, a
norma tem por fim tutelar os direitos e garantias fundamentais.
Nesse âmbito, tanto o Estado quanto a pessoa submetida à intervenção abusiva são sujeitos passivos
(vítimas/ofendidos). Se a vítima do abuso for uma criança ou adolescente, o autor da conduta responderá na
forma do Estatuto da Criança do Adolescente, art. 230 e seguintes da Lei n° 8.069/1990.
O autor do fato (sujeito ativo), para a Lei, é aquele que exerce cargo, emprego ou função pública, de
natureza civil ou militar, mesmo que de maneira temporária e sem receber remuneração (art. 5°). É o que a
doutrina chama de crime próprio, isto é, exige-se especial condição de quem pratica a conduta criminosa.

Importante!
Fique atento! Existem situações em que o autor do abuso, mesmo não estando no exercício de suas
funções, comete o crime em tela. Isso ocorre quando o funcionário, apesar de não estar escalado,
cumprindo suas atribuições, pratica um ato invocando a condição de autoridade de que é investido,
conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal:

Crime de abuso de autoridade. Comete-o o miliciano que, embora, sem farda e fora
do efetivo exercício de sua função, age, evocando a autoridade de que e investido.
Exegese do art. 5° da lei n. 4.898/65. Competente, todavia, para o processo e
julgamento, e a justiça comum estadual, eis que inexistente crime militar. "habeas
corpus" indeferido SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Segunda Turma. HC 59676,
Relator(a): Min. DJACI FALCAO, julgado em 16/04/1982, DJ 07-05-1982 PP-04269
EMENT VOL-01253-01 PP-00114.

O delito de abuso de autoridade é punido a título de dolo (intenção de praticar o ato), ou seja, o autor
da conduta tem consciência de que esteja exorbitando do poder.

Saiba mais...
Uma pessoa não enquadrada no conceito de autoridade, na forma do art. 5°, pode responder pelo
crime em lide, desde que seja na condição de partícipe, conforme estabelece o art. 29 do Código Penal. Com
efeito, responde aquela pessoa que estiver acompanhada de um policial, sabendo de suas intenções, e o auxilia
de alguma forma para que o crime aconteça. Isso ocorre, por exemplo, na hipótese em que o indivíduo fornece
instrumentos para a prática do ato, ou quando conduz o profissional de segurança para o local onde se encontra
a vítima.

70
2.3 Tipos penais
Agora que você já estudou sobre alguns aspectos gerais da Lei do abuso de autoridade, seria
interessante olhar para cada conduta que pode caracterizar esse tipo penal. Lembre-se que o objeto do estudo
dessa norma está relacionado à abordagem policial. Diante disso, dê uma atenção aos artigos 3° e 4° da Lei e
identifique o tratamento dado aos seguintes temas:

 Liberdade de locomoção;
 Inviolabilidade de domicílio;
 Sigilo de correspondência;
 Liberdade de consciência e de crença;
 Direitos e garantias legais assegurados ao exercício do voto;
 Direito de reunião;
 Incolumidade física do indivíduo;
 Direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional;
 Ordenar ou executar medida privativa de liberdade, sem as formalidades legais ou com abuso
de poder;
 Submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado
por lei;
 Ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com abuso
ou desvio de poder, ou sem competência legal.
As condutas elencadas no art. 3° não admitem a modalidade tentada, na medida em que a lei pune o
simples atentado como delito consumado - crimes de atentado (CAPEZ, 2012, p. 24).

A seguir, você estudará alguns dos tipos mais comuns envolvendo a atuação policial, que
merecem sua atenção.

2.3.1 Atentado à liberdade de locomoção (art. 3°, alínea “a”)

O direito à liberdade de locomoção encontra seu fundamento no primeiro inciso XV, art. 5°, da CF/88,
que diz: “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da
lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”. A simples leitura do texto permite inferir que, a contrario
sensu, em tempo de guerra, limitações poderão ser impostas a esse direito, quando houver questões de
segurança nacional.
José Afonso da Silva (1999, p. 240) ensina que a liberdade de locomoção é a principal forma de
expressão da liberdade da pessoa física, conceituada essa liberdade como a “possibilidade que se reconhece a
todas as pessoas de serem senhoras de sua própria vontade e de locomoverem-se desembaraçadamente dentro
do território nacional”.

71
O direito à liberdade de locomoção engloba o acesso, ingresso e saída do território nacional, bem
como a permanência e deslocamento, direito de ir, vir, dentro dele. O referido direito toca tanto os brasileiros
como os estrangeiros, sejam ou não residentes no Brasil.
Uma pergunta: a abordagem policial, por limitar o direito de ir e vir do cidadão, mesmo que
temporariamente, constitui abuso de autoridade, como sugerem algumas pessoas?
Resgatando os ensinamentos do Módulo 2, a abordagem policial representa autêntico desempenho
das atribuições da polícia para preservar a ordem pública e assegurar um ambiente social livre de riscos e
perigos, seja para promover uma orientação de caráter geral, seja para verificar e assegurar a normalidade de
um local, seja para identificar uma pessoa que tenha eventualmente praticado um delito. Entretanto, e conforme
já ficou assentando naquele módulo, tal medida deve seguir os critérios de proporcionalidade, dentre outros
requisitos já estudados (volte ao módulo para relembrar). Com efeito, dentro dessas condições, não há que se
falar em abuso de autoridade, posto que medida consentânea com o estado democrático de direito. Nesse
sentido, destaca-se a posição de Fernando Capez (2012, p. 26):

Com base no art. 244 do CPP, é possível a interceptação de um veículo ou de um


transeunte sempre que haja suspeita de que transporte ou esteja na posse de arma
proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito. Da mesma forma,
com base no poder de polícia, não haverá atentado à liberdade de locomoção, por
exemplo, na hipótese em que a autoridade, realizando barreira policial, vistoria
veículos e realiza a identificação dos seus condutores, ou quando concretiza blitz em
boates com o fim de apreender substâncias entorpecentes. É que, no caso, agem as
autoridades no intuito de prevenir e reprimir a prática de crimes, hipótese em que
está configurado o estrito cumprimento do dever legal. Obviamente que elas devem
agir dentro dos rígidos limites de seu dever, fora dos quais desaparece essa
excludente da ilicitude. Os excessos cometidos poderão constituir crime de abuso
de autoridade.

2.3.2 Atentado à inviolabilidade de domicílio (art. 3°, alínea “b”)


Você já estudou no Módulo 2 as principais questões referentes à garantia constitucional para preservar
a inviolabilidade do domicílio (CF/88, art. 5°, inciso XI – “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela
podendo penetrar sem consentimento do morador...”; CP, art. 150), inclusive sobre o que entende por casa.
Nesse sentido, pratica abuso de autoridade, por incidência na letra “b”, do art. 3°, o policial que, no
exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las, entre ou permanece em casa alheia ou em suas
dependências, sem o consentimento de seu morador. Mesmo as autoridades policiais estão sujeitas ao fiel
observância do princípio da inviolabilidade de domicílio.
Lembre-se, a Constituição de 1988 autoriza o ingresso no domicílio para os seguintes casos:
• com consentimento do morador, à noite ou durante o dia;
• em caso de flagrante delito, à noite ou durante o dia;
• para prestar socorro, à noite ou durante o dia;
• em caso de desastre, à noite ou durante o dia;
72
• mediante mandado, isto é, ordem escrita do juiz competente durante o dia.

Com efeito, não há que se falar em abuso de autoridade nessas hipóteses.

Observações:
- Havendo consentimento do morador, o ingresso é permitido em qualquer momento, seja de dia ou
à noite;
- Inexistindo consentimento, o ingresso a qualquer hora do dia ou da noite, somente pode ocorrer em
caso de flagrante delito, desastre ou para prestar socorro;
- A expressão “dia” compreende o período entre a aurora e o crepúsculo; alguns sustentam que seja no
período que vai das seis às dezoito horas;
- O mandado judicial não poderá ser cumprido no período noturno, a não ser que o morador concorde.
Assim, não resta outra opção senão a de se aguardar até o amanhecer. Do contrário, pratica-se abuso de
autoridade.

2.3.3. Atentado ao sigilo da correspondência (art. 3°, alínea “c”)


Você já viu nesse curso que o sigilo da correspondência é abarcado pela proteção constitucional (art.
5º, XII). De acordo com Capez (2012, p. 28), “Correspondência por carta, ou epistolar, é a comunicação por meio
de cartas ou qualquer outro instrumento de comunicação escrita.”. Admite-se a restrição desse direito
constitucional quando envolver colisão de direitos fundamentais. Nesse sentido, Capez (apud, 2012, p. 29) cita
a lição de J.J Gomes Canotilho:

De fato, não se justifica o sigilo absoluto em todos os casos. Ao invés, sua quebra é
necessária para evitar a tutela oblíqua de condutas ilícitas ou práticas contra legem.
A doutrina constitucional moderna é cediça nesse sentido, porque as garantias
fundamentais do homem não podem servir de apanágio à desordem, ao caos, à
subversão da ordem pública. Realmente, nenhuma liberdade individual é absoluta.
Comporta exceções para preservar o ditame da legalidade. Portanto, afigura-se
possível, observados os requisitos constitucionais e legais, a interceptação das
correspondências e das comunicações telegráficas e de dados, sempre que as
liberdades públicas estiverem sendo utilizadas como instrumento de salvaguarda de
práticas ilícitas.

Daí porque, por exemplo, durante uma busca domiciliar, seja cabível apreender cartas, abertas ou não,
destinadas a alguém acusado de praticar delito ou que estejam em seu poder e que o seu conteúdo sirva de
elemento para esclarecer um delito, conforme preceitua o art. 240, § 1º, f, do CPP. Ainda define o art. 243, § 2°,
desse Código que é cabível a apreensão de documento em poder do defensor do acusado, quando constituir
elemento do corpo de delito. Nesse ponto, vale a leitura do art. 7º, §§ 6º e 7°, do Estatuto da OAB – Lei n°
8.906/1994:

73
§ 6o Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de
advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da
inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada,
expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser
cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese,
vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a
clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho
que contenham informações sobre clientes. (Incluído pela Lei nº 11.767, de 2008)
§ 7o A ressalva constante do § 6o deste artigo não se estende a clientes do advogado
averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou
coautores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade.
(Incluído pela Lei nº 11.767, de 2008)

Vale destacar a relevância do tema que trata do sigilo de correspondência epistolar do preso no
âmbito do sistema penitenciário, quando há notícias de que este instrumento de comunicação esteja servindo
de base para planejamento e execução de atos criminosos. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal decidiu
que:

A administração penitenciária, com fundamento em razões de segurança pública,


pode, excepcionalmente, proceder à interceptação da correspondência remetida
pelos sentenciados, eis que a cláusula da inviolabilidade do sigilo epistolar não pode
constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas.

De outro lado, caracterizado o abuso, ou seja, a ausência de justificativa para proceder na violação do
direito aqui estudado, o agente policial incorrerá no delito previsto no art. 3º, c, da Lei n. 4.898/65. Capez (2012,
p. 31) salienta que estando a carta aberta não há que se falar em sigilo, somente quando estiver fechada.

2.3.4 Do Atentado à liberdade de consciência e de crença e ao livre exercício do culto religioso


(art. 3°, alínea “e”)
Esse direito está previsto no art. 5º, VI, da CF: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença,
sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais
de culto e às suas liturgias”. Com efeito, incorre em abuso de autoridade o profissional de segurança pública
que praticar abordagem com o intuito de coibir o exercício legítimo desse direito, sem que haja motivo para a
intervenção policial.
De outro lado, é possível impedir a realização de cultos que atentem contra a moral ou ponha em risco
a ordem pública, assim como reprimir a prática de curandeirismo, sacrifício de animais ou excesso de som.

2.3.5 Direito de reunião (art. 3°, alínea “h”)


O art. 5º, inciso XVI, da Constituição estabelece que: “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas,
em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião
anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”.
74
Lembre-se que vivenciamos um regime político no qual a vontade do povo deve ser respeitada. A reunião
constitui uma maneira de exercer o domínio popular, pois é por meio dela que a sociedade registra suas
pretensões, insatisfações e apoio àquilo que lhe convém.
Assim, os excessos violentos cometidos por agências policiais, coibindo abusivamente esse direito,
enseja a responsabilização na forma da Lei do abuso de autoridade.
De outro lado, os excessos cometidos no exercício desse direito também podem e devem ser coibidos.
Não se admitem, então, passeatas violentas, manifestações que prejudiquem o direito de outras pessoas. Daí
porque, por razões de segurança pública, os espaços para a realização dessas reuniões podem sofrer
delimitações, como na frente de um hospital, escolas durante as aulas, logradouros que não comportam a
atividade em análise, etc. (MACIEL, 2010, p. 28).

2.3.6 Atentado à incolumidade física do indivíduo (art. 3°, alínea “i”)


O abuso de autoridade contido na letra “i” do art. 3° consiste em toda ofensa física concretizada pelo
policial, quando no exercício de suas funções. É irrelevante que a conduta tenha deixado vestígio, pois a violência
exigida se caracteriza pelo emprego da força física, maus-tratos ou vias de fato. Nesse sentido, foi o que
reconheceu o Judiciário no seguinte precedente:

Abuso de autoridade. Vias de fato. Delitos caracterizados. Procede com abuso de


autoridade o agente policial que, sob pretexto de averiguar uma briga ocorrida
anteriormente, leva várias pessoas à delegacia de polícia e agride arbitrariamente
um menor, com tapas no rosto, na presença do pai. (TJSC. Jur. Catarinense 26/466)

Importante!
Por certo, nem toda violência cometida por agente público deve ser levada à condição de abuso de
autoridade. Há situações em que o recurso da violência é permitido e necessário, inserindo-se no
estrito cumprimento de dever legal, como exemplo, a violência (força legítima) utilizada por policiais
para prender alguém em flagrante ou em virtude de mandado judicial, quando houver resistência ou
tentativa de fuga (sobre a questão do uso da violência legítima, vide Módulo 1).

Lembre-se do que estudamos no Módulo 2, o uso da força só será considerado, conforme o direito,
se estiver pautado na necessidade e proporcionalidade. Nesse contexto, embora tenha opção por adotar
diversas medidas (discricionariedade), o agente policial deve agir de maneira a atingir o fim a que precisa
chegar (prevenir crimes, tutelar bens, resgatar a paz social), com adequação, necessidade e proporcionalidade
em sentido estrito.

Por fim, no que é pertinente ao atentado à incolumidade física do indivíduo, você sabia que um
agente policial pode responder por dois crimes decorrentes de um mesmo fato?

Isso ocorre com os policiais militares que respondem por lesão corporal perante a justiça militar
(estadual) e por abuso de autoridade no âmbito da justiça comum.
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Observações:
- Se a violência praticada pelo profissional de segurança for cometida com o fim de obter informação,
declaração ou confissão, ou, ainda, para provocar ação ou omissão de natureza criminosa, o crime será o de
tortura, conforme os termos da Lei n° 9.455/1997.
- A Súmula 172 do Superior Tribunal de Justiça prevê que: “Compete à Justiça comum processar e
julgar militar por crime de abuso de autoridade, ainda que em serviço”.

2.3.7 Constrangimento ilegal

CP, art. 146. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou


depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de
resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda:
Pena — detenção, de três meses a um ano, ou multa.

A CF/88 garante às pessoas a liberdade de fazer ou não fazer o que bem lhes aprouver (art. 5º, II), desde
que observados os limites da ordem jurídica pátria.
No delito em comento, o agente constrange, obriga ou coage uma pessoa a fazer ou deixar de fazer
alguma coisa, empregando, para tanto, a violência ou grave ameaça. A doutrina lembra que:

Para a tipificação do crime de constrangimento ilegal, é, ainda, necessário


que o agente force a vítima a realizar ou deixar de realizar a conduta pelo
emprego de violência, grave ameaça ou qualquer outro meio que lhe reduza
a capacidade de resistência. (LENZA, 2011, p. 267)

Para exemplificar, é possível verificar as seguintes situações:


- Obrigar uma pessoa a fazer algo
Policial determina para que uma pessoa passe a correr na via pública. Na jurisprudência: “Pratica crime
de constrangimento ilegal o agente que, empunhando arma, procura obrigar moças a entrarem em automóvel,
para dar-lhes, contra a vontade delas, uma carona”. ( TJSP. Tacrim-SP. Rel. Adauto Suannes. RT 592/351)

- Obrigar alguém a deixar de fazer algo


Policial impõe a uma pessoa que não fume em local sabidamente permitido. Ou ainda, policial
determina que um grupo de adultos não permaneça na esquina de uma rua às 03h00.

Violência X Grave Ameaça


A violência constitui o emprego de força física ou agressões sobre alguém (tapas, pontapés, socos,
etc.). Nessa hipótese, há o constrangimento ilegal quando o agente desfere sucessivos socos na vítima até que
ela salte contra sua vontade em uma piscina gelada, ou ainda, esse agente agarra e empurra a vítima à força
nessa piscina (LENZA, 2011, p. 267).

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A grave ameaça constitui a promessa de mal grave a ser praticado contra a vítima ou parente próximo.
Ex.: agente com porte físico de atleta determina à vítima franzina a trocar de lugar em um show, sob pena de
agressão física.

Observações:
- Constrangimento ilegal e tortura: Na Lei n. 9.455/97, o art. 1º, inciso I, alínea “b”, passou a prever
delito específico, que constitui prática de tortura: constranger alguém com emprego de violência ou grave
ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental, para provocar ação ou omissão de natureza criminosa”.
- Há constrangimento ilegal se a violência ou grave ameaça é empregada para evitar que uma pessoa
realize um ato imoral (prostituição). Isso porque o tipo penal fala em conduta “não proibida por lei e não existe
lei que proíba a venda do corpo, apenas a exploração dela por outrem (LENZA, 2011, p. 271).

2.3.8 Violação de domicílio

CP, art. 150. Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a


vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas
dependências:
Pena — detenção, de um a três meses, ou multa.

A norma penal tem por finalidade concretizar a previsão constitucional de que a casa é asilo inviolável
do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador (art. 5º, XI).

Nota
Sobre o conceito de casa, leia novamente a aula 3, do Módulo 2.

A violação de domicílio fica configurada quando, contra a vontade expressa ou tácita do morador,
o policial ingressa na residência ou permanece em casa alheia ou em suas dependências. A permanência é fator
indispensável para que se verifique a ocorrência do delito.

Importante!
É importante lembrar das hipóteses autorizativas de ingresso no domicílio, mencionadas na aula 3, do
Módulo 2.

Observações:
- Trata-se de infração penal de menor potencial ofensivo (art. 61 da Lei n° 9.099/1995), exigindo
lavratura de termo circunstanciado, desde que preenchidos os requisitos do art. 69 dessa lei.
- Consentimento do morador: é a pessoa que tem a capacidade de manifestar-se no sentido autorizar
ou permitir o ingresso de alguém em sua “casa”. Aqui não importa se ele é o proprietário, possuidor legítimo,

77
arrendatário etc. Ademais, havendo vários moradores, o esposo e a esposa são os titulares desse direito de
consentimento, em que prevalece a sua autoridade em relação à dos demais habitantes da casa, mas é bom
lembrar que os demais (filhos, netos, sobrinhos, empregador, etc.) podem admitir ou excluir alguém nas
dependências que lhes são destinadas, mas mesmo assim, caso ocorra a discordância entre estas pessoas,
prevalecerá a proibição dos titulares de direito (esposo e esposa), assim caracterizando o ilícito penal, constante
do Art. 150 do CP.
- Cabe salientar que não configura o delito de violação de domicílio a entrada ou permanência em casa
alheia desabitada, mas o crime de usurpação (art. 161 do CP). De outro lado, “quando ausente os moradores,
subsiste o crime de violação de domicílio” (JESUS, 2007, p. 530).
- Sendo servidor público (ex.: policial), o sujeito ativo poderá incorrer no art. 150 aqui citado, ou
responderá por abuso de autoridade, se confirmado ou não o exercício da função. Com efeito, estando o policial
escalado, caracteriza o abuso de autoridade. De outro lado, estando de folga, responde por violação de
domicílio. Nesse sentido, Nucci (2007, p. 646) assevera que o § 2º do art. 150 não se aplica, mas o art. 3°, alínea
“a”, da Lei n° 4.898/65, empregando o direito intertemporal (lei posterior revoga anterior), bem como em função
do princípio da especialidade.

2.4 Tortura
Após a 2ª Guerra Mundial a comunidade internacional se mobilizou e fez nascer um movimento de
repúdio à prática da tortura, principalmente como instrumento para se obter informações.
A CF/88, em seu art. 5º, inciso III, estabelece que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento
desumano ou degradante”.
Você deve lembrar que no 1° Módulo desse curso foi dito que não existem direitos e nem garantias
absolutas, ou seja, juridicamente se trabalha com a relativização das liberdades públicas. Até porque nem a vida
é absoluta, na medida em que se tolera a legítima defesa para ceifar esse bem jurídico de primeira grandeza.
Ademais, em caso de guerra, o Brasil admite, excepcionalmente, a pena de morte.

Importante!
O repúdio à tortura foi adotado no Brasil e esta garantia é absoluta! Quando diz que ninguém será
submetido à tortura e nem a tratamento desumano degradante é uma garantia que não admite
exceção! Vale dizer, e a doutrina costuma lembrar que, excepcionalmente, esta garantia é absoluta.

Na ordem infraconstitucional, em 1997 finalmente entrou em vigor uma lei específica que trata da
tortura, a Lei n° 9.455. Vale dizer, durante nove anos punia-se a tortura com tipos penais comuns, homicídio,
lesão, constrangimento ilegal, abuso de autoridade, etc. Salvo no caso do Estatuto da Criança e do Adolescente
(Lei n° 8.069/1990), que previa uma tortura específica para proteger crianças e adolescentes, conforme contido
no art. 233, hoje revogado pela Lei n° 9.455/1977.

78
No Brasil o crime de tortura é comum, ou seja, qualquer pessoa pode ser sujeito ativo (autor do crime),
pode ser praticado por qualquer indivíduo, não se exige qualidade ou condição especial do agente. Então tanto
o policial quanto o particular (ex.: credor, que exige dívida do devedor), podem praticar este crime.
O art. 1º da Lei nº 9.455/1997 não traz a definição de tortura, apenas elenca os comportamentos que
configuram a prática da tortura:

Art. 1º Constitui crime de tortura:


I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe
sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira
pessoa;
b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de
violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de
aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
Pena - reclusão, de dois a oito anos.
§ 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de
segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não
previsto em lei ou não resultante de medida legal.
§ 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-
las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos.
§ 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão
de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos.
§ 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço:
I - se o crime é cometido por agente público;
II – se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência,
adolescente ou maior de 60 (sessenta) anos; (Redação dada pela Lei nº 10.741, de
2003)
III - se o crime é cometido mediante sequestro.
§ 5º A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a
interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.
§ 6º O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.
§ 7º O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o
cumprimento da pena em regime fechado.

De forma didática, o Professor Rogério Sanches (2010) explica os três delitos contidos nessa Lei por
meio de um quadro:

MODO DE
SUJEITOS RESULTADO FINALIDADE
EXECUÇÃO
a) Com o fim de obter informação
Causando-lhe
Constranger “alguém” (tortura-prova);
Com emprego de sofrimento físico
- Sujeito ativo comum b) Para provocar ação criminosa
Art. 1º, I violência ou grave ou mental.
- Sujeito passivo (tortura para ação criminosa)
ameaça.
comum c) Discriminação
Consumação
(tortura-discriminação)
Causando-lhe
Submeter alguém sob
INTENSO Aplicar castigo pessoal ou medida
sua guarda poder ou Com emprego de
sofrimento físico de caráter preventivo.
Art. 1º, II autoridade. violência ou grave
ou mental.
 S.A. Próprio ameaça.
(tortura-castigo)
(autoridade)
Consumação

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 S.P. Próprio
(sob a
autoridade)
Mediante
comportamento
Submeter pessoa ilegal
Causando-lhe
presa ou sujeita a – não
Art. 1º, § sofrimento físico
medida de segurança necessariamente XXXXXXX
1º ou mental.
- S.Ativo – Comum violência,
- S. Passivo – Próprio – não
necessariamente
grave ameaça.
Quadro 2 – Tipos penais da Lei da Tortura

O art. 1º, inciso I trata da tortura prova.


O que é tortura prova?

Constranger alguém, com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou
mental com o fim de obter informação.
Exemplo: policial que tortura o suspeito para confessar um crime. Ou ainda, o policial que, mediante
violência ou grave ameaça, causa sofrimento físico ou mental para obter a confissão de um crime.

O que é tortura para ação criminosa?

Alguém sendo torturado, com emprego de violência ou grave ameaça, sofrendo consequências físicas
e mentais para provocar ação criminosa.
Exemplo: réu que tortura a testemunha presencial para mentir em juízo. Imaginem um acusado de
homicídio que sabe quem é a testemunha presencial, passa a torturá-la para que ela minta em juízo. Nesta
situação há alguém torturando uma pessoa, com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe
sofrimento físico ou mental para provocar falso testemunho.

O que é tortura-preconceito?

Alguém constrangendo outrem, com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento
físico ou mental por discriminação.
Exemplo: A pessoa é torturada simplesmente por ser discriminada em razão da sua raça ou da sua
religião

Observações:
- O crime de tortura se consuma com a provocação do sofrimento físico ou mental, independentemente
da finalidade visada.

80
- A doutrina entende que, no caso do §1º, abrange o preso definitivo (com condenação) e o provisório
(flagrante, preventiva e temporária). Também abrange o menor infrator sujeito à medida sócio educativa. Sujeito
à medida de segurança, inimputável ou semi-imputável, submetido a internação ou tratamento ambulatorial.
- No inciso II do art. 1°, que traz a tortura-castigo, é importante que fique evidenciado o intenso
sofrimento físico ou mental causado na vítima. O delegado tem que apurar a intensidade no seu inquérito. Caso
contrário, fica configurado o crime de maus tratos (CP, art. 136).
- No § 1° a vítima do crime somente pode ser pessoa presa ou sujeita a medida de segurança.

2.4.1 Tortura omissão (art. 1º, § 2º)


Você já ouviu falar de alguém que presenciou tortura e nada fez? Você acredita que se o fato de não
praticar qualquer ato na tortura, somente presenciando, o agente estará imune à uma responsabilização pela
prática de tortura?

Atenção!
Você, policial, pode responder pela tortura omissão. Isso ocorre na hipótese em que, estando
acompanhado por outro policial, a quem se imputa o crime de tortura ação, você nada faz.

O § 2° do art. 1° da Lei de Tortura define que “Aquele que se omite em face dessas condutas, quando
tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos”. Como se vê, o
dispositivo em apreço traz dois comportamentos omissivos.
Omissão imprópria: Quando tinha o dever de evitar. Sujeito ativo: garante (garantidor), o que tem o
dever de evitar. Rol de garantes: pai, mãe, curador, tutor, policial, médico, professor etc. Ex.: delegado percebe
que um agente criminoso está sendo levado para uma sala, onde será torturado, e nada faz. Cuida-se de tortura
omissão.
Omissão própria: Nessa há o dever de apurar e a autoridade se omite, nada fazendo. A tortura já
aconteceu. O sujeito ativo é a autoridade que tem o dever de apurar, mas não adota nenhuma providência,
ficando inerte. O sujeito passivo é qualquer pessoa.

2.4.2 Efeitos da condenação da tortura (Art. 1º, § 5º)


Você sabe o que acontece com o profissional de segurança pública condenado por tortura?

O § 5º do art. 1° define que “A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e
a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada”.
Pergunta: Este efeito é automático ou precisa constar claramente na sentença, com uma
fundamentação?

A Doutrina e a Jurisprudência majoritárias entendem que na Lei 9.455/1997 a perda do cargo é


automática com a condenação, dispensada a fundamentação na sentença (STJ, HC 92247).

81
Aula 3 – Implicações de ordem disciplinar ao policial

3.1 Do dever-poder disciplinar

No exercício de atividades para gerir a coisa pública, os bens e os interesses não se acham entregues à
livre disposição da vontade do administrador ou do servidor (MELO, 2010). Nesse sentido, “A administração é
atividade do que não é senhor” (Ruy Cirne Lima).
Dentro desse contexto, exsurge o regime jurídico dos servidores públicos, veiculado através de lei (ex.:
Lei nº 8.112/1990), que estabelece direitos e deveres. Nesse cenário, existem determinadas regras que regulam
o comportamento do agente público. Com efeito, a fim de assegurar a regularidade administrativa, havendo
notícia de transgressão da disciplina, a autoridade deve exercer o dever-poder disciplinar, adotando
providências para apurar os fatos e eventualmente impor sanção disciplinar.
Vale ressaltar que, a administração pública não tem liberdade de escolha para apurar ou deixar de
apurar, punir ou deixar de punir. É dizer, o exercício do dever-poder disciplinar é ato vinculado, em
benefício do bem comum. Tomando conhecimento da falta praticada, cumpre instaurar procedimento
adequado para esclarecer os fatos e eventualmente aplicar a sanção, após o devido processo legal, com
resguardo da ampla defesa e contraditório. Não observando essa determinação, o superior hierárquico estará
passível de responder por condescendência criminosa, infração administrativa e civil (improbidade – Lei 8429/92,
art. 11, II).

3.2 Independência entre as esferas administrativa, civil e disciplinar


Uma pergunta para você: Com uma conduta só, pode o servidor se ver responsabilizado em diferentes
esferas?

Sim. Considerando a independência das instâncias (CF, art. 2º), uma só conduta pode ensejar a
instauração de distintos processos ou procedimentos (penal, civil, disciplinar), sem que configure o bis in idem,
com imposição de punição, respeitados o devido processo legal, ampla defesa e contraditório.
Ademais, é possível que haja absolvição em uma esfera e condenação em outra, sem comunicação
entre elas. Entretanto, excepcionalmente, poderá ocorrer a comunicação entre os processos, quando provada a
inexistência do fato ou a negativa de autoria no processo penal. Por exemplo, se ficar comprovado no processo
penal que o servidor não se beneficiou pecuniariamente, ou ainda, se realmente o fato não existiu, de forma
vinculada, as demais instâncias serão atingidas. É o que se pode concluir com a leitura desses dispositivos:
- Lei 8.112. Art. 126. A responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso de absolvição
criminal que negue a existência do fato ou sua autoria.
- Código Civil. Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo
questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem
decididas no juízo criminal.

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- CPP, Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta
quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.

É bom deixar evidente ainda que processos que tramitam nas diferentes instâncias não precisam
aguardar o desfecho do processo penal, sob pena de se operar a prescrição, caso não haja hipóteses legais de
interrupção e suspensão.
Com efeito, no exercício das atribuições, durante a realização de uma abordagem policial, o
profissional de segurança pública que praticar desvio de conduta, ultrapassando os limites discorridos nos
Módulos 1 e 2, poderá se ver responsabilizado em diferentes esferas (disciplinar, civil ou penal), sem que
haja bis in idem. Assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MILITAR. EXCLUSÃO EX-OFFICIO A


BEM DA DISCIPLINA. FALTA GRAVE. PROCESSO ADMINISTRATIVO. ILEGALIDADE.
INOCORRÊNCIA INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS PENAL E
ADMINISTRATIVA. I – É legal a exclusão, a bem da disciplina, de militar que foi
considerado incapaz de permanecer nos quadros da Corporação da Polícia Militar,
pela prática de falta grave apurada em procedimento administrativo (Conselho de
Disciplina), com base no art. 3º, inciso III, alíneas "a" e "c", do Decreto nº 4.713/96. II
– A independência entre as instâncias penal e administrativa, consagrada na
doutrina e na jurisprudência, permite à Administração impor punição
disciplinar ao servidor faltoso à revelia de anterior julgamento no âmbito
criminal, mesmo que a conduta imputada configure crime em tese.
(Precedentes do STF e do STJ.) (grifo nosso) Recurso desprovido. (Acórdão: ROMS
15628/GO: Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 2002/0157331-7.).

Aula 4 – Da responsabilização por ato de improbidade


administrativa ao policial

Você já ouviu falar sobre crime de improbidade administrativa?


Saiba que esta afirmação está errada, pois não existe tal crime específico.
Vamos descobrir esta estória juntos!

4.1 Conceito e natureza


Você sabe o que significa probidade administrativa? Lembra-se do art. 37, caput, da CF/88 que elenca
a moralidade como um dos princípios a serem observados pela administração pública?

A palavra-chave é honestidade.
Probidade administrativa remete ao agir com honestidade, retidão, honradez. O servidor público probo
é leal, tem que ser bem intencionado, sempre agir com boa-fé, com retidão de conduta, obedecendo aos

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princípios éticos, os princípios morais. Com efeito, se o agente público não observa essas exigências, estará
agindo com improbidade administrativa. Assim, se probidade é honestidade, improbidade é desonestidade.
A Constituição Federal trata do tema no art. 37, § 4°. Vale a pena fazer uma leitura cuidadosa:

Art. 37. .................................................................................................


§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos
políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento
ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Da leitura desse dispositivo, a primeira coisa que tem que ficar claro para você é que o ato de
improbidade administrativa não é crime. Assim, não existe crime de improbidade administrativa, na medida
em que a parte final do § 4° fala “sem prejuízo da ação penal cabível”.
A lei que regula essa previsão constitucional é a Lei n° 8.429, de 02 de junho de 1992. Esta é norma de
leitura obrigatória para todo servidor público. Nela, várias condutas são descritas como improbidade. Você tem
na lista de improbidade, por exemplo, o desvio de dinheiro, o desvio de equipamento (ex.: o policial que
usa viatura para fazer as compras de casa), o engavetamento de processo, a leniência do servidor, o servidor
que não aparece para trabalhar.
É muito comum, no exercício das atribuições, se ouvir o chamado exercício nocivo da função pública.
Basta lembrar-se do “QRU”, da carteirada no cinema, de uma paquerada ou uma contribuição para a caixinha
de natal do agente para que ele não preencha um formulário de notificação de trânsito. É importante dizer ainda
que, muitas vezes o profissional acha equivocadamente que não pratica a improbidade porque não se
enriqueceu, não obteve nenhuma vantagem. Contudo, de alguma forma causou dano ao erário, não observou
os princípios e regras.

4.2 Modalidades de ato de improbidade


A lei estabelece 03 (três) espécies distintas de ato de improbidade, conforme prevê os arts. 9º a 11.

Atenção!
Você tem que ter cuidado com essas listas porque elas são meramente exemplificativas. O rol de incisos
é enorme e é um rol exemplificativo.

O ato de improbidade pode ser subdividido em três modalidades diferentes:


- Ato de improbidade que gera enriquecimento ilícito (art. 9ª)
Durante uma abordagem policial, destacam-se os seguintes dispositivos:

Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento


ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício
de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no
art. 1° desta lei, e notadamente:

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I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer
outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem,
gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser
atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente
público;
[...]
V - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para
tolerar a exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de
contrabando, de usura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou aceitar promessa de
tal vantagem;
[...]
VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou
função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à
evolução do patrimônio ou à renda do agente público;
[...]
X - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente,
para omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado;

- Ato de improbidade que gera dano ao erário (art. 10, da Lei de Improbidade)
Durante uma abordagem policial, destacam-se os seguintes dispositivos:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário
qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio,
apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades
referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
[...]
II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens,
rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades
mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou
regulamentares aplicáveis à espécie;
VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades
legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;
[...]
XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;
XIII - permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas,
equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de
qualquer das entidades mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de
servidor público, empregados ou terceiros contratados por essas entidades.

- Ato de improbidade que gera violação a princípio da administração (art. 11, da Lei de
Improbidade)
Durante uma abordagem policial, destacam-se os seguintes dispositivos:
85
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios
da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de
honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele
previsto, na regra de competência;
II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que
deva permanecer em segredo;
IV - negar publicidade aos atos oficiais;

Saiba mais...
A Escola Superior do Ministério Público da União – ESMPU editou uma obra intitulada “Cem Perguntas
e Respostas sobre Improbidade Administrativa Incidência e aplicação da Lei n. 8.429/1992” (Brasília, 2008).
Leia!!

Finalizando...
Neste módulo, você estudou que:
 Boa parte das persecuções penais se originam durante a atuação dos profissionais de segurança
pública, abrangendo aí o emprego da busca pessoal, domiciliar ou veicular.
 Várias são as ocorrências em que, no momento da abordagem, determinadas pessoas reagem à
atuação do agente policial. Dentre elas destacam-se: a desobediência; o desacato; a resistência, a corrupção
ativa e a contravenção penal.
 a Lei n° 4.898/1965, objeto de nosso estudo, que “regula o Direito de Representação e o processo
de Responsabilidade Administrativa Civil e Penal, nos casos de abuso de autoridade”
 O delito de abuso de autoridade é punido a título de dolo (intenção de praticar o ato), ou seja, o
autor da conduta tem consciência de que esteja exorbitando do poder.
 No exercício de atividades para gerir a coisa pública, os bens e os interesses não se acham
entregues à livre disposição da vontade do administrador ou do servidor (MELO, 2010). Nesse sentido, “A
administração é atividade do que não é senhor” (Ruy Cirne Lima).
 Probidade administrativa remete ao agir com honestidade, retidão, honradez. O servidor público
probo é leal, tem que ser bem intencionado, sempre agir com boa-fé, com retidão de conduta, obedecendo aos
princípios éticos, os princípios morais. Com efeito, se o agente público não observa essas exigências, estará
agindo com improbidade administrativa.
 O ato de improbidade pode ser subdividido em três modalidades diferentes: Ato de improbidade
que gera enriquecimento ilícito (art. 9ª); Ato de improbidade que gera dano ao erário e Ato de improbidade que
gera violação a princípio da administração (art. 11, da Lei de Improbidade).

86
Exercícios

1. Levando em consideração o que você estudou neste módulo, marque “V” para as alternativas
“VERDADEIRAS” e “F” para as alternativas “FALSAS”:
a. Para a configuração do crime de desobediência, é indispensável a existência de uma ordem,
prevista em lei e emitida por profissional de segurança pública com competência para a prática do ato.
b. No desacato não se exige que o ofensor e o policial estejam cara a cara, podendo estar em
recintos diferentes, mas próximos, sendo possível o próprio profissional de segurança ouvir o comentário ou
perceber a reação.
c. Haverá resistência quando alguém se utilizar de violência ou ameaça (não precisa ser grave) para
obstruir um procedimento policial, ainda que realizado por profissional incompetente.
d. Se a pessoa se dirige insistentemente verbalizando ao policial para “dar um jeitinho” ou “quebrar
o galho”, não há a corrupção ativa, porque não houve a oferta nem a promessa de vantagem indevida. De outro
lado, caso o policial dê “o jeitinho” e não pratica o ato que deveria, responderá por corrupção passiva
privilegiada (CP, art. 317, §2 º), tendo o particular como partícipe, em razão do induzimento. Agora, caso o
funcionário público não dê “o jeitinho”, o fato é atípico.
e. Não pratica abuso de autoridade o policial militar que, embora, sem uniforme e de folga, age, se
valendo da autoridade que lhe é investida.

2. De acordo com o que estudou, analise as sentenças a seguir e marque as alternativas corretas:
a. A recusa de dados sobre própria identidade ou qualificação prevista no art. 68 do Decreto-Lei n°
3.688, de 03/10/1941 (Lei das Contravenções Penais) só existe se o policial estiver no exercício de suas
atribuições por ocasião da solicitação ou exigência, do contrário, o fato é atípico.
b. Não existe constrangimento ilegal se a violência ou grave ameaça é empregada para evitar que
uma pessoa realize um ato imoral (prostituição).
c. Investigador que tortura suspeito para confessar um crime incorre na prática do crime de tortura
prova, posto que constrange alguém, com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento
físico ou mental com o fim de obter uma informação para ajudar na apuração de um delito.
d. Mesmo estando o agente em situação de flagrante delito, tornam-se necessários para acesso ao
seu domicílio, o mandado de busca e apreensão judicialmente autorizado, bem como o consentimento do
morador.

3. As sentenças a seguir estão corretas, Exceto:

a. A violação de domicílio fica configurada quando, contra a vontade expressa ou tácita do morador,
o invasor ingressa na residência ou permaneça em casa alheia ou em suas dependências. A permanência é fator
indispensável para que se verifique a ocorrência do delito.

87
b. Considerando a independência das instâncias (CF, art. 2º), existe possibilidade de uma decisão
no processo penal, que reconhece a inexistência de autoria de um delito, vincular um processo de natureza
disciplinar.
c. Investigador que tortura suspeito para confessar um crime incorre na prática do crime de tortura
prova, posto que constrange alguém, com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento
físico ou mental com o fim de obter uma informação para ajudar na apuração de um delito.
d. A doutrina diz que enquanto designativo técnico para improbidade administrativa, a
improbidade se caracteriza como o desvirtuamento da função pública. Em outras palavras, o que o servidor
pratica, ao não observar as diretrizes e as exigências do exercício da função pública, é o desrespeito à ordem
jurídica. Com esse comportamento, o agente público incorre em duas coisas: desrespeito à função pública e
violação à legalidade, portanto, à ordem jurídica.

88
Gabarito

1. Resposta Correta: V-V-F-V-F


2. Resposta Correta: Letra A
3. Resposta Correta: Letra C

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