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POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO

CENTRO DE ALTOS ESTUDOS DE SEGURANÇA

“CEL PM NELSON FREIRE TERRA”

Cap PM Thiago Hideyuki Pedreira Chiyo

O EMPREGO DE POLICIAIS MOTOCICLISTAS NO CONTROLE DE MULTIDÕES:


PROPOSTA DE TÉCNICAS E TÁTICAS DE ATUAÇÃO E COMPLEMENTAÇÃO
DO MANUAL DE CONTROLE DE MULTIDÕES (M-8-PM) DA POLÍCIA MILITAR
DO ESTADO DE SÃO PAULO

São Paulo

2021
Cap PM Thiago Hideyuki Pedreira Chiyo

O EMPREGO DE POLICIAIS MOTOCICLISTAS NO CONTROLE DE MULTIDÕES:


PROPOSTA DE TÉCNICAS E TÁTICAS DE ATUAÇÃO E COMPLEMENTAÇÃO DO
MANUAL DE CONTROLE DE MULTIDÕES (M-8-PM) DA POLÍCIA MILITAR DO
ESTADO DE SÃO PAULO

Dissertação apresentada no Centro de


Altos Estudos de Segurança, da Polícia
Militar do Estado de São Paulo como parte
dos requisitos para aprovação no Curso de
Aperfeiçoamento de Oficiais.

Cel PM Luiz Gonzaga de Oliveira Júnior - Orientador

São Paulo

2021
POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO
CENTRO DE ALTOS ESTUDOS DE
SEGURANÇA CAES “CORONEL PM NELSON FREIRE TERRA”
CURSO DE APERFEIÇOAMENTO DE OFICIAIS – II/20

Cap PM Thiago Hideyuki Pedreira Chiyo

O EMPREGO DE POLICIAIS MOTOCICLISTAS NO CONTROLE DE MULTIDÕES:


PROPOSTA DE TÉCNICAS E TÁTICAS DE ATUAÇÃO E COMPLEMENTAÇÃO DO
MANUAL DE CONTROLE DE MULTIDÕES (M-8-PM) DA POLÍCIA MILITAR DO
ESTADO DE SÃO PAULO

Dissertação apresentada no Centro de


Altos Estudos de Segurança, da Polícia
Militar do Estado de São Paulo como parte
dos requisitos para aprovação no Curso de
Aperfeiçoamento de Oficiais.

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São Paulo, ___ de ___________________ de 2021.

LUIZ GONZAGA DE OLIVEIRA JÚNIOR


Cel PM - Mestre em Ciências Policiais de
Segurança e Ordem Pública

LEANDRA PONTES DABAGUE


Ten Cel PM - Mestre em Ciências Policiais de
Segurança e Ordem Pública

GILBERTO EVANGELISTA VIEIRA


Maj PM - Mestre em Ciências Policiais de
Segurança e Ordem Pública
Este trabalho é dedicado:
Ao meu pai Kaoru, exemplo de honestidade, integridade e genialidade, que me
transmitiu os valores necessários para uma vida digna, conduziu-me pelo caminho da
retidão e me incentivou a questionar os dogmas criados pelo homem.
À minha mãe Maristela, diante do carinho e amor incondicional.
À minha esposa Cíntia que soube compreender minha ausência e me transfere a paz
necessária para vencer as dificuldades.
À minha amável filha Sofia, fonte de felicidade, amor e força, que me renovam
diariamente para o cumprimento das missões.
Aos meus irmãos Jean e Keyla, eternos incentivadores do meu crescimento.
À minha avó Emiliana, símbolo da fé e fonte de amor.
Aos meus sobrinhos, Lucas, Vinicius, Gabriel, Fernando e Henri, futuro da nossa
família.
Ao meu amigo Capitão Arcanjo, pela sua amizade incontestável.
À todos Policiais Militares de ROCAM do 2 BPChq, símbolo de coragem, força e
retidão.
À todos Policiais Motociclistas que, sob sol quente, chuva ou em dias frios, jamais
esmorecem, e transformam o perigo de patrulhar sobre duas rodas em combustível
diário para prosseguir na incansável busca por uma sociedade mais segura, onde a
ordem pública prevaleça.
AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por até aqui ter me ajudado.


Agradeço também:
Ao Sr. Cel PM Gasparian pelos ensinamentos, confiança e acolhida nos momentos
profissionais difíceis.
Ao Sr. Cel PM Rogério, meu Comandante, pela oportunidade e confiança.
Ao Sr. Cel PM Balestiero, eterno Comandante do 2 BPChq, exemplo de coragem,
liderança e respeito por seus comandados;
Ao Sr. Cel PM Gonzaga, eterno Comandante do 2 BPChq, pelas importantes
orientações neste trabalho.
Ao Sr. Cel PM Romanek pelas orientações.
Ao Sr. Ten Cel PM Nishi, pelo incentivo constante, pelos ensinamentos e exemplo de
profissionalismo.
Aos Srs. Ten Cel Carvalho, Maj Elço, Maj Denami, Maj Alves, Major Frisene pelos
conselhos e incentivos.
Ao Sr. Maj PM Vilariço e Maj Gregorim, pelo incentivo e ensinamentos.
Ao Sr. Maj PM Silva, grande estudioso e referência no policiamento com motocicletas,
pela constante incentivo e por compartilhar seus conhecimentos.
Ao Sr. Maj PM Paulo Aguilar pelas orientações.
Ao Cap PM Arcanjo, grande amigo, pelo incentivo, ensinamentos e consideração em
todos os momentos da minha carreira e da vida.
Aos amigos Cap PM Badini, Cap PM Zaccaro, Cap PM Galdino, Cap Casabona, Cap
Galhardo, Cap Paulo Roberto, Cap Depieri, Cap Bertanha, Cap Silas, Cap Bazela,
Cap Matheus por estarem ao meu lado em algumas das muitas batalhas que
enfrentamos.
Aos Ten PM Guilherme, Ten PM Bálsamo e Tenente Tavares, futuro do policiamento
tático com motocicletas da PMESP.
Ao Cap Souza, Cb Zanni e todos Oficiais cavaleiros de aço de Instituições Policiais
Militares de outros estados da Federação que contribuíram para a pesquisa.
Ao Sgt PM Maciel, grande profissional de ROCAM e entusiasta no estudo do
policiamento com motocicletas, pela grande contribuição nas discussões doutrinárias
e sugestões na formulação das propostas aqui apresentadas.
A todos policiais de ROCAM que me ensinaram diariamente no combate ao crime, o
conceito de coragem, técnica e profissionalismo.
Agradecimento especial ao Cb PM Hércules, Cb PM Bonfim (in memoriam), Cb PM
Rocha e Cb PM Valdir pelos ensinamentos e pela honra de dividir o mesmo espaço
de uma viatura 4 rodas durante dias e noites de combate ao crime.
Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal
algum, porque tu estás comigo. (Bíblia Sagrada, Salmo 23, 4)
RESUMO

A partir do mês de junho de 2013, o Brasil e, sobretudo, o Estado de São Paulo


experimentaram a força e as consequências danosas de uma nova forma de protesto.
Impulsionados pela globalização, internet, avanços tecnológicos promovidos pela
quarta revolução industrial e, sob a influência de protestos violentos vivenciados pelo
mundo, como a Batalha de Seattle nos EUA e a Primavera Árabe iniciada na Tunísia,
a sociedade paulista foi às ruas. Em São Paulo, o que teve início pela insatisfação ao
aumento de passagens do transporte público, rapidamente transformou-se em uma
generalizada demonstração de repúdio à situação econômica, política e social no
país, com o engajamento de diversos setores da sociedade, classes sociais, idades e
ideologias. As manifestações mostraram-se heterogêneas e sem estrutura ou
liderança formal que as conduzissem, diferente dos protestos tradicionais já bem
conhecidos. Inúmeros grupos utilizando a tática black bloc infiltraram-se nas
manifestações e, com seus smartphones, rápida comunicação, ações
descentralizadas e violentas, causaram grandes danos a patrimônios públicos e
privados, além de intensos confrontos com a Polícia Militar que, acostumada a
gerenciar manifestações tradicionais, teve bastante dificuldade para garantir a
manutenção da ordem pública. Por meio desse trabalho buscou-se identificar as
características dessas manifestações contemporâneas e analisar a viabilidade de
emprego do policiamento com motocicletas na manutenção da ordem pública nesse
cenário, por meio do desenvolvimento de ações de Controle de Multidões. Na busca
de elementos e respostas para essas questões, foram realizadas pesquisas
bibliográficas, análise de documentos, elaboração de questionários submetidos a
policiais motociclistas, entrevistas com comandantes dotados de experiência em
ações de Controle de Multidões e que atuaram diretamente nas manifestações de
junho de 2013. Os resultados do estudo indicaram que o emprego do policiamento
com motocicletas, pelas suas características, embora apresente algumas restrições
para seu empego, pode ser muito eficiente no Controle de Multidões, principalmente
aquelas em que há a participação de grupos que utilizam a tática black bloc para a
prática de atos violentos. Por não existir normatização na Polícia Militar do Estado de
São Paulo que trate especificamente do assunto, é apresentado ao final deste
trabalho, proposta de táticas, técnicas e procedimentos para o emprego de Policiais
Motociclistas no Controle de Multidões com possível complementação do Manual de
Controle de Multidões, da Instituição (M-8-PM).
Palavras-chave: Polícia Militar. Controle de Multidões. Policiamento com
Motocicletas. M-8-PM.
ABSTRACT

Beginning in June 2013, Brazil and, above all, the State of São Paulo experienced the
strength and harmful consequences of a new form of protest. Driven by globalization,
the internet, technological advances promoted by the fourth industrial revolution and,
under the influence of violent protests experienced by the world, such as the Battle of
Seattle in the USA and the Arab Spring started in Tunisia, São Paulo society took to
the streets. In São Paulo, which began with dissatisfaction with the increase in public
transport tickets, quickly became a generalized demonstration of repudiation of the
economic, political and social situation in the country, with the engagement of various
sectors of society, social classes, ages, ideologies, the demonstrations were
heterogeneous and had no structure or formal leadership to guide them, unlike
traditional protests already well known. Countless groups using the black bloc tactics
infiltrated the demonstrations and, with their smartphones, rapid communication,
decentralized and violent actions caused great damage to public and private assets, in
addition to intense confrontations with the Military Police, who are used to managing
traditional demonstrations, had a hard time guaranteeing the maintenance of public
order. Through this work, we sought to identify the characteristics of these
contemporary manifestations and to analyze the feasibility of using policing with
motorcycles to maintain public order in this scenario, through the development of
Crowd Control actions. In the search for elements and answers to these questions,
bibliographic searches, document analysis, questionnaires submitted to motorcycle
police officers, interviews with commanders with experience in crowd control actions
and who acted directly in the June 2013 demonstrations were carried out. The results
of the study indicated that the use of policing with motorcycles, due to its
characteristics, although it presents some restrictions for its use, can be very efficient
in Crowd Control, especially those in which there is the participation of groups that use
the black bloc tactic to the practice of violent acts. As there is no regulation in the
Military Police of the State of São Paulo that deals specifically with the subject, a
proposal of tactics, techniques and procedures for the use of Motorcyclist Police
Officers in Crowd Control is presented at the end of this work, with possible
complementation of the Multitudes, of the Institution (M-8-PM).
Key words: Military police. Crowd Control. Policing with Motorcycles. M-8-PM.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Lula na Greve de 1979 .................................................................................... 40


Figura 2 Policiais da ROCAM, do 2º BPChq durante ação de desinterdição da Rodovia
“Mário Covas” – Rodoanel, durante greve dos caminhoneiros em 2018 ..................... 55
Figura 3 Manifestante ateando fogo em barricada (Santiago/Chile) ............................ 59
Figura 4 Vândalos destruindo igreja em Santiago/Chile ............................................... 59
Figura 5 Confronto entre manifestantes e polícia em Hong Kong ................................ 60
Figura 6 Manifestante nas ruas do Líbano .................................................................... 60
Figura 7 Manifestante com bandeira do movimento Black Lives Matter, em
Rochester/EUA ............................................................................................................... 61
Figura 8 Manifestações associadas ao movimento Black Lives Matter (por tipos) ..... 62
Figura 9 Manifestações pelo mundo, em 2019 ............................................................. 62
Figura 10 Mapa de protestos e motins no Brasil no período de 01/01/2019 a
10/10/2020 ...................................................................................................................... 63
Figura 11 Praça São Pedro (Itália), em 2005 e 2013 .................................................... 69
Figura 12 Grupo Back Bloc em manifestação ............................................................... 78
Figura 13 Símbolo de grupo Antifa, em São Paulo ....................................................... 82
Figura 14 Grupo A.C.A.B. .............................................................................................. 83
Figura 15 Ilustração gráfica de Normalidade, Pré-crise e Crise ................................... 88
Figura 16 Sala de crises instalada durante manifestação pública na capital ............. 107
Figura 17 Organograma da cadeia de comando em manifestações no CPA/M-1 .... 108
Figura 18 Ilustração da técnica do envelopamento .................................................... 109
Figura 19 Descrição da Graduação de Intervenção para o Controle de Multidões ... 110
Figura 20 Quadro demonstrativo das ações de Controle de Multidão ....................... 111
Figura 21 Pintura na parede do alojamento dos Cabos e Soldados de ROCAM ...... 113
Figura 22 Atuação policial de Controle de Multidões em Paris .................................. 123
Figura 23 Patrulha do Grupo de Intervenção Rápida Ostensiva, da Polícia Militar de
Goiás (GIRO) ................................................................................................................ 153
Figura 24 Representação de uma equipe de resposta rápida .................................... 154
Figura 25 Proposta de Calça para policial motociclista .............................................. 155
Figura 26 Proposta de gandola para Policial Motociclista .......................................... 155
Figura 27 Capacete utilizado por policial motociclista na PMESP ............................. 156
Figura 28 Proposta de botas ........................................................................................ 156
Figura 29 Luva utilizada por policial motociclista na PMESP ..................................... 156
Figura 30 Porta bastão acoplado à motocicleta .......................................................... 157
Figura 31 Motocicleta equipada com o primeiro suporte de arma longa ................... 158
Figura 32 Policial Militar utilizando suporte de arma longa na motocicleta ................ 159
Figura 33 Peças utilizadas para montagem do protótipo do suporte de arma para
motocicleta .................................................................................................................... 159
Figura 34 Motocicleta da ROCAM com suporte de arma longa ................................. 160
Figura 35 Suporte de arma longa para motocicleta (visão superior).......................... 160
Figura 36 Suporte de arma longa para motocicleta (visão lateral) ............................. 161
Figura 37 Policial Militar embarcado em motocicleta com suporte para arma longa. 161
Figura 38 Escudo anti-tumulto marca Saint Shield – modelo LX3 ............................. 163
Figura 39 Policial motociclista transportando o escudo em mochila .......................... 163
Figura 40 Escudo Balístico marca Saint Shield – NIJ standard III ............................. 164
Figura 41 Simbologia para Pelotão de Resposta Rápida ........................................... 164
Figura 42 Representação do posicionamento dos policiais embarcados .................. 165
Figura 43 Equipe de Resposta Rápida embarcada .................................................... 166
Figura 44 Equipe de Resposta Rápida desembarcada .............................................. 167
Figura 45 Equipe de Resposta Rápida desembarcada .............................................. 167
Figura 46 Representação do GRR com 2 ERR .......................................................... 169
Figura 47 Representação GRR com 2 ERR – motocicletas em formação por três ... 169
Figura 48 Representação GRR com 2 ERR – motocicletas em formação por dois .. 170
Figura 49 Representação do GRR com 3 ERR .......................................................... 171
Figura 50 Representação GRR com 3 ERR – motocicletas em formação por três ... 171
Figura 51 Representação GRR com 3 ERR – motocicletas em formação por dois .. 172
Figura 52 Representação do GRR com 4 ERR .......................................................... 173
Figura 53 Representação GRR com 4 ERR – motocicletas em formação por três ... 173
Figura 54 Representação GRR com 4 ERR – motocicletas em formação por dois .. 174
Figura 55 Representação do deslocamento em coluna por um ................................. 175
Figura 56 Representação do deslocamento em coluna por dois ............................... 175
Figura 57 Representação do deslocamento em coluna por três ................................ 176
Figura 58 Representação do Pelotão de Resposta Rápida na formação em linha ... 177
Figura 59 Representação do PRR na formação em linha – motocicletas em formação
por três .......................................................................................................................... 177
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Quantidade de manifestação pública de 2010 a setembro de 2020 ............. 63


LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 Quantidade de participantes de manifestações contra o governo Dilma ..... 56


Gráfico 2 Tempo na atividade de policiamento com motocicletas ............................. 132
Gráfico 3 Conhece os conceitos de Gestão de Multidão? .......................................... 132
Gráfico 4 Conhece a diferença entre Administração e Controle de Multidão? .......... 133
Gráfico 5 Realiza treinamento de Controle de Multidão na OPM? ............................. 133
Gráfico 6 Considera importante o emprego de pelotão motociclistas no Controle de
Multidão? ...................................................................................................................... 134
Gráfico 7 O emprego de policial garupa, em ações específicas de Controle de
Multidões, pode proporcionar maior eficiência na ação policial? ............................... 135
Gráfico 8 É possível o emprego de policial garupa, em ações específicas de Controle
de Multidões, após padronização de doutrina, técnica, tática e procedimentos e da
realização de treinamentos? ........................................................................................ 135
Gráfico 9 Dificuldades na atuação do policiamento com motocicletas no Controle de
Multidões....................................................................................................................... 136
Gráfico 10 Formato de atuação quando foi empregado no Controle de Multidões ... 136
Gráfico 11 Pontos positivos do emprego do policiamento com motocicletas no
Controle de Multidões .................................................................................................. 137
LISTA DE ABREVIATURAS

BPChq Batalhão de Polícia de Choque


BPM/M Batalhão de Polícia Militar Metropolitano
Cap Capitão
Cb Cabo
CIPM Centro de Inteligência da Polícia Militar
Cmt Comandante
CPRv Comando de Policiamento Rodoviário
ERR Equipe de Resposta Rápida
FEMA Federal Emergency Management Agency
GESPOL Sistema de Gestão da Polícia Militar
Grupo de Intervenção Rápida Ostensiva, da Polícia
GIRO
Militar de Goiás
GRR Grupo de Resposta Rápida
ICS Incident Command System
Maj Major
MPL Movimento Passe Livre
Manual de Controle de Multidões da Polícia Militar do
M-8-PM
Estado de São Paulo
Manual de Padronização de Procedimentos Policiais
M-13-PM
Militares
NIMS National Incident Management System
OMC Organização Mundial do Comércio
ONG Organização Não Governamental
OPM Organização Policial-Militar
PM Polícia Militar
PMESP Polícia Militar do Estado de São Paulo
PMGO Polícia Militar de Goiás
PRR Pelotão de Resposta Rápida
Pol Chq Policiamento de Choque
ROCAM Rondas Ostensivas Com Apoio de Motocicletas
SICOE Sistema de Comando de Operações de Emergência
Sgt Sargento
Subten Subtenente
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 19
1.1 Problema ............................................................................................................... 21
1.2 Hipóteses............................................................................................................... 23
1.3 Objetivos gerais e específicos ........................................................................... 24
1.4 Justificativa ........................................................................................................... 25
1.5 Metodologia .......................................................................................................... 27
1.6 Distribuição de capítulos .................................................................................... 28
2 ASPECTOS HISTÓRICOS, SOCIAIS E JURÍDICOS DAS MANIFESTAÇÕES
PÚBLICAS.................................................................................................................... 30
2.1 Breve histórico dos movimentos sociais pelo mundo ................................... 33
2.1.1 A Revolução Russa de 1917 .............................................................................. 33
2.1.2 O “Apartheid”, de 1960........................................................................................ 34
2.1.3 O Massacre da Praça da Paz Celestial em 1989 .............................................. 34
2.1.4 Movimento Occupy nos Estados Unidos (2011) ................................................ 35
2.2. Breve histórico das manifestações no Brasil ................................................. 37
2.2.1 Revolta da Vacina (1904) ................................................................................... 37
2.2.2 Greve Geral de 1917 ........................................................................................... 38
2.2.3 Marcha da Família (1964) ................................................................................... 38
2.2.4 Marcha dos 100 mil (1968) ................................................................................. 39
2.2.5 Greve de 1979 ..................................................................................................... 39
2.2.6 Diretas Já (1984) ................................................................................................. 40
2.2.7 Os Caras Pintadas (1992) .................................................................................. 41
2.3 As “novas” manifestações dos séculos XX e XXI ........................................... 43
2.3.1 A Batalha de Seattle (1999) ................................................................................ 43
2.3.2 A Primavera Árabe em 2010............................................................................... 45
2.3.3 Os Coletes Amarelos em 2018 ........................................................................... 47
2.3.4 A jornada de junho de 2013, no Brasil ............................................................... 48
2.3.5 A greve dos caminhoneiros ................................................................................ 52
2.3.6 Impeachment de Dilma Roussef......................................................................... 55
2.4 As manifestações públicas na atualidade ........................................................ 58
2.5. Fatores que redesenharam as manifestações públicas .............................. 64
2.5.1. Os efeitos da globalização ................................................................................. 64
2.5.2 Os efeitos da internet .......................................................................................... 67
2.5.3 Quarta Revolução Industrial ............................................................................... 70
2.6 Características das “novas” manifestações públicas .................................... 71
2.6.1 Estrutura horizontal ............................................................................................. 75
2.6.2 Heterogeneidade ................................................................................................. 77
2.6.3 Presença de grupos radicais e o emprego de violência .................................... 78
2.6.4 Pautas difusas ..................................................................................................... 83
2.6.5 Manifestações tecnológicas e em rede .............................................................. 84
2.6.6 Incidentes dinâmicos ........................................................................................... 86
2.6.7 Imprevisibilidade/volatilidade .............................................................................. 90
2.7 Os desafios da Polícia Militar do Estado de São Paulo diante das “novas
manifestações” ........................................................................................................... 92
2.8 Aspectos jurídicos das manifestações públicas ............................................. 96
3 A GESTÃO DE MULTIDÕES NA PMESP ............................................................. 106
4 O EMPREGO DO POLICIAMENTO COM MOTOCICLETAS NO CONTROLE DE
MULTIDÕES............................................................................................................... 113
4.1 Breve histórico do policiamento com motocicletas na PMESP................... 115
4.2 Fatores favoráveis ao uso de motocicleta no Controle de Multidões ........ 118
4.2.1 Mobilidade ......................................................................................................... 118
4.2.2 Flexibilidade....................................................................................................... 119
4.2.3 Ostensividade .................................................................................................... 119
4.2.4 Capacidade responsiva..................................................................................... 120
4.3 Limitações ao uso de motocicleta no Controle de Multidões ...................... 121
4.4 O potencial do policiamento com motocicletas no controle de multidões 124
5. DAS PESQUISAS E RESULTADOS ALCANÇADOS ......................................... 131
5.1 Questionário enviado aos Policiais Militares motociclistas ........................ 131
5.2 Entrevista com Cel PM Alexandre Monclus Romanek .................................. 137
5.3 Entrevista com Cel PM José Balestiero Filho ................................................ 139
5.4 Entrevista com o Major PM Aparecido Denami Júnior ................................. 141
5.5 Entrevista com o Major PM Luís Humberto Caparroz ................................... 143
5.6 Entrevista com o Capitão PM Valdinei Arcanjo da Silva .............................. 145
5.7 Pesquisa em Polícias Militares de outros Estados ....................................... 146
6 PROPOSTA DE ATUAÇÃO DO POLICIAMENTO COM MOTOCICLETAS NO
CONTROLE DE MULTIDÕES ................................................................................... 148
6.1 Princípios de Controle de Multidões por tropa de policiais motociclistas 149
6.2 Finalidade do emprego do pelotão de motociclistas no Controle de Multidões
......................................................................................................................... 151
6.3. O emprego de policiais duplamente embarcados ........................................ 152
6.4 Adaptações de materiais e equipamentos...................................................... 154
6.4.1 Fardamento ....................................................................................................... 155
6.4.2 Porta bastão ...................................................................................................... 157
6.4.3 Suporte para arma longa .................................................................................. 157
6.4.4 Transporte de granadas policiais e munições de emprego não letal .............. 162
6.4.5 Escudos portáteis .............................................................................................. 162
6.5 Simbologia das funções nos pelotões de resposta rápida .......................... 164
6.6 Equipe de Resposta Rápida (ERR) .................................................................. 165
6.6.1 Divisão de funções enquanto embarcado ........................................................ 165
6.6.2 Divisão de funções desembarcados................................................................. 166
6.6.3 Logística ............................................................................................................ 167
6.7 Grupo de Resposta Rápida (GRR) ................................................................... 168
6.7.1 Grupo de Resposta Rápida com 2 ERR .......................................................... 168
6.7.2 Grupo de Resposta Rápida com 3 ERR .......................................................... 170
6.7.3 Grupo de Resposta Rápida com 4 ERR .......................................................... 172
6.8 Pelotão de Resposta Rápida (PRR) ................................................................. 174
6.8.1 Deslocamentos .................................................................................................. 175
6.8.2 Formações......................................................................................................... 176
6.9 Treinamento ........................................................................................................ 178
7 CONCLUSÃO.......................................................................................................... 179
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 182
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO AOS POLICIAIS MOTOCICLISTAS ................. 192
APÊNDICE B – ENTREVISTA COM OS COMANDANTES DE TROPA ................ 193
APÊNDICE C – ENTREVISTA COM O CEL PM ALEXANDRE MONCLUS
ROMANEK ................................................................................................................. 196
APÊNDICE D – ENTREVISTA COM O CEL PM JOSÉ BALESTIERO FILHO ...... 200
APÊNDICE E – ENTREVISTA COM O MAJ PM APARECIDO DENAMI JÚNIOR 205
APÊNDICE G – ENTREVISTA COM O CAP PM VALDINEI ARCANJO DA SILVA214
19

1 INTRODUÇÃO

Nos últimos 07 anos, o Brasil tem passado por grande transformação


social decorrente, sobretudo, de diversos acontecimentos políticos, sociais e
econômicos que desencadearam grandes manifestações públicas, as quais levaram
às ruas milhares de pessoas de diferentes grupos e movimentos, cada qual com
suas reivindicações e com grande disposição para solicitar mudanças.
Nesse contexto, podem-se mencionar dois momentos importantes que
exigiram grande esforço de gestão, planejamento e emprego operacional por parte
da Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMESP) na busca da preservação da
ordem pública: as manifestações de junho de 2013 e a greve dos caminhoneiros, em
maio de 2018.
As manifestações públicas ocorridas em junho de 2013 em inúmeros
municípios de diversos Estados brasileiros criaram um marco importante na história
social e política recente do país, principalmente na cidade de São Paulo, onde
centenas de milhares de pessoas, em um primeiro momento, foram às ruas para
protestar contra o aumento da passagem de ônibus.
Relevante se faz notar que a reivindicação inicial contra o aumento das
passagens, ao passar dos dias, foi reforçada pelo surgimento de inúmeros grupos e
ataques mais incisivos a outros fatores e situações políticas, econômicas e sociais
vigentes em todo Brasil naquele momento. (GOHN, 2014, p. 21)
O fato é que o Brasil e, mais especificamente o Estado de São Paulo,
acompanhava o fortalecimento de uma nova “forma” de manifestação pública com
características indefinidas pela participação simultânea de diversos movimentos e
grupos sociais, ocupantes do mesmo espaço físico, porém com objetivos,
reivindicações e estratégias de ação diferentes entre si e, consequentemente, de
difícil definição de liderança do todo e imprevisibilidade do modo de atuação, sendo
constatados atos de extrema violência.
Nos moldes da “Batalha de Seattle”1, iniciou-se a escalada de ações
violentas praticadas por grupos de manifestantes contra patrimônios e agentes

1
A Batalha de Seatlle foi uma série e de confrontos violentos entre ativistas e Policiais, ocorridos na
cidade de Seattle, no mês de novembro de 1999, ocasião em que milhares de pessoas foram às
ruas para se manifestar contra a a realização da terceira conferência ministerial da Organização
Mundial do Comércio (OMC). Disponivel em: https://www.cafehistoria.com.br/a-batalha-de-seattle-
antiglobalizacao. Acesso em 15 dez. 2020.
20

públicos (principalmente policiais), o surgimento de mídias independentes, entre


outros fatores, fazendo vir à tona e tornar-se conhecida a tática black bloc de ação,
praticada por indivíduos mascarados que utilizavam vestimentas e lenço pretos que
encobriam os rostos e atuavam de forma independente aos demais grupos
manifestantes, sem liderança definida em um primeiro momento, avessos à
negociação, contrários ao contato com autoridades públicas e com grande
capacidade de causarem danos.
A utilização de artefatos previamente preparados para agredir agentes
públicos e praticar atentados contra o patrimônio evidenciou a capacidade de
causarem danos em uma ampla extensão territorial, já que mesmo dispersos em
pequenos grupos, conseguiam realizar o seu intento, auxiliados pela velocidade de
comunicação da internet e mídias sociais, muitas vezes gerando dificuldade para o
planejamento e repressão desses atos por parte da Polícia Militar.
Já a greve dos caminhoneiros, iniciada no dia 21 de maio de 2018 e que
perdurou, aproximadamente, 10 dias, foi motivada pela alta dos preços do óleo
diesel e a fixação, pelo Governo Federal, de uma tabela mínima para os valores do
frete (BBC NEWS, 2020) e, mesmo despida de atos violentos na sua maior parte,
gerou grande esforço e demandas à PMESP, pois causou sérias consequências
econômicas e sociais tendo em vista a escassez de alimentos nos mercados, de
combustíveis nos postos de gasolina (paralização de parte dos transportes), faltas
de insumos para o funcionamento de fábricas etc., além do surgimento de diversos
pontos de tensão nas cidades e rodovias.
Nesses cenários, a PMESP viu-se diante de um grande desafio, sendo
muito exigida face da necessidade de implementar ações coordenadas de tropas
com grande capacidade responsiva e alcance territorial, bem como dispor de efetivo
com mobilidade e flexibilidade suficientes para chegar a locais obstruídos pelos
caminhoneiros, onde o policiamento enfrentava dificuldade para acessar.
Desta forma, existe a demanda de estudo que vise atender lacuna
doutrinária e procedimental que contemplem o aproveitamento desse potencial em
casos específicos, como os mencionados.
O presente projeto de pesquisa concentra-se na área de Gestão
Operacional uma vez que “possibilita o que chamamos de hora da verdade, ou seja,
o momento mágico em que todo o esforço gerencial das demais áreas é colocado
21

em contato com o público alvo, que é o cidadão receptor dos serviços da polícia
militar (sic).” (PMESP, 2010. p.61)
Nesse sentido, baseia-se também na diretiva de Inovação dentro da
Gestão do Conhecimento e Inovação prevista no Sistema de Gestão da PMESP
(GESPOL) que busca:

Inovar, ajustando as estruturas e comportamentos as expectativas dos


stakeholders passou a ser fundamental para que a Polícia Militar possa
assegurar desenvolvimento organizacional e excelência em seus serviços.
Gerir o conhecimento a partir da visão compartilhada dos objetivos comuns,
da aprendizagem em grupo, do estímulo a reflexão e a criação, da visão
global do sistema e de como as partes interagem, transformando
conhecimento tácito em explícito, ganhou importância estratégica para a
Polícia Militar (PMESP, 2010, p. 56 e 57).

1.1 Problema

O policiamento com motocicletas na PMESP, desde sua criação em agosto


de 1982, sedimentou-se como imprescindível ferramenta dentro do complexo
sistema de polícia ostensiva e preservação da ordem pública, sobretudo em
municípios que apresentam áreas de grande concentração comercial, intenso
tráfego urbano e congestionamentos.
A capacidade dessa atividade de policiamento na prevenção e repressão
imediata de crimes já restou provada, sendo que a eficácia e eficiência são
alcançadas pelas características proporcionadas pelo uso de motocicletas, quais
sejam: mobilidade, flexibilidade, capacidade responsiva e ostensividade. (PMESP,
1995 apud MOURA, 1997, p.16)
Neste sentido, após mais de três décadas de sua criação, o policiamento
com motocicletas, no âmbito da Polícia Militar, apresenta doutrina, técnicas e táticas
muito bem definidas e sedimentadas.
No entanto, quando se fala em emprego de policiais motociclistas em ações
de Controle de Multidões, a PMESP não dispõe de uma sistemática que possibilite
uniformização das ações no âmbito institucional, que possibilite uma atuação
eficiente, eficaz e segura, sendo imprescindível melhor análise sobre as
peculiaridades do emprego de motocicletas, nessas circunstâncias.
Ademais, nos últimos anos foram observados o surgimento e fortalecimento
de grupos e movimentos sociais de características combativas e alguns deles,
focados em atos violentos, como o emprego da tática black bloc, apresentaram-se
22

de forma mais relevante a partir dos eventos ocorridos em junho de 2013 e vem
perdurando ao longo dos anos, gerando a necessidade de que as forças de
segurança, sobretudo a PMESP, desenvolvam e aprimorem ações de preservação
da ordem pública com intuito de combater a violência nessas situações, preservar a
integridade física das pessoas e mitigar danos ao patrimônio público e privado.
Nesse sentido, tem-se que tática black bloc, segundo HERINGER:
[...] é o nome dado a uma tática de ação direta, de corte anarquista,
empreendida por grupos de afinidade que se reúnem, mascarados e
vestidos de preto, para protestar em manifestações de rua, utilizando-se da
propaganda pela ação da violência como forma de protesto, é basicamente
uma estrutura temporária, informal, não hierárquica e descentralizada[...]
(HERINGER, 2014. p. 53).

No contexto dessa tática está a estratégia de divisão desses grupos para


que alcancem grande mobilidade e rapidez para causarem danos consideráveis,
atingindo maior amplitude de área territorial, de forma simultânea, o que é otimizado
pela facilidade e características dos meios de comunicação atuais, seja por telefonia,
internet e mídias sociais.
Como já explanado, outro movimento de grande repercussão nacional que
desencadeou relevantes consequências sociais, políticas e econômicas no Estado
de São Paulo foi a greve dos caminhoneiros, em maio de 2018, quando milhares de
caminhões permaneceram estacionados ao longo de rodovias em diversos
municípios.
Embora, em um primeiro momento, os participantes tivessem simpatia pelas
forças de segurança, a Polícia Militar foi instada, em diversas ocasiões, a agir com
rapidez e capilaridade para evitar novas obstruções de locais, vias, ou rodovias e até
mesmo para desobstruir grandes áreas, encontrando dificuldades para o acesso de
tropas de Controle de Multidões convencionais.
Relevante se faz observar, porém, que o crescente número de eventos
nessas condições e ampliação da quantidade de participantes, impulsionada pelas
facilidades da telefonia, internet e redes sociais, geram a necessidade de
aperfeiçoamento constante da Polícia Militar, a fim de que seja possível responder
as seguintes questões:
a) Existe doutrina definida em âmbito da PMESP para atuação de policiais
motociclistas no Controle de Multidões?
23

b) Existem técnicas e táticas referentes ao Controle de Multidões por


policiais motociclistas, definidas na PMESP, que orientem a atuação do
Policial Militar operador no teatro de operações, bem como do Comandante
responsável pelo gerenciamento da ação?
c) Quais as capacidades e fraquezas do emprego de policiais motociclistas
em ações de Controle de Multidões?
d) Como empregar o pelotão de policiais motociclistas em ações de Controle
de Multidões de forma a garantir o cumprimento da missão a ele atribuída,
ao mesmo tempo em que seja mitigada a vitimização o Policial Militar, em
face da sua maior exposição?
d) Em quais circunstância o emprego de pelotão de policiais motociclistas
em ações de controle de multidões é indicado?
e) Como empregar o pelotão de policiais motociclistas de forma integrada às
demais modalidades e processos de policiamento nas ações de Controle de
Multidões?
Dessa forma, verifica-se que existe a demanda pelo emprego de pelotão de
policiais motociclistas, frente às ações de Controle de Multidões, sobretudo
decorrentes de manifestações públicas onde haja necessidade de resposta rápida,
barreiras físicas ao acesso de tropa convencional no teatro de operações e/ou a
necessidade de atuação contundente de forma descentralizada diante da dispersão
dos manifestantes no terreno. No entanto, não existe, no âmbito da PMESP,
doutrina, técnicas e táticas definidas em regulamentos para esse tipo de atuação.

1.2 Hipóteses

Para a atividade de patrulhamento com motocicletas, a PMESP possui


doutrina, técnicas e táticas de atuação bem sedimentada graças ao constante
trabalho de aperfeiçoamento ao longo de quase 40 anos desde a sua implantação.
Esse fato é verdadeiramente comprovado pela grande procura por parte de
Instituições Policial-Militares de outros Estados da Federação, Forças Armadas,
Guardas Civis etc., para frequentarem o curso de especialização que é realizado no
2º Batalhão de Polícia de Choque (2º BPChq), Unidade Gestora do Conhecimento.
Não existe, na PMESP, uma definição de doutrina específica, bem como
técnicas, táticas e estratégias para o emprego de policiais motociclistas em ações de
24

Controle de Multidões, uma vez que o conhecido “choque ligeiro”2 aproveita as


características das viaturas de quatro rodas.
O estudo e definição de doutrina, técnicas, táticas e estratégias de emprego
de policiais motociclistas em ações de Controle de Multidões possibilita uma atuação
profissional por parte dos policiais que executam esse processo de policiamento, a
padronização de procedimentos, que viabilize a atuação complementar de tropas de
apoio e, por fim, define uma forma clara de emprego no teatro de operações pelos
Comandantes, de forma a integrar e sistematizar todos processos de policiamento
em ações de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública em manifestações
públicas.
A adoção de protocolos de atuação, congregada no conhecimento dos
pontos fortes e fraquezas, da doutrina, da técnica, da tática e as estratégias
possíveis de emprego, alinhados às melhores práticas operacionais, tem o condão
de viabilizar o cumprimento da missão atendendo-se ao Princípio da Eficiência e, de
não menor valor, buscando a preservação da integridade física do policial militar.
A sedimentação do resultado da pesquisa no Manual de Controle de
Multidões, da Polícia Militar do Estado de São Paulo (M-8-PM), viabilizará essa
busca pela eficiência e qualidade na prestação de serviços, reforçada pela
padronização de procedimentos e, consequente segurança do operador durante sua
atuação, melhores condições de treinamento e redução de não-conformidades.

1.3 Objetivos gerais e específicos

O presente estudo tem por objetivo geral propor a adoção de técnicas e


táticas de atuação de policiais militares motociclistas em ações de Controle de
Multidões3, em situações de difícil acesso de tropas convencionais, diante da
necessidade de resposta rápida e/ou para atuar frente à ação de grupos menores de
turbadores dispersos, com capacidade de gerar danos, e possível complementação

2
Ação de Controle de Multidões com o apoio de viaturas leves. É assim conhecido por proporcionar
ao pelotão de choque, nessas condições, maior velocidade na ação, garantida pela grande
mobilidade e flexibilidade pelo uso de viaturas leves para se deslocar.
3
Define-se Controle de Multidões como sendo o “conjunto de procedimentos destinados à
restauração da ordem pública, quebrada pela ação da turba, subdividindo-se em: Intervenção
Indireta, realizada através da ação de presença, contenção, acompanhamento ou negociação; ou
Intervenção Direta, realizada por meio das táticas de repelir ou de dispersar” (PMESP, 2018, p.18).
25

do Manual de Controle de Multidões (M-8-PM). Como objetivos específicos,


pretende-se:
a) Avaliar as capacidades e vantagens do uso de policiais motociclistas em
ações de Controle de Multidões.
b) Avaliar os fatores restritivos e as dificuldades de emprego de policiais
militares motociclistas em ações de Controle de Multidões.
c) Estudar e apresentar possibilidade de integração dessa ferramenta com
os demais programas e modalidades de policiamento, possibilitando um
planejamento e emprego sistemático da força policial no teatro de
operações.

1.4 Justificativa

Para garantir o cumprimento das suas atribuições de polícia ostensiva e de


preservação da ordem pública, a Polícia Militar do Estado de São Paulo deve ter
capacidade para atuar e possibilidade efetiva para concretizar uma ação eficiente e
aceitável, diante das diversas circunstâncias que se apresentam.
Certamente, os fatores positivos decorrentes do uso de motocicletas no
Controle de Multidões, como mobilidade, flexibilidade, ostensividade e
responsividade, claramente demonstram a eficiência a qual pode ser alcançada por
meio do emprego desse processo de policiamento, nessas ações.
No entanto, como Instituição fundada nos princípios constitucionais que
regem a Administração Pública, sustentada, conforme previsto no Sistema de
Gestão da PMESP, pelo respeito aos direitos humanos e na filosofia da Polícia
Comunitária, na busca da gestão pela qualidade, urge a necessidade de estudo e
determinação de doutrina, técnicas, táticas e estratégias de atuação sistemática, de
forma a garantir o compromisso de atuação profissional do policiamento com
motocicletas em ações de Controle de Multidões.
Como exemplo de grande eficiência, pode ser mencionada a atuação
ocorrida em 26 de maio de 2018, ocasião em que o Comandante do Policiamento de
Choque (Cmt Pol Chq), Sr. Cel PM Alexandre Gaspar Gasparian, estando no
comando direto da operação, promoveu a desinterdição da Rodovia “Mário Covas”
(Rodoanel), que estava ocupada pelos caminhoneiros em greve há 5 dias, nos dois
sentidos da pista, entre as Rodovias Anchieta e Imigrantes.
26

Naquela ocasião, após reunião com os Comandantes de tropa que estavam


a sua disposição no local [Pelotão de Choque, do 3º BPChq – com veículo blindado,
Pelotão das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) e Pelotão do Comando de
Policiamento Rodoviário (CPRv)], análise do terreno e demais condicionantes,
decidiu empregar uma Companhia (Cia), das Rondas Ostensivas com Apoio de
Motocicletas (ROCAM), do 2º BPChq, para adentrar à manifestação e promover a
desinterdição, certamente com as demais tropas realizando o apoio nas
extremidades.
Dessa forma, a mobilidade, a flexibilidade e ostensividade das motocicletas
possibilitaram o acesso a uma área bloqueada por veículo e pessoas, além de
permitir uma reposta rápida a focos de tensões que surgiam ao longo da rodovia e
nos dois sentidos, o que impediu a atuação contundente e contagiosa de lideranças
contrárias a ação de desocupação naquele momento.
Essa ação coordenada da Cia de ROCAM, do 2º BPChq, sob comando do
Sr. Coronel PM Gasparian, resultou na desinterdição de aproximadamente 5 km de
rodovia, nos dois sentidos, sem que houvesse a necessidade de uso de granadas e
elastômeros, sendo o Cmt Pol Chq, posteriormente, convidado a apresentar as
estratégias de atuação nesse evento para Comandantes do Exército Brasileiro que
estavam com a incumbência de realizar a desinterdição das Rodovias Federais4.
Nas palavras do Sr. Cel PM Gasparian, Comandante do Policiamento de
Choque, o emprego da ROCAM, policiais embarcados em motocicletas, foi
fundamental para que fosse possível alcançar o resultado positivo na Operação.
A referida ação, como um todo, certamente, alcançou o resultado esperado
em razão da grande experiência operacional do Sr. Cmt Pol Chq e notável
conhecimento na gestão de polícia ostensiva e preservação da ordem pública,
sobretudo na gestão multidões, no entanto, quanto à intervenção específica dos
policiais motociclistas, esta ocorreu de forma profissional, porém improvisada, pois
não haviam protocolos previamente definidos para atuação em casos similares,
sendo a experiência dos operadores fundamental para o sucesso da missão.
Corroborando tal ideia, tem-se o Manual de Padronização de Procedimentos
Policiais Militares (M-13-PM) em que:

4
As informações são baseadas em experiência e conhecimento próprio do autor, pois era o
comandante da 4ª Cia, do 2º BPChq – ROCAM, cujo efetivo atuou diretamente na liberação da
Rodovia Mário Covas – Rodoanel, durante a Greve dos Caminhoneiros em 2018.
27

2.0 - Tem sido constatado que a padronização é uma ferramenta


fundamental para administrar e um caminho de adequação e alcance de
níveis desejáveis de qualidade, produtividade, competitividade, controle dos
processos e segurança no ambiente de trabalho, contribuindo para a
obtenção de resultados e permitindo melhor descrição das funções, o que
facilita o processo de descentralização operacional, desburocratiza a
administração, simplifica o processo de educação e treinamento dos
profissionais, identifica os responsáveis pela realização do trabalho
adequado e, sobretudo, minimiza os erros profissionais (PMESP, 2003. p.
6).

1.5 Metodologia

Para a realização do presente estudo, definiram-se os tipos de pesquisas a


seguir como os mais adequados aos objetivos pretendidos, bem como para
confirmar o método hipotético-dedutivo:
a) Quanto à natureza: é uma pesquisa aplicada, pois o conhecimento
produzido permitirá o aprimoramento das ações de Controle de Multidões,
na PMESP;
b) Quanto aos objetivos: trata-se de pesquisa exploratória, já que se
identificaram os fatores positivos e negativos, a amplitude do problema e os
desafios para a integração e sistematização com os demais processos de
policiamento;
c) Quanto à abordagem: trata-se de abordagem qualitativa, capaz de
identificar e analisar dados imensuráveis numericamente, tais como as
informações provenientes das entrevistas e questionários; ademais, houve
abordagem quantitativa a partir da análise de dados colhidos na pesquisa de
opinião;
d) Quanto aos procedimentos: foram realizadas pesquisas bibliográficas e
documentais, diante da necessidade do entendimento dos conceitos e dos
padrões, mormente aqueles já sedimentados no Manual de Controle de
Multidões da PMESP (M-8-PM). No tocante à pesquisa de levantamento,
buscou-se colher dados da seguinte maneira: (i) foram encaminhados
questionários a todo efetivo de Praças e Oficiais dos pelotões de
policiamento com motocicletas da 3ª e 4ª Cia – ROCAM, do 2º Batalhão de
Polícia de Choque, das Forças Táticas do 4º BPM/M, 7º BPM/M, 13º BPM/M
e 16º BPM/M, e do 4º e 7º BAEP; (ii) foram entrevistados os Coronéis de
Polícia Militar, José Balestiero Filho e Alexandre Monclus Romanek, os
28

Majores (Maj) de Polícia Militar, Aparecido Denami Júnior, Luís Humberto


Caparroz e Capitão (Cap) de Polícia Militar Valdinei Arcanjo da Silva; e (iii)
foram entrevistados policiais militares da ativa e inativos,
Pelo exposto, o presente estudo foi fundado ainda na experiência pessoal do
autor que trabalhou, aproximadamente, 13 anos no 2º BPChq, Unidade da PMESP
especializada na atividade de Gestão de Multidões e policiamento com motocicletas,
e atuou diretamente nas manifestações de junho de 2013, como comandante de
Pelotão de Choque e comandou o efetivo da 4ª Cia do 2º BPChq – ROCAM na ação
que desinterditou a Rodovia Mário Covas – Rodoanel, durante a greve dos
caminhoneiros em 2018.

1.6 Distribuição de capítulos

A presente pesquisa foi estruturada em sete capítulos, sendo o primeiro


destinado a apresentar de forma introdutória o problema, hipótese, objetivos gerais e
específicos, a justificativa e o método, com o intuito de demonstrar como o estudo foi
realizado e o que se pretende ao seu término.
O segundo capítulo destina-se à análise das manifestações públicas,
apresentação de um breve histórico de alguns dos mais expressivos movimentos
sociais e manifestações ocorridos no mundo e no Brasil, além de movimentos
ocorridos no final do século XX e início do século XXI e na atualidade, com o
objetivo de entender sua evolução influenciada pela globalização, internet e a quarta
revolução industrial. Buscou-se também, demonstrar as novas características
assumidas pelas manifestações contemporâneas e os desafios enfrentados pela
Polícia Militar do Estado de São Paulo para garantir a manutenção da ordem pública
nesse novo cenário, sobretudo diante do debate jurídico em preservar os direitos
fundamentais dos ativistas, ao mesmo tempo em que sejam garantidos os direitos
dos demais cidadãos, sempre dentro da necessidade de garantia da ordem pública
no seu sentido mais amplo.
O capítulo três posiciona a PMESP dentro do conceito de Gestão de
Multidões, apresentando os princípios que regem sua atuação para a manutenção
da ordem pública nesse cenário, bem como uma breve explanação das técnicas,
táticas e procedimentos vigentes.
29

No capítulo quatro são identificados os fatores favoráveis e restritivos para o


emprego do policiamento com motocicletas no Controle de Multidões, ocasião em
que é discutido seu grande potencial para contribuir efetivamente na neutralização
dos incidentes críticos dinâmicos relacionados às manifestações públicas
contemporâneas ou, ao menos, na mitigação dos seus efeitos. Também é explorado
um panorama no qual o incidente crítico “manifestação pública” está inserto, dentro
de uma perspectiva de segurança pública.
No capítulo cinco são apresentados e discutidos os resultados das pesquisas
realizadas por meio de questionários direcionados a policiais motociclistas de
Organizações Policiais Militares (OPM) da PMESP e de outros Estados da federação
que atuam na Gestão de Multidões com relativa frequência, e entrevistas com
comandantes que participaram diretamente de ações operacionais em grandes
manifestações.
No capítulo seis é apresentada proposta de técnica, tática e procedimento
para o emprego do policiamento com motocicletas no controle de multidões, para
possível complementação do M-8-PM. Ainda, algumas adequações técnicas, de
material, equipamentos e fardamento necessários para que se atinja maior eficiência
na missão.
O capítulo 7 é a conclusão.
30

2 ASPECTOS HISTÓRICOS, SOCIAIS E JURÍDICOS DAS MANIFESTAÇÕES


PÚBLICAS

Nos dias de hoje, verifica-se uma participação muito ativa da sociedade nas
discussões e cobranças dos destinos da nação.
As manifestações públicas ocuparam as ruas das cidades sem temer
qualquer autoridade pública, formas de governo, ideologias ou repressão. As
diferenças sociais, culturais, econômicas e políticas existentes entre os povos foram
diminuídas, para não dizer eliminadas, diante de um mundo cada vez mais
globalizado. A assustadora demonstração de força de uma massa decidida a fazer
ser ouvida, muitas vezes com emprego de violência, tornou-se cada vez mais
frequente e voltou a ser uma grande preocupação para as autoridades políticas e,
sobretudo, as de segurança.
Ditadores estão sendo depostos, líderes políticos sendo obrigados a fugirem
para outros países ou a renunciarem seus cargos, governantes são pressionados
por novas políticas públicas ou por anulação de outras. A luta por direitos a simples
demonstração de insatisfação em relação a uma fala, atitude ou decisão contrária ao
conceito próprio de um grupo a respeito do justo, correto ou satisfatório virou rotina
das grandes e, até mesmo, pequenas cidades.
Nesse ponto, questiona-se: o que são os movimentos sociais e as
manifestações públicas?
Gohn (2007), conceitua movimentos sociais como “ações sociais coletivas
de caráter sócio-político e cultural que viabilizam distintas formas da população se
organizar e expressar suas demandas”. E ainda, ao falar de suas formas de
atuação, complementa que:

Na ação concreta, essas formas adotam diferentes estratégias que variam


da simples denúncia, passando pela pressão direta (mobilizações, marchas,
concentrações, passeatas, distúrbios à ordem constituída, atos de
desobediência civil, negociações, etc), até pressões indiretas (Gohn, 2007).
Jasper (2016), por sua vez, ao conceituar os movimentos sociais, pontua a
necessidade de demonstração de algumas características, esclarecendo que:

[...] os movimentos sociais são esforços persistentes e intencionais para


promover ou obstruir mudanças jurídicas e sociais de longo alcance,
basicamente fora dos canais institucionais normais sancionados pelas
autoridades. “Persistente” implica que esses movimentos diferem de
eventos isolados, como reuniões e assembleias, que são as atividades
31

básicas patrocinadas pela maioria deles. A persistência dos movimentos


sociais muitas vezes propicia o desenvolvimento de organizações formais,
mas ele também opera por meio de redes sociais informais.
A palavra “intencionais” vincula os movimentos a cultura e estratégia [...]
(JASPER, 2016, p. 23-24).
O Dicionário Michaelis (2020)5 conceitua manifestação como “Grupo de
pessoas que se reúnem em local público para defender seus direitos, opiniões etc.”.
No âmbito da PMESP, o Manual de Controle de Multidões define
manifestação como “a demonstração, por pessoas reunidas, de sentimento hostil ou
simpático a determinada autoridade ou a alguma condição, movimento econômico,
cultural ou social”. (PMESP, 2018, p. 14)
Desta forma, pode-se entender que manifestações públicas (ou protestos)
são a demonstração de sentimento hostil ou simpático a determinada autoridades ou
condição econômica, social ou cultural e, como exposto por Jasper (2016, p. 16),
“[...] quando os indivíduos passam a coordenar seu protesto, formam movimentos”.
As manifestações públicas e os movimentos sociais não são uma forma de
organização recente dos povos. Certamente, a mobilização popular faz parte da
história do mundo. Sempre existiram, sempre geraram consequências, às vezes
grandes transformações. O fato é que, acompanhando a evolução da sociedade,
sob fortes influências da globalização e da quarta revolução industrial, a organização
e a forma das pessoas e grupos manifestarem-se também evoluiu, sendo inegável a
grande amplitude e força assumida nos dias de hoje, grande frequência, capacidade
de mobilizar pessoas, capacidade para gerar consequências de dimensões
imprevisíveis e velocidade para se transformar.
Na visão de Gomes (2013):

Protestos populares não são novidade em nenhuma parte do mundo. [...]


Trata-se de uma fenomenologia mundial. O ser humano, por natureza, é
insatisfeito. Quando satisfeito, costuma não tolerar a injustiça, o
autoritarismo ou o desmando. Para tudo, sobretudo para a opressão, há
limite (GOMES, 2013).6
A professora Maria da Glória Gohn ainda reforça que:

Na realidade histórica, os movimentos sempre existiram e cremos que


sempre existirão. Isto porque eles representam forças sociais organizadas
que aglutinam a pessoas não como força-tarefa, de ordem numérica, mas
como campo de atividades e de experimentação social, e essas atividades
são fontes geradoras de criatividade e inovações socioculturais [...] Eles
expressam energias de resistência ao velho que os oprime, e fontes
revitalizadas para a construção do novo (GOHN, 2007)

5
Sem paginação.
6
Idem.
32

Desde a antiguidade, as manifestações populares são motivos de grande


atenção para aqueles que detém o “poder”, pois controlar as multidões sempre foi
uma necessidade para garantir a estabilidade e a unidade de impérios. A política do
pão e circo, implementada pelo imperador romano Otávio Augusto, em 14 a.c.
demonstra bem o quanto os governantes temiam as potenciais consequências que
poderiam ser produzidas pela força das multidões.

Em síntese, a crise na transição da República Romana para o sistema de


impérios fez surgir políticas públicas, como a política do Pão e circo. O
termo vem do latim, panem et circenses, e representava a forma que as
autoridades encontraram para distrair a sociedade romana do caos social e
das crises.
Além do mais, a estratégia política era uma forma de evitar que a sociedade
se rebelasse contra o governo, promovendo levantes e manifestações
(BORGES, 2020)7.
Certamente, as intenções dos imperadores e reis, na maioria das vezes, não
estavam relacionadas com uma preocupação direta em garantir as liberdades ou
direitos de seus súditos, restando, portanto, grande receio de desencadeamento de
revoltas incontroláveis, o que poderia gerar revoluções (como muitas efetivamente
ocorreram).
O fato é que em diversos momentos da história, o poder das multidões foi
decisivo ao consagrar tomadas de Poder, destituir ditadores, derrubar governos,
regimes, reorganizar estruturas e organizações, redirecionar políticas públicas,
destruir paradigmas, modificar culturas, comportamentos, pensamentos etc.
Dentro desse cenário, a Revolução Francesa apresenta-se como um dos
maiores exemplos dessa força popular que, insatisfeita com as injustiças promovidas
pelo Rei Luis XVI, o destituiu do trono, sentenciou-o à guilhotina, tomou o poder e
viu surgir a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, baseados nos
preceitos de Liberdade, Igualdade e Fraternidade (REVOLUÇÃO..., 2018).
É verdade, porém, que esse movimento da sociedade também foi evoluindo,
conforme apontado por Jasper (2016):

Em cinquenta anos de pesquisa na França e Grã Bretanha, Tilly mostrou


como o protesto mudou, nos séculos XVIII e XVIV, de ataques diretos a
proprietários de terras, coletores de impostos, vizinhos mal comportados e
outros alvos de indignação para esforços indiretos – por meio de cartas,
petições e manifestações públicas – a fim de influenciar ocupantes de
cargos eletivos (JASPER, 2016, p. 39).
Acredita-se que as manifestações públicas e os movimentos sociais estarão
cada vez mais presentes no dia a dia da sociedade, cultivados pela democracia,
7
Sem paginação.
33

dentro do seu significado mais amplo de soberania popular, a qual “é para os


movimentos, tanto um objetivo quanto um meio” (JASPER, 2016, p. 39).
Nesse particular, as pessoas estão cada vez mais conectadas ao que os
governos fazem ou deixam de fazer e:

Quando grupos percebem que seus governos estão fracassando na tarefa


de prover essas coisas, aprendem a se reunir em movimentos sociais.
Como os regimes que se afirmam democráticos prometem tantas coisas,
ironicamente, constituem fontes potenciais de indignação em maior grau do
que os regimes autocráticos. As expectativas são maiores (JASPER, 2016,
p. 39).
E assim, a história foi e é construída por meio de movimentos de
insatisfações e discordâncias de grupos de pessoas, por vezes formados por
diferentes “classes sociais” que, em algumas situações, se unem para reclamar pelo
que consideram justo, correto, diante de uma dita injustiça, ilegalidade, praticada por
aqueles que detém o poder.

2.1 Breve histórico dos movimentos sociais pelo mundo

A história é farta em exemplos de movimentos sociais que mudaram


significativamente o caminho das sociedades do mundo e, em diversas
oportunidades, demonstraram sua força enfrentando de forma surpreendente
governos vistos como fortes, até ditadores e, muitas vezes, alcançando êxito,
fazendo surgir novos valores, encerrando ciclos de outros valores, forma de
organização social e estrutura de Estados.
Sendo assim, grandes movimentos sociais podem ser lembrados pela sua
grande dimensão ou pela importante transformação no cenário mundial da sua
época.

2.1.1 A Revolução Russa de 1917

Iniciou-se com as manifestações organizadas pela classe dos trabalhadores,


camponeses e soldados desertores da 1ª Guerra Mundial que reivindicavam a saída
da guerra, medidas contra a fome decorrente da grave crise econômica gerada pela
participação no conflito, além da distribuição de terra. A manifestação que teve início
nos últimos dias de fevereiro de 1917, pelo Dia Internacional da Mulher, em São
Petersburgo, ganhou força com apoio popular e outros setores da sociedade,
34

culminado com renúncia do czar e a formação de um governo provisório que, mais à


frente, sob a liderança de Lênin, transformou-se no Estado Socialista Soviético.
(PINTO, 1999)

2.1.2 O “Apartheid”, de 1960

As manifestações contra o Apartheid reuniram milhares de pessoas na África


do Sul, no ano de 1960. O grande movimento teve início em 21 de março, em frente
a uma delegacia no município de Shaperville, ocasião em que as pessoas se
reuniram para protestar contra a Lei do passe, que obrigava a todos os negros
carregarem cadernetas onde constavam as localidades onde poderiam circular.
Nesse dia, durante o confronto com as instituições estatais, estima-se que 69
pessoas morreram e dezenas ficaram feridas (entre elas mulheres e crianças) e
mais de 18.000 pessoas foram presas, o que ficou conhecido como “Massacre de
Shaperville”. A partir desse dia, uma onda de protestos e greves espalharam-se por
todo país e pelo mundo, sendo o episódio condenado pelas Nações Unidas. Em
1966, a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou a data de 21 de março
como o Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, ocasião em
que a ONU reafirma “seu propósito de combater e erradicar o racismo, a
discriminação racial, a xenofobia e todas as formas relacionadas de intolerância que
acontecem em diferentes partes do mundo” (MANIFESTANTES, 2004)8.

2.1.3 O Massacre da Praça da Paz Celestial em 1989

O chamado Massacre da Praça da Paz Celestial foi caracterizado pela


famosa cena do jovem que se postou na frente de tanques de guerra enviados para
reprimir os protestos que eram desenvolvidos por toda a cidade de Pequim, em
junho de 1989. A manifestação foi marcada por uma dura repressão pelo governo
chinês, principalmente nos dias 03 e 04 daquele mês, que resultou em centenas,
talvez milhares de mortos, entre civis e militares, não havendo dados oficias que
comprove a quantidade.

8
Sem paginação.
35

Os protestos iniciaram em 13 de maio de 1989, quando estudantes


acamparam na Praça da Paz Celestial, fazendo greve de fome, pedindo maior
abertura política, menos corrupção, além de mudanças econômicas para conter a
inflação e o desemprego. Com a cobertura por diversos órgãos de imprensa
internacionais, os protestos ganharam força, visibilidade, passando a se espalhar
por diversos pontos da China.
O massacre gerou repercussão negativa em todo o mundo, resultando na
imposição de diversos embargos econômicos e políticos ao Governo Chinês que
decretou a Lei Marcial no país e passou a tomar inúmeras medidas para exercer
cada vez mais controle e fiscalização dos seus cidadãos. (SUDWORTH, 2019)

2.1.4 Movimento Occupy nos Estados Unidos (2011)

O movimento Occupy foi uma série de protestos, em um período de crise


financeira e imobiliária, que teve início em 17 de setembro de 2011, nos Estados
Unidos, com a reunião de milhares de pessoas em Wall Street e a ocupação do
Zuccoti Parke, no distrito financeiro de Manhattan, na cidade de Nova Iorque para
expressarem sua indignação contra a situação financeira e social do país e,
principalmente, reivindicando a nomeação de uma comissão presidencial para
decretar a independência do governo em relação a Wall Street. (CASTELLS, 2017,
p. 13)
Influenciado pelas manifestações na Praça Tahrir, no Cairo, em 2011, palco
da Revolução Egípicia, e as acampadas da Espanha, o movimento Occupy Wall
Street teve como primeiros passos, em 13 de julho de 2011, a publicação da revista
crítica cultural Adbusters, com sede em Vancouver, no seu blog:
“#occuppywallstreet. Você está pronto para um momento Tahrir? No dia 17 de
setembro, invada Lower Manhattan, monte barracas, cozinhas, barricadas pacíficas
e ocupe Wall Street.” (CASTELLS, 2017, p. 131)
Formado por um grupo de pessoas relativamente jovens, cujas expectativas
profissionais se viam limitadas na economia daquele momento, era também
bastante heterogêneo quanto às suas preferências políticas e ideológicas. No
entanto, sua principal característica é a ausência de liderança formal.
A característica mais importante era a ausência deliberada de liderança
formal. Não havia líderes no movimento em âmbito local, nacional ou global.
Esse era o princípio básico aplicado pela multidão de ocupantes com a
36

maior determinação sempre que alguém tentava assumir um papel de


destaque. Foi realmente um experimento de organização de movimentos
sociais. Ele desmentiu o arraigado pressuposto de que nenhum processo
sociopolítico poderia funcionar sem algum tipo de orientação estratégica e
de autoridade vertical. No movimento Occupy, não havia liderança, fosse
ela tradicional ou carismática. E certamente não havia liderança pessoal.
Havia funções de liderança, mas estas eram exercidas em âmbitos local,
pela assembleia geral que se reunia regularmente no espaço ocupado.
Havia também funções de coordenação que ajudavam a estruturar decisões
coletivas, e estas eram assumidas por redes de consulta interativa da
internet. (CASTELLS, 2017, p.149-150)

O movimento nasceu pela internet e redes sociais e foi igualmente por meio
deles que foi amplamente difundido e sedimentado. Esse ativismo no espaço digital,
porém, foi dividido pela contundente tática de ocupação dos espaços públicos que
propiciou a formação de uma comunidade ativa em debates na busca de soluções
para o que consideravam injusto.

Assim, o movimento Occupy construiu uma nova forma de espaço, uma


mistura de espaços de lugares, num determinado território e espaço de
fluxos na internet. Um não conseguia funcionar sem o outro; esse espaço
híbrido é que caracterizava o movimento. Os espaços tornavam possível
interagir face a face, compartilhar a experiência, o perigo e as dificuldades,
assim como, em conjunto, enfrentar a polícia e suportar a chuva, o frio e a
perda de conforto em suas vidas cotidianas. Mas as redes sociais da
internet permitiram que a experiência fosse divulgada e amplificada,
trazendo o mundo inteiro para o movimento e criando um fórum permanente
de solidariedade, debate e planejamento estratégico (CASTELLS, 2017, p.
140).

Com a grande divulgação das imagens e notícias pela internet, outras


ocupações espontâneas passaram a surgir em diversos pontos dos EUA. Não se
tem o número exato, porém se estima que a quantidade de manifestações nos EUA
em meados de outubro de 2011 era superior a seiscentos. (CATELLS, 2017, p. 135)
Nem todos acampamentos eram permanentes, porém as grandes
ocupações como as de Nova Iorque, Los Angeles ou Oakland, apresentavam grande
organização, chegando a obter estrutura de barracas, sanitários, cozinhas, creches,
espaços lúcidos para crianças, jardins comunitários, bibliotecas populares, centros
de mídia e até energia produzida por bicicletas. (CASTELLS, 2017, p. 141)
Embora muitos ativistas tenham sido presos pela polícia, o movimento
Occupy foi predominantemente não violento. Não obtiveram grandes conquistas
práticas, mesmo porque suas reivindicações não eram específicas. Porém, segundo
Castells, (2017, p. 163), as conquistas políticas alcançadas detêm importância
significativa.
37

[...] o mais decisivo na avaliação política de um movimento social é seu


impacto sobre a consciência das pessoas [...] Em consequência do
movimento, assim como dos debates por ele gerados na internet e na mídia
tradicional, a questão da desigualdade social, condensada na oposição
entre os 99% e o 1%, passou para o primeiro plano no discurso público
(CASTELLS, 2017, p. 163).

2.2. Breve histórico das manifestações no Brasil

O Brasil, mesmo com sua democracia recente, tem um histórico importante


de movimentos sociais e manifestações públicas que influenciaram a história
brasileira até os dias de hoje.
O estudo desses movimentos se torna importante na medida em que se
pode identificar sua forma de estruturação, estratégias, comportamento da multidão
e sua evolução, possibilitando a adequação das estratégias, técnicas, táticas e
procedimentos da Polícia Militar frente sua responsabilidade de manutenção da
ordem pública.
A seguir, serão citadas algumas manifestações públicas que pela sua
dimensão, violência, capacidade de influenciar mudanças, impactaram direta ou
indiretamente na formação da sociedade brasileira atual.

2.2.1 Revolta da Vacina (1904)

A revolta da vacina foi uma grande manifestação pública em resposta à


obrigatoriedade da vacinação contra varíola em todo o território nacional,
determinada por lei federal proposta pelo Presidente da República Rodrigues Alves,
sob orientação do sanitarista Oswaldo Cruz que, como Diretor da Diretoria Geral de
Saúde Pública, enfrentou outras epidemias na época, como febre amarela, febre
bubônica, tuberculose e febre tifoide. (A REVOLTA..., 2005)
Aprovada em 31 de outubro de 1904 e regulamentada em 09 de novembro
daquele ano, como forma de conter o surto de varíola, diante de outras inúmeras
medidas de saneamento, a promulgação da referida lei levou às ruas da cidade do
Rio de Janeiro (capital da República a época), grande número de populares
contrários à obrigatoriedade da vacina. A multidão foi reforçada por estudante e
impulsionados por forças políticas contrárias ao Presidente, que criaram a Liga
38

contra a vacinação obrigatória, reunindo também operários, republicanos radicais e


militares a favor da causa. (A REVOLTA..., 2005)
Diversos confrontos ocorreram entre a Força Policial do Rio de Janeiro e
tropas do Exército Brasileiro contra os manifestantes entre os dias 10 e 18 de
novembro, o que resultou em 945 prisões, 461 indivíduos deportados, 110 feridos e
30 mortos. Ao final, Rodrigues Alves desistiu da vacinação obrigatória, e a revolta foi
contida. Convém registrar que “Mais tarde, em 1908, quando o Rio foi atingido pela
mais violenta epidemia de varíola de sua história, o povo correu para ser vacinado,
em um episódio avesso à Revolta da Vacina.” (A REVOLTA..., 2005)9

2.2.2 Greve Geral de 1917

Entre 1917 e 1920 o Brasil viveu anos de fortalecimento dos movimentos


operários que, impulsionados pela Revolução Russa de 1917, promoveram greves
em diversas cidades brasileiras, reivindicando melhores condições de trabalho. Um
dos atos mais importantes foi a Greve Geral de 1917, realizada em São Paulo,
ocasião em que aproximadamente 50.000 trabalhadores aderiram ao movimento.
Iniciado por meio de protestos contra a alta dos preços, decorrentes das
consequências provocadas pela 1ª Grande Guerra, a greve ganhou força em razão
da da participação ativa e da coordenação de militantes socialistas, como o
experiente sindicalista italiano Teodoro Monicelli e o anarquista Luigi Damiani,
marcando também um momento de fortalecimento e reorganização sindical. Após
dias de embates e confrontos entre os manifestantes e a polícia, o governo do
Estado, por meio do Secretário de Segurança Eloi Chaves assinou uma base de
acordo com os representantes empresariais e os grevistas assinalando “que
reconhecia o direito de reunião, aumentos salariais, a libertação dos militantes e
operários presos nas manifestações e embates, e a proibição de despejo de
operárias grevistas.”. (BIONDI, 2016)10

2.2.3 Marcha da Família (1964)

9
Sem paginação.
10
Idem.
39

A marcha da família foi uma série de manifestações ocorridas em março de


1964, organizadas, principalmente, por entidades femininas e setores do clero, além
de segmentos da classe média, favoráveis à deposição do então presidente da
República João Goulart, diante do temor do “perigo comunista”. As primeiras
manifestações ocorreram em 19 de março em São Paulo e se expandiram por todo
território nacional até a derrubada de João Goulart em 31 de março, pelos militares.
As marchas persistiram ainda após a queda do presidente da república em vária
capitais, no entanto, com a denominação de marcha da vitória. No Rio de Janeiro,
estima-se que no dia 02 de abril, cerca de um milhão de pessoas foram às ruas
(LAMARÃO, 1999).

2.2.4 Marcha dos 100 mil (1968)

A marcha dos cem mil foi uma manifestação realizada no Rio de Janeiro, em
26 de junho de 1968, promovida pelo movimento estudantil, com a participação de
intelectuais, operários, profissionais liberais, religiosos e populares contra o regime
militar.
O movimento reivindicava o restabelecimento das liberdades democráticas,
a suspensão da censura à imprensa e a concessão de mais verbas para a educação
e entrou em confronto com a Polícia Militar na Avenida Rio Branco, após embate
ocorrido entre Policiais e manifestantes em frente à embaixada norte-americana, que
foi depredada.
O confronto na avenida Rio Branco durou horas e resultou em viaturas
policiais queimadas, centenas de feridos, mil prisões e três mortos, segundo versão
oficial, ficando conhecido como “sexta-feira sangrenta”. (LAMARÃO, 1999)

2.2.5 Greve de 1979

A greve de 1979 foi uma mobilização deflagrada pelos sindicatos


metalúrgicos do ABC paulista, liderada por Luís Inácio Lula da Silva (Lula), que
reivindicava aumento salarial de 71%, 40 horas semanais de trabalho, estabilidade
no emprego e indicação de delegados sindicais nas empresas.
A paralização teve início em 13 de março daquele ano e perdurou por 14
dias. Estima-se que no terceiro dia eram contabilizados, aproximadamente, 200 mil
40

operários mobilizados no ABC. No décimo dia, o Tribunal Regional do Trabalho


declarou a greve ilegal e determinou a demissão da diretoria dos sindicatos
passando sua administração ao Tribunal. Grande efetivo da Polícia Militar foi
deslocada ao ABC, local onde ocorreram diversos confrontos com os manifestantes
contrários às decisões do Governo.
Diante do cenário apresentado, Luís Inácio Lula da Silva pediu a suspenção
da greve por 40 dias para que as negociações fossem retomadas, sendo que o
acordo entre o sindicato e a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos
Automotores foi efetivado em maio
No primeiro semestre do ano de 1979, incentivada por algumas das
principais lideranças dos movimentos grevistas deflagrados em diversos pontos do
país, foi lançada a proposta de formação do Partido dos Trabalhadores, cuja
comissão provisória seria composta por Lula, entre outros, e que teve seu
reconhecimento oficial pelo Tribunal Superior Eleitoral em 11 de fevereiro de 1982.
(KORNIS e SANTANA, 2009)

Figura 1 Lula na Greve de 1979

Fonte: Folhapress, 2017 (Disponível em:


https://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/1586789998094633-greve-
de-metalurgicos-no-abc-paulista-em-1979. Acesso em 23 ago. 2020).

2.2.6 Diretas Já (1984)


41

“Diretas Já” foi um movimento que reivindicava o retorno das eleições diretas
para presidente da república, tendo início em 1983 e ganhou força nos primeiros
meses de 1984.
A última eleição direta para presidente no Brasil havia ocorrido no ano de
1960, porém foi substituída por eleições indiretas durante o Regime Militar.
A instabilidade econômica e, sobretudo, política vivenciada no 1983 foi
acompanhada pelo fortalecimento e acordos entre os partidos de oposição, que
passaram a se mobilizar em torno da causa. O movimento ganhou força com o
projeto de Emenda à Constituição apresentada pelo deputado federal Dante de
Oliveira.
Nos primeiros meses de 1984, os comícios e passeatas iniciadas em 1983,
tomaram grande dimensões e passaram a ocorrer com maior frequência em diversas
capitas e cidades em todo Brasil, com grande engajamento de artistas, intelectuais,
políticos e a participação de centena de milhares de pessoas que reivindicavam a
“Diretas Já”11.
O movimento perdurou por meses, até que em 25 de abril de 1984 o projeto
de Emenda Constitucional proposto pela Deputado Dante de Oliveira foi posto em
votação no Congresso Nacional, ocasião em que não recebeu os 2/3 de votos
favoráveis necessários para sua aprovação
No entanto, em 1985 a oposição consegue eleger Tancredo Neves a
Presidente e José Sarney a vice. Entretanto, Tancredo Neves adoece e falece na
véspera da assunção do cargo que é ocupado pelo vice, José Sarney, até 15 de
março de 1990, chegando ao fim o regime militar. As Diretas Já, até hoje, é
considerado um dos maiores movimentos sociais e políticos da história do Brasil
(MOREIRA, 1999).

2.2.7 Os Caras Pintadas (1992)

Os “Caras Pintadas” foi um movimento que contou com a participação


maciça de estudantes, caracterizado pela realização de uma série de manifestações

11
Conforme informação presente no Registro das Sessões, da Câmara dos Deputados (Disponível
em: https://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/plenario/discursos/escrevendohistoria/destaque-de-materias/diretas-ja. Acesso em 15
nov. 2020.), estima-se que manifestações ocorridas no Rio de Janeiro reuniram cerca de 1 milhão
de pessoas e em São Paulo, 1,7 milhão.
42

iniciadas em agosto de 1992 que reivindicavam o Impeachment do, então,


Presidente da República Fernando Collor de Melo, após divulgação pela imprensa
de atos de corrupção.
Sob forte influência do período marcado por grandes manifestações, aliado a
euforia gerada pela possibilidade de participação de adolescentes a partir de 16
anos no pleito eleitoral, garantidos pela promulgação da Constituição Federal de
1988, parte considerável da juventude apoiou Fernando Collor na sua eleição de
1989, influenciados pela visão de modernização, do novo, apresentados durante as
campanhas eleitorais.
No entanto, após denúncias de corrupção fortemente divulgadas pela
imprensa, os mesmos jovens que apoiaram o presidente em sua eleição, juntaram-
se a outros grupos e formaram um grande movimento pró-impeachment, que teve
como um marco importante o dia 13 de agosto de 1992, quando, somente em
Brasília, mais de 100 mil jovens foram às ruas, vestido de preto, contrariando o
apelo feito por Fernando Collor que havia pedido para seu eleitores que saíssem
vestidos de verde amarelo como sinal de apoio ao Governo.
As manifestações espalharam-se por todo território nacional e em 25 de
agosto, aproximadamente 200 mil pessoas foram às ruas para pedir o impeachment
do presidente. Começara nesta data a se observar entre os manifestantes os “rostos
pintados”, organização dos movimentos estudantis, incentivo das escolas, bem
como a participação de outros segmentos da sociedade, como professores, os
próprios pais dos estudantes que incentivavam e a UNE que tentava fortalecer o
caráter político das manifestações, passando a organizá-las, bem como fazendo um
trabalho de alinhamento com as manifestações de 1968 contra o regime militar.
Os rostos pintados de verde-amarelo tinham como significado o patriotismo
e as roupas na cor preta o luto simbólico, bem como era uma forma de diferenciar
dos apoiadores de Collor.
As manifestações somente perderam a força e saíram de cena com a
instauração do processo de impeachment e a renúncia de Fernando Collor em 29 de
dezembro de 1992, tornando os “Caras Pintadas” um dos movimentos mais
emblemáticos da história do Brasil. (DIAS, 2008)
Procurou-se por meio dos exemplos acima, analisar como os movimentos
sociais evoluíram no Brasil, buscando entender os atores envolvidos, as estruturas
utilizadas em cada período histórico, estratégias e relações com o Estado, em sua
43

absoluta maioria das vezes alvo das reivindicações e indignações. O entendimento


da cultura de protestos construída no Brasil até os dias atuais é, portanto, uma
medida essencial para que as instituições policiais busquem adequações e formulem
estratégias que permitam seu acompanhamento e controle dentro dos preceitos de
ordem pública. Nesse sentido:

Precisamos entender a cultura para compreender o protesto, mas este


também ajuda a entender de onde vem a cultura.
[...]
Não podemos entender de que forma eles tomam decisões estratégicas
senão pelos significados culturais que lhes são disponíveis ou que eles
inventam. Mesmo as decisões mais banais são filtradas pelas lentes da
cultura (JASPER, 2016, p. 14-15).

2.3 As “novas” manifestações dos séculos XX e XXI

Algumas manifestações tornaram-se marcantes para a história pela


capacidade de reunir grande quantidade de pessoas, de gerar mudanças ou impedir
que elas ocorressem, pela intensidade e gravidade dos confrontos com o Estado e,
principalmente, pelo poder de influenciar milhares de pessoas pelo mundo todo.
Impulsinados pela utilização maciça da tecnologia, internet e redes sociais,
as formas de protestar, formas de planejamento, organização, coordenação,
convocação dos movimentos e recrutamento de pessoas foram inovados e
aprimorados, fazendo sedimentar, ainda mais, as manifestações públicas como
poderosa arma do povo para expremir suas insatisfações e reivindicar seus
objetivos.
São apresentadas abaixo, algumas manifestações públicas do final do
século XX e século XXI que desafiaram a capacidade de organização das
instituições de segurança e governos, criando sérias dificuldades para a manutenção
da ordem pública, exatamente por suas novas características e estratégias,
marcando uma nova era das manifestações públicas. Portanto, são manifestações
que marcaram a história do mundo conteporâneo.

2.3.1 A Batalha de Seattle (1999)

A Batalha de Seatle foi uma grande manifestação que acabou em confrontos


violentos entre manifestantes e forças do Estado, com a participação de diferentes
44

grupos sociais que se uniram contra a Terceira Conferência Ministerial da


Organização Mundial do Comérico (OMC) que seria realizada no Teatro Paramount,
na cidade de Seattle, nos estados Unidos, cuja abertura seria no dia 30 de
novembro de 1999.
Com uma agenda de discussão baseada em medidas que visavam
consolidar o paradgma do livre mercado, o encontro atraiu a atenção de diferentes
grupos sociais contrários ao posicionamento da organização, oriundos de diversas
partes do mundo além dos Estados Unidos, tais como como México, Canadá, Cuba,
países da Europa e América do Sul.
Os manifestantes de Seattle eram formados por uma massa bastante
heterogênea, constituida por ativistas antiglobalização, ambientalistas, estudantes,
sindicalistas, religiosos, ativistas dos direitos humanos, comerciantes comuns e
pessoas comuns, o que se viu foi, aproximadamente 50.000 pessoas nas ruas de
Seatlle, protestando contra a Conferência da OMC, e com reivindicações diversas.
O fato é que as manifestações de Seattle inauguraram uma nova forma de
protestos, o que causou grande dificuldade para que as instituições e autoridades
públicas implementassem ações efetivas de manutenção da ordem pública. Com
relação a esse momento, Carvalho (2019) registra que:

À medida que o dia avançava, novos grupos se juntavam àqueles que já


estavam nas ruas do centro de Seattle, entre eles, os chamados os black
blocs, identificados, em parte, com a doutrina anarquista. Sua forma de
protesto era diferente: mais violentos, queimavam latas de lixo, quebravam
vidraças de lojas multinacionais, bancos, quiosques de venda de jornal,
semáforos de trânsito e desafiavam os policiais. Vestiam-se de preto a
agiam em grupos. As autoridades de Seattle, embora soubessem há meses
da movimentação de diferentes grupos antiglobalização, não haviam se
preparado corretamente. Os policiais simplesmente não sabiam o que fazer.
O número de manifestantes era cinco vezes maior do que o esperado por
eles e empregavam técnicas pouco convencionais de protesto. Com
eventos simultâneos ocorrendo pela cidade, a polícia perdeu rapidamente o
controle da situação. Foi em meio a essa falta de preparo e planejamento
que os policiais começaram, bastante indiscriminadamente, a agir com
extrema violência, não só contra os black blocs, mas contra todos os
manifestantes. (CARVALHO, 2019)12
Castells (apud CARVALHO, 2019) afirma que movimentos sociais
caracterizados pela espontaneidade não são novos e que a diferenciação dos
movimentos antiglobalização inaugurados em Seattle residia na ideia de que:

“A novidade é a sua interconexão via internet, porque ela permite ao


movimento ser diverso e coordenado ao mesmo tempo, engajar-se num
debate permanente sem, contudo, ser paralisado por ele, já que cada um de

12
Sem paginação.
45

seus nós pode reconfigurar uma rede de suas afinidades e objetivos, com
superposições parciais e conexões múltiplas. O movimento antiglobalização
não é simplesmente uma rede, é uma rede eletrônica, é um movimento
baseado na internet. E como a internet é seu lar, não pode ser desarticulado
e aprisionado. Nada como um peixe na rede”. (CALTELLS apud
CARVALHO, 2019)13
A utilização do ciberespaço em Seattle demonstrou ser uma grande arma
dos movimentos sociais contra o controle das autoridades, que se veem diante da
impossibilidade de impedir a coordenação dos protestos e o engajamento de cada
vez maior número de participantes os quais, incentivados pelo sentimento de
pertencimento e incentivos presentes nos discursos das redes sociais, são
encorajados a comparecerem nos espaços públicos para apresentarem suas
indignações.
Para Castells (2017) “é essa conexão entre o ciberespaço público, ignorando
a controlada mídia convencional, e o espaço público urbano, cuja ocupação desafia
a autoridade institucional, que está no cerne dos novos movimentos sociais.”
Ao final, a conferência da OMC para a qual era esperada a participação de
representantes de aproximadamente 134 países teve sua abertura cancelada pela
primeira vez na história. As delegações não conseguiam chegar ao teatro
Paramount e aquelas que chegavam tinham outra impressão dos movimentos
sociais, resultando e rodadas de negociações fracassadas.
Com a utilização de tecnologia, novas estratégias, novas formas de
organização e planejamento das manifestações, o que ocorreu nas ruas de Seattle,
no dia 30 de novembro de 1999, foi algo inédito na história e exerce influência nas
manifestações públicas até os dias de hoje. A Batalha de Seattle foi o grande
impulsor do ativismo digital.

Por outro lado, devemos sublinhar que os movimentos sociais


contemporâneos aprenderam muito com o que aconteceu em Seattle e com
outros movimentos antiglobalização: aprenderam suas técnicas,
organizações, estratégias, etc. O que aconteceu no Egito, em 2011, ou nos
Estados Unidos, em 2014, mostram muito bem isso. O uso da tecnologia é
algo, por exemplo, que perpassa a todos esses movimentos de
contestação. As redes sociais são utilizadas para se proteger e denunciar
os excessos das forças policiais e para arregimentar as massas.
(CARVALHO, 2019)14

2.3.2 A Primavera Árabe em 2010

13
Idem.
14
Idem.
46

A Primavera Árabe foi uma onda de protestos e manifestações populares


que ocorreu no oriente médio e norte da África, no final de 2010 e durante todo ano
de 2011, atingindo diversos países como Tunísia, Egito, Líbia, Iêmen, Bahrein,
Jordânia, Marrocos, Omã, Argélia e Arábia Saudita. O termo “Primavera Árabe”
nasceu com o significado de renovação para os países árabes, significando a
transição do autoritarismo geral para regimes democráticos. (TRISTÃO, 2019)15
A série de manifestações teve início em 17 de dezembro de 2010 na
Tunísia, após o jovem vendedor ambulante Mohamed Bouazizi, de 26 anos, em um
ato desesperado, ter ateado fogo em seu próprio corpo, depois de ter sua banca de
frutas e verduras confiscada, diante da sua recusa em pagar propina a autoridades
policiais corruptas. Poucas horas depois do ato, centenas de jovens com experiência
semelhante fizeram protestos no mesmo local, os quais foram filmados pelo primo
de Mohamed Ali, que distribuiu o vídeo pela internet (CASTELLS, 2017, p. 34-35).
Com relação a isso:

A difusão em vídeos dos protestos e da violência policial pela internet foi


acompanhada de convocação à ação nas ruas e praças das cidades de
todo o país, começando nas províncias centro-ocidentais, depois atingindo a
própria Túnis. A conexão entre comunicação livre pelo Facebook, Youtube e
Twitter e a ocupação do espaço urbano criou um híbrido espaço público de
liberdade que se tornou uma das principais características da rebelião
tunisiana, prenunciando os movimentos que surgiram em outros países
(CASTELLS, 2017, p. 35-36).
As manifestações que se iniciaram com o ato de Mohamed e intensificaram
após sua morte em 04 de janeiro de 2011, no hospital para onde havia sido
socorrido, transformou-se em uma longa série de protestos, incluindo pautas mais
amplas contra as más condições de vida do país, sobretudo o desemprego,
corrupção e autoritarismo do governo. Ficou também conhecida como Revolução do
Jasmim (nome atribuído pela mídia ocidental), ou “Revolução pela liberdade e pela
dignidade”, nas palavras de um dos próprios manifestantes e adquiriu tamanha
dimensão que provocou a queda do então presidente da Tunísia, Zine El-Abdine
Ben Ali que estava no poder a mais de 20 anos e fugiu para a Arábia Saudita.
(CASTELLS, 2017, p. 36)
Algumas características das manifestações tunisianas chamam atenção pela
inovação e particularidades que, aparentemente, tornaram-se imprescindíveis para
as conquistas de dimensões tão surpreendentes: a representação transversal da

15
Idem.
47

sociedade tunisiana nos protestos (embora o papel mais ativo tenha sido
desempenhado por jovens desempregados com instrução superior), ausência de
liderança definida, ausência de uma organização formal (os partidos políticos de
oposição ao governo foram ignorados pelos ativistas), o papel da rede de TV Al
Jazeera e, sobretudo a internet, redes sociais e a tecnologia que possibilitaram que
os protestos focem realizados, coordenados e ampliados. (CASTELLS, 2017)
Para Castells (2017) “foi a conexão entre as redes sociais da internet e as
redes pessoais que se forjou o protesto. E ainda:

Assim, parece que na Tunísia encontramos uma convergência significativa


de três características distintas:
1. A existência de um grupo ativo de desempregados com educação de
nível superior, que liderou a revolta, ignorando qualquer outra liderança
formal, tradicional.
2. A presença de uma forte cultura de ciberativismo que se envolveram na
crítica aberta ao regime por mais de uma década.
3. Uma taxa relativamente alta de difusão do usa da internet, incluindo
conexões entre residências, escolas e cibercafés. (CASTELLS, 2017, p. 40 -
41)
As manifestações da Tunísia influenciaram diretamente uma série de outros
movimentos desencadeados nos países árabes como a renúncia do presidente do
Egito, Hosni Mubarak, em 11 de fevereiro de 2011, o qual estava no poder a 30
anos; o assassinato do presidente da Líbia, Muammar al-Gaddafi, praticado por
rebeldes em 20 de outubro de 2011, encerrando um mandato de 42 anos; a
desistência do presidente do Iêmen, Ali Abdullah Saleh, em reeleger-se em 2014; a
desistência do presidente do Sudão, Omar al-Bashir, em tentar a reeleição em 2015;
a desistência do premiê iraquiano, Nouri al-Maliki, em tentar a reeleição em 2014.
(PRIMAVERA...,2020)

2.3.3 Os Coletes Amarelos em 2018

Oficialmente, “os coletes amarelos” iniciaram suas atividades em 17 de


novembro de 2018, dia em que centena de milhares de pessoas foram às ruas de
Paris e outras localidades da França para protestarem contra o aumento da taxa de
combustível anunciado pelo Governo francês, causando bloqueios de vias em
diversos pontos. Hoje é considerado o movimento mais longo da França desde a
Segunda Guerra Mundial. (MOVIMENTO...,2020)
O nome do movimento é uma referência à vestimenta (colete amarelo)
utilizado pelos participantes durante as manifestações. O colete amarelo é um item
48

obrigatório em todo carro francês e deve ser utilizado pelo condutor como
equipamento de segurança em caso de acidente ou pane do veículo.
Embora a concretização das manifestações tivesse início em 17 de
novembro de 2018, a ideia do movimento teve sua origem após a ativista ambiental
Priscilla Ludovsky, em maio de 2018, ter criado uma petição online contra o aumento
dos combustíveis e questionado uma série de informações sobre a transição
ecológica. Mas foi a partir de setembro, após o compartilhamento em inúmeros
grupos e redes sociais, que sua petição adquiriu notoriedade e repercussão de
forma que Priscila passou a ser procurada por diversas pessoas e pela mídia para
falar sobre a causa. (BAPTISTA, 2019)
Com a notoriedade proporcionada pelas mídias, por meio das redes sociais,
o movimento ganhou força, diante a insatisfação de diversos setores da sociedade
que se viam injustiçados pelas medidas anunciadas pelo Governo, provocando um
interessante engajamento de uma massa heterogênea que foram às ruas, colocando
lado a lado pessoas de diversas linhas de pensamento desde de extrema direita à
extrema esquerda, liberais e ambientalistas. (BAPTISTA, 2019)
Seguindo a mesma linha da Batalha de Seattle em 1999, e o Occupy Wall
Street, em 2011, o movimento se fortaleceu pelo uso intenso da internet e redes
sociais, uma organização horizontal, sem a definição de líderes ou organizações
formalmente constituídas, massa heterogênea e evolução no decorrer das
manifestações para pautas difusas.
O movimento que se iniciou para contestar o aumento da taxa de
combustível, aos poucos teve suas reivindicações ampliadas, passando pelo
questionamento de diversas políticas públicas do Governo francês e busca por
melhores condições sociais.
Os protestos continuam até os dias de hoje e segundo o site El País (2019)
as ações e confrontos com a força policial, desde seu início em novembro de 2018
até novembro de 2019, já teriam causado a condenação de 3.100 manifestantes,
1.268 policiais e 2.448 manifestantes feridos.

2.3.4 A jornada de junho de 2013, no Brasil

As manifestações de junho de 2013, iniciadas em São Paulo, certamente,


inauguram uma nova forma de manifestar-se no Brasil.
49

Sob influência das estratégias e características apresentadas em Seattle no


ano de 1999 e da Primavera Árabe em 2011, vivenciou-se na capital paulista e,
posteriormente, expandida para inúmeras capitais e municípios em todo território
nacional, uma nova forma de protestar, baseada na grande velocidade e capacidade
de mobilização, flexibilidade e agilidade na coordenação e grande força para gerar
consequências, seja por meio atos violentos (dano ao patrimônio público, privado ou
agredindo autoridades públicas) ou pela grande pressão exercida sobre autoridades
e políticos, alimentada pelo impressionante impacto decorrente do alcance da
mensagem produzida pelo grupo e disseminada às pessoas do Brasil e do mundo
pela internet e redes sociais, propiciadas pelos smartphones.
Ao falar sobre as manifestações de 2013 em seu artigo “Vandalismo ou
juventude lúcida?”, Gomes (2013)16 expõe que “Também no Brasil os protestos são
frequentes, porém, menores. Nenhum talvez tenha alcançado, depois da
redemocratização (1985), as proporções (centenas de detidos) dos que
aconteceram recentemente.”.
O professor Luís Flávio Gomes refere-se ao período de “calmaria” no que
se diz respeito às manifestações públicas vivenciadas no Brasil no período
compreendido entre o final da década de 80 até 2013, o qual foi interrompido de
forma importante, apenas pelo movimento dos caras pintadas que saíram às ruas
reivindicando o impeachment do então presidente Fernando Collor de Melo e
poucos outros com pouca expressão e ínfima cobertura dada pela mídia. (GOMES,
2013)
O fato é que superada as intermináveis greves da década de 70 e o grande
embate entre os movimentos sociais contra o regime militar e a reivindicação pelo
voto direto conquistado pela Constituição de 1988, os movimentos sociais
alteraram suas dinâmicas internas, diminuindo sua intensidade de protestos nas
ruas, passando a buscar maior institucionalização por meio da organização de
associação, sindicatos, ONGs e constituição de fóruns. Deixaram de buscar
somente a contestação das políticas públicas, atos reivindicatórios e passaram a
participar do processo propositivo, uma vez que muitas lideranças e assessores
dos movimentos passaram a compor escalões da Administração Pública. (GOHN,
2007, p. 23-24)

16
Sem paginação.
50

Já em 2013, a institucionalização ora apresentada foi superada e o que se


viu foi um movimento contrário em que:

Sob um clima geral de insatisfação em relação às instituições da


democracia representativa e descrença nas organizações políticas
tradicionais, os protestos de junho recolocaram as ruas como lugar da luta
política, rompendo com um padrão de institucionalização das demandas
que marcou o período democrático. (TATAGIBA, 2018, p. 114)
Assim, após a participação e organização inicial articulada pelo Movimento
Passe Livre (MPL), as manifestações passaram a não mais responder a uma
organização formal. Desta forma, as manifestações cresceram e se multiplicaram
apresentando uma estrutura horizontal, sem liderança definida participação
espontânea de diversos grupos sociais, heterogêneos e com pautas difusas, que
se comunicavam, organizavam-se e coordenavam suas ações pela internet e redes
sociais, conforme descrito por Gohn (2014, p. 9) em que:

Os manifestantes de junho no Brasil atuam em coletivos não hierárquicos,


com gestão descentralizada, produzem manifestações com outra estética;
os participantes têm mais autonomia, não atuam sobre a coordenação de
uma liderança central. São movimentos com valores, princípios e formas de
organização distintas de outros movimentos sociais, a exemplo dos
sindicais, populares (urbanos e rurais), assim como diferem dos movimentos
identitários (mulheres, quilombolas, indígenas etc.).
Formados principalmente por jovens escolarizados, de classe média e
conectados às redes sociais, as manifestações de 2013 começaram de forma
tímida no dia 06 de junho quando poucas pessoas lideradas pelo MPL, reuniram-se
na Avenida Paulista em São Paulo para protestarem contra o aumento da tarifa
dos transportes públicos, ato este que foi coberto pela mídia com reprovação.
(GOHN, 2014, p. 12-22)
Os protestos passaram a ocorrer com maior frequência e, no dia 13 de
junho, ocorreram diversos confrontos entre policiais e manifestantes,
demonstrados por meio de grande cobertura da mídia que passou a se posicionar
de forma diversa da inicial, atraindo a opinião pública em favor das manifestações.
A cada ato realizado, a quantidade de pessoas que aderiam aos protestos
nos espaços públicos foram aumentando consideravelmente, sobretudo na
Avenida Paulista, zona central de São Paulo e no Largo da Batata.
Em 19 de junho é anunciado, em São Paulo, o cancelamento do aumento
das tarifas, marcando a conquista das demandas iniciais do movimento. No
entanto, as manifestações prosseguiriam sob outras reivindicações, entre elas a
contrariedade à realização da Copa das Confederações que estava sendo
51

realizada em diversos estados do Brasil, chegando a seu ápice no dia 20 de junho


quando se estima que mais de 1,5 milhões de pessoas foram as ruas de 25
capitais para protestarem. Os protestos de São Paulo contagiaram o Brasil todo.
(GOHN, 2014, p. 27-29)
A crescente participação popular cuja significância, em um primeiro
momento, foi diminuída por autoridades, governo e mídia, passou a impressionar
todos esses atores, os quais muitos se viram obrigados a altear seus discursos.
Assim, intelectuais e formadores de opinião de diferentes tipos e tendências
político-ideológicas passaram a citar as manifestações de junho como “o clamor ou
a voz das ruas”, expressão muito presente nos discursos políticos até hoje,
inclusive por autoridades dos demais Poderes da República, os quais muitas
vezes, de forma explícita tomam decisões e posicionam embasados nas pressões
proporcionadas por essas “vozes”. (GOHN, 2014, p. 11)
Os protestos foram marcados pelos crescentes atos de violência,
sobretudo praticados por grupos anarquistas e que se utilizavam da tática black
bloc, confronto entre os manifestantes e militantes de partidos políticos que
tentavam fazer parte dos protestos com suas indumentárias características, muitos
ônibus queimados, prédios públicos, lojas e bancos apedrejadas, estendendo-se
para diversos pontos do da capital paulista, grande São Paulo e interior do estado,
com bloqueios a rodovias e aeroportos.
A crescente onda de violência de alguns grupos fez, aos poucos, diminuir o
engajamento de diversos setores da sociedade nos protestos, culminando na perda
de força e apoio popular, bem como passaram a ter uma cobertura da mídia mais
focada nos atos violentos de grupos de manifestantes. “A prática sistemática da
violência nas diferentes manifestações depois de junho de 2013, ofuscou a
legitimidade das ações, afastou as grandes massas das manifestações, contribuiu
para o isolamento e segmentação dos ativistas”. (GOHN, 2014, p. 77)
As manifestações de junho, que se estenderam até meados de julho,
causaram grande desconforto nas autoridades públicas, sobretudo políticos que se
depararam com uma impressionante queda de popularidade. A presidente da
república na ocasião, Srª. Dilma Rousseff, viu sua situação cair de 55% de
aprovação para 31% em três semanas. Acredita-se que o impeachment de Dilma
Rousseff começou a ser construído durante esse período. (GOHN, 2014, p. 83)
52

O fato é que a partir de 2013, verifica-se uma importante mudança cultural


na sociedade brasileira, que passa a buscar uma participação mais ativa na
cobrança das autoridades públicas, frentes às políticas públicas apresentadas. As
pessoas de diferentes camadas sociais, idades e ideologias políticas passaram a
se interessar cada vez mais pela política, passaram a acompanhar os atos das
autoridades de todos os Poderes, questionar e expressar suas indignações e
reivindicações nas ruas. Por fim, “Manifestar-se deixou de ser ato apenas de
combate a regimes autoritários, ou campos para sindicalistas, estudantes ou
moradores de periferia.” (GOHN, 2014, p. 12)

2.3.5 A greve dos caminhoneiros

A greve dos caminhoneiros de 2018 foi um movimento grevista que atingiu


todos os Estados brasileiros e causou grande desestabilização econômica e social.
(GREVE...,2018)
Impulsionado pela alta do preço do diesel e somada a reivindicação inicial
de fixação de uma tabela mínima para os valores de frete pelo governo federal, o
movimento te início em 21 de maio daquele ano e durou, aproximadamente, 10
dias. (GREVE...,2018)
Durante o período da paralização os profissionais da categoria
estacionaram seus caminhões em diversas rodovias federais e estaduais, bem
como inúmeras outras vias, interrompendo parcialmente a circulação de veículos e
obrigando aqueles caminhoneiros que tentavam continuar transitando a também
pararem.
Inserida em um período de grave crise política, em que o governo
vivenciava uma inundação de denúncias de corrupção, além de insatisfação de
grande parte dos brasileiros diante das políticas sociais e econômicas que se
apresentavam ineficazes, aos poucos, a paralização ganhou forte apoio popular,
ocasião em que podia ser visto, em diversas oportunidades, pessoas que não
faziam parte do movimento levando até os grevistas alimentos e outros artigos
necessários para que permanecessem no local com seus caminhões parados.
(GREVE...,2018)
Com o passar dos dias, as pautas de reivindicações se tornaram cada vez
mais difusas, sendo fortalecido o discurso anticorrupção e, em alguns casos,
53

pedidos de “intervenção militar”. As negociações entre os representantes dos


manifestantes e Governo Federal intensificaram-se, no entanto, os reflexos no
mercado começam a aparecer. Após o quarto dia a crise de abastecimento se
agravou, passando à falta de combustíveis nos postos de gasolina, ameaça de
paralisação dos aeroportos pela falta de combustíveis de aviação, falta de insumos
e matérias-primas para as fábricas, causando paralização da produção, escassez
de produtos essenciais como alimentos, medicamentos, materiais hospitalares,
cancelamento de aulas em universidades e redução da frota de transporte públicos
nas ruas. (GREVE...,2018)
O Governo, então, anunciou o atendimento de 12 reivindicações dos
grevistas, no entanto parte no movimento não aceitou a proposta e a greve
continuou. (GREVE...,2018)
Pressionado pelas consequências econômicas e sociais da paralização e
fracasso nas negociações, o Governo Federal promulga o Decreto 9.382, em 25 de
maio de 2018, autorizando o emprego das Força Armadas em operações de
garantia da lei e da ordem para a desobstrução de rodovias federais e de vias
públicas estaduais, municipais ou distritais, quando mediante requerimento do
chefe do Poder Executivo estadual ou distrital, acompanhado de elementos que
demonstrem a insuficiência de meios da Polícia Militar do ente federativo. (BRASIL,
2018)
No Estado de São Paulo, não houve a participação direta das Forças
Armadas no processo de manutenção da ordem pública (exceção se faz nas
rodovias federais). Desta forma, as ações implementadas para gerenciar e conter a
crise foram lideradas e, em grande parte, desenvolvidas pela Polícia Militar que, de
forma muito profissional e organizada, conseguiu garantir a manutenção da ordem
pública por meio de diversas ações de polícia ostensiva convencionais e outras mais
adaptadas como escolta de caminhões e guarda de instalações para garantir o
abastecimento de produtos essenciais, bem como desobstruções de vias, as quais
em sua maioria ocorreram sem que houvesse a necessidade de confrontos maiores
confrontos com manifestantes.
Como exemplo de grande eficiência, pode ser mencionada a atuação
ocorrida em 26 de maio de 2018, ocasião em que o Cmt Pol Chq, Sr. Cel PM
Alexandre Gaspar Gasparian, estando no comando direto da operação, promoveu a
desinterdição da Rodovia “Mário Covas” (Rodoanel), que estava ocupada pelos
54

caminhoneiros em greve há 5 dias, nos dois sentidos da pista, entre as Rodovias


Anchieta e Imigrantes.
Naquela ocasião, após reunião com os Comandantes de tropa que estavam
a sua disposição no local [Pelotão de Choque, do 3º Batalhão de Polícia de Choque
(BPChq) – com veículo blindado, Pelotão das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar
(Rota) e Pelotão do Comando de Policiamento Rodoviário (CPRv)] análise do
terreno e demais condicionantes, decidiu empregar uma Companhia (Cia), das
Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicletas (ROCAM), do 2º BPChq para
adentrar à manifestação e promover a desinterdição, certamente com as demais
tropas realizando o apoio nas extremidades.
Dessa forma, a mobilidade, a flexibilidade e ostensividade das motocicletas
possibilitaram o acesso a uma área bloqueada por veículo e pessoas, além de
permitir uma reposta rápida a focos de tensões que surgiam ao longo da rodovia e
nos dois sentidos, o que impediu a atuação contundente e contagiosa de lideranças
contrárias a ação de desocupação naquele momento.
Essa ação coordenada por parte da Cia de ROCAM, do 2º BPChq, sob
comando do Sr. Coronel PM Gasparian, resultou na desinterdição de
aproximadamente 5 km de rodovia, nos dois sentidos, sem que houvesse a
necessidade de uso de granadas e elastômeros, sendo o Cmt Pol Chq,
posteriormente, convidado a apresentar as estratégias de atuação nesse evento
para Comandantes do Exército Brasileiro que estavam com a incumbência de
realizar a desinterdição das Rodovias Federais.17
Em 27 de maio a Associação Brasileira dos caminhoneiros (ABCAM) assina
acordo com o Governo e pede que os caminhoneiros autônomos voltem ao trabalho.
Embora parte dos profissionais continuem com a paralização, o movimento perde
força e em 30 de maio, a situação começa a normalizar. (GREVE...,2018)

17
Na ocasião da desinterdição da Rodovia Mário Covas – Rodoanel, o autor era o comandante da 4ª
Companhia do 2º BPChq - ROCAM e atuou diretamente no comandamento da ação realizada pelos
pelotões de policiais motociclistas.
55

Figura 2 Policiais da ROCAM, do 2º BPChq durante ação de


desinterdição da Rodovia “Mário Covas” – Rodoanel, durante
greve dos caminhoneiros em 2018

Fonte: A Gazeta, 2018 (Disponível em:


https://www.agazeta.com.br/brasil/pm-nao-descarta-
uso-da-forca-para-liberar-vias-como-rodoanel-0518).

2.3.6 Impeachment de Dilma Roussef

As manifestações a favor do impeachment de Dilma Rousseff estão


relacionadas ao crescimento dos movimentos de direita que passaram a tomar corpo
a partir de 2013 com os atos de junho, os quais geraram um grande
enfraquecimento da base de apoio social e parlamenta do governo petista.
(TATAGIBA, 2018, p. 114)
Entre o ano de 2011 e 2016, segundo TATAGIBA (2018), houve um
significativo aumento do número de manifestações de direita, movidas pelo
sentimento antipetista, fortalecido, em 2014, pelo início das investigações da Lava
Jato, realizada pela Polícia Federal, destinada a investigar desvios de recurso
público e lavagem de dinheiro.
“Em 15 de março de 2015, um milhão e 350 mil manifestantes tomaram as
ruas das cidades brasileiras para protestar contra o governo de Dilma
Rousseff. Um ano depois, novo protesto levava 3 milhões de pessoas para
as ruas para exigir o impeachment da Presidente e prisão para o ex-
presidente Lula, um feito inédito para os padrões de mobilização no Brasil.
Os protestos foram transmitidos ao vivo em cadeia aberta de televisão e
tiveram forte impacto na opinião pública.” (TATAGIBA, 2018, p. 118)
O site do G1 aponta números ainda maior de participantes:
56

Gráfico 1 Quantidade de participantes de manifestações contra o governo


Dilma

Fonte: G-1, 2016 (Disponível em:


http://g1.globo.com/politica/noticia/2016/03/manifestacoes-contra-
governo-dilma-ocorrem-pelo-pais.html Acesso em: 12 jan. 2021).

Vestidos de verde e amarelo, e formado, basicamente, por pessoas de


classe média e alta, os manifestantes foram às ruas de todo o país para se
expressarem não somente contra o governo petista, “mas a esquerda partidária e
sindical e a cultura de esquerda de uma forma mais ampla”. Foi na Avenida Paulista
da capital do Estado de São Paulo que em 15 de março de 2015 ocorreu a maior
manifestação desde o movimento das Diretas Já, em 1984. (TATAGIBA, 2018, p.
118)
Com uma eficiente utilização das redes sociais para convocar, repercutir
os protestos e recrutar novos participantes, basicamente três organizações
destacaram-se no processo de organização dos eventos: Movimento Brasil Livre
(MBL), Vem pra Rua e Revoltados On Line. (TATAGIBA, 2018, p. 119)
Pode-se apontar que o caminho para o impeachment se deu na seguinte
cronologia:

17/03/2014 Deflagrada 1ª fase da Operação Lava Jato, da Polícia Federal;


22/03/2014 Marcha da Família com Deus contra o governo do PT;
14/05/2014 Instalada a CPI da Petrobrás no Senado;
21/10/2014 Em delação premiada, denunciado envolve Lula e Rousseff no
escândalo da Petrobras;
25/10/2014 Ato em São Paulo simula o enterro de Dilma Rousseff;
26/10/2014 Dilma Rousseff é reeleita;
57

26/10/2014 Aécio Neves (PSDB) convoca manifestação contra o resultado


da eleição; 01/11/2014 Protestos em 4 capitais pedem impeachment de
Rousseff;
06/12/2014 Novo protesto contra Rousseff em São Paulo;
18/12/2014 PSDB ingressa com pedido de anulação da eleição;
01/01/2015 Dilma Rousseff toma posse e inicia seu segundo mandato;
15/03/2015 Primeira grande manifestação pelo impeachment;
16/03/2015 Tem início a 10ª fase da Operação Lava Jato;
12/04/2015 Segunda grande manifestação pelo impeachment;
15/04/2015 12ª fase da Operação Lava Jato prende o ex-tesoureiro do PT;
17/07/2015 Presidente da Câmara rompe com o governo e anuncia que é
da oposição;
03/08/2015 17ª fase da Operação prende o ex-ministro José Dirceu, Ministro
do Governo Lula;
06/08/2015 Várias capitais registram panelaço durante programa eleitoral do
PT;
16/08/2015 Terceira grande manifestação pelo impeachment;
06/10/2015 Tribunal Superior Eleitoral reabre ação para impugnar chapa
Dilma/ Temer;
07/10/2015 Tribunal de Contas da União recomenda reprovação das contas
do governo por “pedaladas fiscais”;
21/10/2015 Parlamentares da oposição entregam pedido de impeachment;
25/11/2015 Líder do Governo no Senado é preso por obstruir as
investigações da Lava Jato;
02/12/2015 Presidente da Câmara autoriza abertura do processo de
impeachment;
13/12/2015 Quarta grande manifestação pelo impeachment;
03/02/2016 Sete capitais registram panelaço contra pronunciamento da
Presidenta Rousseff;
23/02/2016 Publicitário que trabalhou nas campanhas de Lula e Rousseff é
preso na 23ª fase da Lava Jato;
04/03/2016 Lula é alvo de prisão coercitiva para prestar esclarecimentos;
13/03/2016 Quinto e maior protesto pelo impeachment e pela prisão de
Lula;
16/03/2016 Lula é anunciado Ministro Chefe da Casa Civil;
16/03/2016 Juiz Sérgio Moro quebra sigilo e divulga áudio de conversa
entre Lula e Rousseff
16/03/2016 Protestos em 16 capitais contra a nomeação de Lula para a
Casa Civil
17/03/2016 “Occupy Paulista”, contra nomeação de Lula;
18/03/2016 Supremo Tribunal Federal suspende nomeação de Lula para a
casa Civil;
17/04/2016 Com 367 votos a favor, pedido de impeachment é aprovado na
Câmara;
12/05/2016 Senado aprova abertura do processo de impeachment e
Rousseff é afastada da Presidência;
31/08/2016 Dilma Rousseff é afastada definitivamente da Presidência da
República.
(TATAGIBA, 2018, p.126-127, grifo nosso)

Com a saída de Dilma Roussef, assumiu a presidência o Vice-presidente


Michel Temer que governou até o ano de 2018.
58

2.4 As manifestações públicas na atualidade

Embora as manifestações públicas não sejam novidades, já que


acompanham toda história da evolução social, nos últimos anos e em todo mundo,
verifica-se uma crescente onda dessas ações. O grande número de atuação de
movimentos sociais e suas grandes dimensões tem chamado a atenção de
autoridades e da sociedade. Nesse sentido:

[...] não devemos esquecer, ao nos congratularmos por atravessar um


importante momento na história mundial que protestos ocorrem todos os
dias pelo planeta e sempre ocorreram. Na maior parte do tempo, nem
mesmo ouvimos falar deles – não são suficientemente dramáticos nem
duradouros para que a mídia lhes dê cobertura. O protesto é uma parte
fundamental da existência humana, e todos os períodos da história tem o
potencial de trazer mudanças importantes (JASPER, 2016, p. 13).
Para ilustrar essa dimensão, têm-se grandes manifestações, desencadeadas
nos anos de 2019 e 2020, como as ocorridas no Chile, nos últimos meses de 2019,
em que centenas de milhares de pessoas foram às ruas, principalmente da capital
Santiago, para protestarem, inicialmente, contra o aumento da tarifa do metrô e,
depois, deixaram de ter uma lista definida de demanda, passando a apresentar
críticas generalizadas ao governo e um profundo descontentamento social.
A extrema violência empregada deixou estações, prédios públicos, veículos,
supermercados, igrejas, fábricas, danificados e incendiados. Em quinze dias de
protestos, foram contabilizadas 11 mortes e 1.462 detidos pela polícia, 78 estações
e trens danificados e um prejuízo, somente no serviço de metrô, avaliado pela
empresa que administra o sistema, de US$ 300 milhões. Diante da situação, o
governo chile voltou atrás contra o aumento. (ENTENDA..., 2019)
59

Figura 3 Manifestante ateando fogo em barricada (Santiago/Chile)

Fonte: G-1, 2019.

Em outubro de 2020, movimentos sociais e diversos grupos voltaram às ruas


do Chile para marcar 1 ano das manifestações de 2019, com discursos de profundas
reformas sociais. Durante as manifestações, houve diversos confrontos contra a
polícia, culminando na prisão de pessoas e em lesões a policiais. Pessoas
encapuzadas atacaram e incendiaram duas igrejas.

Figura 4 Vândalos destruindo igreja em Santiago/Chile

Fonte: G-1, 2020.

O ano de 2019 em Hong Kong também ficará na história em face das


grandes e violentas manifestações. Os atos que se iniciaram no mês de junho
perduraram meses e reuniram centenas de milhares de pessoas que foram às ruas,
aeroportos, sede do parlamento para protestar, inicialmente, em repúdio a um
controverso projeto de lei que permitiria a extradição de suspeitos de crimes para a
60

China continental sob certas circunstâncias. Posteriormente, as reivindicações


seriam estendidas para outros pontos. O projeto de Lei foi derrubado após alguns
meses. (PROTESTOS..., 2019)

Figura 5 Confronto entre manifestantes e polícia em Hong Kong

Fonte: BBC News, 2019.

Centenas de milhares de pessoas foram às ruas do Líbano, em outubro de


2019, para protestar contra os planos do governo em taxar chamadas feitas por
meio do aplicativo WhatsApp. Mas a pauta de reivindicações logo se ampliou e
passou a focar corrupção política endêmica, crise econômica e problemas em
serviços públicos, o que provocou a renúncia do primeiro ministro do país. (APÓS...,
2019)

Figura 6 Manifestante nas ruas do Líbano

Fonte: BBC News, 2019

Nos Estados Unidos, em 25 de maio de 2020, após a morte de George Floyd


durante uma ação policial, em Minneapolis, localizada no estado de Minnesota,
61

iniciou-se uma série de manifestações públicas por todo país. Com o slogan “Black
Lives Matter”, os protestos romperam as fronteiras da América, repercutindo em atos
no mundo todo, inclusive com forte engajamento de autoridades públicas e
personalidades da música, arte, esporte. Com relação ao incidente, Guimon (2020)
escreveu que:

“Em intensidade e em alcance geográfico, é o movimento de protesto mais


amplo da história dos Estados Unidos”, afirma Neal Caren, professor de
Sociologia da Universidade da Carolina do Norte, especialista em
movimentos sociais contemporâneos nos EUA. “Nunca antes houve tantos
protestos, durante tanto tempo e em tantas comunidades diferentes.” 18
Figura 7 Manifestante com bandeira do movimento Black Lives
Matter, em Rochester/EUA

Fonte: Guimon, 2020.

Segundo The Armed Conflict Location & Event Data Project (ACLED),
organização que pesquisa protestos no mundo todo:

A morte de Floyd provocou uma onda de manifestações associadas ao


movimento Black Lives Matter (BLM) que rapidamente se espalhou de
Minneapolis por todo o país. Entre 26 de maio, um dia após a morte de
Floyd, e 22 de agosto, o ACLED registra mais de 7.750 manifestações
ligadas ao movimento BLM em mais de 2.440 locais em todos os 50
estados e em Washington, DC. (ACLED, 2020, tradução nossa)19

18
Sem paginação.
19
Idem.
62

Figura 8 Manifestações associadas ao movimento Black Lives


Matter (por tipos)

Fonte: ACLED, 2020.

Em 21 de outubro de 2019, o site de notícias G-1 publicou uma matéria a


respeito das manifestações correntes no mundo naquele momento, apresentando o
seguinte gráfico:

Figura 9 Manifestações pelo mundo, em 2019

Fonte: G1, 2019.


63

O mapa a seguir demonstra o volume de protestos e motins ocorridos no


Brasil no período de 01 de janeiro de 2019 e 10 de outubro de 2020, obteve-se o
seguinte mapa:

Figura 10 Mapa de protestos e motins no Brasil no período de 01/01/2019 a 10/10/2020

Fonte: ACLED, 2020.

Após consulta ao Centro de Inteligência da Polícia Militar do Estado de São


Paulo (CIPM), abaixo são apresentados números relativos à quantidade de
manifestações ocorridas no estado, a partir do ano de 2010 até setembro de 2020, a
partir de dados extraídos da Resolução 160/QMO.

Tabela 1 Quantidade de manifestação pública de 2010 a setembro de 2020

Fonte: CIPM, 2020.


Diante desse cenário de grande volume de manifestações por todo o mundo,
com impressionante adesão popular e, muitas vezes com sensíveis atos de violência
praticadas pelos manifestantes e dura repressão do Estado, tem-se a impressão de
que se vive uma era das manifestações populares.
O povo reafirmou seus ideais de lutar, pacificamente ou não, ocupando as
ruas por seus direitos, de forma a fazer valer suas vontades e poder previstos em lei.
Lutam contra tudo que consideram injusto e têm alcançado conquistas significativas,
tornando motivo de grandes preocupações dos governantes.
64

Existe um grande desafio por parte das autoridades públicas de todo mundo,
as quais encontram pela frente um imenso trabalho no sentido de criar políticas
públicas e preparar suas instituições, de forma que seja garantido o exercício dos
direitos fundamentais por seus cidadãos, ao mesmo tempo que sejam possíveis
ações de preservação da ordem públicas eficientes.
E a Instituição que desempenha o papel de protagonismo nesse cenário,
certamente é a Polícia.
O que se verifica é a grande quantidade de manifestaçõs que, muitas vezes,
geram confrontos. Geralmente, “são manifestações que começaram por motivos
bastante específicos, mas que acabam por refletir a insatisfação da população com
a situação geral de seu país, um descontentamento com a classe política e aqueles
que ocupam o poder” (PROTESTOS..., 2019)20.
Esse contexto de instabilidade social, política e econômica faz surgir a
pergunta: o que mudou nas manifestações públicas e movimentos sociais do mundo
atual?
Mas o que as manifestações públicas atuais têm de diferente? Por que
fazem parte do foco de atenção e preocupação de diversas autoridades públicas e
principalmente líderes políticos?
Pode-se dizer que, diante de uma análise superficial e pragmática, ao
analisar os apontamentos dos diversos estudiosos citados até aqui, três fatores
contribuíram efetivamente para que as manifestações públicas em todo o mundo
fossem redesenhadas, seja na sua forma de convocação, organização,
planejamento, alcance, ação e “poder”, na sua maior dimensão: i. a Globalização; ii.
a Internet; e iii. Quarta Revolução Industrial.

2.5. Fatores que redesenharam as manifestações públicas

2.5.1. Os efeitos da globalização

O estudo dos movimentos sociais apontados nas seções anteriores é uma


demonstração da grande influência da globalização e seus efeitos nos movimentos
sociais atuais e a necessidade de adequação das estratégias das forças de

20
Sem paginação.
65

segurança para garantir a manutenção da ordem pública, ao mesmo tempo em que


garante o gozo dos direitos individuais de cada cidadão pela liberdade de
expressão, reunião e de reivindicar do Poder Público o que considera justo.
O fato é que algumas características as tornaram diferentes quando
comparadas às manifestações clássicas de momentos históricos anteriores.
A alta capacidade de estruturação, organização e recrutamento de pessoas
aptas a participarem do movimento, sem a influência de estruturais formais
(sindicatos, partidos políticos etc.), a velocidade de reunião e transformação do
cenário político e social de momento, o assustador alcance das suas
reivindicações e capacidade para simpatizar um número incontável de pessoas
inserem as manifestações atuais em um patamar importante destinado às grandes
transformações proporcionadas pela globalização e pela quarta revolução
industrial.
As manifestações atuais, em poucos minutos, são capazes de gerar
influências e consequências em círculos sociais cada vez mais amplos: na
comunidade onde se iniciam, rapidamente estendem-se pela nação e antes que se
espera, manifestações em apoio às iniciais estarão ocorrendo em diversas partes
do mundo. O movimento Black Lives Matter é o exemplo mais recente desse
pensamento, conforme apontado por Jasper (2016):

No final do século XVIII e, especialmente, no século XIX, com a expansão


das infraestruturas necessárias, o protesto passou a ser nacional, dirigido
aos parlamentos como arenas-chave. Nos últimos anos, redes de
comunicações, transportes, dinheiro e organizações continuaram a ampliar
seu alcance, conectando pessoas em diferentes países, com mais facilidade
do que antes, num processo conhecido como globalização (JASPER,
2016, p.113, grifo nosso).

Durante entrevista com Cap PM Rodrigo Cunha de Souza, chefe de seção


do Centro de Inteligência da Polícia Militar do Estado de São Paulo (CIPM), o
referido Oficial apontou que a globalização e a internet (potencializadas pelas
novas tecnologias e redes sociais) são os principais fatores de influência nas
manifestações e movimentos sociais da atualidade.
Contribuindo com o raciocínio, Jacobi e Monteiro (apud Gonh, 2013):

[...] os motivos que permitem o avanço do que se convencionou chamar de


movimentos sociais transnacionais organizados em rede estão associados
às mudanças organizacionais, políticas e tecnológicas, o que pode ser
observado pela perda da capacidade dos Estados nacionais em restringir e
estruturar ação coletiva, pelo surgimento de uma rede de computação
66

global e pelas oportunidades políticas nacionais que ampliam as questões


ao nível das oportunidades transnacionais. Observa-se uma crescente
globalização não só das agendas de muitos movimentos, mas também das
formas de luta, notadamente a partir da incorporação das novas tecnologias
da informação. Isto possibilita a formação de networks locais, nacionais e
transnacionais. (JACOBI e MONTEIRO apud GONH, 2013, p. 14)
Importante, portanto, conhecer o significado da palavra “globalização” e,
para tanto, tem-se:

1. Ação ou efeito de globalizar(-se).


2. ECON Integração entre os mercados produtores e consumidores de
diversos países graças ao desenvolvimento e barateamento dos custos de
transporte, aos importantes avanços tecnológicos dos meios de
comunicação, que reduziram significantemente o tempo e a distância (rede
de computadores, satélites etc.), e ao surgimento e à ação de empresas
multinacionais, integrando as economias e tornando o mundo um mercado
único imenso.
3. ECON, POLÍT União dos mercados de diferentes países e a quebra de
fronteiras entre esses mercados.
4. COMUN, SOCIOL Processo pelo qual a arte, a cultura, a música, o
comportamento, o vestuário dos indivíduos de um país sofre e assimila as
influências de outros, devido ao desenvolvimento dos meios de
comunicação de massa, tornando o mundo unificado em uma grande
“aldeia global”, termo criado pelo escritor canadense Marshall McLuhan
(1911-1980) nos anos 1960 (MICHAELIS, 2020)21.
Esse conceito de globalização permite um entendimento claro de sua
influência na potencialização das manifestações públicas e movimentos sociais. A
redução do tempo e da distância entre as pessoas, garantida pelo avanço
tecnológico dos meios de comunicação proporcionado pela internet, explicam a
grande velocidade de formação, estruturação e desenvolvimento dos movimentos
sociais. É através desses meios ágeis e popularizados que os manifestantes se
comunicam, convencem e recrutam outros novos, definem e adequam suas
estratégias a fim de vencerem os obstáculos impostos pelas autoridades na tentativa
de atingirem seus objetivos.
Dentro do conceito de “aldeia global”, que esses movimentos divulgam suas
causas, suas indignações, suas formas de agir, tentam impor à sociedade local e
internacional seus posicionamentos, econômicos, sociais e políticos. Aproveitam
esse mundo unificado para construir e disseminar narrativas e imagens conveniente
aos seus planos de ação, utilizam-se de diferentes estratégias para vencer todos
que se opõe ou dificultam o alcance de seus objetivos. Estratégia essa bastante
utilizada pela ação das mídias alternativas como Mídia Ninja Narrativas

21
Sem paginação.
67

Independentes, Jornalismo e Ação e Pablo Capilé do Grupo Fora do Eixo. (GOHN,


2014, p.73)
A globalização, a internet e as redes sociais permitem que os movimentos
apresentem uma narrativa própria, independente da grande mídia com um alcance
respeitável por meio de ferramentas de fácil acesso, popular e acessível a maior
parte da população nos dias de hoje.
A grande mídia continua exercendo forte influência na direção e na opinião
pública a despeito das manifestações públicas, no entanto, verifica-se que as redes
sociais e seu ativismo digital, cada vez mais, ocupa um espaço importante nesse
processo, aproveitando-se dessa feroz estrutura de oportunidades, como explanado
por Jasper (2016):

O movimento social de hoje tenta enviar mensagens a uma variedade de


públicos, especialmente seus próprios membros, reais e potenciais, mas
também a parlamentares, à outras agências do Estado e à mídia. Os
movimentos formulam visões morais e tentam convencer outros a
compartilhá-las. Mas, ainda que se especializem em persuasão e
performance, não abandonaram totalmente outros meios de tingirem seus
objetivos. (JASPER, 2016, p. 42)

2.5.2 Os efeitos da internet

É fato que, atualmente, as pessoas conseguem se mobilizar a partir de


comandos vindos da rede de computadores e, nesse sentido, Castells (2017) afirma
que:

O papel da internet e da comunicação sem fio nos atuais movimentos


sociais em rede é fundamental [...] Porque as pessoas só podem desafiar a
dominação conectando-se entre si, compartilhando sua indignação,
sentindo o companheirismo e construindo projetos alternativos para si
próprias e para a comunidade como um todo (CASTELLS, 2017, p. 198).
Os conceitos de internet surgiram na década de 50, sendo a ideia
desenvolvida na década de 60, decorrente da necessidade militar identificada pelos
Estados Unidos da América de criar um sistema descentralizado de informações que
protegessem seus documentos, pois se vivenciava o período da Guerra Fria contra a
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Nos anos 70 e 80, surge o
termo internet e, em 1988, inicia-se sua abertura para fins comerciais e o surgimento
dos correios eletrônicos. A partir do início da década de 90, a internet popularizou-se
com a criação da World Wide Web (www) e surgimento de grades portais como
68

AOL, Yahoo, com suas salas de bate papo e mensageiros instantâneos, Hotmail,
serviços de e-mail gratuito e sites de busca como o Google. (BARROS, 2013)22
A computação mainframe (década de 1960), a computação pessoal (década
de 1970 e 1980) e a internet (década de 1990), fazem parte da terceira revolução
industrial, também chamada da revolução digital ou do computador. (SCHWAB,
2016, p. 15-16)
Tem-se que internet é onipresente e móvel, operada por aparelhos cada vez
menores e mais acessíveis, além de inteligência artificial e aprendizado de máquina.
Os sistemas, software e redes estão cada vez mais sofisticados e integrados. As
inovações tecnológicas e as descobertas, ocorrem, simultaneamente, de uma forma
ampla e com uma velocidade incrível, nas mais diversas áreas de conhecimento,
acompanhada de uma igual e impressionante velocidade e amplitude de difusão. “O
que torna a quarta revolução industrial fundamentalmente diferente das anteriores é
a fusão dessas tecnologias e a interação entre os domínios físicos, digitais e
biológicos.” (SCHWAB, 2016, p. 16-17)
A figura a seguir mostra a vista a partir da Praça de São Pedro em dois
momentos diferentes quando foi anunciado o novo Papa. Interessante observar a
quantidade de smart phones e tablets no ano de 2013 em comparação a 2005.

22
Sem paginação.
69

Figura 11 Praça São Pedro (Itália), em 2005 e 2013

Fonte: Business Insider, 2013 (Disponível em:


https://www.businessinsider.com/vatican-square-2005-and-2013-
2013-3. Acesso em 17 ago. 2020).

A internet, impulsionada pelo uso dos smartphones e tablets, permitiu maior


interação entre o meio digital e físico garantindo às pessoas maior facilidade para
formar redes de comunicação e de interação, concedeu liberdade e autonomia para
exporem seus pontos de vistas e indignações, aproximando pessoas que
compartilham das mesmas ideias, livres dos controles sociais de instituições formais
ou informais. (SCHWAB, 2016, p. 73)
As redes sociais fornecem disposição para as pessoas participarem mais
ativamente das discussões sobre questões econômicas, políticas e sociais que as
atingem, e as encorajaram a comparecem nos espaços públicos para materializarem
suas reivindicações, juntamente com os demais participantes das redes de
comunicações formadas.
As novas tecnologias proporcionadas pela revolução digital permitiram maior
amplitude e profundidade na exposição e debate de ideias, encorajou pessoas,
antes assistentes passivos dos cenários sociais e políticos, a posicionarem-se de
70

forma mais ativa no mundo digital e no mundo físico (nas ruas). Concedeu corpo e
força a indivíduos isolados e grupos, mesmo que pequenos, que passaram a
acreditar na sua capacidade de fazer ser ouvido, de fazer sua voz ultrapassar
barreiras antes intransponíveis e influenciar pessoas.

2.5.3 Quarta Revolução Industrial

No que consistiria a quarta revolução industrial? E como esta revolução


poderia exercer influências nas manifestações públicas da atualidade?
Klaus Schwab, fundador e presidente executivo do Fórum Econômico
Mundial, em seu livro de título “A Quarta Revolução Industrial”, descreve o momento
atual de grande transformação, destacando que:

“Estamos no início de uma revolução que alterará profundamente a maneira


como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos. Em sua escala escopo e
complexidade, a quarta revolução industrial é algo que considero diferente
de tudo que já foi experimentado pela humanidade.” (SCHWAB, 2016, p.
11)
A quarta revolução industrial teve iniciado na virada do século XX para o XXI
e baseia-se na revolução digital. (SCHWAB, 2016, p. 16)
Os efeitos positivos da quarta revolução industrial são inúmeros, dada a
hiperconetividade dos sistemas, internet das coisas, inteligência artificial,
biotecnologia, robótica, energia etc.. (SCHWAB, 2016, p. 23-33)
A revolução digital proporcionou um mundo mais veloz e ágil, criou soluções
práticas à problemas diários e possibilidade de soluções para situações críticas de
saúde, antes considerada irreversíveis para a medicina (avanços na genética).
Está se reconstruindo o conceito de geopolítica e território, reescrevendo o
conceito e aplicações das estratégias e táticas de guerra, está se reinventando a
forma como as pessoas se relacionam, expressão suas opiniões e como se
comportam.
É dentro desse conceito de conectividade e interação entre tecnologias e
pessoas, conduzida pela quarta revolução industrial, com forte influência na internet
das coisas, que no final dos anos 90 e início dos anos 2000 a internet deu um passo
decisivo par a criação das redes sociais (GNIPPER, 2018), cuja transformação e
aprimoramento está em constante e veloz evolução, proporcionando uma rede de
71

comunicação cada vez mais próxima e interativa, contribuindo de forma decisiva


para a grande velocidade das mudanças sociais da atualidade.
Não se pode deixar de observar que essa revolução digital exerceu e exerce
grande influência nos novos movimentos sociais, uma vez que se tornaram
“ferramentas decisivas para mobilizar, organizar, deliberar, coordenar e decidir. [...]
cria condições para uma forma de prática comum que permite a um movimento sem
liderança sobreviver, deliberar, coordenar e expandir-se.” (CASTELLS, 2017, p. 199)
Por outro lado, a quarta revolução industrial também proporciona
consequências negativas. Dentre as apontadas por Schwab (2016), estão a
desigualdade social, gerada pelo desemprego e a incapacidade de parte da
sociedade se adequar às novas competências exigidas pelo mercado tecnológico
que vem substituindo a força de trabalho humano por tecnologias ligadas a
robóticas, inteligência artificial e internet das coisa; a segurança nacional, a qual está
cada vez mais ameaçada e vulnerável frente à natureza híbrida dos conflitos
modernos, regados de técnicas e táticas compartilhadas livremente entre/por grupos
violentos que enxerga uma possiblidade de recrutamento diante de um cenário
social desigual (favorável às suas ações); e também, de forma muito importante, o
processo de robotização da humanidade, comprometendo as fontes tradicionais de
significado – trabalho, comunidade, família e identidade.
Por fim, dentro de processo de transformação da comunidade, cada vez
mais globalizada, inovações tecnológicas, aproximação digital, facilidade de
comunicação, interação entre as pessoas, entre pessoas e coisas, redefinição de
conceitos sociais importantes e empoderamento do indivíduo, encorajado e livre
para expressar suas opiniões e reivindicações em uma sociedade polarizada e
desigual, enxerga-se um ambiente perfeito para surgimento de grandes
manifestações públicas e atuações de grupos violentos, como observa Schwab:

O perigo crítico é que um mundo hiperconectado e com desigualdades


crescentes poderá levar ao aumento da fragmentação, segregação e
agitação social que, por sua vez, criam condições para o extremismo
violento. A quarta revolução industrial mudará o caráter das ameaças à
segurança e, ao mesmo tempo, também influenciará as mudanças de
poder, que estão ocorrendo tanto geograficamente quanto de personagens
estatais para os não estatais. (SCHWAB, 2016, p. 84)

2.6 Características das “novas” manifestações públicas


72

Não é objetivo dessa dissertação estudar as causas, nem analisar as


manifestações públicas sob uma lente sociológica, embora não seja possível
descartar a importância em conhecê-las. Dessa forma, o conhecimento sobre a
cultura na qual o movimento está inserido, sua estrutura, o sentimento dos
participantes, quais são suas indignações e as estratégias utilizadas para que
atinjam seus objetivos serão analisados com a finalidade de se buscarem
estratégias policiais voltadas para garantia da ordem pública ou, ao menos, mitigar
os efeitos nefastos dos atos criminosos que venham a ser praticados durante os
protestos.
Não se pode afirmar que as manifestaçõe públicas vivenciadas pelo
movimento sindical do início do século XX no Brasil, intensificadas pela luta de
classes baseada em ideologias conflitantes com o Governo Militar a partir de 1964 e
pelas greves operárias da década de 1970, organizadas em frentes às fábricas do
ABC paulista, inexistem no cenário atual. No entanto, é fácil constatar que essa
forma tradicional de manifestações, apoiadas em estruturas formais, tais como,
sindicatos, associações e lideranças políticas, tiveram sua frequência e amplitude
diminuídas.
O fato é que no final do século XX e início do século XXI observa-se o
surgimento de novas manifestações, novas maneiras de protestos, novos
movimentos que assumiram características bastantes específicas e diferentes de
antes, de forma que sua frequência e seus efeitos foram pontencializados
significamente.
Como já apontado nas seções anteriores, os movimentos antiglobalização
eternizados, sobretudo, pelos protestos no ano de 1999 em Seattle, acompanhados
da Primavera Árabe e os Coletes Amarelos apresentaram ao mundo uma nova
forma de manifestar-se, obrigando as autoridades públicas a reformularem suas
estratégias e técnicas de gerencimamento e manutenção da ordem pública diante
desse problema complexo e caótico.
Bassets (2019) ao tratar do movimento “coletes amarelos” em artigo
publicado no site de notícias El País escreveu que “O sucesso dos coletes amarelos
é tornar visível um país pouco visível: sintetizando muito, porque é um movimento
complexo e heterogêneo[...]” 23. E ainda complementa:

23
Sem paginação.
73

Dominique Reynié, diretor do laboratório de ideias Fondapol, acha que o


movimento traduz uma crise fundamental. “Ninguém consegue mais
antecipar, expressar e regulamentar os conflitos sociais através das
organizações clássicas como os sindicatos e os partidos”, diz. “Em
uma sociedade francesa que enfrenta múltiplas questões [...]
descontentamentos são expressados sem mediação sindical e política
(BASSETS, 2019, grifo nosso)24.
Comparando o movimento “coletes amarelos” com os episódios de 2013:

Para a socióloga Angelina Peralva, essa é justamente uma das


semelhanças entre os movimentos dos dois países. “São protestos que
foram articulados a partir das redes sociais, sem enquadramento de
entidades representativas identificadas, sejam elas sindicatos ou partidos”
(AS SEMELHANÇAS..., 2018).25
As características ora apresentadas também são reforçadas por Baptista
(2019), ao fazer referência ao movimento dos coletes amarelos na França:

Os coletes amarelos são uma grande mistura de pessoas com diversas


linhas de pensamento. Da extrema direita à extrema esquerda, passando
por liberais e ambientalistas, todos estão ou já estiveram lado a lado nas
ruas.
Em um país onde protestos fazem parte da rotina diária dos cidadãos, o
movimento dos coletes amarelos se destaca por não estar ligado a
nenhuma das lideranças tradicionais. Os manifestantes reafirmam que não
há lideranças ou inclinações partidárias.
[...]
Além da composição diversa, os coletes amarelos têm diversas
características que os aproximam dos manifestantes das jornadas de junho
em 2013 no Brasil. O caráter apartidário, a falta de lideranças, a
participação de setores da sociedade que não estão habituados a se
manifestar e a pauta difusa são alguns dos pontos em comum. (BAPTISTA,
2019)
Aqui no Brasil, as manifestações de junho de 2013 podem ser vistas como
um marco para essa nova fase dos movimentos sociais. Gohn (2014), ao citar as
características das manifestações anteriores a 2013 discorre que:

Os protestos até junho de 2013 transcorriam na avenida de forma


tradicional: carros de som puxados por centrais sindicais, MST e outros
movimentos sociais. Bandeiras, cartazes, balões, longos discursos, a
maioria em tom de gritos altíssimos, irados. São protestos planejados,
muitos convocados nas portas das fábricas e feitos pelos sindicatos, com
infraestrutura de transporte aos participantes que incluía, às vezes, até o
lanche/alimentação (GOHN, 2014, p. 132).
Assim, as manifestações de 2013 estabelecem no Brasil um novo cenário,
em que os grupos se organizam e mobilizam milhares de pessoas, com a
participação cada vez mais diminuta das entidades representativas clássicas, como
os partidos e sindicatos.

24
Idem.
25
Ibidem.
74

As manifestações de junho de 2013 no Brasil fazem parte de uma nova


forma de movimento social composta predominantemente por jovens,
escolarizados, predominância de camadas médias, conectados por e em
redes digitais, organizados horizontalmente, críticos das formas tradicionais
de política, tais como se apresentam na atualidade – especialmente os
partidos e sindicatos, eles pregam autonomia em relação a essa forma
antiga, embora alguns possam ter articulações com alguns partidos mais
radicais (GONH, 2014, p. 12).
No mesmo sentido, o Sr. Coronel de Polícia Militar Alexandre Monclus
Romanek26, em entrevista não estruturada, informou que a partir de 2013, as
grandes manifestações deixaram de ser determinadas e conduzidas por sindicatos,
partidos políticos, assumindo um comportamento descentralizado, sem liderança
definida e com reivindicações difusas. Para o Oficial, outra característica que definiu
as manifestações de junho de 2013, foi a intensa participação de grupos
anarquistas, sobretudo os que adotam a tática black block, o que tornou os protestos
muito mais violento do que os tradicionamente conhecidos.
Diferentes grupos, diferentes reivindicações, pessoas solitárias que muitas
vezes sequer participaram de manifestações públicas em suas vidas, passaram a
fazer parte dessa massa, impulsionados pelas facilidades e rapidez proporcionados
pelo mundo tecnológico atual.
Castells (2017) assevera, portanto, que não são os objetivos perseguidos
pelos manifestantes atuais que os tornam semelhantes, ou mesmo o contexto
econômico ou regimes autoritários que vivenciam, pois cada país possui uma
realidade diferente. Assim, dois fatores contextuais parecem decisivos: uma crise
fundamental do sistema político e a capacidade de comunicação autônoma,
traduzida pela habilidade para se conectar com os seus participantes e a sociedade
como um todo pela nova mídia social, por intermédio de smartphones e toda a
galáxia das redes de comunicação.
Como as pessoas não conseguem alcançar seus direitos e desejos de
cidadania por meio da sua representatividade política consolidada pelo Estado
Democrático, que é ineficaz na discussão e implementação de políticas públicas que
atendam seus anseios, somente lhe restam fazer ser ouvidos por meio das
manifestações públicas.

26
Atualmente é o Comandante da Academia de Polícia Militar do Barro Branco, porém possui vasta
experiência na atividade de Controle de Multidões, pois serviu por muitos anos nos BPChq, da
PMESP. Em 2013, era Coordenador Operacional do 3º BPChq e atuou diretamente nas ações de
controle de multidões.
75

Ocorre que diante no mundo atual volátil, incerto, complexo e ambíguo,


surge um manifestante muito mais impaciente para esperar que suas reivindicações
sejam atendidas. Evoluíram suas estratégias, táticas, estrutura e ferramentas, na
mesma velocidade proporcionada pela quarta revolução industrial e seus efeitos.
Diante dessa observação, a seguir serão apontadas algumas características
das manifestações atuais, apresentadas a partir das manifestações de junho de
2013 em São Paulo, que obrigaram e desafiam as instituições policiais a buscarem,
rapidamente, novas estratégias para garantirem a manutenção da ordem pública
nessas situações.

2.6.1 Estrutura horizontal

Uma das características mais visíveis das novas manifestações é a estrutura


horizontal, ou seja, ausência de liderança formal definida.
Embora exista uma certa organização responsável pelo chamamento às
manifestações, sugestão de local e horários, não há uma subordinação dos
manifestantes com os organizadores, não há uma obrigação de fidelidade às pautas
propostas.
Nas manifestações de junho e nas que vieram depois, era comum a
existência de cartazes com dizeres “sem partido” e, em algumas oportunidades,
ocorreram confrontos entre manifestantes e grupos de partidos políticos que
tentavam ocupar o mesmo espaço das manifestações contra aumento de tarifa, bem
como repúdio a políticos que tentavam fazer parte dos atos.
Em 2013, embora inicialmente tenham sido convocadas pelo Movimento
Passe Livre (MPL), ao passar dos dias, verificou-se o engajamento de pessoas com
as mais diferentes pautas que não envolviam apenas o transporte público. O que se
viu foi o surgimento de um “palco” diário, para onde as pessoas se dirigiam para
expressarem suas reivindicações individuais, dedicadas às suas exigências.
A identificação de liderança pela polícia era um problema. E mesmo
incialmente, quando o MPL convocava e, de certa forma, respondia pelo movimento
contra o aumento das tarifas de transporte, não conseguia influenciar as ações de
todos os demais grupos que participavam das manifestações, os quais atuavam de
acordo com suas próprias convicções. Nesse sentido,
76

Os manifestantes de junho no Brasil atuam em coletivos não hierárquicos,


com gestão descentralizada, produzem manifestações com outra estética;
os participantes têm mais autonomia, não atuam sob a coordenação de uma
liderança central. São movimentos com valores, princípios e formas de
organização distintas de outros movimentos sociais a exemplo dos
sindicais, populares (urbanos e rurais), assim como diferem dos movimentos
identitários (mulheres, quilombolas, indígenas etc.) (GONH, 2014, p. 9).
Embora exista a influência dos fatores psicológicos decorrentes do grande
número de participantes que gera a sensação de poder, a possibilidade da imitação
e contágio de comportamentos, sentimento de coletividade, muitos dos participantes
dessas manifestações, aproveitam a visibilidade e a força criada pelas multidões
para agirem de forma autônoma.
A inexistência de liderança central foi uma grande dificuldade enfrentada
pela PMESP nas manifestações de 2013. Certamente, existiam líderes informais,
que emergiram das circunstâncias de momento, das emoções, mas a massa
heterogênea impedia a existência de alguém que respondesse pelo todo. Não existia
vínculo consistente e duradouro entre os grupos, a liderança quando se
apresentava, tratava-se mais de um personagem que compunha todo cenário,
interessante para a participação das manifestações, do que alguém que definia a
pauta das reivindicações, o roteiro, o destino do ato.
Como já apontado pelo Coronel Romanek, a PMESP estava acostumada
com as manifestações tradicionais, em que suas estratégias, táticas, técnicas e
procedimentos já estavam muito bem definidos e sedimentados, para atender aquela
realidade. As organizações eram sempre as mesmas e os seus líderes eram
definidos. Os objetivos, ideologias, visões, táticas e comportamentos, até certo
ponto, eram conhecidos, o que tornava o desfecho das manifestações mais
previsíveis.
Existia um certo protocolo de ações e consequências, pois, com raras
exceções, todos manifestantes atuariam da forma e no momento definidos pelo líder,
pelo partido, pela associação, pelo sindicato responsáveis pela organização.
Durante a entrevista, o Coronel Romanek explicou que as manifestações
tradicionais antes de 2013, embora também apresentasse atos de violência em
algumas oportunidades, seguiam um roteiro já conhecido, tinham a intenção primária
de buscar visibilidade ao movimento na grande mídia e na sociedade, no formato de
bloco único de manifestantes. Em algumas oportunidades confrontavam a polícia em
espaços tradicionalmente definidos e depois dispersavam-se (intenção secundária).
77

Já nas manifestações de 2013, os manifestantes se reuniam em determinados


espaços, os quais eram inicialmente definidos, no entanto, seguiam por um longo
deslocamento pelas ruas de São Paulo, sem destino certo e, ao final, na maioria das
oportunidades, confrontavam a polícia e dispersavam, causando grandes danos ao
patrimônio público e privado, incendiando ônibus, veículos oficiais, fazendo
transparecer que a retórica em torno da visibilidade das pautas de transporte público
não era a intenção primária dos manifestantes. A reunião inicial de apresentação
das pautas (intenção secundária), seria uma forma de encontrar oportunidades, ao
longo do movimento, de praticar atos violentos (intenção primária). O Comandante
ainda alerta que o grande desafio das forças policiais é identificar qual a intenção
primária dos movimentos sociais, fator determinante para o estabelecimento
eficiente de estratégia operacional e emprego de táticas adequadas para garantia da
ordem pública.
Essa tese parece fazer muito sentido, pois na medida em que os atos
violentos foram se repetindo e cada vez de forma mais graves, os movimentos de
2013 foram perdendo força, fazendo crer que os manifestantes que passavam a
entender essa lógica invertida deixavam de comparecer às ruas.

2.6.2 Heterogeneidade

As manifestações de junho foram iniciadas por grupo basicamente formado


por jovens de classe média e escolarizados (GOHN, 2014, p. 12). Aos pouco, com a
ampliação das pautas de protestos que incluíam os excessivos gastos públicos com
a Copa do Mundo de 2014 e a Copa das Confederações de 2013, denúncias de
corrupção, incapacidade do Governo diante do controle da inflação e políticas
públicas deficientes, sobretudo na área da saúde, educação e segurança, observou-
se o engajamento de diversos setores da sociedade e pessoas de diferentes faixas
etárias, classes sociais, profissões e até ideologias, pessoas comum que até então
nunca teriam participado de protestos, como informado por Peruzzo (2013):

No conjunto, houve uma mescla de segmentos de classe e de tendências


político-ideológicas: de esquerda, liberais, conservadores, grupos com
conotação, gente que quer mudar o Brasil, gente que apenas aderiu e
participou, mas sem saber bem o porquê ou, como lembra Chauí (2013), o
fez apenas para sair de casa. Enfim, os protestos de junho de 2013 –
momento em que tiveram maior adesão – expressaram o heterogêneo
(PERUZZO, 2013, p. 79).
78

O lado negativo da heterogeneidade, porém, está no ambiente fértil criado


para que grupos radicais infiltrem-se nas manifestações, como ocorreu e vem
ocorrendo a partir de 2013. Muitos grupos de ideologia anarquista, que utilizam
táticas de enfrentamento, danos ao patrimônio, violência se fizeram presentes,
muitas vezes tornando-se atores principais das manifestações. Exemplo disso são
os adeptos da tática black blocs, ACAB, Antifas.

2.6.3 Presença de grupos radicais e o emprego de violência

Como já citado acima, a violência contumaz e desmedida tornou-se um


símbolo marcante para as manifestações de 2013, em São Paulo. Em dias de
manifestações, era comum andar pelas ruas da capital e constatar ônibus
incendiados, veículos oficiais virados e depredados, prédios públicos com fachadas
destruídas, às vezes invadidos, lixeiras públicas incendiadas e lançadas nas vias,
bancos, lojas, concessionárias de veículos destruídas. Muitas pessoas e a mídia
noticiavam como cenas de guerra.
O período foi marcado pela presença e demonstração de força de grupos
radicais infiltrados nas manifestações até então pouco conhecido pelas autoridades
e pela sociedade. A tática black bloc foi a mais explorada pela mídia e ficou famosa
pelas características físicas e peculiaridade dos grupos que a utilizavam, bem como
pela grande agressividade das suas ações que demonstravam certo
“profissionalismo ativista”.
Figura 12 Grupo Back Bloc em manifestação

Fonte: G-1, 2013.


79

Conceitualmente:

Os Black Blocs são compostos por grupamentos pontuais de indivíduos e


grupos de pessoas formados durante uma marcha ou manifestação. A
expressão designa uma forma específica de ação coletiva, uma tática que
consiste em formar um bloco em movimento no qual as pessoas preservam
seu anonimato, graças em parte, às máscaras e roupas pretas. [...] Para
explicitar ainda mais sua mensagem, os Black Blocs costumam ostentar
diversas bandeiras anarquistas (pretas ou vermelhas e pretas) e fixas com
lemas anticapitalistas e antiautoritários.
[...]
Uma tática como a dos Blacks Blocs é uma forma de se comportar nos
protestos de rua. Ela pode ajudar a dar vozes às pessoas que protestam na
rua, oferecendo-lhes a oportunidade de expressar uma crítica radical ao
sistema ou fortalecendo sua capacidade de resistir aos ataques da Polícia
contra a população (DUPUIS-DÉRI 2014, p. 10).

A ideia acima ajuda a explicar o porquê da atuação desses grupos em


manifestações ideologicamente diferentes e com pautas tão distintas. O Black Bloc
não é um movimento social e não têm pauta definida. É uma tática que pode atender
à diferentes ideologias, ideias e movimentos. Por exemplo, o Antifa pode utilizar a
tática black bloc, da mesma forma que o neonazista.
Embora seja conhecido por suas ações violentas, emprego de bombas,
artefatos incendiários, armas brancas, capacetes, escudos improvisados,
estilingues, entre outros, o Black Bloc possui certa diversidade tática em sua
atuação. Dessa forma, realiza certa análise política e de risco antes de se decidir
pelo uso da força. Seu alvo em regra é o capitalismo e o Estado, o qual pode ser
atacado, em certos momentos, por meio de caminhada pacífica, proteção a outros
manifestantes, e certamente enfrentamento com a polícia e a realização de atos de
vandalismo. Para ilustrar a ideia:

Paul, um veterano de manifestações na Europa, resumiu o debate interno


de um Black Bloc, antes de se tomar a decisão de usar ou não usar a força:
“Primeiro, o objetivo da manifestação, a motivação política por trás dela.
Depois a situação geral do movimento político ou social, o tamanho da
multidão, sua composição, as pessoas que você vê nela [...]” (DUPUIS-
DÉRI, 2014, p. 67).
Para o Black Bloc, o conceito de violência deve ser mais bem analisado.
Assim suas ações contra símbolos do capitalismo e do Estado são mínimas diante
da “grande violência” praticadas por eles e pelo sistema econômico e político
existente em decorrência deles. (DUPUIS-DÉRI, 2014, p. 103)
Com relação às indumentárias, o uso de roupas pretas e máscaras, além de
caracterizar o grupo, tem um sentido prático, qual seja:
80

“Vestir preto permite que você ataque e depois volte para o Black Bloc,
onde é sempre só mais um entre muitos outros”, explica um veterano de
diversos Blacks Blocs, comentando que o anonimato possibilita frustrar, ao
menos em parte, a vigilância da polícia (DUPUIS-DÉRI, 2014, p. 13).
A tática black bloc teria sido utilizada pela primeira vez no início dos anos 80
pelo movimento denominado “autonomen”, em Berlim ocidental. Tem como origem
ideológica o marxismo, feminismo radical, anarquismo e ambientalismo e
“praticavam uma política igualitária e participativa “aqui e agora”, sem líder ou
representantes; a autonomia individual e a autonomia coletiva eram, em princípio,
complementares e igualmente importantes. ” (DUPUIS-DÉRI, 2014, p. 40)
A tática black bloc foi difundida para o mundo por meio de contatos entre
ativistas, caracterizados pela cultura punk e de extrema-esquerda. Mas foi nas
manifestações antiglobalização de Seattle em 1999, por meio da grande cobertura
da mídia que a tática foi divulgada, efetivamente, para o mundo inteiro,
apresentando suas características bem singular: roupas pretas, máscaras nos rostos
e ataques contra alvos econômicos e políticos (DUPUIS-DÉRI, 2014, p. 41-52).
Nas manifestações de 2013, em São Paulo, verificou-se também algumas
referências a grupos ANTIFAS, ou antifascistas, termo mais utilizados nas
manifestações atuais, sobretudo naquelas de pautas contrárias ao Governo atual,
presidido pelo Sr. Jair Messias Bolsonaro que se apresenta como ideologicamente
voltado à direita conservadora.
Bray (2020, p. 32), apresenta o antifascismo como “um método de política,
um lócus de auto identificação individual e de grupo, de um movimento transnacional
que adaptou correntes socialistas, anarquistas e comunistas preexistentes a uma
súbita necessidade em reagir à ameaça fascista”. E ainda acrescenta que:

“[...] o antifascismo é uma política nada liberal, é a revolução social aplicada


ao combate à extrema-direita, não apenas aos fascistas literais”.
[...] os antifascistas alcançaram esses objetivos de várias formas, desde
cantar mais alto em comícios, ocupar os locais de reunião fascistas que
pudessem se instalar, semear a discórdia em seus grupos por meio de
táticas de infiltração, e até romper qualquer véu de anonimato, para
atrapalhar fisicamente suas vendas de jornais, manifestações e outras
atividades (BRAY, 2020, p.34).
Os militantes antifascistas são ligados a movimentos de ideologias de
esquerda e anarquistas, e discordam do que chamam de “perseguições e proibições
do Estado contra políticas “extremistas”, em razão da sua política revolucionária
antiestatal”, alegando que as proibições seriam mais utilizadas contra a esquerda do
que contra a direita. (BRAY, 2020, p.34)
81

Com surgimento ligado à década de 20 na Itália, em oposição ao fascismo


de Benito Mussolini e na década de 30 na Alemanha em resposta ao fortalecimento
do partido nazista, o movimento se espalhou por diversas partes do mundo. (Bray,
2020, p. 66)
Com a extinção formal dos partidos nazistas e fascistas, utilizam, atualmente
como discurso de combate à ideologia de extrema-direita e seus fundamentos.
Cammeron (2017) escreve que:

Ainda que os Antifas sejam classificados por analistas distintos como uma
organização de esquerda ou extrema-esquerda, seus integrantes fazem
antagonismo à ideologia de extrema-direita, mas não promovem iniciativas
que representem a um determinado setor do sistema político.
Diferentemente dos grupos políticos ou partidos tradicionais, os Antifas não
almejam participar de eleições nem influenciar a aprovação de leis no
Congresso.
Com um forte discurso anticapitalista, eles empregam táticas mais similares
às de anarquistas do que às da esquerda tradicional.
Nesse sentido, parte dos Antifas consideram a violência um método válido
durante protestos populares, inclusive a destruição de propriedade privada
e, em determinados casos, o enfrentamento físico contra seus opositores.
Guimón (2020)27, ao retratar os Antifas, descreve que:

[...] é um movimento de ativistas sem uma estrutura formal que


compartilham uma filosofia geral e táticas. Embora a polícia afirme que
alguns ativistas antifascistas estão altamente organizados em células em
nível local, o Antifa não é um grupo com liderança centralizada, uma cadeia
de comando e uma estrutura definida. É impossível saber o número de
membro e nem mesmo definir quando alguém é membro.
Não existe sequer um manifesto aceito em comum ou uma lista de
posições, mas os militantes antifascistas compartilham causas como a luta
contra o racismo, a homofobia, a xenofobia e, em geral, a proteção dos
setores mais marginalizados e desfavorecidos da população.

Bray (2020), em suas considerações sobre as justificativas das ações Antifa


discorre que:

Para os socialistas revolucionários da Antifa, a questão primordial é a luta


política contra o fascismo; dessa perspectiva, os direitos promovidos pelo
governo parlamentar capitalistas não são dignos de respeito.
[...] Na verdade, a violência representa uma parte pequena, embora vital,
das atividades antifascistas (BRAY, 2020, p. 279; 305).
Embora os grupos Antifa admitam a utilização da tática Black Bloc em
determinadas “situações políticas”, para eles trata-se de apenas uma de muitas
outras táticas dos seus repertórios. Dessa forma, o grupo Antifa não participa de
protestos, obrigatoriamente, vestidos de preto e utilizando máscaras, pois muitos
acreditam que ao contrário de gerarem anonimato, a caracterização do grupo facilita

27
Sem paginação.
82

a identificação do grupo pela polícia. Desta forma, como exemplo a ser dado, os
Antifa de Madri marcham sem máscaras em grandes manifestações, e “guardam
bandanas e balaclavas para ações de confronto” (BRAY, 2020, p. 341-343).
Bray (2020, p. 32) conclui:
[...] a redução do termo à mera negação obscurece a compreensão do
antifascismo como um método de política, um lócus de auto identificação
individual e de grupo, de um movimento transnacional que adaptou
correntes socialistas, anarquistas e comunistas preexistentes a uma súbita
necessidade em reagir à ameaça fascista.

Figura 13 Símbolo de grupo Antifa, em São Paulo

Fonte: https://www.facebook.com/AcaoAntifascistaSaoPaulo.

Em algumas oportunidades das manifestações de 2013 também foi possível


verificar bandeiras e pichações com a palavra A.C.A.B.
A.C.A.B. não é um movimento, uma tática, é, pois o acrônimo em inglês da
expressão em inglês “All Cops are Bastards” (Todos Policiais são Bastardos,
tradução livre), também representado pelos números 1312.
A expressão teria surgido no início do século XX na Inglaterra e a sigla teria
sido utilizada na greve operária de 1940 naquele país como forma de expressar a
indignação frente a opressão e brutalidade das instituições policiais.
(GROUNDWATER, 2020)28

28
Sem paginação.
83

A expressão ganhou notoriedade no ano de 1970, por meio da publicação do


jornal Dally Mirror que apresentou uma reportagem que contava a história de um
garoto que bordou ACAB na sua jaqueta e foi preso pela Polícia.
Muito utilizada na subcultura punk e skinhead, e popularizado por meio de
músicas, como por exemplo a canção ACAB da banda londrina 4-Skin, a expressão
atualmente tem sido adotada por hooligans e ultras do futebol europeu.
(GROUNDWATER, 2020)

Figura 14 Grupo A.C.A.B.

Fonte: El Pais, 2016. (Disponível em:


https://brasil.elpais.com/brasil/2016/06/17/album/14661
99237_053831.html#foto_gal_2.
Assim como a sociedade, de forma geral, evoluiu, as táticas black bloc,
filosofia A.C.A.B. e o movimento Antifa também acompanham essa evolução, na
tentativa de adequar suas lutas intermináveis diante do que consideram injusto.

2.6.4 Pautas difusas

Conforme já explanado anteriormente, embora haja uma reivindicação inicial


na qual se baseia a convocação e recrutamento para essas nova manifestações
públicas, não há uma pauta definida como nos movimentos tradicionais que exigiam,
por exemplo, o aumento salarial de uma determinada classe.
O que se observa é uma ampla descrença nos representantes políticos e a
maneira como priorizam, estabelecem e conduzem as políticas públicas.
As reivindicações são, portanto mais amplas e atingem a todos cidadãos,
fato este que proporciona a heterogeneidade e, consequentemente, manifestações
84

públicas com a participação de um grande número de pessoas, número estes muito


maior do que os movimentos dedicados a uma causa, classe ou grupo específico.
Está-se, portanto, em um momento de grandes manifestações.

2.6.5 Manifestações tecnológicas e em rede

Com certeza a utilização maciça da tecnologia e redes sociais, propiciadas


pelo acesso popularizado da internet, é o fator crucial para a determinação das
características das novas manifestações, sendo a condição necessária e
responsável pela grande mudança nas estratégias das manifestações, da sua
estrutura, da sua amplitude, do seu potencial em persuadir e provocar mudanças
desejadas.
A tecnologia e as redes sociais forneceram liberdade às manifestações, na
medida que não são necessários recursos financeiros para que os organizadores
criem uma demanda, desenvolvam ações de persuasão e convencimento em favor
dos propósitos apontados, realizem o recrutamento de novos ativistas, organizem e
marquem a data e local do ato e divulguem seus efeitos não somente para seu
grupo ou cidade, mas também para seu Estado nacional e para além das suas
fronteiras. Nesse sentido, Peruzzo (2013) registra que:

Em meio a essa guerra midiática, os grandes meios não operam sozinhos,


apesar do poder de influência e do alcance que têm. Mais do nunca, os
meios pessoais (celulares e smartphones) e as câmeras de ativistas de
mídias alternativas participaram na difusão da informação, colocando em
blogs, sites, redes virtuais, no Youtube etc., fotos, vídeos e textos. Cada
pessoa com celular conectado à internet pode gravar, interpretar e difundir,
até em tempo real, o que se passava em praça pública. Essa
contrainformação é fundamental no processo de mobilização e
conscientização da população. Ao que tudo indica, esses canais foram
muito utilizados, para postar e para acessar. Anna Carolina Rapp e Camilo
Rocha informam que, de acordo com um monitoramento feito pela empresa
Scup, “publicações sobre os protestos impactaram mais de 136 milhões de
pessoas nas redes sociais. Entre 13 e 21 de junho de 2013, foram mais de
2 milhões de menções em Facebook, Twitter e YouTube e Google”
(PERUZZO, 2013, p. 89).
Livres de manipulações por parte de qualquer órgão público de controle
(afirmação muito questionada nos dias de hoje) (SCHWAB, 2016, p. 73), as redes
sociais e a tecnologia concederam às pessoas liberdade e autonomia para se
expressarem e reivindicarem seus propósitos. Permitiram às manifestações e seus
organizadores capacidade de construírem suas próprias narrativas, livrando-se
também das amarras impostas pela grande mídia, responsável, até então, pela
85

construção e definição das índoles dos atores participantes dos movimentos, de


acordo com sua própria conveniência, mesmo que não explane a realidade. “Hoje
em dia, o baixo custo e o amplo alcance dos veículos de massa faz deles os meios
ideais para comunicar significados, motivo pelo qual os manifestantes tanto se
esforçam para obter cobertura noticiosa” (JASPER, 2016, p. 65) e no mesmo
sentido:

É essa conexão entre o ciberespaço público, ignorando a controlada mídia


convencional, e o espaço público urbano, cuja ocupação desafia a
autoridade institucional que está no cerne dos novos movimentos sociais.
A difusão das redes sociais alocadas na internet de fato é uma condição
necessária para a existência desses novos movimentos sociais de nossa
época (CASTELL, 2017, p. 171).
Castells (2017, p. 143) cita, como exemplo dessa interação, um estudo
realizado por Kevin Driscoll e François Bar a respeito do movimento Occupy Wall
Street, nos Estados Unidos, em que se verificou que somente no mês de novembro,
de 2011, foram observados cerca de 120 mil tuítes num dia típico e 500 mil durante
um ato específico.

Em muitos casos de ameaça de ação policial contra as ocupações, as redes


de Twitter alertaram milhares de pessoas, e sua mobilização instantânea
solidária desempenhou importante papel na proteção dos ocupantes.
Usando o Twitter a partir de seus celulares, os manifestantes conseguiam
divulgar constantemente informações, fotos, vídeos e comentários,
construindo uma rede de comunicação que cobria o espaço ocupado
(CASTELLS, 2017, p. 143).
Ações semelhantes ocorreram nas manifestações de junho de 2013 em São
Paulo, muito intensificadas pelas inovações das redes sociais. E assim como nos
Estados Unidos, essa rápida comunicação dos manifestantes, em muitas ocasiões
dificultaram uma ação eficiente da polícia na manutenção da ordem pública.
Para Castells (2017, p. 199), as redes sociais baseadas na internet são
decisivas para que os manifestantes possam mobilizar, deliberar, coordenar e
decidir. Criam condições importantes para que um movimento sem liderança possa
sobreviver, deliberar, coordenar, expandir e protege, na medida em que os protege
“da repressão de seus espaços físicos liberados, mantendo a comunicação entre as
pessoas do movimento e com a sociedade em geral.”
Schwab (2016), ao discorrer sobre a influência da revolução digital nas
relações das pessoas com o Governo constituído, apresentou o seguinte cenário:

A era digital prejudicou muitas das barreiras que eram usadas para proteger
a autoridade pública, tornando os governos muito menos eficientes ou
eficazes, pois os governados, ou o público estão mais bem informados e
86

cada vez mais exigentes em suas expectativas. [...] a tecnologia, cada vez
mais, tornará os cidadãos mais aptos oferecendo uma nova maneira de
expressar suas opiniões, coordenar seus esforços e possivelmente
contornar a supervisão estatal.
[...] Estruturas paralelas serão capazes de transmitir ideologias, recrutar
seguidores, coordenar ação a favor – e contra – os sistemas de governos
oficiais (SCHWAB, 2016, p. 73).

A internet e as redes sociais tornam as manifestações públicas mais


dinâmicas e grande potencial de mobilização.

2.6.6 Incidentes dinâmicos

Ao tratar sobre as novas manifestações públicas a partir de 2013, Malagutti


(2020) as apresenta como incidentes dinâmicos, baseado nos conceitos previstos no
National Incident Management System – NIMS (Sistema Nacional de Gerenciamento
de Incidente), documento elaborado pela Federal Emergency Management Agency –
FEMA (Agência Federal de Gerenciamento de Incidentes), do Departamento de
Segurança Interna dos Estados Unidos da América. Assim:

As manifestações públicas também foram englobadas por esse novo


entendimento, sendo por assim caracterizadas como incidentes dinâmicos,
o que sugere a impossibilidade de conter e isolar, conforme preconizava a
antiga doutrina de gerenciamento de crises.
[...]
Para nossa análise, primoroso é conhecer os princípios básicos tratados
pela matéria voltados ao panorama das manifestações, cujas
características, conforme previamente relatado, podem ser perfeitamente
enquadradas na modalidade dinâmica do incidente, sobretudo quando
existe a possibilidade de quebra da ordem pública, mesmo que
minimamente, no entanto, com grave risco à integridade física de pessoas e
danos ao patrimônio comum e privado, potencializado com a presença de
grupos extremistas de qualquer ideologia (MALAGUTTI, 2020, p. 37-43).
Para tanto, o NIMS conceitua incidente como:

Uma ocorrência, natural ou provocada pelo homem, que exige uma


resposta para proteger a vida ou a propriedade. Neste documento, a palavra
"incidente" inclui eventos planejados, bem como emergências e/ou
desastres de todos os tipos e tamanhos.” (FEMA, 2017, p. 64, tradução
nossa).
Reconhecer as manifestações públicas como incidentes dinâmicos, dentro
dos conceitos apresentados pelo NIMS, possibilita que a Polícia Militar atualize sua
estratégia de manutenção da ordem pública frente às novas manifestações de rua,
adequando o emprego dos seus ativos operacionais, bem como as técnicas, táticas
e procedimentos para ações mais eficientes e menos danosas.
87

Urge a necessidade de explanar, ainda que brevemente, sobre os conceitos


“incidente” e “crise” para melhor compreensão do assunto.
Segundo Souza (1995, p. 10), aproveitando-se da definição dada pela
Academia Nacional do FBI, crise “é um evento ou situação crucial, que exige uma
resposta especial de Polícia, a fim de assegurar uma resposta aceitável” e tem
como características a imprevisibilidade, compressão de tempo (urgência); ameaça
a vida e necessidade de postura organizacional não rotineira, planejamento
analítico, capacidade de implementação e considerações legais especiais.
A definição de crises apresentada por Souza em seu trabalho tem
importância imensurável nas ações desenvolvidas pela Polícia Militar em ocorrências
críticas, sobretudo nas ocorrências de refém localizado. É considerado um marco
para a doutrina de gerenciamento de crises em São Paulo e a inovação da postura
da organização frente a essas ações, bem como para a postura dos policiais no
atendimento de ocorrências. Tamanha a importância que foi altamente disseminado,
passando a fazer parte dos currículos dos cursos de formação, especialização e
aperfeiçoamento da PMESP, inclusive sendo difundido para Instituições Policiais de
outros estados da federação.
A Diretriz Nº PM3-001/02/13, que trata de ocorrências que exijam a
intervenção do Grupo de Ações Táticas Especiais (GATE), traz algumas inovações e
apresenta em seu texto a definição de crise de uma forma mais ampla:

Para fins dessa Diretriz, considera-se crise o episódio grave, desgastante,


conflituoso, de elevado risco, em que a perturbação da ordem social venha
a ameaçar ou causar danos a indivíduos ou grupos integrados na
coletividade, exigindo para tanto, atuação célere, racional dos organismos
policiais (PMESP, 2013).
No entendimento dos conceitos, Silva (2019) destaca que:

Ambas as palavras estão afetas a mudanças de cenários. A diferença é que


enquanto incidente é alteração num sentido mais amplo (gênero), crise é
uma transformação contundente, agressiva (espécie).
Pode-se inferir, nesta linha de raciocínio, que crise é um incidente de
gravidade diferenciada, impactante e não mera alteração de estado das
coisas. Nesse caso, trata-se de um incidente crítico por ser uma mudança
no cenário, mas com modificações abruptas. Em suma, toda crise é um
incidente, mas nem todo incidente é uma crise (SILVA, 2019, p. 48).
Aguilar (2017) explica que há incidentes menos graves que a crise que
podem ser caracterizados como pré-crise:

De acordo com a Doutrina, incidentes são menos graves do que crises,


possuindo intensidades que vão da mera possibilidade de perigo de lesão à
vida ou ao patrimônio, passando pela efetiva lesão a esses bens jurídicos
88

tutelados, podendo advir certo escalonamento de gravidade ao que chama


de Pré-Crise, momento em que devem ser redobrados os cuidados de
gestão, a fim de se evitar que se alcance o estágio de Crise, situação
crucial, quando os danos poderão ser incalculáveis (AGUILAR et al., 2017,
p. 4-5).
E ainda complementa:

A PMESP desperta interesse em acompanhar prematuramente incidentes


potencialmente lesivos à vida e à propriedade antes mesmo de haver
quebra da ordem pública, como por exemplo o acompanhamento de
manifestações públicas pacíficas previamente comunicadas às autoridades
ou mesmo eventos esportivos de grande porte (AGUILAR et al, 2017, p. 5).
Sobre o assunto, Silva (2019, p. 50) destaca que entre a normalidade e a
crise existe uma fase intermediária denominado incidente pré-crítico ou pré-crise,
menos grave que a crise (figura 14), momento em que uma ação rápida pode
evitar que o problema se alastre ou se torne mais complexo.
Figura 15 Ilustração gráfica de Normalidade, Pré-crise e Crise

Fonte: SILVA, 2019, p. 50.


Para Aguilar “o termo ‘incidente’ de forma lato sensu, alinha-se com a melhor
doutrina, sendo certo, que Pré-Crise e Crise, devem ser utilizadas apenas para
quantificar o grau de risco dos ‘incidentes’.” (AGUILAR et al., 2017, p. 6)
Esse conceito de incidente pré-crítico será muito importante mais à frente
quando será tratado do emprego de equipes de policiais motociclistas em ações de
Controle de Multidões, uma vez que um dos fundamentos da proposta que será
apresentada baseia-se na busca em se evitarem que as consequências danosas
dos incidentes críticos se alastrem pelas ruas.
Explicado o conceito de incidente e sua caracterização em pré-crítico ou
crítico, oportuno se faz conceituar o que seria incidente dinâmico, como forma de
justificar a classificação das manifestações públicas, conforme apresentou Malagutti
(2020) em sua dissertação já mencionada anteriormente.
89

Racorti (2019, p. 35-36) diferencia os incidentes em estáticos e dinâmicos da


seguinte maneira:

Por definição, podemos tratar de incidentes policiais estáticos como


eventos que se limitam a um espaço geográfico determinado, que por sua
natureza, permitem a adoção das medidas iniciais de contenção e
isolamento pela primeira força policial interventora, permitindo o
acionamento das unidades especializadas sem que haja a necessidade de
implementação imediata de uma alternativa tática para a sua solução.
[...]
Já os incidentes policiais dinâmicos são aqueles eventos cujos impactos
não se limitam a um espaço geográfico determinado, em razão da sua
natureza, os atores envolvidos encontram-se em movimento, tornando difícil
a adoção das medidas iniciais de contenção e isolamento, exigindo uma
resposta imediata da primeira força policial interventora, a fim de alcançar a
cessação dos seus efeitos e, posteriormente, o acionamento das demais
ações do Estado e outras organizações. (grifo nosso)
Dessa forma, aproveitando os conceitos apresentados pelo NIMS e pelos
demais autores, pode-se dizer que as manifestações públicas são incidentes
dinâmicos, pois são reuniões (ocorrências) planejadas ou espontâneas, na maioria
das vezes, em movimento e sem limitação geográfica dos seus impactos, exigindo
uma resposta do Estado para proteger vida ou a propriedade, que deve ser dada
pela Polícia a fim de cumprir seu poder-dever, constitucionalmente definido, de
implementar medidas para preservar a ordem pública.
O dinamismo das manifestações públicas, dentro de todo cenário
apresentado, tem grande importância, na medida em que as tornam sensíveis a
quaisquer pequenos fatores circunstanciais existentes à sua volta, na medida em
que se movimentam, tornando-os imprevisíveis. Assim suas características serão
regidas pela Teoria do Caos29 e o chamado efeito borboleta (AGUILAR, et al., 2017,
p. 8). E é frente a esses problemas complexos e caóticos que a PMESP deve dispor
de ferramentas, técnicas, táticas e procedimentos capazes de anular os efeitos
danosos ou mitigar a proliferação das suas consequências, mesmo diante de um
cenário, onde não é possível estabelecer um limite geográfico.
Dada a complexidade desse tipo de operação, atuação da polícia pode
envolver o acionamento de outros órgãos ou instituições públicas e privadas para o
alcance do objetivo de preservar a ordem pública sem, no entanto, desviar da
competência da polícia em gerenciar e liderar todo o processo.

29
“A ideia central da teoria do caos é que uma pequenina mudança no início de um evento qualquer
pode trazer consequências enormes e absolutamente desconhecidas no futuro. Por isso, tais
eventos seriam praticamente imprevisíveis – caóticos, portanto” (O QUE..., 2011).
90

Certamente, diante da complexidade que se pode alcançar em determinadas


manifestações públicas, pode ser necessário a utilização de uma metodologia para o
gerenciamento de incidentes.
Não é o objetivo desse trabalho estudar metodologias de gestão de
incidentes, uma vez que o emprego de policiamento com motocicletas no controle de
multidões é apenas parte do processo de gestão de multidões, estando inseridas
medidas de Administração e Controle, cujos conceitos estão previstos no Manual de
Controle de Multidões da PMESP (M-8-PM). (PMESP, 2018)
Nesse momento, faz-se suficiente entender que “as metodologias de
gerenciamento de incidentes pelo mundo, dado se tratar de temática complexa e os
casos de insucesso demonstram a necessidade de se estruturarem protocolos para
melhorar os resultados operacionais e evitar desgastes à imagem das instituições de
respostas”. (SILVA, 2019, p. 61)
Embora diversas pesquisas acadêmicas tenham explorado a possibilidade
de aproveitar os conceitos do NIMS e sua estrutura de Incident Comand System
(ICS), bem como o Sistema de Comando de Operações de Emergência (SICOE)
muito utilizado pelo Corpo de Bombeiros da PMESP, para as incidentes policiais
críticos, o fato é que formalmente, na PMESP os principais parâmetros de atuação
nas crises de natureza policial estão previstos apenas na Resolução SSP/SP nº 13,
de 09 de fevereiro de 2010 (SSP/SP, 2010) e Diretriz PM3-001/02/13, de 15 de
março de 2013 (PMESP, 2013).

2.6.7 Imprevisibilidade/volatilidade

A característica da imprevisibilidade, na verdade, é a consequência das


características anteriormente apontadas.
A estrutura horizontal dos novos movimentos sociais e ausência das
estruturas formais, por exemplo, diminuem o receio de responsabilização civil,
administrativa e criminal dos grupos, os quais, in tese, juridicamente inexistem,
restando assim, praticamente, uma incapacidade de “barganha” durante o processo
de mediação entre autoridades e manifestantes, que deixam de assumir
compromisso de seguirem as orientações impostas, orientações essas que muitas
vezes que nem chegam individualmente a cada indivíduo.
91

A participação em manifestações no formato de estrutura horizontal pode ser


utilizada de forma proposital, para diminuir o controle de autoridades, como já
explanado anteriormente. Exemplo disso, ocorreu no final do mês de maio, de 2020,
nas manifestações das torcidas organizadas ditas “pela democracia”, contra o
governo federal. Nas reuniões preliminares, realizadas no 2 Batalhão de Polícia de
Choque e presidida por Comandantes da Polícia Militar, com o objetivo de organizar
o evento e permitir que os atos ocorressem de forma organizada e sem quebra da
ordem pública, a liderança de diversas torcidas organizada de clubes de futebol, de
São Paulo, compareceram e informaram que as entidades, como pessoa jurídica,
não iriam participar do movimento, no entanto, muitos associados compareceriam
nos eventos de forma autônoma30.
A ausência de hierarquia e de uma liderança central definida e conhecida
também dificulta o planejamento de ações de polícia administrativa e de preservação
da ordem pública nas manifestações, pois grupos autônomos e desconhecidos
agem de forma diferente, dispersa, imprevisível. Nesses casos não há um parâmetro
claro e lógico, uma linha de pensamento a ser considerado, como existem nos
protestos tradicionais, persistindo, portanto, os conceitos amplos de multidões tão
estudados e conhecidos.
As manifestações são voláteis, não existe um início, meio e fim. Não existe
roteiro. Os objetivos mudam a todo momento, de acordo com as circunstâncias de
momento, de acordo com a avaliação de grupos independentes. Assim, a ações e
reações dos manifestantes tornam-se imprevisíveis.
Parece que os grupos radicais utilizam o tempo enquanto as manifestações
ocorrem para estudarem o movimento das autoridades e encontrarem alguma falha
tática, para agirem com menor risco e quando encontram, realizam suas ações,
sempre alimentados por uma intensa rede de informações via internet. (DUPUIS-
DÉRI, 2014, P. 66-69)
A imprevisibilidade é uma das estratégias de guerra mais eficazes e quando
o conceito é utilizado a favor dos manifestantes gera muita dificuldade para que a
Polícia Militar atue com eficiência nas ações de preservação da ordem pública (DOS
SANTOS, 2018, p. 121) A questão da imprevisibilidade das ações dos manifestantes
não recai sobre a capacidade da PMESP restaurar a ordem pública quando houver

30
Na ocasião, o Autor participou da referida reunião, pois exercia a função de Oficial de planejamento
de operações no Comando de Policiamento de Choque.
92

sua quebra. Isso é uma certeza. A grande luta é em quanto tempo essa resposta
desejada será eficaz? Quantos cidadãos e policiais serão lesionados até lá? Quais
os danos patrimoniais se efetivarão até que a ordem seja reestabelecida?
A imprevisibilidade dificulta o planejamento e emprego dos ativos da PMESP
no terreno.
Esse período que a ordem pública permanece sangrando até que seja
reestabelecida é, talvez, o grande desafio a ser enfrentado. Trata-se de um
problema complexo que exige uma estrutura policial flexível e veloz o suficiente para
se adaptar às demandas que vão surgindo tempo a tempo.

2.7 Os desafios da Polícia Militar do Estado de São Paulo diante das “novas
manifestações”

Certamente, o momento de transformação em que a sociedade atual está


inserida não influenciou somente as características das manifestações públicas e
dos movimentos sociais. Trata-se de um momento de grande ruptura que altera as
questões econômicas, políticas e sociais como um todo, conforme já explanado
anteriormente.
Nesta seção, destinada aos desafios a serem enfrentados pela PMESP no
Controle de Multidões, é importante salientar que, embora o foco do trabalho sejam
as manifestações públicas contemporâneas, não se pode dizer que as
manifestações tradicionais não mais ocorrem. O fato é que para essas
circunstâncias tradicionais, a PMESP já possui estratégias, técnicas táticas e
procedimentos bem definidos, cujos resultados são eficientes.
Os desafios, portanto, recaem sobre essa nova estrutura e formas de
protesto, e mais ainda, sobre aqueles dotados de estruturas horizontais, sem
liderança definida, constituído por grupos autônomos, muitas vezes radicais,
capazes de transformarem as manifestações ora pacíficas em incidentes críticos,
criando uma ambiente complexo e caótico sobre o qual a PMESP deverá atuar para
reestabelecer a ordem pública.
Dessa forma, vive-se atualmente em um “mundo VUCA”, termo surgido da
publicação do livro The Competitive Edge, escrito pelo psicólogo Dr. T. Owen
Jacobs, quando atuou no Instituto de Pesquisa do Exército Americano e ministrou
cursos do War College sobre assuntos ligados à liderança estratégica.
93

VUCA é o acrônimo de volatility, uncertainty, complexity e ambiguity (volátil,


incerto, complexo e ambíguo) utilizado para descrever o ambiente na era da
informação, a qual é disseminada em grande volume, fluxo em alta velocidade,
tempo limitado e conhecimento finito. (BRASILIANO, 2017, p. 21-22)
As novas manifestações públicas também estão inseridas nesse mundo de
volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade, onde foram construídas as
características demonstradas nas seções anteriores, criando um ambiente
complicado desde o início para a atuação das forças policiais.
Calmon (2019), ao citar o Coronel de Exército Brasileiro Alessandro Visacro
apresenta características importantes dos conflitos do século XXI, relacionado ao
termo VUCA:

O War College - instituição de ensino superior do Exército norteamericano -


cunhou a expressão "volátil, incerto, complexo e ambíguo” com o propósito
de descrever o atual ambiente de conflito. De fato, os cenários que dão
forma às áreas conflagradas ao redor do planeta têm se destacado por sua
complexidade, não linearidade, instabilidade, imprevisibilidade,
heterogeneidade, mutabilidade e dinamismo. Contudo, a fim de delinear
objetivamente o conjunto de circunstâncias que condicionam o uso do
instrumento militar, podemos citar como principais características do campo
e batalha do século XXI:
• níveis variáveis de intensidade de conflito;
• ameaças provenientes de atores estatais e não estatais;
• população civil com postura ambivalente (favorável, neutra e hostil);
• indiossincrasias culturais (complexidade do "terreno humano");
• onipresença da mídia;
• assédio de organismos de defesa dos direitos humanos;
• atuação de organizações não governamentais;
• restrições legais;
• limites impostos pela opinião pública;
• velocidade e fluidez da informação;
• disponibilidade de moderna tecnologia (capacidades das forças militares
ampliadas);
• grande volume de dados (propensão à sobrecarga de informação); e
• disseminação da informação em escala global (VISACRO apud CALMON,
2019, p. 20).
Certamente, na citação acima, o autor faz referência a batalhas enfrentada
por exércitos nacionais, no entanto, interessante se faz notar que as características
mencionadas (adaptadas a conceitos relativos à segurança pública), apresentam
grande semelhança com relação as dificuldades enfrentadas pela polícia nas ações
de preservação da ordem pública diante das novas manifestações de rua aqui
estudadas.
Importante frisar, também, que tais conceitos são visivelmente conhecidos
pelos ativistas, sobretudo aqueles que utilizam a tática black bloc, Antifa, A.C.A.B. e
94

outros movimentos ou grupos ligados a partidos políticos ou organizações com


tradição em manifestações públicas.
Grande parte desses grupos radicais mencionados, embora utilizem discurso
de busca por uma sociedade justa, liberdade, ausência de discriminações, repúdio
ao fascismo a extrema direita, repúdio à armas e à violência do Estado sobre as
pessoas, surgiram a partir de conflitos ideológicos, concretizados no mundo físico
construídos inclusive a partir de conflitos armados e guerras, dentro de um mundo
polarizado, com estratétigias e táticas bem definidas.
Esses grupos não protestam pela busca do atendimento de um desejo
definido, com possibilidade claras de atendimento por meio de atos a ser praticados
por autoridades competentes, ou pela sua inércia, eles consideram cada protesto,
uma oportunidade de demonstrar sua intolerância contra um sistema político,
econômico e social contrário ao que ideologicamente acreditam. Travam verdadeiras
guerras contra tudo e todos que consideram seus oponentes.
Muitas vezes aproveitam-se de manifestações pacíficas para infiltrarem-se e
em momento oportuno empregarem a sua tática que consideram adequada ao
momento, que na maioria das vezes traduz em atos violentos. Atuam
conscientemente, com profissionalismo ativista e disciplina tática admirável.
Atualmente, não foi identificado o emprego de armas de fogo, ao menos de
forma coletiva, nessas “novas” manifestações, embora tenha havido a apreensão de
grande quantidade de arma branca, mas parece adequado e cabível a comparação
de características identificadas nesses grupos, bem como estratégias e táticas
empregadas com os conceitos de guerra de quarta geração (fouth generation
warfare – 4GW) e guerra irregular apresentada por Visacro (2019):

Nesse momento, os autores refletiram sobre as prováveis características da


guerra do futuro e delinearam uma “quarta geração”. Com notável lucidez,
fizeram acertadas previsões, dentre as quais se destacam: a perda do
monopólio estatal sobre a guerra; uma mudança de enfoque da vanguarda
do exército inimigo para o interior da própria sociedade oponente, os
elevados custos para o Estado antepor-se a uma ameaça de quarta
geração; o emprego de forças de efetivos bem reduzidos e independentes
(ou células), que atuarão com máximo de iniciativa e liberdade de ação,
com ordens do tipo “missão por finalidade”; essas pequenas forças poderão
contar com um mínimo suporte de retaguarda, incluindo apoio logístico;
mostrar-se-ão capazes de tirar “proveito da abertura proporcionada pela
liberdade”, bem como de empregar “o poder de combate do inimigo contra
ele próprio”, privilegiando a manobra e priorizando os objetivos psicológicos
em detrimento dos objetivos físicos.
[...]
95

Para compreender a guerra irregular há que se partir da premissa de que,


nesse tipo de beligerância, não existem regras. Sem regras, torna-se mais
difícil a tarefa de delinear um conjunto rígido e definido de princípios
teóricos que fundamentem a sua aplicação em circunstâncias muito
diversificadas. Contudo, o vigor da guerra irregular encontra-se justamente
nessa importante característica: a ausência de padrões rígidos que lhe
permite adequar-se e moldar-se a ambientes políticos, sociais e militares
diferentes (VISACRO, 2019, p. 39 e 222).
Reforce-se aqui a ausência de intenção em classificar as pessoas que
compõem esses novos movimentos sociais como inimigos e, muito menos comparar
as interações entre a Polícia Militar e os manifestantes como um ato de guerra. Está
longe disso.
Busca-se, porém, uma compreensão da constituição desses grupos, a causa
dos atos de violência, motivação, técnicas, táticas e procedimentos, como meio para
buscar uma adequação das ações desencadeadas pela Polícia Militar para que a
missão constitucional de preservação da ordem púbica seja cumprida, com o mínimo
de efeitos colaterais possíveis à sociedade.
As novas manifestações, portanto, apresentam características importantes
que em dado momento, por meio da atuação de grupos violentos que empregam a
tática black bloc fazem criar situações complexas e caóticas, caracterizados pela sua
dinamicidade, imprevisibilidade, causa e efeitos muitas vezes desconhecidos. Sua
falta de organização vertical, sistematizada pela inexistência de liderança central,
traduz-se em maior autonomia e proporciona ataques violentos, múltiplos e
simultâneos, desencadeados por células dispersas no espaço geográfico cuja
contenção fica prejudicada.
Embora a polícia apresente uma alta capacidade de resposta no teatro de
operações no momentos iniciais de uma manifestação, ou no local onde se
concentra a grande massa durante o deslocamento, por meio do emprego maciço de
tropas de diferentes especialidades e programas de policiamento, essa força é
praticamente anulada quando a massa se dispersa para a prática de atos violentos.
Essa dificuldade se dá ou porque a tropa empregada, muitas vezes, é
“pesada” e de mobilidade lenta, apresentando dificuldade para acompanhar a
velocidade, agilidade e flexibilidade dos grupos violentos, ou porque a tropa possui
agilidade, velocidade e flexibilidade na atuação, mas são desprovidos de capacidade
combativa para estancar o incidente crítico.
A atuação dos grupos violentos nas manifestações atuais, em proporções
menores e adaptadas ao conceito de segurança pública pode ser caracterizada
96

como conflitos adaptativos complexos, de difícil definição de seus efeitos e


consequências, e, nesse sentido:

A literatura dedicada a técnicas e metodologias de análise enquadrar os


CAC na categoria dos problemas evolutivos não estruturados (wicked
problems) ou problemas de loops estranhos. As conclusões são
absolutamente convergentes em dois pontos: o problema dos conflitos
adaptativos complexos não apresenta solução única, nem progressão linear
- a resposta é sempre estocástica - fazendo com que a qualificação do
problema dependa de como os seus padrões recorrentes são reconhecidos
no contexto em que eles emergem, e das alternativas de resposta que,
concorrentemente, são construídas para possibilitar sua interpretação
(RAZA, 2016, p. 264 - 265).
O motivo que justifica até o momento o estudo dos movimentos e
manifestações do passado, sua organização, constituição, as características
aproveitadas e as novas impregnadas nos movimentos atuais, as técnicas, táticas e
procedimentos empregados pelos ativistas, o cenário político, econômico e social
nos quais estão inseridos, servem especificamente para construir no âmbito da
PMESP uma capacidade para prevenir, neutralizar e enfrentar as causas e efeitos
da quebra da ordem pública, visando a superação das dificuldades antes
enfrentadas.
É um exercício disruptivo que exige capacidade de inovação e adaptação
das estratégias, técnicas, táticas e procedimentos policiais a uma nova realidade,
proporcionando maior autonomia, flexibilidade, mobilidade, velocidade de ação e
poder de combate correspondente à demanda estudada.
O policiamento com motocicletas no Controle de Multidões pode ser a
ferramenta dotada de características e capacidades necessárias para atuar na
preservação da ordem pública nessas circunstâncias, fazendo mitigar as
consequências lesivas à vida, integridade física do policial e do cidadão, bem como
o patrimônio particular e público.
Schwab (2016) expressa de forma muito clara o momento que atual e a
importância dos tomadores de decisão na condução desse processo. Para tanto:

As mudanças são tão profundas que, na perspectiva da história humana,


nunca houve um momento tão potencialmente promissor ou perigoso. A
minha preocupação, no entanto, é que os tomadores de decisão costumam
ser levados pelo pensamento tradicional, linear (e sem ruptura) ou
costumam estar muito absorvidos por preocupações imediatas; e, portanto,
não conseguem pensar de forma estratégica sobre as forças de ruptura e
inovação que moldam nosso futuro (SCHWAB, 2016, p. 12).

2.8 Aspectos jurídicos das manifestações públicas


97

Não é pretensão deste trabalho estudar de forma aprofundada os aspectos


jurídicos que recaem sobre as manifestações públicas ou fundamentar a
aquiescência do Estado frente as manifestações legais ou as ações necessárias
para prevenir e restabelecer a ordem em situações onde ocorra sua quebra, até
mesmo porque os direitos e os deveres dos manifestantes é determinado com certa
clareza na legislação vigente.
No entanto, faz-se necessária uma análise explicativa das normas que
tratam do tema para que seja possível compreender as técnicas, táticas e
procedimentos empregados, atualmente, pela PMESP, e sobre as quais permearão
as propostas dessa dissertação
O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, ao julgar
Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.969-4, requerida pelo Partido dos
Trabalhadores em face do Decreto Distrital 20.098/99 do Distrito federal, que
restringia manifestações públicas na Praça dos Três Poderes, Praça do Buriti e
Esplanada dos Ministérios relatou:

A liberdade de reunião, segundo a tradição, foi contemplada pela primeira


vez no direito positivo pela Declaração de Direitos, de 1776, do recém-
criado Estado da Pensilvânia, que, na esteira do movimento de
independência das treze colônias britânicas da América do Norte,
assegurava ao povo, em seu art. 16, “o direito de reunir-se, de deliberar
para o bem comum, de dar instruções a seus representantes e de solicitar à
legislatura, por meio de mensagens, de petições, ou de representações, a
emenda de erros que considere por ela praticados”.
A incorporação dessa importante liberdade pública ao direito constitucional
deu-se, logo em seguida, na Constituição Francesa de 1791, a qual, em seu
Título 1º, § 2º, consignou que: “ A Constituição garante, como direitos
naturais e civis (...) a liberdade aos cidadãos de se reunirem pacificamente
e sem armas, atendidas as leis de polícia” (BRASIL, 2007)31.
Como é possível detectar, já no documento proveniente da Independência
dos Estados Unidos, apontado na decisão judicial, grande marco da democracia, da
liberdade individual e social, inspirada pelos princípios iluministas, o direito de
reunião e expressão são apresentados como premissa que deveria ser assegurada
ao povo.
A partir dessa revolução, as liberdades e direitos dos homens passaram a
compor todos os importantes documentos que regulam a vida da sociedade
contemporânea, sendo eternizada pela Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão na revolução Francesa.
31
Sem paginação.
98

A liberdade de reunião não fez parte expressamente da Declaração dos


Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789, porém, o documento já apresentava
algumas referências claras sobre liberdade de expressão e manifestação:

[...]
Art. 4º. A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o
próximo. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem
por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da
sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser
determinados pela lei.
[...]
Art. 10º. Ninguém pode ser molestado por suas opiniões, incluindo opiniões
religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública
estabelecida pela lei.
Art. 11º. A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos mais
preciosos direitos do homem. Todo cidadão pode, portanto, falar, escrever,
imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade
nos termos previstos na lei.
Art. 12º. A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma
força pública. Esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para
utilidade particular daqueles a quem é confiada
[...]
Art. 15º. A sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público
pela sua administração (FRANÇA, 1789).
Nesse documento é exposto de modo claro e objetiva o “direito natural” do
cidadão à livre comunicação de ideias e opiniões sobre todas as formas de
expressão, impondo limite ao Estado em coibir essas manifestações, desde que o
exercício dos direitos naturais de determinado cidadão não prejudique o gozo dos
mesmos direitos por outro membro da sociedade.
Note-se, porém, que, embora sejam impostos limites à atuação do Estado
para garantir a liberdade do cidadão, ao mesmo tempo, a Declaração impõe alguns
“limites” ao cidadão que exercita esse direito, qual seja: não prejudicar o gozo do
mesmo direito de liberdade por outro cidadão. E ainda declara a necessidade de
estabelecimento de uma força pública responsável por garantir os direitos do homem
e do cidadão.
Na mesma esteira segue a Declaração Universal dos Direitos Humanos,
adotada e declarada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de
dezembro de 1948:

Artigo 13
1. Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência
dentro das fronteiras de cada Estado.
[...]
Artigo 18
Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e
religião; esse direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a
99

liberdade de manifestar essa religião ou crença pelo ensino, pela prática,


pelo culto em público ou em particular.
Artigo 19
Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse
direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar,
receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e
independentemente de fronteiras.
[...]
Artigo 29
1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e
pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível.
2. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito
apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de
assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de
outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do
bem-estar de uma sociedade democrática.
3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser
exercidos contrariamente aos objetivos e princípios das Nações Unidas
(ONU, 1966).

O Pacto Universal sobre Direitos Civis e Políticos, adotado pela Assembleia


das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1966, cujo texto foi aprovado pelo
Congresso Nacional Brasileiro por meio do Decreto Legislativo n° 226 de 1991
dispõe:

Artigo 19
1. ninguém poderá ser molestado por suas opiniões.
2. Toda pessoa terá direito à liberdade de expressão; esse direito incluirá a
liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer
natureza, independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente
ou por escrito, em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro meio
de sua escolha.
3. O exercício do direito previsto no parágrafo 2 do presente artigo implicará
deveres e responsabilidades especiais. Consequentemente, poderá estar
sujeito a certas restrições, que devem, entretanto, ser expressamente
previstas em lei e que se façam necessárias para:
a) assegurar o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas;
b) proteger a segurança nacional, a ordem, a saúde ou a moral pública.
Artigo 21
O direito de reunião pacífica será reconhecido. O exercício desse direito
estará sujeito apenas às restrições previstas em lei e que se façam
necessárias, em uma sociedade democrática, no interesse da segurança
nacional, da segurança ou da ordem pública, ou para proteger a saúde ou a
moral pública ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. (ONU,
1948)
E o Pacto de San José da Costa Rica, adotada em 22 de novembro de 1969
e ratificada pelo Brasil em 25 de setembro de 1992, assegura:

Artigo 13 - Liberdade de pensamento e de expressão


1. Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão.
Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e
ideias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente
ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de
sua escolha.
2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito
à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser
100

expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para


assegurar:
a) o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas;
b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da
moral públicas.
3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias e meios indiretos,
tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de
imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos
usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios
destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.
[...]
Artigo 15 - Direito de reunião
É reconhecido o direito de reunião pacífica e sem armas. O exercício desse
direito só pode estar sujeito às restrições previstas em lei e que se façam
necessárias, em uma sociedade democrática, ao interesse da segurança
nacional, da segurança ou ordem públicas, ou para proteger a saúde ou a
moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas.
[...]
Artigo 22 - Direito de circulação e de residência
1. Toda pessoa que se encontre legalmente no território de um Estado tem
o direito de nele livremente circular e de nele residir, em conformidade com
as disposições legais.
Em síntese, pode-se dizer que todos esses instrumentos internacionais
foram adotados e declarados com um claro objetivo de reafirmar a liberdade de
expressão, opinião e reunião pacífica e sem armas, porém, em nenhuma ocasião, a
questão foi tratada como direito absoluto. Ao contrário, são reconhecidos os direitos,
os quais são apontados como naturais, fundamentais, no entanto, condicionados a
limites estabelecidos por lei e respeito a direitos e liberdades de outros,
circunstâncias essas que devem ser garantidas pelo próprio Estado.
Todas essas liberdades e restrições também foram tratadas pela
Constituição Federal do Brasil de 1988 como direitos fundamentais, reforçando suas
importâncias:

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
[...]
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
[...]
XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo
qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair
com seus bens;
XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos
ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem
outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas
exigido prévio aviso à autoridade competente;
[...] (BRASIL, 1988).
Assim, cabe ao Estado brasileiro garantir o direito de manifestação do
pensamento das pessoas, desde que esta não use de anonimato para se expressar
101

e o direito de reunião deve respeitar alguns requisitos determinados pela própria


Constituição, quais sejam:
a) reunir-se de forma pacífica;
b) sem armas;
c) em locais abertos ao público;
d) não frustre outra reunião anteriormente convocada no mesmo local; e
e) prévio aviso à autoridade competente.
Reforce-se, que nem mesmo os direitos fundamentais são absolutos,
conforme explica Moraes (2008, p. 33) no sentido de que “Os direitos e garantias
fundamentais consagrados pela Constituição Federal, portanto, não são ilimitados,
uma vez que encontram seus limites nos demais direitos igualmente consagrados
pela Carta Magna (Princípio da relatividade ou convivência das liberdades
públicas).”
Pode-se entender, desta forma, que as reuniões (manifestações públicas)
devem ocorrer dentro dos requisitos ditados pela própria Carta Magna e respeitando
os direitos e liberdades daqueles que não desejam fazer parte do ato, ocasião em
que esses devem ver garantidos os seus direitos de locomoção, bem como de
segurança protegidos pelo mesmo rol de direitos fundamentais estabelecidos pelo
artigo 5º.
O jurista Luís Flávio Gomes deixa bem clara essa relação entre direitos e
deveres e necessidade de respeitar os direitos de terceiros ao afirmar que:

Nossa Constituição garante o direito de expressar o pensamento assim


como o direito de reunião, inclusive em vias públicas. Por sua vez, ao
Estado compete garantir a ordem pública, fazendo com que as pessoas não
participantes das manifestações tenham o menor transtorno possível. Trata-
se de um direito fundamental e de um dever, ambos conciliáveis. Enquanto
as manifestações são pacíficas, não se exige uma intervenção mais efetiva
do Estado. O problema reside quando há violência (pessoal ou danos
materiais, a bens públicos ou privados). Neste momento não há como
impedir o Estado e seus agentes de restabelecer a ordem pública,
impedindo atos de vandalismo ou de violência pessoal. Para a própria
segurança dos que manifestam pacificamente, é fundamental que o Estado
intervenha, fazendo uso inclusive da força, porém, dentro do direito (o uso
da força não significa uma carta em branco que poderia ser utilizada pelo
agente público indiscriminadamente). A força não é incompatível com o
direito, quando utilizada de forma moderada e de acordo com o estritamente
necessário. O que passa da necessidade é tirania (Montesquieu). O que
está dentro da necessidade é força legítima. O desafio que se coloca ao
agente público é este: agir dentro da legalidade. Pois, do contrário, perde
legitimidade, dando ensejo a críticas (assim como à suspeita de que está
atando contra o direito constitucional de reunião e de manifestação)
(GOMES, 2014).
102

Dentro desse cenário de direitos e deveres, bem como necessidade de se


garantir uma convivência harmônica das pessoas, o Estado, por meio da Polícia
Militar, se vê compelido pelo poder-dever de agir, a implementar ações para
preservar a ordem pública, seja por meio de ações preventivas ou de repressão
imediata.
Dessa forma, a atribuição da Polícia Militar para atuar na Gestão de
Multidões, está prevista no §5º, do artigo 144, da Constituição Federal:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade


de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.
VI - polícias penais federal, estaduais e distrital.
[...]
§ 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da
ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições
definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil;
[...] (BRASIL, 1988, grifo nosso) 32.
A Constituição do Estado de São Paulo, basicamente, repete os mesmos
termos utilizado pela Carta Magna para determinar as competências da Polícia
Militar do Estado de São Paulo em seu artigo 141: “À Polícia Militar, órgão
permanente, incumbe, além das atribuições definidas em lei, a polícia ostensiva e a
preservação da ordem pública.”33 (SÃO PAULO, 1989)
Dentro desse mister, importante se faz entender o conceito de ordem
pública, uma vez que significa identificar o objetivo perseguido pela PMESP no
desenvolvimento de suas ações. Para isso Lazzarini expõe que:

Em suma, a ordem pública é uma situação de fato oposta à desordem,


sendo, portanto, essencialmente de natureza material e exterior.
[...]
A ordem pública, portanto, é efeito de causa de segurança pública, como
também, acrescentamos, é efeito de causa de tranquilidade pública ou,
ainda, efeito de causa de salubridade pública. (LAZZARINI, 1996, p. 53)
Ora, se ordem pública está relacionada à ausência de desordem e
prevalência da segurança pública, tranquilidade pública e paz pública, e a
Constituição determina à Polícia Militar que se faça a preservação dessa ordem, fica
explícito que a PMESP não só tem competência para atuar na gestão de multidões
como tem o poder-dever de agir, e mais, agir com eficiência.

32
Sem paginação.
33
Idem.
103

Lazzarini (1996) vai além, e defende uma competência ampla da PMESP,


quando o assunto é ordem pública ao expor que:
No tocante à preservação da ordem pública, com efeito, às Polícias Militares
não só cabe o exercício de Polícia Ostensiva, cabendo-lhe também a
competência residual de exercício de toda atividade policial de segurança
pública não atribuídas aos demais órgãos.
A competência ampla da Polícia Militar na preservação da ordem pública,
engloba inclusive a competência específica dos demais órgãos policiais, no
caso de falência operacional deles [...] pois, a Polícia Militar é a verdadeira
força pública da sociedade. Bem por isso s Polícias Militares constituem os
órgãos de preservação da ordem pública para todo o universo da atividade
policial em tema de ordem pública e, especialmente, da segurança pública
(LAZZARINI, 1996, p. 61).

O Decreto Federal nº 88.777 de 1983, em seu artigo 2º, apresenta o


conceito de ordem pública, manutenção da ordem pública e perturbação da ordem
pública:

21) Ordem Pública - Conjunto de regras formais, que emanam do


ordenamento jurídico da Nação, tendo por escopo regular as relações
sociais de todos os níveis, do interesse público, estabelecendo um clima de
convivência harmoniosa e pacífica, fiscalizado pelo poder de polícia, e
constituindo uma situação ou condição que conduza ao bem comum.
[...]
19) Manutenção da Ordem Pública - É o exercício dinâmico do poder de
polícia, no campo da segurança pública, manifestado por atuações
predominantemente ostensivas, visando a prevenir, dissuadir, coibir ou
reprimir eventos que violem a ordem pública.
[...]
25) Perturbação da Ordem - Abrange todos os tipos de ação, inclusive as
decorrentes de calamidade pública que, por sua natureza, origem,
amplitude e potencial possam vir a comprometer, na esfera estadual, o
exercício dos poderes constituídos, o cumprimento das leis e a manutenção
da ordem pública, ameaçando a população e propriedades públicas e
privadas.
As medidas preventivas e repressivas neste caso, estão incluídas nas
medidas de Defesa Interna e são conduzidas pelos Governos Estaduais,
contando ou não com o apoio do Governo Federal.
[...] (BRASIL, 1983)34.
Além das normas anteriormente expostas, no ordenamento jurídico brasileiro
há outras que ratificam o pensamento, tais como:
a) Decreto-Lei Federal nº 667 de 1969:
Art. 3º - Instituídas para a manutenção da ordem pública e segurança
interna nos Estados, nos Territórios e no Distrito Federal, compete às
Polícias Militares, no âmbito de suas respectivas jurisdições:
a) executar com exclusividade, ressalvas as missões peculiares das Forças
Armadas, o policiamento ostensivo, fardado, planejado pela autoridade
competente, a fim de assegurar o cumprimento da lei, a manutenção da
ordem pública e o exercício dos poderes constituídos
b) atuar de maneira preventiva, como força de dissuasão, em locais ou
áreas específicas, onde se presuma ser possível a perturbação da ordem;
[...] (BRASIL, 1969)35.

34
Sem paginação.
104

b) Decreto Lei Estadual nº 217/1970:


Artigo 9° - Compete à Polícia Militar do Estado
I - executar o policiamento ostensivo fardado, planejado pelas autoridades
policiais competentes, a fim de assegurar o cumprimento da lei, a
manutenção da ordem pública e o exercício dos poderes constituídos;
II - atuar de maneira preventiva como força de dissuasão em locais ou áreas
específicas onde se presuma ser possível a perturbação da ordem;
[...] (SÃO PAULO, 1970)36.
c) Lei Estadual nº 616 de 1974:
Artigo 2º - Compete à Polícia Militar:
I - executar com exclusividade, ressalvadas as missões peculiares das
Forças Armadas, o policiamento ostensivo fardado, planejado pelas
autoridades policiais competentes, conceituadas na legislação federal
pertinente, a fim de assegurar o cumprimento da lei, a manutenção da
ordem pública e o exercício dos poderes constituídos;
II - atuar de maneira preventiva, como força de dissuasão, em locais
específicos, onde se presuma ser possível a perturbação da ordem;
[...] (SÃO PAULO, 1974)37.

A determinação à Polícia Militar devidamente expressa no Decreto-Lei


Federal nº 667 de 1969, para “atuar de maneira preventiva, como força de
dissuasão, em locais ou áreas específicas, onde se presuma ser possível a
perturbação da ordem” é ecoada nos demais diplomas legais mencionados. Como já
visto, segundo Lazzarini (1996) a ordem pública engloba três aspectos: a segurança
pública, a salubridade pública e a paz pública.
Na medida em que se consideram as manifestações públicas como
incidentes, reconhece-se a possibilidade de certo abalo à tranquilidade pública
(mesmo que mínimo em algumas circunstancias) e, na medida que o incidente
evolui para pré-crise e depois incidente crítico, é alcançada a quebra total da ordem,
também nos demais aspectos de salubridade e segurança pública, não restando
dúvidas do dever de atuação da Polícia Militar.
No Estado de São Paulo, em 29 de agosto de 2014, foi publicada a Lei
Estadual n 15.556 que restringe o uso de máscaras ou qualquer paramento que
oculte o rosto da pessoa em manifestações e reuniões. Dentre os pontos
importantes da lei, destaca-se:

Artigo 2º - Na manifestação e reunião a que se refere o artigo 1º, com o


objetivo de assegurar que ninguém a faça no anonimato, fica proibido o uso
de máscara ou qualquer outro paramento que possa ocultar o rosto da
pessoa, ou que dificulte ou impeça a sua identificação.
[...]

35
Idem.
36
Ibidem.
37
Ibidem.
105

Artigo 5º - Para a preservação da ordem pública e social, da integridade


física e moral do cidadão, do patrimônio público e particular, bem como para
a fiel observância do cumprimento desta lei, as Polícias Civil e Militar
efetuarão as devidas intervenções legais (SÃO PAULO, 2014) 38.

A Lei Estadual n 15.556, de 2014, foi regulamentada pelo Decreto n


64.074, de 18 de janeiro de 2019 que regulamentou a proibição do uso de máscaras
e estabeleceu inúmeras medidas na tentativa de organizar a ocupação do espaço
físico pelas manifestações.
Por fim, resta dizer que também nessa questão, a Polícia Militar é a grande
guardiã da Democracia e do Estado de Direito, na medida que garante o direito de
reunião e expressão dos cidadãos para reivindicarem suas demandas, ao mesmo
tempo que implementa ações para que o gozo dessa liberdade ocorra dentro das
normas legais, respeitando o direito e liberdade de terceiros, a fim de que seja
garantida uma convivência social harmônica e a ordem pública seja preservada.

38
Idem.
106

3 A GESTÃO DE MULTIDÕES NA PMESP

Embora há muitos anos labutando na atividade de Controle de Multidões, foi


em 2018 que a PMESP iniciou uma importante evolução em termos de doutrina,
instrução e atuação, pois entrou em vigor a 5ª edição do Manual de Controle de
Multidões (M-8-PM), até então denominado Manual de Controle de Distúrbios Civis.
O novo Manual foi elaborado por um grupo de trabalho multidisciplinar e
trouxe importante influência das Forças Especiais, dos Carabineros de Chile39, tropa
altamente especializada e respeitada mundialmente por sua capacidade técnica e
organização em ações policiais voltadas ao controle de multidões. Ressalta-se aqui
que grandes manifestações públicas, pacíficas e violentas fazem parte da rotina
diária enfrentada pelos Carabineros, sobretudo na Capital Santiago40.
Dessa forma, o M-8-PM sedimentou o conceito de Gestão de Multidões na
PMESP, padronizando de forma mais ampla a ação policial-militar dentro da missão
de preservação e manutenção da ordem pública, envolvendo não apenas ações de
restauração da ordem, mas também aquelas de caráter preventivo.
Conforme já explanado, as manifestações públicas, só pela sua composição
e expressão nas ruas, podem ser consideradas como incidentes de interesse de
segurança pública – “incidente policial41” com grande potencial para atingirem o
estado de pré-crise e transformarem-se em incidente crítico rapidamente, exigindo
da PMESP a utilização de metodologia adequada de gestão de incidentes.
Embora a Polícia Militar do Estado de São Paulo não possua, ou não aplique
formalmente uma metodologia específica para a gestão de incidentes policiais,
utilizando como principais parâmetros de atuação, nessas ocasiões, a Resolução
SSP/SP nº 13, de 09 de fevereiro de 2010 (SSP/SP, 2010) e Diretriz PM3-001/02/13,
de 15 de março de 2013 (PMESP, 2013), academicamente, muitos autores42
sugerem o emprego de diversas estruturas e processos do NIMS (inclusive com foco

39
Em 2014, um grupo de Oficiais da PMESP, composto pelo então Cap PM Razuk, Cap PM Arcanjo,
Cap PM Galhardo e 1 Ten PM Casabona, viajou até Santiago do Chile, onde passaram dias na 27ª
Comissária das Forças Especiais dos Carabineros, recebendo informações sobre a doutrina,
técnicas, táticas e procedimentos de atuação em ações de controle multidões, acompanhando,
inclusive ações reais.
40
Realidade acompanhada de perto pelo autor, enquanto frequentou Curso de Operador de Canhão
d’água nas Forças Especiais dos Carabineros do Chile, ocasião em que acompanhou a rotina da
tropa responsável pelo controle de multidões na capital Santiago, durante 15 dias do ano de 2015.
41
Expressão encontrada na tese de Racorti (2019).
42
Tais como o Aguilar et al (2017), Silva (2019) e Racorti (2019).
107

no ICS), bem como o SICOE, já sedimentado no Corpo de Bombeiros da PMESP,


buscando adaptações às realidades sob análise.
Na prática, muitos conceitos dos sistemas de gestão de incidentes acima
apresentados, são empregados pela PMESP nas inúmeras manifestações públicas,
sobretudo na capital, onde o Coordenador Operacional PM instala uma Sala de
Crises no Centro de Operações Policiais Militares (COPOM) com a participação de
representantes de diversos órgãos e OPM43. Dentro do escopo está o
estabelecimento de uma comunicação integrada entre as diversas agências e
Comandos, como o Comandante do Incidente que está no teatro de Operações, a
instalação estrutura de Comunicação Social e atendimento da imprensa, bem como
estrutura do Centro de Inteligência da Polícia Militar para acompanhamento do
evento.

Figura 16 Sala de crises instalada durante manifestação pública na capital

Fonte: Coordenadoria Operacional da PMESP, 2019.

Além disso, a sala de crises é provida de imagens fornecidas em tempo real


por diversos sistemas de câmeras compartilhados em grandes monitores, inclusive
fornecidos por “drones” e equipamentos de capitação de imagens acoplados nas
aeronaves do Centro de Aviação da PMESP, auxiliando os Comandantes na tomada
de decisão on time.
Importante se notar que existem boas práticas nesse sentido, no entanto,
entende-se que ainda há uma carência de sedimentar e sistematizar os conceitos de

43
Tais como: Poder Judiciário, Ministério Público, Secretarias de Governo, Ouvidoria, Companhia de
Engenharia de Tráfego, Metrô, Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, São Paulo Transportes
S/A, Guarda Civil Metropolitana, Polícia Civil, Comando de Policiamento de Área e comandos de
policiamentos especializados (Comando de Policiamento de Choque, Comando de Policiamento de
Trânsito, Comando de Aviação) e Corpo de Bombeiros.
108

gestão de incidentes policiais, estratégias, técnicas, táticas e procedimentos


relacionados a gestão de multidões na PMESP.
O Comando de Policiamento Metropolitano 1 (CPA/M-1), responsável por
implementar ações de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública na área
central da capital paulista, palco das mais numerosas e complexas manifestações
públicas e movimentos sociais da história de São Paulo, adquiriu, com o passar do
tempo, grande experiência na gestão de incidentes dessa natureza e já implementa,
conforme asseverado por Malagutti (2020), uma estrutura de controle de incidentes
no local da operação, similar à indicada pelo NIMS (ICS) e SICOE, conforme figura a
seguir.
Figura 17 Organograma da cadeia de comando em manifestações no CPA/M-1

Fonte: Malagutti, 2020.

Utilizando toda essa experiência, CPA/M-1 passou a acrescentar


importantes procedimentos nas ações destinadas à gestão de multidões que
apresentaram resultados positivos, permitindo que alguns procedimentos e técnicas
fossem sedimentados na doutrina Policial Militar que trata do assunto.
Podem ser citadas a mediação em manifestações públicas e a técnica de
envelopamento, sendo que, com relação à primeira, segundo Malagutti (2020):
[...] em 18 de janeiro de 2019, através da NOTA DE INTRUÇÃO Nº CPAM1-
001/31/19, foi inaugurada a mediação de manifestações públicas com a
seguinte finalidade:
Regular a atuação de Mediação em Manifestações Públicas no âmbito do
CPA/M-1 como um instrumento efetivo de pacificação social, solução e
prevenção de litígios, consistindo em um método consensual de solução de
109

conflitos, evitando a desordem pública, por meio do diálogo, garantindo,


desta maneira, a promoção e exercício da cidadania/democracia facilitando,
por conseguinte, a realização das manifestações de forma pacífica
(MALAGUTTI, 2020, p. 61).
A técnica do envelopamento (figura 16), utilizada em situações de quebra
parcial do controle ou iminência da quebra da ordem (pré-crise), também foi
desenvolvida na tentativa de mitigar a ocorrência de ações violentas e está descrita
no procedimento operacional padrão de “Atuação em manifestações públicas” - POP
de Processo N 4.06.00, onde também estão previstos outras táticas que envolvem
ações conjugadas, sobretudo, para contenção e acompanhamento das
manifestações com o emprego de diferentes programas de policiamento e Unidades
especializadas. (PMESP, 2019)
Figura 18 Ilustração da técnica do envelopamento

Fonte: PMESP, 2019.

Ao se tratar, efetivamente, do controle de multidões no teatro de operações


por meio do emprego de técnicas, táticas e procedimentos destinados à preservação
da ordem pública, dois manuais policiais militares estabelecem o norte a ser
seguido: Manual de Controle de Multidões (M-8-PM) – já apresentado neste trabalho
– e Manual de Policiamento em Eventos (M-10-PM).
Segundo o M-8-PM, a gestão de multidões consiste no “conjunto de
processos destinados à administração e controle de multidões.” (PMESP, 2018, p.
17)
Nesse contexto, a administração de multidões refere-se às medidas de
recebimento e análise das informações, bem como ações preventivas voltadas para
atuação em multidões, subdividindo-se em planejamento e execução dessas
medidas preventivas; já o controle de multidões “é o conjunto de procedimentos
110

destinados à restauração da ordem pública, quebrada pela ação da turba”, dividido


em intervenção indireta, (“realizada através da ação de presença, contenção,
acompanhamento ou negociação”), e intervenção direta realizada por meio das
táticas de repelir e dispersar. (PMESP, 2018, p. 18)
Essa forma didática de organizar os processos que compõem a gestão de
multidões permite aos Comandantes e todo efetivo, a padronização e adequação
das ações policiais por meio da compreensão do momento em que a manifestação
pública se encontra (planejamento, composição nas ruas em situação de
normalidade – incidente, incidente pré-crítico e incidente crítico).
Demonstra também, e, principalmente, uma clara preocupação da PMESP
em adequar as ações institucionais e dos Policiais Militares às circunstâncias de
cada momento das manifestações públicas, de forma a garantir o alcance do seus
objetivos operacionais ao mesmo tempo em que visa a preservação dos direitos
humanos, empregando a força de maneira adequada e proporcional, valendo-se de
critérios de graduação de intervenção para o controle de multidões, conforme
esquema a seguir:

Figura 19 Descrição da Graduação de Intervenção para o Controle de Multidões

Fonte: PMESP, 2018.

Consoante previsto na definição de Controle de Multidão, tem-se que esse


processo é dividido em intervenção indireta e intervenção direta, a qual está
representada na figura 20:
111

Figura 20 Quadro demonstrativo das ações de Controle de Multidão

Fonte: PMESP, 2018.

Segundo o M-8-PM:

3.1. Intervenção Indireta: realizada através da ação de presença,


contenção, acompanhamento ou negociação;
3.1.1. ação de presença: é o ato de dispor efetivo policial-militar no local da
operação, com intuito de, por meio da sua presença, transmitir sensação de
segurança, colher informações do que está ocorrendo, repassar orientações
por parte da Polícia Militar aos envolvidos, tentar identificar possíveis
interlocutores em meio aos frequentadores, além de dissuadir
comportamentos e atitudes inadequados.
3.1.2. conter: é o ato de manter a multidão em uma área delimitada, por
vezes já pré estabelecida ou determinada em reunião anterior ao evento,
por meio do efetivo policial ou de estruturas físicas (grades, viaturas etc.);
3.1.3. acompanhar: é a ação policial-militar que consiste em seguir uma
passeata, visando minimizar os efeitos da quebra da ordem;
3.1.4. negociar: é o ato de estabelecer vínculo de mediação com os
manifestantes ou com a liderança, na tentativa de convencer, influenciar
para que deixem de tomar alguma atitude que prejudique a ordem pública
ou que desrespeite uma determinação legal.
3.2. Intervenção Direta: realizada por meio das táticas de repelir ou de
dispersar;
3.2.1. repelir: é a ação utilizada para recuar a massa para uma direção
determinada até um limite pré-definido; Não tem o objetivo de retirar a
massa do local, de forma definitiva, mas de afastá-la temporariamente para
restabelecer a ordem pública; trata-se de um tipo de ação pontual, cirúrgica,
em que pode ser possível, também, dentro da necessidade e viabilidade,
realizar a detenção de pessoa ou pequeno grupo que esteja prestes a
cometer algum ilícito ou que já esteja ocorrendo;
3.2.2. dispersar: é a ação utilizada para deslocar uma massa, dividindo-a,
desagregando-a, enfraquecendo-a e, com isso, impedindo-a de se
reagrupar, dissolvendo-a; o objetivo é a retirada da massa, de forma
definitiva, do local. (PMESP, 2018, p. 18)
O momento de dissuasão está relacionado ao à transição entre a prevenção
indireta e direta. Utilizando a linguagem do NIMS, seria o momento de transição
entre o incidente pré-crise e incidente crítico, pois já é possível identificar a pré-
112

disposição de um grupo da multidão em praticar atos criminosos e contrários à


ordem.
Outra questão importante que surgiu, de forma mais clara a partir de junho
de 2013, é sobre qual seria o espaço físico ocupado pelas manifestações públicas?
Em qual teatro de operações a Polícia Militar enfrentará seu desafio de preservar a
ordem pública nessas circunstâncias?
Talvez essa seja uma das grandes variáveis que influenciou e está
influenciando a necessidade de inovações no que tange a estratégias, técnicas,
táticas e procedimentos a serem implementados pela PMESP.
As manifestações públicas e seus efeitos quebraram as limitações espaciais
que antes (manifestações tradicionais), mesmo que em deslocamentos, existiam.
Tradicionalmente, o incidente circulava em torno de um eixo definido (liderança) que
conduzia a multidão estaticamente, ou por meio de passeatas a locais determinados
e até certo ponto definidos. Os pontos de ocorrência da quebra da ordem pública
eram, em tese, previsíveis, pois se presumia uma sequência lógica das ações e
reações. Os incidentes ocorridos fora do epicentro da reunião ou da marcha eram
exceções tratadas de forma particular e específica. Assim, o maior esforço da Polícia
Militar (para não se dizer quase que a totalidade) estava concentrado na área
imediata do incidente, restando para a áreas mediatas a intensificação do
policiamento, sem que houvesse uma estratégia específica de atuação.
Foi necessário um certo tempo para que a Instituição compreendesse as
novas características das “manifestações”, sobretudo sua heterogeneidade,
dinamicidade e volatilidade, que extinguiu a limitação geográfica de atuação dos
ativistas (sobretudo os violentos), ou, ao menos, estendeu significativamente o
alcance das suas ações, colocando as áreas mediatas do local de reunião inicial da
multidão no mesmo patamar de importância do epicentro das manifestações (área
imediata), provocando a necessidade de estabelecimento de rotinas de análise de
riscos, definição de estratégias e emprego racional dos ativos operacionais de forma
mais ampla, abrangente e sistêmica.
Nesse cenário de inovação frente às novas circunstâncias será apresentado
o policiamento com motocicletas como eficiente ferramenta de acompanhamento,
contenção e resolução de incidentes críticos relacionados às manifestações públicas
e controle de multidões.
113

4 O EMPREGO DO POLICIAMENTO COM MOTOCICLETAS NO CONTROLE DE


MULTIDÕES

“Chegando na frente para garantir a segurança dos demais”.

Figura 21 Pintura na parede do alojamento dos


Cabos e Soldados de ROCAM

Fonte: O autor, 2021.

Esse é a frase que está estampado na entrada do alojamento dos Policias


Militares pertencente à 3ª e 4ª Companhia de ROCAM, do 2 BPChq e representa
bem a consciência dos militares que fazem parte dessa respeitada tropa
especializada, quanto a sua capacidade em utilizar as vantagens concedidas pelo
uso de motocicletas no policiamento para serem a “ponta da lança” em ocorrências
policiais, ao mesmo tempo em que possuem a responsabilidade de atuar com
capacidade combativa para a resolução do problema ou criar condições para que o
apoio necessário possa chegar até o local do incidente crítico.
Apoiado na ostensividade, mobilidade, flexibilidade e capasidade
responsividade, o policiamento com motocicletas demonstrou ao longo dos anos
eficiência e capacidade para contribuir de forma decisiva no processo de
preservação da ordem pública desenvolvido pela Polícia Militar, desde que
respeitadas suas limitações, dentre elas, as relacionadas à segurança do policial
motociclistas.
114

Na operações de gestão de multidões desencadeados pela Polícia Militar, o


policiamento com motocicletas também demonstrou sua grande capacidade de
contribuir para a preservação da ordem pública, principalmente quando há a
necessidade de se compor no teatro de operações uma estratégia que envolva o
emprego tático de tropas, com especialidades diferentes.
Embora o emprego de motocicletas no policiamento ostensivo já se encontre
em avançada fase de amadurecimento doutrinário, técnico e tático na doutrina
Policial-Militar, existe grande carência quanto a estudos que explorem o potencial
desta atividade operacional em ações diferentes do policiamento ostensivo
preventivo. É o caso do emprego do policiamento com motocicletas no Controle de
Multidões, sobretudo diante das circustâncias geradas pelas “manifestações
contemporâneas”.
Assim, atualmente, não está bem definido na PMESP os fatores favoráveis
ao emprego dessa forma de policiamento nas circunstâncias mencionada e, muitas
vezes, não são consideradas suas limitações por aqueles responsáveis pelo
planejamento da operação. Não há uma padronização de técnicas, táticas e
procedimentos que permitam aos que detêm o poder decisório de incluírem essa
importante ferramenta, de forma sistemática e tecnicamente consciente, dentro do
processo de gestão do incidente (neste caso, o controle de multidões). Dessa forma,
ainda é preciso criar condições para que todo seu potencial seja aproveitado ou, ao
menos, estabelecer medidas para que o policial motociclista não fique exposto a
graves risco à sua vida e integridade física.
O policiamento com motocicletas apresenta-se como uma ferramenta capaz
de acompanhar a grande velocidade e volatilidade das novas manifestações,
enquanto incidentes dinâmicos, responder rapidamente e com grande amplitude aos
múltiplo ataques coordenados de grupos ativistas violentos que aproveitam da sua
estrutura horizontal, adequar-se à mudanças repentinas de cenários e comparecer a
locais de difícil acesso, geralmente caracterizados pelo tráfego intenso de veículos
das grandes metrópole ou colocação de obstáculos físicos por manifestantes (fogo,
barricada de pneus, veículos etc.).
O emprego de policiamento com motocicletas no Controle de Multidões,
como proposto nesse trabalho, pode ser entendido como como uma importante
inovação na doutrina Policial-Militar, essencial para que a Instituição acompanhe a
evolução e demandas da sociedade que se renovam diariamente.
115

Nesse sentido, tem-se previsto nas Normas para o Sistema Operacional de


Policiamento PM – NORSOP que:

3.1. a concepção moderna de polícia apresenta desafios complexos diante


dos cenários relacionados à ordem pública, especialmente em razão da
constante necessidade de modernização com o propósito de atender aos
anseios da sociedade, desde o atendimento pessoal até aqueles totalmente
estruturados em plataformas tecnológicas;
3.2. a Polícia Militar precisa estar pronta para adaptar o seu portfólio de
serviços às demandas de segurança pública, buscando atendimentos cada
vez mais personalizados, bem como a integração com membros da
comunidade, instituições públicas e privadas, tratando todos com igualdade
de propósitos no que se refere à realização de parcerias e/ou ações
conjuntas que visem à preservação da ordem pública. (PMESP, 2020)

4.1 Breve histórico do policiamento com motocicletas na PMESP

Segundo Dante (1998, apud MERLO, 2000, p. 46):

“[...] foi nos idos de 1985 que dois alemães, Nikolaus August Otto e Gottlieb
Daimler, inventaram o motor de combustão interna. Esse motor, de dois
tempos, foi adaptado em uma bicicleta tendo surgido, então, a primeira
motocicleta do mundo. Note-se que tal fato ocorreu antes da criação do
automóvel.”
No meio militar, Silva (2017, p. 24) aponta que as motocicletas foram muito
utilizadas nas duas grandes guerras mundiais para o desenvolvimento de diversos
serviços, quais sejam, atividades de reconhecimento, controle de trânsito,
fiscalização em geral (inclusive de polícia) ou, ainda, como fogo de apoio, com uma
metralhadora instalada em um sidecar (carro lateral).
Ainda segundo Silva, o emprego de motocicletas nas atividades policiais é
herança, principalmente, da Primeira Guerra, ocasião em que essas máquinas
substituíram os cavalos como meio de transporte. (SILVA, 2017, p.24)
Na PMESP, as motocicletas surgiram na década de 30, quando o Corpo de
Bombeiros realizou aquisição com o objetivo de realizar escoltas dos seus
caminhões e apresentações.
Na década seguinte, mais especificamente em 30 de outubro de 1947, foi
criado o Pelotão de Escolta de Motociclistas (P.E.M.) ao qual foi atribuída,
primordialmente, a missão de realizar a escolta e segurança do Governador do
Estado de São Paulo, sendo, posteriormente tal atividade estendida a outras
autoridades nacionais e estrangeiras que visitavam o estado. Entre inúmeras
autoridades de destaque mundial escoltadas pelo Pelotão de escolta é possível
mencionar Papa João Paulo II, Rainha Elizabeth, Príncipe Charles e Princesa
116

Dianna e presidentes como George Bush, entre outros. Em 1999, por meio do
Boletim Geral PM 061 de 31 de março do mesmo ano Pelotão foi transferido ao 2
BPChq, compondo a 3ª Companhia – ROCAM, passando a realizar além das
atividades de escolta, o policiamento tático com motocicletas. (SILVA, 2017, p.26)
O emprego de motocicletas na atividade de policiamento surgiu na PMESP
no ano de 1982, ocasião em que o então Comandante Geral da Instituição, General
de Brigada Arnaldo Bastos de Carvalho Braga, por meio da Nota de Instrução n
3EMPM-005/32/82 criou as Rondas Ostensivas com o Apoio de Motocicletas,
conhecidas pela sigla ROCAM, que passou a compor a 4ª Companhia do 1º BPChq
– Batalhão Tobias de Aguiar, sob comando do, então, Cap PM Renato Cesar Melo a
quem coube a missão de recrutar policiais motociclistas de diferentes unidades da
Instituição para compor seu efetivo. (MONTINI JÚNIOR, 87, p. 7)
Após o período de seleção, os Policiais classificados permaneceram adidos
ao CSM/MB, sob comando do então 1º Ten PM Pedro Rezende de Oliveira Melo, do
pelotão de escolta, que ficou responsável pelas instruções de pilotagem, legislação,
primeiros socorros e técnicas policiais. Muitos policiais que iniciaram o curso não
conseguiram terminá-lo, sendo devolvidos às unidades de origem. (MONTINI
JÚNIOR, 87, p. 8)
O efetivo inicial da Companhia de ROCAM era de 134 (cento e trinta e
quatro) Policiais Militares, 100 (cem) viaturas tipo motocicleta marca Yamaha modelo
RX-180 e 12 (doze) viaturas marca VW/Gol, sendo a entrega das viaturas realizadas
pessoalmente pelo então Governador do Estado de São Paulo José Maria Marim.
(MONTINI JÚNIOR, 87, p. 8)
Criada com finalidade principal de atuar nos centros comerciais e bancários
visando apoiar os batalhões territoriais, o policiamento com motocicletas
rapidamente ganhou notoriedade pela sua agilidade, versatilidade e mobilidade no
desempenho de atividades de combate à criminalidade. (SILVA, 2017, p.27)
Montini Junior (1987, p. 13) já naquele ano escreveu que:
Pela sua versatilidade e fácil mobilidade no trânsito, em regiões sujeitas a
congestionamentos, calçadões e vias sem pavimentação, as patrulhas
conseguem multiplicar a ostensividade do policiamento, inibindo a ação de
vilões e consequentemente reduzindo o índice de criminalidade.
Complementa Merlo que a ROCAM foi:

Criada com o objetivo de ampliar o alcance do policial militar nos locais de


patrulhamento que, pela extensão, não possibilitavam o emprego do homem
117

a pé, ou, pelas características do terreno, impossibilitassem o acesso de


viaturas de quatro rodas, seu sucesso foi imediato. (MERLO, 2000, p. 49)
Em 06 de fevereiro de 1986, por questões administrativas e estruturais, por
meio do Boletim Geral N 026 daquele ano a ROCAM foi transferida ao 2 BPChq,
passando a integrar a 3ª Companhia de Polícia de Choque – ROCAM, realizando,
atualmente, o patrulhamento tático com motocicletas, escoltas especiais
(autoridades), escolta de valores, armas etc., policiamento externo de eventos
artísticos, culturais e esportivos, e o Controle de Multidões.
Em 2014, em razão da grande demanda por essa modalidade de
policiamento, foi criada a 4ª Companhia – ROCAM do 2 BPChq.
Em 25 de outubro de 2005 foi publicada a Diretriz PM3-005/02/05, de 2005,
que estabeleceu o Programa ROCAM (Policiamento com Motocicletas no Estado de
São Paulo), norma esta que contribuiu para a expansão e padronização do
policiamento com motocicletas em todas as Unidades Policial-Militares, definindo
critérios objetivos e, ao mesmo tempo, restritivos para o seu emprego,
estabelecendo três formas de atuação: dedicados à via, Área de Interesse de
Segurança Pública (AISP) e patrulhamento integrado. Dentro desse formato, as
patrulhas de policiamento com motocicletas eram formadas por dois policiais que
atuavam no status “operações”, ou seja, prioritariamente não era dedicada ao
atendimento de ocorrências encaminhadas pelo Centro de Operações da Polícia
Militar (COPOM), permanecendo, num primeiro momento, no policiamento em áreas
determinadas. (PMESP, 2005)
Já no ano de 2012, foi criado o Programa de Rádio Patrulhamento com
Motocicletas – atendimento 190, disciplinado pela Diretriz PM3-004/02/12, de 30 de
outubro de 2012, cujas patrulhas também eram compostas por dois policiais e, por
meio de cartão de itinerários de patrulhamentos previamente definidos, eram
responsáveis pelo patrulhamento ostensivo preventivo e repressivo imediato, bem
como o atendimento de ocorrências despachadas pelo COPOM.
No Programa de atendimento 190, ficou estabelecido como competência
para as patrulhas de policiais motociclistas o atendimento de ocorrências habituais,
caracterizadas pelo menor potencial de risco, geralmente resolvidas no local dos
fatos e que costumam não implicar a condução de partes ao Distrito Policial
(PMESP, 2012). São exemplos clássicos, a saber, perturbação do sossego público,
averiguação de atitude suspeita, desinteligência, alarme disparado, entre outros.
118

Atualmente, pelas suas características e virtuosa eficiência comprovada na


sua aplicação (DE MOURA, 1997, p.16), o policiamento com motocicletas é uma
realidade nas Unidades Territoriais, Rodoviário, Policiamento Ambiental e
Policiamento de Trânsito.

4.2 Fatores favoráveis ao uso de motocicleta no Controle de Multidões

O uso de motocicletas nas mais diversas atividades operacionais


intensificaram-se em São Paulo, e também em outros Estados da Federação,
principalmente nas capitas, na medida em que houve o crescimento das grandes
cidades e, consequentemente, aumento dos problemas decorrentes da maior
urbanização e aumento da população.
Segundo o IBGE (2020), com uma frota de, aproximadamente, 8,3 milhões
de veículos e uma população estimada de 12,3 milhões de pessoas em 2020, a
capital paulista enfrenta as dificuldades sociais, econômicas, de saúde pública,
educação e, sobretudo, segurança pública e mobilidade urbana (comum nas
grandes cidades).
Dentro desse cenário, facilmente pode-se identificar que realizar o
policiamento ostensivo e implementar ações de preservação e manutenção da
ordem pública nesses locais é uma tarefa complexa e árdua. Como garantir uma
capacidade de resposta eficiente ao cidadão que precisa, em uma metrópole com
tráfego de veículos intenso e grandes congestionamentos?
Por essa e outras razões que o policiamento com motocicletas, iniciado em
1982 na PMESP, evoluiu tanto, tornando-se uma das ferramentas mais eficazes no
combate à criminalidade, decorrentes de importantes características, sobretudo
atribuídas às motocicletas.
Abaixo serão apontadas algumas características que favorecem o emprego
de motocicletas nas atividades de policiamento ostensivo.

4.2.1 Mobilidade

Uma das grandes vantagens do policiamento com motocicletas é a


capacidade de potencializar a ação de presença da Polícia Militar, ao cobrir uma
119

área maior, em um tempo consideravelmente menor do que uma viatura 4 rodas


(maior capacidade responsiva), sobretudo em cidades de trânsito intenso.
Segundo De Moura (1997, p.17), essa mobilidade, possibilitada pelas
características da motocicleta, seu porte e dimensões, permite maior poder de
penetração no trânsito, ampliando a sensação de segurança pela frequência maior
de patrulhamento.

4.2.2 Flexibilidade

A flexibilidade, assim como a mobilidade, decorre das características da


motocicleta, que permitem ao policial militar, grande agilidade na pilotagem. A
flexibilidade do policiamento com motocicletas está relacionada à capacidade que
esse veículo possui para se deslocar em variados tipos de terrenos, realizar
manobras rápidas de retorno, desvios ou transposição de vias, além de transpor
obstáculos.

4.2.3 Ostensividade

De Moura (1997, p.21), explica que a maior ostensividade do policiamento


com motocicletas decorre da sua mobilidade e flexibilidade:
A conjugação dos fatores mobilidade e flexibilidade resulta em uma
amplitude e intensidade maior de atuação da motocicleta no policiamento, o que
determina uma multiplicação da ostensividade policial, produzindo efeitos positivos
para a população, que passa a sentir-se mais segura e protegida contra atos que se
contraponham a Ordem Pública.
O conceito de ostensividade vai além da visibilidade das equipes no terreno,
estando também relacionado à amplitude que pode ser atingida no teatro de
operações, a qual, dentro de uma tática definida, pode ampliar a capacidade de
atuação, dando maior capilaridade ao pelotão.
Exemplo do aproveitamento dessa amplitude foi a atuação do efetivo da 4ª
Companhia do 2º Batalhão de Polícia de Choque (ROCAM) nas greves dos
caminhoneiros em 2018. Naquela ocasião por todo o Brasil, caminhoneiros
protestavam contra condições de trabalho, altas do preço do óleo diesel e baixos
120

valores do frete, estacionando centenas de caminhões nas principais rodovias do


país.
No Estado de São Paulo, o maior protesto ocorreu na Rodovia Mário Covas
(Rodoanel), a qual foi interditada parcialmente pelos profissionais da categoria que
estacionaram seus caminhões ocupando, aproximadamente, 5 km de pista nos dois
sentidos, entre as Rodovias Imigrantes e Anchieta.
A ação de desinterdição da via foi comandada pelo Cel PM Alexandre
Gaspar Gasparian, então comandante do Policiamento de Choque, que tinha à
disposição, no local, uma Companhia de ROCAM, sob comando deste autor, um
Pelotão de Choque, do 3º Batalhão de Polícia de Choque (BPChq) – com veículo
blindado, Pelotão das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) e Pelotão do
Comando de Policiamento Rodoviário (CPRv).
Após reunião de análise de riscos e definição da estratégia, o Comandante
decidiu empregar diretamente na desinterdição a Companhia de policiais
motociclistas, dividida em equipes de três a quatro policiais os quais foram
distribuídas ao longa da manifestação, com as demais tropas em apoio à
retaguarda. Naquela ocasião, inúmeros focos de tensões foram desencadeados, os
quais rapidamente eram neutralizados pelas equipes. A referida atitude, impedia a
proliferação de atos contrários à ordem e o contágio aos demais participantes; ao
contrário, pela grande amplitude alcançada pelas equipes, aqueles que pretendiam
realizar atos contrários à ordem pública sentiam-se intimidados, pela certeza de
serem rapidamente repreendidos e aqueles que desejavam cumprir as
determinações da Polícia Militar, sentiam-se protegidos em fazê-lo em relação aos
demais, diante da ostensividade proporcionada pela ROCAM.
A Rodovia Mario Covas foi desinterditada sem o lançamento de uma única
granada policial ou disparo de elastômero. O sucesso da missão foi tamanho que o
Coronel Gasparian foi convidado para apresentar aos Comandantes do Exército
Brasileiro as estratégias e táticas utilizadas, para servirem de referência na atuação
das tropas daquela Força na desinterdição das Rodovias Federais.

4.2.4 Capacidade responsiva


121

Naturalmente, as características mencionadas anteriormente, permitem que


a equipe policial compareça ao local da ocorrência da emergência com tempo muito
menor que viaturas 4 rodas.
Essa alta capacidade responsiva, ou seja, menor tempo de resposta, geram
consequências importantes que devem ser observadas pelos comandantes e pelo
operacional motociclista quando do planejamento de operações e atuação nas
ocasiões de acionamento.
Com a maior agilidade e menor tempo de resposta, é aumentada, de forma
considerável, a probabilidade de a equipe policial comparecer no local da ocorrência
no momento em que os criminosos ainda estejam cometendo o delito ou iniciando a
fuga e, consequentemente, aumenta a probabilidade de confronto.
Assim, para que as características apontadas acima gerem efeitos positivos
ao policial motociclista, é necessário que seja concedida a esse militar, adequada
capacidade operacional (combativa) para atuar diante do incidente crítico.
Ou seja, são necessários equipamentos e armamentos adequados (poder de
fogo condizente com missão), técnicas, táticas e procedimentos sedimentados por
meio de muito treinamento, e possibilidade de comparecimento de apoio de equipes
mais robustas quanto a viaturas (4 rodas), equipamentos, armamento e munição,
dentro de um breve período.
Lançar uma equipe policial motociclista para uma missão sem capacidade
combativa frente aos criminosos não gera efeito significativo na manutenção da
ordem pública e pode trazer consequências trágicas às vidas policiais militares.

4.3 Limitações ao uso de motocicleta no Controle de Multidões

As limitações ao policiamento com motocicletas, em qualquer atividade


operacional a que é destinado, está relacionada à vulnerabilidade do Policial Militar
ao risco de acidentes na condução da motocicleta ou na aproximação e atendimento
de ocorrência policial, principalmente porque o veículo de duas rodas não oferece
qualquer proteção entre o militar e o objeto ou indivíduo agressor.
Nas considerações de SILVA (2017, p. 18):

Há que se considerar, ainda, que o policial, em função das características


da motocicleta, está mais suscetível a acidentes em função da menor
proteção que o veículo apresenta. Ressalta-se, ainda, uma maior exposição
122

do miliciano a agressões de infratores da lei como, por exemplo, uma


emboscada.
Essa alta exposição gera algumas limitações táticas ao emprego do
policiamento com motocicletas no Controle de Multidões. Dessa forma, nas ocasiões
em que o pelotão de motociclistas está dividido no formato de equipes autônomas
(Equipes de Resposta Rápida – ERR), seu emprego deve ser direcionado para
áreas mediata ao local principal de concentração de manifestantes, para atuar
contra a quebra da ordem pública praticada por grupos menores de ativistas, que
agem de forma dispersa. Primeiro porque o número de operacionais está reduzido,
segundo porque sua capacidade de proteção é pequena e por último, porque sua
capacidade logística (quantidade de equipamentos, granadas policiais e munições
de emprego não letal que conseguem transportar) é bastante limitada.
Outra limitação a ser considerada no planejamento e emprego de policiais
motociclistas no Controle de Multidões é sua limitada capacidade logística. Assim, a
equipe de policiais motociclistas não consegue transportar grandes quantidades de
armamento, equipamentos e munições como granadas policiais, munições de
emprego não letal etc.
Por essas razões, e pela necessidade de conduzir detidos ou socorrer
feridos, para o emprego do pelotão de motociclistas, deve haver previsão de viaturas
4 rodas para atuar em apoio no teatro de operações.
Os fatores naturais também devem ser considerados, tais como a chuva,
dias de forte sol, horários noturnos, pois diferentemente das viaturas quatro rodas,
os efeitos desses fatores incidem diretamente sobre o policial, causando
considerável desgaste físico e psicológico, interferindo na capacidade de condução
da motocicleta, bem como na eficiência do patrulhamento.
As limitações naturais apontadas não devem ser tratadas como restrições
absolutas para seu emprego. O que se pretende contextualizar é que o emprego do
policial militar motociclista nessas condições demandam uma análise circunstancial
detalhada, objetivo específico e considerações de medidas corretivas que sejam
capazes de reduzir os riscos a um nível aceitável.
No mesmo sentido, o desgaste físico do militar é muito maior, em razão da
incidência direta dos fatores naturais já apontados, bem como fatores ambientais o
que lhes pode causar maior desidratação pelo sol e caloria do motor, inspiração de
partículas de poluição do ar, lesões cutâneas, lesões de coluna, membros inferiores
123

e superiores decorrentes do impacto dos obstáculos e imperfeições da via


diretamente no corpo do policial, já que o sistema de amortecimento da motocicleta
absorve parcialmente seus efeitos.
Nessas condições críticas, para que os objetivos desejados sejam atingidos,
o trinômio do “Sistema de Desempenho Humano”: Homem, TTP (técnicas, Táticas e
Procedimentos) e Equipamento devem ser considerados. (AGUILAR et al, 2020, p.
34)
Expor o policial motociclista a condições de inferioridade latente, e
capacidade de reação limitada, nas quais tenha que utilizar medidas extremas para
lutar pela sua sobrevivência, pode gerar consequências graves a ele próprio, à
sociedade, à Instituição e ao Estado

Figura 22 Atuação policial de Controle de Multidões em Paris

Fonte: Lanot, 2018 (Disponível em:


https://brasil.elpais.com/brasil/2018/12/23/internacional/1545566854_958606.htm
l. Acesso em 15 jan. 2020).
A multidão em desordem pode ser mortal ao Policial, conforme afirma Le
Bon (2008, p. 41):

A multidão não é somente impulsiva e estável. Como o selvagem, não


admite obstáculos entre seu desejo e a realização do seu desejo, ainda
mais que o número lhe proporciona uma sensação de poder irresistível.
Para o indivíduo na multidão, a noção de impossibilidade desaparece. O
homem isolado reconhece que sozinho não pode incendiar um palácio,
pilhar uma loja; portanto, essa tentação não se lhe apresenta ao espírito. Ao
fazer parte de uma multidão, toma consciência do poder que o número lhe
confere e, diante da primeira sugestão de assassinato e pilhagem, cederá
imediatamente. Qualquer obstáculo inesperado será freneticamente
rompido. Se o organismo humano permitisse a perpetuidade do furor,
poder-se-ia dizer que o estado normal a multidão contrariada é o furor.
124

4.4 O potencial do policiamento com motocicletas no controle de multidões

Realizando uma análise operacional prática das dificuldades enfrentadas


pela PMESP, a partir das manifestações de 2013, conclui-se que o policiamento com
motocicletas, pelas suas características, dentro de circunstâncias específicas e
estabelecidas, apresenta grande capacidade operacional para contribuir de forma
decisiva nas ações de polícia direcionadas à preservação da ordem pública em
incidentes relacionados ao Controle de Multidões, sobretudo as que compõem a
participação de grupos violentos.
Essa afirmação baseia-se na capacidade do policiamento com motocicletas
neutralizar ou mitigar as características danosas das manifestações
contemporâneas, aproveitando-se dos fatores favoráveis ao seu emprego apontados
acima, sobretudo diante dos seguintes aspectos:
i. as manifestações contemporâneas enquanto conflitos adaptativos complexos:
Aguilar et al (2017, p. 12), ao tratar dos incidentes críticos dinâmicos
posiciona que “a Polícia Militar está sendo chamada à defesa social contra novos
tipos de conflitos, próprios do momento contemporâneo e que são chamados de
conflitos adaptativos complexos (CAC)”. Passando a explicar também que incidentes
complexos seriam aqueles que estão localizados em uma determinada área a que
se atribui uma única estrutura de ICS (gerenciamento do incidente).
Para Raza (2016, p. 264-265) o CAC é enquadrado nos problemas
evolutivos não estruturados, que não apresentam solução única, nem progressão
linear e cuja resposta é sempre estocática, ou seja, dependente das leis do acaso.
Como já dito, as manifestações contemporâneas podem ser enquadradas
nesse conceito, uma vez que apresentam características que as tornam complexas,
imprevisíveis, ausentes de organização e desprovidos de roteiros de ação lógicos.
As manifestações contemporâneas tem contado com a participação de
grupos que utilizam a tática black bloc, os quais se organizam em uma estrutura
horizontal, “buscam agir em uma base igualitária, libertária, sem hierarquia ou
posições de autoridade”, aproximam-se na formação de grupos de afinidades, que
pode ser formado por meia dúzia ou várias dezenas de pessoas, o que facilita a
tomada de decisão autônoma e rápida. (DUPUIS-DERI, 2014, p. 61)
125

O fato é que, nessas circunstâncias, não é possível identificar uma liderança


definida a partir da qual pudesse se traçar certa previsibilidade de ações. “Ainda que
líderes informais surjam, como em todo tipo de grupamento humano, os Blacks
Blocs não têm ‘chefe’, cuja posição oficial lhes possibilite impor sua vontade a
‘subordinados’”. (DUPUIS-DERI, 2014, p. 61-65)

“Alguns Black Blocs ou grupos que os compõem apresentam pouca ou


nenhuma organização formal. Em certas manifestações, por exemplo, as
pessoas chegam ao local de encontro com máscaras e roupas pretas e
montam um Black Bloc – isto é, um grupo que caminha junto como unidade
compacta – espontaneamente, sem qualquer tomada de decisão coletiva
prévia. Em horas de ação direta, um ou mais indivíduos podem decidir atuar
sozinhos – pichar um muro ou atirar coisas contra uma janela ou contra a
polícia – sem consultar outros membros do Black Bloc.” (DUPUIS-DERI,
2014, p. 65)
A consequência da inexistência de liderança na organização desses grupos
reflete na conclusão de que as manifestações ocupadas por grupos black blocs são
imprevisíveis quanto ao local, momento e ação a ser desencadeada por cada um
dos inúmeros grupos ativistas, uma vez que são desprovidos de freio moral, ético ou
até mesmo de qualquer direcionamento do grupo, já que a sua filosofia pressupõe a
ausência de regras. Agem de acordo com sua consciência e vontade individual.
Enxerga-se nesse cenário uma relação análoga ao sentimento de anomia,
onde as regras sociais não regem mais o comportamento do indivíduo, pois não há
uma referência de liderança que possa restringir seus atos, permitindo que esses
indivíduos ajam de acordo com seus próprios interesses.
Nessas circunstâncias, a única forma de se evitar que esses indivíduos
pratiquem atos que abalem a ordem pública, ou ao menos, diminuir os efeitos
danosos de seus atos, é por meio de uma ação direta do Estado desencadeada pela
Polícia Militar, alcançando os locais onde os mal intencionados estarão, de forma
rápida e com capacidade operacional (combativa).
Dentro desse cenário complexo e caótico em que o incidente crítico evolui
com grande velocidade e de forma não linear, dificuldade de locomoção pelas vias
públicas, é que o policiamento com motocicletas, pelas suas características, tem
condições de se adequar, rapidamente, às circunstâncias apresentadas e promover
uma resposta eficiente à ameaça.
Aos moldes da teoria econômica do crime de Gary Becker (RANGEL,
TONON, 2017, p.7), a ideia é que a ação da polícia demonstre ao indivíduo que não
há vantagem praticar atos contrários à ordem pública, pois a chance de serem
126

surpreendidos pela polícia, presos ou dispersos é muito grande e esse “medo” pode
contagiar outros indivíduos dos demais grupos.
ii. as manifestações contemporâneas e o método terrorista de ataques múltiplos
coordenados ou simultâneos
O conceito de ataques múltiplos coordenados surgiu a partir do ataque
terrorista ocorrido em novembro de 2008, na cidade de Mumbai na Índia. Na ocasião
os terroristas dividiram-se em grupos e saíram pela cidade efetuando disparos de
fuzis, lançaram granadas e artefatos explosivos improvisados em diversos locais e
pessoas, o que resultou em, pelo menos, 173 mortos e mais de 350 feridos.
(AGUILAR, 2016, p. 46-47)
Acredita-se que, dentro da devida proporção e finalidade, alguns dos
métodos e táticas utilizados pelos grupos radicais nas manifestações
contemporâneas, sobretudo aqueles que se utilizam da tática black bloc,
apresentam grande semelhança ao apresentado acima.
Nesse sentido, pode-se identificar que as manifestações públicas
contemporâneas reforçaram sua característica de incidente dinâmico. E, mais uma
vez, motivado pela participação de grupos radicais, deslocam-se pelas ruas da
cidade em busca de oportunidades para implementar suas ações. São imprevisíveis,
atacam locais e pessoas (quase sempre policiais), utilizando-se de diferentes armas
(estilingue, artefatos explosivos, artefatos incendiários, corrente, pedras etc.). Agem
de forma simultânea e dispersa, fora dos limites geográficos tradicionalmente
definidos. Agem de acordo com o método de ataques múltiplos coordenados ou
simultâneos.
E como enfrentar esse método no qual se desenvolve o incidente crítico?
Aguilar (2016, p. 47) explica que a partir da ocorrência em Mumbai, a
comunidade policial passou a discutir forma de responder a essas ameaças híbridas,
resultando no surgimento da estratégia de MACTAC (Multi-Assalut Coubter Action
Capabilities), “designada, na tradução em português, como ‘Capacidade de
Resposta Contraterrorista Frente a Múltiplos Ataques’.”
Citando estudo do Departamento de Polícia de Los Angeles, nos Estados
Unidos da América (LPDA), Aguilar complementa que:

O conceito de MACTAC é de fornecer os meios para permitir que os


policiais, usando táticas de pequenas unidades de infantaria, possam se
reunir de forma espontânea e eficaz, a fim de confrontar várias ameaças tão
127

rapidamente quanto possível, compelindo imediatamente as ações dos


criminosos (LPDA, 2017 apud AGUILAR, 2016, p. 50-51).
Trazendo para o estudo, verifica-se que o policiamento com motocicletas,
pelas características já apontadas, tem capacidade operacional para responder a
esses incidentes críticos dinâmicos com rapidez, grande amplitude e de forma
simultânea, aproveitando da sua capacidade em superar os obstáculos físicos
existentes ou colocados no caminho.
Trata-se da possibilidade de empregar a estratégia MACTAC, logicamente,
adaptada à circunstância de preservação da ordem pública, em manifestações,
como ferramenta eficaz de resposta às ações múltiplas, simultâneas e coordenadas
dos grupos radicais.
Importante salientar que a ação rápida da equipe de policiais motociclistas
no controle de uma turba pode impedir o contágio da ação criminosa aos demais
manifestantes, auxiliando a promover a sua contenção.
Sendo as manifestações públicas consideradas incidentes críticos dinâmicos
nas circunstâncias de quebra da ordem pública, necessário se faz buscar sua
resolução por meio de um sistema dinâmico de gestão de incidentes, que “é utilizado
para as situações críticas em movimento, em que a rápida e eficiente contenção e
isolamento são prejudicadas pela intensa alteração do estado das coisas” (SILVA,
2019, p. 60).
Nesse mesmo sentido, Aguilar explica que:

O Sistema Dinâmico é um método de resolução de incidentes que ainda


está em evolução, em movimento (on-going), ou seja, que não estão
confinados em determinados espaços geográficos, denotando dinamismo
do causador do incidente.
Nesses incidentes em movimento, o esforço primário é o de incapacitação
do causador do incidente devido à dificuldade de se efetivar medidas iniciais
de contenção. Exemplos desses incidentes temos ações de Atiradores
Ativos (IARD), de Múltiplos Ataques Coordenados (MACTAC) ao estilo
Mumbai/Paris, de Black Blocs, etc, (AGUILAR et al, 2017, p.7)
O emprego do policiamento com motocicletas nessas situações visa a
neutralização (prisão) ou dispersão imediata desses grupos violentos, o mais rápido
possível, como forma de impedir que suas ações contagiem outros grupos ou que os
efeitos danosos gerados alcancem maior amplitude sobre outras pessoas ou
patrimônios.
Esse objetivo poderá ser alcançado pelo emprego de equipes e grupos
autônomos e rápidos com capacidade de apresentar resposta contundentes diante
128

de atos violentos, além de adequar-se de forma ágil às constantes mudanças


ambientais, estratégias e táticas dos turbadores.
Brasiliano (2017, p. 40-41), faz uma interessante citação ao General
americano Stanley McChrsystal, ao tratar sobre a necessidade de se alcançar a
capacidade de adaptação ao inimigo, baseando-se em princípios de guerra:

O General Stanley McChrsystal esreveu o livro Team of Team: New Rules


of Engagement for a Complex World, com coautores militares, como o
soldado das forças especiais Chris Fussel, para compartilhar as
descobertas feitas quando esteve à frente das tropas norte-americanas no
Iraque e no Afeganistão.
Ele percebeu que não bastava ter uma força tarefa eficiente, bem preparada
taticamente, equipada com a melhor tecnologia e liderada pelos maiores
talentos.
O inimigo em questão, a Al Qaeda, tinha um jeito muito particular de operar,
que não era vencido com eficiência. Os integrantes dessa facção se
organizavam em times pequenos, sem líder definido, e, em especial,
usavam a comunicação em tempo real como sua maior arma. A
ultravelocidade com que a informação circulava do outro lado fez a força-
tarefa dos EUA tropeçar.
Para evitar a derrocada, algo precisava ser feito, e rápido. Depois de
entender como o inimigo operava, Mc Chrystal conseguiu reorganizar sua
equipe para fazer frente à empreitada: ele derrubou silos (próprios do
Exército e das empresas), fez a informação fluir entre departamentos,
aumentou a velocidade na tomada de decisão. Assim, formou equipes
pequenas, ágeis, com comandos descentralizados e responsabilidades de
responder na hora o contexto apresentado. Desta forma, o General quebrou
os protocolos do Exército para que as equipes tivessem um rendimento
superior, capacitando-os a responder às condições emergentes.
Neste trabalho, no Capítulo 6, será tratado a respeito de propostas de
atuação, que visam os objetivos apontados acima, desenvolvida por tropas de
policiais motociclistas, aqui denominadas por Equipes de Resposta Rápida (ERR),
Grupos de Respostas Rápidas (GRR) e Pelotão de Resposta Rápida (PRR)
iii. as manifestações publicas e a dificuldade de acesso ao local do incidente crítico
A existência de manifestações públicas nas ruas, mesmo que pacíficas,
naturalmente, já causam grande transtorno ao tráfego de veículos e deslocamento
de pessoas pela cidade, gerando a necessidade de importante esforço da Polícia
Militar para movimentar seus ativos no teatro de operações e executar suas ações
de preservação da ordem pública.
Na medida em que a essa situação complicada são acrescidas ações
intencionais de ativistas para provocar o bloqueio de vias e ataques múltiplos
coordenados e simultâneos, instala-se uma situação complexa e caótica, pois
diminui de forma exponencial a capacidade de resposta da polícia, que não
consegue movimentar seus veículos pesados de transporte de tropas de choque.
129

Quando a pé, os grupos de resposta não se deslocam rápido o suficiente para


impedir que os baderneiros atuem e, quando em viaturas leves de quatro rodas, não
conseguem transpor grande parte dos obstáculos criados ou colocados (barricadas
de pneus, latas de lixo, veículos incendiados etc.) e, quando conseguem, muitas
vezes não o fazem dentro da velocidade necessária.
A polícia não consegue alcançar os locais onde ocorrem os incidentes
críticos e quando chegam, não o faz em momento capaz de impedir os efeitos dos
atos violentos.
Durante as pesquisas para esse trabalho foi realizada entrevista ao Sr. Cel
PM José Balestiero Filho, Comandante do 2º Batalhão de Choque em 2013, que
serviu nas Unidades de Choque da PMESP desde o ano de 1985 até 2015 e
comandou diretamente as tropas do Batalhão Anchieta, a partir do teatro de
operações, nas manifestações que tiveram início em junho daquele ano e se
estenderam para os meses seguintes. Naquela ocasião, foi relatado pelo Oficial que
uma das grandes dificuldades enfrentadas pela tropa de choque para conter a
quebra da ordem pública que ocorria em diversos pontos da cidade foi deslocar a
tropa em meio ao trânsito intenso. Em algumas oportunidades, os pelotões de
choque tradicionais, eram desembarcados dos caminhões e ônibus e corriam entre
os veículos por quilômetros de distância, até conseguirem chegar ao local do
incidente crítico, o que ocasionava desgaste aos policiais e demora para neutralizar
os atos de violência. Dessa forma, na maioria das vezes os efeitos danosos já
tinham ocorrido.
Como exemplo, o Cel PM Balestiero citou as manifestações que ocorreram
nas imediações do Aeroporto Internacional de Guarulhos, em junho de 2013. Nessas
ocasiões, os manifestantes interditaram as vias de acesso a aeroporto causando
congestionamento das vias por veículos, o que impediu por bastante tempo a
chegada dos pelotões de choque ao local das manifestações.
Baseado na lógica aristotélica, pode-se afirmar, portanto, que as novas
manifestações públicas apresentam características que as tornam incidentes
dinâmicos, heterogêneos e imprevisíveis. Quando compostas por grupos radicais,
são providas de grande capacidade de praticar múltiplas ações violentas e danosas,
de forma veloz, simultânea e dispersa no espaço geográfico, causando confusão às
forças de segurança e grande dificuldade para neutralizar essas ações e suas
consequências.
130

O Policiamento com motocicletas, dotado de características relacionadas à


mobilidade, flexibilidade, alta responsividade e ostensividade, é capaz de agir com
grande velocidade e amplitude no espaço geográfico, possibilitando ações
autônomas do pelotão, dividido em grupos de respostas, com capacidade
operacional para neutralizar, simultaneamente, os incidentes em sua fase inicial,
evitando o contágio de outros grupos e o alastramento dos seus efeitos.
Assim, o emprego do policiamento com motocicletas no Controle de
Multidões, dentro do processo de gerenciamento dos incidentes ora estudado, pode
ser considerado importante, senão essencial, para que o objetivo final desejado, de
preservação da ordem pública, seja atingido.
Certamente, a eficiência das ações desencadeadas pelo pelotão de
motociclistas, nesse cenário, pressupõe algumas inovações referentes a
equipamentos, estratégias, técnicas, táticas e procedimentos como forma de
conceder às equipes policiais capacidade operacional (combativa) para o
cumprimento da missão com o máximo de segurança possível ao policial militar
motociclista.
131

5. DAS PESQUISAS E RESULTADOS ALCANÇADOS

5.1 Questionário enviado aos Policiais Militares motociclistas

A fim de verificar a opinião e conhecer a realidade vivenciada pelos policiais


militares desempenham a atividade de policiamentos com motocicletas, sobretudo
referente a ações de controle de multidões, foram selecionadas Unidades que lidam
com multidão em razão de manifestações ou da atividade de policiamento em
eventos. Nesse sentido, as Unidades focais foram: i. 4º BPM/M: responsável pelo
policiamento externo na área dos estádios “Allianz Parque”, do Palmeiras e
Pacaembu; 16º BPM/M: responsável pelo policiamento externo na área do estádio
do Morumbi e atua nas manifestações na região do Palácio dos Bandeirantes (sede
do Governo do Estado de São Paulo); 7º BPM/M, 13º BPM/M e 7º BAEP: Unidades
que atuam nas manifestações na área central da capital; 4º BAEP: unidade que atua
no policiamento externo do estádio “Neo Química Arena”, do Corinthians; 2º BPChq:
Unidade responsável pelas ações de Controle de Multidão em todo o Estado e pelo
policiamento nos principais estádios e ginásios da cidade de São Paulo.
A população pesquisada foi de 282 policiais militares (entre Oficiais e
Praças), sendo: 4º BPM/M: 15; 7º BPM/M: 23; 13º BPM/M: 26; 16º BPM/M: 18; 4º
BAEP: 40; e 2º BPChq: 160.
Para tanto, no período de 01 a 30 de dezembro de 2021, foram
encaminhados questionários aos Capitães, Tenentes e Praças das Unidades acima,
por meio da plataforma Google Forms. Utilizando a metodologia Survey Monkey
(https://pt.surveymonkey.com/mp/sample-size-calculator/), seriam necessárias, pelo
menos, 163 respostas para que a amostra fosse considerada representativa, tendo
em vista a aplicação de grau de confiança de 95% e margem de erro de 5%. Assim,
183 Policiais Militares (sendo 83% Praças e 17% Capitães/Tenentes) responderam
ao questionário, o que permitiu ultrapassar o patamar mínimo e inferir que, nesta
pesquisa, tem-se uma amostra representativa.
Dito isso, a seguir serão apresentadas as questões e os resultados.

Questão 1: Há quanto tempo exerce a atividade de policiamento com


motocicletas?
132

Tal questionamento visou verificar o perfil policial-militar no quesito


experiência profissional na atividade de policiamento com motocicletas. A maioria
dos respondentes (61,2%) possui cinco anos, ou mais, trabalhando no policiamento
com motocicletas o que permite inferir que há um bom nível de experiência no
trabalho com motocicletas.

Gráfico 2 Tempo na atividade de policiamento com motocicletas

Fonte: O autor, 2021.


Questão 2: Conhece os conceitos de Gestão de Multidões previstos no M-8-
PM?
O resultado do questionamento foi que 84,2% dos respondentes informaram
conhecer os conceitos de Gestão de Multidões previstos no M-8-PM, o que contribui
para o desenvolvimento de treinamentos e atuações junto a multidões pelo efetivo
do policiamento com motocicletas. Além disso, trouxe mais segurança à pesquisa,
pois demonstra que os participantes conheciam a temática e suas respostas foram
ofertadas de maneira consciente, contribuindo, enormemente, para o entendimento
do tema.

Gráfico 3 Conhece os conceitos de Gestão de Multidão?

Fonte: O autor, 2021.


133

Questão 3: Conhece a diferença entre os conceitos de Administração de


Multidão e Controle de Multidão previstos no M-8-PM?
67,8% informaram conhecer a diferença dos conceitos, fato que, também,
contribui para o desenvolvimento de trabalho específico junto a esse grupo focal.

Gráfico 4 Conhece a diferença entre Administração e Controle de Multidão?

Fonte: O autor, 2021.

Questão 4: Realiza treinamentos de Controle de Multidão na sua OPM?


Considerando que o treinamento é um dos pilares básicos para a eficiência
operacional, apresentou-se um quadro positivo, pois 90,2% alegaram existir
treinamento específico de Controle de Multidão em suas Unidades.

Gráfico 5 Realiza treinamento de Controle de Multidão na OPM?

Fonte: O autor, 2021.

Questão 5: Na sua opinião, o emprego de pelotão de motociclista no


Controle de Multidões é importante?
134

67,2% responderam que o emprego de pelotão de motociclista no Controle


de Multidão é importante, o que demonstra convergência com o contexto dessa
pesquisa, bem como com as hipóteses aqui defendidas.

Gráfico 6 Considera importante o emprego de pelotão motociclistas no


Controle de Multidão?

Fonte: O autor, 2021.

Questão 6: Na sua opinião, o emprego de policiais duplamente embarcados


na viatura tipo motocicleta (garupa), em ações específicas de Controle de Multidões,
pode proporcionar maior eficiência na ação policial?
56,4% disseram que o emprego de policial na garupa não proporciona maior
eficiência na ação policial. A opinião da pequena maioria no sentido da ineficiência
do emprego de policiais duplamente embarcados para o desenvolvimento de ações
de controle de multidões, pode estar relacionada à insegurança decorrente da
inexistência de doutrina relativo ao assunto na PMESP, desconhecimento da
técnica, aspectos culturais, já que é sedimentado na Instituição o desenvolvimento
de policiamento com motocicletas com apenas um policial embarcada em cada
viatura e falta de padronização.
135

Gráfico 7 O emprego de policial garupa, em ações específicas de


Controle de Multidões, pode proporcionar maior eficiência na ação
policial?

Fonte: O autor, 2021.

Questão 7: Após a padronização de doutrina, técnica, tática e


procedimentos, bem como de realização de treinamentos, na sua opinião, é
conveniente o emprego de policiais duplamente embarcados na viatura tipo
motocicleta (garupa), especificamente, em ações específicas de Controle de
Multidões?
50,3% afirmaram que é possível o emprego de policiais engarupados para
ações específicas de Controle de Multidões. Comparando com a questão anterior,
verifica-se que, agora, a maioria, entende a viabilidade do emprego, pois foi-lhes
apresentada ideia da doutrina, da técnica, tática e procedimentos, algo que,
aparentemente, gera maior confiança aos policiais.

Gráfico 8 É possível o emprego de policial garupa, em ações específicas


de Controle de Multidões, após padronização de doutrina, técnica, tática
e procedimentos e da realização de treinamentos?

Fonte: O autor, 2021.


136

Questão 8: Qual a maior dificuldade em atuar no Controle de Multidões


enquanto no policiamento com motocicletas? (Poderia ser assinalada mais de uma
opção)

Gráfico 9 Dificuldades na atuação do policiamento com motocicletas no


Controle de Multidões

Fonte: O autor, 2021.

Questão 9: Nas ocasiões de atuação no Controle de Multidões, atuou em


que formato? (Poderia ser assinalada mais de uma opção)
Os números apontam falta de padronização na forma de atuação dos
pelotões de policiamento com motocicletas no controle de multidões, o que dificulta
a aplicação sistemática dessa atividade operacional de forma coordenada com os
demais programas de policiamento e outras atividades, podendo comprometer de
forma decisiva o gerenciamento dos incidentes críticos relacionados ao tema.

Gráfico 10 Formato de atuação quando foi empregado no Controle de


Multidões

Fonte: O autor, 2021.


137

Questão 10: Quais os pontos positivos em atuar no Controle de Multidões


enquanto no policiamento com motocicletas? (Poderia ser assinalada mais de uma
opção)
Percebe-se que há convergência entre a teoria estudada neste trabalho e a
prática desenvolvidas pelos policiais motociclistas nas suas ações, ou seja, as
respostas às questões embasadas em experiências pessoais dos policiais
confirmam os conhecimentos de diversos autores aqui citados.

Gráfico 11 Pontos positivos do emprego do policiamento com


motocicletas no Controle de Multidões

Fonte: O autor, 2021.

Da pesquisa acima conclui-se que há campo para implementação da


sistemática de atuação do policiamento com motocicletas no Controle de Multidões,
embasado, destarte as dificuldades, fatores positivos e potencialidades apontadas
pelas respostas dos próprios operacionais que responderam o questionário. É certo,
no entanto, que foi verificada certa insegurança, sobretudo a respeito de pontos
específicos relacionados à mudança significativa de técnicas de atuação o que,
acredita-se, por meio de necessária estruturação de protocolos e treinamentos que
assegurem a viabilidade no emprego a eficiência e a confiança dos operacionais
pode ser alcançada.

5.2 Entrevista com Cel PM Alexandre Monclus Romanek

No dia 23 de outubro de 2020, foi entrevistado o Cel PM Alexandre Monclus


Romanek, Comandante da Academia de Polícia Militar do Barro Branco, e que
possui distinta experiência em operações de Controle de Multidão por ter servido de
1993 a 2019 nas Unidades subordinadas ao CPChq. Em 2013 era o Coordenador
138

Operacional do 3º BPChq e, portanto, atuou diretamente nas emblemáticas


manifestações daquela ano.
O Oficial concorda que 2013 pode ser considerado um marco para as
manifestações no Brasil, pois houve grande mudança nas forma dos manifestantes
atuarem, os quais, anteriormente tinha como intenção primária buscar a exposição
de suas reivindicações na mídia e, após a dispersão, não praticavam atos violentos
em grupo. A partir das manifestações de 2013, parte dos manifestantes,
principalmente aqueles que se utilizavam-se da tática black bloc, deslocavam-se
para os locais de reunião com a intenção primária e secundária de praticar atos de
violência, durante a reunião ou na dispersão. Para isso, compareciam nos locais de
manifestações preparadas para o confronto com a polícia adotando meios de contra
medida como escudos artesanais, máscaras contra gases, artefatos explosivos e
incendiários.
Na visão do Oficial, a PMESP enfrentou problemas relativos à comunicação
entre as tropas, equipamentos de proteção individual adequados e uma série de
limitações à forma de atuação imposta pelo Poder Judiciário, decorrentes de ações
judiciais que questionavam as ações policiais e teve como dificuldade operacional a
distribuição adequada das tropas e atividades operacionais no terreno, diante das
novas características de manifestação apresentadas.
Entende que o principal equívoco, sobretudo nos momentos iniciais, foi a
concentração da maior parte dos ativos operacionais nas áreas imediatas ao local
de reunião, deixando enfraquecidas as áreas mediatas, onde ocorreram a maioria
dos atos de desordem.
Aduz que as manifestações tradicionais, antes de 2013, havia mais previsão
das ações, fato que mudou drasticamente a partir daquele ano, tendo em vista a
presença de ativistas blac bloc, os quais incrementaram a violência no ponto crítico
e nos afastados, o que dificultou a atuação policial (principalmente no que tange ao
deslocamento do efetivo).
Para o Cel PM Romanek, o policiamento com motocicletas pode ser
empregado nas ações direcionadas à Gestão de Multidões desde que acompanhada
de forte capacitação e treinamento dos policiais motociclistas; ainda, é necessária
adequação dos equipamentos de proteção individual às peculiaridades da missão e
uma prévia análise dos perigos que o operacional vai combater. Ressalta, porém,
139

que não é conveniente empregar pelotões de policiais motociclistas diretamente


contra grandes massas, nem mesmo em bailes funks.
Com relação às dificuldades do emprego de policiais motociclistas na
Gestão de Multidões, ressalta a questão da segurança dos policiais, tendo em vista
a falta de equipamentos adequados, doutrina padronizada e treinamento
direcionado.
Por outro lado, entende como aspecto positivo, a capacidade de chegar
rapidamente ao local e acredita que o emprego de policiais motociclistas no Controle
Multidões deve ser direcionada para as áreas mediatas do evento e atuar
respeitando a distância de operação. O emprego deve priorizar ações preventivas.
Por fim, enfatiza que a capacidade de chegar rapidamente ao local não é
sinônimo de eficiência e que deve ser respeitado o trinômio da eficiência: homem,
equipamento e treinamento.

5.3 Entrevista com Cel PM José Balestiero Filho

Entrevista realizada no dia 29 de outubro de 2020 com o Cel PM José


Balestiero Filho que, em 2013, era o Comandante do 2º BPChq e desde 1985 serviu
nas Unidades subordinadas ao CPChq.
Na visão do Oficial, as manifestações de 2013 são um marco na história do
Brasil, pois houve grande alteração na forma das pessoas manifestarem-se, e um
aumento expressivo da violência contra policiais e patrimônios públicos e privados.
As manifestações urbanas, antes de 2013 eram concentradas. Embora houvesse
ocasiões de confrontos, não havia um enfrentamento direto dos manifestantes
contra os Policiais. Não havia ações contínuas de danos a lojas, ônibus. O foco das
manifestações eram reivindicações determinadas e não haviam ações
indiscriminada de violência. Nas manifestações de 2013 não era possível identificar
uma reivindicação determinada por parte dos ativistas. A intenção deles era
simplesmente causar desordem e danos.
Na ocasião, a maior dificuldade enfrentada pela PMESP foi entender a forma
de atuação dos manifestantes e atuar com rapidez em grande quantidade de pontos
de quebra da ordem pública praticadas por manifestantes black blocs. Diante disso,
a maior dificuldade operacional foi deslocar o pelotão de choque pelas ruas e chegar
rapidamente ao local onde estava ocorrendo a quebra da ordem pública.
140

Diante da nova forma da manifestação que se apresentava (emprego de


violência), a PMESP foi surpreendida e teve dificuldades para agir de forma eficiente
para garantir a manutenção da ordem pública. Após a compreensão da nova forma
de atuação dos manifestantes, a Polícia Militar começou a distribuir melhor a tropa
no terreno, a se preparar adequadamente para as ações violentas dos ativistas black
bloc.
Com relação ao emprego do policiamento com motocicletas, o Oficial
entende que é possível, desde que o efetivo seja capacitado por meio de um intenso
e constante treinamento.
Lembra que em 2013, pois as patrulhas de motos eram empregas em
contenções, balizamento, pequenas desobstruções de vias. No entanto, nas ações,
as motos ficavam sozinhas e, muitas vezes eram derrubadas pelos manifestantes.
No entanto, com o aumento do enfrentamento dos manifestantes contra policiais,
sobretudo por grupos que utilizavam a tática black blocs com muita violência, o
policiamento com motocicletas foi deslocado para áreas mais afastadas, corredores,
em grandes avenidas como 9 de julho, Avenida 23 de maio. Acreditava-se que os
policiais motociclistas não estavam preparados para enfrentarem essa nova
realidade de grande violência praticada pelos ativistas. Os policiais motociclistas
tinham capacidade para chegar rapidamente aos locais de quebra da ordem, porém
não tinham equipamentos adequados, nem mesmo treinamento para enfrentarem
com sucesso ativistas violentos que insurgiam contra a tropa.
Em termos de dificuldades, o Cel PM Balestiero entende que são os
principais pontos: a segurança dos Policiais, falta de equipamentos adequados,
doutrina padronizada e treinamento direcionado. Como ponto positivo, destaca a
capacidade de chegar rapidamente ao local e liberar o acesso para que os pelotões
de choque convencionais cheguem.
Afirma que o policiamento com motocicletas pode contribuir em situações
que os pelotões de choque regulares têm dificuldade para chagar no local das
manifestações, fornecendo uma pronta resposta inicial de reestabelecimento da
ordem e liberação dos acessos. Certamente, o emprego de policiamento com
motocicletas nessas situações demanda um forte e contínuo treinamento dos
policiais.
Citou os exemplos de uma manifestação, na Rodovia Castelo Branco, na
região de Carapicuíba, em 2013, interditou os dois sentidos da via, com veículos
141

parados inclusive nos acostamentos tornando impossível acessar o local por meio
de viaturas quatro rodas, sobretudo com veículos pesados de transporte de pelotões
de Choque. Para chegar ao local, o pelotão de choque foi obrigado a desembarcar
da viatura a 4 Km de distância da manifestação e percorrer todo caminho correndo
entre os carros, carregando todos os equipamentos, como escudos, armas,
munições químicas etc. Nessa ocasião, a atuação de um pelotão de motocicletas,
permitiria um acesso rápido dos policiais ao local, e o desenvolvimento, ao menos
inicial, das medidas de desobstrução da via, para que fosse possível a chegada dos
pelotões de choque regulares. Outro exemplo refere-se às manifestações ocorridas
também em 2013 no aeroporto internacional de Guarulhos. Nessa ocasião, os
Pelotões de Choque foram acionados por volta das 18h e tiveram muita dificuldade
de chegar ao local pois as vias de acesso estavam totalmente obstruídas. O
emprego de um pelotão de motos permitiria uma resposta rápida e a desobstrução
da via para a chegada de apoio.

5.4 Entrevista com o Major PM Aparecido Denami Júnior

No dia 16 de outubro de 2020, foi entrevistado o Maj PM Denami, o qual


serviu de 1991 a 2020 em Unidades subordinadas ao Comando de Policiamento de
Choque (1º, 2º e 3º BPChq), bem como na sede do CPChq. No ano de 2013
acompanhou as manifestações, pois estava na função de Ajunto de Inteligência da
Agência de Área, do CPChq.
Para o Oficial, o ano de 2013 pode ser considerado um marco para as
manifestações no Brasil entendendo que houve forte impacto na forma de
organização e condução das manifestações, nas características dos manifestantes e
na estratégia de atuação utilizada pelos manifestantes. O grande diferencial foi uso
da violência e destruição do patrimônio (público e privado).
Como integrante do sistema de inteligência considera que a maior
dificuldade operacional foi cobrir toda a área de atuação dos manifestantes que se
dividiam em células.
Na opinião do entrevistado, nas primeiras manifestações de 2013, que
tinham como foco o aumento da tarifa de ônibus na cidade de São Paulo, a PM não
tinha a expertise da tática black bloc; portanto, houve a necessidade de inúmeras
adequações, como a atuação da tropa, principalmente para acompanhar "in loco" os
142

manifestantes, inclusive com o emprego da tática do "envelopamento". No momento


do ato propriamente dito, a tática black bloc provocava um estouro de multidão com
ataques aos policiais militares e aos patrimônios. E após esse primeiro ataque,
formavam células para ataques pontuais, o que não era, no primeiro momento,
acompanhado pela PM.
A partir de 2013 os manifestantes se tornaram extremamente violentos,
sendo identificada a existência de estratégia ou táticas definidas por esses,
sobretudo para praticar atos de violência, ludibriar ou enfrentar a polícia ou outras
instituições públicas. Observou-se que desde os dias que antecediam as
manifestações, integrantes desse grupo interagiam através das redes sociais, pré-
definindo os locais e alvos da violência.
Diante da problemática, A PMESP agia respaldada nos seus ensinamentos
de Controle de Multidões, com o Policiamento de Área atuando diretamente no
momento da manifestação e a tropa de Choque posicionada em pontos para o apoio
do policiamento territorial. Ocorre que com a difusão da tática black bloc, toda a
manifestação passou a ter a atuação obrigatória da Tropa de Choque.
Após as manifestações de 2013, a PMESP ainda atuava com base nos
protocolos já definidos, porém com a tropa territorial lançando mão de um grupo de
policiais que passaram por um treinamento específico que encabeçava a testa da
manifestação e suas laterais, fechando (envelopando) parte do agrupamento para
evitar a explosão.
Como dificuldades, verificou que eram utilizadas barricadas, muitas vezes,
com fogo (lixo, veículos, caçambas) para impedir a passagem de viaturas, onerando
os deslocamentos que, por vezes, tinham que aguardar a ação dos bombeiros para
prosseguir. Não obstante após o "estouro" provocado pela tática black bloc, os
manifestantes utilizavam vias estreitas ou corredores para a fuga, dispersando nas
estações de metrô.
Com relação ao emprego do policiamento com motocicletas, entende pode
ser empregado nas ações direcionadas à Gestão de Multidões (Administração
Controle), principalmente no acompanhamento do grupo e, caso ocorra, na
realização de uma atuação rápida aos pequenos grupos.
Ressalta que antes de 2013, o policiamento com motocicleta, praticamente,
não atuava repressivamente, ou o fazia como forma de contenção do trânsito, num
balizamento estacionado.
143

O Maj Denami percebe que não houve mudanças relevantes no emprego do


policiamento com motocicletas na Gestão de Multidões a partir de 2013 e para ele, a
própria condução da moto e a exposição do policial condutor, nas situações de
repressão e prevenção, são dificuldades enfrentadas para o emprego de policiais
motociclistas na gestão de multidões.
Como ponto positivo para o emprego do policiamento com motocicletas,
ressalta a facilidade de deslocamento, atuação pontual e rápida e solução
importante de logística para reabastecimento do efetivo empregado (munição não
letal).
Por fim, entende que o policiamento em apoio à tropa territorial no
deslocamento dos manifestantes (atuação mais distante, porém com plena visão do
movimento) e atuação em patrulha para dispersar grupos menores de manifestantes
(repressão), ressaltando que as patrulhas devem ser formadas com número superior
a dois policiais motociclistas (ideal patrulha com três ou mais).

5.5 Entrevista com o Major PM Luís Humberto Caparroz

No dia 19 de dezembro de 2020, foi entrevistado o Maj PM Luís Humberto


Caparroz, o qual possui experiência na atividade de Gestão de Multidões, pois
serviu no 13º BPM/M (de 1996 a 2002), no 7º BPM/M (de 2013 a 2015) e no CPA/M-
1 (de 2018 a 2020). À época das manifestações de 2013 era Comandante de
Companhia Matricial.
Durante esse período atuou em manifestações expressivas, como: na
década de 90 e de 2000 (envolvendo movimentos sociais), manifestações de 2013
(presença de ativistas de tática black bloc), manifestações durante o processo de
impeachment da Presidente Dilma e nas manifestações após eleições presidenciais
de 2018 (contra e a favor do Presidente Bolsonaro).
Na opinião do entrevistado, o ano de 2013 é considerado um marco para as
manifestações no brasil, porque teve forte influência das redes sociais e atraiu
milhares de pessoas e de ativistas de tática black bloc, que participavam das
manifestações para depredar patrimônio público e privado e agredir opositores e
policiais militares. Entende que houve mudanças na maneira de se organizar o
planejamento de policiamento, que passou a levar em consideração as mudanças
observadas tanto em relação ao maior número de pessoas participantes, como
144

também a presença dos ativistas de tática black bloc, os quais incrementaram mais
violências às manifestações.
Em termos de dificuldade operacional, relata que houve problemas no
monitoramento, acompanhamento e detenção dos ativistas de táticas black bloc
antes da quebra da ordem, ou o mais rápido possível após a quebra da ordem, para
minimizar os impactos causados.
O Oficial registra que a PMESP acertou no monitoramento das redes sociais,
antes, durante e depois das manifestações, no treinamento constante do efetivo de
gestão de multidões e na criação de protocolos de gestão de multidões. Por outro
lado, entende que houve falta de equipamentos, falta de treinamento do efetivo de
apoio que era escalado para operar nas manifestações advindos de Unidades de
outros Batalhões que não os do Centro de São Paulo e falta de integração de
comunicação, por rádio, de todos os comandantes que eram empregados nas
grandes manifestações.
Relativamente à estratégia da PMESP, relata que antes de 2013, havia
somente treinamento de Controle de Multidões e, após 2013, iniciaram-se
treinamentos de Gestão de Multidões e intensificaram-se os treinamentos de
Choque Motorizado integrando as ROCAM com as Forças Táticas, além da criação
da Companhia de Ações Especiais de Polícia (embrião do 7º BAEP). Ademais, após
as manifestações de 2013, houve atuação integrada no planejamento das ações de
Gestão de Multidões e Controle de Multidões.
Destaca que houve um tempo de adaptação para que se pudesse criar uma
doutrina de Gestão de Multidões integrando os efetivos empenhados na gestão e
controle de multidões, o que pode ser considerado uma importante dificuldade.
Especificamente com relação ao emprego do policiamento com motocicletas
nas ações direcionadas à Gestão de Multidões, informa que já existe treinamento
para isso integrando as ROCAM às viaturas de 4 rodas, sejam FT ou BAEP.
Atualmente, seria necessário treinar as ROCAM e FT que apoiam as operações na
área central, pois em outras Unidades da PM esse treinamento ainda é
desconhecido.
Notou que antes de 2013 essas tropas atuavam separadamente e a partir de
2013 passaram a trabalhar de maneira integrada às viaturas de FT e, hoje, BAEP,
sendo considerada uma importante contribuição para a atuação da PMESP nas
manifestações públicas.
145

Finalizando, as dificuldades relatadas pelo Oficial para o emprego de


policiais motociclistas na Gestão de Multidões residem na questão da segurança,
pois esses militares estão mais suscetíveis a agressões, como aquelas realizadas
com o uso de coquetéis Molotov. No entanto, entende que existem aspectos
positivos com destaque à maior agilidade, facilidade de integração à FT e BAEP e
ação de presença.

5.6 Entrevista com o Capitão PM Valdinei Arcanjo da Silva

A entrevista com o Cap PM Valdinei Arcanjo da Silva ocorreu no dia 10 de


dezembro de 2020. O Oficial serve no 2º BPChq desde 2001 e possui experiência
como Comandante de Pelotão de Choque, Comandante de Companhia de Polícia
de Choque, Chefe da Agência de Área e Oficial de Planejamento e Operações. Em
2013, atuou como Oficial de Inteligência do 2º BPChq.
Relatou que aquele ano pode ser considerado um marco para as
manifestações no Brasil, pois o país conheceu a tática black bloc que trouxe grandes
desafios para o sistema de justiça, principalmente para as Polícias Militares e que
deixaram um sentimento de impunidade, pois poucos foram detidos e, de fato,
responsabilizados.
Devido à imprevisibilidade do momento da quebra da ordem e da dispersão
no terreno em que grupos menores davam continuidade à prática da violência, a
Polícia Militar precisou adequar o seu planejamento e lançar mão de atuação de
diversas Unidades Operacionais, além do CPChq.
Entende que a maior dificuldade operacional enfrentada pela PMESP foi
comunicação entre as tropas empregadas nas operações. Como pontos positivos
destaca: monitoramento das redes sociais, monitoramento in locu e mobilização de
efetivo para garantir a continuidade das ações. Por outro lado, identifica que houve
falta de comunicação, falta de atuação integrada e mistura de tropas de diversas
áreas em um mesmo local de atuação.
Destaca que a estratégia da PMESP referente à gestão de multidões, antes
de 2013, limitava-se à atuação convencional, tendo as Forças Táticas locais e os
Batalhões de Choque como forças a serem acionadas e que após, passou a
empregar tropas matriciais e dos Batalhões de Choque (ocupação do terreno e
146

demonstração de força), bem como de uma maior antecipação do setor de


inteligência (monitoramento das redes sociais).
Esclareceu que a maior dificuldade na área de Inteligência foi a manutenção
de uma comunicação eficiente com os agentes a fim de receber informações da
forma mais célere, bem como com o escalão operacional. Destaca que foi verificado
certa dificuldade no estabelecimento do Comando da operação quando da
necessidade de atuação para o restabelecimento da ordem.
Com relação ao emprego do policiamento com motocicletas na Gestão de
Multidões, entende que é perfeitamente possível, pois se trata de uma ferramenta
que permite agilidade na resposta tanto para ocupar terreno quanto para atuar em
pequenos focos de quebra da ordem, destacando que a maior dificuldade é a
questão da segurança, mas que o grande ganho operacional está na possibilidade
de se chegar em locais onde os Pelotões de Choque, de Força Tática e BAEP não
conseguem, bem como de atuar em pequenos e espalhados focos de quebra da
ordem, pois devido às peculiaridades dos Pelotões convencionais de Controle de
Multidões, não é possível deslocamento rápido a esses pontos.
Por fim, entende que o policiamento com motocicletas pode contribuir para a
manutenção da ordem pública em manifestações atuando em pequenos focos de
quebra da ordem, na demonstração de força, na preservação de locais de interesse
e em pontos que, devido à obstrução das vias, as tropas convencionais de Controle
de Multidão não conseguem chegar, como o ocorrido na greve dos caminhoneiros.

5.7 Pesquisa em Polícias Militares de outros Estados

Com intuito de capitanear boas práticas em outras instituições policiais, no


período de 01 a 30 de dezembro, de 2020, foi encaminhado questionário às Polícias
Militares dos Estado da Federação, por meio do link
https://forms.gle/PiJVcSse5R2zkcuQA, a fim de se verificar o nível de evolução do
policiamento com motocicletas, diante dos novos desafios apresentados por uma
sociedade de constantes mudanças. A perguntas foram respondidas por Oficiais da
Polícia Militar de cada Estado, atuante na atividade de policiamento com
motocicletas, ou com experiência anterior. Foram consultados os seguintes Estados:
Bahia, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Amazonas, Minas Gerais,
Ceará, Goiás, Paraná, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, e Mato Grosso.
147

Das respostas recebidas, constatou-se que:


a) Somente Minas Gerais e Rio Grande do Sul não atuam com policiais
duplamente embarcados em motocicletas;
b) Somente os estados de Goiás e Rio Grande do Sul não empregam o
policiamento com motocicletas em manifestações públicas;
c) As Polícias Militares da Bahia, Santa Catarina, Moto Grosso do Sul,
Amazonas e Rio de Janeiro empregam o policiamento com motocicletas
diretamente em ações de controle de multidões e os demais estados
utilizam-no nas imediações das manifestações, terminais de ônibus,
estações de trem e vias de deslocamento de pessoas;
d) A Polícia Militar de Santa Catarina informou possuir normas que tratam do
assunto, porém não foi disponibilizado material que demonstre o emprego do
policiamento com motocicletas em manifestações públicas. No Rio de
Janeiro existe uma Nota de Instrução que se encontra em fase de análise,
aguardando publicação pelo Comando da Instituição.
Percebe-se que o tema ainda carece de discussão, pois as Instituições
empregam o policiamento com motocicletas com diversos objetivos e metodologia.
No entanto, as algumas Polícias Militares já empregam o policiamento no Controle
de Multidões e no modelo engarupado, convergindo com as hipóteses ora
defendidas nesta pesquisa.
148

6 PROPOSTA DE ATUAÇÃO DO POLICIAMENTO COM MOTOCICLETAS NO


CONTROLE DE MULTIDÕES

O emprego do policiamento com motocicletas no controle de multidões pode


ser considerado uma das grandes ferramentas a ser utilizada para a preservação da
ordem pública diante das manifestações contemporâneas porque detém grande
capacidade de adaptar-se às incertezas, à alta velocidade de transformação do
cenário de operações e às mudanças de decisões e táticas dos grupos ativistas que
se relacionam em um complexo e ágil sistema de redes de comunicação.
Nos dias de hoje, com raras exceções, o emprego dessa atividade
operacional resume-se a ações preventivas em áreas mediatas, ações de presença
e de acompanhamento da multidão, porém, suas características de mobilidade,
flexibilidade, velocidade de resposta e capacidade de adaptação ampliam de forma
importante sua capacidade, tornando essa atividade operacional muito atual e
necessária para combater os desafios de segurança pública dentro desse cenário
volátil, incerto, complexo e ambíguo pelo qual passa a sociedade.
O policiamento com motocicletas tem capacidade para ser empregado no
Controle de Multidões, tanto em ações de intervenção direta, quanto indireta, no
entanto, é importante que sejam observadas suas limitações e características
favoráveis que, se aproveitadas de maneira adequada, importará em importante
alternativa para que a missão tenha sucesso.
A atuação das equipes de policiais motociclistas na contenção e
acompanhamento de multidões deve ser bem avaliada, tendo em vista que, nessas
condições, os militares tornam-se muito vulneráveis às ações hostis praticadas pelos
ativistas, sugerida pela sensível diminuição da sua distância de operação. Assim,
preferencialmente deve ser empregada como apoio a uma outra tropa que será
responsável por tais medidas.
Não é adequado que o policiamento com motocicletas seja empregado em
ações de administração de multidões que proporcione o contato direto entre as
equipes policiais e a multidão manifestante, primeiro porque expõe de forma
significativa o policial, segundo porque deixa de aproveitar o seu grande potencial se
empregado em outras circunstâncias.
Em princípio, a regra de emprego do policiamento com motocicletas no
Controle de Multidões é a atuação em áreas mediatas, em formato de Equipes de
149

Resposta Rápida (ERR) que atuam de forma autônoma, porém sob comando, contra
grupos menores e dispersos de manifestantes.
É possível o emprego de policiais motociclistas diretamente no controle de
grandes multidões, no entanto, nessas ocasiões, devem-se utilizar os princípios,
técnicas e táticas relacionada ao emprego de pelotão de choque a pé convencional,
ou seja, as motocicletas devem ser estacionadas em local seguro com relação à
área imediata, e os escudos e equipamentos fornecidos pela viatura de apoio, que
os acompanhará.
O emprego do policiamento com motocicletas no Controle de Multidões é
uma entre diversas atividades operacionais que deve compor, sistematicamente, o
complexo processo de gestão de incidentes críticos relacionados às manifestações
públicas na PMESP. Visa, portanto, fornecer ao Comandante uma ferramenta ágil e
contundente, que deve ser capacitada a acompanhar e combater a velocidade e a
grande violência desencadeadas por grupos de ativistas extremistas que atuam nos
protestos contemporâneos.
Como parte do sistema de controle de multidões da PMESP, respeitadas as
adequações necessárias para garantir a eficiência e segurança dos policiais, as
ações desenvolvidas pelas tropas que realizam o policiamento com motocicletas,
certamente, devem seguir os princípios e conceitos descritos no manual que trata
do assunto na Instituição, o M-8-PM, como necessária medida de padronização e
sedimentação de objetivo institucional único de preservação da ordem pública, pela
atuação sistêmica dos ativos operacionais disponíveis.

6.1 Princípios de Controle de Multidões por tropa de policiais motociclistas

O manual de Controle de Multidões da PMESP indica importantes princípios


a serem seguidos por tropas responsáveis por desempenhar ações de manutenção
da ordem pública diante de multidões, quais sejam:

1. O Controle de Multidões visa assegurar o cumprimento das leis e


determinações das autoridades constituídas.
2. O Controle de Multidões visa assegurar o restabelecimento da ordem,
atentando para a proporcionalidade das ações.
3. Para o Controle de Multidões devem ser observados rigorosamente os
critérios da disciplina tática, técnica e operacional, com destaque às
distâncias de segurança e de operação, à atuação mediante ordem, ao
adequado uso da força, a não ação isolada e ao fiel cumprimento das
alternativas táticas.
150

4. As ações de Controle de Multidões devem ser precedidas de identificação


e análise dos riscos e avaliação das características do teatro de operação.
5. Os policiais militares participantes de operações de Controle de Multidões
devem possuir alta resiliência e capacidade de adaptação à missão.
6. Nas operações de Controle de Multidões, os policiais militares devem
atuar com isenção de ânimos.
7. O sucesso das operações de Controle de Multidões depende de
treinamento constante.
8. Toda a atuação deve ser precedida de conhecimento e análise da
multidão.
9. As operações de Controle de Multidões devem ocorrer com comunicação
eficiente e integrada (PMESP, 2018, p. 21 - 22).
Certamente, todos os princípios apontados têm grande importância,
sobretudo os relacionados ao cumprimento das leis, respeito aos direitos humanos e
segurança do policial-militar.
Importante destacar, porém, algumas questões que recaem diretamente nas
ações desenvolvidas por policiais motociclistas no Controle de Multidões.
O pelotão de policiais motociclistas, enquanto estruturado no formato de
equipes e grupos de resposta rápida, não substitui o pelotão convencional de
Choque, ao contrário, atua de forma complementar ou preliminar nas situações em
que sua capacidade logística e de segurança não são suficientes para dissolver a
crise.
Quando a missão de manutenção da ordem pública exigir maior capilaridade
combativa (ex.: tática black bloc), o pelotão de motos atuará em áreas mediatas,
complementarmente ao pelotão de choque convencional que está com a
incumbência de atuar sobre a área imediata onde se encontra a concentração
principal de manifestantes.
Nas situações em que o pelotão de choque convencional ou motorizado
(quatro rodas) não consegue alcançar o local do incidente crítico, em razão do
terreno ou da existência de obstáculos que bloqueiam o percurso (congestionamento
de veículos, por exemplo), se a dimensão do incidente exigir grande emprego de
força para suas resolução, o pelotão de policiais motociclistas atuará de forma
preliminar, visando desencadear a primeira resposta para contenção do incidente e
liberação das vias de acesso para a chegada de apoio, mesmo porque, possui
limitação de segurança e logística (equipamentos, armamentos e munições).
Assim, em grandes manifestações, a atuação de pelotões de motociclistas
está condicionada à possibilidade de apoio próximo de pelotões de choque
convencionais, a menos que estejam também atuando nesse formato.
151

A comunicação eficiente e integrada entre os policiais componentes da


equipe, entre as demais equipes do pelotão, equipe de apoio (viatura quatro rodas) e
com os comandantes, é fator essencial para a atuação, pois permite contato e ação
rápida contra o incidente crítico, ao mesmo tempo que cria a possiblidade de apoio
nas ocasiões em que a equipe depara com incidentes sobre os quais não detém
capacidade operacional para atuar sozinha, dando segurança aos policiais.
Vale destacar ainda a necessidade de manutenção de distância de operação
segura, a qual deve ser observada com muita atenção pelos policiais motociclistas,
uma vez que é latente sua vulnerabilidade diante de agressões, principalmente pelo
arremesso de objetos.
Pela sua vulnerabilidade e equipamentos de proteção menos efetivos, as
Equipes e Grupos de Resposta Rápidas detêm um caráter ofensivo na sua atuação,
respeitando a distância de operação. A atuação defensiva pode facilmente desgastar
a célula, provocar uma derrocada na missão e importantes riscos à integridade dos
policiais.
Para a aplicação dos pelotões de Resposta Rápidas, embora detenham uma
estrutura básica de organização e distribuição de funções inicial, é importante se
prever a capacidade de adaptação às condições e circunstâncias de momento.
Para o emprego de pelotão de policiais motociclistas no Controle de
Multidões, é essencial que haja em sua composição, ao menos, uma equipe
ocupando viatura leve 4 rodas, que será responsável pelo apoio logístico, condução
de detidos e socorro de feridos.
Por fim, a ações isoladas nessas circunstâncias e condições é inadmissível.

6.2 Finalidade do emprego do pelotão de motociclistas no Controle de


Multidões

O emprego do pelotão de motociclistas no controle de multidões tem a


finalidade de intervir de forma rápida e eficiente para neutralizar os incidentes
críticos ou conter a disseminação dos seus efeitos, para tanto serão denominados
de Equipes, Grupos e Pelotão de Resposta Rápida.
Utilizam-se as características favoráveis decorrentes do uso de motocicletas
(mobilidade, flexibilidade, ostensividade e capacidade responsiva – velocidade), para
aumentar a capilaridade de ação, adequando-se às mudanças inesperada de
152

cenário e circunstâncias da crise, provocando no cidadão de bem uma maior


sensação de segurança e, nos causadores do incidente crítico, o sentimento de
frustação e medo pela grande possibilidade de ser surpreendido na prática de
conduta ilegal e preso.
Quando empregados no formato de equipes, grupos ou pelotão de resposta
rápida executam:
e) ação de presença na área mediata às manifestações;
f) ações diretas de Controle de Multidões contra grupos violentos menores
e dispersos;
g) ações em locais de difícil acesso pelas tropas convencionais.
Quanto às ações indiretas de contenção e acompanhamento, seu emprego
deve estar condicionado a uma importante análise de vulnerabilidade do policial,
uma vez que sua segurança é significativamente reduzida pela sensível diminuição
da distância de operação.

6.3. O emprego de policiais duplamente embarcados

Empregar Policiais duplamente embarcados em motocicletas para


desenvolvimento de atividades operacionais de policiamento ostensivo é algo que
começa a ser discutido em âmbito da PMESP, acadêmica e informalmente.
Vieira (2019), após realização de estudo de viabilidade para o emprego de
policiais duplamente embarcados em motocicletas nas manifestações públicas,
concluiu pela comprovação dos efeitos positivos na implementação dessa técnica.
Observa-se, portanto, que em relação à hipótese apresentada no início da
pesquisa, ou seja, “que as motocicletas duplamente embarcadas poderiam
impactar no aumento da sensação de segurança das pessoas e dos
policiais, bem como positivamente na restauração da ordem pública”, foi
plenamente comprovada, pois a presença de um segundo policial junto à
motocicleta traria melhor sensação de segurança tanto ao policial quanto às
pessoas ao seu redor, além de possibilitar melhor eficiência na atuação de
restauração da quebra da ordem por aumentar o número de policiais
militares para serem empenhados nessas missões. (VIEIRA, 2019, p. 55)
E ainda complementa ao final que:

Também vale ressaltar que tais inovações permitirão melhor atuação dos
policiais militares ao serem empregados em manifestações públicas, além
da diminuição dos riscos desses policiais militares, que já estão impactados
pela própria vulnerabilidade da motocicleta em meio à multidão que, muitas
vezes, pode adotar comportamento hostil com a presença da policial, além
de melhorar a própria sensação de segurança das pessoas que participam
153

ordeiramente das manifestações fazendo valer do direito constitucional que


lhes é assegurado (VIEIRA, 2019, p. 56).
Ademais, unidade de policiamento com motocicletas de muitas Polícias
Militares dos Estados da Federação utilizam policiais duplamente embarcados para
o desenvolvimento de policiamento ostensivo. Nesse sentido, tem-se o Distrito
Federal, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Santa Catarina, Paraná, Rio de
Janeiro, Bahia, Ceará, Amazonas. Dentre os estados pesquisados, somente São
Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul não adotam essa técnica.

Figura 23 Patrulha do Grupo de Intervenção Rápida


Ostensiva, da Polícia Militar de Goiás (GIRO)

Fonte: PMGO, 2017, p. 20.

Não é objeto deste estudo o emprego de policiais duplamente embarcado


em motocicletas para o desenvolvimento de policiamento tático com motocicletas,
embora seja uma alternativa de uso na PMESP, sendo certo que o conhecimento a
respeito do assunto já está exaustivamente testado e sedimentado nos Manuais
outras Instituições Policiais Militares, sobretudo em Goiás, Ceará, Distrito Federal,
Bahia e Santa Catarina.
O emprego de policiais duplamente embarcados em motocicletas no
Controle de Multidões, portanto, possibilita que as características favoráveis
permitidas ao policial pelo uso da motocicleta, quais sejam mobilidade, flexibilidade,
ostensividade e capacidade responsiva, sejam aproveitadas, ao mesmo tempo em
que é concedida ao militar maior segurança à sua integridade física e capacidade
combativa, ou seja, torna a equipe policial mais eficiente.
Certamente, para a utilização dessa nova técnica, é necessário o
desenvolvimento de nova doutrina, reformulação de manuais, instruções,
154

procedimentos operacionais e visitas técnicas, visando a padronização e a


sedimentação do novo conhecimento.
Acredita-se que essa técnica, porém, assim como o emprego de
policiamento com motocicletas em ações diretas de Controle de Multidões devem
ficar restritos às tropas de Forças Táticas, de Ações Especiais de Polícia e
Batalhões de Choque, uma vez que que exige treinamento constante, domínio
absoluto das técnicas, táticas e procedimentos, entrosamento e disciplina técnica,
tática e operacional de todos componentes da equipe.
Propõe-se, por meio deste trabalho, para o Controle de Multidões, nessas
circunstâncias, o emprego de pelotões de policiais motociclistas, divididos em
equipes de respostas rápidas formadas, cada um, por três motocicletas e seis
policiais militares (três conjuntos piloto/garupa) dotados de capacidade operacional
para atuar de forma autônoma, apoiados por uma viatura leve quatro rodas.

Figura 24 Representação de uma equipe de resposta rápida

Fonte: O autor, 2021.

6.4 Adaptações de materiais e equipamentos

As adaptações e adequações de materiais e equipamentos aqui propostos


tem o objetivo de conceder capacidade operacional (combativa) aos policiais
motociclistas para desenvolverem a missão no Controle de Multidões.
Como já dito anteriormente não basta a equipe policial conseguir chegar
rapidamente ao local do incidente crítico, pois sem capacidade operacional, a equipe
resume-se a mera vítima dos turbadores.
155

A seguir são mencionadas adaptações mínimas necessárias para conceder


à equipe empregada no controle de multidões:

6.4.1 Fardamento

O fardamento para o policial motociclista deve ser encarado mais do que


uma parte da estética militar necessária ao exercício da Polícia Ostensiva. É,
portanto, um equipamento de proteção individual necessário como forma de mitigar
os efeitos dos riscos decorrentes das limitações apresentadas acima quais sejam:
vulnerabilidade a acidentes fatores naturais e ambientais. Note-se que a proposta
prevê proteções de joelhos, ombros e cotovelos.

Figura 25 Proposta de Calça para policial motociclista

Fonte: Inflajak, 2020.

Figura 26 Proposta de gandola para Policial Motociclista

Fonte: Inflajak, 2020.


156

Figura 27 Capacete utilizado por policial motociclista na PMESP

Fonte: O autor, 2021.

Figura 28 Proposta de botas

Fonte: Botas Vento

Figura 29 Luva utilizada por policial motociclista


na PMESP

Fonte: O autor, 2021.


157

A utilização do fardamento com proteções de cotovelo, ombro, joelhos, bota


com cano médio (com amortecimento e proteção na região da canela e ponta dos
pés), bem como capacetes e luvas, podem funcionar como proteção contra objetos
contundentes arremessados contra os policiais motociclistas.

6.4.2 Porta bastão

O bastão de borracha, embora já presente há muito tempo nas Polícias


Militares, ainda é um equipamento de emprego não letal muito eficiente no Controle
de Multidões para um possível confronto mais próximo.
De simples utilização, tamanho e peso que proporciona grande mobilidade
ao policial, o bastão de borracha permite que o policial se defenda de injusta
agressão, repelindo seu agressor sem, no entanto, causar lesões graves.

Figura 30 Porta bastão acoplado à motocicleta

Fonte: O autor, 2021.

6.4.3 Suporte para arma longa

Em 2013, o Cb PM Ricardo Campos Rocha, pertencente ao efetivo da


ROCAM do 2º Batalhão de Choque da PMESP, diante da sua grande experiência no
patrulhamento tático com motocicletas, construiu um equipamento para ser fixado na
viatura tipo motocicleta que possibilitaria ao policial transportar armas longas durante
o patrulhamento tático ou durante as escoltas de torcidas organizadas de futebol.
Nas escoltas de torcidas organizadas, o transporte de espingarda com
munições de elastômero foi desenvolvido em razão da grande frequência de
158

emboscadas praticadas por torcedores de agremiações antagônicas que atacavam o


comboio escoltado pelas equipes policiais, com rojões, pedras, bombas caseiras
etc.. Nessas situações, as equipes viam-se em situações com pouca capacidade de
reação às agressões.
No policiamento tático com motocicletas, o transporte de arma longa com
munição de elastômero surge como forma de garantir ao policial motociclista
capacidade de defesa em ocasiões em que criminosos são presos e indivíduos da
comunidade local tenta resgatar o detido da custódia policial, por meio de agressões
aos patrulheiros.
Também no patrulhamento tático, o transporte de arma longa com munição
real tem o objetivo de garantir capacidade operacional (combativa) aos policiais
motociclistas quando do atendimento de ocorrências graves e complexas, em que os
criminosos detenham grande poder de fogo. Não faz sentido a equipe de
policiamento com motocicletas utilizar suas características para diminuir o tempo de
resposta nas ocorrências se não for dotada de condições para responder às
possíveis agressões praticadas pelos criminosos.
Inicialmente, o suporte foi desenvolvido por meio da utilização de
policarbonato, peças de ferro, a alça de fechamento de um coldre e parafusos:

Figura 31 Motocicleta equipada com o primeiro


suporte de arma longa

Fonte: Cb PM Ricardo Campos Rocha, 2013.


159

Figura 32 Policial Militar utilizando suporte de


arma longa na motocicleta

Fonte: Cb PM Ricardo Campos Rocha, 2013.

Figura 33 Peças utilizadas para montagem do


protótipo do suporte de arma para motocicleta

Fonte: Cb PM Ricardo Campos Rocha, 2013.

No ano de 2016, foi identificada a necessidade de buscar amparo técnico e


normativo para a utilização do suporte na motocicleta, ocasião em que foi dado início
ao processo de aprimoramento do protótipo inicial. Para tanto, o Cb PM Ricardo
Campos Rocha e o Sgt PM Maciel de Melo Santos, ambos pertencentes ao efetivo
da 4ª Cia de ROCAM, entraram em contato com o Sr. Helton José Pereira,
engenheiro da empresa Helper´s Assessoria Organizacional que, de forma
voluntária e extremamente dedicada contribui durante mais de três anos na
construção de um novo protótipo para o suporte de arma longa, a partir da ideia
inicial construída pelo Cb PM Rocha.
Durante todo esse tempo, a cada melhoria, o equipamento foi testado em
operações reais e treinamentos, quanto a segurança, composição na dirigibilidade
160

da motocicleta, prática na execução de técnicas policiais etc.. E, a cada modificação,


passou por avaliação no Centro de Material Bélico da PMESP com o intuito de ser
avaliado quanto a segurança e possíveis danos no armamento transportado.
Todo teste e desenvolvimento do projeto foi autorizado pelo Sr. Cel PM
Nivaldo Cesar Restivo, à época comandante do Comando de Policiamento de
Choque, posteriormente Comandante Geral da PMESP e, atualmente, Secretário de
Estado de Assuntos Penitenciários.
O projeto atualmente aguarda autorização para utilização oficial.

Figura 34 Motocicleta da ROCAM com suporte de arma


longa

Fonte: 1º Sgt PM Maciel de Melo Santos, 2013.

Figura 35 Suporte de arma longa para motocicleta


(visão superior)

Fonte: 1º Sgt PM Maciel de Melo Santos, 2013.


161

Figura 36 Suporte de arma longa para motocicleta


(visão lateral)

Fonte: 1º Sgt PM Maciel de Melo Santos, 2013.

Figura 37 Policial Militar embarcado em motocicleta


com suporte para arma longa

Fonte: 1º Sgt PM Maciel de Melo Santos, 2013.

Em consulta ao engenheiro Helton, desenvolvedor do novo protótipo, foi


informado que o custo aproximado para o equipamento é de R$ 850,00.
O suporte foi desenvolvido para possibilitar o transporte de Fuzil Imbel IA2,
cal. 5,56, espingarda 12 gauge e carabina Taurus. 30. No entanto, existe a
possibilidade de a engenharia criar condições para o transporte, também, do
armamento de emprego não letal AM-640 (lançador de munições não letais), muito
eficiente para o controle de multidões a longas distâncias.
162

6.4.4 Transporte de granadas policiais e munições de emprego não letal

A quantidade de granadas policiais e munições de emprego não letal


transportada pelas equipes de policiais motociclistas é muito limitada e deve ser
considerada durante planejamento e cumprimento da missão.
Nas ações de Controle de Multidões, as granadas e munições de emprego
não letal podem ser acondicionadas em bornais e transportadas junto ao corpo do
policial quando da iminência de atuação, e na caixa de transporte quando em
deslocamentos maiores, para evitar possível lesão ao policial em caso de acidente.

6.4.5 Escudos portáteis

Embora um dos princípios do Controle de Multidões na PMESP seja a


manutenção da distância de operação (PMESP, 2018, p. 21 - 22), o uso de escudos
anti-tumultos é essencial para que o policial militar tenha segurança para atuar e
capacidade para promover a sua proteção e dos demais componentes da equipe,
sobretudo contra objetos lançados de forma parabólica.
A grande dificuldade para que policiais motociclistas utilizem escudo está
relacionada ao seu tamanho e a forma de transportá-lo.
A empresa Astro Equipamentos apresentou um escudo da fabricante Saint
Pro, com características que podem contribuir para que o policial motociclista possa
realizar seu transporte acondicionado em uma “mochila” e empregá-lo na ação:
dobrável, pequeno e leve.
A forma mais adequada de se transportar o escudo apontado deve ser
objeto de estudo e testes futuros, sendo que, por enquanto, sugere-se que, na
composição da equipe, os policiais motociclistas o transporte em mochilas próprias
presas ao colete tático.
163

Figura 38 Escudo anti-tumulto marca


Saint Shield – modelo LX3

Fonte: Saint Pro, 2020 (Disponível em:


https://saintpro.com/saintshield.
Acesso em 13 ago. 2020).

Figura 39 Policial motociclista transportando o escudo


em mochila

Fonte: O autor, 2021.

A empresa Saint Pro também tem em seu catálogo de produtos escudos


dobráveis, leves e com proteção balística de acordo com o nível III da norma NIJ
Standard. A aquisição desses modelos por tropas especializadas pode ser
164

considerada mais viável uma vez que ser para o emprego em ações de Controle de
Multidões de patrulhamento tático com motocicletas.

Figura 40 Escudo Balístico marca Saint


Shield – NIJ standard III

Fonte: Saint Pro, 2020 (Disponível em:


https://saintpro.com/saintshield.
Acesso em 13 ago. 2020).

6.5 Simbologia das funções nos pelotões de resposta rápida

Para melhor visualização e fins didáticos, a seguir serão apresentados


símbolos que representam as funções do pelotão de resposta rápida:

Figura 41 Simbologia para Pelotão de Resposta Rápida

Fonte: O autor, 2021 (adaptado do M-8-PM).


165

Em algumas ocasiões específicas, mediante avaliação do Comandante do


Pelotão de Resposta Rápida, determinado integrante do pelotão pode acumular
outras funções.

6.6 Equipe de Resposta Rápida (ERR)

A Equipe de Resposta Rápida (ERR) será formada por 6 (seis) policiais


militares e 3 (três) viaturas tipo motocicleta. Desta forma, os policiais militares
atuarão em duplas embarcados na motocicleta.

6.6.1 Divisão de funções enquanto embarcado

Durante o deslocamento ou no emprego em ações de presença, enquanto


embarcados, os componentes da equipe ocuparão seus lugares da seguinte
maneira:

Figura 42 Representação do posicionamento dos policiais embarcados

Fonte: O autor, 2021.


166

Figura 43 Equipe de Resposta Rápida embarcada

Fonte: O autor, 2021.

6.6.2 Divisão de funções desembarcados

Quando em atuação direta de Controle de Multidões, os policiais militares


ocupantes da garupa, desembarcam das motocicletas e desenvolvem as seguintes
funções:
a) 01 (um) Cmt de Equipe, exercido por Subtenente ou Sargento, que
acumulará a função de lançador;
b) 01 (um) escudeiro;
c) 01 (um) atirador;
Os pilotos das motocicletas devem permanecer, inicialmente, embarcados e
acompanhar os policiais a pé, posicionando-se à retaguarda da célula, sendo
responsáveis pela segurança da equipe durante a ação nas laterais e retaguarda.
Ao cessar os motivos da ação, ou em situações em que a distância entre os
policiais e os turbadores é grande e não permite uma ação da célula, a pé, capaz de
neutralizar ou conter os turbadores, face dinamicidade e velocidade de
deslocamento destes, a equipe rapidamente realiza o embarque nas motocicletas e
se desloca para que seja possível o reestabelecimento a partir de uma efetiva
distância de operação.
167

Figura 44 Equipe de Resposta Rápida desembarcada

Fonte: O autor, 2021.

Figura 45 Equipe de Resposta Rápida desembarcada

Fonte: O autor, 2021.

Em caso de necessidade e conveniência, o Cmt da Equipe poderá


determinar o estacionamento das motocicletas, ocasião em que dois policiais pilotos
permanecerão na segurança das viaturas e o terceiro assumirá a função também de
escudeiro, totalizando dois nesta função na ERR.

6.6.3 Logística

A fim de que seja possível atuar com eficiência e segurança, diante da


complexidade da missão e, ainda, considerando o emprego de policiais duplamente
168

embarcado, faz-se necessária a utilização de motocicletas tipo big traill, acima de


600 cilindradas (cc), dotadas de sistema de controle de tração e freios ABS.
A ERR, além do armamento e equipamentos individuais, transportará os
seguintes materiais:
a) 02 (dois) escudos anti-tumulto portáteis;
b) 02(duas) espingarda 12 Gauge para munições de emprego não letal;
c) 01 (um) AM-600 ou AM-640 para projeção de munições fumígenas;
d) 02 (dois) bornais com granadas policiais;
e) 04 (quatro) cassetetes – individual
Cada integrante da equipe deve portar individualmente rádio portátil para
comunicação.
Em situações específicas, baseado em informações de inteligência que
sinalizem o risco de agressões por disparos de arma de fogo contra a ERR, o GRR
ou PRR, o comandante de pelotão avaliará a conveniência de que seja transportada
também arma portátil com munição real.

6.7 Grupo de Resposta Rápida (GRR)

O Grupo de Resposta Rápida (GRR) será formado a partir da junção de


duas até quatro ERR, cuja necessidade deve ser avaliada por meio da análise da
multidão e das circunstâncias de momento. Sendo assim, terá a seguinte
composição:

6.7.1 Grupo de Resposta Rápida com 2 ERR

Será formado por 12 (doze) Policiais Militares e 06 (seis) motocicletas,


sendo:
a) 01 (um) Subten ou Sgt na função de Cmt de grupo que, pode acumular a
função de lançador em caso de necessidade de aumentar o poder de
dispersão do grupo;
b) 02 (dois) escudeiros;
c) 02 (dois) atiradores;
d) 01 (um) lançador.
169

Para a formação do GRR cada equipe disponibilizará, inicialmente, um


trinômio composto por um escudeiro, um lançador e 01 atirador. Assim, o grupo será
formado pela junção desses dois trinômios. Além de capacidade responsiva, a
formação em trinômios propõe maior organização e velocidade em caso de
necessidade de destituição do GRR e recomposição da ERR.

Figura 46 Representação do GRR com 2 ERR

Fonte: O autor, 2021.

Caso seja necessário, considerando as características do local de atuação,


as motocicletas à retaguarda podem se deslocar em outras formações (por três ou
por dois).

Figura 47 Representação GRR com 2 ERR –


motocicletas em formação por três

Fonte: O autor, 2021.


170

Figura 48 Representação GRR com 2 ERR –


motocicletas em formação por dois

Fonte: O autor, 2021.

A quantidade reduzida de escudeiros, nesse primeiro momento, deve-se à


necessidade de conceder capacidade combativa ao GRR, e maior amplitude de
atuação, visto que é princípio vital para essa tropa, a manutenção da distância de
operação segura.
Novamente, mediante a avaliação de momento, o Cmt do GRR poderá
determinar o estacionamento das motocicletas, a permanência de dois policiais
pilotos na segurança das viaturas (portando espingarda 12 Gauge com munição de
emprego não letal) e distribuir os outros quatro policiais que estavam como pilotos
nas funções que melhor servirem para o cumprimento da missão.
A flexibilidade e capacidade de adaptação dos GRR tornam-se necessárias
frente à volatilidade, rapidez e imprevisibilidade das manifestações contemporâneas.
A logística de um GRR será a soma dos equipamentos e materiais da
quantidade de ERR reunidas.

6.7.2 Grupo de Resposta Rápida com 3 ERR

Será formado por 18 (dezoito) Policiais Militares e 09 (nove) motocicletas, na


seguinte conformidade:
171

a) 01 (um) Subten ou Sgt na função de Cmt de grupo que, pode acumular a


função de lançador em caso de necessidade de aumentar o poder de
dispersão do grupo;
b) 03 (três) escudeiros;
c) 02 (dois) atiradores;
d) 02 (dois) lançadores;
e) 01 (um) segurança (portando espingarda 12 Gauge com munição de
emprego não letal)

Figura 49 Representação do GRR com 3 ERR

Fonte: O autor, 2021.

Figura 50 Representação GRR com 3 ERR –


motocicletas em formação por três

Fonte: O autor, 2021.


172

Figura 51 Representação GRR com 3 ERR –


motocicletas em formação por dois

Fonte: O autor, 2021.

6.7.3 Grupo de Resposta Rápida com 4 ERR

Será formado por 24 (vinte e quatro) Policiais Militares e 12 (doze)


motocicletas, na seguinte composição:
a) 01 (um) Subten ou Sgt na função de Cmt de Grupo
b) 04 (quatro) escudeiros;
c) 02 (dois) atiradores;
d) 03 (três) lançadores;
e) 02 (dois) seguranças (portando espingarda 12 Gauge com munição de
emprego não letal).
173

Figura 52 Representação do GRR com 4 ERR

Fonte: O autor, 2021.

Figura 53 Representação GRR com 4 ERR –


motocicletas em formação por três

Fonte: O autor, 2021.


174

Figura 54 Representação GRR com 4 ERR –


motocicletas em formação por dois

Fonte: O autor, 2021.

6.8 Pelotão de Resposta Rápida (PRR)

O Pelotão de Resposta Rápida será formado por 28 (vinte e oito) Policiais


Militares, 12 (doze) motocicletas e 01 (uma) viatura leve, organizado da seguinte
maneira:
a) 01 (um) Tenente na função de Cmt de Pelotão;
b) 01 (um) Subten ou Sgt na função de Auxiliar Cmt de Pelotão;
c) 06 (seis) Escudeiros;
d) 03 (três) lançadores;
e) 02 (dois) atiradores;
f) 02 (dois) seguranças.
175

Após realizar análise de riscos, das características da multidão envolvida na


manifestação, existência de grupos violentos, bem como qualquer outro fator que
influencia na quebra da ordem, poderá o Cmt de Pelotão decidir pelo emprego de
mais viaturas 4 rodas no pelotão.
O pelotão poderá atuar nesse formato desde o início da ação ou de forma
modular, na medida em que as ERR chegam ao local de reunião e passam a
incorporar o grupo.
Assim como nos GRR e ERR, o Cmt poderá, diante das circunstâncias
apresentadas, determinar o estacionamento das motocicletas e incorporar os pilotos
ao pelotão a pé, os quais poderão ampliar o número de escudeiros ou exercer outra
função.
Neste caso, é importante que a viatura leve 4 rodas acompanhe o pelotão a
pé com o objetivo de fornecer suporte logístico ou para encaminhar detidos.

6.8.1 Deslocamentos

Dependendo das condições da via e tráfego de veículos, os Pelotões de


Resposta Rápida poderão deslocar embarcados em coluna por um, coluna por dois
ou coluna por três, conforme as figuras seguintes:

Figura 55 Representação do deslocamento em coluna por um

Fonte: O autor, 2021.

Figura 56 Representação do deslocamento em coluna por dois

Fonte: O autor, 2021.


176

Figura 57 Representação do deslocamento em coluna por três

Fonte: O autor, 2021.

Em qualquer das formas de deslocamento, quando houver circunstâncias


que demandem o deslocamento emergencial do pelotão diante de um tráfego
intenso de veículos, para fins de preservação da segurança dos Policiais Militares,
dos demais condutores e pedestres, o Cmt de Pelotão poderá determinar que uma
das ERR utilize técnicas de escolta.
No entanto, a velocidade de deslocamento de um PRR deve ser condizente
com as normas de segurança, devendo ser respeitadas as peculiaridades do
emprego de policiais duplamente embarcados, bem como o transporte de material
bélico e equipamentos em quantidade maior que o patrulhamento tático ostensivo.

6.8.2 Formações

O Pelotão de policiais motociclistas, enquanto estruturado no formato


Pelotão de Resposta Rápida, em regra, utilizará a formação em linha, pois é
constituído com a finalidade de atuar com velocidade e flexibilidade, condições
necessárias para combater a imprevisibilidade e volatilidade que compõem os
incidentes críticos dinâmicos, características das manifestações públicas
contemporâneas. Neste caso, pela necessidade de agilidade, não haveria tempo
para maiores evoluções técnicas.
Nas ocasiões em que os pelotões de motociclistas assumirem o formato de
pelotão de choque a pé, as formações desenvolvidas devem respeitar o previsto no
Manual de Controle de Multidões da PMESP referente à atuação de Pelotão de
Choque convencional.
177

Figura 58 Representação do Pelotão de Resposta Rápida


na formação em linha

Fonte: O autor, 2021.

Figura 59 Representação do PRR na formação em linha –


motocicletas em formação por três

Fonte: O autor, 2021.


178

6.9 Treinamento

O treinamento é a condição principal para o sucesso das técnicas, táticas e


procedimentos propostos nesse trabalho, em razão das diversas inovações
apontadas que influenciam o policiamento com motocicletas e atuação no controle
de multidões.
As ações policiais, por si só, são dotadas de elevado grau de dificuldade e
complexidade e, em se tratando da atividade de policiamento com motocicletas,
essa realidade é ainda mais complexa, exigindo treinamento exaustivo.
Segundo Aguilar et al (2020, p. 33), “As estratégias para saírem da
abstração e ganharem concretude no mundo dos fatos, exigem pessoas dotadas
com conhecimentos especializados, habilidades específicas e proficiência no
manuseio de armas e de equipamentos adequados.”
O autor, citando Heal (2015, p.70) explica que:

Quanto melhores os equipamentos e mais habilidosas forem as pessoas


que os manejam, maior será a probabilidade de sucesso. Esta interface
entre pessoas e equipamentos é tão crucial quanto as próprias pessoas e
os seus equipamentos. Juntos compõe um “sistema de desempenho
humano”. Quando ocorrem falhas, esta conexão ente falhas e
equipamentos é frequentemente a causa. Compreensivelmente, tantos as
empresas como as instituições militares dedicam muito estudo para
entender e aperfeiçoas essa interface. O militar, em particular, gastou um
esforço considerável em tentar identificar e explicar as nuances e se refere
a essa interface como táticas, técnicas e procedimentos, ou, mais
frequentemente, apenas o acrônimo TTP. Nos termos mais simples, A TTP
refere-se às políticas, métodos e práticas para integrar equipamentos em
um sistema de desempenho humano. (HEAL, 2015 apud AGUILAR et al,
2020, p. 33-34).
Para os militares americanos, o Sistema de Desempenho Humano é
necessário para que os objetivos sejam atingidos e as estratégias efetivadas,
compreendendo o homem, TTP (técnicas, táticas e procedimentos) e equipamento.
(AGUILAR et al, 2020, p. 34)
A proposta de complementação do M-8-PM da PMESP aqui apresentada, se
considerada adequada, pode ser inserida no referido manual, após o Capitulo V
destinado às “Operações de Controle de Multidões com Apoio de Viaturas Leves”,
passando, portanto, a compor o Capítulo VI denominado “Operações de Controle de
Multidões com Viaturas Motocicletas”.
179

7 CONCLUSÃO

As manifestações de junho de 2013, em São Paulo, inauguraram uma nova


fase para os protestos no Estado e no Brasil, com características muito diferentes
dos movimentos tradicionais até então conhecidos. Contando com a participação de
diversos setores da sociedade e infiltração de grupos que utilizavam a tática black
bloc, criou-se um cenário de grande instabilidade social, danos ao patrimônio público
e privado e constantes confrontos entre ativistas e a Polícia Militar.
Com grande capacidade de comunicação, principalmente pelas redes
sociais, e sem liderança definida, esses grupos violentos passaram a atuar de forma
autônoma, dispersa, em pequenos grupos e fora do espaço geográfico previamente
definidos pelas manifestações planejadas ou organizadas.
A sua velocidade de ação e a imprevisibilidade construída pela ausência de
roteiro definido de atuação criou grande dificuldade para que a Polícia Militar
pudesse implementar ações de manutenção da ordem pública a fim de neutralizar
esses incidentes críticos ou, ao menos, mitigar os seus efeitos lesivos, por meio do
emprego dos ativos, técnicas, táticas e procedimentos disponíveis naquele
momento.
Diante dessa problemática, o presente trabalho foi iniciado com o objetivo de
estudar as capacidades do policiamento com motocicletas e seu emprego no
Controle de Multidões, além de identificar os fatores favoráveis, bem como os
restritivos à sua implementação, sobretudo nas ocasiões ora apresentadas.
Embora haja na PMESP uma doutrina consolidada e muito testada que trata
a respeito da gestão de multidões, inicialmente, a pesquisa apontou que não há
normas internas na Instituição que regulamente o emprego específico do
policiamento com motocicletas em ações diretas de Controle de Multidões. O POP
nº 4.06.02 prevê o seu emprego apenas em ações de acompanhamento pelo
posicionamento das equipes de policiais motociclistas em ruas transversais por onde
a manifestação passará ou em ações de controle do fluxo de trânsito.
No entanto, constatou-se que existem diversos fatores favoráveis ao
emprego de motocicletas em ações de policiamento ostensivo, tais como
ostensividade, flexibilidade, mobilidade e capacidade responsiva, apontados em
diferentes trabalhos acadêmicos mencionados nesta dissertação, bem como
180

identificadas pela experiência deste autor, adquirida durante o período em que


comandou Pelotão e Companhia de ROCAM enquanto serviu no 2º BPChq.
Quanto às restrições, acredita-se que, embora não possam ser totalmente
eliminadas, podem ser consideravelmente mitigadas, por meio de adequação de
equipamentos, fardamento e viaturas, além de definição de doutrina, técnicas,
táticas e procedimentos a serem padronizados na Instituição e, certamente,
acompanhados de intenso e contínuo treinamento dos policiais motociclistas.
Nesse sentido, propõe-se que, após possível normatização e padronização
das técnicas táticas e procedimentos, a disseminação do conhecimento alcance
todos os policiais motociclistas e, também, os comandantes que detêm o poder de
decisão em todos os níveis, para que o emprego do policiamento com motocicletas
alcance o seu potencial de eficiência, sem que haja uma exposição do policial militar
a riscos desnecessários e insuportáveis, além de permitir que essa importante
ferramenta seja empregada de forma sistêmica com os programas de policiamento e
demais atividades operacionais desenvolvidas pela PMESP durante o
gerenciamento de incidentes críticos relacionados ao controle de multidões.
Quanto ao objetivo inicial de viabilizar uma possível complementação do
Manual de Controle de Multidões da PMESP, no capítulo 6, é apresentada uma
proposta de equipamentos, técnicas, táticas e procedimentos destinados ao
emprego do policiamento com motocicletas no controle de multidões.
Importante salientar, no entanto, que as inovações indicadas preveem
adequações significativas nas técnicas, táticas, procedimentos e equipamentos a
serem implementadas pelo policial motociclista, recaindo em fatores importantes que
afetam diretamente, a segurança e integridade física do militar.
Além disso, entende-se que a atuação em formato de patrulhas destacadas
por meio de ações diretas contra grupos violentos não dispensa uma estrutura de
pelotão e definição de comandante responsável por coordenar as ações e fornecer
os apoios necessários. Exige, também, grande entrosamento entre os componentes
da equipe, além de treinamento específico e grau de adestramento elevado que,
pela estrutura e definição de missão, podem apenas ser alcançados por tropas de
Força Tática, Ações Especiais de Polícia e do Policiamento de Choque.
Portanto, com o objetivo de corrigir possíveis inconformidades práticas e,
principalmente, como forma de buscar ações que mitiguem ao máximo a exposição
da vida e integridade física do Policial Motociclista, sugere-se que, caso a proposta
181

de adequação seja considerada viável, sua implantação seja precedida por um


projeto piloto a ser desenvolvido, preferencialmente, com a participação de efetivo
da 3ª e 4ª Companhias de ROCAM, do 2º BPChq, órgão gestor do conhecimento na
PMESP, referente ao assunto de “policiamento com motocicletas”.
182

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Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública) - Curso de Aperfeiçoamento de
Oficiais, Centro de Altos Estudos de Segurança “Cel PM Nelson Freire Terra”,
Polícia Militar do Estado de São Paulo, São Paulo, 2019.
192

APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO AOS POLICIAIS MOTOCICLISTAS

O presente questionário foi encaminhado aos policiais militares motociclistas


por meio do link: https://forms.gle/VuQUatQb5UEes3Uv7

Questão 1: Há quanto tempo exerce a atividade de policiamento com motocicletas?


Questão 2: Conhece os conceitos de Gestão de Multidões previstos no M-8-PM?
Questão 3: Conhece a diferença entre os conceitos de Administração de Multidão e
Controle de Multidão previstos no M-8-PM?
Questão 4: Realiza treinamentos de Controle de Multidão na sua OPM?
Questão 5: Na sua opinião, o emprego de pelotão de motociclista no Controle de
Multidões é importante?
Questão 6: Na sua opinião, o emprego de policiais duplamente embarcados na
viatura tipo motocicleta (garupa), em ações específicas de Controle de Multidões,
pode proporcionar maior eficiência na ação policial?
Questão 7: Após a padronização de doutrina, técnica, tática e procedimentos, bem
como de realização de treinamentos, na sua opinião, é conveniente o emprego
policiais duplamente embarcados na viatura tipo motocicleta (garupa),
especificamente, em ações específicas de Controle de Multidões?
Questão 8: Qual a maior dificuldade em atuar no Controle de Multidões enquanto no
policiamento com motocicletas? (Poderia ser assinalada mais de uma opção)
Questão 9: Nas ocasiões de atuação no Controle de Multidões, atuou em que
formato? (Poderia ser assinalada mais de uma opção)
Questão 10: Quais os pontos positivos em atuar no Controle de Multidões enquanto
no policiamento com motocicletas? (Poderia ser assinalada mais de uma opção)
193

APÊNDICE B – ENTREVISTA COM OS COMANDANTES DE TROPA

ENTREVISTA DIRECIONADA A COMANDANTES DE TROPA QUE ATUARAM EM


MANIFESTAÇÕES PÚBLICA COM O FIM DE ANALISAR AS CARACTERÍSTICAS
DOS ATOS, DAS PESSOAS PARTICIPANTES E DAS FORMAS DE SE
MANIFESTAREM

Data:
Nome: Posto:
Período:
OPM que serviu Periodo:
Período:

Local que serve atualmente:

Função que exercia nas manifestações de 2013:

1) Manifestações expressivas na qual atuou

( ) década de 80
( ) década de 90
( ) década de 2000
( ) manifestações de 2013
( ) manifestações Impeachment Dilma
( ) manifestações após eleições presidenciais de 2018
( ) outra:

2) O ano de 2013 foi considerado um marco para as manifestações no Brasil. O


senhor concorda com essa afirmação?

3) O que mudou?
a) forma de organização e condução das manifestações
b) características dos manifestantes
c) estratégia de atuação utilizada pelos manifestantes

4) Na visão do senhor, quais as maiores dificuldades enfrentadas pela PMESP


194

durante as ações de preservação da ordem pública nessas manifestações?


a) antes de 2013
b) a partir de 2013
c) outra manifestação

5) Qual a maior dificuldade operacional?

6) O senhor pode citar, ao menos, 3 acertos e 3 erros da PMESP na gestão de


multidões nessas manifestações.

7) Na opinião do senhor, a partir de 2013, os manifestantes tornaram-se mais


violentos?

8) O senhor identificou o aparecimento de grupos com ideologias que pregam a


violência ou ações contrárias à lei e ordem?

9) Foi possível identificar a existência de estratégia ou táticas definidas por esses


grupos? Sobretudo para praticar atos de violência, ludibriar ou enfrentar a polícia ou
outras instituições públicas?

10) Qual era a estratégia da PMESP referente à gestão de multidões (administração


e controle de multidões), antes e durante as manifestações de 2013?

11) Qual era é a estratégia após as manifestações de 2013?

12) Quais as dificuldades encontradas no Controle de Multidões, enquanto Cmt


tropa a partir de 2013? (ex.: deslocamento de viaturas, trânsito, ruas inacessíveis,
velocidade de deslocamento, etc.)

13) O senhor acredita que o policiamento com motocicletas pode ser empregado
nas ações direcionadas à gestão de multidões, tanto na Administração (prevenção)
e Controle de Multidões (repressão)?

14) Como era o emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de Multidões


(Administração e Controle de Multidões) antes de 2013?
195

15) O que mudou no emprego de policiamento com motocicletas na gestão de


multidões a partir de 2013? existe outra data que tenha marcado mudança
expressiva no emprego?

16) Quais as dificuldades do emprego de policiais motociclistas na Gestão de


Multidões, tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no Controle de
Multidões (restabelecimento da ordem pública)?

17) Quais os pontos positivos do emprego de policiais motociclistas na Gestão de


Multidões? tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no controle de
multidões (restabelecimento da ordem pública)?

18) Na opinião do senhor, como o policiamento com motocicletas pode contribuir


para a manutenção da ordem pública em manifestações públicas.
196

APÊNDICE C – ENTREVISTA COM O CEL PM ALEXANDRE MONCLUS


ROMANEK

ENTREVISTA DIRECIONADA A COMANDANTES DE TROPA QUE ATUARAM EM


MANIFESTAÇÕES PÚBLICA COM O FIM DE ANALISAR AS CARACTERÍSTICAS
DOS ATOS, DAS PESSOAS PARTICIPANTES E DAS FORMAS DE SE
MANIFESTAREM

Data: 23/10/2020
OPM que serviu:
Serviu nas Unidades subordinadas ao Cmdo Pol Chq de 1993 a 2019
Função que exercia nas manifestações de 2013: Coordenador Operacional do 3º
BPChq

1) Manifestações expressivas na qual atuou.


R: Por ter servido em unidades subordinadas o Cmdo Pol Chq desde o ano de 1993,
atuou em diversas manifestações durante o período.
Entre as mais recentes pode indicar:
• Greve da Polícia Civil em São Paulo em 2008;
• Manifestações de 2013: diversas, MST, MSTT e manifestações com ativistas
de tática black bloc;

2) O ano de 2013 foi considerado um marco para as manifestações no brasil. o


senhor concorda com essa afirmação?
R: Sim, Houve grande mudança nas forma dos manifestantes atuarem.

3) O que mudou?
R: Nas manifestações tradicionais, antes de 2013, a intenção primária dos
manifestantes era buscar maior exposição das suas reivindicações na mídia e de
forma secundária, atingido seus objetivos, dispersavam-se, mas não com a intenção
inicial de praticar atos de violência, ao menos não de forma coletiva.
A partir das manifestações de 2013, parte dos manifestantes, principalmente
aqueles que se utilizavam-se da tática black bloc, deslocavam-se para os locais de
reunião com a intenção primária e secundária de praticar atos de violência, durante
197

a reunião ou na dispersão. Para isso, compareciam nos locais de manifestações


preparadas para o confronto com a polícia adotando meios de contra medida como
escudos artesanais, máscaras contra gases, artefatos explosivos e incendiários.

4) Na visão do senhor, quais as maiores dificuldades enfrentadas pela PMESP


durante as ações de preservação da ordem pública nessas manifestações?
R: A PMESP enfrentou problemas relativos à comunicação entre as tropas,
equipamentos de proteção individual adequados e uma série de limitações à forma
de atuação imposta pelo Poder Judiciário, decorrentes de ações judiciais que
questionavam as ações policiais.

5) Qual a maior dificuldade operacional?


R: A distribuição adequada das tropas e atividades operacionais no terreno, diante
das novas características de manifestação apresentadas.

6) O senhor pode citar, ao menos, 3 acertos e 3 erros da PMESP na gestão de


multidões nessas manifestações.
R: O principal equívoco, sobretudo nos momentos iniciais, foi a concentração da
maior parte dos ativos operacionais nas áreas imediatas ao local de reunião,
deixando enfraquecidas as áreas mediatas, onde ocorreram a maioria dos atos de
desordem

7) Na opinião do senhor, a partir de 2013, os manifestantes tornaram-se mais


violentos?
R: Sim, principalmente os ativistas que se utilizavam das táticas black blocs, os
quais compareciam nos locais de reunião utilizando contra medidas como escudos,
capacetes, máscara contra gases, bem como artefatos explosivos e incendiários,
estilingues, bolas de gude, “coquitéis molotov”, e outros meios de agressão

8) O senhor identificou o aparecimento de grupos com ideologias que pregam a


violência ou ações contrárias à lei e ordem?
R: Sim. Manifestantes que utilizavam a tática black bloc.
198

9) Foi possível identificar a existência de estratégia ou táticas definidas por esses


grupos? Sobretudo para praticar atos de violência, ludibriar ou enfrentar a polícia ou
outras instituições públicas?
R: Os manifestantes se comunicavam com velocidade e se organizavam pelas redes
sociais, buscavam o enfrentamento da polícia e autoridades de forma violenta.
Atuavam de forma descentralizada no terreno, pois não tinham liderança definida,
possuíam uma estrutura horizontal, ou seja, não eram direcionados por
organizações formais, tais como sindicatos ou partidos políticos.

10) Qual era a estratégia da PMESP referente à gestão de multidões (Administração


e Controle de Multidões), antes e durante as manifestações de 2013?
R: Por apresentar uma organização e estrutura horizontal, com liderança definida, as
manifestações tradicionais, antes de 2013, era mais previsível, localizada em um
espaço geográfico definido, com dimensão do enfrentamento menor. Desta forma, a
PMESP concentrava seus ativos operacionais na área imediata aos locais de
reunião e pontos de dispersão, ao término.

11) Qual era é a estratégia após as manifestações de 2013?


R: Inicialmente, a PMESP manteve a concentração dos ativos operacionais nas
áreas imediatas, porém teve grande dificuldade em garantir a manutenção da ordem
pública diante das ações descentralizadas e violentas dos grupos que utilizavam a
tática black bloc.

12) Quais as dificuldades encontradas no Controle de Multidões, enquanto Cmt


tropa a partir de 2013? (ex.: deslocamento de viaturas, trânsito, ruas inacessíveis,
velocidade de deslocamento, etc.)
R: Comunicação e deslocamento da tropa até os locais de quebra da ordem.

13) O senhor acredita que o policiamento com motocicletas pode ser empregado nas
ações direcionadas à Gestão de Multidões? Tanto na administração (prevenção) e
controle de multidões (repressão)?
R: Sim, desde que acompanhada de forte capacitação e treinamento dos policiais
motociclistas. Adequação dos Equipamentos de proteção individual às
199

peculiaridades da missão e uma prévia análise dos perigos que o operacional vai
combater.
Ressalta, porém, que não é conveniente empregar pelotões de policiais
motociclistas diretamente contra grandes massas, nem mesmo em bailes funks.

14) Como era o emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de Multidões


(Administração e Controle de Multidões) antes de 2013?
R: Patrulhamento nas áreas mediatas ao evento.

15) O que mudou no emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de


Multidões a partir de 2013? Existe outra data que tenha marcado mudança
expressiva no emprego?
R: Não houve mudanças significativas.

16) Quais as dificuldades do emprego de policiais motociclistas na Gestão de


Multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no Controle de
Multidões (restabelecimento da ordem pública).
R: A segurança dos Policiais, falta de equipamentos adequados, doutrina
padronizada e treinamento direcionado.

17) Quais os pontos positivos do emprego de policiais motociclistas na gestão de


multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no controle de
multidões (restabelecimento da ordem pública
R: Capacidade de chegar rapidamente ao local. Porém, reforça que a rapidez não é
sinônimo de eficiência.

18) Na opinião do senhor, como o policiamento com motocicletas pode contribuir


para a manutenção da ordem pública em manifestações públicas.
R: Acredita que o emprego de policiais motociclistas no Controle Multidões deve ser
direcionada para as áreas mediatas do evento e atuar respeitando a distância de
operação. O emprego deve priorizar ações preventivas. Enfatiza que a capacidade
de chegar rapidamente ao local não é sinônimo de eficiência. Deve ser respeitado o
trinômio da eficiência: homem, equipamento e treinamento.
200

APÊNDICE D – ENTREVISTA COM O CEL PM JOSÉ BALESTIERO FILHO

ENTREVISTA DIRECIONADA A COMANDANTES DE TROPA QUE ATUARAM EM


MANIFESTAÇÕES PÚBLICA COM O FIM DE ANALISAR AS CARACTERÍSTICAS
DOS ATOS, DAS PESSOAS PARTICIPANTES E DAS FORMAS DE SE
MANIFESTAREM

Data: 29/10/2020
OPM que serviu: Regimento de Polícia Montada “9 de Julho”, 2º e 3º BPChq.
Função que exercia nas manifestações de 2013: Comandante do 2º BPChq.

1) Manifestações expressivas na qual atuou.


R: Por ter servido em unidades subordinadas o Cmdo Pol Chq desde o ano de 1985,
atuou em diversas manifestações durante o período, sendo que dentre as mais
recentes pode indicar:
• Manifestações de 2013: diversas, MST, MSTT e manifestações com ativistas
de tática black bloc;
• Manifestações Impeachment da Presidente Dilma: manifestações contra e
outras a favor do impeachment.

2) O ano de 2013 foi considerado um marco para as manifestações no brasil. o


senhor concorda com essa afirmação?
R: Sim, pois houve grande alteração na forma das pessoas manifestarem-se, e um
aumento expressivo da violência contra policiais e patrimônios públicos e privados

3) O que mudou?
R: As manifestações urbanas, antes de 2013 eram concentradas. Embora houvesse
ocasiões de confrontos, não havia um enfrentamento direto dos manifestantes
contra os Policiais. Não havia ações contínuas de danos a lojas, ônibus. O foco das
manifestações eram reivindicações determinadas e não haviam ações
indiscriminada de violência.
201

Nas manifestações de 2013 não era possível identificar uma reivindicação


determinada por parte dos ativistas. A intenção deles era simplesmente causar
desordem e danos.

4) Na visão do senhor, quais as maiores dificuldades enfrentadas pela PMESP


durante as ações de preservação da ordem pública nessas manifestações?
R: Entender a forma de atuação dos manifestantes e atuar com rapidez em grande
quantidade de pontos de quebra da ordem pública praticadas por manifestantes
black blocs.

5) Qual a maior dificuldade operacional?


R: Deslocar o pelotão de choque pelas ruas e chegar rapidamente ao local onde
estava ocorrendo a quebra da ordem pública.

6) O senhor pode citar, ao menos, 3 acertos e 3 erros da PMESP na gestão de


multidões nessas manifestações.
R: A PMESP teve grande dificuldade inicial para entender o funcionamento dessas
novas manifestações, cometendo alguns erros. Porém, com o passar dos dias,
passou a empregar as diversas forma de policiamento de uma forma mais eficiente,
colhendo bons resultados.

7) Na opinião do senhor, a partir de 2013, os manifestantes tornaram-se mais


violentos?
R: Sim, com o emprego de táticas black blocs, os manifestantes atacavam
diretamente, viaturas, enfrentavam e atacavam policiais, prédios públicos e privados,
incendiavam lixos e ônibus.

8) O senhor identificou o aparecimento de grupos com ideologias que pregam a


violência ou ações contrárias à lei e ordem?
R: Sim. Houve grande participação de ativistas que utilizavam a tática black bloc.

9) Foi possível identificar a existência de estratégia ou táticas definidas por esses


grupos? Sobretudo para praticar atos de violência, ludibriar ou enfrentar a polícia ou
outras instituições públicas?
202

R: Os ativistas atuavam em grupos pequenos de até 12 pessoas, espalhado pela


cidade e com grande violência. Eram rápidos e violentos, praticavam saques a lojas,
praticavam danos e saíam.

10) Qual era a estratégia da PMESP referente à gestão de multidões (Administração


e Controle de Multidões), antes e durante as manifestações de 2013?
R: No início, diante da nova forma da manifestação que se apresentava, grande
violência, a PMESP foi surpreendida e teve dificuldades para agir de forma eficiente
para garantir a manutenção da ordem pública.

11) Qual era é a estratégia após as manifestações de 2013?


R: Após a compreensão da nova forma de atuação dos manifestantes, a Polícia
Militar começou a distribuir melhor a tropa no terreno, a se preparar adequadamente
para as ações violentas dos ativistas black bloc.

12) Quais as dificuldades encontradas no Controle de Multidões, enquanto Cmt


tropa a partir de 2013? (ex.: deslocamento de viaturas, trânsito, ruas inacessíveis,
velocidade de deslocamento, etc.)
R: Dificuldade em deslocar com o Pelotão de Choque e acessar os locais onde as
manifestações ocorriam, com a rapidez necessária.

13) O senhor acredita que o policiamento com motocicletas pode ser empregado nas
ações direcionadas à Gestão de Multidões? Tanto na administração (prevenção) e
controle de multidões (repressão)?
R: Sim, desde que capacitada por meio de um intenso e constante treinamento.

14) Como era o emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de Multidões


(Administração e Controle de Multidões) antes de 2013?
R: As patrulhas de motos eram empregas em contenções, balizamento, pequenas
desobstruções de vias. No entanto, nas ações, as motos ficavam sozinhas e, muitas
vezes eram derrubadas pelos manifestantes.
203

15) O que mudou no emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de


Multidões a partir de 2013? Existe outra data que tenha marcado mudança
expressiva no emprego?
R: Com o aumento do enfrentamento dos manifestantes contra policiais, sobretudo
por grupos que utilizavam a tática black blocs com muita violência, o policiamento
com motocicletas foi deslocado para áreas mais afastadas, corredores, em grandes
avenidas como 9 de julho, Avenida 23 de maio. Acreditava-se que os policiais
motociclistas não estavam preparados para enfrentarem essa nova realidade de
grande violência praticada pelos ativistas. Os policiais motociclistas tinham
capacidade para chegar rapidamente aos locais de quebra da ordem, porém não
tinham equipamentos adequados, nem mesmo treinamento para enfrentarem com
sucesso ativistas violentos que insurgiam contra a tropa.

16) Quais as dificuldades do emprego de policiais motociclistas na Gestão de


Multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no Controle de
Multidões (restabelecimento da ordem pública).
R: A segurança dos Policiais, falta de equipamentos adequados, doutrina
padronizada e treinamento direcionado.

17) Quais os pontos positivos do emprego de policiais motociclistas na gestão de


multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no controle de
multidões (restabelecimento da ordem pública
R: Capacidade de chegar rapidamente ao local e liberar o acesso para que os
pelotões de choque convencionais cheguem.

18) Na opinião do senhor, como o policiamento com motocicletas pode contribuir


para a manutenção da ordem pública em manifestações públicas.
R: Pode contribuir em situações que os pelotões de choque regulares têm
dificuldade para chagar no local das manifestações, fornecendo uma pronta resposta
inicial de reestabelecimento da ordem e liberação dos acessos.
Certamente, o emprego de policiamento com motocicletas nessas situações
demanda um forte e contínuo treinamento dos policiais.
204

Como exemplo, pode ser citado o ano de 2013, uma manifestação na Rodovia
Castelo Branco, na região de Carapicuíba, interditou os dois sentidos da via, com
veículos parados inclusive nos acostamentos tornando impossível acessar o local
por meio de viaturas quatro rodas, sobretudo com veículos pesados de transporte de
pelotões de Choque. Para chegar ao local, o pelotão de choque foi obrigado a
desembarcar da viatura a 4 Km de distância da manifestação e percorrer todo
caminho correndo entre os carros, carregando todos os equipamentos, como
escudos, armas, munições químicas etc.
Nessa ocasião, a atuação de um pelotão de motocicletas, permitiria um acesso
rápido dos policiais ao local, e o desenvolvimento, ao menos inicial, das medidas de
desobstrução da via, para que fosse possível a chegada dos pelotões de choque
regulares.

Outro exemplo refere-se às manifestações ocorridas também em 2013 no aeroporto


internacional de Guarulhos. Nessa ocasião, os Pelotões de Choque foram acionados
por volta das 18h e tiveram muita dificuldade de chegar ao local pois as vias de
acesso estavam totalmente obstruídas. O emprego de um pelotão de motos
permitiria uma resposta rápida e a desobstrução da via para a chegada de apoio.
205

APÊNDICE E – ENTREVISTA COM O MAJ PM APARECIDO DENAMI JÚNIOR

ENTREVISTA DIRECIONADA A COMANDANTES DE TROPA QUE ATUARAM EM


MANIFESTAÇÕES PÚBLICA COM O FIM DE ANALISAR AS CARACTERÍSTICAS
DOS ATOS, DAS PESSOAS PARTICIPANTES E DAS FORMAS DE SE
MANIFESTAREM

Data: 16/10/2020
OPM que serviu: 1º BPCHQ - 1991/2004 e 2006/2009; 3º BPChq - 2004/2006; 2º
BPChq - 2010/2013; e CPChq - 2013/2020.
Função que exercia nas manifestações de 2013: Oficial Adjunto de Inteligência na
Agência Regional, do Comando de Policiamento de Choque.

1) Manifestações expressivas na qual atuou.


R: Manifestações de 2013

2) O ano de 2013 foi considerado um marco para as manifestações no Brasil. o


senhor concorda com essa afirmação?
R: Sim.

3) O que mudou?
R:
a) forma de organização e condução das manifestações;
b) características dos manifestantes;
c) estratégia de atuação utilizada pelos manifestantes.

4) Na visão do senhor, quais as maiores dificuldades enfrentadas pela PMESP


durante as ações de preservação da ordem pública nessas manifestações?
R:
a) antes de 2013: número elevado de pessoas;
b) a partir de 2013: uso da violência e destruição do patrimônio (público e privado).

5) Qual a maior dificuldade operacional?


R: Cobrir toda a área de atuação dos manifestantes que se dividiram em células.
206

6) O senhor pode citar, ao menos, 3 acertos e 3 erros da PMESP na gestão de


multidões nessas manifestações.
R: Nas primeiras manifestações de 2013, que tinham como foco o aumento da tarifa
de ônibus na cidade de São Paulo, a Pm não tinha a expertise da tática black bloc
(“bloco negro”), portanto, houve a necessidade de inúmeras adequações como a
atuação da tropa, principalmente para acompanhar "in loco" os manifestantes, como
por exemplo o "envelopamento". No momento do ato, propriamente dito, a tática
black bloc provocava um estouro de multidão com ataques aos policiais militares e
aos patrimônios. E após esse primeiro ataque, formavam células para ataques
pontuais, o que não era, no primeiro momento, acompanhado pela PM.

7) Na opinião do senhor, a partir de 2013, os manifestantes tornaram-se mais


violentos?
R: Sim, extremamente violentos.

8) O senhor identificou o aparecimento de grupos com ideologias que pregam a


violência ou ações contrárias à lei e ordem?
R: Como citado, os integrantes da tática black bloc (“blocos negros”).

9) Foi possível identificar a existência de estratégia ou táticas definidas por esses


grupos? Sobretudo para praticar atos de violência, ludibriar ou enfrentar a polícia ou
outras instituições públicas?
R: Sim, desde os dias que antecediam as manifestações, integrantes desse grupo
interagiam através das redes sociais, onde pré-definiam os locais e alvos da
violência.

10) Qual era a estratégia da PMESP referente à gestão de multidões (Administração


e Controle de Multidões), antes e durante as manifestações de 2013?
R: A PMESP agia respaldada nos seus ensinamentos de Controle de Multidões, com
a tropa de área atuando diretamente no momento da manifestação e a Tropa de
Choque posicionada em pontos para o apoio do policiamento territorial. Ocorre que
com a difusão da tática black bloc, toda a manifestação passou a ter a atuação
obrigatória da Tropa de Choque.
207

11) Qual era é a estratégia após as manifestações de 2013?


R: Utilizava a mesma estratégia acima, porém com a tropa territorial lançando mão
de um grupo de policiais que passaram por um treinamento específico que
encabeçava a testa da manifestação e suas laterais, fechando (envelopando) parte
do agrupamento para evitar a explosão.

12) Quais as dificuldades encontradas no Controle de Multidões, enquanto Cmt


tropa a partir de 2013? (ex: deslocamento de viaturas, trânsito, ruas inacessíveis,
velocidade de deslocamento, etc)
R: Barricadas, muitas vezes com fogo (lixo, veículos, caçambas), para impedir a
passagem de viaturas, onerando os deslocamentos que, por vezes, tinham que
aguardar a ação dos Bombeiros para prosseguir. Não obstante após o "estouro"
provocado pela tática black bloc, os manifestantes utilizavam vias estreitas ou
corredores para a fuga, dispersando nas estações de metrô.

13) O senhor acredita que o policiamento com motocicletas pode ser empregado nas
ações direcionadas à Gestão de Multidões? Tanto na administração (prevenção) e
controle de multidões (repressão)?
R: Sim. Principalmente no acompanhamento do grupo e caso ocorra na realização
de uma atuação rápida aos pequenos grupos.

14) Como era o emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de Multidões


(Administração e Controle de Multidões) antes de 2013?
R: Praticamente não atuavam repressivamente, ou o faziam como forma de
contenção do trânsito, num balizamento estacionado.

15) O que mudou no emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de


Multidões a partir de 2013? Existe outra data que tenha marcado mudança
expressiva no emprego?
R: Não vejo mudança relevante.
208

16) Quais as dificuldades do emprego de policiais motociclistas na Gestão de


Multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no Controle de
Multidões (restabelecimento da ordem pública.
R: A própria condução da moto como a exposição do policial condutor, nas situações
de repressão e prevenção.

17) Quais os pontos positivos do emprego de policiais motociclistas na gestão de


multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no controle de
multidões (restabelecimento da ordem pública
R: Facilidade de deslocamento, atuação pontual e rápida, solução importante de
logística para reabastecimento do efetivo empregado (munição não letal).

18) Na opinião do senhor, como o policiamento com motocicleta pode contribuir para
a manutenção da ordem pública em manifestações públicas.
R: Utilizado em número superior a dois condutores (ideal patrulha com três ou mais),
o policiamento com motocicletas poderia ser utilizado como apoio da tropa territorial
no deslocamento dos manifestantes (atuação mais distante, porém com plena visão
do movimento), atuação em patrulha para dispersar grupos menores de
manifestantes (repressão).
209

APÊNDICE F – ENTREVISTA COM O MAJ PM LUÍS HUMBERTO CAPARROZ

ENTREVISTA DIRECIONADA A COMANDANTES DE TROPA QUE ATUARAM EM


MANIFESTAÇÕES PÚBLICA COM O FIM DE ANALISAR AS CARACTERÍSTICAS
DOS ATOS, DAS PESSOAS PARTICIPANTES E DAS FORMAS DE SE
MANIFESTAREM

Data: 19/12/2020
OPM que serviu:
• 13º BPM/M: de 1996 a 2002;
• 7º BPM/M: de2013 a 2015;
• CPA/M-1: de 2018 a 2020.
Função que exercia nas manifestações de 2013: Comandante de Companhia
Matricial.

1) Manifestações expressivas na qual atuou.


R:
• Década de 90: diversas, MST, MSTT etc.;
• Década de 2000: diversas, MST, MSTT etc.;
• Manifestações de 2013: diversas, MST, MSTT e manifestações com ativistas de
tática black bloc;
• Manifestações Impeachment da Presidente Dilma: manifestações contra e outras a
favor do impeachment;
• Manifestações após eleições presidenciais de 2018: manifestações contra e a favor
do Presidente Bolsonaro

2) O ano de 2013 foi considerado um marco para as manifestações no brasil. o


senhor concorda com essa afirmação?
R: Sim, porque teve forte influência das redes sociais e atraiu milhares de pessoas,
além de também ter atraído um número muito grande de ativistas de tática black
bloc, que participavam das manifestações para depredar patrimônio público e
privado e agredir opositores e policiais militares.

3) O que mudou?
210

R: A maneira de se organizar o planejamento de policiamento, que passou a levar


em consideração as mudanças observadas tanto em relação ao maior número de
pessoas participantes, como também a presença dos ativistas de tática black bloc.
Além disso, ativistas com intenção de praticar depredações e agressões a
opositores e policiais militares, aumento de presença de ativistas de tática black bloc
e os ativistas de táticas black bloc portando instrumentos de depredação e de
agressão.

4) Na visão do senhor, quais as maiores dificuldades enfrentadas pela PMESP


durante as ações de preservação da ordem pública nessas manifestações?
R:
a) antes de 2013: número elevado de pessoas;
b) a partir de 2013: número de manifestantes e identificação de ativistas para que
pudessem ser monitorados e detidos antes de agirem com violência

5) Qual a maior dificuldade operacional?


R: Monitoramento, acompanhamento e detenção dos ativistas de táticas black bloc
antes da quebra da ordem, ou o mais rápido possível após a quebra da ordem, para
minimizar os impactos causados.

6) O senhor pode citar, ao menos, 3 acertos e 3 erros da PMESP na gestão de


multidões nessas manifestações.
R:
Acertos: 1) monitoramento das redes sociais, antes, durante e depois das
manifestações; 2) treinamento constante do efetivo de gestão de multidões; 3)
criação de protocolos de gestão de multidões.
Erros: 1) falta de equipamentos nas manifestações de 2013; 2) falta de treinamento
do efetivo de apoio que era escalado para operar nas manifestações advindos de
Unidades de outros Batalhões que não os do Centro de São Paulo; 3) falta de
integração de comunicação, por rádio, de todos os comandantes que eram
empregados nas grandes manifestações.

7) Na opinião do senhor, a partir de 2013, os manifestantes tornaram-se mais


violentos?
211

R: Sim, o número de manifestantes de ativismo black bloc aumentou


consideravelmente.

8) O senhor identificou o aparecimento de grupos com ideologias que pregam a


violência ou ações contrárias à lei e ordem?
R: Sim, a imprensa ao divulgar as depredações acabou por inspirar muitos jovens a
integrar grupos de ativismo black bloc.

9) Foi possível identificar a existência de estratégia ou táticas definidas por esses


grupos? Sobretudo para praticar atos de violência, ludibriar ou enfrentar a polícia ou
outras instituições públicas?
R: Sim, muitas as estratégias foram observadas em manuais estudantis, inclusive
advindos de outros países.

10) Qual era a estratégia da PMESP referente à gestão de multidões (Administração


e Controle de Multidões), antes e durante as manifestações de 2013?
R: Antes, somente o treinamento de CDC (Controle de Multidões) após 2013,
iniciaram-se treinamentos de Gestão de Multidões e intensificaram-se os
treinamentos de Choque Motorizado integrando as ROCAM com as FT, além da
criação da CAEP, que em 2019 passou a ser o 7º BAEP.

11) Qual era é a estratégia após as manifestações de 2013?


R: Atuar integrando no planejamento ações de Gestão de Multidões e Controle de
Multidões

12) Quais as dificuldades encontradas no Controle de Multidões, enquanto Cmt


tropa a partir de 2013? (ex: deslocamento de viaturas, trânsito, ruas inacessíveis,
velocidade de deslocamento, etc)
R: Houve um tempo de adaptação para que se pudesse criar uma doutrina de
Gestão de Multidões integrando os efetivos empenhados na gestão e controle de
multidões
212

13) O senhor acredita que o policiamento com motocicletas pode ser empregado nas
ações direcionadas à Gestão de Multidões? Tanto na administração (prevenção) e
controle de multidões (repressão)?
R: Já existe treinamento para isso integrando as ROCAM às viaturas de 4 rodas,
sejam FT ou BAEP. Atualmente, seria necessário treinar as ROCAM e FT que vêm
em apoio, pois em outras Unidades da PM esse treinamento ainda é desconhecido.

14) Como era o emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de Multidões


(Administração e Controle de Multidões) antes de 2013?
R: Antes de 2013 atuavam separadamente, a partir de 2013 passaram a atuar de
maneira integrada as viaturas de FT e hoje BAEP.

15) O que mudou no emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de


Multidões a partir de 2013? Existe outra data que tenha marcado mudança
expressiva no emprego?
R: Passaram a atuar integradas as viaturas 4 rodas.

16) Quais as dificuldades do emprego de policiais motociclistas na Gestão de


Multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no Controle de
Multidões (restabelecimento da ordem pública.
R: Caso não estejam integradas às demais viaturas os policiais estão mais
suscetíveis a serem agredidos pelos manifestantes, inclusive como alvos de
coquetéis Molotov.

17) Quais os pontos positivos do emprego de policiais motociclistas na gestão de


multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no controle de
multidões (restabelecimento da ordem pública
R: Maior agilidade, facilidade de integração à FT e BAEP e ação de presença.

18) Na opinião do senhor, como o policiamento com motocicletas pode contribuir


para a manutenção da ordem pública em manifestações públicas.
R: Atuando de maneira integrada as demais viaturas de FT e BAEP, atuar integrada
no Choque Motorizado em grupos pequenos de duas viaturas de FT e quatro
213

ROCAM, de maneira que possam auxiliar na segurança das equipes e na detenção


de infratores.
(Sugere que seja conhecida a doutrina de Gestão e Controle de Multidões existente
na Divisão Operacional do CPAM/1)
214

APÊNDICE G – ENTREVISTA COM O CAP PM VALDINEI ARCANJO DA SILVA

ENTREVISTA DIRECIONADA A COMANDANTES DE TROPA QUE ATUARAM EM


MANIFESTAÇÕES PÚBLICA COM O FIM DE ANALISAR AS CARACTERÍSTICAS
DOS ATOS, DAS PESSOAS PARTICIPANTES E DAS FORMAS DE SE
MANIFESTAREM

Data: 10/12/2020
OPM que serviu: 2º BPChq (de 2001 aos dias atuais)
Função que exercia nas manifestações de 2013: Oficial de Inteligência do 2º BPChq.

1) Manifestações expressivas na qual atuou.


R: Manifestações diversas desde 2001, tais como: a) as que envolveram
movimentos sociais; b) as emblemáticas do ano de 2013; c) manifestações durante
o processo de impeachment da Presidente Dilma; d) e) manifestações após eleições
presidenciais de 2018 (contra e a favor do Presidente Bolsonaro)

2) O ano de 2013 foi considerado um marco para as manifestações no Brasil. o


senhor concorda com essa afirmação?
R: Sim, pois o Brasil conheceu a tática black bloc que trouxe grandes desafios para
o sistema de justiça, principalmente para as Polícias Militares.

3) O que mudou?
R: Devido à imprevisibilidade do momento da quebra da ordem e da dispersão no
terreno em que grupos menores davam continuidade à prática da violência, a Polícia
Militar precisou adequar o seu planejamento e lançar mão de atuação de diversas
Unidades Operacionais, além do CPChq.

4) Na visão do senhor, quais as maiores dificuldades enfrentadas pela PMESP


durante as ações de preservação da ordem pública nessas manifestações?
R:
a) antes de 2013: número elevado de pessoas;
215

b) a partir de 2013: emprego de tática black bloc, gestão da crise de imagem devido
às críticas pela ação e/ou pela omissão e oportunidade para se discutir o assunto e
identificar necessidade de mudanças.

5) Qual a maior dificuldade operacional?


R: Comunicação entre as tropas empregadas nas operações, bem como com a
Inteligência da PMESP.

6) O senhor pode citar, ao menos, 3 acertos e 3 erros da PMESP na gestão de


multidões nessas manifestações.
R:
Acertos: 1) monitoramento das redes sociais; 2) monitoramento in locu; 3)
mobilização de efetivo para garantir a continuidade das ações.
Erros: 1) falta de comunicação; 2) falta de atuação integrada; 3) mistura de tropas de
diversas áreas em um mesmo local de atuação.

7) Na opinião do senhor, a partir de 2013, os manifestantes tornaram-se mais


violentos?
R: Sim, pois o sentimento de impunidade deixado pela ação dos black bloc,
motivaram a prática de violência cada vez mais constante por parte de participantes
das manifestações, principalmente de jovens.

8) O senhor identificou o aparecimento de grupos com ideologias que pregam a


violência ou ações contrárias à lei e ordem?
R: Sim, aqueles intitulados black bloc.

9) Foi possível identificar a existência de estratégia ou táticas definidas por esses


grupos? Sobretudo para praticar atos de violência, ludibriar ou enfrentar a polícia ou
outras instituições públicas?
R: Sim, muitos jovens se mobilizaram numa demonstração de anarquismos e pré-
disposição à quebra da ordem pública.

10) Qual era a estratégia da PMESP referente à gestão de multidões (Administração


e Controle de Multidões), antes e durante as manifestações de 2013?
216

R: Antes: atuação convencional, tendo as Forças Táticas locais e os Batalhões de


Choque como forças a serem acionadas;
Após: emprego de tropas matriciais e dos Batalhões de Choque, bem como de uma
maior antecipação do setor de inteligência.

11) Qual era é a estratégia após as manifestações de 2013?


R: Ocupar o terreno, demonstrar força e monitorar as redes sociais.

12) Quais as dificuldades encontradas no Controle de Multidões, enquanto Cmt


tropa a partir de 2013? (ex: deslocamento de viaturas, trânsito, ruas inacessíveis,
velocidade de deslocamento, etc.)
R: Como Oficial do sistema de inteligência, a maior dificuldade nessa área foi a
manutenção de uma comunicação eficiente com os agentes a fim de receber
informações da forma mais célere, bem como com o escalão operacional.
Complementarmente, foi verificado certa dificuldade no estabelecimento do
Comando da operação quando da necessidade de atuação para o restabelecimento
da ordem.

13) O senhor acredita que o policiamento com motocicletas pode ser empregado nas
ações direcionadas à Gestão de Multidões? Tanto na administração (prevenção) e
controle de multidões (repressão)?
R: Sim, pois é uma ferramenta que permite agilidade na resposta tanto para ocupar
terreno quanto para atuar em pequenos focos de quebra da ordem.

14) Como era o emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de Multidões


(Administração e Controle de Multidões) antes de 2013?
R: Atuava no patrulhamento preventivo antes, durante e após a manifestação e
protegia pontos de interesse, como agências bancárias, prédios públicos e agências
bancárias.

15) O que mudou no emprego de policiamento com motocicletas na Gestão de


Multidões a partir de 2013? Existe outra data que tenha marcado mudança
expressiva no emprego?
217

R: Não houve mudança, nem padronização do emprego, cabendo a cada


Comandante decidir pela forma de utilização do policiamento com motocicletas.

16) Quais as dificuldades do emprego de policiais motociclistas na Gestão de


Multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no Controle de
Multidões (restabelecimento da ordem pública.
R: A maior dificuldade é a questão da segurança.

17) Quais os pontos positivos do emprego de policiais motociclistas na gestão de


multidões? Tanto nas ações administrativas (prevenção), bem como no controle de
multidões (restabelecimento da ordem pública
R: Possibilidade de se chegar em locais onde os Pelotões de Choque, de Força
Tática e BAEP não conseguem. Possibilidade de atuar em pequenos e espalhados
focos de quebra da ordem, pois devido às peculiaridades dos Pelotões
convencionais de Controle de Multidões, não é possível deslocamento rápido a
esses pontos. A falta de atuação, nessas situações, geram grande desgaste à
imagem da Instituição.

18) Na opinião do senhor, como o policiamento com motocicletas pode contribuir


para a manutenção da ordem pública em manifestações públicas.
R: Atuando em pequenos focos de quebra da ordem, na demonstração de força, na
preservação de locais de interesse e em pontos que, devido à obstrução das vias, as
tropas convencionais de Controle de Multidão não conseguem chegar (Ex.: greve
dos caminhoneiros, fechamento das Marginais e outras avenidas)

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