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Le Bras e a sociologia religiosa*

Stefano Martelli

A atividade de sociólogos de inspiração cristã, sidade de Estrasburgo colocara-o em contacto com


como Toniolo, Sturzo e inclusive Troeltsch, constituem Marc Bloch e Lucien Febvre,4 fundadores da escola
exemplos de como sociologia e teologia, diferente- histórica dos “Annales”, que lhe abriram novas pers-
mente de tudo quanto sustentaram Comte e Marx, po- pectivas nas pesquisas histórico-religiosas. Por meio
dem estabelecer relações não-conflitivas, a partir dos de Georges Gurvitch5 entrara em contacto com a so-
“propósitos metafísicos” dos pesquisadores, que se ciologia, em cujo conhecimento ele tivera ocasião de
tornam critérios hermenêuticos no trabalho de coleta aprofundar-se quando, em 1929, na Sorbonne, teve
e interpretação dos dados. Com a sociologie religieu- relacionamentos amigáveis com Marcel Mauss, Cé-
se de Gabriel Le Bras (1891-1969), porém, se esta- lestin Bouglé, Maurice Halbwachs e outros expoentes
belece um nexo orgânico entre sociologia e religião- da escola durkheimiana.6
de-Igreja: a partir dos anos 30, na França, e com par- O resultado dessas múltiplas influências foi o
ticular intensidade, após a Segunda Guerra, também aparecimento de uma sociologie religieuse que, di-
em outros países (Holanda, Bélgica, Alemanha Oci- ferentemente da sociologia durkheimiana,7 voltava
dental, Espanha e Itália), instaura-se uma relação de sua atenção mais para os dados histórico, religiosos,
tipo institucional entre sociologia e pastoral.1 De fato, estatísticos e jurídicos, inclusive contemporâneos, do
em várias dioceses surgiram centros de pesquisa so- que para aqueles etno-antropológicos, tirados das so-
cioreligiosa e foram criadas duas instituições interna- ciedades pré-literárias. Rompendo as vacilações dos
cionais: as Conferências Internacionais de Sociologia durkheimianos, Le Bras efetuava, assim, uma significa-
Religiosa (CISR), fundadas em 1946, em Lovaina, pelo tiva reorientação da disciplina, focalizando a atenção
cônego Leclerq,2 e a Federação Internacional dos Ins- sobre a situação da religião na sociedade moderna.
titutos de Pesquisas Sociais e Socioreligiosas (FERES). I. As três principais características da abordagem
As finalidades dessa nova colaboração entre so- ao fenômeno religioso da escola de Gabriel Le Bras
ciólogos, de um lado, e teólogos e pastoralistas, de provêm de sua formação jurídica e histórica: o colo-
outro, foram indicadas com lucidez pelo próprio Le car-se conscientemente dentro da instituição eclesial,
Bras, no apelo lançado em 1931 para se fazer um exa- a insistência em respeitar os rigorosos critérios meto-
me minucioso do estado do catolicismo nas diversas dológicos na coleta de dados socioreligiosos.
regiões da França, das quais as primeiras sondagens A primeira característica nasce da convicção, ama-
haviam revelado as diversidades até surpreendentes.3 durecida nos estudos, sobre as instituições jurídicas
O projeto de Le Bras era o de realizar em todo lugar, eclesiais do Ocidente, de que a Igreja é a instituição
em âmbito paroquial e depois diocesano, pesquisas social mais importante e que dela surgiram numero-
precisas, voltadas a recolher todos os dados históri- sas outras instituições.8 Isso induziu Le Bras a consi-
cos disponíveis e a estabelecer o nível da prática re- derar o fenômeno religioso principalmente sob a di-
ligiosa da população, como premissa para orientar a mensão institucional, isto é, como religião-de-Igreja.
ação pastoral dos párocos e bispos, de maneira mais Para Le Bras, a função da sociologia religiosa consiste
consciente da situação histórico-religiosa em que es- em averiguar a prática religiosa, entendida como in-
tavam trabalhando. dício de pertença eclesial.9 Segundo ele, o interesse
Com essa impostação, substancialmente nova no central da sociologia religiosa consiste em medir a
quadro de relações entre sociologia e religião, Le Bras obediência de uma população aos preceitos da Igre-
chegara na base de uma pessoal elaboração de múl- ja; a vitalidade religiosa também é definida com base
tiplos influxos intelectuais. Sua formação científica o na observância, ou não, das crenças ou dos preceitos
advertira sobre a espessura da dimensão histórica e morais estabelecidos pela instituição eclesial. Certa-
da relevância dos institutos jurídicos na vida social mente, existem pessoas que pertencem a outras con-
de um povo; o ensino de direito canônico na univer- fissões cristãs, ou de outra religião, mas Le Bras, na

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tipologia dos praticantes que propõe, denomina-os, nhar um outro mapa da França, o socioreligioso, en-
primeiro, “dissidentes” e, depois, mais oportunamen- tendido como descoberta e explicação do conjunto
te, “não-católicos”.10 Em resumo, Le Bras coloca-se, de ligações, naturais e artificiais, que uma sociedade
conscientemente, dentro do catolicismo, confiando estabeleceu com o seu próprio território.19
à sociologia religiosa — talvez mais corretamente Para enfrentar essa imensa tarefa, Le Bras recor-
“sociologia do catolicismo”, como propõem Maître11 re amplamente ao método histórico, encorajado
e Grumelli,12 a tarefa de estudar a conformidade de por Marc Bloch. Essa é a segunda característica da
uma população aos preceitos eclesiais. Le Bras pre- contribuição da escola de Le Bras ao fenômeno re-
fere não ocupar-se dos outros possíveis objetos da ligioso. Os ensaios recolhidos nos dois volumes dos
sociologia religiosa, como a religião popular ou as Études de sociologie religieuse (1955), fruto do traba-
crenças, deixando isso para os estudiosos do folclore lho preparatório exercido na Introduction à l’historie
ou para os teólogos. de la pratique religieuse en France,20 constituem o
Em outras palavras, para Le Bras a religiosidade exemplo da fecundidade da perspectiva histórica,
individual de que fala Thomas Luckmann13 é mais um para reconstruir o pano de fundo do comportamento
objeto ilegítimo da sociologia religiosa do que um ob- religioso da população francesa. Basta pensar que a
jeto irrelevante. Ele não a leva em consideração, não análise dos dados relativos à diocese de Auxerre em
porque seja um fenômeno limitado ao seu tempo: na dois períodos históricos distantes, como a época me-
verdade, os livres-pensadores são bem conhecidos na rovíngia e o século de Luís XIV,21 permite descobrir
França e o próprio Le Bras lembra que a irreligião está episódios de secularização dos bens religiosos já no
difundida em certos municípios ao redor de Paris. século VII, e estudar as relativas estratégias eclesiais
De fato, Le Bras está convencido, diferentemente de de reação aos mesmos. Por sua vez, a reconstrução
Durkheim, de que não há, fora da instituição eclesial, da história dos cruzeiros rurais na Bretanha22 não
outras instituições sociais legitimadas para definir é, de forma alguma, uma mostra de erudição, mas
como “religiosas” as crenças ou as práticas morais; acaba descobrindo as funções sociais desses monu-
conseqüentemente, a sociologia medirá o comporta- mentos, à sombra dos quais desenvolveram-se não
mento religioso, adotando os critérios da prática reli- apenas as tradições religiosas populares ou a vida
giosa definidos pela instituição eclesial. Com isso, ele artística, mas também institucionalizou-se a ativida-
não pretende afirmar que o comportamento exterior de jurídica (estipulação de pactos, administração da
esgote, em si mesmo, a experiência religiosa: Le Bras justiça, cobrança de tributos).23
está profundamente ciente da existência de múltiplas O quadro geral que Le Bras traça da história reli-
dimensões do fenômeno religioso e, mesmo que não giosa da Bretanha24 também chega a resultados que
chegue a distinguir, como o fazem Glock e Stark,14 tornam bem mais complexo o julgamento sobre aqui-
cinco dimensões. Ele, porém, cita expressamente a lo que se considera a base tradicional do catolicismo
dimensão espiritual ou psicológica.15 Contudo, Le na França: também nessa região, a análise histórica
Bras é do parecer que tal dimensão caiba à teologia, revela a alternância de períodos de devoção (por
isto é, se coloque num âmbito que necessariamente exemplo, nos séculos IX, XII, XVII e XIX) e de relaxa-
escape dos meios de uma disciplina empírica, como mento (períodos intermediários). Le Bras descobre as
o é a sociologia. Portanto, ele considera que sua tarefa características da religiosidade do povo bretão, mais
seja a de medir o mais exatamente possível a prática inclinado a ouvir a voz do sentimento do que o racio-
religiosa, entendida como comportamento exterior, cínio teológico e, portanto, mais atraído por formas
mediante a qual pode chegar à vitalidade religiosa de de misticismo, que encontram expressão nas figuras
um povo. Essa obra é científica e pastoral ao mesmo de santos como Grignon de Monfort, bem como a
tempo, e permitirá desfazer chavões como “a França permanência, sob comportamentos cristãos, de anti-
católica” ou “a França incrédula”: para Le Brás, são gas crenças ou práticas mágicas.
“ilusões verbais”,16 lugares comuns que se prestam
Le Bras analisa, com particular atenção, as mu-
para mitizações ou para usos ideológicos.
danças acontecidas na Bretanha após a Revolução
Na verdade, para ele urge a tarefa de desfazer a ig- Francesa e a restauração, descobrindo a persistên-
norância sobre a efetiva situação da religião na Fran- cia das tradições católicas até o período anterior à
ça. Convida pastores e teólogos a estudarem a realida- guerra, não obstante os processos de laicização do
de socioreligiosa do próprio território, a serem menos Estado: disso são indicadores adequados a elevada
“negligentes do concreto”.17 Inspirando-se no mapa taxa de prática religiosa (quase 90% da população),
da França política traçada por Siegfred em 1913,18 o número elevado de ordenações sacerdotais, a ati-
Le Bras concebe um projeto grandioso, ou seja, dese- vidade de fundação de novos colégios, conventos e

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escolas. Le Bras resume as conclusòes do seu estudo II. Os apelos de Le Bras para se fazer recensea-
da seguinte maneira: mentos em âmbito territorial, a fim de realizar o pro-
jetado mapa socioreligioso da França, não foram em
A primeira certeza que se tira disso é que as idéias cor- vão. Mesmo se, num momento de desânimo, Le Bras
rentes sobre o catolicismo bretão são sumárias e ilu-
teve de confiar ao cônego Boulard, seu fiel colabo-
sórias. Falar de fé tradicional dos bretões é simplificar
excessivamente a realidade histórica, pois na Bretanha
rador desde 1945, a própria amargura porque “tais
sempre houve a coexistência das crenças primitivas, da pesquisas não interessam a ninguém”,29 após quinze
ortodoxia católica e da oposição à Igreja. A influência anos de intensa atividade, o balanço das pesquisas
dessas diferentes tendências foi muito descontínua: a socioreligiosas era muito positivo. Das 92 dioceses
períodos de devoção seguiram-se outros de indiferen- francesas, 51 foram recenseadas por profissionais
ça, muitas foram as idades do ferro e nenhuma do ouro. qualificados, que seguiam os critérios indicados por
Particularmente impressionantes são as diferenças entre Le Bras. O próprio Boulard, depois de uma primei-
a alta e a baixa Bretanha, entre os povoados do mar e ra tentativa,30 publicara o Mapa da prática religiosa
os dos montes, entre as cidades e os campos.25 na França rural.31 Todavia, esse mapa deixava, deli-
Em resumo, os resultados obtidos com o método beradamente, em branco as zonas de grande densi-
histórico, nesta e em outras pesquisas coletadas nos dade urbana, onde é muito mais difícil, em relação
Études, permitem a Le Bras descobrir, no andamento aos campos, medir a prática religiosa. Somente em
dos fenômenos religiosos, mais descontinuidades do pesquisas posteriores, que trouxeram a solução de
que continuidades: em vez de evolução linear, como ulteriores problemas metodológicos, e com a ajuda
sustentarão os teóricos da secularização, depois dele do belga Jean Rémy, Boulard pôde delinear a situa-
(cf. cap. 3), o que caracteriza a religiosidade no “lon- ção da prática religiosa na França.32 Todavia, somente
go período” é antes um andamento de tipo oscila- cinqüenta anos após a sua formulação, o programa
tório que, além do mais, apresenta fortes diferenças indicado por Le Bras foi realizado, com a publicação
territoriais dentro da mesma região. do monumental Atlas da prática religiosa dos católi-
cos na França.33
A terceira característica da sociologia religiosa de
Le Bras, proveniente da sua formação científica, é o As últimas e mais aperfeiçoadas elaborações con-
recurso à estatística na coleta de dados. De um lado, tribuíram para tornar mais claro e detalhado um pa-
Le Bras denuncia o descuido das fontes civis ao con- norama que já tinha sido delineado, em seus termos
siderar a dimensão religiosa da vida social francesa, essenciais, desde as primeiras sínteses de Le Bras. Sob
recorrendo a uma sarcástica observação sobre os cri- o ponto de vista da sociologia religiosa, a França se
térios dos recenseamentos: “Contam-se os bois e os distingue em três grandes áreas: a zona de observân-
cavalos, mas quem se preocupa de contar os católicos cia regular, a de acentuado conformismo sazonal, e a
praticantes, cujo número é, em nossa terra, igualmen- de acentuado distanciamento da Igreja.34 A primeira
te apreciável”.26 Por outro lado, Le Bras não perde zona, de prática mais intensa, compreende três gran-
ocasião para convidar os párocos e os encarregados des regiões: o Noroeste (Bretanha, Vandea), o Nor-
da pastoral, que desejam ser seus colaboradores, para deste e o Leste (Alsácia, Lorena) e o maciço central,
que observem todas as precauções metodológicas no ao qual se acrescentam pequenas regiões, onde os
paciente trabalho de coleta dos dados.27 Ele indica as observantes do preceito pascal constituem a maioria
estatísticas civis como o modelo de rigor com o qual da população (região basca, terras frias do Delfina-
devem confrontar-se e ao qual devem referir-se na com- do, Savóia, Quéiras, Jura). A zona “fiel” à religião-
preensão da situação socioreligiosa de um território, de-igreja (o mesmo se poderia dizer das outras áreas)
além de efetuarem eventuais tentativas de compara- não constitui uma realidade uniforme; ao contrário, é
ção tanto no plano sincrônico como no diacrônico.28 possível encontrar variações até dentro da mesma re-
Partindo da morfologia social e das estatísticas civis gião ou da mesma cidade. Neste último caso, observa
(dados sociodemográficos como base, com particular Le Bras, as diferenças de prática são a “tradução urba-
atenção aos índices de natalidade, casamento, insta- na do contraste entre a burguesia e o proletariado”.35
bilidade conjugal, desvio e criminalidade etc.), e com- Em outras palavras, se a partir das pesquisas reali-
pletando tais observações com referências à história zadas nos anos 50 o catolicismo francês estava soli-
social, à evolução dos costumes e do direito, como damente enraizado no campo, nem por isso Le Bras
também à geografia, Le Bras chega à classificação do deixou-se desviar pela fácil dicotomia entre campo
comportamento religioso dos franceses em tipologias, “fiel” e cidade “fonte de irreligião”. Le Bras está su-
como momento preliminar para a reconstrução do ficientemente ciente tanto da mutabilidade histórica
andamento da prática religiosa nas diversas regiões. das orientações de classe para com a religião como do

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caráter cativante que a cidade exerce sobre o campo, um protesto contra a imagem idílica da Idade Média
sob o ponto de vista da inovação social. Quanto ao cristã e, ao mesmo tempo, é uma homenagem à ação
primeiro aspecto, ele observa que, nos séculos XVII e civilizadora da Igreja”, afirma Le Bras em um seu co-
XVIII, a burguesia foi um estrato onde eram comuns nhecido artigo, no qual ele resume a sua concepção
as manifestações de irreligiosidade,36 ao passo que, da relação entre catolicismo e história moderna.41 Em
agora, ela aparece mais praticante e respeitadora da outras palavras, para Le Bras a França ainda hoje está
religião, também com a finalidade de conservar o sta- para ser “cristianizada”.
tu quo em relação à ameaça ao próprio poder consti- III. Enquanto ainda não estava seguro de atingir
tuído pelo proletariado urbano. a meta perseguida há anos, isto é, o recenseamen-
Quanto ao aspecto do dimorfismo religioso entre to socioreligioso do território francês, Le Bras não
cidade e campo, para Le Bras a observância religiosa renunciava em apontar aos próprios colaboradores
dos camponeses é muito frágil, pois está pouco en- empenhos ulteriores dentro de um cenário bem mais
raizada interiormente e baseada mais no costume e amplo. Num escrito dos anos 50, ele anuncia que
no controle social. Ele observa, ironicamente, que, o recenseamento42 “se estenderá, pouco a pouco, a
“de cem agricultores que se estabelecem em Paris, todos os países cristãos”. Estimulados por seu exem-
há noventa que, saindo da estação de Montparnas- plo e pelo de seus colaboradores (entre os quais re-
se, deixam de ser praticantes”.37 Têm razão, portanto, cordamos F. Boulard, P. Droulers, J. Lebret, S. Ligier,
aqueles que dizem que a cidade tem um efeito de per- L. Gros, J. Labbens, R. Daille, R. P. Marre-André, J.
versão da religião? Arredio à preguiça intelectual, Le Verscheure),43 em vários países europeus numero-
Bras descobre o caráter ambivalente da urbanização: sos pesquisadores puseram-se à obra, e foram ins-
se é verdade que a cidade se distingue por um modo tituídos alguns centros de pesquisa socioreligiosa. A
de vida leigo, que se subtrai à força das tradições, Holanda foi a primeira, com a fundação do “Katho-
entre as quais a religiosa, por outro lado ela oferece liek Sociaal Kerkelijk Instituut”, a seguir o trabalho
um ambiente que estimula a inovação também nesse pioneiro de Le Bras, realizando recenseamentos e
campo, favorecendo, assim, a formação de uma elite publicando relatórios sobre a situação socioreligiosa
de cristãos leigos, conscientes da própria identidade do país. Na Bélgica, sobressaiu-se a atividade dos so-
e sensíveis à vivacidade cultural. Se o fim de um ca- ciólogos do “Centre des Recherches Sócio-Religieu-
tolicismo tradicional está ligado à difusão do estilo ses” da Universidade Católica de Lovaina: além do
de vida urbano, nem por isso Le Bras considera que já citado Jean Rémy, recordamos Françoise Houtart,
tal tendência assinale o fim do catolicismo francês: “É atual diretor da revista “Social Compass” e fundador
nas cidades que se forma, se desenvolve, se reforça o do Centro (em 1955), do qual fazem parte também
espírito novo, do século e da Igreja: a Igreja se renova Liliane Voyé e Karl Dobbelaere, atual presidente da
e renova a sua prática nas grandes cidades”.38 SISR, a “Societé Internationale de Sociologie des Re-
Em resumo, se em muitas partes do mundo católi- ligions” (ex CISR).44
co olhou-se com medo para os processos de urbani- Na Áustria, o Centro de Pesquisas Socioreligiosas
zação e industrialização, considerando a sociedade (IKIKS) realizou pesquisas nas principais cidades. As
moderna portadora de uma secularização irreversí- diversas pesquisas feitas na Suíça foram recolhidas
vel, esse não é o comportamento de Le Bras. Suspen- no volume de Pilloud, Pratique religieuse de la Suis-
dendo, por um momento, o costumeiro estilo de pru- se Romande, enquanto, na Espanha, especialmente
dente exposição dos fatos que aprendeu com a dupla Duocastella45 sobressaiu-se no estudo da prática re-
formação histórica e jurídica, Le Bras propõe a previ- ligiosa urbana, principalmente em Madri e Barcelo-
são de que “a França se encaminha para o predomí- na. Na Inglaterra, diversos estudos estatísticos foram
nio das práticas globais e para uma prática que será realizados, nos anos 60, pelo “Demographic Survey”
totalmente minoritária, mas verdadeiramente religio- da “Newman Association” e, mais recentemente, por
sa”.39 Se os dados coletados por seus herdeiros no Michael Hornsby-Smith.46 Nos Estados Unidos fo-
Atlas confirmam o “fim da civilização paroquial”,40 ram realizados estudos, principalmente por Joseph
e se as dimensões dessa minoria “verdadeiramente Fichter e A. M. Greeley,47 enquanto no Canadá fo-
religiosa” são para alguns verdadeiramente mínimas, ram feitas pesquisas nas dioceses de Saint Jean e de
restam, contudo, indiscutíveis, as constatações das Québec. Há também notícias de pesquisas realizadas
quais Le Bras parte, isto é, que o termo “descristiani- em Portugal, Luxemburgo, Malta, Noruega, Polônia
zação” é equívoco, pois não leva em conta que tenha e Irlanda.48 Os centros de pesquisas socioreligiosas
existido alguma vez uma sociedade verdadeiramente (uns trinta no mundo todo) reuniram-se, desde 1958,
cristã. “Toda a nossa obra de sociólogo e historiador é numa federação, a FERES, com sede junto à Universi-

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dade Católica de Lovaina, na Bélgica, e deram vida à A segunda fase, caracterizada por assumir expli-
revista “Social Compass”. citamente, na impostação das pesquisas, teorias so-
Na Itália, a sociologia religiosa desenvolveu-se so- ciológicas, foi aberta por Le cristianità nascoste, obra
mente a partir dos anos 50, graças ao ensino de P. na qual Burgalassi reelabora a teoria mertoniana da
Droulers, docente na Pontifícia Universidade Grego- adaptação individual, combinando-a com uma intui-
riana, e de A. Rimoldi, em Milão.49 Enquanto na Fran- ção do teólogo Schillebeeckx.59 A maior consciência
ça, Holanda e Bélgica as pesquisas sobre a prática teórica é acompanhada de um aperfeiçoamento me-
religiosa já haviam passado da fase sociográfica para todológico, graças ao emprego nas pesquisas socio-
as primeiras generalizações, na Itália a introdução da religiosas, de instrumentos estatísticos já aprovados
sociologia religiosa configura-se com os caracteres nas survey.60 Nesse período, já havia aparecido o co-
de uma descoberta que é, ao mesmo tempo, a “re- nhecidíssimo L’eclissi del sacro nella civiltà industria-
descoberta” da sociologia como disciplina científica, le, no qual Acquaviva61 realiza uma interpretação de
depois do parêntese da ditadura política do fascismo fontes secundárias relativas aos diversos aspectos da
e da oposição intelectual de Croce e Gentile. religiosidade institucional, à luz das principais teorias
socio1ógicas e fenomenológicas da religião. O qua-
Como sabemos, a sociologia italiana, que havia
dro teórico da sociologia da religião italiana amplia-
realizado numerosas pesquisas nos primeiros anos
se, graças a posteriores contribuições, como a impor-
deste século e tinha sido dignamente representada
tante convenção internacional realizada em Roma,
no contexto internacional por teóricos das elites (Vil-
em 1969, sobre Religião e Ateísmo nas Sociedades
fredo Pareto, Gaetano Mosca, Robert Michels),50 no
Secularizadas, da qual participaram Parsons, Luck-
período entre as duas guerras fora impedida a sua
mann, Bellah, Glock e outros.62 Panorâmicas poste-
institucionalização em âmbito acadêmico, por causa
riores foram oferecidas pelas antologias elaboradas
da extrema oposição da filosofia idealista, do histori-
por Acquaviva e Guizzardi sobre o debate originado
cismo de Croce, e da estatística. No difícil recomeço
por L’eclissi del sacro e sobre as teorias da seculariza-
da sociologia italiana, após a longa interrupção do
ção,63 assim como por aquela de Franco Demarchi e
ensino e da pesquisa, era inevitável que também a so-
Aldo Ellena sobre a relação entre industrialização e
ciologia religiosa retomasse o caminho por meio de
mudanças na religião.64
exemplos provenientes do exterior, configurando-se,
primeiro, como sociografia e, em seguida, enrique- A partir dessas ampliações e consolidações do qua-
cendo-se, pouco a pouco, de considerações teóricas, dro teórico, foram colocadas as premissas para uma
na mesma época da recessão, no país, da produção consciência mais madura da relação entre pesquisas
sociológica estrutural-funcionalista, nos anos 60, e, empíricas e reflexões teóricas, donde tomaram impul-
depois, ampliando-se com a recessão de diversas cor- so os numerosos trabalhos surgidos nos anos seguin-
rentes teóricas, nos anos subseqüentes.51 tes: no período 1970-1979, Dal Piaz catalogou, em
sua Bibliografia generale di sociologia delle religioni,
Já na fase pioneira, a sociologia religiosa italiana
quase 500 títulos de mais de 130 autores.65 Enquanto
havia realizado algumas pesquisas que, pela quali-
remetemos, para uma mais detalhada reconstrução,
dade, eram comparáveis àquelas feitas em contexto
aos parágrafos do capítulo 4.2, limitamo-nos, aqui, a
internacional, como a monografia de Aldo Leoni so-
recordar, por óbvias razões de espaço, somente algu-
bre a diocese de Mântova,52 as pesquisas de Antonio
mas obras principais. A tradição das pesquisas sobre
Toldo sobre a prática dominical em Bolonha e nos
a prática religiosa da população foi continuada pe-
vicariatos forâneos,53 e os estudos de Pier G. Grosso
las pesquisas de Émile Pin,66 em Roma, de Giuseppe
sobre a religiosidade juvenil.54 Depois vieram as pes-
Scarvaglieri, em Assis e Reggio Emilia,67 de Massimo
quisas de Silvano Burgalassi, sobre a prática religiosa
Ampola, em Livorno,68 às quais se deve acrescentar
na Itália,55 e as contribuições de Antonio Grumelli,
as pesquisas realizadas em segmentos de população,
sobre a “sociologia do catolicismo”.56 No final dos
com características específicas, como os jovens69 e os
anos 50, os sociólogos que, na Itália, se preocupa-
trabalhadores.70 São abertos novos filões de estudo,
vam com o fenômeno religioso eram suficientemente
como as pesquisas sobre os fenômenos de contesta-
numerosos para fundar, em 1957, a primeira seção
ção eclesial,71 a relação entre política e religião,72 e
de sociologia constituída oficialmente nesse país,57 e
as pesquisas sobre religiosidade popular.73 Atenção
para animar duas revistas: “Sociologia Religiosa” (Pá-
nova é posta sobre a religiosidade do Mezzogiorno,74
dua, 1957-1967) e “Lettera di Sociologia Religiosa”
sobre as formas de religiosidade extra-eclesial,75 so-
(Pisa, depois Roma, 1962-1967).58
bre associações eclesiais,76 e sobre os valores.77

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A produção sociológica italiana dos anos 70, a laboradores, devemos constatar que, depois de quase
respeito dos fenômenos religiosos não pode, porém, cinqüenta anos do programa oficial da sociologia re-
ser reconduzida com os termos senão em parte, “so- ligiosa (1931), desconfianças e resistências contra o
ciologia religiosa”. A pluralidade das opções teóricas emprego de métodos sociológicos ainda não desapa-
adotadas e a evidente distância dos “propósitos me- receram nos ambientes eclesiais. Todavia, devemos
tafísicos” de alguns pesquisadores da instituição ecle- constatar que também nos ambientes “leigos” exis-
sial constituem dois motivos fundamentais de desvio tem reservas ou, pelo menos, colocam-se obstáculos
da primeira formulação disciplinar, evidenciada pela a quem procura analisar o fenômeno religioso sob o
concomitante adoção de outros nomes, como “so- ponto de vista sociológico. Em outras palavras, pare-
ciologia da religião” ou, com menos freqüência, “so- ce-nos que a sociologia religiosa ainda hoje, espe-
ciologia das religiões”. Alguns, como Gustavo Gui- cialmente na Itália, encontra-se numa situação difícil,
zzardi,78 propõem até uma “sociologia política das por uma série de razões, que devem ser procuradas
religiões”, com a finalidade de sublinhar a adoção dentro da instituição eclesial, como também nos am-
de um paradigma específico, aquele do “campo re- bientes de pensamento “leigos”. Todavia, as duas or-
ligioso” proposto por Pierre Bourdieu.79 Aqui, não é dens de razões tiveram um efeito convergente de tipo
o caso de abrir uma discussão para estabelecer qual negativo para a própria sociologia religiosa, repercu-
das diversas denominações seja preferível: todias as tindo seja na atividade de pesquisa, seja colocando
três podem aduzir argumentos dignos de atenção, en- obstáculos à inserção de ensinamentos nos planos de
quanto o exemplo dado pelos clássicos da sociologia estudo, tanto das faculdades de teologia como das
(Sociologie religieuse em Durkheim, Sociology of reli- universidades estatais. Examinemos, agora, separa-
gion em Parsons e, em geral, nos autores anglo-ame- damente, as causas daquela que Roberto Cipriani82
ricanos, Religionssoziologie em Weber) é suficiente chamou de “uma espécie de conspiração” entre a
para legitimar todas as três. Parece-nos mais oportuno academia leiga e as faculdades de teologia na Itália.
examinar as principais críticas movidas contra a so- Em âmbito eclesial, as razões mais profundas da
ciologia religiosa de Le Bras e concluir perguntando- fraca institucionalização da sociologia religiosa83
nos sobre os motivos da fraca institucionalização da devem ser procuradas não tanto nas desconfianças
disciplina, no panorama cientifico italiano. e resistências que acenamos acima, e sim nas duas
IV. A sociologia religiosa de Le Bras constitui uma ordens de razões, que podemos chamar, respectiva-
tentativa explicita de estabelecer uma colaboração mente, de “desilusão por excesso de expectativas”
orgânica entre ciências sociais e teologia, no âmbito e de “perplexidade sobre a ambigüidade de resulta-
prático das questões organizativas e pastorais. Resga- dos”. No primeiro caso, trata-se da desilusão em que
tando a sociologia da perspectiva adversativa e subs- se encontra aquele que espera da pesquisa socioló-
titutiva da religião que Comte lhe havia conferido,80 gica não apenas um quadro cognoscitivo da situa-
a intenção de Le Bras e seus colaboradores foi aque- ção, mas também uma espécie de “prontuário” das
la mais pragmática, embora talvez mais ingênua, de soluções aos problemas pastorais, talvez com indi-
colocar a serviço dos bispos, padres e assistentes cação precisa das escolhas a serem feitas no plano
eclesiais os conhecimentos que os novos instrumen- operativo. É evidente que o melhor conhecimento da
tos de análise social podiam oferecer. Nesse esforço situação socioreligiosa de uma zona já é em si um
inovador, que na França colocava em discussão uma objetivo relevante, e que as escolhas operativas di-
situação de consolidada separação entre intelectuais zem respeito a quem tem uma responsabilidade ins-
“crentes” e “leigos”, Le Bras teve de superar várias titucional; em outras palavras, o sociólogo não pode
perplexidades e resistências. Em seus escritos, ele substituir o bispo ou os responsáveis por uma organi-
mesmo mostra três objeções mais freqüentes dirigi- zação eclesial. Contudo, é possivel prever, no plano
das à sociologia religiosa nos ambientes eclesiais: o da pesquisa, a inserção de quesitos que, uma vez
temor de indiscrições, por causa da divulgação de esclarecidos, podem inspirar, com clareza, a ação
dados reservados; o risco de um efeito desmorali- pastoral.84 Em outras palavras, pede-se tentar preve-
zante sobre o povo “fiel”, por causa da exposição de nir a “desilusão por excesso de expectativas”, que
resultados pouco lisonjeiros sobre a religião; o mal- nasce do hiato ineliminável entre o conhecimento
estar por causa do agir “profanizante” da sociologia, sociológico e a ação social (neste caso: pastoral),
que visa interpretar com causas puramente humanas seja esclarecendo os limites intrínsecos da pesquisa
comportamentos de natureza espiritual.81 socioreligiosa (que são, porém, os mesmos de qual-
Não obstante as argumentações aduzidas pelo pró- quer pesquisa sociológica), seja conferindo à própria
prio Le Bras em defesa da sua atividade e de seus co- pesquisa um caráter “finalizado”.

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6
Mesmo admitindo que este primeiro tipo de difi- espessura teórica da disciplina; outras, menos razoá-
culdade seja resolvido, isto é, que se obtenham resul- veis, traduzem no plano prático uma atmosfera difun-
tados cognoscitivos dentro de um projeto de pesquisa dida socialmente, que consiste em julgar irrelevante a
finalizado, nos ambientes eclesiais podem permane- religião na sociedade complexa.
cer ainda perplexidades inerentes (e inelimináveis) à Limitando-nos ao primeiro ponto, que é teorica-
ambigüidade dos dados. As objeções feitas, geralmen- mente mais fecundo, notamos que severas críticas à
te, dizem respeito à sobra de sentido que o comporta- sociologia religiosa de Le Bras vieram de Thomas Lu-
mento apresenta sobre os dados que dele podem ser ckmann e, mais recentemente, de Bryan R. Wilson e
quantificados; em outros casos, que tais dados resul- Gustavo Guizzardi. A obra de Le Bras e de sua escola
tem ambíguos, prestando-se a diversas interpretações; é definida como sendo uma “sociografia das Igrejas
em ambos os casos, dá-se como certa a inadequação concebida de modo restrito”86 e “uma apologia teo-
da sociologia para colher a multidimensionalidade lógica”87 do catolicismo que, além do mais, abre-se
do fenômeno religioso. Devemos observar que essas para poluições “sociométricas” de caráter pastoral.
críticas, embora mostrem exatamente a complexida- Na verdade, esta última acusação é feita por Guizzar-
de do fenômeno religioso, podem ser, porém, dirigi- di,88 mais a respeito dos lebrasianos (especialmente
das também a outras disciplinas que se ocupam dos italianos) do que ao próprio Le Bras, ao qual se re-
mesmos fenômenos, desde a psicologia e a antropo- conhece o mérito de ter colocado a distinção entre
logia, desde a história até a teologia racional. De fato, “sociologia científica” e “sociologia pastoral”.89 Para
somente uma compreensão eidética ou “de dentro”, esses críticos, a sociologia religiosa é produto — limi-
própria dos filósofos sapienciais, pode superar os limi- tado e limitador — do contexto confessional em que
tes de qualquer logos, colhendo o fenômeno religioso nasceu: ela não contribuiu para o desenvolvimento da
em sua essência e, também, na sua indizibilidade. sociologia da religião, seja porque não tinha uma te-
O excesso de sentido, portanto, é um aspecto do oria sociológica geral de caráter explicativo, seja por-
agir humano que, como tal, deixa hermeneutica- que aceitava acriticamente a definição de comporta-
mente aberta a interpretação do fenômeno religioso mento “religioso” oferecida pela instituição eclesial.
a posteriores revisitações; é preciso, porém, colocar Sem dúvida, tais críticas tiveram o mérito de am-
um limite, ditado pela racionalidade, ao aprofunda- pliar a perspectiva originária da sociologia religiosa,
mento interpretativo, sem o qual esvai-se qualquer levantando novas problemáticas teóricas, como a
possibilidade de agir. Em outras palavras, trata-se questão da “religiosidade individual”, e fazendo pre-
de não se deixar prender pelo fascínio do “circulo visões, suscetíveis de confirmações empíricas, sobre
hermenêutico”, ou seja, da espiral da “interpretação a difusão na sociedade moderna de atitudes novas,
infinita”, implícita na polivalência semântica do agir tais como a subjetivação das crenças (a bricolage de
humano. De resto, também poder-se-ia fazer admo- que fala Luckmann);90 fenômenos que não poderiam
estação análoga à teologia, diante da abundância de nem mesmo ser notados se permanecessem dentro
interpretações teológicas atualmente oferecidas. da ótica da religião institucional, dentro da qual Le
A solução mais razoável parece estar numa profí- Bras formulara sua tipologia da prática religiosa.91
cua colaboração entre teologia e sociologia, endere- Além disso, o apelo de Wilson à lição weberiana so-
çada para uma melhor definição dos pontos de refe- bre a avaliabilidade certamente deve ser acolhido,
rência para a pesquisa socioreligiosa (por exemplo: pois constitui o horizonte que legitima a pretensão da
quem é cristão, que se entende por fé, em que con- sociologia de ser uma ciência universal, isto é, capaz
siste a experiência religiosa etc.). O esforço para uma de assumir como objeto próprio qualquer religião do
renovada colaboração entre teologia e sociologia, mundo, sem que suas análises fiquem prejudicadas
desejada por Kaufmann e também praticada,85 pode- por causa da posição pessoal do sociólogo, em ma-
ria assegurar as bases tanto para uma profícua siner- téria religiosa.
gia hermenêutica como para uma operacionalização Contudo, as críticas dirigidas a Le Bras por Luck-
empírica dos indicadores usados na pesquisa socio- mann e outros, especialmente se consideradas em
lógica, permitindo, assim, reduzir a limites razoáveis perspectiva histórica, nos parecem injustas. Como
a ambigüidade inevitável, conexa com a possibilida- Burgalassi sustentou em várias ocasiões,92 a pouca
de de interpretação ilimitada do agir humano. espessura teórica atribuída, de forma crítica, a Le Bras
V. Outras e mais consistentes objeções à socio- deve ser contextualizada e reconduzida no quadro
logia religiosa de Le Bras vieram de ambientes ex- do devir da própria disciplina: outros sociólogos con-
tra-eclesiais. Algumas provêm de dentro do próprio temporâneos de Le Bras também apresentam um bai-
mundo sociológico e dizem respeito à insuficiente xo grau de elaboração teórica da sociologia empírica.

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7
Além disso, o projeto de Le Bras e de seus colabora- parte para afirmações de princípio, parece condividir
dores mais conscientes move-se num âmbito especi- a tese, cara aos fenomenólogos, do “homo religio-
ficamente sociológico e não meramente sociográfico; sus”. Todavia, para Le Bras é claro que a sociologia
por exemplo, as pesquisas de Boulard e Rémy procu- pode estudar a religião somente sob o ponto de vista
ram medir a influência da cultura regional no sistema da instituição eclesial e, sob essa perspectiva, não há
de variáveis comumente levadas em consideração nenhuma dificuldade em reconhecer a contribuição
nas pesquisas socioreligiosas, a fim de “fazer emergir dada por Durkheim ao estudo sociológico do fenô-
o processo mediante o qual o fator religioso se torna meno religioso.95 Para Le Bras, contudo, a religiosida-
um componente interno da própria cultura”.93 de é algo de interior e, na raiz, algo de sobrenatural,
Portanto, o verdadeiro problema é se hoje a socio- portanto não pode ser reconduzida geneticamente a
logia que estuda os fenômenos religiosos esteja em episódios sociais de “efervescência coletiva”, como
grau de oferecer uma teoria adequada e que possa ser sustentou Durkheim. Além disso, tal dimensão espiri-
traduzida em indicadores empíricos oportunamente tual da religiosidade escapa aos métodos empíricos;
comprovados. Parece-nos que, não obstante as nu- o que podemos averiguar empiricamente são apenas
merosas abordagens teóricas e empíricas dos últimos os atos públicos, isto é, a prática religiosa e devo-
anos, ainda resta muito trabalho a fazer, como mos- cional, que é assumida como expressão manifesta do
tram as discussões surgidas em torno das questões comportamento interior e interpretada conforme as
epistemológicas principais, evidenciadas, também, definições dadas pela instituição eclesial, não pelo
pela pluralidade de conceitos, teorias e métodos aos pensamento leigo. Reencontramos, aqui, ocultas
quais os sociólogos da religião recorrem hoje em pela coincidência do nome, as raízes da radical opo-
dia.94 Pensemos no uso de conceitos diversos e ape- sição de Le Bras a Durkheim; para este, a sociedade
nas parcialmente passíveis de sobreposição (sagrado, é constitutivamente religiosa, tanto que Pradès96 fala
religioso, transcendência) para designar a mesma rea- de durkheimiana, enquanto para Le Bras a sociedade
lidade fundante da experiência religiosa, assim como torna-se religiosa somente em relação com uma insti-
na diversidade de abordagens teóricas: fenomenoló- tuição que o é constitutivamente. Portanto, a sociolo-
gica, funcionalista, hermenêutica etc., que se fazem gia religiosa deve assumir dela definições e normas.
atualmente. Em geral, a tensão (talvez sem solução?) Le Bras e Durkheim representam, assim, os ca-
entre uma sociologia que weberianamente aceita con- beças de uma radical diversidade de interesses cog-
siderar como “religião” aquilo que assim é considera- noscitivos e de fundamentos epistemológicos: a ex-
do pelas pessoas de uma dada sociedade e uma outra plicação religiosa da irreligião, para quem segue o
sociologia que durkheimianamente pretende definir exemplo de Le Bras, a explicação irreligiosa da reli-
o que seja religião com os seus próprios critérios. gião para quem segue Durkheim. Essa radical oposi-
Notamos que, por uma ironia da sorte, a tensão ção remete-nos a duas concepções especulativas da
entre essas duas concepções opostas, que represen- relação entre sociologia e religião, que, no entanto,
tam as altemativas existentes para o problema episte- permanecem dentro de uma concepção “positiva” da
mológico principal da sociologia da religião — o do realidade, comum tanto à concepção teológica que
fundamento da definição — está condensado e quase prevalece na religião-de-Igreja, o tomismo, como ao
oculto na paradoxal coincidência/oposição entre Le seu antagonista leigo, o positivismo. Permanecendo
Bras e Durkheim. Para esses dois sociólogos france- dentro de uma concepção filosófica positiva e “realis-
ses, a sociologia que estuda os fenômenos religiosos ta” da realidade, não nos parece que as críticas feitas
é sociologie religieuse e tem uma forte dimensão so- por posições positivistas a Le Bras possam apresentar
cial e institucional; no entanto, sob a identidade da maiores pretensões de superioridade. Em nosso modo
denominação, oculta-se a radical (e explorável) opo- de ver, que quer encontrar novas perspectivas para a
sição de referentes teóricos. Para Durkheim, o ponto sociologia da religião, somente pode negar validade
de vista do qual se deve partir para a explicação dos à concepção realista, que está na base das duas ver-
fenômenos religiosos é a sociedade: a ligação social é sões internas à sociologie religieuse, e abraçar posi-
“ipso facto” religiosa, da qual a religião institucional ções nominalistas, nas várias versões oferecidas pelas
é, depois, a expressão simbólica. Mais alheio do que filosofias do “pós-moderno”, do niquilismo à herme-
Durkheim às questões filosóficas por causa de sua nêutica, como veremos melhor no último capítulo,
formação histórico-jurídica, Le Bras prefere expor, dedicado ao futuro da religião no novo clima cultu-
primeiramente, os fatos coletados. Quando, porém, ral, que denominamos “sociedade pós-moderna”.

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8
Notas
*
Texto extraído da obra A religião na sociedade pós-moderna, de Stefano Martelli, São Paulo, Paulinas,
1995, pp 217-259.
1
F. Houtart, Sociologia e pastorale, AVE, Roma, 1966, especialmente c.3, 59-81.
2
Para um balanço recente dos 40 anos de atividade da CISR, cf. É. Poulat, La CISR de la fondation à la
mutation: réflexions sur une trajectoire et ses enjeux, in “Social Compass” 37(1990)1, 11,34.
3
Cf. G. Le Bras, Introduction à l’enquête sur la pratique et la vitalité religieuse du catholicisme en France
(1931), agora em Idem, Studi di sociologia religiosa, Feltrinelli, Milano, 1969, c. I, 29-49.
4
Cf. M. Bloch, La società feudale, 6. ed., Einaudi, Torino, 1965. Tradução portuguesa: A sociedade feudal,
Edição 70, Lisboa, 1982. L. Febvre, Il problema dell’incredulità nel secolo XVI. La religione di Rabelais,
Einaudi, Torino, 1978.
5
Cf. G. Gurvitch, ao cuidado de, Trattato di sociologia, 2 vol., Il Saggiatore, Milano, 1967.
6
Cf. J. Goudemet, Histoire et sociologie dans l’eouvre de Gabriel Le Bras, in É. Poulat e outros, La sociologie
religieuse de G. Le Bras, in “L’Année Sociologique”, s. IIIe, 20 (1969), 303-309, especialmente 303ss.
7
Cf. c. 1.3 e 2.2.
8
Cf. Goudemet, Histoire et sociologie, 306.
9
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 194.
10
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, respectivamente, 129 e 246.
11
Cf. J. Maître, Les sociologie du catholicisme française, “Cahiers Intemationaux de Sociologie”, XXIV (1958), 108.
12
A. Grumelli, Sociologie del cattolicismo, AVE, Roma, 1965.
13
T. Luckmann, La religione invisibile, Il Mulino, Bologna, 1969; cf. também c. 3.5.
14
Cf. C. Glock-R. Stark, Religion and society in tension, Rand & McNelly, Chicago, 1966.
15
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 216.
16
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 29s. e 217s.
17
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 127.
18
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 160, nota 208.
19
Cf. G. Le Bras, Dalle inchieste sulla pratica a una geografia religiosa della Francia, agora em Idem, Studi di
sociologia religiosa, parte II, c. II, 226-257, especialmente 226-228.
20
O trabalho preparatório apareceu em G. Le Bras, Introduction à l’historie de la pratique religieuse en
France, Paris, 1942-1945.
21
Cf. G. Le Bras, Analisi della vita religiosa nella storia delle campagne francesi, agora em Idem, Studi di
sociologia religiosa, parte I, c. II, par. 2-3, 52-78.
22
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, parte I, c. II, par. 5, 89-102.
23
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 99ss.
24
A atenção dedicada à Bretanha explica-se facilmente pelo fato de que tal região é a terra natal de Le Bras;
ele mesmo declara ter nascido em Paimpol (cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 86-87). As recentes
transformações nessa região foram analisadas por Y. Y. Lambert, Dieu change en Bretagne. La religion à
Limerzel de 1900 à nos jours, Du Cerf, Paris, 1985.
25
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 87.
26
Cf. Le Bras, Studi di sociologia, 31, nota 8.
27
Cf. J. Labbens, Sociologia religiosa, Pauline, Roma, 1961.
28
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 303.
29
Cf. o testemunho de F. Boulard, Ce que la pastorale française doit au doyen Gabriel Le Bras, in Poulat et
al., La sociologie religeuse de G. Le Bras, 323.
30
Cf. F. Boulard, Problèmes missionaires de la France rurale, 2 vol., Du Cerf, Paris, 1945.
31
Cf. F. Boulard, Primi risultati della sociologia religiosa, Vita e Pensiero, Milano, 1954.
32
Cf. F. Boulard-J. Rémy, Pratique religieuse urbaine et régions culturelles, Les Éditions Ouvriéres, Paris, 1968.
Para um balanço crítico desse projeto, cf. É. Poulat, Catholicisme urbain et pratique religieuse, in “Archives
des Sciences Sociales des Religions” XIV (1969)29, 97-116; cf. também F. Hervieu-Légier-F. Champion,
Verso un nuovo cristianesimo?, Queriniana, Brescia, 1989, 52-57.
33
Cf. F. Isambert-J.-P. Terrenoire, Atlas de la pratique religieuse en France, FNSP-CNRS, Paris, 1980; os critérios
em que se baseia esta obra monumental estão expostos in J.-P. Terrenoire, Les pratiques cultuelles dans leur
contexte social et historique, in “Archives des Sciences Sociales des Religions” 54 (1982) 2, 149-157.

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9
34
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 223ss, 304ss.
35
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 305.
36
Cf. B. Groethuysen, Origini dello spirito borghese in Francia, I: La Chiesa e la borghesia, 2. ed., Einaudi,
Torino, 1977.
37
Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 225.
38
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 223.
39
Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 225.
40
Cf. Hervieu-Légier-Champion, Verso un nuovo cristianesimo?, 57-61.
41
Cf. G. Bras, La storia non dimonstra la caduta del cristianesimo?, in S.S.Acquaviva-G. Guizzardi, ao cuidado
de, Religione e irreligione nell’atà postindustriale, Il Mulino, Bologna, 1971, 166, nota 5.
42
Cf. G. Le Bras, Struttura e vita di una società religiosa (1951), agora Idem, Studi di sociologia religiosa, 294-
310; cf. 308.
43
Por motivos de espaço, recordamos, aqui, somente as principais obras de alguns colaboradores: J. Lebret,
Connaître une population, in “Cahiers d’Economie et Humanisme” (1951) 2-3; J. Labbens-R. Daille, La
pratique dominicale dans l’agglomération lyonnaise, 3 vol., Institut de Sociologie des Facultés Catholiques,
Lyon, 1955-1957; J. Verscheure, Premier aspect de l’enquête du 23 octobre 1955 à Lille, sur la pratique-
messe, le dimanche, Centre Diocesan d’Études Socio-Religieuses, Lille, 1956; Idem, Aspects sociologiques
de la pratique dominicale. Diocese de Lille, Centre Diocesan d’Études Socio-Religieuses, Lille, 1961. Este
último foi secretário da CISR (Conférence Internationale de Sociologie des Religions) por um longo período
(de 1970 até a sua morte em 1987).
44
Além das já citadas, por motivos de espaço podemos aqui citar apenas algumas obras desses autores:
F. Houtart-J. Rémy, Chiesa e società in evoluzione, EDB, Bclogna, 1974; J. Rémy, Religion, rationalité e
dynamique affective. Hypothéses en vue d’interpréter les résurgences des formes religieuses dans une
societè sécularisée, in “Social Compass” XXXI (1984) 2-3, 221-231; Idem, Le défi de la modernitè: la
stratégie de la hiérarchie catholique aux XIXe et XXe siècles et l’idèe de chrètienté, in “Social Compass” XXXIV
(1987) 2-3, 151-173; L. Voyé, Sociologie du geste religieux. De l’analyse de la domenicale en Belgique à
une interprétation thèorique, Les Éd. Vie Ouvriére, Bruxelles, 1973; L. Voyé-K. Dobbelaere, ao cuidado
de, La Belgique et ses dieux, in “Recherches Sociologiques” XVI (1985) 3; K. Dobbelaere, Secularization: a
multi-dimensional concept, in “Current Sociology” 29 (1981) 2, 70ss.
45
Cf. R. Duocastella, Come studiare una parrocchia, AVE, Roma, 1967.
46
Cf. M. P. Hornsby-Smith, Roman catholics in England, studies in social structure since the Second World
War, Cambridge U.P., Cambridge, 1987.
47
Também para este, como para os outros autores anteriores, podemos citar somente as obras mais conhecidas:
J. Fichter, Social relations in the urban parish, Chicago U.P., Chicago,1954; A. M. Greeley, L’uomo non-
secolare. La persistenza della religione, Queriniana, Brescia, 1975; Idem, The american catholic. A social
portrait, Basic Books, New York, 1977.
48
Além das obras de Houtart, Socioligia e pastorale, 45-46, e de Poulat, La CISR de la fondation à la mutation,
outras indicações sobre o desenvolvimento dos estudos sócio-religiosos, na Europa, podem ser encontrados
em G. Capraro, La rilevazione sistematica della pratica religiosa cattolica, in M. Ampola-S. Martelli, ao
cuidado de, Questioni e metodi in sociologia della religione, em via de publicação pela Editora Tacchi,
Pisa. Na Itália, é apreciada a atividade de alguns observatórios diocesanos, entre os quais aquele do
Triveneto; cf. Osservatorio Socio-Religioso del Triveneto, Annuario elettronico delle Chiese nel Triveneto,
ao cuidado de D. Olivieri, Banco Ambrosiano, Veneto, Vicenza, 1990.
49
Cf. P. Droulers, Cattolicesimo sociale nei secoli XIX e XX. Saggi di storia e sociologia, Edizioni di Storia e
Letteratura, Roma, 1982; P. Droules-G. Martina-P. Tufari, La vita religiosa a Roma intorno al 1870. Ricerche
di storia e sociologia, Gregoriana, Roma, 1971. Para outras informações sobre as origens da disciplina na
Itália, remetemos aos numerosos escritos sobre o assunto de Silvano Burgalassi, especialmente La sociologia
religiosa: proposte definitorie e problemi attuali, in D. Pizzuti, ao cuidado de, Sociologia della religione,
Borla, Roma, 1985, especialmente 129-136; S. Burgalassi, Lo stato della sociologia religiosa oggi in Italia,
in AIS (Associação Italiana de Sociologia), L’Italia dei sociologi. Problemi, prospettive, indirizzi di ricerca,
Torino, 1989, 13-19, especialmente 15, notas 1 e 2. Burgalassi, como decano dos estudos sócio-religiosos
na Itália, reconstruiu e documentou detalhadamente o desenvolvimento da disciplina desde o primeiro
período; cf. Idem; La sociologia della religione in Italia dalle origini al 1967, Edizioni Pastorali, Roma, 1968.

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10
50
Cf. Burgalassi, Alle origini della sociologia, c.1-11, especialmente 40ss. Sobre os teóricos das elites, cf. A.
Pizzorno, Sistema sociale e classe politica, in L. Firpo, ao cuidado de, Storia delle idee politiche, economiche
e sociali, VI vol., UTET, Torino, 1972, 13-68, especialmente 54 ss.
51
Cf. S. Burgalassi, Per una lettura storicamente adeguata dell’evoluzione della sociologia religiosa europea,
in “Studi di sociologia” XXVI (1988) 3-4, 265ss.
52
Cf. A. Leoni, Sociologia e geografia religiosa di una diocesi, Gregoriana, Roma, 1952.
53
Cf. A. Toldo, Risultati dell’inchiesa sulla frequenza alla messa festiva nel comune di Bologna (15.11.59),
ISAB, Bologna, 1960; Idem, Indagini socio-religiose sui vicariati della diocesi di Bologna 7 vol. (dos 12
previstos), ISAB, Bologna, 1959,1965.
54
Cf. P. G. Grasso, Gioventù di metà secolo, AVE, Roma, 1954; Idem, Elementi di sociologia religiosa. Natura,
metodi, primi resultati, PAS Verlag, Torino, 1956.
55
Cf. S. Burgalassi, Italiani in Chiesa. Analisi sociologica del comportamento religioso, Morcelliana, Brescia,
1967; Idem, Il comportamento religioso degli italiani, Firenze, Vallechi, 1968.
56
Cf. A. Grumelli, Sociologia del cattolicismo, AVE, Roma, 1965; Idem, Il prete nella città secolare, AVE,
Roma, 1971.
57
Cf. Burgalassi, Lo stato della sociologia religiosa oggi, 13.
58
Cf. S. Burgalassi, La sociologia della religione in Italia dalle origini al 1967, in “Studi di sociologia” XII
(1975) 3-4, 392,418.
59
Cf. S. Burgalassi, Le cristianità nascoste. Dove va la cristiniatà italiana?, EDB, Bologna, 1970, especialmente
109s; a teoria da adaptação individual foi exposta por R. K. Merton, in Teoria e struttura sociale, 3 vol.,
e.ed., Il Mulino, Bologna, 1971, 311-345.
60
Uma exposição desses instrumentos é obra de P. De Sandre, Sociologia della religiosità, AVE, Roma, 1967.
61
Cf. S. S. Acquaviva, L’eclissi del sacro nella civiltà industriale. Dissacrazione e secolarizzazione nella società
industriale e postindustriale, 5. ed., Comunità, Milano, 1981. O sucesso da obra, publicada em 1961,
é confirmado pelas numerosas traduções estrangeiras (alemã, 1964; francesa, 1967; espanhola, 1972;
inglesa, 1979).
62
Cf. G. Caporale, ao cuidado de, Vecchi e nuovi dèi. Studi e riflessioni sul senso religioso emergente dei
nostri tempi, Valentino, Torino, 1976.
63
Cf. S. S. Acquaviva-G. Guizzardi, ao cuidado de, Religione e irreligione nell’età postindustriale, AVE, Roma,
1971; Idem, ao cuidado de, La secolarizzazione, Il Mulino, Bologna, 1973.
64
Cf. F. Demarchi-A. Ellena, ao cuidado de, Il fattore religione nella società contemporanea, Angeli, Milano,
1983.
65
Encontra-se em S. Burgalassi-G. Guizzardi, ao cuidado de, Il fattore religione nella società contemporanea,
Angeli, Milano, 1983.
66
Cf. É. J. Pin, La religiosità dei romani. Indagine sociologica con nota metodologica di S. Bolasco, EDB,
Bologna, 1975.
67
Cf. G. Scarvaglieri, La religione in una società in transformazione, Pacini Fazzi, Lucca, 1977; Idem, Religione
e società a confronto. Ricerca socio-religiosa nelle diocesi di Reggio Emilia e Guastalla-1981, Bazzocchi,
Reggio Emilia, 1982.
68
M. Ampola, Mondi vitali religiosi e secolari in transizione: la morfologia sociale livornese, Giardini, Pisa, 1983.
69
Por razões de espaço, podemos, aqui, lembrar somente a pesquisa mais conhecida sobre a religiosidade
juvenil na Itália nos últimos anos, a realizada por G. Milanesi e outros, Oggi credono così. Indagine
multidisciplinare sulla domanda religiosa dei giovani italiani, 2 vol., LDC, Torino-Leumann, 1981, remetendo
ao c. 4.2.4 para maiores indicações.
70
Lembramos as pesquisas de C. Cipolla, Religione e cultura operaia, Morcelliana, Brescia, 1981, e F. Garelli,
La religione dello scenario. La persistenza della religione tra i lavoratori, Il Mulino, Bologna, 1986, remetendo
ao c. 4.2.3.III para maiores indicações.
71
Cf. G. E. Rusconi, Giovani e secolarizzazione, Vallecchi, Firenze, 1969; G. E. Rusconi-C. Saraceno, Ideologia
religiosa e conflito sociale, De Donato, Bari, 1970, remetendo ao c. 4.2.5.I para outras indicações.
72
Da vasta produção de Gustavo Guizzardi, por razões de espaço, podemos aqui lembrar somente as obras
mais conhecidas de “sociologia política da religião”, tais como G. Guizzardi, La religione della crisi,
Comunità, Milano, 1979; Idem, ao cuidado de, Religione e politica. Il caso italiano, Coines, Roma, 1976;
Idem, Pour une sociologie politique de la religion, in “The Annual Review of the Social Sciences of Religion”

Ciberteologia - Revista de Teologia & Cultura - Ano II, n. 7


11
(1979) 3, 139-167. Para o desenvolvimento da análise sociológica sobre as relações entre religião e política
também contribuíram R. N. Bellah, Le cinque religioni dell’Italia moderna, in F. L. Cavazza-S. R. Graubard,
ao cuidado de, Il caso italiano, Garzanti, Milano, 1974, II, 440-469, e A. Nesti, I comunisti, l’altra Italia,
EDB, Bologna, 1969; Id., Groupes, idéologie religieuse, société, in The contemporain metamorphosis of
religion?, Actes de la XIIe CISR, The Hague, 1973, 165-178.
73
Para uma panorâmica dos estudos sociológicos sobre a religiosidade popular na Itália, remetemos ao c.
4.2.3.I-II.
74
Cf. F. D’Agostino, Le basi morali e religiosi e loro ambivalenze e contradizioni in un processo di sviluppo,
in Idem, La “gramatica dello sviluppo”. Le basi socio-culturali dello sviluppo, Liguori, Napoli, 1984, 121-
164; F. D’Agostino, Il significato del “basso continuo” religioso nella cultura meridionale italiana, in “Studi
di sociologia” XXVI (1988)3-4, 377-395.
75
Cf. F. Ferrarotti e outros, Studi sulla produzione sociale del sacro, 2 vol.; vol. I, Liguori, Napoli, 1979; vol.
II, Angeli, Milano, 1982; F. Ferrarotti, Il paradosso del sacro, Laterza, Roma-Bari, 1983. Outras indicações
no c. 4.2.6.
76
Cf. G. Milanesi e outros Identità, participazione, scelta religiosa. Ricerca sugli adulti di Azione Cattolica,
AVE, Roma, 1984; I. Colozzi-S. Martelli, L’arcipelago cattolico. Analisi sociologica dell’associazionismo
ecclesiale a Bologna, CIC e IPSSER, Bologna, 1988; A. Ardigò-C. Cipolla-S. Martelli, Scouts oggi. Diecimila
Rovers/Scolte dell’Agesci rispondono, Borla, Roma, 1989. Remetemos ao c. 4.2.5.III-IV para outras
indicações.
77
Cf. C. Calvanuso-S. Abbruzzese, Indagine sui valori in Italia, SEI, Torino, 1985; A. Ardigò-F. Garelli, Valori,
scienza e trascendenza, I: Una ricerca empirica sulla dimensione etica e religiosa fra gli scienziati italiani,
Fondazione “G. Agnelli”, Torino, 1989; S. Burgalassi e outros, I valori nella ricerca sociologica, in “Studi
Sociali” XXIX (1990) 3-4.
78
Além das obras citadas na nota 365, cf. G. Guizzardi, New religious phenomena in Italy. Towards a post-
catholic era?, in “Archives des Sciences Sociales des Religions” 42 (1976), 97,116; Idem, ao cuidado de, Il
fattore religione, “Schema” (1981) 8, 81,107.
79
Cf. P. Bourdieu, Génèse et structure du champ religieux, in “Revue Française de Sociologie” XII(1971),
295-334. Tradução brasileira, apud A economia das trocas simbólicas, Perspectiva, São Paulo, 1974. Idem,
Une intérpretation de la théorie de la religion selon Max Weber, in “Archives Européenne de Sociologie”
(1971) 3, 1-21; Idem, La production de la croyance: contribution à une économie des biens symboliques,
in “Actes de la Recherche en Sciences Sociales” (1977) 13, 3-43.
80
Cf. c. 1.1.
81
Cf. Le Bras, Studi di sociologia religiosa, 309ss.
82
R. Cipriani, Dalla sociologia “religiosa” alla sociologia della religione, in “Rassegna di Teologia” XXVII
(1986)6, 559-565, especialmente 559.
83
A difícil institucionalização da sociologia da religião dentro do panorama acadêmico e, em geral, na
“república dos doutos” italiana, depende de muitas causas, algumas internas à sociologia italiana, outras
externas a ela, das quais Silvano Burgalassi tratou recentemente, na relação ao Convênio AIS de Turim (cf.
Lo stato della sociologia religiosa oggi in Italia, 13-19).
Entre as primeiras parece pesar uma fraqueza da sociologia italiana para oferecer contribuições de caráter
teórico, capaz de sustentar, depois, um esforço interpretativo do fenômeno religioso. Como mostram os
clássicos, a teoria sociológica edificou-se em torno das grandes questões sociais enfrentadas, sobretudo,
como questões coletivas que implicam uma dimensão ética, seja numa perspectiva de substituição da
religião pela sociologia, como fez Comte, ou então de integração moral, como fez Durkheim, ou de reflexão
sobre o futuro da civilização ocidental, sempre mais desencantada e racionalizada, como fez Weber.
Sabemos que a sociologia complexa apresenta-se isenta de valores comuns. Como sociólogos — e
não somente como sociólogos da religião, embora também como sociólogos —, nos perguntamos se a
sociologia pode renunciar à pergunta sobre o futuro desta sociedade, ou seja, a interpretar as questões
éticas emergentes, que retomam na sociedade complexa, por causa dos efeitos perversos da diferenciação
funcional: pensemos na emergência ecológica, nas antigas e novas pobrezas, nos desequilíbrios Norte/Sul
etc. Sob este ponto de vista, parece-nos que a falta de institucionalização da sociologia da religião seja
a tradução, no plano acadêmico, do processo de privatização da religião e da ética, impondo-se sobre
o social; um processo que está tirando espaços acadêmicos da própria sociologia, em favor de matérias

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mais “fortes” como a economia e o direito, somente para ficar no âmbito das ciências sociais. Há matéria
para repensar na própria função da sociologia na Itália, isto é, como repropor um discurso que pense a
sociedade sob o ponto de vista de um projeto comum, sem esse recair em utopismos e ideologismos que
devem ser cada vez menos propostos.
Concluindo, parece-nos que não somente o futuro da sociologia da religião esteja inevitavelmente ligado ao
da sociologia, mas também o contrário. Inclusive um novo impulso aos estudos sociológicos do fenômeno
religioso, tanto na academia “leiga” como na eclesial, pode chamar uma nova atenção para as grandes
questões sociais que esperam a Itália nos anos 90, tais como:
a) O advento de uma sociedade multi-racial e, portanto, também pluralista, sob o ponto de vista religioso;
se se quiser enfrentar adequadamente os problemas sociais que derivam das imigrações de masssa de
cosmopolitismo pobre, não parece realismo ignorar a dimensão religiosa das tensões;
b) A necessidade de reagir aos efeitos perversos da diferenciação funcional (questão ecológica, velhas
e novas pobrezas, desequilíbrios Norte/Sul etc.), quebrando a aquiescência para com uma sociedade
“desfuturisada”, repropõe a ética como uma questão central também na sociedade complexa, isto é, como
instância reguladora da diferenciação funcional “a partir de baixo”; cf. acima c. 1, Primeira observação
intermediária, e c. 5.
84
Cf. F. Houtart, Sociologia e pastorale, AVE, Roma, 1966, 86-89.
85
Cf. F.-X. Kaufmann, Sociologia e teologia. Rapporti e conflitti, Morcelliana, Brescia, 1974, c.l e 2,
especialmente 54-59. Um exemplo positivo dessa colaboração foi oferecido pelo próprio Kaufmann em
diversas ocasiões e, mais recentemente, na obra escrita com o teólogo Metz; Cf. F. X. Kaufmann-J. B. Metz,
Capacità di futuro. Movimenti di ricerca nel cristianesimo, Queriniana, Brescia, 1988.
86
Cf. Luckmann, La religione invisible, Il Mulino, Bologna, 1969, 17-28.
87
Cf. B. R. Wilson, La religione nel mondo contemporaneo, Il Mulino, Bologna, 1985, 33.
88
Cf. Gustavo Guizzardi, Alla ricerca di una sociologia scientifica delle religione, in G. Guizzardi-E. Pace, ao
cuidado de, Sapere e potere religioso, De Donato, Bari, 1981, 9-50, especialmente 24-28.
89
Distinção colocada por G. Le Bras, in Reflexions sur les différences entre sociologie scientifique et sociologia
pastorale, in “Archives de Sciences Sociales des Religions” IV, (1959) 8, 5-14.
90
Cf. c. 3.5.
91
Sobre modificações necessárias para esta tipologia, muito “dentro da” ótica eclesial, cf. J. Maître, Procéduces
typologiques en sociologie religieuse dans I’oeuvre de Gabriel Le Bras, in Poulat e outros, La sociologie de
G. Le bras, 325-334.
92
Cf. S. Burlagassi, Per una lettura storicamente adequata dell’evoluzione della sociologia religiosa europea,
265ss; Idem, Lo stato della sociologia religiosa oggi, in Italia, 13.
93
Boulard-Rémy, Pratique religieuse urbaine et régions culturelles, 18.
94
Cf. M. Ampola-S. Martelli, ao cuidado de, Questioni e metodi in sociologia della religione, em via de
publicação pela Editora Tacchi, Pisa, cf. Introdução.
95
Cf. G. Le Brás, Note sur la sociologie religeuse dans “l’anée sociologique”, in “Arquives de Sciences Sociales
des Religions” XI (1966) 21, 47-54.
96
Do significado dado por J. A. Prades, Persistance ou métamorphose du sacré, PUF, Paris, 1987, cf. acima
c. 2.2.I.II.

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