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(_"I'!'li,::u 'a Bn ·.U1 ,\·r"l~ee 1<1:-.

I:.mbor.. breve, este livro tx:neficiou·se enormemelHe


( d3 ~ crÍticas que r« ebeu, quando aind:. se achava em
preparo, e que me fora m didgidas por Lord Boyle,
o sr. Tyrrell Burgcss, o professor Ernest Gellner, Sir
Ernst Gombrich , o professor B= rnard W illiams e Sir
Karl Popper.

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Kür/ Popp~ r nàu ~~, {lor or//, pelo mCl/os, 11m lIome /alllili,/f
e/llfe peIJOal educadas - e eISC lato rcqtltr explicação. COIII
ejeito, Jsàdh Berfil1. em SIlO biografia de Karl Marx (terah'(/
ediçJo, 1%; ), assevera que o livro The Open Sociely and [u
Enemies, de POpptr, (011/;111 "a mais esef/lpuloJo c ler,;';el crilie"
das dou/ril/u! hiI:ó, icas c /ilos6/icd! do marxismo ;nmt1js cscrilll
por qU,Jlqllu olltor árIa"; ora, le tIl" alim},j(,io L: ("'rclt/, Poprcr
IIJO poée deixar de In ligur.r ,!~. imptlfllÍlfcict lillllldiúf - {>lIi.(
li'" (~ÇO do planeIa é d~· PCSSOlI! 1//1(' " ;//t'lII :.:.ot:<Tl/rit!U! 11(,'
autoridades que u dilcm H!orxÍJ/f/! . D l' 01111"(/ /'l1r/c, Pnp/,cr ,:
('IJJJSidn.uJo. pOI muito! til/taTU, (Omo t) /J/{ÚS ;:uld/"CI fil6sufo
J(J â~ncia, em lIossa tpoca; Sif Pc-ter Me-dI1/L'(/I', q/le receb"(I
o prél,úo Nobel di! medicina, J~cla rou, I!lII prO?,I'l1ma da BEC,
c", 28 d~ julho de 19i2, "P~II!Q I]/lé' Popper é, Um dúvida, o
maior filósofo da âi:llcia que iá existiu". Oulros ganhadorn do
prêm io No bel q ue "lJ lllu:;tlrOm p llblica/lll!lI/~ a infltl~n cio que
ré'ubé'rlll1l da s obras de Popper são JactJlIé's Monod ~ Sir Johll
Ecclf:'s. Este lUzimo, em seu livro Facing Rcality (970), nac-
II~U : ". millha vida ci~lIlifica deve fonlo li mil1ha conlJusão,
.fC (lsJim p0!10 d~1I0Illillú.!(1; abraçando os enj;lIam~ntos de
AI. Poppcr ilCe/"CII da cOl/duta da il1veuigtl{ão ci~l/lílica. .. qlu m~
é'mpu,hâ em ug,iJir Popper Jla formulação c 110 jnvesrigaç~o de
~" problemas III/lJo1HCf!/ail JillU:llfobiofogia.'· O conselho de Eccles
.' tiOS demais cicl/tislns é ;;0 se"úJo de que "lâam i! medi/em
:1 aUfCI1 do que pUpp('j" curai! a propólifo de filosofia do ciéncin,
adollmJn !ll1I ! i,/,:idS mm" {,lIse dr Opefll(lio /Ia ntiv;dadc cif!!/Ii ·

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,,'-,/, ' .!.Hl/llh' /II ('ISO posiçZ"o. O ifl/sfr.: n/{lfefi/ático e "- It r /momo f/ll/!e J,'r jCJ/Jf:"iII. D.·pois de collly!c:ar uus !:studoJ, p~sou tf
\11" fI""fII~'JI B'J/lJi, COI1l sillgdc::a, dcciorou: uNiio b.t ciél;cia g';/lhar d vida C:Jf1IO prc.f<!ssor UCUlull1r fl) de 11Itltl!I1uitiea e fh ic4;
IMr,1 .11':111 d o ," lIhodo c nJo há ntlfis, 1/0 método, do q/le: (Iq/lilo flltTl!tallfo, sel,s illureS!~s maiorcs cOI;fim/cram Q u r as oh,oJ
,/",- I'of'pcr / c/eriu," li iI:fíubtàa il/UllXlua[ d~ Poppa - fJue sociaú. <1 politjc" de esqllerda e a múIica _ e, nolura/mente,
1I~(1 CI:colltra rival lia exercida pOr qu.;.lqucr oulro pensador L"ivo 11 /ilosofia. /,a l ilo.o/i!] j~ mC':J//lm{l c a e/a U d edica QII hoje,
"L' língua il/g/esQ - atinge demM Ios JIU esferas gCJ f)cm " r>/ cntn;s N!I1do ·se afastado, e/!frefat.'to, da posição dominaI/te àquela época
(' historirôdores da tJr:e. S o P,efócio de Art :and IIIu5ion (COIIS;' - o do positil.lismo lógico do (jrw!o de Vicno. Ofto Neurath,
dc,"odo por KCI/Jfeth C/a rk CO III O "11m dos mair brilhalltes livros membro daqucle Cí rculo, apc/idou Poppr!r de " oposição oficial".
,Il' crítica de arte qlle lí") , 5ir ErnSI Gombricb declara: "Eu l uo o tror.I/ormOI4 nl/ma figllra singular, apartada. Foi-lhe im.
ficaria or&,dhoIO u a influindo de Popper eslit'esu patente em posstvel vu OJ primeiros livroJ publicados no forma ~m qu~ OJ
loJas as porles deste livro: ' Ministros de Estl1do progreu;:rtas, havia escrito. S~la primeira obra contil/lla inédito; C o primeiro
filiados a ambos os principaü parJidos poIil ;cOJ da Grii.Brerar.ha e impor/df/te trolb:Ilho publicado, Logik d::c Forschung, publicado
- como, por n~mplo, AJlthony Crosland ~ Si, EdwGrd Boyl/! 110 outOI/O d e 1934 e d$llódo de 1935, 'oi uma vertão viol~nlo.
- sofreram Q influência de Poppcr em J~UJ modos d~ com· m enle r.::duzida de 11111 livro que era dltaJ vtus mais longo. Con .
prunder rI atividade política. tém a JUbJf.7lfcio ddquilo que desde t&l época passou a u r VIJto
Esst'J ~x~mplos i/IISJróU/J , de 1n0neir.1 dire/d, o/1.un; por.tos como os arg f/men/or geralmente aceitos contra o positivismo fó.
importantes para aié", do extraordinário âmbito de apficGÇDO da gico.
(
obra de Popper. Mouram que - difuel/temcnle do oco"ido Sob a violincia de que st rewslia o 'luadro político d4
CO I/1 /.;nlos filósofos conft.'nporJlleos - aquela obril eurcl? I!O· Vieua dr,s anos 1910. c oporição csqu( rdúta ao fl1Jcismo se es.
Itvc! efeito prátíco sobrl' (lS pe;SOt;$ por da influenciadas: dlera luva esft:ceionto. Postuionncnte, ~m Opcn Sociery :and l u
11 III1J1/ára d e ersos peuoas eucutaulJI o próprio u abalho e, sob Er.emie-s, volume ii, pp. 16.J-165. Popper caracterizou a posição
,·.rse t' outros aspectos, modifica.lhes as ddaJ. Trala -u, em rc· marxista radical lia S termos u1.f/infes: "Como a r~voluçDo U rll1'
' illJlO, de uma filoso/ie Je açDo. E eATIa ela uma i"Jiuincia mentr! viria, o fa scúlilO só poderia corresponder a um dOJ meios
{emrlha/lle sobre muitas pessoar que SDD líduu em UI/ S pró· dr! provoctÍ·ld; e IIlnlo mois ;sso t"To verdl1de, dada a circul1!J,;ncia
"rioJ ("Unt pO~ de atividades. Dificilmente sc poderia dher, pOr de que a UVO(IIÇDO l.Ii".?a COI1l grande clraso. A Rússia já ti hovitJ
' ·""f'·.'-:lIillle, qfle POPPt',· é ;l,r.orado. E isso acen/tltT aú',}9- IIltlis realizado, a delpei:o de JUIlJ mlÍ! cOlldiçõu econ6micas. Somente
., ("'" JI.rl' reelldt:ntl! de ele não ur melhor conhecido - peno (;1 V~J esperanças 1.CfodaJ p~/o democr.1cio estal.lam de/~ndo are .
',f, /"r.·, d,· menor elH:crgl14lfrd sôo maú famolos . Det..·e-1f: isso, volução /l OS POlUI lIIaú adia/ltados. D essa lorma. a destruiçiio do
..", p,"" .. ,lI' ocaso. t I' l purte C IUlI(/ I:ÔO dc/iberoda mJ jnlt!fpre- Jemocrac7o petas lascúltls ;6 poderia jacf!ilor Q r~l.Io!uçiio, lell4ndo
1.1(,/" ,I,· \fUI ,,1.,,/ t· . C/li ;Jartf:, a um I1spf!eto dI! seu método, que os trabalhadores à d esilusão líltima com respeito aos mitod os
' fim.! f,i,.,/ H·r ••/, ' lIIull"l"JlI/preendido pelor que nio /ercm a obr4. democráticos . DeiJd maneira, a ala n:dical do marxismo ;ulgou
"·'1111'''1'''' ·'' >I.a. ·. ·/I em Viena em 1902. Na primeira juven· que hllvia deseobt:rlo a 'essi:ncia"e o 'litráaJeiro papel histórico '
, ,,,/, •. / ' " /.':.11 \ 11".' ••' .. III1/ormondo·re, em seguida, num rocial-de· do /l1scl;mo. O fa scismo uria, fUlldamenlalmente, O último b:as.
,1 moer,II" ,·,,111\/," /,/. , 11':111 de dedicar-u a estudOI de âb1âtl e
/,1010/"' . 1111,·,·, ' '''I/ "~o "i1o apeNar pela polílico de uqucrda e
Ii~o da burguesi3. ASúnt p~nJalldo, os cOJnlln;sfal níio lu/tiram
q'/:Indo o larcismo se: apossou do poder. (Ninguém esperava que
! por q llCJlú, ·j ,I.· ,H,;,I.:III·ia sOcl21, relativas à cri..m ço, scgundo OJ social·democrafas luI.usem.) Com c/ cito, os comunistdS esta.
l.Iam seguros de que a rt!VO/:lção pro!('/ü.:a viria e qUi! o irfler..
ar eonapçiJc ,· .I,. , 1,,'/, /. JJI<lJ lambim pela Soc;eJade de Cc.!!ccrtor
.. Prit·tttlor //11/(/(/'/11 t", ....'1/'rl:;'C'''. Paro <'Ie, como paro p/tlilos ltidio l:uâSfI1, necess&rio para apressá-la, lIêo poderia prolongar..

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1}uI" m ,lÍ' LI/h' :1I!i' POUCU$ ;;l CSCS , D,',Sftl fOfilla, Ilão Cubiu dOS
' S,' (16, .. sc til/h(1 ",)1'0'1, ti;;htl·'(c j'oiw('11 inJQTIllc.(Jn (/crrc(/ lft: se"
,/fllflq//(" ação. Eln /.'TI/In ;t;oft!lIsivos, N rllfca bouv,'
~Ollllfllir/,I)' cnlluÚJ ü. O /11''-0 1fí <ljJiJ"crl' r ,w ill~ lrJ Im OllfOIlO de 1959,
um 'pai",,, cn"'ftltislu' d (/IIu'açdr 1/ cOllql1isld 1.') podrr pelo la s, !Im 'I/furfo :/.: skutú OP f)S ,/ príf/lt:itil pllblrcaçíiQ. r~'cebemio ti
âln10 , " tludo: Logic of ScicmiCc Djsco\' c:~', 11 tradução jl/c/ui UIII Pre-
Pr~1l',:I~s, na fl:t;.liJ<ldc hisl6rica sobi3CCr;!C (/ ~ssc t~XIO, ~s· fácio especiat, 1/0 qual Popper se deSllinculava da (por aqu~/a
lavam proful/dos ,i~bales acerca de eSlraJ.1g!3 c morclidut1e poli, é:"lOCQj fi!o.oji.t da lillguagem que ( r,traIlO e1l1 moda, porém
fica, I/OS q:liús FCJ?per u cnvof,,'ell e que constituír.:J1n a stlllel1· ~.t ! nd, a r...;.,â;o1! revista d~ fi!ore f/: b fir.gaagem, recenseou o
fei,,; L l.'''};~': ' parte de ma posterior obra política, Ef~' anle· !ir/t.., ,'h sfat'or.welmcnle e sem I~~" ,~ referil:cia co PrefJcio. Na
lIiu, com dolor')sa acuidade, a anexaçJo da AIIJ·tri:t pela Ale· n,'cturidade, PQp/X'r elicontrava·se como Jigulo singular c apor·
manhl1 mntsla e Jubuqiiente gll~,ra ewopba nu qu:u a sua Una lada, na l ng!aterr.., tol como se ha~'ia encontrado nQ Austria de
se colocarilJ do ledo errado; decidiu abandonar a A ustria allft s sua i u~'entude , .'\';;0 obstal/le, a reputação internacional que, de
que ino aCOt:fecesse. ( Essa dui1iio 10h·ou.lhe a vida, pois, em· há muito, começara a cJquirir, continuou a crescer, e foi reconhe-
bora houvesse tido uma infóncia prOle1fdlfle, e fossem bottZa4O! cida na l nglalcrra (que o fel.: cavalheiro em 196') , Contudo,
I1mbos os seus pais, Hif/~r o tc,;a classificado cowo um judeu.) n~m Oxlord " em CambriJge O quiseram como prolessor. Passou
D~ 1937 a 194.5, cnsinou filo so/io nl1 Un;;;ersüLule dl1 N ova Ze· os últimos 2J allos til: s:/a c!1rreira universitária lia London School
lándw, Na paTle iniei"l dene período, empenhou-u em aprendet of Economics, onde foi professor de 16gica e nUlodologia da
grego por con/tJ pr6pria, a fim de se capoeitar para estudo1r os cibtcia.
Jilósofos gregos, especialmellte Platão, Em uguida, escreveu, Durante eJUJ 01101, pf,blicou ele dois Ofllros livros, ambos
em inglês, Thc Opcn Society a:1d h s Encm:cs - "uma obra", coleções de artigos, a IntJioria do! quais já anteriormenlc divul-
como diz lsaiah BCTlin, no trabalho {J/'Ituiormente Cf/ado, "de gada, Q uando, em 1957, surgiu The Poverty of Historicisrn,
cxcepciona! originalidade e f alça". Popper encarGu·a como seu Arlhur Koesrfer eSCTel'eu no Sunday Times que se tratava, "pro·
trabalho de guura. Decisão finol 110 selltido d:: escut'i·la foi vaue/mellle, do único livro pl/blicdo no corrente ano que sobre-
/nlllodfl no dia em que ~fe recebeu a noticia, há tania temida, da viverá ao s;culo atual". (O conjunto de artigos que conJtitui
;I1V,l1QO da A usI,;a POI R i/ler. Eu ~ jtJlo e a cirC;Jtutô"cia de o livlo hav;a sido rejeitado pelo periódico Mind.) Esta obra
'1//(' n resrdtado da ltgunda g uur~ mundiol era ainda incerlo em poáe ser e1lctJrada como um adendo ao The Open Society and
" }./ I, ncoúão em que o livro fo i terminado, aumenloram tJ pro- lts Ent mies. Analogamente, Con jectu res anel Rdutations, cole·
Il/lIdidade de paixão que inspirou essa defesa da liberdade e tJto· rállr!1 de altigos, publicddd em 196), pode ser daJa como um
'1/1" ,lO 'flfafírarismo, t endo Popper t entado explict1r, ninda, a lideI/do ao The Logic of Scientific Discovery, Desde a ma opa·
<l1,,/(',i .. 'fUI' N/e movimen:o exerceu e slla evoluçiio. O livro Sí!nlado ria, que ocorreu em 1969, Popper publicou mais um livro
"/',/T,·" ,,, l'UI tlnh voftmus, em 1945, e foi 'IIotivo da primeiro
,,.,11 1,,...,,,(,;11 ,I" 1/1)1/1(' de Popper no mundo de ' tJla illglesa,
°
_ out'a coleçiío de el/saios, com título Objcctive KnCN.·ledge:
An E\'olu tion3r~' Approach, que veio a lume em 1972, E pro-
1:'1.'1 " 1,1(" r"ppcr viajou parll a Inglulenl1, onde 01; hoje vát'e/ que ,," uas obra~ sejam aind, publicadaI, De Jat o, alguns
111 1'1" , 11" "/"·)',.Ir. encontrou, como ortodoxia prevalecente no Ih'ros já se achom pu p:muJos e; ao lado d~ mais de uma untena
~ 011111'" f,/"'"Ii,'", 1/ ,/ mrdida em que unia ortodoxia se IJIllniju' de drtigos divulgados em vários periódiCOS especializaJos, Popper
tavtJ, .. I'''''/II/'iw:.. f,íí!ICO q" e havia conhecido em VientJ, antes conserua um número air.da maior de ensaios e conferincios es-
da gJl,'ffJ, L .. " I}/I.,.i fl,<,/Ito havia sido Iro: ido para a 1r.;,late"a cri/Qs, que permanecem iniditos, Popper sempre u mostrou um
l1a L:1 n ~ u :l ).:.c Tt u :l , ,tll.1 Log;c, de A . ]. A)'er, publicadol!ln itJneiro pouco relutaJl~ e eTil rtlluter seus escritos ptJro as gráficas: sem -
de 19JG, /I l."l:i " . k r For~ch l1ng, de Poppcr, lIão havia sido tra· pre há espaço - e tempo - para alguns acréscimos, paro aI
dlfzitla c cm "il /u,,!IJI,'II/(" desconhecida; lia medid!l. em que dd correções, para melhor aprerelltaçJo de certo! tópicos,

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.1" 1I11"i"l" H II I ..,,, , cir<l. POPfic, f')i cncGrado pdas POJl{t- ' r"duzi" eJltJ ou aqudl1 passagem de PlatJo. COl/ludo, a defesa
/',',/,,',' f';.I!{('(J.l" ('(11110 ,,!.",uJm q lle se debrllçur;a sob", o~· mesmo.! da democracia, que se acha lia obra de Poppu, "ão recebeu a
l 'mf,{c'IIf<.l)' <file il/ f t;:TCS$tl CJ m .:IM lIJ ept os daquela cotTeJlle; 05 lIIermll a/el/çõo. Mesmo q:,e se puJnre mortrar S('T inl1deqlll1do
,'"úriviJ"ldf útft"prel aram, pois, os cscritos de Popper à lu;: d!!JSc o tra/aJneJl/n dado a Platóo l' a Afer.\, cqueles argl/men/or de
preSSlfpos/o. Os filósofos da linguagem , por sua vez, fizeram pra· Popper em fll,,"Or da democraâ:l rão dos mais pode-roros de qu~
ficomente o mesmo, um pouco mais tarde. Po$ith'Ülas lógicos e .fe tem lIotícill. Qualquer crítica a~adil1lica li/ais siria de The
filósofos da linguagem acreditaram c afirmaram, com todl1 since- Opcn Society :lnd ]ts Ene:mies de"'cria ler CIII conta os argu-
ridade, q /l e a obra de Poppa, contrariamente ao que ele próprio mentos de Popper, lidO {1 rua emJiçfio - embora erla, COI1IO
tem procurado acent uar, não difere das obras produzidas pelos len/(;rei mOJ/rar adiante, /tJl11btJJl deI/li ur respeitl1da.
(ldepros daq uelas cOrrenles. A n egativa de Papper, insistente- Relaciollado a este obs/áculo referido, que se põe entre
mente repelida, parece fatigante aos olhoI dos positivistas e filó- Popper e seUJ lei/ores, há oulro, de importância menor, maS que
sofos da linguagem. Procurarei analisar mais adiante as causas tam bém maca melJçuo. Popper sus/en/II que a l i/asa/ia é Ul1la
( dos ma/entendidos. N este ponto, meu dcsejo é o de realçar que atividade l:eceJJárill porque 1/61 - todos.' - admitimos umd
existe, na obra de Popper, (( ma caractcrística - inevitável, quon- série de coh"s e vários desses prel1uposJos S40 de cunho lilos6·
do (Orrelamentc entendida - que se tem tr.J!Jsformado em obstá- fico. A gimos em /unç40 de/cs, /la vida privado, na político, em
( c/llo a separá·lo de SI!US leitores potenciais - leitores que, exata· 110JJO t rl1balho c em qualq1ler oulrtt esfera. Embora alguns de
mel/te por serem potenciais, ainda não estão em condições de tais pressuportos sejam indubitavelmente verdadeiros, é provável
.'I/tender aquela calcctedstica. Poppcr acredita (num sentido que outros sejllm fa/Jos e ql/e lerceiros sejam perlliciosos. Deflui
'I"~' se tornará mais explícito adianu) que o conhecimento só daí que o exame crítico dos preSJupoJtos - que é lima lItivioade
finde progredir graças a critico. I sso o lel:a a apresentar a maior de ordem filos6fica - é morll/mente e últe(ec!ualmente impor.
",ir'C! de lfIas idéias cama frut o de críticas dirigidas a outros tallte. De acordo COI1l essa malll!Íttt de /ler, a filosofitt é algo
"filMes . r o que se dit, digamos, com Tne Open Soóety :mJ Its vivido e de relevo para todos, lIão uma atividade acadêm.ica ou
EIIOllics., cu;os principais argumentos defll/em de críticilS dir.;· uma especialização - e certamel/te n~o é algo que (omista prí·
.,:,,1,,( /1 rlatdo e Ma rx. Em conseqüência, gerações de estm!lIlIfd macialmenle do estudo dos escritos de filósofos pr.ofissiollais.
"\','III;1I"r,lII, a obra, t'm bUlCa de tais comentários., dcix<ll!do. Sem embargo, 05 trabalhos de Poppcr consistem de exames CTí·
1".1,,,.;.,. de (".'Caminá·la na ÍI/teEra. Ela passou, meS/ll(). 'I J("/" ticos de teoríti.S e, conseqüentemcnte, enfeixam muitas disc ussões
(
• J:, ./1"./,/ ""110 sendo, e/etivomenff:, uma crítica a Pllili/o I ' li em forno de "iJllJO s" e m uitas alusões aos pensadores do passado
.1I.lr' . " IIUf,I/("I"llS peHoas que dela ouviram falar, sem 1':-1,) (:(J/! . - o que se percebe, em especial, nas primeiras obras escritas em
,,,11.,.1,, ""Út ,Ie perto, gu::rdam err6nea impressão acerca do qU e" inglês, quando ele ainda se achavd sob a influindo dd tradição
r .di ,,' ,·,,·,.,·n · Mui/or chegam a IIdmitir, em virt ude dOl tI""I"") acadêmica alem ií.
",:.i,"" ...,./.. , "''''Ira ,\farx, q:le a obra revela tendéllcf"J ,lirt'Í- Raros, porém, Jão os pensadores qlle se deram ao trabalho,
({,I.', ,\!""'''''f/ f,H ron:rovirsiar, surgidas nor meio .. acudémiclI5. COl1l0 Pop per, de ercrever de /fl dndra clara. A s idéias são tão
lI.i .. l ..fI:.' 'l; I"'" " ,/,,- 0 1 argumentor positivor de Poppcr, IJIUJ claramente apresentadas que cbegam a maSC(1rar suo profundi·
""",.,.,:!/".,,,: ',' ,-", '''r"o da legitimidade da op;lIióo que clt· te/ll dade. A lguns lei/ores fo ram a ponlo de admitir que os escritos

!,, dI" " .. /I .. , .:;,1 ..,. · . /:".H<lr conJrovirrial deram origem a vlÍrioJ
li,.I"( ,.d·' ·If.f•. /, ..,: " , .". I n DdcDse of PLa to, de Ror,o!d H. 1..t.··
villSOlf. " T I.. · I I;" " j'J,ih.ophy and The Open Soc:cty, d(' M"u -
de Popper eram simples, talvez alé um pOllCO óbvios. Não pcr·
ceberam a ClI10çí:o e a eXáld(ão que deles podem ser ret iradas.
A prosa de Poppa ,: peculiar: 1II11;!/lálliml1 e /m.""lIl1l1, com UI1l
., rice Comi", !!, .. \ .1", ,,,. ,i,, p;opegou-se fMra aI f(!vis/ar e'ipccid- ,/listo de (drga illle!eclIIll! c emocional 'luc fiOS recorda o própriu
IhaaM, d, ·h,Ih ·' ·.!·' .... " ,.,. <'\/"I"plo, a fidelidade COm que Poppc' M(/rx. !i'ob or argumelltos esco/ldr·se "1110 força oriel/tadora, a

2" 21
li A formuiaç5" de I~is n:Hur:1!s (em sido c:lcar3da , desde há
I mui 10, pelo menos desde NcwlOn, como uma das tardas mais
I importantes d3 cibci:L Todavia, li: descrição sistemática do pro-
cedimcmo 3: ::Idot3r, na busca d3S leis. só foi fe ila por Francis
fu.con. Embora SU:lS idéias tenham sido ampliadas, depuradas,
(
haj:lm sido rcslring:das e l or:l~da$ mais sofiSlitic3das, algu;na
coisa da m.d:çlo que Bacoo inaugurou foi aceÍla pe/II qU3R
totalidade. das peSSOlS de índole cicnlífiC3, do século dezessete
2 ao século vinte. Em lif'lhas g<:nérkas, 3: situação é li: seguinte.
O cientista principi;] deloanoo alguns experimentos. cujo obje-
,\I.ÉTOOO CIENTIFICO - A CONCEPÇÃO t;vo é o de pc:rmiür observaç~s ruiwdosameme co ntroladas e
TRADICIONAL E A CONCEpÇAO DE meticuJosamente medidas - em algum pontO da fr onteira entre
POPPER nosso conhecim~to e nossa ígnorând.:1. O (ieotista registra sis-
temaric:amenre seus achados , divulgt-os, t31vez , e, com o correr
do tempo, ele e outros ~ quis <ldo res que trabalham na mesma
área chegam a acumular um3 porção de dados comuns e dignos
A palavra "lei" é ambígua e qwlquer pessoa que fale de de crédito. Crescendo o número de dados, traços de ordem
"violação" de urna lei natural ou c:ienúfica confunde os dois geral principiam a emergir e os pesqui sadores começam a fOI-
modos princi?tJs de empregar aquela palavra. Uma lei social muhr hipÓteses g~Iais - enu!"lciados de c3dt~ legal6ide que se
prescreve o que podemos e o que não podemos fazer. Ela pode ajustam a todos os fatos conhecidos e explicam de que modo
ser violada ; t:Ul verd ade, se não pudesse, ela seria desncrcssária: d~ 51! relacionam causalmente entre si. O dentista procura con-
(
a socieciade nio formula normas para impedir que uma pessoa firmar sua hipótese, encontra."Jdo evidência que lhe dê apoio_
, <:steja simultane'oUI'Iente em dois Ju~res divctSOs. A lei da rY.Itu-
reza, por ouuo lado, Dio é prescritiva, mas descritiva. Diz-nos
Bem sucedido nesta te'H:I.tiva de verificação, o cientisUl desq:)bre
mais uma lei c:ientifica - lei que lhe permitirá desvendar mais
.' que ocorre - por exemplo, que 11 água ferve a 100 graus ccn· alguns segredos da natureza . Tt"3baJha ·se, então, De!S3. nova
tígrlldos. Como tal, Dão pretende ~r mais do que afirmõlçiio do linha: a descoben3 é. aplicada em todos os casos que, segundo
( I q u~' 3conlece - denuo de certas condições, como, pU:l (:;>I;cm· .se imagina, permitam coleta de informações adicionais. O conhe-
I'lifkar, a de que exlste uma porção de égua e q ue ela é aqucód:J . cimento científico amplia. se, dessa ImIneira, e a fronteira de nossa
1\ I.: i poJ e ser veréadei.ra o u bLsa, mas nio pode ser "violada ", ignorinci!l. é levada para adiante. O processo se repete, num
{ • pois ":iH ~~. H:lU de um comando; n:io se ordcoa à água que fe rVil ponto d3 fronteira nova.
:. IOf) l:r;lUs centígrados. A crC1lÇ:J pré.o\!otí!ica de que :l lei O método que peIm íre asSentar enunciados gerais sobre
sni.• um ~·tllfl ;lndo (emitido por :alguma dh·ind..de) provoca a obs«yaçães acumuladas de C'ílSOS específicos é conh ~jdo como
;, 'tk~ d ,hb :lIllhi);iiidade; as leis eram enc:u:tdas como ordens induçJo e é consider2do como traço di stintivo da ciência. Em
l'm :tll:lt!,h do~ , k u~cs. Hoje, todavia, as controvérsias desapa- outI':lS palavras, o uso do método indutivo é considerado como
r<:~ U :l Ill , A,,- I.;i!' Il:io são comandos de qualquer tipo, que devam critério de demal"C'ação entre ciência e não-ciência. Enunciados
ser "l>I,:~tfi .lI>~". "ol,(;decídos" e não " vioiados", mas asserçocs cienw icos sio os únicos que conduzem a ,onhecirnento seguro
e);plic ;ltiv:l ~ .Ie ,':lr:;ler ge ral, que preteode:.m ser Í3ctua:s e que, e certo, porque estão assent-..dos em evidencia observadonal e
.1 em ViH:l di~St" ,1.-""111 s<:t modificadas ou ab,mdonadas, uma vez experimenul - porque cstão, em suma, assenrados ~obre os
que se vcrif i,! ,)\" ''' ·1',' '11 inadequadas. falO S; põem·se, pauanto, em co~traste com enunci~d05 de todos
'1 2. 2'
os oulros tipos , q ue se basci;lm n:l autoridade, na emoção, na rndh:lt·se aus passados fut:.tro s. A conclus.,jo a que Hume chegou
u:ld!ç50, na conjectUra, no preconceito. no h1ibito ou e:m qU3]. foi a de Q'le, embora não exlsla meio de demo:lstrar a validade
quer outro '3licerce. A ciência é o corpus de tais conhecimentos dos p;:occdimcntos indutivos, a constituição psicol6gica dos
seguros c certos e o desenvolvi;-nenlo da ciência consiste nc inter· homens é tal quc .. 30 lhes resta outr;l ahern:ativa senão 11. de
minávd processo de adicio;lar Ce:1nlS novas ao çonjunro de «:r- pensar em termos de t:tis procedimentos índU[ivos. Como ~St:s
teliS ~jStent <!5. proccdimen:os parecem ter legitim:dade prática , o homem os
ado ta. Se:n em!urgo, isso não quer dizer que falte fund2men ·
Hume colocou alsunns dúvid2s em rudo isso. Assinalou tação nc1on.1 para as leis cienríficas, que ebs oão se apoiem na
que nenhum número de enur..ci"dos de observaç2o singular, por lógiOl. e na experiência, embora Ullla?a~ sem tUltO urna como
mais amplo que seja , pode acarref3r logicamente um enunciado outra, dado seu caráter de generaüdadc irrestrita.
geral mest:ito . Se eu nOlo que o Itconlcomento A vem acom· O p.oblerr.0.2 da indução, que tem sido deoominado "pro-
p:mhado, em cuta ocasião, pelo acontecirr:l!1lto B, não se segue biema de Hume", vem perturbando os filósofos, desde o tempo
logic3roc.me que A \'olte 11. st:r 'Jcompanhado por B em outra de Hwne ali os nossos dias . C. D. Broad, dt" maneira jocosa,
ocasião. Isso nio decorre logicamente de du:ls observaçõcs, nem de-screve-o como o esquelelo que se acha 00 armário dll filosofia.
de viOle ou de duas mil. $(: os aco;lte<:;menlOs vêm juntos um Por sua vez, Dt"rtrand RusselJ, em seu Hitlory 01 W ~st~rn Pbi-
número suficientemente gra.l'1de de vezes, eu posso, not:mdo que lOIophy Cpp. 699·700) *, relau: "Hume demonstrou que o em·
A ocorreu, manifestar certa expttUtiva no sentido de que B píÚSIDO puro não é base suficiente para a ciência. Contudo, se
OCOrTa - mas iuo é um fato psicológico, não 16gico. O Sol este único princípio (da indução) é admitido, rudo o mais pode
( pode ter surgido a cada di!!, todos os dias de que tenhamos OIminhiu em comonincia com a teoria de que toJo nosso conhe-
conhecimento, mas isso não acarreta que deva surgir amar.hã. A
cimenL:> se assenta na experiência. Deve-se adrnitir que ar está
3.lguém que nos diz . "Ah, sim, mas nós podemos predizer, de um afasta:ncnto importante em relação ao empirismo puro e que
hlO, o momenlo preciso t"m que O Sol voharí a rail! amanhã,

i
os pensadores que não abraçam o empirismo estão no direitO de
com base MS eSl:Ibt"leci das lcis da física, aplicadas b condições indagar pOrque outros aiast3mentos não são permitidos, se este
que v;gcm neste momento", é possível retrucar ·com duas obje·
o i.. Estas quest&s, porém, 030 surgem em conexio direta com
~ües. Em primeiro lugar, o fato de que as leis físic1S vigoraram
os argumentos de Hume. O que os acgwneotos hume:a.nos de--
no p:lss:1du n:io ;lcarret:t logicamente qut" continuem \.igorando
monsaram - e eu não peDSO qut" a demonsllaçio sejs contrc>
110 futuro . Em sc~u nJo lugar , as leis da fís ica são. e:as mesmas,
vertida - é que :I indu~o se convene em princípio lógico inde-
cn .. nó~cI()s J!er:.lis (IUC n::io decorrem logkamt"nte dos casos obser.
pendente. Lr.eap3Z de st"r inferido d:a aperiência 0:;1 de outros
v:Hlu'i :ld'fl.itkls e m ~·ll ( :1\'0" n;io importa quão numerosos poso
principios ~6gicos, e que a ciêncit se torna impossível sem ele ."
S.lln ~ ..: r. !\.\ .~i lll . \·~:':I L'·'!I:\li V:1 de iu~tifj c3r a indU{ão é viciosa ,
p ll rqlll · .I.i por :1 )~ rH~' ~ v:ll id.ld e d:l ')f\'lpria indu~o . A ciência É atrcmallleme embaraçoso que justameote a ciência dev:a
~..!mih: <1"l' Ii.lj.1 rq:ul:lrid:.. k· ,1.1 I1.IIun;%:I. :ldmite C)uc o {utt.:ro apoiar-se elD alicerces cuja validade não pode ser demonstrada.
se :l ss~· 'II\ · II, .u , i .," 1'.,,,.,,,,1., , ·111 1,\(I" s (\S ~I S rx'Ct()S <.:ffi quc l1S Icis E5~ fato levcu numerosos empuistll.s ao ceticismo, ao irracioDa-
opcr:WI. T"d:lI·i:l. 11 :-;" h:; IIK·i" qll~' '....rlllíJ:l !.-::ilim-:lT esse pres- lísmo ou ao misticismo. Alguns chega.ram mesma a encaminhar-
supo!>[(). 1,: 1..- I, :.. , 1"'.1 (. .'VI l·~I:r!ll· I ,..·id" 1'\-1:1 ob!tCrvação. pois -se para li. t~Ugj30 . Praticamente todos os empiristas seotiram-se
que: nos ,: iI11,''''';\'1"1 "h~l·t"\·: lr :1l·"III,xi)1\f1)J\lS f"lur o) . [não ind!.r:ados a afirmar: "P~ecisamos admitir que, estritamente fa-
pode ser c~ t.lhdn· i.l" fl ' lU h. h~· ~· lll .lrJ..:, umcll tm Jó:;icos , pois que lando, as leis científicas n~o podem ser demonsrudas e, por-
., do fato de rlllll""~ I'.I:-'.Idos se h:fcm ;lssemdhado :l p:l.ssados
passados não dd l"i '1'1 ,· t....Ios O~ (UIlUOS futuros venham :I. ôlsse- • Ci:l. Editou
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:IU p~.! de e-"p:ic:Jr porque n:;o (cn'c :'I eSS3 te mptralura em vasos
<Iolo!;i-J. Muitas conlrovérsi:lS e m to rno d~ ubi'.l de P l1pl'n ~ fechados. QU3T'!lO m.ais l ica :I hipótese, Tanto o);3 is inform;3ti v:'l

J<..:vCIlI :l um nlllU cruenJimento des s ~ dislÍnç-;)o. será, escJatC(endo-no~ ::l.cerCa ós ttl:lçôcs que se est abe1ecem entre
l<S dws si tuações e permi ti ndo·nos o d !culo preciso da difereoça
Col1!õidereIDos, ~&o [a , um exemplo concreto. Comecemos que e:<islc entre os dois pontos de ebu!:ção. Em OUlras pal:tvras,
por :ldmiür q~ acreditamos - por forç~ dos ~nsinamcnlOS re· teremos UD'l'1 scgut!da formubç:io que não tem menor conteúdo
cebidos na escola - que a agua fervo:: :l 100 c~us centfgr:ldos e:n;írico do que a primeira, ma s, ao contrário, um conteúdo con·
c que isso ttôlduz uma lei ci~ntífica. N enhum número ele (:liOS s:deu ...eloeme maior. Caberia, em seguida, procurar sistemati·
confirtll'2dore$ demonstrará que ass im é. mtl s n6s poJ·.:mos sub · camcnte uma rdutação pua esra ugunJtJ hipótese. Se d escobrís-
meter a teste :l lei, procunndo circunslincias em que el3 deixe semos que els. nos d:lria result":lclos corretos para vasos abertos
de vigorar. Ess.1 bWC2 c')s laoç3 wn r~to: desafia-nos .1 pensar c fechados, soo p ressão equivale:"Jte :i pressão a~mosférica ao nfvel
em coisas que, lIté o:lde sabemos, :1 ninguém preocupar:un . Com Go.) mu, sem nos d3r, contudo, resultados correras a grandes ahi·
pequeno esforço de ir.lag.i.nação des.:obriremos que a Sgua não luJes, p;3sSlrÍllm05 a buscar uma terceira hipótese, ainda mais
ferve li 100 gnus centígrados em vasos fechados . Aquilo que ria do que a segunda, capaz de explicar porque as hipóteses
supúnhamos fone uma lei cicntHic.J deu:!., pois. de sê-lo. Nesse iniciais e ram legitimas, até o pontO em q ue o efarD, deixando de
ponto, poà~os enveredar por OI minhos enôr.eQS. Podemos sÇ.lo Das condiçõc:s nO\'as; e capaz ainda, é claro, de d ar conta da
mam~r o ~unciado original, restringindo seu conteúdo empírico, sirwçio nova. Em scguid'2 , submete rfa mos 3 teste a Icrcei,tJ rupó-
( pata afirmar: "A água ferve a 100 graus cC'D!Ígrados em vasos tese. De cach uma c.bs hipóteses sucessivas, serbm deduzidas con·
abenos. " Passaríamos, em seguíd:a, a buscar sistematicamente seqüêncbs que abrangeriAm muito mais do que :I. ev idência exis·
situaç&s refu13doras do novo enunciado. Com a.ais um pol!CO te:l:e: a leor::a - verdadeira ou falsa - nos di ria mais acerc3
de imag1.o"iÇ3o. 9 rdutaçâo poJerii ser encontr<lda a grandes 3lti· do mundo do que era aotes conhecido. E um3 das formas de
tudes. Para sa!vagu:ud31 o ~gundo enunciado, restri:lgiriar."los sub:neter a teste a teoria consisitiria em conce~ r confrontos
o seu conteúdo empínco, afilTl!aodo : " A :igW; fuve a 100 graus eotre as suas ronseqüincias e nov3$ experiências de ordem obser.
cenúgrld05, em vasos abertos, 50b presslo a tmosférica igual â vador... !. Consta tando que alg'.Jmas -:lSserçõcs da teoria não se
que se conslna ao nfvd do mar." PassarÍlmos, 3. .seguir, '2 bUSC3 r ;r.a.ni1esl;3m realmente, te m·se descoberta n OV 3 : o conhecimento
casOs refuudores do terceiro enunciado - e assim por diuue . seria. ampliado e se imporia a repetição do procedimento, e m
Podemos imaginar que, ao agir dessa forma, e.sta;nO$ delimitando !:\l~;3 da teGria mais sarisf~t6ri;3.
coro p recisão crescente o nosso conheciT:"1ento acerca do ponto AI está, em resumo, o que Poppe.r pensa acerca de como
de ebuliçlio da. água. o conhecimento progride. Há vá rios pontos que precisam ser
Todavja , pJoceder d essa m:l.neiu, atU\'és de uma 0ie d e erua:4ados.' Se procurásse::nos "verificar" o enundado primi tivo,
enunci;3Jos de con..e{Jdo empír ico decrescenle, eqcivlIler ia a rer· de que a água ferve a 100 graus centfgr:ados, acumulando casos
der de vista as características mais no.Jvei1 da silu-:If;io. Com conlirm\1dores, não teríamos diíjculdades para reunir bilhões de
efeito, ao consuUlrmos que :I. água não fervia li. 100 graus cenú· exemplos. I sso, porém, cão gmntiri1l a verdade do e nunciado
g rados ~ vasos fechAdos, tinh;3mos atingido o limiar de umt e DOU aumentaria a probabilidade de ele ser verdadeiro - o
descoberl:a importa.nte, ou seja, 11 descoberta de um problema que pode parecer chocante. uma vez que se compreenda aponto .
(
novo : "Por que não?". Somos compdir!os, :'Isora, a formular O aspecto mais negativo, todavia, está em que, ao acumular
uma hi pótese, mais rica do qce li primitil'3. demasiado siO'1ple$, evi::iênda fa\'Návd, n.10 se liUlÇ3 dúvida sobre o eounciado o. i.
ou se ja uma hipótese capaz d e c:<?li.::ar porque a água ferve a ginal, de modo que não surgc:rI motivos p:tra substituí·lo por
100 gr:'lu5 cenlígndos ( Dl vasos abertos e, s imul~oeam e.nte, ta· outro - e o conhecimento fica estagnado n3qude esúgio. Nosso

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('I,mh' ÓI11 ClllO não teri" progrediJo cumo progn:Ji ll S~' , ao laJo tcr:ivel. Em \" e :d-~ d e, :l ci ~ n cia es t:í cl:uamen te em constante
dos C3S0S confirmadores, não tivessem, por :lCiJ.:ntl' , surgido modificação - e CStl modificação oio se processa por simples
alguns contra-exemplos. Acidentes desse tipo s~o (1 que de me· acréscimo de novas ce rtl:zas. Se ~gj mos racionalmente, baseamos
iho! nos pode acontece r. (É em tal sentido que muit as film os3s nossas d ecisões e expec tafi vas no " que de O'I d hor s-abemos" -
descobertas cientificas foram "acidentai s",) Porque , em rel1li. '- até onde me é dado saber", como acentua a frase popular, de
dade. o aum~lto de conhecimento se deve aos p robkm3s e às fr.aólc ira tão sáb!:1. Ac:!mit imos .. "verdade" dos nossos conheci-
nossas tenutiv:ls de resolvê-los. Ess-as tentativAs requerem 11 cc> mentos paTa efeito prático , pois que eles são a menos insegura
locação de teorias que - alroej :mdo resolver li. Jjfjeúklaclc - base d isponível. Sem e mbargo, não se pode perder de vista o
precisam ir para além do conhecimcnco o istente c , ponanlO, faro de que a ex~riência pode at estar, a qualquer momento,
exigem esforço de imaginação. Quamo mais ousada 3 teoria, que aqudes conhecimentos siio errôneos e nec~ ssitam de revisão,
unto mais t::la nos d:z - c mais al~vjdo o 310 imaginativo.
(SiClultane:unente, contudo, torna-se nuior a probabiljdade de Segundo essa concepção, :l verdõlde de um enunciado (que
ser falso o que li teoria afirma e é pre<iso submetê-Ia a testes Popper, seguindo o enfoque de Tarsk.i, entrnde como sua cortes-
r igorosos para verificá-lo.) A maior parte das gr-andes revo- pondência com os fatos) é uma idéia reguladora. Uma anliogia
luçõcs cieoú6cas deveu·se 3 teorias te:nerátÍ3s, que exiginm com o vocábulo "acuidade" pe r mi t it~ melhor compreensão do
imaginação cri3tiv:t, profundid:lde de ViS30, inclependênci3 de que signifíca isso, Todas as medidas, de tempo ou de espaço,
espírito e um :x-nsamento desejoso de aventurar-se em regiões só podem ser realizadas com certo grau de acuidade, Solicitando-
r Inseguras. -se um pedaço de ferro de 6 milímetros de comprimento, será
Estamos agora em condições de entender porque O conheci- possível obtê--lo dentro d:1 m:1rgem de erro que os melhores íns-
mentO, l a ver Je Popper, é de natureza provis6da - e pernla- trumentas existentes permitem - frações de um milionésimo de
nellte:ne.."Ite de natureza provisória. Em nenhum momento há milímetro, Mas onde, nessa margem, se situ:1 exalam!!nle o
condições para demonstrar que aquilo que "sabemos" é ver<b.- ponto correspondente aos 6 milímetros é atgo que, pda naturC2a
deito e é sempre possível que o sabido se revele filio. t um das coisas, n:io sabemos. ~ possível que o pedaço de ferro tenha
r~to elementar da história intelectual cU humanidade este de exat-amente 6 milírD('tros de: corr.pr ;menlo, mas não o podemos
~Jl ' C (l "cunhecido" em certa época se revelou, posteriormente, salxr, O que se pode $llbe r é que o comprimento tem a acuidade
inc!lmp:lI ívd com o const:ltado. Em conseqüência, é um erra-' - levada ati tal ou qual fução de milúneuo - e que es~ mais
r, r :IW \,'IH:lr o quI.: muitos cicntislls e filósofos tentaum fuer, próximo do comprimento desejado do que de qualquer outro
i..l(' l'. .tl'1110n Slr:lr a vl'rd;lJe de uma teoria ou justifku nosu : comprimento mensuravelmente maior ou mensurave.lmente menor,
~' rl')I <::1 1.:111 t'l:rl :l \<,.-uria - pois isso é logicamente impossível. O i Com o advento de jnstrumen tos de precisão ainda maior, pode-se
l !l h; ~l' IHII.ll" ( a/,cr, por':ll1, l' isto, sim, é de grande importância, 1
l : jll~linc:1r 11(l~":I prdrrZ'm:i:l por uma tcoria, em detrimento de
nutr:!, No ~ l'.~l'll1l'lns S\Kt'ssivns :1cerca da ~buliç30 d:.I. !Íp:.3,
I obter um ped'lÇü dt! fe rro cujo comprimento é mais acurado, den-
tro de margens ainda mais restritas, Outros instrumentos p0-
derio reduzir, em seguid:l , a ma,rgero de erro para limites ainda
\\\ UI('" (l,,, r"j l'o~~iv ..J I1ln~lr:\r ( IUC a teoria e m vigor en v~rd:l- , menores, Todavi a, a noção corte'spondent e a "exatamente 6 milí-
dcir~, m:ls snll!'t,' nn_", In; possível l."SCnrecer os motivos que .:1 : ' metros" (ou exaUmente qualquer outra medida) não é passível
l ~rn:1~:hn jlldní~'c~, slIl'bnl ;mJu :1 le~ria a ~l~o r. Esta é a I ~ de ser encontrada na experiênc1Q , t uma noção metafísica, Daí
s!tuaÇ'aO t'arOlf l,·II·.. II, :l t·111 qualquer cu-cunstan.:ta, a Q".ulquer li não se segue, entretanto, que a huro :m idade não possa fazer va-
tempo, IlHt·ir:lnlClll l· nrônca ê :1 concepção po?ular de que a I, lioso e prodigioso emprego da medida; nem defiui que a acuidade,
ciênci3 cng!oh.• n"-p,'s de {atos cs t abdlXido~. Nada na ciência ,} por ser inatingível, não se ja de interesse; nem decorre que seja
e$lá perm:lnCrl h':l11nllc cst;lbelccido, coisa alguma, nela, é in~ impraticável chegar ':1 graus cada vez maiores de acuidade,
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dcri::lJn prosscgl.: ir ded uzindo con:.cqúl:l\ci'Is JI.: \1'>0 pnítinl. (ul\· J os, p-:ir:l os seus eventuais biógrafo; ou para certas ~ ssoas prea.
fiôl\lrCmC lltC, até que viessem :J e sbarrar com dificulJ:Jdcs imo- cupacbs com al3umas b ceas da p ~i col csia - mas não tem inte-
lcr~ v e is - emborA a teoria nova tivesse surgido an tes d j ~so :Icon· ressc pau O juJg::lme:Ho da ob ra dessc cient isu . Se eu fosse um
tecer e ca nqu.lnlO a Icoria newtonian3 S('mprc tiwssc :lprcsen· cie:n tist:l e d ivulg:lsse uma tecri:l , '" comunidl de cientilica não
I3do algum:u 2I'l o mab.s. Uma teoria pode, perfci l:Jnlcntc , como se: mostC1ria inleressada pele rr.c::u eu subjetivo, mn revelaria
se deu com I geomelr;:l, de E uclides ou :I lógica de Aristó teles, intC'rt'sse: pela tcoril objetiva proposu . Ou : diz a teo ri a? Ela
(
ser 3cti ra como cO:lh\Ximem o ob jet ivo por mais de do is milên ios. é illlemamente coerente ? ~~ hipótC'Se afirm:ltiva, é genuina.
pode ser quase inrinil3mc nte frutífera e úril durJ.nlc todo es~e mente empírica, O;J n~o pasS-'l de ta u tologia? Úlmo se compat'2
lapso de tempo - c, -ainc!a aS5im, mOSIr3r·sc, afinal , deficie nle. com OUtr3S tcorias existe ntes, já subm:tid as a teste:s? Diz-nos
sob 1l1gum aspecto imprc\'islo, e vc[·se suhstiluídl. por teoria mais do que estas ouuas teorias ? Corno será ela submetida a
( mais 3dequada . Dispomos. hoje, de uma teoria que a ma ioria teste:? Eis as pergunt:1s que podcria:n surgir. As pe:ssoas (eu e
dos físicos encara remo ahern:Jliv8 mdbor, que pode subslituir OUtr:u ) ?Oderi:lm aplicar a t~oria, em condições particula.res, e
li teoria d e Newto n. Ainda assim, da niio ~ a \'c:rdadt= final. derivar dei." por um plQttSSO dedu ti\'o, as suas const=qüências
O próprio Einstdn conside rava :\ sua teoria como insatisfQtória, lógicu - que assumiriam a fo rma de enunciados singubces pas:
passando a ~gunda meta.de de=: sua vida e=:ro busca de algo melhor. sívcis de teslt= ~la observação e pda experimentação. A teoria
Talve.! caiba ~pera.r que O futuro nos apresente uma tcoria mais scrá considerada tanto mais corroborad:l quanto melhor se sair
( avançada quc englobe e explique a de EinMein, assim como ~ra em uis testes e quantO melhor puder suportar o confronto com
englob:wa e explicava a de Newton. outras tt=arias rivais.
O Í3to de que tai s teorias não são corpos de=: fatos irnpesso:1is Acerca desse processo, enC:lrado como um tOdo, tres são os
( a respeito do mundo, mas pIOdutos do es;>irito hum-ano, trans- :lspectos que merecem particul ar utençiic . Em primeiro lugar,
forma-as em conqu:stas individuais surpre:eodentes. A criação nOte·se: que a maneira pela qual eu cheguei ~ teoria não tem re.
científica não pode ser dada como tão li\'re quanto a criação artÍs- laç'do com seu J!IJ!u r lógico ou científico. Em scgundo lugar.
tiCl . pois precisa sofre r um mioucioso co n f~onto com a cx~riê!"!­ note:-se que as obsccv:lções e os c;(~riment os em pauta , lo nge=:
cia. ,'ind;,i assi m , a tentati\'ôl d e compreende:r o mundo é uma de duem origem à teoria, são parcialmente de:civados d ela , e
urda :lbcna - c gênios ~ r ia t ivos como os de: G3lile:u . Newton planejados para submete·la a teste. Em te rceiro luga r, note-se
c: Ein ~l cin podem ser cnloc:ldos :\0 lado de gêoios criativos como q ue a jnduçio não está em ~usa . em quaJquer ponto. A con-
Mid ll:bnHd o. Sh ~,k es r~.: :\t c c llcc lho\'en_ Consciência disso e '3.d- cepção tradicional acerca da maneira pela. qual peosamos e acerca
Ill l r aç':it~ pclos fru lns ,b ·_u iv idadc: de t:lis gênios ~ uma nola do método c ientífico dava lugar ao problema <h iodução; essa
l-o nSUlHc n.\ L1br:t de P\lppcr. I ~ so torna aindl rnli s rclevUlte concq:oção, ealrelantO, estava radic:llmente errada e pode ser
;t n n·~·s:.i tl:l~k ,k (·'•.:l:lrl1:cr que " Icoria de Po ppcr é uma expia-
substituída - corr.o acon:cceu aqui - por concepção mais suis.
n:l~,,;10 d .1 li ',~ i(: 1 ~' .1:1 lIisu·,r:.1 .1.1 ó ênfÍa c n50 uml ViS30 da (atória., em que o prob:cma da indução 0.10 se: apresenta. Con-
, p ~icolu): i:, .I..: ~l· U." ~· lI ll llr..: ~ . f'uPlX r não suste:nta - ninguém o ~iie.nle.r."lenle, a indução, se~ndo Popper, é conc:ito dispen-
folr;;! _ .. ' IU\' " .'- (';\'111 ;., 1:1' . .I ..: 1110do xc ra1, encararam a si mesmos slVel - um mito. Não exisle: Não há induçio.
como 1'<'S>.f l.l:, ' 1"\' :1::i:11II ('Ounn de as d escreve agindo. r-.Jas o Os críticos poderiam objetar, lembrando que Popper de:ixou
ponto é ~'~ I C ~· lk': l r.lIldo , ..' :1 si mcsmos daquela maneira ou não, de considerar o processo em q ue a indução comparece efetiva-
a trod a <.lt.: l'''pl',:r ,: ,J fl!\1 d',1l1lC11l0 r:tcional da ação dos cientistas, mente, isto é, o processo de formação de teoriu. Admitimos.
é urnl [COril <'l' ll' n :pl i" :1 ti" q ue modo se desenvolve o conhe- diri-am esses críticos, que as ObSUVlÇõeS singulares não podem
cimento humano . () q l l~' Sl' p:lssa na mente de um cie:otlsta acarretar uma teoria geral; l".ão obstante. podem slIgeri-IIJ, parti.
pode ser de i n [ l:rC ~ ~l' )lMa ele me:s mo, pua os seus conheci . cularmente no ClSO de cientims de vis:io , dOfados de fértil ima-
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36 37

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ginaçaü. DeSS;l form a , as t(; oria~ puJcm :.c:r c , ·!dil'./III (l f h' !>ão explici tamente GUe co!"!corda com Poppcr quando se diz q ue
obt idas gcneNllizando a pllrtir de ca sos obscn'.,cJos. AJm itimos, "uma teoria ::50 pode ser fabr icada com os dados da observação;
continuariam os crít icos, que há se mpre um "salto" filo'S I;) plS- eJa só pode s~ r invcm-ada".
sagcrn do part1cular para o geral; mas o procedimento n:1o é su- A::resce qtle a obser vação, como tal, ruo pode preceder a
mariament e aleat6rio ou irracional: há um tipo de lógica em teoria, cc;:no ta l, já que toda observação press:.lpõe uma teoría.
pauHI - e é isso que denomi namos induçio. Não reconhect!-lo, segundo Pop;>er, é o erro básico da tracliçiío
(
A resposta dê Popper é mais ou menos :I segu imc. Con- empírica . "A crença de que a ciência caminha da observação
, siderando que o modo pelo 'lual se cr.ega a uma teoria não tem p:1ra a teoria é tão ::l rraígada que minha recusa em aceitá-h!. é
sign1ficação especial, lógica o u científica, inexis tindo, pois, ma· muitas vezes recebida com incredulidade. .. Mas a crença de
neiras ilegítimas de formubr Icorias, é JX'rfeiumenll".: admissivel que é possível principiar com observações puras, sem que elas
( que boas teorias sejam obtidas pelo prOCesso descrito pelos crí- se façam acomp:m har por algo que tenha a nature%a de uma 1eo-
ticos. Sem embargo, essa descTIçZ:O é de cunbo psicológico, não ri-a, é uma crença absurda. Isso pode ser ilustrado pela aoedota
lógico. E o problema da indução t em suas falzes no falo de relati va ao cidedão que devotou sua vida à ciência oatural, re-
não se csubcl.xer a adequada dísunçio corre p rocessos psicoló- gistrou tudo aquilo que lhe foi possível observar e legou sua 'Va-
gicos e processos lógicos. Relatos ~ssoais de dentistas nos in- liosa coleção de observações .3 RoylÚ Soà~/y, para que fosse utili-
fOlffiõllD :ilcerca da maneira pela qual chegaram a elaborar suas zacU corno evidência indutiva . .. . Há vinte e cinco anos
teor~: em sonhos o u estados semdh:ilnl~ s ao do sonho; por passados prex-urei realçar o mesmo pomo para um grupo de
força de um lampejo de insj)iração; e até mesmo em virtude de estudame5 de física, em Vi ena, iniciando urna aula com as se-
malentendidos ou enganos. Aprofundando o estudo da história guintes instruções: 'Apanhem um lápis e algumas folhas de
da ciência pode-se concluir que 11 maior parte das teorias não papel ; observem cuidados3Clente e anotem tudo aquilo que
Coí obtida por qualquer desses procedimentos o u pela gerKrali- tivttem observado.' Eles me perguntaram , muito naturalmente,
zação a partir de observações experimentais, mas por meio da o qui eu desej:lVa q ue observassem. ~ claro qu e a instruçio
alteração de teori;õt$ já existentes. Não há em ciência, como não 'Observem!' nio tem sentido. A observaçio é sempre seletiva.
há em .:mes, uma lógica dtl cr;tlçiio. "Acontece que m:::Ui arguo Para que se efe tive necessita de: um objeto escolhido, de uma
me ntos neste livro (The Logic 01 SâtnJific Discovery, pg. 32) tareia definida, de um interesse, de um ponto de vista, de um
independem desse problema. Entretanto, minha posição, rdati- problema. A descrição pressupõe a existência de uma linguagem
\'amentc ao assumo, se tcm algum in teresse, é a de que não existe descritiva, com palavras relativas a propriedades; pressupõe,
-a lgo que se poss:. J cno minu mé todo lógico para ter novas idéias, aindl, similaridades e classificações, o que, por seu turno, pres-
t.{ue não c:.; iste uma reconstrução 16gica Ot3Se processo. Minha su?Õe interesses, pomos d~ vista , problemas a." l s10 significa
posiç:iu poJc ~cr Jcl:Jr:ldo dizenJo·se que cada descobe!ta encerra que " observações e, ti IOftiori, enunciados rd-ativos à observação,
um 'elemcn to irrJcional', ou 'uma intuição cri:lIiva', no sentido são sempre int~rpreti1{ Õ~s de fatos observados - interpr~ttlçõt'S
bt rgsonbno. J)e 01\1,10 :tn;ílogo, Einscein fala da 'bUSC3 de lei s iJ luz de umtl feori.l"' . ,
de am.,b ul1iver~.diJ :\(k. de que um retrato do mundo pode "O problema 'o q ue vem anres, a hipótese (li) o u a obser-
ser obtido, pela ~inlpk~ d o.:dIIÇ~() . N;io há caminho l6gico', afir- vação (O)?' ~ um problema que admite solução - exatameOle
ma ele, 'que cood u7..l :1 ! ;t i~ . kj~. como o problema 'O qu e vem antes , a S'Jlinha (H) ou o ovo
Elas s6 pootm ~ r :.lt::mç:IJas pda intuição, que se apóia (O)?'. A resposta para esta últim-a ques tão seria : ' Um outro
em algo parecido CO m a 1':1\:';:;0 intelec tu:ll (Ein/ühlung) pelos
objetos d:J experi t:nc i:1 ''-' Em C:lrta dirigida ., Poppcr, que se : CO.'1j( ctuf(S uni RcllilclÍons, ?g. 46.
:Jcha na versão ingles,t d,-' tl}~i/..: I/er FOfschulIg, Ei nsrein declara Th.: Logic 01 SâcfI/ific DisuJllery, pg. 107 , nOl~ .
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38 39

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tipo J c ovo'; para: a primeira: 'Um tipo anterior de hipótese.'
É bem v~rd.ld e que qualquer hipótese particular que possamos
r escolher terá sido precedida por observações - -as observações,
por exemplo, que a hip6tese devia aplicar, ao ser concebida.
Entretanto, estas o bservações, por seu turno, adotaram como
pressuposto algum sistema de referência, um sistema de expecta-
( tivas, um siste ma de teorias, Se as observações tinh::am alguma
importância, se geraram a necessidade de explic:lçcXS e Qljgi- 3
(
nanm, dessa maDeira, a invenção de hipóteses, isso se deveu ao
fato dt:: q~ aquelas observações não se acomodavam no seio do o CRITÉRIO DE DEMARCAÇÃO ENTRE O QUE É
antigo sistema teórico, no seio do antigo horizonte de expecta- CIÉNCIA E O QlJE NÃO E CIÉNCIA
r tivas . Convém observar que não existe, aqui, o perigo de um
regresso infinito. Retomando a teorias mais c mais primitivas
e a mitos, nossa caminhada esbarrad, em última instância, em
( eXJ>e'"laúvas inalar 5 . " Nos termos do que denominei concepção tradicional, lIquiJo
que distingue a ciência da não-ciência é a utilização do método
r Há de se nour , neste ponto, que a teoria do conhecimento,
induti\,o. Contudo, se nâo existe indução, não pode ser aqueJe
elaborada por Poppec, mergulha em uma teo ria da evolução. A
o critério de demarcação. Qual será? Uma forma de chegar à
conexão entre es~ elementos será objeto de atenção no capí-
resposta que Popper oferece pata esse problema é aprofundar
tulo 4.
O contr3ste com a concepção que ele procura substituir .
(
Segundo a concepção tradicional, concepção iodutivista, os
cientistas buscam, acerra do mundo, enunciados que encerrem O
máximo grau de probabilidade, em lermos da evidência dispo.
r tÚvd. Popper contradiz essa posição. Qualquer tolo, assinala
ele, pode oferecer enorme número de previsões que tenham pro-
babilidade quase igual a I - proposições à semelhança de "Cho.
verá", que traduzem uma ocorf(ncia pr13ticamenle inevitável e
que jamais pode0'! ser demonstradas falsas; jamais, porque, em.
bora se passem milhões de anos sem caie uma gota de água,
continua verchdeira a afirmativa de que, um dia, poderá chover.
( A proba.bilidade encerrada por enunciados dessa espécie é má-
xima porque o conteúdo informativo neles presente é OlÍnimo.
r Com efeitO, há enunciados verdadeiros cuja probabilidade é igual
a um e cujo conteúdo informativo é nulo, a saber, -as tautologias,
que nada nos. dizem acerca do mundo, porque sempre se mos.
tram necessaria.mente verdadeiras, independenlemem e de como
(
se jam as coisas.
Se, 0 0 exemplo acima, tornarmos o enUllciado falseáv el, res.
(
CON;erlfues i1l!d Refl//II/lo/I)". pg. 47. t ringindo-o a um lapso fin ito de tempo - "Choverá no ano

41) 41

_.... -- . ~ ....,_.
.,...-- ~ ~ --. . _ .~
p rúx imo" - d..: !.:om j llu ~ r lí virtuallllnllc Vnd 'ld:.. irn, t:1))bora descrição, um tes te ou umJ po:encial fal sificação. A probabili ,
possa vir :I ser demonst rado biso . . De <.jll314uc r m,uH.:ir'l, con· dade de ser verdadeiro aquele enunciado de alto grau de con ·
li nuaf<i sendo de pequen'3. villi a. Se acrt:sCcnta;-ml"" ;l !~() m:l.is, teúdo informativo serla muito próxima de zero - pois é muito
jazendo com que o enu nciado s(' refira a um:l p.ltli ; ubr ;irea - elevado o número c e modos de os fatos se arranjarem diferente-
" Choverá na Inglaterra no pró,uffio aoo" - eS[;}fo.:mos, por fim, mente. "A ci~ncia não desvela truísmos. Ao contrário, faz parte
r começando a dizer algo, pois há numerosos lug:lrcS d;1 slIperficie da grandeza e da beleza da cié:ncia o fat o de podermos aprender,
( da Terra em qUl": n50 chover::í no próx.imo ~no . Pela primeira aunés de im:est igaçõcs conduzidas com espirito crítico, que o
vez, alguma informação útil é veiculada. E qU:\I'H Q mais espe- mundo é inrc:iuClente di\'erso daq uilo q ue chegamos 'li imaginar
crfico tornarmos nosso enunciado, - podemos re stringi.Io para - até que -a nossa imag:nação seja eslimulacla pela refutaçio de
dizer "Chaveri na Inglaterra, na semana próxima" c passar a teorias anteriores I ."
(
"Choverá ~ Londres, na seO'lana próxima", e assim por diante Um sentimento J~ respeitoso temor peJa ciência e pelo
- mais prová\"el será que ele se mostre errôneo, mas, ao mesmo mundo que da desvenda pode ser encontrado nos escritos polí-
tempo, mais informativo e, se verdadeiro, mais ú ti l ele será - ticos de Popper. Em The Poverty of Hisloricism (pg. 56), ele
~lté que cheguemos a enunciados como " Choverá hoje à tarde, na afirma: "A ciência ganha significância como uma das maiores
(
área central de Londre-s ", que podem estar rnuilo longe do ave nturas t:.~pir i tl.l:l j s que: o homem conheceu ." O sentimento
r ôbvio (às doze hor:J.s de um dia sem nuvens) e que sâo de lt:al parece te r um fu ndo religioso, embora P opper não seja o que
utilidade prática. comumente se entende por pessoa relig iosa. Com efeito, ponto
r básico da maioria das rdigi&s l o de que existe uma realidade
Estamos, portanto, interessados em enunci"3dos que encerrem
de ordem peculiar por tds do mllJldo das aparências, isto l, o
, alto conteúdo inform:ltivo, consistindo esse conteúdo de todas
as proposições não tautolôgicllS suscetíveis de serem dele dedu-
zidas. Conludo, quanto rr.aio r o conteúdo L'lfotnl3tivo, menor a
mundo comum do bom senso e da observação e da apuiêoci3
humana ordinária - realidade que, afinal, sustenta esse mundo
probabilidade, seg undo O que nos diz o ci1culo de probabili- e O põe diante de nossos sentidos. Ora, é precisamente uma rea-
dades, pois quanto mai s info rmação um enllJlciado contenha , lidade desse gênero que a ciência revela, um mundo de entidades
maior o número de maneiras segundo as quaü. d e poderá mostrar- ~30 observáveis, de forças invisíveis, de células, de part.kulas e
-se falso. Tal como qualquer tolo poderá formular enuociados de de ondas que se interpcnetram, organizam e estruturam pa.ra
<Iha probabilidade c que praticamente nada digam, assim tam- atingir um nível mais profundo do que os níveis a que somos
bém qualquer tolo pod erá fo rmular enunciados que encerrem alto C3p:1US de chega r em condições normais. O ho mem, presumi-

cont eúdo informativo, ca~o nJo se preocupe co m o serem eles velmente , sempre co ntC' rnplou as nores e se comoveu diante de
f;l lsos. O CJue dc ~cj am o~ ~ ~o t:nunci:lllos de alto conteúdo infer- seu perfume e de saa beleza. Sem emba:go, foi somente a partir
mati vo l: , COnSl''1ij(·n!cmcn tl.: . J ..: haixa prob:lbilidõldc, os . quais, do ú!timo· s&=u.lo que: se tornou possível ter nas mãos urna flor
não ObstanlC-, se óli'roximcm ti". verdade. Silo p recisamente esS4!S e saber que o objeto preso entre os dC'dos é uma complexa asso-
os enunciados pdos qU;lis lIC ín lcreS!'3m os cicmisu s. O fato de ciação de compostos orgânicos contendo carbono, hidrogênio, oxi-
esses enunci~dos SU CllI :.llJmenlc false3\'cis torna·os, também, g~oio, nitrogênio, f6sforo, enxo'fre, cálcio, ferro, sódio, magnésio,
altamente SUSCClíVl.: is do.: ~ l' rc m submetidoo a teste : o conteúdo potássio, cloro e vários outros elementos, em uma complexa
informati\'o que I.:st:í cm proporção inversa à probabilidade, está estrutura celular que: se desenvolveu a partir de uma célula única;
em proporção dirl.:t:\ !. ptlSs ibil idade de teste. O enunciado va· e .saber alguma coisa da estnllura inl~n:l de tais células e dos

(
I.i
,
dadeiro com o mji~ :lll" COI1! eúdo inIormativo possível corrcs-
pondcria à com~let'l , 1' ~ !'lCd fi c ::l e precisa descriçi o do mundo;
e to(h observ:l.ç.1:o \l\1 (.'s pcr ié nci;l possível comtituiria, pau essa
processos que permitir3m sua evoJuçio e saber dos processos ge-

1 The Legic 01 Sci.'JIIi/lc DiscQ IJt,.Y, pg. 4}1.

42 4J
(
néticos que conduziram a eSta flor.,; que pwdt:ú r:io Q Ufr:IS ilores; os dentisl3s rdullram ffi l!i:as ~·C2es em admit ir l refutação de
cOllhccer em pormenores de que modo a luz se rdlele n~ fl or e uma hipó,esc, gastando suas dJ:ls n::l tenta tiva de deíe"der~
atinge a reuna; conhcc~r os pormenores de funcionamento do o que não pode ter defesa , Todavia, segundo Pop;x:r, o falsea -
sistema visual e do SiStem2 oH.uivo e do sisl\:ma ncurofisiol6- mento loral ou parcial é o destino que podemos antecipar para
gico - sisu:mas que cap3ciu m o homem a loc, r rK\ fl or c seotir reJls as hipóteses; de\'eríôlmos, inclusive, alegrar-nos com o fal-
seu perfume e contemplá-Ia . Essas realidades qU.3SC incr i\"eis que sca men :o de uma hipótese que acalentamos como um filho inte-
( se eocoott:Jm ao nosso redor e dentro de nôs são J c!>Cobert3s lectuaL IXssa forma , Jjn':ll.lo-nos de rernores e remorso, tor--
recen tes, que ainda est.o sendo exploradas, enqu::mto novas des- n:lndo-s:: a ciêr,da uma aventura exci tante em que a imaginoção
(
cobc:nas similnes continuam li. $('( feitas. Descortina-sc diante e a intuição conduzem a desenvolvimentos conceituais que trans-
de nós um paoorama sem fim de no~' 3S pos$ibilidades, que se cendem, em generalid ade e 3!caoce, a evidência ex~ri.melml ~
projetam para o fUNro e que f:C2vam para além dos sonhos mai s concreti%3ção dessas visõc~ i:uaginali vas em hipóteses abre CIl-
3.uevidos que o homem podia conce!x:r ali quase os nouos dias. minho pua o rn:1iS rigoroso leste ocperirnental, antecipando-sc:
A permanente e vívida sensação da verdade de tudo isso e o fato sempre que :1 hipótese possa ser contestada, para ser substifuIda
de que cada nova descoberta oos rraz uma série de problemas total ou p:uci31mente ,por uma Outra hip6tese de maior poder
r iruuspeitados !1io notas que csuclerizam a melodologia teórica expticativo )." ,
( defendida por Popper. Ele compreende que a nossa ignodocia Dessa maneira sen tem-se libertados não apenas os cientistas,
cresce com o n OSSQ saber e que, por conseguime, o nÚJncro de mas todos nós, em nossas atividades, graças às noções de que
(
questões será sempre maior do que o número de respostolS. Ele podemos aperfeiçoor nossos pr~dimen t os. identificando O que
sabe que a verdade interessante consiste de proposições cxue- pode ser melhorado e melhora ndo.o. Conseqüen temente, as
mameme i.mproviveis, que sé podem ser fruto de imag.i.n::lÇÂo falh as de\'em ser ativamente procuradas e não ocultadas ou con-
(
ousada. Sabe que tais hipól ~s temeclrias 550 u$u:Wnente errô- tOClUdaS_ O comentário crítico de terceiros, longe de causar res-
neas e não de\"e m ser aceitas, nem mesmo em caráter pro\·jsório, seotimento, deve ser olhado como auxüio valiosíssimo e bem-
sem que se baja realizado uma tentativa séria de constat3r ~ -vindo, pois exerce, em notáve l grau, papel liberador. T:11ve.z
que pOntos podem estar erndas. Popper também sabe, todavia, seja difícil conseguir que as ~soas - condicionadas a rcceberem
que se admitirmos li hipótese mli s plausível, toda v~ que esbar- de m3U grado as críticas e espera ndo que :as cdtic:zs sejam por
ramos com uma dificuJdade, essa hipót~ será a explicflção ad outros mal recebidas e tendendo, porl:!.n!o, a manter silêncio
hoc que mwos se "raSI::I da evidência disponível e que, porl3nto, o~rc. dos próprios erros e dos erros alheios - formulem as
menos lon&;e nos condul._ TroriZ3çio deslemid:l (conquanto nos críticas de: que o aperfeiçoamento depende ; não obstante, pessoa
leve mais lon~c, qUoln llo cor rctol ) é mais fácil de mostrar·se .alguma pode prt'Star -nos maior serviço do que mostrando o que
ctrÔne.1 , ls~(I , l'Or':m . n:io deve ser caUS3 de temores, "A eon-I é erroneo na forma de pensuroos ou agumos. Qu.anlo maior a
cepçiio crtJ, b &1 ci(nó, rr3i-se !lO se ll :tOseio pcb certeza '_" falhll, maior o aperfeiço1!Ilento que sua exposição tom:1 possível ,
, Comprl'Clldl.'r IIU<': !\ silU:l(;iu pode ser como foi deserita ger:r
Um3 sens;lç:tll de l i l)l: r t :I\~it) 110 pe:4Juisador - que foi m3gnifi-
O homem que acolhe a crítica e age cm função dela :I. prez.ar:i a
ponto de colocá-Ls acim-a da âmizade; O homem que repele :I
camente ,k:scrit:\ 1)l IT Sir Juh n E..:c1cs. "A crença errônea de que crh.ica, prcocup.a.do em manter 'i própci.. posj~o, está fadado a
a ciência conduz, l ' ) 1l últim:\ i ll s l :'inci ~, à certC'Z3 das expc.caçôes eSt3grat. Algo que, em nossa sociedade, lembrasse: ampla alte-
definiti vas t"-z col l!\ij-ltl :1 id"::i:t de' Que é grave delito :a divulgação ração, no sentido de llcolhimento das ati tudes popperianas em
de aJguma hipól\:se \IUI.: pode vi r ;) ser bls3 . Co:1seqücnteoot:nte, hce da crítica, representlria uma revolução nas relações sociais
(
~ Tbc LO;lc oi ,\r;"llflii , I) :'f/I(W}\ )lI,;. 281 , :: ). C. Ecclu: Fcâ ng Rt di: )', pg. 107,

44 45
1
."
I

~
c i n lC l'p..:sS'./,,J is - p:.l[:.I n10 iabr d.l!' prál il:h tI:1 OI ~ :lllilJÇjO d.1 de mais alI O CO~I~~JO i nfor m:lrivo; con!<cqüer.lemente. é Olõ deve
s()Çi=d :r~c , ponto :I. que :allldjrcmo~ :ldi3ntC. se e!3 -:r prevalccc:'lle.
Tomemos , entretanto, ao cient i ~ I:r . A pesquisa oricntad.l Acentue·se o ~n;o de que, em determinado lerepo, 2: maio-

I
pela críliC':1 a que: ele se C:DUCtl, em hU!oCa de teorias m.üs c: mais r::l esmagadcra dos cientist:tS não se encontra empenhada em
aprr!c:içood2.s exige muito de qualqüe r teoria <:;ue ele se proponha dcr:-Jbar li o rladoxi:1 domin ante, mas, :10 contr.:ído, trabalha I le-
a sus:entat. Um:!. [eoeia d e.\"e , :'!ntes de: tudo, ptop~cíar soluç30 gre:r.ente dem:o c!-:; suas iinh as. 1\5.0 es tio os óentistlls inovando
( p:U11 um problema que nos íntercsst':. Contudo, deve, ainda, e r3t:lIr:.ente têm de escolher entre teorias conflitantes: o que
mostnu-se comt':ltível com todas '0 5 observações feit:a~ e inc:uir , fazem , de modo geral, é colocar em ação -as teorias aceiu s. Isso
(
como primeiras lproxirnaçóe'J, as tC:,Jrióls !Interiores - embora é o q ~ e vei» a ser conhecido COt:lO " ciência norma.''', com base
deva, ao mesmo tempo, ronu::Iodir:i-las un pomos o nde se: mos- no U~I) de urnJ {rase de Thoma~ $. Kuhn, em Th~ Slruclure 01
ln.ram: falhas e exp1icar a ri7.ão des5a~ falha s. ( Aqui, inciden. Scictltilic R ~volrl!ior.s (2. a ed ., 1970 ) . A ooserv3çio é vál ídt,
t3lmemc, está a cxpliaçio da continu:d:aJc da ciência . ) Se, s.!gundo pwso, m~s nio se levanta conIn Popper. :e
verdade
dianle de: uma determiD3da siluaç:io..problt:rua for adianlaJ .. ma.is que os ~critos ce Po?per são, de algum. lor102, exclusiv:SI15 nas
de uma teoria que prttncha todos os ~u~sitos mencionados, referbK:ias que f3 zem aos grandes gênios inovadores da ciênct3,
:1 cujas atividsdes SU:lS reorias mais diretamente se ajustam . E
(
de"/er=mos optte por uma delas. O {alo de que sejam diferetlle$
( significa que pe!o me!lOS de uma de!as setoÍ vi&veI deduzir pro- é umbém \·erdadeiro que a maioria dos cientistas .cdu, para
posições passíve.is de teste enio deduzívds de uma outra das resolver prob:.:mas em nível infe rior , teorias que apClIs uns
teorw ; e isso permite que a opç.io se faça com b3se empÚ"ia. poucos, entre seus colegas, estão contestando. Contudo, • esse
Caso ruja ib'Jaldade scb todos 0$ demais aspectOs, nOSfa prde· neve1 i..,fcr.or, suas 2,tivíd:ldes se expõem à análise popperiana,
cblC!2 SCffi?!e se incli.n:uá, :lp6s os les:~, p>=:Ja teotia Cj'Je apre· que ~ , em e5sd1c:ia, uma lógica da solução de problemas. Popper
sem?~e se mOSUOIJ preocupado, aotes de tudo, com a descoberta
sente maior conleúdo i..,fonnativo, t:;mto porq'Je {oi mdhor
ensaiada como porque nos d iz mais : a teoria fo i rndhor corro· e a inovaçiio e, por conseguinte , com o tesle de teorias e com a
borada e é mais útil. "Por Stau de corroboução de umll 100:;3 expansio do coohecimerato ; Kuhn ?ceocupa·se com 11 man e ~a
como os Gue aplic:un essas teorias e es~ conhecimenlo orientam
pretendo si&niIic:l r um re!:oto conciso que avalie O est3do (num
seu trabalho. Popper sempre se mostrou cauteloso no acmtuar
dete:minado tempo t ) em que se enCOnlra o deb.ue crÍlico :cerca
"2 dis:i!lCão, i::í feiu n~te livro, entre a lógica dns ativídsdes
da teoria , no q ue respeir3 à se;!. m~r.eif:l de resoh-er os proble-
óendicas e sua psi cologi~, sociologia e ::Issím por diante; a teo·
Jna.s, a seu grau de suscelibilj(bJe a te ~ te§, à severidade dos testes
ria. dI: Kuhn é, em verdade, 1.!00a teoria socioJ6gica acerca das
(
:l q ue foi submctiJ:l e :1 m.1r.cira como se comportou diatllc
dcsses testcs. r\ corroborJ~'iív (ou gr:1U de corroboração) é, -assim,
ad...iduics do cientista em nossa sociedade. Essa teoria nio é
incomp3tí\'d co m -as idéi:\S de Popper c, mais Ii..,da, Kuhn modi ·
um rdolo 12vali>Jl}fJT dt: ,/" um pcnJm p.JHI1JO . An310gamcnlC: à
( (icou.a smsiv::lme!lte na direç50 do pensamentO popperi:tno,
prdcrénci3, u;m C:1r.ílL'C cs,cncia!mcn lc compatarh'o : e:TI ger31 ,
desde que, pela primeira vez, a ti>resenrou. A os leitores que
só se pode d ize r lJ"':: :t Icuria A Ic m grau maior (ou menor) de
de.scjem :tprofuncbr esse ponlo podemos lembra r o simp6sio
corroboraç-:io 4UI; :1 Iwri .1 riv:11 n. :. luz da d iscuss::io crítica que
Crj[jciJm t1nd rhe CrowJh 01 Knowletl,e $ .
inclui li reJ lj za,~1) de Il" lc". IIh~ Jdc rm illado l~mpo t' ." Dessa
maneira , a detcrmin:ldH rl·mpn, e nt re INrias r:va is, os rne!hore5 O fala de eSlarmos nos referindo agot3 às utilizaç&s dadas
resultados sJo 05 proJllI.i dn~ pela teoria melhor corrooorncb e às tcorias Jev3·nos à indagação acerca de $Cu contcúdo-verdade,
(

,I "' Obj1!(Iive Kllo lI"l,· d ~<". I'.t. 11'. ; &I. l.:Ikatos e MlJ~grave, Clfr.brid=:e Uni...ersity Press, 1970.

46 47
scn J u (;>5;1 ;1 cx p[ c!>~ào que POj)IX'r \lSJ: 1).lra dc:nominlr 11 cb sse ;'lcx ?6-las, sem amoigüid .làes, à refutação. E , ao nível metodoló-
de ~ nunci:ldos verd:ldei ros q ue d ..-corre m de um::! leolia . Impor- gico, oão dC"'cmo'i, diz ele, fu gi:- sislemaliclment e à rdutação,
I,mlc c: n05 d:llmos COnt:1 de q ue lodos o:. enunciados e mpíricos, auavés de um3 reformulaçio contínulI cU tcoril!; ou da evidência,
inclusive os falsos, cncerI:lm um conteúdoovc u.bd-:. Suponha- com o obje ti,'o de m:lntê-la5 concordes. Isso é o que fazem
mos , por exemplo, que hoje seja stbunda ·fcira. Nesse caso, o muitos m-::lrxi ~ :as e mui tos psiC3lll1.list3S. Assim, estão substi·
cnunci;tdo "Hoje ê. terç::deira" será h!so. Conl ;Jd0, desse falso tuindo 3 ciência pelo dog31a:ismo, eoqU3n!O proclamam proc:uler
enunciado decorre que "Hoje não é qu arc a·[eir.l " , " H oje não é cie:,uificamcme. Uma teoria científica nio explica tudo qLr.lnto
r q uina-feira" e muitos outros enunciados que 530 verdadeiros. possa ocorre r: ao cont õário, afasta muito do q ue poderia acon·
,. € verdadeiro, com efeito, um indefinido número de outros cnun · tecer e, conseqüentemente, se ve aúslada, se ocorre aquilo que

I
ciados que decorrem daquele fllso enunciado; por exemplo. "O ela afaslou. Dessa fo rma, uma teoria genuinlm~nle ciemifica se
nome {r:mâ:s desse dia da scm:lOa contêm cinco Jeu:ls" ou " Ho j.:: coloca pennanenlemeote em risco. E chegamos, assim, à resposta
nia é dia de um só período de mbaJho em Oxford". Todo q ue Popper ofcrect:: para a queslão proposla ao início deste capí-
enunciado falso tem indefinido número de conseqüências verda. tulo. A r~/ul(Jbi/;JflJ~ é o critirio J~ d~mQ,cQçõO entr~ Q âincUz
deiras - nzão porque, num argumento, contesta r as pr('m iss~s ~ fl não-cii ncÍ4. O ponto central a acentuar é o de que, se todos
do oponente nio leva a refuar-lhe ~s conclusões . E , ponto q ue I os possíveis estados de coisas se acomodarem a uma teoru, não
m2is nos importa, é a razão porque uma teoria científic:l n:io hav'!rá estado de coisas ou observação ou resultado ~i.me o tal
verd.adeira pode conduzir'DOS a cUO'lerosÍ5sim:ls conclusões ver. que pOssa scr ofc:ecido como evidência co nfirmadora da teoria .
dadeius - em maior número, talvez, do que qualque r das teorias Nio havcrá diferença observável ~[te o ela ser verdadeira e o
anteriores - e mostrar-se, portanto, de :lha \'alia e utilidade. ela se r falsa . Nesses termos, a teoria não veicu la informação
Natur:ilinente, a maior porção do conle\Í d!>verd:lce de qualqucr cientlfica. Por ou tro lado, somente se houver alguma observação
(
teoria será trivial ou será írrelev:ln te para os propósitos que te· conctbível capaz de refutá·la, será a teoria susce tível de leste. .
nhamos em viSl:J; o que, obviamente, objetivamos é o conteúdo- E somente se fo r suscetível de teste será cientHica . . .J
( ·veedade que se mostre relevante ou útil Ainda assim, esse tipo . Mencionei o marxismo e ~ ps.icanálise ao ocupar-me deste
de conlcúdo-vcrdadc poderá decorrer em maior es~la de um assunto porque foi o exame de!i5JS, enlre o utras teorias, q ue
enunciado falso do q ue de um enuncbclo verdadeiro . Suponna- levou o jovem Popper a ebborar o st:u critér:o de demarCAçio.
mos q ue agora falte um minuto pua o meio di a; assim sendo, $cntiu·se ele intrigado e impressionado pela maneira como a teo-
o enunciado "€. me io d ia e m pon lo" é fa lso. Cont udo, paNl a ria da rehtividade, de Einsteln, p;3recia expor-se abertamente 9-
m:Jioria dos propós it~ que se posu imagi nar, esse enunci ado
fa lso te m con leúdo·\.'crdlde mais relevante e útil do q ue o ecun·
ó 3do verdadeiro " Es tamn ~ cntrc a~ 10 d:l m:)nhã e:l5 4 da tarde".
I, refutação, prevendo efeitos observáveis que ninguém sonharia
espetAr. A T eoria Geral (c, de passagem, frizemos que o pro-
gresso de Einstein, da teoria especial para a geral, é o tema de
An:tlo,:::tmente, e lU ci~'llc i:l - JlM:'I :l mlioria dos obje tivos, um um livro de Popper ainda incompleto 1 conduzia à conclusão de
enunci:l<Jo d in:lo qu<: POIlW ~c deS\' j;1 dfl verdade tem maior utili.
dade do que oulro que. ~n do vc rd3Jeiro, é vago. Não estOu,
( que a luz deve ser :lIraleIa por ,?ryDS peudos. Einstein percebeu
que se isso fosse correto, a lua que vem de uma estrela para a
n::t lur:. lme-nll.·, !>u$:,criudo quc dC\'alOos c('nleOlar,nos com enun·
ci:tdos fal so!'. N:'in ol1"I:lOlc os cicntistas vêem·se comument e
t Tern, passando próxima ao Sol, deveri a defletir-se , em razão da
atração gravitacional do Sol. Durante o dia, normalmente, nio
compe lidos :. ul ili"'.lr UIII; ' leori3 que sabem errône3 porque até podemos ver e s~ s estrelas devido ao brilho do Sol. Mas, se
o mo mento .\:iu !' ur~ju h:o ri3 me:ho r.
fosse possível ve-Ias, a deflexã:> de seus raios luminosos faria
Tal como :IOH:" ôlct'muci, Poppcr rccomenda que fo rmule. parecer que ocupassem posiçõe, diferentes daquelas que sabemos
mos as teori3S dt.: Ill:"l(:ir'j tão cl3u quanto possível, de modo que ocupuc. E a d iferença prevista poderia ser determinada
I:
(
48 • 49
fotografando, em tais circunstánci:Js, uma eSl rc:b ií);:'., de dia, e, d )(~io de IJCri!ICtl{jjel d3 tcoria, Tudo qu anto ocorresse iria sem·
posteriormente, à noite, na ausência do SoL Eddinj),ton suometeu pre confirmá·b. Assim, sua verdade mostrava·se manifesta; e os
a teste essa previsão através de uma das mais famosas obstr. de~ren~es cram, !;em dúvida, pessoas Gue não queriam ver a
vações científicas deste século. Em 1919, chdiou um;; cxpedição verdade ma :J.ifesta, que se recusavam a enxergá·la, seja porque
para certo ponto da África, do qual, segundo calculou, um espe· da i-a. contra seus interesses de classe, seja por padtterem de
r rado eclipse do Sol tornaria essas o.relas visíveis c, conseqüen· repressões ainda 'não 3n~li s:1da s' e clamando por trata..rnento.
r temente, possíveis de fotografjj,[ duranle o dia. As observaç6cs ... Um mll>.:iSla nio podja ~ b r:r um jornal sem descobrir em
foram feitas no dia 29 de maio. E conoborar3m :I teoria de todas as páginas e"idêncüs confirmadot'as da interpretação que
r Einstein. Outras teorias que se proclam3vam cientíCicas c domi. ernpresc:\\'3 à história; não apeD:lS nas nOlícias mesmas, porém
navam a moda inteltttual na Viena em que Popper viveu sua ainda na forma como eram apresentadas - e que revehva a
juventude - as teorias de Freud e Adler, por exemplo - não lende:-nciosídade da cl25se a que se filiava o jornal - e, espe·
r foram e não podiam ser aferidas dessa maneira. Não h:JVia como cialmen tc, naquilo que o jornal Não dizia. Os analistas freudianos
conceber observaçõcs que pedessem cont raditá·Ias. Elas expli. ~ a~ntuavam que suas teorias eram constantemente confirmadas
C":lriam tudo quanto ocorres~ (embora de diferentes formas). : par 'observações clínicas'. No que respeita a Adler, muito me
r Poppcr deu·se Conta de que a possibi lidade que tiMam de ex·' impressionou uma experiênda pessoal. Certa vez, em 1919, re-
pli.car tudo, possibilidade que noto impressionava e excitava seus' latei.lhe um caso que não me parecia particularmente adleriano,
adeptos, era precisamente o que nelas havia de mais erndo. ! m:l:s que ele analisou facilmente em termos de sua teoria do sen· ·
A única outra teoria que tinha. popularidade na época, pre- limemo de inferioridade, embora nunca houvesse visto a criança
te.,5Ões cienwicas e oerci-.l também grande fascín io, o marxismo, a que eu me refcria. Ligeiramente chocado, perguntei.lhe como
situava·se em posiç5o djferente. Dele er~m deduziveis, sem dú- podia ter tanta certeza. 'Por causa de minha experiência de mil
vida, prev:sõcs falseáveis. O problema estava em que numerosas ~ ngulos' , retrucou Adler; ao que não pude impedir-me de d.i.zer:
dessas previsões já se haviam mostrado falsas. Contudo, os mar· e com este novo caso, segundo suponho, sua experiência adquirirá
xistas ~ recusavam a -admitir a refutação e reformulavam inces· o milésimo primeiro ángulo' " r..
santemeote a teoria (e a evidência), paro afastar a refutação. Popper jamais - e isso não pode ser exageradamente subli.
Para elcs, na prática, 131 como se dava com os psicanalistas na nhado _ afasrou essas teorias como destituídas de valor e, menos
teoria, as idéias tinham ":t incont~táv el certeza de uma fé reli· ainda, como absurdas. Desde o começo, muitas pessoas que o
giosa e :l insist ência em que revestiss<!m caráter científico era, ligavam aos positivistas lógicos, supuseram que Popper repelia
, embora sincera , i:nprocedentc. aquelas teorias c, em conseqüência, entenderam mala que ele
Poppcr nunca duvidou de que o segredo da enorme atração dizia. "Não quer isso dizer que Fttud e Adler deixassem de
psico16gica exercida por essas várias teorias residisse no fato de paceber Corretamente cert:ls coisas; pessoalmente, não duvido
{ se mostr:l.rcm c~pazcs de tudo explicar. Saber antecipadamente de que muitas das a!irmativas por e.le:s feitas sejam de impor·
que havcrá possibi1id~dc de compreender tudo quantO aconteÇa, tâocia considerável e de que v$!'nhlm a desempenhar papel rele·
concede 030 :lpcnas um sentimento de domfnio inteleCTUal, mas, vante numa ciência psicológica suscetível de ser submetida a
r o que é mais importantc, traz sensação emotiva de segura orien· testes. Contudo, não significa isso que as 'obsuvações clínicas'
tação no munJo. A :lccitaçJo de uma dessas teorias aercia, se. que os aoali.stlS ingenuamente acreditam confirmar a teoria poso
gundo Popper ob~crvou, "o efeito de uma conversão ou reve· sam fazê ·lo em nível mais alto do que -as confirmações dUrias
lação intelectual, abrindo m olhos para uma verdade nova, oculta que os astrólogos encontram nas atividades ' a que se dedicam.
aos ainda não iniciados. Uma vez que os olhos se aorisse.m dessa
fOn:::la, veriam em tudo instâncias confírmadoras: O mundo eStava Q Conjtet,,'tJ tJnd &JllltJlions, pp. J4-3S.
(

"
50
Quanw a fIcud c s u~ g r:lr.Jios,\ concepção de C,K'), Iri c Jflpr:r- m-.::nte dissessem ;lIgo e enunciados que nada encerrassem. Con-
-ego, niío pode cb invoc:lr Jlalll! cie ntífico substanciJlmcr.tc mais cluíram que as pro;x>siç&s significativas se distcibufam por duas
fundamentado que o das estórias que Homero c'-!ligiu do Olimpo. cbsscs. Ha\·ja enur:aados em l6gica e matem:í!ic~, não otientados
Essas leori3S descrevem algu:1s fatos, mas à maneira &:: milOS. pelo o!:ljetivo de propiciar i!"lformaç:io acerC:l do mU!"ldo empreico,
Encerram sugestõcs psiço!úgicas ioteressanlíssimas , sem JS apre- os qo.;ais, conseq t:entcme;, te, poderiam ser considerados verda·
sentarem sob forma s u sccü~'d de tes.e. deiros ou fahos sem se verem referidos à experiênci3 - os
"Ao mesmo tempo, dei-me coma de que esses mitos podem verd:ld~iros eram t;Juto logias e os fa!sos eum contradições. A
ser des~volvidos para se tornarem susce tíveis de les te; que, pJr ddes. ha...·ia enunciados q:Jc pretendiam :ransmitit infor-
(
hlando de um pontO de vista his;6rico, todas - ou quase todas mação 3cerca do mundo empírico, enunciados cuja ve tdade ou
- as ((.orias científicas se originam de müos e que um miro pode falsida de deve deixar patente alguma diferença obs<:rvável, p0-
iocluir impor.antes antecipaçôes de teorias científicas. São exem- dendo, assim, ser colocados numa ou noutra catcgoria, por força
(
plos a teoria d:t evobção por tentativa e erro, devida a Empé. da obs<:rvação. Todo enunciado que não fosse proposição formal
docles ou o mito do universo U1':O e imut~vel, de Parmênides, de matemática ou lógica (o que &nrand Russell havia procurado
no qwl naó.a jamais acont~ e O qual, se lhe acrescentarmos mostrar constituírem a mesma coisa) e q~e n:lO fosse, ainda,
uma no...a dimCT'lsão, se tt3nsforma DO universo uno de Eínstein sus.ce:ível de verificaçâo empírica, haveria de ser des?ido de
(no qual, também, nada jamais aconteCI!, pois tudo está, falando ~ignificado. A possibiüdaàe de verificação era, portamo, conside-
, de um ponto de vista da quarta dirnenslo, determinado e esta-
bc1ecído desde o principio). Pareceu-me, assim, que se uma teo-
rada o critério de demarcação entre enunciados significativos e
não significalivos, acerca do mundo.
( ria é c("lo~iderad.a não ::1enúfic::l ou 'meu-física' (tal como se po- Popper, desde o i!1ício, contestou essa posição, por motivos
deria dizer), ne:n por isso deve se! tida como privada de impor- vários. E;n primeiro lugar, fossem ou não fossem verificáveis
dncia, insignificante, 's..."1l"l sentido' ou 'absurda'. Não obstante, empiricameme os enunciados singulares, ;] verdade é que não
é improcooente que essa teoria p:ocl:.lme estar sustentada por O eram enunciados universais como as leis cientificas e. assim,
evidência empírica, no sentido científico - embora possa facil- o princípio da verificação eliminava não apenas li metafísica, mas
todo o edifício da ciéncia natural. Em segundo lugar, o prin-
(
mente ocorrer que, em a!gum ~cntic!o genético, seja da 'resul
tado de observação' 1 ." cipio da verificação a~irma va ser destituída de significado toda a
A primeira interpretação errônea dada à obra de Poppc:r, melllHsica e, nio obstante, historicamenlc, foi da metafísica _
prop~gad3 3.mpLamentc e ainda hojc o':Jjclo de divulg:Jção, con· de concepções mítiCls, religiosas, penetradas de superstição _
r sis~ iu em vê·la como proj>Osito13 da fa!:>e:Ibilidade como crité-rio que brotou a ciéocia_ Uma idéia que em determinada época é
de dcmllrc:l,ão não, como ela pretendi<1 SU, cntre a cic:ncia e a insuscetivd de tcste, revestindo, porlanto. c3.táter metaIrsico,
n.io-ciênciíl, ma.. ent :c o significativo e o destituído de signifi- pode, com ' a transfonnação das ci(CU~sl3.ncias, tornar-se passí...e!
cado. A p:luir daí (e porque os pró;mos m:lUS jntérpretes acre- de tes:e e. conseqüe!"ltemC!"lle, pode [ornar·se científica. "Exem-
. ditassem quc o não cie ntifico cra dcstituído de sentido), insis· plos de idéias t3is são o atomismo; a idé ia de um ' princípio
líúo' único ou elemento último (do qual dcrivam os demais);
tiram os críti(:l.ls cm rcr.J1ondcr ao prOtesto de Popper dizendo
( que, afinal. II!du n.:sult:!\";L no mesmo. Com efeito, os positivistas a teoria do movimenro da Terra (a que B3.con se opôs, dando-o
lógicos, cletcrmjn3Jo~ ;1 abst:lr o palavreado metafísico de que corno fictício li a antiga teoria corpuscular da luz ; a teoria da
se impregnara a fllmofi;t, tinham como preocupação central a de e:Jecricidade como um fluido (rediviva como hipótese do elétron·
er.contrar um pri:,cípill J c dcmarcaç3"o entre enunciados que te31- -gás aplicável à conduribilidade dos metais) s." Não ocorre

(
CM;Ulura tJui Rr!lIltJlirJ/;J, pp. 37·38. ~ Tln Log.:c oi SO,"lfl/IC Dh~ol'(r)". pg. 278 .
(

(
52 5}
"
luto cômodo de uma longa descrição - e nada ma is. AnaJj· lormular e discutir toori.as a propósi to do mundo. Um filósofo
5:1ndo-3., não se caUle informação algum a a propósito da física . que devot-a a vida à ptrocu~ação com o inSll"'Jmento lembra um
Sem essa expressão, 111 física permancre exatamente a mesma - carpinteiro que devota todas as suas horas de trabalho 30 aUH
apenas a comunicaç-io ~ lorn3fia um pouco mais difícil . "A as ferram entas, nunc.a chegando a usá·las, a não ser uma conua
idéia cc que a pr.eci~o da ciência e a da língu3gem científica :3 outra. Os fi16wfos , como lodos, têm o de.ver de falar de.
dependem d2 pl etisão dos Icrmos empregados é certamente muito maneira cht3 e. direu; mas, à semelhança dos físicos , devem
plausível, mu não paSS2, crtio eu, de me ro preconceito. A pre:· executar o trabalho que lhes cabe de fonna lal que nada que se
cisio de uma (jnguagem depende antes e lão-somemc do falO de re-.-lsra de impordncia depcr.da do modo como utili..zem as pa·
ela acautelar-se pua não sobrecar~gar OS Termos de que se vale bvras.
com o ônus de serem precisos. Uma cxprcssEo como "duna-de- A partir desse ponto de vista, Poppel, coerentemente, con·
-areia", ou "veoto", é, por cerlO, mu ilO vaga. (Quantos cend· lestou ambas as filosofi:3s propostas pOr Wit~genstein - O posi-
melros de altura. deve ler um monte de arei" pa~ merecer o tivismo lógico que emergiu do :lIomismo lógico e dominou uma
nome de duna-de-arcia ? Com que velocid3dc deve o 1.1.[ mov~,se geração e a análise lingüística, pela qual foi dominada .a geraçio
pan merecer o nome de vemo? ) Sem c:mb3rgo, para muitos
,
seguinte. "Os .analistas da linguagem acredir-am que não há pro·
dos propósitos que os geólogos possam lef e m vista, esses termos
blemas filosóficos genuínos ou que 05 problemas de filosofu,
são sufici entemente precisos; e, para outros propósitos, que re·
queiram grau maior de diferenciação, sempre se pode dizer "dunas se é que a;istem, são problern.as I elatjvos ao uso da linguagem
entre um metro e dez metros de altura", ou " vento com uma velo- ou concernentes lia signifiC"3do das palavras. De minha parte,
cidades entre 20 e 40 quilómclIos ?Cr hora" . A situação, no que porém, acredito que há pejo mecos um problema filosófico pelo
coo<:erne às cié.ocias exatas, é análoga. No que respeita a me- qual todos os homens de pensamento hão de esta r inte.ressados.
didas físicas, por e.:templo, sempre tomamos cuidado para esta· g o problema da cosmologia: o problema do comprunsõo do
belecer a amplitude dentro da qual pode ocorrer um erro; e li mut:do - no qual es{omos incluídos nós próprios C norro conhe·
procisio não consiste em tentar reduzir essa amplitude a nada cimento, como parte do mundo. Toda ciência c:: cosmologia, se·
ou em pretender que nio ex.ista essa margem de erro, mas an tes gundo creio, e, para mim, o interesse da filosofia, n10 menos.
em reconhecê·la explicitamente" b. que O da ciência, se resume na~ cOnlribuições ql!e podem oferecer 1
Se alguém desejasse assumir ulr:a atitude prov0C3nte, pc> p.na esch1rttE.lo 10."
deda 3Sse\'erar que a quantilhde de conhecimento útil que ~ec8e Muitas distinções dicotômicas sur.lliram ao )onll:o da his-
(
de qualquer campo de investig2Ção (exceto, naturalmente, o dos tória d2 filosofi.a (e . g., nom inalismo/realismo ; empirismo/trans·
estudos Lingüisticos). tende a estar em proporção inversa para ceodentalismo; materialismo/idealismo) e nenhuma ddas deve
com a qU1ntidade de discussão em torno de significados de pa· ser tomada em termos dem~s.iado estritos: o que pode fazê·las
lavras que, neste mesmo campo, ocorreoo . Discussio desse tipo, panicubrmente desoríeoudoras é O f2to de que, seja qual foc
longe de se faz er necessária par3 t<"... cIartter o pensamenlo e torou a dicolomi;;l aplicada, muit.a coi~a $!eralmente se .acumul;;l n;;l liM;;I
preciso o conhecimento, obscurece um e outro e tende li COOOUZU de fronteiJ':3 . Contudo, um dOs duali smos que está presente ao
.a controvérsias interminiveis .a propósito de palavras, em vez longo da maior pane da história da disciplina c:: aquele que dis·
de f.azer com que ;as controvérsias gi rem em torno de quest&s tingue entre uma concepçio de filosofia que a enca ra como ten·
de subSt3nci:.l . A lingul1gc:m é um instrumento e importante é t.ativa de compreender o uso que fnemos dos conceiros e uma
o que se faz com c: l~ - no CIlSO que nos ocupa, seu uso p.an i, concepção de filosofia que 3 vé como ten l:uiva de compreensão

~! Tht Op.:" Soe"·/ .' 'I/ul /11 Entnlltl. \"01. ti, pp. 19·20. HJ PrcHcio p~u a cdiç~ de 19;19 d. Lot.i~ af 5eiClllifi, Dircova".

, 56 57
elo mundo. É obvi~me:H(! impossível ::hcgar H compreensão do I IIVeJlitJlliOIlJ, publicada postumamen te, em 1953 , provavelmente
mundo sem (l utililaçii:o de conceitos e, conseqüentemente, exe.ce:J sobre a filosofia bglesa, posterior à Segunda Guerra
adeptos de amblls as posições admiti rão, geralmente, e com algu- ;\iundi:al, influê ncia maior que a de qualquer outrO livro. (O
ma procedência, estarem levando a cabo lI.S duas tentativ:ls. To- livro que: se colocou imed ia tamente após, T he COl1cept of mind,
davia, '3 difercnç:l de cnfase é, com freqüência, acentuadí~síma. de: Gilbcrt Ryle, foi profu"dame:nte influenciado pelo Wiltgens-
É o que se deu com a famosa distinção que, na Idade Média, tein de sua segu nda fase.)
(
se 1r::~ÇO U entre nominaListas c realis!~s. Os realistas (termo que \ E:n seu Afy PJJiloJophiclJ1 D e"'elopmml, RusseU escreveu ;
para nós tem hoje um significado equívoco) filiavam-se à pri- "A partir do pcríodo iniciado cm 1914, três o rientações domina-
me:rs couente acim:l referida ("os conceitos são entidade~ reais ram, sucessiv:lmeme, o mundo (ilosófico bri tânico: em primeíro
em si roesmas c precedem os particulares: estes últimos derivam lugar, a filosofia de WiHgenstein, exposta no Troclalus; depois,
dos primeiros e deles dependem"). Os nominalistas pertenciam a filosofia dos po~itivis tas lógicos; e, em terceiro lugar, a filosofía
3; segunda corrente: ("os conceitos oper:lm como nomes para as exposta por Wittgc:nstl!in nas [nveJligalions. Denue elllS, 1õI pri·
( coisas, que s50, portanto, anteriores: os rótulos podem ser ahe- meira teve considerável influêocLa sobre meu pr6prio pensa-
u dos sem alteração da realidade"). Durante a maior parte do mento, embora eu agora julgue q:.Je essa influência niio f 01 intei-
século alu :l1, a filosofia desenvolvid:l no mundo de fala inglesa ramente boa. A segunda escola, 'll dos positivistas lógicos , con-
incH.. 10U'~ fortemente no sentido da elucidação dos conceitos. tava, de modo geral, com minha simpat ia, embora eu discordasse
P opper é, decididamcn te, um fi!ósofo da outra espécie (embora de algumas de suas doutrinas mRis caracteristicas . A terceira
ele seja um realista, no sentido moderno da palavra, no sentido escola, que, por comodidade, chamarei W IJ. para distingui-la
de acred itar qu e um mt;r:clo material existe independente da da doutriru do Traela/tl!, que denominarei W I, continua a ser,
experiência) , a meus olhos, inteiramente ininteligível. Seus pOntOs positivos
Nas pr: roeius págmas de My Philosophical Development, parecem-me triviais ; e os pontos negativos, infundados. Não
Bemand RusselI nos díz co mo, até aquela data, 1917, _ qU:l[~do descobri, nas Invcsligation s, de Wirtgenstein, coisa alguma que
ele tinha 45 anos e havia elaborado quase toda a obra: filos6fica me parecesse interessante e não chego a compreender coroa toda
e m razio da qual é ho je famoso - de "havia considerado a uma escol:!. descubra sabedoria naquel3s pági nas. " Russell afastou-
Ungu3:gem como transparente, equivalendo isso a dizer que 3 en- -se cada vez mais de seus colegas, na medida em que envelhecia.
tendia como um meio C'3p3Z de ser utilizado mais ou menos des- Aín.d.a em .My Philosophical Deve/opment, deixou regislr'ado;
preocupadamente". Wít1g:ens t~ in , de outra p2rte, sofreu dl<I9.nte "Wittgenste;n, por quem fui superado, na opiniâo de muitos
toda a vida a obsessio dl Jin~u lJ!em e, em partiruIar , a obsessão filósofos britânicos .. não é experiência por qualquer título
do significado. Seu primeiro Iino, Tracldl ur Logico--Philow- agrldável ver·se oiliado como ultrapassado, depois de ter estado,
phicllJ, public<lclo e m 1921. (oi o texto que maior inf:uênci..1 por algum .tempo, n3 moda. Ê difícil de aceitar :llrosamente esse
exerceu sobre o Círcu lo de Viena . Wittjo!enstein veio, posterior- estado de cois:1s." Pelo menos, e.: meIMtO, Russell havia cons-
mente, a repuJiar ~,,!ucla o bra c :l [ ~pu diá- Ia precisamente por- truido sua grande obra e adq1;!irido grande reputação antes de
que nela se incor~lT<IV:l um,l bisa [Co,ia do significado. Propôs. Wittgensteii\ se lom ar conhecido. Popper, que explicitamente
-se, conseqüentemente, :I invcstig:.lr as d iferentes esp&:ies de ca. partilha da maneira de Russell ver a obra final de Wittgeastein 11,
minhas pelos quais podemos nos perder, em razão do uso Q!.IC nâo teve: a mesma possibilicbde, Sua peculiar desventura, tanto
hçaO'los da lingu:lgem; dI.' próprio, cm verdade, se havia perdido na Áustria como na Inglaterra, foi ter vivido a maior parte de
( e aquea inveslig.:lçã<J :.Ilimentou uma nova escola de filosofia , sua v:d3 profi ssional em Jugues e tem;>os dominados peJa figura
h:lbituahnente denomin:.lda "Análise lingüística". A priocipal
obra de Wittgenstein, :lO IO:'lgo das novas linn.:ls, PhiloJoph.;caf 11 Ver .A,(oJ~", BIi'úb Plu'lol<Jpl" (ed, Bryan M.gC't ), pg. UI o:: ss.
(
>1) 5'
1
de Wingenstein. Esta é a exphc:lção paI3 a pOUt'3 es tima, que
seria, sob o utros prismas, im:ompreensível, a ele devotada por
( seus colegas de profissão, espeçialmente quando posta em con-
traste com a inHuéricia exercida sobre outras jreas c tantas pes-
soas altamente qualifkadas. Tal como Geoffrey \Varnock assi-
nalou: "Os filósofos tendem mui to a tomar o assunto no estado
em que o encontram e a nadar alegremente a favor da cor-
rente I~ : ' Sob certo aspecto, porém, a experiência de Popper
surge corno oposta ii de Russel1: numa época avançada de sua
4
vida, agora que se tornou impossível ignorar a falha das filosofja~
(
wittgensteinianas no corresponder às esperanças de seus segui- o E VOLUCIONISMO DE POPPER E SUA TEORIA
dores, começa ele a projetar-se. ACERCA DO MUI\1)() 3
• Antes de encerrarmos as referências a esses malentendidos
passados e presentes, importará acentuar ainda um ponto. Traço
r . típico da hegemoni a analítici, nis décadas recentes, tem sido a Segundo a concepção tradicional , o rné"todo cienlÍfico abran-
genuína crença dos fil ósofos no sentido de SUStentarem que a gia as seguintes fast:s, nesta ordem, cada qual dando o rigem à
(
filosofia é elucidação de conceitos e de esquemas conceituais, fase seguinte: 1. obsemação e cx~ri.mentação; 2. generalização
o que raramente fizeram os grandes filósofos, tivessem ou não indu tiva; .3. hipótese; 4. Ico tativ3 de verificação da hipótese ; 5.
consciência disso. Gerações de estudantes passaram a dominar prova ou contra-prova; 6. conhecimento. Popper substituiu essa
modernas técnicas de análise aprendendo a usá-las com relação concepção tradicional por outra: 1. problema ( em geral, ( 0 0 -
( aos escritos dos gt"lndes mortos; e muitos livros foram com- flítos face a expectativas ou recrias e,ostentes ); 2. solução pro·
postos a propósito de gigantes do passado para apresentá-los posta, ou seja, em outras palavras, nova [Olri:l.; ). dedução, a
COmo fiJórofos analíticos. Como disse Alasdair MacIntyre: partir da teoria, de conseqüências, na fo rma de proposições pas-
"Qu80do os filósofos brit:1nicos escrevem acerCa de história da síveis de tes te; 4. testes, ou seja, tentativas de refutação, obtidas,
lilo:)Ofia, tr:1t3m costumeiramente a figura histórica em termos entre outras maneiras (mas apenas entre: outras maneiras) por
tão contemporáneos quanto possíveis, discutindo com ela como meio da observação e da cxperirnrntação; 5. escolha ent re teorias
( com um colega da Arisrorr:lian Socier:; n." Isso tem ocorrido rivaiS.
há lanto tempo que a incompreensão radical, embora sincera, A pergunta a respeito de como su:giu, na fase 1, a teoria
incorporada nessa posição, espalhou-lhe amplamente, tanto na ou a expectativa, cuja falha gerou nosso problema, admite como
litCl',ltura de nossos dias , como no ensino universitário. Assim, resposta breve e mais comum: surgiu do estágio' de um pr()-
não se trata de uma in just iça especial, feita a Popper, dizer que cesSO anterior. Caminhando para trás, em busca de tais p ro-
sua obra não d ifere muito da de ilustres contemporâneos seus, ou cessos anteriores, chegamos a sertas apeclativas i03t3S _ não
diter q ue o jove m Porper nao se afa5tava muito dos pc-s;tivistas s6 DO homem, como nos animais. "A teoria das idéias inatas é
l6gjros. Essa atitude teve muitas vítimas ilustres, além de absurda, segundo imagino; con tudo, cada organismo tem certas
Popper .
reações, ou respostas inatas; entre elas, respostas adaptadas -aos
aconto!"Cimentos iminentes. Tais respostas podecn ser descritas
como "expectativ:ls" - sem que haja necessidade de imaginá-
U Em Mod,-,·" lJririr" ]'lulu w plJ)" (cd . Brpn 1>ügeé), pg. 88. -Ias conscientes. O bebê recém-nascido "espera'.', em tal sentido,
I.l Em M o.üm n f/fá" PbifnJoph)" {ed. Bryan _'"-·h gc-e), pg. 193. receber alimento (e até mesmo, segundo se poderi a. sustenC3f,

L 60
61
c"pcu ser amado c p ~o Lcgido). Em vis(oI d:l eSlrei'a cone:div organismo, de contro lc~ que modific~m Ou s vpdn~em transfor-
que se m30ifes[:l entre cXpcCl3liv:\ e conhecimento, pode·se falar mações inadequad:ls.
31é, com boa base, em "co:lhedmento inalO", Todavi:t, esse "co.. Tal como acontece com 2 teoria de Darw in, a de Pop~r não
Muimeoto" não é válido a prior;: uma expeclati\'a inata, não nos oferece uma explicação pna a origem da vida, relacionando-
impona quio fOrle ou espedfica, pode ser errônea. (O bebê -se apenu ao ~ desem·olvimento. Em verdade, Po?per sus-
recém.nascido pode ser abandonado e morrer de fome.) Nas· tenta que a origem, seja da vida, sej;t das teorias, seja das obras
cemos, ?Ois, com cutas expectativas; com um "conhecimento" de :lrte, não é suscetível de explanação racionaL Eis o que diz
que, cmbcm. n50 seja válido q priori, ~ pJico[ogícamenl~ 011 !.~nC'­ em várias parteS de The POJJl'fly 01 Hisloricísm: " No mundo
(
ticam~n le a priori, isto é, anterior a loebs as cxperiencias obsee- que t. descrito peja física, nada ocorre de verdadeir:!: e intrinse-
vacionais 1." camente novo. Uma nov'l máquina pode ser invenuda, mas ela
A teori2 do coMetimento defendida por Popper está, pois.
se analisa em tennos de componentes que nada têm de novo .
intimamente associada a uma teoria da evolução. A resolução Novidade, na física, é simplesmente novidade de aCT3ojos ou
de problemas é a auvid::lde b.\:sica e o problema fundamental combiluçiXs_ Em o?Qsição direta, a novidade biológica é uma
, é o da sobrevivência. "Todos os org{)nismos estio, dia e noite, espécie intrlnS«1l de novidade_ _ _ . O novo não pode ser apli-
cado causalmente ou raciorutim ente, mas pode apenas ser enten-
constantemente, empenhados 124 fesolução de problemas; e isso
{
aCODtece com t~s as uqiiêndas de organismos, na escala evo- dido em termos intuitivos. Na medida em que a novidade
lutiva - sub-reino, ou phy(a, que principia com as mais rudimen- é pas.slvd de análise .racional e de previsão, ela deixa de ser
taJes formas e de que os atuais organismos vivos são os cle· 'intrínseca'_" A questão da emergénÓ'lI, a emergência do genui-
mentos mais recentes '." Nos organismos e animais que se en· namente novo, preocupa-o b3stante e é um dos temas aos qua is
contram abaixo do nível humano, -a solução provisória dos pro- PopPtt poduá prestar contribuição de imeresse, no {UlurO.
i
blemas se revela em forma de novas reações, novas expectativas, No processo biológico de evolução, encarado como hist6ria

"I
I'
I'
,-
novos modos de comportamento_ Tais reaÇÕC5, expectativas e
modos de comportamento, quando persistentemenle lxm suce·
didos, permitindo I. superação d:\s dificuldades que se antepõem
da resoloçío de problemas. um aspecto é de particular importâ n.
cia, colocando-se em destaque: o do desenvolvimento da lin -
guagem_ (h animais emitem sons, que admitem funções expres-
'I aos organismos, podem provocar a modjficação de órgãos da siVl e sinaliz3me. A essas funç&.s, que virN:UmeDte sempre
comparecem na fala hum3J\'3, o homem adicioDou pelo menos
111 II
(
criacura ou a modificação ce uma de suas formas, incorporando-
-se (através da seleção) à ana tomia do org:uüsmo_ (Um dos outras duas : 2S funções descritiv2 e argumenuuva (cabendo
I motivos que I ~ Po pper a rejeitar :1 epjs~emologia empirista, fri sar que algum:ls formas sofistiadas de comunicação anim-al,
como a dança das abelhas, por exemplo, já enfeixam formas rudi-
r 111 li
insistindo em que todas as observações se fazem no seio de: UIDa
teoria, está em que os ptÓprios órg~os dos sentidos - repre- menUles d~ mensagens descritivaf). A linguagem tornou pos-
( sentando, como de fato representam, sofisticadas tentativas de sível - eDtre tantas outras coisas - a formuLrçio de descrições
adapl3ção ao ambiente - incorporam teorias.) A eliminação do mundo, abrindo margem p3~a a compreensio. A. linguagem
{ .11 Ij dos erros pode redundar, ou na chamad.t seleção natural - que: se deve o surgimeDto de conceitos como 05 de verdade e falsi-
I-
" t. a in<:apacjdade de um organismo sobreviver, face j ausêoc::a dJde. Em outns palavras. 'll lioguagc:m tornou viáveJ o desen-
de uma transformaçio necessária, ou em virtude de transfor· volvimento d3 fa2ão - melhor dizendo, foi parte integrante
maçio inadequada - ou no desenvolvimento, no interior do do des.envolvi.memo da r.1zão - e pcnnitiu a emergência do
homero no seio do reino ani:nal . (locidentalmente, o f2to de
COIl;ulll't S and Rt!ul,Jions, Pl:. 47. que o homem surgiu do reino animal corno surgiu, passando \
2 Obiwillt Mowft'dgc, " , . 242. lcntumente por certas fases, s:gnifica ter ele vivido em grupos \
(

62 ("

\ - - -------""
,la longo de vascos períooos; rccord:wdo esse fato, deve ser ou um conjuoto de novos objetivos: a estrutura-de·objetivos dos
errôn~a a. idéia, mujto disseminadJ, de que todos os fenômenos animais (~ do ho mef':l, em particular) nio é aJgo 'dado', mas
sociais podem ser, em 0Jtiml análise, explicados em termos de algo que st: desenvolve, com auxilio de algum mecanismo que
natureza human a ~ com efeito, o homem foi um ser social muito open por meio de re.alimeolação, a patlü de objetivos anteriores
antes de se traosformar em ser humano.) Segundo Popper, é SI e a panir cc
res'.Jhados q ue podem ou não ter sido buscados.
li~guagem - no semido cle forma estruturada de contato, de Dessa mmeira, lodo um novo universo de: possibilidades e POlal-
comunica.ç~o, de descrição e de argumentação, poI m eio de sím- cialidades vem :1 abrir·se: um mundo que é, em boa medida,
bolos - que nos loma humanos, n!ia apenas como espécie, mas tJull;nomo !."
( como indivfcluos; a aquisjç50 de uma linguagem é que torna N esta sua arúlise da t:vo!uçio da vida e da emergência do
possível a consciência: completa do homem, a consciência do eu. homem e do desenvolvimento da civilização, Popper vale-st: da
(Em surpreendente número de casos, a obra de Poppcr antecipa noção n~o apenas de um mundo objetivo, de coisas materiais
as idéias de Chomskr. ) (que ele denomina 'Mundo 1') e de um mundo subjetivo das
( As primeiras descrições do mundo parecem ter sido ani· menles (Mundo 2), como da noção de um terceiro mundo - ,
mi stas, mâl;ius , cheias de elementos vindos da superstição. Pôr mundo de estruturas objetivas que são o produto, Pio obrigato- \
em dúvida essas descrições ou qualquer outro fator que asse- riamente intencional, da aç50 dos espÚ"itos de criaturas vivas e
gurava a coesão da tribo era tabu - e podia '3carretar a morte que, uma va surgido, existe independentemente desses espíritos.
dos dissidentes . O homem primitivo veio ao mundo, portanto, Precursores disto, no mundo animal, são AS casas constnúdas por
dominado pdas abst rações - relações de parentesco, formas de pássaros, formiga:; ou vespas, colmeias, teias das aranhas ou
o rganização social, forma s de gOverno, leis, costumes, convenções, diques dos castores, - todas elas estruturas altamente (ompli-
((adições, wsnças e amipatias, rituais, religiões, mitos, supers- cada.~, e edificadas pejo '3nim:a1 fora de seu pr6prio corpo, com
(
11
lições, linguagens - abstraçóes feitas pelo homem , mas não pelo ° fito de resolver seus problemas. As pr6prias estruturas se
inc!.ivíduo pauicular, que se via impossibilitado de modificá-las transformam no centro do roe.i<>ambiente do animal, para o qual
ou mesmo de colo<:'3·)8$ em questão. As abstrações punham-se, se ori~ta a pute mais importante de seu comportamento. Em
pois, diante de C1Ida homem, como uma espéde de realidade obje- verdade, o animal, multas vez.cs, nasce em uma de tais estru-

li
tiva que o dominava desde seu nascimento, tornando-o humano, IUr3 S e elas constituem sua primeira experiência do ambiente
determinando - de maneinl quase autônoma - todos os as- físico, no momento em que deixa o corpo matemo. Acresça-se
11
~os de sua vida . Ao ver de Popper, a maioriz dessas condições que em alguns casos as estruluras são abslratas: formas de orga-
nunca foi planejada ou tencionada. "De que maneira surge 2 nização social, por exe mplo, ou padrões de comunicação. No caso
!
I
trilha segu ida pelo animal nu floresta s? Um animal abre Ç!l. do homem, certos traças característicos se de~volveram pU':!.
( minha por entre a vegetação rasteira para ak:mçar a água. que lhe: fos,e possfvel enfrentar o ambiente e acabaram por in-
Outros animai s acham mais fácil seguir a mesma trilha. Dess.a rroduzir modificações espetaculares nesst: mesmo ambiente. A
(
maneira, ° uso a alarga e melhora. Não houve plano, trata-se mão do homem é apenas um dos .muitos exemplos a ser lembI'3do.
(
11 de conseqüência não intencional da necessidade de movimentação E as estrutur.as :abstratas criadas pelo homem - a linguagem,
(
, mais d"pida . t assim que surge a trilha - talvez aberta. pelo a éliC3, a religião, a filosofia, 3S ciências, as artes, 2S instituições
homem - e é assim que podem surgir a linguagem e outras - st:ropre riv:alizaram , em escopo e guu de ebboração, com as
( instituições úteis, cuja CXiSlênCi.a e desenvolvimento podem dever- transformações que ele impôs ao '3mbiente Hsico. Tal como
(
-se à sua utilidade . Não há plano ou intenção e talvez não acontece com :lS criações de oultOS animais {m:ls e m escala 3inda
111 houvesse necessidade de tais instituições antes de elas surgirem
efetivamente . Contudo, elas podem gerar novas necessidades, Objwill( Kno/llldgt, pp. 11 7·I IS.
.! ~

I:
; 64 , 65
lógico, sem !ou prC('iso :lpdut (como se deu com Mar~ , &g3- Anuga, iniciando-se com a de Ta.les e seu disdpulo Anaximmdro
mo~) ~ra um plano ou um.:! trama geul, e sem ser pR'Ciso c com a do discípulo d es tc, Anaxímenes" . Aí se encerrou a
considerar (como no C.3SO de Regei, por exemplo) algum espí- uadiçio dogmát ica de plilssar adiante uma verdade imaculada,
rito ou al~uma força vital a movimentar o proc~so , por assim iniciando-se li r.ova tradição ncioo.al de submeter a discussão
dizer, de seu interior. A teoria é profundamente esclarecedora critia t06s lIS rd1.exõcs . O erro começou a ser encarad o sob
e deverá C!lostrar-se muito rjca em suas ap!icaçiXs. O uso que outro prisma : em vez dI! ser um desastre, era uma vitÓria ou
dcla fez Emsl Gorobrich, Icvw do-ll para a história e a crític:a uma Vanfll~l!m . O homem dogmático, como os an.iauis e os
da :ute, tesuhou em obra que muilos autores consideurn genial. o rganismos inferiores, permaneceu de pé ou caiu com suas teorias .
O próprio Popper vale-se da teoria que elaborou, discutindo " Ao nível pr~-ci("otifico , somos muius vetts des:núdos ou eli-
c: apresentando soluções para certos problemas das mudanças mioados COm nossa.s teori<ll s falsas; perecemos com n O$.SliS teorias
sociais -:- que 2bsorveram os grandes filósofos polÍticos, de PIa- falsas . Ao nfvel científico, procurllrnos sistematica mente eliminar
tio a Marx - e das mudtnçu íntelect\la.is e artísticas _ sobre nossas falsas teorias; tentamos fazer com que nossas teorias falsas
~s quais se dcbruç.uam muitos filósofos, de'ide H egel Ou mesmo perCÇ1JD. a fim de que con tinuemos vivos ' ." Quando o homem
aOles dele . dei.xou de partilhar o d e$tino de suas teorias, perecendo com
Na história do Mundo J, encarado como um rodo, o mo- elas, seotiu coragem para arrisca r·se em novos empr«nd.imentos.
mento mais not5vd, desde 3. emergéncit da linguagem, foi o da Antes, todo o peso da tN:d.ição intdewnl impunha UlDaI posição
( emergência da critica e (em seguida) o da sua aceit3bilidade. defensiva e se prestava pua a preservação das doutrinas exis-
Como já tive ocas.Uo de notar acima, todas ou quase todas as tentes; agora, pda primeira vez, ~sa tradição era enfrentadll
sociedades de que lemos cooheeimenlo parecem ler dado uma com ~púi:o de crítica e se transformava em força capaz de
interpretaçio <lIO mundo, consolidada em algum mito ou em .Igu- impor mud:1!)ç2.S. Os pré-socráticos preocuparam-se com questócs
r
pu rtligião; a1t1:m disso, qualquer dúvida 3CeI"C2 de tal itmrpre- relativas 1110 mundo natural. SÓCrates aplicou a mesma racionali-
laçiO podia ser punida com <li morte. A verdade devia ser preser-
dade aftic.1i ao comportamento humano 111 às inst ituições sociais.
vada intacta e tn.rumitida imacuuca de geração em geração. Ali principiou o incoercível crescimento da pesquisa e d~ conhe.
Com esse objetivo é que surgem e se deieD.,'olvem muil:l$ insti- cimento deu resultante - fator que, de modo espetacular, dis-
tuições - miSlt1:rios, sacerdócios e, em estágios mais avançados, tingue a civilização da Grécia clássica, e dos seus herdeiros, da
escolas . " Uma escola desse gênero jam.. ã admite uma idéir. nova. de tOCÚS as OUtrllS civi1iz.açôcs.
(
" ' Id6as novas sio heresias e leva.rn a cisrn-as; se um demento da
escola procura alterar as doutrinas, ele é expulso como ~réúco.
O herético, porém, asseYCN, de hábito, que t1: ele quem cansava
os verdadeiros VJsinamenlos do fundador da escoa. Assim, nem
( mesmo o inven tor IiIdmite haver crillldo; ac~itlil, em vez d.:sso,
que está voltando para a veldadein ortodoxia que foi, de algum
modo, pervertida r, ."
I
Pop?er $ustenl:l , como questão de fa[O histórico, que as
primeiras escolas, onde a crítica nio se via apenas permitida,
mas e ncorajada, foram <lI S dos filósofo s prt1:-socráticos, na Gr&ia

I 1 Ver, umbém, õI. cil~O J c X eD6 f'/"I~-S que se xh.t no capo 2.


B Con;u lufo III/d Rt.lul~ liof/J, pg. 1~ 9 . a Poppc:r. em Modt rlf B,itiJh PIJí!OJOph,. ed . B!")':IID ltúgee, pg. 7) .
(
68 69
maior), as c:r:ações humanas :ldquiriram importâncis nuclear no escrita linear n, da civiliz..1ç30 M!nOlca, só foi decifrada recen-
ambiente ao qual de precisou, em seguida, ajustar-se - mode- temente), de!.cle que codifiç:;dls e preservadas em alguma forma
Jando-O, por assim dizer. A existtncia objetiva de tais criaç&s acessível _ pelo menos potencialmente acessível - do M\1fldo 1.
significa\'-2 que o homem tinha condições de examin~ - bs. avaliá· (Daí ddlui a d iferença crucial entre o conhecimento que está
-bs e criticá-las, explorá-Ias, ampliá-Ias, revê-las ou reformá.bs no espírito humano e O conhedmento que se acha nas bibliotecas
e até de delU:n, com seu aUXJ1io, descoben~s in teir;l:mente ines- - sendo este, sem comparação, muito mais importante.) No
pendas. E isso se verifica até com a mais abslua de todas as seu livro F/1cing Reality, Sir John Eccles endossa as conclusões
criações. como, àigamos, a m:.w:roátic3. "Estou de acordo com (pg_ 170) c e Popper, dizendo que "somente o hom~ possui
Brouwer quando ele afirma gue a seqii~ncia dos números naturais uma linguagem de proposiÇÕC's e essa linguagem só pode ser uti-
é UrIY.l criação humana. Sem embargo, embora criemos a seqüên- lizada por quem seja capaz de pensamento conceitual, q~ é, em
cia, ela, por sua vez, gera, de modo autônomo, seus próprios essência, pensamento llssocJ..do aos componentes do Mundo 3_
problemas, A distinção entre oúmeros pares e ímp:ues não é Esse pensam~lHo transcende o presente perceptual ... Em
criada por nós: trata-se de conseqüência inevitável e não inten- contr.l.Sle, o comportamento dos 1iI.nim,ilÍs deriva de seu presente
ciona) de nossa. criação_ Os números primos também são, é claro, perceptual e de seu condicionamento passado_ _.. Não há evi-
latos objetivos e autônomos, que, analog:amente, n30 fOrllm inten- dências em favor da idéia de que os animais puticipem, ainda
cionais; e, acerca de tais números, é óbvio que eles colocam que em reduzido grau, desse Mundo_ Sob esse aspecto funda-
muitos problemas, muitos fatOS que aí estão para serem desco- mental, os homens diferem radicalmente dos outros :tn.imais"_
bertos - ar está a conjectuf3 de Goldbach entre tais fatos 4. Esta concepç50 de Popper, de um terce iro mundo, produ-
Tais cooje<turas, embora se refiram indiretamente aos objetos zido pelo homem , mas que dele independe, é uma das mais
(' de nossa criação, referem-se de modo direto a blos e problemas promissoras na filosofia popp(riana. A aplicação dessa concepção
ql!e emergiram de nossa criação e s.o!>re os q U'l is ruo podemos ao problema da dualidade cOrpo-mente é objeto de 3tenção em
exercer influência ou controle : são falOS difíceis e a verdade um dos livros inéditos de Popper. (A idéia de que é através da
( [I acerca ddes urobém é, muitas vezes , difícil de descobrir_ Aí
está um exemplo do que pretendo dizer ao afirmar que o te:!-
interação com o Mundo 3 que nos transformamos em pessoas
permite considerar ramifícaçóe5 incontávds.) Mas sem ~trar
ceiro mundo é amplamente autônomo, embora criado por nós ~_" em tais conjecturas, a teori'll do Mundo} permite perceber por-
O Mundo 3, por conseguime, é o mundo das idéias, da arte, que as du..as facções que c:liscutem o eterno problema da subjeti-
da c~ência , da linguagem, dl ética, das instituiçÕC"S - em suma, vidade ou objetividade de padrões morais e estéticos têm apre-
I: de toda a nossa herança cuhura! - na medida em que t:SY<l
herança está codificada e preservada em objetos do Mundo I ,
sentado argumentos sem resposta. A teoria nos dá, ainda, uma
análise de outro problema de capital importância para a filo-

I
~ como os cérebros, os livros, as máquinas, os film es, os computa- sofia ocidental, o problema das mudanças sociais _ Com efeito,
dores, os quadros, os regislros de toda espécie . Conquanto todas :lS idéias, as instituições, a linguagem , a ética, as artes, as ciências
as entidades do Mundo 3 sejam produtos do espirito humano, e todos os dt!mais elementos já. le mbrados possuem uma história
elas podem ter existência independente de qualqu er suj eito (a em virtude do caráter objetivo do mundo} das criações humanas
e das permu tas que se estabelecem enue o home m e essas ma-
t • GoIdbach bnçou a COlljCCtuta $t:gundo :J qual cada J'llÍmuo par é
• soma de dois nlÍroeros primos. Ninguéro conseguiu, a!é boje", dC"morunar
çõcs_ Não há, obrigatoriamente, um progresso em tais criações,
mas das são, por- natureza, abert'lls para as alterações e, de
esse resv.ltado, embora ele scj:a kaítimo para lodos os casos 105 Quai~ fato, sofrem :lherações continuas, na maior parte das vezes. A
chegou il 1CT ilpl;çUID. (N. do A. ) teoria de Poppcr tem o mérito indiscutível de explicar de que
~ Obi((l íll( K!loli-·kdgr. pg. 118. maneira um processo evo!utivo pode admitir um fuodamento

66 67
uma solução dev~ S3tisfazer - a! teI3ndo, pois, a siruaçio probl~·
mb.ica . O proc~so também nio é dialético (em qualquer seno
tido he8eliano ou marxista), pois considera a contradição ( que
diferI! da crítica) e m termos de '3180 que não pode ser tolerado,
em qualquer circunstância.
A f6rmula citada contém algumas das mais importantes
idéias de Popper. Ele próprio :1 condl12iu para vários campos
5 da invest igação, enquanto outros a Jevuam para áreas que Popper
nio chegou a explorar. Em sua opinião, a fórmula não seria
CONHECIMENTO OBJETIVO aplidvel no l err~o da m:atemática e da lógica . Em tempos
recen tes, porém, convenceu-se do contrário, graças, ~ especiaJ,
:lO mlnlho de Imre Lakatos - que, sob este prisma, foi mais
Um desdobramento inconsútil da Histó ria, desde li ameba poppe.tiano que Popper. Popper escreveu pouco aCttCl das artes,
a:é EiDstein, revela, em tOO:l. extensão, um padrão constante. embon. '11 música signifique mu..i to pata ele. Foi, aliás, em decor-
"As soluções provisórias que 'animais c plantas incorporam em rênci. de scus estudos de histó ria da música, no icúc io de sua
sua llIl:l.tomia e em seu comportamento são os análogos bioló- cureir:l, que nasceu a sua concepção acerca da resolução de pro-
,, gicos dls teorias. Vice-versa: 35 teorias correspondem (como se blemas. Todavia, é com Ernst Gombrjch, em Art t1nd IIlusion,
dá com muitos produtos exossom áticos - os favos de rnd, por que a hist6ri a das artes visuais vem descrita e m termos poppe·
.i exemplo _ e especialmente co m muilos lnslrumelHos exo5som;Í· rianos, como jncessante c "gradual modificaljão das convenções
tiros - as teias de aranha, por eJlõemplo ) 3 6rgãos endQSsom{j. esquemáticas tradicionais relativlS à formação de imagens, sob
, tiCOs e seu funcionamento . Tal como a5 teorias. os ó rgãos e ação das pres~ e...>::ercidas pelas novas ex.igências". Virtual.
lI !, seus modos de o~ração úo adaptaç&s provisórias ao mundo menle todos os processos de descnvolvimenlo orgânico (em seno
em que vivemos . E exalameOle como 3.5 teorias ou 05 instru- údo litcral ou figu rado) e todos os processos de apr~dU:ado
·,
, mentos, os noves órgãos e suas {uaÇ'ÓeS. ~m como novas espécies podem ser encarados dessa maneira, até: mesmo o processo pejo
de comporumeoto, exerCt:1Jl jnfluência sobre O prímeuo mundo qual os seres humanos cheg:sm a conhecer-se uns aos outros. O
Ii !
I que ajudam li. modificar 1." Popper caracterizou o padrão subja· psiquiatl':l Antoony 5torr, sem ter conhecimento Ihs obras de
I C!.nte desse desenvolvimento contínuo usaodo a fórmula
I Popper, chegou à seguinle conclus3o : "Quando, em nossa vida,
mergWh3..Qlos em situaç&s noV3S e nos colocamos waDte de
P, ~ TS ~ EE ~ P,
uma pessoo. desconhecida, arrastamos conosco OS p reconceitos
e m que P, é o problema inicial, T5 .; a solução provís6rill pro· formados no passado e as experiêndu ganhas no trato com nutras
posta, EE o processo de diminaçio de ~'ITo, apUcado à solução pessoas. Esses preconceitos, nós .05 projeumos sobre a pessoa
provisória, e p~ a situação resuhante, com seus novos problemas. diante da qual nos colocamos .. Em verdade, chegar a conbtter
T rata-se, em essência, de um pIOCt.SSO de realimentação. Não ~ uma pessoa é, em boa medida , Uf'n2 questio de eUminação de
dclico, pois P: .; sempre div~rso de P.: mesmo o fl'2C2. s$O total projtÇães; ques tão de afaslar :I cortina de fumaça de corno ima.
na resolução d~ um pcobl~ma nos ensina alguma coisa; I'tvela em ginamos que ela scja, para subSlirul-la pela r ealidade de como
qu~ pontO se acham :,JS dificu ldades e as condições mínimas que ela rt2lmente é 2 ."

'. .; I Ohit!Cliv~ Kr!ou:ledgt, pg. 145. 2 Tht" Obstr~r. 12 de julho Je 1970.

I! 70 7J
A 3ceitaçio desse enfoque )eva a ceuas conseqüências na· e da linguagem se mostum, em geral, alheios à história. de saas
tCNis. Em primeiro Jug3t, :1 tô:lÍa ~ colOCl nos problemas - dlsciplir.as, o enfoque popperiano produz o sentimento de paxti·
n1io apenas no que nos diz :espeito, mas na apreci.çuo dos cipação pt'Ssoal na. hist6ri" das idéi..3s_ (Isso explica. porque
esforços alheios. Uma tarda não principia com a ttnur..iva de Poppcr, como fil6sofo da cifncia, conhecedor de física moderna,
resolver um problema (a solução provisória é o segundo termo não ddxa de ser um erudito.)
da fórmula, Dão o primeiro). Principia. com o próprio problema Conseqüê!lcia de partir sem?re de problemas que são rt!l.l-
e com tiS razões que o tra:lsforrnam em problema . Antes de mente problemas - dúvidas que lemos e que enfrentamos - é
voltar 11 IItençio para li busca de possíveis soluções, g'2St3·se tempo o h to de que estamos existencialmente compromissados com
e ~forço com a formulação de problemal . E o êxito que se nOS5Q tuooJho. Decorre d2..f, sob o prisma do próprio trabalho,
alcança na ~gUDda etapa depende, muitas vezes, do êxito que que ele adquire aquele tom de "autenticidade" a que se referem
se alcança na primeira. Est'Jdando a obra de um Ci.16sofo, digs- os oUsleocialistíllS . Trata-se não apenas de um interesse inte-
mos, a primeira pergunta que se coloca é esta: "Que problema lectu~, mas de um envolvimento emocional - de eofrentar uma
est:.f cle procurando resolver?" Isso pode parettr óbvio, mas D«"CSsidade human3 sentida . Dai def.!ui, ainda, ceno de.sialer~se
minha experiência revela que a maioria dos estudantes de filo- pda sq>anção coovendonal entre as várias disciplln.as : o que
sofia não é ensinad:a a {ner aguda pa-gunu, nem mesmo cogita realmente impona é um problema empolgante que estejamos ge-
ck colocá-la. Em \'a disso, os csrudant~s perguntam: "Qu~ esd nuin.3mente empenha.dos em solucionar,
o fil6sofo querendo dizer?" Em conseqüê ncia , e!~ experimen· A filosofia de Popper - em termos objetivos, sem con-
tam, de hábito, a sensação de que entend~1D o que o fil6sofo fundir-se com a conduta de qualquer individuo, mesmo com a do
afino:!., mas MO percebem por que O afirma . CIsto s.6 seria com· próprio Popper - dificilmente poderia ser menos dogmática,
prttnsívc:l depois de a1~nçar íII sitU9çãc>problema que o filósofo já que coloa o maior prêmio na audácia da imaginação. Segundo
debate. ) essa filosofia, DÓS jamais chegamos a $abu: C!os~ abordagem de
Outra conseqüência, fundamenl31 para toda a filosofia de qwquer situação ou problema deve sempre perm iti r não só as
Popper, e que muito possivelmente oc:ercetá infludlcia sobre a contnouiç&s insuspeitadas, mas a permanente possibilidade de
mandn pela qual os I~.ilores de Popper passarão a eacarar todas uma transformação radical de todo O esquema conceitual com
'iI$ cois.as, é a de que, ao assimílat as idéias do ~sador, com· que Ce DO seio do qual) t;-abalhalXlos. A filosofia poPPf=riana
plttDde-se que as eS~Nturas complexas - sejam intdectU3i.s, dilue fuoda.menulmente de todas as concepções de ci~ncia e
ard'sticas, soci3is ou administrativas - sio geradas e ~ trans- racionalidade em que eStas são encaradas com oclusão de ele-
formam por etapas, por via de um processo de realimentação mmtos como o sentimento, a imaginação ou a intuição criadora ;
c rhíc ... de ajustes sucessivos. A idéia de que tais estruturas poso ela condem. (como "demifidsmo") a idéia de que a ciinda
sam nascer de um golpe, fruto de plano prévio, é ilusória, uma pode oferece r-nos conhecimentos certos e pode ser capaz, DO
ilusio que não se pode materializar. A concet'Ção evolutiV2, entre futuro, de nos dar respostas definitivas pU'3 todu as questões
outu.s coius, leva inevitavdmcnte à preocuplç30 com 05 dese:n· legítimas que nos prcocupaff;l. Boa parte da desilusão com a
volvimenlOS ao longo do t ~mpo. A história da filosofia ou da ci&\c:i.1 e a razio - muito c6mum em nossos dias - baseia-se,
ciência, por exemplo, é CDtendida não como um registro de jtUt.a.mente, em noções erradas acerca de ciência e razão. ES9a
ertos passados , mas como raciocínio em p~so, uma cadeia de desilusão, nessa medida, não se aplica ao popperismo. Se Popper
problemas e soluções provisórias interligadas; nessa Clideia esta· tem razão, nio existem duas culturas - uma cienlífica e outn

I
mos nós, co presente ins tante, aminhando par:3 o fururo _ e.sté:iC2, uma racional e outra irT'3cional - mas existe apenas
se a $Orte nos favorece - e tendo o~ s mãos uma das octremi- urna . O cic.'ltiSlas e o ~rtista, longe de se en trC(jnem a aLividades
II dades de toda a argumeJ"ltsção. Enquanto 0$ filósofos positivistas oposcas ou illCompatíveis, procu ram ampliar nossa compreensão

I
"
72 73

j:

"
da experiência medillnle o uso da im:lginaçio cri:llilll 5Ubmetid:l1 :na.ni feslar ou comunior alg'Jma coisa ou de prodlUir praur, s6
ae
a cODtrole criLico, va!eodo-se, portamo, façuldades iruclOruais
e racionais. Anislas e cientis1as cx,Joram o dc!.Conhecido e
tentam articular suas pesquisas e Sl.tll.S descobertas. Uns e outrOS
I foi alctlJlÇ":acla depois de incontá..,eis idades evolutivas . Artistas
que imaginaQ rC!omar la príndpio estão, em verdade, façam
o que f.iur em, lom;lndo elementos em u m estádio altamente
buscam a vudade e não podem pttscind..ír do uso da inruição. aVllDÇ:ldo e co!ocando-se sobre os ombros de numerosa s gerações

, Seguc:.se, porém, que se o apralc!izado, o crescimento e o precedentes . Em tudo aquilo em que mergulhamos e em tudo
desenvolvimento se processam mediante subJJJ..issão das expecta- aquilo que fazemos, somos herdeiros de lodo o passado e não
tivas ao teste da experiênca, mediante reconhecimento de áreas há meio que possibilite, por mais que o desejer:los, uma desvin-
de confli to e mediante o uso progrcss.ivo desses dememos (QU, cu.I..ção desse passado. Isso -atribui um:a irretorquIvd importin·
ero um nível purameole intelectual, medianle controle e correção cia à tradição . S nel31 que precisamos principiar, ainda que seja
de conjecturas - que podem "r mais ou menos ousadas - pela para dar·lhe comb3fe. De h3bíto, o progresso resulta de críticas
critica - mais ou menos severa), cnl50 é impossível escolher ao pusado e de alterações que nde impomos : UIamOJ li tradição
um poeto de parti.d.a absolullllIent(: novo. Mesmo que fosse e avanÇ2JJlOS com apoio nd"iil . A situação é, basic:unen:e, • mes-
possfveI ~o homem começar ptlo prindpio, ele nio se adiantaria, ma, quer na arte, quer ru ciência, "Isto significa que o íovem
~o tempo de sua morte, para além do que teria concluído O ho- cientisu, e:sperançoso de cheg:af a descobrimentos, recebe maus
mem de Ntanderthal. Estes sio fato s que muitas pessoas de cons.elhos .se O seu mestre lhe diz "Ande por .aí e observe" e
, temperamento radical ou independente relutam muito em aceitar. recebe bons conselhos se o mestre lJ"lC: diz "Procure ver o que as
pe\soas estio discutindo agora no campo da ciência; descubra
Antes mesmo de, como indivíduos, tomarmos consciência de
I nossa existência, já sofremos a influência (que se estende pua o onde se :Kham as dificuldades e ?asse a int~isar·se ;>elas diver-
I
, :! passado, -abrangendo períodos pré.-n:nais) das rdaçÕl=:s que man- gênd-.r.s. Aí estio as questões que você deve considerar ", Em
outras palavras, o que C":lhe t estudar a Jiluaçãt>problemo da
,,I temos com outros indivIduos , de complicadas histórias pe$SOllis,
que são elementos de um-a sociedade, de história infiniwnente época . Isto quer dizer que escolhemos e prOCUr2mos continuar
i:1 mais looga e complicada do que ti dos $Cus membros - que a uma linha de pesquisa que tem atrás de ~i lodo o desenvolvi-
ru pertencem em um dado momOllo e local E no instante mento da ciência ; acompanha-se a tradição da ciência. . . , Sob
em que esbmOS em condições de h.z.er opções conscientes já o prisma daquilo que desejamos, na posição de dentislas _
nos valemos de categorias de uma linguagem que atingiu um compret:osão, p:evisão, análise, e assim por diante - O mundo
particular grau de desenvolvimento -aua\"és de vidas de incon- em que vivemos é e:xaemameote complicado. Estaria inclinado
táveis geraç&-s de seres humanos que nos precederam. Popper :1 dizer que é infinitamente complexo, se e:sta ff3sc tivesse algum
não afirma, porém poderia diztr que a própria existência é o significado. N3"o sabemos onde e cOrno iniciar nossa análise do
resu1udo direto de um aio soci31 praticado por duas ·pessoas que mundo. N50 há sabedoria que nos informe. Mesmo a tradiÇão
não temos condições de eseolher e cuja ação DOS é impossível científica não nos diz como proceder. Diz·nos apenas onde e
impedir - pessoas cujo leg:aoo geoélico se im·pl3!1t3 em nosso como outras pessoas iruciaf":!m . a pesquisa e aonde chegaram' ."
corpo e em nossa petsoD:alidade . Somos criaturas sociais até a Considerando que é objetivo (na medida que importa
raiz de oosso ser. A idéia de que é viável começar quslquu a cadt indivíduo, quando de entra em cem) o falO de que as
coisa do nada, sem dividas pua com o passado ou p:U"iil com os investigações cheguam a tal ou quaJ ponto, oeste ou naqude
semelhantes, é uma idéia co mpletamente errônea, fama desta ou daqueb ciência, área acadêmica, arte (ou socie·
Aquela verdade aplica·se a qualquer tipo de atividade iate- dade ou lingu:lgem); considenndo que qualquer cIítica, proposta
1111 Iêct'Jal ou artística. A pró?ria possibilidade de deixar marcas
I!
(
sobre uma superfície ou de produzir soos, com o objeti\·o de J Co"i~/"r(f ~"d R~flll~liOIIJ, pg. 129.

74 75
II ::
,
,

,
t,
de alteraçio Ou solução de um problema, apres~t.ada pejo indi- Je estantes com obras de referrncia . E scolhamos uma del:l.S,
víduo, deve sa fonnul.ds em uma linguagem antes de se poder uma d e que o próprio Popper se utiluou, pua servir de ilus-
discutir ou submeter I teste ruas id&as - ~e·se que qu:t1quu uação - uma t:ibua de logaritmos. Tábuas de logaritmos enfei-
proposta desse gênero se tr:ms(orma em proposta objttivQ. Ela xam conhecimenro de ~pécje prodigiosamente útil, conheámento
pode ser discutida, atllcada, defendida ou utilizada, sem fazer-se que ~tá em uso ativo a c3da dia, por todas as panes da TelCa,
alusão à ~ssoa que a apresen(o,)ll . Em verdade, isso .. COflt~ na construção de edifícios, de pontes, de estracns, de aeronaves,
com li maioria das idéias de inu~resse. E ~ presta para sublinhar de máquinas e de milhares de outras coisas. Sem embargo, du-
a enctmc irnportincia do tornar objetivas nOS5:!:5 idéias - na vido que hl'lja 3lgu~m nesle mundo que "conheça" as úbuas; ela
linguagem, no comportamento ou nas obras de arte . Enquanto pode ser desconhecida -até pelo autor do Uvro que está aqui,
:1S id!ias permanecem em nosso espírito elas não são pass!v6s diante de mim (livro que, ali3s, pode ter sido compilado por
de critica. A fonnulação púHica das idéias é que conduz, nOI- um computador). A observaçio estende·se pua todos OS tipos
malmente, ao progresso. De outH parte, 2 validade de qullqu.::r de registros . Até o estud.ioso, que devota sua vida ao preparo
argumento em toroo dessas idéia! é, de novo, algo objetivo! não de obca.s eruditas, nio dispensa as anotações, via de regra nume-
é algo que dependa do número de pessoas que se disponham a rosas. recolhidas em várias espécies de documentos, livros e obras
aceitá-las . Mesmo que uma teoria tenha cadtee cieotilico e de referfncia ; e de ~eve com base em tais anoUlÇ'ÕC$. Mas
tenha sido rigorosamente submetida a teste pdo seu proponente, nem m~mo ele "conhece" (00 sentido associado ao Mundo 2)
( a comuci<bde científica não a acolherá enquanto os experimentos tudo que deixa registrado em SUlIS obras. Ele aio pode recorda.t-
e ob~tv3ções não hajam sido repetidos por outros. A afirmação -se de tabelas estatísticas, de datas, de páginas consultadas, e
"Eu sei", considerada em plano individua], ~ssevera minha dis.- assim por diante; ele não pode guardar de memória todas as
posição pata agir, dizer e acreditar em certas C'Oisu e engtoba citações, pabV[";1 por palavra; em verdade - e este é o ponto
condiçÕC'5: que justificam tais ações, ditos ou crenças. Na<b disso, de rdevo - ele nõo poJe memorizar suas pr6pritu ObNIt. Elas
porém, é conhecimento em sentido objetivo: ninguém conferirá se acham no papel, não em sua mente. As bibliotecas e OS sis-
às minhas asserções, sem o devido teste, o cuáter de conheci- tem2S de reglstro e os arquivos contêm material do Mundo 3,
mento (salvo se o conhecimento é de algo em meus próprios material que, analogamente. não se encontra no espreitO de
estados de coosciénw, como ~ dá quando eu respondo 1s inda· nÍllguém, mas que, sem embargo, é conhecimento de espécie mais
gações do meu oculisu ou inEormo ao meu médico cU Jocaliuçio ou meDOS valiosa e útil. O status cognitivo desse material e sua
de minhas dores - e mesmo estes casos de rel.atos d.iretOS de utilid2de ou valia independem da existência de alguém que o
nossos esudos correntes de consdéocia não são sempre arundos, "conheça" no sentido subjetivo. O conhecimento, no seotido
como qualquer doutor descobre pela aperiência). No trabalho objetivo, é conhecimento sem conhecedor : é conhecimento sem
civuífico, portanto, nem as nosS3S próprias observações são enca- um sujeito ·da cognição.
radas como ccrtas; em verdade, elu não são aceitas como obsa· Sob esse prisma, Popper ataca:l epistemologia ortodoxa. fiA
vaçõcs cientlfic3.s até que tenham sido rq>etidas e submetidas ':l epistemologia md.icional estudou o conhecimento ou o pensa-
teste. Sob todos esses aspectos, conseqüentemente, o conheci- mento em um sentido subjetivo - no seotido que se associa
mmlo é objetivo. Ele pertence ao domfnio público (o Mundo ao uso ord.inário das expressõcs "Eu sej" ou "Eu estou pen-
J). Não reside nos estados privados das maues dos indivíduos S3Ddo". Esse fato, afirmo eu, conduziu os estudiosos de episte-
(o Mundo 2). mologl2. a qUeil&s irrelevantes: pr0cur3ndo examinar o conhe-
Em sentido privado, individual, a maior parte do conheci- cimento cientifico, aqueles estudiosos examinaram, na realidade,
mento humano não é "conhecida" por qualquer pessoa. O conhe- algo que alO tem importância pata o conhecimento cienúfico.
cimento existe no papel. A mesa em que escrevo está rodeada De fato, o conhecimtnlO científico simplesmente não é conheci·
76 li

!.
meoto no s~tido do uso ordiruí rio d a c :'\p r ::ss~o "Eu sei" , . . . :l
epistemologia uadidonlli . de Loc..lte. Berk~ey , Hume e me.srco
Russdl, é irrelevante, num sen tido Tnc ito estrito de Sl$ p3l2vra.
Corohirio dessa lese é o fala de q'J e larga parte da epistemologia
contemporânea também é ir:e.!cva nte. Estará ai abnJ1Sich :1 ló·
gica ~is tbn ; ca. se admitirmos que seu objetivo é ti formulaçÃo
de uma teoria do conhrcimento científico. $em embargo, qual.
quer estudioso da 16gjca epislêmia pode facilme nte escap:u: de G
minha.s arrias. simplesmente torn<Uldo cbro que seu alvo MO é
cont::ibuic para li. clabonção de uma Uor;a do conhecimento cien· A SOCIEDADE ABERTA
tífico ' ."
Eis o que Pop~r sublinha 00 Prdácio de Obiuli~
Knowldge: "Os ensaios deste livro rompem com uma tradição A maior parte d:ls filosofias políticas surgidas de Pla tio a
que remonta :I Aristóteles - a tradição da teoria do conheci· Marx teve raízes ~ Ctlncepçi5e$ que se reJadonavam nio ape:ms
mento as~tada no seoso comum . Sou um grande: admirador COm o desenvolvimento social e rus:óúco, mas tam~m com o
do senso comum que:, acho eu, é essenciaJmente autocrítico. To. aV:lnço da lógica e da ciência e, em última análise, com as con·
( envia, embora esteja preparado para defender, até às últimas quistas da epistemologia. o.s leitores que até aqui me acampa·
conseqü~ncias, a essencial verdade do realismo do senso comum, nhUaID terão percebido que Popper não cons titui uma exceção.
enca ro a t eoria do conhecimento aJuntada no senso comum como Devido ao fato de ele encarar li vida antes de tudo e principal-
um desatino su!:ljetivisll . Esse eoga no do minou a fi10s05 8 oci· mente como processo de solução de probl emas, deseja sociedades
dental. I'>e minha parte, procurei eliminá·lo, substituindo-o por que b voreçam esse processo. E, como a solução de problemas
uma teoria objetiv-a do conhecimento essencialmente conjecturaI. supõe a livre proposiçio de: sugeslõcs, que paSS3m .3 ser submc:~
Minha asseveração pode ser ousada, mas nio me pareçe que: deva tidas à crítica e ao cri vo do sistema de eliminação de erro, deseja
pedi r desçulp3S por fazê ·la ." Popper formas de: sociedade que pamitarn a irreSlri!3 apresen·
tação de proposições difc reoles, seguidas pela crítica e pela d eliva
possibilidade de mudança à luz da. critica . I ndependentemente de
qu-aisqucr considerações de o rdem moral (e é da ma.is alta impor-
tância q ue disro nos demos conta), acredita Popper que uma
sociedade organizad3 ao longo dusas liooos esteja mais capad-
uda do que outras pau. resolver suas dificuldades e, cooseqüen-
temente, em condiçõe$ mais favoráveis p a ra possibilitar que sew
componentes alcancem os rc:s~ctivos fin s individuais. A idéill
comum de que a mais eficiente for ma de orgaruzaÇ'io social s~a
alguma variante da di tad ura aparece, 90S olhos de P opper, como
in te.iram~ le equivocada . O fato de li. dúzia de pafses onde se
goza de mais alro p adrão de vida (e n ão que iSlo constitua o
critério decisivo) estar organizada sob a forma de democracia
-l Obftcli~t Knoll:lt d/,(', pg. 108. liberal n ão ~ deve a que a democracia seja !uJ<o a que: os ricos

78 79

, ",
~ podem d:l!; COmraIlo, a gr:mde maioria de seus habitantes
;10 como no processo de estabelecer estrururas de organização; se
enfrentava '11 poO~a quando viu instalado o sistem'3. de sufrágio assim não for, o !:lesma f210 se erigirá em fonte permanente de
universal. A conexão causa] deve ser estabelecida de modo intei- distorção. Isso reforça 11 necessidade de vigilância critica ao longo
ramente diverso. A d emocracia de~mpe.nhou papel impoitantis- do processo de concretização de diretrizes de planejamento e de
simo 00 ensej21 e as~gurar a pc=:r0t3nência de altos padrões de recurso ao sistema de eorreção por eliminação de erros. Em tais
vida. T-anto do pomo de vista material como de outros, é de termos, as autoridades que proíbem o prévio exame critico de
espetar que uma soci«l.ade alcance maior progresso se dis-
SI.": suas diretrizes de ação condensm·se a. cometer muitos erros, de
puser do que se nio dispuser de instituições livres. maneira dísptndiosa, SÓ os descobrindo mais tarde de> que seria
necesSiÍrio. E - se, como acomece muitas vezes, prolbem Iam·
Todas as diretrizes governamentais c, em verdade, todas -:15 I bém o o:ame crítico das apl.i~ções práticas daquelas diretrizes
decisões administrativas envolvem predições empíricas: "se fizer-
- condenam·se igualmente s ver·se atingidas por esses erros duo
mos X, ocorttd Y c, por outro lado, se quisermos B, teremos rante algwn tempo após haverem eles eomeçado a produzir con·
de f~ AI>. Como é de conhecimento geral, essas previsões fre-
seqüências danosas. Toda essa colocação, característica de estru·
qüentemente se mOStram errôneas - todos cometem erros - e
turas altamente autoritárias, é anti·racional. Deflui d.a.f que as
é nornJal que lenh3m de Sl!C alteradas, n;1 medida em que delas m.a.i.s rígidas dentre essas estruturas perecem por força de suas
se passa para o terreno das aplicações coocretas . Uma política
falsas teorias ou, na melhor das hipóteses (caso sejam afortu·
é uma hip6te:se que deve su submetida ao teste da realidade: nadas e rudes ), pualisam·se; e as estruturas menos rigidas fazem
( corriqueira, à hu da experiência . Id~tj(jcar erros e: perigos um progresso doloroso, dispendioso e desne<:essariamente lento.
ínsitos aU1vés de ex-ame crítico e discussio prévia é o protXdi·
menta mais racional e, via de regra, convém a de recorrer - Não basta que o d etentor do poder (quer no gOverno, quer
em organizaçOO menores) tenha diff.trizcs de ação, no sentido
f porque erige menor dispêndio de recursos, esforço e tempo -
em vez de esperar que os male:s apareçam na prática. Além disso, de finalidades ou objetivos formulados de maneira mais o u menos
com freqüência, somente o exame critico dos resultados práticos ooa. :f também preciso que exlst-am os meios para concretizá·
_ iodependeotCD'leDte: das diretrizes que os lospirem - permite ·las, Se esses meios inexistem, deverão ser criauos ; de outr:1
~;am os erros iclentílicados. Tendo tais circunstâncias em vista, forma, os objetivos, devados embora, não serão 2lingiJos. Sob
é osencial a coosciência de que qualquer ação pode ter conse· certo aspecto, ponaoto, organizações e instituições de ql:alqucr
qüências indesejadas. Esta simples ObSCIVaçãO tem implicações
espécie devem ~r vistas em termas de máquinas que levem a
de alta significaçio no campo da poüti~ e da administração e
cabo ações planejadas. t tio difícil projetar máquinas que for·
em todos os setores que: envolvam planejamento. E é HciJ Deçam o produto descj9do, como é diflcil estruturar organizações
ilustrar o ponto. Se me proponho a adquirir uma ca$3, o fato que levem 90S o bjetivos visados. & o projeto d. máquina, feito
de eu apare<:er no mercado, como comprador, tenderá a fazer pelo engeahriro, nio for 9deq~do ao propósito em vista, ou
se ele, introduzindo 1ldap taçães em máquinas já existentes, d~ixar
com que o preço se eleve; embora esta seja uma conseqüência
direta de minha ação, ninguém poderá dizer que se trata de uma de fazer todas as 2lteraÇÕts necessárias, não poderá obt~r o que
conseqüência desejada. Quando subscrevo uma apólice de se· deseja. 56 obterá o que a m.á4uina possa produzir - ~ isso não
soment~ será diverso do que o engenheiro deseja, mas poderá,
guro, para poder fazer uma hipoteca, Ísso tende a devar o w.lor
ainda, mostrar·se defeituoso (sejam quais forem os padrões de
das ações da companhia de seguros. Também aqui a conseqüência
avaliação) e até mesmo perigoso. O mesmo é verdadeiro com
direta do meu aTO não tem relaçio com as minhas Íntenções. A
respeito à grande porção da maquinaria das orga.ol2açõcs: mostra·
todo instante estão ocorrendo coisas que ninguém planejou ou
desejou. (Veja, a prop6siw, a pg. l 02.) E esse fato inevitável ·se incapaz de exerutar O que dela requerem OS que a mani·
deve ser considerado tanto no processo de tomada de decisões
pulam - índependeotemente da habilidade dos operadores, de

80
• RI

- '".-
suas boas i.nren;ões ou à05 berro formulados objetivos . Reque:·5c, t.':I obordagcrn cíc:nlfica, owo ndo em ~on; un to, o rie r.tam·:-oos
pois; uma tecnologia política (ou admimst.;ôlliva), btm 'como um::a p:ua uma sociedade "aberta" e plurllista, 'dentro da qud se
ciência pol1tica (ou admiDistrativll.) que a si incorpore uma 2ti· cxpressom pontos de vista incomp:llíveis c se perseguem ·obje-
tude crítica permanente, mas construtiva, em (ace dos meios de tivos conflit antes. Um:l sociedade em que todos sejam livres
q~ dispõe a organização e à luz de S(!us cambiantes objetivos . par:! es tudar situações·problema e propor soluçõcs; uma sociedade
A coocretizaç2o dos planos há de ser submetida a teste - e cm que todos sej~m livres para criticar as soluções propostQS
isto se fará não aperus :mavés d3 busca de evidência de que por o utros e, em particubr, as propostas pelo go\'erno, estejam
os esforços estio alcanÇ'Uldo 05 pretendidos efeitos, mas am~m estas em Í2se d~ dabonç3o o u de aplicaçio; e, acima de tudo,
através da busca de evidência de que assim 1130 está ocomodo . uma sociedade em que as diretrizes govemamenra:s se alterem
Neste sentido, subm:te:r li teste é., em geral, fácil e baraco, se por fo:ça da crfuca .
não por ouuo m..,uvo. pdo fato de que raramente se exige 9pr~ Uma vez que os phlOOS do gove:rno sio normalmente: pro-
fundado grau de ptttisão. O 5i5~a ingI~ de eduC1Içio superior postos e ti m sua COncretU3ção supc:rvisioruda por pessoas que:
já conta com pelo menos um órgão devotado ao estudo de insti· a eles estio, de uma ou de outra forma, ligadas, alterações de:
tuições ~guDdo o esqut:lI12 popptliano (6rgão criado por TyneJl certa importincia hão de implicar em alte:raÇ'Ões de pessoas.
Bur8~5 na North Eut London Polytechnic) e os resultados obti. Assim, para a sociedade aberta ser uma re:ilidade, o requisito
dos são simples e de grande utilidade potencial, pois devadu fundamental é o de que os que de:têm O mando sejam de:stituídos
( SOlI)3S e muito esforço são cOmumente dedicados a empreendi. a intervalos razoáveis, sem violi nci. , e substitufdos por outros,
m~tOs m:ll orientados, sem que se dediquem esforços e quantia s coro diferentes orientações. Para que a opçio tenha caráter
reduzidos para verificar se n50 estarão surgindo, concomitante· genuíno, as pessoas que perfilham idéias diferentes das que nor·
rn~te, conseqüências indesejadas. Numa organlzaçiio, as pessoas teiam o gOvemo de:vem sentir-se livres para se organuarem como
tendem a se mostrar cegas para a evidência de que não est4 ocor· alternativa de governo, pro ntas para assumirem o poder j quer
~odo o que desej~rn , a despeito do fato de que tal evidência isso dizer que essas pessoas devem ter como agrupar·se, falar ,
é exatamente o que deveriam esur procurando. Naturalmente, escrever. publicar, usar o rádio e: a televisão, parn difundirem
o processo de continua busca e rtt"'OOhecimento de e:rro, em orga· sua posição de crítica ao gov~no e devem ter constitucionalmente
nizações, to m a·se Miei! qU:1Odo se Wua de esrruturas autoritá· garantirl2 a utilizaç:3o de meios que as levem a substituir os
rias. Por essa via, a irr.Jciooalidade se estende para atingir os governan tes, meios que serão, por exemplo. :I realização de
prâprios instrumeotos de que as mesmas org~ções se valem . eleições livres.
As posições morais de Popper, em rehção a qu~tões poLí. A a) sociedade quer Popper aludir, quando fah e m "demo-
ticas, (oram expressas, talvez com roeoor carga de: pai!:ão, por cncia", embora, como sempre, ele não :ltrib\a grande ímpor·
outrOs. Seus esaitos mostram·se, nesse ponto, profuodame:nte tância à palavra . O ponto mc!ccedo r de ênfase é o de que ~e
penetrados de emoção, mas catacte:!'Ísticas são a força e o poder vê a democracia e:m termos de presc:.rvaçio de: certos tipos de
dos argumentos com os quais de:.mOnslIOU que o coração tem a instituição - que costumavalljl receber o nome de instituições
razão como ali.. do. Tem·se:, com deito, acreditado e, em oosso livres, antes que a propagand:a no rte·americana em t OrDO da
sécuJo mais do que em qualquer OUtro, que a ncio!l3lidade, a guerra fria desmoral.iz.asse aquel.t expressão , Poppcr quer ver
lógica, • aborcbge:m científica reclamam um. sociedade: que: se preservadas, especialmente, as insti tuições que efetivarnane pos-
..apoie em orie:ntação central e que seja planejada. e ordenada sibilitem ao governado criucsr os governantes e vê·tos 5ubstiruí·
como um todo. Popper demonstrou que essa maneira de vu, dos, sem derramamento de s-angue. Não limita ess-as instituições
aJ~m de r evestir cunho autoritário, fundamenta·se em errônea às que possibilitam a e:leição dos governanteS pela maioria dos
e ultrapassada concepção de ciência. A racionalidade, a 16gica governados, pois que essa tD3.!leira de ver conduziria ao que ele

82 ."

'"
._._ -- - -
,I
chama "0 paradoxo da clemocr.lcia", Q.lC f~ qua..,do a oaJoria migos podem " começar denuncjando qualquer d isC\JSSão; podem
vou! Ilum partido como o fascista ou o comunista, que não crê impedir seus seguidores de dar ouvidos a argumentos racionais ,
em instituiçõcs livres e quase sempre as destr6i quanc!o se alça porque são faJaze-s, rnsiJ):lIldo-os :a responder a esses argumentOS
110 poder? O homem que defende :I escolha do governo por VO IO com os pUMos ou com atm3S". E a sociedade l oleran t~ som~ te
majoritário vê-se, em tal Cl1SO. diante de um dilema: qualquer sobreviverá se, em última instância, ~tiver prep3::lda pua coo-
tcmativ:a de impedir a ascensão do panido comunista ou fas- ter esses inimigos <l:!"avés do !l$O da {orça . " Deveriamos ... con-
cista ao poder significa agir de maneira contrária aos prind?ios sideru a indt:a)io iI perse-guição e à intolerância como atos cri-
aceites e, não obsl2Dle. se aqueles partidos sub~m ao ptxkr, minosos, tal qual devezL.lmos cons.íderar criminosa a incitaçio ao
21liquilirão a democracia . O mesmo homem não encolltrari. base homicídio, ao r:apto ou 30 restabelecimento do tr-áfico de
moral para resistência ativa a um regime nazista, se a f-aval de escravos '."
al rçgime houvesst: votado:l ma..ioria dos cidadãos, corno na
Outro paradoxo, ~Ie mais comum, peb primeira va: formu -
Alemanha quase 2COOteceu. A colOCllçio de Poppu afasta esse lado por Pu.tio, l o da libercbde. A liberdade sem remições,
paradoxo. Um homem, comprometido com li p~rvação de im· como a tolcl.ocia sem restri~, nio a~nas é autod~truidora
tituiç&s livres, pode, sem contradiçio, deI~dê-Lu de ataquts mas também c:apaz de produzir o seu reverso; com efeito, afas-
provindos de qualquer pontO, v~ nham e.l~ de minoria.s, ou de tadas todas as repressões, nad:a existiria para impedir que o forte
maiorias. E, se houver tentativa de subverter as instiruiçÕtS livres CSCTaviu5Se o fuco (ou humilde) . Liberdade total aniquilaria
por violência :mnada, pod~rá squcle hom~m defendê-us recorrendo a liberdade e, em conseqüência, os que advogam a liberdade com-
â Violência 2.tmada. Isso porque, ~ , Duma socied:ade cujo govemo pleta $io, em verdade, e sem consideração de suas intenções ,
pode ser alterado .sem apelo à for,a, um grupo recorre às arm.1S. inimigos da liberd'lde. Popper assina.la, COIT: ênÍ3se especial, o
( porque não pode ver de outra m30eira concretizados 0$ seus pro- par:uioxo da liberdade econômic3, que torna possível a desen·
p6sitos, esse grupo - independentemente do que pense ou pre- freada. exploração do pobre pelo rico e resuha em o pobre perder
tenda - estará estabelt::<:~do, pe12 violêncill, um governo que qua~ completamente a mesma liberdade econômica . No caso,
só pda violência será poss(ve.l afastar, e que l, em outf"2.S pa.- uma vez mais, " deve h:aver um re mooio polílico - remédio seme-
lav:-as, uma tirania . ! OIbívd justificar mor:ilinente o emprego lhante ao que ~ usa contra a violência Hska. Devemos uigir
da. força em oposiçio t um regime aliCCt"Ç"ado na força , ca.so .se instiruJçôes sociais, gl1r:1otidas pelo poder de Estado, para pro-
teo112 em vista cr1:ar instiNiçães livre:s _ e ('3SO haj:a ruoáve1 teger OS economiC3CDente írncos dos economicamente foues. Sig-
possibi.lid:Jde de êxito - pois em tal circu.nst.incU o prop6s.íto nifica isso, naturalmente, que deve ser abandonado o principio
é o de substitui r :a regT:l de violéocia por uma regra de r.uão e da nio intervenção, 3 idéia de um sistema econômico sem peias.
[t)lerincia.
Se desc:jarmos que :a liberdade seja sal"l/:aguardada , deveremos
Popper apoot:a OUtrOS paradoxos que sia evitados por Sl::a exigir que a" politiC'l da libe:n:!:ade ecooôr:nica i..rrestril:t eeda Juga.r
forma de colocar o assunto. Um p:aradoxo :li que já se aludiu a uma economia que admita intelVmção estatal planejada . Deve-
l o da tolerânci3 : se uma. sociedade admite ilimitada tolerância., remos exigir que o capitalismo ,irrefreado ceda passo ao jntu-
alva venha a des:lparect:r - e a tolu:i.nci.a com e.l:a. Assim, ,,~nciOIUl/irmo «on6mico" I . E avança P opper para assinalar que
uma socied:ade toleranle deve estar preparada pata, em certas hi- os contestado~ do iotervencionismo estatal sio réus de aUlO-
póteses, suprimir os inimigos da tolerâocia. Não deve fazê..lo, :a contr.adiçio. "Quc liberdade deve o Est:ado proteger? A liber-
r.:ten05 que exista real perigo - pois, além de tudo mW, isso
pode conduzir a uma "c:aç~ ~s bruxas"_ A socied2de toleraote
deve, recorrendo a !Odos os meios, tentar defrontar-se com seus

,.,.,
TIH O/H" Sodel, .snJ l u fl1~mits. vol. i, PC. 26.5 .
ini.migos a uro nlvd de discuss30 racional. Contudo, esses im- z Tbt Oprn Socit!)' ,urd 111 EntfJ,irs, vaI. li, Pi. t25.

84 85
I'
,.,
~ ...;.... . . . ~ .
..... _._--- -
dade do melc-.tdo d<! trabalho ou :I. liberdade de os pobres se e 2S diferentes doutrinas buscam justi{ic:u as diferentes respos tas:
congregarem? ~j a qual for a decisão tomada , c::!minh3rcm~s, um homt=1J) a;xnas, o bem nascido, o r;co, o sábio, o fOMe, o
no campo da economia, para a intervenção CSt3tal, para o uso do bom, li maioria, o prolclui3do, e :Issin:: por diante. Contudo, a
pOda político organizado, seja do Estado, seia dos Sindkuos. pf'Ópn1 indag3çio está mal colOC:J.d3, e isso por vários motivos.
Caminharemos, em qtl::tlque r caso, JY.U'a um !!,brgamento da res- Em primeiro lugar, por encami::tha(·nos diretamente p:l..tll um
ponsabilidade econômica do Estado, se ja ou Dão essa respons3bi· O'JUO dos pauc!oxos de Poppt=r, que ele denomina "pa radoxo
lichde conscientement~ 3ceit2 "," Em termos m:1is amplos, asse- da sobuutia". Se o poder fo r colocado, por exemplo, na mão
veta Popper : "$e o Estado nio interferir, poderão interferir do nl:Us sábio dos homens, e le poderá, do fundo de sua sabe-
o uuas o rganizaçÕC!s semipolíticas, tais como os monopólios , os do ria, dizer : " O governante não devo ser eu, mas quem é moral.
m:stes, os sindicatos, reduzindo·se a liberdade de merC'ldo a mente bom." Se o moralmente bom estiver no governo, ele po-
uma fjcção. De outra parte, I. importantíssimo ter COJlsciência derá dizer, COID a melhor das intenções : ".t errado que eu im-
de que, sem um mercado livre, cuidadosamente protegido, todo ponha minha vontade .sobre ouuos. O govunante não deve ser
o sistema econômico deixar:í de atingir seu único prop6sieo ra- eu, mos. maioria." A maioria, dete.cdo o poder, wvez assim
ciona], que é O de saliJlt/Z~T as necessidades do consumidoT .. , se expresse: " Impõe-se que haja um homem forte para implaJ'ltaJ:
O 'planejamento' econômico, que não inclui p13 no de libudade a o rdem e dizer-nos o que me r." Uma ~ objeçio, diri-
econômic.a, no sentido referido, lcn rá perigosamente pau as vizi- g:da con tra a pergunta "Quem de\'e deter :I. .soberana?" I. a de
nhanças do totalitarismo· ." repousa r ela no pressupostO de que o poder último deve estar
Em todos os casos mencionados, o máximo possível de tole- localiudo, o qu~ não é verdade. Na maioria das sociedades,
rância ou de liberdade é um grau ótimo, não um absoluto, pois existelD centros de poder, difercm cs e conflitantes, nenhum deles
há restrições para poderem existir . A intervenção govetn2.metltal, CJpu de determinar tudo segundo seus pr6prios mo ldes. Algu-
única fonte de garantia da liberdade, é arma ame-açadora : sem mas sociedades apresentam o pode r difuso em alto grau. A
jnterv~ão, ou com intervenção, em medida in suficiente, a liber- pergunta "Afinal, onde se 1000liza ele?" elimina, antes de er..
d2de perece; mas a liberdade perece rá também se 3. intervenção ~ aventada, a possibilidade de conuoJe sobre os governantes
se nur com demasiado peso. Somos leV3dos li, reconside.rar :I. - e este: é o ponto mais i mpo~ca n te a de terminar. A questão
Üle:vitabilid3de do controle - que, para $O' efetivo, deve signi- fundamental não é "Quem deve exercer o governo? ", porém,
ficar renovação - do governo peJo governado, como condição "Como podemos reduzir ao mínimo o desgoverno tanto a
sittt ql#J non da democracia. Não assegura a preservaçio da Liber- possibiüd2de de ele ocorrer quanto, na hipót ese de de ocorrer,
d3de, pois nada pode fazê.lo: o preço da liberd-ade I. a eterna as suas conseqüências?".
vigilância. Tal como observou Popper, as instituições assemelliam- Até este ponto, admite-se, portanto, que !l. melhor sociedade
-se às fortalezas , no sentido de q ue embora, para serem eficazes, de que podemos dispor, seja do ponto de vista moral , seja do
deve m ser odequadamente construidas. embora isso apenas seja ponto de vista prático, é aquela capaz de assegurar a seus mem-
insuficiente p3ra levá-Ias a preencher o papel que lhes toca : é bros o máximo possível de liber~ ade; admite-se, ao mesmo tempo,
preciso ainda que sejam adequadamente manipuladas . que o máximo de liberdade é aJgo sujeito :1 restrições ; que só
De modo 8enl , as filosofias politicas têm visto como pro- pode surgir e ser mantido em nível ó timo por irlSlituiçães plane-
blema cent ral o que defl ui da ind~gação "Quem deve governa r?" jadu com esse objetivo e sustentadas pelo p<xler d o Esudo; que
isso envolve, em larga escala, a intervenção esl2taJ na vida eco-
oô:oic:t , social e política ; que in tervenç-Jo dernasjado tímida o u
! Tht Opm Socitly tU/ti I:J EllfmiCJ, vol. ii, pg. 179. demasi 3do severa resultará, igualmente, em desnecessária ameaÇ2
"' Tk O~" Socitly &IIJ 1'1 Elltmiu, \'OI. ii , pg. 348. .à liberdade; que a melhor maneira de reduzi r os perigos ao

86 R7

• - ·.C
I'
mínimo estará em preservar, corno as instituições mais impor- -democratas. Se o exigi sst.JD., ele se desc:re\·eria, hoje , como um
ta.C.les. os me ios comorucionais que permítam '305 governados liberal, no velho sen tido da palavra.
afastar Os ocupantes do poder es ~ ataf, subsrjcu.indo-os por ~ssoas Aqui devo fazer uma reft:rência pessoal. Sou um social.ista
de orientação diversa; que to.,h tC!1tat iva no sentido de privar dI! danocrátíco e acredilo gt.:e o jovem Poppn definiu , como nin-
eficáóa essas instituições é tentativa de admitir governo -autori· guém jam.ais o fez, qutlis devam ser os fundamentos filosóficos
tário e deve ser obstada _ se necessário, pela força; que se do socialismo democrático. T21 como ele, desejada eu ver essas
justifica. o uso da força contra a urania, mesmo qtUlldo esl2. idéias substituírem li deturpad.3 mescla de marxismo e oportu-
encontra o apoio da maioria dos cidadãos; mas que o único uso nismo de orientação liberal, que passa por ser teoria polJtica
que se pode dar à força é a defesa das institUições livres, onde para 9. esquerd.3 democrática; em 1962, publiquei o livro Th ~
das já existam, e sua criação, onde ainda não existam. N~w Rmiicalism, advogando c<sses pontos dentro do contexto da
Sempre me pareceu óbvio que ess.a é urna filosofia que pre· pol1tic-a do Partido Trabalhista britânico. Em resumo, embora
coniza • democracia social - tão claramente anticonservadora, ddxando claro que Popper não é mais um socialista, desejo re..alçar
de um lado, como \Ultitotaütária (c, assim, anrlcomurusta), de as idéias que produziu e:m prol do socialismo democrático, em
outro. Com efdto, é, antts de tudo, uma filosofia do como a,~dimen[o das nece:ssidades que: essa COrrente política mani-
alterar as coisas e de como fazê-lo de modo que, diversamente da festava na ocasi~o em que ele se deu 3S reflexões aqui referidas.
revolução, seja racional e humano. Penso ter mostr.r.do que essa Nisso reside, segundo acredito, a real significação de que: se reveHe
dou trina se liga indissoluvelmente à filosofia da ciência elaborada e que aponta pa r.a o futuro. Minha mai$ profunda discordância
pdo mesmo Popper. Devemos, coDtudo, lembrar também que com Q Popper mais velho diz respeito à acusação que lhe dirijo
o homem que escrc:veu Th~ Open Socie!y tinha, a suas costas, de ele não aceit--a r, em ques tões de política prálÍc3, as radicais
vinte anos de convivência com me:nbros ativos do pacúdo social- conseqüências de suas pr6prias idéias. (Se estou certo quanto
-democrático da Áustria. Como social-democrat8, d e se havia a este ponto, há pelo menos um precedente famoso : Marx cos-
convencido de que a nacionalização dos meios de produção, troca tumava .afirmar, nos últi mos anos de vida, que não eC'l marxista .)
e distribuição, qUl constituíam as bases da plataform-a de seu Em The Open Soci~ty, preconiza-se, como princípio geral
pa:tido, não resolveriam os problemas que se destinavam a re- oríe:nudor da política, o seguime : " Reduúr ao mínimo o sofri-
solver, embora pudessem vir a d~truir os valores que O partido mento ev:iuvel." Esse prinápio tem, singularmente, o efeito
considerava mais dignos de prezar. Sendo jovem, com influência imediato de charrur a atenção par.a prob/~m4S. Se um-a autori-
, política apenas sobre alguns amigos, o que ele desejaria ver, mas dade educacional se: propusesse o objetivo de ampliar ao máximo
supunha que não teria opor runidade de ver, era os social-demo- as oportunid3.des oferecidas às cri:l1lÇ3S sob seu cuidado, poderia
cratas repudiarem a análise marxista da mudança social, substi- vir a encontrar·se sem saber e:xat2mente como concretizar suas
tu.indo-a por idéias do tipo das que ele defendia. Ao fim, desi- intenções ; ·ou pode:ri.a começar pensando e m termos de como em-
ludiu-se com o partido, não, primariamente, por causa de sua pregar fundos na construção de escolas-modelo . Contudo, se, ao
limitação intelectual, mas por causa da m:meln como expunha contrário, a autoridade se propusesse a r~duzir ao mínimo as
os trabalhadores à violência, sem contar com um progr-ama para d~JU4"t(lg~ns, isso faria com que su.a ate.oção $C voltasse imedia-
rc-sistir-lhe; em v:rtude dos líderes temerem a responsabilidade; tamente para escolas mer::.os atendidas - para aquc:las com
e, aci ma de tudo, por se .acumplici.arcm com OS comunistas, não maiores problemas de: pessoal, com cl.a.sses mais numerosas, com
oferecendo qualquer resistência ao ato de os lu.zistas se apossart: m lnsta.l.ações ma..i s precáril1$, com mais reduzido equipamento de:
do poder - aind.a que os motivos do partido não foss em, como ensino - e t nnsform:uia o auxilio a eHas escob s em primeira
os dos comunistas, tn'lquiavélicos, mas caracteristicamenle devidos prio ridade. A abordagem popperiana traz es ta pronta conseqijcn-
à debilidade. Desde essa época, Popper descrê: dos partidos social- eia: em vez de e: ncam inhar o pensamento para a construção da

,I:
88 89


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Utopia, l c\'3-0 a d~.scob,jr c tcolar remover os especificos males daremos r:o proXlffiO capítulo). Há, porém, dúvida quanto a
sociais que estão afetando os seres humanos. Sob esse :l spect~, s:'lber se "reduzir a inIelicid3de ao mínimo" tem alcance sufi-
é, antes d::= tudo, wna abordagem de caráter prático, encerrando, dente para se constituir em [D:ÍJ(ima política fundamenta: , níio
não obstante, o propósito de prOv0C2r u~nsforDlações . Parte de obstante seu alto valor heuristico. Limita·se ela a retificar abusos
uma prcocup3ção com os seres humanos e envolve permanente e anomalias, dentro de um siste mlt já beistente. de distrib'Jiçãa
e ativa de terminação de rc=modelar .-.s insliruiç5es. de poderes, bens e oportunidades. Literalmente considerada, pa-
, "Reduzir a infelicidade 30 mínimo" não é apenas urm for-
muJação negativa da máxima utilitarista " Elevar !!I felicidade ao
rece, i:::ldusive, deixar de contemplar medidas liberai s moderadas
como O subsídio estatal par-a l1S artes e a construção de piscinas
máximo", Hli, no caso, uma assimetria lógica: não sabemos como e campos de espone com fun dos municipais. Uma posição tão
fazer fdizes as pessoas , mas sabemos como lhes reduzir a infeli. extremamente conservadora scria anormal conseqüência da radical
cidade. E os leitores estabelecerão, desde Jogo, analogia entre filosofia de Popper, pelo menos em uma sociedade opulenta _
este ponto e li possibilidade de serem corroborados ou contesta.· e foi visu como demasiado conservadora até mesmo por um
dos os en'.lllciados óenúficQs. " Creio que do ponto de vista político profi ssional de orientação conservadora 6 - e o próprio
ético, não há simetrÍa entre sofrim ento e felicidade ou entre dor Poppe.r não dest:jaria deta-se aí. Devemos fazer daquela má-
e prazer. .. Do sofrimento hUffi3no se levanta um clamor de xima uma regra metodológica a aplicar de inl'cio, agindo, em
matiz moral , invocação de auxílio que não tem similar em pedido seguida, conforme as conseqüéndas, mas sempre que possível
t reexaminando a situação, com vistas a uma formulação nova, n::ai~
de aumento de felicidade fei to por aquele que eSTá bem. (Outra
crítica ~sível de dirigir contra '3 fórmula utilitarin3 ' conseguir rica, aperfeiçoamento da inicial. A segunda regra é: "Eleva~ ao
o máximo de prazer' é a de que tal f6rroula presume a existência máximo a Jiberd3.de de as pessoas viverem como desejam." I sso
(
de uma eSCila contínua prazer-dor que permite ver os graus de requer maciço emprego de recu rsos públicos em educoção, artes,
dor como graus negativos de prazer. Do ponto de vista moral, habiração, saúde e todos os outros aspectos da vid3. soci<ll _
não pode a dor, contudo, su comrabalançada pelo prazer e, espe· sempre com o objetivo de ampliar a gamo de escolhas c, portanto,
cialmente, cão pode a dor de um homem encocaar contrapartida a dimensão de liberdade aberta às pessoa s.
, e equihôrio no prazu de outro. Em vez de ple.ite-ar a maior
felicidade para O maior númuo, deve·se, mais modestamente,
plcitear o menor sofrimento possível para todos; e O sofrimento
( inevitável - como o que provêm da fome, em épocas de falra
de alim~to - deveria ser plrtilhldo em termos d-J maior igual.
dade possívd ~.)
A abordagem do problema por esse :ingulo conduz, como
Poppe r actntua acertadameme, a uma contínua correOle de exi·
gências de ação imediata para remediar os enos identificados.
E ui ação é do tipo que se presta a merecer ampla aceitação
e a resultar em visível mdhoria. Popper mostra-se, ainda, e pro-
cedentem~n te. preocupado e m evitar o utópico qu~ , na prática,
se revela de caráter intolerante e :tutaritário (panto que 3profun.

a Th e Opw SOclt'!)' (1I:d lu Ell tmit'J, \'01. i, pp. 284-285. ç Sir EdwJ:rd Bor k : N~w SOâ~/)", 12/9/1963 .

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lar responsabilidade por nossa vida equivale a eo{r~tar coolinw.
mente escoLi.as e decisões difíceis, suporundo-lhes as CO Dseqü~.
das quando errôneas, e isso é desagradável, para MO dizer
assustaGor. Exisle em lodos nós algo de infantil. uly~, que
apreciaria escapar a esse peso, vendo a c:uga tirada dos ombros.
Não obstante, sendo o de sobrevivência o nosso mais forte ins.
tintO, nossa nect"Ssidade mais profunda é, provavelmente, a de
7 S(:guranÇ':!. Dessa forma, só nos dispomos a transferir respon.
sabili~e para 3..Iguém ou para alguma coisa em que depositemos
OS INIMIGOS DA SOCIEDADE ABERTA confiança maior do que a depositada em 065 mesmos. (Tal é a
razão porque o povo deseja seus governantes "melhores" do que
ele éi porque o povo acolhe tantas crenças imp6usívci3 que te.
Embora a meu ver, nos ruas de hoje, o aspecto mais rue. (orçam aquela confiança; e porque se perturba tão profunda.
vante de The Open 50ciny and ItI Ent'mieI seja a filosofia da mente diante da revelação de que a crença é infundada . ) .Dese.
democracia social ali pregada e embora esse: 9Specto faJasse de jamos que as difíceis e inevitáveis decisões que disciplinam nossas
peno ao coração de Popper qwndo eSCIeveu o livro, cão foi vidas sejam tomadas por alguém mais forte que nós mesmos e
a razão principal da ehboração da obra . Importa lembrar que que, nio obsta0 te, considere de pertO nossos interesses, como
durante a maior pane do tempo dedicado à redação, Hhla es. O faria um pai severo, porém benevolente; ou nos sejam ofere.
tava alcançando êxito após êxito, conquisracdo quase que a totali. cidas por um sistema priÍtico de idéias que seja mais sábio do
dade da Europa, país depois de p:ús, e penetrando profundamente que n6s e .só nos leve a incidir "em poucos erros ou cm nenhum.
Oa Rússia. A civilização ocident.al defrontava·se com a ameaçl Acima de tudo, desejamos ver-nos libertados do medo. No fun.
próxima de uma nova Idade Obscura. Em circunstâncias tais, o do, a maior parle dos temores - incluinJo os temores básicos,
que preocupav2 Poppe:.r era coruprc:t:oder e explicar a atração tais eomo o do escuro, O de es tranhos, o d:. mortc, o d!Js con.
das idéias tmalilárias, fuendo O possivd para solapá-lu e para seqüências de nossas ações e o do futuro - siio formas do
proclamar o valor e a importância da liberdade, em amplo seno medo do desconhecido. Assim, estamos continuamente chmando
tido. Esse vasto programa coloca a filosofia dOI democt3cia em por garantias de que o desconhecido seja conhecido e que aquilo
contexto dos mais estranhos, estranho no que ~ refere ao tempo, que nde se contém seja algo que, de uma forma ou de outra,
bem como ao lugar. desejamos. Abraçamos religiões que nos garantem que não pc.
receremos e filosofias políticas que nos asseguram que a socie.
Próximo .ao núcleo da explicação que Popper oferece para dade se torrY<lrá perfeita no futuro, talvez em fururo p róximo.
a atração exercida pelo totalitarismo, COI0C3-se um cooceito
Tais neces.sidades foram satisfeitas pelas inalteráveis certezas
sócio-psicológico por ele denominado "tensão da civilização" _
das sociedades p~<ríticas, através de apc..lo à autoridade, hierac-
conceito relacionado, como ele reconhece, ao fonnulado por Freud quia, ritual, tabu, e assim por diante. Na medida em que o
em A Civilizoção e Seus Descontentes. Com freqliênda, vemos homem. emergia do tribalismo e se iniciava a tradição crItica,
afirmado que a maior pane das pessoas realmente não descja a novas e assustadoras exig~ncias começaram a s« feitas: o indi-
liberdade, porque libercbde envolve responsabilidade e a maioria viduo deveria pôr em questão a autoridade, questionar aquilo
das pessoas tcme a responsabilicbde. Indepe:odullcmente de isso que sempre havia admitido e assumir responsabilidad~ por si
aplicar-se ou não aplicar-se à "maioria das ~soas", há, estou mesmo e por oulros. Em contusle com as velhas ce.rtczas, isso
seguro, um importante elemento de verdade na afirmação. Acei- ameaçava a socied:lde de ruptura e o indivrduo de desorientação.
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Como resuJtado, ho uve, desde o começo, reação conlra esse es- \'Imemo está neles inerente desde ° prindpio, embora ao man i·
tado -de coi sas, tanlO da parte da sociedade em geral, como (e festar-se leve a dizer que a teoria foi pervertida. Já se tomou
esse foi, em certa medida, objeto de consideração de Freud) no lugar comum ouvir dizer que esta_ ou aquela teoria reacionária
interior de cada indivíduo. Adquirimos liberdade à custa ·de (e.g., que a mais ef:C:lZ lorma de governo seria uma dita·
segu.ranÇ':l, iguald~de à custa de nossa autO-cstima e autocons- dura) ou teoria a respeito de um futuro perleito (e .g. , o CODlU-
ciência oíuca à cus ta de nOS!.3 pu de esplrüo. O preço é aho: nismo) é muito boa como teoria, mas, iofclizmenre, não opera
nenhum de n6s o paga alegremente e muitos não querem pagá-lo. convenientemente na prática. Trata-se de urna falácia . Se uma
Os melhores dentre os gregos n50 tinham dúvidas aCeIea dos mé· teoria deixa de operar adequadamente na prática, basta isso para
ritos dessa pe:nnuta . "Melhor", diz.iam eles li. propósito do maior mostrar que eno=rra algo de errôneo (pois que exatamente esse
dos seus criticos so:::iais e contesllldoces, "ser um Sócrates descon. ponto, desconsiderados quaisquer outros nspectos, é O critério do
tente do que um animal contente", Houve, contudo, uma reação, experimento cientiüco).
que levou S6crates à morte, em vista de sua atitude contestadors. . Embora 3S coosequências . práticas das teorias reacionári:Js
·, A partir do seu disópulo Platão, nunca mais deixou de haver e utópicas se:j-am socie<i2des como as de IDder e Stalin, o desejo
figuras dIa mente dotadas que se opunham à sociedade tornar-se de uma sociedade perfeita por certo que não tem raizes na mal.
mais "aberta". Desejavam que ela retrocedesse ou avançasse no dade humana, mas 00 oposto. Os mais horrorosos excessos t êm
sentido de uma sociedade mais "fechada". sido perpetrados com sincera convicção moral poI idealist3s, cujas
Assim, desde o despertar do pensamento crítico, o que se intenções eram inteiramente boas - por exemplo, os que se
deu COID oS pré-socráticos, :1 tradição desenvolvimentista da civi- ligaram à inquisição espanhola. As autocracias ideológicas e reli-
lização tem visto caminhar, par::alelameme a ela (e talv(:Z fosse giosas e as guerras que formam parte considerável da hist6ri 3
mais correto dizer, caminhar dmlro dela), uma tr-ad..ição de rea· ocidental, são a mais contundente exemplificaç1io do provérbio
ção contra as tensões que se originam d3 civilização; esta última "O CUDinho do infe rno está p:wimcntado com boa ~ intenções" .
tradição produziu filosofias de retorno à segurança inicial própria Não sâo apenas os tolos que caminh;!m 30 longo c1ess;1 trilha;
de uma sociedade pré-eritica, ou tribal, ou filosofias de encami· em verd3cle, o sentido de insati sfação com :'\ socicdndc existente,
nbamento a uma Utopia. Uma va que esses ideais reacionários e que atinge as pessoas, muito mais comumc:nte se ô'ls~ocia à inte ·
ut6picos pretendem dar atendimento a necessidades semelhantes, ligência e à imaginação do que à sua -ausência. Os nio inteli·
apresentam afinid3des profundas e essenciais. Ambos rejeit:lm a gentes e não imaginativos tendem a aceitar a.s COiS3S como as
sociedade ~ is tenle e proclamam que uma sociedade mais per· encontram e a mostrar-se conservadores. Assim, a revolta contra
feita surgirá em algum momemo. Conseqüentemente, ambos a civilização - isto é, contra as formas que na realidade reve3·
tendem a ser violentos e, não obs tante, românticos. Quando se tem a liberdade e a tolerância e eontra as SU3S conseqüências, no
acredila que a sociechde vai passando de m:ll a pior, deseja·se pôr que diz respeito à diversidade, conflito, aceitação das transfor·
fim aos processos de 3heração; quando alguém se vir estruturan· mações impre:visfve:is e incontrOlíveis e à insegurança que se 3bre
do a-sociedade perfeita do futuro, desejar:i perpetuar essa mesma em mw uplas facetas - tem ~ido , corno anteriormente sugeri,
sociedade, ao alcançá-Ia e isso também significará deter os pro- comandada por alguns dos maiores líderes iotelectuais da huma·
cessos de uansformação. Dessa forma, UntO os reacionários como nidade. O gênio desses líderes colocou-os de maneU-a " oatural" e
os ut6picos alme jam uma sociedade estagoalh. Como a transfor- confonável no seio de uma elite - que significa desprezo pelo
mação só pode ser impedida pelo mais rígido contrOle social , conservadorismo ineMe do homem comum e, conseqüentemente,
- privando o povo de fazer qualquer coisa por ínicialiv'3 própria, uma não 3ce:itação prática do igualitarismo e da democracia.
para impedir as graves conseqüências sociais dessa atuação - Popper, ao dirigir ataques contra os írúrnigos da sociedade aberta,
ambos aqueles ideais conduzem ao totalitarismo. Esse clesenvol· lltribui à maioria deles os motivos mais elevados e a alguns deles

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a mlis 2ltJ inttligtncia, reconhéce.ndo que apd.1I1ll a alguns de I: aLrAeIllt:. Esst mélodo - o mais sério qut se=: po!>5a cooceber,
nossos nuis puros instintOS e tlX:l.m ~ pontos de jo~g:.Jl'2Dça Jo prisma iDCdCCtllÜ - é apaixonaote; e seus resultados, quaado
profundamente enraizados c=m todos nós. :I!cança êxito, são devastadores. Com eJe.ilo, em tal hipótese,
Popper toma Platão como o supr~o exdllplo de filósofo d~ nenhuma versão imagináve1 da posiçip denotada é passlve1 de
gênio em cuj:a teoria polític3 se inclui um desejo de retomo ao reconstrução depois da mtica, pois todos OS seus recursos conhe.
passado e dirige uma extensa e ponnenorizada crhica a essa teo- cidas e reservOls de substância i' escavam p~ntes na forma qut:
ria no prime:r.) dos dois volwnes de The Open Saciely and 11s [ornou ao ser derrubada. Isso é o que se peo.sa haver Poppa
Enemin. O segundo volume contém uma (Crúc. a.náloga, diri· conseguido em relaç3:o ao marxismo - daí o CODlenúrio de
gida contra Marx, como o supr--..J"CO filósofo cuj.a teoria Iilntecipa Isaiah Berlin. citado na. sentença de abertura deste livro . Devo
um futuro per!eito. (Poppc-r distingue o mn:zumo de teorias confessar que não percebo como um homem racional, tendo lido
;l critica dirigida por Poppc:r contra Mant. })OSs' continU2r smdo
utópicas, por motivos qu!: se lornuão cbros m.ais ad.i.s.nle. porém
, se coloca em oposição ~ ambos.) Sua maneira de UlÍrenur esses
poduosos OpoD~tes e, an panicuhr, Mux, CODstirui, por si
marxista. E5~ é ponto, eotreuUlto, a que logo voharemos.
Nos meios acadêmicos, O asp«1o mais C'OIlttovttti.do de The
mesma, uma das mais importantes lições metodológicas que se O~n Society and 111 Enemies tem ~do sempre o .tague dirigido
pode retirar de seus escritos. Ao longo de toda a história da t"Onttll Pl.atio. A maior parte dos comentirios dessa ordem caroce
advocacis e da controvérsia, a abordagem escolhida, mesmo por de funchmento. Já ouvi muitos OIdrruti.rem Cjue o primeiro vo·
polemistas de gênio, como Volu..ire, tem sido a de procurar e lume de The Open Society é, antes de tudo, uma entia feit.
atacar os pontOS fracos da posiçio adversária. Isso e.Dct:rTa uma ;1 Piatio, que Popper diminui a estalUra de Platão como mósofo
desvantagem séria . Todas 25 posições apresentam ângulos mais .: Cjue foi "totalmente refut~do", ou algo semelhante. pelo exce·
ftllcos e mais [artes e li atração Cjue exercem se liga, obviamente, lente, bem documentado e erudito liv ro de Ronald B. lLvinson
aos últimos; assim, atacar OS primeiros pode ClUSlr embaraço intitulado In DelenJe 01 Plato (ao qual Popper replicou num
IK)S adeptos da doutrioa, mas mo destruirá as bases sobre as I1ddendum à qu;ru. edição de Tbc O~n 50âcty, surgida em
qtu.is se asseDta a adesão. Essa é uma das ru.õe.s porque as 1961 l. Nada disso é verdade. Popper refc re·~ ~ Platão clara-
~soa5 uramente alteram seu poDtO de visa depois de se verem mente, chllmando-lhe "o maior filósofo de todos 05 tempos" (pg.
infuiorizada.s em uma discussão. Mais freqüe.memeotc, um revés ')8 ) e emprega , naturalmente seUl ironit. , "com toda a força de
dessa ordem leva·as li forulettron a própria posição, no sentido ~ua inigmlada intdigênci~" ( pg. 109 ), e frases semelht.ntes .
de que as leva 3. abandonar ou a aperfeiçoar as porções mais Pnpper endossa, em verdade, a observação de 'Whitehead, se·
fracas da posição em que ~ colocam . Ocoru, com lreqüénóa, gundo a qual toda a filosofi.. ocidental é um conjunto de notu
que, quanto mais discutem duas pessoas .inteligentes, mais .se de pé de página, apostas aos textos platônicos. Além disso, não
fortalece o ponto de vist.a de cada qual, pois os modos de ver ~: o prop6sito principlII de Pop?Cr dirigir criticas a Platão. te·
se aperfeiçoam constantemente como resultado da críua que re· vinsan eoloa a questão em termos corretos ao dizer, no [n De·
cebem. A análise que Poppe.r faz de tal situação é cUel. Busca Icnu 01 PÚJIO . :1 pg. 17, que "O õalaque de Popper é o aspecto
- e consegue, nas welhores ocasiões - ideotifiar e at2eaJ o ncgati \'o de sua própri-3 convicção positiva, que orienta coda 11
ponto mais (orte da posição de sd.1 0IXlDente. Na verdade, antes "hra , ou seja , a de que a maior das revoluções consiste ouma
de atacá·In, tenta rdorçá-lo. Procura ver se suas fraqueuas p0- ll.:lssagem da "sociedade fcchad. " ptr1 a "sociedade aberu" -
dem ser :!.f.15tadas, se alguau de SU2$ formulaçõc.s :admite 3per· um:! a SsoC~io de pessoas livres que respeitam os dir~tos alheios,
feiçolmeoto, concede·lhe o benefício das dúvidas possíveis, ignota num sistema de rderência de proteção mUhJa, ofuecido pelo
certas falhas 6bvias e então, tendo aquda posição de!eDdicL1 cU Estado, e que alcanÇ3mJ por meio de decisócs raciOMis e respan·
melhor forma possfve:l, ataca·a no Cjue ela tenha de mais poderoso ~ ~íve~s , um cresct:nte aumento dos v ~lofes humanos e a vida cheia

9G 97

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de: sabedoria", Longe de rejeitar tOl1llmeme o juizo que Popper It-ctua l já cam 50 anos com;>letos, que d evotava seus dias a ler
faz de Platão, Levinson acaba 4coInendo a pane mais notável " escrever, R:ndo pequ~o a conhecimento que dde tinha a pú-
desse juízo. " Em primeiro lugar e $101m de tudo, concorwmos 1.lico . Menos de 70 anos após sua marte, um terço de toda
com a idéia ck que Platão propunha, DO S termos de Pop~ , o " espécie humana, inclusive toda a Rússia e seu império. e tod a
"fechamento" de sua sociedade, na medida em que isto corres. ;l Chin a, adat'J ram formas de sociedade que têm denominação

pondia li :1ITI3 ar:egimentação dos dd3dãos comuns (pg. ' 71 ). ,·alc..da em seu nome. Trala-se de um fenômeno cujo carÁter
. '. O ideal político de Plalâo pode ser classificado, sem erro, l'x traordinária n 3"o foi ainda, segundo ~sa, suficientemente con.
como ideal altamente dife renciado das muitas fo rmas de governos ~iJcr3do. Paucos negarão, porem, que Marx é o fil ósafa que

... 3utorilários abrangidos pc}, definição g~érica dacb pdo Websler


de lotalit.llrísmo; umbém pode, como vimos antes, situar.se no
1Il:!ior influência exerceu nos últimos cem anos e que é impos •
~ fvcl compreende r o mundo a nde hoje vivemos, ~m algum co-
âmbito do "totalitarismo", respeitando a cuidadosa mane.ira de IIhecimento d e SU3S idéias políti ~s e sociais. Ao contrár:'o do
entender o lermo em Sabine - como governo que ' oblitera 11 l{U C hÁ vinte ar.os atrás ocorri.a, o in teresse atu al pelo marxismn,

'7
distinçio tlllre llS áreu de jufro privado e 8S de CODtrole pú. <:m nossas lL.'1iversidades e n os meios intelectu:l is jovens, em tod(1
, blico' " (pg. J) . Lcvinson nâo concorda com muitas das o~r. " mundo ocidenw, está lumeol.ando e não diminuindo.
vaçóes de Popper , mas sempre re3pe1ta "seu amplo conhecimento Panto central do m:I.CXismo é 5U:I afirmação de canst ituir
de muitos selores do pensamento." e " sua irrestrita ldesão lOS · ~c em douuina científica . Marx v i l.!·~ a si mesmo con!.. , pm
idc..3 is lilxrais.democdticos, a cuja defesa se dedica todo o t r3' ;l ~s im dizer, o Newton a u o Dacwin das ciénci:'!s h i~It·,rjl·: I'i . !,uH
b-:Ilho (The Optn Sodety anJ lu Encmits )" (pg. 19) . A idéia ticas e econô micas - em verdade:, d:tquc b s quI,; po. krí:tu"')t.
muilO repetida d e que $. erudição quC' Po.pper rnel3, ao falar dc manei.r3 geral, denominar ciênci~s soc i :t i ~. " J)cdinltl M' U livro
de Platão, está chW de pormeno.res sem interesse é, ela própria , (Dar Kapital) a Darwin , por quc m tini.:'! 1lI;li.,r :l.llIlir:II,~ .u iUII '
uma idéia cheia de pormeoo.res sem intaesse - no sOltido de k-c tu:1l do que por qU3 lquer de SI· II.~ IIlIt111'i (·.I\lIt·IIII.....i ..n.·..
que é reitenc:b sem base. Não há culpa, entretanto, dos filósofos I.:llCaGilndo-o coma alguém q ue. I!m,;.", ;( ~ II:I .n ... i:. ,I.• \·\·.,1"\:.,, .'
de maior emioência. Bc.rtrand Rus.sell escreveu: "Seu ataque a da seleção natural, havia fc itu IX·I.! 11101 ('II"I~ i:t ,1.•.; • i,'·II. i .•'. 11 .1
Patio, embora Dio ortodoxo, é, segundo aeio., inteiramente ju!- 11Ir2is o que ele própria es tav:! (<: III :lIId.. f.'".t"t 11" ' ·.I"'!>" .1.1 I.i '.
ti{icado" e Gilberc Ryle, que é notável especialista em Platão. rória h umana. Darw:n dec linau pruntl lllt:III.· ,I.• 1./11:1.1 .• 1111 ..;.
deixou registrado na resenha que fC'2 do livro de Popper, para ,;u ta polida e C2uteloumente escrita, d izc!ld" )OL". illf.·lil.lt't"llIt·.
Mind: "Seus estudos a propósito da história grega e do pensa. i~norante da ci~ilc ia econômica, mas dCs:: jl ntln <~x it t) :Ito :111101\" .
n~qui lo que ele entendia ser um objelivo comu m :\ :\1111>" ,
• mento grego, form, sem dÚv1dt, profundos e originais. A exe-
(I pragressa da cOllhecimento humano '. " O núclcu tI:. qt\(:~ I :'"
gese platônica nunca mais se far:í n05 termos antC'Oores." Um
quano de século depois. a lr3Vés da BBC Rádio 3 (28 de julho é o ~gu Uue : Marx acredilava que o desenvolvimento doi S S'I\.·;.·
de 1972 ), Ryle volloo a endoss.ar, expliciumC'nte , esu maneira tl:ldc:s hum:iln3s es tava disciplinado por leis científicas, d:'ls quai)o
de ver. de e ra o descobridor. A concepção que fazia da ciência ~ r :l (illl"
vítavelmente ) pré·cinsteinian3.; À semelha.'lça dos hornnes bem
O p13tonismo, como lal , nio é uma qUC"Stão VIV:I no pano-
ínformados de ~u tempo, julg3va que Newton houvesse desco.
rama político e social do mundo moderno. Como nio o é, tam.
hCIta leis naturais disciplinadons dos movimentos da matéria
bém, .a füosofi.a dos pré-socráticos . Mas o marxismo é. Com
no espaço, de tat modo que, conhecidos os d:J.dos relevantes a
efeito, sob um aspeClO profundamente prático, a contribuição. de
respeito de qu:uquer sistc ma físico, se ria possível predizer-lhe
Marx , tal como se apresenu em Í:Jce d2 siruIÇão de nosso tempo.
não tem paralelo 03 h istória da hum.anidade. Há menos de um
século, vivia em Ha mpstead, com sua esposa e filhos, um inte- Jw2.h Bcrlin, K"fl M"f", pg. 231.

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todos 05 eSt3dos futuros. Fodemos predizer o momento do $01 ,I<- Puppcr, ou "socjalíst.3.~ lItópicos", na acepção de Marx. Se,
se levan tar cu se dei.ar, O~ eclipses, os DJoviroeotcs d:ls rr.arés, e :'.unJu creio, o comunismo c: utópico, mas 030 o marxismo, de
assim por cL:antc. Con:udo, embora as Leis Naturais DOS per_ IllOdo quI!' ;lquela distinção importante eleve ser retida em nossos
tnio:am p~edizer o Cutuco do sistema solar, não DOs c<lp-.lcium a "~ I,íri los.
exercer controle sobre ele. A~ Leis - caberia dizer _ agem com
férrea necessidaàe, produzindo resultados inevitáveis, que esta- Conseqüência nOlável do fato de o mancismo comparar-se à
mos ~ cond.ições de prever, aias não de alterar. i\1arx con. ,-j",Kia é a de que deve, pua não ,,\ir em contradiçcXs, defender,
(
templou as suas descobertas sob esse mesmo prisma e firmou rom l:x~IO, /JO plano das discussões cíe:HiJie.3s, as posições que
( o paraJe!ismo valenclo-se de tennos retirados da teoria newto- :Hlvuga . Em caso de derrota, nesse plano, não lhe resta outro

(
,, .. niana . Em Das Kapilal, de descceve sua atividade aünnando J'l'Cur SO, ~is fica impedido de lançar mão de outras formas de

haver descoberto as "uis Narurais da produção capitalista"; ;lrp:umentação. Em resumo, O marxismo deve submeter-se a testes
( L _ • ,. adverte-nos de que "mesmo qU3nclo uma sociedade trilha os ca. " :lcciur :as conseqúências deles advindas. O que se admite é
klVcr Popper derrubado os proclamados alicerces científicos do
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minhos cert~ que a conduzido à descoberta cUs Leis N3turaiS
marxismo - que se viram abalados a ponto de impedir uma
, .;- de seus movimentos - e é objetivo desta obra colocar de modo
explícito a .Lei Econômica de Movímento da moderna sociedade rl'construção da teoria. Popper não abalou os alicerces do mar,
- ela não eStá em condições (seja por meio de saltos ousados, )..ismo tentando mostrar que a teoria é irrelutável. O m.3.cxismo
~ja por melo de estat utos legais) de afastar OS obstáculos que vulgar é irrefutável, mas Popper não comete o erro de j;ttríbuir
se apresentam nas fases sucessivas de seu desenvolvimento nor- l·~~t macxi!'. mo vulgar a Marx . A teoria de Marx, uatada com a
(
~cricJade ioteJectual que merece, permitiu número considerável
mal. Acontece que as leis, ou tendências, agem com férrea
ne<:essidade, conduzindo a resultados inevit3:vei3. O país mais .1,· previsões falseáveis - as m a i~ import-antes das quais se mo~­
desenvolvido industrialrnemc só pode mostnlr O futuro que Ir.lr.lffi, de fato, falsas. ExempJilicativamcnte, somente os países
(
espera o país menos desenvolvit!o". npita list3s plemmente desenvolvidos poderiam. de acordo com
:1 h,;ori.3, tornar-se comunistas; CO:lScqüCnlCmCnIC . HXIaS :15 socic-
O fotto de que Marx recebia com agrado o futuro inevitável ,h.!\';, deveriam preliminarme::ne completar :1 f;1SC GllJit;lli~t:l ,
é irrelevante, do ponto de vista científico. Falando estritamente, :l!lll' S de se voltarem para O comunismo. Contudo, rc~s ... lvanJo-sc
Marx n;'io podia defender o futuro inevílávd, assim como um (I C.Nl da Checoslováqw':l, lodos os países que se tornaram comu-

astrônOmo não pode deIender um eclipse que teve conwç&s de lIi~t:l l> :ur3vessavam fases pré·industriais - nenhum deles chegou
prever; podia alegrar-se com a comernplação dos acontecimentos, .1 ~l'r urn:l sociedade capitalista plenamente desenvolvida. Se-
antecipar OUtrOs e sentir-se feliz com a sua chegada. Móltx insistiu ~:I/lltk> a :.eoeia, a revolução teria de asssentar·se no proletariado
várias veles no caráter científico de sua teoria : ela fazia des- illdusniaL Entretanto, Mao Tse·Tung, Ho Chi·Minh e Fidel
crições, mas não prescrições. Rejeitava, por contraste, outras for- (:;I>1ro refut:lram a previsão, baseando suas bem sucedidas revo-
mas do SocbJismo, que classifica\':!. de "ut6picas" _ 1005, na 111,''-' ' ':> nos camponeses de seus respectivos palses. Segundo a
melhor d:ls hipóteses, meus vjslk~, na pior. Popper aceita essa (·ori;l. exis fem ponderáveis tnóes para que o proletariado indus-
distinção q ue se traça emee, de um lado, a crença marxisu. de ui .•1 se torne mais pobre, mai~ numeroso, mais revolucionário
que somos impotentes para fixar os rumos da história e, de outro " '-"01 maior consciênda de chsse. O que se COnslata, porém,
lado, a crença utópica de que est:i em nossas mãos :l capacid.3.de de , In .l,· os dias de Marx, nos países industri:alizados, é que esse
construir a sociedade pcrfeit.3.. Em TCalid:tde, o m:lrxismo foi I,rnj(': :lriado se vem tornando mais rico, [em diminuído em nú -
amplamente dissernlfl.3.do como se foca uma cr~ça deste segundo Hino. esrá perdendo a consciência de classe e se lornou cada vez
tipo e nessa condição chegou a ser acolhido pela m:lioria dos <1"'11'''' revolucionário. De acordo com a tcoria, o comunismo s6
comunistas - q ue são, pois, "marust3.S vulgares", na acepção J""lni:l ser implantado pela ação dos trab:llhadores. das massas.
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100 lnl

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N" re:ltidllde. COntuJo, em nen hum p;tí:; ( ne=n mesmo no Chil e)
fu ndamental do marxismo, de acordo com o gu·al o dese nvolvi
o partido comur.istd conseguju 3;>oio das maiorias, em eJe:ç&s
mento dos me ios de produção é o único dete:rminante de uam·
livres. Nas países em q ue o partido comunista consc=guiu do.
formação social , revw-se logicamente incoerente, pelo fato dt:
mínio con;pleto, isso se deveu a uma imposição feita por um exér.
4ue a teo ria não pode explica r de que m:1oeira os mdos de pro-
cito - geralmente de naç50 estrangeira . A teoria também previa
dução se desenvolvem, em vez: de permanecerem os mesmos.
que os meios de produção do capitalismo se cOnctO lrariam nas
A concepção de Marx, de acordo com li qual "3 hi st6 ria se
n:ãos de um número cada vez menor de pessoas. Todavia, com
( desenvolve de conformidade com leis científicas, é um exemplo
a criação d:ls companhias de capital social, li proprjedade ~ dis-
" . do q ue Poppcr denomina " ru stor icísmo" . " Conside ro 'hi stori-
.:, persou de lal maneira que passou as mãos de uma nova d:lsse
' . -. cismo' a form a de abordar as ciências sociais que presume ser ;\
de administradores profissionais. O surgimento dessa classe é,
! por si me~mo} refutação da previsão marxista, segundo a qual
p r~IIÍJão histórica O principal objetivo e que presume scr esse
obje tívo atingível por meio da descoberta de 'ritmos' ou de ' pa.
~ todas as dasses t~deriam a desaparecer, polarizadas em ap~as
r :'.... duas - :I classe decrescente: dos Capitalistas, dos proprieúriO$
drôcs', 'leis' ou 'tendências' subjacentes à evolução da histó ri;l, ~
Exemplos de crenças h.istoridstas são: a dos judeus dn Vdllo
e contro13do res que não trabalhariam , e :1 dasst:: cada vu mais
Testamemo, na missão de povo deito; a dos prime iros crisl;j"., .
ampla do Proletariado, que trabalhari/!. sem tt::r propriedades ou na inevitabilidade das conversões em massa, scguicbs pd ;. !>• •
exercer controle.
gunda vinda ; a de alguns romanos, no destino dI: 1("111.1 . \." .....
~ outra parte , para encarar o lema sob OUtro prisma, o dominador·a. do mundo; a dos liberais ilumi n i s l:l~. 11;1 illt·v\ t.II,ili
que Marx e Enge1s tinham 11 diur aceoca das ciências tomou.se dade do progresso e na perrec t!bilid;tdc elo IW I1lI"IIl: ;, ,Ie IIlIli[""-
obsolt:to em virtudt: do próprio dest:nvo lvirnt:nto dessas ciências; socialistas, na i"evitabilid3de dn S( 1(·i; . li~ 1I 1" : :\ .I,. 11 !l !' ·I . ILI
as concepções acerca da matéria, por ext:mplo, viram-se superadas criaçio de um Império J c m il ;Ulll" . 1\;1"", rd ... ·j ••II .cr ..... , •• 1.:<1 .. ·.
pela física pós-einsteiniana; e as concepções acerca do compor- dos mais Íolmosos excrnrlos !,:lr:1 n" I:lrmo., " ·.•·u h.ci , •• lu. I;, "
tamento iodividuai fotam suplantaJas pela psícologja pés-freu- de concretização. Dejx3Ja ~ dI: 1.1<1" :011'.1'111.,·. [(·, '1 i.I·. '"' I" ·' li ...,..
diana . O fundamemo ricardiano da economia m:trXiSt:l foi aban- é muito difuod ida a noção dt: qUl· .1 1...;!,i rl:1 ,In·(· I,·, 111'1 .1 ,1.-·.[1
donado depois de surgidas as idi ias de Keynes ; a lógíca ht:gt:- nação; s.e não isso , u ma [r:.l m:1 I'rúpfl:1 " 11. , h· q U:d'l,wl 1", ,, 1, ,. '''I)
liana, q ue serviu de base ~o marxismo, também foi olvidada significado ou, pelo menos, alJo;ulII tip" .1..: p:,d,·a...1, · ""·" ·''' ·•. 1
., quando surgiram as lógicas p6s-fregianas. As idéias marxistas Desde q ue se pretenda debater :;c:ri;UIII·nh" .1 III<"\'i[;.I"I .. I... I,
" , acerca do desenvolvimenro das instituiç&s po1Jticas também di-
fe riIam muito do que re.Umente oco rre u _ sobretudo (creio eu)
histórica, torna·se possível oferecer um limitu do mim...... ,I. ' 1"\ " lc
cações. A história estará sendo orientad<l po r algum.1 11I[,·li/:'·11< 1.1
porque não levavam em COOl'2, com a ser iedade devida, o cres- exterior (usualmente Deus), de conformiJ<lJo..: (()III 1"·"I "·,,il'O:.
cimento da democracia parlamentar. E sta falha foi decorrência próprios. . Ou a h istó ria eSlará sendo impelida po r :.d~III11 :' ill[..!1
da própria teoria marxista, que impedia os seus adeptos de gência interior ( espírito imaneote, força vital, o u alguOI:I t.·llI idat!\.:
encarar seria mente a possibilidade de um tal crescimento. como " o destino do homem"). Ou não h3\'eJá, de modo alv,lIln .
Tudo isso é re.fu[aç50 da teoria _ uma teoria que reclama csplrito, caso em gue deverão b tar operando processos Il Hll l' ri ;ti~
Jlnlm científico e m razão de "3do tar o mé todo básico de submeter de caráter inteiramente determ inista. As duas primeira s allt.: CI1;I·
suas pr evi~s ao teste da ex~riência, podendo concluir que são (ivas têm, de forma óbvÍ2, feição metafísica : não são reful h cis
falsas. Lembremos, contudo, referindo-nos a capítulos ~teriores, e , por «:110 , 0 30 são científicas. A terceira apoia-se n uma co n-
que embota seja esse o teste mais importante que orna teoria cepção de ciência que não i mais sustentável.
deverá vencer. não é o unico: tem da de preencher :linda os
critérios lógicos de compatibilidade c coerência interna . O ponto
2 Th~ PO U~rl"l o/ Historieis,,,, pg. 3.
102
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As razücs que levam Poppcr a rejei tar essas concepções de- ru~sc cicmili-C'3mcnce previsível, não poderia , uma vez descoberto,
f[u et:l claramente de tudo q U!lD tO ~tc livro já se c:!eL'lfo:.J r::gis- IlCrmWc::'er scerelO, pois seria, em princípio. passível de redesco·
t!:!.do. Eie ~ um indeterminisu, acreditando que a trans!orma- hrimenro por qualquer pessoa. Isso nos defrontaria com "Um pa·
ção é o resu:tado de nosS1S ten:;a':.Ívas de resolver probJero3s _ r;.doxo acerca da possibilidace/impossibilidade de adotar ação
e que nOSS1S teot:uiv:lS de resolver problemas envolvem, ent!e evasIva. Coro base apenas nesses fundamentos lógicos, o h isto ·
outros imprevislveis, imaginação, escolha e sorte. Com referên. r;cismo se desmorona; e devemos reje:iur a noção. centlal no
cia a esses elementos, so:nos responsáveis po= nossas escolhas. Iltoguma do marxismo, de: \;!1la história teorética em correspon·
N:l roedida em que: qualquer processo de orientação esteja ope- dência a uma física teorética .
rando, somos n6s que impelimos :I história para frente , por meio
Com o colapso da noç:io de que o fUluro seja cientificamente
de nos5a iote~~o coro OS outros e com o ambiente físico (o qual ,
prcvisivd, eo tra em colapso, também, o concei ro de uma sacie·
coruo espécie, não criamos) e com o Mundo J (que, como es-
Jade totalmente planejada . Há como demonstrar, ainda, que, do
p&-ie, criamos, mas que cada indivíduo herda e só muito redu-
ponto de vista 16gico, isso é incoerente sob outrOS aspectos: antes
zicLamenle pode alterar) . Quaisquer propósitos que 11. história
de tudo, porque aquela noção não nos pode propiciu uma res·
incorpore serão nossos p ropósitos. Qualquer sentido que a his- posta plaus!vtl para a pergunta : "Quem planeja os planejado-
tória enttrre será o que nós 1he demos .
Tes ?" ; e, em segundo lugar porque, tal como anteriormente vimos,
Do ponto de vista desras idéias, Popper combate todas as cabe espetar, em todos os casos, que nossas ações tenham con·
teorJas historicistas. E aquela Contra a qual dirige o ataque mais seqüênci3s aio desejadas. Este úJtimo ponto, acentuemo·lo de
poderoso lo marxismo , tanto porque essa é a doutrina que, entre passagem, expõe a falácia exis tente na presunção gera lmente feita
todas as doutrinu hisrorid stu, maior influência exerce sobre o relos Ulopist1s (embora não por Marx - na vetdade , os mar·
mundo moderno, corno porque é a que mais alto proclama ocorrer xislas abordam esse ponto de maneira mais clJl~ que muitos
o desenvolvimento da história segundo leis científicas, habili. social-democratas ), segundo a qual " qu:lndo :lIgo ' m:l\!' ocorre
tand<>nos o conhecimenco dessas leis (conhecimento propiciado na sociedade, quando ocorre algo qu e nos (k"':1gmJ~ - com(1
peja doutrina) a predizer o fUluro. O PODto mais especializado guerra, pobreza, desemprego - deve i s~o ser tI r eS~ df:ldo de
do "rgum~ to de Popper consiste em mostrar que não há rne.io õ\lguma intenç:io má, de algum si nistro desígnio: a l ~u é m assim
cientIfico de um cientista ou de máquina de calcular predizer, :Igiu 'de propósito'; e, naturalmente, alguém est:i tiT:mdo pro·
por métodos cientfficos, qu:!.is serão os resultados futuros da pre- vcito da siruação. Esse pressupOStO filosófico (oi por mim deno·
visão. Em termos mais populares, o argumenlo loma a seguin t~ minado teor:a social da conspiração l." OutrOS aspectos do
feição . t fácil mostrar que o curso da história humana \.iu-se :Haque de Poppe[ ao marxismo encontram apoio em argumentos
fortemente influenc iado pelo aumento do conhecimento hUnl3DO, j,j anleriottnen te expostos nes te livro e de repetiçio dispensável.
lalO que mesmo as pessoas que tendem a encarar o conhecimenlo
O mais importante deles é o de que Marx, apresenundo O que
como subprodulo do desenvolvimento material podem admitir
de denominou " socialismo ciendfico", errava não apenas no que
~em incorre rem em autoconl radiçio. ê entretanto logiC3:oente di7. respeito 2 sociedade, mll$ ~i.nda no que diz respeito ~ ciência ,
impossível predizer o conhecimento futuro: se pudéssemos pre-
lendo Marx um:!. concepção de ciência que Popper acrcxlita haver
dizer o conhecim~t o fUlUro, nós o estaríamos dominando hoje e
' "llCr:ldo. Se Poppe.r está certo a respeito de ciência, a rua é
ele não seria futu ro; se pudéssemos predizer os futuros descobri-
:1 \í nica filosofia polüiC3 genuinamente científica; e, a1ém disso,
mentos , eles seriam descobrimentos alu3is . Daqw decorre que
" que ~ mais importante, a hostilidade conlra a ciência e are·
se o futuro encerra descobrimentos significativos, isso é de pre-
visão científica impossfvel , ainda que deterroiMdo independente-
mc n~e de desejos humanos. Há um oUlro argumento: se o futuro Por>pet, in J,[oürn Brilish PhiloJophy (0:1 . Bryan t-.bgct), pg. 67 .

104
105

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-r :

..
volta contra a razão, que se expressam tio fortemente DO mundo racionalmeme; e devemos ser cautcJosos no determinar n()s~~-.
cont~mporá."\eo, estio dirigid.:n, em ve:dade, contra falsas con. fin s e.!euvos, ou últimos, dos quais importa distinguir claramellt..:
cepções de ciéocia e de u,zio. os objetivos que seja.m i:ltermediários, ou parcia.is, e que sãv.
O argumelllO de Popper, segundo o qual nio pod~os em verdade, t3o-somente meios ou degraus no C1minho ?a t3 ()
encontrar, Da história, significado outro que nio o a doi empres- fim l1timo. Se não fizermos esta d istinção, não hav~d como
tado por seres hufTUnoS . tem, psicologicamente, efeito putur- ind:lgar se esses fins parci:lis são suscetíveis de levar ao fim
bador, porque desorieOlador, sobre certas pessoas que, por força último e, nesses termos, falharemos no agir racionalmente. Esses
dele, se sentem coJOC'adas em uma espécie de vazio existencialista. princfpios, se os aplicarmos ao domínio da atividade política,
Outras temem, que, se Poppe r está cerlO, são lnbitririos todos exigirão que determinemos nosso objetivo político último , ou
os vaJores e normas. Esta última iocompreensão é muito bem Estado Ideal, antes de iniciar '1ual'luer 3ção prática. Somente
considerada em Th~ Opcn Society (vol. 1, pp. 64·65). "Quase quando esse objetivo último esteja detumioado, pelo menos em
todas as incomprttn,s&s :cmontam .a um maJenteodido funda- linhas gera is, apenas quar.do estejamos de posse de algo çomo
mental, ou seja, i crença de que 'convenção' implic.a 'arbitrarie- um esboço da sociedade qce objetivamos, somente então poc.h:·
c!..lde'; que , se: formos livres para escolher o sistema de notmls remos começar a considerar os melhores caminhos e meios par:I
desejado, um sislema será tio bom quanto qualquer outro. Im- li. sua concretização, trnçando um plano para a ação pJlhic:l . ...
porta, naturalmente, admitir o ponto de vista de que, serem -as Os argumentos de Popper cootra qualquer lI.bordagem d:)
!'Ionnas convenc.ionais ou llrtificiais, indica a presença de certo poutica, a partir de um esboço, seguido CÚI tentativa de conCH'·
elemento de arbitrariedade, isto é, de que pode haver diferentes ti.zá·Jo, têm de ser enfrentados por qualquer idealista que dc~~: j.­
sistemas de oOrrnas entre os quais a escolha ser" mais ou menos seriamente ser umldealisra sem ilusões. Inicialmente, há o ar,~"
indiferente (fato que foi devid2mente sublinhado por Protá- mento de que, esteja a pessoa onde estiver, não lhe resta. rcc llr ~"
goras). Artificialidade não implica, eotreunto, de maneira algu- ~en5o o de comeÇltr onde está. Já 050 é mais possível comrpl
ma, total ubitnriedade. Os cálruJos m3temáticos, por exemplo, do o.ada, em politÍC'a, o mesmo valendo paI"J a epistemulo):i.•.
ou as sinfonias, ou as peças de te:uro são altamente artificiais e ou para a clencia ou para as artes TO<h transformação rIo::11
dai não decorre, por€m, que um dlculo OI.! sinfonia ou peça seja
usando essa palavra como oposta a tcórica - só pode ser tt:tr!~
tão bom quanto outro." EJl:plicaçio completa do porque: assim formação de circunstâncias realmen te existentes. Os ulupi-.I.'·.
ocorre e de qual acredita Poppec ser a verdadeira orien- asseveram comumeme que, antes de isto ou aquilo poJC'r ~, ' I
:' tação do homem, sio propiciadas por sua tcoria evolutiva do atter:1do, terá de ser aheradll. a soc iedade como um h", ln : "
conhecimemo, em panicuJar por sua teoru relativa ao Mundo 3, isso, eotrctanto, leva .à asseveração de que, antes de se :lll\'r.1I
que se eoconua em obra s por nós já discutiebs, 0'13S publicadas
(
.,,
~-,

em período posterior ao que orl\ examinamos .


uma coi.~ a, deve-se alterar tudo, o que é cODtradhório. EIII ~"
,. gundo lugar, todas as nossas ações terão algumas conseqii~l'K'i : l ~
• Alguns dos argumentos de Popper contra o marxismo apli-
cam·se igualmeme :lO utopismo - por exemplo, seu argumento
indesejadas '1ue facilmente se oporão ao esboço feito. E qu:.n hl
ma.is 'Ampla a ação, maiores ~s conseqiiências indeserad:ls . Ix"
contra a possibilidade de as sociedades ~erem "arrasadas" e subs- fender a racionalidade de vastOS planos de transformação dJ so·
ulUidas por algo " inteiramemc novo". "A abordagem utópica ciedade como um tOdo é afirmar grau de pormenorizado COOlll',,-j-
pode ser descrita da forma seguinte. Toda llçiO racional deve mento sociológico, simplesmente inexistente. Falar ~ m:tndr:t
ler cerlo objetivo. .t racional no mes mo grau em que persiga utopista acera de meios e de fin s € usar enganOS:lmcntc "111 .1
consciente e coerentemente seu objetivo e 0.:1. medida em que
determioe os meios de acordo com esse fim . Escolher o meio é,
port::lnto, li. pcimeira coisa que temos de fazer se desejamos agir Tht Opt n Soci~/, 1:/1(/ l u En(lf1i(l . vol. I , f>I:. t H

106 f li ,

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I, ! ~ ~l{
~~'~ .~'-· ·~~";r~iI3•• J ~~ '!.._:-::"!.._ ~!:e~L,!'@i
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;:
expressão metafórica: aquüo que está realmente em causa é um ncjadores são p.me da sociedade que desejam arrasar e a expe-
conjunto de acontecimentos, pr6:<imos no tem?O, aos quais se riênc:a social e, pDnamo, os pressupos!Os e os objetivos sociais
f~. alusão chamanéo-lhes "os meios", seguido por outro conjunto 4ue têm eH..3 rão pcofund3men te con&cionados por ela. Assim,
de acontecimentos, mais clisl3nciado, a que se dá o nome de "o :urasar vtrtÚldtiramenle aquel.:a sociedade implica arrasarem-$C :I
um". ConlL:do, eles serão, por sua vez, seguidos - a menos si mesmos e 30S próprios pla:los. De modo geral, Um3 recons·
que a história simplesmente se detenha - por outros conjuntos trução da sociedade que desça às rilies que, por esse motivo,
de acontecimaltos sucl.'"Ssivos . Ncs se..~ termos, o fjm não é, de exija longo tempo, abalará e desorientará enorme número de
fato, um fim, c 0500 se pode, iundamentadamentc, reclamar pri- pessoas, dando margem, dessa m.:meira, à ampla hostilidade, tanto
vilégios para aquilo que se constitui simplesmente no segundo psicol6gica quanto m:neríal; c:abe esperar, pois, que pelo menos
, conjunto de acontecimentos, numa série interminável. Além algumas pessoas se oponham a medidas que aIDelIÇ3ID fazer pesar
disso, o primc=iro conjunto de acoDTecimentos, estando mais pró- sobre das efeitos dessa ordem. Essas pessoas serão vistas pelos
ximo 00 tempo, é mais suscetível de: se materializ.ar da maneira detentores do poder, empenhados em concretizar a sociedade
imaginada do que O segundo conjunto, que está mais distante e ideal, como pessoas que se opõem ao bem geral por interesse
é mais incerto. As recompensa!. prometidas por este último são partícular - e nisso haved meia verdade. Serão essas pessoas
menos seguras do que os s-acríficios feitos para alcançá-las em vistas como inimigas da sociedade. Isso as tornará, inevitavel-
relação ao primeiro conj unto. E se todos os indivíduos pod~ mente, vítimas do que ocorra . Sendo inatingíveis os ideais, sua
"
moralmente recl:lmar o mesmo, é errado sacrificar uma geração pretendich materialização exige longo tempo e se prolonga o
J '> período duran te o qual a crítica e a oposição devam ser sufo-
:i~ à geração seguinte.
cadas; dessa forma, a intolerância e o autoritarismo se intensi-
, "
Quanto ao esboço mesmo, é fa to sus<eúvd de comprovação ficarão, movidos, embora, pela!! melhores intenções. Precisamente
( o de as pes.soas diferirem com relação ao t ipo de sociedade que porque as intenções e os objetivos são ideais, a persistente falha
" . ..~: d~e}am - mesmo os conservadores, os liberais e os socialistas no se malerializarem dará surgimen to a acusações de que alguém
~ ,
, tradicionais assim agem, pa ra não falar em outros. Assim, qual- está prejudicando o esforço - deve haver sabotagem ou ir:tcr-
quer grupo que assuou o poder, com o objetivo de coocretizar ferência esu3ngeiu ou liderança corru?ta, pois tOO3S as expli-
seu e5boço, terá de nculr:tlizar a oposição dos outros, se não cações que lornam incabível a crítica da revolução atribuem ma·
(
de coagi-los a servir um fim do qual discordem. Enquanto uma lignid3de li alguém. Torna·se preciso identificar esse alguém c
sociedade livre não pode impor objetivos sociais comuns, um dimin:í.lo; e se culpados deve haver, culpados serão encon lrados .
governo com finlllida des ut6picas tem de fazê-lo e se inclinará a 11. essa altura, o regime revolucionário estará mergulh-ado nas
t ' "
tornar-se autoritário . A reconstrução radical da sociedade é um imprevista s conseqüências dos seus atos. Com efeito, mesmo após
I" ; .: vasto empreendimento que se pode esperar tome longo tempo os inimigos da revoluçio terem recebido punição, os objelivos
- só remotamente cabe espe tar que os objetivos e idéias e ideais revolucionários continuarão, obstinadamente, a não se conue·
, sociais não se modifiquem substanda lmente durante esse tempo,
especi3 1menle se ele fo r, como pOr definição deverá ser, um
tizlt; e o grupo dirigente será levado, cada vtt mais, a se apega r
:\ soluções imediatas pau problêmas wgentes (aquilo que P oppe r
tempo de levante revolucionário. E se os objetivos, idéias e chama "planejamento não planejado"), o que é, usualmente, um
ideais se transformam, aquilo gue pareceu a mais desejável forma dos motivos que mais levava esse grupo a criticar os regimes
de sociedade, mesmo para os que a esboçaram, se afastará rm.is precedentes . Isso abrirá ainda mais o abismo entre os objetivos
e mais do enfoque inicial _ e mais ainda do que possam de- ,kdarados e o que efetivamente está sendo feito - e o que
sejar seus sucessores , quc nada tiveram com o esboço original. l's tá sendo feito vem li assemelhar-se crescentemente às :llivi·
Este pomo se relacion~ a outrO srgumento: oco rre que os pIa- ,hdcs dos governos mais cinicamente não utopistas.

108 lO')

:, I,
", ;
, ,
i
método que estão pre$em es na concepção Ir:h.lic io nal de ci';IlÓa
A verdade é que quase todos nós exigilllos que os aspectos

I ;c:!C\-mtes da ordem social continu em o.,eundo :la longo de


qualqu er rerons ln:çio: as pe:ssoas devem com inuu a alimcHar.
·se, vestir-se, morar í '<15 crianças, caso não se transformem inacei·
tavelmente em vítimas, devem continu ar a ser educadas e cui·
dadas; os se.rviços médicos, de poUcia, de bombe iros, de tr:m5-
Por isso, os nrgume ntos sobre os quais repousa a crítica ,li-
Poppe:r à concepçã'o de que, em poliriea, podemo s, para n50 {abr
devemo s, estabelecer e preserv ar certo es tado da socie(J:.dc é
mesma , pon lo por ponto, que serve de apoio à crítica
dirige conrra a concepção de que a ciência pode, para não dizer
q ue cll-
:.

deve, es tabeJecer e preserv u cerlO conhec imento , Sua conce pçiio,


pone, hão de conLin uu operan do. Numa sociedade moderna , ,:
essas cois.:IS dependem de uma orgaruzaçio em larga cSC2b. Abs- concep ção que se opõe à exposta , concepção de que a ciênci3
oentifi co, e concep ção acerca de coroa tal método Jcv..:
t!i·las de um momen to para OulfO seria criar, literalmente, um método
caos; e acredita r que disso emergi rá, de alguma forma, :1 socie· ser encarad o, relacionam·se à Sll a concepção de que 2 poH' ICI
dade ideal, toca às raias da loucura, o mesmo se dando com li é método polilico e .à sua concep ção de como Ial método .h'v.-
aquda que ser enc,uad o. Em ambos os CllSOS, POPrf nos pede qne lltili
cr~Ça de que uma s.ociedade algo rndhor do que
temos poderá mais facilme nte emergi r do ClIIOS do que dJ socie· zemos. com imagina ção e sentime nto, um intermi nável prnlx""
dade que temos. Não obstant e, ainda que estivéss emos deter. de re.alimentaçio, no qual 2 proposi ção de idéias novas' : inV;trÍ"
reinado s a arrasar tudo e tudo começa r de: novo, jamais o coa.se- velmen le <lIcomp2nhada por uma submis são dessas jd~i :,.~ :, UI/I
gwríam os, a despeil o de: nossos sonhos de perfeição. A humani
· rigoros o processo de eliminação de erros, à IlU da cxpni;'II' 1,1
dade se p:uece com a tripulação de um navio no mar . Pode um<> A essa abordagem daJo mina ele " raciona lismo crí,iC'o", ~ '''' "I..
ddar qualqu er parte do navio e pode remode lá·lo inteiram ente, soEi:.; em política , dá·lhe O nOme de "engen hari2 soei:t l 11.11: 1111' "
tida" ("piecc meal soci21 enginee riog"), Essa eXIHD:..,,, ,I 111"0
pane por pane, mas nio pode remoclehi·\o rodo de uma só vez,
vezes i.,fe1iz : "fragm eolária " é vocábuJo que tem, ".; \ ' l"In • •
,' U

O fala de q ue a transfo::mação nunca se detém priva de tido pejo~tivo, 2presen taodo, aqui, a segund a lo' .hli, i.... ,.1 ,I.,.
5~tido li 00ç30 mesma de esboço de uma sociedade perfeita
, pois
asse .10 esboço, ness.c mesmo 'lanuge m de maSCarar o radicalismo do métud" I "" I ~."", ,I.
llinda que a sociecb de se conform
Ou tra parte, "engen haria" tem conotações de~:1~:r;hb\'f h 'I'HtI.l"
instant e começa ri3 a divergi r dele. Assim, as sociedades ideais aplicad a 2 ~res humano s, A palavra soa com...~II:" I li ". IIh_
não são inatíngíveis apenas porque sejam ideais, roas são inatin· n2da poderia ser m2is .apaixonado que :l Jl,r~" ,1 'I"" ,I.I~ I",
gíveis lambêm porque, para corre~pooder a quaJque:r espécie: de Popper , ou mais humano que alguns .argurnl'JlI' " ),,,, ,I,· .... ,t. ..
e!oOOço, teriam de ser estáticas, fixas, inalteráveis; e não há Tentan do mostr3 r que sua filosofia é um 1,,, 1•• """', """"" 1, ,,1
sociedade imaginá vel que venha a -ajustu- se 11 tais ex..igências. !
·me, ao esct~er este livro, DOS argume nto.; I, ;.:" "-, " "'li " ..,
verdade que a íntensid ade de=: tr:uufonna~o social partte tomar·
imedig:u;õcs, porém de importâ ncia aimh 1,,:o i" l . ,1" '"~ "li'"

·se mais rápida, e não rmis lenta, com O p:.1ssar de c.da ano. E
mentO$ /Dorais; par<1 deles tomar conhcl'iull'U'" " , ....., IIII,U.•
esse processo não ted, t<1010 quanto podtmO S imaginar, um lim o JlI" 11,., ..
. mais de que não pudemo s tr:uar, aconsdlo.u",,', " I,
Dessa m3neíra, pafa ter li vdeida de de corresp ondu ao real, uma curllt as obras de Popper ,
ar·se não com os estados de .
abord3gem polilica deve preocup
coisas, mas com a transfo rmação , Nossa tarefa não é a urda
imposs ível de estabelecer e preserv ar urn2 p:uticu lu forma de=:
sociedade: é a de elevar ao máximo oosso controle sobre as tnlllS-
form2çó es que efetivam ente ocorrem num incess:mte processo de
I
tT'lnsformação - e llSH avisada mente esse control e.
As estrutu ras autori tárias mcorpo um as mesmas errôneas
r noções de certeza e as mesmas errôneas presunções acerca do

110 '"

"" ... -"".


_.. , ... , ._ ~ .. _,_.... ~
• "
POS-ESCRlTO BIBLIOGRAI"A

Quando Logik der Forschung devia aparecer em inglês, 25


anos após a sua publioação em Ungua alemã, Popper tencionou Livros de Karl Popper:
juntar um pós-escrito à obra, indicando pontos em que sua con- Tht Logic 01 Scientific Dúcovery, lIuI.-l,il1 ''' II. 1'1I100i.·•• 11I NU
cepçio se bavia aher,do . fu notas cresceram de tal forma que 19.59; última edição revista (seglll1d:,!. 1'111 1')(,11 TUI .. . f'
se uansformaram em OUtra obn. Anna!, The Logic 01 Sci~n · de versão inglesa, com oot~s d~· T".I.'I" : I' ~1 ..'II, II.f'O . d.
lilie Dücotltry foi divulgada ~m as now e o PÓ1 ~Jcr;/o perma- obra Logik der For:schung. puhli r.,.I" ,.", V" "hl . ' II! 1'/\·1
neceu em prOvas tipográficas desde 1957. Em minha opinião, o (com data de: 193.5) .
POJIJuipl é obra de t:lOU importância quanto as QutC3S j:.i publi-
cadas; em particular , o " Epílogo Metafísico" esl' en tre as me- Tht Optn SOciel] a"d III Entmics, Rnllllc·,I".,· .•.. ~: .. ~~II I'~,d.
lhores coisas escritas por Popper e seria bom que fosse publi- dois volumes, publicados em J")·fi : ,i llllll.l ,',I,\~" ",·loU
cado com a brevidade possível. (quinta l. em 1966.
EntfCtanto, o fala é que POpJXc s6 chegou a divulgar, até
o p~sente, pouco mais da metade de sua obra . Ainda perma- The Pov~"y 01 Historiásm, Routled~ç &. ....: .·I~ · ". 1"", 1. 1" .1.1 ., ",1" .
necem ia&iitos trabalhos longos (que assumiriam forma de livro em forma de livro, em 1957; çdi\'j" ''''11 1:..1·•. ,." t'/, . I
ou quase isso) 3ce.rca cY.!. teoria da rdativídade de E.inste1.n, do Conjecturts 4nd ~/uratiom: th~ Gmll·II, ,,/ \. ,,·<lfl/,. ,. ',.''''
Mundo 3 de Popper, do problt:ma corpo-mmtt:, d:l evolução t: I~Jgt, Routledge & Kegan Paul. 1')(, I . ,,1,,11,' ,.\"..1.' " · I· t ~ l.,
da filosofia da linguagt:m, tal como dt: a cODsidt:u ; juntt:-se a (quuta), em 1972.
isso toda uma sérit: dt: artigos t: conferências, t:m qUt: outrOS
temas são abordados . Boa partt: desses trabalhos será divulgada, Objecrivt Know/edge; A" E/JoluJioJllJf)' ,1/'1""" '/'. t 1.1..,,1 li" ,
de uma forma ou dt: Outra. Dois novos livros já St acham no versity Press, publicado t:m 1972.
prelo no !Domento em qut: redigimos estas linhas: Philosophy
!1nd Physics e Th t Philosophy of Karl Popper, nt. slrie "Library Ver, .índa, as CODlribuiçlks de Karl 1'01'1 .... . ·' tI .U.../.·", 11",.. /,
af Li... ing Philosophers", editada por Paul A. ·Schílpp. Este úhi- Philosoph-y, de Bryan Magtt, puhliclt l" ",u 1"/1 I" li S,·. ~ ,.,
mo li... ro contém , como outros volum~ w. mesma série, uma & Warburg.
autobiografia jlHelectu~I, uma lista completa das obras publicadas
e uma "Réplica aos meus Críticos". Acrtsce que Popper con- N . B . Todo! os liu/Os citados /,0,1011 ", .d·I,,,,,·f.. , ..,.,
rinua a produzir. Assim, embora de já tenha atingido 11 casa lXJ(umes encadernodoJ (lll nll " r.~ /"" .11
dos setenta, a quantidade de trabalhos originais que aind3 deverá
vir a lume é tão grande que :I filosofia de Popptt deve su enca-
rada como uma Cilosafi:!: ainda em pleno desenvolvimento.
(
112 11 :

I:
,,
.

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