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11/07/2006
1. Introdução
Originando-se nas antigas civilizações, a Teoria dos Números é considerada a mais pura
das disciplinas dentro da mais pura Ciência, a Matemática, e dentro desta teoria destaca-se
um teorema muito importante. A Lei da Reciprocidade Quadrática, como é conhecida hoje,
foi primeiramente conjeturada por Euler em 1783, e por Lagrange em 1785. Em 1787,
Legendre apresentou uma prova extensa, porém incorreta. Gauss foi o primeiro a apresentar
uma prova rigorosa deste teorema, chamado por ele, “teorema dourado”. Iniciando o estudo
deste problema em 1795, então com 18 anos, somente após um ano de muito esforço,
conseguiu apresentar uma prova completa desta lei. Gauss ficou tão atraído pela beleza deste
teorema que apresentou mais sete provas: uma em 1796, e as outras, em 1801, 1805, duas em
1808, sendo que a quinta demonstração é considerada a mais elegante e direta pela maioria
dos matemáticos, e outras duas em 1818.
A beleza e elegância deste teorema consiste em nos permitir determinar o caráter
quadrático de um número primo p com respeito a um outro primo q , e vice-versa.
Atualmente, existem 2071 provas da Lei da Reciprocidade Quadrática, das quais, a prova
apresentada por Eisenstein é considerada a mais elementar. Essas demonstrações podem ser
pesquisadas no livro As Leis de Reciprocidade, de Franz Lemmermeyer: De Euler à
Eisenstein.
A seguir, apresentaremos uma demonstração do “teorema dourado”.
a
O símbolo de Legendre é um instrumento de determinação do caráter quadrático
p
do número inteiro ou resíduo a (mod p) e define-se do seguinte modo
0 se a | p
a
= 1 se a é quadrático (mod p ) ( p é primo ) . (2.1)
p
− 1 caso contrário
p −1
a
≡ a 2 (mod p ) . (2.2)
p
Dem.
I) a é resíduo quadrático.
Neste caso temos, por um lado x 2 ≡ a (mod p ) , para algum x, devido a p /| x , e daí
p −1
a p −1
= 1 ≡ x p −1 ≡ x 2 ( ) 2 ≡a 2
(mod p )
p
2
p2−1
a ≡ 1 (mod p ) ;
logo
p −1
a 2
≡ ±1 (mod p ) .
Seja
p − 1
Q p := i 2 | 1 ≤ i ≤ ;
2
p −1
p −1
Como x 2
≡ 1 (mod p ) para qualquer x ∈ Q p e Q p tem precisamente elementos, então,
2
a ∉ Q p ; conseqüentemente
p −1
a
= −1 ≡ a 2 (mod p ) .
p
Teorema 2.3 (Lema de Gauss) Se p é um número primo ímpar que não divide a e
p −1
l = # j |1≤ j ≤ ∨ jaˆ < 0 , então
2
a
= (− 1) .
l
p
p − 1
Dem. Como p não divide a, a função i a iaˆ é uma permutação de i ∈ Z | 1 ≤ i ≤ , em
2
p − 1
particular, # iaˆ | 1 ≤ i ≤
2
ˆ p − 1 p − 1
ja : 1 ≤ j ≤ = 1, 2, ..., , pelo que, por um lado
2 2
p −1
2
p −1
∏ jaˆ = (− 1)
l
!
j =1 2
e por outro
p −1
p −1
2
p −1
∏ jaˆ ≡ a 2
! (mod p );
j =1 2
p −1
a
≡ a 2 ≡ (− 1)
l
p
a
e = (− 1) .
l
p
2
2
p −1
= (− 1) 8
p
p −1
Dem. Para 1 ≤ j ≤ tem-se
2
p −1
2 ˆj = 2 j se 1 ≤ j ≤
4
p − 1 p −1
2 ˆj = 2 j − p se < j≤
4 2
p − 1 p − 1
l= −
2 4
p2 − 1
e o segundo membro da equação acima tem a mesma paridade que , como se pode ver
8
observando que p ≡ ±1 (mod 4 ) , portanto para certos k ∈ Z , vem
p − 1 p − 1 p2 − 1
− = k e = 2k 2 + k
2 4 8
ou
p − 1 p − 1 1 p2 − 1
− = 2 k − 1 − k − = k e = 2k 2 − k
2 4 2 8
p q ( p −1)( q −1)
= (− 1) 4 .
q p
Em outras palavras: se dois números primos ímpares são congruentes a 3 (mod 4),
então somente um deles é resíduo quadrático módulo o outro; caso contrário, qualquer deles
é ou nenhum é resíduo quadrático módulo o outro.
q −1 q −1
C pq = x ∈ Z | 1 ≤ x ≤ ∨ − ≤ px < 0 (mod q )
2 2
p −1 p −1
Cqp = y ∈ Z | 1 ≤ y ≤ ∨ − ≤ qy < 0 (mod p )
2 2
l = # C pq
m = # Cqp
Pelo Lema de Gauss (teorema 2.3),
p q
= (− 1) .
l+m
q p
l+m e
( p − 1)(q − 1) têm a mesma paridade. (2.3)
4
q −1
De fato, para cada x ∈ C pq existe somente um y ∈ Z tal que − ≤ px − qy < 0 e
2
p
simultaneamente 0 < y < (observe-se que p é ímpar). Segue-se que
2
1 1 1
C pq = (x; y ) ∈ Z 2 | 0 < x < q ∨ 0 < y < p ∨ − q < px − qy < 0 .
2 2 2
Analogamente,
1 1 1
Cqp = (x; y ) ∈ Z 2 | 0 < x < q ∨ 0 < y < p ∨ − p < qy − px < 0 .
2 2 2
Se
1 1
R = ( x; y ) ∈ Z 2 | 0 < x < q ∨ 0 < y < p ,
2 2
então # R =
( p − 1)(q − 1) e # R − (l + m ) é o número de pares ordenados ( x; y ) ∈ ℜ tais que
4
1 1
− q < px − qy < 0 ou − p < qy − px < 0 ;
2 2
define uma bijeção entre eles. Portanto, concluí-se que vale a condição (2.3).
Apêndice
[2] Neves, Vítor Introdução à Teoria dos Números. Caderno de Matemática: Universidade
de Aveiro, 2001
[3] Santos, José P. de O. Introdução à Teoria dos Números. Rio de Janeiro: IMPA, 2005
[4] Shokranian, S., Soares M., Godinho, H. Teoria dos Números. Brasília: Editora da
Universidade de Brasília, 1994.