Ana Silvia Lopes Davi Medola como requisito parcial para aprovação na disciplina Organização da produção em televisão II, do Curso de Comunicação Social com habilitação em Radialismo, da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Campus de Bauru.
Bauru – SP
2° semestre / 2010 1. Contexto histórico
O cinema brasileiro tem seu suposto nascimento em 1896, mas a
sua história não se apresenta como uma linha reta, mas como uma série de surtos em vários pontos do país, são os chamados ciclos regionais: São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Campinas e Cataguases.
Em 1940 surge a Atlântida Cinematográfica, que apostava em
atores famosos do rádio (Oscarito, Grande Otelo) e nas comédias (chanchadas). A cinematográfica existiu até 1962, período no qual controlou a produção, distribuição e exibição de seus filmes. Em 1950 surge a Vera Cruz que importava a maioria dos seus profissionais da Itália, produzindo filmes inflacionados que não conseguiam ser distribuídos e exibidos. Único filme com sucesso internacional foi o “O Cangaceiro”.
Por possuir uma história cinematográfica nacional inconstante e
de certa forma inexistente, pois grande parte dos filmes produzidos aqui apenas copiavam modelos internacionais. Era difícil pra um jovem cineasta produzir um filme nacional, como explica Jean Claude Bernardet em seu livro Brasil em tempo de cinema de 1967.
O jovem italiano que se prepara para fazer cinema
tem atrás de si toda uma tradição que pode aproveitar, ou contra a qual pode se revoltar, mas que, em ambos os casos, representa uma prévia elaboração e interpretação da realidade sobre a qual vai trabalhar. O jovem brasileiro não tem nada disso. Deve descobrir e tratar não só a problemática da sociedade brasileira, mas até a maneira de andar, de falar, a cor do céu, do mar, da mata, o ambiente das cidades e do campo... Nesse contexto surge o Cinema Novo, aprendendo a fazer cinema com temáticas nacionais, e tentando fazer com que o público identifique-se com o cinema nacional.
2. Surgimento do Cinema Novo e suas fases
O cinema novo brasileiro emerge no início da década de 1960
com forte cunho político e contestador. Os cinemanovistas - formados nas sessões dos cineclubes, na crítica cinematográfica produzida nas páginas de cultura dos jornais e, sobretudo, nas longas e constantes discussões em torno do cinema e da realidade do país desejavam, acima de tudo, fazer filmes, ainda que fossem "ruins" ou "mal feitos", embora "estimulantes", conforme opiniões da época.
Tinham a pretensão de retratar a cara e o sentimento do povo brasileiro
da época. Inspirados pelo movimento artístico do cinema francês, Nouvelle Vague, produziam filmes com montagem inesperada, original, sem concessões à linearidade narrativa.
As produções dessa corrente cinematográfica podem ser
classificadas em três grandes áreas temáticas ligadas à vida em um país ainda fortemente rural: a escravidão, o misticismo religioso e a violência predominantes na região Nordeste.
Tendo como o cerne de suas produções o que Glauber Rocha
definiu no que se pode considerar como o manifesto do cinema novo, a EZTETYKA DA FOME.
De Aruanda a Vidas Secas , o Cinema Novo narrou,
descreveu, poetizou, discursou, analisou, excitou os temas da fome: personagens comendo terra, personagens comendo raízes, personagens roubando para comer, personagens matando para comer, personagens fugindo para comer, personagens sujas, feias, descarnadas, morando em casas sujas, feias, escuras: foi esta galeria de famintos que identificou o Cinema Novo com o miserabilismo tão condenado pelo Governo.
Neste sentido, os cinemanovistas não queriam, nem poderiam
fazer filmes nos padrões do tradicional cinema narrativo de "qualidade", americanos em sua maioria, que o público brasileiro estava acostumado a ver. O cinema que pretendiam fazer deveria ser "novo" no conteúdo e na forma, pois seus novos temas exigiriam também um novo modo de filmar.
A baixa qualidade técnica dos filmes, o envolvimento com a
problemática realidade social de um país subdesenvolvido, filmada de um modo subdesenvolvido, e a agressividade, nas imagens e nos temas, usada como estratégia de criação, definiriam os traços gerais mais característicos do Cinema Novo.
No ano 1964 o cinema novo atinge sua maior fase de
reconhecimento, especialmente fora do país com o sucesso de Deus e o Diabo na terra do sol de Glauber Rocha. É importante salientar que apesar de seu cunho político e revolucionário, o cinema novo falou muito mais diretamente aos intelectuais do que à população em si, como elucida Jean Claude Bernardet, em seu livro Brasil em tempo de cinema, de 1967.
Tais filmes mostram as chagas da sociedade
brasileira: o povo é explorado, não tem condições mínimas de vida; se o país evolui, o povo não toma conhecimento dessa evolução. Aparentemente, são filmes feitos para o povo, mostrando-lhe sua situação e incitando-o à reação. Essa intenção era utópica: os filmes não conseguiram travar o diálogo com o público almejado, isto é, com os grupo sociais cujos problemas se focalizavam na tela. Se os filmes não conseguiram esse diálogo é porque não apresentavam realmente o povo e seus problemas, mas antes encarnações da situação social, das dificuldades e hesitações da pequena burguesia, e também porque os filmes se dirigiam de fato, aos dirigentes do país. É com estes últimos que os filmes pretendiam dialogar, sendo o povo assunto do dialogo.
No entanto, nesta mesma época o cinema novo começa a sofrer
os primeiros golpes da censura instaurada pela ditadura militar em vigência. O documentário Maioria absoluta, de Leon Hirszman teve sua exibição proibida no Brasil por tratar da temática do analfabetismo. O golpe militar, portanto, inviabiliza o projeto original dos cinemanovistas de discutir o Brasil abertamente, enfatizando segmentos sociais sem direito a voz, com a proximidade da câmera na mão, do som direto, da ida dos cineastas aos locais onde o real seria enquadrado, ou seja, de desenvolver um modo brasileiro de fazer "cinema-verdade".
A produção do Cinema Novo ficou quase paralisada até o ano
seguinte, quando aos poucos os cineastas começam a encontrar brechas para possíveis realizações, mais ou menos provocadora. Os cinemanovistas são obrigados a redefinir seus projetos para adaptar o movimento estética e tematicamente às circunstâncias impostas pelo regime militar.
Devido aos embates cada vez mais freqüentes com a censura, as
perseguições e prisões, o cinema novo aos poucos começa a se descaracterizar de sua temática inicial. Filmes como Garota de Ipanema de Leon Hirszman e Capitu de Paulo César Saraceni começam a retratar temas menos ásperos, com uma estética mais colorida, embora ainda mantivessem um ideal de contestação com enfoque sobre a frustração da juventude refletindo sobre uma falsa alegria que dominava o imaginário sobre Ipanema, em uma atmosfera característica da Zona Sul carioca.
Com a instauração do AI-5 no final de 68 o cinema novo ficou
ainda mais descaracterizado de seus ideais e posteriormente seus principais expoentes foram para fora do país ou envolveram-se com publicidade. Os que ainda continuaram passaram a fazer adaptações com menor cunho político, como é o caso de São Bernardo de Leon Hirszman em 1971.
Principais expoentes do cinema novo foram: Glauber Rocha,
Carlos Diegues, Leon Hirszman, Ruy Guerra, Rogério Sganzerla e Joaquim Pedro de Andrade, entre outros.
3. Glauber Rocha
Glauber de Andrade Rocha nasceu em Vitória da Conquista, 14
de março de 1939 foi o primeiro filho de Adamastor e Lúcia Rocha e teve duas irmãs: Ana Marcelina e Anecy. Cursou o primário em Vitória da Conquista e, em 1947, mudou-se com a família para Salvador.
Em 1957, Glauber entrou para a Faculdade de Direito da
Universidade da Bahia, que cursou até terceiro ano. Com poucos recursos, filmou "Pátio", utilizando sobras de material de "Redenção", de Roberto Pires. Em 1958, trabalhou como repórter no Jornal da Bahia, assumindo depois a direção do Suplemento Literário.
Publicou artigos sobre cinema no "Jornal do Brasil" e no "Diário de
Notícias". Trabalhou na produção de "A Grande Feira", de Roberto Pires e de "Barravento", de Luiz Paulino dos Santos, filme que acabou dirigindo depois de refazer o roteiro. Finalizou "Barravento", no Rio de Janeiro, com Nelson Pereira dos Santos. O filme foi premiado na Europa e exibido no Festival de Cinema de Nova York. Em 1963, filmou "Deus e o Diabo na Terra do Sol", que concorreu à Palma de Ouro no Festival do Filme em Cannes do ano seguinte.
Em 1965, Glauber Rocha participou da criação da Mapa Filmes,
junto com Walter Lima Jr. e outros. Em 1966 co-produziu "A Grande Cidade", de Carlos Diegues e preparou "Terra em Transe", que chegou a ser proibido, mas foi liberado sob algumas condições. Exibido no Festival de Cannes, o filme ganhou os prêmios Luis Buñuel e o da Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica. Recebeu ainda prêmios e elogios na Suíça, em Cuba e no Brasil.
No mesmo ano, Glauber Rocha trabalhou no argumento de
"Garota de Ipanema, de Leon Hirszman. Recebeu o convite de Jean-Luc Godard para participar de "Vent d'Est", onde Glauber viveu seu próprio personagem: um cineasta que aponta o caminho para o cinema político- revolucionário. Iniciou o filme "Câncer", rodado durante quatro dias no Rio de Janeiro. Co-produziu "Brasil Ano 2000", de Walter Lima Jr.
Em 1969, "O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro" foi
exibido no Festival de Cannes e Glauber ganhou o prêmio de melhor diretor, dividido com o tcheco Vobtech Jasny. Além deste, o filme ganhou muitos outros prêmios importantes. Ainda na Europa, o cineasta recebeu dois convites para filmar. Um do produtor espanhol Pedro Fages e outro de Claude Antoine. Em 1970, Glauber Rocha rodou, na região da Catalunha, o filme "Cabeças Cortadas".
Glauber voltou ao Brasil, mas o crescimento da repressão o
desestimulou. Em 1971 Glauber partiu para o exílio. Na Universidade Columbia, em Nova York, apresentou a tese "Eztetyka do Sonho". No Chile filmou um documentário sobre os brasileiros exilados, que não foi concluído. Viajou para Cuba, onde permaneceu um ano, trabalhando no projeto de "America Nuestra". Da colaboração com Marcos Medeiros surgiu o filme "História do Brasil", que foi concluído em Roma. Em 1976, Glauber retornou ao Brasil, depois de cinco anos de exílio. No ano seguinte, o curta-metragem "Di Cavalcanti" ganhou prêmio especial do júri do Festival de Cannes. Em dezembro, Glauber Rocha iniciou as filmagens de "A Idade da Terra". Glauber morreu de problemas broncopulmonares, no Rio de Janeiro em 22 de agosto de 1981 aos 42 anos. 4. Referências
Atlântida histórico. Disponível em:
http://www.atlantidacinematografica.com.br/sistema2006/historia_texto.a sp. Acessado em 26 de setembro de 2010.
Biografia Glauber Rocha. Disponível em:
http://educacao.uol.com.br/biografias/ult1789u551.jhtm. Acessado em 26 de setembro de 2010.
BERNARDET, J.C. Brasil em tempo de cinema. Editora Civilização
Brasileira S.A, Rio de Janeiro 1967.
História do cinema. Disponível em :
http://www.webcine.com.br/historia4.htm. Acessado em 26 de setembro de 2010.
MASCARELLO, FERNANDO (ORG.). História do cinema mundial.
Editora Papirus, São Paulo, 2006.
ROCHA, GLAUBER. Eztetyka da fome. Revista Civilização