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STRESS NO TRABALHO, FATORES PSICOSSOCIAIS E ALTA INCIDÊNCIA DE

LER/DORT ENTRE OPERADORAS DE CAIXA DE SUPERMERCADO: UM


ESTUDO DE CASO

Autores: Hudson de Araújo Couto e Lúcio Flávio Renault de Moraes

RESUMO

Em determinada empresa ligada ao ramo de comércio varejista, verificou-se a alta


incidência de tendinites e outros distúrbios músculo-ligamentares nos membros superiores
(antigamente denominados LER-lesões por esforços repetitivos e atualmente denominados
DORT-distúrbios osteo-musculares relacionados ao trabalho) entre os operadores de caixa.
Um dos fatores mais instigantes foi a alta incidência em determinadas lojas de hipermercado,
contra uma baixa incidência em outras.

O estudo deste caso foi feito utilizando metodologia de análise biomecânica dos postos
de trabalho (check-outs), bem como estudo de fatores de organização do trabalho e
psicossociais, estas duas últimas categorias pesquisadas através de análise de dados
secundários e de entrevistas semi-estruturadas com trabalhadores e chefias.

Evidenciou-se que o pior check-out era aquele da loja com maior incidência de
queixas; demonstrou-se também terem sido os fatores de organização de trabalho (número
insuficiente de pessoas) e mudança traumática no horário e no efetivo dos trabalhadores
fatores diferenciais. No entanto, o fator mais importante foi a cobrança obsessiva de
produtividade (baseada no número de itens passados por minuto).

1. Introdução

Lesões por esforços repetitivos (LER) ou distúrbios osteomusculares relacionados ao


trabalho (DORT), conforme denominação mais atual da Previdência Social, são transtornos
dolorosos de membros superiores. Geralmente trata-se de inflamação dos tendões, decorrentes
do trabalho com movimentos repetitivos dos membros superiores, associados ao uso de força
excessiva na realização das tarefas, com posturas inadequadas dos membros superiores, e sem
o devido tempo de recuperação da integridade das estruturas. Esses fatores biomecânicos
podem ser potencializados por outros relacionados à organização do trabalho e a fatores
psicossociais, saindo, então, o tema da área exclusiva de interesse da Medicina do Trabalho e
passando para a área de interesse da Administração. Especialmente dos estudos de
Organização do Trabalho e de Comportamento Humano nas Organizações.

O trabalho de operador de caixa de supermercado é uma atividade que contém em si o


fator básico para a ocorrência de lesões por esforços repetitivos nos membros superiores: a
repetitividade dos movimentos. Segundo a literatura disponível, esta repetitividade pode se
tornar crítica quando o seu limite é ultrapassado e não existe o tempo necessário para a
recuperação da integridade dos tecidos.

2. O caso em estudo

Uma rede de supermercados no Brasil, com dezenas de lojas, vem apresentando desde meados
de 1996 um número crescente de queixas de dores nos membros superiores entre operadores
de caixas, em geral diagnosticadas como tendinites e tenossinovites (7 casos em 1996, 42

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casos em 1997 e 144 casos em 1998). Na ocasião desta pesquisa (dezembro de 98), a alta
incidência comprometia a saúde dos trabalhadores e até mesmo a própria administração das
lojas, uma vez que o trabalhador portador dessas queixas dificilmente tem condições de
permanecer na função. Os afastamentos eram cada vez mais freqüentes. Quando possível, a
área aproveitava os trabalhadores em funções de menor sobrecarga, mas este recurso chegou
ao seu limite, por não haver mais funções compatíveis para absorver as novas ocorrências.

Foi demonstrada uma nítida predominância de ocorrência nas lojas de hipermercados


(83% dos casos) contra 17% nas lojas de supermercados. No entanto, essa distribuição não é
igual nem proporcional nas 5 unidades de hipermercados, conforme ilustram os dados da
Tabela 1, a seguir.

Tabela 1 – Distribuição dos casos de distúrbios de membros superiores entre operadores de


caixa nas 5 unidades de hipermercados da empresa A. .

Ano Loja CX Loja CF Loja G Loja T Loja B


1996 0 5 0 Não existia Não existia
1997 5 12 14 2 2*
1998 25 34 50 4 7
(*) Esta loja foi inaugurada em dezembro de 97, e nesse mesmo mês apresentou dois casos de
queixas.

Conforme pode-se depreender, a questão apresenta aspectos instigantes, pois pode-se


perceber a existência de uma realidade bastante diferente: as lojas G e CF com altíssima
incidência; a loja CX com alta incidência, porém menor do que as anteriores, e as lojas T e B
com uma menor incidência.

3. Objetivos:

O presente trabalho teve os seguintes objetivos:


1. Identificar os fatores envolvidos na origem da alta incidência de queixas de dores e lesões
nos membros superiores entre os operadores de caixa de hipermercado da Empresa A .
2. Identificar os motivos da diferença na incidência de queixas comparando unidades de
incidência totalmente diferente (especialmente entre a Loja G – alta incidência- e a Loja
T-baixa incidência).
3. Recomendar à empresa medidas visando a redução de novas ocorrências.
Neste artigo será feito um relato dos dois primeiros objetivos.

4. Descrição do trabalho do operador de caixa de supermercado

O operador de caixa de supermercado é um profisssional submetido a alta exigência


física e psíquica.
Sob o ponto de exigências físicas, o mesmo está submetido:
1. ao fator repetitividade de movimentos, como essência de seu trabalho. Esta exigência, que
envolve movimentos tão significativos quanto passar 2200 ítens por dia num check-out, é
agravada por fatores biomecânicos outros, tais como:
2. a força excessiva ao manusear alguns produtos muito pesados;
3. a postura incorreta muitas vezes precipitada pelo mau posicionamento do mobiliário;
4. a jornada de trabalho prolongada (basicamente, é previsto uma jornada de 8 horas, mas
especialmente nos turnos de fechamento da loja, não é raro que ela se prolongue);

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5. A multiplicidade de funções e de exigências físicas – o trabalho do operador de caixa,
especialmente na Empresa A, foi transformado de forma significativa nos últimos anos.
Assim é que desde 1994 foi eliminada a função do embalador, e o caixa coloca, ele
mesmo, os produtos dentro das sacolas de plástico. Isso equivale a exigência ainda maior
do que aquelas de simplesmente passar o produto pelo scanner, pois as sacolas muitas
vezes encontram-se longe do corpo, em posição difícil, e os produtos a serem embalados
são pesados.Mais recentemente, introduziu-se a balança de pesagem de
hortifrutigranjeiros e de frios no próprio check-out, acrescentando-se outra exigência
biomecânica.
Às exigências físicas, superpõem-se muitas exigências psicológicas, próprias da
função:
1. Lidar com dinheiro e numerário – o operador é responsável pelo seu caixa, e pelas
eventuais diferenças que possam vir a ocorrer. Ao final do turno, ele se dirige com seu
malote ao caixa geral, onde é feita a conferência individual. Em caso de diferença, o
operador pode ser advertido ou mesmo demitido, além de ter que pagá-la;
2. Atenção no lidar com alimentos de pesagem no caixa – se anteriormente o caixa tinha que
ter enorme atenção ao olhar o preço de um produto e digitar corretamente o seu valor, os
sistemas automáticos atuais baseados em leitura por scanner reduziram esta necessidade.
Por sua vez, a recente introdução de balanças para pesagem de hortifrutigranjeiros e frios
nos caixas voltou a acentuar o aspecto da atenção visual, pois ele deve, olhando um
determinado produto, identificá-lo numa lista e digitar o código corretamente;
3. Lidar com pessoas –. Há várias situações em que o operador recebe uma orientação de
seus superiores ou da gerência, e o cliente tenta forçar para outra conduta, proibida pelas
regras. Nestas situações há tensão, maior ainda quando o encarregado chamado para
resolver a situação desautoriza o caixa junto ao cliente;
4. Problemas na passagem da compra – é bastante freqüente a ocorrência de algum
problema que atrasa a passagem da compra (sistema fora do ar, produto não precificado e
outros) e nestas situações ocorre todo um acúmulo, sendo o operador de caixa aquele a
quem algum algoz em potencial irá descarregar sua insatisfação.
5. Nível geral de ruído num supermercado, especialmente em hipermercados, com anúncios
de promoções, reverberação geral do ruído de equipamentos, de fala, etc...

Acrescentam-se ainda as exigências psicológicas desnecessárias, tais como:


1. A existência de critérios de produtividade muito apertados, muitas vezes desrazoáveis e
privilegiando apenas o número de registros por minuto;
2. O número insuficiente de pessoal de operação de caixa na frente de loja em determinados
horários. Isso ocasiona tensão entre os clientes pela demora no atendimento;
3. Tensão entre os operadores e os auxiliares, cuja relação hierárquica com os operadores
de caixa muitas vezes não está bem estabelecida;
4. Tensões com chefias, por motivos diversos.

Reportando-nos ao Modelo de HACKMAN e OLDHAM (1975) quanto à qualidade de


vida no trabalho, o operador de caixa de supermercado:
• Tem na identidade com a tarefa um dos pontos mais importantes de sua adaptação ao
trabalho; em geral as pessoas que assumem este tipo de função gostam do que fazem e
expressam isso nas suas entrevistas;
• Podem realizar ciclos completos: ela atende um cliente desde o início da compra até o
recebimento do pagamento;
• Tem algum grau de autoridade sobre o processo, mas não muito, pois em geral o sistema
informatizado já define os limites de sua atuação. Sua autoridade é maior no momento do

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recebimento, onde tem que ter uma alta capacidade de discernimento das situações que lhe
são apresentadas no cotidiano do trabalho;
• Não é possível exercer criatividade, uma vez que o sistema informatizado delimita sua
atuação.
• Recebe feedback de seu trabalho, tanto relativo ao número de clientes e de compras,
quanto ao fato de estar trabalhando corretamente ou não, expresso no acerto de caixa;
nesses casos, não costuma haver um feedback proativo, mas apenas reativo (somente fica
sabendo quando há problema);
• O salário é baixo.

Assim sendo, ser operador de caixa de supermercado costuma ser uma alternativa na vida
de pessoas jovens (entre 18 e 25 anos), e de mulheres, como alternativa de primeiro emprego.
Ao entrarem para o trabalho, geralmente as pessoas gostam do que fazem, mas com o tempo e
com as situações de tensão e sobrecarga (quando existem), costumam perceber sua falta de
alternativa profissional. Efetivamente, as chances de evolução dentro da organização
“supermercado” para os profissionais de caixa são bastante reduzidas. Assim, não é de se
estranhar que, em épocas de demissão voluntária, muitas delas se apresentem.

5.Metodologia

Neste estudo de caso, foi utilizado o seguinte instrumental básico de pesquisa:


1. Reunião com o pessoal de gerência de loja, de atendimento e outros para ouvir
questionamentos e opiniões;
2. Entrevistas semi-estruturadas com pessoal gerencial. Foram entrevistados: o gerente de
hipermercados; o gerente de supermercados ; a gerente de loja e a supervisora imediata
das operadoras de caixa da loja G (de alta incidência de queixas); o gerente de loja e a
supervisora imediata da loja T (de baixa incidência de queixas); o gerente de atendimento
da loja CF (de alta incidência de queixas); o gerente de atendimento da loja B (com baixa
incidência de queixas), mas que na época da incidência epidêmica na loja G trabalhava
como supervisor imediato daquela unidade; o gerente de atendimento atualmente
prestando serviços no trabalho de redefinição de efetivo e de horário de trabalho de todas
as lojas de hipermercados; o médico do trabalho; a enfermeira do trabalho; e a técnica de
segurança.
3. Entrevistas semi-estruturadas com 5 trabalhadores da Unidade T (baixa incidência de
queixas) e com 7 trabalhadores da Unidade G (com alta incidência de queixas).
4. Pesquisa de dados secundários relacionados à organização do trabalho, à produtividade e à
carga de trabalho das áreas em comparação – T e G; foi também possível levantar dados
também das unidades CF, B; e alguns poucos dados da Unidade CX; foram levantados
especialmente: (a) dados constantes da folha de controle de movimento de loja, incluindo
produtividade por trabalhador; (b) número de horas extras; (c) número de horas extras por
trabalhador; (d) indicadores de produtividade individual.
5. Metodologia de análise biomecânica dos postos de trabalho, principalmente a análise
qualitativa. Essa medida visou fundamentalmente identificar a intensidade dos diversos
fatores biomecânicos conhecidos na origem das lesões (força, posturas incorretas, postura
estática, repetitividade, compressão mecânica e outros) presentes na realidade de trabalho,
e em que grau se constituem em diferencial entre as áreas que apresentam e as que não
apresentam lesões.
6. Entrevistas gerais de complementação: foram entrevistados o médico do trabalho, a
enfermeira do trabalho, a técnica de segurança com maior experiência em assuntos de

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Ergonomia e o gerente de Benefícios, que tomou a iniciativa da pesquisa por estar lidando
com o número cada vez maior de casos de queixas.

Com base nos resultados desses 6 instrumentos, foi formulada uma conclusão para
explicar os motivos da alta incidência de lesões nos hipermercados, e também para concluir
os motivos da diferença de ocorrência entre as diversas unidades.

6- Resultados encontrados

6.1- Fatores biomecânicos do posto de trabalho de operador de caixa de supermercado

O trabalho de operador de vendas em check-out de supermercados vem passando por


mudanças muito significativas na última década, especialmente determinadas pela gradativa
introdução da informática sob a forma de código de barras.

Há nada mais que 10 anos, no Brasil, o trabalho era feito, basicamente, através da
leitura da etiqueta de preço, e a digitação do respectivo valor no caixa. Nesse tipo de
atividade, o trabalhador tinha quatro exigências ergonômicas: (i) a alta repetitividade com
que digitava os valores constantes da etiqueta (com sobrecarga para o membro superior
direito), (ii) a acuidade visual para perto exercida de forma constante (ao ter que ler etiquetas
de preços, muitas vezes mal colocadas ou sem nitidez; (iii) o grau de atenção para não
cometer erros e (iv) os esforços com os membros superiores para passar as mercadorias. Não
é sem razão que desde esta época já se relata a existência de queixas de dores nos membros
superiores de operadores de caixa (COUTO, 1991, NUSAT,1992,1993,1994,1995,
OLIVEIRA,1990,1997).

A introdução do código de barras parecia ter acenado como o final dos problemas
biomecânicos relacionados ao trabalho da operadora de vendas em check-out de
supermercados, pois eliminaria um dos grandes fatores relacionados à repetitividade, a
digitação do preço das mercadorias. Mas isso não aconteceu, pois nos primeiros check-outs a
trabalhadora tinha que ficar na perpendicular em relação ao scanner, ocasionando um esforço
enorme do tronco ao ter que passar o código de barras do produto o mais próximo possível do
mesmo.

Uma evolução bastante significativa sob o ponto de vista de ergonomia e de conforto


para trabalhar aconteceu quando foram introduzidos os check-outs de última geração
(semelhantes aos existentes nos hipermercados da Empresa A). Neles, o trabalhador fica na
perpendicular do eixo maior do móvel; nesta posição, o mesmo pode pegar o produto com as
duas mãos e trabalhando com o mesmo mais próximo do corpo, passa a ter assim um
equilíbrio muito melhor, com menor sobrecarga.

Na modalidade de check-out dotado de código de barras, o esforço visual ficou


significativamente reduzido, pois não há mais necessidade de enxergar os pequenos números
da etiqueta, ficando a acuidade visual exigida apenas quando houvesse dificuldade de leitura
ótica. Nestas situações, o operador digitaria o código de barras e o sistema automaticamente
faria a computação do produto. Neste caso, o teclado está posicionado de frente para o
trabalhador, um pouco mais alto, de forma a permitir a passagem do produto; este
posicionamento um pouco elevado a princípio não traria problema porque o teclado seria para
ser usado apenas como exceção. Teoricamente, estaríamos próximos ao final da era das
tendinites entre operadores de caixa de supermercado.

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Esta evolução, no entanto, não durou muito por quatro motivos: (i) a introdução da
embalagem dos produtos pelo operador, o que passou a exigir grande esforço ao movimentar
pacotes pesados; (ii) a introdução, no posto de trabalho, da balança para pesar
hortifrutigranjeiros e frios, geralmente mal posicionada, e exigindo grande esforço ao deslocar
da esteira para a balança e vice-versa, produtos tão pesados quanto sacas de batata e chester;
(iii) a freqüência de falhas do scanner, que obriga o operador a movimentar o produto com
freqüência, e não obtendo resposta, a digitar seu código de barras; (iv) a falta de definição da
posição de trabalho do operador, muitas vezes induzindo-o a trabalhar sentado, o que é crítico
para os membros superiores e coluna ao ter que manusear cargas pesadas.

Classificação dos check-outs da Empresa A sob o ponto de vista ergonômico

A análise biomecânica, instrumentalizada pela avaliação qualitativa, pelo estudo com


eletromiografia de superfície e medidas dimensionais do posto de trabalho, demonstrou que
todos os check-outs analisados são de terceira geração, e neles o operador trabalha na
perpendicular em relação ao cliente e o leitor de código de barras (scanner) está em frente.

Numa classificação qualitativa,


- o melhor check-out encontra-se na Loja B (com baixa incidência de lesões);
- o segundo melhor, embora mais antigo, encontra-se na Loja CX (com média incidência)
- em terceiro lugar, os da loja T (baixa incidência), que tem alguns aspectos positivos, mas
tem também aspectos bastante negativos;
- já entre aqueles em que predominam os aspectos negativos, encontramos os da loja CF
(com alta incidência de lesões);
- e o pior de todos encontra-se na loja G (com altíssima incidência).

6.2- Fatores de organização do trabalho

A presente análise de organização do trabalho, visando detectar sobrecarga


potencialmente causadora de lesões nos membros superiores, está estruturada (i) na análise de
dados secundários quanto a efetivo e sua relação com o movimento da loja (ii) e na análise
crítica do processo de adequação do efetivo de operadores de caixa segundo a necessidade de
compras e o horário de trabalho (denominado esquedulagem).

6.2.1-Avaliação da carga de trabalho

Para esta análise, utilizamos basicamente os dados secundários existentes na empresa,


especialmente as folhas diárias (com totalização mensal a cada dia 15) existentes em cada
unidade. Um dos indicadores mais importantes para a análise da carga de trabalho sobre as
operadoras é o número médio de registros/operador/dia. Os mapas fornecidos pela empresa
permitiram a dedução desse indicador. Foram analisados os dados de 1998, que evidenciaram:

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Na Loja T (baixa incidência de queixas)

Até o ponto em que dispomos de informação, verificamos que em maio e junho havia
uma carga maior de trabalho para os operadores, e que a partir de julho, com o aumento do
quadro de operadores, houve uma redução do número médio de registros. Embora não
tenhamos os números de dezembro a abril, pode-se suspeitar que durante esses meses o
efetivo tenha sido insuficiente, o que pode explicar a ocorrência de 4 casos nesse período.

Na Loja G (altíssima incidência de queixas)

- Embora seja a loja de menor número de registros/dia (em média 1121), deve ser
considerado que ela possui o pior check-out, sob o ponto de vista biomecânico; isso torna
o esforço nesta loja pior do que em outras.
- A loja tinha um efetivo de operadores de caixa maior ao longo do ano de 97. Em
janeiro/fevereiro de 98 houve uma grande redução, atribuída à diminuição de demanda
esperada com a abertura da loja B, relativamente próxima à Loja G;
- No entanto, esta redução não aconteceu, conforme pode ser visto pelos números do
movimento financeiro (era em média de R$ 9,285 milhões por mês em 97 e passou para
R$ 8,510 milhões em 98) – ou seja, uma redução de apenas 8,4% , contra uma redução de
efetivo de 171 operadores em 97 para 146 em 98, ou seja, de 14,4%. (sabemos que o ideal
para este tipo de comparação é a verificação do número de registros, mas tal dado não
esteve disponível).
- A partir de janeiro de 98, aconteceu uma correlação linear entre o número médio de
registros por dia e o número de queixas, conforme tabela abaixo:

Tabela 2– Número médio de registros por dia e número de queixas no período de janeiro a
dezembro de 98- Loja G
Mês Número médio de Número de queixas
registros/dia
Janeiro 1008 3
Fevereiro 1136 2
Março 1080 5
Abril 1216 8
Maio 1296 9
Junho 1184 7
Julho 1024 4
Agosto 952 -
Setembro 1136 1
Outubro 1136 4
Novembro 1192 3
Dezembro 1096 3
O coeficiente de correlação de Pearson (r de Pearson) foi de 0,72. O grau de certeza de
afirmação desta correlação é de 99%. (p<0,01) .

Na Loja CF

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No primeiro semestre de 98 houve um aumento expressivo do número médio de
registros por operador por mês, que culminou no maior valor em junho. A partir de julho de
98 houve contratação de pessoal e o número de registros por trabalhador caiu. Não foi
demonstrada correlação entre o número médio de registros e o número de queixas, sugerindo
outros fatores para explicar a alta incidência.

Na Loja CX

Embora os dados sejam poucos, pode-se suspeitar que o comportamento tenha sido
semelhante ao de CF, com número restrito de pessoal no primeiro semestre e contratação no
segundo semestre de 1998.

Na Loja B

Os dados ilustram ter havido um alto contingente de pessoal de frente de loja quando a
mesma foi inaugurada, em dezembro de 97; a partir de março de 98 houve cortes
significativos no efetivo, o que aumentou muito o número médio de registros/dia. Como a loja
foi aumentando gradativamente seu movimento, sem aumento do efetivo, a carga de trabalho
também foi aumentando. Esta situação chegou ao seu nível mais crítico em novembro de 98,
quando se atingiu o número de 1528 registros por operador de caixa por mês. Em dezembro
houve contratação de pessoal.

Como o número de queixas é baixo, não foi possível fazer uma correlação com o número
de registros/dia, embora possa tal fator ter contribuído para as queixas ocorridas no período.

6.2.2-Avaliação crítica de horas extras

É bem conhecido que as horas extras são consideradas fatores críticos na origem e na
perpetuação de lesões por sobrecarga funcional nos membros superiores. As horas extras do
ano de 1998 foram levantadas e os resultados não evidenciam este fator como um
determinante crítico de sobrecarga para os operadores de caixa do Empresa A..

6.2.3-Horário de trabalho e “esquedulagem”

Dentre as alterações de organização do trabalho pelas quais passou o Empresa A nos


últimos 3 anos, uma das mais importantes foi o projeto de esquedulagem. O termo foi
adaptado do equivalente em inglês “schedule”, indicando o trabalho feito para adequar o
efetivo de frente de loja (especialmente operadores de caixa) às necessidades de demanda de
compras, visando fundamentalmente a eliminação de filas. Este projeto foi iniciado em
novembro de 96 e os motivos determinantes do mesmo foram: (i) as filas (hoje raras, mas na
ocasião muito freqüentes), e (ii) a falta de controle sobre o efetivo da empresa. Segundo relato
dos entrevistados, era muito fácil conseguir gente; e um efetivo solicitado hoje pela chefia,
amanhã já era considerado insuficiente, e aumentava-se o quadro a bel prazer do gerente da
loja.

O primeiro momento da esquedulagem: traumático e com corte de pessoas

A tônica do primeiro momento da esquedulagem (novembro de 96 até dezembro de


97) foi marcada exatamente por isso: forte pressão para reduzir custos; estabelecimento de
normas rígidas para os operadores; e grande redução de efetivo. Não conseguimos dados que

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nos pudessem suportar essa afirmação, uma vez que os mesmos não mais existem na empresa
(sem um grande esforço para levantá-los). Mas há um consenso dos entrevistados em relação
a isso.

A ordem de implantação foi a seguinte: CX (novembro de 96 a maio de 97), CF


(novembro de 97) e G (início de 98), sendo que nesta última loja já foram feitas uma série de
adequações visando reduzir o seu impacto. A loja T foi inaugurada em abril de 97, e portanto
a esquedulagem, já foi feita no segundo momento (ver abaixo) e não sofreu o impacto da
esquedulagem traumática ; a loja B (inaugurada em dezembro de 97) passou por alterações
no efetivo de frente de loja, mas também não sofreu o impacto da esquedulagem traumática.

Assim, o primeiro momento de esquedulagem foi baseado em um projeto não realista


e muito centrado em um cálculo de software. Seu ímpeto reducionista era tão forte, e
contagiou tanto as chefias no espírito de downsizing que foi necessário uma intervenção direta
do presidente da empresa que desaprovou esta forma de se conseguir resultados.
Naturalmente, pode-se depreender a alta relação desta mudança na organização do trabalho
com a alta incidência de lesões. Este raciocínio se aplica especialmente para explicar a alta
incidência de queixas em CF e G.

O segundo momento da esquedulagem: uma análise racional do trabalho

Num segundo momento, a Empresa A reestruturou o trabalho com o apoio de uma


consultoria. Junto à assessoria técnica da superintendência de hipermercados e à área de
Desenvolvimento de Pessoal elaboraram um outro projeto, que se parece muito com um
estudo de análise racional do trabalho, pois: (i) baseia-se numa verificação em campo, em
horários pré-estabelecidos, do número de caixas abertos e fechados e do número de pessoas
nas filas;(ii) esta análise é feita na última e primeira semanas do mês; (iii) também considera a
análise em dias diferentes da semana, uma vez que se sabe ser o fluxo de pessoas em
supermercados diferente a cada dia da semana; (iv) considera ainda o relatório evolutivo de
vendas, para obter o padrão de venda da unidade; (v) considera ainda um tempo para abertura
e fechamento do caixa; (vi) e considera o feeling do analista.

Para o desenvolvimento desta análise racional, foi elaborado um Manual de Projeto de


Esquedulagem, que previa : "ao número final do orgânico (efetivo) serão acrescentados
alguns valores, para que se tenha a definição numérica exata do orgânico. Estes valores são:
10% de margem de segurança (de acordo com a realidade da Loja), 3% de absenteísmo e
9,17% de férias.”

Com base nesse instrumento, foi assim feita a esquedulagem atual, que já atingiu todos
os hipermercados e a grande maioria dos supermercados da rede Empresa A. Como toda
análise racional do trabalho (intitulada antigamente como análise científica do trabalho), a
esquedulagem atual apresenta uma série de pontos positivos em relação ao processo anterior.
Uma das maiores verificações favoráveis é o efetivo aumento de pessoal de frente de caixa
após a instituição da mesma, nas diversas unidades, exceto G, ao longo do ano de 98.

No entanto, a mesma ainda não contemplou a necessidade real de trabalho, pois deixa
de considerar: (i) o tempo de pausa entre uma compra e outra; ou uma pausa de 10 minutos a
cada duas horas trabalhadas; (ii) tempo para reuniões; (iii) tempo para treinamento; (iv) tempo
para fazer balanço; há um balanço que era trimestral e que agora é mensal, geralmente feito
aos domingos, e para o qual o pessoal de frente de loja é escalado; (v) não considera dias

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atípicos; (vi) também não considera a data do vencimento do cartão Empresa A, no qual há
um acúmulo de clientes nos caixas.

Deve-se fazer uma ressalva que alguns desses aspectos são resultados da aplicação
inadequada do método, que previa esse excedente, mas que não encontra repercussão positiva
quando o gerente solicita aquele excedente de 10% de que fala o manual. Soa melhor falar
que esse excedente não é necessário, que não contratará. No caso específico de falta de tempo
para treinamento, cria-se uma situação de constrangimento qualquer que seja a atitude
administrativa da chefia: caso opte pelo excedente de 10% permitido pelo Manual, correrá o
risco de ser chamado de perdulário com os recursos da empresa; caso solicite horas extras,
mesmo que para treinamento, será constrangido por estar requisitando e pagando horas extras.

Um dos maiores fatores de impacto do horário de trabalho sob o ponto de vista


psicossocial e que a esquedulagem atual ainda não resolveu, é a dificuldade para se ter um
tempo de ir ao banheiro. Efetivamente, ir ao banheiro é um transtorno para o caixa, pois o
número de horas de trabalho direto é muito grande. Em alguns casos, a esquedulagem prevê
até 6 horas de trabalho ininterrupto! Ao caixa restam duas alternativas: fechar o caixa, o que
é considerado fora de propósito dentro dos valores do Empresa A, ou pedir substituição.
Nesses casos, é necessário fechar o caixa, para que outro possa assumir, recolher o malote ao
caixa geral; e depois reabri-lo retomando todo o controle.

6.3- Análise dos fatores psicossociais – o fator “produtividade” baseado no número de


toques por minuto.

Este é, na opinião dos trabalhadores entrevistados, o principal fator determinante da


alta ocorrência de queixas.

O controle individual de produtividade das operadoras de caixa foi introduzido na


Empresa A em agosto de 1996, sendo inicialmente baseado no número de toques executado
pelas mesmas durante uma compra. “Toque” aqui equivale à passagem de um produto pelo
scanner, ou se necessário, digitando o seu código de barras no teclado, quando o scanner não
o lê por algum motivo. O sistema fica inativo quando não está havendo compra, e quando esta
se inicia, ao se passar o primeiro produto, dispara-se o sistema, que termina quando passa o
último produto. Num segundo momento, percebendo-se a necessidade de controlar o tempo
de recebimento do valor da compra, após a passagem de todos os produtos, instituiu-se
também o controle sobre este tempo, (que vai desde o final do último produto até o momento
do fechamento da compra). Assim, o cálculo de produtividade passou a considerar os dois
fatores.

O controle de produtividade foi rapidamente espalhado por todas as unidades, e graças


ao eficiente controle de toques pelo computador, diretamente ligado à automatização da
compra, passou-se a originar uma informação diária do número de toques dado pelo operador
de caixa, com relatórios diários.

Rapidamente, instituiu-se a produtividade-padrão, que seria de 10 toques por minuto.


Mas, como o pessoal começou a conseguir os resultados propostos, com o tempo, este número
aumentou para 12 toques por minuto, e na atualidade é de 15 toques por minuto. O limite de
12 toques por minuto passou a ser o referencial de continuidade no cargo: quem não o
conseguisse perderia o emprego.

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Tensão criada pelo controle individual da produtividade

Atualmente, e desde algum tempo para cá, atingir 12 toques por minuto passou a ser
item de classificação. Durante o contrato de experiência, esse pré-requisito é colocado para o
operador, fazendo com que o mesmo se esforce bastante para atingir esta meta. Ele sabe que,
se não conseguir, será demitido. O mecanismo de controle pelo computador fornece uma lista
diária de produtividade individual, com os resultados do dia anterior, colocada
publicamente no local onde eles se reportam para o controle de seu trabalho.

No final do mês, era feito o estabelecimento do padrão da loja: verificava-se a


produtividade de 10% dos funcionários de maior número de toques no mês, fazia-se a média,
e estabelecia-se aquele valor como a meta da loja.

Sobre os operadores que não atingiam a meta, existiam medidas diversas: (i) chamava-
se a atenção; (ii) perguntava-se por quê não atingiram e se necessitavam de alguma ajuda; (iii)
colocava-se operadores de melhores resultados para auxiliar os operadores de baixo resultado;
(iv) demitia-se. Embora diversos outros fatores devessem estar envolvidos no turnover,
provavelmente este o que mais contribuía para a rotatividade de mão-de-obra entre os
operadores de caixa na Empresa A .

A visão de que era necessário apertar para obter a produtividade era compartilhada
pela maioria dos gerentes e chefias entrevistados.

O indicador de produtividade atual fora do domínio do desempenho do operador de caixa

O resultado de produtividade de um determinado operador de caixa, pelo critério atual,


podia estar reduzido ou aumentado não refletindo necessariamente a atuação ou o esforço do
mesmo. Especialmente podia haver redução do número de toques por minuto sem que fosse
devido à atuação deficiente do operador. Especialmente podiam acarretar este problema:
(i) os problemas com scanner – conforme já citado anteriormente, o scanner não lê uma
série de ítens;
(ii) os problemas de parada na fila – eles podem ser de diversos tipos: mercadoria por
pesar, mercadoria sem código, falta de troco, produto não cadastrado, desistência de
compra, falta de sacolas, divergência quanto ao preço de determinada mercadoria,
cliente vai buscar mercadoria da qual tinha se esquecido e outros;
(iii) Os problemas de demora na hora do pagamento – entre elas, troca de bobina,
problemas com a leitura do cartão Hiper, demora na liberação de cheques, desistência
de compra, erro de impressora e divergência quanto ao total da compra.

Assim, o operador de caixa passa a ficar no meio de um fogo cruzado: caso não consiga a
produtividade, pode estar com seu emprego em risco; e ao mesmo tempo, existem fatores que
comprometem este desempenho e que não estão sob seu controle. Quando acontece algum
desses problemas, o operador fica muito tenso.

O critério de produtividade atual não baseado na capacidade física das pessoas

Tentamos verificar com as mais diferentes pessoas, alguém que pudesse nos dar
informações a respeito da lógica envolvida na determinação deste critério de produtividade, e
não o conseguimos. Ao que parece, foi instituído como uma norma de cima, inquestionável,
por alguém, em determinada época.

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Um dos aspectos mais importantes que demonstram a pouca importância que se deu às
limitações físicas do ser humano, ao se instituir o controle individual de produtividade: não
foram consideradas as diferenças em check-outs e na operação. Assim, por exemplo, o check-
out da loja G é muito inferior ao da loja T, conforme já descrito anteriormente; e qual é o
impacto sobre a produtividade da pesagem de hortifrutigranjeiros junto ao caixa, conforme
recentemente instituído?

Em geral os gerentes de atendimento (supervisores imediatos) têm uma noção clara de


que alguma coisa está errada com o critério de produtividade, mas não sabem bem o que é.

Mecanismos de resistência e de burla colocados pelos trabalhadores diante do critério de


produtividade

A pressão para a obtenção da produtividade era muito alta e constante: diariamente


saia a folha do computador com os resultados de cada uma delas; e aquelas com resultado
menor do que o esperado eram pressionadas.

É bem conhecido da psicopatologia do trabalho (DEJOURS, 1988), que diante de


práticas muito rígidas e de tensão excessiva, ou sem sentido, os trabalhadores tendem a fazer
as coisas do seu modo, passando por cima do critério oficial, num mecanismo denominado
“resistência psicológica”. Não se pode dizer que os operadores de caixa tinham uma noção
clara da inadequação do controle de produtividade. Em geral eles não entendiam bem porque
o resultado nem sempre correspondia ao esforço. Mas em geral eles sabiam que se tratava de
um jogo, não necessariamente ligado à qualidade do atendimento, e no qual eles deviam
mostrar um resultado que não resultasse em sua demissão, pelo menos enquanto a eles
interessasse permanecer no quadro de empregados.

O mecanismo de burla quanto aos critérios desrazoáveis de produtividade são bem


conhecidos na história do trabalho (BRAVERMAN, 1974). Entre os operadores de caixa da
Empresa A, os mecanismos de resistência e de burla visando obter uma produtividade
aceitável são bem evidentes, através de uma série de práticas adotadas pelos mesmos para
conseguir o índice de produtividade, sem que necessariamente isso se reflita em bom
atendimento ao cliente. Como o sistema somente é acionado à leitura da primeira compra, o
operador pratica uma série de mecanismos para retardar este início, e também para facilitar a
passagem dos produtos:
(i) agrupamento de produtos na esteira de entrada, antes de começar a passagem da
compra, de forma a facilitar sua passagem;
(ii) ver com antecedência de que forma será feito o pagamento e pegar os documentos
(cheque, cartão) antes de iniciar a passagem da compra;
(iii) verificação com antecedência se existem na compra alguns dos produtos que
sabidamente dão problema no scanner, de forma a se preparar para os mesmos;
(iv) diante de um volume igual de produtos, passa todos eles, pois é fácil passá-los
rapidamente, ao invés de passar somente um e digitar a multiplicação no teclado
(observe que esta prática aumenta indevidamente a repetitividade dos movimentos);
(v) procura de postos de trabalho de alta produtividade e de baixo volume (compras de
pequenos volumes, bazar, setor de roupas e de discos);
(vi) ou simplesmente ficar em outros serviços (bobinas, caixa central), nos quais não há
qualquer controle da produtividade; outra prática comum é arranjar um trabalho no
escritório da frente de loja, ajudando o gerente de atendimento; naturalmente, nesses

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casos, tem que haver algum tempo na frente de loja, para sair algum resultado de
produtividade no mapa.

Os mecanismos de resistência se aplicam não só aos operadores de caixa, mas também


são praticados pela chefia de frente de atendimento, que procura amortecer a pressão enorme
que recebe de cima para demitir os caixas com baixo desempenho.

7.Conclusões

Uma vez levantados os fatores biomecânicos, de organização do trabalho e


psicossociais, podemos sistematizar da seguinte forma os fatores contributivos para a alta
incidência de tendinites e outros transtornos por sobrecarga funcional nos membros superiores
entre os trabalhadores da Empresa A .

Fatores biomecânicos

O trabalho de operador de caixa de supermercado apresenta os seguintes fatores


causadores: (i) força excessiva – especialmente aumentada pelo fato de embalar os produtos,
e especialmente aqueles mais pesados ou manuseados longe do corpo; (ii) alta repetitividade
de movimentos – está relacionada à repetitividade especialmente do movimento de alcançar a
esteira, pegar o produto, movê-lo até o scanner, balançá-lo ligeiramente para que o scanner
faça a leitura, movê-lo até o outro lado e soltá-lo. (iii) posturas incorretas dos membros
superiores – está relacionada principalmente aos esforços com sobrecarga para os ombros,
ao ter que manusear volumes pesados longe do corpo (uso da balança, embalagem de
produtos que exigem precaução, embalagem de produtos no segundo suporte, longe do
corpo), e ao ter que digitar com freqüência maior do que a esperada, nesse caso acentuada
pela existência de teclados muito elevados. (iv) tempo insuficiente para recuperação dos
tecidos – em nenhuma das lojas existem pausas pré-determinadas ao longo da jornada.

Fatores de organização do trabalho

Houve uma sobrecarga significativa para os operadores de caixa, especialmente nas


unidades onde se implementou a esquedulagem traumática, que visou essencialmente reduzir
o número de pessoas. Nesta ocasião, houve um número expressivo de horas extras entre os
operadores de caixa. No esquema atual, não existem pausas de recuperação dos tecidos. Os
horários existentes, embora feitos com base em análise racional do trabalho, não
contemplaram diversas necessidades humanas, e como conseqüência, nos dias de maior
movimento e nos horários de fechamento, trabalha-se sem o devido tempo de recuperação dos
tecidos. Na Loja G (de altíssima incidência de queixas), houve uma correlação nítida entre o
número de cupons/dia e o número de queixas ao longo do ano de 1998.

Fatores psicossociais

O estabelecimento de um critério de produtividade baseado no número de toques por


minuto veio acompanhado de uma tensão piramidal para a obtenção dos objetivos propostos.
Este critério contemplou a velocidade, e como tal, pode ser lesivo para os tecidos. Mas o
principal problema do critério de produtividade não foi a velocidade e sim a tensão dele
decorrente, pois lidou com parâmetro cuja obtenção não estava necessariamente nas mãos do
trabalhador. Sua forma tensionadora é colocada desde a época da admissão, sendo um fator de

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opressão e tensionamento, tanto para operadores como para o pessoal de chefia de frente de
loja. Posturas diferentes desempenhadas pelas chefias de frente de loja foram diferenciais na
existência de maior ou menor incidência de lesões. Nas unidades em que as chefias aliviaram
a cobrança da produtividade, a ocorrência de lesões foi menor. Este amortecimento teve uma
contrapartida: a tensão e o stress sofrido pelas chefias que assim procediam, pois também
elas eram pressionadas para demitir aqueles que não atingiam os índices.

Além disso, o prêmio de produtividade, instituído em 3 unidades, pode ter tido um papel
bastante importante no desenvolvimento de tendinites, principalmente no momento de sua
instituição. Hoje ele representa um fator pouco importante na origem das queixas, pois
caducou por si mesmo (quem trabalha eficazmente raramente o percebe como prêmio, pois
não está relacionado a uma maior produtividade das pessoas para a organização).

Quanto a um dos propósitos desta pesquisa, o de esclarecer fatores associados à alta


incidência de queixas numa unidade (Loja G) comparando com a baixa incidência de queixas
em outra unidade (Loja T), podemos concluir:

Sobre a Loja G:

Essa loja (i) tem mobiliário inadequado, sendo este um fator de alto peso na origem
das lesões. (ii) sobre esta base biomecanicamente inadequada, vieram todos os instrumentos
de natureza psicossocial aplicados na Empresa A nos últimos 2,5 anos: controle individual de
produtividade com a alta pressão que isso ocasionou; acentuação da pressão ao se acrescentar
o cômputo do tempo de cobrança e instituição do prêmio de produtividade. (iii) no final de 97
a loja passou por uma redução do efetivo (por conta da redução esperada de demanda com a
inauguração da loja B), que resultou em sobrecarga dos operadores de caixa pois a esperada
redução de venda não foi da mesma ordem que a redução do quadro. O resultado é que, ao
longo do ano de 1998, houve uma correlação linear direta entre o número de registros do
trabalhador por dia e a incidência de queixas, ou seja, nos meses de maior número de registros
ocorreu um aumento do número de casos. Pode-se afirmar esta relação com uma segurança
estatística de 99%. (iv) Somaram-se a essas tensões outras de natureza organizacional, sendo
uma loja muito pressionada para vendas, qualidade, faturamento e outros indicadores.

Há ainda na Loja G um alto número de afastados pelo INSS, o que complica ainda
mais a situação, pois a carga de trabalho é distribuída para um número menor de operadores.
Além disso, existem os que têm queixas, e que são colocados em serviços mais fáceis,
ocasionando uma sobrecarga ainda maior para os que têm que passar compras de grandes
volumes. Além do mais, queixar-se de dor no braço passou a ser interessante nesta unidade,
pois o queixoso é colocado em postos de trabalho mais fáceis (pequenas compras, CDs,
eletrodomésticos), onde é fácil atingir altos índices de produtividade (número de toques por
minuto) e até mesmo ganhar o prêmio de produtividade.

Há também situações em que a pessoa é afastada pelo médico, porém não se afasta,
por interesse dela própria (para ganhar prêmio de produtividade) ou da gerência.

O problema tende a se agravar com a instituição (em dezembro último) da balança


junto dos check-outs, pois haverá esforços maiores.

Loja T (baixa incidência de queixas)

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É uma loja que iniciou suas atividades há apenas 1 ano e 9 meses, mas já veio
relativamente imunizada, pois não teve que passar pela fase da reesquedulagem traumática
(orientada para a redução de quadro) e também não há pagamento do prêmio por
produtividade. Tem as exigências biomecânicas normais de todas as lojas de hipermercados, e
seus postos de trabalho não são tão bons quanto os das lojas B e CX e nem tão ruins quanto os
das lojas G e CF.

A produtividade individual dos trabalhadores baseada no número de registros/dia é


alta, e assim podem aparecer alguns casos de queixas.

Boa parte da pressão visando atender o critério individual de produtividade baseada no


número de toques por minuto é amortecida pela gerência de frente de loja, que discorda desse
critério. Os operadores de caixa em geral trabalham tranqüilos, não pressionados.

Recentemente, um fato novo pode ocasionar um aumento no número de queixas: foi a


introdução da balança para a pesagem de hortifrutigranjeiros e frios, instituída em novembro
de 98.
REFERÊNCIAS

BARON,J. e GREEBERG, J. Behavior in organizations: understand and managing the human


side of work, 3.a ed.,Boston, 1989, 606 p.

BRAVERMAN, HARRY.Trabalho e capital monopolista;a degradação do trabalho no século


XX.3.a ed.Rio de Janeiro:Guanabara,1987.379 p.

COUTO, H.A. Guia prático: tenossinovites e outras lesões por traumas cumulativos nos
membros superiores de origem ocupacional. Belo Horizonte: Ergo ed. B&C, 1991.

COUTO, H.A. Ergonomia aplicada ao trabalho; o manual técnico da máquina humana -


vol.I.Belo Horizonte: Ergo Ed, 1995.351 p.

COUTO, H.A.Ergonomia aplicada ao trabalho; o manual técnico da máquina humana -


vol.II.Belo Horizonte: Ergo Ed, 1995.383 p.

COUTO, H.A. Como gerenciar a questão das L.E.R./D.O.R.T.Belo Horizonte: Ergo Editora,
1998. 438 p.

DEJOURS, C. A loucura do trabalho. 3a. ed. Trad. Cortez ed., 1988.

HACKMAN, J.R., OLDHAM, C.R. Development of the job diagnostic survey, Journal of
Applied Psychology, v.60(02), p.159-170, 1975.

NUSAT - Núcleo de Referência em Doenças Ocupacionais da Previdência Social. Relatório


anual. Belo Horizonte, 1992.

NUSAT - Núcleo de Referência em Doenças Ocupacionais da Previdência Social. Relatório


anual. Belo Horizonte, 1993.

NUSAT - Núcleo de Referência em Doenças Ocupacionais da Previdência Social. Relatório


anual. Belo Horizonte, 1994.

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NUSAT - Núcleo de Referência em Doenças Ocupacionais da Previdência Social. Relatório
anual. Belo Horizonte, 1995.

OLIVEIRA,C.R. Lesões por esforços repetitivos. Belo Horizonte: NUSAT; núcleo de


coordenação de saúde do trabalhador, 1990. (Monografia).

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