Você está na página 1de 3

INFECÇÕES URINÁRIAS

DE REPETIÇÃO
NA PÓS-MENOPAUSA

Patrícia de Rossi
Mestre em Ginecologia e Obstetrícia pela Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo
Preceptora da Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia no Conjunto
Hospitalar do Mandaqui (SUS) - São Paulo/SP
Infecções urinárias de repetição urocultura não mostre crescimento bacteriano. O tempo de uso não é con-
senso, mas a maioria dos guidelines recomenda seis meses seguidos por ob-
servação. Em média, observa-se redução de 95% das infecções; porém uma
PROMESTRIENO
O promestrieno é um análogo do estradiol que tem ação puramente
local quando administrado por via vaginal. A ausência de efeitos sistêmi-

na pós-menopausa
parcela significativa das pacientes volta a ter recorrência após a interrupção cos foi demonstrada em vários estudos em que foram medidos os níveis
da profilaxia. Nesses casos, a manutenção dos antibióticos por um período séricos de estrogênios e gonadotrofinas após uso contínuo de promestrieno
maior pode ser uma boa alternativa.12 As drogas sugeridas estão listadas no vaginal, onde não foi observada diferença em relação aos valores basais.
QUADRO 2. Apesar de serem altamente efetivas, as quinolonas (por exemplo, Estudos de longo prazo também demonstraram não haver estimulação do
norfloxacino e ciprofloxacino) não são mais recomendadas para profilaxia, de-
Patrícia de Rossi vido ao risco de emergência de cepas bacterianas resistentes.13
endométrio (medida por meio do eco endometrial ao ultrassom) ou indução
neoplásica (avaliação histológica).21
Mestre em Ginecologia e Obstetrícia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo O promestrieno usado por via vaginal é eficaz no tratamento das manifes-
Quadro 2. Antibióticos para profilaxia da ITUr.13
Preceptora da Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia no Conjunto Hospitalar do Mandaqui (SUS) - São Paulo/SP tações atróficas vaginais da pós-menopausa, tanto do ponto de vista clínico
POSOLOGIA (USO POSOLOGIA (USO como biológico (aumento de maturação das células vaginais avaliadas pelo
ANTIBIÓTICO Índice de Maturação Vaginal), com diferença significativa com placebo.22
CONTÍNUO) PÓS-COITO)
A tolerabilidade clínica do promestrieno é elevada, tendo sido considerada
EPIDEMIOLOGIA Quadro 1. Efeitos do hipoestrogenismo no trato urogenital Nitrofurantoína 50-100 mg ao deitar 50-100 mg boa por 92% das pacientes tratadas para atrofia vaginal, sem efeitos adver-
As Infecções do Trato Urinário (ITUs) são comuns nas mulheres, com mais de TRATO URINÁRIO TRATO GENITAL Sulfametoxazol- 200 mg / 40 mg ao sos significativos. Associada à mínima absorção sistêmica, torna-se uma opção
200/40 a 400/80 mg segura para as pacientes com sintomas urogenitais associados à menopausa,
50 anos tendo ao menos um episódio de cistite ao longo da vida. Destas, trimetroprima deitar
Dor ou desconforto na uretra Sensação de ressecamento vaginal incluindo as mulheres que já pararam de menstruar há muitos anos.23
aproximadamente um quarto terão nova infecção em seis meses e 10% a 20%
Cefalexina 125-250 mg ao deitar 250 mg
apresentarão quadros recorrentes.1,2 Disúria Prurido O esquema de tratamento com promestrieno inclui uma fase inicial com
A ocorrência de duas ou mais infecções em seis meses ou três em um ano Fosfomicina 3 g 10/10 dias --- (sem estudos) 20 dias consecutivos de uma medida (um aplicador cheio) de creme ou
Urgência miccional Ardor uma cápsula intravaginal ao deitar. Posteriormente, pode ser usada uma
caracteriza ITU recorrente (ITUr). Em 90% dos casos a recorrência é uma rein-
fecção, ou seja, a paciente é acometida por uma bactéria uropatogênica pro- Polaciúria Irritação dose (10 mg) duas vezes por semana, devendo-se individualizar o esquema
Em uso mais prolongado, a nitrofurantoína pode causar, ainda que raramen-
veniente da própria flora intestinal ou da pele. Um estudo que acompanhou conforme a resposta clínica. Como a condição básica (hipoestrogenismo) é
Noctúria Dispareunia te, pneumonite, hepatite e neuropatia periférica. Recomenda-se acompanha-
mulheres com ITUr observou que há aumento da colonização da região periu- crônica e progressiva, o tratamento pode ser de longo prazo, ajustando-se
mento clínico das pacientes e testes periódicos de função hepática.14
retral por enterobactérias em até 90% nos dias que antecedem a infecção.3 Incontinência urinária Aumento do pH às necessidades da paciente.24
Na modalidade de profilaxia pós-coito, o antibiótico deve ser tomado após
CAUSAS Aumento da frequência de ITUs Infecções vaginais a relação sexual. Essa estratégia é indicada nos casos em que se observa rela- CONCLUSÃO
ção temporal entre esses dois eventos, tendo como principal vantagem menor O promestrieno, agindo na restauração do trofismo vaginal e melhorando
Vários fatores de risco para cistite foram descritos em estudos epidemiológicos.
Fonte: PORTMAN,D.J.; GASS, M.L., 2014. exposição a antimicrobianos.13 os sintomas urogenitais associados ao hipoestrogenismo, pode ser considerado
Entre eles, destacam-se antecedente de ITU, atividade sexual recente ou fre-
ESTROGENIOTERAPIA TÓPICA como excelente opção no profilaxia das infecções urinárias de repetição.
quente e uso de espermicida (inclusive em preservativos). Nos casos recorrentes,
observa-se ainda um padrão de risco familiar, com aumento de chance quando TRATAMENTO Os estrogênios são a opção mais eficaz para reversão das alterações uro-
a mãe ou irmã tiveram cistite, e pessoal, quando a paciente teve alguma in- MEDIDAS NÃO MEDICAMENTOSAS genitais da menopausa. O tratamento por via vaginal é preferencial, por não
fecção urinária antes da idade de 15 anos. Pacientes com microbiota vaginal Devido ao impacto na qualidade de vida nas ITUr, muitas mulheres optam causar efeitos sistêmicos e requerer doses menores. O uso de estrogênios por R eferências B ibliografias :
alterada estão mais sujeitas a ITUs de repetição. Nas mulheres após a menopau- por iniciar medidas profiláticas para reduzir a incidência dos episódios. As op- via oral não reduz a frequência de ITUr (RR=1,08 com IC95%: 0,88 a 1,33); no (1) FOXMAN, B. Recurring urinary tract infection: incidence and risk factors. Am. J. Public Health, v.80,
sa, diabetes e incontinência urinária são fatores de risco adicionais. Na peri e ções incluem mudanças comportamentais, antibióticos em baixa dose usados entanto, os estrogênios utilizados por via vaginal reduzem a frequência desta n.3, p.331-333, 1990. (2) FOXMAN, B. Epidemiology of urinary tract infections: incidence, morbidity,
pós-menopausa, distúrbios miccionais com dificuldade de esvaziamento vesical and economic costs. Am. J. Med., v.113, suppl.1A, p. 5S-13S, 2002. (3) CZAJA, C.S. et al. Prospective
diariamente ou pós-coito, entre outros.6 afecção (RR=0,64, com IC95%: 0,47 a 0,86).15 cohort study of microbial and inflammatory events immediately preceding Escherichia coli recurrent
decorrente de prolapso uterino ou cistocele podem favorecer a recorrência de- As mudanças comportamentais incluem ingestão frequente de líquidos para Estudos demonstraram superioridade da estrogenioterapia tópica em com- urinary tract infection in women. J. Infect. Dis., v.200, n.4, p.528-536, 2009. (4) KIRJAVAINEN, P.V. et
al. Abnormal immunological profile and vaginal microbiota in women prone to urinary tract infections.
vido aumento do resíduo vesical pós-miccional e estase urinária.4 aumentar a frequência das micções, micção após o coito e troca de método paração a placebo, cremes sem estrogênio e estrogênio por via oral, reduzin- Clin. Vaccine Immunol., v.16, n.1, p.29-36, 2009. (5) PORTMAN, D.J.; GASS, M.L. Genitourinary syn-
A incidência de ITUr aumenta de forma significativa na pós-menopausa, e contraceptivo associado a espermicida.7 Mesmo que essas medidas não te- do os sintomas urinários e a recorrência de ITUs.16,17 drome of menopause: new terminology for vulvovaginal atrophy from the International Society for
the Study of Women’s Sexual Health and the North American Menopause Society. Maturitas, v.79,
um dos mecanismos envolvidos são as modificações urogenitais secundárias nham sido provadas eficazes em estudos prospectivos, podem ser adotadas Nas mulheres com ITUr na pós-menopausa, a estrogenioterapia tópica vaginal n.3, p.349-354, 2014. (6) GRABE, M. et al. Guidelines on Urological Infections European Associa-
ao hipoestrogenismo.5 tion of Urology 2013. Disponível em: http://uroweb.org/wp-content/uploads/18 U_ rological-infectionsLR.
por apresentar um baixo risco de causar dano. tem papel importante, podendo ser usada de forma conjunta às outras abor- pdf. Acessado em 18 março 2015). (7) HOOTON, T. M. Recurrent urinary tract infection in women.
No menacme, a ação dos estrogênios na vagina mantém o trofismo do Outras medidas não medicamentosas para prevenção da recorrência de dagens ou isoladamente. Dentre as vantagens, destaca-se a reversão de outros UpToDate Review 2012. (8) HISANO, M. et al. Cranberries and lower urinary tract infection pre-
vention. Clinics (Sao Paulo), v.67, n.6, p. 661-668, 2012. (9) BAUER, H. W. et al. Multicenter UTI Study
epitélio estratificado com predomínio das células superficiais que são ricas em ITU em mulheres na pré-menopausa incluem: sintomas urogenitais relacionados à menopausa, manutenção da flora vaginal Group. A long-term, multicenter, double-blind study of an Escherichia coli extract (OM-89) in female
glicogênio. As células descamadas fornecem esse substrato para os lactobaci- • Cranberrry (Vaccinummacrocarpon), que in vitro inibe a adesão bacteria- e redução da pressão seletiva para desenvolvimento de resistência bacteriana patients with recurrent urinary tract infections. Eur. Urol., v.47, n.4, p.542-548, 2005. (10) LEE, B. S. et
al. Methenaminehippurate for preventing urinary tract infections. Cochrane Database Syst Rev. 2012
los, que então convertem a glicose em ácido lático e reduzem o pH da vagina na ao epitélio urinário;8 aos antibióticos.18,19 As opções para uso vaginal atualmente disponíveis no Brasil Oct 17;10:CD003265. (11) ALBERT, X. et al. Antibiotics for preventing recurrent urinary tract infection
(4,5 a 3,5). O meio ácido ajuda a manter o controle da flora patogênica e in non-pregnant women. Cochrane Database Syst Rev. 2004;(3):CD001209. (12) AYDIN, A. et al.
• Lisado bacteriano liofilizado de E. coli por via oral, que melhora a respos- são os estrogênios conjugados, o estriol e o promestrieno (QUADRO 3).20 Recurrent urinary tract infections in women. Int. Urogynecol. J., 2014 (No prelo). (13) HOOTON, T. M.
protege o trato urogenital de infecções. ta imunológica frente à infecção;9 Clinical practice: uncomplicated urinary tract infection. N. Engl. J. Med., v. 366, n.11, p.1028-1037,
2012. (14) HICKLING, D. R.; NITTI, V, W. Management of recurrent urinary tract infections in healthy
• Hipurato de metenamina, que é metabolizado em amônia e formaldeído Quadro 3. Opções de estrogênio para uso tópico (vaginal) disponíveis no Brasil.
QUADRO CLÍNICO na urina e tem ação bactericida para algumas bactérias, usando predo-
adult women. Rev. Urol., v.15, n.2, p.41-48, 2013. (15) TAVARES, W. et al. Cistite recorrente: tratamento
e prevenção. Diretrizes Clínicas na Saúde Suplementar. jan. 2011. (16) RAHN, D. D. et al. Vaginal
estrogen for genitourinary syndrome of menopause: a systematic review. Obstet. Gynecol., v.124, n.6,
A menopausa leva a uma redução substancial da produção de estrogênios, minantemente em pacientes com bexiga neurogênica.10 DROGA DOSE p.1147-1156, 2014. (17) LYNCH, C. Vaginal estrogen therapy for the treatment of atrophic vaginitis. J.
causando muitas alterações no trato urogenital. O epitélio vaginal se afina, Womens Health, v.18, n.10, p. 1595-1606, 2009. (18) MADERSBACHER, S. et al. Pathogenesis and
ANTIMICROBIANOS management of recurrent urinary tract infection in women. Curr. Opin. Urol., v. 10, n.1, p. 29-33,
com acentuada diminuição da quantidade de células superficiais e do glicogê- Estrogênios equinos conjugados 0,625 mg/g 2000. (19) DASON, S. et al. Guidelines for the diagnosis and management of recurrent urinary tract
nio. Há redução da população de lactobacilos, favorecendo o crescimento de Os episódios de ITUr causados por reinfecção (intervalo após a infecção an- infection in women. Can. Urol. Assoc. J., v.5, n.5, p. 316-322, 2011. (20) Consulta Remédios. Disponível
Estriol 1 mg/g em: <http://consultaremedios. com.br>. Acessado em 15 março 2015. (21) SANTOS, I.; CLISSOLD, S.
coliformes e outros agentes associados a infecções genitais e urinárias. As alte- terior > 2 semanas) podem ser tratados empiricamente usando as drogas ha- Urogenital disorders associated with oestrogen deficiency: the role of promestriene as topical oestro-
gen therapy. Gynecol. Endocrinol., v.26, n.9, p.644-651, 2010. (22) POMPEI, L. M. et al. Promestrieno
rações inflamatórias e a mudança de microbiota observadas no esfregaço do bituais. É necessário colher uma cultura de urina antes do início da terapêutica, Promestrieno 10 mg/cápsula vaginal no tratamento da atrofia vulvovaginal: revisão sistemática. Femina, v.38, n.7, p.359-365, 2010. (23)
conteúdo vaginal levaram a essa condição ser denominada vaginite atrófica. devido à maior incidência de bactérias resistentes. Caso não haja resolução WEHBA, S.;,FERNANDES, C. E. Avaliação clínica da eficácia e tolerabilidade do promestriene em
Promestrieno 10 mg/g mulheres menopausada com atrofia vaginal. J. Bras. Ginecol., v.103, p. 219-224, 1993.(24) ANTROFI:
Entretanto, várias estruturas do trato urinário compartilham da mesma origem da infecção, o antibiograma identifica os antibióticos que podem ser usados e promestrieno. São Paulo: Eurofarma, 2014. Bula de remédio.
embriológica da vagina e da vulva e, por isso, também são sensíveis aos a concentração inibitória mínima para a bactéria isolada.
efeitos do hipoestrogenismo. Os sinais e sintomas associados a essa condição, A profilaxia de novos episódios infecciosos com antimicrobianos tem sua efi-
Rua Coronel Irineu de Castro, 43 - cj. 503
atualmente denominada Síndrome Geniturinária da Menopausa (Genitourina- cácia bem estabelecida, tanto no esquema contínuo como na administração São Paulo - SP, CEP 03333-050
Tel.: (11) 2679-4420
ry Syndrome of Menopause – GSM), são variados (QUADRO 1).5 pós-coito.11 Antes, porém, é necessário que a urina esteja estéril, ou seja, a editor@editorcriacao.com.br
www.editorcriacao.com.br

Você também pode gostar