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ATRAVÉS DA BARREIRA DO
TEMPO
UM ESTUDO SOBRE A PRECOGNIÇÃO E
A FÍSICA MODERNA
Série publicada com base nas pesquisas realizadas pela
Society for Psychical Research", sob a orientação de BRIAN
INGLIS
Tradução
BEATRlZ SIDOU
EDITORA PENSAMENTO
São Paulo
1982
PARA IAN
Conclusão
PRÓLOGO
Por volta do ano de 1873, recordaria mais tarde Frederic
Myers, em seu Human Personality, um pequeno grupo de
amigos, em Cambridge, que chegara à conclusão de que nem
a religião nem o materialismo haviam proporcionado
respostas satisfatórias às questões que os intrigavam:
Nossas atitudes mentais, de certa maneira, eram
diferenciadas; pelo menos no meu modo de ver, ficou a
impressão de que jamais se fez alguma tentativa no sentido
de determinar que há algo a aprender em relação ao mundo
invisível. Se houvesse algo a ser conhecido sobre esse
mundo, de tal maneira que a Ciência pudesse adotar e
sustentar esse conhecimento, seria algo prestes a ser
descoberto não por uma análise tradicional ou pela
manipulação da metafísica, mas simplesmente pela
experimentação e observação, pela simples aplicação dos
mesmos métodos de investigação exata, deliberada e
desapaixonada, que ajudaram a construir todo o nosso
conhecimento atual do mundo que podemos ver e tocar, e
dos fenômenos que ocorrem dentro e em torno de nós.
Junto com seus companheiros - os principais dentre eles eram
Henry Sidgwick e Edmund Gurney -, Myers tornou-se um dos
membros-fundadores da Sociedade para a Pesquisa Psíquica,
formada em 1882 para colocar em prática essas idéias. O
presente volume é o primeiro de uma série de livros a ser
publicada visando assinalar o centenário da Sociedade.
Os fenômenos do "mundo invisível" a que Myers se referia
foram distribuídos de início em cinco categorias, por
conveniência, e organizou-se urna comissão a fim de
investigar cada uma dessas categorias: a telepatia, a hipnose,
os "sensitivos", as aparições e "os vários fenômenos físicos
normalmente chamados de espiritualistas". Através dos anos,
houve um recuo, sobretudo em relação à hipnose, que foi
descartada na época como uma ilusão ocultista, a ponto de
ser aceita corno realidade; desta maneira, ela deixava de
estar do lado psíquico da cerca. Mas, falando-se de maneira
geral, os fenômenos sob investigação permanecem os
mesmos, e as maneiras como têm sido investigados ainda
estão conforme os planos de Myers.
Mas a terminologia mudou, e com bastante freqüência, o que
deu lugar a uma certa confusão. O próprio Myers introduziu a
"telepatia", pois "leitura do pensamento" seria uma expressão
ambígua. Poderia referir-se às maneiras como Sherlock
Holmes apreendia o que estivesse na mente de Watson pela
observação de sua expressão facial. "Supra-normal", que
Myers havia considerado preferível a supernatural para
descrever a classe dos fenômenos com os quais a Sociedade
iria lidar, foi desde então substituída por "paranormal";
"parapsicologia" tem sido usada no lugar de "pesquisa
psíquica", embora alguns pesquisadores prefiram restringir
seu uso ao trabalho de laboratório, deixando "psíquica" como
adjetivo de pesquisa sobre fenômenos espontâneos. "Psi"
também tornou-se uma expressão que serve a qualquer
fInalidade a fim de descrever ou identificar as forças
envolvidas; por exemplo, para distinguir um acontecimento
normal de um paranormal.
Se faltasse alguma evidência para a "paraciência" (como
pode, ser descrita hoje, de modo mais abrangente, pois o
enfoque da pesquisa recentemente tem mudado da psicologia
para a física), ela poderia ser encontrada na composição da
Sociedade, desde seu início. Poucas organizações atraíram
tantos membros ilustres. Entre os físicos, estiveram Sir
William Crookes, Sir John Joseph Thomson, Sir Oliver Lodge,
Sir William Barrett e dois Lords Rayleigh - o terceiro e o quarto
barão. Entre os filósofos: o próprio Sidgwick, Henri Bergson,
Ferdinand Schiller, L. P. Jacks, Hans Driesch e C. D. Broad.
Entre os psicólogos: William James, William McDougall,
Sigmund Freud, Walter Franklin Prince, Carl Jung e Gardner
Murphy. Junto com estes, muitas personalidades eminentes
em diversos campos: Charles Richet, um Prêmio Nobel de
Fisiologia; o conde de Balfour, primeiro-ministro da Grã-
Bretanha de 1902 a 1906, e seu irmão, Gerald, primeiro-
secretário da Irlanda nos anos de 1895-1896; Andrew Lang,
polímata; Gilbert Murray, catedrático de Grego em Oxford e
autor do primeiro Projeto da Liga das Nações; seu sucessor
em Oxford, E. R. Dodds; a sra. Henry Sidgwick, reitora do
Newnham College em Cambridge; Marie Curie; a honorável
sra. Alfred Lyttleton, delegada à Assembléia da liga das
Nações; Camille Flammarion, o astrônomo; F. J. M. Stratton,
Presidente da Royal Astronomical Association (Sociedade
Astronômica Real); e Sir Alister Hardy, professor de zoologia
em Oxford.
Uma lista como esta, indicava Arthur Koestler em The Roots of
Coincidence, bastaria para demonstrar que a pesquisa PES
"não é diversão para excêntricos supersticiosos". Ao contrário,
os padrões de pesquisa em geral têm sido rigorosos - bem
mais rigorosos, como os psicólogos já tiveram a oportunidade
de admitir, do que os da psicologia. A razão pela qual os
resultados não vêm sendo aceitos é porque
fundamentalmente eles não são aceitáveis: a percepção
extra-sensorial e a psicocinese permanecem fora do campo
da ciência, apesar das evidências. E, embora o preconceito
contra a parapsicologia esteja começando a romper-se e ela
comece a ser admitida como disciplina acadêmica nas
universidades, ainda está muito distante de garantir para si
uma base sólida no mundo acadêmico.
Os céticos propagaram diligentemente a noção de que os
pesquisadores psíquicos acreditam em PES, PK, aparições e
por aí afora, porque eles querem acreditar ou porque
necessitam acreditar. Qualquer um que tenha estudado as
Revistas e as Atas da Sociedade, ou que tenha estado
presente, em seus encontros, poderá testemunhar que se
trata de um equívoco absurdo. Muitos dos mais assíduos e
capazes dentre os pesquisadores foram atraídos, a princípio;
exatamente por sua descrença - digamos, por um desejo de
expor um médium à fraude. E também deve-se lembrar que
muitos, e possivelmente a maioria dos membros tiveram e
ainda mantêm o desejo de sustentar que as manifestações
ditas paranormais são naturais e podem ser explicadas
cientificamente - embora se admita que não pelos estreitos
cânones da ciência materialista, que, de qualquer modo, já se
demonstraram falaciosos para os físicos nucleares.
Não; até onde se pode dizer que uma Sociedade com tão
diversificado conjunto de pessoas tem uma identidade
coletiva, digamos cética; mas, com toda certeza, racional,
como esta série de livros pretende demonstrar. Racional não,
embora, racionalista. Infelizmente os racionalistas, na
determinação de purgar a sociedade de suas inclusões
religiosas e ocultistas, deixaram muitas vezes de fazer uma
distinção entre superstições e fenômenos observados que a
elas deram origem - o que os levou a armadilhas como a
recusa em aceitar a existência de meteoritos, por causa da
associação aos raios de Júpiter. Até hoje eles têm uma
inclinação a deslizar em apoio a dogmas rígidos, mal-
fundamentados em suas bases, como quaisquer dos das
Igrejas. Se esta série de livros não conseguir nada mais, pelo
menos mostrará o quão racionalmente - usando esta
expressão em seu sentido mais adequado - os autores
examinaram e apresentaram as evidências.
Até um tempo relativamente recente a existência da
precognição, ou previsão, como costumava ser chamada, era
considerada verdade, mesmo sem razões objetivas para isso.
O Velho Testamento contém dezenas de profecias e sonhos
(como o do Faraó, interpretado por José) que prediziam o
futuro. Os gregos do período clássico tinham seus oráculos; os
romanos, seus adivinhos. Até o século XVIII era raro o
ceticismo sobre a possibilidade de visões do futuro. Mas com
a ascensão do racionalismo científico, colocou-se a previsão
pelo lado do supranatural das coisas, junto com outras
manifestações do miraculoso. Quando apareciam casos, eles
eram considerados como presciência, coincidência ou
imaginação.
Embora na primeira metade da existência da SPP tenham sido
recolhidas muitas provas que indicavam a realidade da
precognição, esta não foi levada a sério até a publicação, ao
final da década de 20, do livro An Experiment with Time, de J.
W. Dunne. O relato de seus sonhos precognitivos, apesar de
não ter a necessária independência de testemunho capaz de
impressionar os membros da Sociedade, mostrou-se um
sucesso junto ao público. Desde então, a precognição passou
a gozar de certo respeito mesmo por parte de pessoas
geralmente céticas quanto à realidade dos fenômenos
psíquicos.
Esses que fazem objeções, no entanto, continuaram a
argumentar que a percepção extra-sensorial desta ou daquela
espécie contraria tudo o que se conhece sobre as leis da
natureza. Os físicos de hoje já não são tão dogmáticos a
respeito dessas leis; na verdade, eles preferem usar uma
expressão menos desgastada como "modelos", o que implica
que sejam no máximo uma aproximação da realidade.
Danah Zohar, uma física, examinou os testemunhos históricos
e contemporâneos da precognição, pretendendo verificar se
poderiam ser reconciliados com os atuais modelos da física -
muito à maneira como Pauli e Jung haviam explorado a
possibilidade de uma reconciliação semelhante em relação à
Teoria da Sincronicidade de Jung. Como ela sublinha, ainda
não chegou o tempo em que se tenham respostas claras às
inúmeras questões que permanecem sobre a PES. Mas tenho
certeza de que muitos dos leitores que compartilham da
minha dificuldade em compreender quase tudo sobre a física
mais elementar ficarão gratos pela notável clareza de sua
exposição, que torna as coisas técnicas mais legíveis.
Brian Inglis
INTRODUÇÃO
Todos temos uma compulsão em falar sobre o Tempo. A
mesma necessidade profunda que induzia o homem primitivo
a consultar feiticeiros que diziam ler o futuro na configuração
do fluxo de sangue da ferida de um leitãozinho sangrado, ou a
que fazia os antigos gregos irem em dura peregrinação ao
Parnaso buscar aconselhamento do Oráculo em Delfos, hoje
ainda leva as pessoas à leitura das previsões da meteorologia
e das cartas de maré ou das pesquisas de opinião pública em
vésperas de eleições.
Com a sabedoria da compreensão trazida pelo tempo,
observamos que os antigos podem ter sido supersticiosos,
porém seus métodos arcaicos nem sempre estavam
inteiramente longe da verdade. Muito da visão outrora
atribuída aos mágicos poderes de "profetas" e "videntes"
deveu-se muitas vezes a primitivas, mas não menores,
capacidades de analisar acontecimentos passados e de
projetar seus padrões no futuro. Atualmente, é provável que
chamemos nossos profetas e videntes de cientistas e
psicólogos; seus métodos de previsões são muito sofisticados,
mas eles preenchem a mesma função necessária em nossas
vidas. De certa maneira, todos eles nos ajudam a olhar para o
futuro.
Só o mais obstinado empirista seria capaz de negar o valor e
a validade de predições baseadas em óbvias inferências de
acontecimentos passados ou de dados reunidos
cuidadosamente; mas seria necessário também um
pragmático muito resistente que não estivesse querendo
procurar mais nada. A maioria das pessoas, em algum
momento de suas vidas, gostaria de simplesmente poder
atravessar a barreira do tempo e dar uma espiada mais ampla
naquilo que o futuro lhes reserva. Por toda a história se
atribuiu a algumas pessoas esse poder, e o assunto do
presente , volume é a série de relatos de tais experiências.
Presciência, previsão, ou "precognição", a capacidade de ver
o futuro como se diz comumente hoje, é um assunto difícil,
tanto para o pesquisador psíquico com prática quanto para o
leigo. Conforme escreveu Gardner Murphy em The Challenge
of Psychical Research, "entrar em contato com aquilo que
ainda não existe é, para muitos, uma contradição de palavras,
um paradoxo filosófico, uma afronta ou, então, pode chegar a
ser colocado na categoria de 'impossibilidade'''. Assim, essa
mesma capacidade misteriosa que nos atormenta com sua
promessa de concessão de uma boa posição de partida na
corrida do destino, ao mesmo tempo nos ofende com suas
reivindicações afrontosas e "impossíveis" - e bem mais do que
qualquer outra capacidade psíquica.
Enquanto a telepatia e a psicocinese continuam
problemáticas pela ausência de qualquer prova firme e de
peso quanto à sua existência, o aparecimento de tal evidência
não iria trazer nenhum desafio mais devastador à nossa
maneira já aceita de encarar o mundo. A transferência de
pensamento de uma mente para outra ou a influência física
da mente sobre a matéria exige no máximo a descoberta de
alguma força física ou de alguma capacidade do cérebro
humano ainda não detectada. Poderia coexistir pacificamente
junto às forças e capacidades que já conhecemos. Mas não
acontece o mesmo em relação à precognição. A prova firme
de que algumas pessoas realmente tenham feito previsões de
acontecimentos futuros iria, desafiar os princípios mais
fundamentais do bom senso e da física clássica.
Todo o ritmo de nossas vidas diárias conscientes é vivido
contra o pano de fundo da "passagem do tempo", uma
sucessão de momentos subdividida em passado, presente e
futuro. Nessa estrutura familiar, o "agora" deve sempre
preceder o "então". Aliada a isso está a lei da causalidade,
uma das leis fundamentais da natureza, que diz que uma
causa sempre deve preceder um efeito. E um efeito "agora"
não poderia ser necessariamente o resultado de uma causa
"então" - e é justamente nisso que temos de acreditar se
aceitarmos que algumas pessoas podem ver agora
acontecimentos futuros, embora as causas que levem a eles
ainda não tenham ocorrido -, o cadáver de uma pessoa antes
que ela tenha sido assassinada, a manchete de um jornal
antes que este tenha ido ao prelo, uma cidade arrasada antes
que o terremoto que a destruiu tenha começado a dar sinais,
como os tremores de advertência. Nada disso é possível de
acordo com a ciência, como a entendemos.
"A previsão do futuro, do tipo minucioso como o indicado em
algumas das narrativas que chegaram até nós", escreveu
Frank Podmore, um dos membros fundadores da Sociedade
para a Pesquisa Psíquica, em 1908, "provocaria o abalo de
todo o edifício da ciência. Se as coisas relatadas em algumas
dessas narrativas realmente aconteceram, devemos nos
preparar para construir um novo céu e uma nova Terra." Mas,
embora uma reconstrução universal dessas talvez fosse uma
tarefa ambiciosa demais para um pesquisador psíquico
vitoriano, ela logo foi assumida pela nova espécie de
cientistas do século XX, cujo trabalho alterou de maneira
impressionante todo o quadro conceitual, para os termos em
que se pode encarar a precognição nos dias de hoje. A Teoria
da Relatividade de Einstein e a nova física quântica forjaram
mudanças radicais em nossas noções da ciência e do bom
senso da realidade, e, cada uma à sua maneira, manteve à
frente nossa noção convencional de Tempo.
No mundo da relatividade, não há uma seqüência absoluta de
momentos, e assim, não há maneira objetiva de ordenar os
acontecimentos no tempo. Realmente, se algumas das
interpretações da Relatividade Geral estão corretas, o tempo
poderá ser circular e os passeios no passado ou no futuro
poderão ser teoricamente possíveis. Com os avanços da física
quântica, que nos leva ao sombrio micromundo das partículas
elementares que compõem o átomo, a noção de qualquer
ordenação temporal dos acontecimentos se torna ainda
menos sustentável. O próprio Tempo torna-se um conceito
ilusório com um significado impreciso, como a causalidade.
De uma forma bastante curiosa, enquanto aqueles que
pesquisam sobre a precognição ainda se mostram
embaraçados por seu visível desafio às leis da causalidade, os
físicos quânticos já aprenderam a conviver com a não-
causalidade como uma conseqüência natural de suas teorias
físicas. As velhas categorias de causa e efeito deram lugar
amplamente, no nível quântico, a discussões sobre
relacionamentos não-causais que podem transcender a
distância e o tempo. Mesmo a outrora espectral noção de
"ação à distância", pela qual corpos físicos podem influenciar
uns aos outros apesar de não haver um evidente intercâmbio
de força ou energia entre si, foi recentemente demonstrada
em laboratório. As disseminadas implicações dessa ruptura
para a compreensão de questões como a telepatia, a
psicocinese e a precognição ainda estão para ser melhor
estudadas.
O século passado testemunhou um consistente esforço para
se trazer os benefícios da ciência em apoio a questões que
preocupam os pesquisadores psíquicos. A própria Sociedade
para a Pesquisa Psíquica foi fundada em 1882 por um grupo
de ilustres eruditos que via a disciplina da ciência como uma
ferramenta através da qual seria possível, de uma vez por
todas, sujeitar as águas do oculto, tão cheias de segredos, à
investigação rigorosa e objetiva. A nova "ciência" da
parapsicologia, que tenta proceder a um estudo dos
fenômenos psíquicos em condições de laboratório, é um
resultado de seus esforços; outro, são as inúmeras tentativas
de se compreender a física dos fenômenos psíquicos. Se, a
longo prazo, tais abordagens técnicas irão nos dizer mais
sobre os fenômenos psíquicos do que a paciente coleta
metódica de evidências de casos espontâneos que a
Sociedade para a Pesquisa Psíquica também continua a
reunir, é algo que ainda está por se verificar. Exemplos
desses casos encontram-se nas páginas a seguir, para ajudar
o leitor a julgar por si mesmo.
Aqueles que se sintam especialmente próximos dos aspectos
levantados no antigo debate que envolve o problema mente-
corpo poderão perturbar-se com a grande ênfase colocada na
física da precognição, no presente volume. Como observou J.
B. Rhine em muitas ocasiões, o fato de se acreditar que a
precognição ou qualquer outra forma de "percepção extra-
sensorial" seja realmente extra-sensorial (ou seja, não-física)
desempenha um papel-chave no fundo emocional de grande
parte da pesquisa psíquica, parecendo prometer alguma
evidência para a sobrevivência de alguns aspectos da
personalidade após a morte. Certas idéias da física moderna
algum dia poderão nos ajudar a compreender o mecanismo
pelo qual o cérebro humano é capaz de perceber um
acontecimento que ainda não ocorreu; no entanto, parece
haver uma insuficiência de provas nesta compreensão para
que se argumente que desta maneira o materialismo terá a
última palavra no dualismo. Nós entendemos exatamente
como o olho pode ver a maçã em cima da mesa, mas isso não
quer dizer que devamos entrar cegos no mundo seguinte; isso
apenas nos diz como utilizar um órgão de nosso corpo vivo
enquanto estamos neste mundo. Com tudo o que sabemos, a
física do pós-vida pode muito bem operar a partir de
princípios inteiramente diferentes.
Outro aspecto que preocupa muitos parapsicólogos
profissionais e aqueles que estudam cuidadosamente as
questões levantadas na pesquisa psíquica é a amplitude em
que a precognição pode se distinguir como faculdade isolada,
se é que ela possa ser de algum modo diferenciada de
faculdades como a telepatia (a comunicação direta entre duas
mentes), a clarividência (conhecimento direto de alguma
fonte física exterior) ou mesmo a psicocinese (a mente
afetando a matéria). Muitos sustentam que são diferentes
aspectos de um mesmo fenômeno desconhecido. Mesmo
assim, apesar dos sólidos argumentos de pesquisadores
experimentais como Louisa E. Rhine para nivelar a
precognição e a clarividência, nos últimos capítulos
demonstrar-se-á que uma equação destas gera dificuldades
para se explicar de que forma a precognição poderia
funcionar realmente. Essas dificuldades, no entanto, não
colocam obstáculos aos que possam querer nivelar a
precognição com a telepatia ou a psicocinese.
É bem possível acontecer que a visão aparentemente
precognitiva de algum acontecimento futuro seja realmente
apenas uma forma de comunicação telepática com alguém
que já tenha o conhecimento desse acontecimento. Ou então,
pode ser que aquilo que realmente ocorre na precognição é
que a mente "vê" algo (sonha, imagina, deseja isso) e então,
a seguir, age sobre os acontecimentos no mundo com a
psicocinese para realizar o fruto de suas próprias
expectativas. Cada uma das duas principais teorias físicas da
precognição discutidas no Capítulo 11 interpreta a faculdade
dessa maneira - uma, em termos de telepatia, a outra, em
termos de psicocinese.
Não há uma resposta segura para qualquer dessas sugestões
alternativas, e parece que não haverá até o dia em que se
tenha muito mais provas disponíveis sobre a precognição e
até que a física real desta faculdade tenha sido inteiramente
compreendida. Neste livro assumiu-se que pelo menos a
telepatia (e talvez a psicocinese) está muito proximamente
relacionada à precognição, e mencionam-se casos de
telepatia em que matérias relacionadas a eles possam ajudar
a lançar alguma luz sobre a natureza e o funcionamento da
própria precognição.
Dessa maneira, os estudos psicológicos destinados a
determinar se crianças são mais telepáticas que adultos
parecem indicar muito bem que o mesmo pode acontecer
com a precognição, e assim incluiu-se a evidência trazida por
tais estudos. E há, também, apesar de haver muito pouca
informação disponível sobre a capacidade precognitiva de
animais, numerosos testemunhos de que eles possuem essa
capacidade, e esses testemunhos foram incluídos por
acreditar-se que sejam relevantes para a compreensão da
precognição.
Enfim, é importante dizer algo sobre a qualificação dos
testemunhos citados para casos de visível ou alegada
precognição discutidos no presente volume. Variam do
extremamente sutil, na maior parte do Capítulo 1; onde
quaisquer fatos que possam ter realmente existido são de há
muito interpretados à luz de temas míticos ou literários, ao
rigorosamente profundo, como nos casos de estudos de
laboratório sobre a precognição, descritos no Capítulo 4. A
maior parte dos casos discutidos depende da corroboração de
testemunhas confiáveis cujos relatórios foram diligentemente
registrados por funcionários da Sociedade para a Pesquisa
Psíquica ou, algumas vezes, por psiquiatras. Como ainda é
verdade que, apesar dos demorados esforços na pesquisa de
muitos gêneros diferentes, ainda não existam sólidas e firmes
provas sobre a precognição que possam convencer um júri
independente de cientistas desinteressados, achei melhor
incluir uma ampla variedade de casos que tenham contribuído
para discussões sobre a precognição no decorrer desses anos
todos. Com exceção dos mitos e lendas do primeiro capítulo,
a cada um dos casos citados pelo livro segue-se alguma
argumentação sobre os testemunhos em que se baseia.
Gostaria de agradecer a meu marido por sua ajuda paciente e
incalculável durante a elaboração deste livro, e sobretudo por
suas numerosas idéias a respeito da possível física da
precognição. Inúmeras conversas com o professor David
Bohm ajudaram a aperfeiçoar minha compreensão como, por
exemplo, quanto às implicações da não-localidade quântica e
do Teorema de Bell. Além disso, ele foi muito gentil em ler o
manuscrito original, vetando algumas partes onde entrava a
física direta.
Finalmente estou grata à Sociedade para a Pesquisa Psíquica
por ter me permitido fazer uso de sua biblioteca e de seus
arquivos.
PRIMEIRA PARTE
A PRECOGNIÇÃO EXISTE?
"Ó", disse o cocheiro para Tom Brown, "a melhor coisa para
gente simples assim que nem você e eu é usar antolhos, de
modo que a gente só possa enxergar o que está bem na
frente". A natureza parece haver funcionado muito dentro
desse mesmo princípio. Nossos sentidos e nosso cérebro
funcionam como uma espécie de filtro muito complexo que
limita e dirige os poderes clarividentes da mente, de modo
que em condições normais a atenção esteja concentrada nos
objetos e situações que tenham importância biológica para a
sobrevivência do organismo e da espécie... Como regra geral,
a mente rejeita idéias de outra mente, assim como o corpo
rejeita enxertos de outros corpos.
Ainda que afirmando a provável necessidade de uma tal
abordagem limitada à realidade, Burt acrescentou
rapidamente: "Acreditar que partindo de tal base possamos
construir um quadro completo que tudo inclua do universo é o
mesmo que supor que um mapa das ruas de Roma possa
dizer como parece exatamente a Cidade Eterna quando ali
estamos".
A opinião de que faculdades extra-sensoriais como a telepatia
e a precognição sejam um retrocesso primitivo é unânime.
Outros psicólogos discordam inteiramente, argumentando que
a PES é uma parte natural, embora negligenciada, de nossa
constituição psíquica normal, ou ainda, que é algum novo
"sexto sentido" cujo domínio estamos desenvolvendo.
Frederic Myers, um dos fundadores da SPP, escreveu no final
do século passado que essa nova faculdade poderia expandir
nossa consciência para muito além dos limites da experiência
humana normal. Cinqüenta anos depois, o controverso filósofo
C. E. M. Joad argumentava que ela era "uma primeira
intimação hesitante de um novo impulso para a frente de
parte de uma força de vida muito útil".
A Pesquisa na Psicologia da PES
Se a PES é realmente alguma faculdade regressiva que vai
até eras obscuras de nosso passado primitivo, algo antigo e
ultrapassado, embaraçoso e sinal de instabilidade mental, ou
se é um sintoma de um novo amanhã resplandecente, é uma
discussão que modelou grande parte da pesquisa
psicologicamente orientada na parapsicologia experimental
nesses últimos 25 anos. Os pesquisadores sustentam a
esperança de que, se pudessem chegar a acumular dados
suficientes sobre os tipos de pessoas (idade, estado mental,
grau de educação etc.) que costumam passar por
experiências PES e as condições físicas e psicológicas que
predispõem a estas experiências, a questão estaria resolvida
de uma vez por todas.
A tese de Freud de que a PES é um fenômeno atávico mais
apropriado à vida selvagem do que à das pessoas altamente
desenvolvidas (o homem civilizado) deu origem a três alvos
evidentes para a pesquisa experimental: os animais, aqueles
poucos "povos selvagens" que ainda existem dispersos em
áreas remotas da África e do sudeste da Ásia, e nossas
crianças, antes que alcancem a maturidade intelectual.
Se a PES é uma faculdade em desaparecimento que pertence
aos degraus inferiores da escala filogenética, raciocinaram
alguns psicólogos, certamente iríamos encontrá-Ia dominante
entre os animais inferiores; e, realmente, as histórias sobre
alegadas faculdades psíquicas de animais selvagens e
domésticos são abundantes. Mas, em todas as tentativas, os
experimentalistas na verdade obtiveram muito poucas e
frágeis provas de que os animais possuam a telepatia ou a
precognição. E assim, a evidência para a tese de Freud
deveria estar em outra parte, e a antropologia parecia um
campo promissor para que se tentasse verificar.
A Pesquisa Antropológica
Da mesma maneira como os mitos e lendas dos primeiros
estágios de nossa cultura eram dominados por histórias de
feiticeiras e videntes investidos de poderes extraordinários
para a leitura da mente das pessoas, a previsão, a levitação
etc., parte do conhecimento antropológico no início de nosso
século era bastante inspirado por narrativas sobre "médiuns
selvagens" que apareciam nas histórias de viagens dos
exploradores. Os antropólogos fizeram viagens para pesquisa
de campo a lugares como Bornéu, Haiti, Cidade do Cabo e
Congo, voltando carregados de histórias sobre sessões
mediúnicas, ritos extáticos de vudu em que a levitação
ocorria normalmente, e miraculosas narrativas sobre
importantes informações que viajavam através das selvas,
por entre as matas, quase instantaneamente.
Conta-se que um adivinho na África do Sul previu
corretamente que uma cabra negra grávida, com a qual um
antropólogo estava preocupado, iria dar à luz em breve a um
filhote branco e um cinza. O adivinho de Tembu (Cidade do
Cabo), Solomon Baba, teria acertado corretamente que, antes
de ir visitá-Io de uma distância de 100 km, o psiquiatra sul-
africano Laubscher havia enterrado uma bolsinha embrulhada
em papel pardo, que por sua vez fora coberta por uma pedra
cinza. Meia hora antes do terremoto de 1907 na Jamaica, uma
garota mulata teria explodido em soluços convulsivos e saíra
correndo pelas ruas gritando: "Uma coisa horrível está para
acontecer!" Durante o devastador furacão de 1951, também
na Jamaica, pessoas desprovidas de quaisquer meios normais
para a comunicação à distância teriam entrado em contato
umas com as outras através da ilha por algum meio "natural e
misterioso", enquanto certa mãe teria enviado com sucesso
uma mensagem a seus filhos em perigo a 16 km pelos bons
ofícios de um algodoeiro.
O denominador comum em todas essas histórias é que a
prova é o fato, e quem as contava eram os nativos, que
invariavelmente se descobria acreditarem na veracidade de
suas próprias faculdades psíquicas, ou nas de seus ancestrais.
Muitos dos primeiros antropólogos descaradamente
consideravam esses testemunhos bons o suficiente. Como
Robert Lowie dizia:
QUESTIONÁRIO
Por favor, responda a TODAS as perguntas; é muito
importante. Obrigado.