Você está na página 1de 95

Editor Responsável: Prof.

Silvio Donizete Chagas


Divulgaqdo e vendas: José Alves Carneiro
Diagrainaqdo: Márcio de Souza Gracia
SUMÁRIO
Capa: Abelardo da Hora
RevisaO: Domingas Ignez Brandini Ribeiro
Clélia Eunice Chagas Franciulli Introduq-d'o
9 CI
o
Capítulo 1
Da Legislacáo Simbólica: Um Debate Propulsor. 11 o
"BIBLIOTECA DE DIREITO PÚBLICO" 0
1. Ambigüidade de 'Símbolo', 'Simbólico' e 11
Conselho Editorial 'Simbolismo' O
1.1. O Símbolo como Intermediacáo entre Sujeito
e Objeto. O homem como Animal Simbólico 12 n
Prof. Clémerson Merlin Cléve (Diretor)
Prof. Clóvis de Carvalho Júnior 1.2. A Estnitura Social como Simbólica 12
14
n
Prof. Dircéo Torrecillas Ramos 1.3. Simbolismo e Simbólico na Psicanálisc 0
Prof. Edmundo Lima de Arruda Júnior 1.4. Institu i00 como Redc Simbólica
18
19 o
Prof. Gilmar Ferreira Mendes
Prof. José Eduardo Martins Cardozo
1.5. O Símbolo na Semiótica
1.6. O Simbólico na Lógica
22 e
Prof. Luis Roberto Barroso 1.7. O Simbólico na Sociologia. Um exemplo da o
Prof. Marcelo da Costa Pinto Neves Teoria dos Sistemas
23
24 o
Prof. Maurício António Ribeiro Lopes
Pral. Regina Maria Macedo Nery Ferrari
2. Delimitacáo Semántica
3. Política Simbólica versus Legislacáo Simbólica
26 o
Riva de Freitas 4. Dircito Simbólico versus Legislagáo Simbólica
28
o
Prof. Rui Décio Martins 5. Legislacáo Simbólica versus Rituais e Mitos 29 o
Prof. Silvio Donizete Chagas Políticos
6. Por uma Conceituacáo
31
33
o
7. Tipos de Legislacáo Simbólica 33
© 1994 by Autor 7.1. Da Tipologia 34 o
7.2. Confirmagáo de Valores Sociais
7.3. Legislacáo-Álibi
37 o
Todos os direitos reservados á 7.4. Legislacáo como Fórmula de Compromisso
41
o
Dilatório
Efeitos ()

EDITORA ACADÉMICA 8. Eficácia e Efetividade das Leis versus 42


Rua Planalto, 81 - CEP: 07171 - 110 -Tel.: (011)998 - 0536 - Fax: 221 - 6060 Reais da Legislacáo Simbólica
Jardim Presidente Dutra - Guarulhos - Sáo Paulo - SP 8.1. Eficácia como Concretizagáo normativa do texto
42
legal 46
Livraria Académica
8.2. Efetividade como Realizacáo da Finando& da Lei
47
Rua Senador Feijó, 176 - 79- andar - Cj. 704 8.3. Efeitos Indiretos e Latentes da Legislacáo
49
01006 - 000 - Centro - Sáo Paulo - SP 8.4. Efeitos da Legislacáo Simbólica
Tel.: (011)605 - 5171
Capítulo 2 9. ConstitucionalizaQáo-Álibi e Agir Comunicativo 104
...Á ConstitucionalizaQáo Simbólica: Abertura de um Debate 10. ConstitucionalizaQáo Simbólica versus Lealdade
53
I. Constitui0o c ConstitucionalizaQáo das Massas e Regras-do-Siléncio 107
53
1.1. O Problema da Plurivocidade 53 Capítulo 3
1.2. O Debate Correntc sobre o Conceito de
ConstituiQáo 54 ConstitucionalizaQáo Simbólica como Alopoiesc
1.3. A Constitucionaliznao 61 do Sistema Jurídico 113
1.3.1. Constitui0o como Vínculo Estnitural 1. Da Autopoiese á Alopoiese do Direito 113
entre Política e Dircito 61 1.1. Da Autopoiese Biológica á Social 113
1.3.2. ConstitniQáo como Subsistema do 1.2. Direito como Sistema Autopoiético 119
Sistema Jurídico 63 1.3. A Alopoiese do Direito 124
1.3.3. Constitui0o como Mecanismo de 2. ConstitucionalizaQáo Simbólica como Sobreposicáo
Autonomía Operacional do Dircito 65 do Sistema Político ao Direito 129
1.3.4. FunQáo Social e Presta0o Política da 3. ConstitucionalizaQáo Simbólica versus Auto-
Constituido 69 Referencia Consistente e Hetero-Referéncia
1.3.4. 1. Direitos Fundamentais Adequada do Sistema Jurídico 133
(Diferenciado da Sociedade) e 4. ImplicaOes Semióticas 141
Estado de Bcm-Estar (inclusáo) 70 5. ConstitucionalizaQáo Simbólica versus Juridificacflo.
1.3.4.2. RegulaQáo Jurídico-Constitucional Realidade Constitucional Dejuridificante 144
do Procedimento Elcitoral 72 6. ConstitucionalizaQáo Simbólica como Problema da
1.3.4.3. "Divisáo - de Poderes e Diferenca Modernidade Periférica 147
entre Política e Administra0o 74 7. Constitucionalizacáo Simbólica na Experiéncia
2. Texto Constitucional e Realidade Constitucional 76 Brasileira. Uma Referencia Exemplificativa 153
2.1. A Relnáo entre Texto e Realidade Constitucional
como Concretiza0o de Bibliografia 163
Normas Constitucionais 76
2.2. Concreliznáo Constitucional e Semiótica 79
3. Constitucionaliznáo Simbólica cm Sentido Negativo:
Insuficiente ConcretizaQáo Normativo-Jurídica
Generalizada do Texto Constitucional 83
4. Constitucionaliznáo Simbólica cm Sentido Positivo:
Furwáo Político-Ideológica da Atividadc Constituinte
e Do Texto Constitucional 86
5. Tipos de Constitucionaliznáo Simbólica. ConstituiQáo
Como Álibi 92
6. A Constitucionaliznáo Simbólica e o Modelo
ClassificatOrio de Loesvenstein 95
7. Constitui0o Simbólica versus
"ConslituiQ5o Ritualista" 99
8. ConstitncionalizaQáo Simbólica e Normas
Constitucionais Prograniaticas 102

6 7
INTRODUCÁO

No presente trabalho, pretende-se abordar o significado social e po-


lítico dos textos constitucionais, exatamente na relaeáo inversa da sua
concretizaeáo jurídico-normativa. O problema náo se reduz, portanto,
discussáo tradicional sobre ineficacia das normas constitucionais. Por
um lado, pressup5e-se a distineáo entre texto e norma constitucionais;
de outro lado, procura-se analisar os cfeitos sociais da ICgislaeáo consti-
tucional normativamente ineficaz. Nessa perspectiva, discute-se a fun-
00 simbólica de textos constitucionais carentes de concretizaeáo nor-
mativo-jurídica.
No primeiro capítulo, consideramos o debate propulsor sobre legis-
laeáo simbólica, que vem sendo desenvolvido na tcoria do Direito e
ciéncia política alemá mais recente. Em vista da confusa° semántica em
torno do termo simbólico, propomo-nos inicialmente a determinar o seu
sentido dentro da expressáo "legislaeáo simbólica". Será relevante aqui
a distineáo entre o conceito mais recente de legislacáo simbólica e as
noeóes de política simbólica e Direito como simbolismo, consagradas
nos anos 60 e 70. Tratamos, por fím, da conceituaeáo, tipos e el-Mos da
legislaeáo simbólica.
No segundo capítulo, propóc-se a abertura de tun debate sobre
constitucionalizacao simbólica. Para isso, é delimitado inicialmente uni
conceito sistémico-teorético de Constituicáo como vínculo estrutural en-,
tre os sistemas político e jurídico, mas principalmente enquanto tueca;
nismo de autonomia operacional do Direito na sociedadc moderna. Tra-
ta-se de uma estratégia: parte-se dessa concepeáo estrita, para questio-
nar - se a sua adequaeáo empírica em casos de constitucionalizaeáo sim-0
bólica. Correspondentemente, abordamos o problema da concretizacá;
normativa do texto constitucional. Com esses pressupostos teóricos, pre-1)
tendemos enfrentar diversos aspectos da relacáo entre ineficacia norma-
tivo-jurídica e funeáo político-ideológica da Constituieáo.
Tendo em vista que o presente trabalho está vinculado a pesquisa
anterior sobre positividade do Direito e Constituieáo, onde abordamos
criticamente a concepeáo luhmanniana da diferenciaeáo e autonomi40
operacional do sistema jurídico em sociedades complexas ()leves, 1992)‘)
propomos no terceiro capítulo urna discussáo sobre a constitucionaliza-
cáo simbólica como alopoiese do Direito. Isso implica o questionamento
da nocáo de Direito como sistema autopoiético da sociedade moderna
(supercomplexa). Após considerar alguns aspectos específicos com pre-
tensáo teórica mais abrangente, a constitucionalizacáo simbólica será
caracterizada como problema típico da modernidade periférica; a convi-
véncia de supercomplcxidade social com falta de autonomia operacional Capítulo 1
do sistema jurídico. analisada de forma mais genérica na supramencio-
nada investigacao, vincularemos agora mais estreitamente á hipertrofia DA LEGISLACÁO SIMBÓLICA:
da funcáo político-simbólica do texto constitucional cm detrimento de UM DEBATE PROPULSOR...
sua eficácia normativo-jurídica. Encerramos a presente contribuicáo
com urna breve referéncia exemplicativa á constitucionalizacáo simbó-
lica na experiéncia brasileira.
1. Ambigiiidade de 'Símbolo', 'Simbólico' e 'Simbolismo'
Do presente livro náo resultara conclusbes teoricamente fechadas.
Ele náo deve ser interpretado como resultado final de rellexiks teóricas. Os termos 'simbólico', 'símbolo'. `simbolismo' etc. sáo utilizados
Objetivamos abrir novios caminhos e horizontes para a Teoria da Consti- nas diversas áreas da producáo cultural, freqüentemente sem que haja
tuicáo. Tanto a dogmática jurídica quanto a sociologia do Direito cor- urna pré-definicáo. A isso está subjaccnte a. suposicáo de que se trata de
rentes, orientadas pela experiéncia constitucional do Estado democrático expressócs de significado evidente, unívoco, partilhado "universalmen-
curopeu e norte-americano, partem do seguinte pressuposto: há urna te" pelos scus 'Atentes', guando, cm verdadc, nem sempre sc está usando
forte contradicáo entre Dircito e realidade constitucionais nos países a mesma catcgoria 2 . Ao contrário, estarnos diante de termos os mais
"subdesenvolvidos". A rigor, assim entendernos. a questa() diz respeito ambiguos da semántica social e cultural', cuja utilizacáo consistente
falta de normatividadc jurídica do texto constitucional como fórmula pressupóc, portant°, urna previa delimitacáo do seri significado, princi-
democrática: a partir dele náo se desenvolve suficientemente um proces- palmente para que náo se caia cm falácias de ambigüidadet. Assim
so concrctizador de construcáo do Dircito Constitucional; mas a lingua- sendo. parece oportuno apontar alguns dos usos mais importantes de
gcm constitucional desempenha relevante papel político-simbólico, com símbolo" e "simbólico - na tradicáo filosófica e científica ocidental,
implicacóes na esfera jurídica.
procurando relevar as convergéncias e divcrgéncias de significados 5, an-
tes de precisar o sentido de "legislacáo simbólica" no presente trabalho.

1. Cf. Eco, 1984:202 (tr. br., 1991:198).


2. Firth, 1973:54.
3. Eco (1984:199s. — tr. br., 1991:196) refere-se á misiá° cm que os
redatores do dicionário de Lalande se rcuniram para discutir publicamente a
respeito da deliniliío de 'símbolo' como "um dos momentos mais patéticos da
lexicografía filosófica", observando que o dicionário "neto concluí: a conclusdo
indireta a que Lalande convida é que o símbolo sáo multas coisas, e nenhuma.
Em síntese, a° se sabe o que é". Cf. Lalande (org.), 1988: 1079-81.
4. Sobre falácias de ambignidade, v. Copi, 1978:91 ss.
5. A respeito da diversidade de definicóes e usos do tenno "símbolo", v.
Firth, 1973:54ss.; Eco, I 984:199ss. (tr. br., 1991:195ss. ).
1.1. O Símbolo COMO Intermediaqáo entre Sujeito e Objeto. O Ilomem em que a esfera do simbólico compreende a rcligiáo, a arte, a filosofia, a
como Animal Simbólico ciéncia", aproxima-se a antropologia estruturalista de Lévi-Stratiss:
"Toda cultura podc ser considerada como um conjunto de sistemas sim-
Num sentido filosófico muito abrangentc, o termo "simbólico" é bólicos em cuja linha de frente colocam-sc a linguagcm, as regras ma-
utilizado para indicar todos os mecanismos de intertnediaqáo entre su- trimoniais, as relagóes económicas, a arte, a ciéncia, a religiáo"m. A es-
jeito e realidade. É nessa perspectiva que Cassirer vai definir o homem trutura social seria um sistema simbólico, náo se confundindo com a
como animal symbolicum, distinguindo o comportamento e o pensa- própria realidade das relagóes sociais15. Entre significante e significado
mento simbólicos como difereneas específicas do humano em rebela ao haveria uma descontinuidade, sendo relevada a nogáo da superabun-
género anima16. O sistema simbólico implicaria uma mediatizagáo da
relagáo "homem/realidade"7. Ao contrário das reaqóes orgánicas aos
dáncia dos significantes16. É essa relativa autonomia do sistema simbó- o
lico, como estrutura de significantes", em face das relagóes sociais
estímulos exteriores, diretas e imediatas, as respostas humanas serian.'
diferidass. Daí se distinguirem os sinais dos símbolos: os primeiros es-
(objetos simbolizados), que possibilita, segundo o modelo de Lévi-
Strauss, a "eficácia simbólica"18. Mesmo no caso dos "significantes flu-
o
tariam relacionados de forma fixa e única com a coisa a que se referem tuantes" ou "valor simbólico zero", a sua fungáo ou efícácia é "a de o
e pertenceriam ao "mundo fisico do ser", vinculando-se especialmente opor-se á auséncia de significagáo sem comportar por si mesma qual- o
aos fenómenos de reflexos condicionados; os símbolos seriam "univer-
sais" e "extremamente variáveis", caracterizando-se pela versatilidade9.
quer significagáo particular"t9.
É inegavelmente sob influéncia da antropoiugia estruturalista de
o
O próprio pensamento relacional encontrar-se-ia na dependIncia do Lévi-Strauss que Bourdieu e Passcron váo desenvolver a concepOo de o
pensamento simbólico, na medida em que só através desse seria possível "violéncia simbólica"". Mas aqui o sistema simbólico - também apre- e
isolar as relagóes para considerá-las abstratamente'°. Observa-se aqui a
influencia da noeáo kantiana de sujeito transcendental, construtor da o
realidade cognoscente, sobre a concepgáo do simbólico de Cassirer. Mas
13. Cassirer, 1972:74.
14. Lévi-Strauss, 1974:9.
o
ele aponta para o sistema simbólico como uma aquisiqáo que "transfor- 15. Cf. Lévi-Strauss, 1958:305s. (tr. br., I967:315s.). o
ma toda a vida humana"", em uma conquista historicamente condicio-
nada, náo lhe abribuindo caráter transcendental".
16. Lévi-Strauss, 1974: 33s. o
17. É de observar-se aquí a influéncia da nogáo de "solidariedades sintag-
máticas" de Saussure (1922: 176s. - tr. br., s.d.: 148s.) sobre a concepgáo de
estrutura de Lévi-Strauss (1958: 306 - tr. br., 1967:316)): "Ela consiste cm o
1.2. A Estrutura Social como Simbólica elementos tais que uma modificagáo qualquer de um deles acarreta tima modifi- o
cagáo de todos os outros" . Num sentido mais abrangente, pode-se afirmar que o
Dessa concepgáo abrangente do simbólico, de naturefa filosófica, princípio da interdependéncia dos elementos estruturais (significantes) de Lévi-
Strauss é influenciado pelo modelo lingüístico-estrutural das relagóes sintagniá-
6. Cassirer, 1972:51.
7. Cf. Cassirer, 1972: esp. 50. Especificamente sobre o conceito de formas
ticas e associativas entre os signos, proposto por Saussure (1922:170-75 - tr. o
br., s.d.: 142-47; cf. também Badiles, 1964:114-3(1- ir br., s.d.: 63-91-, em-
simbólicas, v. também idem, I988:esp. lss. pregando os termos "sintagma" e "sistema" ; Lyons, 1979: 72-83; Greimas e
8. Cassirer, 1972: 49. Cottrtés, s.d.: 324s. e 428s.).
9. Cassirer, 1972: 59-61 e 66s.
18. Sobre "a eficácia simbólica" , v., p. ex., Lévi-Strauss, 1958:205-26 (tr.
10. Cassirer, 1972: 69s.
11. Cassirer, 1972: 49.
br., 1967: 215-36). Referindo-se ao seu significado na obra de Lévi-Strauss, cE o
também Bourdieu, 174:32, nota 10.
12. Nesse sentido, Eco, 1984:208 (tr. br., 1991: 203) e também Bourdieu,
19. Lévi-Strauss, 1974:35, nota 37.
1974:28. A respeito, cf. sobretudo Cassirer, 1988:9ss.
20. Cf. Bourdieu e Passeron, 1975; Bourdieu, 1974:30ss. e passiin. No seu es-
tilo eclético, Faria (1988:103-11 e 124-61, esp. 146) adota a no0o de violéncia

12 13
sentado como estruitira de significantes cm relacóes de oposicao, con-
realizaqáo (disfarQada) de um desojo (reprimido, =oteado)" 2°, a con-
forme o modelo da lingüística estrutural de Saussuren - é posto mais
cep9ao de simbolismo freudiana refere-se ao sentido indireto e figurado
estreitamente cm conexao com a questao do poder, apresentando-se
dos signos", significado cm regra de caráter sexual 30 . Embora consista
como veículo ideológico-legitimador do sistema político". Nao haveria,
numa comparnao, a reina. ° simbólica nao é suscetível de ser deseo-
entao, uma distinQáo entre o simbólico e o ideológico. Porém, por outro
lado, o sistema simbólico nao serviría apenas á manuten0o e reprodu- berta pela associa0o, constituindo urna comparaQáo desconhecida pelo
Q50 da ordem política. advertindo-se que a revoluQáo simbólica. apesar próprio sonhador, que, embora dela se sirva, nao está disposto a reco-
de supor a revoluQáo política, serviría para dar "urna linguagem ade- nhecé-la, "guando eta é posta diante de seus olhos" 31 .
quada" a asa, "condicao de urna plena realizacao"". Jung vai afastar-se da teoria do simbolismo freudiana, sustentando
que sao "sinais para proccssos instintivos elementares" aquilo que Freud
chamara de símbolo, ou seja, o "simbólico" de Freud será denominado
/.3. Simboli.smo e Simbólico im Psicimálise de "semiótico" por Jung". Enquanto na reina() semiótica, o sinal repre-
senta algo de conhecido, havendo urna determinaeao do conteúdo da
No ámbito da psicanálisc a noca() de simbólico tornará posicao de significaeao, o símbolo prcssuporia que "a expressao escolhida soja a
destaque. lsso nao significa, porém, univocidadc significativa cm torno melhor designa9ao ou fórmula possível de um fato relativamente desco-
do simbólico psicanalítico. De Freud, passando por Jung, a Lacan, ob- nhecido, mas cuja existéncia é conhecida ou postulada" 33. O símbolo
serva-se uma variacao semántica relevante dos termos "simbólico" e
"simbolismo"". bolismo no sonho" (1969:159-177 - tr. br., s.d.:133-51): "... estas relageJes
Na teoria freudiana, a reina() simbólica pode ser vista, cm sentido simbólicas nao pertencem exclusivamente ao sonhador e nao caracterizara
lato, como urna forma de intermedinao entre o pensamento manifesto unicamente o trabalho que se realiza no correr do sonho. Já sabemos que os
consciente e o pensamento latente inconsciente, ou seja, o termo mitos e os contos, o poyo em seus proverbios e cancetes, a linguagem corrente e
"simbolismo" está "relacionado com o emprego de símbolos para repre- a imaginacao poética utilizara o mesmo simbolismo. O dominio do simbolismo
sentar na mente consciente conteúdos mentais inconscientes"". Num é extraordinariamente vasto; o simbolismo dos sonhos nao é mais que uma
sentido estrito, o simbolismo consistirá numa reina() constante entre o pequena provincia do mesmo" (1969:174 - cit. conforme tr. br., s.d.:I48s.).
símbolo e o simbolizado inconsciente 2 ". Desenvolvida principalmente 28. Freud, 1972:175.
nos quadros da interprctacao do sonhon definindo-se esse como "a 29. Nesse sentido, v. Eco, 1984:217-19 (tr. br., 1991:211-13).
30. Freud, 1969:163 (tr. br., s.d.: 137), apontando aqui para a desproporQáo
simbólica de Bourdieu e Passeron (1975). Cf. também Ferraz Jr., 1988:251. quantitativa entre símbolos e conteúdos a designar. Em outro trecho, ele dife-
21. Cr l3ourdieu, 1974: esp. 17. rencia: enquanto "nos sonhos os símbolos servem quase exclusivamente para a
22. Cf. l3ourdieu e Passeron, 1975:19ss.; Bourdieu, 1974:30ss., 46, 52ss., expressáo de objetos e relacóes sexuais", em todos os outros dominios o simbo-
69ss. lismo nao é "necessariamente e unicamente sexual" (Freud, 1969:175 - tr. br.,
23. Bourdieu, 1974:77. s.d.: 149).
24. A rigor, nao cabe, portanto, atribuir aos cotícenos psicanaliticos de 31. Freud, 1969: 162 (tr. br., s.d.: 136).
"simbolismo inconsciente" e de "pensamento simbólico" tan sentido unívoco, 32. Jung, 1991:73 (nota 38) e 443.
como o faz Piaget ao invocá-los com vistas á abordagem do "jogo simbólico" na 33. Jung, 1991:444. "Unía expressáo usada para designar coisa conhecida
crianza (1975:11). continua sendo apenas um sinal e nunca será símbolo. É totalmente impossível,
25. Nagera (org.), s.d.: 102. Cf. Freud, 1969: 159-77 (tr. br., s.d.: 133-51), pois, criar um símbolo vivo, isto é, cheio de significado, a partir de relagaes
1972:345-394. conhecidas" (445). Seria Calvez possível tacar um paralelo entre a nogao
26. Freud, I 969:160 (tr. br., s.d.: 134). Cf. l.aplanche e Pontalis, 1985:626- junguiana de símbolo e a conceplao freudiana do simbolismo dos sonhos, no
3I. sentido de que para a interpretalao dos sonhos os símbolos silo monos,
27 Mas Freud advertia eta sita célebre prele0o (i'oriestrug) sobre o "sim- tornando se meros sinais, mas para o sonhador, en q uanto desconhece o sen sig-
-

14
I5
dem humana se caracteriza pelo seguinte - a fungáo simbólica inter-
considera-se vivo na medida em que ele é encarado como a cxpressáo de véni eni todos os momentos e en' todos os niveis de stia existéncia".
um conteúdo incompreensível dcsconhccido. No momento cm que Enquanto uní dos registros psicanalíticos (os outros serian' o iniaginário
surgcm traducóes unívocas e conscientes do set' sentido, o símbolo está e o real)", o simbólico é condicáo de singularidadc, possibilitando a
morto3°. O símbolo vivo é apresentado como "a melhor expressáo possí-
construgáo da subjetividade", mas ao mesmo tempo distancia o sujeito
vel e insuperável do que ainda é desconhecido em determinada época"". do real vivido", subordinando a sua "identidade" ás estruturas dos sig-

no5 ol ef t5 r3
E o símbolo ganha a sua significacáo exatamente do fato de náo ter um nificantes", os quais, quanto mais nada significam, mais indestrutíveis
significado determinado, de ser apenas pressentido, náo consciente". sáo". Influenciado lingüisticamente pelo modelo estruturalista de Saus-
Aqui se pode observar uma aproximacáo entre a nogáo de "valor simbó- sure°, Lacan, na mesma linha de Lévi-Strauss, apontará para a "dis-
lico zero" ou "significante flutuante" de Lévi-Strauss, a que nos referi- cordáncia entre o significado e o significante"", o caráter fechado da
mos acima, com o conceito junguiano de simbólico. ordern/cadeia significante e sua autonomia em relacáo ao significado°,
Embora Jung reconhega a existéncia do símbolo individual ao lado
retirando daí a releváncia dos símbolos lingüísticos e sócio-culturais
do símbolo social", sua concepcáo vai singularizar-se por apontar a
para a determinagáo (conflituosa) da "identidade" do sujeitom). Através
relacáo do símbolo com o inconsciente coletivo, desenvolvendo-se entáo
da entrada na ordem simbólica, o sujcito perde algo essencial de si mes-
a teoria dos "arquétipos" como "imagens primordiais" comuns "a todos
os pavos e tempos"". Daí porque se trata de posicáo que pressup&
"uma metafísica do Sagrado, do Divino", implicando "infinitude de dializada por tim símbolo" (Lemaire, 1989:46).
interpretacáo"39. 41. Lacan, 1978:41 (tr. br., 1985:44) "A agáo humana está fundada origina-
riamente na existéncia do inundo do símbolo, a saber, nas leis e nos contratos"
Na perspectiva lacaniana, o simbólico apresenta-se como uma for-
ma de mediagáo entre o sujeito e o outro", de tal maneira que "a or- (Lacan, 1979:262).
42. Cf Laplanche e Pontalis, 1985:304s. e 645s. Mas o simbólico tem
prevaléncia sobre o imaginário e o real na teoria lacaniana; cf., p. ex., Lacan,
nificado latente, apresentam-se como símbolos vivos (cf. Freud, 1969:161s. -
tr. br., s.d.: 135s.; Jung, 1991:444, referindo-se á interpretagáo esotérica). 1966:11s., 50ss., 276.
34. Jung, 1991:444 - 46. Cf. a respeito Eco, 1984:225ss. (tr. br., 1991: 43. "... é a ordem simbólica que é, para o sujeito, constituinte" (Lacan,
1966:12). "O homem fala, pois, mas é porque o símbolo o faz homern" (I,acan,
219ss.).
35. Jung, 1991:446. 1966:276).
36. "Um símbolo é vivo só guando é para o observador a expressáo melhor 44. Lemaire, 1989:45ss., 103 e Illss.
e mais plena possível do pressentido e ainda náo consciente. Nestas condigóes 45. Cf. Ladeur, 1984:145. Afirma-se, entáo, "uma dotnináncia (...1 do sig-
operacionaliza a participagáo clo inconsciente. Tem efeito gerador e promotor de nificante sobre o sujeito" (Lacan, 1966:61).
vida" (Jung, 1991:446). 46. 1,acan, 1988:212.
37. Cf. Jung, 1991:446s. 47. A respeito, v. Lemaire, 1989:49ss.
48. 1,acan, 1966:372.
38. Ring, 1991:419.
49. Lacan, 1966:501s.; ',emane, 1989:87.
39. Eco, 1991:220. Embora Freud (cf. 1972:345-94, 1969:162ss. - tr. br.,
s.d.:136ss.) preocupe-se "em efetuar a construgáo de um código do simbolismo 50. Nesse sentido, escreve Lacan: "O homem elCtivainente possuído pelo
onírico", aproximando-se da "hipótese de unt inconsciente coletivo", náo se discurso da lei, e é com esse discurso que ele se castiga, em nome dessa divida
trata de um código "universal e coletivo", mas sim "histórico, semiótico" e que simbólica que ele náo cessa de pagar sempre mais etn sua neurose. [...] A
"depende da encicloplédia da pessoa que sonha" (Eco, 1984:218 - tr. br., psicanálise devia ser a ciéncia da linguagem habitada pelo sujeito. Na perspec-
1991:212s.). Laplanche e Pontalis (1985:630) apontam, por sua vez, para "a tiva freudinana, o homem é o sujeito preso e torturado pela linguagem" (1988:
hipótese de uma heranga filogenética" do símbolo em Freud. 276). Lemaire (1989:100s.) adverte, porém, que "o simbolismo social é insepa-
rável do discurso", ou seja, ela aponta para a conexáo de linguagem e simbolis-
40. Para Lacan,"a ordem simbólica, de maneira geral, instaura relagóes me-
diatas entre os seres, isto é, a relagáo do homem ao homem, do si ao outro, é me- mo social na concepgáo lacaniana de ordem simbólica.

17
16
mo, podendo ser apenas mediatizado, traduzido através dos significan- cóes"". Essa relativa autonomia da esfera do simbólico, cujas fronteiras
les (Spaitung divisáo do sujeito)''. Ncssa perspectiva, pode-se afir- "nada permite determinar'', náo significa, porém. que a autonomizacáo
mar que "é aquele a quem chamamos de silo de espirito que se aliena, do simbolismo soja um fato último, muito menos que o simbolismo ins-
pois consente em existir num mundo definível somente pela relacáo en- titucional determine a vida social"'. "Nada do que pertence propriamen-
tre nihil e o outro"". De outro lado. porém, a cura importarla a passa- te ao simbólico" - enfatiza Castoriadis - - impóc fatalmente o domi-
gem do imaginário náo simbolizado, "alienante", conforme urna relacáo nio de um simbolismo autonomizado das instituieóes sobre a vida so-
imcdiata e dual com o "semellhante", para o imaginário simbolizado", cial, nada, no próprio simbolismo institucional. cxclui seu uso lúcido
implicando a análisc da rede de significantes corno estrutura de media- pela sociedade" 61.
cáo entre consciente e inconsciente'. O problema da utilizaeáo do simbólico pelo sujeito leva á questáo da
relaeáo do simbólico com o imaginário 64. Concebido o imaginário como
algo "inventado", sustenta-se, entáo, que ele deve utilizar o simbólico
1.4. Institni•0 como 1?ecle N'imbólica
para "existir" 65 . O imaginário social "deve-se entrecruzar com o simbó-
lico, do contrário a sociedade náo tecla podido 'reunir-se', e com o
Na filosofia social, é, parece-nos, sob a influéncia lacaniana que
económico-funcional, do contrário eta náo teria podido sobreviver" 66.
Castoriadis vai distinguir o simbólico do funcional e do imaginário". O Embora a alienacáo seja definida como -domináncia do momento ima-
simbólico é encontrado aquí. como também em Lacan, tanto na lin- ginário na instituicáo", propiciadora da autonomizacáo da instituicáo
guagent guamo nas instituicóess". Embora as instituicóes náo se redil- (rede simbólica) relativamente á sociedades', só através do imaginário
zam ao simbólico, Blas do inconcebíveis sem o simbólico". Castoriadis há producáo de novos simbolismos, ou seja, criaeáo de novas significa-
critica a visáo funcionalista, na medida cm que essa explica a instituicáo eóc56g.
pela Jim/..áo que cla desempenha na sociedade e reduz, portant°, o
simbólico ao funcional". Se bem que a alienacáo possa ser concebida
"como autonomizaffio das instituicócs com relacáo á sociedade"", 1.5. O Símbolo na Semiótica
adverte-se que os símbolos como significantes "náo do totalmente sub-
jugados pelo 'conteúdo' que supostamente t'eh' que vcicular", seja guan- Na semiótica, a teoria dos signos, cm gera1 6°, acentua se ainda mais
-

do se trata da linguagem on, "infinitamente mais ainda", das institui- o problema da falta de univocidade do termo 'símbolo'. Dentro da cate-
goria genérica dos signos, Peirce irá distinguir, conforme a relaeáo com
51. () que implica a seguinte delinnifio de significante: "tun significante é o
o referente, os leones, índices e símbolos". Os ícones caracterizar-se-
que representa o sujeito para um (nitro significante" (1.acan, 1966:819). Cf.
Lemaire, 1989:112. 60. Castoriadis, 1991:148.
52. Lévi-Strauss, 1974:10, cut referéncia a Lacan. 61. Castoriadis, 1991:150.
53. 1,emaire, 19119: I 19. 62. Castoriadis, 1991:152.
54. Cf. Lemaire, 19119:45. Especificamente com relaláo a caso de psicosc, 63 Castoriadis, 199 I : 153.
Lacan (1988:20) enfiitiza que "so pela porta de entrada do simbólico é que se 64. Cf. Castoriadis, 1991:154ss.
consegue penetró-lo" analiticamente. 65. Castoriadis, 1991:1 54.
55. Cf. Castoriadis, 1991:139ss, 66. Castoriadis, 199 I :159.
56. Cf. Castoriadis, 1991 :142ss. 67. Castoriadis, 1991:159.
57. Castoriadis, 1991:142.
68. Cf. Castoriadis, 1991:161s,
58. Castoriadis, 1991:140.
69. Ou, na fonnulaláo de Carnap, "a teoria geral dos signos e linguagens"
59. Castoriadis, 1991:139s. (1948:8). Cf. Neves, 1988:127s., nota 1.
70. Cf, Peirce, 1955:1 02ss., ou I 977:52s. e 63-76. Crítico com reina() á "pre-

I8
19
iam por sua similaridade com o objeto a que se referem7'. Um índice, objeto denotado apresenta-se ao observador como arbitrariamente im-
por sua vez, será apresentado como "um signo que se refere ao Objeto putadas'.
que denota em virtude de ser realmente afetado por csse Objeto". O Interpretando Peace e Morris, Firth enfatizará que na determinagáo
do sentido dos sinais o produtor e o intérprete usam o mesmo código,
símbolo é um signo que se refere ao objeto que denota em face de uma
enquanto na consideragáo do sentido dos símbolos o intérprete toma
regra ("lei") geral que "opera no sentido de fazer com que o Símbolo
uma posigáo de destaque, dispondo de um espago bem mais amplo "para
seja interpretado como se referindo áquele Objeto"73. Ou seja, no mesmo
sentido da tradigáo aristotélico-tomista", Peirce vai definir o símbolo
exercitar o seu próprio juízo"82. Em virtude desse trago pragmático dife- o
como um signo convencional e arbitrario".
renciador, os símbolos distinguem-se pela imprecisáo, a variabilidade de o
interpretagáo, a aparente inexauribilidade do seu sentido, "sua caracte-
Em Morris, assim como em Peirce, 'signo' será utilizado como ter-
rística mais essencial"83. E é nessa concepgáo pragmática que o símbolo
o
mo genérico, distinguindo-se, porém, dicotomicamente, os símbolos e os
vai ser abordado por Firth como instrumento de cxpressáo, comunica-
sinais. Os sinais sáo apresentados como signos que criam a expectativa
ou a exigéncia de determinada agáo. O símbolo seria produzido pelo pró- Qá0, conhccimento e controles'.
Em posigáo totalmente contrária á de Pcirce e lamben' á de Morris,
o
prio intérprete, atuando como substituto para alguns outros signos, em
relagáo aos quais funcionaria como sinónimo7".
Na sua abordagem antropológica do sentido do termo símbolo, Firth
Saussurc distinguirá 'signo' e 'símbolo'. O signo vai ser caracterizado
pelo "princípio da arbitrariedade"", enquanto que "o símbolo tem como o
vai recorrer á posigáo semiótica de Peirce e Morris'". Dentro desta característica ná'o ser jamais completamente arbitrário; ele liáo está va-
orientagáo, distinguir-se-áo, na categoria geral do 'signo', o Indice', o zio, existe um rudimento de vínculo natural entre o significante e o sig-
nificado"86. Assim sendo, pode-se afirmar que o conceito de símbolo em
o
`sinar, o `ícone' e o 'símbolo'. Encontra-se um índice "onde uma rela-
Saussure corresponde á nogáo de ícone em Peirce, implicando uma se- e
gáo seqüencial é inferida, como da parte ao todo, do precedente ao
antecedente, ou do particular ao geral". O sinal implica uma agáo melhanga do significante com o objeto por ele denotado". o
conseqüente, é um signo que atua como estímulo para respostas as mais Também nos quadros da discussáo semiológica, Eco, após conside- o
complexas". O ícone importa uma relagáo sensorial de semelhangas°. rar criticamente diversos sentidos discrepantes de 'símbolo', define o o
Por fim, o símbolo caracterizar-se-á por envolver "uma série complexa
de associagóes", podendo ser descrito apenas em termos de represen-
modo simbólico como "uma modalidade de produgáo ou interpretagáo
textual", na qual um elemento é visto como a projegáo "de tima porgáo o
tagáo parcial; além do mais, o sentido de um símbolo resulta da "cons- suficientemente imprecisa de conteúdo"ss. A "nebulosa de conteúdo", a
trugáo pessoal e social", de tal maneira que a relagáo entre o signo e o
81. Firth, 1973:75.
sen9a do referente como parámetro discriminante", cf. Eco, 1991:239s. (tr. br., 82. Firth, 1973:66s.
1980:157s.). .83. Firth, 1973:66 e 72s.
71. Peirce, 1955:102 e 104, ou 1977:52 e 64. 84. Firth, 1973:76ss.
72. Peirce, 1955:102 ou 1977:52 . 85. Saussure, 1922:100-102 (tr. br., s.d.: 81-84). Como variante cf. Barthes, 0_1
73. Peirce, 1955:102 ou 1977:52 . 1964: 110s. (tr. br., s.d.: 52-54). Em postura crítica com relagáo á tese saussu-
74. Cf Eco, I984:esp. 24 (tr. br., 1991: 34). riana da arbitrariedade do signo, v. Derrida, 1967:65ss., partindo do argumento
75. Cf. Peirce, 1955:112ss., ou 1977:71ss.; Eco, 1984:210s. (tr. br., 1991: de que a idéia da instituigáo arbitraria do signo "é impensável antes da pos- t)
205s.). sibilidade da escrita"(65).
76. Cf. Firth, 1973:65s., interpretando Morris, 1938. 86. Saussure, 1922:101 (tr. br., s.d.: 82).
77. Fútil, 1973:60ss. e 65ss. 87. Nesse sentido, d. Eco, 1984:211 (tr. br., 1991:2(16); Derrick'. 1967:66, (-)
78. Firth, 1973:74. recusando entáo, "em nome do arbitrário do signo, a definitilio satisstiriana da kj
79. Firth, 1973:75. escrita como 'imagein' - portanto, como sfinlx)lo natural - - clalingua-
80. Firth, 1973:75. 88. Eco, 1984:252 (tr. br., 1991:245).

21
20 tr)
incerteza e a intraduzibilidadc dos símbolos aproximan] a concep9áo dc
Eco do modelo junguiano, como também colocam-na cm direta relaeáo da linguagem simbólica, nunca presentes na linguagcm natural, facili-
com o "modo simbólico tcologal"". Mas Eco aponta basicamente para o tam "extraordinariamente" as opernóes, comparnóes e inferéneias".
modo simbólico como estrategia poética', fazendo abstraQáo dc toda Carnap também refere-sc importáncia da lógica simbólica para a solu-
metafísica ou teologia subjacente, que conferc tima vcrdade particular QáO de catas contradiQóes náo eliminadas pela lógica clássica91, como
aos símbolos°'. O modo simbólico é aprcsentado como um procedimento lamben] á possibilidadc dc traduzir proposiOes teóricas sobre qualquer
de "uso dc texto", que podc ser aplicado a qualquer tipo de signo, -me- que scja o objeto na linguagcm lógico-simbólica. que sc apresenta, por-
diante uma dccisáo pragmática" que produzirá ao nivel semántico a as- tant°, como o sistema de signos mais formalizado ("esqueleto dc uma
sociaeáo de -novas poreóes dc contcúdo" ao signo, "o mais possível in- I i nguagem")"7.
determinadas e decididas pclo destinatário''. Dcssa mancira, o modo
simbólico, além de implicar a "nebulosa de conteúdo" ao nivel semán-
/. 7. O Simbólico na Sociología. Uní Exemplo da Teoria dos Sistemas
tico, dependerá de uma postura pragmática determinada do Mente do
texto, sendo assim radicalmente contextualizado.
Na sociologia, a conceituaQáo de 'simbólico' variará de autor para
autor, náo se excluindo a variaQáo de sentido na obra de um mesmo
1.6. O Simbólico na Lógica autor. Faremos apenas referéncia excmplifícativa ao modelo da teoria
dos sistemas.
Em Lultinann. verdadc. amor. propriedade/dinheiro. poder/Direito.
Na perspectiva da lógica simbólica, o conccito de símbolo está
vinculado basicamente á distiwio entre linguagcm artificial e lingua- arte, creitQa religiosa e "valores fundamentais" constitttem exemplos dc
"Indos dc comunica0o simholicamente generalizados.'" "O conccito
gen] ordinaria, tomando um sentido km diferente daquele que e vei-
culado na discussáo antropológica, filosófica, psicanalítica e sentioló- de símbolo/simbólico deve nesse caso designar o meio da fortnnáo de
gica. Assint wad°. dentro de situnks sociais altamente comple-
A linguageni simbólica e construida e empregada com o fím de evi- xas e contingentes. os mcios simbolicamente generalizados de comuni-
tar a imprecisáo e a flexibilidade da linguagcm ordinária. bloqueadoras caQáo possibilitariam a continuidade da comunicaeao. servindo ao pros-
do raciocinio lógico, matemático e científico"3. Segundo Carnap. a lin- seguimento da conexáo entre seletividade e motivaeáo'°°. Na medida cm
guagent simbólica possibilita a "pureza de uma deduQáo". na medida em que os ¡netos simbolicamente generalizados dc comunicaqáo sáo dife-
que só os elementos relevantes para a respectiva inferéncia sáo empre- renciados conforme códigos de prefer'encia dicotómicos entre um
gados; a linguagem ordinária. ao contrário, permite a introduQáo des- "valor" c um -desvalor", entre un] "sim" c um "náo", que só tém rele-
váncia com relaeáo a um dos mcios de comunica0o. eles Vá0 distinguir-
percebida de elementos estranhos á opernáo lógica. desvirtuando os
se da linguagem natural náo especializada. surgindo entáo a linguagem
scus resultados". Além do mais. acentua-sc que a brevidade c a clareza
especializada da cióncia. do Dircito. da economia. da arte etc'°'.
89. Eco, 1984:225ss. e 234ss. (tr. br., 1991:21 9ss. e 228ss.).
Entretanto. na obra de Lubmann vamos encontrar também o con-
90. Eco, 1984:242 (tr. br., 1991:235).
91. Eco, 1984:252 (tr. br., 1991:245). 95. Carnap, 1954:2.
92: Eco, I 984:253s. (tr. br., 1991:246). 96. Carnal), 1954:3.
93. Caniap, 1954: Is. 97. Carnap, 1954:1.
Wittgenstein, 1963:30s. (§ 3.344) e 32 (§ 4.002):
Firth, 1973:55. 98. Cf. Idthinann, I 975a, 1987a: I 35ss. e 222ss.
94. Carnap, 1954:2. Nesse sentido, enliitizava Wittgenstein que "é huma- 99. Lulimann, 1987a:135.
100 Lulunann, 1975a:174, I 987a:222.
namente impossível retirar imediatamente dela ida linguagein correntel a lógica
da linguagem- ( 1963:32 - § 4.002). 101. Cf. I Ailunium, I 974:62, 1975a:175s. Sobre códigos binarios cm geral.
v Ltilunann, 19116a: 75ss.

22
23
ceito de agir simbólico-expressivo em contraposicáo á nocáo de agir `simbólico' e 'simbolismo' exige que, no uso da expressáo legislacáo
instrumental 102 . Este último implica urna relacáo de meio-fim, de tal simbólica', determine-se precisamente cm que sentido se está empre-
maneira que as necessidades vele envolvidas extraem seu sentido da gando o termo adjetivador.
realizacáo dos fins num momento posterior, sendo, cm face disso, variá- Em primciro lugar, deve-se observar que a confusáo do simbólico
veis; o agir simbólico-expressivo satisfaz imediatamente as necessidades com o semiótico, que encontramos nas concepcóes de Cassirer, Lévi-
a que se dirige, "de tal forma que urna alteracáo do agir pressuptie urna Strauss e Lacan", é incompatível com o uso da expressáo legislacáo
alteracáo da necessidade"m. Luhmann enfatiza que o modelo instru- simbólica', na medida em que toda producáo humana de sentido —
mental, ou seja, o agir orientado pela relacáo meio-fim, é apenas um dos
portanto, também a legislacáo — seria simbólica. Estaríamos, entáo, no
aspectos da funcionalidade dos sistemas sociais, que, portanto, para re-
duzirem a complexidade do seu meio ambiente, precisam articular variá- caso de uma tautología.
veis simbólico-expressivas. No processo de reducáo da complexidade, os • Também náo nos parece que se possa vincular o sentido de
modelos finalístico-instrumentais somente "sáo empregados guando os simbólico em Jung, expressáo de significado desconhecido e incom-
problemas já ganharam estruturas mais específicas, guando, pois, a preensível, com o problema da legislacáo simbólica. Talvez se possa
vislumbrar urna analogia com a concepcáo de simbolismo freudiana,
complexidade já está amplamente absorvida" 104. A própria legitimacáo
náo é alcancada com base na escolha de meios adequados para a reali- na medida em que nela se distingue entre significado latente e sig-
nificado manifesto. Poder-se-ia, entáo, afirmar que na legislacáo sim-
o
zacáo de um fim no futuro, mas sim através do agir simbólico-expres-
sivo, mediante o qual o procedimento ganha sentido para participantes e bólica o significado latente prevalece sobre o seri significado maní-
nao-participantes, motivando-os no presente a se integraren no proces- festo 1°7.
so de reducáo da complexidade". Mas, inegavelmente, náo poderá ha- Entretanto, como já adiantamos acima, a questáo da legislacáo sim- o
ver legitimacáo, caso as variáveis instrumentais percam em sentido, bólica está usualmente relacionada com a distincáo entre variáveis ins-
sondo a relacáo meio-fim constantemente bloqueada e hipertrofiando-se trumentais, expressivas e simbólicas. As func ó- cs instrumentais impli-
as variáveis simbólico-expressivas. Esse é um dos aspectos que vai pos- cariam urna m'acá° de meio-fim, a tentativa consciente de alcancar re-
sibilitar o uso de simbólico de maneira distinta do uso de Luhmann. sultados objetivos mediante a acáo. Na atitude expressiva, há uma con-
Além disso, há na concepcáo luhmanniana urna confusáo entre o ex-
pressivo e o simbólico, aspectos da acáo que devem ser analíticamente
fusáo entre o agir e a satisfacáo da respectiva necessidadc. Enquanto a
acáo instrumental constitui-se em "veículo de confl ito", o agir expres-
o
diferenciados. sivo é "veículo de catarse" 1 ". Afastando-se de outros autores que abor-
o
daram o problema da política simbólica, Gusfield distinguiu o simbólico o
náo apenas do instrumental, mas também do expressivo w. Em contra- O
2. Delimitando Semántica _ posicáo á atitude expressiva e semelhantemente á acáo instrumental, a
postura simbólica náo é caracterizada pela imediatidade da satisfacáo
O
O panorama acima apresentado sobre a ambigüidade de 'símbolo', das respectivas necessidades e se relaciona com o problema da solucáo o
de confito de interesses" ° . Contudo, diferentemente das variáveis ins-
102. Cf. Luhmann, 1983a:223-32, 1987b:315ss.
103. Luhmann, 1983a:224s. 106. Cf. Eco, 1984:206-10 (tr. br., 1991:201-5) Essa confusáo também se
104. Luhmann, 1973a:156; cf. também idem, 1983a:223, 1971:294. Por- manifesta na ahordagem de Castoriadis("instittii0o como rede simbólica") e no
tanto, náo nos parece fundamentada a interpretacáo crítica da teoría luhman- emprego da expressáo "funláo simbólica da língua" por Ferraz .Ir (1988:233-36)
niana por Ilabermas (1982a: 261), no sentido de que "a racionalidacle sistémica 107. Retornaremos a esse ponto guando tratarmos dos eleitos da legislacáo ti
é a racionalidade-com-respeito-a-fins transportada para sistemas auto-regula- simbólica (item 8 deste Cap.)
U
dos".
105. Luhmann, 1983a:224.
108. Gusfield, 1986:179.
109. Gusfield, 1986:77ss. u
110. Cf. Gusfield, 1986:183. e
u
24 25 u
trumentais, a atitude simbólica náo é orientada conforme tuna relacáo
bolos referenciais e símbolos-condensMo: os primciros seriam inter-
linear de incio-fina e. por outro lado, náo se caracteriza por uma cone- pretados da "mesilla maneira por diferentes pcssoas", ajudando "no
xáo direta e manifesta entre significante e significado, distinguindo-se pensamento lógico sobre a situacáo e na manipulacáo dela"; os símbo-
por scu sentido mediato e latente". Como bem observou Gusfield, "a los-condensacáo evocariam emocóes associadas com a situacáo"" 4.
distincáo entre acáo instrumental e simbólica C. cm muitos aspectos, A política instrumental, orientada por símbolos referenciais, seria pri-
similar á diferenca entre discurso dcnotativo e conotativo"". Na deno- vilegio de grupos minoritários organizados para obtencáo de beneficios
ta4áo há uma conexáo relativamente clara entre expressáo e coludido:
concretos e satisfacáo de interesses específicos. A política simbólica,
na acáo instrumental, similarmente. um direcionamento da conduta pa-
ra fins fixos. Na conotacáo a linguagcm é mais ambigua; o agir simbó- orientada por símbolos-condensacáo. seria um cenado. "tima série de
quadros" apresentados abstratamente á maioria dos homens, os es-
lico é conotativo na medida cm que ele adquire um sentido mediato e
pectadores; consistiria numa "parada de símbolos abstratos"Hi. Assim
impreciso que se acrescenta ao seo significado intediato e manifiesto"', e
prevalece cm relnáci ao sondo. para a massa da populacáo a política constituida antes de todo
urna esfera de acóes e vivencias simbólicas.
Evidentemente, a distinclio entre funcáo instrumental, cxpressiva e
Conforme Edelman, os atos políticos simbolizam para a massa dos
simbólica só é possível analiticamente: na prática dos sistemas sociais
espectadores tanto tranqüilizacáo quanto ameaca"% mas a política sim-
estáo sempre presentes essas trés variáveis. Porém, guando se afirma
bólica serve antes á harmonia social''', reduzindo as tensilles" 8 e, por-
que una plexo de acáo tem funcáo simbólica, instrumental ou expressiva,
tanto. desempenhando primariamente uma funcáo de tranqüilizacáo (->
quer-se referir á predomináncia de urna dessas variáveis, nunca de sea
quietude) do público'''.
exclusividade. Assim é que Icgislacáo simbólica aporta para o predomi-
nio, ou mesuro hipertrofia, no que se refere ao sistema jurídico, da hm- Desde que, seguindo Edelman, toda atividade política é predomi-
Qáo simbólica da atividadc legiferante e do set.' produto, a lei, sobrctudo nantemente simbólica, náo tem sentido. nessa perspectiva. falar-se de
cm detrimento da funcáo jurídico-instrumental. legislacáo simbólica como um problema específico da relaclio entre sis-
temas político e jurídico: toda legislacáo já seria simbólica. É por isso
que náo cabe uma vinculacáo estreita da abordagem abrangente de
3. Política Simbólica versus LegislacAo Simbólica Edelman ao debate específico sobre legislacáo simbólica' 2°, enibora,
como veremos, algumas de suas posicóes sejam aplicáveis a cssa discus-
Dentro ciega perspectiva, a nocáo de legislacáo simbólica deve ser sáo. Além do mais, a posicáo de Edelman é passível de crítica no que se
diferenciada preliminarmente do conceito mais abrangente e também refere á separacáo dualista entre agentes (da acáo instrumental) como
mais impreciso de política simbólica. Edelman distinguiu política ins- minoría e e.spectadores (do agir simbólico) como maioria, cis que a po-
tnimental e simbólica ("expressiva") com base na diferenca entre sim 7 lítica instrumental pode trazer beneficios para amplos setores da popu-
lacáo mobilizados cm torno dela, como também a política simbólica
I I I Guslield, 1967:
I 76s. pode levar a urna mobilizacáo (aliva) do público. Por último deve-se ob-
112. (Iusfield, 1986:170. Os termos 'conotativo' e 'denotativo' silo empre- servar que a política simbólica náo conduz apenas á "tranqüilizaqáo
gados aqui cm sentido lingüístico mi semiológico. Nessa acepOo cf. Hanks,
1964:130-32 (tr. hr. s.d.:95-99); Eco. 1980:45-48; ("reúnas e Landovski, 1981:
, 114. Edelman, 1967:6.
75: Greimas e Courtés, s.d.:77s. e 106s. Já no sentido lógico, a conoto0o cor- 115. Edelman, 1967:5.
responde a dimensiio semántica de sentido (significado), a denotacáo concerne á 116.Cf. Edelman, 1967:7, I 3s. e 188.
dimensáo semántica de nfil.éneia von Wright, 1970:109; Copi, 1978:1 I 9- I I 7. 1Welman, 1967:8.
23) Sobre essa varináo de sentidos, cf . Neves, 1988:21 (nota 19) e I 32s. (nota 118. Edelman, 1967:38.
17). 119. Cf. Edelman, I 967:22-43,163-65,I70s., I 88-94 e passinr. idem, 1977:
I I 3. I uslield, 986: I 70 Cf . também idem. 1967:177. 141 55.
-

120. Nesse sentido, Kindennann, 1988:229.

26
27
psicológica" dos grupos a que se dirige, mas pok igualmente certos inte- sentido o tratamento da legislacáo simbólica como inn problema especí-
resses cm perigo"'. fico do sistema jurídico. Estaríamos diantc de luna tautologia. Mas, co-
mo veremos, nem se:11pm o dimito e a legislacjio exerceni hiperirolica-
mente uma funcáo simbólica, sobressaindo-se ein :motos casos a sua di-
4. Dircito Simbólico versus LegislacAo Simbólica mensáo instnimental. Assim como superestimar a funcáo instrumental
do direito é fator e produto de uma ilusáo sobre a capacidadc de dirigir-
se normativo-juridicamente os comportamentos'29, a supervalorizacáo
No ámbito da nocáo abrangente de política simbólica, desenvolveu- do caráter simbólico do direito é simplicadora, impossibilitando que se
se especificamente a concepláo de "direito como simbolismo". Arnold
fagain distincits ou análises diferenciadas em relaQáo ao material
O
foi inegavelmente o pioneiro no enfrentamento dessa questáo, tendo
jurídico.13° O
atribuído a todo o Direito uma funcáo primariamente simbólicam. O
"direito" vai ser concebido como uma maneira de referir-se ás institui-.
góes governamentais "em termos ideais", em vez de concebé-las realís-
5. Legislacáo Simbólica versus Rituais e Mitos Políticos
tico-objetivamentem. Nesse sentido, ressalta-se que "é parte da funcáo O
do `direito' reconhecer ideais que representam o oposto exato da con- Na concepcáo abrangente de política e dircito simbólicos, há náo
dula esbabelecida", desenvolvendo-se, assim, um complicado "mundo apenas uma confusáo entre simbólico e expressivop'. ki criticada acima
onírico"'". Essa funcáo simbólica do direito seria predominante, sobre- com apoio em Gusfield, mas também uma tendéncia <1 confusáo entre
pondo-se á sua funcáo instrumental: "o observador deve sempre ter pre- variáveis simbólicas e elementos ritualísticos e míticos das atividades
sente que a fl11100 do direito náo reside tanto em guiar a sociedade
políticas e jurídicas.
como em confortá-la"'". Embora possa levar tanto á obediéncia quanto
á revolta ou á revolucáo, a crenca no "reino do direito" teria comumente
Para Edelman rituais e mitos sáo formas simbólicas que perinciam O
as instituicóes políticas'". Haveria, assim, uma relacáo de género e
a funcáo de "produzir a aceitacáo do status quo" 126. Inclusive a ciéncia
espécies: O ritual é concebido como "atividade motora que envolve seus
do direito estaria incluida nesse mundo onírico, servindo para encobrir- participantes simbolicamente numa empresa comum", sugerindo-lhes
lhe as contradicóes e a irracionalidade, apresentando-lhe retoricamente
que se encontram vinculados por interesses comuns'". Define-se, por-
como um mundo govcrnado pela razáo, sem contradicóesw.
tant°, como uma atividade coletiva que tranqüiliza os scus participantes
Inegavelmente, a contribuicáo de Arnold é relevante e, cm parte, da inexisténcia de dissenso entre eles'34. Os mitos podem ser concebidos
ainda insuperável para uma crítica da ideologia jurídicam. Entretanto,
da mesma maneira que nos referimos á concepcáo abrangente de políti- 129. Cf. Lenk, 1976:147.
ca simbólica, a nocáo de direito como simbolismo é incompatível com o
conceito de legislacáo simbólica: partindo-se de que toda atividade ju-
130. Nesse sentido, v. a crítica de Dworkin (1991:15s.) ao que ele denomi- O
na juristas "nominalistas".
rídica, tanto prática quanto teórica, scja primariamente simbólica, perde 131. Cf., p. ex., Luhmann, 1 983a:224ss.; Edelman, I967:19ss.
O
132. Manan, 1967:16.
121. Gusfield, 1986:182, em crítica a 1:delman.
122. Antold, 1935:esp. 33ss. ou 1971. 133. Edelman, 1967:16. Na perspectiva da leona do agir comunicativo,
sustenta Habermas (1982b 11:88): "...as at,:óes rituais perderam sitas futilkies
123. Amold, 1935:33 ou 1971:47.
adaptativas; elas servem á produgá'o e manutenláo de uma identidade coletiva,
124. Arnold, 1935:34 ou 1971:48.
125. Arnold, 1935:34 ou 1971:48. devido á qual a conduláo da interna() por tan programa genético, ancorado no o
126. Arnold, 1935:34s. ou 1971:48. organismo individual, pode ser ajustada a unr programa cultural intersubjeti- u
127. Arnold, 1935:56ss. ou 1971:51s. vamente compartilhado".
128. Lenk, 1976:143 (nota 12). 134. Edelman, 1967:17.

28 29
como crencas "socialinenie comunicadas- e "inquestionadas""s. Rituais
va das kis) está multo freqüentemente fundamentada cm rituais (que
como atividades motoras e mitos como crcncas inquestionáveis refor- sáo primariamente 110CS expressivas) e mitos. Portanto, o que vai dis-
reciprocomente, tendo significados latentes, nívcis de conotacáo. tinguir a legislacáo simbólica náo é o ritualístico ou o mítico. mas sim a
que náo se apresentam aos agentes e crentes. "presos'. a scus significa- prevaléncia do scu significado político-ideológico latente em detrimento
dos manifestos, a suas refcréncias denotativas. Porém, a esfera do sim- do scu sentido normativo aparente.
bólico náo se reduziria aos rituais e mitos. scndo bcm mais abrangentc.
Mais recentemente Voigt, ao abordar o problema da política simbó-
lica, distinguiu mitos. rituais e símbolos, advertindo, porém, que eles fre- 6. Por uma Conceitualáo
raientemente se cncontram simultaneamente13°. "Mitos determinan, nos-
sa comprcensáo do mundo. freqüentemente sem qtte nós lenhamos a A concepcáo instrumental do Dircito Positivo, no sentido de que as
consciéncia disso"137. Elcs impregnam o pensamento de tal mancira, que leis constituem insuperáveis para se alcancar determinados fins
11111 comportamento desvionte se apresenta como praticamente impossí- "desejados" pelo legislador, especialmente a mudanca social, implica
vell". Por mcio dos rituais, a vinculacáo mítica ao passado "é corrobo- um modelo funcional simplista e ilusório, como tém demonstrado os
rada através de contínua e invariável repeticáo'". O principal resultado seus críticos. Em primeiro lugar, observa-se que há um grande número
seria. entáo. "a abolicáo do tempo": através dos rituais o passado seria de leis que servem apenas para codificar jurídicamente "normas sociais"
revivificado"). Por último. Voigt define os símbolos como "sinais codi- reconhecidasl '3. Por outro lado. a complexidade do mcio ambiente social
ficados cujo sentido é entendido apenas por quem pode decifrar o códi- dos sistemas jurídico c político é multo acentuada, para que a atuacáo do
go"' ". Os símbolos comidos nos rituais serviriam á adaptacáo dos novos Estado através de legislacáo possa ser apresentada como instrumento
dados reais aos modelos de interpretacáo de sentido existentesm. Os seguro de controle social"4. Já se tem apontado mais recentementc para
símbolos podcm ser interpretados, nessa perspectiva, como instrumentos a situacáo paradoxal do aumento dos encargos do Estado cm concxáo
eventuais das atividadcs ritualísticas c das crencas míticas. com a reducáo da capacidade do Dircito de dirigir a conduta sociali".
A distincáo entre mitos, rituais e formas simbólicas interessa-nos Mas a qucstáo dos limites dc unta concepcáo instrumental da le-
especificamente para caracterizar diferenciadamente a legislacáo sim- gislacáo interessa-nos, aqui, cm outra perspectiva: o fracasso da funcáo
bólica. Parece-nos quc, guando se fala da funcáo hipertroficamente sim- instrumental da lei é apenas um problema de ineficácia das normas ju-
bólica de atividades legiferantes, dc kis c de discursos cm torno dclas, rídicas'? A rcsposta negativa a cssa questáo O-e-nos diante do debate em
ott scja, (piando sc trata dc "legislacáo simbólica", náo sc está, em torno da funcáo simbólica de determinadas leis. Como bcm formulou
principio. refcrindo a formas ritualísticas c míticas. Só eventualmente sinteticamente Gusfield. "many laws are honored as much in thc breach
crencas inquestionávcis (mitos) e atividadcs motoras contínua e inva- as in performance"H". Em sentido mais abrangente, pode - se dizer que
riavelmente repetidas (rituais) está° relacionadas com a legislacáo sim- quantidade considerável de leis desempenha funcóes sociais latentes em
bólica. Entretanto. também a legislacáo instrumental (a l'orca normad-
143. I,enk, 1976:146.
I 35. Edelman, 1967:18. 144. Nesse sentido, enfatiza ',William: "A sociedade mcsma nao pode .ser
136. Voigt, 1989:9. conceituada tao-só a partir de sita constituicao jurídica-. O Direito - assim
137. Voigt, 1989:10. como a política - "é apenas um momento estrutural entre °litros" (1987b:299).
138. Voigt, 1989:10. Cf. também Teubner, 1982, 1989:81ss.; idem e Willke, 1984; Ladeur, 1983:
139. Voigt, 1989:12. 466ss., 1984:170ss., 1990.
140. Voigt, 1989:12. 145. Grimm (org.), 1990.
141. Voigt, 1989:14. 146. Gustield, 1967:177. Isto é, muitas leis, pelo seu conteúdo, sao dig,ni-
142. Voigt, 1989:14. ficadas tanto em caso de violacáo generalizada quanto na hipótese de cumpri-
mento sistemático.

30
31
contradigáo com sua eficacia normativo jurídica, ou seja, cm oposigáo problema da legislacáo simbólica é condicionado estruturalmente, seudo
antes de se falar cm interesses sociais que a possibilitam'" do que de
ao seu sentido jurídico manifesto. Náo se trata, portanto, de urna sim-
vontadc ou intencao do legislador.Por mitro lado, náo cabe, no sentido
ples negagáo da legislagáo instrumental. Nesse sentido, observa Kin-
oposto, distinguir a legislacáo simbólica da legislacao instrumental com
dermann que a "legislagáo simbólica náo pode ser vista meramente co- base na diferenca entre, respectivamente, efeitos tencionados e nao-
mo contraponto para a legislagáo instrumental de proveniéncia con- tencionadosI 53, pois nada impede que haja legislacáo intencionalmente
temporánea, mas sim deve ser conceituada como alternativa para a dire- orientada para funcionar simbolicamente. Parece-nos sim adequada a
QáO normativo-geral da conduta" 147 . Considerando-se que a atividade contraposicao dos efeitos latentes da legislacáo simbólica aos efeitos
legiferante constitui um momento de confluencia concentrada entre sis- manifestos da legislacao instrumental (v. item 8 deste cap.)
temas político e jurídico, pode-se definir a legislagáo simbólica como

on o
produgáo de textos cuja referencia manifesta á realidade é normativo-
jurídica, mas que serve, primária e hipertroficamente, a finalidades po- 7. Tipos de LegislacAo Simbólica
líticas de caráter náo especificamente normativo-jurídico.
Náo me parece que tenha sentido sustentar que simbólicos sáo os 7.1. Da Tipología
atos legiferantes, náo as leis 148 . É verdade que de determinada atividade
legislativa com fungáo primariamente simbólica pode resultar lei que, Tendo cm vista que os casos enquadrados no campo conccitual da

c coecc ec e ce eco o e coo-1 00


posteriormente, venha a ter uma intensa "forga normativa"; como tam- legislacáo simbólica sáo multo heterogéneos, tem-se procurado clas-
bém, ao contrário, leis resultantes de atos de legislagáo instrumental sificá-los. Em algumas tentativas de tipificacao, porúii ► , sao incluidos
podem com o passar do tempo adquirir caráter predominantemente sim- atos normativos que náo constituem legislacáo simbólica no sentido es-
bólico149 . Porém, o conceito de legislagáo simbólica deve referir-se trito e diferenciado que estamos utilizando. Assim é que Noll incluí as
abrangentemente ao significado específico do ato de produgáo e do texto declaracóes, tal como se apresentam principalmente ras Constituicaes e
produzido, revelando que o sentido político de ambos prevalece hiper- nos seus preámbulos, na vasta categoria da legislacáo simbólica'". En-
troficamente sobre o aparente sentido normativo-jurídico. A referencia tretanto, apesar da funcáo simbólica das declaracbes contidas nos textos
deóntico jurídica de agáo e texto á realidade torna-se secundaria, pas- constitucionais e seus preámbulos, Blas podem servir também á interpre-
sando a ser relevante a referencia político-valorativa ou político-ideoló- tacáo e, portanto, á concretizacáo normativa do texto constitucional.
Assim sendo, nao devem, cm princípio, ser enquadrados na categoria da
gica. legislacáo simbólica, caracterizada por urna hipertrofia da sua fuina°
Embora retornemos a esse problema mais á frente, cabe adiantar
simbólica cm detrimento da concretizacao normativa do respectivo texto
que náo concebemos a legislagáo simbólica cm termos do modelo
legal. Isso só se justificará guando as declaracó-es estejam em descon-
simplificador que a explica ou a define a partir das intengóes do formidade com o próprio sistema constitucional cm vigor ou cm des-
legisladorl s° . É evidente que, guando o legislador se restringe a formular compasso com a realidade constitucional. Da mesma mancira deve-se
uma pretensáo de produzir normas, sem tomar qualquer providencia no argumentar com relacáo a normas que se referem a símbolos do poder
sentido de criar os pressupostos para a eficacia, apesar de estar em "soberano" estatal, como braseies das forras armadas, bandciras,
condigóes de criá-los, há indício de legislagáo simbólica'''. Porém, o as quais, além de urna funcáo informativa, possucm foro normativa
para os seus destinatários, até mesmo conseqiiéncias penais, náo
147.Kindermann, 1989:258: implicando, em princípio, legislacáo simbólica'".
148. Ern sentido contrário, cf. Noll, 1981:356.
149.Nesse sentido, cf. Kindermann, 1988:225 152.Cf. Schild, 1986:199.
150. Cf., diversamente, Noll, 1981:356. Ver também Kindermann, 1989: 153. Cf. Ming, 1982:308.
266. 154. Noll, 1981:356s.
151. Kindermann, 1988:227. Analogamente, mas muna posiláo ainda yo- 155. Kindermann, 1989:265; Noll, 1981:359s.
luntarista, cf. Blankenburg, 1977:43.

33
32
illaprOpriadO pct 1.A.V-11US ciassiticar como simbólica a legis-
li11110C111
Um clássico cumplo no cstudo da legislacáo simbólica é o caso da
laclio que vem para regular materia já suficientemente tratada cm ou-
"lei seca" nos Estados Unidos da América, abordado pormenoriza-
tro(s) diploma(s) normativo(s). como no caso da cominacáo de pena a
damente por Gusfieldiss. A tese central de Gusficld afirma que os de-
fato já punivel's`>. É evidente que tima nova regulacáo legislativa de con-
fensores da proibicáo de consumo de bebidas alcoólicas náo estavam
(elido idéntico ou scmelhante a kis mais antigas, mcsmo que se reco- interessados na sua eficacia instrumental, mas sobretudo em adquirir
nheca a sua funcáo simbólica, pode servir para fortificar determinada maior respeito social, constituindo-se a respectiva legislacáo como
posicáo do Estado-Legislador, contribuindo para tima maior efetivacáo símbolo de status. Nos conflitos entre protestantes/nativos defensores da
do respectivo conteúdo normativo. Em principio, portant°, pode ter uma lei proibitiva e católicos/imigrantes contrários á proibicáo, a "vitória
funcfio relevantemente instrumental. Quando, porém, a nova legislacáo legislativa" teria funcionado simbolicamente a um só tempo como "ato
coustitui apenas mais tima tentativa de aprescntar o Estado como iden-
dc dcfcréncia para os vitoriosos e de degradacáo para os perdedores",
tificado com os valores ou fins por cla formalmente protegidos, sem
sendo irrelevantes os scus efeitos instrumentais"°. Embora contestada
qualquer novo resultado quanto á concretizacáo normativa. evidente-
quanto á sua base empírica'6°, é de se reconhecer que a contribuicáo de
mente estaremos d'ante dc um caso dc legislacáo simbólica. Mas náo
Gusfield possibilitou uma nova e produtiva leitura da atividade legis-
simplesmente por se tratar de legislacáo destinada a regular situacóes já
lativa'''.
suficientemente previstas em leis mais antigas. e indcpendemente disso.
Outro caso. mais recente, é o da disc
- -usááo sobre o aborto na Alema-
Kindermann propós um modelo tricotómico para a tipología da
nha. Blankenburg enfatiza que os participantes da discussáo cm torno
Icp,islacáo simbólica, cuja sistematicidacle o torna teoricamente frutifero:
da legalizacio do aborto cstáo informados dc que a violacáo do § 218 do
"Conteódo de legislacáo simbólica pode ser: a) confirmar valores
Código Penal Alemfio (StGB) "sáo muito freqüentes e que punicóes
sociais, b) dentonstrar a capacidadc de acá° do Estado e c) adiar a
°corren( apenas ein casos excepcionais""'2. Conclui. cntáo, com base
SOILIQ50 de conflitos sociais através dc compromissos dilatórios"'".
mesmo em decisóes do Tribunal Constitucional Federal, que no conflito
sobre a legalizacáo do aborto trata-se da afirmaMo simbólica de preten-
7.2. (.onfirounao de lidores S'ociais sties normativas, náo da imposicáo efetiva dessas'6'.
Um outro exemplo, muito significativo para a experiéncia social
O que sc exige do legislador multo freqüentemente é, primariamen- européia mais recente, é o da legislacáo sobre estrangeiros. O debate a
te, tima posicáo a respcito de conflitos sociais cm torno de valores. Nes- respeito de uma legislacáo mais rigorosa ou mais flexível em relacáo aos
scs casos. os grupos que se encontram envolvidos nos debates ou hitas estrangeiros seria predominatemente simbólico: nesse caso, a legislacáo
pela prevaléncia de determinados valores vécin a "vitória legislativa" teria uma forca simbólica muito importante, na medida em que influ-
como tuna forma de reconhecimento da "superioridade" ou predonii- enciada como os imigrantes seráo vistos pelos nacionais — como estra-
náncia social de sua concepcáo valorativa, sendo-lhes secundaria a efi- nhos e invasores, ou como vizinhos. colegas de trabalho, de estudo, de
cácia normativa da respectiva lei. Dcssa mancira. procuran] influenciar associacáo e. portant°, parte da sociedade'64. Primariamente, a legisla-
a atividade legiferante. no sentido de que sejant formalmente proibidas
158. Gusfield, 1986: esp. 166ss. (Cap. 7), 1967:176ss.
ármelas condutas que náo se coadunant com os scus valores, assim como
159. Gusfield, 1986:23.
permitidos ou obrigatórios os comportamentos que se conformam aos
scus padrócs valorativos, satisfazendo-se as suas expectativas basica- 160. Friedman, 1972:210, Noll, 1981:350. Cf. Kindermann, 1988: 224s.,
mente coni a expedicáo do ato legislativo. 1989:266.
161. Kindermann, 1989:266.
156. l'in sentido contrario, ef. Schild, 1986:197. 162. Blankenburg, 1977:42.
157. Kinclennann, 1988:230, 1989:267 (variando aqui a fonnula0o). 163.- Blankenburg, 1977:42. Cf também Kindennann, 1988:231s.; He-
genbarth, I 9{11:202; Noll, 1981:353.
164. Kindennann, 1989:267, wat base em conelusiSes de Groenendijk, 1987:

14
35
QáO funcionaria entáo como "etiqueta" em relagáo á figura do estrangei- migo externo", ao "poder colonial" etc. E, por outro lado, aros legislati-
ro'65. vos considerados como "gestos de diferenciagáo" — é o caso da "Lci Se-
Analisando os problemas do Direito e da Administragáo na África ca" nos EUA, conforme a interprctagáo de Gusfield — podem servir re-
da pós-independéncia, Bryde sustentou que a énfase legislativa em levantemente para a coesáo dos respectivos grupos, tanto dos "glori-
principios como "negritude" e "autenticidade" teria desempenhado urna ficados" quanto dos "degradados".
fungáo simbólica para a delimitagáo do "caráter" nacional perante o po-

CO tt)3 0Z el
der colonial. A mesma fiingáo exerceria, por outro lado, a codificagáo
modernizadora, como no caso da Etiópia em 1960, onde elá teria ser- 7.3. Legislavtio-illibi
vido como fórmula de confírmagáo da modernidade". Kindermann in-
terpretou esses casos de legislagáo simbólica como "confírmagáo de va- O Objetivo da legislaqáo simbólica pode ser também fortificar "a
lores sociais" 167. Embora quanto á primeira hipótese, énfase na "negritu- conflanga do cidadáo no respectivo governo ou, de um modo geral, no
de" e na "autenticidade", parega adequado o enquadramento do caso Estado"'". Nesse caso, náo se trata de confirmar valores de determina-
nessa classe de legislagáo simbólica, tendo em vista que há pretensa- dos grupos, mas sim de produzir conflanga no sistema jurídico-políti-
mente a corroboragáo de valores sociais, a codificagáo modernizadora co'". O legislador, muitas vezes sob pressáo direta, elabora diplomas
parece adequar-se melhor na categoria da legislagáo-álibi, de que trata- normativos para satisfazer as expectativas dos cidadáos, sem que com
remos no próximo subitem. isso haja o mínimo de condigóes de efetivagáo das respectivas normas.
A legislagáo simbólica destinada primariamente á afírmagáo de va- A essa atitude referiu-se Kindermann com a expressáo "legislagáo-áli-
lores sociais tem sido tratada basicamente como meio de diferenciar bi" 173 . Através dela o legislador procura descarregar-se de pressóes polí-
grupos e os respectivos valores e interesses. Constituiria um caso de po- ticas e/ou apresentar o Estado como sensível ás exigéncias e expec-

CeteC ee ee Ce CC O O CC4 4
lítica simbólica por "gestos de diferenciagáo", os quais "apontam para a tativas dos cidadáos.
glorificagáo ou degradagáo de um grupo em oposigáo a outros dentro da Nos períodos eleitorais, p. ex., os políticos dáo corita do seu deseni-
sociedade"'". Mas a legislagáo afirmativa de valores sociais pode tam- penho, muito comumente, com referéncias á iniciativa e á participnáo
bém implicar "gestos de coesáo" 169, na medida cm que haja urna aparen- no processo de elaboraQáo de leis que correspondem ás expectativas do
te identificagáo da sociedade nacional com os valores legislativamente eleitorado. É secundário aqui se a Ici surtiu os efeitos socialmente "dcsc-
corroborados, como no caso de princípios de "autenticidade" 170. Além jados", principalmente porque o período da legislatura é muito curto
do mais, a distingáo entre "gestos de coesáo" e "gestos de diferenciagáo" para que se comprove o succsso das leis entáo aprovadas' 7 '. Importante
é relativa. Mesmo guando se fala de "gestos de coesáo" com referéncia á é que os membros do parlamento e do governo a tm ,sentem-se como
sociedade nacional como um todo, deve-se observar que eles podem atuantes e, portanto, que o Estado-Legislador mantenha-se merecedor
funcionar como fortes "gestos de diferenciagáo" relativamente ao "ini- da confíanga do cidadáo.
Mas náo só dessa forma genérica evidencia-se a legislagáo-álibi.
25, a respeito do direito eleitoral dos estrangeiros, a nivel municipal, na Holanda. Face á insatisfagáo popular perante determinados acontecimentos ou á
165. Kindermann, 1989:267.
166. Bryde, 1987:37. 171. Kindermann, 1988:234; com fonnulacáo análoga, Ilegenbarth, 1981:
167. Kindermann, 1989:267. 201.
168. Gusfield, 1986:172. 172. Kindermann, 1988:234.
169. Cf. Gusfield, 1986:171. 173. Kindermann, 1988:234-38, 1989:267ss. Analogamente, NoII (1981:
170. Aqui pode caracterizar-se um dos casos dos "mirandas", conforme os 360-62) fala de "reac8es substitutivas" como espécie de legislacáo simbólica.
define Lasswell (1982:13s.): "Os `mirandas' do os símbolos de sentimento e 174. Kindermann, 1988:234, 1989:269.
identificacáo no mito político, cuja funcáo consiste em despertar admiracáo e
entusiasmo, criando e fortalecendo crencas e lealdades"(14).

36 37
emergencia de problemas sociais, exige-se do Estado muito freqüente- do. a legislacáo-álibi serve corno mecanismo de exposicáo simbólica das
mente urna reacáo solucionadora imediata. Embora, nesses casos, cm re- instituicóes. Um exemplo interessante é o da legislacáo sobre os mcios
gra, a regulamentacáo normativa multo improvavelmente possa contri- de comunicacáo nos EUA'''. As normas sobre controle da radiodifusáo e
buir para a SOIMO dos respectivos problemas, A atitude legiferante ser- da televisáo teriam permanecido "sem efeitos regulativos reais", mas
ve como um álibi do legislador perante a populacáo que exigia urna rea- tcriam servido para dar "a aparencia das precaucóes estatais por um
00 do Estado .
mínimo de responsabilidadc da mídia". como também para "dissipar
Kindermann refere-se ao caso de peixes acometidos por nematódeos dúvidas sobre a racionalidade do sistema de 'India americano", evitando
e que, conforme uma reportagem da TV alemá (1987), estariam sendo possíveis reas óes de descontentamento dos cidadlosm. Em casos como
comercializados, provocando doencas intestinais nos consumidores. Os esse, a legislac50-álibi náo estada vinculada a relacóes mais concretas.
problemas económico-sociais resultantes da reducáo do consumo provo- entre políticos e eleitores ou entre governo/parlanicnto e pressócs espe-
cada pela reportagem levou o Governo Federal da Alemanha a expedir cíficas do público, mas sim, de forma mais genérica. á exposicáo abstra-
um Decreto muito detalhado, de acordo com o qual estaría garantindo ía do Estado corno instituicáo merecedora da confianca pública.
que nenhum peixe acometido chegaria ao comércio. Com isso, obti- A legislacáo-álibi decorre da tentativa de dar a aparencia de uma
nham-se efeitos positivos para a regularizacáo do comércio de pescados, solucáo dos respectivos problemas sociais ou. no mínimo, da pretensáo
embora, sob o ponto de vista instrumental, o problema da comercializa- de convencer o público das boas intenCócs do legislador'''. Como se tem
QA0 de peixes contaminados permanecesse fora do controles. observado. cla náo apenas deixa os problemas sem solucáo, mas além
No Direito Penal, as reformas legislativas surgem muitas vezes disso obstrui o caminho para que eles scjam resolvidos 1 ". A essa
como reacóes simbólicas á pressáo pública por urna atitude estatal mais formulacáo do problema subjaz urna crenca instnimentalista nos efeitos
drástica contra determinados crimes' 76 . A onda anti-semítica que se das leis, conforme a qual se atribuí á legislacáo a funcáo de solucionar
propagou na Alemanha cm 1959-60, onde houve freqüentes violacks os problemas da sociedade'". Entretanto, é evidente que as Icis náo sáo
de cemitérios judeus e sinagogas, levou, por cumplo, a urna reforma instrumentos capazes de modificar a realidade de forma direta, cis que
juridicamente desnecessária do Parágrafo 130 do Código Penal Alemáo as variáveis normativo-jurídicas se defrontam com outras ,.variáveis
(StGB), a qual, porém, demonstrava simbolicamente a prontidáo do Es- orientadas por outros códigos e criterios sistemicos (v. infra Cap. 111.
tado de responder á "indignac5o" pública pelas desordens anti-scmíti- 1.) A resolucáo dos problemas da sociedade dependeria entáo da
cas' 77 . Também em relacáo á escalada da criminalidade no Brasil das interferencia de variáveis náo normativo-jurídicas. Parece. portanto,
mais adequado afirmar que a legislac50-álibi destina-se a criar a i-
duas últimas décadas, a discussáo cm torno de urna legislacáo penal
magem de um Estado que responde normativamente aos problemas
mais rigorosa apresenta-se corno tun álibi, cis que o problema náo de-
reais da sociedade. sem, contudo, normalizar as respectivas relacóes so-
corre da falta de legislacáo tipificadora, mas sim, fundamentalmente, da ciais.
inexistencia dos pressupostos sócio-económicos e políticos para a efeti-
Nesse sentido, pode-se afirmar que a legislaczlo-álibi constilui unta
vacáo da legislacáo penal em vigorm.
forma de manipulacáo ou de ilusáo que imuniza o sistema político con-
Além dos casos cm que se apresenta como "rcacáo substitutiva" a
pressóes sociais ou corno referencia na prestacáo de comas ao eleitora- 179. A respcito, v. I loffinatin-Riem, 1981, 1985. Cf. também Kindermann,
1988:235-37.
175. Kindennann, 1989:268.
180. 1 lollinann-Itiem, 198 I :81s.; Kindennann, 1988236.
176 Cf. Schild, 1986:198. 181. Kindennann, 1988:234.
177. Kindennann, 1988:237. 182. Noll, 1981:364; Kindermann, 1988:235, 1989:270.
178. Aqui se enquadra evidentemente o debate sobre a legalizalfio da pena 183. Assim é que Kindennann Bula de "soluláo de problemas sociais" atra-
de morte. que, por Último, implica o problema da constitucionalidade da respec- vés de leis (1988:264).
tiva reforma da constituiláo (cf. art. 5 2, inciso XLVII, al. a, c/c art. 60, § 4 2, in-
u ciso IV, da Constittii0o Federal).

u
38 39
tra outras alternativas'84, deseinpenhando uma fungáo ideológica. Mas 7.4. Legislaqdo como Fórmula de Compromis.vo Ddatório
parece muito limitada e simplista a concepgáo que considera, no caso A legislagáo simbólica lamben) pode servir para adiar a solugáo de
da legislagáo-álibi, o legislador como quem ilude e o cidadáo como o conflitos sociais através de compromissos dilatóriost". Nesse caso, as
iludidol". Em primeiro lugar, deve-se observar que, face "perda de divergéncias entre gnipos políticos nao sáo resolvidas através do ato
realidade da legislagáo" em urn mundo que se transforma ace- legislativo, que, porém, será aprovado consensualmente pelas partes
leradamente, confundem-se o real e a encenagáo, "desaparecem também envolvidas, exatamente porque está presente a perspectiva da ineficacia
os contornos entre desejo e realidade", "ilusáo e auto-ilusáo tornam-se

on
da respectiva lei. O acordo náo se funda entáo no conteúdo do diploma
indiferenciáveis", de tal maneira que "líderes políticos náo sáo apenas normativo, mas sim na transferéncia da SO1U00 do conllito para tim fu-
produtores, mas também vítimas de interpretagóes simbólicas"'86. A turo indeterminado.
legislagáo-álibi implica uma tomada de papéis sociais tanto pelas elites
Como "compromisso-fórmula dilatório", expressáo utilizada por
que encenam, quanto por parte do público-espectador, náo podendo ser

c eecc ee cc ee e cot ec o o• oco to


Schmitt em relagáo á constituigáo de Weimar'95, enquadra-se perfeita-
restringida a atividades conscientes das elites para alcangar seus fins; mente o caso da Lei Norueguesa sobre empregados domésticos (1948),
eis que tentativas de manipulagáo desse tipo "tornam-se usualmente investigado muito habilidosamente por Aubert'96. A fungáo manifesta
conhecidas" e tendem ao fracassoi". Entretanto, embora seja de rela- dessa lei teria sido a regulamentagáo de relagóes de trabalho; instrumen-
tivizar-se os conceitos de manipulagáo e de ilusáom, é evidente que a talmente o seu fim teria sido a melhora das condigiíes de trabalho dos
legislagáo-álibi pode induzir "um sentimento de bem-estar" (-> "reso- empregados domésticos e a protegáo dos seus interesses'97. A suavidade
IllQáO de tensáo")1" e, portanto, servir á lealdade das massasm. das normas sancionadoras a serem aplicadas ás donas de casa nas hipó-
Por fim, é importante salientar que a legislagáo-álibi nem sempre teses de violagáo da lei, dispositivos punitivos cujas dificuldades de
obtém éxito em sua fungáo simbólica. Quanto mais ela é empregada aplicagáo decorriam da própria lei, constituía uni fator importante para
tanto mais freqüentemente ela fracassa'91. Isso porque o emprego abusi-
garantir a sua ineficacia. Também a forte dependéncia pessoal dos em-
vo da legislagáo-álibi leva á "descrenga" no próprio sistema jurídico,
pregados domésticos em relagáo ás donas de casa atuava como condigáo
"transtorna persistentemente a consciéncia jurídica"1". Tornando-se negativa de efetivagáo do texto legal. Foi exatamente essa previsível
abertamente reconhecível que a legislagáo náo positiva normas jurí- falta de concretizagáo normativa que possibilitou o acordo entre grupos
dicas, o Direito como sistema de regulagáo da conduta em interferéncia "progressistas" e tendéncias "conservadoras" em torno da Lei. Os pri-
intersubjetiva cai em descrédito; disso resulta que o público se sente meiros ficaram satisfeitos porque a Lei, com os seus dispositivos sancio-
enganado, os atores políticos tornam-se cínicosm. A esse ponto retor- natórios, documentava a sua posigáo favorável a reformas sociais. A-
naremos guando tratarmos especificamente da constitucionalizagáo sim- queles que eram contrários á nova ordem legal contentaram-se com a
bólica. falta de perspectiva de sua efetivagáo, com a sua "evidente impraticabi-
lidade"1". Dessa maneira, abrandava-se um conflito político interno
184. Cf. Noll, 1981:362; Kindermann, 1988: 235, Itegembarth, 1981:202s. através de uma "lei aparentemente progressista", "que satisfavia ambos
185. Kindennann, 1989:270.
partidos"'99, transferindo-sc para ilin futuro indeternibi.ido a ,,.i1.1;,áo do
186. I legenbadh, 1981:204.
187. Edelman, 1967:20. Cf. também Kindennann, 1988:238; 011"e, 1976: 194. Kindennann, 1988:239. Analogamente, refete-se I legenhal 111 ( I 9g I :
IXs. 202) a leis que se dirigem simultaneamente a fins antitéticos
188. Kindermann, 1988:238. 195. Cf. Schmitt, 1970:31ss. (tr. esp., 1970:365s).
189. Edelman, 1987:38. 196. Aubert, 1967. Cf também Lenk, 1976:148.; Kindennann, 1988:228,
190. Cf. Kindermann, 1989:269; Hegenbarth, 1981:201. 230 e 239.
191. Kindermann, 1989:270. 197. Aubert, 1967:285; Kindermann, 1988:228.
192. Kindermann, 1989:270, 1988:235. 198. Aubert, 1967:302; l,enk, 1976:149.
193. Kindennann, 1989:270. 199. Lenk, 1976:149. Cf. Aubert, 1967:296ss.

40 4I
conflito social subjacente. co".
Inicialmente elevemos distinguir entre obscrváncia e imposieáo (ou
CXCCUQáO cm sentido cstrito) das leis: a obscrváncia significa que se agiu
8. Eficácia e Efetividadc das Lcis versus Efebos Rcais da Legislaláo
Simbólica conforme a norma legal, sem que essa conduta esteja vinculada a uma
atitude sancionatória impositiva; a CXCCUQáO (ou imposieáo) surge exa-
As consideraeóes aprescntadas no item anterior implican] a rejcieáo tamente como reaQáo concreta a comportamentos que contrariam os
da concepeáo simplista da inexisténcia ou irreleváncia social da legis- preceitos legais, destinando-se á manutenQáo do direito ou ao restabele-
Inflo ou dos textos legais carentes de eficácia normativa. Nesse sentido cimento da ordem violada2". Assim é que a observáncia diz rcspcito á
"norma primária" e a CX.CCUO0 cm sentido estrilo ou imposieáo refere-
é que Aubert, cm set' já mencionado cstudo, fez a distineáo entre fun-
se á "norma sccundária", partes da norma que atribucm conseqüéncias
elles sociais manifestas e latentes da legislaeáo2''. A legislaeáo simbólica
dcómicas, respectivamente, á conduta lícita (ou Lamben] a tatos jurídicos
tcria, cntáo, cfcitos sociais latentes; cm muitos casos bcm mais relevan-
cm sentido estrilo) e ao ato ilícito2". A cficácia pode decorrer, conse-
tes do que os "cfcitos manifcstos" que lhe faltaram. Entretanto, a utiliza-
qüentementc, scja da observáncia da lel ou de sua imposiQá06. Numa
00 indiscriminada do termo `cficácia" e 'efctividade' cm relaeáo legis-
acep9áo estritamente jurídica (náo do ponto de vista da accitaQáo mo-
laeáo simbólica pode embaraear a compreensáo de quais os seus efeitos
ralmente fundamentada) seria possível, entáo, distinguir-se entre eficá-
específicos. Além do mais. há efeitos latentes que náo importam funeáo
simbólica da lei. Por isso pretendemos a seguir aprescntar um quadro cia autónoma (por observáncia) e efícácia heterónoma (por imposi0o de
tipológico dos efcitos da legislaeáo. terceiro) de um preceito normativo. Aqui náo se concebe. portanto. a
restriQáo do conceito de cfícácia á observáncia "autónoma". no sentido
de abordar-se a questáo especificamente na perspectiva da possivel jus-
8. I. Eficacia como C'oncretizaefio Normativa do Texto Legal teza da norma jurídica2v. Também a superestimaQáo da observánciam

204. Lultinann, 1987b:267. Cf. também Garrn, 1969:168s.., Noll, 1972:259.


Distingue-se tradicionalmente a cficácia no sentido técnico-jurídico
205. Sobre a distincifio entre norma primária e norma secundária, v. Geiger,
da eficácia cm sentido "sociológico"2"1. A primcira refere-se á possi-
1970:144ss. Cossio empregava, respectivamente, os termos `endononna. e 'pe-
bilidadc jurídica de aplicaeáo da norma, ou mclhor, á sua aplicabili-
rinonna'; para acentuar que se trata de dois componentes disjuntivamente vin-
dadc, exigibilidade ou executoriedade. A pergunta que sc póc é, nesse
culados de unta única norma (cf. Cossio, 1964:esp. 661s.). Kelsen titilizava, in-
caso, sc a norma preenchcti as condieóes intra-sisrémicas para produzir
os scus cfcitos jurídicos específicos?". No sentido "empírico", "real" ou versamente, as express6es 'norma secundária' (-> observáncia) e 'norma pri-
"sociológico" - acolhido, no cntanto, na "Tcoria Pura do Dircito"2" nária'Otonna sancionadora), em face de stta superestimayfio do momento san-
--, a eficácia diz respeito conformidadc das condutas á norma. A cionatório para a identifícala() do fenómeno jurídico (cf. Kelsen, 1966:5Is.,
pergunta que se coloca é. cntáo, sc a norma foi realmente "observa- 1946:60s., 19130:52 e 124-27). Em perspectiva lógica, Vilanova (1977:64s. e 90)
da". "aplicada", "executada" (imposta) ou "usada". É cssa questáo que rejeita a inversfio conceitual em Kelsen e mantém os adjetivos `primário' e 'se-
nos intcressa aqui. ou seja, o problema da eficácia cm sentido "cmpíri- cundário' no sentido usual, enfatizando designarem unta reina() de antecedente
e conseqüente lógicos no ámbito da norma
200. Aubert, 1967. A distinOo entre funlbes latentes e manifestas remonta 206. Cf. Geiger, 1970:70.
207. Assim, porént, Ryffel, 1972:228; v. também idem, 1974:251 58. A -
a Merton, 1968:105 e 114ss. A respeito, cf. também Treves, 1978:169s.
respeito, criticamente, Blankenburg, 1977:33ss.
201. Cf. Neves, 19811:51s.
208. Cf. Garrn, 1969:169. Equívoca é, porém, a posiláo de Garrn, o qual,
202. Cf. RottleutImer, 1981:92; Silva, 1982:55s.; 13orges, 1975:42-44.
203. Cf. Kelsen, 1960:10s e 215ss. (tr. port., 1974:29-31 e 292ss.), 1946. em contradi9Oo com stta aftnnayao de que "unta 'tonna é CfiCaZ guando é ob-
39s. servada ott executada" (168), escreve:"Ela só pode mostrar-se como eficaz por ser

42
43
ou a énfase na "eficacia regulativa" 2°9 náo é de admitir-se, na medida tejam estreitamente vinculadas, existem, porém, atividades de aplicacáo
em que assim se desconhece o significado da eficácia através de imposi- que náo cstáo relacionadas com execucáo do Direito cm sentido cstrito,
como, por cxcmplo, no caso da jurisdicáo voluntária. A diferencial:á°
QáO (execucáo). A ineficacia só se configura, por conscguinte, na hipóte-
entre execucáo e aplicacáo (polícia e outros órgáos de execucáo versus
se da náo ocorréncia de nenhuma das duas alternativas de concrecáo da
juízes e tribunais) implica que surjam discrepancias entre esses dois mo-
norma legal, ou seja, no caso de tanto "norma primaria" quanto "norma
mentos da concretizacáo do Direito. Na medida em que a "norma indi-
secundária" fracassarem 210.
vidual" (do órgáo aplicador da lei) constitui "uma mera possibilidade",
Como os conceitos de execugáo (imposicáo) e observancia adquirem
estará sempre presente a hipótese de que nem a parte condenada nem os
aqui um sentido estrito, pode-se introduzir nesse ponto duas outras no-
funcionários competentes para a execucáo conduzam-se de acordo com
caes: `aplicagáo do Direito' e 'uso do Direito'. Da mesma maneira que a
o seu conteúdo213. A consonancia entre producáo e aplicacáo de normas
execugáo, a aplicacáo do Direito exige, em ordens jurídicas positivas, o
gerais náo é suficiente, portanto, para que se caracterize a eficácia do
agir de um terceiro, o órgáo competente, em face dos destinatários da
norma. Porém, a execucáo em sentido estrito consiste numa atividade Direito: a falta de observancia e/ou de execucáo (cm sentido cstrito)
impositiva de fato, enquanto a aplicacáo normativa pode ser conceituada poderá, também nesse caso, quebrar a cadcia de concretizacáo normati-
va.
como a criacáo de uma norma concreta a partir da fixacáo do signifi-
Uma outra distincáo relevante para o problema da eficacia das Iris é
cado de um texto normativo abstrato cm relacáo a um caso determinado, a que se estabelcce entre obscrváncia e uso do Direito. A observáncia
incluindo, na concepcáo de Müller, náo só a producáo da "norma de refere-se ás "regras de conduta", isto é, ás obrigagóes e proibigóes; o
decisáo" (individual) 2 u, mas também a producáo da "norma jurídica" uso, ás "ofertas de regulamentacao" 2 ". Náo estando presentes as condi-
(geral) aplicável ao caso 212 . Embora aplicacáo e execugáo normativa es-

c ceec ce ec ee ec o e eop o 4i
cóes ("infra-estrutura") para o uso das ofertas de regulamentacáo legal-
mente postas, pode-se falar, entáo, de ineficacia normativa. Porém,
observada" (169), de tal maneira que sua execucáo (imposigáo) implica exclu- nesse caso, nao se trata de respeito, violacáo ou burla de preceito legal,
sivamente a eficácia (observáncia) da respectiva "norma secundária" (norma de mas sim de uso, desuso ou abuso de textos legais que contém oferta de
execugao) (169s.). É verdade que `observá'ncia' e `execucáo' (`hnposigáo') cons- auto-regulamentagáo de relacóes intersubjetiva0 5.
tituem conceitos relativos, na medida em que a imposigáo (execucáo) de urna A eficácia da lei, abrangendo situacóes as mais variadas — obser-
"norma primária" através de sua correspondente "norma de exectu,:ao" importa vancia, execucáo, aplicacáo e uso do Direito, pode ser comprcendida
a observáncia dessa última; deve-se, porém, acrescentar-se: na perspectiva de genericamente como concretizacáo normativa do texto legal. O nosso
sua observáncia/náo-observáncia, a última náo constitui mais "norma de execu- conceito de concretizacáo é mais amplo do que o formulado por Midler,
gáo" ("norma secundaria"), mas sim uma "norma primária", á qual, por sua vez, conforme o qual o "processo de concretizacáo" restringe-se á producáo
corresponde urna "norma secundária". da "norma jurídica" (geral) e da "norma de decisáo" (individual) na
209. Cf. Kramer, 1972:254ss. resolucáo de um caso determinado 216. No sentido cm que o concebentos,
210. Com isso náo se desconhece o seguinte: "uma norma que relativamen-
te aos destinatários normativos primários náo é mais regulativamente eficaz, 213. Kramer, 1972:255. Nesse sentido, náo cabe reduzir o conceilo de cli-
mas sim apenas repressivamente, a longo prazo cairá de todo — também re- cácia á "disposigáo para a aplicagáo", como pretende liulygin, I965:53ss.
pressivamente — em desuetudo" (Kramer, 1972:256). 214. Blankenburg, 1977:36s. Bulygin (1965:45ss.) propóe urna distingáo
211. Cf. Garrn, 1969: 169s. Em Kelsen a "aplicagáo" inclui a atividade inteiramente diferente entre "observáncia e uso de normas", sengudo a qual a
executória da sancáo — cf. Kelsen, 1960:11 e 240 (tr. br., 1974:30 e 325); a "aplicagáo" constitui um caso típico de "uso", a saber, "é definida como uso das
respeito, criticamente, Garrn, 1969:169s. normas para a fundamentaláo de decisóes jurídicas"(40).
212. Cf. Müller, 1984:263ss. Aqui é de se observar que a "Teoria Pura do 215. Cf. F'riedman, 1972:207s.; Blankenburg, 1977:37.
Direito" já acentuava a relatividade dos conceitos de aplicacáo e criacáo do 216. Cf. Müller, 1984:263. De acordo com Miiller (p. ex., 1984:269),
Direito — cf., p. ex., Kelsen, 1960:240s. (tr. br., 1974:325s.), 1946:132s., também a norma jurídica só vem a ser prodmida cm cada caso.
1966:233s.; a respeito, v. Kramer, 1972:247ss.

45
44
o proccsso de concretiznáo normativa sofrc bloqucios cm toda e qual- se, entáo, efetividade. inefetividade e antiefetividade de sua atunao 221 .
quer situnáo na qual o conteúdo do texto legal abstratamente positivado Uma leí destinada a combater a infia0o, por exemplo, será eft.tiva guan-
é rejeitado, desconhecido ou desconsiderado nas internóes concretas do a inflaQáo for reducida relevantemente por forQa de sua eficacia (ob-
dos cidad5os, grupos. órgáos estatais, organizaCes etc.; inclusive, por- serváncia, aplicaQáo, exccuQáo, uso). Entretanto, o vínculo "se-entáo"
tanto, nas hipóteses de inobserváncia ou inexecwáo da "norma jurídica" previsto abstratamente numa Iei antiinflacionária pode estar sondo regu-
(geral) e da "norma de decisáo" (individual) producidas em um caso ju-
larmente concretizado nas relaQóes em interferéncia intersubjetiva, sem
rídico determinado, como também guando °correr desuso ou abuso de
que hija qualqucr modificnáo significativa no aumento dos presos;
"ofertas de regulamentnáo". Entretanto, o proccsso concretizador náo
tem-se, portanto, eficácia sem efetividade. E há lamben -1 a possibilidade
deve suscitar, de mancira nenhuma, "a ilusáo da plena correspondéncia
de que a legislaQáo antiinflacionária (para permanecer no exemplo) soja
do abstrato c do concreto", mas sim, como problema, "a ser resolvido
intensamente eficaz, mas provoque urna relevante alta de prews, impli-
através de uma forma de náo-identidade integrada do abstrato e do con-
cando portanto antiefevetividade.
creto-217 . Retornaremos a esse tema ao abordarmos especificamente a
Para finalizar, queremos advertir que tanto 'eficácia' quanto 'efeti-
relaQáo entre texto constitucional e realidade constitucional (Cap. 11.2).
vidade' sáo conceitos relativos, graduais. Nos casos, porém, cm que a
ineficácia e/ou inefetividade atingem um gran muito elevado, impli-
cando que as expectativas normativas das pcssoas e dos órgáos estatais,
8.2. kletividade como Realizaeño da Finalidade da Lei de uma forma generalizada, náo se orientara pela "norma" legisla-
tivamente posta, encontramo-nos diante de falta de vigéncia social da Ici
Da eficácia, compreendida como mera conformidade dos compor- ou de caréncia de normatividade do texto legal (cf. subitcm 8.4 deste
tamentos ao conteúdo (alternativo) da norma. tem-se procurado distin- cap.).
guir a efetividade, sugerindo-se urna referéncia aos fins do legislador ou
da lel'''. Formulando com outras palavras, pode-se afirmar que a eficá-
cia diz respeito á realiznáo do "programa condicional", ou soja. á con- 8.3. Pjeitos Indirelos e Latentes da Legislaeño
creQáo do vínculo "se-entáo" abstrata e hipoteticamente previsto na
norma legar', enquanto a efetividade se refere á implementaQáo do A eficácia e a efetividade náo esgotam o problema dos efeitos da
"programa finalístico" que oricntou a atividade legislativa, isto é, á con- legislaQáo. As normas legais produzem efeitos indirctos ou latentes que
cretizaQáo do vínculo "mcio-fim" que dccorre abstratamente do texto le- podcráo estar vinculados ou náo á sua efetividade c eficácia.
ga 220 . Em primeiro lugar cabe distinguir as conseqüéncias da legislaQáo
Especificamente quanto aos fins das normas jurídicas, distinguem- na sua conexáo com outros fenómenos sociaism. ASSilll é que se discute
sobre a utilidadc e o significado económico de normas jurídicas 223 . Urna
217. Luhmann, 1974:52. lei tributária, por exemplo. pode ser intensamente eficaz e efetiva, mas
218 Capella, 1968:105; Jeammatid, 1983:53s. Cf Glasvrin et al., 1982. produzir recessáo, desemprego e/ou inflnáo. Também no concernente á
Noll (1972:261) denomina-a "eficacia social". arte, ao amor. ás relaQóes familiares, os efeitos indirctos de uma lei po-
219. Sobre programacáo condicional como particularidade do Direito po- dem ser bastante significativos. Urna lei que amplie os casos de permis-
sitivo, v. Luhmann, 1987h:227-34, 1981 b:140-43, 1981 c:275ss., 1973a:88ss. sáo de aborto inegavelmente terá forte influéncia sobre as relaQóes amo-
(esp. 99); Neves, 1992:29. rosas e familiares. Urna legislaQáo que imponha censura aos meios de
220. Quanto á relacáo recíproca entre programa condicional e programa comunicaQáo terá conseqüéncias sobre a criaQáo artística.
linalístico para a legitimacáo do Direito positivo, v. Luhmann, 1983a:130ss.,
I 973a: I O l ss. 221. Cf. tilasyrin et al., 1982:49 52.
-

222. Cf. Illankenburg, 1977:41.


223. A respeito, v. Glasyrin et al., 1982:52-60.

u
u 46 47
No plano do dircito penal, fala-se da hinca() ou cremo criminógeno ta, a participacáo na elaboracáo dc um antcprojeto de código civil, códi-
da própria lei penal224. Poder-se-ia objetar que se trata aqui de um caso go penal, código tributário ctc. pode implicar a sua consagracáo no 'nejo
de antiefetividadc. Mas a hipótese é mais abrangentc. A pesquisa crimi- académico e profissional. Uní burocrata que elabora um importante pro-
nológica aponta situacóes cm que a atuagáo coercitiva do aparclho esta- jeto de lei terá maior chances de galgar na estrutura administrativa.
tal contra a criminalidade juvenil leva a estrellar os lagos entre os res- Também muito relevante é a atividade legislativa para a carreira políti-
pectivos jovens, que, em reacáo, passam a praticar atos puníveis mais ca. Em todas essas hipóteses, a aprovagáo da respectiva lei importa
graves225. Em muitos casos, á promulgacáo de uma nova lei penal se- igualmente a satisfacao pessoal do seu "elaborador"232. É evidente que,
guem-se contra-reacóes, atos de resisténcia e de ajuda aos autores, im- nesses casos, a legislacáo pode ser simplesmente simbólica. Mas os efei-
plicando outras condutas puniveis226. Por fim, entre os penalistas consi- tos positivos da legislagáo para o elaborador da lei, especialmente para
dera-se como incontroverso que a criminalizacáo de uma conduta tem
juristas e burocratas, tendem a ser tanto mais intensos quanto maior for
freqüentemente por conseqüéncia a prática de novos atos puníveis para
a sua forca normativa.
sua eXeCUQáO e encobrimento, incluindo-se também a extorsáo227.
Do ponto de vista psicanalítico, sustenta-se que a legislacáo pode
constituir um processo de estabilizacáo do ego, mesclando-se aí variá- 8.4. Efeitos da Legislaqeio Simbólica
veis instrumentais e simbólicas228. No campo do direito penal, tem-se
indicado que a legislacáo serviria para satisfazer, de forma sublimada, a A legislacáo simbólica é caracterizada por ser normativamente ine-
"necessidade de vinganca" do poyo, evitando-se, entáo, a justica por lin-
ficaz, significando isso que a relacáo hipotético-abstrata "se-entáo" da
chamento229. Analogamente, satisfaz-se por leis punitivas ou restritivas
"norma primária" e da "norma secundária" (programacáo condicional)
de direitos á necessidade de "bodes expiatórios", estigmatizando-se de-
náo se concretiza regularmente. Náo é suficiente a náo-realizacáo do
terminados membros da sociedade e descarregando-se outros de respon-
vínculo instrumental "meio-fim" que resulta abstratamente do texto le-
sabilidade ou sentimento de culpa23°. Porém, nessa hipótese, em náo ha-
gal (programa finalístico) para que venha a discutir-se sobre a funcáo
vendo eficácia dos preceitos legais, estaremos num típico caso de Icgis-
hipertrofícamente simbólica de uma lei. Sendo eficaz, ou seja, regular-
lacáo simbólica.
mente observada, aplicada, executada ou usada (concretizacáo norma-
Um relevante efeito indireto da legislacáo é aquele que cla excrce
tiva do texto legal), embora incfctiva (náo - realizacáo dos fins), náo cabe
com relagáo a quem elabora o respectivo projcto de lei23'. Para uní juris- falar de legislacáo simbólica.
Entretanto, como tém salientado os sociólogos do Dimito, "eficacia"
224. CE Schild, 1986:200s., tratando da "furnia° criminógena" da legisla-
é um conceito gradual, mensurável (quota de observáncia e de execu-
cao penal.
gáo)"3. Qual o grau de ineficácia normativa entáo necessário, para que
225. Schild, 1986:201. -
se atribua a uma lei efeitos hipertroficamentc simbólicos (legislacáo
226. Schild, 1986:201.
simbólica)? Parece-nos que a resposta se encontra, porém, náo numa
227. Schild, 1986:201.
quota de ineficácia mensurável, mas sim no problema da falta de vi-
228. Cf. Schild, 1986:200.
géncia social da norma. Expliquemos a seguir.
229. Schild, 1986:200. Através-de pesquisa sociológico-jurídica, C. Solito e
Considerando-se que constituem flItlOCS do sistema jurídico tanto a
T. Souto (1991) procuram demonstrar que a falta de eficacia da legislacao penal
em áreas do interior do Nordeste do Brasil está vinculada á prevaléncia da
"direcáo da conduta" quanto o "asseguramento das expectativas"234, a
vinganca (privada) sobre os modelos punitivos do Direito Penal Positivo. Numa
eficácia diz respeito á primeira, enquanto a vigéncia (social) se refere á
perspectiva psicanalítica, poder-se-ia afinnar que a lei penal nao responde, de
232. Schild, 1986:202.
fonna "sublimada", "civilizada", á "necessidade de vinganca" do poyo.
233. Cf Carbonnier, 1976: 99-111; Geiger, 1970: 228ss.
230. Schild, 1986:200.
234. Luhmann, 1981d, onde se trata especialmente da tensa() entre essas
231. Cf. Schild, 1986:201s.
duas fungaes.

48
49
segunda. Embora a eficacia scja mensurável, a vigéncia náo pode scr texto legal náo é apenas incapaz de dirigir normativamente a conduta,
medida através de um "cálculo de vinculatoriedade" baseado na "quota caracterizando-se principalmente por náo servir para orientar ou assegu-
de eficácia"2"; apesar de sua relatividadc no sentido sociológicon6, a rar, de forma generalizada, as expectativas normativas. Falta-lhc. por-
"vigéncia do direito" é um problema que se cncontra no plano do tanto, normatividade.
"vivenciar". ao contrario da questáo da eficacia, que muge no plano do A legislacáo simbólica náo sc delincia, quanto aos efeitos, táo-so-
"agir"2". O fato de que a vigéncia (social) náo pode ser reduzida a uma mente num sentido negativo: falta dc eficacia normativa e vigéncia so-
funcáo da "quota de eficacia" náo exclui que cssa quota condicione a cial. Há atos de legislacáo e textos normativos que tém essas caracterís-
vigéncia das normas jurídicas e vice-versa, pois "nenhum vivenciar é ticas, scm que desempenhem qualquer funcáo simbólica. Basta lembrar
acessível sem o agir, ncnhum agir é compreensível sem consideracáo do o fenómeno do desuso, o qual atinge a própria "validadc" (pertinéncia)
vivcnciar do agente""8. A capacidadc do sistcma jurídico de dirigir con- da norma cm sentido técnico-jurídicom. A legislacáo simbólica define-
dutas cm interferéncia intersubjetiva e sua capacidade de assegurar ex- se também num sentido positivo: cla produz cfcitos relevantes para o
pectativas normativas encontram-se em relacáo recíproca. O problema sistema político, de natureza náo especificamente jurídica. Náo se dis-
de como estáo se comportando as pessoas e a questáo da orientacáo das tingue da legislacáo instrumental por náo exercer influéncia sobre a
expectativas de comportamento pressupóem-se e complementam-se mu- conduta humana, mas sim pela forma_ como exerce cssa influencia e
tuamente "9. pelo modelo de comportamento que influencia-2". Conforme o tipo de
Urn gran muito acentuado de ineficacia pode significar que náo há legislacáo simbólica, variará°, porém. os scus cfcitos.
orientacáo generalizada das expectativas normativas de acordo com a No que concerne á legislacao destinada á confirmacáo de valores
leí, scja isso tanto por parte dos cidadáos, organizacóes, gnipos, quanto sociais. podc-sc distinguir trés cfcitos socialmente relevantes. Ein pri-
por iniciativa dos órgáos cstatais (falta de vigéncia social). Se partimos miro lugar, trata-se de atos que SCR'CM para convencer as pcssoas e
de que a funcáo primária do Direito "náo reside na realizacáo de deter- grupos da consisténcia do comportamento e norma valorados positiva-
minado comportamento, mas sim no fortalecimento de determinadas mente, confortando-as e tranqüilizando-as de que os respectivos senti-
expectativas"24°, pode-se afirmar que a legislacáo simbólica só tem lugar mentos e intcresses cstáo incorporados ao Direito c por ele garantidos2".
guando a vigéncia social da norma legal, ou seja, a sua funcáo de Em segundo lugar, a afirmacáo pública de tima norma moral pelo legis-
"congruente generalizacáo de expectativas normativas""' é atingida. O lador, mcsmo que !he falte a específica eficacia normativo-jurídica. con-
duz as principais instituicóes da socio:la& a servir-lhe de sustentacáo.
235. Cf., em sentido contrário, Geiger, 1970:71s. e 209s.; acompanhando o,
-
de tal mancira que a conduta considerada ilegal tem mais dificuldade de
Teubner, 1989:212. impor-se do que um comportamento lícito; vislumbra-se aqui funcáo
instnimental para o Dircito. inesmo cin havendo "cvasáo padroni-
236. Cf. Weber, 1985:17.
zada"2". Por fini. a legislacáo simbólica confirmadora de valores sociais
237. Para a distingáo entre "vivenciar" (Erlehen) e "agir" (Handeln), v.
distingue, com relevancia institucional. "quais as culturas tém legitima-
1,illimann, 1981e; Kiss, 1986:12-15. 00 e dominacáo pública" (dignas de respeito público) das que sáo con-
238. Ltilimann, 1981f85.
sideradas "desviantes" ("degradadas publicamente"), sendo. portanto,
239. Cf. 131ankehurg, I 977:35
geradora de profundos conflitos entre os respectivos grupos2".
240. ',William), I 981 h:118
241. Conforme a detinigáo de Direito formulada por Lulunann: "...estru-
242. Cf. Kelsen, 1960:220 (tr. br. I 974:298s.). A respeito da rehíla° da efi-
tura de um sistema social baseada na generalizaedo congruente de expectativas
cácia com a pertinencia e a validade em sentido técnico-jurídico, v. Neves, 1988:
normativas de comportamento" (1987b: 105). Ou simplesmente: "expectativas
49-52.
normativas de comportamento congruentemente generalizadas" (1987b: 99).
243. Cf. Kindennann, 1989:257
Formulando de maneira diferente, afirma-se que "o Direito preenche amplas 244. Gustield, 1967:177
fungáes de generalizagáo e estabilizagáo de expectativas normativas" (1974: 245. Gusfield, 1967: I 77s.
24). 246. Guslield, 1967:178.

50 51
A legislagáo-álibi é um mecanismo com amplos efeitos político-
ideológicos. Como já enfatizamos acima, descarrega o sistema político
de presseles sociais concretas, constitui respaldo cleitoral para os res-
pectivos políticos-legisladores, ou serve á exposigáo simból10 das insti-
tuigóes estatais como merecedoras da confianga pública. Capítulo 2
O efeito básico da legislagáo como fórmula de compromisso dilató-

coc ce e c c ee e c o e c0 0 0. , oco 'no n oz r-/, t


rio é o de adiar conflitos políticos sem resolver realmente os problemas ...Á CONSTITUCIONALIZACÁO SIMBÓLICA:
sociais subjacentes. A "conciliagáo" implica a manutengáo do status quo ABERTURA DE UM DEBATE
e, perante o público-espectador, urna "representagáo"rencenagáo" coe-
rente dos grupos políticos divergentes.
I. Constituiyáo e Constitueionaliznáo

1.1. O Problema da Plurivocidade

Quando falamos em constitucionalizaQáo admitimos, implícitamen-


te, ordens jurídicas ou Estados sem Constituigáo. Ao definir-se Consti-
tuigáo, partilha-se correntemente a idéia de que todo o Estado tcm urna
Constituigáo real e/ou normativa. E mesmo (iando se nega caráter
constitucional a certos Estados, a discussáo é reduzida a um problema
de axiologia do Estado e/ou do Direito, tratado nos termos do constitu-
cionalismo.
Assim como muitas outras expressóes da semántica social e política,
o termo `Constituigáo' caracteriza-se sincronicamente pela plurivocidade
e diacronicamente pela mutagáo significativa. Em trabalho anterior, já
abordarnos essa questáo da pluralidade de sentidos'. Os manuais, cursos
e "tratados" de Direito Constitucional e Teoria do Estado, muitas vezes
sem a devida clareza na distingáo conceitual, propóem-se freqüentemen-
te a uma exposigáo abrangente da variagáo do sentido ou da diversidade
de conceitos de Constituigáo 2 . Náo é este o lugar para mais uma abun-
dante explanagáo do inumerável acervo de defínigóes. Porém, tanto em
virtude da variagáo de sentido do conceito de Constituigáo no tempo, ou
seja, á sua semántica histórico-política 3, particularmente na iransigáo

1. Cf. Neves, 1988:53ss.


2. Cf., p. ex. Canotilho, 1991: 59-73, Biscaretti di Rutila, 1973:148-53,
1974:433-440; Pinto Ferreira, 1962:27-4(1, 1975:408-15; García-Pelayo, 1950:
29-48; Bastos, 1981:38-42, 1988; J. A. Silva, 1982:9-29. Ver tainhém referén-
cias da nota 14 deste cap.
3. A respeito, cf. Maddox, 1989; Mcllwain, 1940, BückenfOrde, 1983; Me-
lo Franco, 1958:43-61; Stourzh, 1975 ou 1989.

53
52
para o Estado Moderno'. como também cm face da persisténcia de con- vra inglesa `government' 9, o conceito aristotélico vai desempenhar um
ceituacóes relevantes no presente. é importante unía abordagem preli- importante papel até o início dos tempos modernos 10. Porém, na transi-
minar a respeito da discussáo tradicional sobre os conceitos de Consti- QáO para a sociedade moderna, abriu-se urna nova constelacáo semán-
tuicáo e suas variacóes históricas'. tica, no ámbito da qual Constituicáo será conceituada como carta de li-
berdade ou pacto de poder". Em contraposiQáo ao caráter apenas
"modificador do poder", "casuístico" e "particular" dos pactos de poder,
1.2. O Debate Correate sobre O Concedo dé Constilui0o surge, no quadro das revolucóes burguesas dos fans do século XVIII, o
constitucionalismo moderno, cuja semántica aponta tanto para o sentido
A discussáo sobre o conceito de Constituicáo remonta a Aristóteles. normativo quanto para a fun9áo "constituinte de poder", "abrangente" e
Nele, a Constituicáo (polilela) era concebida, num sentido muito abran- "universal" da Constitui9áo".
gente. como a ordem da polis:"... Constituicáo é a ordem (taxis) dos Es- A esse uso lingüistico inovador, vinculado ás transformas ks revo-
tados era rclacáo aos cargos govcrnamentais (arché), corno eles sáo de lucionárias 13, náo se seguiu, contudo, de maneira nenhuma, univocidade
distribuir-se, e á determinacáo do poder governamental supremo no Es- em relaQáo ao conceito de ConstituiQáo. Ao contrário, fortificou-se desde
tado. como também do fim (lelos) da respectiva comunidade (koi- o surgimento do Estado moderno liberal o problema da plurivocidade da
tionía)"". Conforme essc conceito de organizacáo da polis, o qual incluía palavra 'ConstituiQáo'. Isso manifestou-se sobretudo na clássica Teoria
elementos estruturais e teleológicos', Constituicáo c Estado podiam ser alemá do Estado e da ConstituiQáo; mas, apesar da pluralidade de con-
equiparados'. Sem desconhecer que somente a partir dos fins do século ceitos que foram formulados entáo", eles sáo suscetíveis de ser classifi-
cados cm quatro tendencias fundamentais, que podem designar-se res-
XVIII tornou-se correrte, nas traducóes de Aristóteles. verter `politeia'
pectivamente através das palavras-chave 'sociológica', `jurídico-norma-
cm ConstiMiQáo' prevalecendo anteriormente a tradugáo pela pala-
tiva', 'ideal' e 'cultural-dialética', e que até hoje ainda desempenham
um papel importante nos estudos em torno de Estado, Direito e Cons-
4. Cf. Luhmann, 1990a:176s. Enpregamos aqui a expressáo "semántica his-
tituiQáo.
tórico-política - para nos referir á conexáo entre mulato de sentido dos con-
A defíniQáo "sociológica" clássica de Constituicáo, formulou-a Las-
ceitos e translimitado da estrutura social (cf. Luhmann, I 9g0:19, nota 13).
5. A respeito, v. Neves, I 992a:45ss., de onde retiramos, cm linhas gerais,
9. Stourzh, 1975:101ss. oil I989:5ss.
os elementos da exposigáo que se segue.
10. Cf. Stourzh, 1975:99ss. oil 1989:3ss.
6. Aristóteles, I968:124s. (IV, I, 1289a), cf. lamben 80 (III, 1, 1274h) e
11. A respeito, cf. Bückenfürde, 1983:7ss.
91s. (III, 6, I278b). Na edi4ito bilingüe grego-espanhol organizada por J. Martas
12. Grimm, 1987a: esp. 48ss. Cf. também idem, 1989:633s.
e M. Araújo (Aristóteles, 1951), o termo 'milicia' é traduzido, na passagem ci- 13. "Concentrando-se nas quest8es da política relativa a conceitos e da
tada, por 'régimen político' ( I67s.). Mas nos dois outros trechos aos quais fize- inovagáo semántica, entáo é fácil reconhecer que transformagóes revolucionári-
mos referencia traduz-se a mesura palavra por 'constitución' (67 e 78). nal po- as motivara um uso lingüístico inovador" (Luhmann, 1990a:177). A respeito, cf.
deria deduzir-se que titila unidade terminológica a essa famosa versáo espa- Skinner, 1989.
nhola. Mas, como observa I3ordes (1967:436) - analisando a variagáo do
14. Cf., Schmitt, 1970:3ss.; Heller, 1934:249ss., esp. 274-76 (tr.br .,
significado de `politeia . no pensamento grego náo só no conjunto da obra de
1968:295ss., esp. 322-24). Conforme Vilanova (1953: esp. 19 e 98s.), essa plu-
Aristóteles, mas no interior da própria "Política", aparecem "contradigóes
ralidade de conceitos de Constituicáo seria de atribuir-se, sob prisma kantiano,
mesmo, que o autor nao procurou eliminar".
á complexidade do dado. Segundo Luhmann (1990a: 212), em contrapartida, as
7. Portanto, embora se retira á comunidade política tal "como ela realmente
diferentes definic5es de Constituiláo formuladas no ámbito da Teoria do Estado
é", isto é, seja um termo descritivo (Mcllwain, 1940:28; Maddox, 1989:51),
alemá teriam servido simplesmente para encobrir o déficit em relagáo á capaci-
-politeia' tem itnplicagües axiológicas.
dade de compreender claramente ou esclarecer "a fungáo própria e, dal, também
g. Smend, 1968:196. Cf. Aristóteles, 1968:85 (III, 3, 1276b).
o conceito de Constituiláo".

5-1 55
salle em sua célebre conferéncia de 1862: "as relagóes de poder realmen- Em oposigao á concepcáo "sociológica" clássica, apresenlain-se os
te existentes em um país"". Náo se tratava de uma conceituagáo pio- conceitos exclusivamente jurídico-normativos de Constituigáo, nos ter-
neira, como o dcmonstra a análise anteriormente (1844) apresentada por mos da Teoria Pura do Direito: "o escaláo de Dircito positivo mais ele-
Engels sobre a Constituigáo Inglesa'6; mas se destacou pela simplicidade vado" (Constituigáo cm sentido material) ou as normas jurídicas que,
e clareza, o que !he possibilitou ampla divulgagáo. Por outro lado, náo em comparagáo com as leis ordinárias, só podem ser revogadas ou alte-
se manteve isolada nos limites do movimento socialista, como o com- radas através de um procedimento especial submetido a exigéncias mais
prova o fato de ter sido adotada expressamente por Weber'7. Deno- severas (Constituigáo em sentido formal)". Nessa perspectiva, pressu-
minaram-na "histórico-universal", no sentido de que "todos os países póe-se uma identifícagáo entre ordenamento jurídico e Estado", como
possuem ou possuíram sempre, e em todos os momentos de sua história, também a norma é concebida como objeto ideal, mais precisamente,
uma constituigáo rear9. sentido objetivo-idea/ de um ato de vontade". Embora náo se proponha
Mas Lassalle náo se limitou a isso, havendo reduzido o conceito de com isso uma identidade de norma e texto normativo", desconhece-se a
Constituigáo á sua dimensáo simplesmente sócio-económica, ao consi- realidade das expectativas normativas constitucionais como elementos
derar as normas jurídicas constitucionais como mera expressáo da estruturais da Constituigáo jurídica, o que torna o modelo teórico Kel-
Constituigáo "real", da qual seriam absolutamente dependentes, sem seniano inapropriado para uma abordagem referente á funcionalidade
qualquer reagáo condicionadora26. Essa postura "sociologista" (ou mes- do Direito constitucional, ou seja, á forga normativa do texto constitu-
mo "economicista") e "mecanicista" de Lassalle desconhece que o orde- cional. Porém, na medida em que a Teoria Pura do Direito, em con-
namento (normativo-jurídico) constitucional tem uma relativa autono- traposigáo a °Litros enfoques jurídico-dogmáticos, reconhece que uní o
mia em face do processo real de poder, condicionando-o em certa medi-
da. Náo observa que os fatores "materiais" de poder e a ordem "jurídi-
certo gran de "eficácia" do ordenamento jurídico e de unía norma sin-
gular é condigáo de sua "vigéncia" ou "validade" ("existéncia jurídi-
e
ca" constitucional encontram-se em relagóes permanentes de implicagáo ca")", ela já deixa um espago aberto - sem que cssa scja a sua vertente o
recíproca, principalmente através da delimitagáo de fronteiras2'. Por ou- - para uma interpretagáo sociológico-jurídica da relagáo entre `vigén-
tro lado, L,assalle sugeria uma equiparagáo entre texto e norma consti-
tucional'', e partia do pressuposto de que normas constitucionais náo 23. Kelsen, 1960:228-30 (tr. br., 1974:310-312), 1946:124s., 1966:251-53,
constituíam realidade. Dessa maneira, a atividade constituinte náo é com variag5es em relagáo ao conteúdo da "Constituiyáo em sentido material"
compreendida como um processo de filtragem de expectativas normati- (cf. Neves, 1988:56s.). Partindo de que "é um problema contingente de classifi-
vas de comportamento e, portanto, a constituigáo náo é concebida como cagáo estabelecer que normas se váo considerar Constituigáo material de um
Estado" (Vernengo, 1976:310), muitos autores foram levados, na tradicional
expectativas normativas vigentes (v. sub item 1.3 deste cap.).
discussáo da Teoria do Estado, a atribuir apenas ao conceito de "Constituigáo
c,
15. Lassalle, 1987:30. CE- tr. br., 1980:35, numa versáo mais livre. em sentido formal" significagáo normativo-jurídica (cf., p. ex., Jellinek, 1976:
16. Cf. Engels, 1988: esp. 572ss. 534; Carré de Malberg, 1922:572ss.; lieller, 1934:274; Pinto Ferreira, 1975: c-
17. Weber, 1985:27.
18. Canotilho, 1991:59.
433s.). Em sentido contrário, v. Kelsen, 1946:258s.
24. Cf. Kelsen, 1966:13-21, 1946:181-92, 1960:289-32(1 (ir. hr., 1974:385-
c)
19. Lassalle, 1987:136 (cf. tr. br., 1980:49). Ver também idem, 1987:134 425).
(tr. br., 1980:47). 25. Cf. Kelsen, 1960:3-9 (tr. br.,1974:20-28), 1979:2 (tr. br., 1986:2s.). Em
20. Cf Lassalle, 1987: esp. 125 e 147 (tr. br., 1980:19 e 73). sentido contrário, v. Luhmann, 1987b:43s. u
21. Inclusive no ámbito do marxismo náo se deixou de enfatizar a relativa 26. Cf. Kelsen, 1979:120 (tr. br., 1986: 189s.). Müller (1984:148 e 268) in-
autonomia e releváncia do jurídico em sua relagáo "dialética" com o económico terpreta diferentemente, sustentando a confusáo de norma e texto normativo na
(cf., p. ex., Poulantzas, 1967:160; Nersesiants, 1982:177s.). teoria pura do Direito. Em controversia com Müller, cf. Walter, 1975:444.
22. Em posigáo depreciativa, Lassalle designa a Constituigáo escrita mo- 27. Cf. Kelsen, 1960: esp. 215s. (tr. br., 1974:292ss.), 1979: 112s. (tr. br.,
derna como "folha de papel" (1987:134 e 136 - trad. br., 1980:46 e 50). 1986:178s.), 1946:41s. e 118-20.

56 57
da' e 'efícácia' da Constituieáo. a limitacáo jurídica do poder estatal. Nesse sentido, os Estados autoritá-
Ent uma terccira perspectiva, a Constituiefío será definida nos ter- rios e totalitários, na medida cm que náo realizarn os principios consti-
mos do chamado "constitucionalismo", que se impós principalmente tucionais, náo possucm Constituieáo". Esse conceito de Constituieáo
com as revolueóes burguesas dos séculos XVIII e XIX, correspondendo, relaciona-se de forma indireta com a noeáo de constitucionalizaeáo que
portanto, ao ideal constitucional do Estado burgués de Direito28. Aqui o utilizaremos neste trabalho: considerando-se que a Constituieáo em
conccito de Constituieáo está relacionado com o de Estado Constitucio- sentido moderno surge apenas através da positivaeáo do Direito34, pode-
nal". Em conformidade com isso, contrapócm-se os Estados constitucio- se também afirmar que os Estados pré-modernos e também os Estados
nais aos náo-constitucionais e fala-se até mesmo de uma "Constituieáo autoritários e totalitários contemporáneos náo possuem Constituieáo.
constitucional do Estado"". O problema da Constituieáo é limitado, en-
Porém, os modelos de interpretaeáo distingucm-se. Um supbe a "decla-
táo, sua dimensáo axiológica: ncssa oricntaeáo seria Constituieáo
raeáo" de valores fundamentais essencialmente jurídicos ou a evolueáo
"verdadeira" apenas aguda que correspondesse a um determinado pa- da consciéncia moral", o outro enfatiza o problema da autonomia do
dráo valorativo ideal. Uma exprcssáo clássica do idealismo constitucio- sistema jurídico.
nal cncontra-se no Art. 16 da Declaraello dos Direitos do Homem c do Aos conceitos "unilaterais" opócm-sc as chamadas concepeóes
Cidadáo de 1789: "Qualquer sociedade em que náo estcja assegurada a "dialético-culturais" de Constituieáo, conforme as quais ela vai ser
garantia dos direitos, nem estabelecida a separaeáo dos poderes, náo tem definida como síntese abrangente das -trés dimensóes básicas referi-
Constituieáo"31. De acordo com esse modelo, Constituieáo implica um das. A Constituieáo do Estado resultaria da relaeáo recíproca entre
sistema de garantia da liberdadc burguesa. a divisáo de poderes e uma devcr-ser constitucional ("ideal") e scr constitucional ("real"). Em
forma escrita". Mcsmo que se rejeite essa visáo liberal do constitucio- Elena essa fórmula expressa-se através da dialética "normatividade/
nalismo cm favor de uma concepeáo democrática - inclusive social- normalidade"", que lcva a um conceito muito amplo: "A Constituieáo
democrática - do Estado constitucional, ainda assim permanece como estatal, assim nascida, forma um todo em que apareccm completando-se
núcleo do conccito a "garantia" dos chamados direitos fundamentais e
reciprocamente a normalidade e a normatividade, assim como a norma-
tividadc jurídica e a cxtrajurídica"37. De acordo com essa conceituaeáo,
28. Cf. Schmitt, 1970:36-41 (tr. esp., 1970:41-47); Canotilho, 1991:64-66.
na qual se aponta para a síntese de ser e dever-ser - cm oposieáo tanto
29. Hollerbach, 1969:47.
aos unilatcralismos de Kelsen e Schmitt38 como ao dualismo de Jelli-
30. Schmitt, 1970:36 (tr. esp., 1970:41).
31. Entre °litros, in: Duverger (org.), 1966:3s.(4). Miranda (org.), 1980:57- 33. Nessa orientad)°, cf., p. ex., Loewenstein, 1975:12/1s.
59 (59). A respeito dessa postura liberal no inicio do século passado, cf. Melo 34. Como veremos adiante (v. sub item 1.3.2. deste capítttlo), adotamos,
Franco, 196011:10ss. l'ara tima fundamentacáo mais recente do constituciona- estrategicamente, o modelo de ix)sitivaláo e positividade do Direito de 1,uh-
lismo liberal, v. Ilayek, 1983: esp. 205-29. também Rawls, 1990:221ss. (tr. mann, no sentido de tim Direito posto por deci.sáo e permanentemente alterável,
br., 198 I :177ss.), definindo a _instila da Constituidio como igttal liberdade-par- como também auto-referente.
ticipadlo. Crítico cm reina° ao conceito ("ideologia") liberal de Constituicáo,
35. Sobre a tese do desenvolvimento da consciencia moral de tan nivel pre-
v. Miiller, 1990b:163ss., enfatizando: "lima Constituid:lo náo é 'Organízala° da
convencional, passando pelo convencional, a tuna moral pós-corwencional ou
liberdade.. I...) Fin tuna Constituidlo e seu Estado, coadio e liberdade ná° sáo
universal (nuxlerna), ver I labennas, I 983:127ss.; Eder, 19110. Cf. também Ha-
grandezas da mesilla ordem, como tais levadas a tuna síntese. Liberdade
bennas, 1982b1:350ss., 1982b11:260ss., 1982a:13ss. e 69ss.
como antítese equivalente é uma ilusáo" (163). "'fina Constituicáo é organiza-
36. Cf. 1934:249ss. (tr. br., 1968:295ss.)
dio do poder (Gewalt)" (168). Mas Miiller visa aqui criticamente á concepláo 37. !leiter, 1934:254 (tr. br., 1968:300s.).
hegeliana do Estad° como "a realidade da liberdade concreta" (llega 1986:406 38. 1 {eller, 1934:259 e 276s. (tr. br., 1968:307 e 325s.). Sobre o conceito
260). A respeito ver lamban, ein perspectiva marxista, a crítica de schmittiano (decisionista) de Constituicáo como "decisáo de conjunto sobre
Miaille, 1980:165-67. modo e forma da unidade política", isto é, deeisáo politica fundamental, ver
32 Schmitt, 1970:38-40 (tr. esp.. 1970:43-46). Schmitt, I 970:20ss. (tr. esp., I 970:23ss.). Crítico cm atlas:fío ao "voluntarismo ju-

58 59
nek39 —, as análises parciais do sistema constitucional pressupócm sua ce ao Direito Constitucional. Em ambas concepgóes, nao se observa que
concepgáo integral. Portanto, a Constituigáo estatal normada pú- o próprio dever-ser constitucional é suscelívcl de ser compreendido
dicamente é compreendida como expressáo parcial de um todo'°. Em- corno parte da realidade, nAo se percebe ser possível e frutífcro enfocar
bora dever-ser ideal, apresenta-se também como "expressáo das relagóes as normas constitucionais como expectativas estabilizadas de comporta-
mento. De acordo com essa orientagáo, os proccdimentos decisórios
de poder tanto físicas corno psíquicas"'".
tanto constituintes como de concrctizagáo normativa dos textos consti-
Urna variante da concepgáo cultural-dialética de Constituigáo en-

r")
tucionais filtram as expectativas jurídico-normativas de comportamento,
contra-se em Smend. De acordo com esse modelo, o Estado é concebido transformando-as em normas constitucionais vigentes. Náo se trata de
como processo de integragáo 42 , sendo a Constituigáo conceituada como a uma estrutura ideal de sentido em relagáo recíproca com a realidade so-
sua ordem jurídica, isto é, "a normagáo de aspectos particulares desse

e
cial, mas sim de um subsistema normativo-jurídico, o qual, de um lado,
processo"43 . Mas a Constituigáo em sentido estritamente jurídico consti- tem urna relativa autonomia, de outro lado, encontra-se em permanente
tui aqui — diferentemente das construgóes de Jellinek, Kelsen, Schmitt e variado inter-rclacionamento com os sistemas sociais primariamente

t
e Heller — náo apenas uma estrutura de sentido normativa (ideal): cognitivos, os outros sistemas primariamente normativos e, especial-
"Como Direito positivo a Constituigáo náo é somente norma, mas mente, com as outras partes do sistemas jurídico.
também realidade"". Disso resulta urna concepgáo dinámica, conforme

C ee eC c e c e eC e0 0 e 00 00 ,w0 0 1
a qual o sistema constitucional "completa-se e transforma-se por si
1.3. A Constitucionalizaqáo
mesmo"45 , na medida em que a Constituigáo convertc-se em vida po-
litical' e, com isso, exige interpretagóes divergentes das normas consti- 1.3.1. Constituiqáo como Vínculo Estrutural entre Política e Direito
tucionais47.
Nas perspectivas dialético-culturais de Heller e Smend, o dever-ser Ao emprego do termo "constitucionalizagáo" subjaz a idéia de que
constitucional é conceituado como conexáo (ideal) de sentido, que, po- nem toda ordem jurídico-política estatalmente organizada possui urna
rém, é condicionada pelo ser (real) ou dele recebe o seu significado so- Constituigáo ou, mais precisamente, desenvolveu satisfatoriamente um
cial. Uma diferenga encontra-se, entre outras, no fato de que para Heller
sistema constitucional. O conceito de Constituigáo assume, entáo, um.
a Constituigáo no sentido estritamente jurídico constitui urna estrutura
significado bem delimitado. Refere-se á Constituigáo cm sentido mo-
normativa (ideal), para Smend, ao contrário, a realidade política perten-
derno. Disso náo resulta, porém, necessariamente, tima fundamentagáo
axiológica nos termos do constitucionalismo. Ou scja, cmbora na acep-
rídico" subjacente a essa concepcao, cf. também Pontes de Miranda, 1932:26s.
gáo estritamente moderna a Constituigáo possa ser apreendida corno
39. Heller, 1934:259. A respeito, cf. Jellinek, 1976:10-12 e 20. "uma limitagáo jurídica ao governo", "a antítese do regimc arbitrário"
40. "Por essa razáo, o preceito jurídico particular só pode ser fundamental- (constitucionalismo) 48, daí náo decorre forgosamente que scja concebida
mente concebido, de modo pleno, partindo da totalidade da Constituicáo políti- como urna "declaragáo" de valores político-jurídicos pré-exist,:ntes, ine-
ca" (Heller, 1934:255- tr. br., 1968:302). rentes á pessoa humana, ou como produto da evolugáo da consciéncia
41. Heller, I934:259s. (tr. br., 1968:307). moral no sentido de uma moral pós-convencional ou universal (cf. nota
42. Cf. Smend, 1968:136ss. Quanto á infiuéncia da concepcáo de Smend 35 deste cap.). É possívcl também urna leitura sentido de que a
sobre a mudanga do significado de Constituigáo na República Federal da Ale-
Constituigáo na acepgáo moderna é fator e produto da diferenciagáo
manha, cf. Bóckenfürde, 1983:17ss. funcional entre sistemas político e jurídico. Nessa perspectiva, a consi-
43. Smend, 1968:189. tucionalizagáo apresenta-se como o processo através do qual se realiza
44. Smend, 1968:192. essa diferenciagáo.
45. Smend, 1968:191. É de acordo com esse modelo que Luhmann vai definir a Constitui-
46. Smend, 168:189. Stern (1984:73) enfatiza que em Smend dá-se "uma
inclusáo mais intensa do processo político no Direito constitucional". 48. Mcllwain, 1940:24.
47. Smend, 1968:190.

60 61
ea° como vínculo ("ligacao", "acoplamento") estrutural (strukturelle
kopplung) entre política e Direito.'' Ncssa perspectiva, a Constituicao Através da Constituicao como vínculo cstrutural, as ingeréncias da
ein sentido especificamente moderno apresenta-se como tima via de política no Dircito nao mediatizadas por mecanismos especificamente
prestacóes recíprocas c, sobretudo, como mecanismo de interpenetracao jurídicos e N'ice-versa sao excluidas. A autonomia operacional de ambos
sistcmas é condicao e resultado da existéncia dcssa "acoplagcm estrutu-
(oil mesmo de interferénciar entre dois sistemas sociais autónomos, a
Tal". Porém, por meio dela, cresce imensamente a possibilidade de in-
Política e o Direito, na medida em que cla "possibilita uma solucao
jurídica do problema de auto-referéncia do sistema político e, ao mesmo fluéncia recíproca" e condensam-se as "chances de aprendizado" (capa-
tempo, tima solticao política do problema de auto-referéncia do sistema cidade cognitiva) para os sistemas participantes". Assim scndo, a Cons-
juridico",,. tituicao serve á interpenetracao e interferéncia de dois sistemas auto-
referenciais, o que implica. simultaneamente, relacó-es recíprocas de de-
Nao se trata de mil relacionamento qualquer entre o Dircito e o Po-
der. o que implicaría um conceito "histórico-universal" de Constituicao.
Nas sociedades pre-modernas e também nos Estados autoritarios con-
cm Ipendéncia e independéncia, que, por sua vez, só se tornam possíveis
eom base na formaQáo auto-referencial de cada um dos sistemass6.
temporáneos. a Macao entre Poder e Dircito é hierarquica. caracteri-
zando-se pela supra-infra-ordenacao "Poder -> Direito". Em lin-
guagem da teoria dos sistemas, aponta-sc para a subordinacao explícita 1.3.2. Constituicao COMO Subsistema do_Sistema Jurídico
do código de diferenca entre lícito ("jurídico") e ilícito ("antijurídico")
ao código de diferenca entre poder e nao-poder. o código binario de Mas náo só como vínculo cstrutural entre Política e Direito pode ser
prefcréncia do Dircito nao atuaria como segundo código do sistema interpretada a Constituicao numa perspectiva da tcoria dos sistemas. É
poli tico". possível conccbé-la, sob o ponto de vista político-sociológico, como um
instituto específico do próprio sistema políticos'. Mas, para os fins a que
49. Ltilimann, 1990a:193ss. O conceito de "vínculo (acoplamento, ligNao) nos propomos. a análise do significado da constitucionalizacao simbó-
estrutural" ("stnikturelle Kopplung") ocupa mil lugar central na teoria biológica lica", apresenta-se estrategicamente oportuno o conceito dc Constitui-
dos sistemas autopoiéticos de Maturana e Varela (cf. Maturana, 1982:143ss., QáO como subsistema do sistema jurídico (Direito Constitucional)".
150ss., 25Iss., 287ss.; idem e Varela, 1980:XXs., I 987:85ss.), qua! Lulunann Nessa perspectiva, a norma constitucional, como um caso particular
explicitamente recon-e na aplica0o do mesmo aos sistemas sociais (cf. 1993: de norma jurídica, representa um tipo de expectativa de comportamento
440ss., 1990a:204, nota 72; 1989a:6, nota 6). Sobre a teoria dos sistemas auto- contrafaticamente estabilizada, e náo é compreendida como dever-ser
poiéticos, ver infm cap. 111.1.
50. A respeito do conceito de intetpenetrNlio, ver Lithinann, 1987a:289ss., especificamente guando ¿lo sistema jurídico, idem, 1986b.,1993:165ss. Embora
que a distingue das relaeaes de prestaelio ("inpui output relayaes"
- — 1987a: o poder desenvolva-se primariamente com base no código "superioridadefinfe-
275ss.). A interpenetraerio significa que cada um dos sistemas, reciprocamente, rioridade", observa-se que, no "Estado de Direito", a difereno entre lícito e
póc sua própria complexidade á disposis:iio do processo de autoconstruyílo do ilícito (o Direito) atila, na perspectiva de observaláo do sistema político, como
outro sistema (Lulimann, 1987a:290). Dela se distingue a "interferencia" no segundo código do poder (I Ailimann, 1986b:199,1988a:34,48ss., 56).
sentido de Teubner (1989: esp. 110, I988:55ss.), eis que, enquanto nesse caso 54. Lulunann, I990a:205.
(interterencia) cada tun dos sistemas pile á disposiefío do outro tuna comple- 55. Lultmann, I990a:206.
xidade pré-ordenada, na interpenetrallio o sistema receptor tem á sua 56. Lulunann, 1981g:165.
uma "complexidade ineompreensível, portant°, desordem" (1,uhrnann. 57. A respeito, ver Lulunann, 1973b.
I987a:291). 58. "O que é Constituigáo? A diregáo en-1 que essa questáo deve ser orien-
51. Lultmann, 1990a:202. tada depende do problema que deve ser resolvido com o conceito a ser obtido"
52. Cf. Lulimann, 198 I g:159s., I 987b:168ss (1-lesse, 1980:3).
53. Sobre código binário de preferencia em geríil, ver Lulimann, 1986a:75ss.; 59. Nesse sentido, ver Neves, 1992:50ss., de onde retiramos ein hilas
gerais os elementos da exposilfio que se segue. Reconhecendo essa possibilidade,

62
63
1.3.3. Constituiqáo como Afrcanismo de Autonomia Operacional do Di-
idea160 . Isso náo implica forgosarnente o conceito de Constituigáo como
reito
ordem fundamental da coletividade 61 , o qual pressupóe "que também em
nossa sociedade estruturas `constituintes' possam tomar a forma de ex-
Partimos aqui, estrategicamente, do conceito luhmanniano de positi-
pectativas normativas de comportamento" 62 . Porém, se a Constituigáo
sob um ponto de vista sistémico-teórico pode ser conceituada como sub- vagáo ou positividade do Direito. Como característico da sociedade mo-
sistema do Direito, entáo náo se exclui uma leitura das normas consti- derna, o fenómeno da positivagáo significa que o Direito se caracteriza
tucionais como expectativas de comportamento congruentemente esta- por ser ponto por decisóes e permanentemente alterável". Além do mais,
bilizadas (ver nota 241 do cap. I). Nesse sentido, a vigéncia das normas a positividade indica que o Direito é um sistema operacionalmente au-
constitucionais náo decorre simplesmente do procedimento constituinte todeterminado 65. Com isso relaciona-se a hipótese de que ao proccsso
histórico da positivacáo corresponde o surgimento da Constititicáo no
e da reforma constitucional como processos de filtragem especificamen-
te orientados para tal fim, mas também da concretizagáo constitucional sentido moderno66 , isto é, a diferenciacáo interna do Dircito Constituci-
como pluralidade de processos de fíltragem. Por conseguinte, a Consti- onal no sistema jurídico. Na medida cm que as representagóes moral-
tuigáo náo se define apenas sob o aspecto estrutural (expectativas, nor- legitimadoras válidas para todos os dominios da sociedade perdcram sua
mas), mas simultaneamente sob o ponto de vista operativo: ela inclui as significacáo e funcáo sociais, evidentemente a vigéncia das decisóes
aplicadoras e ponentes de Direito náo podiam mais fundamentar-se ne-
comunicaOes que, de um lado, fundamentam-se nas expectativas cons-
titucionais vigentes e, de outro lado, servem de base ás mesmas. las. A positividade como o fato de o Direito autodeterminar-se implica a
Considerada a Constituigáo como subsistema do Direito positivo, exclusáo de qualquer supradeterminacáo direta (náo-mediatizada por
sao levantadas as seguintes questóes: 1) Qual o significado da Constituí- critérios intra-sistémicos) do Direito por outros sistemas sociais: políti-
gáo (moderna) para o sistema jurídico, ou mais especificamente, para a ca, economia, ciéncia etc. De acordo com isso, a relacáo entre sistemas
positivagáo do Direito? 2) Que fimgáo social preenche o Direito Consti- jurídico e político é horizontal-funcional, náo mais vertical-hierárquica.
tucional positivo? 3) Como o subsistema constitucional póe o Direito Nesse novo contexto, sem os seus fundamentos políticos e morais glo-
positivo em relagáo com as exigéncias dos outros sistemas sociais? Es- balizantes67 , o sistema jurídico precisa de critérios internos náo apenas
sas trés questóes nos póem diante, respectivamente, dos problemas de para a aplicagáo jurídica concreta, mas também para o estabelecimento
"refiexáo", "fungáo" e "prestagáo" do sistema jurídico a nivel constitu- de normas jurídicas gerais (legislacáo cm sentido amplo). Esse papel é
cional63. atribuído ao Dircito Constitucional. Assim seudo, "a Constittlicáo é a
forma com a qual o sistema jurídico reage á própria autonoinia. A Cons-
tituicáo deve, com outros palavras, substituir apoios externos, tais como
cf. Luhmann, 1990a:185ss.
60. Luhmann pondera que, embora numa perspectiva jurídico-sociológica
- - _
(observagáo externa) a norma jurídica deva ser conceituada como fato (expecta-
flexáo), ver em geral Luhmann, 1982:54ss.; idem e Schorr, 1988:34ss. Espe-
cificamente em relagáo ao Direito e á Constituiláo, ver Neves, 1992:113ss. e
tiva de comportamento), sob o ponto de vista da teoria do Direito (auto-obser-
147ss., problematizando criticamente. Retornaremos a esse tema no Cap. III.
vagáo) normas náo sao deduzíveis de fato, interpretando isso como unía exigén-
64. A respeito, ver Luhmann, 1981h, 1987a: I 90ss., 1983a:141 -50; nieves,
cia lógica que tenia decorrido da evolugáo da sociedade no sentido da diferen-
1992: esp. 27-30.
ciagáo do sistema jurídico (1986c:21).
65. Cf. Luhmann, 1988b, 1983b, 1985, 1981h; Neves, 1992:34ss.
61. Nessa orientagáo, cf., p. ex., Hesse, 1980:11; Hollerbach, 1969:46;
66. De tal maneira que a "promulgagáo" (?) de Constituigóes é indicada
Bóckentbrde, 1983: I 6ss.
como prova da realidade da positivagáo do Direito (Luhmann, 1984a:95s.).
62. Luhmann, 1973b:2. "Conseqüentemente, o interessc na realidade cons-
titucional cai muna perspectiva que indaga sobre comportamento conforme á 67. Nessa perspectiva, a tese de Timasheff de que o Direito, como fenóme-
no secundário, é a combinagáo da ética e da política, como fenómenos primarios
norma ou desviante" (ibid.).
(1937-1938:230s., 1936: esp. 143 e 155ss.), náo é válida para o Direito moder-
63. Sobre esses trés modos de referéncia dos sistemas (funcao, prestagáo, re-
no, embora tenlo significagáo para as sociedades pré-modernas.

65
64
os que foram postulados pelo Direito natural" 68 . A inexisténcia de Cons- eáo entre Constituieáo e lei. Á luz do conceito de "mecanismos reflexi-
tituicáo juridicamente diferenciada conduz — na sociedade altamente vos"", é possível exprimir-se isso da seguinte forma: a Constituicáo co-
complexa e contingente do mundo contemporáneo, náo orientada por mo normatizacáo de processos de producáo normativa é imprescindível
urna moral compartilhada globalmente e válida em todas as esferas da á positividade como autodeterminacáo operativa do Direito.
vida — á manipulacáo política arbitrária do Direito, o que impede sua O Direito Constitucional funciona como limite sistémico-interno pa-
positivacáo. ra a capacidade de aprendizado (-> abertura cognitiva) do Direito po-
A urna legislacáo ilimitada, que tem como conseqüéncia a quebra da sitivo; com outras palavras: a Constituicáo determina, como e até que
autopoiese do sistema jurídico, isto é, a alopoiese da reproducáo da co- ponto o sistema jurídico pode reciclar-se sem perder sua autonomia ope-
municacáo jurídica, opóc-se a forma interna de hierarquizacáo através racional". A falta de urna regulacáo estritamente jurídica da capacidade
da validade supralegal do Direito Constitucional". Isso náo tem apenas de reciclagem do sistema jurídico conduz — em urna sociedade hi-
signifícacáo técnico -jurídica". Náo se trata de vários planos isolados em percomplexa, com conseqüéncias muito problemáticas — a intervenctks
relacáo a outros, mas sim de "tangled hierarchies"'': a validade e o diretas (náo-mediatizadas pelos próprios mecanismos sistémicos) de ou-
sentido do Direito Constitucional depende da atividade legislativa e da tros sistemas sociais, sobretudo do político, no Direito. Porém, é de ob-
aplicacáo concreta do Direito. A interna hierarquizacáo `Constituicáo/ servar-se que o sistema constitucional também é capaz de reciclar-se em
Lei' atua como condicáo da reproducáo autopoiética do Direito moder- relacáo ao que ele mesmo prescreve. Esse caráter cognitivo do sistema
no, serve, portanto, ao seu fechamento normativo, operacional". Nesse constitucional expressa-se explicitamente através do procedimento es-
sentido, enfatiza Luhrnann que "a Constituicáo fecha o sistema jurídico, pecífico de reforma constitucional, mas também se manifesta no decor-
cnquanto o regula como um dominio no qual cla mesma reaparece. Ela rer do processo de concretizacáo constitucional. Náo se trata, por conse-
constituí o sistema jurídico como sistema fechado através do reingresso guinte, de unta hierarquizacáo absoluta. Principalmente as leis ordiná-
no sistema"". Dessa mancira, qualquer intervencáo legiferante do rias e as decisóes dos tribunais competentes para questsks constitucio-
sistema político no Direito é mediatizada por normas jurídicaS. O nais, que 'mina abordagem técnico jurídica constituem Direito infra-
sistema jurídico ganha com isso critérios para a aplicacáo do código constitucional, determinam o sentido e condicionam a vigéncia das
/ícito/i/ícito ao procedimento legislativo". Sob esse ángulo, pode-se normas constitucionais". A circularidade é mantida, pelo menos na
afirmar que a positivacáo do Direito na sociedade moderna, além da
distincáo entre estabelecimento de norma geral (legislacáo) e aplicacáo 75. A respeito, ver Luhrnann, 1984a.
concreta do Direito (jurisdicáo, administracáo), pressup& a diferencia- 76. Em consonancia com isso, escrevia Luhmann (1973b:I65): "Distin-
guem-se o sentido e a fungo da Constintigáo pelo emprego de negar es explí-
68. Lulmuum, 1990a:187. citas, negagées de negagées, demarcag8es, impedimentos; a Constituigáo mes-
69. Luhmann, 1990a:190. ma é, conforme sua compreensáo fonnal, a negagáo da alterabilidade ilimitada
70. Em sentido diverso, ver Luhrnann, 1973b:I. do Direito". Parece simplista a crítica de Canotilho (1991:86s.), no sentido de
71. Hin conceito de Hofstadter (1986:12 e 728ss.) empregado nesse contex- que esse conceito formal negativo implica a "expulsáo de elementos sociais" e
to por Luhrnann (1986c:15s.). Cf. também Tcubncr, 1989: 9. seja, portanto, incompatível "com o texto constitucional de um Estado demo-
72. Sobre o Direito positivo como sistema cognitivamente aberto na medi- crático socialmente orientado como é o portugués". Nada impede que a Consti-
da em que é fechado operacional, nonnativamente, ver Luhmann, 1983b: esp. tuigáo como mecanismo de limitayáo da alterabilidade do Direito adote elemen-
139 e I52s., 1984b:110ss., 1993:38ss.; Neves, 1992:37 41. Retomaremos a esse
-
tos social-democráticos. Antes caberia observar que esse conceito de Constituí-
tema no cap. 111.1.2. 00 é incompatível com o sistema político do Salazarismo.
73. Luhrnann, 1990a:187. 77. "Pode haver diferengas de influéncia, hierarquias, assimetrizaebes, mas
74. Sobre a diferenga entre códigos e critérios ou programas, cf. Luhmann, nenhuma parte do sistema pode controlar outras sem submeter-se, por sua vez,
1986a:82s. e 89ss.; em relagáo especificamente ao sistema jurídico, idem, ao controle; e nessas circunstancias é possível, antes altamente provável em sis-
19861):194ss., 1993:165ss. Retornaremos a essa distingáo no Cap. 111.1. temas orientados no sentido, que cada controle seja exercido em antecipagáo do

66 67
"relacáo de mistura" entre criacáo e aplicacáo do Direito". sentacóes morais com validade social globalizantc pressupóc tima socie-
De acordo com o enfoque da teoria dos sistemas, a Constituiáo de- dade simples, pobre cm possibilidadcs, na qual ainda náo há, portanto,
sempenha uma funcáo descarregante para o Dircito positivo como sub- os elementos est ruturais para a di ferenciacilo (positivacáo) clo sistema ju-
sistema da sociedadc moderna, caracteriz.ada pela supercomplexidade. rídico. lima "Constituicáo-que-se-identifica" produz, nas condicóes con-
Impede que o sistema jurídico scja bloqueado pelas mais diversas e con- temporáneas de alta complexidade e contingéncia da sociedade, efebos
traditórias expectativas de comportamento que se desenvolvem no seu disfuncionais adiferenciantes para o Dircito, na medida cm que falta sin-
meio ambiente. Essa funcáo descarregante é possível apenas através da tonizaccio entre sistema jurídico subcomplexo e mcio ambiente super-
adocáo do "princípio da náo-identificacáo"". Para a Constituicáo ele complexo8'. Nessa perspectiva. pode-se até mesmo acresccntar que uma
significa a náo-identificacáo com concepcóes globais (totais) de caráter -Constituicáo que se identifica" com concepcóes totalizadoras náo se
religioso, moral, filosófico ou ideológicos°. A identificacáo da Constitui- apresenta como Constituicáo no sentido estritamente moderno, na me-
cáo com uma dcssas concepcbes viria bloquear o sistema jurídico, de tal • dida cm que, cm virtude da "identificacáo", náo é Constituicáo jurídi-
maneira que ele náo poderia produzir uma complexidade interna ade- camente diferenciada, mas sim um conjunto de princípios constitutivos
quada ao seu hipercomplexo meio ambiente. Uma Constituicáo identifi- superiores, que tem a pretcnsáo de valer diretamente para todos os do-
cada com "visóes de mundo" totalizadoras (e, portanto, excludentes) só mínios ou mecanismos sociais.
sob as condicóes de uma socicdade pré-moderna poderia funcionar de
forma adequada ao seu meio ambiente. Nesse caso, o domínio de repre-
1.3.4. Funqiio Social e Prestwilo Politica da C'onstitiliqáo
controle inverso" (Ltilimann, 1987a:63; cf. cm relagáo especificamente ao sis-
Tendo em vista o "princípio da náo-identificacáo", pode-se esclare-
tema jurídico, idem, 1981i:254s.).
cer qual a relacáo da Constituicáo moderna, enquanto subsistema do Di-
78. Da teoria "estrtilia escalonada" do ordenamento jurídico fbnnulada cm
por Ohlinger (1975), tuna variante da teoria pura do Direito, Ltilimann faz tuna
rcito, com a sociedade como unt todo, ou sep. qual sua
leitura no sentido de que o escalonamento do sistema jurídico se refere apenas á sentido cstrito. lsso nos póc diante do problema da institucionalizacao
"relacáo de mistura" entre criagáo e aplicacáo do Direito, para acrescentar: dos direitos fundamentais e do estabelccimento constitucional do Estado
"Um passo além disso seria conceituar a reina() de criacáo/aplicaláo do Direito de km-estar. Além do mais, aquele principio possibilita esclarecer a
a cada grau como circular, portanto, como auto-referencial. Entáo, a estnitura relacáo específica do Direito constitucional com o sistema político, isto
escalonada seria tuna decomposicáo e hierarquizagáo da auto-referéncia funda- é, sua prestaqdo política. Isso nos coloca perante o problema da eleicáo
mental do Sistema" (Luhmann, 1983b:141, nota 26; cf. também idem, política e da "divisáo" de poderes82.
1990b:11).
79. Empregamos aqui, á luz - da perspectiva da teoria dos sistemas, o con- 81. Náo desconhecemos que, embora "disfuncional" sob tan ángulo especi-
ceito de náo-identifícacáo (do Estado) de Krüger (1966:178-85), que I lollerbach ficamente jurídico, chi pode atuar "Ilincionalmente" cm outros dominios sociais
(1969:52-57) adotou especificamente em relacáo á Constituicao. Náo desconhe- e para determinados interesses particularistas. Mas é juridicamente "distitlicio-
cemos que tal principio de.sempenha um forte papel ideológico discussáo nal" no sentido de que é nonnativamente excludente, desconkcendo diferen-
sobre "inimigos da Constituicáo". Mas, por outro lado, ele corresponde, na ciacáo e a pluralidade contraditória das expectativas normativas existentes na
perspectiva axiológica de Habermas, ao princípio da indisponibilidade do Direi- sociedade.
to ou da imparcialidade do Estado de Direito (cf. Habermas, 1987a, 1992:583 82. A respeito da (relacáo com a sociedade como sistema global) e
S S. da prestaccio (relacáo com os demais subsistemas da sociedade) do Direito,v.
80. Hollerbach, 1969:52. Nesse sentido, embora apoiado em outros pressu- Luhmann, 1993:156ss. e especificamente ao nivel da Constinticao, Neves, 1992:
postos teóricos, afirnta Grimmer (1976:9): "As finalidades de grupos sociais ou 147-181 (Cap. V), confrontando criticamente esses conceitos sistémicos com o
partidos políticos e os desejos, interesses e necessidades de acáo estatal que es- desenvolvimento constitucional brasileiro.
táo na base dessas finalidades náo tém nenhuma validade geral imediata".

69
68
1.3.4.1. Direitos. Fundamentais (diferenciapo da sociedade) e Estado pode-se afirmar: através dos direitos fundamentais a Constituicáo Mo-
de bein-estar (inclusa()) derna, enquanto subsistema do Direito positivo, pretende responder ás
Através da Institucionalizacáo dos direitos fundamentais" a Cons- exigéncias do seu meio ambiente por livre desenvolvimento da co-
tituicáo reconhece a supercomplexidade da sociedade, a dissolucáo de municaQáo (e da personalidade) conforme diversos códigos diferencia-
critérios socialmente globalizantes de orientacáo das expectativas, a ine- dos.
xisténcia de um sistema social supremo. Os Direitos fundamentais ser- A concepQáo corrente do Estado de bem-estar diz respeito á sua fim-
vem ao descnvolvimento de comunicacks cm diversos níveis diferen- QáO compensatória, distributiva, para acentuar que um mínimo de reali-
ciados. Sua funcáo relaciona-se com o "perigo da indiferenciacáo" (es- dade dos direitos fundamentais clássicos (liberal-democráticos) depende
pecialmente da "politizacáo"), isto é, exprimindo-se positivamente, com da institucionalizacáo dos "direitos fundamentais sociais"". Propondo
a "inantitencáo de urna ordent diferenciada de cointinicacáo"". Median- um modelo interpretativo mais abrangente, Luhmann conceitua o Esta-
te a institucionalizacáo dos direitos constitucionais fundamentais, o di- do de bent-estar com base no principio sociológico da inclusclo". "O
reito positivo responde ás exigéncias da sociedade moderna por dife- conceito de inclusáo refere-se á integracáo de toda a populacáo nas pres-
tacóes de cada um dos sistemas funcionais da sociedade. Ele diz respei-
renciacáo sistémica. Assim sendo, na hipótese de "Constituicáo" identi-
to, de um lado, ao acesso, de outro lado, á dependéncia da conduta in-
ficada com concepcóes totalizadoras, por serem excluidos ou deturpados
dividual a tais prestacóes. Na medida era que a inclusáo é realizada, de-
os direitos fundamentais, náo se consideram a pluralidade e contingén-
cia das expectativas, produzindo-se, portanto, uma indiferenciacáo ina- saparecem os grupos que náo, ou apenas marginalmente, participam da
dequada á complexidade da sociedade contemporánea". Em resumo, vida social"". A contrario sensu, pode-se designar como exclusdo a
manutencáo persistente da marginalidade". Na sociedade moderna
83. O conceito de "institucionalizacáo" tem aqui tun sentido abrangente, atual, isso significa que amplos setores da populnáo dependem das
incluindo as dimensóes temporal, social e material, oil seja, normatizacáo, con- presta95es dos diversos sistemas funcionais, mas náo tém acesso a elas
senso suposto e identificalá'o generalizada de sentido: "Instituiciks sao expec- (subintegraQáo)90.
tativas de comportamento generalizadas temporal, material e socialmente, e
propriedade, obteve a liberdade de propriedade. Nao foi libertado do egoísmo
constituem, enquanto tais, a estnttura de sistemas sociais" (Luhmann, 1965:13,
da industria, obteve a liberdade industrial" (1988:369). Marx fala, porém, de
o qual, posteriormente, restringe o conceito á dimensáo social, isto é, ao "con-
senso suposto" — cf. 1987b:64ss.). Por sua vez, cm consonancia com esse sig- "decomposigáo do homem" (357).
86. Cf. Grimm, 1987b; Grimmer, 1976:11ss.; Bonavides, 1972..
nificado amplo, Mayltew (1968:19) aponta para trés momentos imprescindíveis
87. Cf. Luhmann, 198 lj:25ss., recorrendo aqui (25) expressamente a Mar-
institucionalizacáo jurídica de tun valor: ( I ) "uma interpretacá'o do valor é ju-
ridicamente reforcada"; (2) "há urna maquinaria para invocar sainetes contra
shall (1976).
violac5es" (organizacáo jurídica); (3) "a maquinaria jurídica é sistematicamente 88. Luhmann, 1981j:25. Acompanhando Parsons, acentuara Luhmann e
invocada em casos de possivel violado da norma" ("execticáo sistemática"). Schorr (1988:31) que a inclusa() se refere apenas aos papéis complementares:
84. Luhmann, 1965:23-25. "Nem todos podem tornar-se médico, mas qualquer um, paciente; nem todos
85. Em hannonia com essa colocacáo parece-nos encontrar-se a crítica de podem tornar-se professor, mas qualquer um, aluno". Além do mais, o principio
1,efort (1981) ás tendéncias totalitarias contrarias aos "droits de Phomme", na da inclusa-o náo nega que, "como sempre, as camadas superiores sejam distin-
medida em que ele reconduz a institucionalizacáo desses direitos á diferencia- guidas pela maior participacáo em bem todos dominios funcionais" (Luhmann,
cáo (desintrincamento) de poder, lei e saber (1981:64 — tr. br., 1987:53). Mas 1981j:26).
89. Cf. Luhmam, 1981 j:255., nota 12. Para uma reavaliagáo do problema
também na Postura crítica de Marx (1988:361ss.) com relacáo aos "direitos do
da inclusáo/exclusáo na sociedade de hoje, v. Luhmann, 1993:582ss.
lionient" ("em contraimsnáo aos direitos do cidadáo") como "direitos do mem-
90. A sobreintegracáo seria, cm contrapartida, a independéncia com respei-
bro (la sociedade burguesa, isto é, do homem egoísta" (364), pote - se observar
tuna conexiio com O problema da diferenciacáo fncional: "O homem náo foi por to ás regras combinada com o acesso ás prestacóes de cada tun dos subsistemas
da sociedade. A respeito, cf. Neves, I992:78s. e 94s. Retornaremos ao tema no
isso libertado da religiáo, ele obteve a liberdade religiosa. Nilo foi libertado da

70 71
Definindo-se o Estado Cle, bem-estar como "inclusáo política reali- mento cleitoral contra diferencas de Num/N c Isso implicaría,
zada"91 e, porque Estado de Direito, como inclusáo jurídica realizada, segundo Ltilimanti, a passagem de eritérios baseados cm atributos (es-
observa-se que os "direitos fundamentais sociais" por cle instituidos táticos) para criterios fundados na aptidáo e desempenho (dinámicos),
constitucionalmente sáo imprescindíveis á instinicionalizacao real dos no que se refere á octipacáo dos papéis políticos". É de se observar, po-
direitos fundamentais referentes á liberdade civil e á participacáo políti- rém, que uma interpretacáo multo cstrita da sociedade moderna no sen-
ca92. Isso decorre do fato de que a inclusa() de toda a populacáo nos di- tido da prevaléncia do princípio da SCICOO e recrutamento bascados na
veros sistemas sociais e a diferencialdo funcional da sociedade pressu- aptidáo, como se a democracia conduzisse á eleicáo dos melhores, iiáo
póem-se reciprocamente, na medida em que a exclusdo de grupos soci- resiste evidentemente a uma crítica de modelos ideológicos"'. Antes, a
ais e a auto-rejeréncia operacional dos sistemas funcionais sáo incom- eleicáo democrática atua como apoio descarregante para o sistema po-
patíveis93. Nessa perspectiva pode-se afirmar que, na sociedade super- lítico, na medida em que esse "assume a responsabilidade integral pelo
complexa de hoje, fundada em expectativas e interesses os mais dife- Direito" na socicdade moderna'°°. A "generalizacáo do apoio político"
renciados e contraditórios, o Direito só poderá exercer satisfatoriamente que decorre do procedimento eleitoral constitucionalmente regulado scr-
sua funcáo de congruente generalizacáo de expectativas normativas en- Ve, por conscguinte, á diferenciacáo do sistema político, funcionando
quanto forem institucionalizados constitucionalmente os princípios da como empecilho á sua manipulacáo por interesses particularistas'°'. Sem
inclusáo e da difercnciacáo funcional e, por conseguinte, os dircitos fun- eleicóes democráticas ou um equivalente funcional parece impossível,
damentais sociais (Estado de bem-estar) e os concernentes á liberdade na sociedade complexa de hojc, que os sistemas político e jurídico náo
civil e á participacáo política. se identifiquem excludentemente com concepcóes ideológicas globali-
zantes e interesses de grupos privilegiados. A falta de eleicóes demo-
cráticas conduz, nas condicóes atuais, á identificacáo do "Estado" com
1.3.4.2. Regulaq'do Jurídico-Constitucional do Procedimento Eleitoral determinados gruposm e, com isso, á indiferenciacáo do sistema jurídi-
co, inadequada á complexidade da conexáo de comunicaOes, expectati-
Muito embora a institucionalizacáo dos direitos fundamentais a-
branja o direito eleitoral" e, portanto, possa ser definida como funIdo 97. "Todas as diferenos podem ott devem ser ignoradas, salvo agudas que
do sistema jurídico, é possível, sob outro ángulo, considerar a regulacáo em um contexto funcional específico possam ser justificadas como convenien-
constitucional do procedimento eleitoral como prestaldo do Direito pe- tes" (Lulunann, 1983a:160).
rante o sistema político95. 98. Ltilunann, 1983a:156-58.
As disposicóes constitucionais referentes ao sufrágio universal, igual 99. Cf. Rubinstein, 1988: 539s., no contexto de tima crítica á concepOo do
e secreto tém por objetivo assegurar a independénci? do eleitor em rela- achievement como base e esquema de distribuiláo de recompensas na sociedade
cáo a seus outros papéis sociais96 e, dessa maneira, imunizar o procedi- moderna (531).
100. Ltilintann, 1981b: 147.
Cap. III. 6. 1(11. Com isso itáo se desconhece que a "generalizacáo do apoio ixilitico" é
91. Luhmann, 1981j:27. "Para o Estado de bem-estar a inclusa() política da incompatível com o mandato imperativo With:mitin, 1981a:165, nota 19), o
populagáo é tima necessidade funcional... "(idem, 1981 j:118). qual, embora tan mecanismo pré-modenio (tuna "figura medieval" — Lamou-
92. É nesse sentido que o conceito de cidadania de Marshall (1976:71ss.) nier, 1981:253), leve tim respaldo importante na obra iltiminista de Rousseau
abrange os direitos civis, políticos e sociais. Acompanhando Marshall, cf. Hen- (1975:301-303 — Livro III, Cap. XV).
dix, 1969:92ss. 102. Daí porque o ordenamento que náo dispó`e de regulnáo democrática
93. Luhmann, 1981j: esp. 26s., 35 e 118. da eleicáo exige "que o cidadáo se identifique ent suas comunicacóes com o
94. Cf. Lulunann, 1965:186ss. sistema de ay.áo (e náo porventura apenas com tuna ordem normativa básica: a
95. Cf. Lulunann, 1983a:155ss. Constituigáo), portanto, que se apresente como inteiramente leal" (Ltiluitann,
96. Luhmann, 1983a:159. 1965:149).

72 73
vas e interesses constitutivos da sociedade.
Evidentemente, para que a eleicáo atore como mecanismo de apoic monstrado incompatível cono a complexidade da sociedade atual.
generalizado e de diferenciacáo do sistema político, imunizando-o dos Como corolario da "divisáo do poderes", o Direito Constitucional es-
tabelecc a diferenca entre política e administracáo". Através dessa
bloqucios particularistas, náo é suficiente a existencia de um texto con-
prestacáo do Direito positivo perante o sistema político, a administracdo
stitucional que preveja o procedimento respectivo. Através da experi-
é neutralizada ou imunizada contra interesses concretos e particulares;
éncia dos países periféricos, demonstra-se, muito claramente, até que
eta atua, entáo, conforme preceitos e principios com pretensáo de gene-
ponto por falta de pressupostos sociais as normas constitucionais sobre
ralidade' 09 . Com isso náo se exclui que as camadas superiores da socie-
procedimento eleitoral sáo deformadas em seu processo de concretiza-
00, como ocorre tipicamente no caso brasileiro'° 3. dade exercem urna influéncia mais forte na elaboracáo e execucáo do
programa administrativo, mas se afirma que o sistema político (em sen-
tido amplo) dispóe de mecanismos próprios de filtragem diante da atua-
1.3.4.3. "Divisad" de Poderes e Diferenga entre Política e Administra- QáO de fatores externos. Nesse sentido, os funcionários administrativos
gdo precisam, "náo raramente, impor-se contra membros da sociedade per-
tencentes a categorias superiores e necessitam, por isso, de direitos es-
Também especificamente contra a possibilidade de indiferenciacáo pecialmente legitimados para decidir vinculatoriamente""°. Em conexáo
do Direito e da Política, as constituicbes modernas institucionalizam a com essa exigéncia, decorre que, num sistema político que diferencia e
"divisáo de poderes". A influéncia da comunicacáo conforme o código especifica funcionalmente os seus subsistemas, á administracáo execu-
do poder sobre a comunicacáo de acordo com o código jurídico é, dessa tante náo devem ser atribuidas simultaneamente funcóes de legitimacáo
mancira, intermediada pelo próprio Direito. Luhmann acresccnta: política, busca do consenso e controle das desilusks, porque tal mescla
"Através da divisáo de poderes o código do poder é, cm principio, asso- de funciíes importa-lhe urna sobrecarga de efeitos colaterais que dificul-
ciado ao Direito. Processos decisórios sáo conduzidos pela via do Direi- tam a sua racionalizacáo e eficiéncia"'. Quando se dá o contrario, como
to"'". Assim sendo, a "divisáo de poderes" pode ser considerada como se observa nos paises periféricos, ocorre a particularizacáo e politizacáo
limitacáo do poder político por urna esfera jurídica auteinoma' 03. Porém,
da administracáo, com os seus condicionamentos e implicacóes negati-
cumpre também "a funcáo de filtragem entre política e administracáo, e vos: partindo-se de "baixo" (subintegrados), a administracáo é envol-
a funcáo de prolongamento da cadeia do poder, que, do mesmo modo, vida com necessidades básicas concretas das camadas inferiores, que,
náo podcm prescindir de uno apoio na Constituicáo" 106. Nessa perspec-
sob essas condiceies, "náo podem esperar" 12 e, portanto, sáo facilmente
tiva, a introducáo de procedimentos funcionalmente diferenciados manipulávcis por concesseies administrativas contrarias aos principios
(legislativo, judicário e político-administrativo), através da instituciona- constitucionais da impessoalidade, legalidade e moralidadc administra-
lizacáo da "divisáo de poderes", aumenta a capacidade dos sistemas po- tiva"'; partindo-se de "cima" (sobrcintegrados), a administracáo é blo-
lítico e jurídico de responder ás exigéncias do seu respectivo meio ambi-
ente, repleto de expectativas as mais diversas e contraditórias'°'. A au- 108. Cf. Luhmann, I 973b:8-12, relevando o valor dessa diferenca cm face
séncia ou deformacáo do princípio da "divisáo de poderes" leva á indife- do próprio principio clássico da "divisáo de poderes".
renciacáo das esferas de vida (politizacáo totalizadora) e tem-se de- 109. Nessa orientaláo sustenta Luhmann (1965:155) que a diferenca entre
política e adminístrala() possibilita "a aplicagáo prática da norma de igualda-
103. A respeito, ver Neves, 1992:97s. e 170ss.
de"
104. Luhmann, 1973b:11.
110. Lulunann, 1965:147.
105. Essa é a concepcáo corrente, que remonta a Montesquieu (1973:168-
111. Luhmann, 1983a:211.
79 — Livro XI, Cap. VI).
112. "As necessidades básicas devem ser, em todo caso, satisfeitas, para
106.Luhmann, 1973b:11s.
que qualquer pessoa possa esperar" (Luhmann, 1983a:198).
107.A respeito, ver Luhmann, 1983a.
113. Em outra perspectiva, conforme o modelo "antes — depois" da teoria
da modernizactio, escrevia Luhmann, (1983a:65, nota 10): "...fatos que em socie-

7•1
75
queada por intercsses particuláristas de grupos privilegiados. cretizacáo" das normas constitucionaisw, que, nessa perspectiva, náo se
confundem com o texto constitticional"°. Sob esse novo ponto de vista, o
texto e a realidade constitucionais encontram-se em permanente Macao
2. Texto Constitucional e Realidade Constitucional através da normatividade constitucional obtida no decurso do processo
de concretizacáo. Na teoría constitucional alemá, destacam-se nessa di-
recáo os modelos de Friedrich Mülle.r e Peter Haberle.
2.1. A Relaqdo entre Texto e Realidade Constitucional como Concreti- De acordo com a concepcáo de Müller, a norma jurídica compée-se
zwilo de Normas Constitucionais do programa normativo (dados lingüísticos) e do ámbito normativo
(dados reais)"7. A estrutura normativa resulta da conexáo desses dois
O conceito de Constituicáo sistémico-teorético que adotamos acima componentes da norma jurídica"8. Portanto, a concretizacdo da norma
estrategicamente, vinculado á nocáo moderna de "constitucionalizacáo", jurídica, sobretudo da norma constitucional, náo pode ser reduzida á
pode ser complementado mediante a abordagem da reina() entre texto e "interpretacáo aplicadora" do texto normativo, o qual oferece diversas
realidade constitucionais. Náo se trata, aqui, da Miga dicotomia `nor- possibilidades de compreensáo"9 e constitui apenas um aspecto parcial
ina/realidade constitucional'"4, mas sim do probldiia referente á "con- do programa normativol": ela além do programa normativo, o
ámbito normativo como "o conjunto dos dados reais normativamente
dades complexas, fortemente diferenciadas, sáo considerados cOrrucáo em sen- relevantes para a concretizacáo individuar'''. Nesse sentido, Miiller
tido amplo, correspondem ein sociedades sinIples, ao contrario, á expectativa define a normatividade em duas dimensóes: "`Normatividade' significa
moral, sendo diretamente exigidos - deve-se ajudar o próximo! Isso a propriedade dinámica da 1...1 norma jurídica de influenciar a realidade
ram-nos investigacees mais recentes sobre os países etn desenvolvintento, os a ela relacionada (normativiclacle concreta) e de ser, ao mesmo tempo,
quais, nessa questáo, encontram-se numa fase de tratisio5o com cotilla° institu- influenciada e estruturada por esse aspecto da realidade (normaiividade
cional" (grifos nossos). No caso investigado, náo se trata, porém, de um proble- materialmente determinadar22. Sc o ámbito normativo, que importa u-
ma de sociedades simples em "fase de transigáo" ("países em desenvolvimen-
to"). Ele resulta, ao contrário, da "heterogeneidade estruturar de sociedades 115. A respeito, ver Müller, 1984, 1990a, 1990b; Christensen, 1989:87ss.
complexas, modernas, os paí.ses periféricos, e pode ser melhor interpretado sis- Cf. tainbém I Iesse, 1980:24ss.
témico-teoreticamente como sintoma de complexidade estruturada insuficiente 116. Cf. Müller, 1984: esp. 147-67 e 234-40, 1990a: 126ss., 1990b: esp.
ou inadequadainente (ver abaixo Cap. 111.6.). 20; Christensen, 1989:78ss.; Jeand' I leur, 1989: esp. 22s.
114. A teoria de Jellinek da (brea normativa do fático (1976: 337ss.) náo se 117. Midler, 1975:38s., 1984:232-34, 1990b:20.
desliga dessa tradigáO Hesse (1984) permanece, em parte, ainda vinculado a 118. Midler, 1984: 17 e 250; cf. tambera idein, 1990b:124ss.; Christensen,
esse dualismo, na medida ern-que, no seu modelo, trata-se apenas da "relacáo 1989:87.
da Constituicáo jurídica com a realidade" (8). A respeito, criticamente, cf. 119. "Os problemas hennenétiticos complexos residem no espaco que o
Müller, 1984:77-93. Ver também, sob outro ponto de vista, as ponderacóes de texto nonnativo deixa aberto ás diversas possibilidades de compreensáo" (Mal-
Ritter (1968) sobre a concepcáo da realidade constitucional como 'bate do Di- ler, 1984:160).
reito. Luhmann critica, por sua vez, a discussá'o tradicional sobre a discrepáncia 120. Müller, 1984:252. Formulando de forma mais radical, afirma Miiller
entre texto e realidade constitucionais, pois, "para isso, náo se precisaria de ne- (1990b:20): "O texto nortnativo náo é 1.1 componente conceitual da norma ju-
nhum conceito de Constituicáo e nenhuma teoria da Constituicáo" (1973b:2), o rídica, mas sim, ao lado do caso a decidir juridicamente, o mais importante
que, evidentemente, náo é o caso no presente trabalho. Por fila, é de observar-se dado de entrada do processo individual de concretizagilo". Cf. tambera ibid.:
que, na perspectiva da teoria dos sistemas, a distincáo entre Direito e realidade 127 e 129; Jeand'Heur, 1989:22.
constitucionais só pode ser concebida como expressáo jurídico-constitucional da 121. MítIler, 1984:253. Cf idem, 1990b:128.
diferenea 'sistema/mei° ambiente' 122. Müller, 1984:258. Cf. também Christensen, 1989:87.

76
ma funcáo seletiva perante os ámbitos da materia e do caso'", náo se do processo interpretativo encontra-se a "esfera pública pluralistica" 133.
constitui de forma suficiente, a normatividade do respectivo texto cons- De acordo com essa abordagem, pode-se afirmar: o texto constitucional
titucional é atingida' 24 . Faltam, entáo, as condicóes e os pressupostos só obtém a sua normatividade mediante a inclusáo do público pluralis-
para a "producáo" da norma jurídica "que rege mediatamente um ticamente organizado no processo interpretativo, ou melhor, no processo
caso determinado" - e, portanto, da norma de decisdo - "imediata- de concretizacáo constitucional.
mente normativa, reguladora do caso determinado" 125. Nesse contexto
náo se fala de legislacáo e de atividade constituinte como procedimentos
de producáo de norma jurídica (geral), mas sim de emissáo de texto 2.2. Concretizaqdo Constitucional e Semiótica
legal ("Gesctzestextgcbung'') ou de emissáo de texto constitucional
("Verfassungstextgebung") 126 . A norma jurídica, especialmente a norma
As teorías constitucinais de Müller e Háberle sáo passíveis de urna
constitucional, é produzida no decorrer do processo de concretizacáo' 27. abordagem de acordo com a distincáo semiótica entre sintática, semán-
Com a perspectiva de Müller, "referente á matéria", compatibiliza-se tica e pragmática'". Em Müller, trata-se das características semánticas
a orientacáo de Haberle, "relativa a pessoas e grupos" 128. Através do en-
da linguagem jurídica, especialmente da linguagem constitucional, a
saio "A Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituicáo" 129, Háberle, ambigüidade e a vagueza' 35 , que exigem um "processo de concretiza-
além de indagar os fins e métodos da interpretacáo constitucional, póe Qá0", náo simplesmente um "procedimento de aplicacáo" conforme re-
sobretodo a "questáo dos participantes", para propor a teso: "Nos pro-
gras de subsuncáo. No caso de Háberle, a questáo diz respeito á relacáo
cessos de interprelacáo da ronstituilvlo, estilo potencialmente envolvi-
pragmática da linguagem com diversos expectantes e "utentes", o que
dos todos os órgáos estatais, todas as poténcias públicas, todos os cida-
implica um discurso conflituoso e "ideológico". Os aspectos semánticos
dios e grupos"m. O fato de que o Direito Constitucional "material",
4111'! conforme csse modelo, surge de urna multiplicidade de interesses e fun- 133. "O jurista constitucional é apenas um intermediario" (Haberle,
cóes, implica a diversidade prática de interpretacáo da Constituicaopl. 1980b:90). Dessa maneira, liaberle deixa de considerar o papel seletivo que os
Dessa maneira, náo se superestima a significacáo do texto constitucio- participantes, em sentido estrito, do procedimento de interpretacáo da Cons-
nal, como na doutrina tradicional da interpretacáo ) ". No primeiro plano
tituigao (cf. idem, 1980b:82s.) desempenham perante o público. Visto que a
"esfera pública" nao constitui lima unidade, mas sim urna pluralidade de inte-
123. Cf. Midler, 1984:253-56, 1990b:128; Christensen, 1989:88.
resses conflitantes, surgem expectativas constitucionais contraditórias, que se-
124. Cf. Midler, 1984:171.
rao, portanto, selecionadas ou exluídas no processo interpretativo da Constitui-
125. Sobre a distiNao entre norma jurídica (geral) e norma decisória (indi-
cao.
vidual), ver Müller, 1984:264ss. Cf. idem, 1990a:48; Christensen, 1989:88. 134. Essa divisa° da semiótica em trés dimensües, que remonta á distinga°
126. Cf. Miiller, 1984:264 e 270.
de Peirce entre signo, objeto e interpretante (cf. 1955:99s., 1985:149ss., 1977:
127. "A norma jurídica só é produzida no decurso da solticilo do caso"
esp. 28, 46, 63 e 74), foi formulada por Morris (1938:6ss.) e adotada por Car-
(Midler, 1984:273). Cf. Christensen, 1989:89. Nesse sentido, afirma Midler que nap (1948:8-11). Diversas correntes da teoría do Direito empregaram-na; cf., p.
o juiz nao é "legislador de segundo gran", mas sim "o único legislador, mesmo ex., Schreiber, 1962:10-14; Viehweg, 1974:111ss.; Ross, 1971:14-16; Kali-
que isso soe estranho" (Midler, 1990b:127, nota 16). Para uma explanaQao di-
nowski, 1971:77s., 82-93; Capella, 1968:22 e 76; Warat, 1972:44-48, 1984:39-
datica da conceffilo de Midler em língua portuguesa, ver a síntese de Canoti-
48; Reale, 1968:173.
lho, 1991:208ss. e 221 ss.
135. É verdade que isso é amplamente reconhecido; mas do incontestável
128. Assim as qualifica Ladeur, 1985:384s.
sao retiradas as mais diferentes conseqüéncias - cf., p. ex., Kelsen, 1960:348s.
129. Haberle, 1980b.
(tr. br., 1974:466s.); Smend, 1968:236; Ehrlich, 1967:295; Ross, 1971:111s.,
130. Haberle, 1980b:79s.
130. Especificamente sobre a ambigüidade e vagueza da linguagem jurídica, ver
131. Haberle, 1980b:93s.
Cardó, 1986:28ss.; Koch, 1977:41ss.; Warat, 1984:76-79, 1979:96-100. Em co-
132. Ilaberle, 1980b:90.
nexa() com a funláo simbólica do Direito, ver também Edelman, 1967:139ss.

7s
79
normativa'39.
e pragmáticos rclacionam-se, porém, mutuamente: a ambigüidade e va-
Todo isso implica que a linguagem jurídica, sobretodo a constitucio-
gucz.a da linguagcm constitucional levan' ao surginiento de expectativas
normativas diferentes e contraditórias perantc os textos normativos; por nal, náo é uma linguagent artificial, nias sim uni tipo especializado da
outro lado, as contradigóes de interesses c de opinióes entre expectantes linguagem ordinaria ou natural"), que, portant°, descnvolve-se basica-
e agentes constitucionais fortificam a variabilidadc da significagáo do mente a partir da situagáo semántico-pragmática, variando intensamen-
texto constitucionaln°. Somente sob as condigóes de uma unidade de in- te de significado conforme a situagáo e o contexto comunicativos".
teresse e concepgáo do mundo, as questóes constitucionais perderiam Assim sendo, é inconcebível um isolamento sintático. mediante a neu-
sua releváncia semántico-pragmática, para se tornarem primariamente tralizagáo dos problemas semánticos e pragmáticos, a favor da univoci-
dade e da seguranga de expectativa. Possível é, no entanto, a seletivida-
questóes sintáticas, orientadas pelas regras da dedugáo lógica e subsun-
de concretizante através de proccdimentos e argumentos, que, porém,
gáo. Mas uma tal situagáo é seguramente incompatível com a complexi- podem variar sensivelmente de caso para caso.
dade da sociedade moderna, especialmente no que diz respeito aos con-
A propósito, é de observar-se que também noma perspectiva semió-
fiaos. tica a supremacia normativa hierárquica da Constituigáo deve ser relati-
Nessa perspectiva semiótica, justifica-se entáo a reagáo crítica da
tópica (Viehweg), da hermenéutica normativa estniturante (Müller) e da
139. Cf. Christensen, 1989:88; Neves, 1988:136s.
interpretagáo constitucional pluralística (Haberle) á pretensáo do posi-
140. Cf. Vissert't Hooll, 1974; Carri6, 1986:49ss.; Greimas e Landowski,
tivismo jurídico de tratar os problemas constitucionais, enquanto ques-
1981:72s.; Olivecrona, 1968:7. 1)e acordo com o modelo lithmíniniano, pode-se
tóes jurídicas, primariamente sob seus aspectos sintáticos. "Modo de
sustentar que a especializallio da linguagem ordinaria relaciona-se com o de-
pensar situacional"137, "processo de concretizagáo" e "esfera pública
senvolvimento separado de mecanismos complementares para a linguagem, "luí
pluralística" sáo fórmulas distintas de acentuar a equivocidade semán-
forma de meios de conitinica0o simbolicamente generalizados para cada do-
tica dos textos constitucionais e a pluralidade pragmática das expecta-
minio funcional" (ver Cap. I. 1.7.), e, ix)r isso, com a formii0o dos esquema-
tivas constitucionais (dissenso valorativo ou "ideológico" na "como-
tismos binarios correspondentes; no caso do Direito, a especializa0o da 'nigua-
nidade" discursiva). Dessa mancira, cm contraposigáo ao positivismo gem resultaría do uso do código-diferenyli 'licito/ilícito' exclusivamente cm uní
jurídico, a dimensáo sintática fica subordinada á semántico-pragmá- sistema Iiincional para isso diferenciado (cf. Inlimann, 1974:62, onde, contudo,
tica'38. Observa-se que a operagáo lógico-sintática de substingáo pres- tal código-diferenla é vinculado ao mei° de conitinicaiiíio 'Poder', nao emita-
sup6e um complicado processo semántico-pragmático de concretizagáo
mente ao 'nejo de comunicayan `Direito' — mas cli acima nota 53 deste cap.).
141. É nesse sentido a célebre afirmativa de Wittgenstein (1960:211, § 43
136. A respeito, afirma Edelman (1967:141): "l'ara os diretamente envolvi-
— tr. br., 1979:28): "A significagáo de tima palavra é seu uso na linguagem".
dos, o sentido do Dimita modifica-se constante e notavelmente com as varia-
Cf. a respeito Müller, 1975:32-34, aplicando-a no dominio da leona do Direito.
g5es na influéncia dos gnipos".
Gadamer (1990:332s.), por sua vez, acentua que o jurista intérprete tem de
137. Cf. Viehweg, 1974:111ss. (tr. br., 1979:101ss.). Observe-se que para
Viehweg o padráo semántico de pensamento é náo-situacional, na medida em reconhecer a mudanga das relag5es e "daí determinar novamente a fittiláo nor-
mativa da Lei", adaptando-a ás necessidades do presente, a fun de "solucionar
que o significado das palavras estaria fixado para sempre (cf. 1974:114 — tr.
um problema prático". Pondera, porém, que, por isso inesino, náo se trata de
br., 1979:103). Porém, pode-se distinguir entre modo de pensar sintático-se-
"uma reinterpretagáo arbitrária". Na mesma linha e pressupondo também que a
mántico, que implica tima significagáo univocamente ftxada do signo (cf. idem, "linguagem náo é nunca arbitrária", sustenta Wimmer (1989:14): "A nualatwa
1974:111s. — tr. br., 1979:101s.), e modo de pensar semántico -pragnzático, que
radical permanente é uma característica essencial de todas as linguagens natu-
pressup5e a variabilidade do sentido dos termos e expressbes.
rais. Sem essa mudanla, as linguagens perded= sua fuina° cognitiva e sua po-
138. Em conformidade com o estruturalismo lingüístico, poder-se-ia afir-
téncia para a aquisiláo e assimilaláo da realidade". Cli também 1.arenz,
mar: no tocante á linguagem constitucional, as relagóes paradigmáticas (asso-
1978:401ss.; Pontes de Miranda, 1972:99; Vilanova, 1977:245; Alchourrón e
ciativas) tém predomináncia sobre as sintagmáticas (cf. Neves, 1988:150-52).
Bulygin, 1974:140-44; Sáchica, 1980:18s.; I3iscaretti di Ruffla, 1974:525-40.
Sobre essa distingáo, cf. as referéncias da nota 17 do cap. I.

8I
80
vizada. A separacáo completa entre metalinguagem e linguagem-obje-
te como sistema constitucional (complexo das expectativas normativas
tom tem sentido apenas no plano sintático. Na dimensáo semántico-
de comportamento filtradas através da legislacáo e concretizacáo consti-
pragmática condicionam-se reciprocamente metalinguagem e lingua-
tucionais, incluindo-se nele as respectivas comunicacóes) e realidade
gem-objeto. Por outro lado, embora o texto constitucional atue como constitucional como meio ambiente da Constitukáo (totalidade das ex-
metalinguagem em relacáo á "concretizacáo constitucional", as decisóes pectativas e comportamentos que se referem ao Direito Constitucional
interpretativas da constituicáo representam metalinguagem com respeito com base em outros códigos sistémicos ou em determinacóes do "mundo
ao texto constitucional (linguagem-objeto)" 3 . Se se tem presente a ca- da vida"). — Quanto maior é a complexidade social, tornam-se mais in-
racterística do texto constitucional de ser simultaneamente metalingua- tensas as divergéncias entre as expectativas em torno do texto constitu-
gem e linguagem-objeto com m'acá° á linguagem concretizadora, entáo cional e varia mais amplamente o seu significado no ámbito da interpre-
se pode, sob o ponto de vista semiótico, compreender mais claramente tacáo e aplicacáo. O que é válido para todos os textos normativos é par-
tanto a distincáo entre norma e texto constitucional, como também a in- ticularmente relevante no dominio do Direito Constitucional, na medida
sustentabilidade da concepcáo tradicional da supremacia hierárquica da era que ele é mais abrangente na dimensáo social, material e temporal.
Constituicáo.
Em conformidade com urna leitura sistémico-teórica desse enfoque
semiótico-lingüistico, cabe afirmar que o procedimento constituinte é 3. Constitucionaliznáo Simbólica em Sentido Negativo: Insuficiente
apenas um dos processos de filtragem para a vigéncia jurídica das ex- Concretizacáo Normativo-Jurídica Generalizada do Texto Cons-
pectativas normativo-constitucionais: as expectativas diversas e contra- titucional
ditórias em relacáo ao texto constitucional já ponto sáo filtradas ou se-
lecionadas através das decisóes concretizadoras da Constituicáo; somen- Da exposicáo sobre a relacáo entre texto constitucional e realidade
te entáo se pode falar de normas constitucionais vigentes. — Caso se constitucional, pode-se retirar um primeiro elemento caracterizador da
qucira, sob esse ángulo, insistir na dicotomia Direito/realidade constitu- constitucionalizacáo simbólica, o seu sentido negativo: o fato de que o
cional, ela significa aqui a diferenca entre Dircito constitucional vigen- texto constitucional náo é suficientemente concretizado normativo-juri-
dicamente de forma generalizada. Parte-se aqui do pressuposto da me-
142. Sobre esse par de conceitos, ver Carnap, 1948:3s.; Badiles, 1964:130- tódica normativo-estruturante (Müller) de que "do texto normativo
32 (tr. br.,s.d.: 96-99). mesmo — ao contrário da opiniáo dominante — náo resulta nenhuma
143. Cf. Neves, 1988:160-62. Porém, nesse trabalho anterior (162), a deci-
normatividade" 141. Por outro lado, náo fazemos uma distincáo entre
sao interpretante da Constituiláo era caracterizada como metalinguagem "des-
critiva" com relacáo ás normas constitucionais, em oposigáo ao caráter "pres- realizacáo e concretizacáo constitucionais" 5. Tal distincáo só teria sen-
tido se náo incluíssemos no processo concretizador todos os órgáos esta-
critivo" destas com respeito á sua própria interpretagrío-aplicagáo. No presente
trabalho trata-se, antes, da relagáo circular entre texto constitucional e sua pró- tais, individuos e organizacóes privadas, restringindo-o á construcáo da
pria interpretacao, que também tem Unplicagües normativas. Nesse sentido, a- norma jurídica e da norma de decis.áo pelos órgáos encarregados estri-
firma Luhmann (1990a:217) que "os componentes auto-referenciais realizam-se tamente da "interpretacáo-aplicacáo" normativa. A concretizacáo cons-
pelo Ibto de que também a interpretagáo tenia produzir vínculos normativos", titucional abrange, contudo, tanto os participantes diretos do procedi-
náo se restringindo apenas a falar sobre o texto. O "jurista constitucional" en- mento de interpretacáo-aplicacáo da Constitukáo quanto o "público"" 6.
contrar-se-ia, entáo, muna situagáo idéntica á do lingüista, que, ao falar sobre a Nesse sentido, ela envolve o conceito de realizacáo constitucional. Mas
linguagem, ten como seu objeto o seu próprio comportamento (ibid.). Cf. tam-
bém I lofstadter, 1986:24s., crítico com relacáo á teoría dos tipos de Russell
(1968: 75-80), na medida em que essa pretende eliminar "entrelagamentos" e 144. Jeand'Heur, 1989:22.
paradoxias no interior da linguagem, levando á hierarquizagáo entre metalin- 145. Em sentido diverso, ver Canotilho, 1991:207-209.
guagem e linguagem-objeto. 146. Cf. Haberle, 1980b:82s., enumerando os participantes do procedimen-
to de interpretacáo constitucional.

82
83
náo se trata de um simples conceito sociológico, relevante apenas em u- lítico, científico, religioso, moral etc.), subordinado e orientado por ou-
ma perspectiva externa, tendo implicaeóes internas, ou seja, do ponto de tros códigos-diferenQa (ter/nao-ter, poder/nao-poder, verdadeiro/falso
vista da auto-observaeáo do sistema jurídico'". E pode-se afirmar que a etc.), sejant eles sistemicamente estruturados ou envolvidos no "mundo
falta generalizada de concretiz.náo das normas constitticionais, como no da vida"m, nao estariam ent condiOes de sublima-se a unia connitaQao
caso da constitucionalizaQáo simbólica, pode significar a própria selctiva por parte do código jurídico de diferenQa entre lícito e ilícito. Os
proccdimentos e argumentos especificamente jurídicos nao (crian' rele-
possibilidade de uma distineáo entre abordagens internas e externas'48.
O problema náo se restringe á desconexáo entre disposiOes consti- vancia funcional em reina° aos fatores do mcio ambiente. Ao contrário,
no caso da constitucionalizaQáo simbólica ocorre o bloqueio permanente
tucionais e comportamento dos agentes públicos e privados, ou seja, náo
e estrutural da concretizaQáo dos critérios/programas jurídico-constitu- e
é uma questáo simplesmente de eficácia como direcionamento norma-
tivo-constitucional da a9áo. Ele ganha sua releváncia específica, no ám- cionais pela injunQáo de outros códigos sistémicos e por determinaQóes o
bito da Constitucionalizaqáo simbólica, ao nivel da vigéncia social das do "mundo da vida", de tal maneira que, no plano constitucional, ao
código "lícito/ilícito sobrepócm-se outros códigos-difereno orientadores
normas constitucionais escritas, caracterizando-se por uma auséncia ge- da aQáo e vivéncia sociais. Nessa perspectiva, mesmo sc admitindo a di- o
neralizada de orientaQáo das expectativas normativas conforme as deter- fercnQa entre constitucional e inconstitucional como código autónomo
minaqóes dos dispositivos da ConstituiQáo (ver acima item 8.4 do cap.
I). Ao texto constitucional falta, entáo, normatividade. Em linguagem
no interior do sistema jurídicol51, "o problema reside nao apenas na
constitucionalidade do Dircito, ele reside, priinciramentc, já na juridi-
o
da teoria dos sistemas, náo lhe correspondem expectativas normativas cidade da Constitui0o"1". Pode-se afirmar que a realidade constitucio- o
congruentemente generalizadas (cf. nota 241 do cap. I). Nas palavras da nal, enquanto mcio ambiente do Dircito Constitucional, tem relevancia
metodologia normativo-estruturante, náo há uma integraQáo suficiente "seletiva", ou mclhor, destrutiva, em relaQáo a essc sistema.
entre programa normativo (dados lingüísticos) e ámbito ou domínio Numa leitura da concepqao pluralística e "processual" da Constitui-
normativo (dados reais). Náo estáo presentes as condiQües para o pro-
cesso seletivo de construeáo efetiva do ámbito normativo a partir dos 150. A nog'áo de "inundo da vida" refere-se aqui á esfera (las agóes e vivisii-
ámbitos da matéria e do caso, com respaldo nos elementos lingüísticos
contidos no programa normativo. O ámbito da matéria — "o conjunto de
cias que náo se encontram diferenciadas sistémico-funcionalmente, implicando
códigos de preferéncia difusos. Nesse sentido, a inoral na acepyáo de 1,tilimann
o
todos os dados empíricos V.] que estáo relacionados com a norma"149 — (1990c), como comunicagá'o orientada pela diferenga entre respeito e desprezo,
náo se encontra estruturado de tal maneira que possibilite o seu enqua- estaria incluida no "mundo da vida". Náo se trata da concepgáo habennasiana
dramento seletivo no ámbito normativo. Ao texto constitucional náo
corresponde normatividade concreta nem normatividade materialmente
de "mundo da vida" como esfera do "agir comunicativo", orientado para o en- o
determinada, ou seja, dele náo decorre, com caráter generalizado, nor-
tendimento intersubjetivo, embora também concebamos o "mundo da vida''
espago de agir (e vivenciar) n'áo subordinado aos códigos-ineio sistémico-
o
ma constitucional como variável influenciadora-estruturante e, ao mes- funcionais (cf. Habennas, 1982b11:171ss., apontando para a diferenciagáo entre
mo tempo, influenciada-estruturada pela realidade a ela coordenada. sistema e inundo da vida como processo de evolugáo social — 229ss. ; idem,
Numa visáo sistémico-teórica, o ámbito da matéria (económico, po- 1973:9s.). Por outro lado, náo adotainos aqui o conceito lulimanniano de
"mundo da vida" como soma e unidade de todas as possibilidades que se apre-
147. Quanto á distingáo entre perspectiva interna ou auto-observagáo e sentain ao sistema (I Ailimann, 1987a:106; cf. também 1988a:70s., onde se filia
perspectiva externa ou hetero-observagáo, em relagáo, respectivainente, á teoria de "horizonte de possibilidades náo-atualizadas", recorrendo-se a Husserl,
do Direito/dogmática-juridica e á sociologia do Direito, ver 1,uhmann, 1989b,
1986c: esp. 19, 1987b:360s.; Carbonnier, 1978:22s.
1982, o qual vai definir o "mundo da vida", em contraposigáo ao inundo das
idealidades, antes como "fundamento-de-sentido esquecido da ciéncia natural"
<
148. Nesse sentido, cf. Neves, 1992:206s. e 210. Retornaremos a esse pro- — 52ss.). Para tal referéncia, seria mais adequado o termo "mundo" simples-
blema no Cap. mente.
149. Christensen, 1989:88. 151. Cf. Lulunann, 1990a:188s.
152. Ltilimann, 1992: 3.

84 85
00, tal como a formulou Háberlcm, é possível afirmar que o problema
á "ineficácia" ou "náo-realizacáo" das normas constitucionais.
da constitucionalizacáo simbólica está vinculado á náo-inclusáo de urna Aqui náo se desconhece que também as constituicties "normativas"
"esfera pública" pluralista no processo de concretizacáo constitucional. desempenham funcáo simbólica, como bem enfatizaram Burdeau e E-
Mas náo apenas: além da auséncia de um "público pluralista" como
delman, amparados, respectivamente, na experiéncia constitucional eu-
participante (em sentido lato) do processo de concretizacáo constitucio-
nal, as disposicbes constitucionais náo sao relevantes para os órgáos es- ropéia e norte-americana 1 S6 ; tampouco que a distincáo entre "Constitui-
tatais vinculados estritamente á sua interpretacáo-aplicacáo. Nesse QáO normativa" e "Constituicáo simbólica" é relativa, tratando-se "antes
sentido, náo tem validade, no dominio da constitucionalizacáo simbó- de dois pontos extremos de uma escala do que de urna dicotomia"'". Po--
lica, a afirmativa de Hesse, baseado na experiéncia constitucional da rém, a funcáo simbólica das "Constituicó'es normativas" está vinculada
(antiga) Alemanha Ocidental: "Na relacáo entre Uniáo e Estados-Mem- á sua releváncia jurídico-instrumental, isto é, a um amplo grau de con-
bros (Llindern), na relacáo dos órgáos estatais entre si como cm suas cretizacáo normativa generalizada das disposicóes constitucionais. Além
func•Ites, a argumentas áo e discussáo jurídico-constitucional desempe- de servir de expressáo simbólica da "consistencia", "liberdade", "igual-
nham um papel dominante"'". Nas situaeles de constitucionalismo dade", "participacáo" etc. como elementos caracterizadores da ordem
simbólico, ao contrário; a práxis dos órgáos estatais é orientada náo política fundada na Constituicáo, é inegável que as "constituicóes nor-
apenas no sentido de "socavar" a Constituicáo (evasáo ou desvio de fi- mativas" implicam juridicamente um grau elevado de direcáo da condu-
nalidade), mas também no sentido de violó - la contínua e casuistica- ta em interferencia intersubjetiva e de orientacáo das expectativas de
mente'''. Dessa maneira, ao texto constitucional includente contrapóe-se comportamento. As respectivas disposicsks constitucionais correspon-
uma realidade constitucional excludente do "público", náo surgindo, dem, numa amplitude maior ou menor, mas sempre de forma social-
portanto, a respectiva normatividade constitucional; ou, no mínimo, mente relevante, "expectativas normativas congruentemente generaliza-
cabe falar de urna normatividade constitucional restrita, náo generali- das" (ver nota 241 do Cap. I). O "simbólico" e o "instrumental" intera-
zada nas dimensóes temporal, social e material. gem reciprocamente para possibilitar a concretizacáo das normas consti-
tucionais. A Constituicáo funciona realmente como instancia reflexiva
de um sistema jurídico vigente e eficaz.
4. Constitucionaliznáo Simbólica em Sentido Positivo: Funcáo Polí- Já no caso da constitucionalizacáo simbólica, á atividade constituinte
tico-Ideológica da Atividade Constituinte e do Texto Constitucio- e á emissáo do texto constitucional náo se segue urna normatividade
nal jurídica generalizada, uma abrangente concretizacáo normativa do texto
constitucional. Assim como já afirmamos em relacáo á legislacáo sim-
Finbora sob o ponto de vista jurídico, a constitucionalizacáo simbó- bólica (cf. item 6 do Cap. I), o elemento de distincáo é também a hiper-
lica soja caracterizada negativamente pela auséncia de concretizacáo trofia da dimensáo simbólica cm detrimento da rcalizacáo jurídico - ins-
normativa do texto constitucional, ela também tem um sentido positivo, trumental dos dispositivos constitucionais. Portanto, o sentido positivo
na medida em que a atividade constituinte e a linguagem constitucional da constitucionalizacáo simbólica está vinculado á sua característica
desempenham um relevante papel político-ideológico. Nesse sentido, ela negativa, já considerada no item anteriorm. Sua definicáo engloba esscs
exige um tratamento diferenciado das abordagens tsadicionais referentes
156. Cf. Edelman, 1967:18s.; Burdeau, 1962:398, tratando da "dissolucáo
153. Além do artigo já citado no item 2.1 deste Cap. (Haberle, 1980b), ver, do conceito de Constituicáo". Ver também, analisando a funcáo simbólica da
a respeito, os outros trabalhos publicados na mesma publicacáo — Haberle, retórica das decisóes do Tribunal Constitucional Federal na Alemanha, Mas-
I980a. sing, 1989.
154. 1-lesse, 1984:15. 157. Bryde, 1982:27.
155. Aqui nos reportamos a Grimm, 1989:637, que distingue, muna lingua- 158. Nesse sentido, afirma Villegas (1991:12) coro reina() á experiéncia
gem muito singular, entre "realidade constitucional socavaste da Constituicáo" constitucional colombiana: "A eficacia simbólica do dircito constitucional na
e "icalidade constitucional violadora da Constituis:Ao". Colóinbia costuma apresentar-se combinada com urna ineficacia instnimental,

86
R7
dois momentos: de um lado, sua funcáo náo é direcionar as condutas e constitucionalizaQáo simbólica, o problema ideológico consiste cm que
orientar expectativas conforme as determinacóes jurídicas das respecti- se transmite um modelo cuja realizacáo só seria possível sob condiOes
vas disposiOes constitucionais; mas, por outro lado, cla responde a sociais totalmente diversas. Dessa maneira, perde-se transparL'iicia ein
exigéncias e objetivos políticos concretos. "Isso pode ser a reveréncia relaqáo ao fato de que a situaQáo social correspondente ao modelo cons-
retórica diante de determinados valores (democracia, paz). Pode tratar- titucional simbólico só poderia tornar-se rcalidade mediante tima pro-
se também de propaganda perante o estrangeiro"'59. funda transformaQáo da sociedade. Ou o figurino constitucional atua co-
Nós nos encontramos aqui na esfera do ideológico no sentido de Ha- mo ideal, que através dos "donos do poder" e sem prejuízo para os gru-
bermas: "O que chamamos ideologia sáo exatamente as ilusiies dotadas pos privilegiados deverá ser realizado, desenvolvendo-se, entáo, a fór-
do poder das convicOes comuns"16°. Náo se trata de ideologia no sen- mula retórica da boa intencáo do legislador constituinte e dos governan-
tido de Luhmann, que - como neutralizaQáo artificial de outras possi- tes em geral'66.
bilidades'6' ou valoraQáo de valores (mecanismo reflexivo)'62 - estaria á O "Constitucionalismo aparente"167 implica, nessas condiOes, unia
SCIViQO da reduQáo funcionalmente adequada da complexidade da socie-
representacáo ilusoria em relacáo realidade constitucionalm, scrvindo
dade contemporánea'63; nos termos do conceito Itilimanniano de ideo- antes para imunizar o sistema político contra outras alternativas. Atra-
logia, seria de afirmar-se, cm relacáo ao caso por nós analisado, que es- vés dele, náo apenas podem permanecer inaltcrados os problemas e re-
taríamos diante da atuacáo unilateral dos aspectos "simbólicos" da ideo- la95es que seriam normatizados com base nas respectivas disposiOes
logia, isto é, perante a falta de sua correspondente "funeáo instni- constitucionaisw, mas também ser obstruido o caminho daS
mentar". Por outro lado, no presente trabalho a ideología náo é com- sociais direQáo ao proclamado Estado Constitucional'7". Ao discurso
preendida como deformaQáo de uma verdade essencial, de modo ne- do poder pertence, entáo, a invocaQáo perinancnte do documento consti-
nhum como uma representaQáo falsa do que "náo náo é"'65. Em caso de tucional como estrutura normativa garantidora dos dircito fundamentais
(civis, políticos e sociais), da "divisáo" de poderes e da eleiQáo
ou o que é igual, com um fracasso na realizaláo de seus objetivos explícitos".
Mas esse autor generaliza indistintamente a noca° de eficacia simbólica da 1986b:596). Dm panorama das conceptiées de ideologia dominantes na tradi0o
filosófica e científica ocidental encontra-se em Lenk (org.), 1972. A respeito,
Constituiláo nos termos da conceplán "clássica" de política simbólica (v. acima
ver também a síntese de Topitsch, 1959. Quanto á relallio entre Direito e
Cap. I. 3): "() poder da Constituigáo - de todas as constittuyées - é funda-
mentalmente simbólico e náo jurídico" (idem, 1991:8). Subestima-se, íissim, a ideologia, ver, sob diversos pontos de vista, Maihofer (org.), 1969.
releváncia regulativo-jurídica das "Constituilóes normativas". 166. "É ingenuo acreditar que bastiiria o legislador ordenar, entáo ()concha
159. Bryde, 1982:28, que cita a afinnacao de um otici¿d superior de Ban- o querido" (Shindler, 1967:66 - grifo nosso). Mas, sob determinadas condi-
gladesh, antes das eleilées de janeiro de 1979: "O Ocidente, e especialmente o lées sociais, ~beim é ingenuidade acreditar, como Schindler (1967:67), em
Congress° dos EUA, gosta de- que sejamos denominados de tima democracia. boas imenqaes do legislador.
Isso toma para nós mais fácil receber ¿Oda" (ibid., nota 6). 167. Grimm, 1989:634.
160. Habennas, 1987b:246 (tr. br., 1980:115). 168. Como já observamos acima (Cap. I. 7.3.), daí náo decorre a concepOo
161. Lulunann, 1962. simplista do legislador constitucional e do público, respectivamente, como ilti-
162. Luhmann, 1984c:182ss. sor e iludido.
163. "Direito positivo e ideologia adquirem nos sistemas sociais unta fun- 169. Cf. 13ryde, 1982:28s.
gáo para a reduláo da complexidade do sistema e de set' meio ambiente" (1,1th- 170. Cabe advertir, porém, que mesmo as "ConstittnOes normativas" 'lijo
maim, 1 984c:I79). podem solucionar diremmente os problemas sociais (cf. acima p. 39.). Nesse
164. Cf. Luhmann, 1984c: I 83. sentido, enfatiza Grimm (1989:638) que elas "náo podem modificar diretamente
165. Lulunann, 1962: passim, criticando tal concepOo ontológica de ideo- a realidade, mas sim apenas indiretamente influenciar". Considera-se, entáo, a
logia, da qual faz parte a noláo marxista de ideología como "falsa consciencia" atttonomia dos diversos dominios funcionais no Estado Constitucional (641).
(cf., p. ex., Marx e Engels, 1990: esp. 26s.; Engels, 1985:108s., 1986a: esp. 563, Cf. também idein (org.), 1990.

89
88
crática, e o recurso retórico a essas instituicdes como conquistas do Es-
tado-Governo e provas da existéncia da democracia no país'''. A fór- normativa esteja relacionada com a funcáo simbólica. É sempre possível
mula ideologicamcnte carregada "sociedade democrática" é utilizada a existéncia de disposicóes constitucionais com efeito simplesmente
pelos govenantes (em sentido acoplo) com "constituicóes simbólicas" táo simbólico, sem que daí decorra o comprometimcnto do sistema consti-
regularmente como pelos seus colegas sob "constituicóes normativas", tucional em suas linhas mestras. Falamos de constitucionalizacáo sim-
supondo - se que se trata da mesma realidade constitucional. Daí decorre bólica sitiando o problema do funcionamento hipertroficamente político-
uma deturpacáo pragmática da linguagem constitucional, que, se, por ideológico da atividade e texto constitucionais atinge as vigas mestras
um lado, diminui a tensáo social e obstrui os caminhos para a transfor- do sistema jurídico constitucional. Isso ocorre guando as instituicóes
1111100 da sociedade, imunizando o sistema contra outras alternativas, constitucionais básicas — os direitos fundamentais (civis, políticos e
pode. por outro lado, conduzir, nos casos extremos, á desconfianca pú- sociais), a "separacáo" de poderes e a eleicáo democrática náo encon-
blica no sistema político e nos agentes estatais. Nesse sentido, a própria trara ressonáncia generalizada na práxis dos órgáos estatais, nem na
conduta e expectativas da populacáo. Mas é sobretudo no que diz respei-
funcáo ideológica da constitucionalizacáo simbólica tem os seus limites,
podendo inverter-se, contraditoriamente, a situacáo, no sentido de urna to ao princípio da igualdade perante a lei, que implica a generalizacáo
tomada de consciéncia da discrepáncia entre acáo política e discurso do código 'lícito/ilícito', ou seja, a inclusáo de toda a populacáo no sis-
constitucionalista (cf. item 10 deste Cap.). tema jurídicom, que se caracterizará de forma mais clara a constitucio-
A constitucionalizacáo simbólica vai diferenciar-se da legislacáo nalizacáo simbólica. Pode-se afirmar que, ao contrário da generalizacáo
simbólica pela sua maior abrang'éncia ras dimensócs social, temporal e do Direito que decorreria do princípio da igualdade, proclamado simbó-
material. Enquanto na legislacao simbólica o problema se restringe a lico-ideologicamente na Constituicao, a realidade constitucional é cntáo
relacóes jurídicas de dominios específicos, náo seudo envolvido o sis- particularista, inclusive no que concerne á prática dos órgáos estatais.
tema jurídico como um todo, no caso da constitucionalizacáo simbólica Ao texto constitucional simbolicamente includente contrapóc-se a reali-
esse sistema é atingido no seu núcleo, comprometendo-se toda a sua es- dade constitucional excludente. Os direitos fundamentais, a "separacáo
trutura operacional. Isso porque a Constituicáo, enquanto instáncia re- de poderes", a eleicáo democrática e a igualdade perante a lei, institutos
flexiva fundamental do sistema jurídico (ver item 1.3.3 desse Cap.), previstos abrangentemente na linguagem constitucional, sáo deturpados
apresenta-se como metalinguagem normativa em relacáo a todas as na práxis do processo concretizador, principalmente com respeito á ge-
normas infraconstitucionais, representa o processo mais abrangente de neralizacáo, na medida em que se submetem a uma filtragem por crité-
normatizacáo no interior do Direito positivo. Caso náo seja construida rios particularistas de natureza política, económica etc. Nesse contexto
normatividade constitucional suficiente durante o processo de concreti- só caberia falar de normatividade restrita e, portanto, excludente, parti-
zaclio, de tal maneira que ao texto constitucional náo corresponda es- cularista, em suma, contrária á normatividade generalizada e includente
trutura normativa como conexáo entre programa e ámbito normativos, a proclamada no texto constitucional. Mas as Instituicóes jurídicas" con-
Icgislacáo ordinária como linguagem-objeto fica prejudicada em sua sagradas no texto constitucional permanecem relevantes como referen-
normatividade. Como veremos no Cap. III, o próprio processo de repro- cias simbólicas do discurso do poder.
ducáo operacional-normativa do Direito é globalmente bloqueado nos Por fim, quero advertir que náo se confunde aqui o simbólico com o
casos de constitucionalizacáo simbólica. ideológico. Inegavelmente, o simbólico da legislacáo pode ter um papel
Também náo se confunde o problema da constitucionalizacáo sim- relevante na tomada de consciéncia e, portanto, efeitos "emancipató-
bólica com a ineficácia de alguns dispositivos específicos do diploma
constitucional, mesmo que. nesse caso, a auséncia de concretizacáo 172. "O principio da igualdade náo diz que todo o mundo deve ter os mes-
mos direitos (em tal caso tornar-se-ia inconcebível o caráter do direito como di-
171. "I-loje, no mundo inteiro, náo deve haver ainda quase nenhum Estado reito), mas que a ordem jurídica de urna sociedade diferenciada deve ser gene-
que náo dé valor a ser qualificado de democracia e, como tal, reconhecido inter- ralizada de acordo com determinadas exigéncias estruturais" (I.uhmann, 1965:
nacionalmente" (Krttger, 1968:23). 165). Especificamente a respeito do "principio da igualdade como forma e como
norma", v. idem, 1 99 la.

90
rst rr I
decisionista de constituicao (cf. nota 38 deste Cap.), sustenta se, entáo,
-

rios". Lefort aponta para a releváncia das declaragóes "legais" dos que os compromissos auténticos destinam-se á "regulagáo e ordcnagáo
"direitos do homem" no Estado de Direito democrático, cuja fungáo objetiva" de certos assuntos controversos, "mediante transagócs" cm
simbólica teria contribuído para a conquista e ampliagáo dcsses direi-
tos'''. Mas no caso da constitucionalizagáo simbólica, principalmente
torno da organizagáo e do conteúdo da Constituigáo'77. Os "de fórmula
dilatória" ou "náo auténticos", ao contrário, náo diriam respeito a deci-
o
enquanto constitucionalizagáo-álibi, ocorre antes uma intersegáo entre sóes objetivas alcangadas através de transagóes, servindo cxatamente
simbólico e ideológico do que um processo crítico de conscientizagáo para afastar e adiar a decisáo'78. O compromisso objetivaria "encontrar
dos direitos, na medida mesmo em que se imuniza o sistema político

CCC C CC C C0 00 0 0 00 0 0 04 , 005 00 50 t>


uma fórmula que satisfaga todas as exigéncias contraciitórias e dcixe in-
contra outras possibilidades e transfere-se a solugáo dos problemas para decisa em uma expressáo anfibiológica a questáo litigiosa mesma"'79.
um futuro remoto. Assim sendo, qualquer dos partidos inconciliávcis podem recorrer ás
respectivas disposigóes constitucionais, sem que daí possa decorrcr tima
interpretagáo jurídica convincente'''. Mas Schmitt enfatizava que a
S. Tipos de ConstitucionalizacAo Simbólica. Constituicao como Álibi
questáo dos compromissos de fórmula dilatória atingia apenas particu-
laridades da regulaQáo legal-constitucional'''. Conforme o modelo deci-
Partindo-se da tipologia da legislagáo simbólica já tratada acima sionista, concluía ele: "Se a ConstituiQáo de Weimar náo contivesse
(Cap. 1. 7.), poder-se-ia classificar também a constitucionalizagáo sim- nada mais que tais compromissos dilatorios, seria ilusório seu valor e
bólica em trés formas básicas de manifestagáo: 1) a constitucionalizagáo teria de admitir-se que as decisóes políticas fundamentais recairatnibm
simbólica destinada á corroboragáo de determinados valores sociais: 2) a dos procedimentos e métodos constitucionalmente previstos"'". Porém
constituigáo como fórmula de compromisso dilatório; 3) a constitucio- nessa hipótese, náo estaríamos mais no domínio estrito dos compromis-
nalizagáo-álibi. sos de cláusula dilatória — que sempre liodem surgir em qualquer pro-
No primeiro caso teríamos os dispositivos constitucionais que, sem cesso de constitucionalizaqáo, implicando funQáo simbólica de aspectos
releváncia normativo-jurídica, confirmam as crengas e modus vivendi de parciais da ConstituiQáo —, e sim perante o problema mais abrangente
determinados grupos, como seria o caso da afirmagáo de princípios de
da constitucionaliznáo-álibi, que compromete todo o sistema constitu-
"autenticidade" e "negritude" nos países africanos após a indcpendén-
cia, a que sc refere Brydem. Mas aqui náo se trata exatamente do pro-
177. Schmitt, 1970:31 (tr. esp., 1970:36).
blema abrangentc do comprometimento das instituigócs constitucionais
178. Sclunitt, 1970:31 (tr. esw, 1970:36).
básicas, ou seja, do bloqueio na concretizagáo das normas constitu-
179. Schmitt, 1970:31s. (tr. esp., 1970:36).
cionais concernentes aos direitos fundamcntais, "divisáo de poderes",
180. Sclunitt, 1970:34s. (tr. esp., 1970:39).
eleigóes democráticas e igualdade perante a lei. Constituem simbolismos
181. Ou seja, a Constituiláo em sentido relativo "como uma pluralidade de
específicos, muitas vezes vinculados a textos constitucionais autocrá- leis particulares" (Sclunitt, 1970:11-20 — tr. esp., 1970:13-23), nao a Constitui-
ticos, de tal maneira que náo cabe, a rigor, falar de constitucionalizagáo gáo em sentido positivo "como decisáo de conjunto sobre modo e Innna da
simbólica. unidade política" (1970:20ss. — tr. esp. I 970:23ss), que tem predominancia no
No que se refere ao segundo tipo, é representativa a análisc da
modelo decisionista (cf. acima nota 38 deste cap.): Schmitt também diferenciará
Constituigáo de Weimar (1919) por Schmitt, que releva o seu caráter de
os conceitos absoluto e ideal de Constituicao, que se referem, respectivamente,
compromisso'", distinguindo, porém, os compromissos "auténticos" dos
á "Constituicao como um todo unitario", seja esse a "concreta maneira de ser"
"náo auténticos" ou "de fórmula dilatória"'7°. Conformc a concepgáo
da unidade política ou "um sistema de nomas supremas e últimas" (3ss.), e á
"verdadeira" Constituiyáo como resposta a um modelo político-ideológico
173.Cf. Lefort, 1981:67ss., 82 (tr. br., 1987:56ss., 68). determinado (36-41 — tr. esp., 41-47). Cf. aciina p. 58s. e nota 14 deste capítu-
174. Bryde, 1987:37. Ver também acima, p. 36.
lo.).
175. Schmitt, 1970:28-36 (tr. esp., 1970:33-41).
182. Schmitt, 1970:36 (tr. esp., 1970:40).
176. Schmitt, 1970:31-36 (tr. esp., 1970:36-41).

93
92
cional. Daí porque restringimos a questáo da constitucionalizacáo sim- governa n tes.
bólica aos casos cm que a própria atividade constituinte (e reformadora),
o texto constitucional mesmo e o discurso a ele referente funcionam, A compreensáo da constitucionalizaeáo simbólica como álibi em fa-
vor dos agentes políticos dominantes e em detrimento da concretizacáo
antes de Ludo, como álibi para os legisladores constitucionais e gover-
constitucional encontra respaldo nas observacks de Bryde a respeito,
nantes (cm sentido amplo), como também para detentores de poder náo
integrados formalmente na organizacáo estatal. também, da experiéncia africana: as "Constituicóes simbólicas", em
oposicáo ás "normativas", fundamentam-se sobretudo nas "pretensóes
Já em 1962, cm scu artigo sobre a "dissolucáo do conceito de Consti-
(correspondentes a necessidades internas ou externas) da elite dirigente
tuicáo", Burdcau referia-se á Constituicáo como "álibi" e "símbolo"'".
pela representacáo simbólica de sua ordem estatal" 1 "°. Delas náo decorre
Contudo, sob tais rubricas, incluíam-se situacóes as mais diversas, co-
mo, no caso das democracias ocidentais, "a incapacidade do parlamento qualquer modificacáo real no processo de poder. No mínimo, há um
perantc os problemas da cconomia planificada e do controle da vida adiamento retórico da realizacáo do modelo constitucional para um fu-
económica", e "a inutilidade das normas que devem garantir a estabili- turo remoto, como se isso fosse possível sem transformac5es radicais
dade do regime"'". De outro lado, considerava o problema da Constitui- nas relactes de poder e na estrutura social.
00 como "símbolo" nos Estados africanos que, entáo, haviam conquis-
tado recentemente a independencia forman". Esse caso distinguia-se 6. A ConstitucionalizacAo Simbólica e o Modelo Classificatório de
radicalmente daquele, que Loewenstein denominara de "desvalorizacáo Loewenstein
da Constituicao escrita na democracia constitucional" 186 . Tal situacáo,
considerada como urna crise no segundo pós-guerra, resultava dos limi- Conforme a sua relacáo com a realidade do processo de poder, as
tes do Direito Constitucional numa sociedade altamente complexa, na
Constituicóes foram classificadas por Loewenstein em trés tipos básicos:
qual oufros mecanismos reflexivos, códigos autónomos e sistemas auto- "normativas", "nominalistas" e "semánticas" 19°. As Constituicóes "nor-
poiéticos surgiam e desenvolviam-se 187 . A Constituicáo náo perdía estru- mativas" seriam aquelas que direcionam realmente o processo de poder,
turalmente sua (brea normativa' 88 e, portanto, o Direito positivo náo era de tal maneira que as relaceres políticas e os agentes de poder ficam
generalizadamente bloqueado na sua reproducáo operacional. Nos esta- sujeitos ás suas determinac5es de conteúdo e ao seu controle proce-
dos que se formavam, entáo, na África, tratava-se da falta de condicóes dimental. As Constituicóes "nominalistas", embora contendo disposi-
sociais mínimas para a concretizacáo constitucional e, por conseguinte, c5es de limitaQáo e controle da dominaeáo política, náo teriam resso-
da ausencia dos pressupostos para a construcáo do Direito positivo como náncia no processo real de poder, inexistindo suficiente concretizacáo
esfera funcional autónoma. O texto constitucional, a sua producáo e o constitucional. Já as Constituicóes "semánticas" seriam simples reflexos
respectivo discurso em torno dele atuavam como álibi para os novos da realidade do processo político, servindo, ao contrário das "norma-
tivas", como mero instrumento dos "donos do poder", náo para sua
183. Burdeau, 1962:398. limitacáo ou controle. Tratava-se de conceitos típico - ideais no sentido
184. Burdcati, 1962:398. de Weberm, de tal maneira que na realidade social haveria vários graus
185. 13urdeatt, 1962:398s.
de "normatividade", "nominalismo" e "semantismo" constitucional, ca-
186. Loewenstein, 1975:157-66.
187. Cf. Grinun, 1987a:73. Ver lamben] idem (org.), 1990, onde se discute 189. Bryde, 1982:29.
o problema da ampliacáo das tarefas estatais em face da reducáo da capacidade 190. Cf. Loewenstein, 1975:151-57, 1956:222-25. Para urna releitura da
regulativa do Direito. Quanto ao conceito de sistema autopoiético, ver acima
classifica9áo de Loewenstein, ver Neves, 1992:65-71, de onde retiramos, em
Cap. III. I.
linhas gerais, os argumentos que se seguem.
188. O próprio Loewenstein referia-se ao problema da "judicializacáo da 191. Cf. Neves, 1992:110s. A respeito do conceito de tipo ideal, ver We-
política", considerando especialmente a experiéncia do Tribunal Constitucional ber, 1973:190-212, I968a:67-69, 157-59 e 163-65. Ver também abaixo Cap.
da República Federal da Alemanha (1975:261ss.). 111.6.

95
racterizando-sc a respectiva constituicáo pela predomináncia de um des- te (cf. nota 141 deste Cap.). Nas -Constituicóes nominalistas", ao con-
ses aspectos. trário, dá-se o bloqucio generalizado do set! proccsso concretizalor, de
A classificacáo de Locwelistein refere-se mais exatainente á funcáo tal mancira que o texto constitucional perde cm relcválicia normativo-
da acáo constituinte e linguagem constitucional, especialmente perantc jurídica diante das relacóes de poder. Faltan] os pressupostos sociais
o processo político, ou, simplesmente, á relacáo entre texto e rcalidade para a realizacáo do seu coludido normativo. Locwenstein vai acentuar
constitucional'". Se ao texto da constituicáo corresponde, de forma ge- essc aspecto negativo, apontando para a possibilidadc de evolucáo
neralizada, norrnatividade constitucional, entáo se fala de "Constituicáo política no sentido da realizacáo do modelo constitucional: a Constitui-
normativa". 1sso náo significa que entre normas constitucionais e rcali- 00 é comparada metaforicamente a um terno temporariamente pendu-

dade do processo de poder haja uma perfeita concordáncia. Tensóes en- rado no guarda-roupa, devendo ser usado guando o corpo nacional eres-
tre realidade e kis constitucionais estará° sempre presentes'"3. "Distán- cer correspondentemente'%. Náo se apercebe, assim, da funcáo simbó-
cia da realidadc" é incrente á normatividadc da Constituicáo e condicáo lico-ideológica das Constituicóes nominalistas. Ao contrário. aponta
de autonomia do respectivo sistema jurídico'''. O que vai caracterizar para a esperanca de realizacáo futura da Constituicáo, fundada na hoa
especificamente a "Constituicáo normativa" é a sua atuacáo efetiva co- vontade dos detentores e destinatários do poder'". E, no sentido positi-
mo mecanismo generalizado de filtragem da influéncia do poder políti- vo, atribui-se ás "Constituicóes nominalistas" unía funcáo primaria-
co sobre o sistema jurídico, constituindo-se cm mecanismo reflexivo do mente educativa'"8.
Direito positivo. Ao texto constitucional corresponderiam, entáo, "ex- A respeito dcssa posicáo "rnodernizadora" de LOCWCIISICill Cill reía-
pectativas normativas congruentemente generalizadas". Na medida cm QáO ao "nominalismo constitucional", orientada por um esquema evolu-

que a "Constituicáo normativa" sc enquadra no conceito estritamente tivo linear, é bem pertinente a crítica de Bryde no sentido de que ela
moderno de Constituicao já acima analisado (item 1.3 destc Cap.), náo remontaria á interpretacáo incorreta, difundida nos anos cinqiienta e
estamos evidentemente diante de situacóes de constitticionalizacáo sim- sessenta, do papel das camadas dirigentes dos países cm desenvolvi men-
bólica. to, caracterizadas, entáo, como clitcs idealistas e modernizadoras'"" A
O problema surge no ámbito das "Constituicóes normalistas". Ncla experiéncia parece ter ensinado algo km diverso. O objetivo das
há uma discrepáncia radical entre práxis do poder e disposicóes consti- "Constituicóes nominalistas" náo é "tornar-sc normativa no futuro pró-
tucionais, um bloqueio político da concretizacáo constitucional, obsta- ximo ou distante""°. Ao contrário: há nulitos elementos favoráveis á
culizador da autonomia operativa do sistema jurídico. Como observa afirmativa dc que os "donos do poder" e grupos privilegiados iláo tém
Loewenstein, -essa situacáo náo deve, contudo, ser confundida com o iatcresse numa mudanca fundamental das relacóes sociais, pressuposto
fenómeno bem conhccido de que a práxis constitucional difcre da letra para a concretizacáo constItucional. Contudo, o discurso do poder invo-
da Constituicáo"'". Metamorfose através de interpretacáo/aplicacáo ou ca, simbolicamente, o documento constitucional "demo,;,:itico", reco-
concretizacáo é imprescíndível á subsisténcia e estabilidade das "cons- nhecimento dos dircitos fundamentais, a CleiQáO livre e democrática etc.,
tituicóes normativas", e á sua adcquacáo á rcalidade social circundan- como conquistas do governo ou do Estado. Os textos das "constituicóes
nominalistas" e "normativas" contlin basicamente o mesmo modelo ins-
192. De acordo con) a tenninologia de Mecham (1959), tratar-se-ia do rela- titucional: direitos fundamentais, -divisáo de poderes". 10o
cionamento entre "a constituiyáo nominal" (texto) e "a constitti4o real ou ope- igualdadc permite a lei e tainbein dispositivos do Lstado de km-
rativa" (realidade constitucional). estar. Embora tal fato tenha multo pouco significado para se classifi-
193. Ronneberger, 1968:426.
194. "A Constituit;áo toina distáncia da realidade e ganha, sí) a partir 196. Loewenstein, 1975:153. Cf também idem, 1956:223
dai, a capacidade de servir de critério de conduta e julgamento para a política" 197. Loewenstein, 1975:153.
(Grimm, 1989:635). "Distáncia da realidade" significa aqui "autonomía perante 198. Loewenstein, 1975:153.
o meio ambiente". 199. 13ryde, 1982:28, nota 4.
195. Loewenstein, 1975:152. Cf. também idem, 1956:223. 200. 1,oewenstein, 1975:153, em sentido contrário.

96 97
carero os respectivos países no mesmo grupo — "sociedadc democráti-
A "Carta" ou outras "Icis constitucionais" servem primariamente, entáo,
ca" —, essa fórmula, repitamos, é usada táo freqüentemente pelos a-
á instrumentalizaeáo unilateral do sistema jurídico pelo político. Portan-
gentes governamentais CO??? "Constittneóes nominalistas" como pelos
to, a negaeáo da autonomía da esfera do jurídico já se exprime mani-
scus colegas sob "Constituie ó- cs normativas". Estes estáo efetivamente
festa e diretamente no momento da ponéncia dos textos ou leis consti-
envolvidos numa linguagem constitucional cm que se implicam relevan-
tucionais, ao passo que no "nominalismo constitucional" o bloqueio da
te e reciprocamente os aspectos simbólicos e jurídico-instnnnentais,
reprodueáo autónoma do Direito positivo emerge basicamente no pro-
contribuindo ambos complementarmente para a funcionalidade da Cons-
cesso concretizador. É verdade que náo se pode excluir a funeáo hiper-
tituieáo. Aqueles estáo comprometidos com urna linguagem constitucio-
troficamente simbólica de aspectos das "Constituieóes instrumentalis-
nal hipertroficamente simbólica, á qual náo corresponde concretizaeáo
tas": declaraeáo de direitos fundamentais, eleieáo política e outras insti-
normativa generalizada e includentc.
tuieóes do Estado Constitucional podem pertencer ao seu conteúdo lin-
Em relaefío ás "constituieóes semánticas", cabe inicialmente uma
güístico. Mas essa funeáo é secundaria e náo Ihe constituí o trago dis-
mudanea de denominaeáo, eis que na classificaeáo de Loewenstein o
tintivo. Da própria "Carta" ou de outras leis constitucionais já resulta
termo "semántico" é empregado sem quise nenhuma conexa() com o seu
que as instituieóes constitucionalistas adotadas náo tém nenhum signifi-
sentido habitual, podendo contribuir para equívocos. Considerando que
cado, principalmente porque ficam subordinadas a princípios superio-
Blas foram designadas "instrumentos" dos detentores do poderm, parece
mais adequada a expressáo "Constituieóes instrumentalistas". Cont isso res, como "razáo de Estado" ou "seguranea nacional". Com as palavras
náo se desconhece que também as "Constituieóes normativas" sáo im- de Burdeau, pode-se dizer que, enquanto a "Constituieáo nominalista"
portantes instrumentos da política; mas Blas sáo, além disso, mecanis- representa um "álibi", a "Constituieáo instrumentalista" é "apenas arma
na luta política" 203 . Característico da primeira é a funeáo hipertrofica-
mos para o controle e limitaeáo da atividade política. Nos casos de
"Constittneóes instrumentalistas", ao contrário, os "donos do poder" uti- mente simbólica ou político-ideológica do "texto constitucional", da se-
lizan' os textos ou leis constitucionais como puros meios de imposieáo gunda, a instrumentalizaeáo unilateral do Direito pelo sistema político
da dominaeáo, sem estarem normativamente vinculados a tais mecanis- (orientado primariamente pelo código-diferenea superioridade /inferiori-
mos: o "soberano" dispóc dos "instrumentos" e pode, sem qualquer dade) mediante a emissáo/reforma casuística de "Cartas" ou "leis consti-
tucionais".
lintitaeáo jurídica, reformá-los ou substituí-los.
As Constittneóes semánticas. ao contrário das "nominalistas", cor-
responden' á rcalidadc do processo de poder, mas, por outro, cm oposi-
áS - normativas", náo tés qualquer reaeáo contrafática relevante so- 7. Constitukáo Simbólica versus "Constituicáo Ritualista"
bre a atividade dos ocasionais detentores do poder. É o caso das expe-
riéncias autocráticas contemporáneas. sejam autoritarias ou totalitarias"' Bryde formulou a distincáo entre constituicóes "relevantes" e Cons-
tituicóes "ritualistas" 204 . Aqui náo se trata exatamente do problema da
2(11 . Cf. Loewenstein, 1975:153s., 1956:223. adequacáo da conduta ás determinacóes do diploma normativo consti-
202. A respeito, ver Loewenstein, 1975:52ss., distinguindo na autocracia tucional, mas sim da significacáo procedimental dos comportamentos
dois tipos básicos: o autoritarismo, que se refere á estnitura governamental e se
contenta com o controle político do Estado (53); o totalitarismo, que diz respeito 203. Burdeau, 1962:398s. Mais recentemente, Luhmann (1990a:213s.) Pala
á ordem global da sociedade (55). Ou seja, enquanto o autoritarismo implica di- analogamente de leis constitucionais que "só podem ser tomadas em considera-
retamente sobreposiláo adiferenciante do sistema político sobre o jurídico, só gáo como meio de luta ou como meio de 'política simbólica —. Na perspectiva
atingindo a autonomia dos demais sistemas sociais na medida em que, no ámbi- do estruturalismo marxista poderia afirmar-se: enquanto a "Constituicáo nomi-
to déles, o poder político seja posto críticamente em questílo, o totalitarismo im- nalista" desempenha primariamente um papel ideológico, a "Constituicáo ins-
porta a politizayíto adiferenciante de todos os dominios sociais, com a pretensáo trumentalista" preenche sobretudo uma funcáo repressiva (cf. Althusser, 1976:
mani t'esta de eliminar-lbes qualquer autonomia (Neves, 1992:70). 8Iss.; Poulantzas, I 978:31 - 38 -- tr. br., 1985:33-40).
204. Cf. 13ryde, 1982:29-33.

99
que sc conforman.' ao texto constitucional. Náo é de excluir-se "que dis- mo", as !els constitucionais, outorgadas e reformadas casuisticamente
posicóes constitucionais sejam observadas literal e formalisticamentc, conforme a concreta constelacáo de poder, sáo efetivadas através dc unta
mas, apcsar disso, náo regulem o proccsso político"2°. Nesse caso, a práxis políticamente relevante. Entbora tambént se cncontrent elemen-
práxis correspondente ao texto constitucional atingiria (como "ritual") tos ritualistas (cleicóes, rettnióes parlamentares etc.), clas distinguem-se
apenas a superficie do processo político, náo abrangcndo os scus aspec- enquanto estabelecem mecanismos políticos para a manutencáo do sta-
tos "relevantes"2°6. tus quo autoritário ou totalitário (cf. nota. 202 deste Cap.). O conceito
Em tal classificacáo também náo se configuraría uma dicotomia en- de ritualismo constitucional estaria mais adequado, portanto, á relacáo
tre Constituicóes "ritualistas" e "relevantes", mas antes uma escala va- entre parlamento/regime e Coroa na experiéncia inglesa mais recente:
riável entre dois casos-limite°. É a predomináncia de um dos aspectos "o programa governamental é proclamado pela rainha como sua própria
que vai possibilitar o enquadramento da Constituicáo num dos dois ti- declaracáo de vontade, nenhuma lei pode surgir sem roya! assent, de-
pos. Tracos "ritualísticos" encontram-se em qualquer ordem constitucio- cretos (Orders-in-Council) sáo baixados pela rainha em um cerimonial
nalm. O que vai caracterizar as Constituicóes "ritualistas" é o fato de da corte", de tal maneira que o Dircito Constitucional británico seria
que, em suas linhas mestras da regulacáo procedimental, "as acóes ainda o de uma monarquia limitadam. Entretanto, os rituais da coroa a-
constitucionalmente prescritas para a producáo e o exercício da vontade penas proclamam solenemente decisóes políticas já pré-determinadas
estatal sáo na verdade praticadas, mas as decisócs sáo tomadas real- mediante os proccdimentos do sistema parlamentarista.
mente de maneira inteiramente diferente""'. Entáo, cm vez de "proce- Do exposto observa-se que a nocáo de "Constituicáo ritualista" nao
dimentos" regulados pelo Direito Constitucional, apresentain-se formas se confunde com o conceito de "Constituicáo simbólica". Enquanto a
"ritualistas". Nesse sentido, observa Luhmann, em relacáo á legitimacáo primeira categoría diz respeito ao problema da irreleváncia de práticas
procedimental, que "a forma náo pode congelar-se em um cerimonial jurídico-constitucionais efetivas, inclusive costumeiras, para o processo
que é representado como um torneio, enquanto os confiitos reais sáo de "formacáo da vontade estatal", no segundo caso a questáo refere-se á
resolvidos ou náo de outra maneira"21°. Os procedimentos formalmente náo concretizacáo normativo-jurídica do texto constitucional, o qual,
previstos no texto constitucional transformam-se assim em práxis "ri- porém, exerce uma funcáo simbólica no ámbito do sistema político.
tualista", náo atuando realmente como mecanismos de selecáo jurídica Muitas das críticas em relacáo ao Estado constitucional da Europa Oci-
das expectativas e comportamentos políticos, o que só vai consumar-se dental e América do Norte, embora utilizem o termo "simbólico", apon-
ao nivel da "Constituicáo material". tam antes para aspectos ritualísticos da práxis constitucional. Observa-
O que torna problemática a classificacáo de Brydc é o caráter muito se, por exemplo, que cm CielOCS de sistemas distritais majoritários, face
abrangente da categoria "Constituicóes ritualistas", na qual se inclui ás condicóes políticas e sócio-económicas, já se pode antever com segu-
tanto a experiéncia constitucional inglesa como um exemplo-padráo, ranca o resultado; e também se acentua o caso-limite da antecipnáo do
quanto as "Constituicóes "Semánticas" no sentido de Loewenstein, que processo de decisáo parlamentar pela burocracia ministeria12'3. Mas cm
designamos de "instnimentalistas"2". Mas no caso do "instt umentalis- tais hipótescs, o processo (ritual) cleitoral e legislativo é realizado con-
forme as determinacóes constitucionais. A "constitucionalizacáo simbó-
205. Bryde, 1982:29. lica", ao contrário, vai configurar-se somente a partir de que "procedí-
206. Bryde, 1982:29. mentos" eleitorais, legislativos, judiciais, administrativos, como também
207. Bryde, 1982:30. o comportamento dos grupos e individuos em geral, descumprem as dis-
208. Cf. Bryde, 1982:30-32.
209. Bryde, 1982:29s.
mais ampla e vaga, incluindo-se nela, expressamente, as "Constituilóes s'emán-
210. Luhmann, 1983a:102.
ticas" no sentido de Loewenstein (cf. Bryde, 1982:33, nota 24).
211. Cf. Bryde, 1982:32s. Portant°, náo se justifica a critica de Bryde
(29s., nota 12) ao caráter muito abrangente do conceito de "Constituicáo 212. Bryde, 1982:32.
semántica" em Loewenstein; a categoria das "Constitiii0es ritualistas" bem 213. Bryde, 1982:30s.

100 10 1
posicóes constitucionais ou delas desviam-se, de tal maneira que o dis-
curso constitucionalista torna-se, antes de tudo, um álibi. cretizacáo normativa de determinados dispositivos constitucionais sim-
plesmente ao seu caráter programático. Em primeiro lugar, deve se ob- -

servar que a vigéncia social (congruente generalizacáo) de normas cons-


8. Constitucionalizacklo Simbólica e Normas Constitucionais Progra-
titucionais programáticas depende da existéncia das possibilidades es-
máticas
truturais de sua realizacáo. A própria nocáo de programa implica a sua
realizabilidade no contexto social das expectativas e comunicacóes que
O problema da constitucionalizacáo simbólica tem sido freqüente-
mente encoberto através da deformacáo do conceito jurídico-dogmático ele se propóe a direcionar ou reorientar. Por exemplo: através da norma-
de normas constitucionais programáticas. Trata-se de urna confusáo tizacáo "programática" dos "direitos sociais fundamentais" dos cida-
prejudicial tanto ás abordagens dogmáticas quanto extradogmáticas. dáos, os sistemas constitucionais das democracias ocidentais européias
Superada a doutrina distintiva das cláusulas constitucionais manda- emergentes nos dois pós-guerras respondían, com ou sem éxito"', a
tórias (obrigatórias) e diretórias (facultativas) 21 , impós-se ao nivel dog- tendéncias estruturais cm direcáo ao welfare state. Pressupunha-se a
mático a concepcáo da vinculatoriedade jurídica de todas as normas realizabilidade das normas programáticas no próprio contexto das rela-
cóes de poder que davam sustentacáo ao sistema constitucional.
constitucionaisra. As normas programáticas seriara, pois, normas de
Outra é a situacáo no caso da constitucionalizacáo simbólica. As
"eficácia limitada", náo servindo á regulacáo imediata de determinados
disposicóes programáticas náo respondem, entáo, a tendéncias presentes
interesses, mas estabelecendo a orientacáo fmalística dos órgáos esta-
"A legislacáo, a CXCCUO0 e a própria justita" — afirmava Pontes nas relacóes de poder que est nituram a realidade constitucional. Ao con-
trário, a realizacáo do conteúdo dos dispositivos programáticos impor-
de Miranda — "ficam sujeitas a esses ditames, que sáo como programas
dados á sua funcáo" 21 . Nesse sentido, os agentes estatais náo podem tarla urna transformacáo radical da estrutura social e política. Além do
propor ou executar outro programa 218 , nem sequer agir contra o progra- mais, a rejeicáo ou deturpacáo das normas programáticas ao nivel do
ma constitucional. Daí porque o descumprimento de normas progra- processo concretizador náo resulta apenas da omissáo, mas também da
máticas pode suscitar o problema do controle da constitucionalidade da acáo dos órgáos estatais. Diante das injuncóes do "meio ambiente" so-
respectiva acáo (ou omissáo) de órgáo do Estado 219. cial da Constituicáora, especialmente das relacóes económicas e políti-
Sem desconhecer, portanto, que o sistema jurídico inclui programas cas, a acáo dos agentes estatais encarregados de executar as disposicóes
finalísticos220 , parece-nos, porém, que náo cabe atribuir a falta programáticas dirige-se freqüentemente no sentido oposto ao do aparen-
de con- te programara. Portanto, a questáo náo se diferenciaria, em principio,
214. Distincáo que remonta á jurispnidéncia e doutrina norte-americana do do problema do bloqueio da concretizacáo normativa (falta de normati-
século passado. Cf Cooley, 1898:390. vidade) dos demais dispositivos constitucionais. Mas é através das cha-
215. Cf. Ghigliani, 1952:3s.; Silva, 1982: 61-63 ; Bittencourt, 1968:56-60; madas "normas programáticas de fins sociais" que o caráter hipertrofi-
13trzaid, 1968:48s.; Campos, 1956: 392ss.; Mello, 1968:92; Mendes, 1990:28ss. 1981 c:275ss., 1973a:88ss. (esp. 99).
216. Cf. Silva, 1982:126ss. É evidente que aqui se trata de eficácia em sen-
tido jurídico. Ver acima Cap. I. 8.1. 221. Com éxito, as Constituigles francesa de 1946, italiana de 1947 e fede-
217. Pontes de Miranda, 1960:111. Cf idem, 1970:127. ral alemá de 1949; sem éxito, a Constituicáo de Weimar (1919).
218. "Algo do que era político, 222. É de observar-se que, nessas condicóes, a própria diferen9a funcional
partidario, programa, entrou no sistema ju-
rídico: cerceou-se, com isso, a atividade dos legisladores futuros, que, no assun- entre sistema e meio ambiente perde era significado. A respeito, ver Neves,
to programado, náo podem ter mitro programa" (Pontes de Miranda, 1960:111 s.; 1992, 1991.
cf. idem, 1970:127). 223. Daí porque náo se trata simplesmente de urna questáo de omissáo in-
219. Cf. Neves, 1988:101-103; Silva, 1982:141-43 e 146. constitucional a ser suprida por mandado de injwicáo (Art. 5 9, Inciso LXXI , da
220.Cf. Luhmann, 1987h:241. Contudo, o Direito positivo emprega prima- Constittricáo Brasileira) ou pela respectiva acáo de inconstitucionalidade (Art.
103, § 22, da Constituick Brasileira; Art. 283 da Constituiláo Portuguesa). Cf.
riamente "programas condicionais"; ver idem, 1987b:227-34, 1 9 81b:140-43,
Neves, I992:158s.
indo cssa pretensáo universalista da filosofia dc Habermas, niteressa nos -

camente simbólico da linguagem constitucional vai apresentar-se de for-


aqui a distincáo entre "agir comunicativo" e "agir racional com respei-
- - -

ma mais mareante. Embora constituintes, legisladores e governantes etu


to-a-fins" (zweckrationales !lamida), categoría na qual se incluent o "a-
geral náo possam, através do discurso constitucionalista, encobrir a rea-
gir instrumental" e o "estratégico"228.
lidade social totalmente contrária ao welfare state previsto no texto da
Habermas vai definir o "agir instrumental" como modo de agáo o-
Constituicáo, invocam na retórica política os respectivos princípios e
rientado por regras técnicas, ou seja, direcionado para obtengáo de de-
fins programáticos, encenando o envolvimento e interesse do Estado na
terminados fins do agente mediante a utilizagáo de objetos. O agir es-
sua consecugáo. A constituicáo simbólica está, portanto, estreitamente
tratégico implicaria a escolha racional de meios de influenciar um ad-
associada á presenga excessiva de disposigóes pseudoprogramáticas no
versário. O agir instrumental é, em princípio, "náo-social", podendo,
texto constitucional. Dela náo resulta normatividade programático-fina-
porém, estar vinculado a interagóes sociais. O agir estratégico constitui
Iística, antes constitui um álibi para os agentes políticos. Os dispositivos
em si mesmo agáo social. Ambos seriam orientados para o éxito do
pseudoprogramáticos só constituem -letra morta" num sentido exclusi-
agente e, portanto, avaliados respectivamente conforme o grau de eficá-
vamente normativo-jurídico, sendo relevantes na dimensáo político-ideo-
cia sobre situnks e acontecimcntos ou de influéncia sobre its decisócs
lógica do discurso constitucionalista-social.
do adversário229. O agir comunicativo, ao contrário, náo é dirccionado
pelo cálculo egocéntrico do éxito, mas sim coordcnado por atos de en-
tendimento entre os participantes"°.
9. Constitucionalizacáo-Álibi e "Agir Comunicativo"
peito, também cf. Alexy, 1983:77ss. e 137ss. Ao contrário da "pragmática trans-
Tendo em vista que a constitucionalizagáo implica a atividade cons-
cendental" (aprioristica) proposta por Apel (1988), a "pragmática universal"
tituinte e o processo de concretizagáo constitucional, portanto, uma co-
desenvolve-se a partir de tima perspectiva reconstrutiva em face do "mundo da
nexáo de acoles intersubjetivas, é possível uma leitura do problema da
vida" como horizonte do agir comunicativo (Habermas, 1982b11:182ss., 1988a:
constitucionalizagáo simbólica a partir da teoría dos —Mos de fala"
87ss.; cf. idem, 1986a: esp. 379ss.).
(speech act)224. Classificando-se as agóes constituintes e concretizadoras
como "comissivo-diretivas"2", afirmar-se-ia que elas fracassam, quanto 228. A respeito, ver, em diferentes fases de desenvolvimento da "teoría do
agir comunicativo", I labennas, 1969:62-65 (tr. br., 198(1:32(1-22), 1982b1: esp.
á sua l'orca ilocucional, em virtude de "inautenticidade"22.°. Ao aspecto
384ss., 1988a:68ss. (aqui especificamente quanto distinlilo entre agir comuni-
proposicional da linguagem constitucionalizadora náo corresponderia
cativo e estratégico). Cf. também Wein, 1986a:404s., com o acréscinto do "ágil-,
uma disposigáo ilocucional do agente com respeito realizagáo do res-
simbólico" (ver abaixo nota 237 deste Cap.). Essa classifica0o implica tima rej
pectivo conteúdo. É evidente que, na constitucionalizagáo simbólica, o
constniláo do tnodelo weberiano dos tipos de aláb: afetiva, tradicional, racio-
emitente do ato “comissiyo-diretivo" ilocucionalmente inauténtico seria,
nal-com-respeito-a-fins e racional-com-respeito-a-valores (cf. Weber, 1985:12s.;
ao mesmo tempo, destinatário, de tal maneira que, na teoria dos "atos de
Schluchter, 1979: esp. 191-95; Habermas, 1982b1:379-84; Neves, 1992:13s.).
fala", sua agáo também poderia ser caracterizada como uma "promessa
Através dela, Habermas vai afastar-se definitivamente dos scus predecessores
inauténtica".
da Escola de Frankfttrt, na medida em que a ciítica da "Tilii-b5 instru,,iclital" vai
Na recepgáo habermasiana, a teoria dos "atos de fala" foi reinterpre-
ser relativizada, atribuindo-se o problema cla inodernidade nao mais — como
tada a partir do modelo da pragmática universal, com a pretensáo de for-
naqueles — ao desenvolvimento técnico em si mesmo, mas sim á hipertrofia da
mular as regras universalmente válidas do entendimento intersubjetivo
"racionalidade-com-respeito-a-fins" (Zweckrationalittii) ent prejuízo da esfera
(agir comunicativo) e do discurso racional (ética do discurso)227. Abstra-
do "agir comunicativo" — cf. Habennas, 1969:48ss., 1982b1:455ss. (esp.
489ss.); Marcuse, 1967: esp. 159ss.; Horkheimer e Adorno, 1969.
224. Cf. Searle, 1973; Austin, 1968.
229. Habennas, 1982b1:385.
225. Sobre os tipos de atos "ilocucionais", ver Searle, 1973: 116ss.
230. Ilabennas, 1982b1:385. Ele concebe o agir comunicativo como "funda-
226. Cf. Searle, 1973:124; Austin, 1968:141.
227. Ver Ilabennas, I986a: esp. 385ss., 1982bI: esp. 388ss., 1971b. A res-

105
104
Aqui é especialmente relevante a distincáo entre agir estratégico e bermas, a constitucionalizacáo simbólica importa, no ámbito político,
agir comunicativo enquanto tipos básicos de acóes sociais. Para Haber- ou mclhor, para os detentores do poder, funcáo- primariamente "instru-
mas, na medida cm que as acóes estratégicas sáo orientadas egocentri- mentar. Considerando-se, porém, o sentido que o termo "simbólico"
camente para a obtencáo de éxito diante do adversario, náo se supe a assume no contexto destc trabalho (v. Cap. I), permanece válida a tese:
autenticidade da manifestacáo lingüística do agente 231 . O éxito pode ser cm relacáo ao domínio do Direito, trata-se da atuacáo hipertroficamente
alcancado através do engano do adversario'''. O agir comunicativo prcs- simbólica da atividade constituinte e do discurso constitucionalista, na
supóc a autenticidade dos participantes, no sentido de que eles devem medida em que ambos constituem uma parada de simbolos para a mansa
expresar transparentemente suas posicks, desejos e sentimentos na in- dos espectadores 236 , sem produzir os efeitos normativo-jurídicos genera-
teracáo intersubjetiva 233. lizados previstos no respectivo texto constitucional 237. Por outro lado, a
O Direito náo é, no modelo habcrmasiano, apenas meio sistémico, teoria da acáo de Habermas parte de interacóes entre sujeitos determi-
-mas também "instituicáo"; portanto, inclui-se cm parte na esfera do agir nados, o que torna discutível a sua transposicáo ao problema da consti-
comunicativo 234 . Dessa maneira, torna-se possível urna leitura da consti- tucionalizacáo simbólica, no qual está implicada uma conexáo complexa
fucionalizacáo simbólica a partir da distincáo entre agir estratégico e e contingente de acóes, que náo pode ser reduzida á questáo do agir es-
agir comunicativo. Na medida em que a atividade constituinte e o dis- pecífico de sujeitos determinados.
curso constitucionalista náo tém correspondéncia nas posturas, senti-
mentos e intencóes dos respectivos agentes políticos, ou seja, sáo ilocu-
cionalmente "inauténticos", a constitucionalizacáo simbólica náo envol- 10. Constitucionalizacáo Simbólica versus Lealdade das Massas e
ve "80CS comunicativas" referentes ao Direito. Caracteriza-se, antes, "Regras-do-Siléncio"
como um plexo de acóes estratégicas a servico do meio sistémico "po-
der". Náo se trata de "agir aberta ► ente estratégico", como aquele que A passagem do modelo liberal clássico para o we/fare state na Eu-
se manifesta nas lutas entre facc'ócs políticas durante o processo cons- ropa Ocidental e Norte-América implicou um maior acesso da mansa
tituinte e também nas contendas políticas e judiciais cm torno da con- trabalhadora ás prestacóes do Estado. Marshall interpretou esse fe-
cretizacáo constitucional. A constitucionalizacáo simbólica implica "a- nómeno como processo de ampliacáo da cidadania: os direitos civis e
gir ocultamente estratégico", seja ele comunicaqáo deformada sistema- políticos teriam ganhado em realidade com a conquista dos direitos so-
tica ► ente (ilusáo inconsciente) ou mesmo a simples manipulaqao (ilu- ciais238 . No século XX, a cidadania, orientada pelo princípio da igual-
sáo consciente) 235 . O sentido manifesto e aparente (normativo-jurídico)
da atividade constituinte e linguagem constitucional encobre, entáo, o 236. Cf. Edelman, 1967:5, referindo-se, porém, mais abrangentemente
seu sentido oculto (político-ideológico). "política simbólica". Ver acima Cap.I.3.
Diante do cxposto, observa-se que, conforme a teoria da acá° de Ha- 237. lIá aqui urna analogia com a noca() habermasiana de "agir simbólico",
que inclui as danyas, os concertos, as representag5es dramáticas etc. (cf. Ha-
mental", pois parte de "quc outras formas do agir social — p. ex., luta, compe- bernias, I 986a:40.I) e, portanto, está relacionado (ou se confunde), na própria
tiyáo, conduta estratégica cm geríil — constituem derivados do agir orientado obra de Ilabennas, com o agir expressivo ou drainatúrgico, cujo questionamento
para o entendimento" (1986a:353). crítico e negayílo referem-se á sua "inautenticidade" (Cf. 1982b1:436 e 447s.).
231. A "autenticidade", enquanto tuna das "pretensóes de validade" (Gel- Mas o conceito de simbólico tem também um sentido mais acoplo e relevante
tungsansprtiche), Pica, entáo, suspensa (Ilabermas, 1986a:404). dentro da "teoría do agir comunicativo", guando se define "sociedade como
232. Cf. Ilabennas, 1982b1:445s. inundo da vida estruturado simbolicamente" (idem, I 988a:95ss.). Daí náo
233. Cf. Ilabennas, 1986b:138 e 178, 1978:24. decorre, porém, uma confusáo do simbólico e semiótico, eis que esse "mundo"
234. Cf. Ilabennas, 1987a, 1982b11:536ss. Para o aprofundamento da evo- simbolicamente estruturado só se constitui e reproduz através do agir comuni-
luyfio do pensamento habennasiano nesse sentido, v. idem, 1992. cativo ( I 988a:97).
235. Ilabennas, 1982b1:445s. 238. Cf. Mar 1976:71ss.:, acompanhando-o, Bendix, 1969:92ss Para

107
dade, teria entrado em guerra com o sistema de desigualdade inerente timagáo seria resultante da incapacidade do weljare state de manter a
ao capitalismo e ás suas classes sociais"9. Nesse sentido, a ampliagáo da "lealdade das massas" através dos scus mecanismos administrativos"4.
cidadania importaria a redugáo das desigualdades do capitalismo, con- Com restrigóes ao modelo entáo predominante de abordagem do pro-
duzindo ao modelo social-democrático do welfare state. blema, Luhmann pondcrava que a ampliagáo das prestageses do Estado
Enfrentando a questáo posta por Marshall, Bendix vai sustentar de bem-estar náo asseguraria atitudes permanentes de "gratidáo" e "leal-
dade" política, considerando a constante mudanga de motivagócs dos in-
que, nesse contexto de ampliagáo da cidadania, as lutas da classe traba-
divíduos em face mesmo do acesso aos diversos sistemas funcionais da
lhadora náo se orientavam pela construgáo de "uma nova ordem social",
respectiva sociedade245. Ou seja, ao mesmo tempo em que o Estado de
mas sim por maior "participagáo" na ordem estabelecida, caracterizan-
bem-estar amplia os scus servigos em relagáo ás "massas", cle torna-as
do-as como expressáo de um espírito conservadorm. Assim, o modelo
capazcs de exigir-lhe scmpre mais novas e inesperadas prestagóes. Mas,
clássico marxista de luta revolucionária do trabalhador pela superagáo
da ordem capitalista é substituído por uma conccpgáo do colino tra- embora a "lealdade das massas" náo seja incompatível com mudangas
balhista como forma de integragáo/inclusáo das massas no sistema so- imprevisívcis, parece-nos que cla implica uma postura conservadora ein
cial vigente ou de acesso ás suas prestagóes"'. relagáo ao Estado de bem-estar enquanto estrutura de ampliagáo e ino-
Relacionado com esse tipo de enfoque, desenvolveu-se na Alemanha vagáo permanente de prestagóes.
Ocidental dos anos setenta o famoso debate sobre Estado de bem-estar Na abordagem da legislagáo simbólica no Estado dc bem estar do -

(Wohlfahrtsstaat) e le,aldade das massas ellassenloyalitat)"2. Aqui se Ocidente desenvolvido, tem-se procurado caractcrizá-la como meca-
discutia sobre a "lealdade das massas" como decorréncia do desempe- nismo possibilitador da "lealdade das massas" (cf. p. 40). A manuteNáo
nho de caráter social do Estado de bem-estar243. A própria crise de legi-
dessa náo resultaria simplesmente dos efeitos rcais da -Icgislnáo ins-
trumental", mas dependeria também da produQáo de diplomas legais
destinados basicamente a promover a confianQa dos cidadáos no Estado.
uma problematizagáo crític,a da aplicagáo do modelo evolutivo de Marshall ao
Através da legislaQáo simbólica, os órgáos estatais demonstrariam ceni-
desenvolvimento constitucional brasileiro, Neves, 1990.
camente seu interesse e disposiQáo de solucionar problemas estrutural-
239. Marshall, 1976:84. Analogamente, Bobbio apontava posteriormente
para o conflito entre a desigualdade capitalista e o principio de igualdade da mente insolúveis. A legislaQáo-álibi constituiria, entáo, um típico me-
democracia (1976:esp. 207 — tr. br., 1979:242), enquanto Offe se preocupava canismo de promo9áo da "Icaldade das massas" no Estado de bein-cstar.
com os limites estruturais do Estado de Direito Democrático no capitalismo Essa situagáo náo se transporta irrestritamente aos casos de consti-
avangado (1979). Por sua vez, sustenta Preuss mais recentemente "que a diná- tucionalizaQáo simbólica. Aqui náo se configura um sistema jurídico-
mica inerente ao processo c,apitalista de produgáo de valor é autodestrutiva, na constitucional que responde globalmente ás expectativas de bem-estar
medida em que ela destrói progressivamente os fundamentos náo-capitalistas do das "massas". Enquanto a legislaQáo simbólica no weljare state está en-
capitalismo" (1989:4) Em contexto, afirma Weffort invocando a referida volvida num sistema jurídico político que, cm linhas gerais, realiza se
- -

passagem de Marshall: "Náo haverá exagero em dizer-se que, no caso brasi-


como práxis includente de toda a populaQáo (cf.item 1 3.4.1. deste Cap.),
a constitucionaliznáo simbólica importa que os principios de inclusáo
leiro, a desigualdade tem vencido esta 'guerra', deixando apenas um espago mí-
do Estado de bein-estar, previstos abstratamentc no te.\1z,
nimo á expressáo do principio contrário" (1981:140).
240. Bendix, 1969:89.
244. Cf. 1-labermas, 1973: esp. 55s., 68-70 e 96ss.
241. Nesse sentido, Preuss refere-se á "domesticagáo da luta de classes
através da juridificaQáo da luta trabalhista" no Estado de bem-estar europeu 245. Lithinann, 1981j:10. 1 labennas nao se despercebeu desse problema,
leudo observado anteriormente, que a amplinilo das materias administrativas
(1989:2).
tornaria imprescindível promover "lealdade das massits" para novas IiinOes es-
242. A respeito, ver sobretudo Narr e Ofli: (org.), I975a. Ao discutir os
limites da Constituigáo e da obediéncia nas democracias, Preuss (1984), jurista, tatais, o que implicaria mn "desproporcional aumento da necessidade de legiti-
emprega a expressáo "lealdade dos cidadáos" (Bürgerloyalitat). maláo" (1973:100s. ).
243. Narr e Offe, 1975b: esp. 27-37.

109
108
náo se concretizan] de forma suficientemente relevante para a massa dos
"base consensual" como o "pressuposto mais importante da efetiva vi-
subintegrados. O aspecto simbólico náo está associado com um desem-
géncia de uma Constituicáo"2", ou melhor, da orientacáo generalizada
penho eficiente e generalizado do Estado diante das caréncias da popu-
do público pelo modelo normativo constitucional, a institucionalizacáo
lacáo. A "lealdade política" vai desenvolver-se principalmente por meio
de gag rules está condenada ao fracasso"'. Face á ineficiéncia do "apa-
de mecanismos difusos e particularistas náo compatíveis com a Consti-
relho estatal" diante das necessidades da maioria da populacáo há, nes-
tuicáo. Mas náo se trata de institutos generalizados possibilitadores da
"lealdade das massas", mas sim de formas de prestacáo compensadora sas circunstáncias. uma tendéncia á politizacáo dos mais variados te-
que ensejam apenas a graticlao individual ou de grupos isolados2". mas, incluindo-se a discussáo sobre a legitimidade da ordem social
como um todo2". Á proporcáo que o sistema constitucional perde cm si-
Contraditoriamcnte, portanto, embora a constitucionalizacáo sim-
gnificado como ordem básica e horizonte da política, cle mesmo torna-
bólica, presente basicamente no Estado periférico (ver Cap.I11.6.), tenha
a funcáo ideológica de promover a confianca no Estado ou no Governo se tema da discussáo política253. Enquanto através da "Icaldadc das mas-
sas" o welfare Mate, caracterizado por "Constituicóes normativas", p5e
(cm sentido ainplo), scrvindo-lhes como fórmula de representacao retó-
os conffitos de classe no segundo plano ou "domestica-os" (ver nota 241
rica e álibi, ela pode converter-se, em casos extremos de discrepáncia
deste Cap.), possibilitando o desenvolvimento das chamadas "regras-do-
entre texto e realidadc constitucionais, num fator de promocáo de des-
siléncio", as experiéncias da constitucionalizacáo simbólica, presentes
confianca na própria figura do Estado. Aquilo que Kindermann fala a
sobretudo nos Estados periféricos, sáo marcadas -pela incapacidade de
respeito do fracasso da legislacáo-álibi tem realidade principalmente nos
uma superacáo ou controle satisfatório da questáo social e, portanto, do
casos de constitucionalizacáo-álibi: reconhecendo-se que a atividade
constituinte (e reformadora) o texto constitucional náo estáo associa- conflito de classcs, o que torna improvável o desenvolvimento estável de
"regras-do-siléncio" democráticas, sejam elas implícitas ou explícitas?".
dos a lima concretizacáo normativo-jurídica relevante, representando
antes formas cspeciais de aQA0 política simbólica, o próprio Direito As críticas generalizadas, sem delimitacáo temática, surgem exatamente
como reacáo ineficiéncia ou ao náo funcionamcnto do modelo de Es-
como sistema de regulacáo da conduta cm interferéncia intersubjetiva
tado previsto simbolicamente no texto constitucional e pertencente á re-
cai cm descrédito; o público senic-se, entáo, iludido; os atores políticos
tornam-se "cínicos-2'7. tórica político-jurídica. Nesse contexto, as "regras-do-siléncio" só sc
tornam possívcis em virtude da negacáo manifesta desse modelo através
A qucstáo dos limites ideológicos da constitucionalizacáo simbólica
da imposicáo de ditadura, ou seja, do estabelecimento de Constituicáo
perante a -lealdade das massas" pode ser relacionada com a nocáo de
"regras do siléncio" (gag rules) como mecanismos através dos quais
- -
i nstrumenta I ista2".
determinados temas sáo excluidos da discussáo jurídico-política nos
ria para a emergéncia e estabilidade das democracias" (Holmes, 1988:24s.).
sistemas constitucionais democráticos2'. Trata-se de restricóes descar-
250. Grimm,1989:636.
regantes da pauta política com rcspeito a temas controversos específi-
251. Cf., mais cuidadoso, Lulunann, 1990 a: 213 s.
cos'''. Na medida em que falta aos textos constitucionais simbólicos 252. Enquanto nos Estados Unidos da América, por exemplo, a legitimida-
246. A respcito, ver Neves, 1992: 170-79, abordando a deturpaláo do pro- de da propricdadc privada nunca é discutida em sessóes legislativas (Holmes,
1988:26), cla é freqüentemente posta cm questáo nos parlamentos dos Estados
cedimento eleitoral e a politizaláo particularista da administra0o na experién-
periféricos s icamente consti tucional izados.
cia constitucional brasileira.
247. Kindemann, 1989:270, tratando especificamente do fracasso da legis- 253. Cf.,ein outro contexto, Lulunann, 1983a: 196. "O Direito reina princi-
palmente em uma sociedade na qual as questóes fundamentais dos valores so-
lalflo-álibi em face mesmo de sua amplialáo. Cfacima p. 40.
248. Cf. Holmes, 1988. ciais náo sá'o geralmente discutidas ou discutíveis" (Parsons, 1967:133).
249. "... a forma da política democrática é indubitavelmente determinada 254. Embora Holmes se limite á análise das "regras-do-siléncio" abertas
(cf. 1988:27), o conceito incluí também regras implícitas (cf.1988:26).
pela reniNfio estratégica de certos ítens da agenda democrática. Alguns teóricos
255. Segundo I lolmes, se a sociedade está "dividida muito profundamen-
térn memo ¿irgumentado que a supressfio de questiSes é tuna condilfio neeessá-
te", as gag rules levam contraditoriamente á "democracia sem oposigfio" (1988:

1 10
Os limites da funeáo ideológica da constitucionalizagáo simbólica
diante da "Iealdade das massas" e das "regras-do-siléncio" democráticas
importa a permanente possibilidade de crítica generalizada ao sistema Capítulo 3
de dominagáo encoberto pelo discurso constitucionalista. Como proble-
ma estruturalmente condicionado, o desgaste da constitucionalizaeáo CONSTITUCIONALIZACÁO SIMBÓLICA COMO
simbólica poderá conduzir a movimentos sociais e políticos por trans- ALOPOIESE DO SISTEMA JURÍDICO
formagóes conseqüentes em diregáo a um sistema constitucional demo-
crático efetivo. É possível também que conduza á apatia das massas e ao
cinismo das clites. A reagáo mais grave, contudo, é o recurso á "rea- 1. Da Autopoiese á Alopoiese do Direito
lidade constitucional" mediante a imposigáo do padráo autoritário e o
estabelecimento de constituigáo instrumental, na qual se exclui ou limita 1.1. Da Autopoiese Biológica á Social
radicalmente o espato da crítica á própria "realidade" de poder.
O conceito de autopoiese tem sua origem na teoria biológica de Ma-
turana e Varela'. Etimologicamente, a palavra deriva do grego autos
(`por si próprio') e poiesis (`criagáo', `produgáo') 2 . Significa inicialmente

e0 0 00 04 00 0 4) 0
que o respectivo sistema é construído pelos próprios componentes que
ele constrói. Definem-se entáo os sistemas vivos como máquinas auto-
poiéticas: urna rede de processos de produgáo, transformagáo e destrui-
00 de componentes que, através de suas interaeóes e transformaeóes,
regeneram e realizam continuamente essa mesma rede de processos,
constituindo-a concretamente no espato e especificando-Ihe o dominio
topológico'. Trata-se, portanto, de sistemas homeostáticos 4, caracteriza-
dos pelo fechamento na produgáo e reprodugáo dos elementos'. Dessa
maneira, procura-se romper com a tradigáo segundo a qual a conserva-
QáO e evolugáo da especie seriam condicionadas basicamente pelos fato-
res ambientais. Ao contrário, a conservagáo dos sistemas vivos (indivi-
duos) fica vinculada á sua capacidade de reprodugáo autopoiética, que
os diferencia num espato determinado'.
A recepgáo do conceito de autopoiese nas ciencias sociais foi pro-

1. Cf. Maturana e Varela, 1980:73ss., 1987: esp 55-6(1, Maturana, 1982:


esp. 141s., 157ss., 279s.
2. Cf. Maturana e Varela, 1980:XV11.
3. Maturana e Varela, 1980:78s. e 135; Maturana, 1982:158, 141s, 184s.,
280. Segundo Teubner (1989:32), apresenta-se aqui a "definicáo oficial" de au-
topoiese.
4. Maturana e Varela, 1980:78.
5. Cf., p. ex., Maturana e Varela, 1980:127s., em relacáo ao sistema ner-
voso.
31), ou melhor, á negacáo da democracia. 6. Cf. Maturana e Varela, 1980:117s., com críticas ás implicatiZes ideológi-

112 113
posta por Luhmann, tendo tido ampla ressonáncia'. A conccpcáo luh- mann, o meio ambiente náo atua perante o sistema nem meramente co-
manniana da autopoiese afasta-se do modelo biológico de Maturana, na mo "condicáo infra-estrural da possibilidade da constituicáo dos ele-
medida em que nela se distinguen os sistemas constituintes de sentido mentos" 15 , nem apenas como perturbacáo, barulho, "bruit"16; constituí
(psíquicos e sociais) dos sistemas orgánicos e neurofisiológicos 8. Na algo mais, "o fundamento do sistema"". Em relacáo ao sistema atuam
teoria biológica da autopoiese, há, segundo Luhmann, urna concepcáo as mais diversas determinacbes do meio ambiente, mas elas só sáo inse-
radical do fechamento, visto que, para a producáo das relacóes entre sis- ridas no sistema guando esse, de acordo com seus próprios critérios e
tema e meio ambiente, é exigido um observador fora do sistema, ou seja, código-diferenca, atribui-lhes sua forma' 8.
um outro sistema'. No caso de sistemas constituintes de sentido, ao con- Além de diferenciar-se da teoria biológica da autopoiese, a concep-
trário, a "auto-observacáo torna-se componente necessário da reprodu- QáO luhmanniana do fechamento auto-referencial dos sistemas baseados
autopoiética"". Eles mantém o scu caráter autopoiético enquanto se no sentido, especialmente dos sistemas sociais, afasta-se ainda mais cla-
refcrein simultaneamente a si mesmos (para dentro) e ao scu meio am- ramente da clássica oposicáo teórica entre sistemas fechados e abertost".
biente (para fora), operando internamente com a diferenca fundamental O conceito de sistemas fechados ganha, "em comparacáo com a antiga
entre sistema e meio ambiente". O scu fechamento operacional náo é teoria dos sistemas, um novo sentido. Ele náo designa mais sistemas que
prejudicado com isso, considerando-se que sentido só se relaciona com existem (quase) sem meio ambiente e, portanto, podem determinar-se
sentido e só pode ser alterado através de sentido". Porém, a incorpo- (quase) integralmente a si mesmos"". Nesse sentido, afirma-se: "Fecha-
racáo da diferenQa "sistema/meio ambiente" no interior dos sistemas ba- mento náo significa agora nem falta de meio ambiente, nem determi-
seados no sentido (a auto-observacáo como "momento operativo da au- nacáo integral por si mesmo" 21 . Trata-se de autonomía do sistema, náo
topoiese")" possibilita una combinacáo de fechamento operacional com de sua autarquia 22 . O fechamento operativo "é, ao contrárío, condicáo de
abertura para o meio ambiente, de tal maneira que a circularidade da possibilidade para abertura. Toda abertura baseia-se no fechamento"".
autopoiese pode ser interrompida através da referéncia ao meio A combinacáo de fechamento e abertura pode ser tratada sob duas
Portant°, na teoria dos sistemas sociais autopoiéticos de Luh- perspectivas: (1) embora um sistema construtor e construído de sentido
exerca o "controle das próprias possibilidades de negacáo por ocasiáo da
cas da teoria darwiniana da seleyáo natural. producáo dos próprios elementos" (fechamento), esse controle depende
7. A respeito, ver sobretudo Luhmann, 1987a; Haferkamp e Schmid (orgs.), das condiqóes de escolha entre o sin e o ndo do respectivo código
1987; Baecker et al. (orgs.), 1987:esp. 394ss. Para a crítica á recepcáo científico- sistémico (abertura) 24; (2) o controle das possibilidades de negacáo (fe-
social do conceito de autopoiese, ver Bühl, 1989, com referéncia especial ao pa- chamento) proporciona una relacáo seletiva contínua e estável (ou, no
radigma luhmanniano (229ss.); e ruma perspectiva mais abrangente sobre a
teoria sistémica de Luhmann, Krawietz e Welker (orgs.), 1992. Para a leitura 15.Luhmann, 1987a:60.
crítica a partir da teoria do discurso, ver Habermas, 1988b:426ss., 1988a:30s. 16.Para Varela (1983), o "ruido" ("bruit" - "couplage par clóture" em
Definindo a autopoiese como paradigma ideológico conservador, Zolo, 1986. oposiláo "á couplage par input") atua como forma típica de atoado do meio
8. Ladeur (1985:408s.) interpreta de maneira diversa. Cf. também Teubner, ambiente em relacáo aos sistemas autónomos.
1988:51, 1989:38, 43 e 46, criticando a tese sustentada por Luhmann (1985:2; 17.Lulunann, 1987a:602.
1987c:318), que nesse ponto acompanha Maturana e Varela (1980:94; Matura- 18."Fundamento é sempre algo sem forma" (Luhmann, 1987a:602).
na, 1982:301), da impossibilidade de autopoiese parcial. 19.Nessa direláo, ver Bertalanffy, 1957: lOss. Em contraposi0o, cf. Luh-
9. Luhmann, 1987a:64. mann, 1987a:63s.
10. Luhmann, 1987a:64. 20. Luhmann, 1987a:602.
11. Luhmann, 1987a:64. 21. Luhmann, 1983b:133.
12.Luhmann, 1987a:64. 22. Ltilimanti, 1983a:69; Teubner, 1982:20.
13.Luhmann, 1987a:63. 23. Luhmann, 1987a:606.
14.Lubina:in, 198711:64s. 24. !Adunan:1, 1987a:603. Cf. idem, 1986a:83.

1 14 115
mínimo, menos instável) do Sistema com o set' rucio ambiente (abertura
ou mentor, a proccssos sistémicos da mesma especie". Assint se apre-
adequada).
sentam a decisáo sobre tomada de decisáo, a normatizacilo da normati-
O conceito de autopoiese será definido mais enfaticamente por
zacito, o cnsino do cnsino etc.3°. Mas, fornmlado dessa mancira, o con-
Luhmann, sob influencia de Maturana e Varela, como auto-referencia
ceito resulta insuficiente para caracterizar a reflexividadc de um sistema
dos elementos sistémicos: "Um sistema pode ser designado como auto- autopoiético. Em face disso, Luhmann tcnta defini-lo mais exatamente:
referencia!, se ele mesmo constitui, como unidades funcionais, os ele- "De auto-referencia processual ou refiexividade queremos falar apenas,

4D4 OCCOC COC Q00 0000Z ZZJ Z3 ,3 3 33


mentos de que é composto..."" Aqui se trata primariamente da reprodu- entáo, se esse reingresso no processo é articulado com os meios do pro-
Cá0 unitária dos elementos construtores do sistema e, simultaneamente, cesso"". Pode-se, de acordo com o modelo sistémico-teorético, formular
por ele constituídos'6, náo da auto-organizacáo ou da manutencáo estru- de maneira mais rigorosa: reflexividade como mecanismo no interior de
tural do sistema'''. Nesse sentido, a unidade do sistema apresenta-se cm um sistema autopoiético implica que o processo referente e o processo
primeiro lugar como unidade dos elementos básicos de que ele é com-
referido sáo estruturados pelo mesmo código binário e que, cm conexáo
posto e dos processos nos quais esses elementos reúnem-se operacio-
com isso, criterios e programas do primciro reaparecem ent parte no se-
nalmente'". Nessa perspectiva, formula-se "que um sistema autopoiético
gundo. Por conseguinte, náo é suficiente, por cumplo, indicar a nor-
constitui os elementos de que é composto através dos elementos de que é
matizacáo de normatizacáo, pois a normatizacáo religiosa oil ética da
composto, c, dessa maneira, demarca fronteiras que náo existem na
normatizacáo jurídica, como também a referencia normativa de um pa-
complexidade infra-estrutural do mcio ambiente do sistema"'''.
dráo de "Direito natural" á emissáo de norma jurídico-positiva
Mas a concepcáo de autopoiese náo se limita cm Luhmann á auto- presentam, nesse sentido estrito, nenhuma reflexividade da producáo
referéncia elementar ou de base, que se assenta na diferenca entre ele- normativa.
mento e relacáo". Essa apresenta-se apenas como -a forma mínima de Na reflexáo, que pressup5e auto-referencia elementar e reflexivida-
auto-referencia", constituindo um dos tres momentos da autopoiese32: de, é o próprio sistema como um todo que se apresenta na operacáo au-
os outros sáo a reflexividade e a reflexao, que se baseiam respectiva- to-referencial, náo apenas os elementos ou processos sistémicos38. En-
mente na distincáo entre "antes e depois" ou entre "sistema e mcio am- quanto "teoria do sistema no sistema"", ela implica a elaboracáo con-
biente"33. Reflexividade e rellexáo incluem-sc no conccito mais abran-
ceitual da "identidade do sistema cm oposicáo ao scu meio ambiente"4°.
gente de mecanismos reflexivos'''.
A reflexivida(k diz respeito á referencia de unt processo a si mesnto,
35. A respeito, ver esp. Ltilimann, 1987a:601 e 610 16. Distingttindo do
conceito lógico de reflexidade, observa látluntinn (1984:109, nota 6): "Ele de-
25. 1.tilunann, I987a:59.
signa urna reina() que preenche o pressuposto de que cada inembro está para si
26. "Elementos sdo elementos apenas para os sisteinas que os utilizam co-
mesmo na mesilla reinar) que está para o outro Nós Mío nos atemos a essa
mo unidade, e só o sáo attavés-desses sistemas" (Lulunann, 1987a:43).
definiláo, porque a identidade exata da relaciáo reflexiva obstruiria justamente
27. Ltihmann, 1983b:132.
o argumento a que queremos Llegar: o aumento da eficiencia através de refle-
28. Ltilunann, 1983b:131.
xividade. Aqui, por isso, inecanismo-deve ser consid(•rádo emito como re-
29. 1,tilunann, 19/13b:132.
flexivo, se ele tem em vista um objeto que é tun mecanishio da especie,
30. Lulunann, 1987a:600s.
se, portanto, conforme a especie, refere-se a si mesmo".
31. Ltilimann, 1987a:600.
36. Lulunann, 1984a:94-99.
32. Daí porque a confusáo entre autopoiese e auto-refe.réncia de base (cf.
37. Lulumann, 1987a:611. De acordo com Luluntinn inesino (ibid., nota 31),
Luhmann, 1987a:602) deve ser relativizada e compreendida restritivamente no
faltava essa distilnáo em sua anterior contribui0o para esse tema, publicada
ámbito do modelo teorético-sistémico de Luhmann.
primeirainente em 1966 (1984a).
33. Luhmann, 1987a:60 I s.
38. Cf. Ltilunann, 1987a:601, 198111:423.
34. Cf. 1.uhmann, 1984a.
39. Lultinann, 198111:422 e 446.
40. Ltilunann, 1987a:620.

116 1I7
Trata-se, pois, de "tima forma concentrada de auto-referéncia", que Cies sobre o seti mcio ambiente psíquico, orgánico e químico-físico (a-
possibilita a probleinatiznáo da própria identidade do sistema'. bertura) 4R.
Enquanto cm Luliniann, a autopoicse é concebida cm tres momen- O caráter autopoiético dos subsistemas da sociedade náo pode, po-
tos interdcpcndentes (auto-referéncia elementar, reflexividade e refle- rém, ser esclarecido desse mesmo modo: a comunicaQáo é a unidade
xáo), Teubner vai propor um conceito mais abrangente, defínindo-a elementar de todos os sistemas sociais; no meio ambiente de todos
como "enlace hipercíclico" de elemento, processo, estrutura e identi- subsistemas da sociedade, há comunicaQáo; para esses sistemas parciais
dade 13 . Parece-nos, porém, que o modelo luhmanniano de autopoiese desenvolvem-se náo apenas comunicaOes sobre o seu meio ambiente,
náo contraria a noeáo de "enlace hipercíclico", envolvendo também o mas também comunicapks com o seu meio ambiente". Somente guando
momento estrutural. Luhmann mito rcduziu a reprodueáo autopoiética á um sistema social dispóe de um específico código-diferenqa binário é
auto-referéncia dos elementos, mas apenas fixou que essa é a forma que ele pode ser caracterizado como auto-referencialmente fechado (->
mínima de autopoiese. E o que vai caracterizar exatamente a conceNáo
aberto ao meio ambiente)". Por meio de código sistémico próprio, es-
dos sistemas autopoiéticos é que eta parte dos aspectos operacionais, náo truturado binariamente entre um valor negativo e um valor positivo es-
se referindo primariamente á dimensáo estrutural (autonomía).
pecífico, as unidades elementares do sistema sito reproduzidas interna-
Corra relaQáo aos sistemas sociais, enquanto se constituem a partir mente e distinguidas claramente das comunicacAes exteriores".
de tima concxáo unitaria (auto-referencial) de comunicaQóes", a socie-
dade é o sistema mais abrangente. As unidades elementares da socie-
dade, as comunicaOes 15 , que eta constituí através da síntese de 1.2. Direito como Sistema Autopoiético
informa0o, mcnsagem e compreenslio", só cstáo presentes no interior
da mesilla, n.3o cm set' lucio ambiente, de tal maneira que eta pode ser A diferenciaQáo do Direito na sociedade moderna pode ser interpre-
caracterizada como um sistema "real-necessariamente fechado"". Em- tada, por conseguinte, como controle do código-difere .Na "lícito/ilícito"
bora a reprodueáo de comunicaeóes só se realize dentro da sociedade por um sistema funcional para isso especializado". De acordo com o
(fecha mento auto-referencial), existem imprescindivelmente comunica- modelo luhmanniano, essa nova posiQáo do Direito pressupbe a supera-
QáO da sociedade pré-moderna, diferenciada verticalmente, ou seja, con-
41 . Lultinantu 198111:423.
forme o principio da estratificaQáo. Na medida em que o princípio de di-
42. I , 1982:59.
ferenciacáo baseava-se numa distinQáo entre "acima" e "abaixo", prati-
43. Teubner, I 987a:106ss., 1989:36-60. Cf. também idem, 1987b.
camente apenas o sistema supremo, a ordem política da camada social
Luhmann, 1987a:92. Segundo Luhmann (1987a: 43s.), os sistemas so- mais alta, constituía-se auto-referencialmente". O Direito permanecia
ciais, unidades atitopoiéticas de comunicitOes, emergen de "cima", ou seja, sobredeterminado pela política e as representa9óes morais estáticas, po-
constittieni-se ao estabelecerem, em um outro plano, urna nova diferencia entre lítico-legitimadoras, náo dispondo exclusivamente de um código-dife-
sistema e meio ambiente. Mio resultara, pois, da acumula4110 de elementos in- renQa específico entre um sim e um rlo. A positivaQáo do Direito na
fra-estruturais, Mis como consciéncia, seres humanos etc. Ao contrario, na dis- sociedade moderna implica o controle do código-diferenqa "lícito/ilíci-
tinylio de Maturana e Varela (1980: I 07-11, 1987:196ss.) entre autopoiese de to" exclusivamente pelo sistema jurídico, que adquire dessa maneira
primeira, segunda e terceira ordem, os seres vivos apresentam-se como compo-
nentes dos sistemas sociais (ernergéncia de "haixo"). Cf. também Teubner, 48. Luhmann, 1983b:137.
1989:40s. Vale advertir que o conceito de sociedade (género) de Maturana e 49. Luhmann, 1983b:137s.
Varela, primariamente biológico, é mais abrangente do que o de sociedade hu- 50. Cf. Luhmann, 1983b:134, 1987a:603, 1986a:83, 1986b:171s.
mana (especie); cf. idem, 1980: XXIV-XXX, I987:196ss. 51. Sobre código binário em geral, ver Luhmann, 1986a:75ss.
45. Lantano, 1987a:192s. 52. Luhmann, 1986b:171. Cf., em relagáo aos sistemas sociais em geral,
46. Luhmann, 1983h:137. Ver também idem, I 987a:193ss. idem, 1986a:85s.
47. Luhmann, 1987a:60s. 53. Luhmann, 1981g:159s.

110
1 lo
siqóes científicas59, ela depende de processos seletivos de filtragem con-
seu fechamento operativo". ceitual no interior do sistema jurídico°. A capacidade de reciclagem
Nesse sentido, a positividade é conceituada como auto-determinacáo
(dimensáo cognitivamente aberta) do Direito positivo possibilita que ele
operacional do Direito". Assim como em relacáo aos outros sistemas
se altere para adaptar - se ao meio ambiente complexo e "veloz". O fe-
sociais diferenciados, náo se trata aqui de autarquia, (quase) privacáo de chamento normativo impede a confusáo entre sistema jurídico e seu
meio ambiente. Se o fato de dispor exclusivamente do código-diferenca meio ambiente, exige a "digitalizaQáo" interna de informaQóes proveni-
"lícito/ilícito" conduz ao fechamento operacional, a escolha entre lícito entes do meio ambiente. A diferenciaQáo do Direito na sociedadc náo é
e ilícito é condicionada pelo meio ambiente. Por outro lado, a auto-de- outra coisa do que o resultado da mediagáo dessas duas orientnóes°. A
terminagáo do Direito fimdamenta-se na distincáo entre expectativas alterabilidade do Direito é, desse modo, fortificada, náo — como seria
normativas e cognitivas", que só se tornou clara a partir da codificaeáo de afirmar-se com respeito a um fechamento indiferente ao mcio ambi-
binária da diferenca entre lícito e ilícito exclusivamente pelo sistema
ente — impedida; mas ela ocorre conforme os criterios internos e espe-
jurídico. Com base na distincáo entre o normativo c o cognitivo, o fe-
chamento operativo do sistema jurídico é assegurado e simultaneamente cíficos de um sistema capaz de reciclar-se, sensível ao set' mei° ambien-
compatibilizado com sua abertura ao meio ambiente. A respeito escreve te°.
Nessa perspectiva, o fechamento auto-referencial, a normatividade
Luhmann: "Sistemas jurídicos utilizam essa diferenca para combinar o
para o sistema jurídico, náo constitui finalidade em si do sistema, antes
fechamento da autoproduQáo recursiva e a abertura de sua referéncia ao
é a condiqáo da abertura°. A radicalizaQáo da tese do fechamento como
meio ambiente. O Direito constitui, com outras palavras, um sistema
falta de meio ambiente desconhece o problema central da capacidade de
normativamente fechado, mas cognitivamente aberto [...]. A qualidade conexáo (em contraposicáo á simples repeticáo) entre acontecimentos
normativa serve á autopoiese do sistema, á sua autocontinuaqáo dife- elementares64. Só sob as condiOes de abertura cognitiva em face do
renciada do meio ambiente. A qualidade cognitiva serve á concordáncia meio ambiente (capacidade de reciclagem), o sistema jurídico pode to-
desse processo com o meio ambiente do sistema"". Daí resulta uma co- mar providéncias para desparadoxizar a auto-referéncia, possibilitando
nexáo entre conceito e interesse na reproduqáo do Direito positivo. Ao
mesmo tempo em que o sistema jurídico fatorializa a auto-referéncia por
59. Com relacáo especificamente ao conhecimento científico, afirma Luli-
meio de conceitos, ele constrói sua heterorreferéncia através da assimi-
mann (1985:17) ein consonáncia com isso: "Seria, poréin, seguramente fatal
lacáo de interesses58.
Nesse contexto, o sistema jurídico pode assimilar, de acordo com os para o sistema jurídico — e sobretudo politicamente fatal — se ele pudesse ser
revolucionado através de tuna substittlicáo de elementos teóricos centrais ou
O
seus próprios critérios, os fatores do meio ambiente, náo sendo direta- mediante uma mudanca de paradigma". Cf. também idem, 1990d:593s. e 663s. O
mente influenciado por esses fatores. A vigéncia jurídica das expectati- Em contrapartida, na perspectiva singular de C. Souto e S. Souto, pode-se
vas normativas náo é determinada imediatamente por interesses econó-
micos, critérios políticos, répresentacóes éticas, nem mesmo por propo-
definir o Direito, em parte, confomie os criterios do conhecimento científico O
(cf. C. Souto e S. Souto, 1981: esp. 101 e 106-113; Souto, 1992:43-45, 1984:82-
84 e 91s., 1978:85-117).
O
54. Luhmann, 1986a:125s. E'specificamente sobre o código binario do sis-
60. "Desenvolvimentos externos" — enfatiza 'l'enhila (1982:21) - - " nao
tema jurídico, ver de forma abrangente idem, 1986b, 1993:165ss. Aqui deve ser sáo, por um lado, ignorados, nein, por outro lado, convertidos diretamente, con-
lembrado que o Direito, na perspectiva de observacáo do sistema político, pode forme o esquema 'estímulo-resposta', ein efeitos internos". Nesse sentido, ad-
ser qualificado como um segundo código do poder político (idein, 1986b:199,
verte o mesmo autor: "Autonomia do Direito refere-se á circularidadc de sua
1988a:34, 48ss., 56).
auto-reproducáo e náo á sua independéncia causal do lucio ambiente" (1989:47).
55. Cf, Luhmann, 1988b, 1983b, 1985, 198111.
61. Luhrnann, 1983b:152s.
56. Lulunann, 1983b:138ss.
62. Cf. Ltilunami, I 9{13b:136.
57. Lulunann, 1983b:139. Cf. também idem, 1984b:110ss.
63. Lithinann, 1987a:606, 1993:76.
58. Lulunann, 1990b:10. Cf. idem, 1993:393ss.
64. Liihmann, I987a:62

I21
120
a capacidade de concxáo"s. O fechamento cognitivo do sistema jurídico seja como adequada complexidade (justita externa) ou como consisten-
proporcionaria urna paradoxia insuperável da autopoiese, náo permiti- cia das decisócs (justita interna) 7'. Trata-se, coro outras palavras, por
ria, portanto, a interrupcáo da interdependéncia dos componentes inter- um lado (externamente), de abertura cognitiva adequada ao meio ambi-
nos através da referéncia ao meio ente; por outro lado (internamente), da capacidade de conexáo da repro-
Por outro lado, porém, a interrupcáo do fechamento normativo atra- ducáo normativa autopoiética. A positividade náo se limita, pois, ao
vés do questionamento do código-diferenca "lícito/ilícito" afetaria a au- deslocamento dos problemas de fundamentacáo no sentido da ética do
tonomia do sistema jurídico, levaria a paradoxias heteronomizantes: "Se discurso habermasiana 71 , significa a eliminacáo da problemática da fun-
um sistema emprega urna diferenca-guia como código da totalidade de damentacáo. O fato de que o Direito preenche sua funcáo perante um
suas °pernees, essa auto-aplicacáo do código ao código deve ser excluí- meio ambiente hipercomplexo, inundado das mais diversas expectativas
da. A auto-referencia só é admitida dentro do código e, aqui, operacio- normativas, exige, segundo Luhmann, um desencargo mais radical com
nalizada como negacáo. [. ..] A autonomia do sistema náo é, entáo, nada respeito á fundamentacáo ética, seja eta material ou argumentativo-pro-
mais do que o operar conforme o pi-ciprio código, e precisamente por- cedimental 72 . A rcleváncia eventual de ponderac5es referentes a valores
que esse desparadoxiza a paradoxia da auto-referéncia" 67 . De acordo pretensamente universais tenia como conseqüéncia a imobilidade do sis-
com a concepcáo de Luhmann, a "auto-aplicacáo do código ao código" tema jurídico, o bloqueio de sua tarefa seletiva, portanto, efeitos dis-
náo implica apenas efeitos heteronomizantes, mas também imobilidade funcionais. Em suma: nos termos da concepcáo luhmanniana da positi-
do sistema jurídico, na medida em que a capacidade de conexáo da re- vidade do Direito, isto é, fechamento normativo e abertura cognitiva do
produclio autopoiética é, dessa maneira, bloqueada. Direito moderno, o problema da justita é reorientado para a questáo da
Especialmente nesse ponto, cmergem as divergéncias entre a teoria complexidade adequada do sistema jurídico e da consisténcia de suas
luhmanniana da positividade e as novas concepcees axiológicas do Di-
r wM
Pressuposto que á positividade do Direito é inerente náo apenas a sen) ou de urna "norma de reconhecimento" (Hart). Cf. Luhmann, 1983b: 140s.;
supressáo da determinacáo imediata do Direito pelos interesses, von- Gttnther, 1988:328.
tades e criterios políticos dos "donos do poder", mas também a neutrali- 70. Luhmann, 1988b:26s. Cf. também idem, 1981k:388ss, 1993:225.
'acá° moral do sistema jurídico, torna-se irrelevante para Luhmann 71. "A fungáo própria da positivacao consiste em deslocar problemas de
urna teoria da justita como criterio exterior ou superior do sistema jurí- fundamental-do, portanto, em descarregar a aplicacáo técnica do Direito, sobre
dico: "Todos os valores que circulan' no discurso geral da sociedade sáo, amplos espaqos, de problemas de fundamentacáo, mas náo em eliminar a pro-
após a di ferenciacáo de mil sistema jurídico, ou jurídicamente irre- blemática da fundamentacáo - (I labermas, 1982b1:359). Mais tarde, a oposigáo
levantes, ou valor próprio do Direito"". Portanto, a justita só pode ser á concepcáo lulunanniana da positividade como autonomia sistémica vai ser ex-
considerada conseqüentemente a partir do interior do sistema jurídico, pressa de forma mais vigorosa: "Um sistema jurídico adquire autonomia náo
apenas para si sozinho. Ele é autónomo apenas na medida em que os procedi-
65. Cf. Luhmann, 1987a:59. mentos institucionalizados para legislacáo e jurisdicáo garantem fonnagáo im-
66. Cf. Luhmann, 1987a:65. parcial de julgamento e vontade, e, por esse caminho, proporcionam a uma ra-
67. Luhmann, 1985:6. Em relacáo aos sistemas sociais em geral, cf. tam- cionalidade ético-procedimental ingresso igualmente no Direito e na política"
bém idem, 1986a:76s. e 80s. (I-Iabennas, 1987a:16). Fundamentando essa posieáo, ver, mais recentemente,
68. Ver sobretudo Luhmann, 1981k, 1988b, 1993:214ss.; e, a respeito, cri-
idem, 1992:571ss.
ticamente, Dreier, 1981. Cf também como críticos do modelo luhmanniano A- 72. Segundo Lubmaim (1981k:389, nota 33), "... formas discursivo-racio-
lexy, 1983:161-65; GtInther, 1988:318-34; defendendo-o, Kasprzik, 1985. nais de esclarecimento de posic8es valorativas aceitáveis ou inaceitáveis fícam
69. Luhmann, 1988b:27. Daí porque Kasprzik (1985:368ss.) designa o en- boje encravadas no domínio do mero vivenciar. O pressuposto central da filoso-
1bque de Luhmann de "desfundamentalizagrio". E, de observar-se que a vigéncia fia prática, segundo o qual, ao argumentar-se sobre o que boje se designa de
do código "lícito/ilícito", diferenca-guia da reproducao autopoiética do Direito valores, poderia compreender-se inelbor o agir, nao é mais defensável nas con-
confonne Luhmann, é também independente de tuna "norma fundamental" (Kel- dileSes hodiernas de um mundo 'imito mais rico em possibilidades".

122 123
réncia autopoiética náo é, entao, unt problema a ser superado. mas sin]
decisóes. unía condiga° imprescindível unidadc operacional e estrutural do sis-
tema jurídico.
1.3. A Alopoiese do Direito Tarnbém náo partimos aqui de tuna distinga° radical entre sisientas
auto-referentes e alo-referentes no sentido da concepgáo biológica de
O modelo luhmanniano do Direito moderno (positivo) como siste- Maturana, conforme a qual se distinguem, respectivamente, os sistemas
ma autopoiético é, numa perspectiva empírica, suscetível de restriqóes. que só podem ser caracterizados com referencia a si mesmos e os siste-
mas que só podem ser caracterizados com referéncia a um contexto82.
A determinagáo alopoiética do Direito prevalece na maior parte da so-
No caso dos sistemas sociais, a autopoiese operacional é combinada com
ciedade moderna (mundial)". Inicialmente cabem alguns esclarecimen-
tos. a referéncia cognitiva ao meio ambiente. A heterorreferéncia informa-
tiva é pressuposto da auto-referéncia operacional e vice-versa. No siste-
Ao contrapor-se á autopoiese a alopoiese, náo se trata de uma dis-
ma jurídico, isso significa, como observamos no item anterior, a cone-
cussáo sobre a superagáo lógica da paradoxia da auto-referéncia74. Nesse
xáo entre fechamento normativo e abertura cognitiva. O Direito enquan-
sentido orientou-se o debate entre Hart e Ross sobre a possibilidade ló-
to sistema autopoiético é, ao mcsmo tempo, normativamente simétrico e
gica da auto-referéncia no Direito". De um lado, Han fazia objegóes á
cognitivamente assimétrico83. Só guando há tuna assimetriza0o externa
resposta de Kelsen ao argumento de que a serie infinita de sangóes na
reina() entre normas sancionadoras e sancionadas estaria cm contradi- ao nivel da orienta0o normativa é que surge o problema da alopoiese
ga° com a nogao de Direito como ordern coativa7b; por outro lado, con- como negaQáo da atito-referéncia operacional do Direito. Derivado eti-
testava a tese, sustentada por Ross, de que a reforma constitucional das mologicamente do grego (do Cum outro', 'diferente') + poiesis Cpro-
• d.,
normas constitucionais referentes á reforma da Constituigáo configura- duqáo', 'criagáo'). a palavra designa a (re)produQáo do sistema por
pa,
ría "um absurdo lógico'. Hart apresentava o argumento conclusivo de critérios, programas e códigos do scu meio ambiente. O respectivo sis-
sal tema é determinado, por injungóes diretas do mundo exterior,
que o Direito náo constitui um sistema de proposigaes no sentido lógico
e, por conseguinte, admite auto-referéncia78. perdendo em significado a própria difcrenga entre sistema e mcio ambi-
Nos termos da concepgáo sistémico-teorético da autopoiese, a auto- ente. Por outro lado, bloqueio alopoiético do sistema é incompatível com
referéncia pertence á realidade do Direito como sistema social, náo capacidade de reciclagem (abertura cognitiva) e, por conseguinte, com a
sendo tratada como um problema lógico. O conceito de auto-refcréncia é própria nogáo de referéncia ao meio ambiente como interrupgáo da in-
"retirado de seu clássico posto na consciéncia humana ou no sujeito e terdependéncia dos componentes sistémicos.
transposto para o domínio dos objetos, a saber, para os sistemas reais A crítica á nogáo luhmanniana da autopoicse do sistema jurídico
como objeto da ciéncia". Daí resulta "uma certa distancia em reina° desenvolvett-se sobretudo entre os autores vinculados á concepgáo pós-
ás dificuldades puramente lógicas da auto-referéncia"8°. Nesse contexto modernista do Direito84. Em Ladeur, argumenta-se no sentido da plu-
náo é mais o pensamento sobre o Direito que é considerado como auto- ralidade do discurso jurídico, criticando-se o conccito de Dircito como
referencialmente constituido, mas sim o próprio Direito8'. A auto-refe- generalizagáo congruente de expectativas normativas, porque tal con-

73. A respeito, ver Neves, 1992. 82. Maturana, in: Maturana e Varela, 1980:XIII.
74. 83. Luhrnann, 1984b:111. relalrio aos sistemas sociais em geral, cf.
Cf. Teubner, 1989:14s.
75. Hart, 1983; Ross, 1959:80-84, 1969. idem, 1987a:65 e 262.
76. Cf. Hart, 1983:170-73; Kelsen, 1946:28s. 84. Cf. Teubner, 1982, 1987a, 1987b, 1988, 1989., idein e Willke, 1984;
77. Ladeur, 1983, 1984: esp. 153ss. e 222ss. 1985, 1986, 1990, 1991, 1992:esp
Ross, 1959:80ss., 1969:esp. 4s., 20s. e 23s.; Cf. Hart, 1983:175ss.
78. 80ss. A respeito, ver tambem.Neves, 1992:41-44. Ein outro contexto, v. Ost,
Cf Hart, 1983:177s.
79. Luhmann, 1987a:58. 1986.
80. Luhmann, 1987a:58.
81. Teubner, 1989:18.
125
124
ceito estaría associado a urna concepcáo instrumenlal da linguagem
como "sistema de signos"' e, portanto, náo tomada cm consideracáo a Dircito formalmente racional e da racionalidade jurídica material°6. No
primeiro caso, 1-merla uma insensibilidade em relaQáo ao contexto so-
heterogeneidade e descontinuidade histórica dos "jogos de linguagem"".
cial; o direito materialmente racional, por sua vez, náo responderia ade-
Disso resulta que náo se fala de consenso (suposto), mas sim de compa-
quadamente á diferenciaQáo da sociedade e náo proporcionaria a auto-
tibilizacao do dissenso". A autopoiese é flexibilizada, na medida cm que
nomia do sistema jurídico. O Direito reflexivo regularia o contexto so-
o plano da virtualizacáo de estrutura e funcáo" possibilita o cmalha-
cial autónomo, respeitando a dinámica própria dos outros subsistemas
mento dos diversos sistemas sociais, o que exige "uma cultura jurídica
da incerteza"8". Ladeur sustenta a pluralizacáo cm vez da unidade do sociais, mas impondo-lhes restriOes possibilitadoras da combinaQáo de
Direito"°, assirn como o caráter constitutivo da desordem para a "pon- todas as partes, restriQóes essas que funcionariam, para cada sistema-
deracáo" (ahlidgung) como paradigma jurídico"'. Mas mantém o con- parte, como "regras do contexto'. Divergindo do modelo de Luhmann,
ccito de autopoiese. Ela é interpretada situativamente a partir da "eres- essa constniQáo pressupót que os subsistemas sociais náo se encontram
cente heterogeneidade e diferenciacáo das arenas do agir social e admi- apenas em relaeóes de observaQáo recíproca, admitindo também inter-
feréncias intersistémicas". Náo se nega, porém, a autopoiese do sistema
nistrativo""2, exigindo aplicacáo situativo-tópica do Direito ("ponde-
jurídico; ao contrario, afirma-se a dupla autopoiese do Direito e dos
racáor; náo é negada: a reproducáo autopoiética realizar-se-ia nos
demais subsistemas da socicdade".
termos de "rima lógica local" para a dogmática'''. Apenas haveria uma
No desenvolvimento de sua concepcáo jurídica pluralista e pós-mo-
pluralizacáo da autopoiesc.
derna, Teubner vai distinguir entre Direito autopoiético, Direito parcial-
O modelo pós modernista proposto por Tetiblier e Willke aponta cm
-

mente autónomo c Dircito socialmente difusom. Parte-se da concepqáo


outra dirccáo. Na tentativa de compatibilizar a tcoria dos sistemas de
COM a tcoria do discurso de Habcrmas, apresenta-se a nocáo
de que o sistema jurídico autopoiético constitui-se do entrelaeamento
de "Dircito reflexivo", o qual surgida como tima rcacáo diferenciacáo
entre os componentes sistémicos, a saber, procedimento jurídico (pro-
funcional da sociedade (Luhmann) e como "Constituicáo exterior" para cesso), ato jurídico (elemento), norma jurídica (estrutura) e dogmática
a auto-rellexáo nos outros sistemas sociais (Habermas)", O "Direito re- jurídica (idcntidade). No caso do Direito parcialmente autónomo, ha-
flexivo" é concebido, entáo, como uma síntese superadora dos limites do vería a auto-referencial constituiQáo dos respectivos componentes sis-
témicos, náo surgindo, porém, o enlace hipercíclico entre eles. Ou seja,
85. ef. Ladeur, 1985:415 e 417s., nota 131. Recuando nessa crítica, cf haveria (re)produeáo auto-referencial dos atos jurídicos entre si, das
ideni, 1992:127s. normas entre si, dos procedimentos entre si, dos argumentos e proposi-
86. Cf. Ladeur, 1986:268, nota g.
eóes dogmáticas entre si, mas esses diversos componentes sistémicos
náo se entrelaeariam num hiperciclo autopoiético. Por fím, teríamos o
87. ef. Ladeur, 1986:273.
direito socialmente difuso, no qual os componentes sistémicos sáo pro-
88. el-. Ladcur, 1985:414.
89. Ladeur, 1985:423. A respeito, ver mais recentemente idem, 1990, 1991,
duzidos sem diferenciacáo jurídica, ou seja, simplesmente como cotilla°
1992.
(processo), aQáo (elemento), norma social (estrutura) e imagem do
90. Ladeur, 1983: esp. 479ss.„ 1984.
mundo (identidade). Ao distinguir esses trés tipos de constitui0o e
91. Ladeur, 1983:478. Como aplica0o dessa concepcao teórica a tima ques-
96. Cf. Teubner e Willke, 1984:19ss.; Teubner, 1982:23ss.
tlio constitucional concreta, ver idem, 1987; e, em controvérsia, Blanke, 1987.
92. Ladeur, 1986:273. 97. Teubner e Willke, 1984:7.
93. Ladeur, 1983:472. Cf. também idem, 1984: esp. 205ss. 98. Teubner, 1988:52ss., 1989:96ss. Cf. acima nota 50 do Cap. II.
99. Cf. Teubner, 1988:46-48, 1989:88ss. A respeito, v. criticamente Naha-
94. Ladeur, 1985:426.
mowitz, 1990. Replicando-o, Lulunarm, 1991b. Distanciando-se de ambas posi-
95. Teubner e Willke, 1984:24-30; Teubner, 1982:44-51. A respeito, ver
Oes, Kargl, 1991.
em diversas perspectivas zis críticas de hilimann, 1985; Naluimowitz, 1985;
100. Cf. Teubner, 1989:49ss., especialmente o sugestivo quadro da pág. 50;
19xs.
idcm, 1987a 106ss. (o mesmo quadro á pág. 108), 1987b:432ss.

127
condicionamento de todo e qualquer sistema autopoiético pelo sem mero-
(re)producáo dos componentes do sistema jurídico, Teubner é levado á
ambiente, e que isso constitui pressuposto da conexa() auto-referencial
seguinte aporia: tratando-se do mesmo ámbito de vigéncia, como se re-
dos componentes intra-sistémicos. Mas, nesse caso, Irá a "conuitacao"
solvem os confitos entre os trés diversos tipos sistémicos do Direito?
Ele responde com o conceito de Direito intersistémico de colisáo'°', in- ou "digitalizacáo" dos fatores externos pelo código e o criterio do res-
clusive para "o confito entre ordem jurídica estatal e ordens sociais pectivo sistema. É na capacidade de "releitura" própria das determinan-
piarais quase-juridicas"")2 . A questáo, contudo, permanece: o Direito tes meio-ambientais que o sistema afirma-se como autopoiético. Na
intersistémico de colisáo constitui sistema autopoiético, ordem jurídica medida em que, ao contrário, os agentes do sistema jurídico estatal
parcialmente autónoma ou Direito socialmente difuso? Caso se trate de póem de lado o código-diferenca "lícito/ilícito" e os respectivos progra-
urna dessas duas últimas formas, náo haveria, a rigor, Direito autopoié- mas e critérios, conduzindo-se ou orientando-se primária e freqüente-
tico; se, ao contrário, for caracterizado como Direito autopoiético, náo mente com base em injuncóes diretas da economia, do poder, das rela-
haveria exatamente Direito parcialmente autónomo ou socialmente difu- OeS familiares etc., cabe, sem dúvida, sustentar a existéncia da alopoi-
so. ese do Direito. Aqui náo se trata de bloqucios eventuais da reproducáo
autopoiética do Direito positivo, superáveis através de mecanismos
o
Quando falamos de Direito alopoiético, referimo-nos ao próprio Di-
reito estatal, territorialmente delimitado. Procurarnos observar que náo
imunizatórios complementares do próprio sistema jurídico. O problema
implica o comprometimento generalizado da autonomia operacional do o
se desenvolve, em determinado ámbito de vigéncia espacial delimitado
fixamente, a diferenciacáo funcional suficiente de urna esfera do agir e Direito. Diluem-se mesmo as próprias fronteiras entre sistema jurídico e o
do vivenciar jurídico, ou seja, náo se constrói um sistema auto-referen- meio ambiente, inclusive no que se refere a um pretenso Direito extra-
estatal socialmente difuso.
o
cial apto a, de maneira congruentemente generalizada no domínio da
Como veremos mais adiante, a alopoiese afeta a auto-referéncia de
respectiva sociedade, orientar as expectativas normativas e direcionar as
acóes em interferéncia intersubjetiva. Náo se trata, pois, do modelo tra- base (elementar), a reflexividade e a reflexáo como momentos constitu- o
dicional do pluralismo jurídico, no qual se distinguiria Direito "oficial" tivos da reproducáo operacionalmente fechada do sistema jurídico.
autónomo(?) de esferas jurídicas construidas informalmente e de modo Atinge também a heterorreferéncia, ou seja, a funcáo e prestacóes do
Direito. Conforme o modelo de Teubner, a alopoiese implica, em pri-
o
difuso. Em primeiro lugar, tal distincáo nos conduz á já referida aporia
meiro lugar, a náo constituicáo ou o bloqueio generalizado do entrela- o
insuperável quanto aos mecanismo de solucáo dos conflitos intersis-
témicos, pois a prevaléncia de um dos modelos jurídicos implica a ab-
camela° hiperciclico dos componentes sistémicos (ato, norma, proce- o
sorcáo do outro. Por outro lado, a concepcáo pluralista pós-moderna, de
dimento e dogmática jurídicos). Mas pode significar algo mais: a náo
o
origcm européia, procura apontar para a relacáo de mecanismos extra- constitilicáo auto-referencial de cada especie de componentes sistémi-
cos. Nesse caso, as fronteiras entre sistema jurídico e meio ambiente o
estatais "quasc-jurídicos" com um Direito estatal operacionalmente au-
tónomo. Em nosso caso, pretendemos considerar algo mais radical, a social náo só se enfraquecem, Blas desaparecem. o
própria falta de autonomia operacional do Direito positivo estatal. Isso o
significa a sobreposicáo de outros códigos de cornunicacáo, especial-
mente do económico (ter/náo-ter) e do político (poder/Mío-poder), sobre 2. Constitucinaliznáo Simbólica como Sobreposicáo do Sistema Po- u
o código "lícito/ilícito", cm detrimento da efíciéncia, funcionalidade e lítico ao Direito u
mesmo racionalidade do Direito. u
Ao afirmar-se o intrincamento dos códigos e critérios de preferéncia Ao definir-se a Constituicáo como vínculo estrutural entre Direito e
o
das diversas esferas da vida social (economia, poder, etc.) com o código- política (ver Cap. II. 1.3.1), pressupóe-se a autonomia operacional de
ambos esses sistemas. A Constituicáo apresenta-se entáo como meca- u
deferenca e os criterios do Direito, náo se desconhece que sempre há um
nismo de interpenetracáo e interferéncia entre dois sistemas sociais au- u
101.Teubner, 1989: I 23ss.
topoiéticos, possibilitando-lhes, ao mesmo tempo, autonomia recíproca. u
102.Teubner, 1989:135-38. Correspondentemente, concebida como instancia interna do sistema
u
129 u
128 u
jurídico (Dircito constitucional), ela caracteriza-se como mecanismo de
No caso de constitucionalizaeáo simbólica, a politizaeáo adiferen-
autonomia operacional do Dircito (ver Cap. II. 1.3.3). Nesse caso, ~-
ciante do sistema jurídico náo resulta do contcúdo dos próprios disposi-
se cm vista especificamente o proccsso de constitucionalizaeáo como tivos constitucionais. Ao contrario, o texto constitucional proclama um
distintivo do "Estado de Dircito" moderno.
modelo político-jurídico no qual cstaria asscgurada a autonomía ope-
Tratando-se, porém, das "constituieóes instrumentalistas" e "sim- racional do Dircito. Mas do sentido cm que se orienta a atividade consti-
bólicas" (ver cap. II. 6), há unía cxpansáo da esfera do político cm
tuinte c a concretizaeáo do texto constitucional resulta o bloqucio políti-
detrimento do desenvolvimento autónomo de um código específico de co da rcprodueáo operacionalmente autónoma do sistema jurídico. Ao
diferenea entre lícito e ilícito. No caso típico de "instrumentalismo
texto constitucional, numa proporeáo muito elevada, náo corresponde
constitucional", a subordinaeáo heteronomizante do sistema jurídico ao
expectativas normativas congruentemente generalizadas e, por conse-
código primario do poder (superioridade/inferioridade)m sucede dire-
guinte, consenso suposto na respectiva sociedade. A partir da sua emis-
imítenle através do processo de estabelecimento de textos constitucionais
sáo náo se desenvolve uma Constituieáo como instáncia reflexiva do sis-
ou de leis "supraconstitucionais" de exceeáo. Nas situaeóes-limite de to- tema jurídico.
talitarismo e autoritarismo, isso significa que os detentores do poder náo
Com relacáo á legislaeáo simbólica, Kindermann também acentua
ficam vinculados a mecanismos jurídicos de controle previstos nas res-
que se trata de um mecanismo de negacáo da diferenea entre sistemas
pectivas leis constitucionais, seja porque as próprias disposieóes (supra-)
político c jurídico, em detrimento da autonomia do últimow7. Mas, nesse
constitucionais excluem os órgáos políticos supremos de qualquer limi-
caso, cogita-se, cm principio. de aspectos parciais ou setoriais do siste-
taeáo ou controle jurídico, ou porque °corren' mudaneas casuísticas da ma jurídico. A constitucionalizaeáo simbólica, que afcta as cstruturas
Constituieáo no sentido de impedir a invocaeáo dos eventuais instru-
fundamentais da Constituieáo e náo determinados dispositivos constitu-
mentos de controle. É, portanto, a nivel da própria emissáo de leis
cionais isolados, é um mecanismo que póe a autonomia do Dircito glo-
(supra-) constitucionais que se impede o desenvolvimento do código-di- balmente cm questáo. DCVC-SC observar aqui a abrangéncia dos temas
ferenea "lícito/ilícito" como segundo código do poder. Dos próprios tex-
constitucionais nas dimensócs material, social e temporal: 1) o Dircito
tos normativos constitucionais, sem qualquer distáncia em relaeáo á
Constitucional refere-se imediata ou mediatamente a todos os ramos do
realidade constitucionalm, decorre o bloqueio heterónomo da reprodu-
Direito; 2) o consenso ("suposto") cm torno da base constitucional é
eáo dos componentes do sistema jurídico. Tal situaeáo pode estar vincu-
pressuposto da institucionalizaeáo das normas infra-constitucionais e
lada á predomináncia de uma ideologia totalitaria que elimine qualquer
respectivos procedimentos; 3) a continuidade normativa da Constituieáo
autonomia á esfera do jurídico's; mas é possível que esteja associada a
é condieáo da alterabilidade juridicamente regulada c reciclagem per-
interesses mais concretos de minorias privilegiadas, sem consisténcia
manente das normas infra-constitucionais ás novas exigéncias do mcio
"ideológica"".
ambiente. Conseqüentemente, cm náo havendo suficiente releváncia
normativo-jurídico dos textos constitucionais, compromete-se o Dircito
103. "O poder político é antes de tudo codificado hierarquicamente de
acordo com o esquema poder superior/inferior" (1,ulimann, 1986b:199). Cf.
como um sistema autónomo fundamentado na congruente generalizaeáo
de expectativas normativas nas dimensócs material, social e temporal!".
llenita nota 53 do Cap. 11.
Enquanto sobreposieáo do sistema político ao jurídico, a constitu-
101. l'or isso as "Constituilács instrumentalistas" implican] o "realismo
constitucional", significando isso que náo ha distinyáo entre .sistema jurídico
regime Vargas; Neves, 1992:187s.
constitucional e sett meio ambiente político. Cf. acima nota 194 do Cap. H.
107. Cf. Kindennann, 1989:270.
105. Daí a distinyáo de Luhmann (1984c:193-96) entre "Estados de Direi-
108. Sobre nonnaláo, institucionalizaláo e identilicayáo de sentido coino
to" e sistemas integrados ideologicamente.
mecanismos de generalizayáo das expectativas normativas respectivamente nas
106. Os regimes autoritarios latino-americanos tém sido caracterizado, com
dimensées temporal, social e material, Lulunann, 1987b: 53-106.
razáo, pela falta de tuna "ideologia" consistente de sustentayáo. Cf., p. ex.,
Cheresky, 1980: esp. 1976; Loewenstein, 1942:125ss., ein reina() específica ao

13 0
111
cionaliznáo simbólica náo se 'apresenta apenas como mecanismo de
tua9ócs de constitucionalismo simbólico, um problema típico do Estado
bloqueio do Direito pelo código-diferenga primário do poder, "superiori-
periférico (ver item 6 deste Cap.). Nesse sentido, a constitucionalizacáo
dade/inferioridade", ou seja, náo tem um sentido puramente negativo.
simbólica também se apresenta como um mecanismo ideológico de en-
Através do discurso constitucionalista, da referéncia retórica ao texto
cobrimento da falta de autonomia e da ineficiéncia do sistema político
constitucional, é possível, com éxito maior ou menor, construir-se pe-
rante o público a imagem de um Estado ou um governo identificado estatal, principalmente com relacáo a interesses económicos particula-
ristas. O Direito fica subordinado á política, mas a unía política pulveri-
com os valores constitucionais, apesar da auséncia de um mínimo de
zada, incapaz de generalizacáo consistente e, pois, de autonomia opera-
concretiznáo das respectivas normas constitucionais. Trazendo a esse
cional.
contexto palavras de Luhmann, trata-se de um caso típico de "explora-
gáo" do sistema jurídico pela política'°9 . Náo se configura aqui urna "ex-
ploragáo" eventual ou em aspectos isolados, mas sim tuna "superexplo- '
3. Constitucionaliza00 Simbólica versus Auto-Referéncia Consis-
raqáo" generalizada. Daí porque se fala de "sociedade hiperpolitizada"
tente e Hetero-Referéncia Adequada do Sistema Jurídico
em casos de constitucionalizaqáo simbólica"°.
O fato da subordinnáo do Direito ao poder político no contexto da
A concepcáo do Direito como sistema autopoiético pressupóe a as-
constitucionalizaQáo simbólica náo deve, entretanto, levar á ilusáo da
simetria entre complexidade do sistema jurídico e supercomplexidade
autonomia do sistema político. Tendo em vista que o pressuposto de tal
do meio ambiente na sociedade modernaw. Diante da complexidade
autonomia, o desenvolvimento da diferenQa "lícito/ilítico" como segun-
náo-estruturada ou indeterminada /indeterminável do meio ambiente, o
do código do poder"', náo se realiza satisfatoriamente no ámbito da
Direito positivo construiria complexidade sistémica estruturada ou de-
constitucionalizaQáo simbólica, o poder político sofre injunQóes particu-
terminada /determinável' 13 Para isso, exige-se tanto a auto-referéncia
.
laristas as mais diversas, tornando-se ineficiente com respeito á sua fun-
Qáo de decidir de forma vinculatória generalizada. Náo havendo um sis- consistente do sistema jurídico com base no código de diferenca entre
tema normativo-jurídico constitucional efetivo que se possa invocar le- lícito e ilícito quanto a heterorreferéncia adequada ao correspondente
gitimatoriamente para descarregar-se e inumizar-se das pressóes con- meio ambiente, a tal ponto que o problema da justita interna e externa é
reduzido, respectivamente, á questa() desses dois modos de referéncia
cretas de "cima" e de "baixo", os respectivos governantes (em sentido
sistémica" 4.

amplo) ficam suscetíveis ás influéncias dos interesses particularistas,


A auto-referéncia implica trés momentos sistémicos: a auto-refe-
surgindo daí mecanismos instáveis e compensatórios de "legitimagáo".
réncia de base ou elementar, a reflexividade (auto-referéncia proces-
Principalmente no que se refere ás injuqóes do código "ter/náo-ter"
sual) e a refiexao. A auto-referéncia de base significa ¿, capacidade de
(economia), observa-se claramente a fraqueza do sistema político cm si-
conexáo consistente entre os elementos constituintes do respectivo sis-
109..CE Luhmann, 1983b:150. tema; por reflexividade entende-se que processos rcfcrclu-se a processos
110. Cf. Villegas, 1991:16, tratando da eficacia simbólica da Constituicao com base no mesmo código sistémico de preferéncia; a reflexáo cm sen-
colombiana. Evidentemente, a "hiperpolitizacao" que envolve a constitucionali- tido estrito significa que o sistema reflete sobre a sua própria identidade
zalá° simbólica também resulta da permanente invocagao do texto constitucio- (cf. pp. 116ss.).
nal no discurso dos grupos políticos e movimentos sociais interessados efetiva-
112. Cf. Lubina:in, I 975b: esp. 210s.
mente na trasformagao das relnaes reais de poder, mas nao nos parece adequa-
113. Sobre a distiNáo entre complexidade estruturada e nao-estruturada,
do aplicar a esse caso o "conceito de uso alternativo do Direito", eis que ao
ver Luhmann, 1987a:383, 1987b:6s. Paralelamente, ele distingue entre com-
texto constitucional náo corresponde concretizacao normativa (cf., em sentido
plexidade indetenninada/indetenninável e detenninada/deteri ► innvel (cf., p e-
contrário, Villegas, 1991:11s).
xemplo, idem, 1971:300-302, 1975b:209ss.). l3ertalantly (1957:9) falava analo-
111. Cf. Luhmann, 1986b:199, 1988a: esp. 34, 48ss , 56. Ver também aci-
gamente de complicaláo desorganizada e organizada.
ma nota 103 deste Cap.
114. Luhmann, 1988b:26s. Cf. também idem, 198Ik:388ss.„ I993:225ss.

132
133
Ao tratarmos desses trés momentos da auto-referéncia do sistema
xáo, por outro lado, fica vinculada á legitima0o em sentido sistémico,
jurídico cm traballto anterior, relacionamo-las respectivamente aos
conceitos de legalidade, constitucionalidadc e legitimaeáo (no sentido definida como capacidade do sistema de orientar e reorientar as expec-
sistémico)'''. A /egandade, nessa perspectiva, define-se dinamicamente tativas normativas com base nas suas próprias diferencas e critérios.
como capacidade de conexáo consistente das unidades elementares do A constitucionalizacáo simbólica implica problemas de reproducáo
sistema jurídico (comunicaeóes. atos jurídicos) com base no mesmo có- do Direito nos trés momentos de sua auto-referéncia. A falta de forca
digo generalizado (includente) de difcrenea entre lícito e ilícito'''. Nes- normativa do texto constitucional conduz á insuficiéncia de legalidade e
constitucionalidade na práxis jurídica e, correspondentemente, no plano
se caso. ha redundáncia operacional ein face da variedadc do mcio am-
biente'''. A can.s.inucionalidade é concebida como o mecanismo mais de reflexáo, ao problema da desconexáo entre a prática constitucional e
abrangente de re.flexividade no interior do sistema jurídico, oil scja, as construcóes da dogmática jurídica e da teoria do Direito sobre o texto
constitucional.
como a normatizaeáo ¡pais compreensiva de proccssos de normatizaeáo
do Dircito positivo (cf. Cap. II. 1.3.3). A reflexao enquanto referéncia O principio da legalidade, proclamado no texto constitucional, náo
se realiza suficientemente através da conexáo consistente das comunica-
do sistema á sita própria identidadc manifesta-se cm dois níveis de abs- p3eS jurídicas (atos jurídicos) com base exclusivamente no código dife-
track): a dogmáticajuddica como reflexáo limitada, cis que prevalece o -

renca "lícito/ilícito". A legalidade, que implica igualdade perante a lei


principio da "inegabilidade dos pontos de partida de cadeias de argu-
(cf. nota 172 do Cap. II), transforma-se fundamentalmente numa figura
incittae5o" ("proibieáo de negaeáo" da identidade do sistema)"8; a (ca-
ria do Direila como "abstraeáo de abstraeáo" (reflexáo abrangente), na de retórica do discurso do poder. O bloqueio do processo de concretiza-
QáO constitucional resulta da predomináncia de outros códigos binários
qual é admitido o questionamento da identidade do sistema'''. A relle-
de preferéncia, principalmente dos códigos-direrenca "poder/náo poder"
115. Cf. Neves, I 992: I g2ss. e "ter/náo ter", sobre o código "lícito/ilícito". Náo se desenvolve a
I 16. Náo se trata, pois, simplesmente de concordáncia entre lei ou "Direito capacidade de concxáo generalizada das comunicacóes como unidades
escrito- e conninicaOes jurídicas. A essa concepi¡áo estática da legalidade cor- dementares dc um sistema operacionalmente autónomo, sobressaindo-
responde a dicotomia 'ordein legal versus orden] social', usual tanto entre se o problema da ilegalidadc na práxis constitucional, encoberto tanto
"juristas.' quanto entre "típicos'. sociólogos do Direito (cf., por ex., l'alelí°, pela retórica legalista dos ideólogos do sistema de poder quanto pelo
I 984). A legalidade é concebida a partir do wvro legal, cujo caráter náo-social é discurso antilegalista dos seus críticos.
sugerido. A essa concepqáo stibiaz o dualismo liberal 'Estado/sociedade', no Nas condicóes de constitucionalizacáo simbólica, a nocáo de consti-
qual se encobre que o Pstado un] subsistema ou sistema Jiu/dona/ da socie- tucionalidade como reflexividade mais abrangente no interior do siste-
dade (cf Pullman!" I 965:29ss., 1981j:19). 1)e lato, a relnáo hanrainica entre ma jurídico também é afetada. Na medida em que o texto constitucional
texto legal e comunicaOes jurídicas é, antes, tuna expressáo jurídico-lingüística
náo se concretiza normativamente de forma generalizada, impossibilita-
da legal idade (cf. Neves, 1992:185s.) se o desenvolvimento de Constituicáo como normatizacáo mais com-
117. Sobre a rel"áo equilibrada entre redundancia ("cristal-) e variedade preensiva de processos de normatizacáo dentro do sistema jurídico. A
(`-funiNal como condi0o de autonomía dos sistemas, ver Atlan, 1979: esp. 43. paradoxia da "realidade constitucional inconstitucionar" importa uma
tambein Neves. 1992:80s. e g4s. práxis política na qual se adotam ou rejeitam os critérios normativos
118. Lulimann, 1974:15. A respeito, ver Ferraz Jr., 1980:95ss. procedimentais previstos no texto constitucional, conforme ele corres-
119 1.tiltiptinn, 1974:13, aqui ainda incluindo a teoria do I)ireito no sistema ponda ou náo á constelacáo de interesses concretos das relacóes de
científico. Posteriormente, a teoria do Direito vai ser definida como auto-relle-
poder. O problema náo se reduz á questáo da inconstitucionalidade das
xáo do sistema jurídico ( itlem, 19811" cf também I 987b: 361fss., I 986c:19). Se
leis ou "atos normativos", sempre suscetível, num grau maior ou me-
ein caso de retlexao, "a identidade do sistema deve ser prohlentatitada, pode,
portant°, aparecer como negável" (lailimann, 1982:59), apenas a teoria do Di-
'mítica jurídica. Mas no sentido menos estrito do termo, trata-se de dois níveis
de rellexIto do 1)ireito.
reit° constituiria, a rigor, instáncia de rellexilo do sistema jurídico, itrio a dog-
120. Grimm,19119:637.

111
rídicas para o Direito enquanto sistema normativo'". Pretendemos enfa-
mor, de uma solugáo medianté os respectivos mecanismos de controle da
tizar que, nos casos de constitucionalizatáo simbólica, a insuficiente re-
constitucionalidade. Ele torna-se relevante ao nivel de práticas infor- !lodo da indentidade sistémica ou a ineficiente definiQáo das "con-
mais descaracterizadoras dos próprios procedimentos constitucionais (p. diOes do jurídicamente possível" pela dogmática constitucional e a
ex., prido sem o correspondente due process of law, deturpagáo do teoria do Direito constitui fator negativo da oricntagáo generalizada das
procedimento eleitoral, prática judicial corrupta, parlamento como foco expectativas normativas pelo texto constitucional. N'áo se trata do con-
da criminalidade organizada). Nessas circunstáncias, a nogáo de "or-
ceito weberiano de legitimidade racional (moderna) como "crenga na
dem constitucional" perde em sentido prático-jurídico, sendo, porém, legalidade" 123, nem da concepgáo de legitimidade como reconhecimento o
invocada particularisticamente nos casos de instabilidade da ordem po-
lítica real subjacente. Em tal contexto, a constitucionalidade, que impli-
de decides obrigatórias (consenso fático)' 24. Também náo interessam
aqui concepgóes axiológicas de legitimidade com pretensáo de univer-
o
caría generalizagáo includente da normatizagáo constitucional, conver-
salidade, como o modelo haberrnasiano da fundamentagáo do proce-
te-se amplamente em figura de retórica, náo só no discurso do status
quo, como também, em certa medida, na práxis discursiva dos grupos

CeeCtee r.: CC CO C CC 0 0 /2 00 0 0 0 '5 0


122. Nesse sentido, afirma Eder (1986:20): "Teorías jurídicas nao expli-
interessados por transformagóes reais das relagóes de poder.
cam, Blas legitimam o sistema jurídico. Decisiva é sua fungáo legitimatória e
Considerado que a legalidade (auto-referencia de base) e a consti-
náo sua verdade".
tucionalidade (reflexividade) do condigóes imprescindíveis para urna
123. Weber, 1985: esp. 19s., 124, 822; cf. também ideen, 1968b: 2 I5ss.
(auto-) refiexáo consistente sobre a identidade do sistema jurídico e
Com posigáo crítica a respeito, ver Habermas, 1973:133ss., 1982b1: 354ss.
vice-versa, a construgáo de uma dogmática jurídica e também de urna
Divergindo da interpretagáo dominante, Winckelmann (1952:72s. e 75s.) sus-
teoría do Direito relevante na práxis constitucional fica prejudicada cm
tenta o fundamento "racional-valorativo" no conceito weberiano de legitimi-
situagóes de constitucionalizagáo simbólica. Nesse contexto de falta de dade. Por outro lado, Schluchter (1979: 155ss.) relaciona a najáo de "principios
auto-referéncia elementar e processual, náo se desenvolve suficiente-
jurídicos" com a "ética da responsabilidade". Contra essas duas interpretagóes
mente uma dogmática jurídico-constitucional que esteja em condigóes
referentes a valores, cf., respectivamente, I labennas, 1973:136-38, I 982b1: 361,
de, conforme o modelo luhmanniano, preencher satisfatoriamente sua
nota 197. Mas também nao é fundamentável a afinnagáo de Ltilunann (1965:
fungáo de "controle de consisténcia em relagáo á decisáo de outros ca-
140, nota 12) de que Weber vena o problema da legitimidade "somente na
sos" e, nos limites dessa fungáo, definir com releváncia prática "as con- efetividade da dominagáo". Ele mesmo acentua em outra passagem que a
diqóes do jurídicamente possível, a saber, as possibilidades de constru-
legitimidade, segundo Weber, "seria simplesmente a conseqüéncia da (Tenla
00 jurídica de casos jurídicos"'". As abstragóes conceituais da dogmá- fálica no principio da legitimaqc7o" (144). A efetividade seria, nesse sentido,
tica jurídica e as "abstragóes de abstragóes" da teoria do Direito náo se
apenas um indicio da legitimidade.
refietem na práxis jurídico-constitucional, na medida em que constela-
124. Sobre essa concepgáo dominante, que deve ser distinguida da webe-
góes concretas de interesses impedem urna consistente interdependencia
nana, principalmente porque náo se refere apenas á crenga no exercicio legal da
das decides. Daí surge o desvio retórico da cultura jurídica, assim
dominagáo, mas também considera a crenga no título jurídico ou principios ju-
como, freqüentemente, a discuss.áo constitucional orientada basicamente
rídicos do poder, cf. Friedrich, 1960; lieller, 1934:175ss., 191, 221. Nesse con-
pelas questóes e casos jurídico-constitucionais da experiencia estran-
texto, ver, para a distingáo entre "legitimidade" como qualidade do título do
geira. Em linguagem psicanalítica, trata-se, cntáo, de reagóes sublima-
poder e "legalidade" como qualidade do exercício do poder, Bohhio, 1967: esp.
doras diante da realidade constitucional rejeitantet
Com a incapacidade de (auto-) reflexáo consistente do sistema jurí- 48s. Correspondentemente, a legitimidade é reduzida á legalidade no "Estado
de Direito Democrático", na medida em que as "leis" sáo concebidas como
dico-constitucional relaciona-se o problema da legitimagáo. Aqui náo
"expressáo da vontade popular formada democraticamente" (Preuss, 1984:28).
nos queremos referir simplesmente ao papel legitimatório das teorias ju-
Críticamente a respeito de teorias "participatórias" da legitimagáo, ver Luh-
mann, 1987d.
121. Luhmann, 1974:19. No mesmo sentido, ver Ferraz Jr., 1980: 99ss.

137
136
dimento jurídico através de unta moral processual'”. É relevante apon- educacional), limitacócs á atividade política'3°.
tar que, no contexto da constitucionalizacáo simbólica, a orientacáo e No plano constitucional, a funcáo de congruente generaliz.acáo dc
reorientacáo generalizada das expectativas normativas conforme crité- expectativas normativas vai ser possibilitada, na socicdade moderna,
rios e proccdimentos próprios do sistema jurídico, especialmente do Di- através da institucionalizacáo dos Direitos fundamentais, que consti-
reito Constitucional, náo se realiza de maneira generalizada e perma- tuem a rcsposta do sistema jurídico ás exigencias de diferenciacáo fun-
nente. Do figurino constitucional náo decorre legitimacáo do sistema cional. Mas como o princípio da diferenciacáo funcional é inseparável
jurídico no sentido de Luhmann, o que pressuporia uma Constituicáo do principio da inclusáo, a funcáo de congruente generalizacáo de ex-
envolvida nos trés momentos da auto-referéncia do Direito'". É inegá- pectativas normativas importa a institucionaliz.acáo constitucional do
vel que o texto constitucional, enquanto álibi invocado permanente- Estado de bem-estar131. Ou scja, através da institucionalizacáo dos Direi-
mente na retórica do poder, serve. cm ccrta medida, como mecanismo tos fundamentais, a Constituicáo responde á semántica social dos
substitutivo de legitimacáo política. Mas daí ido decorre tima legiti- "dircitos humanos", que pressupee tima sociedade diferenciada cm esfe-
macáo estável e generalizada (includente), o que só seria possível se ao ras de vidas orientadas por criterios os mais diversos, náo subordinada a
texto constitucional correspondcssem expectativas normativas con- uma moral globalizantc e hicrárquica fundamentadora do poder'32; me-
gruentemente generalizadas.
A constitucionalizacáo simbólica náo importa apenas a falta de 130. I Athmann, 1981h: 440. Correntemente a distinga° Ittlunanniana entre
auto-referencia consistente dos componentes do Direito. Envolve tam- prestalao e fuina° nao é empregada, de tal maneira que "a funOo social do Di-
bém o problema da adcquada heterorreferéncia do sistema jurídico. reito" pode ser definida como "uma prestacao do Direito para a sociedade"
No sentido da tcoria dos sistemas autopoiéticos, a refcréncia dos sis- (Maihofer, 1970:25). A referéncia de 13obbio (1977:113-15) a diferentes níveis
temas sociais ao seu mcio ambiente realiza-se através da funqao e da de !luna° importa indistincao entre funcao e prestalao no sentido aqui utili-
prestaqdo. A funcáo é a relacáo do subsistema social com a sociedade zado. Por outro lado, ele distingue entre fuina() do Direito cm reina() á
como um todo. A prestacáo apresenta-se como a referéncia de um "sociedade como totalidade" e funlao do Direito com respeito aos individuos
subsistema a outros subsistemas da sociedadem. Com respeito ao siste- como "componentes" dessa totalidade (ibid.: 111-13). Conforme Schelsky
ma jurídico, a fimqao realiza-se primariamente através da orientacáo ( I 970:57ss.), no segundo caso trata-se de "fuina° antropológica do Direito"; cf.
congruentemente generalizada de expectativas normativas, embora tam- também Maihofer, 1970: 32ss. Na perspectiva luhmanniana, o homem nao é
bém scja funcáo do Dircito a dirccáo da conduta em interferéncia inter- considerado parte, mas sim "meio ambiente" da sociedade (cf. Lulunann,
subjetiva'". A prestaqao mais genérica do sistema jurídico é a SOillQáO 1987a: 2116ss.; I 987b: 133s.).
dc conflitos que náo sc apresentarn mais cm condiceics de ser rcsolvidos 131. Cf. Neves, 1992:151ss. Ver também acima Cap. 11. 1.3.4.1.
com os criterios e diferencas de cada um dos outros sistemas'". Mas o 132. Do conceito de direitos fundamentais, constitucionalmente amparados,
Direito também realiza prestaceíes especificamente diferenciadas para os prodtttos da sociedade moderna funcionahnente diferenciada, Lithinann (1965:
outros sistemas da socicdade, guando, por exemplo, asscgura possibili- 23) distinguia a nolao de "direitos humanos" como direitos eternos. Mais re-
dades de formacáo de capital na cconomia, accsso á instrucáo (sistema centemente (1993:574ss.), ele reelabora o conceito de direitos humanos na pers-
pectiva de um sistema jurídico mundial, propondo que a discussao se concentre
125.Cf.Ilabermas, 1987a, 1992:541ss. Para sua fonnulaláo anterior de um no problema das ofensas flagrantes e escandalosas á "dignidade httmana", no
conceito de legitimacáo com pretensáo de verdade, ver idem, 1973: esp. 140ss. ámbito de tuna semántica restritiva dos direitos humanos. Aqtti diferenciamos
126. A respeito, cf. Neves, 1992: 212ss. os direitos fundamentais, incorporados juridicamente á Constituiciao, da
127. Cf. Lultinann, 1982:54ss., 1993:156ss..., idem e Schorr, 1988: 34ss. semántica político-social dos "direitos humanos" — também própria da socie-
Ver acima C7ap. II. I .3.4. dade moderna —, qtte ¿limita para a exigéncia de constntcao, amplialao e efe-
I 2g. A respeito, ver Lulunann, 19g1d, 1987b:94ss. Cf. acima nota 241 do ti vaya° dos "direitos limdamentais" (nesse sentido, v. I.efort, 1981., Ferry e Re-
Cap. I. naut, 1992; I Atfer, 1988). Mestno na perspectiva de base valorativo-procedimen-
12') Teubner, 1982: 48. tal de Alexv (1986), a expressno "direitos fundamentais" refere-se a dircitos
diante a institucionalizacáo do Estado de bem-estar, a Constituicáo eles de constitucionalizacáo simbólica náo é mil problema de um siste-
ma operacionalmente autónomo diantc do seri meio ambiente. A questáo
volta-se para as exigéncias das massas por maior accsso ou participacáo
nas prestacóes dos diversos sistemas sociais, sobretudo da política e do está vinculada á própria ausencia de distincáo nítida entre sistema e
Direito. Tanto urna como outra forma de institucionalizacáo sáo im- meio ambiente, exatamente por falta de "Constituicáo normativa" corno
prescindíveis para o éxito do Direito em sua funeáo de congruente gene- mecanismo de autonomia do Direito (Cap. II. 1.3.3.). O texto constitu-
ralizacáo de expectativas normativas na sociedade moderna. cional atua basicamente como figura de retórica política, náo se desen-
A nivel constitucional, a prestacáo jurídica relativa á solucáo de volvendo como instáncia de rellexividade que possibilite a autonomia do
conflitos náo resolvidos nos outros sistemas vai ser assegurada com o código "lícito/ilícito" diante de outros códigos-difereno, especialmente
estabelecimento dos procedimentos constitucionais de resolucáo de o político ("poder/náo-poder") e o económico ("ter/náo - ter"). Nesse con-
conflitos, o due process of Law. Como prestacáo específica do Direito texto, a questáo da heterorreferéncia é, primariamente, um problema de
auto-referéncia.
perante o sistema político, a Constituicáo regulamenta o procedimento
eleitoral, estabelece a "divido de poderes" e a distincáo entre política
(em sentido estrito) e administracáo, com urna semántica orientada para 4. Implicacóes Semióticas
a imunizacáo do "Estado de Direito" perante interesses particularistas
de dominacáo (ver Cap. II. 1.3.4.2 e 3.). A constitucionalizaQáo simbólica como alopoiese do Direito tem
Esse modelo do Direito como sistema autopoiético perde cm valida- relevantes conseqüéncias para urna leitura semiótica do sistema jurídico.
de empírica guando se esbarra com o problema da constitucionalizacáo Defina-se o Direito corno plexo de normas ou cadeia de comunicaOes,
simbólica, típico do Estado periférico (ver item 6 desee Cap.). A insufi- ou mesmo, no sentido de Teubner, como entrelacamento hipercíclico de
ciente concretizacáo normativa do texto constitucional, no qual todas as norma (estrutura), ato (elemento), procedimento (processo) e dogmática
instituicóes referidas do proclamadas, é um sintoma da incapacidade do
(identidade) jurídicos (cf. pp.127s.), trata-se sempre de um fenómeno
sistema jurídico de responder ás exigéncias do scu "meio ambiente". Os intermediado lingtiisticamente. Distinguen-se, entáo, as dimensaes sin-
direitos fundamentais constituem-se, entáo, cm privilégio de minorias, tática, semántica e pragmática do sistema jurídico enquanto linguagem
sobrevivendo, para a maioria da populacáo, quase apenas na retórica normativa em geral: do ponto de vista sintático, eta vai ser caracterizada
político-social dos "direitos humanos", tanto dos ideólogos do sistema pela "estrutura relacional deóntica, sendo o functor específico o dever-
quanto dos seus críticos. A inclusáo através do Estado de bem-estar, ser (D), que se triparte cm trés submodais: o obrigatório (0), o proibido
proclamado na Constituicáo, é relevante apenas no discurso da realiza- (V) e o permitido (P)" 133 ; sob o aspecto semántico, dirige-se á realidade
QáO das normas programáticas num futuro remoto. O desrespeito ao due
com a pretensáo de dirigir normativamente a conduta em interferéncia
process of law constitucionalmente festejado é a rotina da prática dos
intersubjetiva; na perspectiva pragmática destina-se a orientar nor-
órgáos estatais (especialmente da policía) com relacáo ás classes popula- mativamente as expectativas dos sujeitos de Direitom. Mas, para dife-
res (á maioria). A politizacáo particularista da administraeáo impede a renciar-se a linguagem jurídica (especializacáo da linguagem natural),
concretizacáo generalizada dos princípios constitucionais da moral idade náo é suficiente caracterizá-la como linguagem normativa. Na teoria dos
e impessoalidade. A corrupcáo e as fraudes eleitorais impossibilitam a sistemas autopoiéticos, é imprescindível que um único sistema funcional
legitimacáo constitucional (generalizada) do sistema político, que passa, da sociedade disponha da diferenca lingüísticamente intermediada entre
entáo, a subordinar-se instavelmente aos interesses particularistas de lícito e ilícito'".
cima e ás necessidades concretas de baixo, sendo constrangido a adotar
No caso da constitucionalizacáo simbólica, o problema semiótico
mecanismos substitutivos de "legitimacóes casuísticas" inconstitucionais
(favores, concessóes, ajudas e trocas ilícitas). 133. Vilanova, 1977:40.
A incapacidade de heterorreferéncia adequada do Direito em situa- 134. Cf. Vilanova, 1977:40.
135. Cf. Luhmann, 1993:165ss., 1986b, 1986a: esp. 125s., 1974:72. Ver
amparados constitucionalmente.
também acima nota 140 do Cap. II.

140 141
apresenta-se guando se constata que á linguagem aparentemente norma- tizacáo normativa do texto constitucional, é evidente que á linguagem
tivo-jurídica dos textos constitucionais náo correspondem realmente a constitucional náo corresponde orientacáo congruentemente generaliza-
estrutura e a funcáo próprias de unta linguagem especificamente jurídi- da de expectativas normativas. A normacáo constitucional é atingida
ca. Náo se trata apenas de "deformacáo" no plano semántico-pragmáti- náo só pela falta de institucionalizacáo (consenso suposto), mas também
co, mas também ao nivel sintático. pela caréncia de identificacáo de sentido. O texto constitucional passa
Do ponto de vista sintático, deve-se observar cm primeiro lugar que, fundamentalmente a ser objeto do discurso político. Pragmaticamente,
cm situacóes típicas de constitucionalizacáo simbólica, o texto constitu- perde sua forca comissivo-diretiva, tornando-se sobretudo mecanismo de
cional como plexo de signos náo se encontra envolvido relevantemente persuasáo política. A própria questáo sintática da descaracterizacáo do
no complexo de normas do sistema jurídico, tornando-se primariamente functor deóntico só pode ser compreendida a partir da consideracáo
um conjunto de símbolos do discurso político. Ou seja, na medida cm dessa variável pragmática. Perlocutivamente'37, o discurso constitu-
que Ihe falta normatividadc, ele pude sua concxáo sintática com o sis- cionalista, tanto dos detentores do poder quanto dos seus críticos, náo se
tema jurídico e passa a integrar sintaticamente o sistema político. Isso dirige fundamentalmente no sentido de, com pretensáo de generalidade,
implica a descaracterizacáo do functor deóntico-jurídico "dever-ser". Os obrigar, proibir ou permitir juridicamente, constituindo antes uma
submodais obrigatório (0), proibido (V) e permitido (P) permaneccm linguagem destinada a persuadir e convencer do ponto de vista político:
como "fórmulas" lingüísticas envolvidas no discurso persuasivo do po- por parte dos detentores do poder, persuadir de sua identificacáo com a
der Daí porque cssc problema sintático dos modais dcónticos constitui, realizacáo (futura) dos "valores constitucionais"; do lado dos críticos da
cm última análisc, uma questáo pragmática. ordem política, convencer do desresixito governamental ao "valores
Sob o ángulo semántico, revela-se nas situacóes típicas de constitu- constitucionais" proclamados e também da sua capacidade de realiz.á-
cionalizacáo simbólica que o modo-de-referIncia da linguagem consti- los o mais rápidamente possível guando no poder.
tucional á realidade náo é especificamente normativo-jurídico. Das dis- Por fím, cabe também uma aplicacáo da diferenca semiológica entre
posicóes constitucionais náo dccorre direcáo coercitiva da conduta hu- códigos fracos e códigos fortes"' ao problema da constitucionalizacáo
mana cm interferéncia intersubjetiva. Náo se argumente aqui a objecáo simbólica como alopoiese do Direito. Considerando que a autopoiese do
de que só há norma guando está presente a possibilidade de sua viola- sistema jurídico pressupóe a plena diferenciacáo do código sistémico
cáo. No caso de constitucionalizacáo simbólica, trata-se, ao contrário, de "lícito/ilícito", intermediado lingüisticamente, é possível afirmar-se que
uní contexto de impossibilidade social de concretizacáo normativa do a constitucionalizacáo simbólica implica um código jurídico fraco em
texto constitucionaP3°, náo só em face dos comportamentos da popula- face dos códigos binários "poder/nao-poder" (político) e "ter/náo-ter"
cáo, geralmente alheios aos dircitos e devercs proclamados constitucio- (económico). Esses, códigos fortes, bloqueiam a comunicacáo consis-
nalmente, como lamben] em virtude da atitude expressa e sistematica- tente e generalizada nos termos da diferenca "lícito/ilícito" como código
mente inconstitucional dos agentes cstatais cricarregados de aplicar fraco. Assim sendo, prevalece, a nivel constitucional, a codificacáo-de-
normativo-juridicamentc o texto da Constituic3o. Quanto ao modo-de- codificacáo de mensagens políticas (e económicas) cm detrimento da
referéncia á realidade, a linguagem constitucional funciona basicamente codifica0o-decodifica0o de mensagens jurídico-normativas.
como mecanismo de influéncia política, tanto na retórica dos defensores
do status quo guamo no discurso dos grupos interessados em trans- 137. Sobre a distinláo de J. I,. Austin entre atos locucionais, ilocucionais e
formacóes efetivas na relacáo de poder. perlocucionais, caracterizados esses últimos pela sua influéncia nos sentimen-
O problema semántico do modo-dc-referéncia está diretamente vin- tos, idéias e alíSes do(s) orador(es), ottvinte(s) ou outras pessoas, v. Habertnas,
culado á dimensáo pragmática, que, no caso de constitucionalizacáo 1982b1:388ss.
simbólica, é a mais importante. Bloqueada sistcmaticamente a concre- 138. Cf. Eco, 1991:47-50; e para uma aplicaláo jurídica em outro contexto
Ferraz Jr., 1988:257s.
136. Cf. Neves, 19118: 50s., tratando da relaláo entre ineficácia social e
perfinéncia da norma ao ordenamento jurídico.

I 12 143
5. Constitucionalizacáo Simbólica versus Juridificacáo. Realidade mocrático de Direito", que o debate sobre a crisc de juridificaeao se de-
Constitucional Dejuridificante senvolveu. Nesta discussáo, relevou-se a crítica habermasiana com base
na distineáo do Direito como mcio ("Mediu'', Redil") e o [Mello como
A ampliaQáo dos temas juridificáveis nos quadros da positivaQáo do instituicáo. No primciro caso, "o Dircito é combinado de tal forma com
direito 19 fez da juridificafflo um dos problemas críticos do Estado mo- os meios (Medien) dinheiro e poder, que ele mesmo assume o papel de
derno. Conceituada "para fora" como expansáo do Direito e "para den- meio de direcáo (Stenertingsmedium)" 145, como no campo do Direito
tro" como seu detalhamento e especializacáo (condensacáo)I", o fenó- Económico, Comercial e Administrativo. Por "instituicóes jurídicas"
meno da juridificacáo foi, no ámbito de um intenso debate na Alemanha compreende Habermas "normas jurídicas que através das referencias
Ocidental dos anos 80, classificado em trés tipos básicos: legalizacáo,

0 00 e0 01)/5 2
positivistas a procedimentos irá° podem tornar-se suficientemente legi-
burocratizacáo e justicializacáom. Os cfeitos juridificantcs sobre a socie- timadas""°. Desde que cías pertencein "ás ordcns legítimas do inundo
dade foram, de um lado, avaliados negativamente (alienacáo, burocra- da vida" (horizonte do agir comunicativo), precisan de "justiticacilo
tizacáo, "colonializacáo do mundo da vida"), de outro lado, positiva- malcriar". De acordo com esse modelo analítico, o Direito como meio
mente (asseguramento da liberdade e do stntus) 142 . teria "forra constitutiva", o Direito como instituieáo apenas "fuina() re-
O processo de juridificacáo desenvolveu-se no Estado Moderno em gulativa"". Na medida em que ele atuasse como meio ría esfera regula-
quatro fasesm. Na primeira, a juridificacáo conduz aos clássicos direitos da informalmente do "mundo da vida", como, p. ex., o Direito d.; Famí-
subjetivos privados, estando vinculada ao conceito de Estado Burgués. lia e a legislacáo do ensino, a juridificacáo teria efeiios negativos, so-
Num segundo período, eta implica a positivacáo dos direitos subjetivos cialmente desintegradores. Fala-se entáo de colonizaeáo interior do
públicos de caráter liberal, correspondendo ao Estado Burgués de Direi- mundo da vida: "A tese da colonizaeáo interior afirma que os subsiste-
to. Posteriormente, com o surgimento do Estado Democrático de Direi- mas economia e Estado, em face do crescimento capitalista, tornara-se
to, tem-se a emergéncia dos direitos subjetivos públicos democráticos mais complexos e invadem sempre mais profundamente a reproducáo
(juridificacáo do processo de legitimacáo) "na forma de direito de voto simbólica do mundo da vida" 149 . O Direito-mcio, interinedi,„ao sis-
geral e igual, assim como do reconhecimento da liberdade de organiza-

Ceee Ce e 0C ee 0OC 4 OC":


témica de agir instrumental-estratégico, a servieo da economia e do
QáO das associacóes políticas e partidos" I44. Por último, ternos a questáo poder, invadiria a efera do agir comunicativo, fundada no entendimento
da juridificacáo nos quadros do Estado social e democrático de Direito, e, desta forma, prejudicaria a construeáo de tima razáo intcrsubjetiva.
que trouxe consigo a positivaláo dos direitos sociais, a intervencáo Por outro lado, porém, a juridificaeáo teria caráter social-integrativo e
compensatória na estrutura de classes e na economia, a política social funcional, guando o Dimito como instituieáo desempcnhasse unt papel
do Estado, a regulamentacáo jurídica das relacóes familiares e educaci- regulativo a favor do plexo de aeáo do mundo da vida, orientado no en-
onais. tendimento, ou servisse como mcio de direcáo dos sistemas de aeáo da
É com vistas a esta última fase, a do chamado "Estado social e de- economia e do Estado'''.

139.Cf. Luhmann, 1981b: 129, I987b: 211, 1983a: 144. 145.Habennas, 1982b11:536.
140.Cf. Voigt, 1980:16; Habermas, 1982b11: 524; Werle, 1982:4. 146.Habennas, 1982h11:536.
141. Voigt, 1980: 18-23. Werle (1982:5s.) defende a limitaláo do conceito 147. Habennas, 1982b11:536. Para o aprofundamento da concepOo haber-
de juridificacáo ao aumento de leis e decretos num determinado período. Contra masiana do Direito como "instittii0o", v. idem, 1992.
esta posilZio, v. Voigt, 1983: 18s., considerando os "apectos qualitativos" da ju- 148.I labennas, 1982b11:537
ridificalÉto. 149.lIabennas, 1982h11:539.
142.Voigt, 1980:30. 150. Cf. Ilabennas, 1982b11:536ss. Assim seudo, justifica-se a L'inca de
143. Habermas, 1982b11524ss., a quem acompanhamos a seguir. Cf. tam- Nahamowitz (1985: esp. 42) a Teubner e Willke, na medida cm que esses, cm
bém Voigt, 1983:215, Werle, 1982:9s. urna tentativa de unir a ética do discurso habennasiíma á teoría (los sistemas de
144.Habermas, 1982b11529. Luhmann, tiraram consequéncias neoliberais da conceináo de juridilicaylo de

144 145
Na perspectiva da tcoria dos sistemas, o problema da juridificacáo der-se-ia, nos quadros do pluralismo jurídico, apresentar a objecao de
nao é tratado com base no dualismo "sistema e mundo da vida"''', mas que outras formas jurídicas atuariam no lugar do Direito positivo com
sim através da dicotomia "sistema e mcio ambiente". Conforme este relacáo á solucáo de conflitos'51. Quanto a essa restricáo, deve-se ad-
modelo, a juridificacáo seria definida como "expansáo do sistema jurídi- vertir que o debate em torno da juridificacáo e dejuridificacáo refere-se
co com gravame para outros sistemas sociais"'". Os problemas da juri- ao Direito positivo como sistema social diferenciado1". No caso de
dificacáo estariam estritamente ligados á questáo da autonomia dos sis- constitucionalizacáo simbólica, o código "lícito/ilícito" é sistemática e
temas jurídicos e dos demais sistemas sociais, passando a serem inclui- generalizadamente bloqueado em seu desenvolvimento por critérios
dos no tema mais amplo da autopoiese do sistema jurídico-positivo cm políticos e económicos, de tal mancira que a diferenca entre sistema ju-
face da autopoiese dos demais sistemas sociais (economia, política, re- rídico e mcio-ambiente perde em nitidez. Enquanto código fraco, o ju-
ligiáo. arte, ciencia etc.). Portanto, ele pressuporia Constituicao norma- rídico náo se amplia em detrimento de outros códigos sistémicos. Ao
tiva como mecanismo de autonomía operacional do Direito. contrario, os códigos fortes "poder/nao-poder" e "ter/nao-ter" atuam em
No caso de constuticionalizacáo simbólica, que implica falta de au- prejuízo da reproducáo constitucionalmente consistente do sistema ju-
tonomia operacional do Direito. o problema nao é de juridificacao, mas rídico. O qtte há é politizacáo dejuridicizante da realidade constitucio-
sin], ao contrario. de dejuridificacáo da realidade constitucional. Partin- nal, respaldada evidentemente nas relacóes económicas. Parafraseando
do-se da distincáo de Blankenburg entre juridificacáo no plano das ex- Habermas, trata-se de "coloniz.acáo política -e económica" do mundo do
pectativas (ponencia de "mais" rcgras jurídicas no lugar de regulacóes Direito.
informais) e juridificacáo no plano da acáo ("mais" eficacia do Direi-
to)'", poder-se-ia formular, entao. que á juridificacáo no sentido de au-
mento l'a producáo de normas jurídicas positivas cstatais, opor-se-ia a
I
6. ConstitucionalizacAo Simbólica como Problema da Modernidade
dejuridifica0o a nível da condtiOo do comportamento. Nessa perspec- Periférica
tiva, a dejuridifica0o seria considerada apenas no plano do "agir" ( > -

eficacia). Porém, as tendencias dejuridificantes &corremos da constitu-


A constitucionalizacao simbólica como alopoiese do sistema jurí-
cionalizacáo simbólica afetam também o "vivenciar" do Direito (as ex- dico é um problema fundamentalmente da modernidade periférica'".
pectativas de comportamento). O pretenso filtramento das expectativas Náo utilizamos o modelo "centro/periferia" da forma simplificadora
de comportamento através da normacáo constituinte náo é seguido, de ideologizante das "teorias da exploracao" dos anos 60 e 701". Recor-
mancha alguma, da orientacáo generalizada das expectiativas normati- remos a essa dicotomia principalmente para enfatiz.ar que se trata de
vas com base no texto constitucional, quer dizer, nao é acompanhado uma e da mesma sociedade mundiaP", náo de sociedades tradicionais
da generalizacáo congruente das expectativas normativo-constitucio-
nais. O vivenciar normativo da populacáo ent geral e dos agentes esta- 154. Cf., p. ex., Sonsa Santos, 1977, 1980, 1988.
tais faz implodir a constituicáo como ordem básica da comunicacáo ju- 155. Cf. Voigt, 19113:20., flabermas, 1982b11:524, que tisa, porérn, a expres-
rídica. sáo "direito escrito".
Contra a itocáo de unta 1-Mida& constitucional dejuridificante po- 156. l'ara lima abordagem mais abrangente do problema da constitticiona-
lizaláo e da positivnáo do Direito na moclernidade periférica, ver Neves, 1992.
I labermas (cf. Teubner e Willke, 1984:24 e 29; Teubner, 1982:26s. e 41-44, o
157. Cli, p. ex., Frank, 1969. Para tim panorama global sobre os debates
qual modifico(' sita posi0o mais tarde, 1989:81s. e 85s.).
dos anos 60 e 70 ein tomo da teoria da dependéncia e do capitalismo periférico,
151. No sentido da diferencia0o de sistema e mundo da vida como proces-
ver Sengliaas (org.), 1972, I 974a, 1979.
so de ~1110o social, v. I labennas, 1982b11:229ss. Cf. também acima Cap. II.
158. Sobre a sociedade moderna como "sociedade mundial", orientada pri-
mariamente pela economia, a técnica e a cié.ncia, v. Ltihinann, 1975c, o qual,
152. Voigt, 1980:27
entretanto, sem coeK.'ilcia coin essa conceplao, aplicava o modelo "tradiláo/mo-
153. 131ankenburg, 1980:84.
deniidade" á diferenla entre países cm desenvolvimento e países desenvolví-

14 6 147
versus sociedades modernas, como se uma diferenca de "antes e depois" náo funcional, nem mesuro a criacáo de urna esfera intersubjetiva au-
estivesse na base dos diferenciados níveis de desenvolvimento social. tónoma fundada numa generalizacáo institucional da cidadania, carac-
Partimos da constatacáo de que o advento da sociedade moderna está terísticas (ao menos aparentes) de nutras regióes estatalmente organi-
estreitamente vinculado a unía profunda desigualdade económica no zadas (países centrais)' 62 . O fato de haver gratis diversos quanto á dife-
desenvolvimento inter-regional 159, trazendo conseqüéncias significativas renciacáo funcional exigida pela complexidade social e quanto A cons-
na reproducáo de todos os sistemas sociais, principalmente no político e trucáo da cidadania como exigéncia do desaparecimento da moral hie-
no jurídico, estatalmente organizados. É claro que estamos como que ao rárquico-material pré-moderna, náo invalida o potencial analítico dos
nivel de conceitos típico-ideais no sentido weberiano, os quais, como conceitos de modernidade central e modernidade periférica, antes a-
"utopías" gnosiológicas, nunca sáo encontrados em forma pura na ponta para sua funcáo de estrutura de selecáo cognitiva das ciéncias
realidade social, servindo antes como esquema de sua interpretacáo com sociais.
énfase unilateral em determinados elementos mais relevantes á a- A bifurcacáo no desenvolvimento da sociedade moderna (mundial)
bordagern 16°. Náo desconhecemos, pois, que a sociedade mundial de resultou, para os países periféricos, numa crescente e veloz complexifí-
hoje é multifacetada e possibilita a aplicacáo do esquema "centro e cacáo social, sem que daí surgissein sistemas sociais capazes de estnitu-
periferia" em varios níveis' 61 . Parece-nos, porém, que a distincáo entre rar ou determinar adequadamente a emergente complexidade (cf. nota
modernidade central e periférica é analiticamente frutífera, na medida 113 deste Cap.). Nas palavras de Atlan, á variedade do meio ambiente
em que, definindo-se a complexificacáo social e o desaparecimento de náo há resposta sistemica através de redundáncia (cf. nota 117 deste
uma moral material globalizante como características da modernidade, Cap.). Os respectivos sistemas náo se desenvolvem, poit,, com suficiente
constata-se que, em determinadas regióes estatalmente delimitadas (pa- autonomía operacional. Com isso se relaciona o problema da "he-
íses periféricos), náo houve de maneira nenhuma a efetivacáo adequada terogeneidade estrutural", cuja discussáo remonta ás tcorias da de-
da autonomia sistémica de acordo com o princípio da diferencia- pendéncia e do capitalismo periférico dos anos sessenta e setenta 163 . Em
urna relcitura, pode-se afirmar aqui que a questáo das grandes dispari-
dos (cf. 1983a: 65, nota 10; 1987b: 96, nota 114; 1965: 101s.), afastando-se dades no interior de todos os sistemas sociais e também entre eles, a que
desta posicao mais recentemente (cf. 1990a: 212-214). Cf. também Iieintz, se referia o conceito problemático de "heterogeneidade estrutural", im-
1982. Analogamente, mas em outra perspectiva, Wallerstein (1979:74ss.) fala plica um difuso sobrepor-se e intrincar-se de códigos e criterios/pro-
de capitalismo mundial. gramas tanto entre os subsistemas sociais quanto no interior deles, en-
159. A respeito, v. Hopkins e Wallerstein, 1979. Este problema está vincu- fraquecendo ou impossibilitando o seu funcionamento de maneira gene-
lado estreitamente á divisáo regional do trabalho, que, segundo Durkheim ralizadamente includente 164 . Daí surge o problema da "marginalidade"
(1986:164), "desenvolve-se a partir do século XIV". ou "exclusáo" 165, que, a rigor, é um problema de "subintegra0o" nos
160. Weber, 1973:190s. Na concepcáo do tipo ideal "os elementos conside-
rados náo essenciais ou casuais para a constituiáo da hipótese" náo sáo toma- 162. A respeito, v. Neves, 1992:esp. 16s. e 75-81, 1991.
dos em tonta (Weber, 1973:201s.). Mas enquanto em Weber (1973:208) o con- 163. Para um panorama, v. Nohlen e Sturm, 1982.
ceito de tipo ideal baseia-se na "nNáo fundamental da teoria do conhecimento 164. Cf. Neves, 1992:78. Parece-nos que deve ser também nessc sentido a
moderna que remonta a Kant, de que os conceitos sáo e apenas podem ser meios leitura do "enfoque de entrelaomento" proposto pelos teóricos do de:;cnvolvi-
mentais para o controle espiritual do empiricamente dado", ou soja, remonta á mento da Universidade de Bielefeld; a respeito, cf. Evers, 1987; Scliiiii.lt-Wul-
concepgao do sujeito transcendental, concebemos o tipo ideal como estrutura ffen, 1987.
cognitiva de sele9áo das ciéncias sociais em relaáo á realidade, que, diante 165. Sobre "marginalidade" na discussáo dos anos 60 e 7(i cm torno de de-
delas, apresenta-se autónoma e mais complexa. Numa perspectiva estritamente pendéncia e capitalismo periférico, v., em diferentes persr..livas, t,i,rdoso,
teorético-sistémica, cf. a respeito Luhmann, 1987a:51. 1979:140-85; Amin, 1973:208-14; Quijano 1974; Sunkel, 1972:271ss. Sobre
161. Cf., p. ex., Galtung, 1972:35ss.; Wallerstein, 1979.; Hopkins e Wal- "exclusáo" em sentido sistémico-teorético, v. Idihmann, 1981j:25ss.; cf. acima
lerstein, 1979; Senghaas, 1974b:21. pp. 71s.). Como constata I leintz cm sua investigaláo sobre a sociedade mun-

148 1 149
tittiem, portant°, sistemas alopoicticamente determinados, na medida
sistemas funcionais da sociedade. Emergen], entáo, relaeóes de "sub-
cm que náo se reproduzem operacionalmente por difereneas. criterios e
integraeáo" e "sobreintegraeáo" nos diversos subsistemas sociais, o que
elementos próprios, mas sáo difusa e instavelmente invadidos. na sua
os descaractcriza como sistemas autopoieticos'. A subintegracáo sig-
reprodueáo operacional. por difcrencas. programas c elementos dc
nifica dependencia dos criterios do sistema (político, económico, jurí-
outros sisteinas sociais.
dico etc.) sem acesso a suas prestaeóes. A -Sobreintegraeáo" implica a-
Mcsmo sc admitindo que os criterios de tiltragem autonominntes
ccsso aos beneficios do sistema sem dependencia dc suas rcgras e crite-
do Dircito e do sistema político. como, por excmplo, o principio da
rios.
igualdadc perante a lei e o das elcieócs democráticas. constituern ilusócs
Embora a distincáo típico-ideal entre "centro" c "periferia" da soci-
ideológicas na modernidade central. concordando com Claus Offe que
cdadc moderna tenha fundamentos económicos. cla pressupóc a seg.
se trata de mecanismos de encobrimento de relaeóes concretas dc domi-
inentaeAo territorial do sistema político-jurídico cni Estados'". Quanto
naeáo", deve-se reconliccer que. na modernidade periférica ncm ma-
modernidade periférica, o problema estrutural desde o set' surgimento
mo nesse sentido eles funcionam adequadamente: entre outras, as injun-
vinctila-sc primariamente á falta de suficiente autonomia operacional
QÓCS particularistas da dominaeáo económica realiz,am-se de forma des-
dos sistemas jurídico e político. bloqueados externamente por injuncóes,
nuda, destniindo abertamente e com tendencias generalizantes a legan-
náo mediatizadas por mecanismos próprios, de criterios dos demais
do& no plano jurídico e os procedimentos democráticos na esfera políti-
sistemas sociais, principalmente do económico. Na linguagem da tcoria
ca. Tambein entre política e Dircito. a aplicaeáo controlante e !imita-
dos sistemas, os mecanismos dc filtragem seletiva do Dircito positivo
dora do código "lícito/ilícito- como segundo código do sistema político
(principios da legalidadc, da constitucionalidade etc.) c do sistema
(cf. nota 54 (leste Cap.). característica do "Estado de Direito". náo se
político (eleieóes livrcs, secretas e universais, organizaeáo partidária
realiza de forma satisfatória, sendo claramente constatada a ingerencia
etc.) náo funcionan] adequadamente cm relaeáo ás injuneóes blo-
ilícita sistemática do poder .sobre o Dircito ou mcsmo, nos períodos dita-
queantes do código binário de preferencia ler ou nao-ier. como tambem
toriais. a subordinaeáo dos criterios de licitude/ilicitude aos órgáos su-
do código do amor, da rcligiáo, da amizade etc. Internamente. por sua
premos de poder. baseada nos chamadas "leis dc CXCCQ50", casuistica-
vez. náo há um funcionamento adequado da Constituieáo como "vínculo
mente postas cm vigor e revogadas.
cstrutural" entre Dircito e política. ou scja, como mecanismo dc in-
Pressuposto que o Estado periférico sc caracteriza pelo péndulo en-
terpenctraeáo e interferencia de dois sistemas autónomos (v. Cap. II.
tre instrumentalismo constitucional e nominalismo constitucionalr°, in-
1.3.1), antes um bloqueamento recíproco, principalmente no sentido da
teressa-nos aqui a funeáo predominantemente simbólica das "Constitui-
politizaeáo adiferenciante do sistema jurídico". Direito e política cons-
QÓCS nominais". Náo se desconhece que as "Constituieóes instrumen-
talistas" tambem desempenham funcóes simbólicas; entretanto. o que as
dial ( 1982:45), "a estrutura internacional de estratificNilo transffinna-se em di-
distingue é que atuam, antes de tudo, como simples instnimentos
res:áo ao aumento da poptilinlio marginalizada nos países ein descnvolvimento".
("armas") jurídicos dos "donos do poder". As C011StillliQÓCS nomina-
166. Cf. Neves, 1992:7gs. e 94ss.
listas dos Estados periféricos implicam a falta de concretizacáo nor-
167. "E por fundamentos políticos que se persiste na segmentaláo regional
111,111k:o-jurídica do texto constitucional em concxáo com a releváncia
do sistema político da sociedade mundial em Estados, apesar de permanente
simbólica do mcsmo no discurso constitucionalista do poder (constitu-
perigo de guerra., e sao fundamentos económicos que foNain a diferenciaiiáo da
cionalizaeáo simbólica). Nas relaeóes dc subintegraeáo e sobreinte-
sociedade em centro e periferia, cm regibes superdesenvolvidas e regiócs caren-
graeáo político-jurídica. náo sc desenvolve Constituicáo como horizon-
tes de desenvolvimento" (Lulimann, 986a:I68). E nesse sentido que é possível
designiir-se a sociediide niundial como sistema internacional estratificado de de-
respectivos sistemas autónomos da sociedade (cf. Lubina:in, 1981j:35, em rela-
senvolvimento., cf. Henal:, 1982:17s e 33ss.
Oo especificamente tto sistema político).
168. A vespa°, v Neves, 1992: esp. 180s. Nao nega aqui ingenuamente
que essa sittinfío seja "funcional" cm outras perspectivas e para determinados 169. (21.. Offe, I977:92ss.
setores. Mas ntio é funcional no sentido de "inclusilo- de toda a popitInflo nos 170. Neves, 1992:119-109 e 144-16.

151
1 50
te normativo-jurídico do sistema político'''. Na prática jurídica do "so- gente:riente as dimensócs social, temporal e material do sistema jurídi-
brecidadáo", as disposigóes constitucionais serán utilizadas, abusadas ou co, náo apenas aspectos scloriais. Mas sobretudo porque a concretizacáo
rejeitadas conforme a constelacáo concreta de j'iterases políticos. No normativa do texto constitucional pressuporia uma radical revolug•o nas
agir e vivenciar do "subcidadáo" a Constituigáo apresenta-se antes como relagóes de poder.
complexo de restricóes oficiais corporificadas nos órgáos e agentes esta-
tais, náo como estrutura constitutiva de direitos fundamentais. Tal au-
sencia de concretizagáo normativo-jurídica generalizada do texto consti- 7. ConstitucionalizacAo Simbólica na Experiéncia Brasileira. Urna
tucional relaciona-se com um discurso fortemente constitucionalista na Referéncia Exemplificativa
práxis política. De parte dos agentes governamentais, vinculados em re-
gra á "sobrecidadania", o discurso político aponta para a identificagáo Estabelecido que a constitucionalizacáo simbólica como alopoiese
do governo ou do Estado com os "valores constitucionais" consagrados do sistema jurídico é um problema típico do Estado periférico, cabe, por
no documento constitucional. Sendo evidente que tais valores náo en- fim, urna breve refcréncia exemplificativa ao caso brasileiro. Em traba-
contram o mínimo de respaldo na realidade constitucional dejuridifican- lho anterior já propusemos uma interpretacáo da experiéncia constitu-
te do presente, os agentes de poder desenvolvem a retórica de sua reali- cional brasileira como círculo vicioso entre instrumentalismo e nomina-
zacáo no futuro (remoto). A constitucionalizacáo atua como álibi: o lismo constitucional"'. Náo é este o local para urna nova ribordagein in-
"Estado" apresenta-se como identificado com os valores constitucionais, terpretativa do "desenvolvimento" constitucional brasileiro. Aqui nos
que náo se realizam no presente por "culpa" do subdesenvolvimento da interessa considerar, em tragos gerais, como apoio empírico de nossa
"sociedade". Já na retórica dos grupos interessados em transformagóes argumentacáo, a funcáo hipertrofícamente simbólica das "Constituicóes
reais nas relagóes de poder, os quais pretendem freqüentemente repre- nominalistas" brasileiras de 1824, 1934, 1946 e 1988. Conforme já
sentar a "subcidadania", invocam-se os direitos proclamados no texto afirmamos no item anterior de maneira genérica, náo se nega, com isso,
constitucional para denunciar a "realidade constitucional inconstitucio- que as "Constituicóes instrumentalistas" de 1937 e 1967/1969 tenham
nal" e atribuir ao Estado/governo dos "sobrecidadáos" a "culpa" pela exercido funcóes simbólicas: a primeira, por exemplo, através da decla-
náo realizacáo generalizada dos direitos constitucionais, que seria pos- racáo dos direitos sociais, que atingia apenas urna pequena parcela da
sível estivesse o Estado/governo em outras máos. A retórica constitucio- populacáo; os documentos constitucionais de 1967/1969, mediante as
nalista subjaz muitas vezes urna concepcáo voluntarista e instrumenta- declaracóes de direitos individuais e sociais náo respaldadas na realida-
lista do Direito. de constitucional. Mas, em ambos casos, desvinculava-se. a partir de
É evidente que nas condicóes de constitucionalizacáo simbólica do dispositivos da própria "carta política" ou de leis constitucionais de
Estado periférico, caracterizado por relacóes de "subintegracáo" e excecáo, o chefe supremo do executivo de qualquer controle ou limita-
"sobreintegracáo" náo só no sistema político-jurídico, mas também nos 00 jurídico-positiva' 74 A legislacáo constitucional, casuistkamente mo-
.

sistemas económico, educacional, de saúde etc., tornam-se inadequados dificada de acordo com a conjuntura de interesses dos "donos do poder",
— com muito mais razáo do que cm relagáo á legislagáo simbólica no tornava-se basicamente, entáo, simples instrumento jurídica dos 1,1-tipos
Estado de bem-estar do Ocidente desenvolvido — o tratamento e a solu-
cáo do problema da ineficácia da legislacáo constitucional com base no 173. Neves, 1992:1 1646.
esquema instrumental "meio-fim" das "pesquisas de implementacáo"'". 174. Na Carta de 1937, tal situacáo decorria do Art. 186 (declarava o esta-
Em primeiro lugar porque a constitucionalizacáo simbólica afeta abran- do de emergencia) em combinaláo com o Art. 178 (dissolucáo dos órgfios legis-
lativos) e o Art. 180 (atribuiláo do poder legislativo central exclusivamente ao
171. Cf. em outro contexto Luhmann, 1983a: 196. Presidente da República), como também das sucessivas leis constitucionais
172. A respeito, Mayntz, 1983, 1988. Para uma reinterpretagáo sistémico- emitidas pelo Chefe de Estado. No sistema constitucional de 1964, a iliinitagáo
teorética da problemática da implementagáo com referéncia á relagáo entre po- jurídico-positiva do órgáo executivo supremo resultava dos Atos Institticionais,
lítica e Direito, v. Luhmann, 19811:166ss. especialmente do A15.

152 153
políticos dominantes, atuítva como tima "arma" na luta pelo poder. O va'78. Daí porque nunca sc desenvolvett o controle da constitucio-
qiic distinguia fundamentalmente o sistema de relacáo entre política e nalidade de leis, que, dc acordo com o texto constitucional, poderia tcr
Dimito cra, portanto, o "instrumentalismo constitucional", dc maneira sido cxercido pelo Poder Moderador'"; e guando dele se tem noticia,
alguina a constitucionalizacáo simbólica. trata-se de "controle inconstitucional da constitucionalidade" de atos
Apcsar de tolerar a cscravidáo'', estabelecer um sistema cleitoral legislativos locais através de simples avisos ministeriaism.
censitário amplamcnte excludente (Arts. 92-95) e adotar a figura do A falta de concretizacáo normativa do texto constitucional náo sig-
Poder Moderador (ans. 98-101), resquicio absolutista, a -Carta" impe- nificava sua falta de significacáo simbólica na realidade do jogo de
rial de 1824 tinha unos liberais, expressos sobremdo na declaracáo de
poder imperial. Nesse sentido já observava Gilberto Amado: "É claro
dircitos individuais contida no seu Art. 179. Mas os direitos civis e po- que a 'Constituicáo' erguida no alto, sem contato nenhum com ela la
líticos previstos no texto constitucional alcancaram um nivel muito populacáol. náo poderia ser senáo tima ficcáo, um símbolo da retórica
limitado de realizacáo. Também os procedimentos constitucionais sub- destinada ao uso dos oradores"181. Na mesma linha de interpretacáo.
meteram-se a tima profunda "deturpacáo- no proccsso de concretizacáo. Faoro acentua que a Constituicáo reduzia-se "a tima promessa e a um
Para cxemplificar, basta apontar a generalizacáo da fraude eleitoral'76, a painel decorativo"'82. Na perspectiva da tcoria da acá°. ela seria carac-
que se cncontrava estreitamente vinculada a prática pseudoparla- terizada como unta "promessa inauténtico" (cf. Cap. II. 9.), náo como
mentarista desenvolvida durante o Segundo Reinado, da qual resultava expressáo da "boa intencáo" dos "donos do poder". Na perspectiva mais
unta inversáo no proccsso dc "formacáo da vontadc Nesse abrangente da teoria dos sistemas, configurava-se a subordinacáo ime-
contexto, a nocáo de constitucionalidade náo encontrava apoco na diata do sistema jurídico ao código do poder, através da utilizacáo hiper-
práxis dos próprios agentes estatais. Náo só através da atividadc le- troficamente "siinbólico-ideológica" do texto constitucional pelo sistema
gislativa ordinária incompativel com dispositivos constitticionais pos- político, ludo isso por falta dos prcssupostos sociais para a positivacáo
suidores dc supremacia formal nos termos do Art. 178, mas sobretudo (como autonomia operacional) do Direito. Tal situacáo náo implicava,
na prática -informal" dos cventuais governantes, náo sc concebia a de modo algum. a irreleváncia da carta constitucional como "um painel
Constituicáo como horizonte jurídico da acá° político-administrati- decorativo", cis que o "mundo falso" da "Constituicáo- atuava muito
eficientemente no "mundo vcrdadeiro" das relaclies reais de poder'".
175. 1.t. verdade que a escravidáo mio se baseava explieitamente no texto
Náo só na retória constitucionalista dos governantes. mas também no
constitucional de 1824. Contudo, através da distiNáo entre cidadáos "ingénitos-
discurso oposicionista de defesa dos valores constitucionais ofcndidos
e "libertos- (Art. 6'2, inciso P2), a escravidao reconbecida indiretamente. Nos
seus comentarios a esse dispositivo, Mínenla Bueno (1857:450-53) estranlia- 178. Cf. Neves, I 992: I 96s.
mente lifio nenliuma referéncia a essa questáo. Também nlio encontramos 179. Teria sido, porém, um controle político, amparado no Art. 98 da Cons-
qualquer releréncia en) Sonsa (1867:40-45) e Rodrigues (1863:10). tituiQáo, que atribuía ao Imperador o poder de "incessantemente" velar "sobre a
176. Segundo Calógeras (1980:270), para a vitória eleitoral, "qualquer pro-
manitteiwao, equilibrio c hannonia dos mais jxxleres". Nos termos da estrutura
cesso, por mais fraudulento fosse, era admitido", sendo "considerada por todos, do texto constitucional, nao ixxleria ter sido desenvolvido o controle judicial
indistintamente, única falta moral para o partido no poder, o perder a elei0o". conforme o modelo norte-americano, cis que a figura do Poder Moderador era
A respeito defbrnia0o do procedimento eleitoral no Imperio, v. n'oro, 1984: incompativel com tun auténtico judical review Nesse sentido, cf Bittencourt,
364-87, 1976:127-63 Cf. também Tórres, 1957:2g3ss.
1968:281 também Mendes, 1990:170. Em sentido contrario, cf. Pontes de Mi-
177. Tal situa0o é usualmente expressa mediante o famoso Sorites do Se-
randa,1973:620
nador Nabuco de Araino- "O Poder Mcxlerador pode chamar a quem quiser para
180. Rodrigues, 1863: I 83-88.
organizar ministerios, esta pessoa faz a eleic;ao, porque de fazé-las, esta elei- 181. Amado, 1917:30.
(¡.rio l'az a maioria- ((unid Nabuco, 1936:81). Faoro (1976:132) manifesta-se cri-
1112. Faoro, 1976:63. Com semelhantes fonnulalóes, cf. Leal, 1915 : 146 e
ticamente com aos limites dessa fonntilNiio, considerando a inlluéneia 149.
do poder local e das oligarquias partidarias., cf. lamben] T6rres, I 962:99s. 183 Faoro, 1976:175.

ISI
I
corporativista e nacionalista, o problema da falta de concretiznáo nor-
na práxis governamental, a Carta imperial desempenhou urna impor- mativa do texto constitucional de 1891 foi denunciado como contradicáo
tante funcáo político-simbólica'TM. A ineficácia jurídica do texto consti- entre "idealismo da Constituicáo" e "realidade nacional" 192 . Porém, cm
tucional era compensada pela sua eficiencia política como mecanismo suas críticas ao "idealismo utópico" do legislador constituinte, a signifi-
simbólico-ideológico de "legitimacáo". cagáo simbólico-ideológica do documento constitucional náo foi consi-

COQGCC OC CO .00
Com a Constituicáo de 1891, náo se reduz o problema da discre- derada com exatidáo, mas sim, ao contrário, acentuada a ingenuidade de
páncia entre texto constitucional e realidade do processo de poder. Ao
"suas boas intengóes" 193 . Náo pertencia á discussáo se o "idealismo utó-
contrário, as declaracóes mais abrangentes de direitos, liberdades e pico" só foi adotado no documento constitucional na medida em que a
principios liberais importavam uma contradicáo ainda mais intensa realizacáo dos respectivos principios ficava adiada para um futuro re-
entre o documento constitucional e a estrutura da sociedade do que na moto, de tal maneira que o status quo náo era ameacado. Além do mais,
experiencia imperial' 85. A permanente deturpacáo ou violacáo da Cons- náo se pode excluir que a "Constituicáo nominalista" de 1891 atuava
tituicáo em todo o período em que ela esteve formalmente em vigor como rucio de identificacáo simbólica da experiencia político-jurídica
(1891-1930) 186 pode ser apontada como o mais importante trato da rea- nacional com a norte-americana (EUA), construindo-se a imagcm de
lidade político-jurídica da Primeira República. Constituem expressaes um Estado brasileiro táo "democrático" e "constitucional" como o seu
significativas da falta de concretizacáo normativa do texto constitucio- modelo. No mínimo, a invocacáo retórica dos valores liberais e demo-
nal: a fraude eleitoral como regra do jogo político controlado pelas oli- cráticos consagrados no documento constitucional funcionava como
garquias locais' 87 ; a degeneracáo do presidencialismo no chamado "neo- álibi dos "donos do poder" perante a realidade social ou como "prova"
presidencialismo"'", principalmente através das declaracóes abusivas
de suas "boas inten95es".
do estado de sitio'"; a deformacáo do federalismo mediante a "política
A afirmagdo dos valores social-democráticos em uma sociedade ca-
dos governadores" 19° e a decretacáo abusiva da intervencáo federal nos

- 0 -0 --ZZO O G4 ZZ ZZD JZ333


racterizada por relacóes de subintegracáo e sobreintegracáo é a nova
Estados'91 . variável simbólica que surge com o modelo constitucional de 1934' 94.
Entre os críticos conservadores, adeptos de um Estado autoritário, Em face das tendencias autoritárias que se manisfestavam durante o pe-
ríodo em que a nova constituicáo esteve formalmente em vigor, que re-
184. Nesse sentido, afirma Faoro em sua interpretagao político-sociológica sultaram no golpe de 1937, náo se desenvolveu amplamente urna ex-
da obra literária de Machado de Assis: "A Constituilao só seria venerada pelos periéncia de constitucionalizacao simbólica.
políticos de oposicao, que, no govemo — por ser governo — violavam, asse- A constitucionaliz.acáo simbólica de base social-democrática é re-
nhoreando-se dos instrumentos de poder que cla só nominalmente limitava. O tomada com o texto constitucional de 1946. Sintomática aqui é a relacáo
exercício do govemo seria sempre a Constituicao violada — daí o brado pito-
dos valores social-democráticos proclamados e a forra majoritária na
resco e oco da oposicao: `Mergulhemos no Jordáo constitucional — (1976:65s.). constituinte e principal base de sustentacáo do sistema constitucional de
185. Atento a esse problema, embora em outra perspectiva, Buarque de 1946, o Partido Social Democrático, vinculado estreitamente ás oli-
Holanda (1988: 125) observava que, com a implantacao da República, o Estado
garquias rurais. Tal situacáo contraditória entre interesses subjacentes e
"desenraizou-se" ainda mais do país. Segundo Faoro (1976:64), fortificou-se o
valores democráticos solenemente adotados pode ser melhor compreen-
"arbítrio". dida guando se considera que a realizacáo do modelo constitucional é
186. Cf. Pacheco, 1958:240ss. transferida para um futuro incerto e atribuida aos próprios detentores
187. A respeito, ver Neves, 1992:170s.
188. Sobre esse conceito, v. Loewenstein, 1975:62-66. 192. Nesse sentido, ver principalmente Vianna, 1939: 77ss., Torres, 1978.
189. Cf. Barbosa, 193311:373ss., 1933111:323ss. 193. Cf., p..ex., Vianna, 1939:81, 91 e 111.
190. A respeito da "política dos governadores", v., p. ex., Faoro, 1985: 194. Ao falar-se de "advento do Estado social brasileiro" com a Constitui-
563ss.; Carone, 1969: 103ss., 1971:177ss. Cardoso (1985:47ss.) designa-a de gao de 1934 (Bonavides e Andrade, 1989:325-27), nao se considera o problema
"pacto oligárquico". da constitucionalizalao simbólica.
191. Cf. Barbosa, 1934:17.

157
156
do poder''. Portant°. náo &corre dessa aparente contradieáo amena ao
belecimento de procedimentos constitucionais para a solueáo jurídica de
status quo. Nesse contexto. cabc falar de "liberdade dc decretar a denlo- conflitos (due proce.v.s. of Law) ou á previsáo de tnecanismos específicos
cracia"''', mas náo conforme unta interpretaeáo estritamente bascada de regulaeáo jurídica da atividade política (v. Cap. II. 1.3.4.3 e 4)., o
nas inteneóes dos agentes políticol97: a conexáo dc aeóes propor- texto constitucional é suficientemente abrangente. O problema surge ao
cionadora da constitucionalizaeáo simbólica de 1946 era condicionada nivel da concretizaeáo constitucional. A prática política e o contexto
por variáveis estniturais que tornavam possível a "liberdade" de, sem social favorece uma concretizaeáo restrita e excludente dos dispositivos
risco, "decretar" a democracia-social. O texto constitucional, equipará- constitucionais. A questáo náo diz respcito apenas á aeáo da populaeáo
vel aos scus modelos da Europa Ocidental, só funcionava como símbolo
e dos agentes estatais (eficacia), mas também á vivéncia dos institutos
político enquanto náo emergiam tendéncias sociais para a sua concreti-
constitucionais básicos. Pode-se afirmar que para a massa dos "subinte-
zaeáo normativa generalizada.
grados" trata-se principalmente da falta de identificaeáo de sentido das
A constilucionalizaeáo simbólica de orientaeáo social-democrática é determinaeóes constitucionais"1. Entre os agentes estatais e setores
restabelecida c fortificada com o texto constitucional de 1988. Diante do
breintegrados", o problema é basicamente de institucionalizaeáo (con-
esgotamento do longo período de "constitucionalismo instrumental" au-
senso suposto) dos respectivos valores normativos constitucionais"2.
toritario iniciado em 1964, a indentificaeáo simbólica com os valores do
Nessas condieóes náo se constrói nem se amplia a eidadania nos termos
constitucionalismo dcmocrárico deixou de ser relevante politicamente do princípio constitucional da igualdade (Art. 52, caput), antes se desen-
apenas para os críticos do antigo regime, passando a ser significativa volvem relacóes concretas de "subcidadania" c "sobrccidadania" cm fa-
tambent para os grupos que Ilte deram stistcntaczio. Á crenca pre- consti- ce do texto constitticiona12°3.
tuilite na restauracílo ou recuperaclio da legitimidade" eslava subja-
Os problemas de hetero-referéncia sáo inscparávcis das questóes
cente mil cerio grau de "idealismo constitucional-. O contexto social da
concernentes á auto-referéncia do sistema jurídico ao nivel constitucio-
Constituiclio a ser promulgadaP" já apontava para limites intransponí-
nal (cf. hm 111 deste Cap.). O bloqtteio permanente e generalizado do
veis á sua concretizacáo generalizada. Nada impedia, porem, unta retó-
código "lícito/ilícito" pelos códigos "ter/nao-ter" (cconomia) e "supe-
rica constitucionalista por parte de todas as tendencias políticas; ao
rioridadc/inferioridadc" (poder) implica uma prática jurídico-política
contrario. parece que, quanto mais as relaeóes reais de poder afastavam-
estatal e extra-estatal caracterizada pela ilegalidade. Quanto á constitu-
se do modelo constitucional social-democrático, tanto mais radical era o
cionalidade, as dificuldades náo se referem apenas á incompatibilidade
discurso constitucionalista.
de certos atos normativos dos órgáos superiores do Estado com disposi-
Partindo-se de que, diante da exigéncia de diferenciaeáo funcional e
tivos constitucionais. como, por exemplo, no caso do uso abusivo das
de inclusáo tia socicdade moderna, é jim(yla jurídica da Constituieáo
medidas provisorias pelo Chefe do Executivo2"; o problema náo se res-
institucionalizar os direitos fundamentais e o Estado de bem-estar (Cap.
11. 1.3.4.2). náo caberia restrieóes ao texto constitucional. no qual as
(l'erry e Renaut, 1992: 26-32), por fim, "direitos humanos de primeira, segunda
declaraeóes de direitos individuais, sociais e coletivos é das mais abran- e terceira gerayáo" (11,afer, 1988: 125-34) estáo amplamente previstos no texto
gentes'''. Tainhérn guamo prestaffio, seja no que se refere ao esta- constitucional.
201. Cf., p. ex., Lesbaupin, 1984, investigando a falta de conseiéncia clara
195. Ahumo, 1980:305, 1985:70s.
dos "direitos humanos" nas classes populares.
196. Alinino, 1980:66-94.
202. Velho (1980:363) refere-se a um exemplo muito expressivo: a queixa
197. sentido contrario orienta-se o enfoque de Almino, 1985:77.
de 'int político quanto ao absurdo que seria o fato de o voto de sua lavadeira ter
I 98. Vítor°, 19111; l'aria, 1985.
o mesmo valor do seu.
199. Sobre a sitiunáo social do pais no período imediatamente pré-consti-
203. Fala-se, entáo, paradoxalmente, de cidadáo de priineira, segunda e
tuinte, v Jaguaribe et al., 1986; NEI>1)-111\11CAMP, 1986, 1988.
terceira classe (cf., por ex., Velho, 1962; WetTort, 1981:141-44, com base ein
200. Ott seja, tanto "liberdades negativas - quanto "liberdades positivas- Bendix, 1969:811s.)
(Passerin d"Filtréves, 1969:249 - 73), tanto dmáts /ibertés como droits créances 204. A respeito,
- -
Ferraz ir., I 990.

158 1 SO
tringe á "constitucionalidade do'Direito", mas antes á -juridicidade da fere-se a "culpa" para a sociedade desorganizada, "descarregando-se" de
Constituicao" 205 , ou seja, á normatividade do texto constitucional. A "responsabilidadc" o Estado ou o govcrno constitucional. No mínimo,
insuficiencia de auto-referencia elementar (Icgalidade) e reflexividade transfere-se a realizacáo da Constituicáo para um futuro remoto e incer-
(constitucionalidade) é condicionada e condiciona, por fim, a reflexáo to. Ao nivel da reficxáo jurídico-constitucional, essa sittracáo repercute
jurídico-conceitualmente inadequada do sistema constitucional 2Ó6 ; diante ideologicamente, guando se afirma que a constituicáo de 1988 é "a mais
da "realidade constitucional dejuridificante", náo é possível que se de- programática" entre todas as que tivemos e se atribui sua legitimidade á
senvolva urna dogmática jurídico-constitucional capaz de definir efici- promessa e esperanca de sua realizacáo no futuro: "a promessa de urna
entemente as "condigóes do juridicamente possível" e, pois, de atuar sa- sociedade socialmente justa, a esperanca de sua realizacáo" 209. Confun-
tisfatoriamente como "controle de consistencia" da prática decisória de-se, assim, a categoria dogmática das normas programáticas, realiza-
constitucional. Por tudo isso, o texto constitucional náo se concretiza co- veis dentro do respectivo contexto jurídico-social, com o cofrecito de
mo mecanismo de orientagáo e reorientagáo das expectativas normativas • constitucionalizacáo simbólica, indissociável da insuficiente concreti-
e, portanto, náo funciona como instituigáo jurídica de legitimagáo gene- zacáo normativa do texto constitucional.
ralizada do Estado (cf. item 3 deste Cap.). Mas a funcáo hipertroficamentc simbólica do texto constitucional
Nessas circunstáncias de "realidade constitucional dejuridificante", náo se refere apenas á retórica "legitimadora" dos governantes (cm sen-
náo parece adequado interpretar os mecanismos "náo-ofíciais" de solu- tido amplo). Também no discurso político dos críticos do sistema de
gáo de conflitos de interesse, principalmente aqueles que se desenvol- dominacáo, a invocacáo aos valores proclamados no texto constitucional
vem entre os subintegrados, como alternativas jurídico-pluralistas ao desempenha relevante papel simbólico. Por exemplo, a retórica político-
"legalismo"207 . Trata-se, em regra, de reagóes á falta de legalidade. Tam- social dos "direitos humanos", paradoxalmente, é tanto mais intensa
bém náo se pode aplicar, nessas condigóes, o modelo do pós-modernis- quanto menor o grau de concretiz.acáo normativa do texto constitucio-
mo jurídico208 , que, negando a unidade do Dimito como cadeia operacio- nal.
nalmente diferenciada, sustenta que o sistema jurídico se constrói plu- Á constitucionalizacáo simbólica, cmbora relevante no joto políti-
ralisticamente como emalhamento de comunicagóes, importando incer- co, náo se segue, principalmente na estrutura excludente da soriedade
teza e instabilidade construtivas (cf. item 1.3. deste Cap.). O problema brasileira, "lealdade das massas", que pressuporia um Estado de bern-
da "dejuridificagáo da realidade constitucional" implica, no caso brasi- estar eficiente (cf. Cap. II. 10.). Contraditoriamente, na medida cm que
leiro, a inseguranga destrutiva com relagáo á prática de solugáo de se ampliara extremamente a falta de concretizacáo normativa do docu-
conflitos e á orientagáo das expectativas normativas. mento constitucional e, simultancamente, o discurso constitucionalista
A falta de concretizagáo normativo-jurídica do texto constitucional do poder, intensifica-se o grau de desconfianca no Estado. A autoridade
está associada á sua f1.11100 simbólica. A identificagáo retórica do Esta- pública cai em descrédito. A inconsisténcia da "ordem constitucional"
do e do governo com o modelo democrático ocidental encontra respaldo desgasta o próprio discurso constitucionalista dos críticos do sistema de
no documento constitucional. Em face da realidade social discrepante, o dominacáo. Desmascarada a farsa constitucionalista, segue-se o cinismo
modelo constitucional é invocado pelos governantes como álibi: trans- das clites e a apatia do público. Tal situacáo pode levar á estagnacáo
política. É possível que, como reacáo, recorra-se ao "realismo constitu-
205. Luhmann, 1992: 111. cional" ou "idealismo objetivo", cm contraposicáo ao "idealismo utópi-
206. Náo se trata apenas do problema heterorreferencial da construcáo de co" existente°. Mas, como cnsinaram as experiéncias de "constitucio-
"conceitos jurídicos socialmente adequados" (Luhmann, 1974:49ss.), mas tam- nalismo instrumental" de 1937 e 1964, o recurso a essa semántica auto-
bém do problema auto-referencial de construcito de um modelo conceitual juri- ritaria náo implicará, seguramente, a "reconciliacáo do Estado com a
dicamente adequado (Neves 1992:20 ';.).
207. Cf. em sentido diverso Sousa Santos, 1988:25, 1977:89ss. 209. l'erraz Jr., 1989:58.
208. Ao qual aderiu Sousa Santos, 1987, para dar respaldo á sua concepcao 210. Cf. Vianna, 1939: esp. 7ss. e 303ss.; Reale, 1983:67; Torres, 1978:
de pluralismo jurídico. 160ss., utilizando a expressáo "política orgánica".

160 1 161
realidade nacional", mas, antes, a identifica/y/o excludente do sistema
jurídico estatal com as "ideologias" e interesses dos detentores eventuais
do poder. Nesse caso, seráo impostas "regras-do-siléncio" ditatoriais,
negando-se a possibilidade de críticas generalizadas ao sistema de
poder. típica da constitticionalizacáo simbólica. BIBLIOGRAFIA
É principalmente por isso que náo se eleve interpretar a constitucio-
nalizacjio simbólica como un) jogo de soma zero na luta política pela
ampliacáo ou rcstricáo da cidítdítia, equiparando-a ao "instrumentalis- AI,CI IOURRON, Carlos E. e 13ULYGIN, Eugenio (1974). Introducción a la
mo constitueional" 2 ". Epquanto nao estilo presentes "regras-do-silén- A fetodologla de los Ciencias Jurídicas e Sociales, Buenos Aires: Ed. As-
cio" democráticas nem ditatoriais. o contexto da constitucionalizacao trea.
simbólica proporciona o surgimento de movimentos e organizacócs so- ALEXY, Robert ( 1983). Theorie der Juristischen Argumentation: Die Theorie
ciais envolvidos críticamente lía realizado dos valores proclamados so- des rationalen Diskurses als Theorie der juristischen Begründung, Frank-
'eminente no texto constitucional c, portanto. integrados na luta política furt am Main: Suhrkamp.
pela ampliarlo da cidadania. Náo se pode excluir a possibilidade, po- ALEXY, Robert (1986). Theorie der Grundrechte, frankfurt am Main: Suhr-
rém, de que a realizacáo dos valores democráticos contidos no docu- kamp.
mento constitucional pressuponha um momento de rutura com a ordem ALMINO, Joáo (1980). Os Democratas autoruários: Liberdades individuais,
de poder estabclecido, com implicacées politicamente contrárias á de associaedo política e sindical na Constituinte de 1946, Sáo Paulo: Bra-
diferenciacáo e á identidade/autonomia do Dircito. siliense.
ALMINO, Joáo (1985). Era urna vez urna constituinte, Sáo Paulo: Brasiliense.
ALTI IUSSER, Louis (1976). "Ideologie et appareils idéologiquek d'Etat (Notes
pour une recherche)", in: ideen, Positions (1964 1975), Paris: Editions So-
-

ciales, pp. 67-125.


AMAIX), Gilberto (1917). As instituir es políticas e o meio social no 13razil,
Rio de Janeiro: Imprensa Nacional.
AMIM, Samir (1973). Le Développement Inégal. Essai sur les Fonnations
Sociales du Capitalisme Périphé ► ique, Paris: Minuit.
APEL, Karl - Otto (1988). "Das Apriori der Komunikationsgemeinschall und die
Grundlagen der Ethik", in: ¡dem, Transformation der Philosophie, vol. 2,
4. ed., Frankfurt am Main: Suhrkamp, pp. 358-435.
ARISTOTELES, (1951). Politica, ed. bilingüe, trad. esp. de Julian Marias e
Maria Araujo, Madrid: Instituto de Estudios Politicos.
ARISTOTELES (1968). Politik, trad. alemá org. por Nelly Tsouyopoulos e Er-
nesto Grassi, Reinbek bei Hamburg: Rowohlt.
ARNOLD, -Irliunnan W. (1935), 7he Symbols of Governn:ent, New Haven: Yale
University Press (5. impressao, 1948).
ARNOI,D, Thumian W. (1971). "El derecho como simbolismo", in: Vilhelm
9 Aubert (org.), Sociolología del Derecho, trad. esp. de J.V. Roberts, Cara-
cas: Tiempo Nuevo.
ATLAN, I lenri (1979). Entre le cristal el la I ► niée: Essai sur l'organisation du
J 211. 1.:in sentido diverso, cf. Loewenstein, 1956:224. vivan!, Paris: Senil.

t()2 11
AUBERT, Vilhelm (1967). "Einige soziale Funktionen der Gesetzgebung", Alternativo: zum Reck (Jahrbuch für Rechtssoziologie und Rechistheorie,
Ernst E. Hirsch e Manfred Rehbinder (orgs.), Studien und Materialien zur vol. 6), Opladen: Westdeutscher Verlag, pp. 83-98.
Rechtssoziologie - Beiheft (n. complementar) 11 da Kolner Zeitschrifi für 130131310, Norberto (1967). "Sur le príncipe de légitimite", in: Anna/es de Phi-
Soziologie und Sozialpsychologie, Küln/Opladen: Westdeutscher Verlag, losophie Politique 7 (Paris: Presses Universitaires de France), pp. 47-60.
pp. 284-309. 130131310, Norberto (1976). "Quale socialismo?", in: MallViSMO e lo Stato: 11
AUSTIN, J. L. (1968). "Performative und Konstatierende Áussening", Rü- dibattito aperto nella sinistra italiana sulle tesi di Norberto Bobbio
diger Bubner (org.), Sptuche und Analysis: Texte zur englischen Philosofie (Quaderni Alondoperario 4), Roma: Mondoperario, pp. 199-215. o
der Gegenwart, Güttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, pp. 140-153.
BAECKER, Dirk et aL (orgs.) (1987). Theorie als Passion: Niklas Luhmann
Trad. bras. (1979): "Qual Socialismo?", in: O Marxismo e o Estado, Rio de e
Janeiro: Graal, pp. 233-251.
zum 60. Geburtstag, Franlcfurt am Main: Suhrkamp. BOBBIO, Norberto (1977). Dalla struttura alía funzione: Nuovi .studi teoria
BARBOSA, Ruy (1932-1934). Comentários á Constituio5o Federal Brasileira, del diritto, Milano: Edizioni di Comunitá.
org.de Homero Pires, Sáo Paulo: Livraria Academica/Saraiva, 1933 (vols. II BOICKENFÓRDE, Ernst-Wolfgang (1983). "Geschichtliche Entwicklung und
e III), 1934 (vol. IV).
BARTHES, Roland (1964). "Éléments de sémiologie", Communications 4
Bedeutungswandel der Verfassung", in: Festschrift Jur Rudolf Gmür, Bie-
lefeld: Gieseking, pp. 7-19.
o
(Paris: Senil), pp. 91-135. BONAVIDES, Paulo (1972). Do Estado Liberal ao Estado Social, 3. ed., Rio
Trad. bras. (s.d.): Elementos de Semiologia, Sáo Paulo: Cultrix. de Janeiro: FGV.
BASTOS, Celso Ribeiro (1981). Curso de Direito Constitucional, 4 ed , Sáo
Paulo: Saraiva.
BONAVIDES, Paulo e ANDRADE, Paes de (1989). Historia Constitucional do o
BASTOS, Celso Ribeiro (1988). "Constitukáo", in: idem e Ives Gandra Mar-
Brasil, Brasília: [Senado Federal] / [Rio de Janeirol Paz e Terra.
BORDES, Jacqueline (1967). Politeia dans la pensée grecque jusquO Aristote,
o
tins, Comentários á Constitukdo do Brasil, Sáo Paulo: Saraiva. Paris: "Les Belles Lettres". o
BENDIX, Reinhard (1969). Nation-Building and Citizenship. Studies of our BORGES, José Souto Maior (1975). Lei complementar ttibutária, Sáo Paulo: o
changing social order, Garden City, New York: Anchor (1. ed.: 1964). Ed. Revista dos Tribunais/EDUC.
BERTALANFFY, Ludwig von (1957). "Allgemeine Systemtheorie: Wege zu BOURDIEU, Pierre (1974). A Economia das Trocas Simbólicas, introd., org. e
einer neuen mathesis universalis", in: Deutsche Universitotszeitung, n. 5/6 seleláo de Sergio Miceli, Sáo Paulo: Perspectiva.
(Bonn: Deutsche Universitátszeitung), pp. 8-12. BOURDIEU, Pierre e PASSERON, Jean Claude (1975). A Reproduqdo: Ele- o
BISCARETTI DI RUFFIA, Paolo (1973). Derecho Constitucional, trad. esp. de mentos para uma teoria do sistema de ensino, trad. bras. de R. Bairáo, Rio
Pablo Lucas Verdú, 1. ed., reimpr., Madrid: Technos. de Janeiro: Francisco Alves (original: La Reproduction, Paris, 1970).
BISCARETTI DI RUFFIA, Paolo (1974). Introduzione al Diritto Comparato, 3. BRYDE, Brun-Otto (1982). Verfassungsentwicklung: Stabilitat und Dynamik
ed., Miláo: Giuffré. - - im Verfassungsrecht der Bundesrepublik Deutschland, Baden-13aden: No- o
BII1ENCOURT, C. A. Lúcio (1968). O controle juri.sdicionál da constitucio-
nalidade das Leis, 2. ed., Rio de Janeiro: Forense.
mos. o
I3RYDE, Ilnin-Otto (1987). "Recht und Verwaltung nach der Unallangigkeit
BLANKE, Thomas (1987). "Kritik der systemfunktionalen Interpretation der - Entwicklungstendenzen", in: Hans I,. Illy e 13run-Otto Bryde (orgs.),
Demonstrationsfreiheit", Kritische Justiz 20 (Baden-I3aden: Nomos), Staat, Verwaltung wul Recht in Afrika 1960-1985, Dedal: Duncker & o
'pp. 157-165. Humblot, pp. 27-40.
BLANICENBURG, Erhard (1977). "Ober die Unwirksanikeit von Gesetzen", in: BUARQUE DE IIOLANDA. (1988). Raizes do Brasil, 20. ed., Rio de Janeiro:
Archiv für Rechts- und Sozialphilosophie 63 (Wiesbaden: Steiner), pp. 31- José Olympio (1! ed: 1936).
58. BÜHL, Walter L. (1989). "Grenzen der Autopoiesis", in: Kolner Zeitschnft fUr
BLANKENBURG, Erhard (1980). "Recht als gradualisiertes Konzept - Begri- Soziologie und Sozialpsychologie 39 (Opladen: Westdeutscher Verlag), pp. u
• ffsdimensionen der Diskussion tun Verrechtlichung und Entrechtlichung", 225-253.
in: idem, E. Klausa e H. Rottleutluier (orgs.), Alternative Rechtsformen und

164 165
13111,YGIN, Itigenio (1965). "Der 13egriff der Wirksinkeit", in: Enesto Garzón Queiroz, Silo Paulo: Mestre Jou (Original. •rs Essav on fan,
New I laven,
Valdés (org.), Lateinamerikanische Studien zur Rechtsphilosophie (Archiv Cannecticut, 1944).
für Recias- und Sozicdphilosophie, n. complementar 41 - n. 4 da aova sé- CASSIRER, Ernst (1988). Philosophie der svmholis•hen Foimen,
vol. 1,9. ed.,
rie), Neuwied am Rhein/Berlin: Luchterhand, pp. 39-58. Dannstadt: Wiss. 13uchges. (reimpressáo da 2.ed. de 1953).
BURDEAU, Georges (1962). "Zitr AuflÓsung des Verfassungsbegriffs", Der CASTORIADIS, Cornelitts (1982). A h►stituiedo imaginá ► ia da sociedade,
trad.
Sima 1 (13erlin: Duncker & Ilumblot), pp. 389404. bras. de G. Reynaud, Rio de Janeiro: Paz e 'Perra (original: L'Institucion
BUZAH), Alfredo (1958). Da aedo direta de declaraedo de inconstitucionali- imaginaire de la Societé, 1975).
dade no direito brasileiro, Silo Paulo: Saraiva. CI IFRESKY, Isidoro (1980). "Democracia y autoritarismo en los capitalismos
CALÓGERAS, J. Pandiá (1980). Fo► maedo histórica do Brasil, 8. ed., Silo dependientes. Bases para un proyecto de investigación -. Los casos de Ar-
Paulo: Ed. Nacional (1. ed.: 1930). gentina y Brasil", in: Revista Mexicana de Sociología,
vol. XLII, n. 3
CAMPOS, Francisco (1956). Direito Constitucional, vol. 1, Rio de Janeiro/Sao (México: 1JNAM), pp. 1071-1103.
Paulo: Freitas Bastos. CI IRISTENSEN, Ralph (1989). "Der Richter als Mund des sprechenden Tex-
CANOTIL110, J. J. (iones (1991). Direito Constitucional, 5. cd., Coimbra: Al- tes. Zur Kritik des gestezespositivistischen Textmodells -, in: Friedrich
medina. Midler (org.), 1989: 47-91 .
CAPELLA, Juan-Ramón (1968). El derecho como lenguaje: un catálisis lógico, C(X)LEY, Thomas M. (1988). The General Principies ql.
Constituticmal La IV in
Barcelona: Ariel. the t inited Sudes 91 ...Interim 3. cd., Boston: I.ittle, 13rown, and Company.
CARBONNIER, Jean (1976). Flexible Droit. Texte.s pour une Sociologie du COP1, Irving M. ( I 978). Introduedo á Lógica,
trad. bras. de Álvaro Cabral, 2.
Droit satis Rigueur, 3. ed., Paris: 1,ibrairie Genérale de Droit et de Juris- ed., Sao Paulo: Mestre Jou.
prudence. COSSIO. Carlos (1964). La teoría Egológi•a del Derecho y el Concepto Jurí-
CAR13ONNIER, Jean (1978). Sociologie juridique, Paris: Presses lJniversitai- dico de Libertad, 2. ed., Buenos Aires: Abeledo-Perrot.
res de France 1)1:RRIDA, Jacques (1967). De la Gmmmatologie, Paris: Miimit.
CARIX)S0, Fernando lienrique (1979). ()Modelo Político Brasileim e Outros DREIER, Rair (19811. "Zu Lultinanns syslemtheorelischer Neuffinnulierting des
Ensaios, 4. cd., Sáo Paulo/Rio de Janeiro: D1FEL. GerecIttigkeitsproblemes - , in: R. I heier, Recia A Ioml Ideologie:
CARIX)SO, ferrado Ilenrique (1985). "Dos Governos Militares a Prudente- Studien zur Rechistheorie,Frankfurt am Main: Sultrkamp, pp. 270-285.
Campos Sales", in: Boris Fausto (org.), Geral da ('ivilizaedo 1)1.111K I 11.:IM, Emite (1986). De la division t ► avail social, Paris: Presses
Brasileau,tomo 111, 1. vol., 4. cd., Sao Paulo: 1)11 ,11„ pp. 13-50. Ilniversiiiiires de France (1. cd.: Paris, 1893).
CARNAP, Rudolf (1948). ha•oduction lo Semantics, Camhridge, Mas- JVERGER, Maurice (org.) (1966). Constinitions et Documents Politiques,
sachusetts: 1 larvard University Press. Paris: PI1F.
CARNAP, Rudolf (1954). Einfüh ► ung in die symbolische Logik hesonderer DWORKIN, Ronald (1991). Taking Rights Seriou.sk (1977), 6. impr., London:
Berück.sichtigung ihrer Anwendungen, Viena: Springer-Verlag. Duckworth.
CARONE, Edgard (1969). A Primeira República (1889-1 9.30): Texto e Contex- ECO, Umberto ( 1984). Semiótica e Filosqlia del Linguaggio,
Finaudi.
to, Sao Paulo: DIFEL. Trad. bras. (1991): Semiótica e Filosqlia da Linguagem, Sao Paulo: Ática.
CARONE, Edgard (19711. A República U'elha (Evoluedo Politica), Sao Paulo: ECO, tJmberto (1991). *Duma° di Semiotica Genemle, 12. cd., Milano: 13om-
DIFEL. piani (1. ed.: 1975).
CARRE DE MA1,13ERG, R. (1922). Contribution á la Théorie générale de Trad. bras. ( 1980): Tratado Geral de Semiótica, Sao Paulo: Perspectiva.
lÉtat, vol. II, Paris: Sirey. EDELMAN, Murray (1967). The Symbohc Uses qf Politics, Urbana/Chicago/
CARR1Ó, Genaro R. (1986). Notas sobre derecho y lenguaje, 3. ed., Buenos Londres: Ilniversity Press.
Aires: Abeledo-Perrot. EDELMAN, Murray (1977). Political Language: Words That Succeed and Po-
CASSIRER, Ernst (1972). Antropologia Filosófica Fascia, sobre o nomen:: lides Thai Fall, New York/San Francisco/mildo:1: Academie Press.
Introdu•do a urea Filosafia da Cul► u ► Humana, trad. bras. de V. F. de
J

166 16 7
EDER, Klaus (1980). Die Entstehung oizanisierter Gesellschcifien: FERRAZ Jr., Tércio Sampaio (1988). Intmduedo ao e.studo do dimito --
Ein Beitrag ZII einer Theorie sozialer Evolution, Frankfurt am Main: Sula- técnica, decisdo, dominctec7o, Sáo Paulo: Atlas.

kamp. FERRAZ Jr., Tércio Sainpaio (1989). "Legitimidade na Constituiyáo de 1988",


EDER, Klaus (1986). "Prozedurale Rationalitát: Modeme Rechtsentwicklung in: idem et al., Constituiedo de 1988: legitimidade, vigéncia e eficácia, su-
jenseits von formaler Rationalisierung", in: Zeitschrift für Rechtssoziologie Paulo: Atlas, pp. 13-58.
premacia, Sá'o
7 (Opladen: Westdeutscher Verlag), pp. 1-30. FERRAZ Jr. Tércio Sampaio (1990). "Sobre a reedicáo de Medidas Provisó-
EHRLICH, Eugen (1967). Gnaidlegung der Soziologie des Rechts, 3. ed., Ber- rias", in: idem, Interpretaedo e Estudos da Constituildo de 1988, Sáo
lin: Duncker & Humblot (reimpressáo inalterada da 1. ed. de 1913). Paulo: Atlas, pp. 93-94. o
FERRY, Luc e RENAUT, Alain (1992). Philosophie politique 3 ---- Des dmits
ENGELS, Friedrich (1985). Nem, Eugen Dührings Untwalzung der Wissen-
de l'homme á l'idee républicaine, Paris: Presses Universitaires de France
schaft rAnti-Dühring"), in: K. Marx/I7. Engels, Ausgewithlte Werke, vol.
(1. ed.: 1985).
o
V >11. ed., Berlin: Dietz Verlag, pp. 5-356 (1. ed., 1877-78).
ENGELS, Frieárich (1986a). "Engels an Conrad Sclunidt in 13erlin" (carta de FIRTI-I, Raymond (1973). Symbols: Public and Private, almea, New York: Cor-
27/10/1890), K. Marx/I7. Engels, Ausgewállite Werke, vol. VI, 12. ed., nell University Press. o
Berlin: Dietz Verlag, pp. 558-566. FRANK, André Gunder (1969). Do subdesenvolvimento Capitalista, trad. port.
ENGEI,S, Friedrich (1986b). "Engels an Franz Mehring in I3erlin" (carta de de J.A. Mendonca da Cruz e M.Couto, Lisboa: EdicAes 70, s.d. 11969i.
14/07/1893), in: K. Marx/F. Engels, Ausgewáhlte Werke, vol. VI, 12. ed., FREUD, Sigmund (1969). Vorlestingen Zill* Eitifichning in die Psychoanalyse
Berlin: Dietz Verlag, pp. 595-600. (1916-17 1 915-17]), in: Freud Studienausgabe, vol. 1, Frank flirt am e
ENGELS, Friedrich (1988). "Die Lage Englands. II. Die englische Konstitu- Main: Fischer, pp. 33-445.
tion", iti: Karl Marx e Friedrich Engels, Werke, vol. 1, 15. ed., Berlin: Dietz Trad. bras. (sem data): Introduedo á Psicanálise, Rio de Janeiro: Editora
Verlag, pp. 569-592 (primeiro in: Vorwarts! n. 75, de 18/09/1844). Guanabara. o
EVERS, Hans-Dieter (1987). "Subsistenzproduktion, Markt und Staat. Der so- FREUD, Sigmund (1972). Die Traumdeutung (1900), Freuii-Studienausgabe,
genannte Bielefelder Verflechtungsansatz", in: Geographische Rundschau vol. II, Frankfurt am Main: Fischer.
FRIEDMAN, Lawrence M. (1972). "Einige Bemerkungen über eine allgemeine
39 (Braunschweig: Westermann), pp. 136-140.
FALCA() NETO, Joaquim de Arnida (1984). "instila Social e Justica Legal: Theorie des rechtsrelevanten Verhaltens", ir:: Manfred Rehbinder e Helintit
o
Confiaos de propriedade no Recife", in: ídem (org.), Coi:JIU° de direito de Schelsky (orgs.), Zur Effektivitát des 1?echts (Jahrbuch Recht.vsoziologie o
propriedade: invasóes urbanas, Rio de Janeiro: Forense.
2. ed.,
und Rechtstheorie, vol.111), Düsseldorf: 13ertelsmann, pp. 206-223. o
FAORO, Raymundo (1976). Machado de Assis: a pircimide e o trapézio, FRIEDRICH, Carl Joachim (1960). "Die Legitimitát in pGlitischer Perspek-
Sáo Paulo: Ed. Nacional/Seer. Cult. Ciéncia e Tecnol. Est. S.P. tive", in: Politishe Vierteljahresschrili 1 (Opladen: Westdeutscher Verlag),
FAORO, 'Raymundo (1981). ASsembléia Constituinte: a legitimidade recupe- pp. 119-132. o
rada, Sáo Paulo: 13rasiliense. GADAMER, Hans-Georg (1990). Wahrheit und Aletluxle: Grundzüge cúter o
FAORO, Raymundo (1984-1985). Os donos do poder: formaldo do patronato philosophischen Hemeneutik, 6. ed., Tübingen: Mota ( ed.: 1960).
GALTUNG, Johan (1972). "Eine stnikturelle Theorie des Imperialisintis", in:
o
político brasileiro, 6. ed., Porto Alegre: Globo, vol 1: 1984, vol. 2:1985 (1.
ed.:1958). Senghaas (org.), 1972: 29-104.
FARIA, José Eduardo (1985). A Crise Constitucional e a Restauracdo da Legi- GARCÍA-PELAYO, Manuel (1950). Derecho contitucional comparado, ma-
timidade, Porto Alegre: Fabris.
drid: Revista de Occidente. o
FARIA, José Eduardo (1988). Eficácia jurídica e violéncia simbólica: o direito GARRN, Ileino (1969). "Rechtswirksamkeit und faktische Rechtsgeltung. Ein
como instrumento de transformaedo social, Sáo Paulo: EDUSP. Beitrag zur Rechtssoziologie", in: Archiv fitr Recias- und Sozialphilosophie
FERRAZ Jr., Tércio Satnpaio (1980). Funedo social da dogmática jurídica, 55 (Wiesbaden: Steiner), pp. 161-181.
Sáo Paulo: Ed. Revista dos Tribunais. GEIGER, Theodor (1970). Vorstudien zu cúter Soziologie des Rechts, 2. ed.,
Nettwied/Berlin: 1,tichterhand.

169
168
GIIIGHANI, Alejandro (1952). De/ "confiar' juri.sdiccional de constitucio-
nalidad, !lucilos Aires: Depalina. HABERLE, Peter (19110a). Die Verfas.sung des Pluralismos: Studien zur Ver-
GI,ASYR IN, Viktor Wassiljewitsch et. al. (1982). 4/jektivitin der Rechisnor- Ja.s.sungsiheorie der affioien Gesellschaf Kánigsteinf l's.: Athenátim.
men. 71worie und Forschungsmethoden, trad. alma de Leon Nebenzahl e I IÁI3ERLE, Peter ( I 9g0b). "Die offene Gesellschaft der Verfltssungsinterpre-
Alfred Reissiter, Berlin: Staatsverlag der 1)1)11. ten: Beitrag zur pluralistischen ttnd `prozessualen' Verfassungsinter-
pretation", in: ickm, 1980a: 79-105 (primeiro in:JZ 1975, pp. 297-305).
(i1Z()ENENI)IJK, C.A. (19117). "Vom Auslander zum Mitbürger: I)ie symbolis-
HA13ERMAS, Jürgen (1969). Thechnik und Wissen.schaft als `Ideologie',
che tind faktische Bedeutung des Wahlrechts für auslándische Iinmigran-
ten", in: Zeitschrifi fiir AusláncleiTecht und Auslandetpolitik 1/1987 ata- Frankfurt am Main: Surkamp.
den-I Nomos), pp.21-25. Trad. bras. parcial in (1980): Walter 13enjamin et al., Textos Escolhidos,
GREIMAS, A. J. e COUR.FES, J. (s.d. Dicionário de Semiótica, trad. bras. de Sáo Paulo: Abril (Coleyáo Os Pensadores).
A. I.). et al., Sáo Cultrix (original: Semiotique: Dictionnaire I1ABERMAS, Jürgen (1971a). "Theorie der Gesellschaft oder Sozialthechno-
misonné de la théorie du langage, Paris, 1979). logie? Eine Auseinandersetzting mit Niklas Lultmann", in: J. 1 labermas e
GRE1MAS Algirdas Julien e LAN1)OWSKI. Eric (1981). "Análise Semiótica N. Ltthmann, Theorie der Gesellschaft oder Sozialthechnologie• Was
de tun 1)iscurso Jurídico: a I,ei Comercial sobre as Sociedades e os Grupos leiste( die Svsteinforschung?, Frank t'un ant Main: Stihrkamp, 142-290.
de Sociedades'', in: A J. GREIMAS, Semiótica e Ciéncias Sociais, trad. HABERMAS Jürgen (1971b). "Vorbereitende Bemerkungen zu einer Theorie
bras de A. Lorencini e S. Nitrini, Silo Paulo: Cultrix. der kommunikativen Kompetenz", in: J. I labennas e N. 1,,tihmann, Theorie
(111IMM. 1)ieter (1987a). "I'mtstelnings- der Gesellschaft oder SozialthechnOlogie Was lei.stet 'die Systenifor
Wirkungsbedingungen des intxler-
nen Konstitutionalisintis", schung?, Frankfun ain Main: Sulirkainp, pp. 101-14 I .
Akten des 26. Deutschen Rechtshistorikerta-
ges: Prankliirt am Main, 22. bis 26. September I9N6,
HABERMAS, Jürgen (1973). Legitimationsprobleme im Spatkapitalismu.s,
org. por Dieter Si-
mon, Frankfurt ain Main: Klostennann, pp. 45-76. Frankfurt am Main: Stilirkamp.
11A13ERMAS, Jürgen ( 97g). Theorie und Praxis: Sozialphilosophische Studi-
GR1MM, Dieter (1987b) "1)ie sozialgeschichtliche und verfassungsrechtliche
Entwicklung zum Sozialstaat", 1.11: idem, Recia raid Siaai der boixedidien en, Frankliirt ant Main: Sultrkainp.

Gesellschaft, Frankfurt itin Main: Stihrkamp, pp. 138-161. 11A13ERMAS, Jürgen (1982a). Zur Rekonstniktion des Ilistori.schen Materia-
GIIIMM,l)ieter (1989). "Verflissung", in: Staat.sleakon: l?echt lismos, 3. ed., Frankfurt am Main: Sultrkamp.
Wirtschafi - -
Gesellschaft. org . pela (iórres-(iesellschall, 7. ed., 5. vol (Freiburg/Ba- 11A13ERMAS, Jürgen (19g2b), Theorie de.s Kommunikativen Ilandelns, 2. ed.,
sel/Wien: Ilerder), colunas 633-643. Frankfurt a.M.: Sultrkamp., 2 vols.
GR1MM, 1)ieter (org.) (1990) Wachsoule Siaatsailfgahen I IA13ERMAS, Jürgen ( I 9g3). A lorrilbewu.ssisein und kommunikatives
sinkende Steue-
ningsf¿ihigkeit des 1?echts, com Frankfurt am Main: Surkamp.
a colaborayáo de Evelyn Ilagenah, Baden-
Iladen: NOmos. I IA13ERMAS, Jürgen (1986a) "Was heisst Universalpragmatik? ( 1976)", in:
idem, l'orstudien und Eixanzungen zur Theorie (les kommunikativen lían-
GIZIMMER, Klaus (1976). "Zur Dialektik von Staatsverfassung und Gesell-
schaflsordming", in. .-.1rchit, 1?eclos- und Sozialphilosophie 62 (Wies- delns, 2. ed., Frankfurt ant Main: Sultrkamp, 353-440.

baden: Steiner), pp. 1-26. I1A131:1(MAS, Jürgen (19g6b). "Wahrheitstheorien (1972)", in: idem,
dien und Erxanzungen zur Theorie de.s kommunikativen ed.,
(iUSFIE1,1), Joseph 1( (1967). "Moral Passage: The Symbolic Process in Public
Designations of Deviance-, in: Social Prohlems, vol. 15, 2 (Detroit, Mi- Franklitrt itin Main: Sulirkamp, pp. I 27-1g3.
chigan: Society for the Studv oí Social l'roblems), pp 173-188. HABERMAS, Jürgen ( I 9g7a) "Wie ist Legitimilát dttrch Legalitát móglich?",
OUSFIELD, Joseph R. (19116). Svmbolic Cnisade: Status Poldics and the in: Kritische Justiz 20 (Baden-I3aden: Nomos), pp.1-16.

American Ten:mance Alovement. 2. ed., llrbatta e Chicago: I Jniversity of I IABERMAS, Jürgen (19g7b). "11annalt Arendts13egrilr der Macht", in: Jürgen
Illinois Press (1 ed.: 1963). Habennits, Philosophisch-politische Profile, Frankffirt ant Main: Suhr-
(iONT1111t, Klaus ( 98g). Der. Sin,/ J'O- Angemesseahea: Anwendungsdiskurse katnp, pp.228-248.
in A foral und 1?eclit, Frani:Fun ¿un Main: Sultrkamp. Trad. bras. (1980): "0 Conceito de Poder de Hannalt Arendt", in: I laber-
mits„S'ociologi a , Nulo: Ática, pp. 100-118.

-) 17o
171
HABERMAS, Jürgen (1988a). Nachmetaphysisches Denken: Philosophische 110FSTADTER, Douglas R. (1986). Gadd, Escher, Bach: ein endioses gelloch-
Aufsatze, Frankfurt am Main: Suhrkamp. lenes Batid, trad. alemá de P. Wolff-Windegg e II. Feuersee com a cola-
HABERMAS, Jürgen (1988b). Der philosophische Diskurs der Modense, Frank- boragáo de W. Aléxi 8. cd., Stuttgart: Klett-Cotta.
,

furt am Main: Suhrkamp. HOLLERBACH, Alexander (1969). "Ideologie und Verfassung", Maihofer
HABERMAS, Jürgen (1992). Faktizitat und Geltung: Beitreige zur Diskursthe- (org.), 1969: 37-61.
orie des Rechts und des demokratischen Rechtsstaats, Frankfut am Main: HOLMES, Stephen (1988). "Gag roles or the politics of omission", in: Jon Els-
Suhrkamp. ter e Rune Slagstad (orgs.), Constitutionalism and democracy (Studies in
rationality and social chane), Cambridge: Cambridge University Press,

04 0 fr0 $0 0: 0 00 151111,
HAFERKAMP, Hans e SCHMID, Michael (orgs.) (1987). Sinn, Kommunika-
li011 und soziale Di„ ftrenzierung: Beitreige zu Luhmanns Theorie sozialer pp. 19-58.
Systeme, Frankfurt am Main: Suhrkamp. HOPKINS, Terence e WALLERSTEIN, Immanuel (1979). "Gmndzüge der Ent-
HART, H. L. A. (1973). "Self-Referring Laws", in: idem, Essays in Jurispru- wicklung des modernen Weltsystems", in: Senghaas (org.), 1979: 15 I -200.
dence -and Philosophy, Oxford: Clarendon Press, pp.170-178 (primeiro in: IIORKIIEIlvfER, Max e ADORNO, Theodor W.(1969). Dialetik der .1ufkleir-
Festsknft till Karl Olivecrona, Stockholm, 1964, pp. 307 316).
-
ung: Philosophische Fragmente (1947), Frankfurt am Main: Fischer.
HAYEK, F.A. (1983). Os Fundamentos da Liberdade, trad. bras. de A.M. Ca- Trad. bras. (1985): Dialética do Esclarecimento: Fragmentos Filosóficos,
povilla e J.I. Stelle, Brasília: UnB, SAo Paulo: VisAo (Original: The Consti- Rio de Janeiro: J. Zahar.
of Liberty, 1960). HUSSERL, Edmund (1982). Die Krisis der europáisclu.,i and
HEGEL, G. W. F. (1986). Grundlinien der Philosophie des Rechts oder Natur- die transzendentale Phanomenologie, org. por Elisabeth Stróker, 2. ed.,
recht und Staatswissenschqft im Grundrisse: Mit Hegels eigenhandigen Hamburg: Meiner.
Notizen und den mündlichen Zusátzen (Werke 7), Frankfurt am Main: JAGUARIBE, Hélio et al. (1986). Brasil, 2000 - para MI ►101,0 pacto social ,
Suhrkamp (1. ed.: Berlin, 1821). Rio de Janeiro: Paz e Terra.
HEGENBARTH, Rainer (1981). "Symbolische und instrumentelle Funktionen JEAMMAUD, Antoine (1983). "En torno al problema de la efectividad del de-
moderner Gesetze", in: Zeitschnft für Rechtspolitik 14 (München/Frank- recho", in: Contradogmáticas, vol. I, n2 2/3 (Santa Cruz do Sul: FISCS/
furt: Beck), pp. 202-204. ALMED), pp.50-77.
HEINTZ, Peter (1982). Die Weltgesellschaft im Spiegel V011 Ereignissen, Dies- JEAND'IlEUR, Bernd (1989). "Gemeinsame Probleme der Sprach- und Recias-
senhofen: Rtteggcr. wissenschall aus der Sida der Stmkturierenden Rechtslehre", in: Friedrich
FIELLER, Hermann (1934). Staatslehre, org. por Gerhart Niemeyer, Lciden: Müller (org.), 1989: 17-26.
Sijthoff. JELLINI.X, Georg (1976). Allgemeitze Siaatslehre, 3. ed., Kronbergírs.: Athe-
Trad. bras. (1968): Teoria do Estado, SAo Paulo: Mestre Jou. naum.
HESSE, Konrad (1980). Gruádzüge des Vetfassungsrechts der Bundesrepblik JUNG, C. G. (1991). Tipos Psicológicos, trad. bras. de L.M. Endlich Grill, Pe- O
trópolis: Editora Vozes.
Deutschland, 12. ed., Heildelberg/Karlsruhe: Müller. O
HESSE, Konrad (1984). "Die nonnative Kraft der Verfassting", in: idem, Aus- KALINOWSK1, Georges (1971). Introduzione alía logica giuridica, trad. ital.
gewahlte Schnften, org. por P. Haberle e A. Ilollerbach, Heidelberg: de Massimo Corsale, Mildo: Giuffré. O
Müller, pp. 3-18. KARGL, Walter (1991). "Gesellschaft ohne Subjekte oder Subjekle ohne Ge- o
HOFFMANN-RIEM, Wolfgang (1981). "Femsehlcontrolle als Ritual? - Über-
legungen zur staatlichen Kontrolle im amerikanischen Fernsehen", in: Ju-
sellschaft? Kritik der rechtssoziologischen Autopoiesc-Kritik", in: Zeit-
schrifi für Rechtssoziologie 12 (Opladen: Westdeutscher Verlag), pp. 120-
u
ristenzeitung 36/3 (Tübingen: Mohr), pp. 73-82. 141.
HOFFMAM-RIEM, Wolfgang (1985). "Deregulierung als Konsequenz des KASPRZIK, Brigitta (1985). "Ist die Rechtspositivismusdeoatte beeudbar? Zur u
Marktrundfunks - Vergleichende Analyse der Rundfunkrechtsentwick- Rechtstheorie Niklas Luhmanns", in: Rechtstheorie 16 (I3erlin: Duncker &
lung in den USA -", in: Archiv des áffentlichen Rechts (Tübingen: Mohr), Humblot), pp. 367-381.
pp.528-576.

172 173
KELSEN, I lans ( 1946). (;e► eral Theo ► v Law ami State, trad. ingl. de Anders KROGER, I lcrbcrt (1968). "Verfassung und Recht in Obersee", Ve ►fa.ssung
Wedberg, Cambridge-Massachusetts: i lavard University Press. und Recia in 1. ;hersee 1 (I lamhurg: 11(nburger Geselschali fl
► r Volkerrecht
KEI,SIS, I fans ( I 960). Reine Rechtsleh ► , 2. ed., Wien: Franz Deuticke und Auswürtige Politik), pp.3-29.
(reimpressiio inalterada - 1983). LACAN, Jacques (1966). Écrits, Paris: Senil.
Trad. port. ( 1974): Teoria Pura do nava°, 3. cd., Coimbra: Armajo
LACAN, Jacques ( 1978). "L'univcrs symbolique", in: Le Seminaire de Jacques
Amado.
Lacan, texto estabelecido por Jacques-Alain Miller, Iivro 11:
Le A foi dans la
Ilans (1966). Allge ► eine Staatslehre, I3ad Ilamburg v.d.
théorie de Preud et Sons la technique de la psychanalvse (1954-1955), Pa-
I lobeillerlin/arick: !chic!' (inalterada reimpressáo Ibtomecánica da I. ed. ris: Seuil, pp. 39-53.
de.1925). Trad. bras. (1985): - 0 universo simbólico", in: O Seminario,
livro 2, Rio
KEI,S1'N, I lans ( 1979). Allgemeine iheorie der Normen, org. por Kurt 1Zinglio- de Janeiro: Jorge ¡aliar, pp. 41-56.
fer e Robert Walter, Wien: Mainz. LACAN, Jacques (1979). "A Ordem Simbólica", in: O Seminario de Jacques
Trad. bras. (1986): Teoría (;eral das Normas, Porto Alegre: Fabris. Lacan, texto estabelecido por Jacques-Alain Miller, livro 1:
Os escritos
KELSEN, ! fans( 19140). Compendio de Teoria General del Estado, trad.esp. de técnicos de bread (1953-1954), versáo bras. de 13etty Milan, Rio de
Luis Recaséns Siches e Justino de Azcárate, 2. ed., México: Ed. Nacional. Janeiro: ¡aliar, pp. 251-265.
K1NDERMANN, larald (1988). "Symbolische Gesetzgehung", in: Dieter LACAN, Jacques ( 1988). O Seminário, texto estabelecido por Jacques-Alain
Grimm e Werner Maihotbr (orgs.), Gesetzgehungstheorie und Rechtspolitik Miller, livro 3: psicoses (1955-1956), versáo bras. de Aluísio Menezes,
(Jahrbuch 1ür RecIassoziologie und Rechtstheorie 13), Opladen: West-
2. ed., Rio de Janeiro: ¡aliar.
deutscher Verlag, pp.222-245.
I ,ADEUR, Karl-I leinz (1983)•Abwiigung" - ein nenes Rechtsparadigma?
K1NDERMANN, Ilarald (1989). "Alibigesetzgebung als symbolische Gesetz-
Von der Einheit der Rechtsordnung zur l'luralitat der Rechtsdiskursc", in:
gebung", Ritdiger Voigt (org.), Symhole der Politik, Politik der St'mho- •rchiv für Recias- und Sozialphilosophie 69 (Wiesbaden: Steincr), pp.
le, Opladen: I,eske + 13udrich, pp. 257-273. 463-483.
KISS, Gabor ( I 986). Gnmdzage raid Entwicklung der Luhmannschen System- LADEUR, Karl-1 leinz (1984). "Ahwagung" ein nenes Paradigma des Ver-
theorie, Stuttgart: Enke.
waltungsrechts: von der Einheit der Rechtsordnung zum Rechtspluralis-
KOCI 1, lans-Joachim (1977). "Einleitung: Ober juristisch-dogmatisches Ar- mus, Frankliirt am Main/New York: Campus.
gumentieren im Staatsrecht", in: icen (org.)„S'eminar "Die juristische 1.,A1)1"1/R, Karl-Ileinz (1985). "Perspektiven ciner post-modernen Rechtstheo-
A lerhode im Stamsrecht": Üher Grenze ► von rerlassungs- und Gesetzes- rie: Zur Auseinandersctzung mit N. Lulunanns Konzept der 'Einheit des
hindung, Frankfurt am Main: Suhrkamp, pp. 13-157. Reclassystems - , in: Reclustheorie 16 (13erlin: Duncker & I lumblot), pp.
KONIG, Klaus (1982): "Zur Evaluation der Gesetzgchung", in: Studien zu ciner 383-427.
neorie der Gesetzgehung, 13erlin/Ileidelberg/New York: Springer-Verlag, LADEUR, Karl-I leinz ( I 986). "'Prozedurale Rationalitár - Steigerung der
pp.306-3 15.
Legitimationstlihigkeit oder der Leistungsthhigkeit des Reclitssystems?",
KRAMI'14, 1"nist A. (1972). "Integniti ve und repressivc Wirksamkeit des Re-
in: Zeitschrilifia- Rechissoziologie 7, pp. 265-274.
clits", in: Manfred Rehhinder e I !clima Schelsky (orgs.), Zar Elfi?ktivitat
I ,ADE1JR, Karl-I leinz ( I 987). "Ein Vorschlag zur doginatischen Ñetikons-
des Ralas (Jahrbuck Rechtssoziologie und Rec ►► stheo ► ie, volume III),
tniktim des Grundrechts aus Art. 8 GG als Recht auf 'Ordnungsstonuig -,
Düsseldorf Ilertelsmann, pp. 247-257. in: Kritische Justiz 20 (13aden-13aden: Nomos), pp. 150-1 57.
KRAWII". 17„ Werner e WEI,KER Michael (orgs.) ( 1992). Kritik der Theorie LADEUR, Karl-I leinz ( 1990). "SelbStorganisation sozialer Systeme und Proze-
sozialer Systeme: Auseina ► dersetzunge ► mit Luhmanns Hauptwe ► k, 2. ed.,
duralisierung des Rechts: Von der Schranketrziehung zur Steuening von
Frank Run am Main: Suhrkamp. 13ezieli ungsnetzen", in: Dieter Grinun (org. ), 1990:
I 87-216.
KRVK ER, Ilerbert ( I 966). Allgemeine Staatsleh•e, 2! cd., StuttgartMerlitil 1,A1)EUR, Karl-I leinz (1 991) "Gesetzinterpretation, 'Richterrcclit' und Kon-
Kóln/Mainz: KobIliaminer Verlag.
ventionshildung in Kognitivistischcr Pcrspcktive - I landeln unter Unge-

174
175
wissheitsbedingungen und '-richterliches Entscheiden", in: Archiv Jim (Hamburg: Ilamburger Gesellschaft für Vülkerrecht und Auswartige Poli-

..CcL. c oo cco cC/ZO,P, 011 000 00 003 ,3z3z


Recias- und Sozialphilosophie 77 (Stuttgart: Steiner), pp. 176-194. tik), pp. 139-156.
LADEUR, Karl-I leinz (1992). Postniodenie Rechtstheorie, 13erlin: Duncker & 1,ENK, Kurt (org.) (1972). Ideologie. kleologiekritik und Wissenssoziologie, 6.
I Itunblot. ed., 1)annstadt/Nettwied: Luchterhand.
LAFER, Celso (1988). A Reconstruedo dos Direitos Humanos: Un, Diálogo LESBAUPIN, Ivo (1984). As Classes Populares e os Direitos llunlanos, Petr6-
com o Pensamento de Hannah Arendt, Sáo Paulo: Companhia das Letras. polis: Vozes.
LALANDE, André (org.X1992). Vocabulaire technique et critique de la Philo- LÉVI-STRAUSS, Claude (1958). Anthropologie Stnicturale, Paris: Plon.
sophie, vol.2, Paris: Quadrige/Presses Universitaires de France (edicáo Trad. bras. (1967): Antropologia Estrutural, Rio de Janeiro: Tempo 13rasi-
original, em fascículos, no Bullen,: de la Société franeaise de Philosophie, leiro.
1902-1923). LÉVI-STRAUSS, Claude (1974). "Introduláo á Obra de Marcel Mauss", in:
LAMOUNIER, Bolivar (1981). "Representacáo política: a importáncia de cenos. Marcel Mauss, Sociologia e Antropologia, vol. I, trad. bras. de L. Pucci-
formalismos", in: idem, Francisco G. Weffort e Maria Victoria Benevides nelli, Sáo Paulo: E. P. U./EDUSPE, pp. 1-36.
(org.), cidadania e participaedo, Sáo Paulo: T.A. Qtteiroz, pp. LOEWENSTEIN, Karl (1942). Brazil under Vargas, New York: Macmillan.
230-257. LOEWENSTEIN, Karl (1956). "Gedanken über den Wert von Verfassungen in
LAPLANCHE, J. e PONTALIS, J. B. (1985). Vocabulario de Psicanálise, sob a unserem revolutionáren Zeitalter", Arnold J. Zurcher (org.), Velfassun-
direcáo de D. I,agache, trad. port. de P. Tamen, 8. ed., Sáo Paulo: Martins gen nach dem zweiten Weltkrieg, trad. alemá de Ebba Vockrodt, Meisen-
Fontes (original: Vocabulaire de la Psychanalvse, Paris, 1967). heim am Glan: I lain, pp. 210-246.
LARENZ, Karl (1978). Aletodologia da Ciéncia do Direito, trad. port. de J. de LOEWENSTEIN, Karl (1975). Vedassungslehre, trad. alemá de Rtidiger I3oer-
S. e Brito e J. A. Veloso, Lisboa: Fundacáo Calouste Gulbenkian (original: ner, 3. ed., Tübingen: Molu-.
Metodenlehre der Rechtswissenschaft, 2. ediyáo, 1969). LUHMANN, Niklas (1962). "Wahrheit und Ideologie: Vorschlage zur Wieder-
LASSALLE, Fedinand (1987). "Ober Verfassungswesen", in: Reden und aufnahme der Diskussion", in: Der Staat 1 (Berlin: Duncker & Humblot),
Schnften, org. por Hans Jürgen Friederici, Küln: Róderberg, pp. 120-147. pp. 431-448.
Trad. bras. (1980): Que é uma Constituifflo?, Porto Alegre: Villa Martha. LUHMANN, Niklas (1965). Gnindrechte als Institution: Ein Beitrag zur poli-
LASSWELI„ Harold (1982). "A linguagem do Poder", in: idem !Org.], /I Lin- tischen Soziologie, Berlin: Duncker & Humblot.
guagem da Politica, trad. bras. de L. D. Vivacqua e Silva e S. de Castro LUHMANN, Niklas (1971). "Systemtheoretische Argumentationen: Eine Ent-
Neves, 2. ed., 13rasília: Ed. UNI3, pp. 7-20 (Original: The Language of gegnung auf Jürgen Habennas", in: J. I labennas e N. Luhmann, Theorie
Polifics, 1949). der Gesellschaft oder Sozialthechnologie - Was Leistet die System-
LEAI„ Aurelino (1915). História Constitucional do Brazil, Rio de janeiro: Im- forschung?, Frankfurt am Main: Suhrkamp, 291-405.
prensa Nacional. - LUHMANN, Niklas (1973a) Zweckbegriff uncl Systensrationalitat: Über die
LEFORT, Claude (1981). "Droits de l'homme et politique", in: idem, Linven- Funktion von Zwecken in sozialen Systemen, Frankfurt ttm Main: Suhrkamp.
non Démocratique: Les limites de la domination totalitaire, Paris: Fayard, LUI IMANN, Niklas (1973b). "Politische Verfassungen int Kontext des Gesell-
pp. 45-83. schaftssystems", in: Der Símil 12 (13erlin: Duncker & Iltunblot ), pp. 1-22 e
Trad. bras. (1987): "Direitos do homem e política", in: /I hivenqdo Demo- 165-182.
crática: Os Limites do Totalitarismo, 2. ed., Sáo Paulo: Brasiliense, pp. LUIIMANN, N iklas (1974). Rechtssystem und Rechtsclogmatik, Stuttgart: Kohl-
37-69. haminer.
LEMAIRE, Anika (1989). Jacques Lacan: unia inirodul.c7o, trad. bras. de D. LUIIMANN, Niklas ( I975a). "Einführende 13enterkungen ztt cúter Theorie
Checchinato, 4 ed., Rio de Janeiro: Campus (Original: Jacques Lacan, 10. symbolisch generalisierter Kommunikationsmedien", in: Soziologische
ed., Bruxelas, 1977). Auflkláning 2: Aufsatze zur Theorie der Gesellschaft, Opladen: Westdeut-
LENK, Klaus (1976). "Zur instrumentalen Funktion des Rechts bei gesell- scher Verlag, pp. 170-192.
schaftlichen Veránderungen", in: Vetfassung und Recia in Übersee 9

176 177
LUFIMANN, Niklas ( I975b). "Komplexitát", in: idem, Soziologische Auf- LUIIMANN, Niklas (1981k). "Gerechtigkeit in den Reehtssystemen der mo-
• klürung 2: Aufsütze zur Theorie der Gesellschaft, Opladen: Westdeutscher dernen Gesellschaft", in: idem, 1981a:374-418 (primeiro in: 1?echtstheorie
Verlag, pp. 204 20.
- 4 [19731,pp. 131-167).
LUHMANN, Niklas (1975c). "Die Weltgesellschaft", in: idem., Soziologische LUIIMANN, Niklas (19811).. "Rechtszwang und politische Gewalt", in: idem,
Auflkaning 2: Aufsütze zur Theorie der Gesellschaft, Opladen: Westdeut- . 1981 a: 154-172.
scher Verlag, pp. 51-71 (primeiro in: Archiv ftir Rechts- und LUIIMANN, Niklas (1982). Funktion der Religion, FranIcfurt am Main-
Sozialphilosophie 57 [1971], pp. 1 35). - . Suhrkamp.
LUIIMANN, Niklas (1980). Gesellschaftsstruktur und Semantik: Studien zur UHLMANN, Niklas (1983a). Legitimation durch Verfahren, Frankfurt am
Wissenssoziologie der modernen Gesellschaf I, vol. I, Frankfurt am Main: Main: Stilirktimp.
LIJIIMANN, Niklas (1983b). "Die Einheit des Rechtssvstems", in: Recht.sthe-
LUIIMANN, Niklas (1981a). Ausdiffinwnziening des l?echts, Frankfurt a. M.: orie 14 (13erlin: Dinicker & I Iumblot), pp. I 29-154.
Stilirkamp. LUILMANN, Niklas ( 1984a). "Reflexive Mechanismen", Soziologi-
LUI IMANN, Niklas (1981b). "Positivitát des Rechts Voraussetzung eincr sche Aufklarung I: AufseitzeZiff 7heorie sozialer S:vsteme, 5. ed., Opladen:
modernen Gesellschaft", in: idem, 1981a: 113-153 (primciro in: Jahrbuch Westdeutscher Verlag, pp. 92-112 (primeiro iirSoziale IVelt 17 11966], pp.
Pa- Rechtssoziologie und Rechtstheorie I [1970], pp. 175 202).
-
I -23).
LUFIMANN, Niklas (1981c). "Funktionale Methode und juristische Entschei- LUIIMANN, Niklas (1984b). Self-Reproduction of the Law and its 1,imi-
dung-, idcm, 1981a: 273-307 (primeiro in: Archiv des affentlichen Re- ts", in: Felippe Augusto de Miranda Rosa (org.), Dimito e Atudanea Soci-
cias 94 [1969], pp. 255-276). al, Rio de Janeiro: 0A13-RJ,.pp. 107-128.
LUFIMANN, Niklas (1981d). "Die Funktion des Rechts: Erwartungssicherung LUIIMANN, Niklas (1984c). "Positives Recht und ldeologie", in: idem, Sozio-
oder Verlialtensstuening", in: idem, 1981a: 73-91 (primeiro n. comple- logische Aufklaning : Aufsütze Theorie sozialer Systenw, 5. ed.,
mentar 8 des Archivs Rechts und Sozialphilosophie, Wiesbaden, 1974,
-
Opladen: Westdeutscher Verlag, pp. 178-203.
pp. 31-45). LIJIIMANN, Niklas (1985). "Einige Probleme mit 'rellexivem Recia-, in:
LUHMANN, Niklas (1981e). "Erleben und Handeln", in: hien:, Soziologische Zeitschrili Rechtssoziologie 6 (Opladen: Westdeutscher Verlag), pp. 1-
Aufklannig 3: Soziales System, Gesellschaft, Organisation, Opladen: I 8.
Westdcutscher Verlag, pp. 67-80. LUIIMANN, Niklas (1986a). "Okologische KommuniÁ-ation: Kann die modenw
LUHMANN, Niklas (1981f). "Schematismen der Interaktion", in: idem, Sozio- Gesellschaft sich auf ókologische Gefühnlungen einstellen?, Opladen:
logische Aufkkining 3: Soziales System, Gesellschaft, Organisation, Opla- Westdetitscher Verlag.
den: Westdeutscher Verlag, pp. 81-100. LUI1MANN, Niklas (1986b). "Die Codierung des Rechtssystems", in: 1?echts-
LUITMANN, Niklas (198Ig). "Machtkreislauf und Recht in Demokratien", in: theorie 17 (I3erlin: Duncker & Ilumblot), pp. 171-203.
Zeitschrift Rechtssoziologie 2 (Opladen: Westdeutscher Verlag), pp. LIIIIMANN, Niklas (1986c). Die soziologi.sche Beobachtung des Recias,
158-167. Frankftirt am Main: Metzner.
LU1IMANN, Niklas (1981h). "Selbstreflexion des Rechtssystems: Rechtstheo- 1,1.11.1MANN, Niklas (1987a). Soziak Sv.steme: Grundriss einer allgenteinen
ri e in gesellschaftstheoretischer Perspekti ve", in: idem, 198 I a: 419-450 Frankfurt ain Main: Sultrkamp.
(primeiro in: Rechtstheorie 10 [l 979J, pp. 159-185). Niklas (1987b). Rechtssonologie, 3 ed., Opladeir Westdeutscher
LUHMANN, Niklas (1981i). "Systemtheoretische Beitráge zur Rechtstheorie", Verlag.
in: idem. 1981a: 241 272 (primeiro in: Jahrbuch ftir Rechtssoziologie tind
-
LIIIIMANN, Niklas ( I 987c). "Autopoicsis als soziologischer Begrift", in: II.
Rechtstheorie 2[1972], pp. 255 276).
-
I laferkamp M. Schmid (orgs.), 1987. 307-324
LUIIMANN, Niklas (1981j). Politische Theorie in: WoMführtsstaat, Munique. LUI IMANN, Niklas (1987d) "Partizipation und Legitimation: Die Ideen und
Olzog die Frfahrungen", in: idem„VozioIogische Atifkleining 4: Delire*, zur

178 119
fimktionalen Differenzierung der Gesellschaft, Opladen: Westdeutscher in der moderno, tiesellsch(ult (.1ahrbuch .1 j'ir Rechtssozü,l(wie und
Verlag, pp. 152-16(1. vol. 1), 13ieleleld: Itertelsmann, pp. 11-36
Rechtstheorie,
LIJI IMANN, Niklas (1988a). Macht, 2. cd., Stuttgart: Enke. MARO NE, I lerbert (1967). Der eindimenviona/e A tenych: Studien Ideo-
o
LUHMANN, Niklas (1988b). "Positivitüt als Selbstbestimmtheit des Rechts", logie der lartges•h•ittenen bulustriegesellseha.11, trad. atenta de Alfred
in: Rechtstheorie 19 (Berlin: Duncker & I lumblot), pp. 11-27. Schmidt, Netiwied/13erlin: Luchterhand (Original: (hne-Dimettsiona/ Atar ► ,
LUHMANN, .Niklas (1989a). Wirtschaft und Recht: Probleme struktureller Boston, 1964).
Kopplung, Bielefeld (mimeo). MARSHALL, T. H. (1976). Class, Citizenship, and Social Developnient, West- e
LUH/vIANN, Niklas (1989b). "Le droit comme systéme social", in: Droit et port, Connecticut: Greenwood Press (Reimpressáo da ed. de New York,
Société, n. 11-12 (Paris/Vaucresson: L. G. D. J. /C.R.I.V.), pp. 53-66. 1964).
LUHMANN, Niklas (1990a) "Verfassung als evolutionüre Emingenschaft",
Rechtshitorisches Journal 9 (Frankfurt am Main: Lówcnklau), pp. 176-
MARX, Karl (1988). "Zur Judenfrage", in: Karl Marx e Friedrich Engels,
Werke, vol. I, 15. ed., Berlin: Dietz Verlag, pp. 347-377 (primeiro in:
o
220. Deutsch-FranzÓsische Jahrbücher, Paris, 1944). o
LUH/vIANN, Niklas (1990b). "Interesse und Interessenjurisprudenz im Span- MARX, Karl e ENGELS, Friedrich (1990). Die deutsche Ideologie. Kritik der e
nungsfeld von Gesetzgebung und Rechtsprechung", in: Zeitschrift fiar
Neuere Rechtsgeschichte 12 (Wien:Manz), pp. 1-13.
neuesten deutschen Philosophie in ihren Reprase ► nanten Feuerbach, B.
o
LUHMANN, Niklas (1990c). Paradigma lÓst: Über die ethische Reflexion der
Bauer und Stirner, und des deutschen Sozialismus in seinen versc•iMenen
Propheten (1845-1846), K. Marx e E. Engels, Werke, vol. 3, 9. cd.,
o
Moral: Rede ankisslich der Verleihung des Hegel-Preises 1989, incluida a Berlin: Dietz, pp. 9-530 ( I. ed.: Moscou, 1932). e
"Laudatio" de Robert Spaemann, Frankfurt am Main: Suhrkamp. MASSING, Otwin (1989). "Identitat als Mythopocm. Zur politischcn Symboli-
LUHMANN, Niklas (1990d). Die Wissenschaft der Gesellschaft, Frankfurt am
Main: Suhrkamp.
sierungsfunktion verfassugsgerichtlicher Spruch-weisheiten", in: Rüdiger
Voigt (org.), Politik der Symbole, Symbole der Politik, Opladen: 1,eske . 1- o
LUHMANN, Niklas (1991 a). "Der Gleichheitssatz als Fonn und als Nonn", in: Budrich, pp. 235-256. o
Archiv Jür Recluís- und Sozialphilosophie 77 (Stuttgart: Steiner), pp. 435- MATURANA, Humberto R. (1982). Erkennen: Die O ► ganisation und VerkÓr-
445.
LUHMANN, Niklas (1991b). "Steuerung durch Recht? Einige klarstelleade
penung ron Wirklichkeit. Ausgerváldte Arbeiten zur biologischen EpistentoL
logie, trad. alemá de Wolfgang K. Mick, 13ratinschweig/Wiesbaden: Vie-
o
Bemerkungen", in: Zeitschrift fttr Rechtssoziologie 12 (Opladen: West- weg. o
deutscher Verlag), pp. 142-146. MATURANA, Humberto R. e VARELA, Franscisco J. (1980). .-linopoiesis and o
LUHMANN, Niklas (1992). "Zur Einführung", in: Neves, 1992: 1-4. Cognition: The Realizalion of the Living, I>ordreclit: D. Reidel Publishing
LIJIIM.ANN, Nikkas (1993), Das Recluí der Gesellschaft, Frankfurt am Main: Company.
Suhrkamp. MATURANA, I lumberto R. e VARITA, Francisco J. (1987). Der Baum der o
LUIIMANN, Niklas e SCI IORR, Ilerhard ( 1988). Refierionsprobknw in: Er- Erkenninis, trad. aletná de Kurt Ludewig, 3. cd., 1 tern/Mtinschen/Wiett: o
ziehungs.system, Frankfurt am Main: Suhrkamp.
LYONS, John (1979). Introduedo á Linguistica Teórica, trad. bras. de R. V.
Scherz.
MAYIIEW, Leon 11. (1968). "Introduction: A Case
o
in Instlitilionaliza-
Mattos e Silva e II. Pimentel, Sáo Paulo: Ed. Nacional/EDUSP. tion", in: kkm,L.aw and Equal Opportunitv: A Study of the Massachusetts
MADDOX, Graham (1989). "Constitution", in: T. Ball, J. Fan- e R. I,. Hanson Commission Against Discrimfilation, Cambridge, Massachusetts: lIarvard
(ed.), Political Innovado ►: and Conceptual Change, Cambridge: Cam- University Press, pp. 1-31. 1)
bridge University. Press, pp. 50-67. •
MAIHOFER, Werner (org.) (1969). Ideologie und Reck, Franktitrt am Main:
MAYNTZ, Renate (1983). "Zur Einleitung: Probleme der •heoriebildung in (,)
der Implementationsforschung", in: ideen (org.), Implementation politischer
Klostermann. Programme Ansatze zur Theoriebildung, Opladen: Westdeutscher Ver-
4)
MAIHOFER, Werner (1970). "Die gesellschaftliche Funktion des Rechts", lag, pp. 7-24. u
R. Lautmann, W. Maihofer e II. Schelsky (orgs.), Die Funktion des Rechts
u
180 18 1
,
MAYNT1„ Remite (1988). "Berncksichligung vol) Implementationsproblemen MOLLER, Friedrich (1990a). Die Positivitát der Gnindrechte: Fragen einer
bei der Gesetzesentwicklung. /Aun Beitrag der Implementationslbschung
praktischen Gnmdrechtsdogmatik, 2. ed., Berlin: Duncker & Htnnblot.
zur Gesetzgebungstheorie", in: D. Grinun e W. Maihofer (orgs. Geseizge-
MÚLLER, Friedrich (1990b). Essais zur Theorie von Recht und Velfassung,
hungstheorie und Rechtspolitik Glahrhuch fiir Rechtssoziologie Und
org. por Ralph Christensen, Berlin: Duncker & Humblot.
Rechistheorie 13),
Opladen: Westdeutscher Verlag, pp. 130-150.
~ICH, Richard (1985). "Die sprachlose Systemtheorie. Systenadifferenzie-
MCII.WAIN, Charles lloward (1940). Constitucionalisin Anclen! and Modem,
rung und Integration durch Indifferenz", in: Zeitschnft fi1r Rechtssoziologie
Ithaca, New York• Cornet' Ilniversitv Press.
6 (Opladen: Westdeutscher Verlag), pp.19-28.
MECI IAM, J. 1.loyd ( I 959). "I.atin Americím Constitutions: Nominal and
NABUCO, Joaquim (1936). Um Estadista do Império: Nabuco de Araujo -
Real", in: The lozana! of Politics 21 (New York: AMS Press), pp. 258- sua vida, n'as opini5es, sua época, tomo II, Sáo Paulo/Rio de Janeiro: Ed.
275. Nacional/Civilízala° Brasileira.
José Luis de Anhaia (1968). Da separacáo de poderes á guarda da
NAGERA, Flumberto (org.) (1981). Conceitos Psicanalíticos Básicos da Teoria
Constituicao; as cortes constitucionais, Sáo Paulo: Revista dos Tribunais.
dos Sonhos, trad. bras. de A. Cabral, Sáo Paulo: Cultrix, 1981.
MEI.° Franco, Mons() Arillos de (1958-1960). ( 'limo de Dimito (.7onstitucional
NAHAMOWITZ, Peter (1985). - Rellexives Recht': Das unmógliche Ideal
Brasileiro, Rio de Janeiro: Forense, 1958 (vol. 1)- 1960 (vol. 2)
eines post-interventionistischen Steuerungskonzepts", in: Zeitschnft
MENDES, Gilmar Ferreira (1990). Contmle de Constitucionalidade: Aspectos
Rechtssoziologie 6 (Opladen: Westdeutscher Verlag), pp. 29 44.-
Jurídicos e Políticos, Sáo Paulo: Saraiva.
NAHAMOWITZ, Peter (1990). "Autopoietische Rechtstheorie: mit dem baldi-
MERTON, Robert K. (1968). Social l'Ileon' and Social Structure, New
gen Ableben ist zu rechnen - Kritische Anmerkungen zu: Gunther
York/1~(ton: The Free Press/ Collier-Macmillan (1. ed., 1949).
Teubner, Recht als autopoietisches System", in: Zeitschnft flir Rechts-
Michel (1980). /,"1.:tat du Dmit. Intmduction á une critique du droit
theorie 11 (Opladen: Westdeutscher Verlag), pp. 137-155.
Grenoble: Presse Universitaire de Grenoble/Franlois Mas-
con.stitutionnel,
NARR, Wolf-Dieter e OFFE, Claus (orgs.) (1975a). Wohlfahrisstaat und Mas-
pero. senloyalitát, Kóln: Kippenheuer & Witsch.
MICI IILES, Carlos, RAMA1,110, José Everaldo e MARTINS, Joáo Carlos F.
NARR, Wolf-Dieter e OFFE, Claus (1975b). "Einleitung", in: idem (orgs.),
"Patuleia, Democracia e Constituinte: Uma retlexáo sobre a contem- 1975a 9-46.
poraneidade de nossa Innníniiio sócio-politica na constituinte", in: Vánia
NEPP-UN1CAMP = Núcleo de Estudos em Políticas Públicas - Universidade
,oninnaco Bastos e Tánia Moreira da Costa (orgs.), Constituinte: Oue.st5es
Estadual de Campinas (1986). Brasil 1985: Relatório sobre a Situaqao
Polémicas (Caderno FACII1n13, ímo n. 2), 13rasília: Un13, pp. 17-27.
Social do País, vol. I, Campinas: UNICAMP.
miRANDA„Iorge (org.) ( 1980). Textos Históricos do Direito Constitucional,
NEPP-UNICAMP = Núcleo de Estudos em Políticas Públic,as - Universidade
Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda.
Estadual de Campinas (1988). Brasil 1986: Relatório sobre a Situaqdo
MON'VES01111.11 (1973). De / Esprit des Lois, vol. I, Paris: Garnier.
Social do País, Campinas: UN1CAMP.
MORRIS, Ch. W. (1938). "Foundation oí the Theory of Signs", in: hilen:caro-
NERSES1ANTS, Vladik (1982). "El derecho como factor del desarollo social",
na! Enctrlopeda Scioice, vol. I, Nr. 2, Chicago: Chicago Uni-
in: A fernoria del X Congreso Atm:dial Ordinario de Fllosofla de1 Derecho
versitv Press ( 12. impressáo, 1966). y Filosofía Social, vol. 9 (México: UNAM), pp. 175 178.
-
Friedrich ( 1975). Recht Spmche Elemente einer l'er-
NEVES, Marcelo (1988). Teoria da inconstitucionalidade das leis, Sao Paulo:
jássungstheorie 1, Berlin: Duncker &Ilumblot.
Saraiva.
MO ,1,1 Friedrich ( I 984 ). Strukturierende Rechtslehre, Ilerlin: Duncker &
NEVES, Marcelo (1990). "T. H. Marshalls `Citizenship and Social Class' und
Ilumblot.
die politische Entnicklung Brasiliens", comunica9ao apresentada ao semi-
MOLLEA, Friedrich (org.) (1989). Ditersuchungen zur Rechtslinguistik:
nário "Die soziologische Analysen von Gerechtigkeitsnormen", dirigido
terdisziplináre Studien Zii pmktisCher Semantik und strukturierender
pelo Prof. Claus Offe, no departamento de Sociologia da Universidade de •
1?echtslehre in Gnindfragen der juristischen Alethodik, I3erlin: Duncker &
Bremen, no semestre de invento de 1990-1991 (mimeo).
lumblot

111'2
1R1
l'ORCE, Charles S. (1955). Philo.sqli•al 1Vriting.s, sel. e cd. por .1. Inichler,
NEVES, Marcelo (1991). "A Crisé do Estado: Anotagóes a partir do Pensa-
New York: Dover.
mento Filosófico e Sociológico Alemao", in: Anais 16. Congress° dos Tri-
PEIRCE, Charles S. (1977). Semiótica, trad. bras. de J. T. Coelho Nctto, Sáo
bunais de Comas do Brasil (10 a 14 de Novembro de 1991), vol. 1, Recife:
Paulo: Perspectiva.
Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, pp. 157-172
PEIRCE, Charles S.(1985). "Über Zeichen", in: ideen, Die Festigung der Über-
NEVES, Marcelo (1992).. Verfassung und Positivitát des Rechts in der peri-
zeugung und andere Schnften, trad. alemá, org. por Elisabeth Walther,
pheren Moderare: Eine theoretische Betrachtung und eine Interpretation
Frankfurt am Main/Berlin/Viena: Ullstein, pp. 143-167. o
des Falls Brasilien, Berlin: Duncker & Humblot.
NOHLEN, Dieter e STURM, Roland (1982). "Über das Konzept der struktu-
PIAGET, Jean (1975). A formafflo do símbolo na crianea: i ► itafflo, jogo e„so- o
rellen Heterogenitat", in: Dieter Nohlen e Franz Nuscheler (orgs.), nho, imagem e representaet7o, trad. bras. de A. Cabral e C. M. Oiticica~ 2.
Handbuch der Dritten Welt, 2! ed., vol. I (Unterentwicklung asid ed., Rio de Janeiro/Brasília: Zahar/INL. •
PIMENTA BUENO, José Antonio (1857). Dimito Público Brom-kin) e •naly.se
Entwicklung: Theorien, Stnategien, Indikatoren), I lamburg: I Ioffinann und
da Constituiedo do Império, Rio de Janeiro: Villencuve.
Campe, pp. 92-116.
NOLL, Peter (1972). "Grande für die soziale Unwirksamkeit von Gesetzen",
PINTO FERREIRA, ILuizi (1962). Principios gerais do dimito constitucional
moderno, t. 1., 4. ed., Sao Paulo: Saraiva.
e
in: Manfred Rehbinder e Helmut Schelsky (org ), Zur Effektivittit des Re-
PINTO FERREIRA, [Luiz] (1975). Teoría (;eral do Estado, vol. 1, 3. cd., Sao
chts (Jahrbuch für Rechtssoziologie und Rechtstheorie, vol. III), Düssel-
Paulo: Saraiva. O
dorf: Bertelsmann, pp. 259-269.
NOLL, Peter (1981). "Symbolische Gesetzgebung", in: Zeitschnft für Schwei-
PONTES DE MIRANDA, [F. C.] (1932). Os fundamentos Actuaes do Direitt, e
Constitucional, Rio de Janeiro: Empresa de Publicagaes Technicas.
zerisches Recht (nova série) 100 (Basel: Helbing & Lichtenhahn), pp. 347-
PONTES DE MIRANDA, [F. C.] (1960). Comentários á Col:mit:liga° de 1946,
e
364.
t. 1, Rio de Janeiro: Borsoi. •
OFFE, Claus (1976). "Editorial", in: Murray Edelman, Politik als Ritual: die
symbolische Funktion staatlicher Institutionen und politischen Handelns, PONTES DE MIRANDA, [F. C.] (1970/1973). Comentarios á Constituiedu de
Frankfurt am Main/New York: Campus, pp. VII X. -
1967 con: a En:enda n. I de 1969, 2. ed., Sao Paulo: Revista dos Tribunais, o
OFFE, úlaus (1977). Strukturprobleme des Kapitalistischen Staates: Aufstitze
tomo 1:1970, tomo II(2.tiragem):1973.
PONTES DE MIRANDA, IF. C. (1972). Sistema de Ciéncia Positiva do Direi-
o
zur Politischen Soziologie, 4. ed., Frankfurt am Main: Suhrkamp.
ÓHLINGER, Theo (1975). Der Stufenbau der Rechtsordnung: Rechtstheoreti-
lo, torno I: ha•oduedo ü Ciéncia do Direito, 2. cd., Rio de Janeiro: 13orsoi, o
POULANTZAS, Nicos (1967). "A propos de la théorie marxiste du droit", in:
sche und ideologische Aspekte, Wien: Manz.
OLIVECRONA, Karl (1968). Lenguaje jurídico y realidad, trad. esp. de Ernes-
Archives de Philosophie du Droit 12 (Paris: Sirey), pp. 145 162.
-

POULANTZAS, Nicos (1978). L 'Etat, le Pouvoir, le Socialisme, Paris: PUF.


o
to Garzón Valdés, Buenos Aires: Centro Editor de America Latina.
Trad. bras. (1985): O Estado, o Poder, o Socialismo, 2. ed., Rio de Janeiro: o
OST, Frangois (1986). "Entre ordre et désordre: le jeu du droit. Discussion du
paradigme autopoiétique ata droit", in: Archives de Philosophie du Droit 31
Graal. o
PREUSS, Ulrich K. (1984). Politische Verantwortung und Bü ► gerlóvalitüt: Von
(Paris: Sirey), pp. 133-162.
den Grenzen der Verfa.ssung und des Gehorsams der Demokratie,
PACHECO, Claudio (1958). Tratado das Constituip3es Brasileiras, vol. I, Rio
de Janeiro/Sáo Paulo: Freitas Bastos. Frankfurt am Main: S. Fischer.
o
PARSONS, Talcott (1967). "Recht und soziale Kontrolle", in: Ernst E. Hirsch PREUSS, Ulrich K. (1989). "Perspektiven von Rcchtsstaat und Deniokratie", O
e Manfred Rehbinder (orgs.), Studien und A.faterialien zur Rechtssoziologie in: Kritische Justiz 22 (Baden-Baden: Nomos), pp. 1-12.
(n2 especial - Sonderheft - 11 da Ktilner Zeitschrifi für Soziologie und
QUIJANO, Anibal (1974). "Marginaler Pol der Wirtschaft und uiartinalisíerte
Arbeitskraft", in: Senghaas (org. ), 1974a: 298-34 1 .
o
Sozialpsychologie), Kóln/Opladen: Westdeutscher Verlag, pp. 121-134. O
RAWLS, John (1990). A Theorv of Justice (1972), Ox Ibrd: OxIbrd Ifitiversity
PASSERIN D'ENTRÉVES, Alexandre (1969). La Notion de l'État, vol. II, trad.
Press.
franc. de Jean R. Weiland, Paris: Sirey (original: The Notion of the State,
Oxford, 1967).
bras. (1981): lima l'eoria da Justio, Brasília: Unll. u
185
184 O
REALE, Miguel (1968). O direito como experiéncia (Introduly7o á epistemolo-
schali (Jahrbuch Rechtssoziologle und Rechtstheorie, vol. I), Bielefeld:
gia jurídica), Sao Paulo: Saraiva.
• Bertelsmanti, pp. 37-89.
REALE, Miguel (1983). "Momentos decisivos do constitucionalismo brasi-
leiro", in: Revista de hiformaedo Legislativa, ano 20, Nr. 77 (Brasília: Se- SCIIILD, Wolfgang (1986). "Funktionale und nicht-funktionale Bedeutting des
fiádo Federal), pp. 57-68. Gesctzes. Einige Anmerkungen zur GesetZgebüngslehre am I3eispiel des
inateriellen Strafrechts", in: limar l'anuncio e Erhard Mock (orgs.),
RITFER, Enist-Ilasso (1968). "Die Verfassungswirklichkeit - Eine Rechts-
Rechtstheorie und Ge.setzgehung: I.'esischrift fkr Robert Weimar, Frankfurt
'Odie?", in: Der Maco 7 (I3erlin: Duncker & I Iumblot), pp. 352-370.
arn Main: Sithrkamp, pp. 195-215.
ROI)RIGUES, José Carlos (1963). Constituifflo Política do Imperio do Brazil
SCIIINI)LER, I)ietrich (1967). Verfassungsrecht und soziale Stntktur, 4. ed.,
Rio de Janeiro: Lacmmert.
Zürich: Schulthess.
RONNEBI.:RGIR, Franz (19611). "Verlássungswirklichkeit als politisches Sys- SCHLI la ITER, Wol fgang (1979). Die Entivicklung des okzidentalen Rationa-
tem", in: Der Staat 7. (Berlin: Duncker & Humblot), pp. 409429.
lismus, Tübingen: Mohr.
ROgS, Alf (1959). On Law and Justice, Berkeley/Los Angeles: University of
SC I IMID'f-W1.11 ,FFEN, Wulf I). (1987). " 10 Jahre- entwicklungstheoretischer
California Press.
Diskussion: Ergebnisse und Perspektiven für die Geographie", in: Geo-
RO§S, Alf (1969). "On Self-Reference and a Puzzle in Constitutional Law", in:
graphische RundSc•hau 39 (13rattnschweig: Werstettnann), pp. 130-135.
78 (Oxford: 131ackwell), pp. 1-24.
SCI IMITT, Carl ( 1970). I 'erfiissungslehre, 5. ed., I3erliti: Duncker & Ilumblot
MISS, Alf (1971). Lógic•a de las notmas, trad. esp. de José !fierro, Madrid:
Technos. (reimpressao inalterada da 1. ed., publicada cm 1928). Trad. esp. (1970):
Teoria ia ( 'imstiiiición, México: Editora Nacional.
RdITLEUTI INER, Iltibert (19111 ). Rechtstheorie und Rechissoziologie, Frei-
SCIIREIIIER, Rupert (1962 ). Logik des Rechts, Berlin/Gottingetill leidelberg:
burg/Mtinchen: Alber.
Springer-Verlag.
ROUSSEAU, Jean-Jacques (1975). "Di' contrat Social", in: idem, Du Control
SEARLE, John (1973). "Linguistik und Sprachphilosophie", in: Renate 13artsch
Soc•ial et atares Oeuvres politiques, Paris: Garnicr, pp. 235-336.
e Theo Vennemann (org.) Liguistik IIIId Nachbarwissenschalien, Kronberg/
RUF3INSTEIN, David (1988). "The concept oí justice in sociology", in: Theory
- Scriptor, pp. 113-125.
' and Society 17 (1Dordrecht:1 Kluver Academie Publishers), pp. 527-550.
SENGIIAAS, Dieter (org.) (1972). Imperialisnms und stnikturelle Gewalt:
RUSSEI„ Bertrand ( 1968). Logic and Knowledge - Essays, 19014950, Lon-
Analvsett ither ahhangige Reproduktion, Frankfurt atn Main: Sulirkamp. •
-' don/New York: Allem & Unwin/Macmillan ( I. ed.: 1956).
SENGI IAAS, Dieter (org.) (1974a). Peripherer Kapitalistnu.s: Analyse?: alter
RYFFEI„ Hans (1972). "13edingende Faktoren der Effektivitat des Rechts", in:
•Abhangigkeit- tutti Unterentwicklung, Frankfurt ain Main: Sithrkainp.
Manfred Relibinder e Ilelinut Schelsky (orgs.), ZUr Effektivitát des Rechts
SENGIIAAS, Dieter (1974b). "Elemente einer-Theorie des peripheren- Kapita-
Vahrbuch Rechtssoziologie und Rechtstheorie, vol. III), Düsseldorf:
lismus (Vonwrt)", in: idem (org. ), I 974a:7-36.
13ertelsinatin, pp. 225-246.
SENGIIAAS, Dieter (org.) (1979). KapitalistiSc•he Weltókonomie: Kontroverse
RYFFEI„ Hans (1974). Rec•hissoziologie. Eine systematische Orientieruttg,
iiher ihren Ursprung und ihre Entwicklungsdynantik, Frankfurt ani Main:
Nettwied/13erlin: Luchterhand.
Sithrktimp:
SÁCIIICA, Luis Carlos (1980). El control de Constitucionalidad y sus Meca-
SILVA, José Alimso da (1982). Aplicahilidade das normas con.stimeionais, 2.
nismos, 2. ed.,13ogotá: Temis.
ed., Sao Paulo: Ed. Revista dos Tribunais.
SAUSSURE, Ferdinand de (1922). COUrS de linguistique générale, Paris:
SKINNER, Quentin (1989). "Language and political change",- in: T. 13all, J. Farr
Payot.
e R. L. I lansón (ed.), Political Innovation and conceptual Change, Catn-
Trad. bras. (s.d.): Curso de Lingüística Geral, 12. cd., Sao Paulo: Cultrix.
biidge: Cambridge University Press, pp. 6-23.
SCIIEI,SKY, Ilelintit ( 1970). "Systemfunktionaler, anthropologischer und per-
SIVfEND, Rudolf (1968). "Verfassung und Verfassungsrecht" (1928), in: idem, •
sonfunktionaler AnsatZ der Rechtssoziologie", in: R. Lautmann, W. Maiho-
Staalrechtlic•he Ahhandlungen und andere ilqrsátze, 2. ed., I3erlitt: Dunk-
rex e I I. Schelsky (orgs.), Die Einsktimi de.s Rechts in der nnxIernen Gesell-
ker & I lumblot, pp. 119-276.
SUNKEL, Osvaldo (1972). "Transnationale kapitalistische integration und na-
SOUSA, Joaquim Rodrigues de (1867). Analyse e Co ► mentário da Constitui-
930 PolltiCa dó Império do &rail ou Theoria e Practica do Governo
tionale Desintegration: Der Fall Latcinamerika", in: Senghaas (org.), 1972:
'Constitucional Brazileiro, vol.1, Sáo Luiz: 13. de Mattos.
258-315.
SOUSA SANTOS, Boaventura de (1977). "The Law of the Óppressed: The TEUBNER, Gunther (1982). "Reflexivas Recht: Entwicklungsmodelle des Re-
Construction and Reproduction of Legality in Pasargada", in: Law & Society chts in vergleichender Perspcktive", in: Archiv .fiír Rechts uno' Sozialphi-
-

Review 12• (Deliver, Colorado: Law and Society Association), pp. 5-126.
losophie 68 (Wiesbaden: Steiner), pp. 13-59. e
TEUBNER, Gunther (1987a). "Hyperzyklus in Recht und Organisation. Zum
SOUSA SANTOS, Boaventura de (1980). "Notas sobre a História Jurídico-So-
Verhaltnis von Selbstbeobachtung, Selbstkonstitution und Autopoiese",
e
cial de Pasárgada", in: Cláudio Santo e Joaquim Falcáo (orgs.), Sociología
e Direito: Leituras Básicas de Sociología Jurídica, Sáo Paulo: Pioneira,
H. I laferkamp e M. Schmid, (orgs.)1987: 89-128. e
TEUI3NER, Gunther (1987b). "Episodenverknüpfung. Zur Steigerung von
pp. 109417.
SOUSA SANTOS, Boaventura (1987) "Law: A Map of Misreading. Toward a Selbstreferenz im Recht", in: 13aecker el al (orgs.), 1987: 423-446.
Postmodern Conception of Law", in: Journal of Law and Society 14 TEIJBNER, Gunther (1988). "Gesellschallsordnung durch Gesetzgebungslárm?
(Oxford: Robertson), pp. 279-302. Autopoietische Geschlossenheit als Prohlem für die Rechtssetzung", in: D. O
SOUSA SANTOS, Boaventura de (1988). O discurso e o poder: ensaio sobre a Grimm e W. Maihofer (orgs.), Gesetzgebungstheorie und Rec ► tspolitik
sociología da retórica jurídica, Porto Alegre: Fabris (primeiro in: Boletim (Jahrbuch für Rechtssoziologie und Rechtst ► eorie 13), Opladen: Westdeut- o
da Faculdade de Direito de Coimbra, 1980). scher Verlag, pp. 45-64.
SOUTO, Cláudio (1978). Teoria Sociológica do Direito e Prática Forense, TEUBNER, Gunther (1989). Recht als autopoietisches SYste ► , Frankfurt ain•
Porto Alegre: Fabris.
Main: Suhrkamp. e
• SOUTO, .Cláudio (1984). Allgemeinste wissenschaftliche Gna ►dlagen des So-
TEUBNER, Gunter e WILLKE, Helmut (1984). "Kontext und Autonomic: Ge- O
sellschatiliche Selbststeuerung durch reflexives Recht", in: Zeitschrift für
zialen, Wiesbaden: Steiner.
Rechtssoziologie 6 (Opladen: Wcstdeutschcr Verlag), pp. 4-35.
o
SOUTO, Cláudio (1992). Ciéncia e Ética no Direito: uma alternativa de mo- O
TIMASI IEFF (TIMACI IEFF), N.S (1936): "Le droit, l'éthique, le pouvoir : Es 7,.
dernidade, Porto Alegre: Fabris.
sai d'une théorie sociologique du droit", in; Archives de Philosophie du
SOUTO, Cláudio e SOUTO, Solange (1981). Sociología do Direito, Rio de Ja-
droit et de Sociologie Juridique, n. I -2 (Paris: Sirey), pp. 131-165.
neini/Sáo Paulo: Livros Técnicos e Científicos Editora/Editora da Univer-
sidade de Sáo Paulo. TIMASHEFF (TIMACHEFF), N.S. ( 1937-1938): "W11;.it is 'Nociology of
SOUTO, Cláudio e SOUTO, Teresa (1991). "Crime como Vingano, Ministério law"?", in: The A ► erican Journal of Sociology 43, .Julio 1937 - Maio
Público e Ciéncia Social do Direito", Recife (mimeo). 1938 (Chicago, Illinois: The University of Chicago Press), pp. 225-235. O
STERN, Klaus (1984 ).-DasStqatsrecht der Bundesrepublik, vol. I, 2. ed., Miin- TOPITSCH, Ernst (1959). "Ideologie", in: Staatslexikon: Recht Wirtschaft
Gesellsc ► aft, org. pela Górres-Gesellschaft, 6. ed., 4. vol. (Freihurg: He-
chén: ‘Beck.
STOURZH, Gerald (1975 ou 1989). "Vom aristotelischen zuin liberalen Ver- der), colunas 193-201.
fassüngsbegriff. Zur Entwicklung in Nordamerika im 17. und 18. Jahrhun- TORRES, Alberto (1978). A o ► yanizacelo nacional: Primeira parle, A Constituí-
caó, 3. ed., Silo Paulo: Ed. Nacional (1. ed.: 1914).
den", in: F. Engel-Janosi, G. Klingenstein e H. Lutz (orgs.), Fürst, Bü ►zer,
TORRES, Joáo Camilo de Oliveira (1957). A Democracia ('ornada (Teoria
Mensch: Uittersuchungen zu politischen und soziokulturellen Wa ► dlungs-
Política do I ►pério do Brasil), Rio de Janeiro: José Olympio.
München: R. Oldenbourg, 1975,
prozessen ini vorrevolutionaren Europa,
TORRES, Joáo Camilo de Oliveira (1962). O Presidencialismo no Brasil, Rio ti
pp. 97-122. Posteriormente, com pequenas alterayÓes: "Volt] aristoteli-
schen zum liberalen Verfassungsbegriff. Staatsfonnenlehre und Fundamen- de Janeiro: O Cruzeiro u
talgesetze in England und Nordamerika im 17. und 18. Jahrhundert", in: TREVES, Renato (1978). Introducción a la Sociología del Derecho, trad. esp.
de Manuel Atienza, Madrid: Taunis.
u
Gerald Stourzh, Wege zur Grunclrechisden:okratie: &tullen zur Begriffs- u
und Institutionengesc ► ichte des liberalen Vetfassungsstaates, Wien/Kóln:
Mil" 1989: 1-35.
u
u
189,
188
VAREI Fransciso ( I 9113). "I ;auto-organi sation: de l'apparence au méca- WALTER,' Robert (1975). Resenha sobre o livro defriedriCh Müller "Juris-
nistne", in: Paul Durnottchel e Jean-Pierre Duptty, Lauto-organisa tion: De tische /viethodik", in: Juristische Blatter 97 (WieniNew York: Springer-
la physique politique, Paris: Settil, pp. 147-162. Verlag), pp. 443-44.
VELI10, Gilberto (1980). "Violéncia e Cidadania", in: dados Revista de WÁRÁT, Luis Alberto (1972). Semiótica y derecho, Buenos Áires: Eikón.
éticias Sociais, vol. 23, n. 3 (Rio de Janeiro: EUPERJ/Camptis), pp. 361- WARAT, Luis Alberto (1979). Mitos e teorias na interpretaqulo da Port
364. Alegre Síntese.
'VERNENGO, IZoberto José (1976). Curso de ieoria general del derecho, 2. cd., WARAT, Luis Alberto (1984). O direito e sug lingyagem, com a colaboracho de
13ttenos Aires: Cooperadora de Derecho y Ciencias Sociales. .
L.S. Rocha e G.G. Cittadino, Porto Alegre: Fabril.
VIANNA, Oliveira (1939). O hlealismo da Constituiedo, 2. ed., Pattlo/Rio WEI3ER, Max (1968a). "Idealtypus, I landlungsstruktur und Verhaltensinterpre-
-de janeiro/Recife/Porto Alegre: Nacional. tation (Auszüger, in: idem, Methodologische Schrifien, org. por Johannes
VIEI IWEG, Theodor ( I 974). Topik und Jurisprudenz, ed., München: I3eck. Witickelinann', Frankfurt ain Main: Fischer, pp. '65-167.
Trad. bras. (1979): Tópica e Jurisprudéncia, 13rasília: Departatnento de WEBER, Max (1968b). drei reinen Typen der legitimen Ilerrschatr, in:
Imprensa Nacional. idem, A foliodologische Schnfien,,org. por Johannes Winckelmann, Frank-
'VILANOVA, Lourival (1953). ()Problema do Objeta da Teoria Geral do E:ma-
furt am Main: Fischer, pp. 215-28 (prirneíro-iw,freussische Jahrbücher,
i:do, Recife: Tese para a cátedra de Teoria Geral do Estado (Faculdade de Vol. 187, 1922).
Direito da Universidade do Recife).
WEBER,
, Max (1973). "Die 'Objektivitüt' sozialwissenschaftlicher und sozial-
VTLANOVA, Lourival (1977). As Estnitum.s Lógicas e o Sistenia do Direito politischer Erkenntnis", in: idem, Gesammellte Aufsatze zur Wissenschafts-
Posit ivo, Sfio Paule R. T./ED11C.
lehre, 4. ed., org. por Johannes Winckelmann,, Tübingen: Mohr, 146-
VILLEGAS, Mauricio García (1991 ).-La Constitución e su Eficacia Simbó- 214 (primeiro in: Archiv Jur Sozialwissenschaft und Sozialpolitik, 19. vol.,
liCa", in: 1?evista Universidad de Antioquict, voi. 1,X, n. 225 (Medellín:
1 lniversidad de Antioquia), pp. 4-21. WEI3119,111)41ax (1985). Vrtschaft und Gesellschaft: Grundriss der verstehenden
VISSER'T 1100FT, 11. Ph. (1974). "La philosophie du langage otdinaire et le Soziologie, 5. ed., org. por Job:mies Winckelmann, Tübingen: Motu-.
'':droit", in: Archives de Philosophie du Droit 1(1 (Paris: Sirey), pp. 19-23. 1
WEFFóRT, Francisco Corréa (1981 y "A cidadania dos trabalhadores", in: Bo-
VOIGT, Rüdiger (1980). "VerreChtlichting in Stain GesellSchar, in: idem livar Lamounier, Francisco C. Weffort e Maria Victoria Benevides (orgs.),
" (Org.), I "errechtlichung: Analysen Funktion und Wirkung V011 Parlamen- Direito, cidadania e participaetio, Sáo Paulo: T. A. Queiroz,,pp. 139-150.
;-talisiening, Büroktatisierung und Justizialisiening sozialer, politischer WERLE, Raymund (1982). "Aspekte dcr Verrechtiichung", in: 'Zeit.schnfi flir
und ókonomischer Proze.sse, Kóingstein: Athentium, pp. 15-37. • Rechts.soziologie 3 (Opladen.: Westdeutscher Verlag), pp. 2-13.
VOIGT, Rtidiger (1983). "Gegentendenzen zur Verrechtlichung: Verrechtli- WIMMER, Rainer (1989). "Bernerkungen zum Éxposé von Christenscn/Je-
chung und Entrechtlichung im Kontext der Diskussion urn den Wohlfahrts- and'Heur", in: Friedrich Midler (org.), 1989: 13716.
staat", in: idem (org.), Gegenteiuknzen zur l'errechilichung (Jahrbuch fitt- WINCKELIvIANN, Johannes (I 952): Legitintiteit und Legalitat in Mar Weben
Rechtssoziologie und Reclitstheorie 9), Opladen: Westdeutscher Verlag,
Herrschafissoziologie, Tübingen: Moly.
pp. I 7-4 I . WITTGENSTE1N, Ludwig (1960). "Philosophische Untersuchungen' , in: idem,
VOIGT, Riidiger (1989). "Mythen, Ritttale und Symbole in der Politik", in: hrifien 1, Frani:flirt am Main: Suhrkamp, pO. 179-544.
idem (org.), SYmbole der Politik, Politik der Symbok, Opladen: Leske + Trad. bras. (1979): Inve.stigaeaes Filosóficas, 2. ed., &lo Paulo: Abril
I3udrich, pp. 9-3T Cultural (Os pensadores).
VON WR1GI IT, Georg I lenrik ( I 970). Norma y Acción: una inve.stigación ló- WITTGENSTEIN, Ludwig (1963). Tractatus iogico-philosophicus, Frankfurt
gica, trad. esp. de P.G. Ferrero, Madrid: Technos. am Main: Sulirkamp (primeiro in: Annalen der Naturphilosophie, 1921).
WALLERSTE1N, Immanuel ( 1979). -Aufstieg und Künftiger Niedergang des ZOLO, Dando (1986). "Autopoiesis: Un paradigma conservatore", in: Micro
kapitalistischen Weltsystems", in: Sengliaas (org.), 1979: 31-67. Mega 1/86 (Roma: Periodici Culturale), pp. 129-173.

90'1
)

Você também pode gostar