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INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO

ISCED – HUÍLA
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

SECÇÃO DE HISTÓRIA

TÍTULO: A INFLUÊNCIA DO MULTICULTURALISMO NO


CONTEXTO ESCOLAR. UM ESTUDO EXPLORATÓRIO NO
LICEU Nº 1068 DA MATALA

CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO-HISTÓRICO


DO MUNICÍPIO DA MATALA

Autor: Matias Chicomba Cassamba

Matala

2019
INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO
ISCED – HUÍLA
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

SECÇÃO DE HISTÓRIA

TÍTULO: A INFLUÊNCIA DO MULTICULTURALISMO NO


CONTEXTO ESCOLAR. UM ESTUDO EXPLORATÓRIO NO
LICEU Nº 1068 DA MATALA

CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO-HISTÓRICO


DO MUNICÍPIO DA MATALA

Autor: Matias Chicomba Cassamba

Orientador: MsC. Hélder Rodrigues Maiunga

Matala

2019
Índice
CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO-HISTÓRICO DO MUNICÍPIO
DA MATALA..........................................................................................................................1
1.1. Dados Geográficos da Região..............................................................................1
1.1.1. Clima.......................................................................................................................1
1.1.2. Flora.............................................................................................................................2
1.1.2.2. Fauna.......................................................................................................................3
1.1.3. Recursos Hídricos...............................................................................................4
1.2. Origem do Nome e do Município da Matala......................................................4
1.2. Principais Actividades............................................................................................5
1.2.1. A Criação de Gado..............................................................................................5
1.3.2. A Agricultura.............................................................................................................6
1.3.3. O Artesanato..............................................................................................................7
1.3.4. A Caça.........................................................................................................................7
1.3.5. A Pesca.......................................................................................................................7
1.3. Organização Sócio-Política...................................................................................7
1.4. População..................................................................................................................9
1.5. Cultura........................................................................................................................9
1.6. Religião....................................................................................................................10
CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO-HISTÓRICO DO
MUNICÍPIO DA MATALA

1.1. Dados Geográficos da Região

O município da Matala faz parte dos 14 municípios que compõem a província


da Huíla. Fica situado a Leste da província da Huíla e dista a aproximadamente
180 quilómetros do município do Lubango, a capital da província. O município
faz fronteira a Sul, com os municípios da Kahama e Ombandja (província do
Kunene), a Oeste, com os municípios dos Gambos e Quipungo (província da
Huíla), a Leste, com o município da Jamba (província da Huíla) e a Norte, com
o município de Chicomba (província da Huíla).

O município conta com quatro comunas, nomeadamente: comuna Sede,


comuna de Capelongo, comuna do Mulondo e comuna do Micosse.
Administrativamente, o município conta também com um elenco composto por
um Administrador Municipal, um Administrador Adjunto, Chefes de Repartições
Municipais, Chefes das Povoações, Sobas e Sekulo.

1.1.1. Clima

O município da Matala situa-se numa região de clima semi-árido, com


temperaturas que oscilam os 21ºC a 23ºC, a Norte, e 22ºC a 24ºC, a Sul; a
média de precipitações anual varia entre os 600mm, a Norte, e 400mm, a Sul.
A sua altitude varia entre os 1100m e os 1200m, cuja humidade relativa é de
40% a 60%. No município, encontram-se vários tipos de solos. O clima é, em
geral, quente (temperatura média anual superior a 20ºC), mas nas zonas com
maior altitude, o clima é temperado (temperado-quente). O mês mais frio é o de
Julho e os mais quentes são os de Outubro e de Novembro. A temperatura
média dos meses mais quentes é superior a 22ºC. A amplitude e variação
anual da temperatura do ar é inferior a 10ºC. Embora muito raro, pode-se
verificar alternadamente temperaturas excepcionalmente baixas (Perfil do
Município da Matala, 2009, p. 7).

Geomorfologicamente, a região faz parte do planalto interior de Angola, com


ligeira e gradual inclinação para o Sul. A região da Matala apresenta um clima

1
bastante instável. É uma zona caracterizada por um desequilíbrio ecológico
com ocorrência de secas cíclicas e devastadoras que reduzem o seu capital
rural (o gado).

O desequilíbrio na distribuição e a irregularidade nas quedas fluviométricas


implicam a escassez de pasto, água e, consequentemente, provoca a
tradicional transumância, que consiste na deslocação periódica dos rebanhos
de uma região para outra a procura de melhores pastos de água, ou seja, para
mudança de pastagem (Governo Provincial da Huíla, 2007, p. 19).

As comunidades rurais da região em estudo desenvolveram uma economia


adaptada ao seu meio ambiente e têm, por isso, um quadro e referências
culturais tanto em termos de classificação como de interpretação dos
elementos que as identificam.

As espécies vegetativas faunísticas e seu comportamento vegetativo ao longo


do ano é traduzido, na prática das comunidades rurais, pelo sistema de
maneio, em ligação com as disponibilidades de asseguramento do gado em
cada período, ao mesmo tempo em que enquadram as actividades e a
organização do trabalho do grupo doméstico, relativamente à recolecção
silvestre, que completa as suas disponibilidades alimentares.

1.1.2. Flora

Em Angola, a flora é muito diversificada. A vegetação prodominante no


município é a arbustiva e arbórea. Existem, no município, diversos tipos de
vegetação natural, como é o caso do muvange, de grande, médio e pequeno
porte. Encontra-se, em todo o território, árvores como a muyumba, o mumue, a
mupanda, o mussassu, o muissi, o girassonde, o eucalipto e o mungolo, bem
como outras espécies não identificadas (Perfil do Município da Matala, 2009, p.
12).

A flora é a principal fornecedora da matéria-prima para o uso doméstico:


fogueira e o carvão para cozer os alimentos e aquecer-se, o fabrico do
artesanato. Na fabricação dos diferentes artefactos, os materiais empregues
variam consoante o tipo de objecto.

2
A madeira constitui a principal matéria-prima para o trabalho dos agricultores,
artesãos e escultores. O derrube das árvores, muitas delas raras e
excepcionais, tem contribuído para a desertificação ou desequilíbrio na
biodiversidade. O derrube de árvores para o artesanato, associado à produção
de carvão e da lenha, principais combustões para a maioria dos lares,
sobretudo das comunidades rurais, tem consequências drásticas; pois, o meio
ambiente sofre alterações, afectando a vida não só humana como de toda a
biodiversidade (Tavalic, 2008: 50).

A queimada é uma prática primitiva da agricultura, destinada principalmente à


limpeza do terreno para o cultivo de plantações, fabricação de carvão para o
uso doméstico ou formação de pastos, com uso do fogo de uma forma
controlada e algumas regiões para a caça de animais.

O efeito mais notório da queimada é a destruição do ambiente. Em quase todo


o território angolano, particularmente no município da Matala, verificam-se
queimadas e destruição de grandes extensões de árvores, quando os
agricultores limpam os terrenos para o cultivo ou fabrico de carvão; criando
deserto e poluindo a atmosfera (Ibidem: 51).

1.1.2.2. Fauna

Nesta região, a fauna é bastante diversificada, mas em pequenas quantidades.


Nela encontram-se elefantes, olongos, chitas, nunces, búfalos, palancas
vermelhas, mabecos, hienas, gnus, guelengues, focachiros, potamocheiros,
leões, leopardos, burros do mato, cabras do mato, coelhos e outras espécieis
de animais.

O Parque Nacional do Bicuar abrange uma parte da extensão do município


(extremo Sul e Sudoeste), compreendendo os territórios das comunas de
Capelongo e Mulondo. Foi criada com o objectivo de preservar e defender a
fauna, privar a invasão de caçadores e evitar a migração de animais para ouras
regiões. É de referir que actualmente, tendo em conta a política da
diversificação da economia do país, estão a ser efectuadas algumas obras de
restauração no referido parque, com o objectivo de potenciar o turismo
(Governo Provincial da Huíla, 2009, p. 16).

3
1.1.3. Recursos Hídricos

O município da Matala é atravessado por um dos maiores rios do país, o rio


Cunene, com nascente em Kussinda-Huambo. Para além do rio Cunene,
existem outros rios, tais como: rio Kuvelaim, rio Kalonga, rio Qué, rio Hossi, rio
Kuvangue, rio Mbamba e rio Bembere (alguns destes intermitentes).
Encontram-se também riachos e lagoas ao longo da sua extensão.

1.2. Origem do Nome e do Município da Matala

Existem várias hipóteses para o surgimento do nome do município em estudo.


Na primeira hipótese, a palavra Matala tem a sua origem no termo ″omatala″,
língua local, que traduzido para o português significa ″lagoas″ (Perfil do
Município da Matala, 2009, p. 9).

O nome foi atribuído como consequência da existência, junto ao rio Cunene,


próximo à ex-fábrica de salsicha, de várias lagoas, tudo porque no período de
povoamento branco, os portugueses, que inicialmente se instalaram em
Capelongo, Vila Flogares, criando ali o seu colonato, nas relações que tiveram
com os povos nativos, quando comercializavam alguns produtos, perguntavam
sobre a origem dos mesmos, como resposta, os nativos respondiam: Etu
twatunda ko matala1.

Como os portugueses não entendia a língua nativa, traduziram a expressão e


atribuíram à localidade o nome Matala, mas com o mesmo significado.

Como os portugueses tinham a intensão de estender o seu comércio por onde


se encontravam os nativos, chegaram à localidade hoje município da Matala e,
ainda espantados pelas características geofísicas, não só das lagoas, mas
sobretudo do rio Cunene, criaram ali um projecto de construção de uma
barragem hidroeléctrica, isso fez com que alguns brancos portugueses
construíssem as suas primeiras residências no bairro hoje designado por
colonato, onde se instalaram a maior parte dos portugueses que ajudaram na
construção da barragem.2

1
Nós viemos das lagoas
2
Conversa com o soba Firmino Katyiedjo, aos 14 de Janeiro de 2019, pelas 17h.

4
Outra hipótese do nome Matala vem da designação do riacho que se situa a
Sul da vila da Matala e que limita os bairros Comandante Cowboy e Jamba. 3

A 27 de Agosto de 1958, a Portaria nº 10.313 estabeleceu novos limites para a


circunscrição administrativa do Alto Cunene, criando o Posto Administrativo da
Matala. Mais tarde, a 31 de Dezembro de 1965, por intermédia da Portaria nº
14.123, a sede do concelho de Capelongo, Vila Folgares, foi transferida para a
Vila da Matala, que havia sido elevada à categoria de Vila. Entre Agosto de
1975 e Janeiro de 1976, a Matala foi reconhecida como município (Concelho
de Capelongo, 1973, p. 1).

1.2. Principais Actividades

Apresenta-se, a seguir, as principais actividades praticadas pelos habitantes do


município da Matala.

1.2.1. A Criação de Gado

Para os nyaneka, a criação de gado, para além de património cultural, é


símbolo de riqueza ou seu banco tradicional, prestígio social e sinónimo do
poder. Quando os europeus introduziram a tracção animal, podiam ouvir-se
reflexões e desaprovoações como esta: ‘’isto é o que se chama fazer sofrer os
bois.’’ (Estermanm, 1971, p. 17).

Para os nyaneka, desde os tempos remotos, o boi foi sempre considerado


como animal de estimação, aproximando-o mesmo aos sentimentos humanos.
Para eles, o boi constitui a riqueza mais avidamente procurada. Há homens
que se dedicam à pastorícia com fervor, perspicácia e persistência,
manifestando por ela uma verdadeira paixão. Isto não quer dizer que todos
alcançam o fim desejado com o mesmo sucesso. Quanto a esta actividade, os
criadores de gado podem ser distinguidos em grandes, médios e pequenos
proprietários (Estermanm 1971, p. 17).

O trabalho mais penoso cabe ao pastor profissional e não ao dono do gado.


Quando não há pasto, deve levar a manada em transumância e permanecer no
local até que haja pasto na área de origem. O gado é exaltado através de

3
Conversa com o soba Firmino Katyiedjo, aos 14 de Janeiro de 2019, pelas 17h25.

5
canções poéticas. Apesar de o gado constituir símbolo de riqueza, os nyaneka
não deixaram de se dedicar à agricultura para a sua subsistência. Da prática
simultânea das duas actividades, surgiu o seguinte ditado: “Mphai mepya;
mphai mottyiunda”4.5

1.3.2. A Agricultura

Os nyaneka ocupam uma região cujas condições climáticas permitem a prática


da actividade agro-pecuária. Até muito pouco tempo, este trabalho era
exclusivamente executado com uma enxada de cabo curto.

Os principais produtos que cultivam são: o massango, a massambala, o milho,


o feijão, variedades de abóboras, batata-doce, mandioca e hortícolas. Pode-se
dizer que nas terras mais favorecidas por chuvas semeia-se essencialmente o
milho ou o sorgo e noutras regiões, o massango (Perfil do Município da Matala,
2009, p. 16).

De acordo com as características do terreno, a sementeira de milho e


massambala é feita durante as primeiras chuvas nas terras mais altas, em fins
de Outubro e Novembro, enquanto o massango pode ser lançado mais tarde. A
colheita começa nos finais de Abril e pode se prolongar até ao mês de Julho. A
batata-doce é plantada nas últimas chuvas e o seu tubérculo só fica formado
na altura da época chuvosa seguinte, isto é, na fase em que as reservas dos
cereais atingem um nível baixo. A boa ou má colheita depende das condições
climáticas na época do cultivo, da qual se circunscreve o seu condicionalismo
económico.6

Não é de admirar que a questão da fome ocupa um lugar predominante nas


conversas e preocupação dos Nyaneka e que, outrora, um poder mágico de
favorecer as precipitações atmosféricas rituais de prospecção de chuvas, fosse
considerado prerrogativa dos grandes sobas.

4
Pé na lavra, pé no curral.
5
Conversa com o soba Firmino Katyiedjo, aos 15 de Janeiro de 2019, pelas 10h.
6
Conversa com o ancião Tchipita, aos 04 de Fevereiro de 2019, pelas 11h.

6
1.3.3. O Artesanato

No que tange ao artesanato, as mulheres dedicam-se à olaria, fabricando


vários tipos de panelas, pratos de barro e sangas ou muringues para reservar
ou acarretar água. Também fazem cestaria, com a finalidade de serem
utilizadas como utensílios domésticos. Os homens fabricam objectos de ferro,
machados, facas, lanças, navalhas, enxadas e pulseiras. Também fabricam
objectos de madeira como o muholo, o pilão, funis, caixas de rapé e ferros
(Perfil do Município da Matala, 2009, p. 17).

1.3.4. A Caça

Os caçadores profissionais recorrem aos espíritos para caçar. Antes de irem à


caça realizam cerimónias rituais em memória dos antepassados, onde evocam
os espíritos destes para lhes ajudar na caça. O caçador amador realiza a caça
espontaneamente, sem passar pela festa de iniciação.

Os principais animais de caça são: veados, coelhos, oholongos, gazelas e


outros. A carne é para o consumo, as peles servem para fabricar banco,
batuques, tapetes, sacolas, calçados e os chifres, para fabricar objectos de
adornos.

1.3.5. A Pesca

A pesca é uma actividade importante para os nyaneka. No município da Matala


pescam principalmente no rio Cunene. O tipo de peixe que mais pescam é o
bagre e a quimaia.

1.3. Organização Sócio-Política

Segundo Estermann (1960, p. 145) a administração das autoridades


tradicionais estava sob custódia dos sobas grandes, que dirigiam os seus
ovilongo (terras) de forma independente e estes tinham as suas dependências,
dirigidas por sobetas, que dependiam dos respectivos sobas. Dentro dos
sobados havia uma estratificação social da população.

1º Rei (Ohamba), que era o chefe supremo do otchilongo, a ele competia a


administração do território e da justiça;

7
2º Conselho de Anciãos (Onossoma), que era um órgão com atribuições
consultivas e às vezes deliberativas. Este conselho era o responsável pela
eleição do novo Rei (Ohamba). Também tinha as competências de depor um
soba em caso de má governação;

3º Sobetas (Onosekulu), que eram os representantes máximos dos sobas nos


seus respectivos Ovilongo;

4º Aqui encontrava-se o povo em geral, Ovantu (Estermann, 1960, p. 145).

Além destes, havia os escravos (Ovapika), que eram obtidos em guerras e por
dívidas. Era a camada mais baixa da sociedade, mas tinha a possibilidade de
ascender e ser cidadão normal, depois de trabalhar um certo tempo ou pagar
as dívidas

Esta organização política pré-colonial, com a presença colonial começou a


perder o seu valor, pois o colonialismo extinguiu os verdadeiros sobas e criou
outros com o objectivo de fragilizar o poder tradicional, governar livremente e
colocou “sobas dóceis” de acordo com os seus interesses.

A sucessão do soba era geralmente feita entre os sobrinhos, filhos da irmã


materna do falecido ou entre os netos, prevalecendo aqui a linhagem matrilinear.
Podia ser feita também entre os irmãos do soba, em caso de não existirem
sobrinhos directos. Quanto à sucessão, à dignidade e aos cargos, é natural que
encontremos ainda o mesmo princípio directo. Neste caso, porém, será mais fácil
admitirem um consanguíneo homem do primeiro grau da linhagem colateral, ou

seja, um irmão do falecido (Estermann, 1960, p. 146).

Na organização actual, ficaram os grandes sobados suprimidos ou pelo menos


muito reduzidos. Mantiveram-se os «seculos», que são hoje os verdadeiros
representantes da autoridade gentílica, servindo de agentes de ligação entre o
elemento indígena e as autoridades coloniais. Também lhes compete resolver,
segundo a tradição oral, questões litigiosas de pouca importância. (Estermann,
1983, p. 30).

8
1.4. População

A população da Matala tem crescido exorbitantemente, comparado com o


período colonial. No levantamento populacional feito em 2004, o município
contava com uma população estimada em 222.880 habitantes. De acordo com
os resultados preliminares do Censo de 2014, o município conta com 243.938
habitantes, correspondendo a 10,4% da população geral da província, dos
quais, 115.105 homens e 128.833 mulheres. O grupo etnolinguístico
predominante no município da Matala é o Nyaneka. (Gabinete Central do
Censo, 2014).

O município da Matala é habitado, maioritariamente, pelo grupo etnolinguístico


Nyaneka-Humbi, mas, fruto das decolações das populações a procura de
melhores condições de vida, podemos encontrar, neste município, para além
do grupo etnolinguístico acima citado, os seguintes grupos etnolinguísticos:
ovimbundu, kwanhama, nganguela e tchokwe. A existência de diferentes
grupos etnolinguístico é que concorre para a existência do multiculturalismo,
que mais tarde estudaremos.

1.5. Cultura

Segundo Souza (2012, p. 24), a palavra cultura, geralmente, é empregue para


identificar o processo de desenvolvimento, a partir dos elementos identitários
de uma comunidade ou sociedade, tendo em conta, também, os intercâmbios
culturais entre povos.

O grupo etnolinguístico Nyaneka é um grupo com identidade própria e com


uma cultura bastante rica que em muitos casos representa, no mundo fora, a
identidade angolana.

Segundo Melo (2007, p. 17), em qualquer sociedade ou parte do mundo, as


identidades dos diferentes grupos populacionais são construídas e
transformadas histórica e continuamente, através das suas inter-relações nos
determinados traços exteriores, como a indumentária, os penteados e os tipos
de tatuagens, a forma de realização dos rituais e muitos outros traços
reveladores da sua cultura, como identidade enquanto grupo e que implicam a

9
sua interacção com as influências externas que permite a constante
aculturação.

A região em estudo é ocupada, desde os tempos remotos, pelos povos do


grupo etnolinguítico Nyaneka. Este grupo constitui um grande agregado
populacional no Sudoeste de Angola, possui uma grande unidade, no domínio
étnico, bem definido e, entre os subgrupos, utilizam dialectos parecidos ou
próximos (Guebe, 2008, p. 23).

Quando às características antropológicas ou culturais, os Nyaneka apresentam


elementos comuns, em alguns casos, em comparação com os vários grupos
etnolinguísticos de origem bantu, como por exemplo: todos os povos têm a
língua como factor importante na formação e na manifestação da identidade
(Melo, 2007, p. 50). Tem a família como elemento mais importante, que
compreende o pai, a mãe e os filhos. Existe, na sociedade bantu, a família
nuclear, a extensa e composta. Os Nyaneka têm várias heranças que
conservam até hoje, tal como os rituais de iniciação.

Existe ainda, entre este grupo etnolinguístico, os rituais de passagem, com


destaque para o casamento, o nascimento e a morte. Este grupo utiliza, para
esses rituais, em muitos casos, o gado, que é muito importante e constitui um
elemento de riqueza e prestígio na comunidade.

O cuidado e o tratamento do parentesco é um elemento importante na distinção


da linhagem. Os filhos pertencem a parte paterna. Esse grupo etnolinguístico
está organizado em linhagens exogâmicas matrilineares (epata). A sucessão
ao poder ou à herança era feita pela linhagem matrilenear, cabendo a
propriedade aos sobrinhos, isto é, filhos da irmã. Actualmente, esta prática tem
sofrido alterações constantes, fruto da globalização e do intercâmbio com
outras culturas (Bahu, 2013, p. 107).

1.6. Religião

Os Nyaneka e todo bantu acreditam em Deus Único, por intermédio dos


espíritos dos antepassados. Os espíritos são denominados de “onondele” e
subdividiam-se em bons e maus. Os bons espíritos são aqueles que protegem
e ajudam o homem e os seus bens, isto é, os que desejam a prosperidade das

10
famílias inteiras ou dos indivíduos particulares, são chamados
“onosandi/onosande/onohande”. Os espíritos maus são aqueles que causam
males, desgraças à vida das pessoas ou dos bens, isto é, provocam a morte,
prejuízos nas actividades agrícolas, em suma, impedem o desenvolvimento das
famílias e das suas riquezas (Ndambuca, 2003, p. 37).

A crença religiosa destas populações manifesta-se também em sacrifícios


dirigidos aos espíritos dos antepassados, que são tidos como mediadores entre
os vivos e Deus. Pois, os antepassados necessitam de ser lembrados pelos
vivos para o fortalecimento da união entre as duas partes, são eles que,
estando junto de Deus, conhecem os céus na terra e as suas necessidades.
Tais sacrifícios podem ser animais ou cereais, privados ou públicos. Os
sacrifícios em animais são dados pela acção de graças ou petição a Deus
(Huku/Suku), nos momentos de calamidades naturais, doenças individuais ou
familiares (Ndambuca, 2003, p. 36).

Na estrutura quer de organização familiar, quer de grupo, os vakulu (ou


ovakulu) – são tidos como os mais velhos do grupo, os anciãos e os detentores
do saber, mas também como entidades pertencentes a um escalão superior,
por terem já partido fisicamente deste mundo – residem no centro das suas
preocupações. Aliás, no caso das entidades espirituais (onosande yovakulu),
elas são normalmente, segundo se crê, membros da família e do grupo. Daí
orientarem de certa forma a vida dos vivos, além de intermediarem a relação
destes com Suku, a entidade suprema (Melo, 2007, p. 42 e 43).

O boi não está ligado apenas à actividade económica, mas também ao domínio
das ideias, práticas religiosas e a ancestralidade cultural deste grupo étnico. A
instituição tradicional do “gado sagrado” (ovipanga) é de tamanha importância
nos nyaneka que predominam seis classes distintas de bois consagrados aos
antepassados. Realizam um ritual de consagração de um animal, no qual
intervêm vários indivíduos e o proprietário assume plenamente as funções de
consagrador. É considerado um crime horrendo matar um boi sagrado. O
consumo da carne de um animal desta índole morto por doença, obedece a
uma estrita regulamentação tradicional. Só alguns parentes próximos, uterinos

11
do proprietário estão habilitados a fazer o uso deste alimento (Mucuatxilamba,
2002, p. 95).

Segundo Estermann (1960, p. 187), entre os nyaneka, conhecem-se pelo


menos seis classes de bois sagrados:

 Onaluhongue, que quer dizer “aquele da vara” (dos circuncisos). Pode ser
um macho que o filho recebe de seu pai para ser “comido” por ele e pelos
camaradas da circuncisão (Oma-Kula). Trata-se, porém, de uma vitela. Assim
que tiver a primeira cria, o leite só poderá ser utilizado pelo proprietário ou
pelos companheiros de circuncisão. Os mesmos, e só eles podem comer a
carne desta vaca, depois de ter morrido de doença ou de velhice;

 Ondyila-ombe, vaca que os herdeiros dão ao filho do falecido dono do


gado. O leite pertence exclusivamente ao órfão e aos seus filhos, se os tiver.
Enquanto pequenos, alimentar-se-ão com o leite desta vaca, uma vez
crescidos abster-se-ão de o fazer, por respeito. Os tarros usados para ordenha
do animal devem ficar separados dos que servem para as restantes vacas.

De vez enquanto, conduzem todas as vacas ao cemitério, incluindo as profanas


(não sagradas). Estas vão acompanhadas dos seus vitelos, a um dos quais
cortam ao meio uma orelha. O sangue derramado sobre as campas é oferecido
como sacrifício aos mortos aí enterrados. Se o vitelo vingar e se for fêmea,
passará a ser um animal sagrado (otyi-panga). O leite que produzir será
reservado à família. Terá tarros próprios que não podem ser empregues para
uso profano e um animal destes não pode ser alienado (Estermann, 1960, p.
187).

 Onumatwa, «a mordida», por causa da orelha cortada. Esta vaca pouco


difere da progenitora. Para a consagrar, porém, não é necessário fazer a
cerimónia no cemitério. O animal é recebido por um sobrinho, por ocasião da
morte de seu tio, é como seu memorial. O leite pertence ao dono e aos seus
filhos. A descendência dessa vaca pode, no entanto, ser vendida;

12
 Onamphinga, «a do herdeiro», é um boi geralmente abatido por ocasião da
morte do dono. Os herdeiros só podem comer a carne do peito, que é
imediatamente separada do resto, logo depois da rês abatida. A esta carne
especial têm também direito os próximos parentes paternos;

 Ondilisa de oku-lilisa, «fazer chorar», por alusão aos prantos fúnebres. É o


boi morto por ocasião do passamento físico do proprietário. Mas não se lhe
come a carne (otyi-hitu, com prefixo depreciativo), a qual é içada aos cães. O
couro pertence aos herdeiros;

 Onamulilo, nome cuvale, que significa «o do fogo». O termo é muitas vezes


traduzido pelos nyaneka por: Ongombe yotupia, a tradução equivale
praticamente a um segundo nome. Temos aqui uma vaca muito respeitada e
ao qual não se podem dar maus-tratos. O dono, depois de o ter escolhido,
manda um dia ministrar-lhe umas drogas por um quimbanda, o que o torna
imune contra a voracidade do leão. Quando morrer, unicamente lhe podem
comer a carne mulheres e raparigas (Estermann, 1960, p. 187-188).

A intervenção portuguesa acabou por anular alguns dos elementos culturais


“tradicionais” da região e, introduziu formas novas de representação cultural.

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