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Regimento do Santo Oficio 1640

de muito, que lhe importa satisfazer a elas, e de risco, a que se expõem, se


inteiramente não confessar suÍrs culpas; e quando com esta advertência não
acabar de satisfazer de todo, será retida em sua casa fora do cárcere, e se verá
seu processo em mesa pelos Inquisidores; e tomando-se nele assento, que seja
presa, assim se executará; e ainda que satisfaça logo depois de presa, não ficará
gozando do privilegio de apresentado, posto que em seu despacho se poderáter
a isso algum respeito.
5. Vindo alguma pessoa, que não tem idade bastante parafazer abjuração
(conforme ao que se dispõem no livro 3, Título 1, $ 12.) apresentar-se na mesa
do S. Oficio, e confessar culpas de heresia formal, depois de lhe ser tomada sua
confissão, e de ser por ela examinada, e havendo-se lhe feito sessão de
genealogia, e crença, os Inquisidores a mandarão instruir nas coisas da Fé, e
confessar sacramentalmente, e absolver da excomuúão na forma que lhes
parecer, segundo o que de sua capacidade entenderem.
6. Se alguma pessoa vier à mesa do S. Ofïcio, e disser, que outra, que já
foi reconciliada, se quer apresentar, e confessar culpas de heresia, cometidas
depois de sua reconciliação, contanto que lhe prometam misericórdia, os
Inquisidores guardarão que esíá disposto no $ 5, do Título precedente.
7. Confessando a pessoa apresentada culpas, que não sejam de heresia
formal, ainda que não satisfaça à prov4 que há contra el4 ou de sua confissão
resulta, se procederá em sua causa sem chegar a prisão, até se tomar assento
final; ejulgando-se, que se devefazer algumadiligencianotormento então será
presa paÍa se poder executar.
8. E se a culpa for por bigamia, ainda que o apresentado confesse ambos
os matrimônios, não se tomará assento em sua casa, sem primeiro se verificarem
por testemuúas, ou certidões dos livros dos casamentos, e se fizer informação
judicial de como era viva a primeira mulher, ou o primeiro marido, ao tempo,
que se celebrou o segundo matrimonio; salvo se aprova se houver de fazer em
lugares tão remotos, que seja necessária grande dilação; porque neste caso se
verá sua confissão em mesa, e se tomará nela o assento, que parecer, e com ele
se enviará ao Conselho.
9. Quando alguma pessoa natural destes reinos, se vier apresentar na mesa
do S. Ofïcio, e confessar culpas de judaísmo, ou outraheresia, que cometeu em
reinos estranhos, declarando que se comunicou com outras pessoas; ou que há
pessoas que lá lhas vissem cometer, parecendo que faz inteira, e verdadeira
confrssão, e não estando delata com prova bastante para se proceder a prisão,
será recebida ao grêmio, e união da Santa Madre lgreja, na forma, que se diz
no livro 3, Título 1, $ 10. E parecendo, que a confissão não é verdadeira, se
guaridarâo que se dispõem no $ 4 deste título; mas parecendo aos Inquisidores,
pelas circunstâncias do caso, que se não deve proceder a prisão, como no dito

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Sônia Aparecida de Siqueira

parágrafo se ordena, enviarão o processo ao conselho, com o assento, que nele


se tomar: e estando a tal pessoa já delata por testemunhas bastantes para se
proceder a prisão, se guardará o que se dispõem no livro 3, Títulol, $ 2.
10. Apresentando-se na mesa do S. Oficio algum herege estrangeiro, e
confessando que se apartou de nossa santa Fé, pedindo, que o admitam ao
grêmio, e união da Igreja Católica, os Inquisidores o receberão benignamente
e lhe tomarão sua confissão, e o examinarão por ela, para que conste se procede
de verdadeiro arrependimento de suas culpas; e não resultando do exame coisa
em contrario, será reconciliado na forma, que se diz no livro 3, Título 7, $ 10.

I L Se alguma pessoa criada entre pais, e parentes hereges, e em parte onde


não teve, nem podia ter verdadeiro coúecimento da Fé Católic4 nem suficiente
instrução nos mistérios dela, vier a mesas do S. Ofício pedir que o admitam ao
grêmio e união da S. Madre lgreja; os Inquisidores a mandarão instnrir por
algum Religioso douto e depois de instruída a mandarão confessar, e absolver
da cautela da excomunhão, em que podia ter incorrido, e assim a este, como
aos hereges, que forem reconciliados da mesa, mandarão, que guardem o que
se dispõem no livro 3, Título 1, $ 6. E se a pessoa sobredita se apresentar por
seu confessor, e ele for tal pessoa, de que se possa fiar sua instrução, os
Inquisidores lhe poderão cometer, e que a absolva sacramentalmente, e nestes
dois casos se não formará processo aos apresentadores.
12. Se contra apesso4 que se apresentou, e confessou culpas de heresi4
depois de reconciliada na mesa do S. Ofício, e de ter abjurado em segredo,
acrescerem testemunhas, que mostrem ser sua confissão diminuta, e a diminui-
ção for tal, que baste para se proceder a prisão, procedendo requerimento do
Promotor, será mandada vir à mesa, com tal segurança e resguardo, que não
possa fugir, ou esconder-se, e na mesa será examinada por suas culpas, e
advertida das diminuições de sua confissão, na forma, que fica dito no $ 4 deste
título; e satisfazendo logo a informação da justiça será absolvida da excomu-
nhão com que ficou ligad4 pornão descobriros cúmplices, e lhe serão impostas
as penitencias espirituais declaradas no livro 3, Título 1, $ 6; e não satisfazendo,
será retida em uma casa fora dos cárceres; e se visto seu processo, se tomar
assento, que seja presa serii recolhida neles.
13. Apresentando-se alguma pessoa na mesa do S. Ofïcio, e confessando
nela culpas de heresia ocultas por acidentes e pedindo absolvição delas, os
Inquisidores a poderão reconciliar judicialmente, assim como está disposto no
livro 3, Título l, $ 2; e assento, que na mesa se frrnr,frcarâlembranç4 que se
a dita pessoa reincidir nas mesmas culpas, e em outras de heresia, e constar
delas por sua confissão, ou por outra prova legítima, se daú conta a sua
Santidade, para não ser havida por relapsia; e não querendo a dita pessoa vir à
mesa do S. Oficio cada um dos Inquisidores em sua casa, a poderá reconciliar,

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e absolver confonne ao Breve de Clemente VII; e com as condições nele


declaradas; e quando se apresentar por meio de seu confessor, e ele disser que
a tal pessoa não pode, ou não quer vir à mesa do S. Oficio, nem diante de algum
dos Inquisidores, depois de feita a diligencia possível, para que se apresente
pessoalmente, não se podendo acabag que o faça, se o confessor for pessoa
douta, e de confiança, os Inquisidores lhe poderão cometer, que a absolva no
forum da consciência.
14. Toda a pesso4 que estiver presa nos cárceres do S. Ofïcio por culpas,
que não forem de heresia, e confessar na mesa culpas de heresia formal, de que
não esüâ delah, não sení havida por apresentad4 se fizer a confissão antes do
libelo dajustiça, mas será reconciliadq e fará abjuração de seus erros em auto
público; poÍque neste caso não tem a confissão as qualidades, que de direito se
requerem paragozar do favor de apresentado; e confesse depois do libelo, fará
abjuração na mesa; e se estava presa por culpas de heresia, e confessar outras
de diferente qualidade, de que não esteja delata, ou ainda que o esteja, é somente
por indícios, que não bastavam para obrigar a prisão, será havida por apresen-
tada, e ouvirá sua sentença, quanto a esta culp4 que confessou, na mesa do S.
Oficio perante os Inquisidores, e Notário somente.
15. Quando as pessoas, que tem terra de Mouros, obrigadas de tormentos
professam a seita de Mafoma, tomam nome, e habito de Mouros, e fizeram suas
cerimonias vierem à mesa do S. Ofïcio, e pedirem misericórdias, e perdão de
suas culpas, os Inquisidores as receberão com muita caridade, e as despacharão
com a brevidade possível, respeitando quanto importa usar com as tais pessoas
de benignidade, para que outras, que tiverem cometido as mesmas ou seme-
lhantes culpas, se animem a procurar o remédio de suas almas; e sendo algumas
das ditas pessoas reconciliadas em form4 será no lugar, que se dispõem no livro
l; e as mandarão instruir nas coisas de nossa santa Fé, por pessoas
3, Título 7, $
Religiosas,,e doutas; e negando a tenção, se guardará o que se diz no $ 2 do
mesmo Título.
16. Sendo algumas das ditas pessoas natural, e moradora em outro Reino,
depois que os Inquisidores a despacharem, lhe passarão em seu nome carta de
sua reconciliação, ou despacho; e lhe ordenarão, que indo viver à terra donde
é natural, e donde foi morador, se apresente com a carta no tribunal do S. Oficio,
se na terra o houver, e não o havendo, perante o Ordinrârio delq para que por
esta via cesse o escândalo, que poderia ter causado com suas culpas.

17. E se as ditas pessoas, que vierem datena de Mouros, em algum dos


lugares da África da ìonquiÁtá deste Reino se forem represêntar perante o
Comissrário do S. Ofïcio, provisor, ou vigário geral, a cada um deles damos
licença para que as possa absolver com reincidência, com tanto que lhe
mandem, que em termo limitado veúam apresentar no S. Ofïcio, e para esse

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efeito lhe mandarão passar instrumento em forma, pelo qual os Inquisidores a


receberão do modo, que fica dito; e paÍa que o Comissário, Provisor ou Vigrário
geral teúam notícia e possam usar da faculdade concedida neste $. os Inqui-
sidores enviarão o traslado dele ao Bispo de Seita" encomendando-lhe que o
faça saber aos oficiais dos lugares de seu Bispado, o mesmo mandarão ao
comissário do S. Oficio.
18. Porenquanto conforme direito, como se dirá no livro terceiro no
principio, pelo crime de heresi4 se incorre em pena de confiscação de bens; e
em ordem a isso se manda fazer seqüestro neles: ordenamos, que aos apresen-
tados fora do tempo du gt"çq que confessarem culpas de heresia formal e por
não satisfazerem, forem presos, se faça seqüestro em seus bens, e pataofaz.er,
o Juiz do Fisco será logo avisado pelos Inquisidores; e isto mesmo se guardará
com os que abjurarem em público, ao tempo, que forem recolhidos para se lhes
publicarem suas sentenças; e aos que abjurarem em segredo, se não fará
seqüestro de bens; porque sendo seu crime oculto, não aconteça manifestar-se
por esta maneira.

rÍruro ur
De como se hão de tomar as denunciações
1. Porenquanto a denunciação é um dos meios principais que há para se
poder em juízo proceder contra os culpados; os Inquisidores sem dilagão
alguma, ouvirão as pessoas, que vierem denunciar à mesa do S. Ofïcio, e
tomarão pessoalmente suas denunciagões, sem as poderem cometer aos Depu-
tados, como se diz no Livro l,Título 3, $ 14; e examinarão tudo o que nelas se
disser com muita consideração; e farão declarar aos denunciantes em seu
testemunho, sua idade qualidade, donde são naturais, e moradores, o tempo, e
lugar onde se cometeu o crime de que denunciam as pessoas que sabem dele,
e as razões, que os moveram a denunciar, e sendo passado muito tempo depois
de cometido, serão perguntados, porque mzÃo não denunciaram mais cedo, e
pelas mais circunstancias que parecem necessárias para melhor se inteirarem
do credito, que se deve dar a seus ditos; e assim mais lhe farão declarar a idade,
qualidade dos denunciados, donde são naturais, e moradores; e se ao tempo que
cometeram o crime, estavam em seu perfeitojuízo, ou se pelo contrario tomados
do vinho, ou de alguma paixão que lho perturbasse; se farão advertidos, ou
repreendidos das pessoas, que se acharão presentes, e o que lhe responderão,
com o mais que parecer, que convém, para se ter coúecimento das pessoas dos
culpados, e das culpas por eles cometidas.
2. Quando a denunciação for contra algum confessor de solicitar na
confissão, se guardarão muito os inquisidores de faz.er aos denunciantes mais
perguntam, das que parecerem necessiírias para se inteirarem da culpa dos

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denunciados, antes lhe advertirão no principio da denunciação, que não são


obrigados a dizer de si coisa alguma das que somente lhe tocam, se não aquelas,
que tocarem aos denunciados; e não mandarão escrever o que somente fizer
culpa à pessoa solicitada; salvo se ela (sem a obrigarem a isto) denunciar de
algum ato de sodomi4 ou disser de algum outro crime, cujo coúecimento
diretamente pertença ao S. Ofïcio, ou de algum ato de fornicação, ou de malícias
consumado, porque razão é, que se escreva uma circunstanciq que agrava tanto
a culpa do denunciado, para efeito de haver por ela maior castigo.
3. Os Inquisidores farão chamar com brevidade possível, as pessoas, que
nas denunciações estiverem referidas, e as examinarão com a mesma advertên-
ci4 com que devem examinar aos denunciantes, perguntando-lhe geralmente
em primeiro lugar, se sabem, ou ouvirão alguma coisa contra nossa santa Fé
Católica, ou qualquer outr4 cujo coúecimento pertença ao Tribunal do S.
Oficio, e deferido ao caso, em que estão referidas, se tomará seu testemunho
com muita miudeza, para que se veja se contestam com os denunciantes, e não
satisfazendo ao referimento nele feito, lhe perguntarão em particular, pela
ì substancia de denunciação, em que estão referidas, não lhe declarando o lugar
\ do delito, nem os nomes do denunciado, e denunciante; e quando nem com isto
I
satisfação, lhe será dito, que na mesa do S. Ofïcio há informagão, que elas sabem
outem noticias das coisas, porque foram perguntadas, queüatem de descarregar
suas consciências, manifestando a verdade; e assim aos denunciantes, como as
testemunhas referidas, qrte forem perguntadas, se encaregará muito o segredo
I
debaixo do juramento, que houverem tomado; e sendo as referidas cúmplices
\ não serão perguntadas. Se as pessoas referidas forem freiras, ou mulheres de
: grande qualidade, ou casadas com fidalgos, ou que estejam recolhidas em
clausura, ou finalmente pessoas, que tenham legitimo impedimento para não
vir testemunhar ao S. Oficio, se guardará o que fica dito no Liwo l, Título 3,
$ 13. E se pelos ditos dos denunciantes, ou das testemunhas resultar culpa contra
os denunciados, serão logo ratificados pelos lnquisidores na mesma audiênci4
em que uns, e outros forem perguntados, ainda que seja necessiírio deterem-se
na mesa algum tempo, alem das horas, que estão ordenadas para o despacho.
4. Quando parecer aos Inquisidores, que convém tomar alguma informação
sobre o credito dos denunciantes, e das testemunhas referidas, assim o farão,
ou mandarão fazer antes de se proporem as denunciações em mesa; e sendo o
denunciado algum confessor, por solicitar na confissão, sempre se fará esta
informação, e outra mais, sobre a opinião, e fama do denunciado, procurando-se
quanto for possível, que uma e outra se faça com tal segredo, que não possa de
nenhuma maneira vir a notícia dos denunciados.
5. Os Inquisidores tomarão as denunciações, que perante eles forem dadas
contra pessoas, que vivem em outro distrito, e perguntadas as testemunhas
referidas, e ratificados seus ditos, remeterão otraslado detudo aos inquisidores

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t Inquisidores lhe passarão precatório para lhes serem remetidas, e nele iná
declarando, que até verem ordem sua" seja o preso detido na cadeia; e sendo-lhes
remetidas, se acharem, que lhes pertence o conhecimento delas, passarão
segundo precatório, em que peçam a pessoa do preso, ao qual sendo remetido,
) mandarão por em custodia, e verão em mesa as testemuúas depois de reper-
I
guntadas, e ratificadas na forma, que fica dito, e tomando-se assento, que as
culpas são bastante para prisão, será o preso recolhido nos cárceres, e se
procederá em sua causa; e não sendo bastante, o mandarão por em sua liberdade,
e sem o remeter à prisão, em que estava" salvo se ele estivesse preso por outra
culpa, alem daquelaporque foi trazido ao S. Oficio, como adianta se diráno $.
8. do Título seguinte.
10. Pela denunciação, que houver de alguma pesso4 por casar duas vezes,
se não procederá, sem primeiro se verificarem ambos os matrimônios, e constar,
que foram contraídos na forma do sagrado Conselho Trident. e que no tempo,
em que se celebrou o segundo, era ainda viva a primeira mulher, ou o primeiro
marido, e constando de todas estas coisas na forma, que estiá dito no título 3. $.
8. deste livro, se procederá nesta denunciação, como adiante se dirá nas mais
denunciações.
I l. E se a denunciação for de palavras, ou feitos duvidosos, antes de se por
em mesa os Inquisidores os mandarão qualificar por dois, ou três qualificadores
do S. Oficio, para que sendo certa a qualidade da culp4 se possa melhor
proceder contra os culpados; e ao assento, que se tomar nas culpas, que tiverem
qualificação, se enviará com elas ao Conselho.

: TÍTIJLO IV

, De como se hui de proceder contra os denunciados

l.
Quanto mais graves são os crimes, principalmente aqueles que se
cometem contra nossa S. Fé, de que coúece o S. OÍïcio, tanto importa, que
com maior consideração se proceda neles à prisão dos culpados: por tanto
ordenamos que depois de tomados os testemuúos dos denunciantes, e pergun-
tadas as referidas, e ratificados uns e outros, e feitas nas denunciagões que
vierem remetidas as diligências, que ficam apontadas, se entregue tudo ao
Promotor do S. Oficio, para que lançando o primeiro em Repertório possa
requer contra os culpados por parte dajustiça, e autuadas com seu requerimento
as denunciações se farão conclusas aos Inquisidores, para todosjuntos as verem
em mesa; e em neúum caso pronunciarão por lista ou relação verbal das
testemuúas; e se o caso for razÃo gÍave; ou tÍío duvidoso, que entendam que
seria razão pronunciar-se com mais votos, poderão chamar dois Deputados,
quais lhes parecer para votarem nele; e para as que vierem remetidas dos

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Ordinrírios, ou tiverem qualificações, serão chamados todos os Deputados,


como se diz no Título 5, $ 6, do livro primeiro.
2. Parecendo a todos os seus votos, ou a maior parte deles, que alguma I
pessoa deve ser presa farão disso assento, que logo mandarão executar, e se dirá (
nele, e assentou se por todos os votos, ou pelos mais votos, segundo o modo, i
em que se vencer, e todos assinarão o assento, posto que alguns fossem de I
parecer contriário: porém se o negócio for de qualidade que haja de ir ao
Conselho, no assento, que se frzer irão declarados os fundamentos, que para ele
houve, e os que teve cada um dos votos, quando todos não forem conformes; e
sempre o assento se fará no processo pelo mesmo Inquisidor, que o propuser,
ainda que sejulgue, que as culpas não são bastante para se proceder a prisão.

3. Sendo a pessoa denunciada de tão pouca idade, que não teúa a que no
Livro 3, Título l, $ 12; se requer parafazer abjuração os Inquisidores a man-
dario trazer à mesa, e a examinarão pela denunciação, que contra ela houver,
e confessando algum erro contra a Fé, se fará o que fica disposto no Título 2,
deste livro, $ 5. E negando a culpa, de que estiá denunciada, a mandarão por em
casa de um oficial da Inquisição, e com rogos, e ameaços a procurarão reduzir
a confessar, dando-lhe, se for necessário, algum castigo em lugar de tormento,
conforme o direito dispõe.

4. Declaramos, que para os inquisidores decretarem que alguma pessoa


seja presa" é necessiírio preceder tal prova, que razoavelmente parega bastante
paÍa se proceder por ela a alguma condenação, e não bastará uma só testemunha
para ser presa a pessoa denunciada; salvo se for marido, ou mulher, ou sua
parente dentro do primeiro grau de consangüinidade contado por direito canô-
nico. Mas se a testemunha for maior de toda a exceção, ou ajudada com alguma
outra presunção de direito, ou de tão bom credito, e o denunciado de tão
ordinária condição, que pareça aos Inquisidores, que deve ser preso, farão disso
assento, em que se declarem as razões, porque se moverão, a qualidade da
testemunha, e do culpado, e se há entre eles algum parentesco, o qual enviarão
com Íìs culpas ao conselho para nele se determinar o que se deve fazer; porem
isto não haverá lugar, sendo a culpa de solicitar na confissão, porque nesta em
neúum caso se procederá a prisão por uma só testemuúa.
5. Os Inquisidores não mandarão prender Clérigo, ou religioso algum, nem
pessoa secular, a que conforme a este Regimento na mesa se deve dar cadeira
de espaldas, ao mercador de grande cabedal, nem pessoa alguma pelo crime de
sodomi4 sem primeiro enviarem as culpas ao Conselho; e o mesmo farão
quando houver duvida" se o culpado é merecedor de grande cabedal, o de
qualidade, que na mesa se lhe houvera de dar cadeira de espaldas; com tudo se
houver temor de fuga, fazendo-se dela informação judicial, que se juntará às

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culpas, se podenâ proceder a prisão nos sobreditos casos sem ordem do Conse-
lho.
6. Depois de tomado assento das pessoas, que devem ser presas, se passarão
outros tantos mandados, entrando o nome de uma pessoa somente em cada um
deles, e estando assinados os Inquisidores, os entregarão ao Meiriúo, familiar
ou pesso4 a que se cometer a prisão, advertindo-lhe, que feita el4 ou não tendo
efeito, os viÉ entregar na mesa, e dar razÁo nela do mais que tem passado; e
quando os mandados se remeterem aos Comissários, se lhe encomendará muito
particularmente, que os tornem enviar: e em nenhum caso se mandarâ fazer
prisão alguma, sem mandado por escrito assinado pelos Inquisidores.
7. Quando a prisão for com seqüestro de bens, ordenarão, que a possa, a
quem se encarregar, guarde o que se dispõe no Título 13, $ 9, do Livro l; e
sendo sem seqüestro de bens, mandar-lhe-ão, que advirta ao preso, que deixe
sua cÍìsa, e fazenda encarregada a quem lhe parecer; mas se houver algum
: inconveniente, no preso entender, que não se faz seqüestro em seus bens, neste
caso, deixarâacasa encarregada a alguma pessoa de confiança, de quem possa
presumir, que se o preso o soubera, lhe encomendará sua fazenda.
8. Se os Inquisidores mandarem prender alguma pessoa que já estiver presa
(
por culpas cujo conhecimento pertence ao ordinrário, ou Juiz secular, farão
passar precatório para lhe ser o preso remetido, e irá declarado nele, que
acabado o negócio para que se pede a remissão, será tornado o preso ao lugar,
em que estava; e mandamos, que assim se cumpra, e guarde pontualmente; e
se o preso depois de estar nos cárceres do S. Ofício, for condenado em pena, a
qual senão possa executar nele, sem primeiro ser tornado à prisão donde veio,
será levado a ela com carta, em que se diga ao ordinário, ou Juiz secular, que
depois de sentenciado em seu juízo, será outra vez remetido ao S. Ofïcio, para
nele se executar sua sentença, de modo que sempre a execução dela haja de
preceder a qualquer outra; salvo quando de se executar em primeiro lugar do
S. Ofício, se seguir maior prejuízo a alguma pessoa, ou à sentença dada em
outrojuízo; porque sem razão seria, que por o preso ser remetido segunda vezo
se defraudasse o comprimento da justiça, ou o direito das partes.

9. Tanto que algum preso chegar ao S. Ofïcio, mandarão os inquisidores,


que seja buscado na formq que se dispõe no Título 14, ç 7, do Livro 1, e que
t logo depois disso vá à mesa, e nela lhe perguntarão como se chama, donde é
natural e morador, e se lhe farão as mais perguntas, que parecerem necessárias,
paÍa constatar se é a mesma pessoa, que se mandou prender da mesa. Saberão
dele, se os ministros, que o prenderam, e trouxeram ao S. Oficio, o trataram
bem na prisão, e no camiúo, e se lhe fizeram algum agravo, ou lhe pediram,
ou tomaram alguma coisa, e depois o consolaram muito, declarando-lhe que
lhe não faltarâ coisa alguma, que lhe seja necessária, assim para bem de sua

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\
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alma, e averiguar a verdade de suas culpas, como para sustentação de sua


pessoa. Encarregar-lhe-ão, que examine sua consciência, e se disponha a
confessaÍ Í!s culpas, que tiver cometido, que pertencerem ao S. Ofício, para que
usem com ele da misericórdia, que a Santa madre igreja costuma conceder aos
bons, e verdadeiros confidentes, advertindo, que tanto será maior, quanto mais
cedo as confessar; mas sendo o réu preso pelo pecado nefando, ou relapso no
crime de heresia, não lhe prometerão misericórdia, e só lhe dirão, que trate de
descarregar sua consciência para despacho de seu processo, e salvação de sua
alma. Depois de lhe dizerem o que acima fica dito, lhe mandarão, que esteja no
ciárcere com muita quietação, tratando só de cuidar em suas culpas, e de se
encomendar a deus para que o ilumine no que lhe convier; e que no crárcere não
fale de maneira, que possa ser ouvido fora dele, nem trate de saber o que passa
nos cárceres vizinhos, advertindo-o que se exercer em alguma destas coisas,
será castigado como o cÍrso merecer; e também se lhe dirá que tendo notíci4
que algum preso faz o mesmo, o veúa sem dilação dizer namesa; e que todas
as vezes que lhe for necessiírio vir a ela, para bem de sua consciência, causa ou
pesso4 diga ao Alcaide, que lhe peça audiência; sem lhe declarar o para que, e
que logo será provido conforme a ordem, que para esse efeito se tem dado.
10. Amoestado o preso na forma sobredita, mandarão ao alcaide, que o
poúa na casa do cárcere, que dantes lhe hão de ter assinad4 e a um Notiírio,
que declare no seu processo a casa, em que foi posto, a companhia, que lhe
deram, e a terra donde são os companheiros; e esta ordem guardarão quando os
mudarem, de uma casa para outra. Se o preso vier em dia feriado, ou a horas,
que esteja fechado o tribunal, quando o Alcaide for a casa de algum Inquisidor
a dar-lhe conta disso, o Inquisidor lhe ordenará, que ponha o preso só em uma
das casas, que estão antes do cárcere secreto, e ai o tenha entretanto que se não
der outra ordem; e no primeiro dia de despacho assentará em mesa o que se
deve fazer.
rÍrulo v
De como se hão de preparar os processos antes
de serem os presos amoestados

l. Por quanto convém muito, que os processos do S. Oficio sejam ordena-


dos sem falta, ou defeito algum, mandamos neste regimento dar certa forma
com particular instrução de cada coisa, que os inquisidores hão de guardar
inviolavelmente no discurso das coisas, que perante eles se processarem.
2. Depois de ser preso recolhido nos cárceres do S. Oficio se começará a
entender em seu processo, e com ele se irá continuando até ser finalmente
sentenciado. O processo se dividirá em duas partes; a primeira, comeganí pelo
mandado da prisão, auto da entrega do preso ao Alcaide, folha do cárcere, em

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que o réu foi posto, e logo as culpas com requerimento do promotor, e assento
da mes4 porque se decretou a prisão, e depois, disto, as mais culpas que
acrescerem. A segunda começaÌá pelo inventario do preso na forma do pará-
grafo segundo, e logo continuarão as sessões, como adiante se dirá nos Títulos
6 e7.E em caso, que haja de acusar algum ausente ou defunto, para efeito de
ser condenada sua memóri4 e confiscados seus bens na forma de direito, se
porão na primeira parte as culpas somente, e a segunda começará com o
requerimento do promotor, e assunto, que sobre ele se tomar, e logo se juntará
a cwta dos editos porque farão citados os ausentes, e os herdeiros do defunto,
com certidão do Notrário do dia, em que os fixou, e em que foram tirados, e
continuará o processo, como se declara nos Títulos 18 e 19 deste livro.
3. Se a prisão for com seqüestro de bens, tratarão os inquisidores, com a
brevidade possível, de fazer com o preso inventario deles, no qual lhe mandarão
que declare com juramento, os bens de raiz e móveis, de que estava de posse,
avalia, e qualidade deles, se são de morgado, capela ou prazo de vida ou fatos
perpetuo, Eclesiástico ou secular, ou tem algum outro encargo que direito, e
ações tem contra outras pessoas, ou elas contra ele, que dividas lhe devem, ou
estrâ devendo, que coúecimentos, letras, e papeis tiúa em seu poder, ou em
mão alhei4 e feito assim este invenüirio, se dará com ele principio à segunda
parte do processo, na forma, que fica dito, e se fará uma copia dele, com todas
as declarações sobreditas, que será enviada ao Juiz do Fisco, paratratar de por
em arrecadação, a segurançaafazenda do preso; e não tendo o preso alguns
bens, se fará disso termo assinado por ele, e será junto em lugar do inventrârio.

4. Sendo o preso menor de vinte anos, antes de lhe ser feita alguma, lhe
será dado curador, ao qual comjuramento dos santos evangélicos, que há de
receber em presença do preso, será encarregado, que o aconselhe bem, e
verdadeiramente em tudo o que entender-lhe convém, assim para bem de sua
alma, como paÍa o procedimento de sua caus4 e de tudo se farátermo assinado
pelo curador, que juntará ao principio logo depois ao inventrírio, e não o
havendo, depois do termo, que se hâdefazer em seu lugar.
5. Todas as sessões ordinárias e confissões dos presos menores, lhe serão
lidas em presença de seu curador, o qual estarátambém presente, quando se lhe
ler o libelo da justiça, e à publicação das testemunhas, e dos despachos
prejudiciais, ou sentenças, que lhe forem publicadas, na ratificação das confis-
sões, e abjuração, que o menor frzer, e a todos os mais autos judiciais de seus
processos; e os termos, que o menor assinar, assistirátambém o curador, e assim
irá declarado neles, e nos que não forem assinados, daú fé o Notiírio, que os
escrever, como o curador esteve presente.
6. Se no discurso da causa sobrevier ao curador tal impedimento, que não
possa continuar com ela, se dará ao preso outro, de que se fará termo na forma

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Sônia Aparecida de Siqueira

sobredita" que se juntará ao processo, segundo o lugaÍ, e tempo, em que for


feito. Será ordinariamente dado por curador aos presos menores, o Alcaide dos
cátceres, e aos apresentados, o Porteiro da casa do despacho, ou algum outro
oficial do S. Ofïcio: porem se paÍecer aos inquisidores, que convém dar a alguns
menores curador letrado, o poderão fazer,e sempre será um dos procuradores
dos presos.
7. Depois de feito o sobredito, será o pÍeso amoestado em mesa em
diferentes sessões, segundo o estado, em que estiver de negativo, de confesso,
ou diminuto, como separadamente se dirá nos títulos seguintes.

TÍTULo VI
Das amoestações, e das sessões que se hão defazer aos
presos negativos antes do libelo dajustiça

l. Antes de vir o Promotor com libelo por parte da justiça contra os presos,
que estiverem negativos, lhe farão os Inquisidores fiês admoestações, com
'distinção
de tempo em cada uma delas, e a primeira se fará na sessão da
genealogia; a segunda na sessão in gênero; e a última na sessão in espécie, todas
as sessões começarão na form4 que estiá declarado no Título '7, 5,8, do livro
primeiro; e na primeira, que se fzer com réu, se dirá, que o Inquisidor N. ou
Inquisidores (estando na mesa mais que um) mandarão vir perante si a um
homem, ou mulher, que a tantos de tal mês veio de tal parte para os cárceres do
S. Oficio: em todas se dará juramento ao réu para dizer verdade, e ter segredo,
e será perguntado, se cuidou em suas culpas, e as quer confessar para descargo
de sua consciênci4 e seu bom despacho; e sendo relapso, ou tendo culpas de
sodomi4 se dirá, para descargo de sua consciênci4 e salvação de sua alma. Se
ao tempo, que se fizer a sessão estiver na mesa mais de um Inquisidor, todos
os que se acharem presentes a assinarão, mas o que a fizer assinará no último
lugar, ainda que seja mais antigo.
2. A primeira sessão, que há de ser de genealogia, se fará ao preso dentro
em dez dias, depois de haver entrado nos cárceres; nela será perguntado por seu
nome, por sua idade, qualidade de sangue, que oficio tiú4 de que vivia, donde
é nafural e morador, que foram seus pais, e avôs de ambas as partes, quais tios
teve, assim paternos, como maternos e que irmãos, o estado, que uns, e outos
tiveram, se são casados, e com quem, que filhos, ou netos, tem vivos, ou
defuntos, e de que idade são, se é cristão batizado,e crismado, onde, e por quem
o foi, e quem foram seus padrinhos; e se depois que chegou aos anos de
discrição, ia às igrejas; se ouvia missa, e se confessav4 e comungava, e fazia
as mais obras de Cristão. Mandarão ao preso, que se poúa de joelhos, e que se
benza, e diga a doutrina cristã, a saber, o Padre nosso, Ave Maria, Credo, Salve
Raiúa, mandamentos da lei de Deus, e da Santa Madre lgreja, o que se fará"

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Regimento do Santo OJicio 1640
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ainda que o preso notoriamente seja pessoa de letras: será mais perguntado, se
saber ler, e escrever, se estudou alguma ciência, e onde; se tem algumas ordens,
se saiu fora do reino, e porque partes andou, e nele, em que terras esteve; com
que pessoas tratava, e comunicava, e se foi outra vez preso, ou penitenciado
pelo S. Oficio, ou teve alguns parentes que o fossem. Todas estas declarações
se tomarão com muita miudez4 e se escreverâ cada uma delas em regra
separad4 para que mais facilmente se possa achar pelas genealogias, o que por
elas se quiser saber. será mais perguntado, se sabe, ou suspeita a causa porque
foi preso, e trazido aos cárceres do S. Oficio, e dizendo que não, e que antes
presume, que o prenderam por algum falsotestemunho levantado por inimigos,
se lhe faná primeira admoestação na forma de estilo do S. Ofïcio, na qual lhe
não será declarada a qualidade das culpas, porque foi preso, e somente lhe será
dito, que está preso por culpas, cujo conhecimento pertença ao S. Oficio; e no
fim da sessão tornará o Inquisidor a admoestar o preso, que cuide em suÍts
culpas, e trate de ao confessar, de que o notário dará fe. Antes de ser recolhido
o preso, lhe lerá o Notrírio a sessão, dizendo no ftm, como lhe foi lida, e o que
ele respondeu depois de a ouvit, e logo será assinado por ele, se souber escrever,
e pelo Inquisidor ou Inquisidores que estiverem presentes; e não sabendo os
presos escrever, farão seu sinal acostumado; e sendo mulheres, que não saibam
escrever assinará por elas o Noüirio, declarando, que o faz de seu consentimen-
to.
3. E as pessoas, que não forem presas por culpas de heresia formal, se não
fará a sessão de genealogia por extenso, mas somente serão perguntadas, por
seu nome, idade, e qualidade, e pela de seus pais, e avós, se são Cristãos
batizados, e crismados, com o mais, que dai em diante fica apontado; e aos que
forem presos segunda vez, se perguntará somente por seu nome, e de seus pais,
e se mudaram de estado depois da primeira prisão; ou sendo casados, se tiveram
mais filhos, e depois de saírem do S. OÍïcio foram fora do Reino, e com que
pessoas trataram.
4. Na segunda sessão, que se fará dentro de um mês depois da prisão, será
o preso perguntado em geral por suas culpas, e pela crença, e cerimonia da lei,
ou seita, de que estiver delato, para que achando-se o culpado em alguma delas
o confesse, e trate do que convém à salvação de sua alma; e nossa sessão se
multiplicarão as perguntas, segundo a qualidade das culpas e cerimonias da lei,
ou seita, de que estrá indiciado; e depois de responder a todas elas, afirmando,
que não tem cometido culpas na matéria das perguntas que lhe foram feitas, se
lhe fará a segunda admoestação, na qual o Inquisidor se conformará com a
prática, e estilo do S. Ofício, tendo consideração à qualidade das culpas, porque
o réu esüi preso.
5. E sendo as culpas do judaísmo, será o réu perguntado pelas que cometeu
depois do último perdão geral; e se o réu estiver indiciado de alguma proposi-

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Sônia Aparecida de Siqueira

ção, ao ato herético pertencente a qualquer seita de hereges; será perguntado


em geÍal, se tem ou crê os erros da tal seita, e em particular pelas cerimonias,
que usam aqueles, que a seguem; se leu alguns livros, que a ensinem, se andou,
ou criou em terras onde a tal seita se professe, ou se tratou com pessoas, que a
sigam, e pelo mais que paÍecer conveniente, em razio da qualidade de suas
culpas.
6. Feitas aos presos negativos as sobreditas sessões de genealogia, e in
genere, se lhe farâ a terceira in espécie dentro do mais breve tempo, que for
possível; salvo se parecer aos Inquisidores por alguma causa justa, que convém
dilatar-se por mais tempo: nela serão perguntados em particular pelos ditos das
testemunhas, que contra eles houver na mesma forma, em que depuseram; e
havendo neles alguma circunstancia particular, pela qual se possa vir em
conhecimento da testemuú4 neste caso se calará a tal circunstancia; e quantas
forem as testemuúas, tantas perguntas se farão aos réus; salvo se algumas das
testemunhas forem contestes no mesmo ato; porque entllo se formará de
contrastes uma só pergunta.

7. Tendo o réu contra si pouca prova, se nos testemuúos houver verdade


de cerimonias, ou atos repetidos, de cada uma testemunha, se poderá fazer de
uma pergunt4 dividindo se o testemuúo, segundo no teor dele se permitir; e
nunca se fará pergunta ao preso de cois4 de que não esteja indiciado, nem de
testemunha que depuser de ouvida; e nas perguntas se guardará a forma do estilo
do S. Oficio; e acabadas as testemunhas se lhe fará a terceira admoestação, e
no fim dela se ordenará ao Promotor, que venha com libelo contra o réu, e para
o formar se lhe entregará o processo.

8. O promotor formará os libelos em nome da justiça e o primeiro artigo


será geral, conforme a qualidade das culpas, de que o réu estiver delatando, e
dirá nele, que sendo o réu cristiÍo batizado e como tal obrigado a,ter, e crer tudo
o que tem, crê, e ensina a santa Madre Igreja de Rom4 ele fez pelo contriírio,
e se passou a tal crença; ou seita, e sendo as culpas de judaísmo dirá que o réu
as cometeu depois do perdão geral. logo irá formando artigos pelas perguntas,
que foram feitas ao réu na sessão in espécie, dos ditos das testemuúas, e depois
formará artigo de fama, se houver testemunhas, que dela deponham; e em um
artigo particular argüíra o réu de não ter confessado suas culpas, sendo por vezes
para isso amoestado; e concluirá o libelo; pedindo recebimento, e que o réu seja
castigado como herege negativo, e pertinaz, com todo o rigor de direito, e
entregue à justiça secular. E quando as testemuúas não depuserem de heresia
formal, senão de indícios, e presunções dela, depois de formar os artigos dos
ditos das testemunhas, fará outro artigo, em que diga, que contra o réu resulta
presunção conforme a direito, que ele cometeu tal heresia, e concluirá o libelo
na forma sobredita. Confessando o réu em alguma das sobreditas sessões, ou

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depois do libelo lhe ser lido, se lhe tomará sua confissão, e se procederá em sua
causa na foÍma, que vai ordenado no título seguinte.

TÍTTJLo VII
De como se hão as confusões aos presos, e das omoestações
que se hão defazer antes de serem
acusados por diminutos

l. Porenquanto as confissões dos culpados no crime de heresia são o único


meio, com que podem merecer, que com eles se use de misericórdia, e o
principal fundamento, que tem o S. Oficio, para proceder contra as pessoas, de
que nelas se denuncia: ordenamos, que começando algum preso a confessar
suas culpas em alguma das sessões, de que estrâ dito no título precedente, ou
em qualquer outra parte de seu pÍocesso, os Inquisidores tomem por si essa
confissão, sem cometer a algum Deputado; salvo se for em tal tempo, e
estiverem tão gravemente impedidos, que ter aos que tiverem especial licença
nossa para as tomar, como fica dito no Livro 1, Título 3, $ 4. E isso mesmo, se
o preso, queestiverdoente, quisercomeçaraconfessarsuas culpas, ou continuar
sua confissão, um Inquisidor, o irá logo ouvir, sem meter tempo em meio, e
tomada a confissão, aratificarâna mesma sessão.
2. Tanto que algum preso disser, que quer confessar suas culpas os
Inquisidores o admoestarão particularmente, que lhe convém muito, assim para
bem de sua alma, como para seu bom despacho, dizer somente a verdade, sem
acrescentarnem diminuircoisaalgum4 não levantando, nem asi, nem aoutrem
falso testemuúo, porque se assim o não fizer, alem de não alcançar a miseri-
córdi4 que pretende por meio de sua confissão, se arrisca muito ao rigoroso
castigo, que no S. Oficio se costuma dar às pessoas, que de si, ou de outrem
dizem falsamente em suas confissões; e lhe farão saber, que está obrigado a
dizer de vivos, mortos, ausentes, presos, soltos, ou reconciliados, tudo o que
tiver com ele comunicado contra nossa Fé; e esta admoestação sempre se
lançará no processo por extenso, antes de se entrar na primeira confissão.
3. Tratarão os Inquisidores com grande cuidado, de examinar, e inquirir o
animo do confidente, se é verdadeiro, ou fingido, se faz sua confissão com
intento de escapar da pena, que merecia por suas culpas, ou com zelo de liwar
delas sua consciência, e de se converter à Fé de Cristo: se as coisas, que
confessa, são verosímeis, e de alguma maneira conforme com a prova dajustiça,
advertindo sempre no modo, e na ocasião, com que o preso confessa, e em que
tempo, fazendo, que declare todas as circunstancias, que podem fazer indicio
de ser a confissão verdadeira, ou simulada e deixando aquelas, que para este
efeito forem escusadas e impertinentes. Em primeiro lugar mandarão ao preso,
que declare a pessoa, ou pessoas, que lhe ensinaram os erros, de se acusa, o

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tempo, e o lugar, em que foi, as pessoas, que se acharam presentes, com toda a
miudez4 e o mais, que ali passou: se aceitou o tal ensino, e movido dele se
apartou de nossa S. Fé, e o declarou assim aos que estavam presentes, que
cerimonias, lhe ensinaram, em que forma se fazia, e até que tempo continuou
com elas, e lhe durou a crença dos sobreditos erros.
4. Se o preso em sua primeira confissão, ou em qualquer, outra, confessar
culpas cometidas antes do perdão geral, nem por isso se deixará de escrever, e
tomar a confissão, que delas fizer, mas no fim se fará declaração, que a tal
confissão se tomou por informação, e terá isto lugar na pessoas de nação dos
Cristãos novos, que gozarão do último perdão geral, que lhe foi concedido.
5. Quando o preso em sua confissão disser de pessoas, com que comunicou
seus erros se lhe tomarão as comunicações com muita miudeza, declarando
nelas, quanta parte tem de nação as pessoas, de que vão dizendo, e porque via:
donde são moradoras, que estado, e idade tem, se são solteiros; o tempo da
declaração, o mais ao certo que for possível, escusando sempre de o tomar com
alternativa, com mandar aos presos, que cuidem, e lancem conta aos anos, de
modo que ajustem as confissões com a verdade, quanto a memória lhe permitir:
a ocasião, que houve paÍa se declarar, se o fizeram mais que umavez,e quando
foi a última; se os cúmplices são vivos, ou defuntos, se foram presos pelo S.
Ofício, e se a comunicação foi antes ou depois de o serem; se tem com eles
razão de parentesco, se declaram quem os ensinou, ou as pessoas, com que,
comunicavam, e no fim de cada sessão lhe farão declarar aÍazÃo, que houve
para se fiarem uns dos outros e tudo o que tiverem que dizer ao costume. E
quando na mesma comunicação disser de muitos cúmplices depois de se
haverem tomado com suas confrontações, e que se passou na comunicação,
serão segunda vez repetidos por seus nomes, e após isso se continuará a
declaração, que com ele teve.
6. Se o preso depois de confessar suas culpas, no discurso de sua confissão
acrescentar mais cúmplices em alguma das comunicações, que tem declarado,
ou depuser de outras diferentes em substancia, e no lugar, a respeito das pessoas,
de que tem dito, os Inquisidores se não contentaram em remeterem umas
comunicações a outras, antes farão, que o preso declare particularmente em
cada uma os nomes de todas as pessoas, que se assinaram presentes, posto que
tenha dito a substancia da culpa, que cometeram, e assim mais lhe farão declarar
o tempo, e lugar, em que tiveram a declaração, com todas as circunstancias, que
paÍecerem necessárias paÍa os testemunËos ficarem claros, e confundentes, e
as publicações, que deles houverem de sair, se puderem fazer com certez-a.

7. Posto que o preso continuando sua confissão diga algumas coisas


encontradas e repugnantes entre si, ou inverossímeis, os inquisidores lhe não
interromperão a confissão com perguntas, e replicas, e somente de palavra lhe

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poderão dizer, que o que mais lhe convém, é dizer em tudo verdade, e
descarregar sua consciência; mas depois de tomada a confissão, e ratificação
na mesma forma em que estiver feit4para que não aconteça ficar por ratificar,
revogando-se o preso, quando vir que o examinarão por ela; e depois disto em
diferente sessão metendo algumas audiências em meio, examinarão ao preso
pelas contradições, repugnância, e inverosimilidades de sua confissão, e no fim
desta sessão será admoestado na forma, que se diz no $. seguinte, juntando à
admoestação o que parecer conveniente, em razío das ditas contratações,
repugnâncias, e inverosimilidades.
8. E não se podendo tomar toda a confissão ao preso na primeira audiência,
lhe será dito no fim dela, que examine bem, sua consciência, para continuar
sua confissão, e os inquisidores terão cuidado de lha ir tomando sem meter
tempo em meio. E depois do preso dizer que não tem mais o que confessar, lhe
dirão, que tomou muito bom conselho em começar confessar suas culpas, que
lhe convém traze-las todas à memória, e declarar inteiramente as verdades
delas, e todas as pessoas, com quem as comunicou; porque fazendo-o assim,
salvará sua alma, e se porá em estado de com ele se usar de misericórdia.

9. No tempo, em que os presos forem confessando, se terá particular


advertência no modo, com que confessam, como está dito, e se dão mostras, e
sinais de arrependimento, e verdadeira contrição e de falar verdade no que
disseram de si, e contra cúmplices, ou se pelo contrário neles se viram indícios
de impenitência, e de não ser verdade o que tem dito, e depois de assinada a
sessão, e recolhido o preso a seu cárcere, mandará o Inquisidor ao Notiírio, que
dê fe de tudo o que se passou, e declare particularmente por termo cada um dos
sinais, e mostras acima referidas; e o juízo, que ambos formarão da confissão
do réu, para que a todo o tempo possa constar do credito que se lhe deve dar,
assim no que faz contra ele, como no mais, que tem dito contra outras pessoas;
o qual termo assinará o Inquisidor, ou Inquisidores, que assistirem na confissão.

10. Tomada a confissão, e examinados os presos pela verdade dela, se lhe


fará sessão de genealogia, se antes de começarem a confessar, lhe não estiver
feita, a qual será em tudo conforme a que se faz aos presos negativos, e não se
dilatarâ por muitos dias; e parecendo aos Inquisidores, que a confissão é
diminuta nesta sessão, lhe farão a primeira admoestação, na forma do estilo, e
pratica do S. Ofício, advertindo-os, que com a confissão, que tem feito, não
satisfazem à informação, que há de suas culpas, e animando-os a continua-la,
não impondo sobre si nem sobre outrem falso testemuúo. E tendo o preso com
sua confissão satisfeito à informação, que contra elahâ,lhe será dito somente,
que trate de examinar sua consciência, e achando-a carregada de alguma coisa
mais, a veúa manifestar, estando certo, que se usará com ele de muita
misericórdia.

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1 1. Depois da sessão de genealogi4 se fará sessão de crenç4 na qual será

o preso perguntado pelo tempo, em que se apartou da nossa santa Fé, e se passou
à crença dos erros, que tiver confessado: por quem lhos ensinou, e cerimonias
que fez, repetindoJhe de palavras as que se contem na sessão in genere do
negativo; e em que Deus cria no tempo de seus eros; que orações rezava, a
quem as oferecia; e dizendo de algumas orações, que não sejam as da igrej4 se
tomarão todas por extenso; se cria no mistério da santíssima Trindade e em
Cristo nosso seúor, e se o tiúaporverdadeiro Deus, e Messias prometido na
lei dos Judeus, ou se esperava ainda por ele, como os judeus esperam; se cria
nos Sacramentos da santa madre Igreja, e os tinha por bons, e necessários para
salvação da alma, se lhe fez alguma irreverência, principalmente ao da Euca-
ristia: se tomava os sacramentos, e fazia as mais obras de Crist2Ío, e com a tengão
asfazia; se confessava os erros, que tem declarado a seus confessores, e os tinha
por tais; se sabi4 que ter crença na lei de Moisés, ou seguir os erros, que tem
confessado, eÍa contra o que tem, crê, e ensina a santa madre Igreja de Roma"
e contra o uso comum dos Católicos Crist2ios; até que tempo lhe durou a crença
de seus erros, e que o moveu a apresentar-se deles e em que crê de presente. E
se o réu for sacerdote, será mais perguntado, se quando dizia miss4 ou
ministrava os sacramentos do batismo, e penitencia, tinha intenção de consa-
gr ar, b atizar e absolver.
12. Todas as perguntas, e respostas, que os réus derem a cada uma delas,
na sessão de crenç4 se escreverão por extenso; e tendo o réu satisfeito a
informação da justiga, e assentando bem na crença de seus erros, se lhe dirá o
que fica dito no $ 10 precedente. E tendo; e quando não tiver satisfeito, ou não
assentar bem na crença, se lhe fanâ a segunda admoestação, na qual a advertirão
em particular, das faltas de sua confissão, repugnâncias, contradições, e inve-
rosimilidades, que dela resultarem, escrevendo-se fudo por extenso, e admoes-
tando-o da parte de Cristo N. S. trate de confessar toda a verdade, e emendar
as faltas, de que foi advertido-o para merecer, que com ele se use da misericór-
dia, que pretende.
13. As confissões dos presos se radicarão ordinariamente, antes de lhe ser
feita sessão de crença; salvo se por algum respeito parecer necessiírio aos
inquisidores fazer-se a ratificação em outro tempo; e em todo o caso, adoecendo
no cárcere algum preso, que teúa confessado suas culpas, os inquisidores o
irão ratificar tanto que adoecer, e farão declarar na ratificação o lugar, em que
se fez, e a causa, que para isso houve.
14. As ratificações se farão em presença de duas pessoas eclesiásticas, das
aprovadas por nós para efeito, na forma, que fica dito no livro primeiro Título
3, $ 21, as quais se darájuramento para dizerem verdade, e guardarem segredo,
e diante delas se perguntará ao preso, se está lembrando das pessoas, de que
tem dito em sua confissão, e do que contra elas tem testemuúado, depois de

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declarar a substancia de sua confissão, e as pessoas, de que se lembrar, lhe serão
lidas com clarez4 e distinção todas as sessões, em que tiver confessado,
declarando-as no termo da ratificação, e o dia, mês e ano em que cada uma foi
feita, e depois de lidas lhe perguntarão se são aquelas suas confissões, se estl[o
escritas na verdade, assim, e de maneira que ele as fez, e se passa na verdade
tudo o que nela se contem, se tem alguma coisa, que declarar, acrescentar,
diminuir, ou emendar nelas, se o afirma, e ratifica assim, e torna a dizer de novo,
sendo necessário, por tudo passar na verdade; e se tem alguma coisa, que
declarar ao costume: e tudo escreverá o Notrário na forma referid4 e assinará o
preso, sabendo escrever, ou fazer seu sinal; e não sabendo, assinará o Notrário
por ele de seu consentimento com os Inquisidores, e com as pessoas, que
assinarem à ratificação: e mandando recolher o preso, serão perguntadas sob
i cargo do juramento, que receberão, se lhe paÍece que falou verdade no que
confessou, segundo o modo, com que o viram, e ouviram dizer, e o que
responderem se escreverá em termo apartado ao pé da ratificação, que será
assinado pelos inquisidores, e pelas pessoas eclesiásticas. Fazendo-se as ratifi-
cações em tempo, e lugar onde se não possam comodamente achar pessoas
Eclesiásticas paÍa assistirem a elas, se poderão admitir pessoas seculares,
contanto que sejam de boa consciência" vida, e costumes.
15. Não satisfazendo o réu inteiramente à informação da justiç4 nem
emendando as faltas, que há em suas confissões, depois de ratificado nelas, e
de lhe ser feita sessão de crença, se lhe fará sessão in espécie, na qual será
perguntado pelos ditos das testemuúas, em que estiver diminuto, ou por não
dizer das mesmas testemunhas, ou por não declarar os cúmplices, e cerimonias,
que elas lhe dão, ou o tempo da comunicação, sendo a falta dele, e das
cerimonias considerável: e nas perguntas lhe será declarado o tempo certo, de
que depõe as testemunhas, mas não será perguntado por causa de que não esteja
indiciado, nem haja dado ocasião com sua confissão; e não satisfazendo-se lhe
fará a terceira admoestagão, declarando-lhe, que há de ser feita antes do libelo
da justiga; e nesta admoestação o tornarão a advertir de todas as faltas,
contradições, repugnâncias, e inverosimilidades, como fica dito na sessão da
crença; e se nem ainda então satisfizer, sendo assim advertido, mandarão ao
promotor, que veúa com libelo contra ele, e para esse efeito se lhe entregará
o processo.

16. O Promotor, tanto que o processo lhe for entregue, formará libelo contra
o réu no qual o primeiro artigo será conforme ao primeiro dos negativos, de que
fica dito no Título 6, $ 8, e no segundo dirá que em tanto é verdade o sobredito,
que o réu o tem confessado, e no terceiro porâa substancia de suas confissões,
tomando-a dos lugares do processo, em que o réu a fez" e dtÍá, que as aceita
enquanto fazemcontra ele: no quarto artigo articulará em geral as diminuições,
encontros, e inverosimilidades, que houver nas confissões, e logo irá formando

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os artigos necessários, confonne as perguntas, que na sessão in espécie se


fizeram ao réu dos ditos dastestemunhas, e no último argiiiráoréu de não acabar
de confessar sendo amoestado para isso, e concluirá pedindo recebimento, e
que o réu, como fito, e simulado confidente diminuto, seja castigado com todo
o rigor de direito, e entregue à justiça secular.
17. Se o réu, que tem satisfeito com sua confissão houver de ser acusado
só em razão da pena, que se lhe há de dar, o promotor formará os primeiros três
artigos do libelo na forma dos confidentes diminutos, e concluirá pedindo, que
o réu seja castigado com todo o rigor, que merece, conforme a disposição de
direito; e esta mesma conclusão porá em todos os libelos, em o réu não tem
pena capital por razão de seu delito.

TÍTuLo Vm
Da apresentaçõo do libelo dajustiça,
e defesa dos réus

1. Tanto que o Promotor tiver feito libelo contra algum réu, dará na mesa
conta disso aos Inquisidores, os quais mandarão vir o preso perante si, e lhe
dirão, como o Promotor o quer acusar por parte dajustiça, e vir contra ele com
libelo; que trate de confessar a verdade de suas culpas, e que será melhor para
seu despacho, e para alcançar mais misericórdia, confessa-los antes, que depois
dele; e esta admoestação se tomará por terÍno no processo; e se com tudo sendo
negativo, persistir na contumácia de sua negação, ou não satisfazer a suas
diminuições, sendo confidente, será chamado o promotor à mesa" e estando o
réu em pé, lerão libelo dajustiça, e lido ele, e entregue ao inquisidor, que fizer
a audiênci4 que logo o receberásiet in quantum, se recolheú para o secreto; e
depois de recebido o libelo, darâo Inquisidor juramento ao réu paÍa contestar,
e logo mandará ao Notiário, que segunda vez lhe leia cada um dos artigos de
por si, e ao réu, que separadamente vai respondendo a eles; e tudo o que disser,
e responder se escreverá nos autos.
2. Na mesma audiência perguntará o Inquisidor ao réu se tem defesa, com
que vir, e se quer vir com ela; e dizendo que sim, lhe nomeará os advogados,
que costumam procurar pelos presos, para que faça procuração a todos, e a cada
um in solidum; salvo se disser, que tem pejo em algum deles, porque neste caso
fará procuração aos outros; e dizendo, que tem pejo em todos, e pedindo, que
lhe dêem outro, os Inquisidores mandarão tomar seu requerimento no processo,
e declarar nele as causas que o preso alegar para não aceitar os procuradores
ordiniários, e de fudo darão conta ao Conselho geral, para se prover no caso
como parecer justiça.
3. Sabendo o réu ler, se mandará dar o traslado do libelo, paÍa que inteirado
do que nele se contem, possa dar melhor informação ao Procurador, que lhe há

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t Regimerúo do Santo O/ícío


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de formar sua defesa; porem sendo o réu pessoa ústica, ou de pouca capaciclade
e que não saiba ler, lhe sená declarada com muita miudez4 e substancia do
libelo, e o traslado, mandarão os Inquisidores dar a seu procurador, quando
houver de estar com ele.
4. Se o réu pedir papel para fazer suas lembranças das coisas, de que se
quer ajudar em sua defesa, os Inquisidores lho mandarão dar, com tida, e pena
para escrever, o que lhe for necessário, e as folhas que lhe derem, serão
rubricadas por um Notiário, que fará termo no processo, de quantas foram, e as
mesmas tornará a entregar, ou escritas, ou em branco, tanto que vier com sua
defesa, e no processo se fará descarga delas à margem do dito termo; o que se
guardará inviolavelmente pelos inconvenientes, que sepodem seguirde ficarem
com papel os presos no cárcere.
5. Depois de ter o réu bastante tempo para deliberaÍ em sua defesa, o
mandarão os Inquisidores trazer à mesa onde também será chamado um dos
procuradores, que tiver feito, ao qual em presença do preso darão notícia por
maior do estado de sua causa, e qualidade de suas culpas, e juramento dos santos
evangélicos, e lhe encarregarão, que defenda o réu bem, e verdadeiramente,
requerendo, alegando em seu favor tudo o que entender faz a bem de suajustiç4
advertindo-lhe mais, que se pelo discurso da causa alcançar, e se persuadir, que
o réu se defende injustamente, desistirá dela, e o virá declarar na mesa; e de
tudo se fará logo termo, que o procurador assinará em presença do preso, e do
Inquisidor, que der a audiência.
6.Tendo o procurador aceitado a causa e assinado o dito termo, se recolhená
com o preso na casa, que lhe for ordenado, para ali lhe formar sua defesa; e
enquanto com ele estiver lhe assistirá o Meiriúo do S. Oficio, ou um dos
solicitadores, sendo ele impedido, o que assim se guardará todas as vezes que
o preso houver de estar com seu procurador.
7. Se o réu disser, que para formar sua defesa lhe importa saber o tempo,
e lugar do delito, e pedir, que deles lhe façam declaragão, posto que o lugar
próprio de a pedir era quando viesse com contraditas as testemunhas, com tudo
os Inquisidores por seu despacho mandarão ao Promotor, que lhe faça a tal
declaração na forma de direito, e estilo do S. Ofício, e em nenhum caso a farão
de palavra" por alguns inconvenientes, que pode haver se o réu a pedir na mesa
logo depois de acusado, lhe será dito, que a peça por seu procurador, e que então
lhe diferirão como forjustiça.
8. Quando o réu confidente acusado por diminuto pedir, que lhe dêem vista
de suas confissões, para tratar com seu procurador, do que importa a sua
defensão, os Inquisidores o mandarão vir à mesa juntamente com o procurador,
e por um dos Notários lhe será lido tudo o que teve confessado somente de si,
calando o que toca aos cúmplices.

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Sônia Aparecida de Siqueira

9. Como o procurador tiver formado a defesa do réu, segundo o que está


disposto no Livro l, Título 9, atrarâ à mesa com o traslado do libelo, que lhe
foi dado, e os inquisidores mandarão juntar tudo ao processo, o qual com o
termo da apresentação, e artigos de defesa, se fará concluso, e se verá em mesa"
e sendo a defesa de receber, pronunciarão, que a recebem si et in quantum, e
mandarão, que se perguntem as tesúemunhas para prova nela nomeadas, que
não passarão de quafuo em cada artigo: e sendo moradores fora do lugar onde
assiste o S. OÍïcio, farão passar comissão païa a pessoa, que as houver de
perguntaram e sempre trabalharão, que as testemunhas nomeadas pelo reu,
sejam brevemente examinadas, e posto que não sejam maiores de toda a
exceção, nem por isso deixarão de ser perguntadas, e à final se lhe dará o credito,
que conforme a direito merecerem; e parecendo, que a defesa não é de receber,
assim pronunciará por despacho no processo do réu, que lhe será publicado.
10. Quando o réu em sua defesa articular, que é Cristão velho, alem de se
haverem de perguntar as testemuúas, que para isso nomear, mandarão os
Inquisidores no mesmo despacho da defesa do réu, ex-fficio, fazer e><ata
diligencia sobre sua qualidade, assim no lugar donde ele fornatural e morador,
como também nos lugares onde foram naturais seus pais e avós; e paÍa esta
diligencia, se passará comissão separada, com a qual se juntará ao processo
depois dejunta, a que se fizer pelos artigos da defesa do réu.
11. E se o réu confidente, por seu procurador disser que não tem defes4
com que vir, sejuntará ao pÍocesso a declaração, que o procurador nisto fizer
com o traslado do libelo, na forma, que fica dito, e feito tudo concluso,
pronunciarão os Inquisidores, que o lançam da defesa, com que pudera vir, e
que o processo se continue em seus termos ordinários.

12. E dizendo o réu por seu procurador, que quer confessar suas culpas, ou
continuaÍ sua confissão, junta esta declaração ao processo, o mandarão os
lnquisidores vir à mes4 e lhe tomarão a confissão, e no termo da sessão irá
declarado, que o mandarão vir perante si, por dizer por seu procurador, que
queria confessar suas culpas, ou continuar a confissão, que havia feito; e no fim
da sessão será perguntado, se quer ainda vir com defesa; e dizendo, que não,
será lançado no mesmo termo; mas dizendo, que tem defesa, com que vir,
tornará a estar com seu procurador.
13. Quando o réu, depois de lhe ser lido o libelo dajustiça, disser, que não
tem defesa com que vir, ou que não quer vir com ela; se for negativo, os
Inquisidores exficio,lhe mandarão, que faça procurador, para se poder defen-
der; e o mesmo se guardará sendo confidente diminuto, e tais as diminuições
porque foi acusado, que justamente se possa duvidar, se será recebida sua
confissão; porem sendo as diminuições de pouca consideração, se o réu disser,
que não quer usar de defesa, o lançarão dela no mesmo temo, o mandarão, que

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Regimento do Santo Ofuio 1640
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o processo se continue em seus termos ordiniários. e não querendo o réu fazer


procurador, ou seja negativo, ou confidente, com tais diminuições que haja
alguma duvida de ser recebida sua confissão, os Inquisidores, o mandarão estar
com um das advogados, o qual dirá por escrito, o que passou com o réu, e não
vindo com defesa; se lhe parecer, que as culpas são de qualidade, que a elas se
deve fazer defesa, ex-fficio, a mandarão fazer; e não lhe parecendo necessário,
o lançarão dela por seu despachor porem em quaisquer termos, que o processo
estiver, se o réu tornar a diznr, que quer vir com defesa, será admitido a ela,
como também será admitido qualquer réu a acrescentar a defesa com que tem
vindo.
rÍrurox
Da publicação da prova da justiça

1. Depois que os inquisidores tiverem deferido à defesa, e ratificadas as


testemunhas, que contra ele houver, requererá o Promotor, que lhe façam
publicação delas, e tomado seu requerimento por termo nos autos, lhe respon-
derão, que no que pede se proverá com justiça; e logo tirarão por si a publicação
dos ditos das testemunhas, na mesma forma, em que houver, deposto, calando
os nomes delas, e o dia" mês e ano em quetestemuúaram, fazendo computação
do tempo, em que a testemunha diz, que o réu cometeu o delito até aquele, em
que se faz a publicação, não declarando o lugar, onde o delito se cometeu, mas
dizendo, que foi em certa parte. havendo no testemuúo cúmplices, se dirá na
publicação que o réu se achou em companhia de certas pessoas de sua nação;
e não havendo cúmplices, se dirá, que se achou com certa companhi4 referindo
por extenso o teor do testemuúo, calando porem as circunstancias, por que se
possa vir em coúecimento da testemuúa; e no fim de cada uma irá declarado
se diz ao costume, ou dizendo, que disse nad4 ou o que se contem em seu
testemunho; à margem se poná o nome da testemuú4 com o dia" mês e ano,
em testemunhou, e o número de cada uma delas, e a publicação será assinada
por todos os Inquisidores, que se acharem presentes. Se o testemuúo for largo,
e se puder dividir, se fará a publicação por capítulos, dizendo; disse mais a
mesma testemunha; e teúo deposto em diferentes sessões de diversas comu-
nicações, se dirá; disse mais a mesma testemuúa jurad4 e ratificada na forma
sobredita: e se a testemunha depois de publicado seu dito, tornar a dizer do reu,
quando se lhe publicar o segundo dito, irá declarado, que há uma testemuú4
das quejá foram publicadas ao réu.

3. Havendo alguma testemuúa deposto contra a réu de culpa cometida no


ciírcere do S. Ofício, se lhe fará publicação dela, tomando o tempo cinco ou
seis meses atrás de sua prisão, dizendo-se que de tanto tempo a esta parte, e
ter-se-á muito particular advertência, que na publicação se não declare circuns-

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Sônia Aparecida de Siqueira

tancia alguma, porque o réu possa vir em conhecimento do lugar, em que a


culpa, de que a testemunha depõe foi cometida.
4. Em caso, que ao réu se forme culpa por algumas certidões, sentenças,
ou algum outro instrumento, se lhe fará publicação do teor dele, para que de
todo o modo possa tratar de sua defesa, dizendo-se que consta por uma certidão,
sentença" &c. mas sendo possível reduzir as certidões, sentenças, ou instrumen-
tos, a testemuúos judiciais, assim se fará, para que com mais clareza, se faça
publicação delas.
5. Se o réu confidente acusado por diminuto satisfizer à informagão da
justiça antes da publicação das testemunhas, não se lhe publicarão seus ditos,
e o mesmo se guardará, se depois de feita publicação lhe acrescerem por
testemunhas algumas das pessoas de quem tem dito em sua confissão; porem
quando o reu for pessoa de bom juízo, e tiver feito estreita confissão, e parecer
aos inquisidores, que de lhe ser feita publicação não pode resultar prejuízo
algum, antes esperar-se fruto, nesse caso, posto que tenha satisfeito, se lhe fará
publicação das testemuúas, que contra ele houver, como também se fará das
que lhe acrescerem, depois de feita a publicação, se delas não houver dito.
6. Não se fará publicação ao réu das testemuúas dajustiça, senão depois
de estarem ratificadas, e se houver deferido à sua defesa; salvo se algumas forem
mortas, ou não se puderem ratificar por estarem ausentes, porque nestes casos
se fará publicação, ainda que não sejam ratificadas, e nelas se dirá somente
uma testemunha da justiça jurada na forma de direito; nem outros se daní
publicação de testemunhas, que vagamente testemuúarem de ouvida; porem
se forem de fama pública, ou seja de alguma heresi4 ou de algum outro delito,
ou de algum ato especial, e ela estiver provada com as qualidades, que de direito
se requerem sendo as testemunhas ratificadas, se fará publicação delas.

7. Se os Inquisidores duvidarem do credito de alguma testemuúa, para


que não aconteça, que sendo falsa, se faça dela publicação ao réu; antes de se
lhe publicar, se verá seu testemuúo em mesa com cinco votos ao menos e
assentando-se pela maior parte deles, que a prova, ou indícios da falsidade são
tais, que a testemuúa não merece neúum credito, fazendo disso assento no
processo, não se fará publicação dela; mas paÍecendo, que sem embargo da
dúvida, que havia, a testemuúa não perdeu o credito de todo, não deixará de
ser publicada; o mesmo se guardará no testemunho da testemuúa, que se
revogar.
8. Sendo o réu acusado antes de haver confessado suas culpas, e confes-
sando-as antes de lhe ser feita a publicação se satisfizer de modo, que não haja
de ser acusado por diminuto, não se lhe faú publicação das testemuúas; e se
começar a confessar depois de lhe ser feita publicação de alguma testemunh4
ou testemuúas, e depois for acusado por diminuto, não lhe tornarão a publicar

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57 (392) : 69j-883, jul./set. I 996.


Regimento do Santo O/ício 1640
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ìi as testemunhas,quejá estavam publicadas, posto que esteja diminuto em todas,


s:
ou alguma delas, ou cúmplices, ou nas cerimonias, que lhe dão; mas somente
ü
,t lhe farão publicação das testemunhas, quede novo lhe acrescerão, se em alguma
\":
delas estiver diminuto, e não lhe havendo acrescido algum, lhe será feita uma
admoestação, em que se lhe declarem as faltas, e diminuições de sua confissão,
para que trate de as emendar e satisfazer a elas.
9. Estando tirada a publicação, mandarão os Inquisidores trazer perante si
o réu, e lhe farão saber, que o promotor do S. Ofício requer, que se publique a
prova da justiça" que conta ele há e que lhe será melhor, e alcançará mais
misericórdia, se confessar suas culpas antes da publicação, que depois del4
admoestando com caridade o queira assim fazer, pois tanto lhe convém para
salvação de sua alm4 e seu bom despacho; e não querendo confessar, o
mandarão levantar, e estando em pé, lhe lerá o Notário a publicação, com
advertência, que o réu não possa dar fe dos nomes das testemuúas que estÍio
escritos a margem dela.
10. Lida a publicação, se dará juramento ao réu para responder a ela com
verdade, e depois de o receber, será perguntado se é verdade o que as testemu-
nhas dajustiça contra ele depõem, e respondendo, que não, lhe perguntarão os
Inquisidores, se tem algumas contraditas com que vir; e dizendo, que si, se
mandará recado a seu procurador, e ao réu se dará o traslado da publicação
concertado com um Notário, o que tudo se continuará ao mesmo termo, que o
réu assinará com o Inquisidor, que lhe frzer aaudiência.
11. Dizendo o réu, que não tem contraditas, ou que não quer vir com elas,
se for negativo, se lhe diná, que isso responda por seu procurador, com o qual
o mandarão estar; e se for confidente diminuto, e a diminuição for de pouca
consideração, o lançarão no mesmo termo das contraditas, com que poderá vir;
porém se a diminuição for considerável, ex-ficio, se mandará, que esteja com
seu procurador para o aconselhar no que lhe convém, e requerer por ele o que
fazer abem de suajustiga.

12. Se o réu não tiver feito procurador na defesa, porque não quis vir com
ela, nem de presente o que fazer, para vir com contraditas, nos casos referidos,
o mandarão os Inquisidores estar com um dos advogados, a quem primeiro
informarão do estado de sua causa, para que o aconselhe, e encaminhe no que
bem lhe estiver; e de tudo mandarão fazer termo no processo, ao qual se juntará
o que o advogado responder, depois de haver estado com o réu; e o mesmo se
guardará todas as vezes que se lhe fizer nova publicação da prova" que lhe
acrescer.

13. Pedindo o réu papel parafaznr suas lembranças para as contraditas, ou


declaração do tempo, e lugar do delito neste livro no Título 8, $ 4 e 7.
(
\ R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 69i-883, jul./se t. I 996.
Sônía Aparecida de Siqueira

{
TITULO X
Das contraditas

I . Tanto que for publicada ao Réu a prova dajustiç4 e dada tempo bastante
para cuidar em sua defesa" os Inquisidores mandarão vir à mesa, onde será
amoestado confesse suas culpas, como lhe convém para bem de sua alma e seu
bom despacho; e dizendo, que não tem culpas que confessar, nem contraditas,
com que vir, ou que não quer vir com elas, se guardará o que fica dito no fim
do título precedente; e se com tudo disser, que está aparelhado para vir com
suas contaditas às testemuúas, que contra ele depuseram, o mandarão estar
com seu procurador, o qual continuará com ele, até todo de lhe formar as
contraditas, e como as tiver feitas, as assinará com o próprio Réu, e em mesa
as oferecerá em seu nome, e os Inquisidores as mandarão juntar ao processo, e
fazer termo de como se apresentaram.
2. Juntas as contraditas ao processo, será o Réu chamado à mes4 e lhe
mandarão os Inquisidores, que nomeie testemunhas para prova delas, e logo lhe
irão lendo os artigos, cada um por si, e acadaum deles poderá nomear até seis
testemunhas; e será o Réu advertido, que faça nomeação em Crisüio velhos, e
que não sejam seus parentes dentro do quarto grau, nem seus familiares, ou
pessoasi infames, e que fossem presas pelo S. Ofïcio, nem ausentes em lugares
remotosn que não possam ser perguntadas sem grande dilação; porém sendo a
matéria da contradita de qualidade, que se não possa provar por outras pessoas,
e afirmando o Réu com juramento que não tem outra que dar par prova dela;
neste caso se lhe admitirão quaisquer que nomear; e no despacho final se lhe
dará o credito que merecerem. E se a matéria da contradita for tal, que aos
Inquisidores paÍeça, que conforme a direito, para prova dela, não bastarão as
testemunhas nomeadas, mandarão ao Réu, que nomeie mais, até o número que
houverem por bastante; e isso mesmo se guardará nas testemuúas, que houver
de nomear, para prova das contraditas, que contém defesa cortada; e em caso
que algumas pessoas das que o réu nomear para prova de suas contraditas sejam
falecidas, ou ausentes, lhe mandarão nomear outras, não lhe declarando arazáo,
que para isso tem.
3. Feita a nomeação das testemunhas, para prova das contraditas, se dará
ao Réu juramento dos Santos Evangelhos sob cargo do qual farão declarar, se
o que articula passa na verdade, e vem com elas bem, e verdadeiramente, por
entender que fazem a bem a sua justiça, e não a fim de dilatar o procedimento
de sua causq e se depois de passar o que diz, falava, e comunicava com as
pessoas recusadas, tratando-se como amigos, ou se perseverarão sempre na
mesma inimizade; e a resposta, que o Réu der, se estenderá" por termo, o qual
assinaná com o Inquisidor.

790 RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):69j-88j,jul./set. 1996.


Regimento do Santo Oficio 1640
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4. Com este terÍno se fará o processo concluso, ejuntos os Inquisidores em


mesa, ou ao menos dois deles, verão as contraditas, e receberão todos os artigos,
q.
que tocarem nas testemuúas da justiç4 ou sejam impugnadas por defeito
pessoal, ou por qualquer outro, ainda que não concluam inimizade capital; nem
sejam tais, que provados tirem todo o credito das testemunhas: e bem assim
receberão os artigos, que posto que não toquem diretamente às testemunhas,
todavia contem matéria, que provada diminuirá seu crédito; e neste caso se dirá
no despacho atazáo, e a causa, que houve pÍìra se receberem, dizendo, que se
recebe tal artigo, por tocar em tal testemunha, e quanto parente de N. nele
contraditado. Outro si receberão todos os artigos, em que o réu corta o tempo,
e lugar do delito, ainda que em respeito do tempo sejam formados com
incerteza de pouco mais, ou menos; e quando o processo se despachar em final,
se verá quanto a prova assim feita, deve diminuir do crédito da testemunha; e
em neúum caso receberão os Inquisidores contraditas, que direta ou indireta-
mente não tocarem nas testemuúas, nem aquelas, que provadas não ajudam a
defesa do Réu.
5. Oferecendo o Réu em sua defesa, por seu procurador contraditas de
algum parente seu, que estej4 ou estivesse preso; depois de se deferir às
próprias, no mesmo despacho se deferirá as que assim forem oferecidas,
recebendo-se delas artigos, que na forma sobredita fizerem a bem de sua causa;
e estando feita prova aos artigos, que destas forem recebidos, se mandará
trasladar com os mesmos artigos e juntar tudo por apenso a seu processo, e não
estando ainda feita prova, se fará, ou manlará fazer, e juntar na mesma forma;
contanto porém que se a pessoa, que veio com os tais artigos, estiver ainda presa
nos cárceres, a prova se fará em seu nome; mas estando solta, se fará em nome
do Réu, acomodando-se para isso os artigos de maneira que se não entenda que
foram feitos em nome de terceiros
6. O despacho, porque as contraditas do Réu, ou alguns artigos delas forem
recebidos, lhe não será publicado, para que de nenhum modo possa vir em
coúecimento das pessoas, que contra ele testemunharão; porém quando de
todo não forem recebidas, se lhe publicará o despacho; salvo se da publicação
dele se receaÍ, que possa alcançar o Réu quem foram as testemunhas, ou se
seguir algum outro inconveniente considerável. se o Réu tiver vindo com
contraditas, primeiras, segundas e terceiras, &c. e em um só despacho se deferir
a todas, posto que de algumas delas lhe não seja recebido em nenhum artigo,
como se recebam artigos de outras, não lhe será publicado o despacho; e se
depois de se deferir algumas contraditas, vier com outras, as quais lhe não sejam
recebidas, ainda que lhe recebam alguns artigos daquelas, com que de antes
tinha vindo, se lhe publicará o despacho, declarando-lhe, quais contraditas são
as que lhe não recebem; salvo se desta publicação se seguir algum inconvenien-
te, como fica dito.

R IHGB, No de Janeiro, I 57(j92): 693-883, jul./set. 1996. 791


Sônia Aparecida de Siqueira

7. Das pessoas nomeadas pelo Réu paÍa prova de suas contraditas, se


perguntarão três somente em cada um dos artigos exceto nos de cortada; porque
nestes se poderão perguntar as mais, que parecerem necessárias, contanto que
não seja o número excessivo; e sendo moradores no lugar onde reside o S.
Ofício, os Inquisidores as perguntarão por si; e se moraÍem em algum dos
lugares de seu distrito, mandarão passar comissão aos Comissrários do S. Oficio,
para serem perguntadas por eles; porém se o caso for tal, que lhes pareça
necessário, para melhor averiguar a verdade, cometer a diligencia a algum
Deputado, nos darão primeiro conta, e seguirão o que lhe ordenarmos; e sendo
de outro distrito, passarão carta requisitória aos Inquisidores dele, os quais com
todaabrevidade farão, oumandarão fazeras diligencias, queporeles lhesforem
pedidas; e residindo fora do reino, mandarão passar comissão, ou requisitórias,
conforme aos lugares aonde estiverem.
8. Achando os inquisidores que algumas testemuúas nomeadas pelo réu,
para os artigos recebidos são mortas ou ausentes, e que não fica número bastante
para prova deles, mandarão vir o réu à mesa, e lhe dirão, que é necessiário
nomear mais testemunhas aos artigos de contraditas com que tem vindo, os
quais lhe serão todos lidos, e as testemuúas, que a eles tem nomeado, para
acrescentat as que mais lhe lembrarem; o que se fará com tanta cautel4 que o
réunãopossavirem coúecimento dos artigos recebidos, nem das testemuúas
da justiça, que neles se impugnam

9. Posto que o réu, quando vem com suas contraditas, diga que não tem
mais algumas, com que vir, se todavia depois pedir procurador para formar
outras, fazendo-se disso termo no pÍocesso, será admitido a elas, e isto sem
embargo de se haver tomado assento final em sua causq porém se tiver por
vezes vindo com contraditas, e de novo pedir procurador para ir com outras os
Inquisidores lhe farão declarar na mesa a materia delas, e as pessoas, cujos
testemunhos pretende impugnar; e parecendo, que o fazsó a fim de dilatar sua
causa, e impedir o despacho dela, não será admitido a novas contraditas, como
também não será admitido a elas, quando depois de estar defendido na forma
de direito, pedir procurador a tempo, que se entenda, que o faz maliciosamente,
a fim de impedir a execução da sentença, que contra ele estiver dada.

10. Não se juntarão ao processo as contraditas, que o Réu fizer por sua
mão, ainda que seja letrado, mas em todo o caso, estará com seu procurador,
que as formaní de sua letra, e assinadas por ele, e pelo Réu, as oferecerá em seu
nome, na form4 que fica dito.
1 l. Quando o Réu disser, que se não lembra de pessoas, que possa nomeaÍ
para prova de alguns artigos de suas contraditas, para que nem ainda nessa parte
fique indefeso, mandarão aos Inquisidores ex-fficio, sobre os artigos recebi-
dos, perguntar algumas pessoas da viziúança, onde o Réu, e os recusados eram

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 693-883, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Olicio 1640
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moradores, ou as que lhe parecer, que podem ter notícia da matéria dos ditos
artigos.
l2.Vindo o Réu com contraditas, que lhe não foram recebidas por não tocar
nas testemunhas da justiça; se estiver em estado perigoso, e se entender, que
pode ser julgado por convicto, mandarão os Inquisidores por seu despacho
ex-fficio, fazer diligencia, sobre a qualidade, e crédito delas, e por outra
comissão separada, mandarão tomar informação, se o réu teve diferenças, ou
razãode inimizade com algumapessoa, oupessoas, que estejam, ouestivessem
presas no S. Ofïcio; mas não se perguntará em particular pelas testemunhas,
porque se não possa vir em coúecimento de que foram; e a mesma diligencia
fará quando das contraditas, com que o Réu tem vindo, lhe forem recebidos
poucos artigos, e parecer que não está bastantemente definido; e bem assim,
quando não tiver vindo com contraditas, ou seja por dizer, que as não tem, ou
que não quer vir com elas.

13. Os Inquisidores aceitarão aqueles papéis, ou artigos de contraditas, que


na mesa do S. Oficio se oferecem em favor de algum Réu, os quais se juntarão
por apenso a seu tempo em mesa, se lhe deferirá na forma, que esüí nas
contraditas, com que vier o Réu, e havendo-se de perguntar testemunhas, serão
pessoas sem suspeita, e de quem se não possa presumir, que fossem induzidas
pelas partes, e as testemuúas que elas nomearem para prova dos artigos, não
serão perguntadas; salvo se o caso for de qualidade, que senão possa provaÍ
por outras, ou o lugar em que a diligencia se houver de fazer tiio limitado, que
não haja nele outras, de que se possa tomar verdadeira informação; e nestes
dois casos se terá particular consideração no despacho final do processo, para
o crédito, que se deve dar as testemuúas.

rÍruro x
Das mais diligências, que se devemfazer
antes deJìnal despacho

l. Quando nas confissões dq réu houver tais diminuições que paÍeça aos
inquisidores, que haverá duvida em ser admitido com elas ao grêmio, e união
da S. M. Igreja antes de propor em mesa seu processo, para se despachar em
final, lhe farão duas ou três admoestações em sessões diferentes, advertindo-o
particularmente das faltas, encontros, repugnâncias, e diminuições de suas
confissões, para que as possa emendar, e merecer a misericórdia de que se usa
com os verdadeiros confidentes, e em cada uma destas sessões se lhe fará uma
admoestagão aperladç declarando-lhe o perigoso estado, em que eúá" e o
despacho, que pode temer, não melhorando sua causa, e na última sessão lhe
serão lidas todas suas confissões, porque não aconteça deixar de dizer de

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algumas pessoas, ou de emendar as faltas, que tiverem imaginando, que já o


tem feito.
2. Aos pÍesos negativos menoÍes de vinte e cinco anos, que pela prova da
justiça, poderão ser convencidos no crime de heresias, se farão também duas
sessões de admoestação antes de seus processos se verem em mesa, paÍa que
advertidos do perigoso estado em que estão, tornem sobre si, e se resolvam a
confessar suas culpas, e tratar do remédio de suas almas.
3. Se dos ditos das testemuúas, ou da prova das contraditas resultar
alguma presunção de falsidade contra as testemuúas dajustiç4 os Inquisidores
para maior justificação do procedimento do S. Oficio, e paÍa se saber melhor a
verdade, e se inteirarem do crédito, que elas merecem, as mandarão vir à mes4
e por si as reperguntarão, ainda que pelas partes lhes não seja requerido: e posto
que esta diligencia se deve fazer em todos os processos em que houver a dita
presunção de falsidade, com tudo se tratará dela com particular advertência,
onde parecer, que os Réus estão em termos de serem julgados por convictos,
pois nestes é o perigo maior; e em todos os casos, em que parecer, que convém
reperguntar as testemuúas, se lançará despacho no processo, no qual se declare
a razÃo, que houve para serem reperguntadas; e paÍa se reperguntarem não
bastará, que os Réus assim o peçam em qualquer parte de seus processos, mas
somente se reperguntarão em casos, examinados bem seus ditos, e a prova, que
os réus conha elas deram em sua defes4 e em suas contraditas, com as mais
circunstâncias, que se oferecerem,pareça aos inquisidores, que é necessiário
serem reperguntadas na forma sobredita.
4. Quando se reperguntarem testemuúas, serão em geral perguntadas, se
estiio lembradas das pessoas, de que tem dito em suas Confissões, ou denun-
ciações; e dizendo, que sim, se nomearem ao Réu, de que se trata, serão mais
perguntadas em particular, pelo que dele tem dito, e dizendo, que se reportam
a seu testemunho, procurarão os Inquisidores, que reporüam a substância dele;
mas se disserem, que não estão lembradas, e insistirem em que se lhe leia seu
testemunho, os Inquisidores lho mandarão ler; e todas as perguntas, e respostas
que a elas derem, réplicas, e advertências, que lhe forem feitas, se escreverão
por extenso, para que melhor conste do credito, que merecer; e sendo cÍtso, que
entre as mais pessoas não nomeiem ao Réu serão perguntadas por ele, e pelo
mais, que neste panágrafo contém.
5. Se a defesa do réu for tão limitada, ou na prova dela, considerada a
qualidade do réu, e das testemuúas dajustiça, houver tais circunstâncias, que
pareça aos Inquisidores, que não está bastantemente defendido, antes de se
proporem em mesa seu processo afinal poderão mandar fazer nova prova às
defesas, com as mais diligências que lhe parecer necessárias, para melhor se
averiguar a verdade, e assim o pronunciarão nos autos por seu despacho.

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Regimento do Santo Oficio 1640
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6. Quando no processo houver diligencia sobre qualidade de sangue do réu,


ou fosse feita ex-fficro, ou pelo réu ter articulado que é Cristão velho, antes de
se despachar em final, o verão os Inquisidores em mesa com o Ordinário e
Deputados, e com o assento, que nele se tomar sobre este incidente, enviarão o
processo ao Conselho.
7. Antes de serem os processos trazidos para se despacharem em mesa, os
inquisidores advertirão ao promotor, quais devem ser para que os proteja na
forma, que em seu título está ordenado; e o Inquisidor que os houver de propor,
verá se falta neles alguma diligencia; e se achar, que está mandadafaznr,pararát
no despacho, até que veúa; e parecendo-lhe, que se deve fazer de novo, a
comunicará com os inquisidores, e se guardará o que entre eles for assentado;
ou seja ordenado, que se faça adiligencia, ou havendo-a por escusada.
rÍrulo xr
De como o ordinário luí de ser requerido para o
despacho lìnal dos processos

1. Os Inquisidores antes de despacharem os processos em final, ou seja


havendo despacho geral, ou algum particular, mandarão requerer os Ordinarios
do distrito dos Réus, para que veúam ou mandem outra pessoa em seu nome
assistir ao despacho; e isto se fará não somente nas causas de heresia, e
apostasia, mas em todas aquelas, de que o S. Ofïcio, se conhece por Breves
Apostólicos. porém os processos dos aprendizados, que confessarem culpas de
heresia oculta por acidentes, se poderão despachar sem os Ordinarios serem
requeridos.
2. Quando o ordinário, sendo requerido, não vier ao despacho, a pessoa a
quem cometer suas vezes, antes de ser admitida, apresentará sua comissão em
forma assinada por ele, a qual se recolherá no secreto, e se juntará no maço,
que fica ordenado no Livro I , Título 2, $ 8, e nos processos fará um dos Notiírios
termo, em que dará fé da comissão; e em caso, que o Ordinrírio, nem veúa ao
S. Oficio, nem faça comissão a outra pessoq que poÍ ele em seu nome haja de
assistir no despacho, se fará disso termo nos processos, e se procederá na forma
do estilo do S. Ofïcio. E nomeando pessoa em que faltem as qualidades, que
conforme a esse Regimento se requerem nos ministros do S. Ofïcio, se lhe
mandará dizer que nomeie outra, e não a nomeando, se procederá na forma
sobredita.
3. Para o despacho das causas dos religiosos, e de quaisquer outras pessoas,
que por alguma via sejam isentas da jurisdição ordinária, será requerido o
Ordinário do lugar onde assiste o S. Oficio, assim e de maneira que houvera de
ser, se as tais pessoas não foram isentas de sua jurisdição, e o mesmo se
guardará, quando o Réu conforme a direito, não tiver Ordinário no Reino.

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Sônia Aparecida de Siqueira

rÍruroxil
Do despachofinal dos processos, e dos votos,
que nele devem haver

I . Tanto que os processos se puderem fazer conclusos, para se despacharem


em final mandarão os Inquisidores lista deles ao Conselho, na forma, que fica
dito no Livro 1, Título 3, $ 36, e tendo ordem nossa para entrar em despacho,
farão requerer o Ordinário, como se disse no Tífulo precedente, e chamar os
Deputados, que houver na Inquisição, em que se tratar do despacho.
2. No despacho dos processos, enhe Inquisidores e Deputados, não podená
haver menos de cinco votos, além do Ordinário, quando ele assistir pessoal-
mente, ou der comissão a outra pessoa fora da mesa; porque dando a algum
Deputado, bastará que com ele sejam cinco votos, sem ser necessário esperar
por outro; e não havendo bastante número de deputados, para com eles fazer
cinco votos, os Inquisidores nos darão conta disso atempo, sem haver falta, ou
dilação no despacho, mandemos prover no caso, como nos pÍÌrecer.
3. Junto em mesa os Inquisidores, Ordinários e Deputados, um dos Inqui-
sidores proporá o processo, que se há de despachar, lendo por extenso tudo o
que nele houver, assim por parte da justiça como da defesa dos Réus; e em
nenhum caso se lerão as testemunhas dajustiça pelos cadernos, nem se relatará
por maior coisa alguma dos processos.
4. O Ordinário, e os Deputados irão tomando em cadernos (que para isso
lhe serão dados) assim as testemuúas da justiça, como todos os termos
essenciais dos processos e confissões dos Réus, para que melhor inteirados do
merecimento das causas, possam formar juízo, e dar nelas seu voto; e o
Inquisidor que propuser o processo, quando ler as testemunhas dajustiça, irát
declarando em cada uma delas sua qualidade, e a opinião, em que está, se tem
ou não tem algum defeito, para conforme a isso se poder arbitrar o crédito que
merece.
5. Quando o processo for de algum Réu preso segunda vez por culpas de
heresia, ou sejam da mesma espécie, ou de outra diferente, depois de tomada
nos cadernos, se verá também o primeiro processo; e se as culpas porque
segunda vez foi preso, fossem cometidas antes da primeira senteng4 se juntarão
as provas umas às outras, para de todas se lhe fazer cargo, dando porém na
primeira prova a diminuição, que paÍecer conforme a direito, por razão do
tormento, que o réu levou, e pena, que se lhe deu; e sendo as culpas cometidas
depois da primeira sentença, se por elas foi condenado a abjuração de leve, do
mesmo modo se lhe juntará a prova das primeiras; porém se tiver abjurado de
veemente, ou em forma, somente será julgado pelas culpas subseqüentes à

796 R IHGB, Rio de Janeiro, 157(j92):69j-883,juL./set. 1996.


Regimento do Santo OJício 1640
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primeira sentença, porque ficam sendo de relapsia, e as antecedentes pertencem


ao primeiro lapso.
6. Depois de o processo lido, e tomado nos cadernos, mandarão os
Inquisidores vir o preso ante si, e posto ele de joelhos, o Inquisidor, que leu o
processo, lhe dirá como se tem visto, e que os ministros, que ali vêem juntos
estão para o despachar, que veja se tem alguma coisa, que advertir para bem de
sua causa; e querendo-lhe algum dos ministros, que estão presentes fazer
algumas perguntas, pedindo licença aos inquisidores, as poderá fazer; e depois
de ser ouvido e responder ao que lhe for perguntado, o mandarão recolher a seu
cárcere.

7. Recolhido o réu, relatará o Inquisidor, que leu seu processo, tudo o que
nele se contém, ponderando com muita miudezaa prova da justiça, e defesa do
réu, e tudo o mais, que entender é necessário para se alcançar perfeito conhe-
cimento da causa; e logo dará nela seu voto, e após ele votarão os Deputados,
começando o mais moderno, e seguindo-se os outros por sua antigüidade; e
assistindo o Ordinrário pessoalmente na mesa, votará em último lugar depois
dos Inquisidores; mas se ele ai não assistir, a pessoa, que estiver em seu nome
votará depois dos Deputados, e antes dos Inquisidores votarem; o que também
se guardará em caso, que algum dos Deputados assista pelo Ordinrário; porque
então, posto que esteja assentado no lugar, que lhe cabe, conforme sua antigüi-
dade, como está dito no Livro 1, Título 3, $ 57, com tudo nos processos, em
que vota como Ordinário em razão desta qualidade, ordenamos, que preceda a
todos os deputados, ainda que sejam mais antigos, e os Inquisidores votarão
por sua antigüidade, seguindo-se o mais moderno, e votando no último lugar o
mais antigo.
8. Se depois de se propor o processo, antes de se votar nele, ou tendo se
começado a votar, parecer a algum dos Inquisidores, e Deputados ou Ordinário,
que convém fazer alguma diligenci4 ordenará o Inquisidor mais antigo, que se
vote sobre ela; e vencendo-se que se faça, o tomarão por assento, e parará o
despacho do processo, até que veúa, e se junte a ele; e se com tudo parecer à
maior parte dos votos, que a diligencia se deve escusar, se votará na casa, e sem
ela se despachará o processo.
9. O Inquisidor mais antigo irá tomando os votos, que regulará depois de
todos votarem, paÍa ver o que fica vencido, e conforme a isso se escrever o
assento, o qual se lançará logo no processo, para se poder assinar antes de passar
ao despacho de outro; mas havendo lugar de logo se escrever, se fará com toda
a brevidade possível, e será assinado por todos os votos pela mesma ordem, em
que votarão, ainda que alguns fossem de contrário parecer, do que esüâ vencido;
e querendo emenda-lo, o poderão fazer ainda depois de o terem assinado,
propondo em mesa as razões, porque se moveram.

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Regimento do Santo Oflcio 1640
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em se lhe publicar a sentença no auto, considerando-se para isso a qualidade da


pesso4 e circunstlincias do caso, para no Conselho se determinar o que mais
convier a bem dajustiça. E não sendo o processo afeto ao Conselho, se dirá: E
pareceu aos mais votos, declarando no assento os fundamentos, e razões, que
tiveram e em todos se nomeará a pessoa, que assistiu pelo Ordinário. E quando
no assento final o Réu for condenado em confiscação de bens, se fará nele
declaração do tempo, em que cometeu o delito dizendo se consta pela prova da
justiça, se pela confissão do réu, ou se por ambos; porque a todo o tempo se
veja o que se assentou, e se possam passar ao Fisco as certidões, que dele forem
pedidas, para decisão das causas tocantes aos bens confiscados.
13. Quando, se assentar, que o Réu seja posto a tormento, ou pelo crime
não estar provado, ou pelas diminuições de sua confissão; no assento se tratará
somente do grau de tormento, que há de ter, e se dirá, que seja ajuízo do Médico,
e Cirurgião, e arbífio dos Inquisidores; e que depois de satisfeito a ele, se
tornaná a ver o processo em mesa, paÍa se despachar em final; e não se votani
entiío sobre a resolução que há de se tomar, depois de executado o tormento,
nem se votará em tal tormento, que por ele se purgue toda a suspeita, que houver
contra o Réu, antes se terá sempre respeito, a que fique lugar para a abjuração,
que deve fazer.
14. Os Inquisidores mandarão ao Conselho com assento final, todos os
processos dos réus absolutos da instância, e todos aqueles, em que parecer a
algum dos votos, que o Réu deve serrelaxado à Cúria secular: e bem assim os
processos das pessoas, que por assento do mesmo Conselho, foram pronuncia-
das à prisão, ou a ele vieram com algum assento definitivo; e assim mais os
processos das pessoas, que foram acusadas por culpas de falsidade; os de
heresiarcas, Dogmatistas, ou Arrenegados em terras de Mouros, e os de pessoas
Cristãs velhas, que afirmam não estar na Hóstia consagrada o corpo de Cristo
seúor nosso, tão perfeitamente, como esüí no Céu, ou de quaisquer outras, que
forem condenadas em abjuração de leve, quando se lhe der condenação pecu-
niária; e além destes, todos os mais que neste Regimento se declaram, e em
particular no título 23. deste livro; mas não tornarão ao Conselho com assento
final, os que tiverem ido a ele com interlocutor, se não houver outra razão, nem
menos os de pessoas, que forem despachadas por assento do Conselho, se
depois tornarem a ser presas por culpas de qualidade, que paÍa a pronunciação
não eram afetos ao Conselho.

TÍruLo XTV

De como se há de proceder com os réus, que houverem


de ser postos a tormento, e na execução deles.

l.Quando se tomar assento, que o Réu seja posto em tormento, os


Inquisidores tirarão a sentença do processo, na qual sendo o Réu negativo, se

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Sônia Aparecida de Siqueira

dirá somente, se os indícios forem urgentes, que vistos os urgentes indícios, e


se não forem urgentes, que vistos os indícios, que resultam dos autos, e da prova
da justiça" de ter cometido o crime de que é acusado, especificando dele,
mandarão que antes de outro despacho seja o Réu posto a tormento, onde sená
perguntado por suÍrs culpas, para que manifeste a verdade, para salvação de sua
alma, e das pessoas com que as houver cometido, ou sabe cometerão o dito
crime; e sendo confidente, se diná" que vistos os indícios, que dos autos, prova
dajustiça Autor, e sua confissão, resultam de não acabar de confessar suas
culpas (declarando por maior as diminuições, porque se lhe mandar o tormento,
como será, se estiver diminuto em pessoas, ou cerimonias, dizendo, que por
não dizer de todas as pessoÍÌs, nem de todas as cerimonias, que fez)&c. e
concluirá a sentença do negativo, dizendo, o que assim mandam sem prejuízo
do provado, e por ele confessado.
2.Tiradaa sentença, e assinada pelos inquisidores, mandarão trazer o Réu
à mesa, onde será perguntado, se quer confessar, ou acabar de confessar suas
culpas; e dizendo, que as quer confessar, ou continuar sua confissão, se lhe
tomará logo a que ftzer, e não lhe darão notícia do assento, que contra ele estava
tomado; antes com os Réus negativos, que então começarem a confessar suas
culpas, se procederá na forma, que fica dito no título 7. deste livro, e os
processos dos que continuarem sua confissão, se tornarão a ver em mesa com
o Ordinrârio, e Deputados para se tomar neles novo assento, e se declarar se
alterou que estava tomado. E dizendo, que não tem cometido as culpas, de que
é acusado, ou que não tem mais que confessar, se lhe farâ a saber, que seu
processo foi visto em mesa por pessoas doutas, e de sã consciênci4 e que estiâ
tomado nele um assento rigoroso, que lhe será melhor confessar suas culpaso
ou continuar sua confissão, antes de se executar; e não mudando de estado, seú
chamado à mesa o Promotor, e em sua presença estando o Réu em pé, lhe será
lida a sentença de tormento por um Notrírio; e se for menor, assistirá seu
curador; e se depois de a ouvir confessar alguma coisa, se lhe tomará na mes4
e se sobrestará na execução do tormento, e se verá o processo de novo com sua
confissão, como fica dito; e julgando-se, que ainda o tormento tem lugar, posto
que se lhe diminuirá, quando se houver de executar, lhe não será outra vez lida
a sentença, mas será levado de seu cárcere à casa do tormento, para se executar
o assento, que se houver tomado. E não confessando, mandarão os Inquisidores
vir o Alcaide, e lhe ordenarão leve o Réu à casa do tormento, na qual não
assistirão mais que os guardas do cárcere, que hão de fazer a execução.
3. Apelando o promotor por parte da justiça, ou o Réu da sentenga do
tormento, não se procederá à execução dela, e neste caso, ao Promotor se dará
vista do processo, para requerer o que lhe parecer, e se o Réu estará com seu
procurador para lhe formar sua apelação; e ao que cada um deles disser e alagar,
se deferiú na form4 se que dispõe no Título 21 deste livro; e pedindo o Réu

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tempo para deliberar, se lhe dará; salvo se parecer, que o faz maliciosamente,
a fim de impedir, ou dilatar a execução da sentença.
4. Par:a a execução do tormento será chamado o Ordinário, ou a pessoa,
que estiver em seu lugar, e vindo assistir a ele, estarão também presentes dois
inquisidores, ou ao menos um Inquisidor com um Deputado; e não vindo o
ordinrírio, assistirão dois Inquisidores com um Deputado ou um Inquisidor com
dois Deputados, de sorte, que sempre haja três votos, quando o tormento se
executar.
5. Depois dos Inquisidores, e ordiniário estarem na mesa da casa do
tormento, mandarão trazer ante si o réu, em que se houver de executar, e se lhe
dará juramento, para que em tudo diga verdade, e logo o admoestarão, que trate
de descarregar sua consciência, e de escusar com isso o trabalho , e aperto em
que se há de ver; e não confessando as culpas, porque foijulgado a tormento,
serão chamados os ministros, que houverem de fazer a execução, e o médico,
o cirurgião, que também hão de assistir a ela , aos quais se não dirá o grau do
tormento, a que o Réu esüájulgado, e se lhe darájuramento, par que façam seu
ofïcio bem, e verdadeiramente, e tenham segredo, e de tudo isto fará o Notário
menção na sessão, que ai se fizer, na qual declarará os nomes dos Inquisidores,
que assistirem, e do Ordinario, ou da pessoa, que estiver em seu lugar, e então
mandarão levar o Réu ao lugar do tormento, e se executará na forma do assento;
e sendo o Réu começado a atar, irá o Notario fazer-lhe um protesto, dizendo,
que em nome dos Inquisidores, e dos mais ministros, que foram no despacho
de seu processo, proposta, que se ele Réu no tormento morïer, quebrar algum
membro, ou perder algum sentido, a culpa será sua, pois voluntariamente se
expõe aquele perigo que pode evitar, confessando suas culpas, e não será dos
ministros do S. Ofício, que fazendo justiça, segundo os merecimentos de sua
causa o julgam a tormento.

6. O tormento será ordinariamente de pele; e quando o médico, e o cirurgião


entenderem, que os homens por fraqueza, ou indisposição o não poderão sofrer
de pele, lhe será dado no potro, onde logo será levado; porém às mulheres se
não dará no potro, pelo muito, que se deve atentar por sua honestidade; e em
caso, que não possam ter nenhum tormento de poli, nem haja lugar para se
dissimular com ele, os inquisidores darão conta ao conselho, para ai se deter-
minar o que for justiça. Sendo necessario dartrato esperto nos quinze dias antes
do auto, por não irem presos a ele, mostrando os sinais do tormento, lho darão
no potro, e na sessão, que se ftzer na casa do tormento, farão os Inquisidores
sempre declarar arazão, que houve, para se dar no potro, e não na pele; e em
todas as sessões se dirá a hora em que começou e acabou o tormento.
7. Sendo o réu negativo, e dizendo na casa do tormento, antes, ou depois
ï dele começado que quer confessar suas culpas, mandados os ministros para

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fora" se lhe irá tomar sua confissão no mesmo lugar onde estiver; e estando já
de todo levantado, será decido, e sentado no banco onde foi atado, paÍa ser
ouvido; e tomada a confissão, se suspenderá o tormento, para se continuar seu
processo; e sendo confidente, e querendo continuar sua confissão, se procederá
no tomar dela na mesma forma; e não se contentarão os Inquisidores com tomar
por maior o que disser, antes se tomará a confissão com todas as circunstancias;
e não satisfazendo, mandarão continuar o tormento, e alterando o assento, que
se tiúa tomado, os votos, que assistirem no tormento na casa dele, votarão na
causa, e logo se executará o que entre eles se assentar.
8. Se o Réu der algum acidente na casa do tormento antes de ser começado,
ou sobrevier causa, que impega a execução dele, os Inquisidores mandarão
recolher o preso a seu cárcere, declarando na sessão, que com ele se ia fazendo,
araz.ão,que houve para o tormento se não executar; e cessando o acidente, ou
a causa, será o Réu tornado ataz,er à casa do tormento, e sem que se lhe leia
nova sentença, se executanâ nele; porém se o acidente, ou impedimento sobre-
vier depois de começado o tormento, mandá-lo-ão suspender, fazendo na sessão
a mesma declaração, e se tornará a ver o processo em mesa, para se assentar,
se há de continuar, e em que forma.

9. A confissão, que o Réu fizer na casa do tormento, ou depois de lhe dada


a notícia na mesa, que esüí tomado rigoroso assento em seu processo, será
ratificada depois de passadas vinte e quatro horas, quando parecer conveniente,
conforme à qualidade do preso, e ao estado, em ficou, e de neúum modo se
fará antes de passarem as vinte e quatro horas, nem se dilatará por muito tempo,
e a esta ratificação, não assistirão religiosas pessoas, e nela será o Réu pergun-
tado, se esüá lembrado da confissão, que fez emtal dia, e em tal estado, e se é
verdade o que entiío disse, e o afirm4 ratifica, e diz de novo, sem medo, forçan
ou viol6encia alguma; e depois em diferente audiência se fará com ele a
ratificação diante de Religiosas pessoas.
10. Acrescendo contra o Réu novos indícios, depois de executado o
tormento, se processará sua causq conforme a qualidade deles, e se verá de
novo o processo em mesa, e julgando-se, que se lhe deve repetir o tormento, se
tirará nova sentença do processo, na qual se dirri que vistos os novos indícios,
que acrescerão contra o Réu, mandam-lhe que seja repetido o tormento, e se
procederá a execução dele na forma, que fica dito; mas não se repetirá o
tormento ao Réu que uma só vez; e se depois de repetido, acrescer tal causa,
quejulgue se deve repetir segunda vez, se daní conta disso ao Conselho.
11. Se o Réu for negativo, ou confidente diminuto, depois de lhe ser em
mesa notificada a sentença do tormento, ou estando já nele, começar a confes-
sar, ou continuar a confissão de suas culpas, e em todo ou em parte satisfazer
a elas, se ai mesmo logo revogar a tal confissão, será havido como se sempre

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estivera negativo, ou diminuto para efeito de se executar nele a sentença do


tormento na forma, em que estava determinada. E se depois de confessar, e de
ser recolhido a seu círcete, disser que quer revogar a confissão, que tem feito;
se ainda não forem passadas vinte e quatro horas, lhe dirão os Inquisidores, que
se aquiete, e considere melhor no que lhe convém, e que a seu tempo lhe
deferirão; e mandarão fazertermo do sobredito no processo, declarando ahor4
em que o Réu disse, que revogava a confissão; e persistindo em se querer
revogar, ainda depois de passadas as vinte e quatro horas, será havida a
revogagão, Çomo se fora feita em continente, antes de ser o Réu recolhido a seu
cárcere, e tomado por termo no processo, sem ouha sentença, se procederá à
escusa do assento nele tomado; e se quando se tratar dela, o Réu tornar afazer,
a mesma confissão, senda e terceiravez, e outras tantas a revogar, sem a querer
ratificar, passadas as vinte e quatro horas; será posto a tormento, e ainda que
diga" que quer confessar suas culpas, se lhe dará de tormento, a que estava
julgado, a parte, que paÍecer aos Inquisidores; e continuando em dizer, que quer
confessar suas culpas, paraná o tormento, e se lhe tomará a confissão; e se antes
de passar as vinte e quatro horas a tornar a revogar não será posto a tormento,
mas afinal se terá respeito ao que lhe faltou, e aÍi revogações, que fez, para a
pena que se deve dar.
12. Quando o Réu depois de passadas vinte e quatro horas, revogar a
confissão que fez no tormento, os Inquisidores lhe tomarão a tal revogação, e
será de novo examinado por ela, acusado pelo novo indicio, que lhe acresceu,
e se verá processo em mesa, para tomarem assento, se deve executar, repetir ou
acrescentar; o que se entendení sendo a confissão de alguma coisa" de que o
Réu estava indiciado; porque sendo de culpa, de que não estava indiciado, não
se fará caso de tal confissão, nem da revogação dela; antes se executará a
primeira sentenga: e se o Réu revogar a confissão depois de a ter ratificada na
forma de direito, e do $. 9. deste título, se guardará o que se dispõe no Livro
3, Título 5.

13 . Sendo algum Réu convencido pela prova dajustiça, e estando indiciado


com muitos cúmplices do mesmo delito; posto que haja de ser relaxado àjustiça
secular, poderá ser posto a tormento in caput alienum; e na sentença do
tormento, que lhe for publicad4 se dirá, que vistos os indícios, que da prova da
justiga resultam, que sabe de outras pessoas, que cometeram o crime, porque
foi acusado, mandam seja posto atormento paÍa que as declare; e nas admoes-
tações, que antes da sentença, e na casa do tormento lhe forem feitas, não será
perguntado pelo que lhe tocar, como parte, senão só pelo que tocar aos
cúmplices, deçlarando-lhe, que este é só o respeito, porque o mandam por a
tormento; porém advertirão os Inquisidores, que se não votará neste tormento,
senão em casos muito graves, e de que se possa esperaÍ grande fruto; e quando
neles se votar, antes da execução, enviarão o processo ao Conselho.

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Sônia Aparecida de Siqueira

14. Depois de executado o tonnento, se tornará a ver o processo em mesa,


com o ordinrário e Deputados, e se tomará nele assento final, segundo o
merecimento dos autos.
rÍruro xv
De como se há de proceder com os réw convictos
no crime de heresia até a publicação de suas sentenças
l. Quando algum Réu for julgado por convicto no crime de heresia, quinze
dias antes de se celebrar o Auto da Fé, será chamado a mesa, onde se lhe dará
notícia do assento, que estátomado em seu processo, declarando-lhe como visto
na mesa, por pessoas doutas, e de sã consciência; e sendo negativo, se lhe dini
que considera a prova da justiça, se assentou que estava convicto no crime de
heresia e pronunciado por herege, e pertinaz, e será amoestado, que trate de
descarregar sua consciência, confessando a verdade de suas culpas para que se
possa usar com ele da misericórdia que a S. M. Igreja concede aos que
verdadeiramente se convertem; e se for confidente diminuto, se lhe dirá" que
visto o seu processo, e consideruda a prova da justiça, e qualidade de suas
comissões, se assentou, que estava convicto no crime de heresia, e suÍìs
confissões, não eram de receber, e que por herege convicto, confesso e impe-
nitente, estava declarado, admoestando-o, que trate de acabar de confessar suas
culpas, e declarar toda a verdade, paÍa merecer a misericórdia, que pretende; e
desta notificação se fará auto no processo pelo Notário, que a ela assistir.
2. Havendo al gumarazío particular, para que esta notificação se faça antes,
ou depois dos quinze dias, se dará conta ao conselho, a tempo, que se possa
ordenar o que for mais conveniente ao serviço de Deus, e bem do procedimento
do S. Oficio.
3. Aos Réus, que forem julgados por convictos por culpas de relapsia" ou
sejam confidentes, ou negativos, se não fará esta notificação, como também se
não fará aos convictos do crime da sodomia.
4. Se algum Réu depois de notificado na forma sobre dita, pedir audiênci4
os Inquisidores o ouvirão com muito cuidado; e querendo vir com contraditas,
se guardará o que fica disposto neste livro Titulo 10, $ 9; e querendo confessar
suas culpas, ou continuar sua confissão, se lhe tomará sem dilação o que disser;
e sendo negativo, se continuará com seu processo na forma, que se dispõe no
título 7 deste livro, até final conclusão, e se tornará a ver o processo em mesa
com o Ordinário, e Deputados, e com o assento, que nele se tomar, se enviará
ao Conselho, e o mesmo se guardará nos confidentes, que depois de notificados
continuarem sua confissão.
5. Sendo recebidas por assento do Conselho as confissões dos Réus
notificados, e mandando-se fazer alguma diligencia no tormento, far-se-á na

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Regimento do Santo Oftcio 1640
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forma" que fica dito no $ 6, do Título precedente; e julgando-se, que as


confissões não são de receber, e que o Réu deve ser relaxado àjustiça secular,
na sexta feira antes do Auto, e antes de se entrar na audiência da tarde, irá um
Noüário, ao cárcere, e lhes notificarri que estão relaxados por suas culpas à
justiça secular; e que no domingo seguinte serão levados ao Auto, para ouvir
suas sentenças; que tratem do que lhes convém a suas consciências, e salvação
de suas almas, e se encomendem a N. Senhor, para que os encamiúe no
conhecimento da verdade; e logo por um guarda, que levará consigo, lhe
mandará atar as mãos; e na mesma forma se procederá com os Réus negativos,
que estiverem notificados, e com os que estiveremjulgados por convictos no
crime de sodomi4 e no de heresia por culpas de relapsia; e desta notificação
fará o Notrário auto no processo; e aos relapsos, que tiverem satisfeito de modo,
que se não foram, houveram de ser recebidos, e aos sodomitas advertirá logo,
que no dia seguinte se lhe há de dar por viático o Sacramento da Eucaristi4 o
qual lhe administrará um dos Notrários no Oratório da Inquisição.
6. Terão os Inquisidores prevenidos tantos Religiosos, quantos forem os
Réus, que tiverem assento de relaxação para lhes assistirem e os confessarem,
e encamiúarem no que lhes convém a sua salvação, aos quais antes de entrarem
no cárcere, e serem postos com os Réus advertirão na mesa, como se hão de
haver com eles; e que só tratem do que convier a suas consciências; e não
procurem persuadi-los a confessar, quando entenderem, que se não convertem
de coração, nem lhes perguntem por parentes seus presos, nem lhe digam que
o estão, a fim de lhe facilitar sua confissão, nem fale cada um mais, que com o
preso, com que for posto; e que quando o preso pedir audiência, avise ao
Alcaide, para dar recado na mes4 e de tudo o mais, que paÍecer conveniente;
e para cumprirem o sobredito, e guardarem em tudo segredo, lhe darãojura-
mento dos Santos Evangelhos: e quando o Notário notificar aos Réus, e lhes
forem atadas as mãos, porá logo com cada um deles, um dos Religiosos, qual
os Inquisidores lhe ordenarem.

7. Pedindo algum Réu audiência, depois de lhe serem atadas as mãos, a


qualquer hora que seja, antes de sair do cárcere para o Auto os Inquisidores o
ouvirão com grande cuidado, mandando-o para esse efeito vir à mesa, e
confessando suas culpas, , ou continuando suaconfissão, sendo diminuto se lhe
tomarâ o que disser, e se ratificará logo, mas não assistirão à ratificação por
honestas pessoas, ou Religiosos, que estiverem com os notificados; e examina-
da a confissão, se verá o processos em dilação em mesa, com o Ordinrârio e
Deputados; e satisfazendo à informação da justiça, será recebido ao grêmio, e
união da S.M. Igreja, com as penas e penitências, declaradas no Livro 3, Título
3 e $ 8; o que tená lugar, posto que o Réu seja heresiarca ou dogmatista: porém
terão os Inquisidores grande consideração na substância, e modo das confissões
I
feitas neste tempo, e nos sinais, que os Réus derem de sua conversão, ou

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Sônia Aparecída de Siqueira

impenitência, pela grande presunção, que há de serem feitas mais a fim de


escapaÍ do castigo, que merecem por suÍls culpas, que por estar verdadeiramente
arrependidos de as haver cometido. E parecendo à maior parte dos votos, que
as confissões do Réu, posto que parecem verdadeiras, devem ser examinadas
judicialmente frcarâ o Réu reservado para outro Auto, e se continuará seu
processo na forma que fica dito no Título 7 deste livro.

8. Quando os processos das pessoas, que por assento do Conselho geral


julgadas por convictas, e mandadas relaxar àjustiça secular, alterem depois de
lhe ser feita notificação do dito assento, nas Inquisições onde Nós, e o Conselho
não formos presentes, os Inquisidores os poderão despachar em final com o
ordinário, e Deputados, e proceder a execução de sua sentença sem os enviarem
ao Conselhol salvo se de novo sobrevier alguma outra razão, porque pareça a
maiorparte dos votos se devem enviar a ele; porque neste caso ficarão os Réus
reservados para outro Auto; porém encarregamos muito aos Inquisidores que
enquanto houver tempo para terem resposúa do Conselho antes do auto, enviem
a ele todos os processos que lhe estão afetos; e que de neúum modo, por escusar
o despachodo Conselho, deixem deosverem mesaatempo, que eles sepossam
enviar; e se os Réus, ou o Promotor apelarem neste tempo de algum despacho
dos Inquisidores, se guardará o que se dispõe no Título 21 deste livro.

9. Se algum Réu negativo, ou confidente diminuto, quiser confessar suas


culpas, ou continuar sua confissão, depois de estar no cadafalso, antes de lhe
ser lida a sentença de relaxação, um dos inquisidores o irá ouvir na cas4 que
para este efeito deve estar preparad4 e lhe tomará sua confissão, e no mesmo
cadafalso se juntarão os Inquisidores , Ordinário e Deputados em lugar secreto,
e examinarão a confissão de novo feita, e parecendo a maior parte dos votos,
entrando nestâ parte ao menos um dos Inquisidores, que se deve sobrestar na
publicação da sentença poderão reservaÍ ao Réu, para ser tazido ao cárcere, e
de novo se examinar sua confissão judicialmente; e este assento se comunicará
ao conselho geral, se e tiver presente, e o que o Conselho assentar se dará à
execução, ou Nós estejamos, ou não presente; mas porque se deve presumir,
que semelhantes confissões são fingidas e simuladas, e feitas só por temor da
morte, e por vefem os Réus no cadafalso, as pessoas, que deles tinham
testemuúado, ou com quem estavam indiciados, se fará esta reserva com
grande consideração, e muito raramente; e só em caso, que considerada a
qualidade da pessoa, e circunstância da confissão se espere que dela resulte
grande fruto, assim para a salvação do réu, como dos cúmplices, com que estiver
delato. E a pessoa, que assim for reservada,frcará. fechada na casa, em que fez
sua confissão, e não será outra vez posta a vista dos outros penitenciados, e
vigiada de modo que com eles não comunique; e tirando-lhe o habito de
relaxado, que levava, será trazida ao cárcere por dois familiares de muita

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Regimento do Santo Oficio 1640
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confianga fora da ordem dos outros penitenciados, de maneir4 que por nenhum
modo possa no caminho receber ou dar aviso a pessoa alguma.
10. Quando o Réu depois de lhe ser publicada sua sentenç4 e ser entregue
àjustiça secular, pedir aos inquisidores, que o ouçÍrm, que quer descarregar sua
consciênci4 se ainda estiver no cadafalso, um dos Inquisidores o ouvini como
no $ precedente fica dito; e se já tiver saído do cadafalso, o mandarão ouvir por
um Deputado, e um Notrírio na casa da Relação, ou onde parecer conveniente,
e sua confissão se tatifrcarâ, e juntará a seu processo, e se darâ a seu dito o
credito, que conforme a direito merecer.
rÍruro xvr
Dos hereges afirmattvos
1. Havendo nos cárceres alguns presos por culpas de heresia, que aÍïrme
crer nos erros, de que estiá denunciado, ou em alguns outros contra nossa santa
Fé Católica, depois de lhe ser tomada por escrito sua confissão em seu processo,
e de ser admoestado com caridade, que se aparte da crença de seus eros: os
Inquisidores por todos os meios, que for possível, procurarão reduzi-lo ao
conhecimento da verdade, e ao caminho de sua salvação, e não o podendo
conseguir com as admoestações, que lhe ftzerem, perguntarão ao preso, se quer
que lhe chamem pessoas doutas, com quem possa comunicar sua crenç4, e os
fundamentos dela; e dizendo que sim, chamarão paÍa este efeito alguns Reli-
giosos, ou outras pessoas Eclesiásticas, de que tenham maior satisfação, assim
em letras, como em virtude, e capacidade, e dando-lhe primeiro na mesa conta
do estado do preso, e qualidade dos erros, que afirma" ou crença, que tem, e
instruindo-os de como se devem haver com ele, encarregando-lhe debaixo do
juramento dos santos Evangelhos, o segredo, os mandarão colocar com o preso
cada um por si em diversas audiências, estando presente um Notário, e depois
de estar com ele o tempo que lhe parecer, mandarão vir à mesa o Religioso, e
nela o perguntarão judicialmente, pelo que passou com o preso, e juízo, que
formou de sua crença e capacidade; e resultando de seu testemuúo culpa contra
ele, a ratificarão na forma do estilo.
2. Depois de haver escrito o que o religioso depuser, mandarão os Inqui-
sidores tazer àmesa o preso, com quem houver estado, e lhe perguntarão, se
esteve com o Religioso, e o que passou com ele, e o mais, que lhes paÍecer
necessário, segundo o estado, em que o acharem, e o estarão, que trate de se
apartarde seus erros, ede se conformarcom o queas pessoas doutas lhe afirmam
ser necessário para sua salvação.
3. E posto que o preso dig4 que lhe não são necessiários pessoas doutas
paÍa se aconselhar, nem quer estar com elas; com tudo os Inquisidores,
ex-fficio, e como ministros da Igreja, cujo principal intento é procurar a

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Sônia Áparecida de Siqueira

salvação das almas, e reduzi-las ao conhecimento da verdade, mandaÍão por


com ele as pessoas doutas, na forma, que fica dito; e essa diligencia se fará por
duas vezes, uma antes do Promotor da justiça vir com libelo contra o tal preso,
e outra depois do processo estar concluso em final, antes de propor em mesa,
paÍa se sentenciar; salvo se parecer necessiário fazer-se por mais vezes.
4. E por quanto se pode presumir, que por falta de juízo, ou lesão no
entendimento, persista o preso em afirmar os effos, ou crença, que tem:
mandarão os inquisidores fazer exata diligencia sobre sua capacidade, no lugar
donde era natural, e morador ao tempo de sua prisão; e a mesma farão com o
Alcaide e guardas do cárcere, para que conste se depois de estar nele, lhe
sobreveio alguma paixão no juízo, de que lhe ficasse leso; e estas diligências
se farão antes do Promotor dajustiça apresentar seu libelo; e constando por
elas, que o preso, assim antes de sair da prisão, como depois de estar nos
cárceres, teve e tem perfeito juízo e capacidade, se processará sua causa na
forma ordiniária, dando tempo ao réu paÍa que possa vir em coúecimento de
seus eÍTos, e com o assento, que nela se tomar, mandarão o processo ao
Conselho; e depondo alguma testemuúa, ou testemunhas com dúvida sobre
seujuízo, depois do processo concluso, antes de se propor em mesa, se fará
nova diligencia com o Alcaide, e guarda, e alguns dos presos, que fossem seus
companheiros, e com os Médicos, que para este efeito mandarão que os visitem,
e falem algumas vezes com ele.

rÍruro xvrr
Dos presos, que endoidecem no cdrcere

1. Se algum preso, ou seja, confidente ou negativo, endoidecer no cárcere,


os Inquisidores, farão e mandarão fazer todas as diligencias, e exames neces-
siírios, assim com pessoas do cárcere, como no lugar onde era morador, para se
averiguar, se a doidice é verdadeira, ou fingida; e achando ser fingida, proce-
derão em sua causa na forma ordinrária; e se acharem que é verdadeira"
sobrestarão nela, e mandarão tratar da cura do preso, por todos os meios, que
for possível, aplicando-lhe os remédios necessários, e que os médicos jurarem,
que podem ser de efeito para recuperar o juízo; e não se lhe podendo estes
aplicar, estando preso no cárcere, ordenarão, que seja levado ao hospital de
todos os Santos de Lisboa, para ai se tratar de sua cura, como convém.
2. Sendo o preso curado, e tomando a seu juízo, se continuará sua causa
nos termos ordinários, e não melhorando no juízo,paratânos termos, em que
estiver, e mandarão os inquisidores entregar o preso sobre fiança a algum
parente seu dos mais chegados, que tiver, o qual se obrigará a dar conta dele
todas as vezes, que se lhe pedir, e vir dar razáo à mesa no tempo, em que lhe
for ordenado, do estado em que está e que falecendo naquele estado apresentará

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Regimento do Santo Olício 1640
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disso na mesa certidão do médico, que o curou, e do piároco da Igrej4 em que


for enterrado; e que melhorando, o fará saber aos Inquisidores; e não se achando
paÍente, que queira obrigar com fiança, se lhe aceitará cauçãojuratória; e em
caso, que nem ainda assim o queira aceitar, se o preso tiver bens, e no hospital
o quiserem ter, dando-se lhe o necessrírio para seus alimentos, ai estará; e não
tendo bens, de que se possa alimentar, o mandarão soltar no cárcere.
3, Tendo os Inquisidores a notícia, que o preso depois de entregue sobre
fiang4 ou cauçãojuratória, ou solto dos cárceres, tornou em seujuízo, manda-
rão, que seja trazido aos cárceres e se continuará com sua causa na forma
ordinária; e achando que faleceu no mesmo estado, mandarão fazer auto de seu
falecimento, pelo qual se perguntarão testemuúas, para que conste judicial-
mente de sua morte, e se procederá em sua causa na forma do título seguinte.

TÍTULO XVIII
Dos defuntos

l. Falecendo no cárcere algum preso, antes de seu corpo ser tirado da casa,
em que falecer, os Inquisidores o mandarão ver por dois Notrírios, e um dos
notários e um dos médicos do S. Ofïcio; e podendo ser comodamente, será
estando todosjuntos, e verão, se o conhecem e se lhe parece, que sua morte foi
natural, ou se há no corpo sinal algum, de que se possa presumir, que foi
violent4 e logo um dos Notários fará no processo do dito auto de seu faleci-
mento, e ao pé dele passarão ambos certidão de como viram o corpo do defunto
e o conhecerzÌm e do que nele achaÍam; e depois disto, será perguntado ao
médico, Alcaide, e guardas e os companheiros, que o dito preso tiú4 para se
saber se faleceu de morte natural, ou de morte violenta, e se confessou na
doença, e fez alguns outros atos de Cristão.
2. As causas das pessoas, que falecem no cárcere, procurarão os Inquisi-
dores despachar com brevidade, posto que haja contra elas pouca prova, e não
sobrestarão no despacho, por esperar, que lhe acresça; salvo se houver esperan-
ça mito provável e ocasião propícia, de lhe acrescer, como será se o defunto
fosse de terra, de que haja no cárcere muitas pessoas presas, e estivesse
indiciado com algumas delas ou tenha nele algumas suas parentes, com que se
presuma haver-se comunicado; e bem assim se sobrestará em seu despacho,
quando no cárcere houver presos, a quem de direito toque sua defesa, e que paÍa
ela houverem de ser citados; porque neste caso se esperarri que eles saiam dos
ciirceres; porém ter-se-á particular advertência de correr com as causas destes
presos, por se não retardar por seu respeito o despacho dos defuntos.
t
3. Sendo o defunto preso por culpas de heresia, ou fosse confidente ou
negativo, depois de feito o auto de seu falecimento, e de serem perguntadas as
pessoÍrs, que o devem ser, na forma do $ 1 deste tífuIo, os Inquisidores mandarão

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Sônia Aparecida de Siqueira

fazer o processo concluso, e o verão em mesa com o Ordinário, Deputados; e


se for confidente, e se assentaÍ, que a confissão é satisfatória, e deve ser
recebida, será despachada sua causa, sem para isso serem citados seus herdei-
ros, pois lhe não complete a defesa; e o mesmo se fará se for negativo, e parecer,
que considerada a prova dajustiça" deve ser absoluto da instancia dojuízo;
salvo se houver alguma dúvida na qualidade do defunto; porque neste caso se
fará assento, que sejam citados seus parentes, a quem de direito possam alegar
o que lhes parecer, e defender a qualidade do defunto, em que também são
interessados; porém isto não terá lugar, quando considerada a qualidade do
defunto e seus parentes, parecer, que da tal averiguação se lhe pode seguir
alguma infâmi4 porque neste caso se não fará. E apresentando-se, que a
confissão não é satisfatóri4 nem deve ser recebida; ou havendo disso alguma
dúvida" se fani outros assentos, que sejam citados os herdeiros do defunto, e
pessoas, a quem sua defesa de direito pode tocar; os que estiverem no Reino,
em suas pessoas, e os ausentes dele, por editos, e com eles se procederá sua
causa até final da conclusão, se vierem assistir a ela, posto que o defunto se
houvesse defendido, e sua causa estivesse conclusa em final; e não vindo, se
lhe dará defensor ex-fficio; e o mesmo se fará sendo negativo, se parecer, que
tem prova bastante para ser convencido, ou houver alguma dúvida de ser
absoluto da instancia do juízo, e em qualquer dos casos sobreditos, quando se
tomar assento final, virá o processo ao Conselho.
4. Quando os herdeiros do defunto ou pessoas a quem por alguma via tocar
sua defesa, sendo citados, acudirem para defender sua memória, fama, e
fazenda, farão procuração em forma a um dos procuradores, que costumam
advogar pelos presos, a qual se lhe tomará nos autos, e a eles se dará vista do
libelo da justiça, e publicação das testemuúas, para que tomando de seus
constituintes as informações necessárias, aleguem o que lhes parecer que
convém, para defesa dos defuntos: e sendo pessoas de tal qualidade, que não
possam vir faz,er procuração, se lhe aceitaút a que apresentarem feita por
tabelião público, ou por sua mão, tendo qualidade para a poder fazer, e se juntará
ao processo; e não vindo, nem mandando procuração, havendo-se de dar
defensos ex-officio, será também um dos mesmos procuradores.
5. Falecendo no cárcere algum herege afirmativo, que professasse a lei de
Moisés, ou alguma outra heresia contra a nossa santa Fé, dizendo, que nela
viveu, e nela queria morrer, posto que pareça-lhe não compete defesa, confudo
serão citados seus herdeiros, e se procederá em sua causa na forma, que fica
dito no $ 3 deste título, porque poderão alegar, e provar coisa que de condenação
o releve.
6. Se algum preso, ou seja negativo ou confidente, se achar morto em seu
cárcere, e por ser a morte repentina, ou por alguns sinais, ou indícios parecer,
que podia ser violenta" os inquisidores o irão logo ver, levando consigo dois

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Notiírios, e o médico, e cirurgião, e em sua presença mandarão fazq exame no


corpo do morto, para constÍìr, se o preso se matou ou se o mataxam, e depois de
feito este exame, e de se fazer o auto dele no processo, serão perguntados os
médicos, cirurgião, Alcaide, Guardas e companheiros que com ele estavam, e
os pr€sos dos cárceres vizinhos ao cárcere do morto, aos quais farão as
perguntas necessárias para se saber, como a morte aconteceu, e se foi de dia,
se de noite; e constando pela prova de direito, que o preso se matou os
Inquisidores mandarão fazer diligencia no lugar donde era morador, sobre sua
capacidade, para se averiguar, se padecia algum alusão no entendimento, e fala
nojuízo, da qual procedesse a sua morte; e feito o exame, e diligencia, se correrá
com seu processo na form4 que fica dito nos mais defuntos.
7. Sendo os defuntos presos por culpas, que não forem de heresia, depois
de feito o auto de seu falecimento, e de serem perguntadas as testemunhas na
forma sobredita, ver-se-á o processo em mesa, com o Ordinário, e Deputados;
e sendo o crime de qualidade, que por ele se não incorra em confiscação de
bens, se tomará assento, que visto extinguir se o crime com a morte, a causa se
não continue, e para nos termos, em que estiver, e se dê notícia aos herdeiros
do defunto de sua morte, declarando-lhe, que podem mandar buscar seu corpo,
I e enterra-lo em sagrado, e fazer por sua alma os suftígios da lgreja, e se lhe
dará certidão, de que conste em como o defunto não foi preso por culpas de
heresia; porque suposto sua prisão foi pública" convém, que se dê satisfação a
ela: e tendo o crime confiscação de bens, se parecer, que não está provado, se
fará o mesmo; e em neúum destes casos se formará sentença no processo; e
estando provado ou havendo disso alguma dúvida, serão citados seus herdeiros,
e as pessoas, a quem tocar sua defesa, e com eles se vierem, ou não vindo, dado
defensor à causa, se procederá até a sentença final; e tomando-se assento, que
pelo tal crime o defunto incorreu em confiscação de bens, se publicará a
sentença na mesa" como se diz no Livro 3, Título 26, $ 10, e mandarão passar
certidão ao juiz do fisco, panfazer execução neles, e a seus herdeiros entregar
o coÍpo, e passar certidão na form4 que fica dito.

8. Havendo no S. Ofïcio prova bastante de testemunhas, porque paÍeçq


que algumas pessoas defuntas podem ser convencidas no crime de heresia,
mandarão os Inquisidores a requerimento do promotor,tirar certidão do livro
do batismo, para que conste, se eram os defuntos cristãos batizados, e não se
achando o dito assento, se fará sumário de testemunhas, para que conste, se
eram naturais do Reino, e como eram tidos e havidos por cristãos batizados; e
junta a certidão aos sumário, havendo o promotor feito seu requerimento, verão
os Inquisidores tudo em mesa' com as culpas do defunto, e pronunciarão que
sejam citados seus herdeiros, ou pessoas, a quem de direito pertencer sua defesa;
e esta citação se fará pessoalmente aos que estiverem no Reino, e por editos aos
ausentes dele, e se continuará na causa na forma que fica dito nos mais defuntos;

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Sônia Aparecida de Siqueira

e estando conclus4 verão os Inquisidores o processo em mesa com o Ordinrário


e Deputados e achando, que o crime esüí provado, condenarão os defuntos na
forma porém os Inquisidores grande consideração na prova, com que hão de
proceder contra os defuntos, que seja maior da que bastará para proceder contra
eles, se forem vivos; pois por si, não podem se defender e a defesa por terceiros,
fica mais difícil. E achando, que o crime não está provado, absolverão da
instancia a memória, e fama dos defuntos.

TÍTULo xlx
Dos ausentes

1. Ausentando-se deste Reino algumas pessoas culpadas no crime de


heresia, e apostasi4 os Inquisidores a requerimento do Promotor, mandarâfazer
sumário de sua ausência e juntar a ele certidão do livro dos batizados, para que
conste como o foram; e não se achando assento de seu Batismo, mandarão
perguntar algumas testemuúas, púd saber se os ausentes estavam tidos, e
havidos por cristãos batizados, e de que se ausentaram sem saber para que lugar,
ou que estão em parte onde não podem ser presos nem citados em suas pessoas;
e fazendo o promotor requerimento procederão contra elas.

2. Se parecer aos Inquisidores que os ausentes tem contra si prova bastante


para serem convencidos no crime de heresia, e apostasi4 mandarão passar
cartas de editos, nas quais os citem, e chamem, para que venham pessoalmente
à mesa do S. Ofïcio confessar as culpas, que há contra eles, e pedir perdão delas,
ou defender-se, e mostrar que estão inocentes; e isto dentro do termo, que lhe
for assinado, o qual seú maior ou menor, segundo a distancia dos lugares onde
se presume, ou deve presumir, que eles estão; e serão citados nas ditas caúas
para todos os termos, e autos judiciais do processo, até a sentença definitiva
inclusive.
3. As cartas de editos serão publicadas às portas da casa onde os ausentes
eram moradores, ao tempo, que se ausentaram, e notificadas as pessoas de sua
casa, se ai estiverem, e não estando, aos viziúos mais chegados; e depois disto
serão publicadas em um domingo, ou dia santo de guarda a estação da missa
do dia, nas lgrejas, de que os ausentes estão fregueses, e depois de publicadas,
se fixarão na porta principal da dita Igreja,,onde estarão todo o termo, que aos
ausentes nelas for assinado; e das publicações, e fixação, se passarão certidões
nas costas da mesma carta" declarando nela algumas pessoas das que estiverem
presentes, quando foram publicadas, assim àportados ausentes, como nalgreja;
e quando foram fixadas nas portas dela, as quais pessoas assinarão ao pé das
certidões, e tudo se juntará aos processos, e para ficarem fxadas irão outras
cartas do mesmo teor em forma, que possam ser lidas por todos.

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Regimento do Santo Olicio 1640
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4. Vindo os ausentes pessoalmente à mesa do S. Ofício dentro do termo,


que lhe for assinado, ou depois dele, antes de sua causa estar sentenciada, serão
ouvidos, e se procederá nela conforme a direito, e lhe mandarão os Inquisidores,
que se não saiam sem ordem do S. Ofïcio da cidade, em que ele assiste,
assinando-lhes dias certos, em que acudam as audiências: e se continuando a
causa houver informação, que se queÍem ausentaÍ, serão postos em custódi4
onde lhe parecer. E não vindo passado o termo assinado nas cartas de editos,
ser-lhe-á acusada sua revelia em três termos distintos, esperando-o de um até
o outro, nos quais serão apregoados pelo poúeiro da casa do despacho, que dará
sua fé de como não aparecem, a qual tomará o Noüírio nos termos das revelais;
e passados eles, apresentará o promotor seu libelo, e se lhe faná publicação da
prova da justiça, em termos diferentes, assinando-lhes em cada um deles os dias
que pÍÌrecerem, nos quais serão também apregoados, e acusadas as revelais na
forma" que fica dito; e feito o processo concluso em final, se despachará em
mesa com o Ordinário, e Deputados, como for justiça; e com o assento que se
tomar se enviará ao Conselho.
I 5. Não havendo prova bastante para os ausentes serem convencidos por
ela, se houver prova, de que resulte presunção de haverem cometido o crime
de heresia, precedendo informação como são ausentes, e cristãos batizados na
1 forma do $ l' deste título, os Inquisidores poderão proceder contra eles,
conforme à disposição do capítulo Cum contumacia haeretieis in 6. mandando
passar cartas de editos, citando-os por elas, que apaÍeçam pessoalmente a se
defender, e dizer de suajustiça sobre certos artigos tocantes à Fé em certo delito
de heresia; e nos editos se lhe porá pena de excomuúão maior por isso mesmo
ineurrenda" para que apareçam no termo, que lhe for assinado, o qual será maior
ou menor na forma que fica dito no $ 2o deste título; e irá repartido por três
termo iguais, dados pelas três canônicas admoestações; e estas cartas publica-
rão, e fixarão na forma, que fica dito no $ 3o deste título. E não aparecendo no
termo, que lhe for assinado, o Promotor acusará sua reveli4 requerendo, que
sejam declarados poÍ excomungados, e que agravem contra eles as censuras; e
os Inquisidores por seu despacho, pronunciatão sobre seu requerimento, e
mandarão passar carta declaratória, a qual será publicada, e fixada na mesma
forma, e se sobrestarâ na casa por tempo de um ano, e passado ele, se
continuarem em sua contumácia, e forem rever, se procederá nela, acusando as
revelais; e seguindo os mais termos do processo na forma do $ 4 deste título; e
assim a estes, como aos mais, condenarão conforme ao que vai declarado no
Livro 3,Título 26.
6. Se os ausentes sendo legitimamente citados na forma sobredita, não
aparecerem, perseverando em sua contumancia, se não dará defensor a suas
causÍrs; porém vindo alguma pessoa, a quem conforme a direito, possa tocar
sua defesa, e querendo na mesa do S. Oficio alegar, que os tais ausentes são

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Sônia Aparecida de Siqueira

defuntos, ou tem justa causa de audiênciq será admitida" e se procederá na


causa, confonne a direito.
7. Vindo os ausentes, depois de suas causas sentenciadas, e de estarem
relaxados, em esüátua, à justiça secular, apresentar-se na mesa do S. Ofïcio, ou
sendo presos, confessarem suas culpas, serão admitidos, e ouvidos, querendo
defender-se, e se procederá em suas causas conforme a direito; e no que toca a
confiscação de bens se guardará o que se dispõe no Livro 3, Título 26, $ 3.
8. Se alguma pessoa depois de se apresentar na mesa do S. OÍïcio, e
confessar culpas de heresia, se ausentar antes de se tomar assento em sua caus4
e não constar de lugar certo onde esteja, ou estiver em lugar, onde não pode ser
presa, nem citada; os Inquisidores procederão contra ela como ausente, citan-
do-a por editos na forma, que fica dito; e senão tiver contra si mais que srul
própria confissão, o processo se formará na forma do capit. cum contumancia;
mas se além de sua confissão, houver contra ela testemunhas, posto que delas
não resulte mais que presunção de haver cometido o crime, que confessou
poderão formar o processo em qualquer dos dois modos sobreditos.

rÍruro xx
Das suspeições

1. Quando algum réu disser que tem legitimas causas de suspeição, e que
com elas quer recusaÍ de suspeito a alguns dos Inquisidores, Ordinário, Depu-
tado, Notário, ou Comissário do S. Oficio, lhe será dito, que declare as razões
que tem de suspeição; e que para formar os artigos dela, há de estar com seu
procurador, ao qual os Inquisidores mandarão chamaÍ, e depois de lhe haverem
declarado para que os chamaram, e de lhe darem juramento, se ainda o não tiver
tomado, como procurador na causa do Réu sob o cargo dele lhe dirão, que não
venha com suspeição, se não entender, que é legitima, e não ordenada, a fim de
dilatar a causa, logo estará com o Réu, e lhe formará a suspeição, que será
escrita, e assinada por ele, etazìdaà mesa, onde depois de autuada, e juntada
por liúa ao processo, se verá pelos Inquisidores, os quais, se lhe parecer, que
os artigos contém tal matéria, que provada não conclui ser o recusado suspeito
ao recusante, julgarão por assento ao pé dos artigos, que a suspeição não
procede; porém se todos os artigos, ou algum deles parecerem de receber, se
dirá no assento, que os recebem visto sua matéria, e que por eles se perguntarem
as testemuúas, que o réu nomear; e para esse efeito será chamado à mesa, e
poderá nomear até cinco testemunhas a cada um dos artigos, ou até quinze ao
todo; e sendo tirada a inquisição das testemuúas, se verá em mes4 e segundo
o que por ela constar, dirão os Inquisidores no assento que se prova, ou que se
não prova quanto baste para o recusado serjulgado de suspeito ao recusante, e
não votar, ou escrever em seu processo.

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Regimento do Santo Oficio 1640
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2. Se o réu vier com suspeição a um dos Inquisidores, os outros, que ficam


livres serão juizes dela; e recusando a dois Inquisidores, serájuiz o terceiro
Inquisidor; e se for posta suspeição a todos, eles mesmos a verão em mesa; e
parecendo-lhes, que as causas são notoriamente frívolas, e intentadas somente,
afim de impedir, ou dilatar o curso do processo, assim o julgarão e irão por
diante na causa, como se não foram tentados de suspeitos: e se parecer, que as
suspeições são legitimas, e de materi4 que sendo provada, seriam os recusados
julgados opor suspeitos, se remeterão ao Conselho geral, para nele se determi-
nar, o que forjustiça.

3. Os mesmos Inquisidores serão juizes das suspeições postas à pessoa,


que assiste pelo ordinrário, e aos Deputados, Notários, e Comissários, e quais-
quer outros oficiais, etrataráo de sentenciar as causas de suspeição com a maior
brevidade, que for possível; porém enquanto elas durarem, não pararâ o curso
dos processos, antes o Inquisidor, ou inquisidores, que não forem recusados,
irão com eles por diante, e poderão votar nas sentenças interlocutórias que se
forem dando; e somente na definitiva não votarão, sem primeiro se acabar a
causa da suspeição, e se saber, que pessoas nela podem, ou não ser votos.

4. E nenhum dos sobreditos poderá votar, escrever, ou fazer alguma outra


diligencia na causa do réu, tanto que estiver tentando de suspeito; e tudo o que
frzer serâ nulo, e de neúum vigor; e sendo algum Inquisidor, Ordinário ou
Deputado julgando de suspeito, não poderá mais ser juiz do recusante; e se for
julgado de suspeito, a pessoq que assiste pelo ordinrário, lhe mandarão dizer,
que nomeie outra, que não seja suspeita; e sendo algum Noúário julgado de
suspeito, não escreverá mais na causa do réu mas será tudo o que tiver escrito,
até o tempo em que foi recusado. Porem se os comissários, que forem julgados
por suspeitos, tiverem feito algumas diligencias tocantes ao processo do Réu,
que os recusou, serão de nenhum efeito e se mandarão fazer outras de novo por
pessoas sem suspeita; e dai por diante lhe não cometerão as mais, que paÍa que
o processo do réu se houverem de fazer.

5. Nos processos, que finalmente estiverem sentenciados por assento do


Conselho geral, só não admitirá preso alguns com suspeição de qualquer
qualidade que seja, ainda que afirme com juramento, que lhe veio de novo;
porque neste caso justamente se pode presumir, que a suspeição é posta, só a
fim de embaraçar ou dilatar a causa; e assim mesmo depois de ter o Réu vindo
com a primeira suspeição, que os Inquisidores julgarão, que não procedia, ou
que a não haviam por provada, não poderá vir com a segunda; salvo se por
sumaria informação, tirada extrajudicialmente, antes de se dar licença ao Réu
para vir com suspeição, constasse aos Inquisidores, que ela teve nascimento de
novo. E se algum Réu disser, que toda a mesa em geral, ou todos os ministros

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Sônia Aparecida de Siqueira

do S. OÍicio lhe são suspeitos, e que lhes quer vir com suspeição, não sení
ouvido com tal requerimento.
6. Quando algum Inquisidor, ordinário ou pessoa, que por ele assistir,
Deputado notário, ou qualquer outro ministro do S. Ofício, entender, que é
suspeito a algum Réu, se poderá lançar de suspeito em sua causa, e neste caso
não bastará dizer, que tem apego nela; mas será necessário declarar por escrito
no processo que é suspeitojurejurando.
7. Se o Réu disser, que tem legitimas causas de suspeição a algum dos
deputados, ou secretario do conselho geral, e o processo for de qualidade, que
haja de ir ao Conselho, os Inquisidores nos darão conta disso, paÍa no caso
provennos como parecer justiça.
8. Nas causas entre partes, de que os Inquisidores coúecem, em virtude
das provisões, e privilégios Reais, se alguma das partes vier com suspeição a
algum deles, ou ao Notário, que na causa escÍever, coúecerão dela os inquisi-
dores na forma do $ 2, deste título; e em tudo o mais guardarão o que se dispõe
pela Ordenação do Reino no Livro 3, Título 31, dando apelação, e agravo para
o conselho, nos casos, que por ela se permitirem.

rÍruro xx
Das apelações
1. Das sentenças, que os Inquisidores derem nos processos, que se despa-
cham no S. Oficio, ou sejam definitivas, ou interlocutora, poderá o promotor
apelar para o Conselho geral, alegando por escrito as razões, com que pretende
mostrar por parte da justiça, que lhe feito o agravo; e isto haverá lugar não só
nas sentenças dadas em processos, que não houverem de ir ao Conselho; mas
também naqueles, que por bem deste Regimento lá devem de ir; ainda que no
assento se declare como se assentou, que o processo fosse ao Conselho.
2. As razões, que o promotor tiver para justificar a gravidade de sua
apelação, dará por escrito em papel separado, que se juntará ao processo; e
depois de vistas em mesa" ao pé delas, dirão também por escrito os Inquisidores
as principais razões, em que se fundou seu despacho, se nele não estiverem
declaradas, com toda a mais informação, que lhe paÍecer necessiáriq para do
caso haver inteiro coúecimento, e se poder decidir mais facilmente; e se não
tiverem mais razões, que as que posto no assento, responderão, que se remetem
a ele.
3. A mesma ordem, que há de ter o promotor de ser interposta sua apelação
por escrito, de responderem os Inquisidores a ela" e de vir tudo ao Conselho
junto aos autos, se guardará nas apelações, que interpuserem os Réu em seus

816 R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (j92) : 69 3-88j, jul./set. I 996.


Regimento do Santo O/ício 1640
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processos, aos quais para virem com elas, mandaÍão, que estejam com seus
procuradores, e eles lhes formarão a apelação por escrito, com as razões, e
causas em que a fundarem.

4. Poderão os presos apelar de todos os despachos, e sentenças que lhes


forem publicadas, e tiverem dano irreparável, ou força de definitiva; como será,
quando lhe forpublicado, que lhes não recebem adefes4 ou as contraditas, com
que tem vindo, ou a sentença de tormento; e bem assim poderão apelar de
qualquer outro despacho, que lhe for publicado, ou de que judicialmente
tiverem notíci4 ainda que publicado lhe não seja, nem se conteúa nele mais
que uma simples interlocutora, e por essa razáo pareçaque pertencia ao ordenar
do processo; porque justa causa é, que meio da apelação se emende aos presos
todo o agravo, que receberem em suas causas, sem nelas se passar avante: e
pode ser exemplo; se o Réu visse, que o libelo da justiça, que o promotor deu
contra ele, era acusado por relapso, e se sentisse nisso agravado, que a abjuração
primeira fora nula, ou que foi somente de leve, ou outra razão semelhante. Item,
se o Réu afirmasse que era cristão velho, e que não tinha alguma e feita
diligencia, e averiguação de sua qualidade, os Inquisidores lhe fizessem saber
como era da nação Hebréia. Item, se pedisse declaração do tempo, e lugar do
delito ou de alguma outra circunstancia, e lhe fosse denegada; porque em todos
estes casos, e nos mais semelhantes a eles, lhe será admitida sua apelação,
porém não poderão apelar das sentenças definitivas, e de quaisquer outras, de
que judicialmente não tem, nem devem ter notícia.

5. Se os réus apelarem, nos casos em que o podem fazer,táo poucos dias


antes do Auto, que não haja tempo para as apelações virem ao Conselho; os
inquisidores com o ordinário e Deputados, as verão em mesa, e consideradas
as razões, que nelas se alegarem, e o mais, que constar dos processos, se lhe
païecerem frívolas, as julgarão por tais, e que sem embargo delas se devem
cumprir os despachos e coisas, de que se apelar; e se entenderem, que por
virtude da apelação, e do que de novo se alegou, as sentenças, em todo, ou em
parte devem ser revogadas, se pronunciará aquilo, que por mais votos se
assentar: e apelando o Promotor no tal tempo, em que a apelação não pode vir
ao conselho, e ser despachada antes do auto, se verá me mesa; e havendo ao
menos dois votos, a que digam, que a apelação é de receber,frcarâ o preso
reservado.

6. Quando pelos despachos finais, que sobre as apelações dos presos forem
dados no Conselho, ou fora dele, se julgar que os Inquisidores procederão bem,
e que as paliações não são de receber, se lhe fará publicação dos tais despachos;
salvo se de lhe serem publicados resultar algum inconveniente, porque parece
aos Inquisidores, que o não devem fazer.

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Sônia Aparecida de Siqueira

TÍruLoXXII
De como se hão de dispor as coisas necessárias
pctra o auto daJë, e da ordem, que nele se há de guardar

1. Quando parecer aos Inquisidores, que estií o despacho de se concluir


brevemente, nos propoÍão três Pregadores, que lhes parecerem, que farão
melhor o sermão do Auto da Fé, paÍa que possam avisar com tempo aquele,
que nós escolhemos; e se houver algumas pessoas, que estejam juradas a
relaxação das Inquisições, que estiverem fora da corte nos proporãojuntamente
três desembargadores, para que deles escolhamos o que nos parecer, para ir
assistir ao despacho dos relaxados, procuremos que sua Majestade lhe mande
passar para este efeito os despachos necessiíÍios. E havendo alguma pessoa de
ordens sacras para relaxar àjustiça secular, nos avisarão também do bispo, que
poderá faz.er a degradagão, e juntamente do dia, em que o Auto se poderá
celebrar; e sendo-lhe por nos assinado, ordenarão de maneira, que sem falta
alguma sejam prestes todas as coisas necessárias para o Auto; e havendo alguns
apresentados, que sejam de ir a ele, os avisarão com tempo, para que não faltem
nesse dia.

2. Antes de se fazeraos convictos aprimeiranotificação disporão o cárcere


com tal ordem, que os presos, que já estiverem com assento final, fiquem em
corredores diferentes dos notificados para que não possam ter noticia uns dos
outros. Aos notificados mandarão por todos em um corredor sendo possível; e
aos guardas, que os vigiem com todo o cuidado, e que os presos, que houverem
de ficar no cárcere, quanto for possível sejam postos em casas donde não
possam ter noticias dos que no Auto houverem de sair, nem dos que de novo
vierem para o cárcere.
3. Ordenarão, que todos os penitenciados vão vestidos decentemente, e
para este efeito, oito, ou dez dias antes do Auto, saberão do Alcaide, que presos
têm necessidade de vestidos, e os mandarão prover, segundo sua qualidade;
mas não consentirão, que levem vestidos de sed4 grandes gadelhas e barbas; e
ao Tesoureiro a advertirão, que tenha hábitos bastante, e a cera necessária, e se
forem muitos os presos que estiverem para relaxar, que com tempo chame o
pintor parafazer os retratos e hábitos afogueados; e se houver livros defesos
para queimar, ou ossos de defuntos para relaxar, chame quem faça os caixões
de madeira, em que hão de ir, e cadeiras para os presos doentes; e em tudo o
mais que for necessiário, se haverão com tal cuidado, que não haja falta alguma:
chamarão outro o Juiz e Tesoureiro do Fisco alguns dias antes de se publicar o
auto, e lhe dirão que brevemente se há de publicar, e que façam prestes para
mandar fazer o cadafalso.

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Regímento do Santo Ofrcio 1640
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4. O Auto se publicará oito dias antes em todas as Igrejas da cidade, e


mandarão os inquisidores, que se façam os editais a tempo, e que ao sábado à
tarde antes do dia da publicação, se entreguem aos familiares, que os houverem
de repetir pelas igrejas; e neles mandarão por autoridade Apostólic4 que no dia
do Auto não haja sermão em alguma igreja da cidade, nem procissão; e
exortarão aos fiéis, que se achem a ele.
5. Na Inquisição que estiver na Corte, no domingo pela maúã, em que o
Auto se houver de publicar, o Inquisidor mais antigo irá dar conta ao rei ou à
pessoa, que estiver no governo do reino, como o Auto se há de publicar naquele
dia; e sendo caso que esteja fora da cidade, lho mandarão dizer por um deputado,
a tempo, que o recado lhe chegue antes do auto se publicar; e então lhe pedirão,
que ordene o capitão da guarda, que pelos tudescos mande guardar a porta da
cadafalso, paxa que sem ordem do Corregedor da Corte, que a ele houver de
assistir, não consintam que entre nele pessoa alguma.
6. Depois do Auto estar publicado, ordenarão ao capelão do cárcere da
penitencia, que assista na sala todos os dias, e aos procuradores dos familiares,
que mandem assistir também nela, naqueles oito dias, alguns familiares, para
que ali se achem, sendo necessários, e façam o que os Inquisidores lhe
mandaÍem; e que dêem um rol de todos os familiares, que houver na cidade
para poder acompanhar os penitenciados, declarando nele os velhos que pode-
rão acompanhar as mulheres. mandarão buscar alguns Clérigos para ler as
sentenças no auto, e deles escolherão os que mais expeditamente souberem ler
e tiverem melhor voz, aos quais mostrarão algumas sentenças sem os nomes
dos Réus, para que fiquem inteirados na letra, e teor delas.
7. Quinta-feira antes do Auto mandarão dizer por um Noüírio ao Coletor,
e Bispos, que houver na cidade, e por um solicitador ao Cabido, que terão seu
lugar no Auto, querendo se achar presentes, e pelos familiares, aos Prelados das
religiões, para que mandem alguns religiosos assistir no Auto. Na sexta feira
pela maúã avisarão ao Regedor pelo Meirinho do S. Oficio, que por quanto
: no auto poderá haver alguns relaxados, mande dar a ordem necessária, para os
julgar, e para a execução, que se hâ de fazer, e lhe pedirão, que ordene aos
t ministros justiça, que acompaúem a procissão, e assistirão no cadafalso, e
da
a porta do pátio da Inquisição; e onde o regedor não assistir, se dirá isto mesmo
na mesa ao Desembargador, que houver de presidir ao despacho dos relaxados,
ordenando-lhe, que se os ministros da cidade não forem bastante, mande
levantar as mais varas, que forem necessárias; e não indo o Desembargador,
por não haver relaxados, darão esta ordem ao Juiz do Fisco; e à mesa chamarão
os corregedores da Corte do crime, ou o Corregedor, e Juiz de fora da cidade,
paraque o Corregedor do crime da Corte mais antigo ouo Corregedordacidade,
tome à sua conta a guarda do cadafalso, e o outro Corregedor, ou Juiz de for4
a porta do pátio da Inquisição mais, que os ministros, familiares e pessoas, que

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Sônia Aparecida de Siqueira

houverem de acompanhar os penitenciados, das quais se lhe dará um rol; e no


mesmo dia, quando saírem da mesa pela manhã, mandarão chamar os religio-
sos, que houverem de assistir aos notificados, para que da uma para duas horas
estejam na Inquisição. Mandarão outro recado ao tesoureiro da capela do rei, e
onde ela não assistir, ao tesoureiro da Sé, para mandarem ordenar os altares do
cadafalso; e ao Reposteiro mor, ou a quem costuma dar os panos, que nele se
Íumam, para mandarem armar os que forem necessários.

8. Da sexta feira por diante ordenarão ao promotor, que vá fazendo a lista


das pessoas, que hão de sair no Auto para que ao sábado à noite esteja feita, e
se possam fazer por ela as copias necessárias. Na lista porão em primeiro lugar
os homens defuntos absolutos da insancia" e vivos também absolutos, se
houverem de ir ao Auto; logo os que não houveremdefazer abjuração; e seguir
se hão os que abjurarem de leve, ou de veemente; e a estes os que abjurarem
em forma: e se houver alguns defuntos confidentes, que sejam recebidos ao
grêmio, e união da S. M. Igreja, irão na lista dos vivos, que abjurarem em forma;
e a mesma ordem as guardará nas mulheres, e no último lugar os homens, e
mulheres vivos relaxados, e depois deles, as estátuas, e caixões de livros, se os
houver; e em cada abjuração precederão os que tiverem as penitencias mais
livres. E quando no Auto saírem algumas pessoas que forem presas segunda
vez, depois de serem reconciliadas, se levarem habito penitencial, irão na lista,
e ouvirão suas sentenças depois dos que abjurarem de veemente; e antes dos
que houverem de abjurar em forma e se o habito for diferenciado com insígnias
de fogo, seguir-se-ão último, os que levarem habito penitencial sem remissão.

9. Havendo presos doentes, que hajam de ir em cadeira" estátuas, e caixões


de livros proibidos, mandarão ao sábado à tarde, que se chamem os homens
necessários para os levar, os quais dormirão a noite seguinte dentro do pátio da
Inquisição, para que estejam prestes quando forem necessiírios: e bem assim os
que houverem de levar as arcas dos processos os quais irão com muita distinção,
e dentro das arcas irá o Regimento do S. Ofício, um dos cadernos dos Inquisi-
dores, o livro, em que esteja a forma da absolvição dos recolhidos, tinteiros, e
papel para escrever no Auto, sendo necessário.

10. Tendo os Inquisidores assentado quantâs pessoas sabem no Auto verão


quantos familiares tem para os acompanhar; è não sendo bastante, mandarão
chamar as pessoas que forem necessárias, que serão de limpeza conhecida, e
de bons procedimentos, e as mais autorizadÍrs, que se acharem; as quais, e aos
familiares mandarão avisar ao sábado paÍa se acharem no pátio da Inquisição
ao domingo de madrugada; e ao Prior do convento de S. Domingos avisarão,
que mande a comunidade na hora, que lhe assinarem, para levar o guião de S.
Pedro Mártir, e acompaúar a procissão.

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Regimento do Santo Olício 1640
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1 1. As sentenças das pessoas que houver de sair no Auto, se farão a tempo,


que ao sábado possam estarjuntas aos processos; mas antes disso as verão os
Inquisidores em mesa, para que não aconteça dizer-se nelas alguma coisa que
não conveúa, ou não conste dos autos; e muito menos as que podem causar
escândalo, ou mover a riso os ouvintes. Nas de mulheres casadas, ou de Réus
solteiros não irá declarada a qualidade do sangue dos pais, ou maridos, e
bastará, que nelas, e nos rostos dos processos, se confrontem pelos oficios e na
mesma advertência se terá nas sentenças de pessoas, cuja culpa não for de
judaísmo; salvo quando por diligencia feita nos autos, estiver averiguando sua
qualidade.
12. Ao sábado à noite mandarão os Inquisidores fazer quatro copias da lista
dos presos que estão para sair no Auto, uma o Alcaide, na qual se porão somente
os nomes das pessoas vivas pela mesma ordem, que hão de ir na procissão,
declarando-lhe as que hão de levar habito penitencial, afogueado, mordaça ou
carocha ou alguma outra penitencia e os relaxados; para que possa quando os
for entregando, dar a cada um o que conforme sua sentença deve levar; outra
para o inquisidor, que houver de assistir a entrega dos penitenciados, as pessoas,
que hão de ir com eles ao Auto, a qual será na mesma forma; a terceira para o
Meirinho, a qual além dos nomes das pessoas vivas, levará os das defuntas,
cujas sentenças se hão de ler no Auto, e distinção das abjurações, para que na
mesma forma os faça chegar ao lugar, em que hão de ouvir suas sentenças, e
juntaros que houverem de abjurar, em cada abjuração; aquartaparaos Notários
conforme a do Meirinho, paÍa que por ela vão dando os processos aos Clérigos,
que lerem as sentenças, e as abjurações a seu tempo. Todas estas quatro listas
serão conferidas antes de saírem do secreto, para que sejam conformes, e não
possa suceder algum encontro.
l3 . Ao Alcaide se entregará a sua lista antes da meia noite, para que ponha
em ordem os penitenciados, e ao Meiriúo a sua depois de acabarem de sair do
cárcere; e tanto que forem horas convenientes, o Inquisidor mais moderno irá
à porta do cárcere, com um Notário, levando a sua lista, e o rol dos familiares,
e pessoas, que houverem de levar os presos; e ordenará ao Alcaide, que os venha
trazendo, e os mandarâentregar pelo Meirinho, que está a porta do cárcere do
lado de fora, aos familiares e pessoas chamadas, as quais advertirá, que nem na
procissão nem o Auto, largarem o preso, que lhe for entregue, ou apartem dele,
sob pena de serem por isso castigados e advertirá mais o Inquisidor, se os
penitenciados levam os hábitos e penitencias, que lhe são impostas; e que as
mulheres principalmente moças, vão com homens velhos, e que com nenhum
penitenciado vá pessoa, de que possa haver escândalo.
14. Depois de acabarem de sair do cárcere, os penitenciados, sairá o capelão
do cárcere da penitencia, e onde não houver, um dos beneficiados da freguesia
\ com o crucifixo, \e.vantaúo nas mãos, acompanhado úe seïs famï\ïares, ou

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Sônia Aparecida de Siqueira

clérigos, com tochas, confonne ao costume, que houver em cada uma das
Inquisições, e detrrás do crucifixo irão os Relaxados com os religiosos, que lhe
assistirem, e ministros dajustiça, que os defendam da gente; e depois de sair a
procissão do pátio, se levarão para o Auto as arcas dos processos, com as quais
irão dois familiares; e por um Deputado se mandará a lista a El Rei, ou à pessoa,
que assistir no Governo; e ao Coletor, Arcebispo, ou Bispo da cidade, pelos
familiares: e como se entender que os penitenciados terão chegado ao Auto,
sairão os Inquisidores, e mais minisfos do S. Ofïcio, a cavalo, levando diante
o meiriúo com vara alçad4 e paÍa acompaúar a procissão, mandarão ao
solicitador mais antigo, que levante vara nesse dia, e com ela irá entre os últimos
religiosos de S. Domingos, e os primeiros penitenciados; e levará consigo um
dos guardas dos cilrceres, que melhor conheça os presos, para chamar quando
o meiriúo lho ordenar, para virem ouvir suas sentenças; e o guarda levará
mordaças para lançar aos que se descompuserem, se os Inquisidores o ordena-
rem.
15. Tanto que o hibunal chegar ao cadafalso, e estiverem os ministros
assentados em seus lugares, se começará o sermão, no qual o pregador, se
estivermos presente, nos captará benevolência e não estando, aos Inquisidores;
e acabado o sermão, se lerá do púlpito o edito da Fé, e monitoria geral; e depois
dele, se continuará com as sentengas, conforme a ordem das listas dos Notários,
e meiriúo; e tanto que se acabarem de ler as dos reconciliados, o Inquisidor
mais antigo tomará sobre pedis, estola, e capa Íoxa, e com autoridade devida a
este atoo irâfazer a absolvição, acompanhado dos clérigos da freguesi4 e dos
que lerem as sentenças, e do capelão do ciircere da penitenciária" os quais com
as varas tocarão os penitenciados; e os noüírios não acompanharão o Inquisidor;
e feita a absolvição, se recolherá o Inquisidor a seu lugar, e se lerão as sentenças
doas relaxados; e assim como se forem lendo, os irá o meiriúo entregando aos
ministros da justiça secular, que assistirem no Auto.
16. Depois de lidas as sentenças, e entregues os relaxados àjustiça secular,
um dos notários levará suas sentenças ao Inquisidor mais antigo, as quais serão
assinadas pelos Inquisidores, e seladas com o selo do S. OÍïcio, e o Inquisidor
as dará da sua mão ao corregedor do crime da Corte mais antigo, ou ao
desembargador, que houver de presidir no despacho dos relaxados, os quais as
irá receber onde o Inquisidor estiver, e ele lhas dará coma cortesia devida, e
necessária.
17. Tanto que os relaxados acabarem de sair do cadafalso, se ordenará a
procissão dos penitentes, e reconciliados na mesma forma, em que foram para
o Auto, e tornará até a sala da Inquisição, onde o Alcaide do ciárcere da
penitenciária tomará entrega deles da mão do meiriúo, e os recolherá no seu
cárcere, e nas Inquisições, que não tiverem cárcere particular da penitencia, se
fará à entrega ao Alcaide do ciírcere secreto, a quem os Inquisidores ordenarão

822 R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 69 3-883, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Ofcio 1640
-

que ponha os penitenciados em casas, donde se não possam comunicar com os


presos, nem dar novas das pessoas, que saíram no Auto, e os guaÍdas mandarão,
que com muito cuidado os vigiem na noite seguinte.
18. Acabando a procissão de sair do auto, os Inquisidores e mais minisfos
se recolherão cada um como lhe parecer, sem virem juntos em forma de tribunal,
e no dia seguinte pela manhã mandarão os Inquisidores trazer à mesa os
penitenciados, e os que houverem feito abjuração, à qual uns e outros assinarão
com Ë de um notário, e duas testemunhas na forma que se dispõe no Livro 3,
Título l, $ l, e a todos se dará juramento de segredo, do que virão, e ouvirão
nos cárceres, e com eles se passou na mesa do S. Ofício, de que se apartem da
comunicação de pessoas suspeitas que lhe podem fazer dano a suas consciên-
cias, em que tudo proceda de modo que dêem mostras, e sinais de sua conversão,
e verdadeiro arrependimento de suas culpas, e lhe farão lembrança das penas,
em que por direito incorreram conforme ao que no Liwo 3, Título l, vai
ordenado, e os tornarão a mandar para o lugar onde hão de ser instruídos.
i
19. Para instruir aos penitenciados, escolherão os inquisidores, um religio-
) so douto e prudente, ao qual chamarão à mesa, e lhe encaregarão, que os vá
instruir no cárcere da penitenciiíria, ou na Igreja, que lhe assinarem, advertin-
do-o de tudo o que lhes paÍecer necessário, e dando-lhejuramento, para que o
que alcançar dos penitenciados fora da confissão sacramental que lhe paÍeça
conveniente saber-se na mesa do S. Oficio, o venha dizer a ela; e aos estiverem
suficientemente instruídos, os ouça de confissão, e lhes passe disso certidão,
que dará ao Alcaide para a entregar na mesa, e o Capelão do cárcere da
penitencirâria, enquanto nele estiverem, lhes dirá missa todos os dias como se
dnno Livro 1, Título 22, S 11 e lhes ministrará o Sacramento da Eucaristi4
depois de ter ordem para isso dos inquisidores, do que passará certidão para se
juntar aos processos, e depois disto lhe imporão os inquisidores as penitencias
espirituais do Livro 3, Título 1, $ 6, que eles irão cumprir na forma , que no
mesmo livro se declara, de que lhe mandarão passar cartas em seu nome,
ordenando-lhe que se vão apresentar com elas perante os comissiirios, e onde
os não houver, peranúe seus párocos; e nelas irão declaradas, assim as peniten-
cias espirituais, que lhes forem impostas, como também as coisas, que lhe são
proibidas., e se contém no Livro 3, Título 3, $ 12.
20. Na terça feira seguinte depois do Auto, se fará execução nos peniten.
ciados, que forem condenados em açoites, e sairão da porta do pátio da
Inquisição, e serão levados pelas ruas costumadas; e no mesmo dia os degra-
dados serão mandados à cadeia pública, onde não houver cárcere da penitencia;
e dai os levará o meirinho à Igreja , em que se fizer a instrução; e depois de
instruídos serão mandados à cadeia da Corte, com precatório ao Juiz dos
degredados, em que se declarem o degredo, a que foram condenados, e se lhe
peça, que o faça cumprir na forma de suas sentenças.

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 693483, jul./set. I 996.


Sônia Aparecida de Siqueira

TITIJLO XXIII
Das coisas reservadas ao inquisidor geral e ao conselho
Muitas coisas há neste Regimento, das quais umas Íeservamos a nós e
outras ao conselho geral, que por si assim conveniente ao S. OfIcio; e posto que
todas estejam colocadas nos livros, a que pertencem; com tudo para se ter delas
melhor notíci4 e se acharem mais facilmente quando for necessário, as man-
darmos juntar neste título, como em sumário, donde irão remetidas aos próprios
lugares, em que se tratam.
Das coisas, que especialmente a nós estão reservadas, nos darão os Inqui-
sidores cont4 ou por carta" ou por consultq que enviarão serrada" para mandar-
mos resolver nelas o que for mais serviço de nosso Seúor; e das e das que são
reservadas ao Conselho, umas-hão de vir a ele por consulta da mesa, e outras
com os próprios autos, ou seja com assento da mês, ou sem ele, conforme à
qualidade delas, e ao que em cada uma está disposto, e todas virão dirigidas ao
Secretiário, para as apresentar no Conselho, e nele se resolverem como paÍecer
a justiça.
Por carta ao Inquisidor geral

Quando seacharemno S. Ofício culpas contraaspessoas, aque semandam


fazer informações para serem admitidas ao serviço da Inquisição, como se
dispõe no Livro l, Título 1, $ 4.

Quando a algum ministro do S. Oficio se oferecer alguma comissão, e ele


a quiser aceitar, como se diz no Livro l, Título 1, $ 9.

Quando houver descuido em se proporem em mesa os negócios, ou na


execução deles, que o Inquisidor mais moderno avise em segredo, Livro l,
Título 3, $ 7v. E pelo muito.
Quando suceder inquietação, ou diferença entre os inquisidores ou algum
deles tiver notícia que o outro cometeu culpa de castigo, Livro 1, Título 3, $ 9.
Quando houver notícia, que o S. Oficio se não guarda segredo, ainda que
seja em matéria leve, Liwo l, Título 3, $ 10v. E por este.
Que o Visitador do S. Ofício vá dando contra do que achar na visita" e das
dúvidas, que nela se lhe oferecem, Livro l, Título 4, $ 13.
Por consulta

Quando for necess:írio ir algum dos Inquisidores fazer diligencia fora de


S. Oficio, Livro l, Título 3, $ 13.
Quando parecer conveniente cometer aos Deputados a processaÍ, tomaÍ
confissões e denunciações, e perguntar as referidas, Livro l, Título 3, $ 14.

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 69i-88j, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Olício 1640
-

Quando faltar alguma das pessoas aprovadas para assistir nas ratificações,
Livro l, Título 3, $ 21.
Quando não houver diúeiro rra aÍca, ou o tesoureiro do fisco disser, que
não tem para alimentos dos presos, Livro 1, Título 3, $ 40.

Quando algum Inquisidor, Deputado ou Promotor, cometer culpa grave,


ou fizer coisa que mereça castigo, repreensão ou advertência ou for necessiírio
fazer diligencia sobre queixa contra eleso Livro 1, Título 3, $ 47.
Quando for necessiírio cometer alguma diligencia fora da cidade onde
assiste o S. Ofïcio a algum Deputado ou Promotor, Livrol. Título 3. $.50. e no
Livro2, Título 10, $ 7.
Quando parecer, que convém repreender na mesa alguma pessoa, a que
conforme ao Regimento se houver npla de dar cadeira de espaldas, Livro 1,
Título 3, $ 59.
Quando não houver número de votos bastante para despacho, Livro 2,
Título 13, $ 2.
Quando algum réu disser, que lhe é suspeito algum dos Deputados do
conselho geral, Livro 2,Tinilo20.
Por consulta ao Conselho geral

Sendo necessário dar confessor aos presos fora dos casos declarados nos
livros, Título 3, $ 28.
Quando de alguma das Inquisições de Castela se pedirem culpas de pessoas
Livro l , Título 3, $ 3 1 .
delatas nas deste Reino,
Lista dos presos para entrar em despacho, Livro l, Título 3, $ 36.
Quando for necessário fazer despesa, que exceda à quantia referida no
Livro 1, Título 3, ç 42.
Quando parecer, que se deve prorrogar o tempo de fiança, as pessoas' que
devem dinheiro ao S. Ofïcio, Livro 1, Título 3, $ 45'
Quando for necessaria confrontar alguma pessoa culpada com as testemu-
nhas da justiça, Livro 2, Título 3, $ 7.

Quando algum oficial do S. Ofïcio cometer culpa grave, Livro 1, Título 3,


$ 47v'. Porém.
Quando algum preso pedir procurador fora dos ordinários do S. Oficio,
Livro 2, Título 8, $ 2.
Quando pzrecer, que se deve antecipar, ou pospor a primeira notificação
aos convictos, Livro 2, Título 15, $ 2.

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):693-883,iuL./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

Quando parecer, que se deve remitir alguma parte dos bens aos aprìesenta-
dos, que abjurarem em público, Livro 3, Título l, $ 5.
Quando se tratar de evocar o S. Ofïcio culpas de algum blasfemo conde-
nado no juízo Eclesiástico, Livro 3, Título 12, $ 13.

Autos sem assento da mesa ao Conselho


As informagões das pessoas, que pretendem ser admitidas ao serviço do S.
Ofício, Livro 1, Título 1, $ 5.
As conclusões, que os Inquisidores mandarem rever, quando algum dos
qualificadores duvidar em alguma proposição delas, Livro 1, Título 3, $ 56.
Os processos de pessoas suspeitas, que diante do Visitador confessem as
culpas declaradas no $ 3, Título 1, Livro 2.
Osprocessos de pessoas, que diante doVisitadordo S. Ofïcio confessarem
culpas de heresia formal, Livro2, Título 1, $ 4.
Os processos de pessoas, que diante do Visitador confessarem culpas de
relapsi4 Livro2, Título 1, $ 5.
As suspeições, que se puserem a todos os Inquisidores, quando parecer,
que procedem, Livro 2, Título 2, g 2.
Decretos de prisão ao Conselho

As culpas que resultarem da visita, quando parecer, que são bastante para
a prisão, Livro2, Título l, $ 7.
As culpas, em que houver proposições qualificadas, Livro 2, Título 3, $
11.

As culpas dos que forem pronunciados à prisão por uma só testemunh4


que não for parente em primeiro grau, na formq que dispõe no Livro 2, Título
4, $ 4v'. Mas se.
t
As culpas dos Clérigos ou Religiosos; as de pessoas seculares, a quem
conforme ao regimento, se deve dar na mesa do S. Oficio, cadeira de espaldas,
e as de mercadores de grande cabedal, Livro2, Título 4, $ 5.
Todas as de sodomia, e quando houver dúvida, se o mercador é de grande
cabedal, ou a pessoa de qualidade, que mereça cadeira de espaldas, Livro 2,
Título 4.
Processos com assento ao Conselho

Os processos, em cujo despacho o Visitador do S. Ofïcio, e ordiniírio, não


concordarem nos votos, Liwo2, Título 1, $ 2v', e não concordando.

R IHG B, No de Janeiro, I 5 7 (392) : 693383, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Ofrcio _ t640

os processol anresenta{os, de cujas curpas


lgs
parecèr,
souberem pessoas não
;:i,*[? ïido que há intonvenïente Ã;;;;;inadas, Livro
quando não tiverem contra
si mais que sua
"""0?r'ullïÏïfli,$n,:5ï'ï:,
os
processos dos apresentados por culpas
cometidas em Reinos estranhos,
"oú"aq ã!*"",
uoi
,t:ïï*ï""i:u3:*t que não devem ser presos,
Livro
os processor'^.ï_q.*,houver d'igencia sobre a quaridade do
réu, ou fosse feita a sua instanci sangue do
u, r;loÍfi.io,
" ;ìi,1i;ïffi
I I $ 6.
em cujo assento final empatarem
,3, $ott0:to"essos' os votos, Liwo 2,Tífulo

n"",1i#;ï1ff;:fliiji1: ïï se reduzirem os voros, para se saber o que


Os processos absolutos a instanci4 Liwo 2,Título
13, $ 14.
os processos' em que houver voto
de reraxação, Liwo 2,Títuro
13, $ 14.
os processos de pessoas, que forarn pronunciadas à prisão por
,"r:ïïti:
ou tiverem ïi
"d;
; ;Ë ;;;i g'o' u,r"nto ã;dtü assento do
Lìvr o 2,rítu ro
os processos depessoas acusadas por
Ofício, Lìwo2,fituto l:, g 14.----*"""' curpas cometidas nos ciírceres do s.
os processos de falsrárioq heresiarcas,
de Mouros, Livro 2,Título --* Dogmatistas e arrenegados em terra
i :j,-íì;:*
os processos de pessoas cristãs velhas,.que
de afirmarem não estar o corpo
cristo nosso seúô-r na Hóstia conr"úâui,e"-p"ffi#rïïã
Céu, Liwo 2,Título 13, 14. esrá no
$ "o_o
Todos os Drocessos de pessoas que
forem condenadas em abjuração
de
iff*tl*:ü:ï;ï*'"'ôono"n'çâãp".*ia.i", ii"iJã, iïàr" g 14, e r,
necessiário dar tormento no pofro
,rrSffo' uÏ a alguma mulher, Livro 2,

Quando Darecer convenientemente repetir


de uma vez, tiv.o z,Títtrt;'íi|íï'o;."'" "t
o tormento a algum Réu mais

oto"essos, em houver voto de tormento in caput


alienum ,Livro2,Tífulo
, o, $ï
os processos de pessoas, que confessarem
que estiio convictas, depois de serem notificadas,
Livro2,Íii.rfo lj,-ú.

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57(j92): 693-gg3,jut./set.


I 996. 827
Sônia Aparecida de Siqueira

Os processos de pessoas, que confessaÍem no Auto, onde assistir o Con-


selho, Livro 2, Título 15, $ 9.
Os processos de hereges afirmativos, Livro2,Título 16, $ 4.
Todos os processos de defuntos, Liwo 2,Tífiilo 18, $ 3.
Os processos dos ausentes, Livro 2, Título 19, $ 4.
Os processos, em que apelar o Promotor, ou as partes na forma do Título
21, do Livro 2.
Os processos dos relapsos apresentados segunda vez,Livro 3,Título I $ 9.
v'. E acontecendo.
Os processos dos apresentados no tempo da gnça,em que parecer a algum
dos votos, que devem abjurar em público, sem habito penitencial, Livro 3,
Título 1, $ 4.
Os processos dos apresentados que confessar culpas cometidas em Reinos
estranhos, quando houver dúvida se abjurarão em público, Liwo 3, Título 1, $
10.
Os processos dos apresentados fora do tempo da gtaça, em que parecer à
maior parte dos votos, que devem abjurar em público, sem habito penitencial,
Livro 3, Título 1, $ 4.
Os processos, em que parecer, que os Réus condenados aabjuragão de leve,
ou de veemente, não devem ir a Auto público, Livro 3, Título 2, ç 12.
Os processos de pessoas suspeitas, que receberem o santíssimo Sacramen-
to, não estando em jejum, Liwo 3, Título 13, $ 4.

REGIMENTO DO SANTO OFÍCIO


LTVRO III
o o' o'"^ cr ime s'
à:l#: !:H;' :: ;#;8;:r
Contra os hereges, e apostatas, que sendo crisüios batizados, deixam de ter,
e confessar a nossa santa fe católica, e se apartam do grêmio, e união da Santa
Madre Igreja, estiío por direito comum, e breves apostólicos determinadas as
penas de excomunhão latae sententiae, reservada ao Sumo Pontífice pela bula
da Ceia do Seúor, da qual os Inquisidores podem absolver no foro exterior,
pela faculdade apostólica, que para isso tem: de irregularidade, que igualmente
impede o exercício das ordens já recebidas, como também receberem se de
novo: de infrmia, e privação de ofïcios, e beneficios obtendo, com inabilidade
para alcançar outros: de relaxação à Cúria secular, e confiscação de bens, desde

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(j92):693-883,juL./set. 1996.


Regímento do Santo Olício 1640
-

o dia, em que se cometeu o delito. Além destas penas, há outras menos graves
como a abjuração, degredo, açoite, reclusão, cárcere, hábito penitencial, con-
denação pecuniári4 e penitenciais espirituais. Com umas, e outras se costuma
no santo Oficio castigar os culpados, segundo a diferença dos crimes, estado
da caus4 e qualidade das culpas, e das pessoas, que as cometerão, e o modo,
com que nelas se há de proceder no santo Oficio, vai declarado nos títulos
seguintes.

rÍrwo r
Dos hereges, e apóstatas da santafé católica apresentados

1. Posto que todas as pessoas de qualquer estado, e condição que sejam,


pelo crime de heresiq e apostasia" apartando.se por obras, ou por palawas, com
confumácia, de nossa santa fé católica, conforme o direito, encoram nas
sobreditas penas de excomuúão maior, inegularidade, inÍâmia privação de
honras, ofïcios, e benéficos, confiscação de bens, e relaxação najustiça secular:
com tudo se vierem apresentar se na mesa do Santo Ofício, assim dentro do
tempo dagraça, como fora delq e confessarem nela culpas de judaísmo, ou de
qualquer outra heresi4 ou apostasi4 e declararem os cúmplices, com que ÍN
cometerão, se ao tempo de sua apresentação não estavam delatas (ainda que
depois dela lhe sobreveúam testemuúas) e suas confissões parecerem verda-
deiras, serão recebidas ao grêmio, e união da santa Madre lgreja; e na mesa
abjuraram em forma, sem hábito penitencial, diante dos Inquisidores, um
notiírio, e duas testemunhas, as quais serão oficiais do S. Ofïcio, e assinarão
juntamente com os Réus os termos da abjuração.
2. E deste mesmo favor goz.arão os apresentados, que ao tempo de sua
apresentação estiverem delatos por uma só testemunha; salvo se essa testemu-
nha for tal, que concorram nela algumas das qualidades, de que se trata no livro
2.Títt;Jo 4. $ 4.Porque então farão abjuração em público no lugar que parecer
aos Inquisidores, conforme a qualidade das pessoas, das culpas, e da confissão;
e levarão hábito penitencial, e terão as mais penas, e penitências espirituais,
que se entender, que convém à solução de suas almas, com o mais que se dirá
no $ 6. E assim mesmo farão abjuração em público, quando estiverem delatos
por algumas testemuúas, posto que sejam cúmplices, ou por tais indícios das
mesmas culpas, que paÍeça aos Inquisidores que havia prova bastante para
serem pronunciados a prisão.
3. E se por confissão do apresentado, ou por qualquer via constar, que pode
haver mais testemunhas que uma, que depoúam de suas culpas, e que nelas
não sejam cúmplices, em tal caso serão examinadas na forma, que hca dito
Livro 2. Título 2. $ 2.: e não resultando de suas ditas coisas que encontre a

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):693-883,jul./set. 1996. 829


Sônia Aparecida de Siqueira

confissão, ou não se podendo achar para serem examinadas, fará o apresentado


abjuração secreta na mesa do santo Oficio; por quanto para ser pública, era
necessário, que antes de se apresentar, estivesse delato emjuízo, ou fora dele
houvessem testemuúas, que vissem a culpa, e a fizessem pública; e não bastará
que sejam cúmplices, quando não tiverem testemuúado em juízo, para o
apresentado haver de abjurar em público; porque não há de crer, que os que
foram cúmplices no delito o hajam de publicar; e ficando a culpa em segredo,
justamente goza o réu do favor de apresentado.
4. E se as culpas forem públicas, e de qualidade, que peçam pública
satisfação, ainda que o réu, que se veio apresentar, não esteja delatado, abjurará
no lugar público, que parecer aos Inquisidores, tendo se respeito a qualidade da
pessoa, e circunstÍincias das culpas; e a todos os apresentados assim no tempo
da graça, como fora dela, que por estarem já delatos abjurarem em público comg
habito penitencial, se fará o favor de lhe tirarem logo o hábito, tanto que fi zoÍem
suas abjurações; e concorrendo tais qualidades na pessoa e nas confïssões, que
frzer o apresentado no tempo dagraça, que pÍìÍeça a algum dos votos, que deve
fazer sua abjuração em lugar público, sem hábito penitencial, se dará disso conta
ao Conselho geral para prover como for justiça: e quando por essas mesmas
qualidades da pesso4 e confissão do apresentado fora do tempo da graça"
parecer a maior parte dos votos que deve abjurar em público, sem hábito
penitencial, se mandarão os autos ao Conselho, com o assento, que se tomar.
5. Os apresentados no tempo da graça, que pelo crime de heresia tinham
incorrido nas sobreditas penas, serão absolutos pelos Inquisidores, da excomu-
nhão maior, quando abjurarem; e lhes será remetida a pena da confiscação dos
bens, na forma do edital da graça, e também a de privação dos ofïcios, e
benefïcios, e serão dispensados na irregularidade: E isto mesmo se guardará
com os apresentados fora do tempo da gtaça, que abjurarem na mesa do s.
Ofïcio, aos quais se não fará seqüesho em seus bens, nem lhes serão confisca-
dos, por ser assim conveniente em ordem ao bem espiritual, e ao segredo, com
que devem ficar suas confissões. Porém se eles abjurarem em público, perderão
seus bens do tempo, que cometerão o delito; e se parecer aos Inquisidores, que
a qualidade da pessoa, o tempo, o modo, e circunstâncias da confissão lhes
vista
devem ser remetidos seus bens, ou alguma parte deles, farão sobre isso consultq
que enviarão com os autos ao Conselho geral, para nele se determinar, se
convém pedir a sua Majestade, que faça mercê ao réu de lhe perdoar os bens,
que tinha perdido, ou alguma parte deles.
6. E a todos os sobreditos apresentados, imporão os Inquisidores as
penitências espirituais, que parecerem necessárias, mandando-lhe, que se apar-
tem da companhia, e ocasiões, que os podem perverter, e provocar a tornarem
a cair nas culpas, que conftssarão, ou em outras semelhantes; e lhes encarre-

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57 (j92) : 69 3-88j, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Ofrcio 1640
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garão que ouçam as pregações, e assistÍÌm aos oficios divinos nas Igrejas, e
comuniquem com pessoÍrs virtuosas, e doutas, que os possam bem instruir nas
coisas da fe; e para examinarem bem suas consciências, lhes mandarão, que se
confessem sacramentalmente nas quaho festas principais do ano,Natal, Páscoa,
Pentecostes, e Assunção de nossa Senhora. E não lhes poderão dar penitências,
posto que sejam espirituais, pelas quais se possa vir em coúecimento das
culpas, que confessaram.
7. Os que se vierem apresentar na mesa do santo Ofïcio no tempo do Edito
dagraça, ou fora dele, e confessarem culpas de judaísmo, ou de qualquer outra
heresia, se estiverem delatos por outros crimes, cujo coúecimento também
pertence, ao santo Ofício, serão recebidos à reconciliação, e abjurarão na mesa
sem hábito penitencial, na forma, que fica dito no $ 1. E do mesmo favor de ser
recebidos à união da Igreja com penas espirituais, na forma que fica dito no $
6. E de abjurar em mesa sem hábito penitencial, gozaráo aqueles, que estiverem
delatos pelas mesmas culpas, que vem confessar, por uma só testemunha; salvo
se com ela concorrerem os indícios, ou a qualidade de parentesco, que se refere
no liwo 2. Título 4. $ 4. Porque neste caso se guardará o que fica dito no $ 2.
Deste título. E se os apresentados estiverem presos nos cárceres do S. Ofício
por qualquer outro crime, e confessarem em mesa culpas de heresia, que não
estavam delatos, se seguirá o que estii disposto no livro 2.Titulo 2. ç 14
8. Os Heresiarcas, e Dogmatistas, que em qualquer tempo se vierem
apresentar, e confessarem suas culpas com sinais de arrependimento, e mostras
de verdadeira conversão, serão recebidos à reconciliação em lugar público com
hábito penitencial, por razáo do prejuízo, e escândalo, que deram com sua falsa
doutrina; e terão além das mais penas, e penitências espirituais, que lhes serão
impostas, reclusão por algum tempo em algum mosteiro, ou lugar, que parecer
aos Inquisidores, para que assim possam ser bem instruídos, e tirados dos erros,
que criam, e ensinavam, atentando-se muito pelo perigo, que pode haver de
tornaÍem outra vez a eles; e assim na reclusão, como nas mais penitências, se
poderá acrescentar o que parecer conveniente aos que se apresentarem fora do
tempo dagraça.
9. Das pessoas, que se vierem apresentar com culpa de relapsia no crime
de judaísmo, ou de outra heresia, se ainda por elas não estiverem delatas, serão
as confissões recebidas, e examinadas na forma, que fica dito no livro 2. Título
2. $ l. E assentando-se, que paÍecem verdadeiras, e que os culpados verdadei-
ramente se convertem a nossa santa Fé, não abjurarão de novo, se no primeiro
lapso tiverem abjurado em forma; mas serão absolutos na mesa, da excomunhão
maior, em que incorrerão, e lhe imporão os Inquisidores penitenciais espirituais,
e as mais penas, que parecer, que convém, segundo a qualidade de suas culpas;
e lhe nomearão pessoa douta, e virtuos4 que os confesse, e instrua nas cousas
\

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(j92):69j-88j,jul./set. 1996. 83r

ì
Sônia Áparecida de SQueira

da Fé. Porém apresentando-se depois de estarem delatos, ficará sua causa na


disposição de direito, e Breves Apostólicos.
E acontecendo, que algum relapso depois de uma vez apresentado, se torne
apresentar segunda vez, e confesse culpas de heresia cometidas em terceiro
lapso, se ao tempo, que assim se apresentar, não estiver delato, será recebida
sua confissão, e se remeterão os autos ao Conselho geral, com o parecer dos
Inquisidores para nele se ordenar como no caso se deve proceder.
10. Os apresentados fora do tempo da graça, que confessarem culpas de
judaísmo, heresia, ou apostasi4 cometidas em Reinos estranhos, ou com
cúmplices ou de que saibam outras pessoas, que as vissem cometer, se ainda
não estiverem delatos, e parecer, que suas confissões são verdadeiras, serão
recebidos ao grêmio, e união da santa Madre Igreja, e abjurarão na mesa diante
dos Inquisidores, Notririos, e oficiais, sem hábito penitencial, para que com este
favor se movÍìm os culpados a confessar suas culpas; e sendo o caso tal, que
haja dúvida, se é bem que abjurarem em público, se dará disso conta ao
Conselho geral, para nele se ordenar o que se deve fazer.
11. Posto que os crimes totalmente ocultos não estejam sujeitos ao juízo
da Igrej4 todaviase alguma pessoa vier à mesa do santo Oficio pedir perdão
de culpas ocultas por acidente, no crime de heresi4 e apostasia, das quais contra
ele não podia haver prova, por quanto ainda que sairão a ato exterior, com tudo
não foram vistas, nem sabidas dq pessoa alguma; será absoluta da excomuúão
maior, em que incorreu, e reconciliada judicialmente, e lhe serão impostas
penitencias espirituais, que mais convenientes parecerem, conforme ao $ 6.
Deste título; guardando se o mais, que fica disposto no livro 2. Título 2. $ 13.
E por razão de serem as culpas ocultas por acidente, e confessadas na mesa
espontaneamente, se não fará seqüestro nos bens da pessoa, que as cometeu,
nem lhes serão confiscados.
12.Para tirar a dúvida, que pode haver sobre a abjuração dos menores:
declaramos, que o varão, que for menor de dezanos e meio, e a fêmea de nove
e meio, não abjurarão, nem em público, nem em secreto na mesa; ou sejam
apresentados, ou denunciados; e passando da dita idade, até os anos, que
chamam de descrição, que são quatorze ao varão e dose na fêmea, constando
judiciaknente, por testemunhas, e juntamente por exame com as mesmas
pessoas, feito com fe do Notário, que a ele assistir, que tem entendimento, e
são capazes de dolo, para poderem pecÍÌr, e caírem neste crime; abjurarão na
mesa, sem se esperaÍ, que cheguem à idade dos ditos doze, ou quatorze anos;
porque nestes termos a malícia supre a idade, conforme o direito; e tanto que a
fêmea for de doze anos de idade compridos, e o varão de quatorze, farão
abjuração em público, assim como afazem os de maior idade.

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Regimento do Santo OJício 1640
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TITULO II

Dos negativos

1. Havendo prova legítima de alguma pessoa se declarado por crente, e


observante da lei de Moisés, ou de alguma outra seita, posto que disso conste
por testemuúas singulares, e cúmplices no mesmo delito, sendo o número, e
qualidade delas, qual se requer conforme o direito, e prática do santo Oficio; e
parecendo que as testemuúas depõem verosimilhante, e com as circunstâncias
necessiírias; se a tal pessoa negar haver cometido o delito, e persistir em sua
negação de modo, que seja julgada por convicta no dito crime, irá ao auto
público da Fé, e levará hábito com fogos na forma costumada, e lhes serão
confiscados seus bens, desde o tempo que constar pela prova dajustiça haver
cometido o crime, e será relaxada à Justiça secular, conforme a disposição de
direito, e Breves do santo Ofício.
2. E em memória, e destacam do crime, os hábitos, com que os tais
negativos, e quaisquer outros convictos por hereges, forem entregues à Justiça
secular, se porem com seus nomes, e de suas pátrias, na forma costumada, nas
t freguesias donde eram naturais, e moradores, para que em todo o tempo se possa
ter coúecimento de quem, foram; e o mesmo se fará no lugar onde assistir o
S. Ofício, em uma Igreja principal, secular, ou regular que mais conveniente
parecer, para que sejam vistos de todos.
3. E todas as sobreditas penas haverão os negativos, que forem convictos
em alguma cerimônias heréticas que se provem serem feitas por atos reiterados,
como são, nojudaísmo, a guarda das Páscoas dos Judeus, que vem na Lua de
Março, ou os jejuns do Thaniz das segundas, e quintas feiras, ou o do Quipur,
que vem no seu dia grande do mês de Setembro, ou na observância da guarda
dos Sábados.

I 4. E sendo os negativos Heresiarcas, ou Dogmatistas levarão ao Auto da


ì fé carocha, com título de Heresiarca, ou Dogmatista, e as casuÌs, em que se
provar, que faziam sinagoga, e ajuntamento para ensinarem seus erros, serão
arrasadas, postas por terra, e salgadas, e no chão, que ficar delas, se levantará
um padrão de pedra, com letreiro, no qual se declare a causaporque se mandarão
arrasar, e salgar.
5. Havendo de ser relaxada à Justiça secular pessoa, que tenha ordens
sacras, irá ao Auto da fé em colpo, vestido em hábito clerical; e tanto que for
\
ì lida, e publicada no Auto a sentença de sua relaxação, será degradado atual-
mente no mesmo auto, das ordens sacras, que tiver, por um Bispo, na forma de
direito, e cerimonial Romano; e feita assim a degradação atual, se lhe vestirá
logo hábito de relaxado, e com ele será entregue à Justiça secular.

R IHGB, Rio de Janeiro, I5 7 (392) : 69 3-88j, jul./set. I 996. 833


Sônia Aparecida de Siqueira

6. E sendo Religiosos de alguma das religiões, e ordens aprovadas, não


levarão ao Auto da Fé o hábito de sua religião, mas irão vestidos em hábito
clerical; e as religiosas, que forem relaxadas, irão com hábito secular, e nas
sentenças de suas relaxações, que se lerem em público no Ato, se nomearão
somente por religiosos, ou religiosas de cerüa religião, sem se declarar em
particular o nome dela.
7. Sendo algumas pessoas presas por culpas de heresia, de que foram
acusadas, ou denunciadas; se pela prova dajustiça senão provar tanto que baste
para serem convencidas, e negarem haver cometido as tais culpas, dando a
defesa, que tiverem; antes de seus processos se despacharem em final, serão
pronunciadas a tormento, para com este meio se ver, se pode descobrir a verdade
das ditas culpas, na forma" que fica disposto no livro segundo, título 14.
8. E se no tormento negarem, e cs Inquisidores ouvirem, que está satisfeito
a ele, serão sentenciadas afazer suas abjurações públicas, segundo a qualidade
da prova; que houver, e segundo o que dela tiverem diminuído pelo tormento,
e poderão também ser condenadas em algum tempo de cárcere, ou de reclusão
em mosteiro, onde façam penitência, conforme a qualidade de suas culpas, e
nas penitências, que lhe derem, lhes mandarão, que ouçam pregações, e que se
confessem, nas quatro festas do ano, com confessores, que bem os instruam nas
coisas da Fé, e recebam a comuúão, e também lhes poderão por outras penas
arbitriírias, e penitenciais espirituais que paÍecer lhes convém à salvação de
suas almas.
9. E os que abjurarem de veemente, poderão ser condenados em pena
pecuniríri4 com tanto que não exceda a terceira parte de seus bens; e se pareceÍ,
que se deve impor pena pecuniária, aos que abjuraram de leve, se não executará,
sem primeiro virem os autos ao conselho, com o assento, que sobre isso na mesa
ordinrâria se tomar, como fica dito no livro 2. Título 13. $ 14.
E sendo Sacerdotes, ou tendo Ordens sacras, além da abjuração, e pena
pecuniríri4 serão suspensos do exercício das Ordens, que já tiveram recebido,
e inabilitados para serem promovidos às que lhes faltarem; mas esta pena não
será perpétu4 senão pelo tempo, que paÍecer aos Inquisidores, segundo à
qualidade da prova, e da abjuração, que fizerem, pela qual fica purgada em parte
a suspeita, que contra eles havia.
10. E tendo dignidade, oficio, ou beneficio, a que esteja anexa jurisdição
Eclesirástica, poderão também ser suspensos dela" na sobredita forma; e se
parecer, poderão obrigar aos que tiverem benefïcio com cura de almas, e que
abjurarem de veemente suspeitos na Fé, a que os renunciem dentro em certo
tempo, que para isso lhe assinarão, de que se farátermo nos autos, que por eles
será assinado; e em tudo se haverão os Inquisidores com grande advertência,
anão procedendo às sobreditas penas de suspensão, e renúncia, senão quando

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Regimento do Santo Oficio 1640
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a qualidade da pessoa" e da prova o pedirem, considerando, que devem prati-


car-se, senão concorrendo tais circunstâncias, que não somente pareçam lícitas,
mas necessárias.
11. Quando os que abjurarem de veemente, forem religiosos, ou religiosas
de alguma religião aprovada, além das mais penas referidas, serão privados de
voz passiva para sempre, e da ativa pelo tempo, que parecer, e se lhes mandará
que sirvam em seus mosteiros os oficios humildes da religião.
I 2. Tendo a pesso4 que não for convencida de heresia, tais qualidades, que
pareça aos Inquisidores, que não deve ir ao Auto público fazer abjuração de
leve, ou de veemente, e que bastará para satisfação dajustiça, abjurar na sala
da Inquisição, ou em outro lugar conveniente, que não seja em Auto público,
enviarão ao Conselho o processo como o assento, que nele se tomar.
13. Quando algum réu preso porculpas de heresia" forabsoluto da instância
t do jufuo ouvirá suã sentença na mesa dó santo Oficio, perante os Inquisidores,
ì e oficiais; porem se pelo assento do Conselho estiver determinado, que a
t sentença se lhe publique no Auto da Fé, em caso , que o réu assim o queria;
ì antes de lhe publicar na mesa, lhe farão os Inquisidores saber, que ele estií
absoluto da instanci4 e que sua sentença se há de publicar na mes4 ou em auto
público; que veja aonde quer que se lhe publique; e querendo o réu, que seja
no auto, neste caso irá a ele, e se lhe não publicará a sentença na mesa.
rÍrulo rrr
Dos confidentes
1. Todos os que depois de delatos, presos, e acusados no santo Oficio por
culpas de heresia" as confessarem nele com mostras, e sinais de verdadeira
conversão, satisfazendo a prova da justiga" serão recebidos ao grêmio, e união
da santa Madre Igreja, e irão ao Auto público da fé com vela acesa na mão, e
hábito penitencial, e nele ouvirão suas sentenças, estando em pé, descobertos
na forma costumad4 e farão abjuração em forma, e lhe serão confiscados seus
bens, desde o tempo, em que cometerão o delito, e se lhes imporão outras penas,
e penitências espirituais, que parecerem aos Inquisidores, de cárcere, e hábito,
segundo a qualidade de suas culpas, e estado, em que as confessarão como
abaixo se declara; e terão instrução nas coisas da Fé, e se lhe mandará o mais
que fica dito no $ 6. Título 1. Deste livro; declarando-lhes, que serão obrigados
a mandar certidão de como se confessarão pelas Páscoas, na forma do dito $ 6.
Mas ordenar-lhe-ão, que não recebam o santíssimo Sacramento da Eucaristi4
sem particular licença do santo Oficio.
I 2. E depois de serem instruídas nas cousas da fe necessrárias para salvagão
de suas almas, lhes mandarão cumprir suas penitências nos lugares, em que
eram moradores, e foram presos, para satisfazer com sua conversão, e penitên-

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392): 69j-88j, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

cia, ao escândalo, que deram com suas culpas; e nisto se terá particular
advertência, encaÍïegando se aos Comissrários dos distritos, para que o façam
assim cumprir, como convém.
3. Os que confessarem suas culpas, logo em sendo presos, ou nas primeiras
sessões, que com eles se ftzerem, sendo as confissões feitas antes de serem
acusados pela Justiça; e sendo satisfatórias, se receberão com cárcere, e hábito,
e o árbitro, o que poderá se favorável, ordinário, ou dilatado, segundo o tempo
e estado, em que ftzerem as ditas confissões, e segundo a qualidade, e circuns-
tâncias delas; o favorável durará por tempo de três meses; o ordinrário de seis,
o dilatado de nove.

4. Os presos pelo crime de heresia, que começarem a confessar depois da


Justiça ter vindo com libelo contra eles, se nas confissões, que ftzerem,
reconhecerem, e confessarem todos seus eros, e todas as cerimônias heréticas,
que tiverem feito, e o que souberem de outras pessoas; parecendo sua confissão
inteira, e que não encobrem nela cousa alguma. Antes que de todo seu coração,
se convertam a nossa santa fé; serão recebidos com cárcere, e hábito perpétuo,
e com as mais penas, e penitências, que paÍecerem, as quais serão maiores, que
as daqueles, que confessarão antes de serem acusados, e o hábito perpetuo
durará por tempo de três anos.

5. Porém quando algum réu depois de preso, e acusado pela Justiça, antes
de lhe serem publicadas as testemunhas dela, confessar suas culpas, e a
confissão for muito satisfatória pelos sinais, que mostrará de sua conversão, e
arrependimento, e pela declaração das culpas, e dos cúmplices, que deu, e
descobriu; poderão os Inquisidores não votar em pena de cárcere, e hábito
perpétuo, senão a arbítrio; e isto mesmo poderá ter lugar no réu, que posto que
não mereça tanto favor pelo tempo, em que fez a confissão; com tudo o merecer
pelo modo, com que aftzer, e pelos sinais, que der de seu arrependimento, e
declarações, que fizer das culpas, e culpados no mesmo crime.

6. Quando o preso confessar logo depois de sua prisão, nas primeiras


sessões, que com ele se tiverem, e depois for acusado por alguma diminuição;
se satisfizer logo a ela se poderá também votar com o mesmo favor de cfucere,
e hábito a arbítrio; e parecendo, que não merece tanto favor para logo se votar
na fcirma sobredita, se porá no assento, que passado um ano, se nos faça
lembrança, para que dispensemos com ele no cárcere perpétuo.

7. Confessando algum réu suas culpas depois de ser notificado aos quinze
dias antes do Auto, de como está convencido no crime de heresia, e apostasia;
se satisfizer como deve, com sua confissão, e como de direito se requer, será
recebido com cárcere, e hábito perpétuo sem remissão, e as mais penas, e
penitências espirituais, que se lhe impuserem, serão mais graves, que as

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):69j-883, jul./set. 1996.


ê,
( Regimento do Santo O/ício 1640
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daqueles que foram recebidos com cáÍcere, e hábito perpétuo simplesmente; e


o cárcere, e hábito perpétuo sem remissão, durará por tempo de cinco anos.

8. Se o réu confessar depois da notificação, que se lhe faz aos três dias do
Auto, quando se entender, que confessa com verdadeiro arrependimento, e
conhecimento de seus eÍïos, e que descobre todos os cúmplices, de modo, que
não pareça sua confissão simulada, e feita somente com o medo da pena da
relaxação; e será recebido com cárcere, e hábito perpétuo sem remissão, o qual
levará ao auto com insígnias de fogo, na forma cosfumad4 e será condenado a
galés por tempo de três até cinco anos, segundo a qualidade, e circunstância de
confissão, que fizer, e das mostras, que der de sua conversão; e sendo mulher,
a condenação de galés, que nela não pode ter lugar, será para S. Tomé, Angol4
ou partes do Brasil, por tempo de cinco até sete anos.

9. E se as culpas, que os réus confessarem em qualquer tempo, forem de


jejuns, ou outras cerimônias heréticas, feitas dentro dos ciirceres do S. Oficio,
depois de serem neles presos; se as confessarem com as mais que tiverem
cometido antes da prisão, com mostras de verdadeira conversão, e arrependi-
mento, declarando os cúmplices delas, serão recebidas suas confissões com
t
cáÍcere, e hábito perpétuo sem remissão.

10. Os heresiarcas, e Dogmático, posto que confessem antes de ser acusa-


) dos pela Justiç4 sempre devem ser examinadas suas confissões, com maior
advertência, para que se vej4 se são verdadeiras, e os sinais, que dão de sua
conversão, mostram estarem de todo apartados dos erros, em que criam, e que
ensinavam; e concorrendo estas circunstâncias, serão recebidos com cárcere, e
hábito perpétuo, sem remissão, e com reclusão, pelo tempo, que parecer que
convém para sua instrugão na Fé, como fica dito no $ 8. Título l. deste livro, e
com o hábito penitencial levarão ao Auto daFé carochacomtítulo de Heresiarca
ou Dogmático.

1 1. Se os réus confidentes forem clérigos, além das mais penas acima ditas,

com que devem ser reconciliados, segundo o tempo, e estado, em que confes-
sarem suas culpas, serão suspensos paÍa sempre do exercício das ordens, que
tiverem, e ficarão irregulares, para não poderem receber ouffas, e incorrerão
em privação dos ofïcios, benefícios, honras, e dignidades, que possuírem, e
ficarão inábeis para poderem alcançar outras; e se forem religiosos, ou religio-
sas, terão a mesma penitência de hábito, e cárcere; e em lugar do degredo, terão
reclusão nos cárceres de seus mosteiros, ou outro tanto tempo, e serão privados
paÍa sempre de voz ativa, e passiva, e se lhes mandará, que sirvam em seus
mosteiros ofïcios humildes da religião; o que tudo irá declarado em suas
sentengas, nas quais serão nomeados, como fica dito no título segundo, $ 6. E
levarão o hábito, que no mesmo $ se declara.

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):693-88 j, jul./set. 1996. 837


Sônia Aparecida de Siqueira

12. E para que os reus confidentes do crime de heresia, que foram recebidos
ao grêmio, e união da santa Madre lgreja, cumpram com humildade suas
penitencias, e mostrem no exterior o sentimento, que devem ter dos enos, em
que cairão; os Inquisidores lhes mandarão, depois de abjurarem em público,
que não tenham, nem possÍÌm ter offcios públicos, posto que seja sem dignidade,
nem jurisdição, como são Procuradores, Advogados, Médicos, Cirurgiões,
Boticrários, Sangradores, Pilotos, ou Mestres de navios, nem ainda bombardei-
ros, e que em suas pessoas, e vestidos não possam ülzer, nem tragam ouro,
prata" nem pedraria, ou vestido de ced4 nem andem a cavalo; salvo se forem
camiúando, nem tragam armas ofensivas, posto que sejam obrigados a tê-las;
somente poderão usar de espad4 depois que forem dispensados; o que tudo
cumprirão sob pena de que fazendo o contrario, serão castigados com as penas,
que parecerem; e no temo, de sua soltura lhes será declarada a proibigão das
cousas sobreditas, e como não poderão usar delas sem licença especial dos
Inquisidores.
13. E quanto aos filhos, cujo pai, ou mãe foram condenados pelo santo
Ofício, por hereges, ou relaxados à Justiça secular, e bem assim aos netos, que
por liúa masculina descenderem de seu Avô relaxado, se mandará, que não
sejam Juizes, Meirinhos, Alcaides,Noüírios, Escrivães, Procuradores, Feitores,
Almoxarifes, Secretiirios, contadores, Chanceler, Tesoureiros, Médios, Cirur-
giões, Boticários, Sangradores, Contadores de rendas reais; e nem usem de
outras hontas, ou de quaisquer outros ofïcios que sejam, ou se possam chamar
públicos, nem os serão por si, nem por interposta pessoa, sendo sua a proprie-
dade deles., nem tragam sobre sua pessoa, nem em seus vestidos, e trajes cousa
algumq que seja insígnia de alguma dignidade, milícia, ou oficio Eclesiástico,
ou secular.
14. Posto que na proibição acima dita, acerca dos ofïcios públicos, se haja
de proceder igualmente com os confidentes reconciliados, e com os filhos, e
netos dos relaxados; com tudo com os tais filhos, e netos (principalmente se o
forem de algum relapso, que antes de ser relaxado, confessou suas culpas, e se
mostrou delas arrependido) se usará de maior favor, para efeito de se dispensar
com eles na dita proibição.

TÍTULO IV
Dos confidentes diminutos

I . Quando o réu, que confessou as culpas e heresia por que foi preso, estiver
diminuto em sua confissão, e a diminuigão fo4 em cumplicidade, que esteja
legitimamente provada com algum seu ascendente, ou descendente, ou com
marido, ou mulher, não lhe será a confissão recebida: e por quanto se deve ter
por simulada, será relaxado à Cúria secular por confidente diminuto, e simula-

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Regimeno do Santo Oftcio 1640
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do: e se a cumplicidade for de pessoa paÍente sua no primeiro grau transversal,


ficará em arbíhio dos Inquisidores haver-se de receber, ou não ser recebida sua
confissão; no que se terá respeito à qualidade do réu, tempo, em que fez a
confissão, e circunstâncias dela.
2. E se a diminuição for de jejuns, ou outras cerimônias judaicas, feitas nos
cárceres do S. Oficio, havendo-as o réu feito em estado de negativo, se os tais
jejuns, e cerimônias se provarem, como de direito, e estilo se requer, será
entregue à justiça secular, pela violenta presunção, que há de ser fingid4 e
simulada sua confissão e a relaxação se fará como de confidente diminuto, e
simulado. Porém se o réu depois de fazer os ditos jejuns, e cerimônias, começar
a confessar suas culpas, com mostras de verdadeira conversão, e declarar em
suas confissões, haver feito os tais jejuns, e cerimôniasjudaicas, no tempo, em
que cria em seus erros, posto que não declare serem feitas nos cárceres do s.
Ofïcio, será recebida sua confissão, por quanto, se deve presumir, que dizendo
o réu dos jejuns, e cerimônias, por que for acusado, não encobre com malícia
o lugar, em que o fez; e se fizer os tais jejuns, e cerimônias depois de ter feito
sua confissão, posto que nela tenha dito de jejuns, e cerimônias da mesma
espécie daqueles, que fez no cárcere, não será recebida sua confissão, se nela
não declarar, que comente a culpa do s jejuns, ou cerimônias também nos
cárceres do santo Ofïcio.

3. Havendo na confissão, em qualquertempo, que se fizer, diminuição de


tempo à parte posterior, provada pelas testemunhas da justiça, na forma da
práúica do S. Ofïcio; os Inquisidores examinarão a confissão com grande
consideração, vendo se convém receber os tais confidentes com a diminuição
do tempo, em que esüio diminutos; e se é tiio considenível, que não pareça
verosímil, que estando reduzidos à Fé, o deixam de confessar, e pedir absolvição
inteiramente de suas culpas, principalmente quando antes das confissões as
tiverem negado com pertinácia.
4. E se os que confessarem suas culpas de heresia, porque foram presos,
tiverem tais diminuições, e contradições nas confissões e crença de seus erros,
que se julgue, e entenda, examinada bem a capacidade dos réus, ser inverosímil,
o que dizem da crença de seus eros; se guardará nos tais casos, a disposição
de direito, e prática do santo Oficio.

5. Se depois de alguma pessoa apresentada, e reconciliada por confissão,


que fez de culpas de heresia, se achar por testemunhas, que dela vieram depois
denunciar, que não falou verdade nas confissões, que fez; em tal caso, se
procederá contra el4 na forma, que fica dito no livro 2. Título l. $ 12. E
satisfazendo, se usará com ela de misericórdia, dando-lhe as penitências espi-
rituais, que pareoer mais conveniente para bem de sua alma, e não abjurará
segunda vez, mas será absoluta na mesa da excomuúão, com que ficou ligada,

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57 (392) : 693-883, jul./set. I 996. 839


Sônia Aparecida de Siqueira

por não haver inteiramente falado verdade nas confissões, e não descobrir os
cúmplices. Mas em caso, que por não satisfazer seja presa, posto que depois
satisfaça às diminuições irá ao Auto público da fé com hábito penitencial a
arbítrio, ou perpétuo segundo merecer.
6. Quando alguma pessoa, que dantes for preza, e reconciliad4 for presa
segunda vez por diminuta, e satisfizer a suas diminuições, irá da mesma maneira
ao Auto com hábito penitenciaV e se o que teve da primeira vez,for a arbítrio,
da segunda será perpétuo; e se for perpétuo, será a segundavez sem remissão;
e se for sem remissão, será com insígnias de fogo.
7. E se a diminuição das ditas confissões estiver provada pelas testemuúas
dajustiça, que depois do réu abjurar, vieram dizer contar ele, e for de qualidade,
que não a confessando o réu, por ela houvera de ser enfregue à Justiça secular;
em tal caso, satisfazendo, será o cárcere, e hábito penitencial perpetuo sem
remissão, o qual levará ao auto da fé com fogos; e declarando em sua confissão
que perseverou na crença de seus erros, até o tempo, em que satisfez as
diminuições, será mais condenado em perdimento, e confiscação de seus bens,
até a publicação da última sentença; e não sendo a diminuição de qualidade,
que mereça pena ordinária; ou não estando a cumplicidade legitimamente
provada, ou dizendo, que a crença lhe durou somente, até o tempo da primeira
confissão, não teút confi scação de bens.
8. Como hereges afirmativos se procederá na forma que estiá disposto no
livro 2. Título 16. E persistindo em seus erros, serão entregues, e relaxados à
justiça secular, conforme à disposição de direito, e ao que fica dito nos $ 1. Do
Título 2. E sendo caso, que se possa temer, que digam em público algumas
cousas contra nossa santa Fe, levarão ao Auto mordaça na boca com hábito de
relarados.
Porém se recoúecerem seus erros, e se reduzirem anossa santa fé católica,
fazendo inteira, e verdadeira confissão de suas culpas, serão recebidos ao
grêmio, e união da santa Madre Igreja, com cárcere e habito penitencial,
segundo o tempo, e estado, em que fizerem suas confissões, na forma, que esta
disposto no Título 3 deste liwo $ 3. e nos seguintes, e terão reclusão pelo tempo,
que parecer, em um mosteiro, ou em outro lugar conveniente, pare que assim
possam ser instruídos nas cousas da fé, advertindo-se ao perigo, que pode haver
de tornarem outra vez aos erros, que professaram.

TÍTULO V
Dos que revogam as confissões, que judicialmente
.fi"eramno Santo Oficio
1. Por quanto os que revogam as confissões, que tem feito de culpas de
judaísmo, ou de outra qualquer heresia, são havidos por negativos, impeniten-

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(j92):693-883, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Olício 1640
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tes: se alguma pessoa espontaneamente confessar no S. Ofício culpas de


judaísmo, heresia, ou apostasia, pelas quais estava delata, e depois com algum
intervalo revogaÍ sua confissão, sem provar que nela houve erro, ou alguma
outra cousa, que justamente o releve: os Inquisidores examinarão a qualidade
da prova, que contra ela houver; e sendo a que de direito se requer, juntamente
com sua confissão, se não reduzir, e arrepender, se procederá contra ela na
forma de direito, e estilo da inquisição, relaxando à Justiça secular como
negativ4 e impenitente: e o mesmo se entenderá no que revogar a confissão,
que tiver feito com qualquer grau de tormento, estando ratificada depois de
vinte e quafo horas, como de direito, e prática se requer; e porém se a revogar
antes da dita ratificação, será posto a tormento, e se procedení contra ela na
forma" que fica dito no livro 2. Título 14 $ 11. e revogando-a por três vezes,
sem querer assentar nel4 será condenada em pena de açoites, ou de degredo
para galês, ou em outra que parecer, tendo respeito ao tormento, a que estava
julgado, e ao que não levou.
2. Quanto algum réu, que não estava delato, confessar culpas de judaísmo,
heresia, ou apostasia, e depois disso com algum intervalo revogar sua confissão;
se antes da revogação lhe vier prova do mesmo crime, a qual junta com sua
confissão seja bastante, como de direito se requer, para se haver por convencido,
se procederá contra ele na forma sobredita, e persistindo com contumácia em
sua revogação será relaxado à Justiça secular.

3. Mas sendo caso, que depois de ter feito, e no intervalo revogado a


confissão, sem estar delato pelo dito crime lhe acresça prova de novo; os
Inquisidores a examinarão com grande consideração, para quejunta à presun-
ção, que resulta de sua confissão, se veja, se fica a prova bastante para se poder
proceder à pena ordiniíria de relaxação.

4. E quando, nem antes, nem depois de revogar a confissão houver prova


conta o revogante, mais que a que resulta da confissão que revogou; posto que
a revogação seja feita no intervalo, e não prove nela elro, ou causa outra, que
o relve, não se lhe dará a pena ordinária; porém abjurará de veemente suspeito
na fé, e terá degredo, e as mais penas arbitrárias, e penitenciais espirituais, e
que parecer aos Inquisidores.

5. Toda a pesso4 que revogar em todo, ou em parte sua confissão, posto


que depois assente nela, e seja recebida ao grêmio e união da santa Madre Igrej4
terá ciârcere, e hábito perpétuo sem remissão, e as mais penas arbitriírias, e
penitenciais espirituais, que parecer aos Inquisidores, na forma que fica dito no
título l. Deste livro, $ 6. Porém se revogaÍ o que em sua confissão tiver dito de
outra pessoa, mostrando que o fez por inadvertência, ou por estar melhor
lembrada ao tempo, que vem declarar sua confissão; parecendo que fala

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Sônia Aparecida de Siqueira

verdade, e não havendo presunções em conhario, não será condenada nas ditas
penas.
6. E o que na mesa do santo Ofïcio revogaÍ sua confissão depois de ser por
ela reconciliado ao grêmio, e união da Igreja; sendo examinado pela revo gação,
e persistindo nela" será havido por herege impenitente, e senão persistir na
revogação, será castigado pela dita culpa, em pena de cárcere, e hábito perpétuo
sem remissão, o qual começará da publicação da última sentenç4 e terá agoites,
e degredo, e as mais penas arbitnârias, e penitenciais espirituais que parecer aos
Inquisidores.
7. Toda pessoa, que depois de ser reconciliada pelo s. Oficio, em público,
ou ao menos perante algumas pessoas disser, que não cometeu a heresi4 ou
crime que confessou, ou alguma parte dele, será logo recolhida nos ciírceres do
s. Ofício; e senso convencida pela prova da Justiça, ou por sua confissão, senão
tiver ainda cumprido as penitências, que lhe foram impostas em sua sentenç4
será condenada em cárcere, e hábito penitencial perpétuo sem remissão, e em
pena de açoutes, e degredo para as galés por tempo de cinco até oito anos, e iú
ao auto público dafé, aouvir sua sentença, e terá as mais penas, e penitências,
que parecer aos Inquisidores; e sendo mulher, será o degredo de outros tantos
anos para o Brasil, ou Angola. E se cometer este crime depois de haver cumprido
as penitencias, que em sua sentenças lhes foram dadas, será castigado como
temerário, nas sobreditas penas de degredo, e açoites; mas poderá haver alguma
moderação no degredo.
E se a prova não for bastante para se haver o crime por provado, sení
condenada a pessoa, que o cometer, que vá ao Auto da fe, ouvir sua sentença
com hábito penitencial, que se lhe acrescentará um grau mais, daquele com que
foi reconciliada, com tanto que não seja menos que perpétuo, o qual começará
da publicação de sua sentença; e isto se entenderá, posto que ao tempo que
cometeu a dita culpa tivesse já cumprido sua penitência; e terão as mais penas,
que aparecer aos Inquisidores, segundo a qualidade da prova, e circunstâncias
da culpa. E se o réu depois de preso persistir em se revogar, do que havia
confessado, será condenado nas penas, que por direito estão impostas contra os
impenitentes, e revogantes, conforme ao que esüí dito. No $ l. Deste título.
rÍrurovr
Dos relapsos

1. Conforme o direito manifesto, aquele que sendo aprimeiravez conven-


cido por legítima prova de haver caído em alguma heresia, que abjurou em
forma; com tudo por sua confissão, ou por outra prova legitimamente consta,
que segunda vez caiu em heresia, ainda que não seja da mesma espécie: e
também por Íicção de direito, é havido por relapso aquele, que havendo

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Regimento do Santo OÍício 1640
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abjurado de veemente suspeito na ft, segÌrndavezestá convencido na culpa de


heresia: e ÍNsim mesmo é havido por relapso, o que depois de abjurar em formq
caído no crime de fautor de hereges, pela violenta presunção, que se considera,
de aprovar com esta culpa o primeiro erro, que tinha abjurado.
2. Contra os hereges relapsos se procede conforme o direito, e estilo do S.
Oficio, com as mais graves penas contidas no princípio deste livro. Por tanto
se algum preso por crime de heresia, for convencido de relapso em algum dos
sobreditos casos, não poderá ser reconciliado, e recebido ao grêmio da lgreja
Católica, posto que mostre sinais de penitencia, e conversão; antes será relaxa-
do, e entregue àjustiça secular, e perderá seus bens, que serão confiscados para
o Fisco Real, desde o tempo, em que tornou a cometer o delito.

3. E somente se der tais mostras de arrependimento, e frzet confissão em


form4 tiío satisfatóri4 que pareça estar verdadeiramente convertido à fé, os
Inquisidores o mandarão absolver sacramentalmente da excomuúão maior,
em que coneu pela culpa de relapsia, e lhes mandarão dar no Oratório da
Inquisição o santíssimo Sacramento da Comunhão, na forma, que está dito no
livro 1. Título 15 $ 5. e acerca da relaxação, e forma da sentença" se guardará
com os relapsos, o mesmo que com os negativos convictos, segundo acima fica
dito no Título 2 deste livro $ 1.
4. E se o tal relapso, estiver impenitente sem confessar as culpas de relapsi4
sendo legitimamente convencido delas, será relaxado à Curia secular, assim
como os outros negativos convictos impenitentes, sem ser absoluto da excomu-
úão, nem se lhe administra o Sacramento da Eucaristia.
5. Sendo caso, que não se provém legitimamente contra o réu as culpas de
relapsi4 porque foi preso, de maneira, que se possa haver por convencido delas
para efeito de ser relaxado à Justiça secular; será condenado a tormento
conforme a qualidade da prova; e se confessar, será havido por convicto; e não
confessando, irá ao Auto da fe, ouvir sua sentenç4 e não fará abjuração de novo:
e sendo a presunção da prova, que tiver contra si veemente, o poderão condenar
cm pena pecuniiária, com tanto, que não exceda à terça parte dos bens, que
possuir, e o degradarão para fora do reino pelo tempo, que parecer, havendo
respeito à qualidade da prova, e prejuízo, que se pode seguir a outros de sua
comunicação; e se a presungão, que resultar da prova, for somente leve terá as
penas, e penitências, que se entender, que convém à salvação de sua alma.
t
6. B em caso, que o tempo do hábito penitencial, que lhe foi dado em sua
reconciliação seja acabado, não levará hábito ao Auto; porém durando aind4
\ levará ao Auto hábito penitencial, o qual se lhe dará perpétuo sem remissão, do
tempo, que lhe for publicada a última sentença, com as mais penas que ficam
ditas no $ precedente.

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)
Sônia Aparecida de Siqueira

TITULO VII
Dos apóstatas, aft ene gados, hereges estrangeiros,
e infiéis, que delinqüem neste reino

1. Apresentando-se na mesa do santo OÍïcio algum apostata arrenegado,


que sendo cristão batizado, confesse haver se apartado de nossa santa ft
católica, e passado a seita de Mafoma, será recebido com muita misericórdia e
fará abjuração na mesa, sem hábito penitencial perante os Inquisidores, e seus
oficiais, e absoluto da excomuúão, em que incorreu, e se lhe imporão as
penitências espirituais, que parecer, e o mandarão instruir nas cousas da fé,
necessárias para salvação de sua alma, e lhe serão seus bens remetidos na forma,
que fica dito no Título 1 $ 5.
2. E se o tal arrenegado, que assim se apresentar, confessar, que por medo,
por mau tratamento, arrenegou somente de palavra de nossa santa Fé, e não de
coração, dizendo, que sempre nele a reteve, será recebida sua confïssão e ouvirá
sua sentença na mesa do S. Oficio, e nela abjurará somente de leve, e será
absoluto ad cautelam da excomuúão, que poderia ocorrer, e terá as penitências
espirituais, que parecer que mais convém para bem de sua alma. Porém se for
pessoa suspeit4 se terá respeito à sua qualidade, e às circunstâncias da culp4
para conforme a isso se lhe dar a abjuração, que mereceÍ.
3. E se o arrenegado depois de ser preso, ou remetido pela justiça secular
ao S. OÍïcio, confessar nele suas culpas, dizendo que por violência" medo, ou
mau tratamento se passou só exteriormente à seita de Mafona, não se apartando
nunca no coração de nossa santa Fé, abjurará também de leve mas será em auto
público, e se lhe darão as penitências, que parecerem aos Inquisidores.
4. Mas se confessando suas culpas na forma, que fica dito constar, que
arrenegou, e se lançou com os Mouros, e que professou a dita seita de Mafonq
em idade, e tempo, em que ainda não tiúa suficiente instrução de nossa santa
Fé católica, não fará abjuragão alguma, e somente será absoluto ad cautelam,
daexcomunhão, e mandado instruirnas coisas daFé, como convém à salvação
de sua alma.
5. Quando os tais arrenegados se não vierem apresentar, nem confessar
suas culpas; antes sendo presos por elas as negarem, serão postos a tormento,
pela presunção, que contra eles result4 de não sentirem bem de nossa S. Fé,
por se haverem passado aos Mouros, e renegado exteriormente, e persistindo
em sua negação, farão abjuração no lugar, que parecer aos Inquisidores,
segundo for a qualidade das pessoas, e das culpas que cometeram.
6. E se depois de presos confessarem suas culpas, dizendo porém, que por
violência, medo, ou mau tratamento arrenegaram exteriormente de nossa S. Fé
católic4 tendo sempre no coração; emtal caso não havendo provaem conhário,

R IHGB, No de Janeiro, I 57 (392) : 693-883, jul./set. I 996.


Regimento do Santo O/ício 1640
-

posto que das testemunhas porque foram presos, resulte presunção, sendo filhos
de Católicos, e criados entre eles, farão abjuração de leve em lugar público, e
terão as mais penas, e penitências, que parecer aos Inquisidores, que os
mandarão absolver ad cautelam, da excomuúão, e instruir nas coisas da Fé.
7. Mas se forem pessoas suspeitas, e confessarem depois de presas na forma
sobredita serão postas em tormento, pela presunção, que contra elas resulta, da
culpa, e de não se virem apresentar, e confessa-la na mesa do S. Oficio, e feita
a execução do tormento, abjurarão em lugar público, conforme à suspeita, que
se formar contra elas, e se guardará o mais que fica disposto no $ precedente.
8. E acontecendo haver prova contra os tais culpados de que arrenegaram
exteriormente, de nossa santa Fé Católica, sem violência, medo, ou mau
tratamento, antes que de sua liwe vontade se passarÍrm à seita de Mafomq
fazendo seus ritos e cerimônias; se procederá contra eles na forma em que se
deve proceder contra os mais hereges, e apóstatas de nossa santa Fé.
9. E os que tornarem a reincidir nas ditas culpas, se no primeiro lapso
tiverem abjurado de leve, no segundo farão abjuração de veemente, e terão as
mais penas, e penitências, que os Inquisidores arbitrarem; e havendo no
primeiro lapso abjurado de veemente, não farão no segundo abjuração, antes
se procederá contra eles na forma de direito.
10. Vindo algum herege estrangeiro apresentar-se na mesa do S. Oficio, e
pedir nela perdão de suas culpas será examinado na forma, que fica dito no livro
2. Título 2 $ 10. e será admitido à união da S. M. Igrejq abjurando na mesa
diante dos Inquisidores, e seus oficiais, sem hábito penitencial, e será por eles
absoluto da excomunhão, em que incorreu; e lhe imporão as penitências
espirituais, que parecerem convenientes, e o mandarão instruir nas coisas da
Fé, e que se aparte de comunicação pessoas suspeitas, e que lhe possam causar
dano a sua alma, e que se confesse nas três páscoas do ano; a de como assim o
fez, mande certidão de seu Pároco. E posto que venha apresentar-se fora do
tempo da graça,lhe não será feito seqüestro em seus bens, nem lhe serão
confiscados pelarazÁo do $ 5. do Título 1. deste livro.
1 1. E achando, que a tal pessoa estrangeira não foi suficientemente instruí-

da nas coisas da Fé, se guardará o que se dispõe no livro 2. Título 2. $11. E


sendo absoluta ad cautelam, não será reconciliada judicialmente, visto não
constar, que tivesse suficiente instrugão nos mistérios de nossa Fé.
12. Sendo algum herege estrangeiro preso pelo S. Ofício por delinqüir
nestes Reinos contra nossa S. Fé Católica será castigado, segundo o que se
dispõe na Bula de Gregório XIII. E posto que haja concordata, que vierem a
estes reinos de outros estranhos não sejam molestados por causa da consciência;
se com tudo delinqüirem com escândalo aqui poderão ser castigados conforme
à culp4 que cometerem. Portanto, se o tal herege, que neste reino delinqüir na

. R IHGB, RiodeJaneiro, 157(j92):69j-883,juL./set. 1996. 845


Sônia Aparecida de Siqueira

forma sobredita, tiver suficiente instrução de nossa Fé Católica, e se quiser


reduzirael4 serárecebido, eabjuraráem formaem lugarpúblico, eterácárcere,
e hábito penitencial, segundo o estado, e tempo em que se reduzir, e pedir
misericórdia de suas culpas, como está dito no título 3. E não tendo suficiente
instrução, querendo-se porém reduzir, se aceitará, será mandado instruir nas
coisas da Fé, e depois de instruído, o absolverão ad cautelam da excomunhão,
em que podia ter incorrido e nestes termos se lhe perderão as culpas, em que
tiver caído, sem lhe ser dada pena corporal por elas; salvo se as tiver cometido
com tais circunstâncias, que seja necessário dar-se satisfagão em público ao
escândalo, que delas resultou.
13 . E se tendo dantes suficiente instrução das coisas da Fé, delinqüir contra
ela nestes Reinos na forma sobredita" e se não quiser reduzir, se podeú contra
ele, como contra herege impenitente, na forma de direito, e Bula do S. Oficio;
e se não estiver suficientemente instruído, a que ficou obrigado pelo batismo,
se guardará com ele a disposição de direito, e prática do S. Oficio.

14. E quanto aos infiéis, que não foram batizados, se delinqüirem nestes
Reinos contra nossa santa Fé Católica, nos casos contidos na dita Bula de
Gregório XIII serão condenados em pena de açoites, e degredo para as galés, e
nas mais arbitrárias, que paÍecerem aos Inquisidores; salvo se a culpa for de
qualidade, que por ela se haja de dar pena ordinária.

rÍrurovrrr
Dos schismaticos

l. Ainda que algumas vezes se possa cometer schisma, sem as pessoas se


apartarem da crença de nossa santa Fé, e por essa ruzãionáo sejam propriamente
havidas por hereges; contudo, como a divisão seja tão contrrária à união da Igreja
Católica, não ficam livres de alguma suspeita de heresia, pela qual o S. Ofício
pode proceder contra elas, como contra suspeitas na Fé. E assim toda a pessoa
que se apartar da Igreja Católica Romana, e da obediência devida ao Sumo
Pontífice como cabeça delq e Vigário de Cristo nosso Seúor, e verdadeiro
sucessor de São Pedro, além de incorrer nas censuras, e penas impostas por
direito Canônico, e Bula da Ceia do Senhor, fica sujeita a se proceder contra
ela no S. Oficio, como suspeita na Fé, e obrigada a abjurar, segundo a qualidade
e circunstâncias da culpa, e do tempo, que nela perseverou.

2. Porém se as sobreditas pessoas não somente se apartarem da obediênciq


que se deve ao Sumo Pontífice Romano; mas juntamente se dividirem da Igrej4
na crença de nossa S. Fé, se procederá contra elas na forma, que se coshrma
proceder contra os mais hereges, como fica dito nos títulos precedentes deste
liwo.

846 R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (j92) : 693-883, jul./set. I 996.


Regimento do Scinto OJício 1640
-

rÍrurox
DosfatÍores, defensores, e receptores, dos hereges
1. Contra os Fautores, Defensores, e Receptores dos hereges se procede no
S. oficio, conforme a direito, e Bula da ceia do senhor, como contra pessoas
suspeitas na Fé, pela presunção, que há de não sentirem bem del4 favorecendo,
e aparando os inimigos da igreja Católica. Portanto toda a pessoa de qualquer
qualidade, estado, e condição que sej4 que nas coisas contra a Fé, favorecer os
hereges, dando-lhes ajuda para não serem presos, e condenados; e não mani-
festando as heresias, que deles souber, além de incorrer em excomunhão maior,
e nas censuras da bula da Ceia do seúor e de direito Canônico, será castigado
pelo S. Oficio, com as mesmas penas, que tem os receptores dos hereges, e fani
abjuração, conforme a qualidade da defesa, que lhes der, e da suspeita, que dela
resultarcontaafé,eterâas mais penas arbitrárias, quepaÍeceraos inquisidores,
havendo respeito à qualidade da pessoa, e circunstâncias da culpa.
2. E aquele, que por qualquer maneira impedir o castigo, e execução da
justiça contra o herege, e o receber, ocultar em sua cÍÌsa ou em outra parte, ou
fzer qualquer ato, porque se mostre ser defensor, ou receptor seu, abjurará em
lugar público, segundo suspeita" que contra ele resultar, e será açoitado, e
degredado paÍa as galés pelo tempo que pareceÍ aos Inquisidores.
3. Aqueles, que por ofïcio, ou juramento, tem obrigação de proceder contra
os hereges, buscando-os, prendendo-os, guardando-os, ou dando favor, ou
ajuda contra eles; se deixarem de o fazer por malícia, terão as penas de fautores
dos hereges, alem de serem condenados em perda de seus ofïcios; e quando
deixarem de o fazer por negligência notoriamente culpável, se lhes darão as
penas, que paÍecer, tendo-se respeito à qualidade das pessoas, e circunstâncias
das culpas.
4. As pessoas, que não sendo cúmplices, não quiserem testemunhar contra
os hereges, ou testemunhando negarem, ou encobrirem a verdade, sendo
perguntadas por parte do S. Ofïcio; serão castigadas como fautores, e uns e
outros terão as mesmas penas, e farão a mesma abjuração, que os defensores,
e receptores, segundo a qualidade da suspeita, que contra eles resultar.
5. Os ministros públicos Eclesiásticos, ou seculares, se forem requeridos
pelos Inquisidores, ou seus oficiais, para procederem contra os hereges, e não
frzerem, serão constrangidos com censuras, e mais procedimentos de direito,
até com efeito de cumprirem o que lhes for requerido.
6. Assim mesmo qualquer pessoa particular, que for requerida por algum
ministro, ou oficial do S. Oficio para alguma prisão ou diligência concernente
a ela, e por malícia, deixar de dar ajuda, ou favor, que lhe for pedido, ficará
sujeita àjurisdigão do S. Ofício, e se procederá contra ela, como contra aqueles

R I HG B, Rio de Janeiro, I5 7 (j92) : 69j-88j, jul./set. I 996. 847


Sônia Aparecida de Siqueira

que dão favor e ajuda aos hereges, e se lhe darão as penas, que paÍecer que
convém, segundo a qualidade da pesso4 e circunstâncias da culp4.
7. Com os apresentados, que voluntariamente vierem confessar as sobre-
ditas culpas à mesa do S. Ofïcio, se procederá na forma que fica declarado no
título 1. Deste livro, a respeito do crime de heresia.
rÍruro x
Dos que comunicam com os hereges, e lhes levam arrnos,
ou mantimentos, ou comem c(nne em días proibidos

1. Comunicar com os infiéis, Judeus, Mouros, ou hereges naquelas coisas,


que pertencem a suas ímpias seitas, ritos e cerimônias, é ato de idolatria, ou
heresi4 e por essa razão deve o S. Ofício proceder contra aqueles, que assim o
frzerem, como contra hereges idolatras; e como sejam tais, que possam usar
delas para seus ritos, cerimônias e superstições, frca induzindo suspeita contra
a Fé nas pessoas, que o fizerem, e contra umas e outras , e assim mesmo contra
os que levarem aÍmas, ou mantimentos, se procederá conforme a Bula da Ceia
do Seúor, e Breve de Clemente VIII e Gregório XV e conffa os que comem
came nos dias proibidos pela Igreja.
2. A pessoa que sendo Católica for as terras dos hereges, Mouros, Judeus,
ou infiéis, e se deixar andar nelas sem justa causa, e comunicar com eles
naquelas coisas, que pertencem aos ritos, superstições, e cerimônias de suas
seitas, fazendo-as juntamente, e adminisfoando-as, se não alegar, e provarjusta
causa com que se escuse, se procederá contra el4 como contra herege e idolatr4
pela violenta presunção, que resulta de estar apartada de nossa Fé.
3. E se a comunicação for em coisas próximas aos atos de infidelidade, e
ritos supersticiosos; estando o delito provado, e sendo a pessoa suspeita, os
Inquisidores procederão contra ela na forma de direito, com a consideração,
que convém, e mandando-lhe fazer abjuração, será de veemente (salvo se
houver circunstâncias, que peçam menor abjuração), a qual farão em lugar
público, e terão as mais penas declaradas no Título 2. $ 8. deste livro.
4. A pessoa que habilitar com hereges, Judeus, ou infiéis, e se achar com
eles em suas festas e sinagogas, e as freqüentar, ouvindo suas práticas, rezas, e
superstições, ou comer sem necessidade o seu pão asmo, ou se abstiver das mais
coisas proibidas em suas leis, e seitas; pela veemento presunção, que contra ela
resulta, de suspeita na Fé, nos sobreditos casos, e nos que forem semelhantes,
fará abjuração de veemente; salvo se a qualidade da pessoa, e circunstâncias da
culpa pedirem menor abjuração; e alem das penas, em que conforme a direito
incorreu se lhe darão as mais arbitrárias, e as penitências espirituais, que parecer
aos Inquisidores.

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Regimento do Santo O/ício 1640
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5. Todos aqueles que levarem, ou mandarem aos hereges, Mouros, ou


infiéis, aÍmas, mantimentos, ou mercadorias, que os sagrados Cânones, e Bula
da Ceia do senhor defendem com graves penas, e censuras, por resultar em
prejuízo de nossa santa Fé Católic4 e Religião Cristã" e em favor dos ditos
Mouros, hereges, ou infiéis, e de suas malditas seitas, serão castigados pelo
santo Ofïcio com as penas contidas em direito e na dita Bula, conforÍne as
circunstâncias do delito, e qualidade das pessoas. E alem de haverem de fur;r
abjuração em público, segundo a suspeita, que contra eles resultar, sendo
pessoas vis e plebéias, terão pena de açoites, e degredo para fora do reino, e
serão condenados em perder tudo o que levara ou mandaram aos hereges, ou
infiéis, e em outro tanto como valer; e em caso que ÍN sobreditas coisas já
estejam em seu poder, pagarão a estimação delas em dobro; e sendo pessoas
nobres se mudará a pena de açoites em outra qualquer.
6. A pesso4 que com escândalo comer carne nos dias proibidos pela ig.eja,
sem ter causa justa; que a releve, se for crist2i velha, pela primeira vez ser
chamada à mesa, e nela repreendida" e admoestada, que não cometa mais
semelhante culpa, sob pena de ser castigada com rigor, e se fará termo por ela
assinado; e se depois disso for compreendida na mesma culpa, sendo pessoa
nobre, será condenada em pena pecuniâiq e nas mais que parecer, e sendo
pessoa de ordinária condição, frcarâ a pena no arbítrio dos Inquisidores, que
terão respeito ao escândalo, que houver dado, para que se dê satisfação à ele.
7. E se for pessoa suspeita, a primeira vezterâ as mesmas penas que o
cristão velho, e na segunda faú abjvação, conforme a qualidade, e circuns-
tâncias, de suas culpas, e escândalo, que com elas houver dado.
8. Os que se vierem apresentar voluntariamente na mesa do S. Oficio, e
confessarem alguma das sobreditas culpas, serão tratados na forma, que fica
declarado no Título 1. deste livro.

rÍrulo xI
Dos que disputam em matérias de fë nos casos
por direito proibidos

l. Posto que o disputar nas matérias de fe seja lícito de si entre as pessoas


católicas, assim materialmente, por causa do exercício escolástico, como for-
malmente, para defender, e persuadir a verdade dela; com tudo em alguns casos
por razÃo das pessoas, ou das circunstâncias, fica sendo ilícito, e se deve
proceder no santo Ofício contra as pessoas, que sendo cristãs batizadas, e tendo
suficiente instrução da fé, disputarem sobre as matérias dela, duvidando de sua
verdade, e firmeza; e se a dúvida for com pertinência serão castigadas como
hereges, ou ao menos suspeitas na fé, segundo a qualidade das pessoas, modo

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Sônia Aparecida de Siqueira

de duvidar, e suspeita, que dele resultar, na fonna, que fica declarada em seus
títulos.
2. E se disputar não duvidando, e for pessoa leig4 a quem por direito é
proibido o fazê-lo, sob pena de excomunhão maior, sendo com algum herege,
Judeu, ou infiel, além da excomunhão, em que por isso.incorrer, sení condenada
nas mais penas, que parecer aos Inquisidores, tendo-se respeito à sua qualidade.
3. O que não terá lugar nos casos de grande necessidade, ou utilidade, como
seri4 havendo algum herege, que com sua doutrina pervertesse aos católicos;
e não havendo pessoa Eclesiástic4 douta, e ciente, que possa defender, e acudir
pela verdade, e doutrina da santa madre Igreja; ou disputando em lugares nos
quais o crime de heresia for entrando; porque nestes, e em semelhantes casos,
poderá a pessoa leiga, se for douta" disputar com os hereges sobre a fé, sem
incorrer em pena, nem cometer culpa alguma.
TITULO XII
Dos blasfemos, e dos que proferem proposições heréticas,
temerórias, ou escandalos as
l. A Blasftmia, que os Doutores chamam heretical, pertence ao Tribunal,
ejuízo do S. ofício, por quanto fica sendo contraria à crença, e confissão da fé,
e contém em si erro, ou suspeita de erro contra ela. Pelo que os blasfemos devem
ser punidos no s. Ofïcio, como também o serão, os que disserem proposições
temerárias, e escandalosas, conforme ao Breve de Júlio III e constituição de
Sixto V. e uns, e outros, serão castigados com as penas neste tífulo declaradas.
2. Toda a pessoa de qualquer qualidade que seja, que disser blasfêmia
heretical, afirmando alguma cousa de Deus, que lhe não conveúa, ou negan-
do-lhe alguma" que seja sua própri4 ou atribuindo a alguma criatura o que
convém somente a Deus, abjurará em lugar público, de leve suspeita na fé, com
tanto que a qualidade da pessoa, e circunstâncias da culpa, não peçam maior
abjuração, e teÉ as mais penas arbitrrârias, e penitências espirituais, que paÍe-
cerem aos Inquisidores, os quais terão nelas respeito à gravesa das blasËmias,
à qualidade da pesso4 que as disser, e ao lugar, tempo, e ocasião, em que forem
ditas.
3. Sendo a tal pessoa costumada a dizer muitas vezes blasfêmias heréticas,
atrozes, com qualquer leve movimento, e perturbação, que lhe suceda, irá ao
Auto público da fé, aonde fará abjuração de veemente suspeito (não havendo
circunstâncias, que obriguem a moderação) e levará mordaça na boca, e será
condenada em pena de açoites, e degredo, e se lhe imporão as mais penas, e
penitências espirituais, que parecer que convém, as quais serão mais rigorosas,
que as daqueles, que não são costumados a blasfemar, e só por algumas vezes
cairão nesta culpa.

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Regimento do Santo Ofrcio 1640
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4. Blasfemando alguma pessoa hereticamente contra o mistério da santís-


sima Trindade, ou divindade de Cristo Seúor nosso, ou sobre ser concebido
por obra do Espírito Santo, ou sobre nos remir com sua sagrada morte, e paixão;
a' ou falando contra sua Encarnação, ou contra a pureza da Virgem Maria nossa
Seúora; se for pessoa vil, e plebéia, além da abjuração, que há de fazer em
autopúblico, aonde iráouvirsentença" seráagoitadapublicamente, econdenada
em degredo de galês; e sendo mulher da mesma qualidade, será também
acoitada" e degradada para a Ilha do Principie, s. Tomé, ou Angol4 por quanto
as ditas blasËmias, e outras semelhantes a elas, se reputam por atrozes,
conforme à Bula de Clemente VIII. E sendo pessoa nobre, e honesta" abjuraná
na mesma forma no lugar público, que paÍeceÍ aos Inquisidores, e em lugar da
pena de açoites, e galês, será condenada em pena pecuniiária, e em outro
degredo, conforme sua qualidade, bens, que possuir, circunstâncias da culpa, e
escândalo, que com ela deu, e a todos, se imporão as penas espirituais, e que
parecer que convém.

5. As pessoas Eclesiásticas, e religiosas, que disserem semelhantes blasfê-


mias afrozes, farão abjuração de leve, ou de veemente; tendo se respeito, a que
se forem letrados, fica sendo mais grave a presunção, que confa eles resulta, e
o deve ser também o grão da abjuração, e as mais penas, e penitências, que se
lhes impuserem; de maneira" que sejam castigados, conforme ao escândalo, que
deram, e sempre por algum tempo serão reclusos no lugar, ou mosteiro, que
parecer mais conveniente.

6. Negando o Réu haver dito as blasfêmias, porque foi prezo, e acusado no


S. Ofïcio, e resultando da prova de Justiça graves indícios, e presunção de querer
encobrir algum erro de entendimento, como negar sua culpa; será posto a
tormento, e se depois de executado persistir em sua negação, fará abjuração em
lugar público na forma, que fica dito nos $ $ precedentes.

7. E confessando o réu as blasfêmias no tormento ou antes dele, negando


porÉm a tengão: se for pessoa suspeita de nagão infecta e as blasËmias forem
atrozes, e de qualidade, que induzam presunção de o réu ter erro contra fé, seú
examinado, e acusado pela tenção, e por ela posto a tormento, para que por este
meio se descubra a verdade de suas culpas; e confessando havê-las cometido,
por ter eno no entendimento contra a fé, se procederá come ele, como no $
seguinte se dirá, e negando, fará abjuração em lugar público, conforme ao que
nos $ $ precedentes está disposto.

E não sendo pessoa suspeita, posto que haja de ser acusada, pelo crime, e
pela tenção, por razÃo du p"t q que se lhe há de dar; com tudo não será posta a
tormento, mas fará abjuração públic4 e tenâ as mais penas, e penitências, de
que nos primeiros $ $ deste título se faz menção.

R IHGB, Rio de Janeíro, I 5 7 (392) : 693-883, jul./set. I 996. 851

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Sônia Aparecida de Siqueira

8. Se o réu confessar as blasfêmias, ejuntamente afirmar, que as disse, por


viver apartado da fé, e ter crença na leide Moisés, ou em alguma ímpia" e danada
seita; ou a confissão seja feita antes, ou depois do tormento, se procederá contra
ele, como contra herege formal, na forma do Título 2 e 3 deste livro; e sendo
alguma das blasfêmias atroz, como contra Cristo Seúor nosso, contra a pureza
da Virgem santissima sua mãe, ou outras semelhantes; se o delito for público,
e o réu recebido à união da santa madre lgreja, além de haver de ter cárcere, e
hábito penitencial, e de levar ao Auto mordaça na boca, será condenado em
açoites, e degredo, para que se dê satisfagão ao escândalo, que os fiéis receberão
de suas culpas, mas sempre se terá respeito à qualidade do Réu, e das blasËmias,
conforme ao que acima fica dito.
9. Quando alguma pessoa depois de condenada pelo S. Ofïcio por blasfê-
mias heréticas for segunda vez presq e acusada, por tornar a cair na mesma
culpa; se na primeiraveztiver abjurado de leve suspeita na fe, na segunda fará
abjuração de veemente, e as penas penitenciais, que lhe forem impostas, serão
mais rigorosas, tendo-se respeito à qualidade do réu, e circunstâncias das
culpas; e se teve abjurado de veemente, não abjurará segunda vez porém se for
pessoa vil, e plebéia, será pelo segundo lapso açoitada" e condenada para as
galés por tempo de sete até dez anos, e as mulheres, terão a mesma pena de
açoites, e o degredo será para a llha do Príncipe, S. Tomé, ou Angola; e se for
pessoa nobre, e honesta, será condenada a degredo, e terá as mais penas
arbitrárias, que convier, segundo a gravesa das blasfêmias, e presunção que
delas resultar, e poderá também ter pena pecuniiâria.
10. Se a pessoa, que da primeira vez tiver abjurado de veemente for aliás
suspeita, e as blasfêmias assim no primeiro, como no segundo lapso, forem
aüozes, e por muitas vezes repetidas, e o réu não provar cousa, que o releve, os
Inquisidores o examinarão com grande consideração, para que confessando a
culpa, e negando a tenção se lhe dê a pena, que por ela merecer.
I l. A pessoa, que disser, e afirmar, que a fornicação simples não é pecado,
se for ústica, e Cristã velha, será condenada a que, na forma costumada, vá
ouvir sua sentença no Auto público, onde fará abjuração de leve suspeita na fe,
e se lhe imporão as penitências espirituais, que parecer que convém ao bem de
sua alma, e terá instrução ordinaria nos mistérios da fé, e o mesmo se guardará
com o que disser, que a usura, ou simonia não é pecado; mas sendo pessoa de
qualidade, fará abjuração no lugar, que parecer aos Inquisidores.
12. Os blasfemos, que se vierem apresentar na mesa do s. ofïcio, e
confessarem sua culpa antes de estarem delatos, abjurarão na mesma mesa de
leve, ou de veemente, conforme à distinção dos $$ precedentes; e se guardaú
com eles o mesmo quem fica disposto a respeito dos apresentados no crime de
heresia, tendo-se consideração ao tempo, e lugar, em que o delito foi cometido,

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Regimento do Santo Ojïcio 1640
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e se dele resultou escândalo a que se deva dar satisfação pública, conforme ao


que no título 1. Deste livro fica dito, nos crimes de heresia, e apostasia.
13. Pendendo a causa de algum blasfemo heretical diante do juízo ordiniário
Eclesiástico, ou secular, os Inquisidores a mandarão evocar à mesa do S. Ofïcio,
por quanto pela suspeita, que resulta conta o réu acusado por blasËmias
heréticas, de não sentir bem de nossa santa Fé Católica, fica pertencendo o
conhecimento deste crime ao santo Ofício, onde somente devem os tais blasfe-
mos ser examinados e castigados por suas culpas; o que terá lugar ainda em
caso, que os blasfemos heréticas; fossem acusados, examinados, e sentenciados
no juízo eclesiástico, mas primeiro se dará conta ao Conselho geral.
14. E quando os tais blasfemos heréticos, forem castigados pela justiça
secular, serão outra vez examinados na mesa do S. Oficio, e nela se conhecerá
de suas culpas, porrazáodasuspeitadeheresia, queresultadas blasfêmias, para
se saber a tenção, com que foram ditas, e se foi tendo algum erro em matéria
de fé, por quanto nestes termos fica o conhecimento desta culpa pertencendo
ao S. Oficio privativamente; mas estando os blasfemos suficientemente punidos
pela Justiça secular, se lhes não dará de novo pena corporal, porém farão
abjuração, e terão as penitências espirituais, que parecer que convém.
15. Por quanto o Breve de Júlio III. E constituição de Sixto V. cometem
ao S. Ofïcio o conhecimento de quaisquer blasfrmias, posto que não sejam
heréticas, por razío de se evitar o escândalo, que há entre os fiéis cristãos de se
proferirem blasfêmias temerárias, e escandalosas, tanto em prejuízo dos bons
costumes, e pureza de santa Fé católica ordenamos, que sendo alguma pessoa
compreendida em dizer blasfêmias temerárias, e escandalosas, que virtualmen-
te contenham erro, ou suspeita dele contra a fé, posto que não sejam formal-
mente heréticas, procedam os Inquisidores contra ela; e sendo a pessoa vil, e a
culpa pública, e escandalosa, lhe mandem ler sua sentença na freguesia, e que
o réu a ouça em corpo com vela acesa na mão; e se for pessoa de qualidade, se
leia na sala da Inquisição na mesma forÍna, e a uns, e outros se imporão as penas,
e penitências espirituais, que parecer que convém, segundo a qualidade da
culpa, e escândalo, que dela resultou. Porém se os tais blasfemos estiverem já
punidos em outro juízo, se não procederá contra eles no santo Oficio.

tÍruro xrr
Dos que desacatam, oufazem irreverência ao santíssimo
sacramento do altar, ou as imagens sagradas
ou recebem o santíssimo sacramento,
não estando em jejum
l. Por quanto a adoração de latri4 que se deve ao santíssimo Sacramento,
e às imagens de Cristo nosso Senhor, e de sua sagrada Cru4 e o culto, e

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Sônia Aparecida de Siqueira

veneração, com que devem ser veneradas as imagens da Virgem Seúora nossa,
e dos Santos, se não pode negar, sem cometer eÍro na fé,ftca sendo certo que
todos aqueles, que lhes fizerem irreverênci4 e desacatos, tem contra si a
presunção de sentirem mal dela" e devem ser por isso castigados no santo Oficio.
Por tanto se alguma pessoa for tão ousada, que em desprezo do santíssimo
Sacramento do altar, quebrar, derrubar, tomar, ou fazer algum outro desacato
à Hóstia consagrada, ou ao Cálice consagrado, ou a alguma imagem de Cristo
nosso Seúor, e de sua sagrada Cruz, ou da Virgem Maria nossa Seúora, será
examinada pela dita culpa, e posta a tormento, pela presunção, que contra ela
resulta de sentir mal de nossa santa Fé Católica, e confessando, que a cometeu
por viver apartada da fé, se procederá contra ela, como conta herege formal, na
forma do título 3. Deste livro; e além das penas nele impostas aos hereges, se
o delito for público, e pedir pública satisfação, será condenada a açoites, e em
degredo para galês, conforme as circunstâncias da culpa; e se negar o delito, ou
posto que o confesse, negÍlr a tenção, fará abjuração de leve, ou de veemente
em lugar público; mas se o delito for público, não bastará negaÍ a tenção, para
deixar de ter a pena de galês, e açoites; e uns e outros terão as mais penas
arbitrárias, e penitências espirituais comensuradas a suas culpas.
2. Porém se o Réu for pessoa suspeita, e cometer o crime publicamente, e
confessando o fato, negar atenção, e concorrerem tais circunstÍincias, assim do
crime, como na qualidade do réu, que paÍecer aos Inquisidores, que se lhe não
deve dar pena arbitrária, senão a ordinária de relaxação, será o caso examinado
com grande consideração, e se procederá na decisão dele, conforme a direito.
3. Toda a pessoa, que em desprezo das imagens sagradas, quebrar, demr-
bar, ou fazer qualquer outra irreverência, e desacato a alguma imagem de Santo,
ou Santa, abjurará de leve em lugar público; salvo se a qualidade da pessoa, e
circunstâncias da culpa, pedirem maior abjuração. E sendo o fato notiável, e de
gue haja escândalo no lugar do delito, será degradadaparaum dos lugares de
Africa, ou para Castro marim; e se lhe imporão as mais penas, e penitências
espirituais, que paÍecer aos Inquisidores.
4. Provando se contra alguma pessoa, que recebeu o santíssimo Sacramento
da Bucaristia, não estando emjejum, se for pessoa suspeita, reportar-se-á sua
culpa; e sendo compreendida segunda vez, se procedera contra ela como
parecer, enviando os autos com oassento, que neles se tomar ao Conselho.
TITULO XIV
Dosfeiticeiros, sortilégios, adivinhadores, e dos
que invocam o demônio, e tem pacto com ele,
ou usam da arte de astrologia judiaría
1. Ainda que conforme o direito, dos crimes de feitiçarias, sortilégios,
adiviúações, e quaisquer outros desta mesma espécie, pudessem conhecer os

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Regimento do Santo Ofeio 1640
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Inquisidores somente quando em si contiúam heresia manifesta; com tudo pela


Bula de Sixto V. lhes esüâ cometido o coúecimento de todos estes crimes, posto
que não sejam heréticos; assim porque ao menos não carecem de suspeita de
heresia, como pela superstição, que há neles tão contnária à Religião cristã. Por
tanto se alguma pessoafupr feitiçarias, sortilégios, ou adivinhações usando de
cousas, e superstições heréticas, incorrerá nas penas de excomunhão, confisca-
ção de bens, e em todas as mais, que em direito estão postas no crime de heresi4
e contara ela procederão os Inquisidores na mesma forma, que procedem contra
os hereges, e apostatas de nossa S- Fé; e havendo prova legítima paÍa ser
convencida" e haver a pena ordinária" se não se reduzir, confessando inteira-
mente suas culpas, será rexada à Justiga secular, na forma que fica dito no título
2. Deste livro, e levará ao Auto da Fe com o hábito de relaxado, carocha na
cabeça" com rótulo de feiticeiro na forma costumada.

2. Porém confessando o réu suas culpas, será recebido ao grêmio, e união


da S. Madre Igeja, e irá ao Auto público da fe a ouvir sua sentença, com hábito
penitencial, e carocha na mesma forma, e no Auto faní abjuragão em forma de
seus eÍros; e terá confiscação de bens, desde o tempo, em que com os ditos
crimes se apartou da fé; e será degredado para as galés, e sendo mulher, paraa
Ilha do Príncipe,

S. Tomé, ou Angola; e uns e outros terão pena de açoites, e serão instruídos


nas cousas da fé necessiárias para sua salvagão, e terão as penitências espirituais,
que parecer aso inquisidores, e não poderão entrar no lugar, em que cometerão
o delito.

3. Quando a pessoa condenada por este crime, for nobre, ou de qualidade,


que pareça, que não deve ter pena de açoites, nem degredo paÍa galés, será
degradada para Angol4 S. Tomé, ou pares do Brasil; e se for Clérigo, ou
religioso, terá a pena de degredo dos $ $ precedentes; e posto que haja de ir ao
Auto ouvir sua sentença, não levará carocha, mas será suspenso paÍa sempre
do exercício de suas ordens, e privado de qualquer ofício, benefïcio, ou
dignidade, quetiver; esendoreligioso, serámaisprivadode vozativa,epassiva;
e tendo se respeito à qualidade da pessoa, se lhe poderá comutar o degredo em
reclusão, por outro tanto tempo, em um dos mosteiros mais apartados de sua
religião com alguns anos de cárcere nele.

4. E no arbítrio, que os Inquisidores hão de fazer das penas, com que devem
ser castigadas as pessoas, que usarem dos ditos feitiços, sortilégios, e adiviúa-
ções, terão respeito a se haver seguido com elas alguma morte, ou outro dano
notável, e de grande prejuízo, para neste caso serem mais rigorosas as penas;
por quanto ainda que o santo Ofïcio pertença castigar somente os feitiços, e
mais crimes semelhantes, e não as mortes, perdas, e danos, que deles se seguirão

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):693-883,juL./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

com tudo como estes fiquem fazendo muito mais grave a culpa, é justo, que
confonne as circunstâncias dela se lhe acrescente a pena.
5. Se constar que os atos de que usarão os feiticeiros, adiviúadores, e
sortilégios, são tais, que deles se colha heresia; pela grande presunção, que
resulta de andarem apartados de nossa santa fé católic4 serão postos a tormento,
e se nele não confessarem a tenção, irão ao Auto público da fé a ouvir sua
sentença, e nele farão abjuração de veemente, quando em suas feitiçarias,
sortilégios, e adivinhações, usarem de hóstia consagrada, ou parte dela, ou do
sangue de Cristo nosso Senhor, ou de pedra de Ara tomada de lugar sagrado,
ou de Corporais, ou de parte alguma destas cousas, ou de qualquer outra cousa
sagrada, ou se expressamente invocarem os espíritos diabólicos, e lhes pedirem
cousa, que Deus somente pode vazar ou invocarem o demônio com preces, e
lhe fizerem sacrifïcios, ou algum outro culto de latria, ou dolia" ou batizarem
imagens, ou algum cadâver, ou rebatizarem, algumas crianças, sabendo que
foram batizadas, ou entre os Santos chamarem também ao demônios por seus
nomes, ou incensarem alguma cabeça de defunto, ou a ungirem com óleo
sagrado; por quanto destes atos, e dos que forem semelhantes, nasce veemente
suspeita de heresia. Porém se os réus em sua defesa diminuírem tanto na gravesa
das culpas, que havendo se juntamente respeito à qualidade da pessoa, e ao
modo, e lugar, em que as cometerão, com as mais circunstâncias, de se
oferecerem, pareça aos Inquisidores que devem abjurar de leve somente, neste
caso serão escusos de maior abjuração.
6. Quando dos atos de feitiçaria, sortilégio, e adivinhações, resultar somen-
te leve presunção de serem suspeitos na fé, serão também os réus postos a
tormento; e confessando outra cousa, no auto público ouvirão sua sentença, e
farão abjuração de leve; e assim estes, como os que abjuraram de veemente,
serão condenados nas penas arbitriárias, e mais penitências espirituais, que
pÍrecer aos Inquisidores, segundo o que fica dito nos $ $ Precedentes; e se os
condenados forem Religiosos, ou pessoas graves de tal qualidade, que parega
que não devem ir ao Auto público da fe, abjurarão na sala do Santo OÍïcio, ou
no lagar, que em mesa se assentar.
7. Sendo compreendida alguma pessoa em segundo lapso, de feitiçarias,
sortilégios, e adivinhações, se no primeiro houver abjurado de leve, no segundo
fará abjuração de veemente, e será condenado em açoites, e degredo, e as mais
penas, conforme ao que fica dito no $ 2 e 3. E porém, se no primeiro lapso tiver
abjurado em forma, ou de veemente, e no segundo for convicta em culpa, de
que pareça, que resulta presunção violenta de viver apartadade nossa santa Fé,
neste caso se procederá contra ela na forma de direito, com a consideração, que
convém; mas não sendo no segundo lapso convicta, será condenada conforme
à presunção, que resultar de suas culpas, com respeito às penas, que havia de
ter, se fora nelas convencida, mas não fará abjuração.

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Regimento do Santo O/ício 1640
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8. Os que se vierem apresentâr voluntariamente na mesa do santo Ofïcio,


ou seja no temo du gruçq ou fora dele, e confessarem culpas de feitiçarias, e
sortilégios, serão despachados conforme ao que fica disposto no Título I . Deste
livro, em quanto o que nele se diz se poder aplicar a este crime.
9. Por quanto o Breve de Sixto V. e constituição de Urbano VIIL Cometem
ao S. Ofïcio da Inquisição, que proceda conta os Astrólogos judiciiários, que
usam desta arte, prognosticando absolutamente casos particulares, de futuro em
temo certo, e ato determinado. Ordenamos, que sendo alguma pessoa com-
preendida na dita culpa seja examinada por ela no santo Ofïcio, e pela primeira
vez admoestada com termo, que assinará, para que não cometa outra semelhan-
te; salvo se a qualidade da pessoa, e circunstâncias da culpa pedirem maior
condenação; e sendo compreendida segunda veznamesma culpa, se lhe darão
as penÍN, que parecer aos Inquisidores, tendo respeito, as que lhe estão impostas
pelo dito Breve, e constituição.

rÍruro xv
Dos bígamos

1. Do crime de bigamia se conhece no S. Ofïcio, conforme à declaração,


que há do Sumo Pontífice, pela presunção, que resulta contra os bígamos, de
não sentirem bem do Sacramento do Matrimônio, com que ficam suspeitos na
fé. Todo o homem, ou mulher de qualquer qualidade, ou condição que sej4 que
tendo contraído primeiro matrimônio por palavras de presente na forma do
sagrado Concílio Trid. Se casado segunda vez, sendo viva a primeira mulher,
ou marido, ou sem ter provável certezade sua morte, como de direito se requer
para contrair segundo matrimônio, será no S. Ofício perguntada pela tenção, e
ânimo, com que cometeu este crime, e condenada, que em Auto público faça
abjuração de leve suspeita na fé; salvo quando a qualidade da pessoa, e
circunstâncias da culpa, pedirem maior abjuragão/ e além disso; sendo pessoa
plebéia, será açoitada pelas ruas públicas, e degredada paÍa as galés, por tempo
de cinto até sete anos; e sendo mulher vil, terá a mesma pena de açoites, e será
degredada pelo mesmo tempo paÍa o Reino de Angol4 ou partes do Brasil,
segundo paÍecer aso Inquisidores, com respeito à qualidade da pessoa" e
circunstâncias da culpa; e sobre tudo terão sua instrução ordinária, e as peni-
tências espirituais, que parecer que convém.
2. E sendo pessoa nobre, que conforme à ordenação do reino seja escusa
de pena vil, irá degredada de cinco até oito anos para Africa" ou partes do Brasil.
3. Se alguma pessoa solteira se casar por palavras de presente com outr4
que saiba de certo ser casada, e ter sua mulher, ou marido vivo, provando-se a
ciência na forma, que de direito se requer, para.se haver de castigar esta culpa

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57(j92): 69j-883, jul./set. I 996. 857


Sônia Aparecida de Siqueira

por bigaÍnia, abjurará de leve em lugar público, e sení condenada em agoites,


e em degredo para galés, por tempo de três até cinco anos.
4. Sendo alguma pessoa castigada pelo santo Ofïcio, por culpa de bigamia
se tornaÍ a cair na mesma culpa,e no primeiro lapso tiver abjurado de leve, no
segundo fará abjuração de veemente em Auto público, e será condenada (não
sendo nobre) em pena de açoites, e degredo para galés, por tempo de oito até
dez anos; e sendo mulher, terá a mesma pena de açoites, e degredo para Angol4
ou Brasil; e aos relapsos neste crime, se imporão penitências espirituais mais
rigorosas, que as que lhe foram dadas no primeiro lapso, e sendo caso que no
primeiro lapso teúa abjurado de veemente, no segundo não fará abjuração,
mas terá as rnais penas de açoites, e degredo: e sendo pessoa nobre, em lugar
dos açoites, se lhe acrescentará o degredo, na forma do $ 2. deste título.
5. As testemunhas, que jurarem falso, ou usarem de alguma falsidade, para
efeito de se cometer o crime de bigamia, jurando ser morto o primeiro marido,
ou mulher e sabendo, que é para efeito de casar segundavez se o tal crime se
cometer de maneira, que o santo Oficio coúeça dele, deve também coúecer
da culpa, que as testemuúas cometeram, dando causa com seu juramento a se
efetuar o segundo matrimônio; e pela suspeit4 que contra elas resulta de
sentirem mal deste Sacramento, serão castigadas no santo Ofïcio, comotambém
os que aconselharem o segundo matrimônio, tendo certeza de serem vivos o
primeiro marido, ou mulher. Por tanto, os que desta culpa forem convencidos,
não mostrando cousa, que dela os escuse, farão abjuração de leve suspeitas na
fé, e serão degredados por tempo de três até cinco anos para Crasto Marim, ou
para algum dos lugares de Africa" e terão penitências espirituais.
6. O Clérigo, que tendo ordens sacras, se casar por palavras de presente na
forma do sagrado Concílio Tridentino, fará abjuração de leve suspeito na fé, no
lugar público que pareceÍ aos Inquisidores, não pedindo as circunstlìncias da
culpa, e a qualidade da pessoa maior grau de abjuração; e além da excomuúão
maior, em que incorreu, será privado do ofício, e beneficio, que tiver, e suspenso
do exercício das ordens para sempre, e ficará inábil para ser promovido as que
lhe faltarem, e será degradado para as galés pelo tempo que parìecer, tendo-se
respeito a sua qualidade, e gravesa de sua culpa.
7. E sendo Religioso professo em algumaReligião, posto que expulso dela"
como não teúa anulado juridicamente a profissão; fará a mesma abjuração, e
será degradado para as galés, ou para um dos lugares da conquista do reino.
Qualquer homem, que se casar por palavras de presente, com alguma
religiosa professa fará abjuração de leve suspeito na fé, e teúr as penas de
degredo declaradas no $ 5 deste título.
9. Vindo alguma pessoq que haja cometido crime de bigamia, apresentar-
se voluntariamente, confessar suas culpas na mesa do santo Oficio, será

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 693-883, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Ofcio 1640
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despachada na forma, que fica disposto no Título I a respeito dos apresentados


pelo crime de heresi4 com esta diferença, que ainda que esteja delato ao tempo
que se apresentar, e com prova bastante para ser pronunciada à prisão; com tudo
se livrará solta" mas fará abjuração de leve em lugar público, conforme à
qualidade da pessoa, o escândalo que houver de sua culpa, e sení condenada
em degredo para ao Brasil, ou para um dos lugar de Africa por tempo de quatro
até seis anos; e sendo mulher,p*:Crasto marim.

TITULO XVI
Dos que sendo casados por palavras e plesente,
se ordenam de ordens sacras, e dos católicos
que casam com herege, ou infiel

1. O que sendo casado por palawas de presente, na forma do sagrado


Concílio Tridentino, deixar sua mulher, e sem consentimento seu e os mais
requisitos de direito se ordenar se ordens sacras, será castigado no S. Ofício,
como pessoa suspeita na fé, pela presunção, que contra ele resulta de sentir mal
do Sacramento da Ordem, ao qual anda anexo voto de castidade, e como tal
abjurará de leve no lugar público, que parecer, segundo a qualidade da pessoa,
e circunstâncias da culpa, que cometeu, e ficará inábil para em neúum tempo
ser promovido as mais ordens; e tendo algum beneficio Eclesiástico, sÉ
privado dele, e se lhe imporão as mais penas, e penitências espirifuais, que
parecer aos inquisidores.
2. Da mesma maneira se haverá por suspeita na fé a pessoa, que sendo
católicq se casar com herege, ou infiel, sabendo que o é, com a certerÀ, que de
direito se requer; pelo que se não houver causa que a releve, fará abjuragão de
leve no lugar, que paÍecêr, tendo-se respeito a sua qualidade, e circunstâncias
do crime; e além disto se lhe imporem penitências espirituais, segundo parecer
que convém.
E os que voluntariamente se vierem apresentar, e confessarem alguns dos
ditos crimes, serão despachados na forma, que fica disposto no Título I deste
livro, e no $ último do Título 15..
TITULO XVII
Dos que dizem missa, ou outem de confissão,
não sendo sacerdotes
1. O crime dos que dizem missa não sendo Sacerdotes, pertence a idolatri4
como declara o Papa Clemente VIII no breve, que sobre ele passou, por quanto
estes fazem adorar aos fiéis cristãos o pão da Hósti4 e o viúo do cálice, como
se foram o verdadeiro corpo, e sangue de Cristo nosso Seúor, consagrado
debaixo de suas espécies; e os que confessarão sem seÍem Sacerdotes, ficam

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):693-883, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

usando mal do Sacramento da penitência com notiâvel detrimento do próximo


que cuida ficar absoluto sacramentalmente de seus pecados. A uns e outros
declararão os Sumos Pontífices, Paulo [V Gregório )ilII Sixto V e Clemente
VIII por suspeitos na fe, e os submetem ao juízo do santo Ofïcio, para nele
serem castigados.
2. Pelo que o Clérigo secular que tendo somente ordens de Epístola, ou
Evangelho, disser missa, ou confessar, sendo compreendido, e preso por
qualquer destes crimes, abjurará de leve suspeito na fé em Auto público, não
pedindo a qualidade de pessoa, e circunstâncias da culpa maior grau de
abjuração, e seni suspenso paÍa sempre das ordens, que tiver, e ficará inabilitado
para ser promovido as que lhe faltarem, e o degradarão para as galés, por tempo
de cinco até dez anos, e terá sua instrução ordiniíria, e penitências espirituais.

3. E sendo pessoa regular, fará abjuração na mesma forma; e além das ditas
penas, será privado paÍa sempre de voz ativa e passiva. Porém sendo a qualidade
da pesso4 e circunstâncias da culpa tais, que pareça conveniente diminuir-lhe
a pena, fará abjuração na sala do S. Ofïcio, e será degradado por tempo de sete
até dez anos para Angola, ou para qualquer e outro lugar das conquistas do reino
onde ouvir convento de sua Religião, e no cárcere dele terá um, ou dois anos
de reclusão com jejuns de pão, e âgu4 e outras penitências espirituais; e não
havendo mosteiro de sua Religião, em neúum dos lugares das conquistas, terá
reclusão no convento mais apartado de sua Província" por tempo de dez anos;
e os primeiros dois, ou três estará no ciircere dele, onde fará as ditas penitências,
e as mais que parecer aos Inquisidores.

4. Os que cometerem qualquer dos crimes sobreditos, não tendo neúuma


ordem sacra, se forem pessoas vis, e plebéias abjurarão de leve em Auto público,
e ficarão inábeis para nunca serem promovidos a ordens, e serão condenados
em degredo para as galés, por tempo de seis até dez anos, e acoitados publica-
mente; e lhes darão as mais penas, e penitências, que parecer'; e se forem
pessoas nobres, que por sua qualidade paÍeça que não devem de ir a Auto
público, nem ter pena de açoites, e galés, abjurarão na sala do S. Ofício, ou no
lugar que parecer convenientej e serão degradados para um dos lugares das
conquistas, por tempo de oito até dez anos.
5. Quando alguma pessoa secular, Eclesiásticao ou Regular, de qualquer
qualidade que seja, depois de condenad4 e castigada no S. Oficio por algum
dos crimes sobreditos, tornar a cair nele; tendo no primeiro lapso abjurado de
leve, ou seja em Auto público, ou na sala do s. Ofïcio no segundo lapso abjurará
de veemente em Auto público, e será degradada para as galés por tempo de dez
anos, e fará as mais penitências do $ 2 e quando no primeiro lapso tiver abjurado
de veemente, no segundo se procederá conforme o direito tendo se respeito ao
que dispõem os Breves Apostólicos passados sobre estes crimes.

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Regimento do Santo O/ício 1640
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6. Vindo se apresentar alguma pessoa voluntariamente, e confessar sua


culpa em qualquer dos crimes sobreditos, ou seja no tempo do Edito da graça,
ou fora del4 ou antes, ou depois de estar delata, se guardará em tudo que fica
disposto acerca dos apresentados no crime de heresia, em quando a estes se
Puder acomodar'
rÍruro xvlfi
Dos confessores, solicitantes no sacramento da confissão
1. Por Breves dos Sumos Pontífices Pio IV e Gregório XV pertence ao s.
Oficio privativamente coúecer do crime dos que solicitam na confissão, e
castigar os culpados nele. Por tanto se algum confessor no ato da confissão
sacramental, antes ou imediatamente depois dele, ou com ocasião, e pretexto
de ouvir de confissão, no confessioniário, ou no lugar deputado para ouvir ou
em outro escolhido paÍa esse efeito, fingindo que ouve de confissão, cometer,
solicitar, ou de qualquer maneira provocar a atos ilícitos, e desonestos, com
palavta, ou com tocamentos desonestos, para si, ou paÍa outrem, as pessoas,
que a ele se forem confessat, assim mulheres, como homens; se houver prova
bastante para se julgar a culpa por provada, posto que conste de testemuúas
singulares, se for Clérigo secular, fará abjuração de leve suspeito na fé (salvo
havendo causa, que obrigue a maior abjuração) e será privado paÍa sempre do
poder de confessar, e suspenso do exercício de suas ordens, por tempo de oito
ate dezanos; e pelo mesmo tempo será degredado para fora do Bispado, epara
sempre do lugar do delito, aonde não poderá mais entrar, pelo escândalo, que
nele deu com suas culpas.
2. E se o confessor for convencido de haver continuado no dito crime com
devassidão além das sobreditas penas, será degradado para um dos lugares das
conquistas do reino; e esta mesma pena haverá, se com a pessoa solicitada tiver
cometido, e consumado algum ato de fornicação, de malícias, ou do pecado
nefando.
3. E sendo o confessor Religioso, fará a mesma abjuração, e será privado
paÍa sempre do poder de confessar, e de voz ativa, e passiva, e suspenso do
exercício de suas ordens, por tempo de três até cinco anos, e irá degradado para
um dos mosteiros mais apartados de sua religião por oito anos, com reclusão
de um, ou dois no cárcere dele; e não poderá jamais tornar ao lugar do delito;
e se lhes darão jejuns de pão, água, e as mais penitências espirituais, que
conforme suas culpas merecer; e se for devasso, se lhes agravarão as ditas penas
na forma, que aparecer aos Inquisidores.
4. A abjuração, que os confessores solicitantes fïzerem, ou sejam seculares,
ou regulares, será sempre na sala do S. Ofício ante os Inquisidores, Deputados,
Promotor, Notários, e oficiais, e alguns Familiares da Inquisição; e serão

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57(392): 693-883, jul./set. I 996. 86r


Sônia Aparecída de Siqueira

também chamadas algumas pessoas Eclesiásticas, seculares, e regulares; e


quando os réus solicitantes, forem religiosos, depois de ouvirem sua sentença
na sal do S. oficio, lhe irá ler um Notário no Capítulo de seus conventos, em
presença dos prelados, e dos religiosos conventuais neles.
5. Quando os confessores solicitantes não forem devassos, nem houverem
cometido algum ato consumado, nem outrossim estiverem muito infamados
deste crime, se lhe poderão moderar as sobreditas penas, na forma que paÍecer
aos Inquisidores, havendo respeito à qualidade das pessoas, número dos atos,
e circunstâncias, com que foram cometidos.
6. Se algum dos confessores, que for preso, e acusado no S. Oficio por este
crime, negar as culpas, de que esüí delato, e se achar, que a prova delas não é
bastante paÍa se julgar o delito por provado, conforme ao estilo, e prática da
Inquisição, não fará abjuração, algum4 mas poderá ser privado de confessar, e
degredado do lugar do delito; e (parecendo que convém) suspenso do exercício
das ordens pelo tempo, que na mesa se assentar, com outras penitencias
espirituais, segundo for a prov4 e a qualidade de suas culpas.
7. Sendo algum confessor compreendido em segundo lapso, no crime de
solicitante; havendo a primeira vez abjurado de leve suspeito na Fé, abjurará
no segundo de veemente, e será suspenso do exercício das ordens para sempre
privado de qualquer oficio, dignidade, e beneficio, que tiver, e inabilitado
perpetuamente para alcançar outros, e degredado para as galés por tempo de
oito até dez anos, e se for Religioso, alem das penas sobreditas, será privado
paÍa sempre de voz ativa e voz passiva. E quando no primeiro lapso tiverem
abjurado de veemente, não farão abjuração alguma no segundo, mas terão todas
as ditas penas, e as mais arbitnárias, que parecer aos Inquisidores.
8. Os que se vierem apresentaÍ voluntariamente, e confessarem o crime de
solicitar na confissão, se vierem no tempo do Edito da graça, antes de estarem
delatos no S. Ofício, ao menos por duas testemuúas, abjurarão na mesa ante
os Inquisidores, Notários, e duas testemunhas, e se lhe mandará se abstenham
quanto for possível, de confessar, encaffegando-lhes isto com preceito no foro
da consciênciq e terão somente penitencias espirituais. E sendo os tais apre-
sentados Párocos, e devassos no crime, se lhes mandará, que logo poúam Cura,
e que dentro no tempo que se lhe assinar, renunciem o beneficio; e não o
podendo renunciar por algum impedimento legítimo de direito, se lhe mandará,
que nunca confessem pessoas, em que possa haver perigo de tornar a cair na
mesma culpa.
9. E vindo, se apresentar fora do tempo da edito da graça, sem estar delatos
no crime por duas testemuúas, como fica dito, abjurarão na forma do $
precedente, e serão suspensos de confessar pelo tempo, que parecer aos Inqui-
sidores, tendo respeito à qualidade, e circunstâncias de suas culpas.

RIHGB, Rio de Janeiro, 157(392):693-883, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Ofcio 1640
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10. Quando os solicitantes ao tempo que se apresentarem, estiverem


delatos por mais de uma testemuúa, ou se apresentarem denfio do tempo de
üaÇa, ou fora dele, abjuração na sala do S. Ofïcio perante os Inquisidores,
Deputados, Promotor, e Notiários, e outras pessoas Eclesiásticas, e serão priva-
dos de confessar, suspensos do exercício das ordens, e degredados do ligar do
delito, pelo tempo que paÍecer, segundo a qualidade das pessoas, e circunstân-
cias das culpas que tiverem cometido.
11. Os confessores, que disserem; e ensinarem aos penitentes solicitados,
que não tem obrigação de denunciar ao S. OÍício os confessores, que souberem,
que solicitam no Sacramento da Confissão, na forma, que fica dito no $ 1. deste
tífuIo, serão castigados conforme aos Breves Apostólicos referidos, com as
penas, e penitencias espirituais arbitriárias, que se assentar que convém, segundo
a qualidade, e circunstancias de suas culpas.

rÍrwo xx
Dos que lêem, e retêm livros de hereges,
ou de alguma ímpia seita

1. Todas pessoa de qualquer estado, qualidade, e condição que seja, que


contra a proibigão da Bula da Ceia do seúor, e dos Editais da Fé, que o S.
Ofïcio manda publicar, de propósito ler, e retiver livros heréticos, na forma,
que estiâ declarado no caüálogo romano e no deste reino, alem de incorrer nas
censuras postas pela Bula da Ceia do senhor, breves apostólicos, e pelos
sobreditos Editais, será havida por suspeita na fé, e condenadaafazer abjuração
de leve; salvo se da qualidade dos livros, e da pesso4 e mais circunstancia do
delito, houvesse tão veemente suspeita de heresia, que pareça aos Inquisidores,
que deve haver maior abjuração; e terá as mais penas, que eles arbitrarem; e
tudo isto haverá lugar, ou os livros sejam impressos ou escritos à mão.
2. E se os livros heréticos forem de propósito compostos pela mesma
pessoa, em cujo poder forem achados, e for como o autor deles, não dando
causa, e defesa legítima, que o escuse, se procederá contra ele na forma de
direito, como contra herege, conforme ao que fica declarado no Título 2. deste
livro, pela grande presunção, que contra ele resulta. e da mesma maneira será
reputado por autor do livro, aquele, que retiver livro de mão herético, sem nome
de autor, e não der, nem mostrando de lhe veio.

3. A pessoa, que trouxer, ou mandar tazer a terra de católicos livros


heréticos, ou de arte mágica, sortilégios e feitiçarias, alem de incorrernas penas
de excomuúão, como fautor de hereges, na forma do Breve de Clemente VIII
perderá os atis livros e será condenada em pena pecuniiria,e outras arbitnárias,
que parecer aos inquisidores, conforme à qualidade da pessoa, e gravidade da

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57 (392) : 693-883, jul./set. I 996.


Sônia Aparecida de Siqueira

culpa; e as mesmas penas terão os que trouxerem, ou mandarem trazer liwos


de Astrologiajudiciária, na forma das constituições de Sixto V. e Urbano VIII.
4. Qualquer herege, Judeu, ou infiel, que vivendo em terra de católicos
divulgar nela alguns tratados de seus heresiarcas, ou o Talmud dos Judeus, ou
o Alcorão dos Mouros, ou outros semelhantes, será condenado em perdertodos
os livros, a nas mais penas arbitrárias comensuradas a sua culpa.
5. Os Impressores que sem aprovação e licença do S. Oficio imprimirem
algum livro, ou qualquer outra escrifura, alem de incorrerem em pena de
excomuúão maior serão privados por um ano do exercício de seu oficio, e
condenados em pena pecuniária, conforme as circunstancia da culpa, e perderão
os livros, e escrituras, que assim imprimem, os quais serão queimados, se não
Possa usar deles'
rÍruro xx
Dos que dão culto, como a santos, aos que nãoforem
canonizados, ou beatificados, e dos livros que se
tratarem de seus milagres, ou revelações,
e dos que os Jìngirem

Conforme aos breves Apostólicos dos santos Padres Paulo V. e Urbano


1.
VIII nosso senhor, e neúuma imagem de defunto pode dar o culto e veneração
devida aos santos, sem primeiro ser canonizado, beatificado, ou aprovado por
uso comum da Igreja; e contra os que fazem o contrário, se deve proceder no
S. Ofïcio. Pelo que, se alguma pessoa venerar a imagem de algum defunto,
ainda que morresse com opinião de santo, tendo-a Oratório particular, capela,
Igejq ou outro lugar público com aureola na cabeça, com raios, ou resplendor,
sem ser canonizado, beatificado, aprovado pelo comum uso da Igreja, será
condenada, pela primeira vez em perdas das tais imagens, e das coisas, com
que as venerar; e continuando na mesma culpa, terá alem da dita pena, as mais
arbitnárias, que parecer aos Inquisidores, tendo respeito às que lhe dão os ditos
Breves; e sendo pessoa eclesirástic4 será castigada com mais rigor.
2. As mesmas penas haverá a que colocar ou mandar colocar nas sepulturas
dos defuntos algumatrábua, ou pano com pintura, escritura, ou rótulo de alguns
milagres seus, ou imagem de qualquer coisa pintada, e esculpida fx4 ou
pendurada, e lhe puser, ou mandar por a lâmpada, ou outra iluminação
qualquer, ou lhe der outro algum culto, ou veneração, sem licença do Ordinrário,
que de direito se requer.
3. Na mesma forma de procederá contra aqueles, que escreverem, ou
compuserem algum livro de milagres, revelações, e outros quaisquer beneficios
alcançados de Deus nosso Seúor por intercessão dos tais defuntos, sem terem
aprovação do ordinrârio, e as mais licenças necessárias: e o oficial, que impedir

R IHGB, Rio de Janeiro, I57(392):69j-883, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Ofuio 1640
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os tais livros e o pintor, e imaginrário que pintar e esculpir as tais imagens,


perderão tudo o que fizerem, e serão mais condenados na pena pecunirâri4 que
paÍecer aos Inquisidores.
4. E por quanto algumas pessoas com fingimentos de virtude, procuram
mostrar, que tem revelagões do Céu, e fazem milagres, e com isso causam
grande escândalo no povo Cristão, costumam por esta via introduzir doutrinas
falsas, e grandes abusos, em prejuízo de nossa santa Fé; ordenamos, que no S.
Ofïcio sejam castigados os que cometerem este crime; e sendo pessoas de
ordinrária condição; sejam condenadas em pena de açoites, e degredo de galés;
e se forem pessoas religiosas, ou nobres, será a pena arbitnâri4 tendo-se respeito
ao escândalo, e prejuízo, que causarão com suas culpas.

TÍTULO XxI
Dos que impedem, e perturbam o ministério do Santo Oficio
1. Qualquer pessoa, que nas causas, e negócios pertencentes à Fé, impedir,
ou perturbar o ministério da Inquisição por algum dos modos contidos neste
título, ou outros semelhantes, alem de incorrer em excomuúão ipso fato, e
houver de abjurar conforme a suspeita, que contra ela resulta, e ser havida em
direito por fautor de hereges, será condenada em pena de açoites, e degredo
para galés, e nas mais arbitnárias que parecer aos Inquisidores, os quais nelas
terão respeito ao que dispõe os Breves Apostólicos do Papa Júlio III, Pio V e
Urbano VII, contra os tais delinqüentes, e ao estilo recebido no S. Oficio.
2. O que perturbar, e impedir o ministério do S. Oficio, injuriando, ou
ofendendo seus ministros, e oficiais em desprezo da Inquisição abjurará de leve
suspeito na Fé, no lugar que parecer aos Inquisidores, salvo se a qualidade da
pessoa, e circunstancias da culpa pedirem maior grau de abjuração, e sení
degredado a arbítrio dos Inquisidores paÍa as galés e açoitado publicamente, se
na qualidade de sua pessoa pode caber esta pena.
: 3. A pessoa que impedir, e perturbar o ministério nos negócios, e causas
da Fé, ofendendo, ameaçando, intimando, ou procurando ofender, ameaçar, ou
intimidar as testemunhas, ou denunciantes, que quiserem vir, ou tiverem vindo
testemunhar, ou denunciar à mesa da Inquisição, ou tomar da mes4 ou de
qualquer outro lugar alguns processos, ou papéis pertencentes ao S. Oficio, e
se queimar, ou sumir, ou quebrar os cáÍceres, para que algum preso possa fugir
deles, ou o livrar da prisão, ou de qualquer outro lugar, ou encobrir, paÍa que
não seja preso, abjurará na mesma form4 e será condenada nas mesmas penas:
o que tudo haverá lugar, posto que nos casos sobreditos se não siga efeito; salvo
se houver tais circunstancias, que pareça aos Inquisidores, que se devem
moderar as ditas penas, as quais também se moderarão, se o Réu mostrar por
prova legítima, como de direito se requer, que o crime não foi cometido em

R IHGB, No de Janeiro, 157(392):693-883, jul./set. 1996. 865


Sônia Aparecida de Siqueira

ordem, e desprezo do ministério do S. Oficio, senão por algum outro respeito


particular.
4. Os que por razio de sua jurisdição. Ou oficio, proibirem aos ministros,
e oficiais da Inquisição levar, e Eazer aÍmas (contanto que não sejam das
proibidas) quando forem fazer algurna diligência pertencente a ela, ou lhe
impuserem algum impedimento para a diligência senão fazer, sendo pessoas,
que tenhamjurisdição, procederão os Inquisidores, contra elas com censuras,
e não obedecendo às censuras, com as mais penas que lhes parecer; e se forem
oficiais de justiça, se procederá contra eles com as penas, que entender que
convém assim para que desistam do impedimento, e proibição, como para serem
castigados pela culpa, que nisso tiverem cometido.
5. Fazendo alguma pessoa de qualquer estado, e preeminência que seja,
estatuto decreto ou constituição que impedida a jurisdição do S. Ofïcio, os
Inquisidores a obrigarão com as censuras, a que os revogue; e não querendo
fazer, se procedení contra el4 como contra impediente do ministério do S.
Ofïcio, e senâ condenada nas penas impostas neste caso pelos Breves Apostô
licos. E assim mesmo se procederá contra os que quiserem, ou pretenderem por
alguma via usurpar o poder, e jurisdição, que por direito Canônico, e Breves
Apostólicos está concedida ao tribunal do S. OÍício.
6. E bem assim se procederá contra os ministros de justiça, que não
quiserem dar a execução às sentenças dos condenados pelo S. Oficio, segundo
a forma do Breve de Leão X e contra aqueles, que não quiserem remeter os
presos, que os inquisidores lhe pedirem para serem examinados, por culpas que
tiverem cometido contra nossa S. Fé.
7. Toda a pessoa, que se achar que por malícia, ou culpa sua descobriu o
segredo do S. Ofïcio, revelando-o à pessoas, que podem impedir seu ministério,
e o curso dos negócios da Fé, será castigada no mesmo S. Oficio, como
impediente de seu primeiro ministério, com as penas arbitrárias, que parecer
aos Inquisidores, tendo respeito à qualidade do delinqüente, e circunstancia da
culpa.
8. Os que ofenderem, injuriarem, ou mal tratarem os ministros, e oficiais
do S. Ofício, ainda que não seja por causa, ou razão de seus ministérios, serão
também castigados, como perturbadores dele, mas com diferentes penas, e
serão as que parecer, que convém para satisfação dajustiç4 e exemplo neces-
sário aos delinqüentes. E contra os que ferirem, ou matarem algum ministro do
S. ofício, se procederá na forma de direito, e Breves Apostólicos.
9. Se houver algum ministro, ou oficial do S. Ofício, tão esquecido de sua
obrigação, que por malícia, rogos, ou peitas, revele o segredo do S. Oficio, ou
faça" qualquer ouba coisa em prejuízo de seu ministério, impedindo-o, e
perturbando-o por este modo; se a culpa, que houver cometido for em matéria

R IHGB, No de Janeiro, I 5 7 (j92) : 693-88j, jul./set. I 996.


Regimento do Santo O/ício 1640
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grave; sendo ministro Eclesiástico, será do S. Oficio, eterâ as mais penas


arbitrárias, que couberem na qualidade de sua pessoa, paÍa as quais se terá
respeito às circunstancias da culpa; e sendo oficial, alem de perder o ofïcio, que
tiver na Inquisição, e ser excluído na mesma form4 será condenado em pena
de açoites, e degredado para as galés, pelo tempo que parecer; e se a culpa, que
uns e outros cometerem, for em matéria leve, se farâ o que fica ordenado no
livro 1, Título 3,5 47.
10. E por enquanto os que conompem, ou tentam corïomper os ministros,
e oficiais do S. Oficio, com rogos, dádivas, ou peitas, são também impedientes,
e perturbadores do ministério cometendo algumas pessoas este crime, se o que
por esta via procurarem alcançar dos ministros, e oficiais do S. Ofïcio, for em
matéria grave, sejam condenados em degredo para um dos lugares das conquis-
tas deste Reino, por tempo de dois até cinco anos; e sendo em matéria leve,
frcarâ a pena no arbítrio dos Inquisidores, que lhe imporão a que parecer que
convém, conforme a qualidade dos culpados, e circunstancias de suas culpas.
rÍrur.o xxt
Dos quefingem ministros, e oficiais na inquisiçõo
1. Convém tanto conservar a autoridade do ministério do S. OÍïcio, e
proceder-se puramente, e com toda a verdade, na matéria, que lhe tocam, que
se algumas pessoas forem tão ousadas, que fingidamente se façam ministros, e
oficiais do S. Oficio, para com isso enganarem a outras e lhes tirarem dinheiro,
ou outra qualquer coisa, ou fingirem que tem ordem do S. Oficio para fazer
alguma diligênci4 ou que sabem algum segredo do S. Ofício, para este efeito,
sendo compreendidos nestas, ou semelhantes culpas, serão condenados a que
vão ao Auto da Fé, a ouvir sua sentença, e não farão abjuração; salvo se do
crime resultar também culpa conha a Fé; e sendo pessoa vil, terá pena de açoites,
e degredo, as quais poderão moderar, conforme a qualidade dos Réus, e
circunstâncias, que diminuírem a culpa; e se forem pessoas de qualidade, terão
degredo, e as mais penas arbitrárias, que paÍecer aos Inquisidores; e uns e outros
restituirão por partes tudo que tiverem levado.
2. O ministro, e oÍicial de Justiça, que prender alguma pessoa suspeita na
Fé, que andar ausente ou tratar de se ausentar com temor do S. Oficio, sem
ordem sua para a tal prisão; e tendo-a presa a tornar soltar, por lhe dar alguma
coisa, além das penas do $ precedente, será condenado em dobro no diúeiro,
ou peça que tiver levado ao preso.
3. Se algum ministro, ou oficial da Justiç4 ou qualquer outra pesso4
querendo prender, ou fazer alguma diligencia para outro efeito, apelidar a padre
do S. Ofício, sem ordem para isso, será condenada em pena pecuniári4 e nas
mais arbitrárias, que parecer aos Inquisidores; e ouvirá sua sentença no lugar,

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Sônia Áparecida de Siqueira

que se entender que convém, tendo-se respeito à pessoa e circunstâncias da


culp4 para que sendo pública" e escandalos4 se haja de dar a ela satisfação.
4. Aqueles, que fingiremterculpas, que denunciarno S. Oficio de algumas
pessoas de nação, e com este fingimento lhes pedirem dinheiro, serão também
castigados pelo S. Oficio, e condenados em pena pecunitíria, e nas arbitnírias
que parecer conforme à qualidade da pessoa, e circunstâncias da culpa.

TITULO XKII
Dos quefogem dos córceres, e dos que não cumprem
as penitências, que lheforam impostas

1. O preso, que por si, ou com forç4 e ajudas de pessoas de fora fugir dos
cárceres do S. Ofício, quebrando grades, ou rompendo paredes, ou sem haver
nada disso, será punido gravemente, a arbínio dos Inquisidores, que terão
respeito nas penas à qualidade da pessoa" e circunstância da culpa" que na fugida
tiver. E sendo pessoa vil, e plebéia sená açoitada publicamente; porém nas penas
se usará de moderação com aquela que fugir por indústria sua; ou descuido do
Alcaide, e guardas do ciárcere; e o que der ajuda, em favor a tal fuga" será
castigado como fautor de hereges, ou impediente do ministério, segundo a
qualidade da culpas do preso, na forma, que fica dito nos títulos 9. e 21. deste
livro.
2.8 o que fugir do lugar, que lhe foi assinado por ciírcere para cumprir as
penitências impostas em sua reconciliação, pela primeka vez será preso, e
pedindo misericórdia, será condenado, a que vã ao Auto da Fé ouvir sua
sentenç4 e se lhe agravará o crírcere, o hábito penitencial mais um grau daquele,
com que foi reconciliado; e nunca poderá ser menos, que perpétuo, o qual
começará da publicação da última sentença.
3. E fugindo do lugar assinado por cárcere, depois de ser castigado por não
cumprir as penitências na forma, que deverá, e parecendo inconigível; além
das ditas penas, será degredado para fora do Reino, pelo tempo que parecer, e
terá as mais penas, e penitencias espirifuais, que se entender que convém à
qualidade, e circunstâncias da culpa; porém antes de ir ao degredo, será preso
na cadeia pública do lugar, que lhe estií assinado por cárcere, e dela levado
publicamente à sua freguesi4 a ouvir a missa da Terça, para satisfação do
escândalo que deu com suas culpas.
4. E se não cumprir a penitenci4 que lhe foi imposta na sentença de sua
reconciliação, e preso não quiser pedir niisericórdia de sua culpa, nem aceitar
as penitencias, que por ela lhe forem dadas, se procederá contra ele, como
impenitente, conforme a disposição de direito, e prática do S. Oficio.
5. Se os penitenciados, que andam cumprindo suas penitencias, forem
achados sem hábito penitencial nas cidades onde assiste o S. Ofïcio, serão pela

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):693-88j,jul./set. 1996.


Regimento do Santo OÍício 1640
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primeira vez repreendidos na mesa, de que se faÌá termo em seus processos por
eles assinado, para que tornando a cair na mesma culpa, se proceda contra eles
confonne sua impenitência merecer; e sendo fora do lugar em que assiste o S.
Ofïcio, se mandará fazer o mesmo pelos Comissrários; e pela segunda vez serão
condenados em perdimento da capa, ou manto com que forem achados sem
hábito, e em alguns dias de prisão no cárcere da penitencirári4 ou na cadeia
pública.
6. E os que forem achados sem hábito penitencial fora do lugar, que lhes
estava assinado por cárcere, perderão pela primeiravez a capa, ou manto, e
terão ao menos quinze dias de prisão na cadeia pública do lugar, que lhe estava
assinado por cárcere, e da prisão serão levados publicamente a ouvir missa, e
aos ofícios divinos. E sendo compreendidos segunda vez na mesma culpa, terão
um mês de prisão na mesma forma, e as mais penas arbitnârias, que parecer aos
Inquisidores, e porém se depois de assim castigados, não cumprirem suÍrs
penitências como devem, e se mostrarem incorrigíveis, serão presos nos cárce-
res do S. Ofício, e condenados conforme ao que está disposto no $2. deste título.

7. Asjustiças seculares poderão prender os reconciliados, que acharem sem


hábito penitencial, ou o houxerem coberto, e farão deles auto, que remeterão
aos Inquisidores, os quais lhe julgarão acapa, ou mÍunto, com que andarem; e
da mesma maneira qualquer oficial, ou familiar do S. Oficio, que achar os tais
penitenciados sem hábito penitencial, os poderá prender, e levar aos Inquisido-
res, que também lhe julgarão os vestidos na forma sobredita.

rÍruro XXIV

Das testemunhas falsas

L Quanto é maior o crime das pessoas que juram falso


no juízo do S.
Oficio, tanto convém que o castigo seja neles mais rigoroso. Toda a pesso4 que
testemunhar falso na mesa do S. Oficio, em qualquer crime cujo conhecimento
lhe pertenç4 pelo qual, se for provado, haja o Réu de ser entregue à Justiça
secular, ou seja para absolver, ou condenar, será açoitada publicamente, e
degredada paÍa as gales, por tempo de cinco até dez anos, e ao Auto público,
onde há de ir ouvir sua sentença,levarâ carocha com rótulo de falsário; e a
mesma pena de açoites e gales haverá pessoa, que com efeito induzir, e
corïomper alguma testemuú4 fazendo que jure, falso no sobredito crime.
Porem quando for absolver no crime de heresia, assim o que testemuúar de
leve, ou veemente, segundo a presunção, que contra ele resultar de fautor e
defensor de hereges; e se for tal o crime, que provado não haja de haver pena
ordinária o que nelejurar falso, e a pessoa que o induzir a isso, serão degredados
para um dos lugares das conquistas do Reino, por tempo de sete até oito anos.

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Sônia Aparecida de Siqueira

2. O que subornaÍ alguma testemunha, prometendo-lhe diúeiro, ou qual-


quer outra cois4 paxa que testemunhe falso na mesa do S. OÍício, se a
testemuúa o não quiser aceitar, nem dar testemunho, sendo tal o crime, que se
provado fora, havia o Réu por ele de ser relaxado à Cúria secular, será
condenado em açoites, e degredado paÍa um dos lugares das conquistas do
reino, por tempo de cinco ate dez anos; e não sendo o crime tal, que haja de
haver por ele pena ordinária, será condenado somente em degredo para um dos
ditos lugares; e sendo para absolver no crime de heresia, fará abjuração na forma
do $ precedente, e o degredo ficará no arbítrio dos Inquisidores; e nas mesmas
penas será condenado o que apresentar testemuúas falsas na mesa do S. Oficio,
posto que depois de apresentadas diga, que não quer usar delas.
3. Toda a pessoa, que falsamente culpara no crime de heresia, e apostasia,
a outr4 que por seu testemunho, com os mais da justiça, for relaxada à Justiça
secular, provando-se lhe a culpa de falsidade, ou por prova legítima, com que
seja dela convencida" ou por sua confissão, poderá ser relaxada à Justiça secular,
conforme a disposição do Breve do Papa Leão X; mas parecendo, que não
convém dar aos tais falsrários a pena ordinári4 irão ao Auto público da Fé ouvir
sua sentença com carocha, e na forma acostumada, sem hábito penitencial; e
serão condenados culpados em penade açoites, e degredo paragales, portempo
de dez anos; salvo se houvertais circunstâncias, que obrigue o moderação desta
pena; e em caso que os tais falsrârios fossem reconciliados, e dure ainda o tempo
de sua penitenci4 e se lhe agtavarâ mais um grau; mas nunca será menos de
perpétuo, o qual começará da publicagão da última sentença; e sendo mulheres,
serão degradadas pelo mesmo tempo paraa ilha de S. Tomé, ou Angola.
4. Sendo condenada alguma pessoa eclesiástic4 ou religiosa pelo crime de
falsidade, irá ao Auto da Fé, na forma, que fica dito; mas não levará carocha;
e se for Clérigo, será suspenso paÍa sempre das ordens, que tiver e inabilitado
pelo poder receber as que lhe faltarem, e degredado para as gales, de S. Tomé
ou Angola, pelo tempo que parecer, segundo a qualidade da culpa; e se for
Religioso, será privado para sempÍ€ de voz ativa, e passiv4 e suspenso das
ordens, e terá reclusão ate dez anos no mosteiro mais apartado de sua religião,
e nele alguns anos de cárcere, com disciplinas, ejejuns de pão eâgua,tendo-se
respeito ao prejuízo, e dano, que fez com a falsidade.
5. Os que antes de saírem dos cárceres do S. Ofïcio confessarem de haver
jurado falsamente em suas confissões contra alguma pessoa ou pessoas, levarão
ao Auto carocha, e serão condenados em açoites, e o hábito penitencial se lhe
agtavafit mais um grau, por razão de falsidade, que cometeram, e nunca será
menos que perpétuo, e a pena de degredo para gales, S. Tomé ou Angola, ficará
no arbítrio dos Inquisidores, para que havendo respeito a culpa, e ao prejuízo
que dela se seguiu, lha passam moderar, segundo lhe parecer; mas não incorrerá
nas ditas penas de falsário, a pessoa que se revogar do que houver dito contra

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Regimento do Santo Ofrcio 1640
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outra, mostrando em breve tempo que o fez por inadveúência, ou que quando
veio declarar sua confissão estava melhor lembrada do que no tempo, em que
o fez, porque neste caso, parecendo que fala verdade se fará o que fica disposto
no Título 5. $ 5. deste livro.
6. E os que pelo contrario negarem a culpa da falsidade que cometeram,
sendo por ela presos, se não houver prova legítimapara serem convencidos,
serão postos a tormento, e persistindo em sua negação, serão degredados para
S. Tomé, Angola, ou Brasil, se a qualidade da prova e circunstância da culpas
o pedirem.
7. Quando alguma pessoa jurar falso em qualquer diligênci4 que se fez
por parte do S. Ofício, os Inquisidores procederão contra ela, e lhe imporão a
penq que lhe parecer, tendo respeito à qualidade de pessoa, e ao prejuízo que
de seu testemuúo se seguiu.

TITTJLO XXV
Dos que cometem o nefodo crime da sodomia
l. Os Inquisidores procederão contra os culpados no pecado nefando de
sodomia de qualquer estado, grau, qualidade, preeminência e condição ainda
que isentos, e religiosos sejam, guardando a mesma form4 com que procedem
no crime de heresia; e quanto às penas, os poderão condenar, nas que merecem
por suas culpas, podendo também usar das que por direito civil; e ordenações
do Reino estão impostas aos que cometem este crime, até os relaxarem àjustiça
secular, conforme aos Breves Apostólicos de Pio IV. e Gregório XIII, e
declarações do Papa Paulo V. por cartas do Cardeal Melino, e a previsão do
Cardeal Infante Dom Henrique.
2. Os que a primeira vez se vierem voluntariamente apresentar na mesa do
S. Ofïcio, e confessarem nela culpas de sodomia" se não tiverem ainda teste-
munhas, nem depois de apresentados lhe sobrevierem, não serão condenados
em pena alguma; somente depois de se lhe tomar sua confissão, serão admoes-
tados, que nunca mais cometeram o tal crime; porque se tornarem a cair nele,
serão castigados com grande rigor; o que assim se guardará por ser este o estilo,
à que sempre se observou no S. Oficio.

3. E se os que assim se vierem apresentar, tiverem já testemunhas contra
si, ou depois da confissão lhes acrescerem, nem por isso castigados com pena
pública, para que com o temor dela e da infâmia, se não abstenham os culpados
de vir confessar suas culpas, e descobrir os cúmplices, com que as cometeram;
porém terão alguma pena, e penitencia secreta, pela qual se não possa vir em
conhecimento de sua culpa.
4. Quando as confissões dos tais apresentados forem diminutas, ou frau-
dulentas, de maneira que se prove, ou presuma com presunção grave, que foram

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (j92) : 69j-88j, jul./set. I 996. 871


Sônia Aparecidn de Siqueira

feitas com malíciq' sem embargo delas, serão os apresentâdos castigados,


conforme a gravidade de suas culpas guardando-se com eles o que fica dito dos
confidentes diminutos, fitos e simulados no crime da heresia.
5. E se os apresentados forem devassos no crime, serão condenados
secretamente em pena de degredo; porque esta pena não impede a confissão,
pela qual os Réus pretendem evitar a infâmia, e com ela fica cessado o
escândalo, que podia haver entre os que tivessem notícia de suas culpas e se
evita o dano, que de seu trato, e comunicação se causaria a outros.
6. E sendo algum tão devasso publicamente, e escandaloso, ou culpado
com tais circunstâncias, que agravem muito suas culpas; como seria se desse
casa para se cometer este delito, ou fosse terceiro para ele, ou perseverasse nele
muitos anos, cometendo-o em toda aparte, onde se achar, será castigado com
pena pública arbitriária, sem embargo de se haver apresentado; porque nestes
termos não recebe o Réu maior pena na infâmia de ser o castigo público, da que
se deve ao escândalo, que tem dado com a devassidão de suas culpas.

7. A pessoa, que assim se apresentar, e confessar suas culpas, posto que


não faça certo, nem dê ordem a serem presas as pessoas, de quem disse em suas
conÍissões, será recebida, na forma, que fica dito nos $$ precedentes, sem que
isso lhes prejudique, por quanto fazer certo os cúmplices, e dar ordem a serem
presos, não pode ter lugar no S. Oficio emrazáo do segredo, com que se fazem
as confissões, e com que se deve proceder à prisão dos que forem culpados.
8. Os que depois de apresentados a primeiravez, tornarem a cair neste
crime, e se vierem apresentar segunda vez, a confessa-lo, se do segundo lapso
não tiverem testemunhas contra si ao tempo da segunda apresentação, nem
depois lhe acrescerem, na forma, que fica dito, serão também condenados
secretamente em pena de degredo, com a qual sejam tirados do ligar do delito;
por quanto considerada a pouca emenda, que de ordinário há nos culpados neste
crime, justamente se pode receaÍ, que venham a ser nele incorrigíveis, e convém
para remédio da República degreda-los para parte onde lhe não façam dano.
9. E se os que se apresentarem segunda vez, tiverem testemuúas contra
si do segundo lapso, ou depois dele lhes acrescerem mas não chegarem afazer
prova bastante para serem convencidos; sendo pessoas qualificadas, serão
castigadas secretamente com a dita pena de degredo; e sendo de outra qualidade,
com pena pública arbitnária. e tendo prova bastante para se haverem por
convencidos, separada de sua confissão, serão condenados em pena pública
extraordinária, a maior, que possa ser, com respeito às circunstâncias, que no
delinqüente concorïem; porque sendo pessoa qualificada, ouvirá sua sentença
na sala do S. Ofïcio,eteúr pena de degredo; e se for pessoa ordinária será
condenada em açoites, e degredo de galés. Porém sendo estes convencidos pela
prova da Justiça escandalosos publicamente, ou muito devassos no crime, de

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Regimento do Santo Ofrcio 1640
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qualquer qualidade que sejam relaxados à Justiça secular, e seus bens confis-
cados na forma da lei do reino.
10. Os que havendo se apresentado primeira e segunda vez, tornarem
terceira vez a cometer o mesmo crime, e se vierem apresentar, e confessar sua
culpa; se do terceiro lapso não houver prova contra eles, mais que sua confissão,
serão castigados com pena publica arbitráni4 e não terão pena capital. Porém
tendo prova legítima contra si do terceiro lapso, serâo relorados à Justiça
secular; por quanto devem ser havidos por incorrigíveis, e convém, que neles
se pratique o rigor da lei, com a confiscação de bens, como fica dito.

11. Toda a pessoa, que for culpad4 e presa pelo crime de sodomi4 antes
de vir confessar no S. Ofïcio, ou seja leiga ou eclesiástica, secular ou regulaç
se estiver convencida pela prova dajustiça, ou pela confissão, que fez depois
de presa, nos cárceres do S. Oficio, sendo exercente (o que se entenderii se ao
menos se confessar, ou contra ela se provaÍ, dois atos consumados) será
relaxada à Justiça secular, e seus bens serão confiscados; salvo se for menor de
vinte anos, ou ocofferem tais circunstâncias no caso, e na qualidade da pesso4
que pareça se lhe não deve dar pena ordinária, porque entiio se lhe dará outra
extraordinária, a mais grave, que pode ser. E os negativos, que não forem
convencidos pela prova da Justiça serão postos a tormento; e não confessando
nele, nem depois, serão condenados em penas públicas arbitrárias, segundo
parecer que convém.

12. Qualquer pessoa que for convencida neste crime, ou seja pela prova da
justiça, ou sua própria confissão, e com tudo não há de ser entregue ajustiça
secular; mas há de ser castigada publicamente; ìrâ ao auto público da Fé a ouvir
sua sentença, e será condenada em confiscação de bens, em pena de açoites, e
degredo para galés, pelo tempo que parecer; e sendo Clérigo, terá as mesmas
pen:ìs, exceto a de açoites, e será suspenso paÍa sempre das ordens, que tiver,
e inabilitado para ser promovido às que lhe faltarem; e tendo ofício, ou beneficio
Eclesiástico, será privado dele, e inabilitado para ter outros; e se for Religioso
professo, ouvirá sua sentença na sala do S. Ofïcio, e será também suspenso das
ordens privado de voz ativa e passiva para sempre, e degredado paÍa um dos
mosteiros mais apartados de sua religião, onde terá algum tempo de reclusão
no cárcere, com as penitencias, que se costumam dar aos religiosos por culpas
gravíssimas; e poderá também ser degredado paÍa algum lugar fora do reino,
tendo-se respeito à gravidade do crime, e qualidade da pessoa; mas em caso
que sejam devassos no crime, e escandalosos, irão ouvir sua sentença no Auto;
e serão também condenados em degredo para galés.

13. E em caso, que alguma mulher compreendida no crime de sodomi4


haja de ser castigada por ele no S. Ofïcio, ouvirá sua sentença na sala da
Inquisição, pelo grande escândalo, e dano, que pode resultar de se levarem a

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Sônia Áparecida de Siqueira

Auto público semelhantes culpas, e sená degredada para a Ilha do Príncipe, S.


Tomé, ou Angola; e quando se assentar, que poÍ algumas razões particulares
convém ir ouvir sua sentença ao Auto público da Fé, será condenada em pena
de açoites, e no degredo que parecer para um dos ditos lugares.

rÍrur,o xxvr
Dos ausentes, e defuntos, que morueram antes
ou depois de presos, e dos que se matarom,
ou endoidecerão nos cárceres

1. Quando algumas p€ssoas acusadas, ou denunciadas no S. Ofïcio por


culpas de heresi4 de apostasia estiverem ausentes, ou depois de acusados, ou
denunciados se ausentarem, se procederá contra elas, na forma, que fica
declarado no Livro 2, Título 19. E havendo por parte dajustiça prova bastante
paÍa serem convencidos no dito crime, serão declarados por sentença" por
hereges, e apostatas de nossa S. fé católica, e levados em estiítua ao Auto público
da Fé, onde se lerão suas sentenças, e por elas serão relaxados àjustiça secular,
e condenados em confiscagão de bens desde o tempo que pela prova dajustiça
constar, que cometerão delito.
2.8 nlohavendo por parte da justiça prova legítim apdraos tais ausentes
serem convencidos no crime; se contudo forem citados na forma do cap. Cum
contumácia de hoereticis, Livro 6, passado o ano, e guardados os termos de
direito, serão também condenados, e declarados por hereges, e relaxados em
estátua no Auto público da Fé à Cúria secular, e incorrerão na pena de
confiscação de seus bens, desde o tempo, em que foram convencidos por sua
contumiícia.
3. E querendo estes tais, depois de assim serem convencidos, a provar sua
inocência, serão admitidos na forma, que fica no Livro2,Título 19, $ 7. Porém
não poderão Íecuperar os bens, que lhes foram confiscados, senão provando
legitimamente estarem inocentes da culpa, que se lhes formou, ou que tiveram
justo impedimento para não poder vir dentro do ano a defender-se; e sucedendo
que os tais ausentes moÍram dentro do ano, se não procederá às ditas penas
conüra eles, por quanto não tendo contra si prova legítima, se não podem
executar, senão em caso que sejam convencidos na contumácia.
4. Quando os ausentes depois de condenados, forem presos pelo S. Oficio,
e confessarem, suas culpas, serão recebidos ao grêmio, e união da S. M. Igreja,
com cárcere, e hábito perpétuo sem remissão, o qual levarão ao Auto com
insígnias de fogo, e serão mais condenados em degredo de galés, de três até
cinco anos, conforme a qualidade de suas confissões. Porém vindo se apresentar
voluntariamente, e confessando de modo que sejam recebidos, posto que hajam
de ter mais penas, serão relevados do dito degredo. E em qualquer dos casos

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Regimento do Santo Ofuio 1640
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sobreditos, depois de reconciliados, se mandarãb tirar seus retratos das lgrejas,


onde se puseram ao tempo que foram relaxados em esüítua.
5. Se depois de se haver procedido contra os defuntos na forma, que fica
declarado no Livro 2, Título 18, eles forem havidos por convictos no crime de
heresia e apostasia, serão em sua sentença declarados por hereges, e apóstatas
de nossa S. Fé, e condenada sua memóri4 e fama, e confiscado seus bens do
tempo em que se provar, que cometeram o delito contanto que estejam legiti-
mamente prescritos por espaço de quarenta anos; e serão seus ossos desenter-
rados, e tirados das lgrejas, adros, ou qualquer outra sepultura eclesiásticq em
que estiverem, podendo se separaÍ dos ossos dos fiéis cristãos, e levados com
sua estiátua ao Auto público da Fé, e relarados à justiça secular.
6. E falecendo depois de serem presos nos cárceres do S. Oficio, se ao
tempo de seu falecimento tiverem confessado suas culpas, e satisfeito à infor-
magão dajustiça" serão recebidos ao grêmio, e união da S.M. Igreja; e no auto
público da Fé se lerá sua sentença, paÍa que possam gozar dos sufrágios da
Igeja, e serão condenados em confiscação de bens, do tempo, em que comete-
ram o delito; mas neste caso se não levarão ao Auto suas estátuas.
7. E estando negativos ao tempo que faleceram; e não havendo prova
bastante para serem convencidos, serão absolvidos do juízo, e se mandani
levantar o seqüesto feito em seus bens; e se publicará sua sentença no Auto da
Fé, para que por este modo se dê satisfação à inümia, em que ficarão pela
prisão; e também neste caso se não levará esüátua ao Auto, nem menos se
relatarão em particular na sentenç4 os enos de que foram acusados, pois lhe
não provados. Mas quando se entender de se publicar a sentença no Auto, pode
resular infimia à memória do defunto, ou a seus parentes, se publicará na mesa.
8. Pedindo-se por parte dos herdeiros dos defuntos, nos casos, em que
foram absolutos, ou reconciliados, os ossos dos mesmos para lhes dar sepultura
Eclesiástica, os inquisidores lhos mandarão entregaÍ, em cumprimento de suas
sentenças, sem por isso lhe pedir, nem aceitar coisa alguma; e os ossos dos
defuntos, que não forem presos por culpa de heresia, serão enterrados em
sagrado.
9. Matando-se alguma pessoa presa no ciírcere do S. Oficio, por suas
próprias mãos, ou seja confidente, ou negativa, se constar, que ao tempo que
se matou, estava em seu juízo e capacidade, se haverá o delito por provado
conüa ela; e sendo culpada no crime de heresia, ou apostasia, será relar<ada à
justiga secular em Auto público, e condenada em confiscação de seus bens,
desde o tempo que pela prova dajustiça constar, que cometeu o delito. Porém
se nas confissões do Réu ocoÍïerem as circunstâncias, que direito se requerìem
para diminuir a presunção, que confta ele resulta de sua morte, poderá.,ser
recebido ao grêmio, e união da lgreja.

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J
Sônia Aparecida de Siqueira

10. Os presos pelo pecado nefando, que falecerem nos cárceres do s. oficio,
e ao tempo de sua morte estiverem convictos por sua confissão, ou por qualquer
outra legítima prova de direito, serão condenados em confiscagão de seus bens,
quando seus herdeiros, que hão de ser citados, conforme ao que estrí dito no
Livro 2, Título 18, não mostrarem tanto que dela hajam de ser revelados; e a
sentença da condenação se levará na mesa do S. ofïcio; e não estando conven-
cidos, se tomará assento em seu processo, na forma, que está disposto no dito
Título ll, $ 7.
ll. Aos que endoidecerem nos cárceres do S. Ofïcio, se não darápena
corporal, pois o furioso, não é capazdel4e assim com eles, como em sua causa,
se fará o que se dispõe no Livro 2, Título 17, e ficarão seus bens em seqüestro,
para que tornando a seujuízo, ou falecendo naquele estado se proceda confa
sua memória, e fama; e tendo prova legítima, será condenado em confiscação
dos bens, e danada sua fama, e memória; e se a prova não for bastante, como
de direito, e prática se recupere, para se haver por convencido, seja absoluto da
instância" e se mande levantar seqüestro feito nos bens, para que se possam
entregar a quem de direito pertencerem.
TÍTULO xxvll
Dos casos, eÌn que os inquisidores poderão dispensm
nas penqs impostas aos condenados no S. Oficio,
e dw sobrefiançaos culpados

1. Sendo alguma pessoa condenada pelo S. Ofício, em cárcere, e habito


penitencial, a arbítrio favorável, ordinário ou dilatado, poderão os Inquisidores
dispensar com ela levantando-lhe o ciárcere, e mandando lhe tirar o habito
penitencial, comutando-lhe estas penitencias nas espirituais, que parecer que
convém; mas será depois de estar suficientemente instruída nos mistérios de
nossa S. Fé, e de se haver confessado sacramentalmente, e de ter ido algumas
vezes ouvir miss4 e os ofïcios divinos à Igreja, que para isso se escolher no
lugar, em que assiste o S. Oficio.
2. E quando Nós houvermos por bem de dispensar com algumas mulheres
condenadas em cárcere, e hábito penitencial perpétuo, se houver causajusta,
poderão os Inquisidores escusa-las de vir ao S. Ofïcio, para lhes serem tirados
os hábitos penitenciais, e impostas as penitencias, e cometer aos Comissários
das terras onde viverem, ou à pessoa, que lhe parecer, que lá lhe tire os hábitos,
e impoúa as penitências, mandando-lhe para isso a instrução necessári4 de
que fará termo com elas, que enviará à mesa para se juntar a seus processos.
3. Aos reconciliados notoriamente pobres, que estiverem no cárcere da
penitência" ou fora dele, nos lugares que lhes são assinados para cumprir suas
penitêncías, poderão dar licença para sair do ciírcere e pedir esmola pela cidade,

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Regimento do Santo Olício 1640
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ou por alguns lugares do Reino, conforme a necessidade, que tiverem; e no


tempo lhes poderão permitir que não levem hábito penitencial. E assim mesmo
poderão dispensarcom os reconciliados quetiverem cumprido suas penitências,
para que possam sair do Reino, mas será com justa causa, e de maneira que da
tal dispensa não resulte escândalo.
4. Poderão também dispensar com os reconciliados, para que recebam o
Sacramento da Eucaristia; mas será quando por espaço de tempo tiverem dado
mostras de estarem verdadeiramente convertidos.
5. E por quanto os reconciliados, e os filhos, e netos dos relaxados do S.
Ofïcio, não podem ter, nem servir ofïcios públicos, nem usar das coisas que lhe
estão proibidas no Título 3, $ 12 e $ 13, deste livro, e se os sobreditos pedirem
dispensa das ditas coisas, poderão dispensar com eles; porém será necessiário
para isto, que concoram tais circunstâncias, que de todo cesse o escândalo, que
justamente pode haver de se levantar a dita proibição à pessoas infames; e com
os filhos e netos dos relaxados, se usará de maior favor, e bastará menos causa
paÍa se poder dispensar com eles.
6. Livrando-se alguma pessoa solta no tribunal do S. Oficio, ou tendo-se
lhe dado por ciírcere a Cidade, enquanto durar sua causa, sendo-lhe necessiírio
ausentar-se por alguns dias, constando aos Inquisidores, que temjusta caus4
poderão dar-lhe licença para se ausentar; dando porém fiança conforme a culpa
de que estiver livrando. Bem assim poderão soltar sobre fiança os presos, que
estiverem no cárcere da penitência, depois de saírem no Auto, por deverem
alguma quantia de dinheiro de alimenton custas de seu processo, ou condenação,
assinando-lhe tempo conveniente parapagar, e não pagando nele , executarão
sem dilação os fiadores, de modo que o tesoureiro do S. Ofïcio, seja indireta-
mente satisfeito, do que por alguma das razões sobreditas se lhe dever.

- 7. Sendo algumas pessoas condenadas em degredo paÍa os lugares da


Africa, poderão os Inquisidores, depois da sentença em tudo mais estar execu-
tada solta-los sobre fiança para irem cumprir seu degredo no tempo, que lhes
for assinado; e sendo presos pobres, ou não tendo fianç4 os mandarão soltar,
e notificar que em termo de dois meses, vão cumprir seu degredo; porém uma
e outra coisa se entenderá, não passando o degredo de cinco anos; porque
passando deles irão presos servir seus degredos; e os que derem sobre fiança,
obrigarão por cada ano de degredo, vinte cruzados, e dentro de três meses
enviarão a mesa do S. Ofïcio certidão do Capitão do lugar para que foram
degredados, paÍa que conste como nele se apresentaram; e não apresentando a
certidão dentro no dito tempo, serão os fiadores condenados em perdimento da
fiança.
8. Aos que forem degredados para algum lugar certo dentro do Reino, como
Castro Marim ou qualquer outro, poderão também assinartempo de dois meses,

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Sônia Aparecida de Siqueira

para irem cumprir seus degredos; porém estes não serão obrigados a daÍ fiança:
e sendo alguns dos ditos degredados depois de passados os dois meses, achados
no Reino, fora do lugar do degredo, sem mostrar certidão, de como tem
cumprido serão presos na cadeia pública, e castigados conforme merecer sua
culp4 tendo-se respeito às penas, que pelas leis esülo impostas aos degredos
que não cumprem seus degredos como devem.

9. Nas mais penas, e degredos, que neste título não ficam, não dispensarão
os Inquisidores, nem darão sobre fiança os culpados condenados, por quanto
as reservamos aNós, para que com seu parecer, que enviarão ao conselho geral,
quando lhe for pedido, resolvamos o que for mais serviço de Deus N. Senhor,
e bem da Justiça.

EDITAL DA FE E MONITORIA GERAL, DE QUE SE


FAZMENÇÃONOLTVRO 1,TÍTULO3 $ 11.

Os Inquisidores Apostólicos, contra a herética pravidade e apostasi4 em


esta Cidade, e Arcebispo de (...) e seu distrito, &c. Fazemos saber aos que a
presente virem, ou dela por qualquer via tiverem notícia, que considerando-nos
a obrigação que nos corre, de procurar, reprimir e extirpar todo o delito, e crime
de heresia e apostasia" para maior conservação dos bons costumes, e pureza de
nossa santa Fé católica; e sendo informados que algumas pessoas, por não terem
perfeito conhecimento dos casos que pertencem ao S. Offcio, deixam de vir
denunciar de alguns deles, e por não estar suficientemente provido a este
conveniente, com se publicarem só nas ocasiões em que se celebram os Autos
da Fé, pela pouca aplicação, com que se houve naquela ocasião os editais em
que os ditos casos se relatam; e desejando achar meio para que os fiéis Cristãos
não fiquem com suas consciências carregadas, e ilaqueados com as excomu-
nhões, que se frrlminam nos ditos Editais; nos pareceu mandar publicar de novo
todos os ditos casos com esta nossa carta monitoria. Pela qual autorizaste
Apostólica mandamos a todas, e quaisquer pessoas Eclesiásticas, seculares e
regulares, de qualquer grau estado, preeminência, ordem e condição que sejam
isentas e não isentas em virtude da santa obediência, e sob pena de excomuúão
maior, ipso fato incurrend4 cuja absolvição a nós reservamos, que em termo
de trinta dias primeiros seguintes, que lhes assinamos pelas três admoestações,
termo preciso, e peremptorio, dando-lhes repartidamente dez dias por cada
admoestação, veúam denunciar, e manifestar ante Nós que souberem dos
casos, que abaixo vão declarados.

Se sabem, ou ouviram, que algum cristÍio batizado haja dito ou feito alguma
coisa contra nossa santa Fé católica, e contra aquilo que tem, crê e ensina a
santa madre Igreja de Roma, e ainda que o saibam se segredo natural, como for
da confissão.

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 69 j-883, jul. /set. I 996.


Regimento do Santo Ofrcio 1640
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Que alguma pessoa depois de ser batizada, e tenha ou haja tido crença na
lei de Moisés, depois do último perdão geral, que publicou em cinco dias do
mês de janeiro de 1605, não reconhecendo a Cristo Jesus nosso Redentor por
verdadeiro Deus, e Messias prometido aos Patriarcas, e profetizado pelos
profetas, fazendo os ritos e cerimônias judaicas, a saber, não trabalhando nos
Sábados; mas antes vestindo-se neles de festa, começando a guarda da sexta
feira à tarde; abstendo-se sempre de comer came de porco, lebre, coelho, e peixe
sem escama, e as mais coisas proibidas na lei velha, jejuando o jejum do dia
grande, que vem no mês de setembro, com os mais que os Judeus cosfumam
jejuar, solenizando suas páscoas, rezando orações judaicas, banhando seus
defuntos, e amortalhando-os com çamisa comprida de pano novo, e pondo-lhes
em cima uma mortalha dobrada, e calçando-lhes calções de linho, e enterran-
do-os em terra virgem, e covas muito fundas, e chorando-os com sua liteiras,
cantando como fazem os Judeus, e pondo na boca grãos de aljôfar, ou diúeiro
de ouro ou prata, e cortando-lhes as unhas, e guardando-as, e comendo em
mesas baixas, e pondo-se atrás da porta por dó, ou fazendo outro ato, que pareça
r ser em observância da dita lei de Moisés.

Que quando cristilo depois debatizado sig4 ou haja seguindo em algum


ì

tempo a maldita seita de Mafamede, observando algum dos preceitos do seu


:
Alcorão.
I
Que teúa, ou haja por boa a seita de Lutero, Caluino, ou de outro algum
heresiarca dos antigos, os modernos, condenados pela santa Sé Apostólica.
Negando, ou duvidando estar real ou verdadeiramente o corpo de nosso
seúor Jesus Cristo no santíssimo Sacramento da eucaristia, e dever ser vene-
rado com a mesma adoração, que é devida a Deus.
Negando ou duvidando ter Paraíso para os bons, e inferno para os maus, e
purgatório em que as almas, que neste mundo não satisfazem interiormente suas
E
Ë culpas, são purgadas primeiro que vão gozar dabem aventurança.
{
Negando ou duvidando, que os sufrágios da lgrej4 como são mlssas,
orações, esmolas, aproveitam as almas dos defuntos, que estão no fogo do
purgatório.
Negando ou duvidando serem as pessoas obrigadas, por preceito divino, a
confessarem seus pecados aos sacerdotes, afirmando que basta confessarem-se
a Deus somente.

Sentindo mal, ou duvidando de algum dos Artigos da Fé.


Negando, ou sentindo mal dos sacramentos da S. M. Igreja, assim como
do da ordem, e o matrimônio; celebrando, ou confessando sacramentalmente,
sem ter ordens de missa, ou casando-se publicamente em face da lgreja, depois

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Sônia Aparecida de Siqueira

de ter feito voto solene de castidade, ou tomado ordens sacras, ou casando


segunda vez, sendo vivo o primeiro marido ou mulher.
Dizendo ou afirmando, que o homem não tem liberdade para livremente
obrar, ou deixar de obrar bem ou mal.
Dizendo, que a Fé sem obras basta para a salvação daalma, e que nenhum
cristão batizado, e que tenha Fé pode ser condenado.
Dizendo e afirmando, que não há mais que nascer, e morer.
Negando haverem de ser venerados os Santos, e tomados por nossos
intercessores diante de Deus.
Negando veneração, e reverência as Relíquias dos Santos.
Sentindo mal dos votos, religiões e cerimônias aprovadas pela S. M. Igreja.
Negando ao Sumo ponúfice superioridade aos outros Bispos, e a faculdade
de conceder indulgências, e a elas Eficácia de aprovarem as almas.
Negando a obrigação dos jejuns nos tempos ordenados pela Igreja.
Afirmando não serem pecados mortais a onzena ou fornicação simples.
Sentindo mal da purez.a da Virgem santíssima nossa Seúora não crendq
que foi virgem antes do parto, e depois do parto.
Se sabem, ou ouviram que alguma pessoa faça feitiçarias, usando mal a
este fim, de coisas sagradas, tendo pacto tiâcito, ou expresso com o diabo,
invocando-o e venerando-o.
Se sabem ou ouviram que alguma pessoa exercite a astrologia judiciária
leia ou tenha livros dela, ou de qualquer outra arte de advinha.
Se sabem ou ouviram que alguma pessoa tenha, ou leia outros livros
proibidos, ainda com pretexto de licenças, que para isso hajam alcangado; por
todas estarem revogadas por sua Santidade até sete dejunho de 1633.
Se sabem ou ouviram que algum confessor secular, ou regular de qualquer
dignidade, ordem, condição e preeminência que seja" haja cometido, solicitado,
ou de qualquer maneira provocado para si, ou para outrem a atos lícitos e
desonestos, assim homens como mulheres, no ato da confissão sacramental,
antes ou depois dele imediatamente; ou com ocasião.ou pretexto de ouvir de
confissão ainda que a dita confissão se não siga" ou fora da confissão no
confessioniário, ou lugar deputado para ouvir de confissão, outro qualquer
escolhido para esse feito, fingindo que ouvem da confissão.
Se sabem ou se ouviram a que alguma pessoa penitenciada pelo S. Oficio
por culpas, que nela haja confessado, dissesse depois, que confessara falsamen-
te o que não havia cometido; ou descobrisse o segredo do que passa na

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Regimento do Santo OJícío 1640
-

Inquisição, ou distraísse, e sentisse mal do procedimento, e reto ministério, do


S. Ofício.
As quais coisas todas, e cada um delas, que souberem por qualquer vi4
cometidas, ou daqui em diante se cometerem, o virão denunciar na mesa do S.
Ofício por si, ou por interposta pessoa: e nos lugares onde houver Comissrário
(
do S. Oficio, denunciarão diante dele, e onde o não houver, cada qual a seu
; confessor, o qual dentro no mesmo termo será obrigado ao fazer saber ao S.
Oficio e passado o dito termo de trinta dias, não vindo fazer denúncia do que
souberem (o que deus não permita) por estes presentes escritos pomos em suas
pessoas, cujos nomes, e cognomes aqui havemos por expressos, e declarados,
\Ì excomuúão maior, e os havemos por requisitos para os mais procedimentos
l que contra eles mandarmos fazer, conforme a Bula da s. Inquisição, alem de
incorrerem na indignação do onipotente Deus, e dos bem aventurados S. Pedro,
Príncipes dos apóstolos; e sob a mesma pena mandamos que pessoa alguma
seja ousada a impedir, ou aconselhar, que não denunciem, ameaçando, subor-
nando, ou fazendo algum mal aos que quiserem denunciar.
E assim denunciarão se sabem de alguma pessoa, ou pessoas, que tiverem
cometido o nefando, e abominável pecado da sodomia.
E com a mesma autoridade Apostólica mandamos com pena de excomu-
úão maior, e de cinqüenta cruzados, aplicados para as despesas do S. Oficio,
i a todos os Priores, vigrários, reitores, Curas, e mais pessoas eclesiásticas, a quem
t
esta nossa carta for apresentada, que no dia, e hor4 que lhes for apontad4 a
leiam e façam ler em suas Igrejas, em voz alt4 e inteligível, paÍa que venha a
h notícia de todos, e não haja quem possa alegar ignorância. Data em ::::: no S.
OÍïcio sob nosso sinal, e selo dele, aos ::::: dias no mês de::::
FORMA DO ruRAMENTO

QUE HÁ DE FAZBR VISITAS DO q. OFÍCIO, DE QTJE


FAZ MENÇÃO NO LIVRO I,TITULO 4 $ 12.
EuN. (dizendo a pessoa seu nome, & o título que tiver) por admoestação,
e mandado do senhor Visitador, que presente está, como verdadeiro Cristiio, &
obediente aos mandados da S.M. Igreja Romana, prometo & juro por estes
santos evangélicos, & santa vera Cruz, que teúo ante meus olhos, & toco com
) miúas mãos, que sempre terei a S. Fé Católica, que a S. M. Igreja de Roma
tem, &ensina & que a farei ter, & guardar atodas as pessoas a minhajurisdição
sujeitas, & defenderei com todas miúas forças, contratodas as pessoas, que a
quiserem impugnar, & contradizer, em tal maneira, que perseguirei todos os
hereges, & os que neles crerem, & seus favorecedores, receptores e defensores,
& os prenderei, & mandarei prender, & os acusarei, & denunciarei à S. M.
Igejq & ante vós senhor Visitador como seu ministro se souber deles em

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57 (392) : 69j-883, jul./set. I 996.


Sônia Aparecida de Siqueira

qualquer maneira, maiormente, quando a cerca deste caso for requerido da parte
do S. Oficio: e que não cometerei, nem encíuïegarei os oficios públicos de
qualquer qualidade que sejam, a pessoa alguma dos sobreditos, nem a outras,
a que for proibido, ou imposto por penitencia pelo S. Ofício da Inquisição, nem
às pessoas, a quem o direito, por razío do delito, & crime de heresi4 e apostasia
o defende; & se os tiverem, não os deixarei usar deles, antes os punirei, &
castigarei conforme as leis do reino. E que neúum dos acima ditos receberei,
nem terei em minha companhia" famíli4 & serviço nem em meu conselho; &
se por ventura o contnário fizer, não o sabendo, tanto que a miúa notícia vier
serem as tais pessoÍÌs da condigão acima dit4 logo as lançarei de mim.
E assim prometo, que todas as vezes que por vos seúor Visitador ou
qualquer outro, que por parte do S. Oficio a estas partes vier, me for mandado
executar qualquer mandado ou sentença contra alguma pessoa, ou pessoas das
sobreditas, o farei, & cumprirei sem dilação alguma, segundo dispõe os sagra-
dos Cânones, que nos tais cÍrsos falam, & assim em tudo o acima dito, como no
mais, que tocar ao S. Ofïcio, serei obediente a Deus, & a vós S. Visitador, &
aos mais, segundo mlúa possibilidade. Assim Deus me ajude, & estes santos
Evangelhos.
FORMA DE RECONCTLTAÇÃO
DE QLIE SE FAZ MENÇÃO NO LIVRO 2, TÍruLO 1 $ 8.

Havendo-se tomado assento na mesa da visit4 que alguma pessoa seja


reconciliad4 & recebida ao grêmio, & união da S. M. Igrejq depois de
assentada a sentença, e assinada pelo Inquisidor, e Ordiniírio, será o penitente
chamado à mesa" estando em pé, lhe lerá o Noüário a sentença; & acabada de
publicar, se porá o penitente de joelhos, tendo diante de si um missal aberto, &
as mãos postas sobre ele: 7 estando assim lhe lerá o Notário a abjuração
seguinte.

ABJURAÇAO EM FORMA
Eu N. perante vos S. Inquisidor juro nestes santos evangelhos, em que
tenho minhas mãos, que de minha própria vontade anatematizo, & aparto de
mim toda a espécie de heresia que for, ou se levantar contra N.S. Fé Católicq
e Sé Apostólicq especialmente estas, em cai, e que agora em miúa sentença
me foram lidas, as quais hei por repetidas aqui, & declaradas; & juro de sempre
ter, e guardar a S. Fé Católica, que tem e ensina a S., M. Igreja de Roma; e que
serei sempre muito obediente ao nosso muito s. Padre o papaN, hora presidente
na Igreja de Deus, e a seus sucessores: e confesso, que todos os que contra esta
S. Fé católica forem, são dignos de condenação; e juro de nunca com eles me
juntar, e de os perseguir, e descobrir as heresias, que deles souber aos Inquisi-
dores, ou Prelados da S. M. igreja; e prometo, quanto em mim for, de cumprir

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I
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Regimento do Santo Oftcio 1640


b -
Ë
;
a penitenci4 que me é, ou for imposta" e se tornaÍ a cair nestes erros, ou em
outra qualquer espécie de heresia (o que Deus não permite) quero, e me pra6
I que seja havido por relapso, e castigado conforme a direito: e se em algum
tempo constar o contriário do que tenho confessado por meu juramento, quero
I que esta absolvição me não valha; e me submeto a severidade, & correção dos
sagrados Cânones: & requero ao notário do S. Oficio, que presente estri que
disto passe instrumento, e aos que esüio presentes sejam testemuúas, e assinem
(
aqui comigo. Assinada a abjuração, se levantará o Inquisidor, e absolverá o
penitente na forma seguinte.
I Dirá o Psalmo de Misesere mei Deus, e a cada verso, ele, ou outra pessoa
?
das que estiverem presentes, dará ao penitente com um molho de varas nas
costas levemente. Acabando o Psalmo dirá: Kyrie eleyson, Christe eleyson,
Kyrie eleyson. Pater noster. et nas inducas in tentationem. R. Sed libera nos a
malo.
E logo os vers.& orações seguintes
Salvum fac servum tuum Dfie. R. Deus meus sperantemin te, V. esto ei
Dfie turris fortitudinis. R. à facie inimci. v. Nihil proficiat inimicus in eo. r. et
filius iniquitatis non apponat nocère ei.V. domine exaudi arationem meam, R.
I Ety clamor meus ad te veniat.V. Dominus vobiscum. R. Et cum spiritu tuo.
Oremos

\ Deus, cuis proprium est misereri sempre, & parcere, suscipe deprecatio-
nem nostram, & hunc famulum tuum, quem sententia excomunicationis catena
constringit miseratio tua pietatis absoluat.
Oremos
Presta quasumus, Dominae, huic famulo tuo, dignum paenitentiae fructum
quem pecando amisit: ut Eclesiae tuae sactae, a cuius integritat deviauit
delinquendo, redatuÍ, innoxius, veniam cosenquendo. Per Christum Dffm nos-
trum. R" Amen.
Dominus noster Jesus Christus, qui habet plenariam potestatem, te abso-
luat & Pauli, & Apostolica autoritate mihi concessa in hac parte, qua fungor,
te absolvo ab omni vinculo excomunicationis, in quod incurristi, tam ab
homine, quam a iure, propter haeresim, siue superstitionem ludaicam, vel
múometicam, quam tenuisti, & sequitus fuist: & restituo te vnitati Ecclesiae,
& perceptioni sacramentorum, & parcipationi fedelium, in nomine Patris, &
Filij, & Spiritus Sancti. E langará água benta sobre o penitente.

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