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Roy Bhaskar
Introdução
O objetivo deste livro é desenvolver avaliação sistemática e realista da ciência. Tal avaliação deve
nos dar uma alternativa ampla ao positivismo que desde o tempo de Hume moldou nossa imagem de
ciência. A teoria Humeana de leis casuais é importante na visão positivista de ciência. É uma das
principais preocupações deste estudo desenvolver alguns novos argumentos e mostrar como eles se
relacionam com outros argumentos mais conhecidos contra essa teoria ainda extensamente aceita. Em
particular o autor desejo argumentar que não apenas uma conjunção constate de eventos não é condição
suficiente, nem mesmo é condição necessária para uma lei científica; e somente se pudermos
estabelecer a última que poderemos dar uma rationale adequada à primeira. Já foi dito algumas vezes
que uma conjunção constante de eventos é insuficiente, mas ainda não foi sistematicamente discutido
que não é necessária. Isso pode, contudo, ser mostrado por um argumento transcendental da a natureza
da atividade experimental.
É uma condição de inteligibilidade da atividade experimental que em um experimento o
experimentador seja um agente causal de uma seqüência de eventos, mas não da lei causal que a
seqüência de eventos lhe permite identificar. Isso sugere que existe uma diferença ontológica entre leis
científicas e padrões de eventos. Obviamente isso gera um problema a priori para qualquer teoria da
ciência. Eu acredito que isso pode ser resolvido seguindo as seguintes linhas: Para atribuir uma lei, o
cientista necessita uma teoria. Pois somente se for baseado em uma teoria, contendo um modelo ou
concepção de uma putativa causal ou ´conexão´ explicativa, que uma lei possa ser distinguida de uma
pura concomitância acidental. A possibilidade de dizer isso claramente depende de uma concepção
não-reducionista da teoria. Agora, no centro da teoria, existe uma concepção de um mecanismo natural
ou estrutura trabalhando. Sob certas condições, alguns mecanismos postulados podem vir a ser tidos
como reais. E é no trabalho destes mecanismos que a base objetiva de nossas atribuições de
necessidade natural está.
Somente se assumirmos a real independência de tais mecanismos dos eventos que eles geram que
temos uma justificativa a assumir que eles resistem e continuam atuando de forma natural fora das
condições experimentais fechadas que possibilitam-nos identificá-los empiricamente. Mas somente se
tivermos uma justificativa para assumir isso que a idéia de universalidade de uma lei conhecida possa
ser mantida ou que a atividade experimental possa ser representada de forma inteligível.
Conseqüentemente uma das principais objeções ao positivismo é que ele não pode demonstrar o porquê
ou as condições sob as quais a experiência é significativa para a ciência. A maioria dos críticos
enfatizou a depreciação da teoria como um todo; este argumento demonstra sua inadequação para com
a experiência. Alem disso, somente porque deve ser aceita, se a atividade experimental deve ser
representada de forma inteligível, que os mecanismos naturais resistem e funcionam fora das
condições que nos permite identificá-los que a aplicabilidade das leis conhecidas em sistemas abertos,
ou seja, em sistemas onde nenhuma conjunção constante de eventos prevalece, pode ser mantida. Isso
tem o corolário que uma conjunção constante de eventos não pode ser necessária para a aceitação da
eficácia de uma lei.
Este argumento mostra que estruturas reais existem independentemente de e estão constantemente
desincronisadas com o padrão de eventos vigente. De fato somente devido ao último que precisamos
desenvolver experimentos e somente por causa do primeiro que devemos entender nosso desempenho
Tabela 0.1
A base real das leis casuais é dada pelos mecanismos geradores da natureza. Tais mecanismos são
nada mais que o modo das coisas agirem, e as leis causais devem ser analisadas como suas tendências.
Tendências podem ser consideradas poderes ou responsabilidades de uma coisa, que podem ser
exercidos sem serem evidentes em qualquer resultado em particular. O tipo de condicional que nos
importa aqui, pode ser caracterizada como ´Nórmica´. Não existem declarações contra-transfactuais e
sim transfactuais. Nórmica universais, propriamente entendidos são declarações transfactuais, ou
declarações nórmica com casos factuais em laboratório (e talvez outros contextos fechados), que
constituem sua base empírica; eles não precisam, e em geral não serão , refletidos num padrão
invariante ou seqüência de eventos com regularidade recorrente.
O ponto fraco do conceito Humeano de leis é que ele amarra leis a sistemas fechados, ou seja,
sistemas onde conjunções constantes de eventos ocorrem. A conseqüência disso é que nem o
estabelecimento experimental nem a pratica de nosso conhecimento pode ser feito em sistema aberto.
Uma vez que permitimos sistemas abertos , então as leis só podem ser universais se interpretadas de
forma não empíricas (transfactual) ou seja, designando a atividade de mecanismos geradores e
estruturas independentemente de qualquer seqüência ou padrão de eventos. Mas, uma vez que fazemos
isto, existe uma base ontológica para um conceito de necessidade natural, ou seja, necessidade na
natureza independente de ação humana.
Em ciência existe um tipo de dialética na qual uma regularidade é identificada, uma explicação
plausível para ela é inventada e a realidade das entidades e processos postulados na explicação são
depois verificados. Esta dialética é ilustrada no Diagrama 0.1 abaixo. Se uma tradição empirista
clássica para no primeiro estágio, uma rival Neo-Kantiana ou idealista transcendental (discerníveis na
historia da filosofia da ciência) param no segundo. Se e somente se o terceiro estágio for alcançado e
desenvolvido da maneira indicada acima, pode haver uma rationale adequada para o uso de leis a fim
de explicar fenômenos em sistemas abertos, onde nenhuma conjunção constante de eventos prevaleça.
é a impensável pressuposição de sistemas fechados juntos com a incapacidade de analisar atividade
experimental (a qual pressupõe sistemas abertos) que se mostra como o maior ponto fraco da filosofia
da ciência ortodoxa: ou seja, a não existência na ciência das leis casuais Humeanas, ou seja, de
generalizações empíricas universais, e conseqüentemente a inadequação do critério de explicação,
confirmação (ou falsificação), racionalidade cientifica etc., que são baseadas na hipótese que o
UMA TEORIA REALISTA DA CIÊNCIA
Tradução: Rodrigo Leitão (Economia/UFF). Revisão/Supervisão: Mário Duayer (UFF)
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mecanismos construção
geradores do modelo
em modelos .
Qualquer filosofia da ciência adequada deve encontrar uma maneira de se ater a esse paradoxo
central da ciência: que homens em sua atividade social produzem conhecimento, que é um produto
social como qualquer outro, e não é mais independente dos homens que os produzem do que motores,
poltronas ou livros, que tem seus próprios artesãos, técnicos, publicistas, padrões e perícias e que não é
menos sujeito a mudança do que qualquer outro artigo. Este é um lado do ‘conhecimento’. O outro lado
de conhecimento é ‘sobre’ coisas que não foram produzidas pelo homem como: a gravidade especifica
do mercúrio, ou processo de eletrólise, ou o mecanismo de propagação da luz. Nenhum desses ‘objetos
de conhecimento’ dependem de atividade humana. Se o homem deixasse de existir, o som continuaria
a viajar e os corpos continuariam a cair da mesma maneira, embora ex hipotesi não haveria ninguém
para saber isso. Vamos chamar isso de objetos intransitivos de conhecimento. Os objetos transitivos de
conhecimento são as causas materiais Aristotélicas. Elas são a matéria prima da ciência ⎯ os objetos
artificiais moldados nos itens de conhecimento pela ciência vigente. Eles incluem fatos e teorias
estabelecidos anteriormente, paradigmas e modelos, métodos e técnicas de inquérito disponíveis para
um cientista. A causa material da teoria da seleção natural de Darwin consiste nos ingredientes dos
quais ele formulou sua teoria. Entre eles haviam os fatos da variedade natural, a teoria de seleção
domestica e a teoria de população de Malthus. Darwin trabalhou com esses ingredientes e gerou o
conhecimento de um processo, lento e complexo demais para ser visualizado, e que estava em curso a
milhões de anos antes de ser descoberto. Mas ele não poderia ter produzido o processo que descreveu,
o objeto intransitivo de conhecimento que ele produziu: o mecanismo de seleção natural.
Nós podemos facilmente imaginar um mundo semelhante ao nosso, contendo os mesmos objetos
intransitivos de conhecimento científico, mas sem qualquer ciência que produza conhecimento sobre
eles. Em tal mundo, que já existiu e que pode existir novamente, a realidade não seria discutida e
mesmo assim as coisas não deixariam de agir e interagir de todas as formas. Em tal mundo as leis
casuais que a ciência tem agora presumivelmente ainda prevaleceriam, e todo tipo de coisa que a
ciência identificou ainda existe. As marés ainda mudariam, e os metais ainda conduziriam eletricidade
da mesma forma que conduzem agora, sem necessitar de Newton ou Drude para produzir
conhecimento sobre eles. A lei de Wiedemann-Franz ainda funcionaria, ainda que não houvesse
ninguém para fórmula-la, estabelece-la experimentalmente ou deduzi-la. Dois átomos de hidrogênio
UMA TEORIA REALISTA DA CIÊNCIA
Tradução: Rodrigo Leitão (Economia/UFF). Revisão/Supervisão: Mário Duayer (UFF)
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Vistas historicamente, três posições na filosofia da ciência devem ser distintas. De acordo com a
primeira, do empirismo clássico, representada por Hume e seus herdeiros, o definitivo objeto do
conhecimento são os eventos atomísticos. Tais eventos constituem fatos dados e suas conjunções
consomem o conteúdo objetivo de nossa idéia de necessidade natural. Conhecimento e o mundo devem
ser vistos como superfícies cujos pontos têm correspondências isomórficas ou, no caso do
fenomenalismo, efetivamente fundidos. Nesta concepção, ciência é concebida como um tipo de
resposta automática ou comportamental a estímulos de fatos dados e suas conjunções. Mesmo se, como
no empirismo lógico, tal comportamentismo é rejeitado como uma avaliação da criação de um
conhecimento científico. Seu conteúdo válido pode ainda em princípio ser reduzido a tais fatos e suas
conjunções. Assim ciência se torna um tipo de epifenômeno da natureza.
A segunda posição recebida é a formulação clássica porem estática no idealismo transcendental de
Kant, mas é susceptível a variações de atualização e dinamização. De acordo com isso, os objetos do
conhecimento científico são modelos, ideais de ordem natural etc. Tais objetos são construtos artificiais
e embora eles possam ser independentes de homens em particular, não são independentes de homens ou
da ação humana em geral. Nesta concepção, uma conjunção constante de eventos é insuficiente,
embora ainda necessária, para a atribuição de uma necessidade natural. Conhecimento é visto como a
estrutura ao invés da superfície. Mas o mundo natural se torna um construto da mente humana ou, em
suas versões mais modernas, da comunidade científica.
A terceira posição, a qual alcançamos aqui, pode ser caracterizada como realismo transcendental.
Ela diz respeito aos objetos do conhecimento como estruturas e mecanismos que geram um fenômeno;
e o conhecimento como produzido numa atividade social da ciência. Esses objetos não são nem um
fenômeno (empirismo) nem construtos humanos impostos pelo fenômeno (idealismo), mas estruturas
reais as quais resistem e operam independentemente do nosso conhecimento, nossa experiência e as
condições que nos permitem acesso a elas. Contra o empirismo, os objetos do conhecimento são
estruturas e não eventos; contra o idealismo, eles são intransitivos. Com esta concepção, uma
conjunção constante de eventos é não mais necessária do que é uma condição suficiente para a
suposição da operação de uma lei causal. De acordo com esta visão, ambos o conhecimento e o mundo
são estruturados, ambos são diferenciados e mutantes; o ultimo existe independentemente do primeiro
(embora não o nosso conhecimento deste fato); e experiências e os objetos e as leis casuais para os
A . Análise da Percepção
Esta análise de episódios experimentais nos permite isolar uma serie erros metafísicos,
epistemológicos e metodológicos dentro da tradição de realismo empírico. Por se a inteligibilidade da
No §3 o autor argumenta que somente se leis causais não forem os padrões de eventos que nos
permitem identifica-las pode a inteligibilidade da atividade experimental ser sustentada. Mas leis
causais são, ou aparentaram ser aos filósofos, entidades misteriosas. O que pode significar dizer que
elas têm uma base real independente dos eventos? A resposta para essa questão só será vista para
necessitar o desenvolvimento de uma ontologia não-antropocêntrica de estruturas, mecanismos
geradores e objetos ativos.
O status ontológico poderá ser mais bem alcançado considerando as respostas divergentes do
realismo transcendental e do idealismo para o problema de distinguir uma seqüência de eventos
necessária de uma puramente acidental. Ambos podem concordar, nas suas visões modernas que sem
alguma concepção de um mecanismo gerador funcionando nenhuma atribuição de necessidade é
justificada. Para o idealismo transcendental, porém, esta necessidade é imposta pelo homem ao padrão
de eventos; os mecanismos geradores são uma parte irredutível da imaginação. Para o realismo
transcendental, por outro lado, os mecanismos geradores devem vir a ser estabelecidos como reais no
curso da atividade da ciência. Realmente ele vai argumentar que somente se perguntas existenciais
possam ser levantadas sobre os objetos de teoria cientifica que a racionalidade da teoria da construção
pode ser sustentada. Pois sem eles continuaria, como no empirismo, um processo puramente interno —
com a familiaridade da imagem substituindo o reforço da sensação, ainda faltando uma dinâmica
racional de mudança.
Agora, uma vez que é sabido que mecanismos e estruturas podem ser chamados de reais, podemos
prover uma interpretação da independência das leis causais do padrão de eventos, e uma previsão da
rationale da atividade experimental. Pois a base real dessa independência está na independência dos
mecanismos geradores da natureza e os eventos que eles geram. Tais mecanismos resistem mesmo
quando não estão em ação; e agem de maneira normal mesmo quando as conseqüências das suas
declarações de lei que elas baseiam, devendo à operação de mecanismos de intervenção ou casos
contra-valentes, não se realizam. É o papel do cientista experimental excluir tais intervenções, que são
usuais; e disparar o mecanismo para que esteja ativo. A atividade do mecanismo pode então ser
estudada sem interferência. E é esse padrão característico de atividade ou modo de operação que é
descrito da declaração de uma lei causal. É somente sob condições fechadas que haverá uma relação de
um para um entre a lei causal e eles resistem a seqüência de eventos. E é normalmente só no
laboratório que esses resistentes mecanismos da natureza, cujas operações são descritas na declaração
de leis causais, se tornam efetivamente claros e empiricamente acessíveis ao homem. Mas porque eles
resistem e continuam a agir, quando estimulados, em sua forma normal fora dessas condições, seu uso
explica fenômenos e resistências a pseudofalsificações podem ser racionalmente justificadas em
sistemas abertos.
Somente se leis causais persistirem através do fluxo de condições, o que significa que devam ser
irredutíveis a, pode a idéia de universalidade de uma lei conhecida se sustentar. E somente se eles
tiverem uma realidade distinta daquela dos eventos pode a suposição de uma necessidade natural ser
justificada. Por essa visão, leis não são declarações empíricas, mas declarações sobre as formas de
atividade características dos objetos do mundo. E é necessária uma conexão natural, não uma conexão
de uma regra humana. Existe uma distinção entre estruturas reais e mecanismos do mundo e padrões
efetivos de eventos que elas geram. E essa distinção por sua vez justifica a maior familiaridade entre
O autor argumentou que as estruturas causais e mecanismos geradores da natureza devem existir e
agir independentemente das condições que permitem o acesso do homem a eles, de forma que eles
devem ser supostamente estruturados e intransitivos, ou seja, relativamente independentes do padrão de
eventos e também da ação do homem. Similarmente o autor argumentou que eventos devem ocorrer
independentemente das experiências as quais estão ligados. Estruturas e mecanismos são então reais e
distintos dos padrões de eventos que ele gera; assim como eventos são reais e distintos das experiências
as quais estão ligados. Mecanismos, eventos e experiências, portanto constituem três domínios
sobrepostos da realidade, como os domínios do real, do efetivo e do empírico. Isso é representado na
Tabela 1.1 abaixo. O ápice da objeção do autor à doutrina do
Tabela 1.1
realismo empírico deve estar claro agora. Por constituir uma ontologia baseada na categoria de
experiência, como expressa no conceito de mundo empírico e mediada pelas idéias de efetividade das
leis causais e da onipresença das conjunções constantes, três domínios da realidade se colapsam em um
só. Isso evita que seja levantada a questão das condições sob as quais experiência é de fato significativa
para a ciência; e os modos pelos quais estes três níveis entram em harmonia ou sincronia um com o
outro, de serem descritos.
Agora esses três níveis de realidade não estão naturalmente ou normalmente sincronizados. É a
atividade social da ciência que os sincroniza. Experiências, e os fatos que elas baseiam, são produtos
sociais; e as conjunções de eventos, que quando ligados a uma experiência, provêem a base empírica
para leis causais são como nós vimos produtos sociais também. Assim podemos, portanto, ver que uma
sociologia implícita é necessária e implícita para a ontologia implícita do realismo empírico na qual
fatos e suas conjunções são vistos como dados pela natureza ou espontaneamente (voluntariamente)
produzidos pelo homem. Neste capítulo, o autor delineou uma resposta para a questão ‘como deve ser o
mundo para que a ciência seja possível?’. No Capítulo 3 o autor vai perguntar ‘como deve ser a
sociedade para que a ciência seja possível?’; Ele vai tentar fazer uma dedução transcendental de certas
categorias sociológicas básicas de uma investigação das condições para a possibilidade de haver a
ciência. As respostas para estas duas questões vão constituir os entrelaçados temas deste trabalho. É
impossível superenfatizar o quão próximo elas estão conectadas. Pois uma vez que rejeitamos a
doutrina que diz que em todo lugar na natureza tais coisas como casos paralelos de ocorrência
espontânea e ver que ao invés disto eles devem ser assiduamente trabalhados e artificialmente