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Um Método de Transcrições e Análise de Vídeos A Evolução de Uma Estratégia PDF
Um Método de Transcrições e Análise de Vídeos A Evolução de Uma Estratégia PDF
DE UMA ESTRATÉGIA
Resumo
Este artigo apresenta um modelo para transcrição e análise de vídeos desenvolvido a partir
das transcrições de videogravações de um projeto de pesquisa com foco em modelagem
matemática. O objetivo é sugerir uma estratégia para transcrever vídeos que possibilite ao
pesquisador trabalhar os dados a partir dos eventos críticos. É discutida, também, a
importância dessa mídia para pesquisas na educação matemática e realizada uma breve
comparação entre transcrições e vídeos no que diz respeito aos dados da pesquisa. O
modelo aqui apresentado pode ser dividido em 6 fases: (i) assistir aos vídeos; (ii)
selecionar os eventos críticos; (iii) descrever os eventos críticos; (iv) transcrever os eventos
críticos; (v) Discutir os dados encontrados e (vi) limpar as transcrições. A conclusão é que
o modelo apresentado pode ajudar os pesquisadores a compreender de forma mais apurada
seus dados e economizar tempo na análise de vídeos. Além disso, é perceptível que tanto
os vídeos como as transcrições podem ser consideradas como dados da pesquisa.
INTRODUÇÃO
1
Pesquisa desenvolvida com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq, processo n. 473850/2011-7) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais
(FAPEMIG, processo n. PPM 00235/13).
Na próxima seção deste artigo, apresento uma revisão bibliográfica sobre
transcrição e análise de vídeos. Em seguida, discuto e analiso o processo de criação do
modelo de transcrição e, finalmente, apresento algumas considerações a respeito da
modelo construído.
O modelo que será apresentado na próxima seção é fruto de uma estratégia utilizada
para transcrever nove vídeos que foram gravados no decorrer de um projeto de pesquisa2
intitulado “Aprendizagem expansiva em projetos de modelagem orientados pela educação
matemática crítica3”. A estratégia utilizada não foi a mesma para todos os vídeos e este
trabalho se destaca justamente por apresentar o processo evolutivo da estratégia principal
de transcrição.
Para entendermos o modelo proposto e sua importância para a análise de vídeos
para pesquisas na educação matemática, precisamos discutir um pouco sobre a pesquisa
que foi desenvolvida enquanto os vídeos eram gravados.
Nessa pesquisa, 5 alunos e 3 pesquisadoras da Universidade Federal de Minas
Gerais tinham o propósito de desenvolver um projeto de modelagem matemática orientado
pela Educação Matemática Crítica (ARAÚJO, 2009).
Modelagem matemática é um termo que possui diversas concepções. Para Barbosa
(2004), modelagem “é um ambiente de aprendizagem no qual os alunos são convidados a
problematizar e investigar, por meio da matemática, situações com referência na realidade”
(p. 4).
Araújo (2002) diz que modelagem é
uma abordagem, por meio da matemática, de um problema não-
matemático da realidade, ou de uma situação não-matemática da
realidade, escolhida pelos alunos reunidos em grupos, de tal forma que
as questões da Educação Matemática Crítica embasem o
desenvolvimento do trabalho. (p. 39).
Apesar de não haver uma definição ou concepção única, podemos entender
modelagem como o uso de ferramentas da matemática para solucionar um problema com
referência na realidade (GIBRAM, 2011).
O grupo de alunos e pesquisadoras em questão estava interessado em trabalhar com
o tema compra de imóveis e todo o trabalho foi desenvolvido a partir disso. O grupo se
reunia em encontros periódicos – um total de nove – sendo todos eles gravados com o
auxílio de uma filmadora.
O modelo de transcrição foi desenvolvido a partir das transcrições dos vídeos
filmados nesses encontros. Como já apontado, esse modelo passou por uma evolução
durante o processo de transcrição dos vídeos. Inicialmente, um dos vídeos foi transcrito
inteiramente, o que possibilitou uma análise mais geral a respeito do método utilizado.
Em um primeiro momento, apresento a primeira estratégia utilizada para as
transcrições, que foram dados para a pesquisa dos autores Araújo e Lima (2015). Logo
depois, apresento a evolução do método, com as transcrições utilizadas por Araújo,
Campos e Torisu (2015) em outra pesquisa.
2
A partir desse momento, chamarei o projeto de pesquisa de PP, para evitar repetições desnecessárias.
3
Esse projeto de pesquisa foi coordenado pela professora Jussara Araújo, da Universidade Federal de Minas
Gerais.
Os dados dessa pesquisa são as transcrições dos vídeos do PP e os e-mails trocados
entre o autor desse artigo e seu grupo de orientação.
Na próxima seção, além de apresentar o modelo de transcrição, analiso cada detalhe
do modelo fazendo um paralelo com sua utilidade no que diz respeito ao PP e a
compreensão do pensamento matemático dos sujeitos de pesquisa.
Como aluno de iniciação científica4, uma das minhas tarefas era transcrever os
vídeos do PP. O processo para definição do melhor modelo de transcrição nem sempre é
fácil. É preciso analisar a situação, os objetivos da pesquisa, a qualidade das gravações,
entre outros fatores para só depois determinar a melhor maneira de transcrever os vídeos.
Muitos pesquisadores se apoiam em outras pesquisas para definir o melhor método
de transcrição. Para o PP em questão, preferi buscar um modelo próprio, que pudesse
suprir as necessidades da pesquisa.
Com a pouca falta de experiência em trabalhos que envolvessem transcrição,
decidi, inicialmente, transcrever um dos vídeos por completo, na tentativa de entender
como esse processo funciona.
Durante todo o processo de transcrição contei com o auxílio de um grupo de
orientação composto pela minha orientadora, professora Jussara Araújo, e por seus alunos
de mestrado e doutorado.
A iniciativa de transcrever um vídeo por completo se mostrou eficiente nos
primeiros dias: todas as falas estavam transcritas e, caso precisássemos de qualquer dado
para a pesquisa5, era só consultar a transcrição e lá estavam as falas. Porém, ao mesmo
tempo que era eficiente, era cansativa e maçante. Tal percepção fica clara no trecho de um
e-mail enviado por mim para o grupo de orientação.
Pois bem, a pedido da Jussara [minha orientadora], envio pra vocês um
BREVE relato sobre as transcrições. Bem, eu ainda não transcrevi muita
coisa, porque os vídeos são muito extensos, mas já deu pra sentir e
observar alguns detalhes. O primeiro deles é que, apesar de ser um
trabalho legal [...], é bem trabalhoso e demanda BASTANTE tempo. Eu
estou gastando, em média, 30 minutos para transcrever por volta de 5
minutos de vídeo. Não sei se esse tempo é bom ou ruim, mas espero que
com o tempo eu possa reduzi-lo. (E-mail enviado ao grupo de orientação
por Fernando Lima6 em 22/09/14).
Nota-se que o trabalho de transcrever vídeos, apesar de simples, parece não ser tão
rápido. Naquele momento, eu gastava muito tempo para transcrever poucas falas do vídeo
e a estratégia utilizada parecia não ser a melhor. Como o objetivo era encontrar uma
maneira mais eficiente de realizar as transcrições, continuar era necessário e interessante
para o sucesso da pesquisa.
O vídeo escolhido para a transcrição tinha exatos 01:59:13 de duração e levei um
mês inteiro para transcrevê-lo por completo, levando em consideração minhas atividades
diárias de aluno de graduação. A transcrição de todas as falas rendeu um arquivo com 56
páginas.
4
Aluno da Licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Minas Gerais, bolsista de iniciação
científica do CNPq, orientado por Jussara Araújo.
5
As transcrições desse vídeo foram utilizadas na pesquisa de Araújo e Lima (2015).
Como fim das transcrições do primeiro vídeo, iniciei o processo de seleção de
dados, junto com minha orientadora, para trabalharmos em nossa pesquisa. Começamos,
então, a procurar nas transcrições os eventos críticos para o artigo. Depois de separadas as
falas e escrito a artigo, o momento era de reflexão. Precisávamos analisar o método
escolhido para transcrição e definir nosso próximo passo na busca por um bom modelo.
A primeira análise feita foi com relação ao tempo gasto para transcrição. Chegamos
à conclusão que tal tempo é inviável, principalmente quando os vídeos precisam ser
transcritos com certa rapidez. Outra análise feita diz respeito à quantidade de falas
transcritas vs. falas utilizadas no artigo. Aproximadamente 10% das falas foram
importantes para entender o discurso dos sujeitos e só 3% do total foi de fato utilizado no
artigo.
Tais números impressionam, pois, aparentemente, muitas falas foram transcritas e
não foram necessárias de uma maneira ou de outra no trabalho final. Mas como fazer para
evitar transcrever falas que não são úteis para a pesquisa em desenvolvimento?
Foi a partir dessa pergunta que começamos a elaborar um novo modelo de
transcrição, baseando nossas escolhas nos problemas observados no primeiro método.
Precisávamos transcrever os dados dos vídeos restantes para outra pesquisa
(ARAÚJO; CAMPOS; TORISU, 2015). Incialmente, com o conhecimento adquirido a
partir da primeira experiência com a transcrição e com o auxílio do trabalho feito por
Powell, Francisco e Maher (2010), desenvolvemos um modelo de transcrição que pode ser
dividido nas seis fases descritas abaixo.
Essas fases não são tão deslocadas umas das outras. O que quero dizer com isso?
Às vezes, é difícil encontrar uma separação clara entre elas – a fase X termina aqui e a fase
Y começa ali, por exemplo. Acredito que algumas delas funcionem muito bem juntas e isso
será mostrado nas próximas seções desse artigo, onde descrevo, discuto e analiso com
cuidado cada uma delas e mostro como elas colaboraram para os objetivos finais da
pesquisa.
Como dito anteriormente, as fases nem sempre são deslocadas umas das outras. A
fase 2, por exemplo, está muito conectada com a anterior. Aqui, o(s) pesquisador(es)
deve(m) selecionar os eventos críticos. Para isso, deve-se assistir ao vídeo novamente com
um olhar clínico – diferente do empregado na fase 1 – na busca de momentos que podem
ser interessantes para a pesquisa em questão. A importância da fase anterior fica evidente
nesse momento. É bem mais interessante selecionar os dados depois de assistir aos vídeos
ao menos uma vez. Uma primeira observação contribui bastante para o olhar do
pesquisador na segunda observação dos vídeos.
Falando sobre a importância dessa fase, no momento de seleção dos eventos
críticos resultados não antes previstos podem surgir, o que é algo relevante para o
momento de análise dos dados.
Para contextualizar a situação, colocarei uma situação encontrada durante a seleção
dos eventos críticos para o PP. O interesse era desvendar a evolução do comportamento de
um dos sujeitos de pesquisa do PP. Inicialmente, pensávamos que esse sujeito apresentava
um comportamento mais linear, isto é, sua evolução era constante ao longo da pesquisa.
Basicamente, imaginávamos que esse sujeito começou de um jeito e terminou de outro,
mas o percurso foi linear, constante e previsível. Todavia, na seleção dos eventos críticos,
percebemos que o sujeito, mesmo tendo um comportamento previsível, não apresentava
uma evolução linear. Durante um mesmo vídeo, ele evoluía e retrocedia seu pensamento, o
que demonstrou uma diferença a respeito da teoria inicial. Para clarear, achávamos que o
sujeito se comportava como uma função linear de primeiro grau. A partir da fase 2,
descobrimos que seu comportamento era mais parecido com uma função seno.
Friso que tal percepção do comportamento do sujeito só foi possível na fase 2. Daí
sua importância para compreensão dos dados e dos pensamentos dos sujeitos.
Para seleção dos eventos críticos, utilizamos apenas os vídeos, papéis e canetas para
registrar tais momentos. A figura 1 mostra um exemplo de como fizemos a seleção dos
eventos críticos.
Figura 1: um exemplo de seleção dos eventos críticos.
Nessa fase, é preciso descrever o que acontece nos eventos críticos. Essa descrição
também acontece em duas partes. Na primeira, como pode ser observado na figura 1, o(s)
pesquisador(es) devem relatar em textos curtos o que acontece em tal situação. Essa
primeira parte auxilia na localização do pesquisador dentro do vídeo, pois os textos curtos
sinalizam a principal ideia do evento crítico.
Na segunda parte, é preciso que o(s) pesquisador(es) façam descrições mais
elaboradas dos eventos críticos. Isso exige que os vídeos, ou ao menos os eventos críticos
sejam assistidos mais uma vez, o que pode ser considerado um ponto forte do modelo aqui
proposto.
Sobre descrição dos eventos críticos, Powell, Fransciso e Maher (2004) destacam
que
devido à intensidade da mídia, o uso de dados de vídeo resulta
frequentemente numa enorme quantidade de informação. Para
propósitos analíticos, isso leva ao desafio de não apenas se familiarizar
com o conteúdo dos dados do videoteipe, mas também de conhecê-lo em
seus mínimos detalhes. (p. 102).
Assim que a transcrição dos dados estiver finalizada, podemos começar a fase 5 do
modelo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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