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Fábio Alves
Introdução
tradutores é o objeto de estudo deste artigo que toma o processo de tradução como
ponto de partida para tecer reflexões sobre a relação entre ritmos cognitivos na
meta-reflexão e experiência.
trabalhos, mantendo uma posição diferenciada, contudo, quanto ao perfil dos sujeitos,
dados. Por sua vez, Fraser (1993), Séguinot (1989) e Tirkkonnen-Condit (1989)
processo de tradução, destacam-se entre elas: (i) o tipo de texto utilizado; (ii) o perfil
dos tradutores -- experientes, novatos, bilíngües; (iii) aspectos estratégicos, tais como,
citados diferem em vários desses pontos e, portanto, seus resultados não são
um processo cuja natureza não linear revela altos níveis de complexidade cognitiva. A
processo de tradução.
por Schilperoord (1996) e utilizada por Jakobsen (2002) para mapear os distintos
3
quadro teórico tratará de definir a noção de ritmo cognitivo e seus respectivos padrões
revisão adicional.
artigo que níveis mais altos de meta-reflexão apontam para uma maior competência
de experiência, como definida por Ericsson (2002), surge como fator crucial para a
no âmbito de um estudo piloto para fins de um futuro trabalho com um maior número
Quadro Teórico
O estudo do processo de tradução tem uma história recente que vem ganhando
força no decorrer das duas últimas décadas. Esses trabalhos podem ser divididos em
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duas grandes fases: a primeira, cobrindo o período de 1986-1996, constitui uma fase
especificidades da tarefa de tradução (brief) e o público alvo. Para Fraser, não há uma
TAPs com e sem pressão de tempo, com e sem acesso a fontes de consulta, etc.
Arnt Jakobsen e Lasse Schou (1999), configura um novo marco metodológico para a
área e pode ser considerado como o precursor da segunda fase de estudos sobre o
de dados. Os trabalhos de Alves (2001, 2003), Alves & Gonçalves (2003), Alves &
Magalhães (2004), Hansen (1999, 2002, 2003), Jakobsen (1999, 2002, 2003), Lauffer
(2003), PACTE (2001, 2002, 2003), entre vários outros, revelam uma preocupação
com a triangulação de dados processuais como forma de controlar com mais rigor as
variáveis investigadas.
se esta constatação nos leva a rever algumas suposições sobre a utilização de TAPs
verbais. De fato, segundo Jakobsen (2003:93), o método mais óbvio para buscar
responder muitas perguntas ainda carentes de resposta é tentar construir hipóteses com
base tanto nos dados quantitativos de Translog quanto nos dados qualitativos dos
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de apoio externo registradas por meio de outras ferramentas, tais como o programa
programa Translog.
propõe ainda que um mesmo desenho experimental seja utilizado em grupos com
mesmo desenho experimental pode ser replicado com a mudança de uma de suas
alvo etc., é importante assegurar que cada uma delas faça parte de um novo desenho
que um mesmo estudo possa ser replicado em diferentes pares lingüísticos ou entre
Ritmo Cognitivo
com etapas de planificação, redação e revisão sobrepondo-se umas às outras sem que,
seguinte.
autores não explicam com base em que tipo de estímulo este monitor funcionaria.
Qual seria, indaga Schilperoord, a razão pela qual o monitor decide se deslocar de um
idéia de Schilperoord, baseada nos trabalhos de Van den Bergh & Rijlaarsdam (1996),
é que existe uma diferença significativa entre o momento em que uma recursão ocorre
e pausas são definidos como sendo o ritmo cognitivo dos escritores. A proposta de
análise de pausas, qual seja, a análise de tempo de pausa, a freqüência dessas pausas e
sua localização. Grosso modo, a análise de pausas pretende fazer com que essas
pausas ‘falem’ e, por analogia, fazer com que sejam protocolos correlatos àqueles
produção textual.
ecológica, ou seja, deve procurar garantir que a produção textual seja feita em
ambiente natural, excluindo-se fatores que possam coibir a naturalidade da tarefa sob
idiossincrática e quais outros poderiam ser considerados como padrões mais gerais
Com base nas reflexões acima, este artigo adota como definição para ritmo
tempo total de produção textual. Essa alternância rítmica não tem apenas um caráter
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mas incorpora também uma dimensão qualitativa na separação relativa entre o tempo
sua localização em três fases distintas do processo de tradução, quais sejam, as fases
tradução a mesma natureza recursiva observada por Flower e Hayes. Mais ainda, com
é possível procurar fazer com que as pausas ‘falem’ durante o processo de tradução.
formas diferentes. Para melhor observar essas possíveis diferenças, Jakobsen propõe
revisão.
texto de partida caso esse não seja completamente visível na tela do computador.
10
Jakobsen menciona que esta definição de orientação está sujeita a controvérsias, haja
vista o fato de que, mesmo após a digitação da primeira letra do texto de chegada, o
aceitável, esta crítica não invalida a definição da fase de orientação com término após
de escrita sugerida por Flower e Hayes, ocorre nesse movimento uma mudança de
nível e, portanto, tem início uma nova fase do processo. Dentro da recursividade
orientação, mas o fará sem dúvida a partir de uma fase hierarquicamente definida.
quando o sujeito tradutor digita o ponto final do texto de chegada que corresponde ao
ponto final do texto de partida. Jakobsen (2002) aponta que esse momento é
facilmente identificado pelo programa Translog, pois logo a seguir o sujeito tradutor
traduzido numa tentativa de obter uma visão global do trabalho realizado. Nesta fase,
mais ou menos longas podem indicar a necessidade de apoio externo por parte do
tradutor, qual seja, a utilização de fontes de consulta tais como dicionários, internet
etc. Outras vezes essas pausas podem indicar a necessidade de apoio interno, ou seja,
revisões em andamento fariam parte do fluxo de produção textual e, como tal, são
identificar com clareza os padrões de pausa entre sujeitos com diferentes níveis de
privilegiam a redação de uma primeira versão ‘rápida e suja’ 3 que será completamente
revista uma vez concluída uma primeira versão. Haverá outros tradutores, experientes
e novatos, que envidarão esforços para solucionar um problema de tradução uma vez
que se deparem com ele. Contudo, Jakobsen sugere que é possível identificar ritmos
tipos de estratégias. Jakobsen sugere ainda que, no caso dos tradutores experientes,
uma vez que uma solução tenha sido encontrada e que o censor interno do tradutor
permita que essa seja digitada, ela terá maior probabilidade de se manter no texto de
chegada que aquelas soluções mais voláteis e temporárias produzidas por estudantes
menciona que os textos produzidos por tradutores experientes seriam mais duráveis 4 .
Essa noção de ‘texto durável’ será retomada e expandida na respectiva seção abaixo,
através da noção de durabilidade textual. Por ora, cabe destacar que essa diferença é
término com a digitação, pela primeira vez, do ponto final do texto de chegada, ritmos
aponta para o fato que a produção textual é mais lenta nesta terceira fase, uma vez que
Esta fase geralmente também inclui consultas ao texto de partida como forma de aferir
soluções incipientes podem ser ratificadas e soluções ainda pendentes podem ser
encontradas.
redação. Tanto a velocidade de produção textual como seu fluxo são afetados pelo
novatos para desempenhar tal atividade. Para Lorenzo, esta incapacidade parece estar
ligada à falta de estratégias adequadas tanto para detectar e julgar erros como para
corrigi- los, fato que faz com que a maior parte do esforço dedicado à revisão resulte
Acredito ser possível perceber nas três fases de orientação, redação e revisão
e Pagano (2003) enfatizam que quanto mais experiente o tradutor, maior sua
processo tradutório por parte deles implicaria em níveis mais altos de meta-reflexão
Durabilidade textual
A partir da observação feita por Jakobsen (2002) sobre o grau de durabilidade de uma
sua produção textual. Esta durabilidade não está relacionada ao fato de que uma
decisão, uma vez tomada, não seja mais revista. Königs (1987) e Alves (1995), ao
término da fase de redação. Mesmo que venha a ser radicalmente modificado durante
a fase de revisão, o texto traduzido ao final da fase de redação terá uma estrutura
adequada. Nesse sentido, dentro da hipótese de trabalho deste artigo, espera-se que
textual seja definida como a propriedade do texto produzido por um sujeito tradutor
redação. Esta observação me parece importante haja vista o fato de que os resultados
de Lorenzo (2003) indicam que a falta de capacidade de revisão textual leva, muitas
vezes, tradutores novatos a piorar suas traduções durante a fase de revisão. No âmbito
Pressupõe-se também que essa durabilidade possa ser aferida através de relatos
Meta-reflexão
apontam para o fato de que tradutores experientes parecem monitorar de forma mais
pressuposto, portanto, de que pode haver uma correlação significativa entre os graus
ser acelerada para tornar mais rápido o processo que pode ser interrompido através da
assim, em consonância com as evidências obtidas por Jakobsen (2003), que não
tradução de modo que os sujeitos ainda tenham ativadas memórias recentes sobre
processamento que são desenvolvidas a partir de níveis mais simples, indicando uma
definido por Gonçalves (neste volume) como competência tradutória específica, qual
tradução. No meu entender, para fins dos objetivos deste artigo, as propostas de
deliberada, é passível de ser adquirida, não sendo vista como talento ou habilidade
indivíduo através de esforço e anos de prática, pode ser mapeado e comparado com o
encontrar evidências que consubstanciem esta afirmação pode ser obtida através do
dados sobre a durabilidade de seus textos antes e depois da fase de revisão e pela
Desenho Experimental
O texto de partida
intitulado “Bugbear-virus: Aus Teddy wird Grizzly” (cf. Anexo 1). Trata-se de texto
jornalístico breve e foi escolhido por se tratar de um texto que poderia ser classificado
em espanhol, inglês e português foram encontradas nesta mesma data e farão parte de
função das representações escolhidas para construir a notícia: o vírus como doença, o
vírus como animal selvagem, o vírus como elemento bélico (ataque e inimigo) e o
vírus como sofisticação tecnológica, cada uma encenada por uma rede coesiva apesar
pessoas. Aos sujeitos tradutores foi solicitada sua tradução ao português para
informada. Os informantes receberam essas instruções impressas e não lhes foi dado
ocasião em que os textos foram traduzidos, o Bugbear.B ainda era um perigo iminente
e a tradução do texto podia ser associada à execução de uma tarefa real de tradução
Os sujeitos tradutores
Três sujeitos tradutores foram utilizados como informantes para a coleta de dados no
âmbito do estudo piloto discutido neste artigo. Seus diferentes perfis tradutórios
experiência com tradução. T2 já teve algumas de suas traduções publicadas, mas não
tem atualmente uma prática constante no exercício dessa atividade. Apresenta, assim,
traduções publicadas por editoras de prestígio no país. Foi escolhido como exemplo
separado.
postular duas hipóteses de trabalho para fins da análise de dados no âmbito deste
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artigo. A primeira hipótese postula que quanto mais alto for o nível de meta-reflexão e
a experiência em tradução, maior será a durabilidade textual nos textos produzidos por
artigo postula que a redação e a revisão são fases distintas com processos bastante
tradutores.
Metodologia de análise
Para fins de se identificar uma correlação entre ritmos cognitivos, durabilidade textual
o tempo total de cada um dos três textos de chegada foi subdividido para calcular o
uma vez identificado o tempo de cada uma das fases, foram separados os textos de
chegada obtidos ao final da fase de redação para cada um dos três tradutores. A
tradução. Desta forma, para cada um dos três sujeitos, obteve-se dois textos de
durabilidade dos textos obtidos ao término da fase de redação é verificada através dos
revisão. A fim de quantificar o volume de revisão efetuado por cada um dos sujeitos,
de revisão (cf. Anexo 4). Todos os símbolos com informações processuais foram
suprimidos e apenas os caracteres na cor azul foram mantidos. Desta maneira foi
cada um dos sujeitos durante a fase de revisão. É importante destacar que a noção de
digitados durante a fase de revisão pode apontar para mudanças significativas nos
os textos produzidos ao final das fases de redação e revisão. Finalmente, seis trechos
sétimo período, e o oitavo período. As seis unidades juntas somam 92 palavras, com
Constituem uma rede coesiva que veicula informações relevantes do texto de partida
tarefa de tradução. Esta redução textual faz-se necessária para permitir uma
que limitações de espaço impõem restrições para uma análise de toda a produção
textual dos três sujeitos. Para fins de informação complementar encontram-se listados,
no Anexo 3, para cada um dos tradutores, os textos completos obtidos após a fase de
Análise e Discussão
para identificar o tempo total de produção textual em cada um dos três textos de
chegada e, a seguir, esse tempo total foi subdividido para calcular o tempo de duração
textual de 01:36:52 10 . Dividido entre as três fases, os dados indicam que os primeiros
03:18 foram dedicados à fase de orientação, ou seja, 3.41% do tempo total. 48:22
46.66% do tempo total de produção textual. Dentro do tempo total dedicado à revisão,
T1 gastou os primeiros 04:20, ou seja quase 10% do tempo de revisão, com a leitura e
produção textual de 34:20. Dividido entre as três fases, os dados apontam que apenas
00:23 foram dedicados à fase de orientação, ou seja, 1.12% do tempo total. A seguir,
23:32 foram dedicados à fase de redação, o que significa 68.54% do tempo total de
30.34% do tempo total de produção textual. Desses 10:25, 05:15 foram gastos com a
leitura do texto produzido na fase de redação. Isto significa que 50% do tempo
alocado por T2 à fase de revisão foi gasto com a leitura e o monitoramento do texto
produzido ao final da fase de redação antes que fosse feita qualquer modificação no
texto. Este fato será relevante quando da discussão da durabilidade dos textos
produzidos por T2 ao final das fases de redação e revisão e de sua comparação com os
textual de 01:05:53. Dividindo esse tempo total entre as três fases, os dados indicam
que 17:35 foram dedicados à fase de orientação, ou seja, 26.69% do tempo total.
30:34 foram dedicados à fase de redação, o que significa 46.39% do tempo total de
desta fase. Isto pode ser indicador de que havia um alto grau de monitoramento do
uma fase à outra de forma rápida e efetiva. As implicações deste tipo de ritmo
Em linhas gerais, percebe-se que cada um dos três sujeitos privilegia um tipo
distinto de processo e distribui de forma diferente suas três fases. T1 dedica pouco
T2, por sua vez, também dedica pouco tempo à fase de orientação, mas, diferente de
T1, investe na fase de redação mais do dobro do tempo que aquele dedicado à fase de
dedicado à redação e revisão. Por outro lado, T3 mostra um padrão mais equilibrado
No que diz respeito ao tempo total, a variação foi grande entre os sujeitos
tradução, ou seja, um pouco mais de tempo que T3 com 01:05:53. T2, por sua vez,
representações Translog dos três sujeitos. T1 encerrou a tradução com 01:36:52 por
estar muito cansada e não se sentir mais em condições de envidar esforços à tarefa.
chegada produzido por T1 ao final da fase de redação, assim como aquele produzido
ao final da fase de revisão, apresenta problemas sem solução e revela sinais de ser um
princípio, que o texto produzido por T2 teria um alto grau de durabilidade. Contudo,
esforços de forma equilibrada entre as três fases e obteve ao final da fase de redação
[1] Bugbear-virus. Aus Teddy wird Grizzly. [2] Der BugBear-Wurm aus dem letzten Jahr hat einen
Wiedergänger: Version B ist hoch aggressiv, schnüffelt nach Kredtikartennummern und öffnet
Hintertüren. Gefährdet sind vornehmlich Privatrechner. [3] wurde W32.Bugbear.B@mm heute von den
Symantec-Virenschutzexperten in die Kategorie 4 von 5 Gefahrenstufen eingestuft. [4] Schon die erste
Version war nicht von schlechten Eltern - immerhin das zweiterfolgreichste Virus des letzten Jahres -
aber gegen Version B noch nahezu ein Teddy. [5] Das Virus leitet also eine ganze Abfolge von
Schadensroutinen ein, bis hin zum Keylogging: [6] Alle Virenschutzunternehmen raten deshalb
dringend zu Updates des Virenschutzes.
que algo novo possa ser acrescentado”11 . Klaudy e Károly (2000:143) apontam para a
informações sobre o significado global de textos com base em eleme ntos lingüísticos
que, através da repetição do item lexical do vírus Bugbear, as seis unidades de análise
protocolos verbais já que, reitero, limitações de espaço impõem restrições para uma
redação. O texto abaixo foi produzido por T1, o sujeito tradutor com pouca
Como se viu acima, o início do processo de produção de T1 é marcado por uma fase
de orientação com duração de 03:18, ou seja, 3.41% do tempo total. O pouco esforço
Eu não li realmente o texto não. Dei uma lida para entender o que era e comecei a
traduzir. (T1)
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Parece-me que essa falta de orientação pode ser responsável por alguns dos problemas
tradução são marcadas com interrogação, sucessor (??), parênteses, fareja (rastreia),
ou, então, por parênteses com entradas lexicais em alemão, (Hintertueren). T1 traduz
literalmente e de forma continuada os diversos itens lexicais que lhe vão surgindo à
Hum, e a princípio eu fui traduzindo, assim coisa que eu tinha dúvida, que eu não tinha
certeza como queria que ficasse... que eu tinha mais de uma opção, eu ia escrevendo tudo
pra depois eu voltar nisso. (T1)
No caso de T1, não se trata de produzir um rascunho, uma versão “suja” (dirty
processo linear de T1 parece ser motivado por uma excessiva preocupação com a
tradução de itens lexicais em detrimento de questões macro textuais, tais como, a falta
língua de chegada, como quando não consegue decidir entre “rastrear” e “farejar”.
parece não ter tido problemas de processamento sintático. As dificuldades parecem ter
31
Acho que é exatamente porque eu fui traduzindo assim, não olhei assim a frase ou o texto
assim como um todo porque eu também entendo pouco dessas coisas de computador, de
vírus, então pelos termos usados eu não sabia direito a que se referia. (T1)
que diz respeito à segunda unidade de análise, T1 relata ter tido problemas com
unidade de análise, talvez aquela sintaticamente mais complexa, parece não ter
unidade de análise faz referência explícita ao título através da menção que a versão
na tradução feita por T2. Por outro lado, a quinta unidade de análise apresenta um
Meu problema maior foi “vai até o keylogging”. O que que é keylogging? E depois tá
explicado o que é isso. Eu podia logo deixar o termo em inglês e traduzir a explicação,
mas eu não tava conectando as coisas. Não sei se foi um pouco de afobação assim. (T1)
nas fases de redação e revisão revela uma produção textual muito menos consistente e
muito mais errática em termos processuais (cf. representação Translog para T1 nos
de tradução para T3 que, contudo, utilizou uma estratégia diferente para solucioná-lo.
deliberada.
contra-atacar o vírus. Percebe-se nessas seis unidades de análise, bem como em todo o
texto produzido ao final da fase de redação, que, se por um lado T1 teve poucos
problemas na compreensão de orações, por outro lado foi grande sua dificuldade para
reconstruir em português a rede coesiva do texto alemão. Também parece não ter
“grizzly” e, talvez, também não tenha claro o que o vírus efetivamente faz. T1 tem
licenciatura em língua alemã e cursou várias disciplinas sobre tradução. Seu processo
de tradução, assim como sua produção textual, revela que T1 tem a sub-competência
estratégica sobre tradução. Seu relato retrospectivo abaixo confirma esta suposição.
Um problema que eu tenho é que muitas vezes eu entendo, mas eu não consigo pensar
numa palavra em português. Às vezes eu uso o dicionário não é porque eu não entendi a
palavra, mas é porque eu quero achar uma palavra em português que fique legal. (T1)
(brief) encaminhadas junto com a tarefa de tradução, ou seja, não verbaliza uma
como competência tradutória. Em outras palavras, teria aquilo que Hurtado (neste
Por sua vez, o texto produzido por T2 ao final da fase de redação revela traços
tem um caráter distinto daquele alcançado por T1. O texto é coeso e não apresenta
alternativas múltiplas. Pode ser lido sem interrupções e parece veicular com exatidão
quase sem pausas, com a digitação contínua da tradução, fato surpreendente dado o
VIRUÕÕÕÍRUSwBUGBEAR.BÃÃTeddywvirawGrizzly ïComowowðÃì[ResizeST]¬OwwormwBugBear,wsurgid
ownowanowapÕÕpassado,wtemwagorawumwsucessor.wawÕÕAwversãowBwéwmais[Ctrlß]aindawðwagressiva,wf
uçawumÕÕatráswdewnúmeros wdewcartãowdewcréditowewabrewaswportas wdoswfundos.w¬¬Oswcomputadoreswpe
ssoais wsãow¬oswquewestãowemwmaiorwruiÕÕisco.w¬¬¬¬"Porwcausawdawvelocidadew¬dew[Ctrlß]extremame
ntewrápidawðdispersão",wdizwow¬[sitewda]wSimantexÕc,wespecializadawemwantivírus,w"¬¬owanÕÕÕÕawva
cinaw¬[Copy]¬¬¬¬W32.BugBear.B@mm¬[8]oðwfoiwreclassif icadowprÕeloswespecialistas wdawSymantec,wpas
sandowdawcategoriaw4wparawaw5
35
De fato, T2 não faz nenhuma alusão à fase de orientação em seu relato retrospectivo.
Informa apenas a estratégia que privilegiou inicialmente para lidar com os problemas
Eu optei por fazer uma tradução... uma dirty version [versão suja ou rascunho], porque é
um texto pequeno. Então dá para ver depois. (T2)
tradutor. Os seis segmentos utilizados para análise revelam um texto com grau de
um sucessor”, “fuça atrás de números”, “abre as portas dos fundos”, para que o ataque
grau de durabilidade do texto produzido por T2. O texto -- se lido sem as interrupções
indicadas pelas unidades de análise marcadas por [...] -- é fluente, coeso e coerente.
sem que houvesse uma preocupação em adequar o título ao público alvo em português
“grizzly” em relação a ursos (ou aqui, por analogia, ao vírus), nem das possíveis
destacar que esses termos em inglês são conhecidos e utilizados por falantes de língua
menção à necessidade de retrabalhar esta parte em seu relato retrospectivo sem que,
Eu deixei assim para ver depois. E tem um outro que seria interessante, mas esqueci de
colar. Ah, sim, tinha uma outra solução que busquei na internet, mas esqueci de colar.
(T2)
ter mais familiaridade com o jargão terminológico utilizado pela área de informática
em português:
processo de tradução parece estar ligado a aspectos macro textuais, tais como, a uma
ciente de que o texto é de interesse geral mas possui terminologia específica. Tudo
indica que gera um texto com bastante durabilidade, sobretudo quando o tradutor
afirma que:
Eu comecei a fazer uma versão dirty. Depois mudei de estratégia para fazer uma versão
tão boa quanto fosse final mesmo. Só que eu não percebi que mudei de estratégia. (T2)
o 5”. Na verdade, a informação contida no texto de partida diz que o vírus foi
digitação que não chamaram a atenção de T2. Ao se dar conta deles durante o relato
retrospectivo, T2 comenta:
Ainda digna de nota é a inclusão não percebida no texto traduzido por T2 do trecho “o
T2 cola por engano no texto da sua tradução como registrado pelo Translog abaixo.
Esta inserção despercebida por T2 permanecera no texto ate o final da fase de revisão
wdigital,wow[Paste:·[dic·Schädling]]Õ¬vandalismowdigital,w
Isso aqui? Por que que ele [o cursor] tá empurrando aqui? Não! Ah, tá aqui. Não havia
percebido isso . (T2)
Esses exemplos apontam para um texto com menor grau de durabilidade que aquele
esperado inicialmente. A falta de monitoração visual da produção textual faz com que
definida neste artigo, uma vez que a informação factual do texto de partida em alemão
final. Um dos aspectos processuais a que se poderia atribuir esta falta de durabilidade
do texto produzido por T2 é o reduzido tempo total investido na tradução, com pouca
parece infundado avaliar seu ritmo cognitivo e sua produção textual como abaixo do
O outro [texto de uma segunda tarefa de tradução que faz parte do mesmo experimento]
eu vou fazer melhor. (T2)
de T1 e T2. Uma diferença evidente diz respeito aos 17:35 que foram dedicados à fase
Eu vou lendo, faço umas anotações e enquanto eu não tenho assim um texto na cabeça eu
não começo a escrever, né? Bom, texto assim pequeno. (T3)
De fato, uma leitura da tradução produzida por T3 ao final da fase de redação parece
indicar que o tradutor dedicou muito mais esforço à fase de orientação que aquele
39
feito por T1 e T2. Parece- me evidente que o texto abaixo tem um caráter mais durável
partida e permite uma leitura fluente pelo público alvo da tradução dentro das
para T3 mostra um fluxo de produção quase sem pausas, com a digitação contínua da
[¬:17.30.28]Dewursinhowdewpelúciawaw¬bichopapãoÃÃááÃÃááBUGBEAR.BVIRUSâââ⬬¬¬¬Owverm
eßßßßß[ààààà]wBugBearwdowanowpassadowtemwagorawumawsegundawversão:wßßßßßßßßßßß
ßßßßß[àààààààààààààà]àବÕÕ,wmaiÕÕÕÕÕwaltamentewagressiva¬,wquewfarejawn
úmeroswdewcartõeswdewcréditowewbarewbackdoors.w¬¬Oswcomputadoreswpessoaisw¬sãowoswquewmaiswcoore
mwowriscowdewseremwinfectados.w"ww¬¬¬¬¬Devidowaowseuwpoderw¬dewpropagação,waltamentewvÕÕÕÕ
ÕÕÕÕÕÕÕextremamentewveloz"¬wwescrevewawSymantec¬,wempresawquewdesenvolvewprogramaswantiv
írus,w"w¬owW32.Bugbear.B@mmw¬¬¬recebeuwdewnossoswtécnicosßßßßßßßßßßßßßßßßßßhojew
ðwawclassificaçãow4wnumawescalawdew5¬¬¬¬¬¬¬¬¬Õvírus wperigosos,wquewvaiwatéw5.w[¬:57.92]
mapeamento macrotextual.
fase de redação, vemos que o tradutor decide traduzir a primeira unidade de análise,
qual seja, o sub-título em alemão “Aus Teddy wird Grizzly”, como “De ursinho de
pelúcia a bicho-papão” utilizando uma relação coesiva formada por dois itens do
natureza selvagem. Esta relação será possivelmente mais bem compreendida pelo
público alvo no Brasil. O relato retrospectivo abaixo revela esta preocupação com o
serviram de subsídio para o processo de produção textual de T3; revela também que o
tradutor está ciente das características genéricas do texto e sabe que pode “brincar”
nesse tipo de texto. O uso de tempos verbais também revela ciência do gênero
Como eu tinha visto no brief aquela historia de informar. [...] Pro tipo de texto que ia
circular na internet, achei que tava meio fora assim [fazer uma tradução literal]. (T3)
língua inglesa, tais como “keylogging” e “update”, indicam que alguns dos problemas
consolidada sobre o uso desses termos em português. Foi um problema apontado nos
Eu não tenho certeza. Tem coisas que a gente usa mesmo em inglês. (T1)
Uma coisa que acho que vai ficar são backdoor, worm... São termos que se usam nesta
área. (T2)
Outros aspectos da análise da produção textual dos três tradutores podem ser
observados na leitura dos seis textos apresentados no anexo 3, quais sejam, as versões
produzidas ao final da fase de redação e revisão por cada um dos três sujeitos.
Entendo que este material corrobora a análise aqui desenvolvida e revela que o grau
comparado àqueles produzidos por T2 e T3. Por outro lado, o texto de T2 se revela
mais durável que o texto produzido por T1, mas menos durável quando comparado à
tradução feita por T3. Esta suposição é reforçada pelos relatos retrospectivos. As
produção textual que aqueles observados nos relatos de T2 e T1. Por sua vez, T2
apresenta um maior nível de meta-reflexão que T1. Nesse sentido, e de acordo com a
hipótese de trabalho deste artigo, qual seja, a suposição que quanto mais alto for o
Uma vez aferidos o grau de durabilidade dos textos produzidos por T1, T2 e
daquele produzido ao final da fase de redação. Apesar dos 326 caracteres digitados,
para a fase de revisão que o ritmo cognitivo de T1 permanece o mesmo que aquele
textual.
manteve intacto o texto anteriormente produzido. Se, a princípio, este baixo índice de
observações críticas feitas anteriormente não foram aperfeiçoadas nesta fase, o que
processual e do texto traduzido por T3. T2, contudo, parece ter bem claro que a fase
imediatamente após o término da fase de redação o que pode ser atribuído a um alto
Eu vejo que é bem literal o que eu fiz no começo. Mas eu acho que nesta primeira vez eu
quis pegar mesmo um sentido mais literal. Eu começo a revisão da tradução mudando
com um pouco mais de folga pelo tipo de texto que era. Então arrisquei colocar que o
bichinho ganhou um irmãozinho, um irmãozinho agressivo. (T3)
percebe-se que a revisão feita por T3 ocorreu em três fases: uma primeira mais
revisão definitiva:
Então depois nas outras versões eu fiquei mais à vontade pra mexer. (T3)
Acho que esta terceira revisão foi mais no sentido de amenizar coisas complicadas para
esse tipo de texto. Foi para simplificar mesmo. (T3)
revisão como uma etapa isolada do processo de tradução, vemos que T3 apresenta
nesta fase um processo distinto daquele observado na fase de redação. Ao final, chega
revisão são indiscutivelmente superiores aos textos dos dois outros sujeitos.
Conclusões
experiência. Para tanto, partiu-se de duas hipóteses de trabalho, quais sejam, (1) --
quanto mais alto for o nível de meta-reflexão e a experiência em tradução, maior será
redação e a revisão são fases distintas com processos bastante diferenciados que
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p.71-82.
KRINGS, H.P. Was in den Köpfen von Übersetzern vorgeht. Eine empirische
9/1 (volume especial sobre o processo de tradução organizado por Fabio Alves) 2003.
p.129-160.
49
UFMG. 2001.
John Benjamins.
50
modeling writing process data. In N. Levy & S. Randlell (eds.). The science of
1
"[...] translation process studies have, in fact, relatively little in common and present very different
pictures of the translation process they all set out to investigate."
2
Informações técnicas sobre o uso do programa Translog, e de seus componentes Translog User e
Translog Supervisor, encontram-se detalhadas em Jakobsen (1999) e Alves (2003). Cf. também
www.Translog.dk
3
Do inglês, “quick and dirty”.
4
“Not only did the professional translators produce target text faster than student translators, but the
text they produced was more durable”. Jakobsen (2002:203)
5
Königs (1987) e Alves (1995) utilizam os termos Adhoc-Block e Rest-Block em alemão. Alves
(1997) os traduz como Bloco Automático e Bloco Reflexivo em português. Nesse sentido, Adhoc-
Block e Bloco Automático são sinônimos, assim como também o são Rest-Block e Bloco Reflexivo.
6
“[…] expert performance [...] is primarily acquired through the engagement in designed training
activities, namely delibertate practice.” Ericsson (2002:191)
7 Os textos com número semelhante de palavras e conteúdo informativo aproximado foram encontrados