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Cantiga de amigo
As cantigas (Aires Nunes)
Criadas por trovadores, poetas das Bailemos nós já todas três, ai
cortes feudais, retratavam sentimentos [amigas,
amorosos entre cavalheiros e damas da so aquestas avelaneiras frolidas,
nobreza (cantigas de amor) ou entre uma e quen for velida, como nós, velidas,
jovem compesiva e seu amante distante [se amig'amar,
(cantigas de amigo). so aquestas avelaneiras frolidas
• Cantigas de amigo - de origem galaico- [verrá bailar.
portuguesa, são marcadas por Bailemos nós já todas três, ai
um eu-lírico feminino, uma donzela [irmanas,
que fala sobre seu problema amoroso, so aqueste ramo destas avelanas,
seja através de um monólogo íntimo, e quen bem parecer, como nós
seja através de um confidente, [parecemos, se amig'amar,
simbolizada pela figura da mãe, irmã, so aqueste ramos destas avelanas
amiga ou até mesmo algum elemento [verrá bailar.
da natureza (flores, árvores...). Por Deus, ai amigas, mentr'al non
A cantiga de amigo possui um aspecto [fazemos,
folclórico, pois retrata um determinado so aqueste ramo frolido bailemos
ambiente ou costume repleto de e quen ben parecer, como nós
sentimento amoroso burguês. Desse modo, [parecemos, se amig'amar,
pode ser uma bailada, romaria, barcarola, so aqueste ramo so lo que nós
pastoreia ou alba. De caráter narrativo [verrá bailar.
e descritivo, retrata as relações • Cantigas de amor - originária de
afetivas entre pessoas de níveis sociais Provença, sul da França, a cantiga
inferiores. O amor é singelo e espontâneo. de amor chegou a Portugal através
Normalmente, estas cantigas narram de casamentos, peregrinações, cruzadas
a partida do namorado para combater os entre os reinos, dando início
mouros, surgindo, assim, aspectos como às primeiras manifestações do lirismo
a solidão, a tristeza e a saudade. Os versos subjetivo, reunidas na coletânea
apresentam musicalidade e ritmo, Cancioneiro da Ajuda.
com repetição total ou parcial do refrão. Sua característica principal revela
sempre a fala de um homem a uma senhora amostrade-mh-a Deus, se vos en
da nobreza - é o chamado amor [prazer fôr,
cortês. Os ambientes desta poesia são se non dade-mh-a morte.
os arredores do palácio, campo ou vilas A que tenh'eu por lume dêstes olhos
em construção. Mostra uma diferença [meus
de classe social, e neste caso, o homem e por que choran sempre
está sempre abaixo da camada [amostrade-me-a Deus,
social da amada. O amor baseia-se na se non dade-mh-a morte.
relação vassalo/senhor, refletindo o sistema Essa que Vós fezestes melhor
feudal e a divisão de classe social: [parecer
nobreza - clero - povo. De quantas sei, ai Deus,
A cantiga de amor é marcada pelo [fazede-me-a ver,
eu-lírico masculino e sofredor, sua amada Se non dade-mh-a morte.
é chamada por ele de "mia senhor", Ai Deus, que me-a fizestes mais ca
de novo um reflexo da relação vassalo/ [mim amar,
senhor feudal. Mostrade-me-a u possa com ela
Não se revela o nome da dama, [falar,
cultivando seu amor em segredo. Dessa Se non dade-me-a morte.
forma, a mulher é idealizada, inatingível Neste período também surgiram cantigas
e sempre colocada num plano elevado. satíricas, nas quais os trovadores
Essa relação é conhecida por "coita portugueses criticavam ou ridicularizavam
d'amor"(amor-sofredor). situações do cotidiano. Esse tipo de cantiga
divide-se em cantigas de maldizer, na
Cantiga de amor qual se falava mal de pessoas conhecidas,
Quer'eu a Deus rogar de coraçon, através de um vocabulário de baixo
com'ome que é cuitado d'amor, calão; e cantigas de escárnio, onde se
que el me leixe veer mia senhor fazia crítica às pessoas, de maneira irônica,
mui ced'; e se m'el non quiser' oír, porém, sem citação de nomes.
logo lh'eu querrei outra ren pedir:
que me Ion leixe mais eno mundo Cantiga de maldizer
[viver! Ai dona fea! foste-vos queixar
E se m'el á de fazer algum bem, porque vos nunca louv' en meu trobar,
oír-mi-á questo que lh'eu rogarei, mais ora quero fazer un cantar
e mostrar-mi-á quanto bem en que vos loarei tôda via;
[no mundo'ei, e vêdes como vos quero loar:
E se mi-o el non quiser "amostrar, dona fea, velha e sandia!
logo lh'eu outra ren querrei rogar: Ai dona fea! se Deus me perdon!
que me non leixe mais eno e pois havedes tan gran coraçon
[mundo viver! que vos eu loe en esta razon,
E se m'el amostrar'a mia senhor, vos quero já loar tôda via;
que am'eu mais ca o meu coraçon, e vêdes qual será a loaçon:
vedes, o que lhe rogarei enton; dona fea, velha e sandia!
que me dê seu Ben que m'é Dona fea, nunca vos eu loei
[mui mester; en meu trobar; pero muito trobei;
e roga-lh'ei que, se non fezer', mais ora já um bon cantar farei
que me non leixe mais eno mundo en que vos loarei tôda via;
[viver! e direi-vos como vos loarei:
E roga'-lh'ei, se me Ben á fazer, dona fea, velha e sandia!
que el me leixe viver en logar GUILHADE, J. Garcia de Apud Amora, A S. Etalli.
u a veja e lhe possa falar, Presença da Literatura Portuguesa. São Paulo: Difusão
por quanta coita me por ela deu; Européia do Livro, 1961, p. 52.
se non, vedes que lhe rogarei eu; No poema acima, a linguagem é simples,
que me non leixe mais eno direta, agressiva; predomina a zombaria
[mundo viver! aberta.
TORNEOL, Nuno Fernandes. MENDES dos
Remédios. História da Literatura portuguesa. Coimbra: Cantiga de Maldizer
Atlântida Livraria Editora, 1930, p. 64. (Duarte da Gama)
No poema acima, o trovador dirigese Nam sey que possa viuer
à dama, que, quase sempre é indiferente Neste rreyno já contente,
às suas súplicas. Poys a desorden na gente
Nã quer layxar de creçer.
Cantiga de amor A qual vay tam sem medida,
(Bernardo Bonaval) Q se não pode soffrer
A dona que eu am'e tenho por Nam há hy quem possa ter
[senhor Boa vida.
(...) (fragmentos)
outros vão trazer atados Véspera de Pinticoste foi grande
hus lençinhos no pescoço gente assüada em Camaalot, assi que
q cõ gram pedra nu poço poderá homem i veer mui gram gente,
deuiam de ser lançados. muitos cavaleiros e muitas donas mui
Outros, sem ser mãçypados, bem guisadas. El-rei, que era ende mui
Sendo menores dydade, ledo, honrou-os muito e feze-os mui bem
Andam já cõ vaydade servir; e toda rem que entendeo per que
Agrauados. aquela corte seeria mais viçosa e mais
(...) leda, todo o fez fazer.
em qual quer aldeazinha Aquel dia que vos eu digo, direitamente
achareys tal corruçam, quando queriam poer as mesas -
ca molher do escriuam esto era ora de noa - aveeo que üa
ccuyda q he hua rraynha. donzela chegou i, mui fremosa e mui bem
E tam bem os lauradores vestida. E entrou no paaço a pee, como
Com suas maas nouydades mandadeira. Ela começou a catar de üa
Querem ter as vaydades parte e da outra, pelo paaço; e perguntavam-
Dos senhores. na que demandava.
(...) - Eu demando - disse ela - por Dom
Lançarot do Lago. É aqui?
- Si, donzela - disse üu cavaleiro.
Novelas de cavalaria Veede-lo: stá aaquela freesta, falando
Posteriormente, a Igreja passa a aceitar com Dom Gualvam.
tais obras em sua doutrina e, com isso, Ela foi logo pera el e salvô-o. Ele,
surgem as primeiras novelas de cavalaria, tanto que a vio, recebeo-a rnui bem e
nas quais encontramos aspectos místicos, abraçou-a, ca aquela era üa das donzelas
ou seja, as aventuras dos cavaleiros que moravam na Insoa da Lediça,
têm significado religioso. Podemos que a filha Amida del-rei Peles amava
destacar, como exemplo A Demanda do mais que donzela da sua companha i.
Santo Graal, uma lenda baseada na busca - Ai, donzela! - disse Lançalot -
incessante do cálice sagrado pelos que ventura vos adusse aqui, que bem
cavaleiros da Távola Redonda, onde José sei que sem razom nom veestes vós?
de Arimatéia recolheu o sangue de Jesus - Senhor, verdade é; mais rogovos,
quando este ainda estava na cruz. Este se vos aprouguer, que vaades comigo
cálice, conforme diz a lenda, teria sido aaquela foresta de Camaalot; e
levado à um castelo na Inglaterra. sabede que manhãa, ora de comer,
Simbolicamente seeredes aqui.
falando, esta busca nada mais - Certas, donzela - disse el - muito
é do que a luta do homem em busca de me praz; ca teúdo e soom de vos
uma verdade metafísica. fazer serviço em tôdalas cousas que
eu poder.
A Demanda do Santo Graal Entam pedio suas armas. E quando
A novela A Demanda do Santo Graal el-rei vio que se fazia armar a tam gram
inicia-se em Camaalot, reino do rei Artur. É coita, foi a el com a raia e disse-lhe:
dia de Pentecostes, e os cavaleiros estão - Como leixar-nos queredes a atai
reunidos à volta da 'Távola Redonda". festa, u cavaleiros de todo o mundo
Galaaz chega, ocupa o assento reservado veem aa corte, e mui mais ainda por vos
para o "cavaleiro escolhido" e tira a veerem ca por al - deles por vos veerem
espada fincada no "padrom" (pedra de e deles por averem vossa companha?
mármore) que boiava na água. Durante a - Senhor, - disse el - nom vou
refeição, o Graal (cálice com que José de senam a esta foresta com esta donzela
Arimatéia colhera o sangue derramado por que me rogou; mais eras, ora de terça,
Cristo na cruz) perpassa o ar, nutre os seerei aqui.
presentes com o seu manjar celestial e Entom se saio Lançarot do Lago e
desaparece. No dia seguinte, após ouvir a sobio em seu cavalo, e a donzela em
missa, os cavaleiros saem na "demanda" seu palafrem; e forom com a donzela
(procura) do Santo Vaso. Daí por diante, dous cavaleiros e duas donzelas. E quando
vão-se entrelaçando várias aventuras, que ela tornou a eles, disse-lhes:
culminam quando Galaaz é beneficiado - Sabede que adubei o por que viim:
com a aparição do Graal enquanto celebra Dom Lançarot do Lago se irá comnosco.
o ofício religioso. O episódio a seguir Entam se filharom andar e entraram
transcrito corresponde ao capitulo XXV. na foresta; e nom andaram muito per ela
Adaptação do texto transcrito in Moisés, Massaud. 4 que chegaram a casa do ermitam que
Literatura Portuguesa através dos textos. 3. ed., Sâo
Paulo: Cultrix, 1970, pp. 36 e 37.
soía a falar com Gualaz. E quando el vio
Lançarot ir é a donzela, logo soube que
ia pera fazer Gualaaz cavaleiro, e leixou tam bõo cavaleiro como sodes fremoso
sua irmida por ir ao mosteiro das donas, E o irmitam respondeo a esto:
ca nom queria que se fosse Gualaaz - Dom Lançalot, nom ajades dulds
ante que o el visse, ca bem sabia que, de Galaaz, ca eu vos digo que de bondade
pois se el partia dali, que nom tornaria i, de cavalaria os milhores cavaleiros
ca lhe convenria e, tanto que fosse cavaleiro, do mundo passará.
entrar aas venturas do reino de E Lançalot respondeo:
Logres. E por esto lhe semelhava que o - Deos o faça assi como eu queria.
avia perdudo e que o nom veeria a Entam começarom todos a chorar
meude, e temia, ca avia em ele mui grande com prazer quantos no lugar stavam.
sabor, porque era santa cousa e santa (...)
creatura.
Quando eles cheguarom aa abadia, Como os da Mesa Redonda
levaram Lançarot pera üa câmara, houveram da graça do Santo
e desarmarom-no. E vèo a ele a abadessa Graal
com quatro donas, e adusse consigo (trecho adaptado ao português moderno)
Gualaaz: tam fremosa cousa era, Grande foi a alegria e o prazer que
que maravilha era; e andava tam bem os cavaleiros da Távola Redonda tiveram
vesàdo, que nom podia milhor. E a abadessa naquele dia, quando se encontravam todos
chorava muito com prazer. Tanto reunidos. Nunca, nem antes nem depois
que vio Lançarot, disse-lhe: do início da Távola Redonda todos os
- Senhor, por Deos, fazede vós cavaleiros assim se reuniram.
nosso novel cavaleiro, ca nom queríamos Ao cair da noite, quando se sentavam
que seja cavaleiro por mão doutro; às mesas, ouviram um trovão tão grande e
ca milhor cavaleiro ca vós nom no assustador, que lhes pareceu que todo o
pode fazer cavaleiro; ca bem crcemos palácio tremia. E, logo após, uma imensa
que ainda seja tam bõo que vos acharedes claridade o iluminou inteiramente. Então,
ende bem, e que será vossa honra todos os cavaleiros foram tomados da graça
de o fazerdes; e se vos el ende nom do Espírito Santo e começaram a contemplar
rogasse, vó-lo devíades de fazer, ca uns aos outros e viram que estavam muito mais
bem sabedes que é vosso filho. formosos. De tão maravilhados
- Gualaaz - disse Lançalot - queredes que estavam não conseguiam falar.
vós seer cavaleiro? Apenas se olharam. E nesse momento entrou
El respondeo baldosamente: no palácio o Santo Graal, envolto por
- Senhor, se prouvesse a vós, bem um veludo branco, sem que ninguém conseguisse
no queria seer, ca nom há cousa no ver quem o trazia. Tão logo o
mundo que tanto deseje como honra de Santo Graal penetrou no palácio, este se
cavalaria, e seer da vossa mão, ca doutra cobriu de um odor tão agradável como se
nom. no: queria seer, que tanto vos os mais finos perfumes aí tivessem sido
auço louvar e preçar de cavalaria, que derramados. E ele percorreu o palácio de
nenhüu, a meu cuidar, nom podia seer ponta a ponta, detendo-se ao redor de
covardo nem mao que vós fezéssedes cada uma das mesas. E estas, à sua passagem,
cavaleiro. E esto é üa das cousas do cobríam-se dos mais deliciosos
mundo que me dá maior esperança de manjares, despertando o apetite e o prazer
seer homem bõo e bõo cavaleiro. de todos. Depois que cada um se serviu,
- Filho Gualaaz - disse Lançalot - o Santo Graal desapareceu da mesma
stranhamente vos fez Deos fremosa forma como entrara: sem que ninguém
creatura. Par Deos, se vós nom cuidades percebesse quem o conduzia nem por
seer bõo homem ou bõo cavaleiro, assi qual porta saíra. Então os cavaleiros retomaram
Deos me conselhe, sobejo seria gram a voz e começaram a dar Graças a
dapno e gram malaventura de nom seerdes Nosso Senhor, que tão grande e honra lhes
bõo cavaleiro, ca sobejo sedes fremoso. dera, confortando-os com a graça do Santo
E ele disse: Vaso. Mas, mais alegre que todos estava
- Se me Deos fez assi fremoso, o rei Artur, porque maior graça lhe proporcionara
dar-mi-á bondade, se lhe prouver; ca, Nosso Senhor que a qualquer
em outra guisa, valeria pouco. E ele outro rei que anteriormente houvesse reinado
querrá que serei bõo e cousa que semelhe sobre Logres. E disse aos que com
minha linhagem e aaqueles onde ele estavam:
eu venho; e metuda ei minha speranç — Amigos, devemos nos considerar
em Nosso Senhor. E por esto vos roç imensamente felizes, pois Deus nos
que me façades cavaleiro. mostrou tão grande sinal de amor, alimentando-
E Lançalot respondeo: nos, nesta festa de Pentecostes,
- Filho, pois vos praz, eu vos tara de seu santo celeiro.
cavaleiro. E Nosso Senhor, assi como,
el aprouver e o poderá fazer, vos façi Resumo do Trovadorismo
Momento socio-cultural afunilado, situado no centro da Terra,
• Idade Média onde os condenados sofrem enormes tormentos.
• Feudalismo: sistema de poder baseado Acompanhado de Virgílio, o poeta
na posse da terra visita depois o Purgatório, uma montanha
• Supremacia do clero (teocentrismo) de nove estágios, ao final dos quais
e da nobreza (senhores feudais, patríarcalismo) desaparece Virgílio e aparece Beatriz (a
Características literárias Teologia). Junto desta, Dante avança entre
• Predomínio da literatura oral, associada os coros dos anjos, ao-tongo das nove
à música e à dança, as cantigas esferas do Paraíso, até que São Bernardo
• Tipos de cantiga: (a Mística) lhe permite desfrutar da presença
De amor (eu-lírico masculino, prestando de Deus".
"vassalagem amorosa" Resumo elaborado por Help! Sistema de Consulta
à mulher, à senhora: o Interativa - Técnicas de Redação e Literatura. São
Paulo: O Estado de S. Paulo, 1996. p. 99.
amor cortês)
• Francisco Petrarca - é o criador do
De amigo (eu-lírico feminino, sensual
Humanismo. Escreveu Canzoniere,
e popular, o lamento pela ausencia
obra que contém canções, badaladas,
do amigo/amante)
sextinas, estâncias e sonetos que,
De escárnio (crítica pessoal e/ou social
posteriormente, vieram a ser imitados
indireta, irônica)
por toda a lírica européia.
De maldizer (crítica pessoal e/ou social
• Giovanni Boccaccio - escreveu
direta)
Decameron, obra repleta de linguagem
• Prosa medieval: novelas de cavalaria
expressiva e rica inventividade.
(o heroísmo de influência religiosa
• Fernão Lopes - foi o primeiro cronista-
e feudal).
mor de Portugal, responsável
pela tarefa de registrar a História de
Autores e obras seu país. Lopes foi o iniciador da historiografia
• Trovadores (poetas-cantores) portuguesa. Utilizava-se
Paio Soares de Taveirós, autor de um estilo elegante e coloquial nas
da Cantiga da Ribeirinha, cantiga de suas narrativas e descrições e acreditava
amor homenageando uma dama da corte que o povo era o agente das
(D. Maria Paes Ribeiro) transformações sociais.
D. Dinis: rei-trovador e mecenas
(protetor das artes).
Crônica de D. Pedro I
Novelas de cavalaria (criações populares):
Como foi trelladada Dona Ines
O rei Artur e os cavaleiros da
pera o moesteiro Dalcobaça, e da
Távola Redonda, Carlos Magno e os
morte dei Rei Dom Pedro
doze pares da França.
Por que semelhante amor, qual el-
Rei Dom Pedro ouve a Dona Enes, raramente
Humanismo he achado em alguuma pessoa,
Período de transição entre a Idade porem disseram os antiigos que nenhuum
Média e o Renascimento, marcado por he tam verdadeiramente achado, como
diversas transformações, nas quais podemos aquel cuja morte nom tira da memoria o
citar a expansão marítima, as invenções gramde espaço do tempo. E se alguum
como a bússola e a pólvora, o disser que muitos forom ja que tanto e
aperfeiçoamento da imprensa, o desenvolvimento mais que el amaram, assi como Adriana
do comércio, o mercantilismo, e Dido, e outras que nom nomeamos,
além do desaparecimento do misticismo segumdo se lee em suas epistolas,
medieval, compreendendo-se o homem respomdesse que nom falíamos em amores
com mais naturalidade. compostos, os quaaes alguuns autores
Foi um movimento que tinha por objetivo abastados de eloquemcia, e
principal a contestação do teocentrismo, floreçentes em bem ditar, hordenarom
dando espaço ao antropocentrismo. segumdo lhes prougue, dizemdo em
Num cenário como este, surgiram nome de taaes pessoas, razoões que
vários autores como Dante Alighieri numca nenhuuma delias cuidou; mas
(1265 - 1375), Petrarca (1304 - 1373) e falíamos daquelles amores que se contam
Boccaccio (1313 - 1375). e lêem nas estórias, que seu
• Dante Alighieri - nascido em Florença, fumdamento teem sobre verdade. Este
estudou clássicos latinos e dedicou- verdadeiro amor ouve eIRei Dom Pedro
se à filosofia. Sua obra principal a Dona Enes como se delia namorou,
foi A Divina Comédia, que se dividia seemdo casado e aimda Iffamte, de guisa
em "Inferno", "Purgatório" e "Paraíso". que pero dela no começo perdesse
A Obra: "Perdido numa selva (o vista e falia, seemdo alomgado, como
Pecado), Dante é auxiliado pelo poeta ouvistes, que he o principal aazo de se
latino Virgílio (a Razão), que o guia através perder o amor, numca cessava de lhe
doHnferno: para ele, um grande local emviar recados, como em seu logar
teemdes ouvido. Quanto depois trabalhou e senhorio que em el avia. E leixou
polia aver, e o que fez por sua morte, eIRei Dom Pedro em seu testamento
e quaaes justiças naquelles que em certos legados, a saber, aa Iffamte Dona
ella forom culpados, himdo contra seu Beatriz sua filha pera casamento cem
juramento, bem he testimunho do que mil livras; e ao Iffamte Dom Joham seu
nos dizemos. E seemdo nembrado de filho viimte mil livras; e ao Iffamte Dom
homrrar seus ossos, pois lhe ja mais Denis outras viinte mil; e assi a outras
fazer nom podia, mandou fazer huum pessoas. E morreo eIRei Dom Pedro
muimento dalva pedra, todo mui sotillmente huuma segumda feira de madurgada,
obrado, poemdo emlevada sobre a dezoito dias de janeiro da era de mil e
campãa de cima a imagem delia com quatro cemtos e cimquo anos, avemdo
coroa na cabeça, como se fora Rainha; dez annos e sete meses e viimte dias
e este muimento mandou poer no que reinara, e quaremta e sete anos e
moesteiro Dalcobaça, nom aa emtrada nove meses e oito dias de sua hidade, e
hu jazem os Reis, mas demtro na egreja mandousse levar aaquel moesteiro que
ha maão dereita, acerca da capella moor. dissemos, e lamçar em seu muimento,
E fez trazer o seu corpo do mosteiro de que esta jumto com o de Dona Enes. E
Samta Clara de Coimbra, hu jazia, ho por quamto o Iffamte Dom Fernamdo seu
mais homrradamente que se fazer pode, primogênito filho nom era estomçe hi, foi
ca ella viinha em huumas andas, muito eIRei deteudo e nom levado logo, ataa
bem corregidas pera tal tempo, as que o Iffamte veo, e aa quarta feira foi
quaaes tragiam gramdes cavalleiros, posto no muimento. E diziam as gentes,
acompanhadas de gramdes fidalgos, e que taaes dez annos numca ouve em
muita outra gente, e donas, e domzellas, Portugal, como estes que reinara eIRei
e muita creelezia. Pelo caminho estavom Dom Pedro.
muitos homeens com çirios nas maãos,
de tal guisa hordenados, que sempre o
seu corpo foi per todo o caminho per
A poesia palaciana
antre çirios acesos; e assi chegarom Refere-se à poesia que surgiu no
ataa o dito moesteiro, que eram dalli século XV nos palácios, ou seja, na vida
dezassete legoas, omde com muitas missas aristocrática. Garcia de Resende, poeta
e gram solenidade foi posto em aquel que costumava freqüentar a Corte, reuniu
muimento: e foi esta a mais homrrada toda a sua produção poética palaciana
trelladaçom, que ataa aquel tempo em no Cancioneiro Geral. Este tipo
Portugal fora vista. Semelhavelmente de poesia possui uma linguagem mais
mandou eIRei fazer outro tal muimento e rica do que a poesia trovadoresca.
tam bem obrado pera si, e fezeo poer
acerca do seu delia, pera quamdo se Cantiga sua partindo-se
aqueeçesse de morrer o deitarem em (João Ruiz Castelo Branco)
elle. E estamdo el em Estremoz, adoeçeo Senhora, partem tão tristes
de sua postumeira door, e jazemdo meus olhos por vós, meu bem,
doemte, nembrousse como depois da que nunca tão tristes vistes,
morte Dalvoro Gomçallvez e Pero Coelho, outros nenhuns por ninguém.
el fora certo, que Diego Lopes Tão tristes, tão saudosos,
Pachequo nom fora em culpa da morte tão doentes da partida,
de Dona Enes, e perdohou-lhe todo queixume tão cansados, tão chorosos,
que dei avia, e mandou que lhe da morte mais desejosos
emtregassem todos seus beens; e assi cem mil vezes que da vida.
o fez depois eIRei Dom Fernamdo seu Partem tão tristes os tristes,
filho, que lhos mandou emtregar todos, tão fora d'esperar bem,
e lhe alçou a semtemça que eIRei seu que nunca tão tristes vistes
padre comtra elle passara, quamto com outros nenhuns por ninguém.
dereito pode. E mandou eIRei em seu
testamento, que lhe tevessem em cada O teatro popular
huum ano pera sempre no dito mosteiro Em 1502, o teatro praticamente não
seis capellaaens, que cantassem por el existia em Portugal. Apenas haviam
e lhe dissessem cada dia huuma missa representações
oficiada, e sahirem sobrei com cruz e religiosas nas festas da
augua beemta; e eIRei Dom Fernamdo Igreja, onde encenavam-se a vida de
seu filho, por se esto melhor comprir e Cristo com o intuito de educar os fiéis.
— 21 — Somente mais tarde é que surgiu o teatro
se cantarem as ditas missas, deu depois de Gil Vicente com a sua encenação
ao dito moesteiro em doaçom por mais popular; Monólogo do Vaqueiro.
sempre o logar que chamam as Paredes, Seu teatro era chamado profano, por
termo de Leirea, com todallas rendas ser representado nas praças públicas.
O autor português mais importante do Dinato
período é Gil Vicente (1460 - 1536), que Que tens sabido?
viveu a maior parte de sua vida em Lisboa, Belzebu
centro comercial e cultural de Portugal, autor Que quer em extremo grado
de Monólogo do Vaqueiro, primeira Todo o Mundo ser louvado,
peça dentre os mais de 44 títulos que escreveu, e Ninguém ser repreendido.
retratou a sociedade da época e VICENTE, Gil. Auto da Lusitânia. In Saraiva, Antonio
sua sátira atingia todas as classes sociais Jose. Teatro de Gil Vicente. 4. ed. Lisboa: Portuga),
como frades, bispos, fidalgos, plebeus, ciganos, 1968, p. 303.
etc, criticando sua postura moral. O poeta critica o comportamento humano
com finalidade moralizadora, embora
Trecho de Auto da Lusitana, de maneira cômica, com o uso de
prosopopéias (Todo Mundo e Ninguém),
de Gil Vicente
satirizando o comportamento humano.
Entra Todo o Mundo, homem como
rico mercador, e faz que anda buscando
alguma cousa que se lhe perdeu; e Auto da Barca do Inferno
logo após êle um homem, vestido como Publicado em 1517, foi encenada
pobre. Éste se chama Ninguém, e diz: pela primeira vez na câmara da rainha D.
Ninguém Maria de Castela, na presença do rei D.
Que andas tu aí buscando? Manuel I e de sua irmã D. Leonor, a Rainha
Todo o Mundo Velha. O Auto da Barca do Inferno tem
Mil cousas ando a buscar: como cenário fixo duas embarcações, num
delas não posso achar, porto imaginário para onde vão as almas
porém ando perfiando, no instante em que morrem. Uma barca é
por quão bom é perfiar. representada por um Anjo, simbolizando
Ninguém o Paraíso e a outra é representada pelo
Como hás nome, cavaleiro? diabo, simbolizando o Inferno. A ação se
Todo o Mundo desenrola a partir da chegada dos personagens
Eu hei nome Todo o Mundo, no porto, procurando encontrar a
e meu tempo todo inteiro passagem para a vida eterna. Na peça,
sempre é buscar dinheiro os personagens serão julgados segundo
e sempre nisto me fundo. as obras que realizaram em vida.
Ninguém A obra apresenta-se com versos
E eu hei nome Ninguém, redondilhos, rimas, símbolos e metáforas.
e busco a consciência. Os personagens são considerados
(Belzebu para Dinato) tipos sociais - a nobreza, o clero e o
Esta é boa experiência! povo. Além da oposição do Bem X Mal,
Dinato, escreve isto bem. Céu X Inferno, o Anjo e o Diabo assumem
Dinato posturas também opostas, fazendo
Que escreverei, companheiro? com que a simpatia e a ironia do Diabo
Belzebu domine toda a peça.
Que Ninguém busca consciência, (resumo)
E Todo o Mundo dinheiro. Num braço de mar, onde estão ancoradas
(Ninguém para Todo o Mundo) duas barcas, chegam as almas
E agora que buscas lá? de representantes de várias classes sociais
Todo o Mundo e profissionais. Uma das barcas dirige-
Busco honra multo grande. se ao Purgatório ou ao Inferno; a
Ninguém outra, ao Paraíso. A primeira será tripulada
E eu virtude, que Deus mande pelo Diabo e seu Companheiro; a outra,
que tope co ela já. por um Anjo.
(Belzebu para Dinato) Eis que chega a primeira alma para
Outra adição nos açude: a viagem. É Dom Henrique, o Fidalgo,
escreve logo aí, a fundo, acompanhado por um criado que transporta
que busca honra Todo o Mundo, uma cadeira e carrega um manto
e Ninguém busca virtude. para seu Senhor. Assim como outros
Ninguém personagens, o Fidalgo argumenta contra
Buscas outro mor bem qu'êsse? sua ida para o Inferno, considera
Todo o Mundo que a barca não é digna de sua nobre
Busco mais quem me louvasse pessoa. O Diabo procura ironizar os
Tudo quanto eu fizesse. diversos argumentos do nobre, dizendo
Ninguém que uma vida cheia de prazeres e pecados
E eu quem me repreendesse só podia resultar em punição.
Em cada cousa que errasse. O Fidalgo reporta-se à barca do
(Belzebu para Dinato) Anjo. Alega direito de embarcar por pertencer
Escreve mais a uma boa linhagem, mas era
muito tirano e vaidoso. Seu esforço foi uma resposta do Anjo. Volta à barca do
em vão e, retornando à barca do Inferno, Diabo ridicularizado pelo Parvo, que lhe
quer demonstrar força moral ao reconhecer pergunta se furtara o facão.
que vivera erroneamente. Assim que o Frade e sua amante
Chega o Onzeneiro, carregando são embarcados, chega uma alcoviteira,
seus bolsões de dinheiro. Recusa-se a Brísida Vaz, que se recusa a entrar
embarcar quando toma conhecimento do na barca. Representa a mais terrível das
destino da barca, mas o Diabo, sarcástico, almas penadas, passara a vida aliciando
se faz de espantado e ironiza o meninas para padres.
fato de o dinheiro do Onzeneiro não ter A Alcoviteira dirige-se à barca do
servido para salvá-lo da morte. Procura Anjo, que se nega ouvi-la, alegando que
então a barca do Anjo, pedindo-lhe que é uma pessoa inoportuna. Brísida, então,
o deixasse entrar, pois queria mesmo volta à barca do Diabo, pedindo-lhe
era o Paraíso. Seu pedido é recusado a prancha e embarcando nela.
quando o Anjo vê seus bolsões, afirmando Depois da Alcoviteira, chega o Judeu
que estavam tão cheios de dinheiro com um bode às costas. O Diabo
que tomariam todo o espaço do nega-se a embarcar o animal, mas o
navio. Desconsolado, o Onzeneiro entra Judeu tenta suborná-lo com alguns tostões,
na barca infernal, cumprimentando sem muita discussão, é rebocado
com respeito o Fidalgo, que lá já estava, pela barca do Inferno.
aguardando a triste partida. Então chega a vez do Corregedor;
Joane, personagem caracterizado carregado de processos, aproxima-se
como o Parvo, conversa com o Diabo e da barca do Inferno. Recusa-se a rumar
começa a praguejá-lo quando descobre para destino tão cruel, tentando defender-
o destino de sua barca; entra em território se, mas é desmascarado pelo Diabo,
do Anjo porque - assim lhe haviam que expõe o recebimento de propinas
dito - o reino do Céu seria dos pobres. através de sua mulher. Para se defender,
Para o Anjo, os atos do bobo eram fruto o Corregedor culpa sua própria
de uma doença, sendo provas de inocência esposa, mas o esforço é em vão.
e não sua sagacidade. Irá ao Enquanto o Corregedor conversa
Paraíso, portanto, o Parvo, passageiro com o Diabo, chega um Procurador cheio
do barco que vai à Glória! Mas antes de de livros; ambos se recusam a entrar no
entrar, mantém-se ao lado do Anjo, para barco do Diabo, chamando pelo Anjo e
ajudar na avaliação dos próximos passageiros. dirigindo-se até ele. O Anjo roga praga
Chega ao barco do Inferno um Sapateiro, aos documentos jurídicos que carregam
com suas ferramentas de ofício. e os manda de volta.
Aparentemente, um bom trabalhador. Nova alma vai se aproximando: o
Quando é convidado pelo Diabo a Enforcado, que se julga merecedor do
embarcar, tenta repeli-lo com o argumento perdão por ter tido uma morte cruel. É o
de que morrera comungado e confessado. próximo personagem a entrar na barca
Que bom cristão parece ser! do Diabo, que não se comove com o
Mas o Diabo responde que foi excomungado sofrimento de um homem que tantos furtos
por omissão de seus pecados, pois cometera em vida. O Enforcado simboliza
roubava seus fregueses ao cobrar pelos o ladrão que rouba sem vantagens,
serviços prestados. Não contente, sendo manipulado por outros de
dirige-se à barca do Anjo e é barrado; posições mais privilegiadas.
explicação: o lugar de quem rouba na Dirigem-se agora à barca do céu
praça é no barco que vai ao Demo. De os Quatro Cavaleiros, empunhando a
nada adiantava ter ido à missa se ao cruz de Cristo. Lutaram pela expansão
mesmo tempo havia roubado, cobrado da Fé Católica e ganham a vida eterna
preços extorsivos. Assim, o Sapateiro como recompensa por terem sido mortos
se dirige a outra barca, aceitando seu pelos mouros. Prosseguiram na barca
destino. do Anjo, cantando e sentindo-se aliviados
Chega então um Frade, trazendo por terem cumprido corretamente
uma moça pela mão: sua amante, Florença. suas missões.
Com ela, traz um broquel, uma
espada e um capacete, representando Farsa de Inês Pereira
sua paixão pelo esporte. Esta peça foi representada em 1523
O Frade tenta convencer o Diabo e é considerada a mais famosa de Gil
de sua inocência, ensinando-lhe a arte Vicente. Trata-se de uma moça sonhadora,
da esgrima, mas seu esforço é em vão. cansada do trabalho doméstico e
Não contente, busca a barca do Anjo que resolve fugir de toda essa monotonia.
para tentar defender seus direitos enquanto Casa-se com um escudeiro, considerado
representante da Santa Madre malandro, porém, este morre durante
Igreja, mas nada consegue, nem sequer a guerra. Viúva, casa-se novamente,
com um homem que faz todas as suas (poesias de amor, sátira e religiosa).
vontades. • Teatro popular, de influência medieval,
(fragmento da obra) mas crítico, satírico, polêmico -
Entra logo Inês Pereira, e finge que Gil Vicente.
está lavrando só em casa, e canta esta • Crônicas e histórias dos reis e do
cantiga: povo português (desenvolvimento da
Canta Inês: prosa) - Fernão Lopes.
Quien com veros pena y muere Autores e obras
Que hará cuando no os viere? • Fernão Lopes, criador da historiografia
Falado: portuguesa: Crônica d'EI Rei
Inês - Renego deste lavrar D. Pedro, Crônica d'EI Rei D. Fernando
E do primeiro que o usou! e Crônica d'el Rei D. João I.
Ó diabo que o eu dou, • Gil Vicente, criador do teatro português:
Que tão mao é d'aturar! Auto da visitação ou Monólogo
Ó Jesu! Que enfadamento, do vaqueiro; Farsa de Inês Pereira;
E que raiva, e que tormento, Auto da Barca do Inferno, Auto
Que cegueira, e que da Barca do Céu; Auto da Barca do
[canseira! Purgatório.
Eu hei-de buscar maneira
D'algum outro aviamento.
Coitada, assi hei-de estar Renascimento
Encerrada nesta casa Teve seu início no século XV e estendeu-
Como panela sem asa se até meados do século XVI e
Que sempre está num lugar? é marcado pela supervalorização do homem
E assi hão-de ser logrados e pelo antropocentrismo, em oposição
Dous dias amargurados, ao teocentrismo e misticismo.
Que eu posso durar viva? Há uma retomada das idéias grecoromanas;
E assi hei-de estar cativa o artista não se contenta em
Em poder de desfiados? apenas observar a natureza, mas procura
Antes o darei ao diabo estudá-la e imitá-la; valoriza-se a
Que lavrar mais nem individualidade do artista, em contraposição
[pontada. à coletividade das obras clássicas.
Já tenho a vida cansada O Renascimento em Portugal deuse
De jazer sempre dum cabo. no período de 1527 a 1580, com o
Todas folgam e eu não retorno do poeta Sá de Miranda após seus
Todas vêm e todas vão estudos na Itália, trazendo inovações de
Onde querem, senão eu. poetas italianos. Porém, foi com Luís de
Hui! E que pecado é o meu, Camões que ocorreu o aprimoramento
Ou que dor de coração? dessas novas técnicas poéticas.
Esta vida é mais que morta. Este período ficou conhecido como
São eu coruja ou corujo, Classicismo e os escritores introduziram
Ou são algum caramujo em suas obras temas pagãos, além do
Que não sai senão à porta? ideal do amor platônico, a exaltação do
E quando me dão algum dia antropocentrismo, a imitação de autores
Licença, como a bugia, clássicos, a predominância da ciência e
Que possa estar à janela da razão, o uso da mitologia, clareza e
É já mais que a Madalena objetividade, uso de linguagem simples e
Quando achou a aleluia. precisa, o culto da beleza e da perfeição.
Sermões Carta
Há de tomar o pregador uma só (fragmento)
matéria,- há de defini-la para que se conheça, Senhor, os reis são vassalos de
Deus e, se os reis não castigam os seus texto literário, por não se tratar de um
vassalos, castiga Deus os seus. A causa romance, poesia, conto ou novela. No entanto,
principal de se não perpetuarem as há, também, literalidade nesta, pois
coroas nas mesmas nações e famílias é está dirigida ao Rei de Portugal e começa
a injustiça, ou são as injustiças, como com uma afirmação religiosa. Depois
diz a Escritura Sagrada; e entre todas Vieira refere-se à causa do tema que vai
as injustiças nenhuma clama tanto ao desenvolver, recorrendo citações das
céu como as que tiram a liberdade aos escrituras sagradas. O autor compara as
que nasceram livres, e as que não pagam tiranias na África com as tiranias e as
o suor aos que trabalham; e estes injustiças da colônia: a morte de milhares
são e foram sempre os dois pecados de índios, a desobediência pela coroa de
deste Estado, que ainda tem tantos defensores. suas próprias leis, a impunidade etc. Concluindo:
A perda do Senhor rei D. Sebastião o conceptismo amarra as idéias
em África, e o cativeiro de sessenta relacionadas com uma ética religiosa e
anos que se seguiu a todo o reino, política, cuja atualidade não se perdeu.
notaram os autores daquele tempo
que foi castigo dos cativeiros, que na
costa da mesma África começaram a
Resumo do Barroco
fazer os nossos primeiros conquistadores, Momento sócio-cultural
com tão pouca justiça como a • Contra-reforma: reação da Igreja
que se lê nas mesmas histórias. católica.
As injustiças e tiranias, que se tem • Os novos valores humanistas, defendidos
executado nos naturais destas terras, excedem pela burguesia, chocamse
muito às que se fizeram na África. com os valores teocêntricos, representados
Em espaço de quarenta anos se mataram pelo clero.
e se destruíram por esta costa e sertões • Começa em Portugal o domínio espanhol,
mais de dois milhões de índios, e mais de que dura de 1580 a 1640.
quinhentas povoações como grandes cidades,
e disto nunca se viu castigo. Proximamente, Características literarias
no ano de 1655, se cativaram no • Antítese, dualidade, contradição: o sagrado
rio das Amazonas dois mil índios, entre os e o profano, a razão e a emoção,
quais muitos eram amigos e aliados dos o espiritual e o carnal, vida e morte,
portugueses, e vassalos de Vossa Majestade, medievalismo e Renascimento.
tudo contra a disposição da lei que • Literatura baseada em antíteses, paradoxos,
veio naquele ano a este Estado, e tudo inversões sintáticas (hipérbatos)
mandado obrar pelos mesmos que tinham e exageros (hipérboles)
maior obrigação de fazer observar a mesma que expressam a angústia existencial
lei; e também não houve castigo: e não barroca.
só se requer diante de Vossa Majestade a • Predominância de duas tendências,
impunidade destes delitos, senão licença que se interpenetram: cultismo (rebuscamento
para os continuar! (...) Dirão porventura formal, jogo sensorial
(como dizem) que destes cativeiros, na de palavras) e conceptismo (sofisticação
forma em que se faziam, depende a conservação no plano das idéias e argumentações
e aumento do Estado do Maranhão; paradoxais).
isto, Senhor, é heresia. Se por não
fazer um pecado venial, se houver de perder Autores e Obras
Portugal, perca-o Vossa Majestade e • Padre Antônio Vieira: maior orador
dê por bem empregada tão cristã e tão gloriosa sacro da língua, escreveu Sermões
perda; mas digo que é heresia, ainda (15 volumes, entre 1679-1718),
politicamente falando, porque sobre os História do Futuro (1718) e outras.
fundamentos da injustiça nenhuma cousa • Francisco Manuel de Melo: estudou
é segura nem permanente; e a experiência com os jesuítas e seguiu a carreira
o tem mostrado neste mesmo Estado do militar. Escreveu Carta de Guia
Maranhão, em que muitos governadores de Casados (1651), Cartas Familiares
adquiriram grandes riquezas e nenhum (1664), Obras Métricas (1665).
deles as logrou nem elas se lograram; nem • Padre Manuel Bernardes: escreveu
há cousa adquirida nesta terra que permaneça, Nova Floresta (5 volumes, 1706-
como os mesmos moradores dela 1728), Luz e Calor (1696).
confessam, nem ainda que vá por diante,
nem negocio que aproveite, nem navio que
aqui se faça que tenha bom fim; porque Arcadismo
tudo vai misturado com sangue dos pobres, O inicio do século XVIII é marcado
que está sempre clamando ao céu. pela decadência do pensamento barroco,
Este trecho pertence a uma carta e, cujos (atores básicos são: o exagero
também não pode se enquadrar como um da expressão barroca, que havia
cansado o público; a ascensão da burguesia
supera o domínio religioso; o surgimento dos centros urbanos. A natureza passa
das primeiras arcádias, enfatizando a ser, então, um refúgio ao homem
a pureza e a simplicidade. civilizado.
A palavra Arcadismo tem sua origem Sua preocupação prioritária era a
em Arcádia, uma antiga região da Grécia, de formular uma sociedade mais igualitária.
de relevo montanhoso, habitada por pastores Teve sua fundação no culto das
que conciliavam os seus trabalhos ciências, da razão e do progresso.
com a poesia, cantando o paraíso rústico De espírito reformista, o Arcadismo
em que viviam e simbolizando-o como pretende, reformular o ensino, os hábitos
uma terra de inocência e felicidade. e as atitudes sociais. Propunha a
O Arcadismo desenvolveu-se ao longo restauração da simplicidade na linguagem,
do século XVIII, influenciado pela Revolução abandonando as figuras de linguagem
Francesa, movimento revolucionário - antíteses, metáforas, paradoxos
de ideologia liberal burguesa, responsável - dando mais ênfase a uma linguagem
pela queda do absolutismo e da economia direta.
mercantilista e pela extinção do antigo sistema Em oposição aos artistas barrocos,
feudal. O Arcadismo ficou também conhecido que preferiam a fuga da realidade, o Arcadismo
por setecentismo (os anos 1700) valoriza o tempo presente.
e neoclassicismo e refletiu uma época que O artista árcade, além de tomar a
ficou conhecida como o Século das Luzes vida campestre e suas paisagens como
ou Iluminismo, movimento filosófico cujo modelos, incorpora, em suas obras, a
objetivo era o de defender a liberdade de mitologia, usando-se de deuses e heróis
pensamento e usar a razão como instrumento da história grega.
de análise e domínio da realidade.
Lutaram contra os excessos do Barroco e Resumidamente falando, podemos
defenderam uma arte racional e didática. citar diversas características da arte literária
Dentre os diversos pensadores iluministas, arcadista:
destacam-se: 1. volta aos modelos greco-romanos;
• Voltaire - possuidor de idéias filosóficas 2. predominam a razão e a ciência, em
e políticas, mostrou em suas primeiras oposição à fé e a religião;
obras seu estilo satírico e anticlerical, 3. há o retorno ao equilíbrio, reagindo
criticando ferozmente a Igreja de contra os preceitos barrocos quanto
sua época. Proclamou ódio pelas monarquias ao desequilíbrio;
absolutas e sua admiração 4. buscam a perfeição da forma;
pela monarquia liberal inglesa. Suas 5. procuram um estilo simples de linguagem,
principais obras foram: Édipo, A Henríada, despojando-o das metáforas
Cartas Filosóficas, Cândido ou e hipérboles deixadas pela estética
o Otimismo e o Dicionário Filosófico. anterior;
• Montesquieu - preocupado com a 6. utiiizam-se da natureza em suas poesias,
renovação, contribuiu com a idéia da tornando-as de aspecto bucólico
divisão de poderes como recurso e ingênuo;
para se evitar o autoritarismo. Em sua 7. dão ênfase à linguagem simples, porém,
obra Do Espírito das Leis, Montesquieu sem perder a sua nobreza;
defendeu a idéia de que cada 8. possuem uma tendência introspectiva;
um dos três poderes (Legislativo, 9. há o culto excessivo à natureza;
Executivo e Judiciário), deve estar 10. a linguagem torna-se melodiosa;
em mãos distintas. Em Cartas Persas 11. usam pseudônimos pastoris. Ex: Elmano
critica os costumes da sociedade. Sadino (Bocage).
• Rousseau - com sua teoria do bom
selvagem, defendeu a natureza virgem Este movimento chega a Portugal
e foi admirador do homem selvagem. em 1756 com a fundação da Arcádia
Desprezou o otimismo um tanto Lusitana e teve seu término em 1825,
ingênuo dos enciclopedistas. Afirmou com a publicação do poema Camões,
que as artes e as ciências tinham de Almeida Garret.
contribuído para o progresso Com o lema da Arcádia Lusitana de
da humanidade, mas também a corromperam. cortar as coisas inúteis, os árcades
Escreveu Discurso sobre passam a buscar, então, a simplicidade,
as Ciências e as Artes e Do Contrato a linguagem mais clara, a metrificação
Social. Posteriormente, deu ênfase simples e o uso de versos brancos (sem
à importância da Educação, com rima).
sua obra Emílio. Permanece a presença da mitologia
Inspirados nestes pensadores e greco-romana e há uma restauração
suas teorias, os árcades voltam-se para de alguns escritores como Virgílio,
a natureza em busca de uma vida simples, Horácio, Teócrito, Camões e Sá de Miranda.
bucólica e pastoril, fugindo, assim, Com o governo de Marquês de Pombal,
há em Portugal uma preocupação em traços estilísticos imitam os de Camões.
modernizar a sociedade portuguesa e expulsar Nesta obra, o herói é Diogo Álvares
os jesuítas do sistema educacional Correia e a obra retrata a subordinação
português. Daí o Marquês de Pombal ser do índio ao colonialismo europeu.
conhecido como déspota esclarecido.
Canto VI
Resumidamente falando, podemos (...)
citar diversas características da arte literária Copiosa multidão da nau francesa
arcaica: Corre a ver o espetáculo
1. Volta aos modelos greco-romanos [assombrada;
e à arte camoniana. E ignorando a ocasião da estranha
2. Predominam a razão e a ciência, em [empresa,
oposição à fé e a religião. Pasma da turba feminil, que nada:
3. Há o retorno ao equilíbrio, reagindo Uma, que às mais precede em
contra os preceitos barrocos quanto [gentileza,
ao desequilíbrio. Não vinha menos bela, do que
4. Buscam a perfeição da forma. [irada:
5. Procuram um estilo simples de linguagem, Era Moema, que de inveja geme,
despojando-se das metáforas E já vizinha à nau se apega ao leme
e hipérboles deixadas pela estética (...)
anterior. Perde o lume dos olhos, pasma e
6. Utilizam-se da natureza em suas poesias, [treme,
tornando-as de aspecto bucólico Pálida a cor, o aspecto moribundo,
e ingênuo. Com mão já sem vigor, soltando o
7. Dão ênfase à linguagem simples, porém, [leme,
sem perder a sua nobreza. Entre as salsas escumas desce ao
8. Possuem uma tendência introspectiva. [fundo:
9. Há o culto excessivo à natureza (rococó). Mas na onda do mar, que irado
10. A linguagem torna-se melodiosa. [freme,
11. Usam pseudônimos pastoris. Ex: Bocage Tornando a aparecer desde o
(Elmano Sadino). [profundo:
"Ah! Diogo cruel!" disse com mágoa,
Podemos destacar, como principais e sem vista ser, sorveu-se n'água.
autores:
Ricardo Reis
Álvaro de Campos
(1887 - ? )
Buscando o mínimo de dor ou gozo, (1890-?)
Bebendo a goles os instantes Voltado para o futurismo, procura
[frescos, expressar o mundo moderno. É considerado
Translúcidos como água o poeta do "não".
Em taças detalhadas, Eia comboios, eia pontes, eia
(...) [hotéis à hora do jantar
Pouco tão pouco pesará nos braços Eia aparelhos de todas as espécies,
Com que, exilados das supernas [férreos, brutos, mínimos,
[luzes, Instrumentos de precisão,
Escolhermos do que fomos [aparelhos de triturar, de cavar,
O melhor pra lembrar Engenhos, brocas, máquinas
Quando, acabados pelas Parcas, [rotativas!
[formos, Eia! Eia! Eia!
Vultos solenes de repente antigos, Eia eletricidade, nervos doentes de
E cada vez mais sombras, [Matéria!
Ao encontro fatal Eia telegrafia-sem-fios, simpatia
Do barco escuro no soturno rio, [metálica do Inconsciente!
E os nove abraços do horror estígio, Eia túneis, eia canais, Panamá,
E o regaço insaciável [Kiel, Suez!
Da pátria de Plutão. Eia todo o passado dentro do
"Para ser grande, sê inteiro: nada [presente!
Teu exagera, ou exclui, Eia todo o futuro já dentro de nós!
Sê todo em cada coisa. Põe quanto Eia!
[és Eia! Eia! Eia!
No mínimo que fazes. Para a beleza disto totalmente
Assim em cada lago a lua toda [desconhecida dos antigos.
Brilha, porque alta vive. Ó rodas, é engrenagens, r-r-r-r-r-r
[eterno! [das pequenas coisas ridículas, eu
Forte espasmo retido dos [verifico que não tenho por nisto
[maquinismos em fúria! [tudo neste mundo.
Em fúria fora e dentro de mim, Toda a gente que eu conheço e que
Por todos os meus nervos [fala comigo
[dissecados fora, Nunca teve um ato ridículo, nunca
Por todas as papilas fora de tudo [sofreu enxovalho,
[com que eu sinto! Nunca foi senão príncipe - todos
Tenho os lábios secos, ó grandes [eles príncipes - na vida...
[ruídos modernos, Quem me dera ouvir de alguém a
De vos ouvir demasiadamente de [voz humana
[perto, Que confessasse não um pecado,
E arde-me a cabeça de vos querer [mas uma infâmia;
[cantar com um excesso Que contasse, não uma violência,
De expressão de todas as minhas [mas uma cobardia!
[sensações, Não, são todos o ideal, se os ouço
Com um excesso contemporâneo [e me falam.
[de vós, ó máquinas!" Quem há neste largo mundo que me
Podemos observar o fluxo das idéias, [confesse que uma vez foi vil?
o vigor do verso livre (sem rima e Arre, estou farto de semideus!
sem métrica regular), além da expressividade Onde é que há gente no mundo?
da linguagem coloquial. O poeta Então sou só eu que é vil e errôneo
retrata a civilização industrial (lâmpadas, [nesta terra?
rodas, engrenagens). Poderão as mulheres não os terem
[amado,
Poema em linha reta Podem ter sido traídos - mas
Nunca conheci quem tivesse [ridículos nunca!
[levado porrada. E eu, que tenho sido ridículo sem
Todos os meus conhecidos tem sido [ter sido traído,
[campeões em tudo. Como eu posso falar com os meus
[superiores sem titubear?
Ode triunfal Eu, que tenho sido vil, literalmente
(fragmento) [vil,
"À dolorosa luz das grandes lâmpadas Vil no sentido mesquinho e infame
elétricas da fábrica [da vileza.
Tenho febre e escrevo. Podemos observar neste poema o
Escrevo rangendo os dentes, fera uso de verso livre, repleto de linguagem
[para a beleza disto, coloquial e de estrofação irregular. Além
E eu, tantas vezes reles, tantas destas observações, podemos salientar
[vezes porco, tantas vezes vil, a enumeração de elementos, a listagem
Eu tantas vezes irrespondivelmente livre e descontínua de idéias, típicos
[parasita, da poesia moderna.
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido Fernando Pessoa
[paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho ele-mesmo
[ridículo, absurdo, Mensagem
Que tenho enrolado os pés A obra Mensagem mostra poemas
[publicamente nos tapetes das organizados de forma a compor uma
[etiquetas, epopéia fragmentária, pois o conjunto
Que tenho sofrido enxovalhos e dos textos líricos acaba formando um
[calado, elogio de teor épico a Portugal. Traçando
Que quando não tenho calado, a história do seu país, Pessoa envereda
[tenho sido mais ridículo ainda; por um nacionalismo místico de
Eu, que tenho sido cômico às caráter sebastianista.
[criadas de hotel, O livro está dividido em três partes:
Eu, que tenho sentido o piscar de "Brasão", "Mar português" e "O Encoberto".
[olhos dos moços de fretes, Na primeira, conta-se a história
Eu, que tenho feito vergonhas das glórias portuguesas; na segunda,
[financeiras, pedido emprestado são apresentadas as conquistas marítimas
[sem pagar, de Portugal; por último, é apresentado
Eu, que, quando a hora do soco o mito sebastianista, um retorno de
[surgiu, me tenho agachado Portugal às épocas de glória. A primeira
Para fora da possibilidade do soco; parte de Mensagem, "Brasão", se estrutura
Eu, que tenho sofrido a angústia como o brasão português, que é
formado por dois campos: um apresenta Pela visão que a alma tem!
sete castelos, o outro, cinco quinas. E assim, passados os quatro
No topo do brasão estão a coroa e o Tempos do ser que sonhou,
timbre, que apresenta o grifo, animal mitológico A terra será teatro
que tem cabeça de leão e asas Do dia claro, que no atro
de águia. Assim dividem-se os poemas Da erma noite começou.
desta parte, remetendo-nos ao brasão Grécia, Roma, Cristandade,
de Portugal. Versam sobre as grandes Europa - os quatro se vão
figuras da história de Portugal, desde Para onde vai toda a idade.
Dom Henrique, fundador do Condado Quem vem viver a verdade
Portucalenses, passando por sua esposa, Que morreu D. Sebastião?
Dona Tareja, e seu filho, primeiro
rei de Portugal, Dom Afonso Henriques O Mar Portuguez
vão ainda até o infante Dom Henrique, "Ó mar salgado, quanto do teu sal
fundador da Escola de Sagres e grande São lágrimas de Portugal!
fomentador da expansão ultramarina Por te cruzarmos, quantas mães
portuguesa, e Afonso de Albuquerque, [choraram,
dominador português do Oriente; até o Quantos filhos em vão rezaram!
mito de Ulisses, que teria fundado a cidade Quantas noivas ficaram por casar
de Ulissepona, depois Lisboa, é Para que fosses nosso, ó mar!
apresentado: Valeu a pena? Tudo vale a pena
"O mito é o nada que é tudo. Se a alma não é pequena.
O mesmo sol que abre os céus Quem quer passar além do Bojador
É um mito brilhante e mudo." Tem que passar além da dor.
A segunda parte, "Mar português", Deus ao mar o perigo e o abismo
apresenta as principais etapas da expansão [deu.
ultramarina que levaram Portugal Mas nele é que espelhou o céu".
a ocupar um lugar de destaque no
mundo durante os séculos XV e XVI: D. Sebastião, Rei de Portugal
"E ao imenso e possível oceano "Louco, sim, louco, porque quis
Ensinam estas Quinas, que aqui vês, [grandeza
Que o mar com fim será grego ou qual a Sorte a não dá.
[romano: Não coube em mim minha certeza;
O mar sem fim é português." Por isso coube o areal está
Já a última parte, "O Encoberto", Ficou meu ser que houve, não o
apresenta o misticismo em torno da figura [que há.
de Dom Sebastião, rei de Portugal, Minha loucura, outros que me a
cuja frota foi dizimada em ataque aos [tomem
mouros em 1578. Muitas previsões, Com o que nela ia.
como a do sapateiro Bandarra e a do Sem a loucura que é o homem
padre Antônio Vieira, prevêem o retorno Mais que a besta sadia,
de Dom Sebastião para resgatar o Cadáver adiado que procria?
poderio de Portugal, criando o Quinto Podemos reparar na obra de Fernando
Império e marcando a supremacia de Pessoa - Mensagem- temas históricos
Portugal sobre o mundo: portugueses: as conquistas marítimas
"Grécia, Roma, Cristandade, e D. Sebastião. Os dois poemas
Europa, os quatro se vão apresentam um tom filosófico, épico,
Para onde vai toda idade. heróico. A aventura portuguesa é apresentada
Quem vem viver a verdade de modo transfigurado. As rimas
Que morreu dom Sebastião?" apresentam-se regulares e há a
presença de rimas.
O Quinto Império
Triste de quem vive em casa,
Contente com seu lar, Florbela de Alma da
Sem que um sonho, no erguer de asa, Conceição Espanca
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar! (1894-1930)
Triste de quem é feliz! Nasceu em Vila Viçosa e realizou
Vive porque a vida dura. seus estudos secundários em Évora,
Nada na alma lhe diz onde começou a escrever seus poemas.
Mais que a lição da raiz Seu temperamento forte misturase
Ter por vida a sepultura. com sua sensibilidade poética, a qual
Eras sobre eras se somem é demonstrada de forma firme, sentimental,
No tempo em que as eras vêm. transparente e vigorosa, diante
Que as forças cegas se dormem dos acontecimentos de sua vida.
Muito infeliz nos seus casamentos, deprimida Sou talvez a visão que Alguém
diante da reação da critica, [sonhou,
Florbela demonstrou claramente as fases Alguém que veio ao mundo pra
dos problemas existenciais que [me ver
sentia: angústias, decepções, desvalorização, E que nunca na vida me encontrou!
tristezas, mágoas, numa Espanca, Florbela. In. Antologia da poesia portuguesa.
época repressora, machista e severa Porto: Lello & Irmão, 1977. v.2.
com o sexo feminino. Em 1919 estudou Expressa seus anseios e angústias
na Faculdade de Direito, em Lisboa, publicando diante de si mesma.
seu primeiro livro -Mágoas. Em
profundo estado de depressão, totalmente Noitinha
abatida e doente, afastou-se de A noite sobre nós se debruçou...
uma v e z do convívio social com o consolo Minha alma ajoelha, Põe as mãos e
e a amizade de alguns poucos [ora!
amigos. Em 1939, faleceu enquanto O luar, pelas colinas, nesta hora,
dormia pelo excesso de barbitúricos. É a água dum gomil que se
Suas principais obras foram; Mágoas, [entornou...
Sóror saudades, Reliquial, Charveca Não sei quem tanta pérola
em Flor, Máscaras do Destino e Domínio [espalhou!
Negro. Murmura alguém pelas quebradas
[fora...
Amar! Flores do campo, humildes, mesmo
Eu quero amar, amar perdidamente! [agora,
Amar só por amar: Aqui...além... A noite, os olhos brandos, lhes
Mais Este e Aquele, o Outro e toda [fechou...
[a gente... Fumo beijando o côlmo dos casais...
Amar! Amar! E não amar ninguém! Serenidade idílica de fontes,
Recordar? Esquecer? Indiferente!... E a voz dos rouxinóis nos
Prender ou desprender? É mal? [salgueirais...
[É bem? Tranqüilidade... calma... anoitecer...
Quem disser que se pode amar Num êxtase, eu escuto pelos
[alguém [montes
Durante a vida inteira é porque mente! O coração das pedras a bater...
Há uma primavera em cada vida: Expressa sua solidão e o vazio constante
É preciso cantá-la assim florida, em sua vida.
Pois se Deus nos deu voz, foi pra
[cantar!
E se um dia hei de ser pó, cinza e Mário de Sá-Carneiro
[nada
Que seja a minha noite uma
(1890 - 1916)
[alvorada, Sá-Carneiro nasceu em Lisboa, em
Que me saiba perder...pra me 1890. Ficou órfão de mãe aos dois anos
[encontrar... de idade. Em 1912 seguiu para Paris,
Expressa a vontade, o desejo e o intentando cursar Direito. Nesse mesmo
anseio de ter alguém que a fizesse feliz. ano publicou Princípios e iniciou sua
produção poética. Retornou a Lisboa,
em férias, e juntou-se ao grupo que lançou
Eu Orpheu, em 1915. Nesse mesmo
Eu sou a que no mundo anda ano publica Dispersão e A Confissão
[perdida de Lúcio. Retornou a Paris, onde sérios
Eu sou a que na vida não tem norte, problemas financeiros o levaram à depressão
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte e finalmente ao suicídio, em
Sou a crucificada... a dolorida... abril de 1916.
Sombra de névoa tênue e Dedicou-se à prosa, à poesia e ao
[esvaecida, teatro. Os seus personagens são geralmente
E que o destino amargo, triste e voltados para si mesmos, com
[forte, a personalidade em desagregação, buscando
Impele brutalmente para a morte! um outro no seu próprio interior
Alma de luto sempre que viesse a completá-los.
[incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém
[vê... Dispersão
Sou a que chamam triste sem Perdi-me dentro de mim
[o ser... Porque eu era labirinto,
Sou a que chora sem saber E hoje, quando me sinto,
[por quê... É com saudades de mim.
Passei pela minha vida Sereia louca que deixou o mar;
Um astro doido a sonhar. Sou templo prestes a ruir sem deus,
Na ânsia de ultrapassar, Estátua falsa ainda erguida ao ar...
Nem dei pela minha vida...
Para mim é sempre ontem, Último Soneto
Não tenho amanhã nem hoje: Que rosas fugitivas foste ali:
O tempo que aos outros foge Requeriam-te os tapetes - e
Cai sobre mim feito ontem. [vieste...
(o Domingo de Paris - Se me dói hoje o bem que me
Lembra-se o desaparecido [fizeste,
Que sentia comovido É justo, porque muito te devi.
Os Domingos de Paris: Em que seda de afagos me envolvi
Porque um domingo é família, Quando entraste, nas tardes
É bem-estar, é singeleza, [que apareceste -
E os que olham a beleza Como fui de percal quando me
Não têm bem-estar nem família). [deste
O pobre moço das ânsias... Tua boca a beijar, que remordi...
Tu, sim, tu eras alguém! Pensei que fosse o meu o teu
E foi por isso também [cansaço -
Que te abismaste nas ânsias. Que seria entre nós um longo
A grande ave doirada [abraço
Bateu asas para os céus, O tédio que, tão esbelta, te
Mas fechou-as saciada [curvava...
Ao ver que ganhava os céus. E fugiste... Que importa ? Se
Como se chora um amante, [deixaste
Assim me choro a mim mesmo: A lembrança violeta que animaste
Eu fui amante inconstante Onde a minha saudade a Cor se
Que se traiu a si mesmo. [trava?...
Não sinto o espaço que encerro Obras completas de Mário de Sá Carneiro ~ Poesias.
Nem as linhas que projeto: Lisboa: Ática, s.d. v.2, p.61-5
Se me olho a um espelho, erro -
Não me acho no que projeto. A Confissão de Lúcio
Regresso dentro de mim (resumo)
Mas nada me fala, nada! Lúcio vai estudar em Paris, acaba
Tenho a alma amortalhada. conhecendo o poeta Ricardo, que se
Sequinha, dentro de mim. torna seu grande amigo. Após dez meses
Não perdi a minha alma, de confidências, Ricardo, de forma
Fiquei com ela, perdida. inexplicável, volta a Portugal e eles
Assim eu choro, da vida, passam a se corresponder através de
A morte da minha alma. cartas. Lúcio também volta a Portugal
(...) e descobre que seu amigo havia se
casado com Marta. Passa, então, a freqüentar
Estátua Falsa a casa deles e descobre que
Só de ouro falso os meus olhos se Marta tem um amante. Lúcio sente ciúmes
[douram; e começa a investigar a vida particular
Sou esfinge sem mistério no dela, mas torturado pelas emoções
[poente. conflituosas, deixa Portugal e volta
A tristeza das coisas que não para Paris. Porém, logo tem que voltar
[foram para entregar a sua peça de teatro
Na minh'alma desceu veladamente. ao empresário. Reencontra o amigo,
Na minha dor quebram-se espadas que lhe confessa saber de toda a verdade
[de ânsia, a respeito de sua esposa, pois
Gomos de luz em treva se ele mesmo a enviava aos seus amigos
[misturam. para se relacionar. Se arrepende de
As sombras que eu dimano não ter feito tal coisa, pois queria que Marta
[perduram, amasse apenas Lúcio e não os demais.
Como Ontem, para mim, Hoje é Então, Ricardo leva o amigo até o
[distância. encontro de Marta e dá um tiro nela. O
Já não estremeço em face do fantástico da narrativa acontece no
[segredo; momento em que o corpo cai no chão,
Nada me aloira já, nada me aterra: pois já não é Marta (que desaparece
A vida corre sobre mim em guerra, aos olhos de Lúcio) e sim, o próprio
E nem sequer um arrepio de medo! Ricardo atingido pelo tiro que deu. Lúcio
Sou estrela ébria que perdeu os é acusado pelo crime e vai preso.
[céus, Após cumprir a pena, retira-se para o
interior e escreve a sua confissão, a
sua narrativa.
(1901-1969)
Em A Confissão de Lúcio, encontramos Suas obras são de estruturas abertas,
uma linguagem metafórica. Para que retratam o mundo psicológico
o próprio autor, esta obra pode ser vista dos personagens. Abrange a poesia, o
como um registro de sua vida pessoal. romance, o conto, o teatro e a crítica literária.
Aparece diversas vezes a problemática Seu romance Jogo da Cabra Cega
do corpo e da beleza física, com Ricardo é considerado o marco da prosa contemporânea.
desejando até ser mulher para ser belo. Aborda em suas obras a
Em vida, um dos problemas do autor era introspecção e sondagem dos conflitos
o seu corpo obeso, que o fazia sentir-se do homem em relação com o mundo. Retrata
ridículo e desprezível às mulheres. Dotado também o tema religioso com as oposições
de uma sensibilidade aguçada, que é entre o bem X mal, espírito X matéria,
levada ao delírio, capta as sensações Deus X diabo.
inusitadas e as coloca em um estilo brilhante
e luminoso, sugestivo e rico de Cristo
ambigüidade. Abusa de reticências para Quando eu nasci, Senhor! Já tu
criar sensação de insegurança, indecisão [lá estavas,
e impressão. A obra pode ser enquadrada Crucificado, lívido, esquecido.
no gênero fantástico, pois os Não respondeste, pois, ao meu
acontecimentos narrados pelo personagem [gemido,
principal Lúcio não podem ser explicados Que há muito tempo já que não
pelas leis naturais. Às vezes sugere [falavas...
que tudo é uma loucura, outras, afirma Redemoinhavam, longe, as turbas
que está lúcido e que tudo é verdade, [bravas,
mesmo que pareça absurdo. Podemos Alevantando ao ar fumo e alarido.
destacar algumas características da obra E a tua benta Cruz de Deus vencido,
abarcando a estética simbolista: obsessão Quis eu ergue-la em minhas mãos
da morte e do suicídio como únicas [escravas!
soluções; traz a marca da frustração; A turba veio então, seguiu-me
obsessão pelo amor pervertido ou sexualidade [os rastros;
ambígua, sempre balançando entre E riu-se, e eu nem sequer fui
a hetero e a homossexualidade (fictícia); [açoitado,
busca da identidade. Narrado em E dos braços da Cruz fizeram
primeira pessoa, a linguagem caracteriza [mastros...
uma narração subjetiva e de estado Senhor! Eis-me vencido e tolerado:
de inconsciência do eu-lírico. A narrativa Resta-me abrir os braços a teu lado,
começa pelo fim, quando o personagemnarrador E apodrecer contigo à luz dos
decide escrever sua confissão [astros!
através de flash-back, daí para frente
seguindo linearmente. O personagem Cântico negro
Ricardo de Loureiro é um desdobramento "Vem por aqui"- dizem-me alguns
do personagem Lúcio, que, por sua [com olhos doces,
vez, é desdobramento do autor. Nesta Estendendo-me os braços,
obra, a trama consiste na integração das [e seguros
duas personagens masculinas através De que seria bom que os ouvisse
da figura feminina - Marta. Quando me dizem: "vem por aqui"!
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos meus olhos, ironias e
[cansaços)
2ª geração E cruzo os braços,
(1927-1940) E nunca vou por ali...
Presencismo - artistas que participaram A minha glória é esta:
da revista Presença. No Presencismo, Criar desumanidade!
a literatura é viva, ou seja, há Não acompanhar ninguém
sinceridade. Há a desmistificação do real Com que rasguei o ventre a
e da realidade aparente das coisas, eliminação [minha Mãe.
da objetividade da ação, pois Não, não vou por aí! Só vou por onde
se mistura com o lado psicológico. Destacam- Me levam meus próprios passos...
se José Régio e Branquinho da Se ao que busco saber nenhum de
Fonseca. [vós responde,
Por que me repetis: "vem por aqui"?
Prefiro escorregar nos becos
José Régio [lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés espaço real, o castelo medieval sobre o
[sangrentos, mundo moderno, a noite sobre o dia. No final
A ir por aí... da narrativa, podemos perceber que a
Se vim ao mundo, foi realidade prevalece sobre o sonho. A linguagem
Só para desflorar florestas virgens, é simples, coloquial e as frases
E desenhar meus próprios pés são curtas, aproximando-se da oralidade.
[na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada. 3ª geração
(...)
RÉGIO, José. Poemas efe Deus e do diabo.
(1940 até os dias atuais)
8. ed. Porto; Brasília E d „ 1972. p. 3 1 . Nesse momento despontou o Neorealismo,
que apresenta uma literatura
engajada com os motivos sociais e políticos:
Branquinho da Fonseca ideais humanitários, homem sofrido e
marginalizado. É um movimento ideológico
(1905-1974) e eclético. Surgem obras que reproduzem
Sua principal obra foi a novela O a realidade vivida por seus autores. Destacam-
Barão, de linguagem simples e com núcleos se Alves Redol, Ferreira de Castro,
entrelaçados. A obra retrata reflexos Fernando Namora e Manuel da Fonseca.
inspirados na alma do povo, de forma
simples e objetiva.
110 - Alves Redol
O Barão
(1911 - 1969)
(resumo) Considerado como o introdutor do
O narrador encontra-se na Serra Neo- Realismo em Portugal, escreveu Gaibéus.
do Barroso, com uma professora, a qual
o apresenta ao Barão, que lhe desperta Gaibéus
uma primeira impressão negativa. Hospeda- (comentários)
se no castelo do Barão e este passa Gaibéus extrai personagens do povo
a lembrar de seu passado, principalmente e é uma obra que possui uma consciência
de sua grande paixão, nomeada muita clara da luta de classes. Relata-se o
apenas por "Ela", a Bela Adormecida. drama dos trabalhadores alugados (gaibéus),
O ambiente vai se intensificando de colhedores de arroz do Ribatejo. O
lirismo e embriaguez, de tom de confidência autor procura mostrar que a miséria do po-
e simpatia, confiança, até culminar bre provém da mesquinhez, da ganância
em mistério. dos poderosos. Preocupado em registrar o
O inspetor (o narrador) também apresenta destino trágico do trabalhador, Alves Redol
suas confidências ao Barão. Seu privilegia as massas anônimas em detrimento
enredo concentra-se na "viagem" do inspetor dos indivíduos. O despojamento
de si a si mesmo, através de um dos traços pessoais dos personagens
personagem fantástico, que lhe permite ilustra a alienação do homem, reduzido à
uma noite repleta de magia, regressando condição de besta de carga, sem consciência
à nobreza e à beleza de um mundo onírico dos motivos da sua degradação.
e poético.
Novela narrada em primeira pessoa,
com um personagem-narrador pertencente Ferreira de Castro
ao corriqueiro mundo moderno - o inspetor
de escolas - personagem sem nome,
(1898 - 1974)
adaptado ao capitalismo. Outra figura importante Dá inicio ao Neo-Realismo com a
é a do Barão, também sem nome, obra A Selva.
oposto ao inspetor, por representar o mundo
intuitivo e nostálgico, mas sem perder o A Selva
lirismo. Temos na narrativa a presença da (comentários)
personagem Idalina, criada e, ao que tudo A Selva reproduz a vida do próprio
indica, amante do Barão, mulher autoritária autor: a vida no seringal da Amazônia. O
que faz do seu senhor um escravo. Em relação personagem Alberto reflete a dura vida
ao tempo da narrativa, há uma reciprocidade dos seringueiros, compara-a mentalmente
entre o presente (sociedade com a vida dos aldeãos de sua pátria;
moderna), representado pelo inspetor-o retrata a triste condição de vida dos trabalhadores
dia; e o passado medieval representado dos seringais. A obra apresenta
pela figura do Barão - a noite, no qual um a vida cruel dos seringueiros e comove
vem a completar o outro, formando uma só a sociedade da época pela realidade
pessoa, um só tempo. Quanto ao espaço, que apresenta.
prevalece o do sonho, da fantasia sobre o
quanto as outras a achavam já diferente,
Fernando Namora quanto lhe notavam o emagrecimento ou a
(1919-1989) palidez. Mas era sobre mim que incidia
Situa-se entre o Presencismo e o mais vezes a sua alertada acuidade: em
Neo-Realismo. Preocupa-se com os deserdados, todos os estremecimentos da minha face
ou seja, com a classe social entediada de médico, ela descobria, ou julgava
média e baixa. descobrir, os agouros da sua ruína.
Em Domingo à Tarde (1961), Fernando Era inútil, aliás, prolongar o Ludíbrio.
Namora defende as propostas Ainda que baralhássemos na mesma enfermaria
neo-realistas, retratando conflitos íntimos. doentes com moléstias e prognósticos
A obra procura relatar situações dramáticas diferentes, e zelássemos por que nenhum
e trágicas de gente simples e sofredora. deles pudesse averiguar a natureza
O personagem central é um médico da sua doença, a verdade escorria não se
que trata dos doentes incuráveis. A personagem sabia donde, um fio de água sub-reptício
que desencadeia o romance é que, de súbito, encharcava o ambiente.
Clarisse (doente incurável). Jorge é um Qualquerdeles, ao fim de algum tempo, percebia
homem pouco social, um tanto agressivo, que, sendo apontado pelos outros
que mal se relaciona com os colegas de trabalho; como meu doente, essa identificação equivalia
representa o homem em situação a um ferrete. O rebanho marcado. Reagiam,
conflitiva com seu meio, com sua época. então, de muitos modos: violência,
Vemos no romance a transformação pânico, misticismo, náusea, raramente com
que as situações vividas operam na heroísmo e nunca com resignação. Muitos
sua personalidade. Jorge, no final da narrativa, saíam do hospital ou desapareciam da consulta
é um homem transformado pelo e, durante semanas, meses, misturavam-
sofrimento e pela força do amor (personagem se freneticamente no convívio dos outros,
itinerante). os de lá de fora, os que continuavam a
viver, para lhes enfiar pelos olhos dentro
Domingo à tarde que estavam vivos também. Era preciso
(fragmentos) que os outros não os distinguissem pelo
Por esse tempo, ou já muito antes, horror ou pela compaixão, não os distinguissem
comecei a ser considerado um tipo fosse pelo que fosse, que não os
insociável. Fumava desalmadamente, diferenciassem de ninguém. Era preciso
macerando o cigarro de um canto para que a estima dos familiares, dos amigos ou
o outro da boca, num jeito nervoso de simples companheiros de acaso não tivesse
nada fácil de imitar, roendo a todo momento uma condescendência lamuriosa a
qualquer danação íntima que se justificá-la, para que essa vida fosse autêntica,
traduzia nos modos com que fazia crer verídica, e não o fruste delírio de um moribundo.
às pessoas que a presença delas me Era tão urgente o amor dos outros!
era insuportável. Tudo me servia para Por isso os cortejavam, subornando-os,
exagerar a brusquidão, talvez porque atiçando-lhes capciosamente o interesse,
toda a gente reparasse nela e a censurasse, a presença, o diálogo ou um arremedo desse
e a minha rebeldia agreste amor. A simulação, por último, bastava,
contra fosse lá o que fosse manifestava- comoatemura das meretrizes. Lembro-me,
se, provocante, tanto mais quanto por exemplo, daquela velhota ricaça que eu
outros a receavam. Era eu a ajudálos internara numa clínica. No último Natal oferecera
ao espetáculo, a colocar-me no centenas de presentes. Escrevia
centro desta arena improvisada que é montes de cartas, todos os dias, mesmo a
a vida... nos outros não admitia, pois é desconhecidos. O importante era que viessem
o riso o que particularmente me ofende agradecer-lhe, vê-la, que, durante alguns
nos medíocres. Poderiam, enfim, minutos, ao pensarem nela, a fizessem
julgar-me um esnobe ou um torturado viva. Tinha um casal de criados já idosos;
- e nem eu, ao certo, o saberia também... obrigava-os a ficarem horas, de pé, ao
(cap. I, p.3) fundo da cama - dois macacos decrépitos,
(...) testemunhas de sua existência.
Quando esses doentes voltavam - e
Eu reparava que Clarisse era agora voltavam sempre -, tinham lido livros, consultado
um dos alvos preferidos dessa intriga melíflua outros médicos, e discutiam já as
e subterrânea. E ela também o sabia. notícias sobre novas e milagrosas drogas
No modo como observava as companheiras, para o seu caso, com que as gazetas lhes
acirradas, estou certo, por um instinto sacudiam a febre de persistir. Investigavamse
de desagravo social (pois não era Clarisse, a si próprios, procurando os ardis sob
entre elas, uma burguesinha a quem a que a morte se escondia e, lá no íntimo,
doença e o desespero iam amachucando esperavam
a soberba de classe?), via-se que procurava ser os primeiros a conseguir
todo o indício que pudesse dizer-lhe dominá-la. Os ardis não eram apenas da
doença. Eles também os teciam. Apercebiam- sabiam que era ali a sua casa. Um resto
se da vizinhança da morte, sentiam-lhe de palha da malhada forrava o chão térreo e
a voracidade e o cheiro, mas, inexorável, cada ambulante acamara mais um molho de
só nos outros. A pérfida ameaça, presença feno, de urze, ou de trapos velhos. Ainda no
obcecante na vida de todos eles, como um domínio do saguão, em dois metros quadrados
punhal enquistado, e que, na sua injusta e de terreno roubados ao adro, os ciganos
medonha objetividade, se assimilava através arrumavam carroças e animais e expunham
da experiência em redor, não lhes dizia, sedas vermelhas ao pessoal da vila.
porém, individualmente respeito. No último
instante, cada um, de per si, conseguiria libertar-
se. Velada ou abertamente, falavamme Manuel da Fonseca
então dos tais fabulosos tratamentos -
até mos exigirem, e era-me mais cômodo (1911 - )
falsear-lhes as análises do que, como dantes, Escreveu Seara de Vento.
evitar que lhes caíssem sob os olhos.
(NAMORA, Fernando. Domingo à Tarde. Porto Alegre: Seara de Vento
Globo, 1963) (comentários)
A narrativa se inicia com a descrição
Casa da Malta do vento, anúncio de desgraças. Duas
(resumo) personagens, Júlia e Amanda Carrusca,
A narrativa inicia-se com o personagem dialogam com certa agressividade sobre
Abílio contando sobre suas andanças a situação precária em que vivem: estão
com o circo e o fim da companhia circense morrendo de fome. Amanda exige que sua
ao amigo Ricocas e este o leva à casa da filha Júlia convença o marido Antônio Valmurado,
malta, lugar onde pessoas que não tinham o Palma, a permitir que ambas
para onde ir se estabelecem por lá. Outros peçam esmola. Amanda, habilmente, diz
personagens são introduzidos na narrativa que é para curar Bento, um dos filhos do
e cada um com um passado trágico que casal, que é excepcional.
os levaram a morar na casa da malta. Todos O romance começa, pois, a partir de
vão relembrando o passado até o momento uma situação trágica.
do nascimento do bebê da cigana,
onde todos se confraternizam como se
fosse uma grande família. Resumo do Modernismo
A narrativa descreve as ações das Momento sócio-cultural
personagens socialmente desprivilegiadas • Proclamação da República (1910).
e perdidas num mundo de injustiças e miséria. • Tensão entre a pequena-burguesia
Podemos perceber claramente nesta radical que exigia reformas imediatas
obra a busca pela interioridade das personagens, e os moderados representados
através de suas lembranças, revelando pela alta burguesia.
suas angústias, dúvidas, numa • Reforma universitária (1911) e a criação
analise profunda de sentimentos e ralações da primeira faculdade de Letras,
humanas. Assim sendo, ao passo no Porto (decênio de 1920).
que traduz a individualidade do homem não • Primeira Guerra Mundial: Portugal fica
deixa de enquadrá-lo no seu meio social. A ao lado dos aliados, garantindo suas
ação se divide entre o tempo presente da colônias na África. Após a guerra,
narrativa (casa da malta) e os acontecimentos grave crise econômica.
passados na vida de cada um dos personagens, • 1926: Um golpe de Estado derruba a
possibilitando a compreensão República Parlamentar
de como chegaram até aquele casebre. A • 1933-1974: Período do estado Novo;
grande metáfora encontrada nesta obra é o instauração da ditadura.
humanismo, ou seja, há uma grande preocupação
com os valores representativos Características literárias
do ser humano. A solidariedade unindo esses • Negação sistemática e total do passado;
seres humanos se faz presente quando desejo de criar uma literatura
eles dividem entre si a comida, num jantar que expressasse o novo século.
de comemoração pelo nascimento da criança. • Fuga das tradições literárias; valorização
Dentre os personagens, todos com dificuldade da originalidade e da obra que
em se ajustará sociedade. possui características inéditas.
(fragmento) • Uso da linguagem coloquial.
... era uma espécie de saguão, colado • O Modernismo quer criticar os padrões
à forja do ferreiro. Em tempos servira de abrigo de bom gosto e causar escândalo.
às manadas de porcos da Granja; mas o • Uso dos conhecimentos da psicologia
patrão fora-se para a cidade, o portão de e da psicanálise.
castanho velho abrira feridas ao sol e às
chuvas das bandas do montado, e agora os Autores e obras
que vinham de longe para roubar, pedir, emigrar,
• Fernando Pessoa: o maior poeta portugueses mais lidos e traduzidos no
português do século. Ele-mesmo: estrangeiro. Em 1991, ganhou o Grande
English Poems (1921), Mensagem Prêmio APE, com o romance O Evangelho
(1934). Heterônimos ou personalidades Segundo Jesus Cristo; o Prêmio
poéticas: Alberto Caeiro: Camões em 1996 por toda sua obra; e
Poemas (1946); Ricardo Reis: em 1998 ganhou o Prêmio Nobel de Literatura.
Odes (1946), Poemas Dramáticos De Saramago destacamos as seguintes
(1952) e Álvaro de Campos: Poesias obras: Terra do Pecado, Os
(1944). Poemas Possíveis, Provavelmente Alegria,
• Mario de Sá-Carneiro: autor atormentado Deste Mundo e do Outro, A Bagagem
pela busca do eu. Escreveu do Viajante, As Opiniões que o DL
Princípio (1912), Dispersão teve, O Ano de 1993, Os Apontamentos,
(1914), A Confissão de Lúcio (1914). Manual de Pintura e Caligrafia,
• José Régio: Jogo da Cabra-Cega Objecto Quase, Poética dos Cinco Sentidos,
(1934), Fado (1941). A Noite, Levantado do Chão; Que
• Branquinho da Fonseca: O Barão Farei dom este Livro?, Viagem a Portugal,
(1943), Porta de Minerva (1947), Memorial do Convento, O Ano da
Mar Santo (1952), Mar Coalhado Morte de Ricardo Reis, A Jangada de
(1932). Pedra, A Segunda Vida de Francisco
• Adolfo Casais Monteiro: Sempre de Assis, História do Cerco de Lisboa,
e sem Fim (1936), Europa (1946). O Evangelho Segundo Jesus Cristo, In
• Alves Redol: Gaibéus (1940), Barranco Nomine Dei, Cadernos de Lanzarote,
de Cegos (1963). Ensaio sobre a Cegueira, Todos os Nomes,
• Ferreira de Castro: A Selva (1930), e A Caverna.
Terra Fria (1934), A Lã e a Neve
(1947), A Curva da Estrada (1950). O Evangelho Segundo Jesus Cristo
José Saramago: Terra do Pecado (comentários)
(1947), Manual de Pintura e Caligrafia Publicado pela primeira vez em novembro
(1977), Memorial do Convento de 1991, O Evangelho Segundo
(1982), A Jangada de Pedra Jesus Cristo causou muita polêmica.
(1986), O Evangelho Segundo Jesus Saramago foi acusado de investir
Cristo (1991), Todos os Nomes contra o cristianismo, de pretender dessacralizar
(1997), A Caverna (2000). Jesus Cristo, e, principalmente,
de interpretar o Novo Testamento de
A Narrativa do Pós- forma abusiva.
A opinião da crítica, que não levou
Guerra em conta essa pretensa tentativa de
Saramago de desvirtuar os Evangelhos,
A cultura sofreu uma revolução é que, ao ler-se essa obra, devemos
após 1940. Encontramos, então, a literatura considerar que tudo não passa de artifício
comercial dos best-sellers, opondo- literário, de invenção.
se às narrativas pós 2- Guerra Mundial. O Vaticano criticou duramente a
Destacam-se José Saramago com obra, que não foi inscrita pelo governo
Memorial do Convento, José Cardoso português em um importante prêmio literário
Pires com Hóspede de Jô e Adolfo Correia europeu, fato que precipitou a
da Rocha com A Criação do Mundo. saída de Saramago do país, passando
a residir nas Ilhas Canárias.
José Saramago
O ano da morte de Ricardo Reis
(1922 - ) A obra O Ano da Morte de Ricardo
José Saramago nasceu em Azinhaga, Reis, de José Saramago, tem como característica
no ano de 1922. Trabalhou como marcante a intertextualidade.
jornalista em vários jornais, entre eles o No título do livro, que resume o conteúdo
Diário de Lisboa, de que foi diretor, até básico e conduz o fio narrativo, podemos
partir e fixar-se definitivamente na ilha perceber a retomada de um dos heterônimos
de Lanzarote, arquipélago das Canárias. de Fernando Pessoa, Ricardo Reis,
A partir de 1975 passou a dedicar-se que, na obra, revela-se como narrador
integralmente à literatura, mas foi após onisciente, presente em todas as situações,
a publicação de Levantado do Chão revendo o passado, prevendo o
(1980) que passou a ser considerado futuro e, principalmente, tomando conhecimento
um grande nome da literatura em língua dos pensamentos e sentimentos
portuguesa contemporânea. passados no "eu" de cada personagem.
Declaradamente comunista e ateu, Na retomada de sua personalidade
suas convicções fizeram-no deixar Portugal. por Saramago, o personagem perde algumas
É considerado um dos escritores características básicas, motivo
de cobrança para Fernando Pessoa, que viagem a diferentes povoados ao redor
ressurge do mundo dos mortos: "você de Lisboa. A narrativa segue linear, sem
afinal desilude-me, amador de criadas, interrupções, vigorosa e rica. Saramago
cortejador de donzelas, estimava-o mais procura dar à linguagem o tom das crônicas
quando você via a vida à distância que históricas, reveste o vocabulário
está" (p. 183). de termos raros e realiza malabarismos
"gestos que parecem querer recompor sintáticos.
umas feições, restituí-las aos
seus lugares de nascença, refazer o (resumo)
desenho, mas o artista tomou a borracha O rei D. João V necessitava de herdeiros,
em vez do lápis, onde passou apagou, mas o ventre de D. Maria Ana
um lado da cara perdeu o contorno, não os concebia. Fez ele, então, uma
é natural, vai para seis meses que promessa de construir um convento em
Fernando Pessoa morreu." (p. 330) Mafra se a concepção ocorresse. Em
Podemos observar que, assim como paralelo, segue-se o registro da vida do
o poeta Fernando Pessoa (na perspectiva povo, primeiro enfocando o soldado que
fictícia) tem os seus contornos perdeu a mão esquerda na guerra contra
físicos dissipados ao longo do romance os espanhóis: Baltasar Sete-Sóis,
pelo decorrer dos nove meses de falecimento, que em um espetáculo da Inquisição,
tecendo um paralelo com o conheceu Blimunda, mulher de poderes
embrião humano que leva nove meses mágicos, que enxergava o interior das
para ser gerado, o seu heterônimo retomado pessoas e cuja mãe, por ter poderes
vai também dissipando a sua personalidade semelhantes, havia sido desterrada para
ao longo desse período: "Alguma Angola. Desafiando os rigores da religião,
latinação clássica de que já não ambos se "casam" através de um
fazia leitura regular" (p. 22) "formara, ritual de sangue. Baltasar torna-se ajudante
de enfiada, três versos de sete sílabas, do Padre Bartolomeu Lourenço,
redondilha maior, ele, Ricardo Reis, autor que, sob a proteção do rei, construía
de odes ditas sáficas ou arcaicas, uma máquina de voar, a passarola. Sob
afinal saiu-nos poeta popular." (p. 47). o signo da máquina de voar, unem-se
O Reis de Saramago deixa-se contagiar ideais: os cultos, representados pelo
pelas coisas mundanas, já não é padre Bartolomeu de Gusmão e pelo
tão coerente e objetivo. Surge Lídia, camareira músico Scarlatti, e os populares, ancorados
do Hotel Bragança com quem em Blimunda e Baltasar. Padre
ele mantém relações. Sua musa se Bartolomeu viaja, enlouquece e morre.
corporifica e ele deixa de "fruir o momento Blimunda, após o sumiço de Baltasar,
que passa" como espectador, passa a procurá-lo, encontrando-o nove
para realizá-lo carnalmente. Aparece anos depois em situação trágica.
também a personagem Marcenda, por (fragmento)
quem Ricardo Reis se apaixona, passando Levar este pão à boca é gesto fácil,
a espectador - aguarda a sua excelente de fazer se a fome o reclama,
presença de todos os meses, as cartas, portanto alimento do corpo, benefício
e por fim uma decisão de unir-se a do lavrador, provavelmente maior
ele, o que não se concretiza. benefício de alguns que entre a foice
Ao final do romance, Reis se deixa e os dentes souberam meter mãos de
contagiar totalmente pelos acontecimentos levar e trazer e bolsas de guardar, e
do mundo, quando chora a morte de esta é a regra. Não há em Portugal trigo
Daniel, irmão de Lídia: "E entra em casa, que baste ao perpétuo apetite que os
atira-se para cima da cama desfeita, portugueses têm de pão, parece que
escondeu os olhos com o antebraço para não sabem comer outra coisa, por isso
poder chorar à vontade, lágrimas absurdas os estrangeiros que cá moram, doridos
que esta revolta não foi sua, das nossas necessidades, que em maior
sábio é o que se contenta com o espetáculo volume frutificam que sementes de
do mundo." (p. 411). abóbora, mandam vir, das suas próprias
e outras terras, frotas de cem navios
Memorial do Convento carregados de cereal, como estes que
Um dos romances mais conhecidos entraram agora Tejo adentro, salvando
de José Saramago é Memorial do Convento à torre de Belém e mostrando ao governador
(1982), classificado como narrativa dela os papéis do uso, e desta
histórica, pois retrata aproximadamente vez são mais de trinta mil moios de pão
30 anos da História de Portugal que vêm da Irlanda, e é a abundância
(época da Inquisição). Nesta obra podemos tal, fome que finalmente deu em fartura,
encontrar um cenário rico, registrando enquanto em fome se não tornar, que,
não só o fato histórico, mas achando-se cheias as tercenas e também
reconstituindo a vivência popular, numa já os armazéns particulares, andam
por aí a alugar depósitos por todo o escolheu, Qual quê, o Senhor ia só a
dinheiro, e põem escritos nas portas da passar, quem estivesse a olhar tê-lo-ia
cidade para que conste às pessoas que percebido pela cor do céu, mas reparou
os tiverem para alugá-los, com que desta que tu e José eram gente robusta e saudável,
vez se vão arrepelar os que mandaram e então, se ainda te lembras de
vir o trigo, obrigados pelo excesso como estas necessidades se manifestavam,
a baixar-lhe o preço, tanto mais que se apeteceu-lhe, o resultado foi,
fala em próxima chegada de uma frota nove meses depois, Jesus, E há a certeza,
da Holanda carregada do mesmo gênero, o que se chame certeza, de que
mas desta virá a saber-se que a assaltou tenha sido mesmo a semente do Senhor
uma esquadra francesa quase que engendrou o meu primeiro filho, Bom,
na entrada da barra, e assim o preço, a questão é melindrosa, o que tu estás a
que ia baixar, não baixa, se for preciso pretender de mim é, sem tirar nem pôr,
deita-se fogo a um celeiro ou dois, mandando uma investigação de paternidade, quando
em seguida apregoar a falta que a verdade é que, nestes conúbios
o trigo ardido já está fazendo, quando mistos, por muitas análises, por muitos
julgávamos que havia tanto e de sobra. testes, por muitas contagens de glóbulos
São mistérios mercantis que os de fora que se façam, certezas nunca as podemos
ensinam e os de dentro vão aprendendo, ter absolutas, Pobrezinha de mim,
embora estes sejam ordinariamente que cheguei a imaginar, ouvindo-te, que
tão estúpidos, de mercadores falamos, o Senhor me havia escolhido para ser a
que nunca mandam vir eles próprios as sua esposa naquela madrugada, e afinal
mercadorias das outras nações, antes foi tudo obra de um acaso, tanto poderá
se contentam com comprá-las aqui aos ser que sim como poderá ser que
estrangeiros que se forram da nossa não, digo-te até que melhor seria não
simplicidade e forram com ela os cofres, teres descido aqui na Nazaré para vires
comprando a preços que nem sabemos deixar-me nesta dúvida, aliás, se queres
e vendendo a outros que sabemos que te fale com franqueza, um filho
bem de mais, porque os pagamos do Senhor, mesmo tendo-me a mim como
com língua de palmo e a vida palmo a mãe, dávamos por ele logo ao nascer, e
palmo. quando crescesse teria, do mesmo Senhor,
o porte, a figura e a palavra, ora,
O Evangelho segundo Jesus Cristo ainda que se diga que o amor de mãe é
(fragmentos) cego, o meu filho Jesus não satisfaz as
Passados meses, numa chuvosa e condições, Maria, o teu primeiro grande
fria noite de inverno, um anjo entrou em engano é julgares que eu vim cá apenas
casa de Maria de Nazaré, e foi o mesmo para te falar desse antigo episódio da
que se não tivesse entrado ninguém, vida sexual do Senhor, o teu segundo
pois a família assim como estava assim grande engano é pensares que a beleza
se deixou ficar, só Maria deu pela chegada e a facúndia dos homens existem à
do visitante, que nem teria podido imagem e semelhança do Senhor, quando
ela dar-se por desentendida, uma vez o sistema do Senhor, digo-to eu que
que o anjo lhe dirigiu directamente a palavra, sou da casa, é ele ser sempre o contrário
e foi assim, Deves saber, ó Maria, de como os homens o imaginam, e,
que o Senhor pôs a sua semente de aqui muito em confidência, eu até acho
mistura com a semente de José na madrugada que o Senhor não saberia viver doutra
em que concebeste pela primeira maneira, a palavra que mais vezes lhe
vez, e que, por conseguinte e consequência, sai da boca não é o sim, mas o não,
dela, da do Senhor, e não da Sempre ouvi eu dizer que o Diabo é que
do teu marido, ainda que legítimo, é que é o espírito que nega, se no teu coração
foi engendrado o teu filho Jesus. Ficou não deres pela diferença, nunca saberás
Maria muito assombrada com a notícia, a quem pertences, Pertenço ao Senhor,
cuja substância, felizmente, não se perdeu Pois é, dizes que pertences ao
na elocução confusa do anjo, e perguntou, Senhor e caíste no terceiro e maior dos
Então Jesus é filho de mim e do enganos, que foi o de não teres acreditado
Senhor, Mulher, que falta de educação, no teu filho, Em Jesus, Sim, em Jesus,
deves ter cuidado com as hierarquias, nenhum dos outros viu Deus, ou
com as precedências, do Senhor e de alguma vez o verá, Diz-me, anjo do Senhor,
mim é que deverias dizer, Do Senhor e é mesmo verdade que meu filho
de ti, Não, do Senhor e de ti, Não me Jesus viu Deus, Sim, e, como uma criança
baralhes a cabeça, responde-me ao que que encontrou o seu primeiro ninho,
te perguntei, se Jesus é filho, Filho, o veio a correr mostrar-to, e tu, céptica, e
que se chama filho, é só do Senhor, tu, tu, desconfiada, disseste que não podia
para o caso, não passaste de ser uma ser verdade, que se ninho havia estava
mãe portadora, Então, o Senhor não me vazio, que se ovos tinha, eram goros, e
que se os não tinha, comera-os a serpente, dos centros de decisão para sabê-lo, e
Perdoa-me, meu anjo, por ter duvidado, agora adeus, fizeste as perguntas que
Agora não sei se estás a falar querias, talvez não tenhas feito alguma
comigo, ou com o teu filho, Com ele, contigo, que devias, mas isso é assunto que já
com ambos, que posso eu fazer não me diz respeito, Explica-me, Explica-
para emendar o mal feito, Que é que te te tu a ti própria. Com a última palavra,
aconselharia o teu coração de mãe, Que o anjo desapareceu e Maria abriu
fosse procurá-lo, dizer-lhe que creio os olhos. Todos os filhos dormiam, os
nele, pedir que me perdoe e volte para rapazes em dois grupos de três, Tiago,
casa, aonde o Senhor o virá chamar, em José e Judas, os mais velhos, a um canto,
chegando a hora, Francamente, não sei noutro canto os mais novos, Simão,
se vais a tempo, não há nada mais sensível Justo e Samuel, e com ela, uma de cada
do que um adolescente, arriscaste lado, como de costume Lísia e Lídia, mas
a ouvir más palavras e a levar com a os olhos de Maria, perturbados ainda
porta na cara, Se tal acontecer, a culpa pelos anúncios do anjo, arregalaram-se-
tem-na aquele demónio que o embruxou Ihe de repente, estarrecidos, ao ver que
e perdeu, nem sei como o Senhor, sendo Lísia estava toda descomposta, praticamente
pai, lhe consentiu tais liberdades, tanta nua, a túnica arregaçada por
rédea solta, De que demónio falas, Do cima dos seios, e dormia profundamente,
pastor com quem o meu filho andou durante e suspirava sorrindo, com o brilho de
quatro anos, a governar um rebanho um leve suor na testa e sobre o lábio
que ninguém sabe para que serve, superior, que parecia mordido de beijos.
Ah, o pastor, Conhece-lo, Andámos na Se não fosse a certeza de ter estado ali
mesma escola, E o Senhor permite que apenas um anjo conversador, os sinais
um demónio como ele perdure e prospere, mostrados por Lísia fariam gritar e clamar
Assim o exige a boa ordem do mundo, que um demónio incubo, desses que
mas a última palavra será sempre a acometem maliciosamente as mulheres
do Senhor, só não sabemos é quando a adormecidas, andara a fazer das suas
proferirá, mas vais ver que uma manhã no desprevenido corpo da donzela, enquanto
destas acordamos e descobrimos que a mãe se deixava distrair com a
não há mal no mundo, e agora devo irme, conversa, provavelmente foi sempre
se tens mais algumas perguntas a assim e nós que não o sabíamos, andarem
fazer, aproveita, Só uma, Óptimo, Para estes anjos aos pares para onde
que quer o Senhor o meu filho, Teu filho quer que vão, e enquanto um, para entreter
é uma maneira de dizer, Aos olhos do e fazer costas, se põe a contar
mundo Jesus é meu filho, Para que o histórias da Carochinha, o outro, calado,
quer, perguntas tu, pois olha que é uma opera o actus nefandus, maneira de
boa pergunta, sim senhor, o pior é que dizer, que nefando em rigor não é, tudo
não sei responder-te, a questão no estado indicando que na vez seguinte se trocarão
actual, é toda entre eles dois, e as funções e as posições para que
Jesus não creio que saiba mais do que não se perca, nem no sonhador nem no
a ti te terá dito, Disse-me que terá poder sonhado, o beneficioso sentido da dualidade
e glória depois de morrer, Dessa parte da carne e do espírito. Maria cobriu
também estou informado, Mas que irá a filha como pôde, puxando-lhe a
ele ter de fazer em vida para merecer túnica até à altura do que é impróprio
as maravilhas que o Senhor lhe prometeu, estando descoberto, e, quando a teve
Ora, ora, tu crês, ignorante mulher, decente, acordou-a e perguntou-lhe em
que essa palavra exista aos olhos do voz baixa, por assim dizer à queimaroupa,
Senhor, que possa ter algum valor e significado Que estavas a sonhar. Apanhada
o que presunçosamente chamais de surpresa, Lísia não podia mentir,
merecimentos, em verdade não sei respondeu que sonhara com um anjo,
que é que vos julgais, quando não passais mas que o anjo nada lhe dissera, apenas
de míseros escravos da vontade olhara para ela, e era um olhar tão
absoluta de Deus, Nada mais direi, sou meigo e tão doce que melhores não poderão
realmente a escrava do Senhor, cumpra- ser os olhares no paraíso. Não te
se em sim segundo a sua palavra, tocou, perguntou Maria, e Lísia respondeu,
diz-me só, depois de todos estes meses Ó minha mãe, os olhos não servem
passados, onde poderei encontrar para isso. Sem bem saber se devia tranquilizar-
o meu filho, Procura-o, que é a tua obrigação, se ou preocupar-se com o que
ele também foi à procura da ovelha se passara a seu lado, Maria, em voz
perdida, Para matá-la, Sossega, que ainda mais baixa, disse, Eu também sonhei
a ti não te matará, mas tu, sim, o matarás com um anjo, E o teu, falou, ou também
a ele, não estando presente na hora da esteve calado, perguntou Lísia, inocentemente,
sua morte, Como sabes que não morrerei Falou para me dizer que
eu primeiro, Estou bastante próximo teu irmão Jesus dissera a verdade quando
nos anunciou que tinha visto Deus, criam uma poesia intimista, mas simultaneamente
Ai, minha mãe, que mal fizemos então, preocupada com o destino pessoal
não acreditamos na palavra de Jesus, e e coletivo, adotando um tom de protesto
ele tão bom, que, de zangado, até podia contra as injustiças e arbitrariedades
ter levado o dinheiro do meu dote, e não do mundo. O número de autores e
o fez, Agora temos de ver como o remediaremos, correntes tornou-se muito grande.
Não sabemos onde está, notícias
não deu, o anjo é que bem podia
ter ajudado, sabem tudo, os anjos, Pois
não, não ajudou, só me disse que procurássemos
o teu irmão, que era esse o
nosso dever, Mas, ó minha mãe, se afinal
foi verdade que o mano Jesus esteve
com o Senhor, então a nossa vida,
daqui por diante, vai ser diferente, Diferente,
talvez, mas para pior, Porquê, Se
nós não acreditámos em Jesus nem na
sua palavra, como esperas que os outros
acreditem, com certeza não quererás
que vamos aí pelas ruas e praças
de Nazaré a apregoar Jesus viu o Senhor
Jesus viu o Senhor, seríamos corridas
à pedrada, Mas o Senhor, visto
que o escolheu, nos defenderia, que
somos a família, Não estejas tão certa
disso, quando o Senhor fez a sua escolha,
nós não estávamos lá, para o Senhor
não há pais nem filhos, lembra-te
de Abraão, lembra-te de Isaac, Ai, mãe,
que aflição, O mais prudente, filha, é
guardarmos estas coisas nos nossos
corações e falarmos delas o menos possível,
Então, que faremos, Amanhã mandarei
Tiago e José a procurar Jesus,
Mas onde, se a Galileia é imensa, e a
Samaria, se para lá foi, oua Judeia, ou a
Idumeia, que essa está no cabo do mundo,
O mais provável é teu irmão ter ido
para o mar, recorda-te do que ele nos
disse quando veio, que tinha andado com
uns pescadores, E não teria antes voltado
para o rebanho, Esse tempo acabou,
Como sabes, Dorme, que a manhã
ainda vem longe, Pode ser que tomemos
a sonhar com os nossos anjos,
Pode ser. Se o anjo de Lísia, acaso tendo
fugido à companhia do parceiro, veio
habitar-lhe outra vez o sono, não se
chegou a perceber, mas o anjo do anúncio,
mesmo se se esqueceu de algum
pormenor, não pôde voltar, porque Maria
esteve sempre de olhos abertos na
meia escuridão dacasa, o que sabia
sobrava-lhe, o que adivinhava temia".
A Poesia do Pós-
Guerra
O período pós-Segunda Guerra Mundial
foi de tristeza e desencanto; o continente
europeu ficou profundamente marcado
pelo conflito mundial. Foi a época da
Guerra Fria e da ameaça de Guerra Nuclear.
Mediante esses fatos, os poetas
3.(UFMT) Sobre literatura, gênero
e estilos literários, pode-se dizer
que:
a) tanto no verso quanto na prosa pode
haver poesia.
Questões de b) todo momento histórico apresenta um
conjunto de normas que caracteriza
vestibulares suas manifestações culturais, constituindo
o estilo da época.
c) o texto literário é aquele em que predominam
1.(UFRS) O gênero dramático, entre a repetição da realidade,
outros aspectos, apresenta a linguagem linear, a unidade de
como característica essencial: sentido.
a) a presença de um narrador. d) no gênero lírico os elementos do mundo
b) a estrutura dialógica. exterior predominam sobre os do
c) o extravasamento lírico. mundo interior do eu poético.
d) a musicalidade.
e) o descritivismo. 4. (UFRS) Assinale a alternativa incorreta
com respeito ao Trovadorismo
2. (UFU-MG) Relacione as espécies em Portugal:
literárias ao lado com suas respectivas a) nas cantigas de amigo, o trovador escreve
características dispostas o poema do ponto de vista feminino.
abaixo e assinale a alternativa b) nas cantigas de amor, há o reflexo
correta: do relacionamento entre senhor e
I. Modalidade de texto literário que vassalo na sociedade feudal: distância
oferece uma amostra da vida e extrema submissão.
através de um episódio, um flagrante c) a influência dos trovadores provençais
ou instantâneo, um momento é nítida nas cantigas de amor
singular e representativo; galego-portuguesas.
possui economia de meios d) durante o trovadorismo, ocorre a separação
narrativos e densidade na construção entre poesia e música.
das personagens. e) muitas cantigas trovadorescas foram
II. À intensidade expressiva desse reunidas em livros ou coletâneas que
tipo de texto literário, à sua receberam o nome de cancioneiros.
concentração e ao seu caráter
imediato, associa-se, como traço 5. (PUC-RS) O paralelismo, uma técnica
estético importante, o uso do de construção literária nas
ritmo e da musicalidade. cantigas trovadorescas, consistiu
III. Essa modalidade de texto literário em:
prende-se a uma vasta área a) unir duas ou mais cantigas com temas
de vivência, faz-se geralmente paralelos e recitá-las em simultaneidade.
de uma história longa e apresenta b) um conjunto de estrofes ou um par
uma estrutura complexa. de dísticos em que sempre se procura
IV. Nos textos do gênero, o narrador dizer a mesma idéia.
parece estar ausente da c) apresentar as cantigas, nas festas
obra, ainda que, muitas vezes, da corte, sempre com o acompanhamento
se revele nas rubricas ou nos de um coro.
diálogos; neles impõe-se rigoroso d) reduzir todo o refrão a um dístico.
encadeamento causal. e) pressupor que há sempre dois elementos
V. Espécie narrativa entre literatura paralelos que se digladiam
e jornalismo, subjetiva, breve verbalmente.
e leve, na qual muitas vezes
autor, narrador e protagonista se 6. (UFMG) Interpretando historicamente
identificam. a relação de vassalagem
() Poema lírico entre homem amante/mulher
() Conto amada, ou mulher amante/homem
() Crônica amado, pode-se afirmar
() Romance que:
() Texto teatral a) o Trovadorismo corresponde ao Renascimento.
a) l l - l - V - l l l elV. b) o Trovadorismo corresponde ao movimento
b) ll — I —V — IV e III humanista.
c) II — I — III — V e IV. c) o Trovadorismo corresponde ao Feudalismo.
d) I — II — V — III e IV. d) o Trovadorismo e o Medievalismo só
poderiam ser provençais.
e) l - I V - l l - V e l l l .
e) tanto o Trovadorismo como Humanismo
são expressões da decadência ( ) E r a s m o de R o t h e r d an
medieval. ( ) Luís Vaz de Camões
( ) Gil V i c e n te
7. (UFMG) Nas mais importantes novelas ( ) Dante A l i g h i e ri
de cavalaria que circularam ( ) Sá de M i r a n da
na Europa medieval, principalmente ( ) G i o v a n n i B o c c a c c io
como propaganda das
Cruzadas, sobressaem-se: 11. (PUC-SP) O Auto da Barca do Inferno
a) as namoradas sofredoras, que fazem pertence ao movimento literário
bailar para atrair o namorado ausente. do Humanismo, em Portugal,
b) os cavaleiros medievais, concebidos porque Gil Vicente:
segundo os padrões da Igreja Católica a) c r i t i ca a i g r e j a p e l a v e n d a i n d i s c r
(por quem lutam). imin
c)asnamoradacastas,fiéis,dedic a d a de indulgências e p e l a v i d a d e s r
a d a s, e g r a d a dos padres.
dispostasaqualquersacrifício b) p r e o c u p a - s e s o m e n t e c o m a s a l v
para a ção
i r ao e n c o n t r o do a m a d o . do h o m e m a p ó s a m o r t e , s e m se
d) o s n a m o r a d o s c a s t o s , f i é i s , d e d i v o l t a r p a r a os problemas sociais da
c a dos época.
que, entretanto, são t r a í d o s pel c) e q u i l i b r a a concepção cristã da s a l vação
a s n a m o r a d a s s e d u t o r a s. a p ó s a m o r t e c o m a visão crít
e) os c a v a l e i r o s s a r r a c e n o s , eslavos e i c a d o h o m e m e da s o c i e d a d e d o s eu
i n f i é i s , i n i m i g o s da f é cristã. tempo.
d) t em c o m o única preocupação criticar
8. (PUC-RS) As narrativas que descrevem o h o m e m e as mazelas sociais do m o m
as lutas dos cruzados e n t o histórico em q u e está inserido.
envolvem sempre um herói muito e) c r i t i c a a Igreja, ao d e f e n d e r c o m e n t
engajado na luta pela cristandade, u s i a s m o os p r i n c í p i o s r e f o r m i s t as
podendo ser a um só tempo d i s s e m i n a d o s pela R e f o r m a p r o t e s t
frágil e forte, decidido e terno, ante.
furioso e cortês. No entanto,
com relação à mulher amada, 12. (OSEC-SP) Relacionar autor e obra:
esse herói é sempre: 1. Gil V i c e n te
a) p o u c o d e d i c a d o . d) indelicado. 2. L u í s V a z de Camões
b) infiel. e) n.d.a. 3. G i o v a n n i B o c c a c c io
c ) d e v o t a d o. 4. Dante A l i g h i e ri
5. E r a s m o de R o t h e r d an
9. (OSEC-SP) Assinale a alternativa 6. A r i o s to
incorreta: () Os Lusíadas
O classicismo () Decameron
a) é o e s t i l o d o m i n a n t e na l i t e r a t u r a () Orlando Furioso
o c i dental ( ) O elogio da Loucura
d u r a n t e o s é c u l o XVI ou Q u i - () Auto da Visitação
nhentismo. () A Divina Comédia
b) c o r r e p o n d e à é p o c a do R e n a s c i m
ent 13. (ENC-SP) Se o teatro vicentino é
o em q u e se o b s e r v a a r e c u p e r a ção acentuadamente religioso e medievalizante,
dosvaloresculturaisgregose como se explica
latinos. sua classificação nos limites do
c) é o e s t i l o que i n c o r p o r a os v a l o r es Humanismo?
humanistasdoRenascimento:ant Se partir de O Auto da Barca do
rop Inferno, responda mediante a alternativa
ocentrismo,racionalismo,univer correta:
s a lismo. a) a n a l i s a o h o m e m em s u a s relações
d) c o m e ç a no Brasil em 1500, c o m a s o c i a i s , nas b u s c a do melhor c a m i nho
Carta, de P e r o Vaz de C a m i n h a . p a r a o e n c o n t r o c o m Deus e a
e) é uma é p o c a c a r a c t e r i z a d a p e l a m o r a l i d a d e r e l i g i o s a.
rejeição b) analisa o h o m e m em s u a s relações c om
dos v a l o r e s r e l i g i o s o s da c u l t Deus, n a b u s c a d o melhor c a m i n h o p a ra
u r a m e d i e v a l. o e n c o n t r o c o m o semelhante.
c) i n v e s t i g a o h o m e m em s u a s relações
10. (OSEC-SP) Relacionar: c o m a i g r e j a , d e s t a c a n d o a c r í t i ca a
( 1 ) autor humanista os padres q u e não se v o l t am p a r a os v a
( 2 ) autor clássico lores humanos.
d) a n a l i s a o h o m e m em s u a s relações É andar solitário por entre a gente;
comanobreza,ocleroeopovo,ten É nunca contentar-se de contente;
do em v i s t a a v i d a t r a n s i t ó r i a da r e l i É cuidar que se ganha em se perder.
gião É querer estar preso por vontade;
e do m e r c a d o a s c e n d e n t e . É servir a quem vence, o vencedor;
e) c r i t i c a a i g r e j a , ao d e f e n d e r c o m e É ter com quem nos mata lealdade.
n t u s i a s m o os p r i n c í p i o s r e f o r m i s t Mas como causar pode seu favor
as d i s s e m i n a d o s p e l a R e f o r m a p r o t Nos corações humanos amizade,
estante. Se tão contrário a si é o mesmo
[Amor?
14. (UNIFAP-SP) As primeiras peças
teatrais portuguesas escritas 17. (MACK-SP) Este soneto, um dos
com objetivo de serem levadas mais perfeitos que foram produzidos
a público são de autoria de: em Língua Portuguesa,
a ) M a n u e l M a r i a B a r b o s a d u Bocage. pertence ao estilo de época do
b) P a i o S o a r e s de T a v e i r ó s. Renascimento, portanto criado
c ) D . D i n i z. no século:
d) Camões. a) XV. c) XVII. e) XIX.
e) Gil V i c e n t e. b) XVI. d) XVIII.
Modernismo
aprendia a tocar violão. Mas que cousa?
Um homem tão sério metido nessas
malandragens! O movimento modernista teve início
(...) em São Paulo, com a Semana de Arte
(Lima Barreto, Triste Fim de Policarpo Quaresma, São Moderna, em 1922. Logo em seguida expandiu-
Paulo: Ática 1990. p. 19-20)
se por todo o país, renovando a
Monteiro Lobato idéia de literatura e de escritor.
Os autores desse período desejavam
(1882-1948) expressar-se livremente, privilegiando
José Bento Monteiro Lobato nasceu como tema a realidade brasileira.
em Taubaté, São Paulo, em 1882. Graduouse A linguagem torna-se mais coloquial,
em Direito e foi promotor em Areias. semelhante à nossa fala, e afasta-se
Herdou a propriedade dos avós e tornou- dos moldes portugueses.
se fazendeiro, mas depois se mudou Os acontecimentos da modernidade
passam a receber maior enfoque, sooretudo Andrade; Juca Mulato, de Menotti Del
os que se referem à civilização Picchia; Nós, de Guilherme de Almeida;
ndustrial, com suas máquinas e seu ritmo Carrilhões, de Murilo Araújo.
acelerado de vida, percebido também No ano de 1922, centenário da Independência,
nas cenas quotidianas. o país vivia um período de
Por diversas vezes, os autores fazem intenso desenvolvimento urbano e industrial,
uso do humor em seus textos, introduzindo favorável ao evento ocorrido
algo novo na literatura, pois na semana de 11 a 18 de fevereiro, no
até então o humorismo era considerado Teatro Municipal de São Paulo. Foram
de mau-gosto e fora dos padrões estéticos. expostos quadros e esculturas e aconteceram
O Modernismo apresentou três fases recitais e conferências.
distintas: 1 a . fase - destruidora Graça Aranha e Ronald de Carvalho
¡1922-1930) - marcada pela ruptura com foram os conferencistas da noite de
as tradições literárias, "poema-piada", 13 de fevereiro, quando poemas foram
profundo nacionalismo, primitivismo, declamados por Guilherme de Almeida e
aversão ao nosso passado histórico; pelo próprio Ronald de Carvalho, além
2ª. fase - edificadora (1930-1945) - da apresentação de peças musicais por
caracterizada pela construção de uma Villa Lobos e Ernâni Braga.
fteratura renovadora, que origina a ficção No dia 15, Menotti de Picchia discursou
nordestina e regional e o romance e contou com a presença de Guilherme
urbano, psicológico e introspectivo; 3a. de Almeida, Ronald de Carvalho, Elísio
fase (1945 até a atualidade), também de Carvalho, Oswald de Andrade, Renato
conhecida como Pós-Modernismo. Almeida, Luís Aranha, Mário de
Andrade, Agenor Barbosa, Moacir de
Antecedentes e a Abreu, Rodrigues de Almeida e Sérgio
Milliet. Foram lidos poemas de Manuel
Semana de Arte Bandeira e Ribeiro Couto. Além disso, Mário
de Andrade fez uma pequena palestra
Moderna sobre a exposição de artes plásticas, seguido
Descontentes com a literatura produzida do bailado de Yvonne Daumerle e
no Realismo-Naturalismo, Parnasianismo do concerto de Guiomar Novais.
e Simbolismo, os escritores No dia 17, Villa Lobos fez um concerto
pré-modernistas já tinham dado indícios e foi muito vaiado.
de renovações na linguagem e no modo
de enxergar a situação social brasileira. Conseqüências da
Alguns jovens intelectuais brasileiros
tomaram contato com as Vanguardas Semana de Arte
Européias (Futurismo de Marinetti,
Cubismo, Expressionismo, Dadaísmo, Moderna
Surrealismo) e foram por elas influenciados, Em 1922, a revista Klaxon foi publicada,
como se fez perceber na Semana paralelamente ao surgimento da
de Arte Moderna. O Manifesto Futurista, corrente dinamista, ligada ao Futurismo
de Marinetti, publicado em Paris e à corrente primitivista, relacionada
em 1909, foi também publicado no Brasil, ao inconsciente e às raízes primitivas
no mesmo ano, nos jornais A República, brasileiras.
do Rio Grande do Norte e Jornal Escrito por Oswald de Andrade em
de Notícias, da Bahia. Paris, o Manifesto Pau-Brasil é publicado
Oswald de Andrade em 1912 viajou no Correio da Manhã em 1924.
à Europa e, influenciado pelas tendências Desejava-se a produção de uma poesia
na arte e literatura européias autenticamente brasileira e de exportação,
do momento, retornou ao Brasil e divulgou- valorizando estados primitivos da
as, propondo mudanças na arte e cultura brasileira.
literatura brasileiras. O manifesto mais radical da primeira
O pintor Lasar Segall em 1913 fez fase modernista foi o Manifesto Antropófago,
uma exposição, influenciada pelas Vanguardas publicado na Revista de Antropofagia,
Européias, em São Paulo. Em em 1928. Caracterizava-sé
1914 foi a vez de Anita Malfatti, ocasião pela devoração da cultura européia, que
em que recebeu severas críticas de deveria ser reelaborada de forma autônoma.
Monteiro Lobato. Já no ano de 1915 Ronald Houve também o Manifesto Verde-
de Carvalho colaborou com a publicação Amarelo, que criticava o "nacionalismo
da revista Orpheu, que marca o importado" de Oswald de Andrade. Foi
início do Modernismo na literatura portuguesa. — 260 —
Em 1917 várias obras renovadoras liderado por Menotti de Picchia, Cassiano
foram publicadas: Há uma gota de Ricardo e Plínio Salgado e marcado pela
sangue em cada poema, de Mário de defesa de um nacionalismo ufanista,
tendendo para o conservadorismo. O Além da literatura, Mário de Andrade
grupo autodenominou-se Escola de era um amante e estudioso da música,
Anta e identificou-se com o Integralismo. das artes plásticas e do folclore
brasileiro. Desejava construir os alicerces
Primeira Geração de uma cultura verdadeiramente
nacional.
do Modernismo — 261 —
— 262 —
(1922-1930) Escreveu poesia (Há uma gota de
Durante as primeiras décadas do sangue em cada poema - 1917;
século XX, ocorrem algumas mudanças Paulicéia Desvairada - 1922; Losango
na economia brasileira. A industrialização Caqui - 1926; Clã do Jabuti - 1927;
cresce, sobretudo em São Paulo, Remate de Males - 1930; Poesias -
importa-se mão-de-obra, tanto para a 1941; Lira Paulistana - 1946); ficção
lavoura cafeeira como para as indústrias. (Amar, Verbo Intransitivo - 1927;
O anarquismo é trazido pelos italianos, Macunaíma - 1928; Contos Novos -
provocando protestos, reivindicações 1946); ensaio (A Escrava que não é
e greves, ou seja, lutas por melhores Isaura - 1925; O Empalhador de Passarinho
condições de trabalho. Mas a economia - 1944); crônica (Os filhos de
ainda centrava-se na cafeicultura Candinha - 1943); musicologia e folclore;
paulista e na pecuária mineira. Entre História da Arte; cartas.
os anos de 1922 a 1930 intensifica-se o Macunaíma
Tenentismo, cria-se a Coluna Prestes e Fruto de anos de pesquisa sobre o
o Partido Comunista é considerado ilegal folclore nacional, o texto foi redigido em
pelo governo. uma semana no ano de 1926, mas veio
Em 1929 o preço do café no mercado a público apenas dois anos depois.
internacional cai, devido à quebra Estruturado em dezessete capítulos
da Bolsa de Nova Iorque, e muitos fazendeiros e um epílogo, o texto é classificado
vão à falência. Imigrantes são pelo próprio Mário de Andrade como rapsódia,
presos pela participação em greves. termo aplicado à música. Rapsódia
Getúlio Vargas é candidato à presidência musical é uma composição que tem
da República. como base melodias populares ou folclóricas.
Durante a primeira fase modernista. O livro é classificado como rapsódia,
os escritores fazem uso dos versos pois reúne motivos populares,
livres e abandonam as formas fixas, folclóricos e culturais brasileiros.
como o soneto. A linguagem coloquial A obra demonstra a preocupação
é recorrente, assim como a ausência modernista de aproximar-se da linguagem
de pontuação. Combatem valores falada, agrupando termos de diversas
tradicionais; valorizam elementos regiões e de diferentes origens (populares,
do cotidiano e do progresso; reescrevem indígenas).
textos do passado, com lirismo ou O trecho a seguir integra o primeiro
parodiando-os; as linguagens da poesia capítulo do livro, em que o protagonista
e da prosa aproximam-se; são empregados da história, Macunaíma, "o herói sem
períodos curtos e utiliza-se a nenhum caráter", nos é apresentado.
metalinguagem. Seu nome, de origem indígena, significa
Mário de Andrade "o grande mal". O personagem representa
o pensamento primitivo, passando
(1893-1945) por uma série de mágicas transformações,
Mário Raul de Morais Andrade nasceu sempre guiado pelo prazer e
em São Paulo em 1893. Formou-se pelo medo. Tinha por meta a busca da
no Conservatório Dramático e Musical, muiraquitã, pedra talismã presente de
onde posteriormente lecionou História sua companheira Ci-Mãe do Mato (já
da Música. Trabalhou como professor transformada na estrela Beta do Centauro),
de piano, jornalista e funcionário público. que o gigante Venceslau Pietro
Em 1934 passou a dirigir o Departamento Pietra havia furtado. Macunaíma vem
de Cultura da Prefeitura de São para São Paulo com este objetivo, acompanhado
Paulo, permanecendo até 1937. Um ano pelos irmãos Maanape e Jiguê.
depois se transferiu para o Rio de Janeiro. O personagem passa tranqüilamente por
Foi crítico literário, professor de espaços e tempos diversos. Ao término
Estética na Universidade do Distrito Federal do livro, Macunaíma transforma-se na
e idealizou a Enciclopédia Brasileira constelação Ursa Maior.
do Ministério da Educação. No ano /. Macunaíma
de 1940 retornou a São Paulo, onde foi No fundo do mato-virgem nasceu
funcionário do Serviço do Patrimônio Macunaíma, herói de nossa gente. Era
Histórico e faleceu em 1945. preto retinto e filho do medo da noite.
Houve um momento em que o silêncio foi Primeiro Caderno de Poesia do Aluno
tão grande escutando o murmurejo do Oswald de Andrade - 1927, Poesias
Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu Reunidas • 1945); romances (Os Condenados
uma criança feia. Essa criança é que - 1922, Memórias Sentimentais
chamaram de Macunaíma. de João Miramar - 1924, Serafim
Já na meninice fez coisas de sarapantar. Ponte Grande - 1933J; teatro (A morta -
De primeiro passou mais de seis 1937, O Rei da Vela - 1937); ensaios
anos não falando. Si o incitavam a falar (Ponta de Lança-1945); memórias (Um
exclamava: Homem sem Profissão - 1954).
-Ai! que preguiça!... A poesia de Oswald de Andrade
e não dizia mais nada. Ficava no comporta elementos das vanguardas
canto da maloca, trepado no jirau de européias, sobretudo o Cubismo e o
paxiúba, espiando o trabalho dos outros primitivismo do Dadaísmo. Realiza uma
e principalmente os dois manos que crítica à sociedade brasileira, com humor
tinha, Maanape já velhinho e Jiguê na e estilo coloquial.
força de homem. O divertimento dele era A "Poesia Pau-Brasil", resultou
decepar cabeça de saúva. Vivia deitado numa poesia "de exportação", incorporando
mas si punha os olhos em dinheiro, "antropofagicamente" a cultura
Macunaíma dandava pra ganhar vintém. estrangeira, como faziam os índios antropófagos
— 263 — com seus inimigos, a fim de
E também esperava quando a família ia absorverem suas qualidades.
tomar banho no rio, todos juntos e nus. Manifesto Antropófago
Passava o tempo do banho dando mergulho, (fragmentos)
e as mulheres soltavam gritos Só a Antropofagia nos une. Socialmente.
gozados por causa dos guaimuns dizque Economicamente. Filosoficamente.
habitando a água doce por lá. No Única lei do mundo. Expressão mascarada
mucambo si alguma cunhatã se aproximava de todos os individualismos, de
dele para fazer festinha, Macunaíma todos os coletivismos. De todas as religiões.
punha a mão nas graças dela, De todos os tratados de paz.
cunhatã se afastava. Nos machos guspia — 264 —
na cara. Porém respeitava os velhos e Tupi, or not tupi that is the question.
freqüentava com aplicação a murua a Contra todas as catequeses. E contra
poracê o torê o bacorocô a cucuicogue, a mãe dos Gracos.
todas essas danças religiosas da tribo. Só me interessa o que não é meu.
Quando era pra dormir trepava no Lei do homem. Lei do antropófago.
macuru pequenininho sempre se esquecendo (...)
de mijar. Como a rede da mãe Tínhamos a justiça codificação da
estava debaixo do berço, o herói mijava vingança. A ciência codificação da Magia.
quente na velha, espantando os mosquitos A Antropofagia. A transformação
bem. Então adormecia sonhando permanente do Tabu em totem.
palavras feias, imoralidades estrambólicas (...)
e dava patadas no ar. De William James a Voronoff. A
Nas conversas das mulheres no Transfiguração do Tabu em totem. Antropofagia.
pino do dia o assunto eram sempre as (...)
peraltagens do herói. As mulheres se riam Antes dos portugueses descobrirem
muito simpatizadas, falando que "espinho o Brasil, o Brasil tinha descoberto a
que pinica, de pequeno já traz ponta", e felicidade.
numa pajelança Rei Nagô fez um discurso (...)
e avisou que o herói era inteligente. Somos concretistas. As idéias tomam
(...) conta, reagem, queimam gente nas
(Mário de Andrade, Macunaíma, São Paulo: Klick praças públicas. Suprimamos as idéias
Editora, 1999, p. 13) e as outras paralisias. Pelos roteiros.
Oswald de Andrade Acreditar nos sinais, acreditar nos instrumentos
e nas estrelas.
(1890-1953) (...)
José Oswald de Sousa Andrade A luta entre o que se chamaria
nasceu em São Paulo em 1890. De 1911 Incriado e a Criatura - ilustrada pela con
a 1912 viajou à Europa, de onde retornou tradição permanente do homem e o seu
com idéias renovadoras na arte e na Tabu. O amor cotidiano e o modus-vivendi
literatura. Formou-se em Direito em 1919. capitalista. Antropofagia. Absorção do
Foi amigo de Mário de Andrade e Di Cavalcanti, inimigo sacro. Para transformá-lo em
com quem planejou as mudanças totem. A humana aventura. A terrena
literárias. Faleceu em 1953 na cidade finalidade. Porém, só as puras elites conseguiram
natal. realizar a antropofagia carnal,
Escreveu poesia (Pau Brasil-1925, que traz em si o mais alto sentido da
vida e evita todos os males identificados Pneumotórax
por Freud, males catequistas. O que Febre, hemoptise, dispnéia e
se dá não é uma sublimação do instinto, [suores noturnos.
sexual. É a escala termométrica do instinto A vida inteira, que podia ter sido
antropofágico. De carnal, ele se [e que não foi.
torna eletivo e cria a amizade. Afetivo, o Tosse, tosse, tosse.
amor. Especulativo, a ciência. Desviase Mandou chamar o médico:
e transfere-se. Chegamos ao aviltamento. - Diga trinta e três.
A baixa antropofagia aglomerada - Trinta e três... trinta e três...
nos pecados de catecismo - a inveja, [trinta e três...
a usura, a calúnia, o assassinato. - Respire.
Peste dos chamados povos cultos e - O senhor tem uma escavação
cristianizados, é contra ela que estamos [no pulmão esquerdo
agindo. Antropófagos. [e o pulmão direito infiltrado.
(...) - Então, doutor, não é possível
Contra a realidade social, vestida e [tentar o pneumotórax?
opressora, cadastrada por Freud - a - Não, a única coisa a fazer é
realidade sem complexos, sem loucura, [tocar um tango argentino.
sem prostituição e sem penitenciárias (Apud Massaud Moisés, A literatura brasileira através
do matriarcado de Pindorama. dos textos, p. 417)
Oswald de Andrade Poética
Em Piratininga. Estou farto do lirismo comedido
Ano 374 da Deglutição do Bispo Do lirismo bem-comportado
Sardinha. Do lirismo funcionário público com
Revista de Antropofagia, Ano I, Ns 1, [livro de ponto expediente
maio de 1928. [protocolo e manifestações de
— 265 — [apreço ao sr. diretor
Manuel Bandeira Estou farto do lirismo que pára e
[vai averiguar no dicionário o
(1884-1968) [cunho vernáculo de um vocábulo
Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Abaixo os puristas
Filho nasceu no Recife, Pernambuco, Todas as palavras sobretudo os
em 1886. Realizou os estudos secundários [barbarismos universais
no Rio de Janeiro, no Colégio Todas as construções sobretudo
Pedro II. Iniciou o curso de Engenharia [as sintaxes de exceção
em São Paulo, mas devido à tuberculose Todos os ritmos sobretudo os
que contraíra teve que deixá-lo. Em [inumeráveis
busca de melhora, foi para diversos lugares, Estou farto do lirismo namorador
entre eles a Suíça. Iniciada a Primeira Político
Guerra, retorna ao Brasil, vindo a Raquítico
publicar em 1917 seu primeiro livro, A Sifilítico
Cinza das Horas. Além de escritor, foi De todo lirismo que capitula ao que
também jornalista, inspector do ensino [quer que seja fora de si mesmo.
secundário, professor no Colégio Pedro De resto não é lirismo
II e na Faculdade Nacional de Filosofia, Será contabilidade tabela de
vindo a aposentar-se em 1956. Foi membro [co-senos secretário do amante
da Academia Brasileira de Letras. [exemplar com cem modelos de
Faleceu no Rio de Janeiro em 1968. [cartas e as diferentes maneiras
Escreveu poesias {Carnaval - [de agradar à mulheres, etc.
1919, Libertinagem - 1930, Estrela da Quero antes o lirismo dos loucos
Manhã- 1936, Estrela da Tarde- 1963, O lirismo dos bêbedos
Estrela da Vida Inteira - 1966) e prosa O lirismo difícil e pungente dos
{Itinerário de Pasárgada- 1954, Frauta [bêbedos
de Papel- 1957). O lirismo dos clowns de
Soube adequar muito bem a poesia [Shakespeare
à linguagem coloquial da primeira fase - Não quero mais saber do lirismo
modernista, além de manejar com perfeição [que não é libertação.
os versos livres, dotando-os de ( t ó t í p p . 417-418.)
ritmo. Tornou-se um "clássico" entre os Momento num café
modernistas, pois expressava com simplicidade Quando o enterro passou
os sentimentos mais profundos Os homens que se achavam
do ser humano. Não se submeteu a [no café
formas literárias fixas, mas produziu uma Tiraram o chapéu maquinalmente
obra poética rica em lirismo, mesmo ao Saudavam o morto distraídos
tratar de fatos do cotidiano. Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida. do Modernismo
Um no entanto se descobriu num
[gesto largo e demorado (1930-1945)
Olhando o esquife longamente A segunda geração modernista inicia-
Este sabia que a vida é uma se em 1930 e estende-se até 1945,
[agitação feroz e sem finalidade período de grandes mudanças no cenário
Que a vida é traição mundial, provocadas inicialmente
E saudava a matéria que passava pela quebra da Bolsa de Valores de Nova
Liberta para sempre da alma Iorque.
[extinta. A queda do preço do café, nosso
(Ibid, pp. 422-423.) principal produto de exportação, provoca
Outros autores a ruína econômica da elite.
Vargas assume o poder e iniciase
Cassiano Ricardo Leite nasceu em a chamada Era Vargas, que vai até
São Paulo em 1895. Cursou Direito em 1945.
São Paulo e Rio de Janeiro. Integrou o Alguns acontecimentos marcantes
grupo "Verde - amarelo", liderado por do período: Revolução Constitucionalista,
Plínio Salgado. Colaborou para a imprensa criação do Dl P - Departamento
e atuou como diretor-geral da Secretaria de Imprensa e Propaganda, início da
de Estado dos Negócios do Governo Segunda Guerra Mundial.
de São Paulo e como chefe do Escritório Os escritores procuram estudar a
Comercial do Brasil em Paris. Foi realidade social e cultural brasileira. A
membro da Academia Brasileira de Letras. literatura torna-se mais madura e tem
Faleceu em 1974 no Rio de Janeiro. consciência de sua identidade.
Escreveu poesias {Dentro da Noite Ao contrário da primeira fase, em
- 1 9 1 5 , / A Frauta de Pã - 1 9 1 7 , Sonetos que a poesia foi predominante, a prosa
- 1952) e prosa (O Brasil no Original - de ficção destaca-se, abrangendo a
1936, Marcha para o Oeste - 1943). prosa regionalista, urbana e intimista.
Cassiano Ricardo Prosa de Ficção
(1895-1974) Prosa Regionalista
— 266 —
— 267 — O grupo regionalista ou nordestino,
organizando-se a partir das idéias de
Antônio de Gilberto Freyre, retomou uma tendência
Alcântara Machado iniciada no Romantismo: retratar a realidade
brasileira.
(1901 - 1 9 3 5) — 268 —
Antônio Castilho de Alcântara Machado Apesar da escolha de uma determinada
d'Oliveira nasceu em São Paulo região geográfica como ponto
em 1901. Graduou-se em Direito, mas de partida para a elaboração de seus
atuou como jornalista. Foi redator e colaborador livros, os escritores regionalistas não
da Revista de Antropofagia e escreveram textos exclusivamente preocupados
da Revista Nova. Após 1932, dedicouse em mostrar as particularidades
à política e transferiu-se para o Rio desta ou daquela região, mas obras
de Janeiro, onde faleceu em 1935. universais, realizando uma importante
Fez uso da linguagem telegráfica, análise da psicologia humana e analisando
exata e objetiva e incorporou em seus dramas humanos e sociais.
textos o vocabulário ítalo-brasileiro, comum A maioria das obras regionalistas
nos bairros italianos de São Paulo, analisa a realidade social nordestina,
os quais também utilizou em sua obra. mas há também obras que exploram a
Observou atentamente a paisagem região Sul do país e a Amazônia.
urbana paulista, com suas modificações Destacam-se como regionalistas:
sociais, econômicas e culturais. Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz,
Escreveu PathéBaby (1926), Brás, José Lins do Rego e Jorge Amado.
Bexiga e Barra-Funda (1927), Laranja
da China (1928), Anchieta na Capitania
Graciliano Ramos
de São Vicente (1928), Comemoração (1892-1953)
de Brasílio Machado (1929), Mana Maria Graciliano Ramos nasceu em Alagoas,
(edição póstuma de 1936), Cavaquinho em 1892. Realizou seus primeiros
e Saxofone (edição póstuma de estudos em Maceió e em seguida foi para
1940). o Rio de Janeiro, onde passou a trabalhar
Segunda Geração como revisor de provas tipográficas.
Retornou a Alagoas, foi comerciante
e depois prefeito. Em 1930 exerceu que adivinhavam desgraça e não se cansavam
o cargo de diretor da Imprensa Oficial de repetir a mesma pergunta:
do Estado. Foi preso, em 1936, acusado - Vão bulir com a Baleia?
de subversão. Passados alguns Tinham visto o chumbeiro e o polvarinho,
anos, retorna ao Rio de Janeiro. Em 1953 os modos de Fabiano afligiramnos,
visita a URSS, onde vem a falecer. davam-lhes a suspeita de que Baleia
Escreveu Caetés (1933), São corria perigo.
Bernardo (1934), Angústia (1936), Vidas Ela era como uma pessoa da família:
Secas (1938), Dois Dedos (1945), brincavam juntos os três, para bem
Insónia (1945), Histórias Incompletas dizer não se diferençavam, rebolavam
(1946), além de diversos livros infantis na areia do rio e no estrume fofo que ia
e memórias, como A Terra dos Meninos subindo, ameaçava cobrir o chiqueiro das
Pelados (1939), Infância (1945) e Memórias cabras.
do Cárcere (1953). Quiseram mexer na taramela e abrir
Graciliano realiza ao mesmo tempo a porta, mas Sinhá Vitória levou-os para
análise social e investigação psicológica, a cama de varas, deitou-os e esforçouse
adotando um estilo clássico e uma por tapar-lhes os ouvidos: prendeu a
linguagem clara e enxuta. cabeça do mais velho entre as coxas e
Vidas Secas espalmou as mãos nas orelhas do segundo.
O trecho a seguir é extraído do romance Como os pequenos resistissem,
Vidas Secas, obra estruturada aperreou-se e tratou de subjugá-los,
em treze capítulos, independentes entre resmungando com energia.
si. Tanto o primeiro como o último capítulo Ela também tinha o coração pesado,
mostram a família fugindo da seca e mas resignava-se: naturalmente a
em busca de melhores condições de vida. decisão de Fabiano era necessária e
Aparecem quatro personagens humanos: justa. Pobre da Baleia.
Fabiano, Sinhá Vitória, o menino mais Escutou, ouviu o rumor do chumbo
novo e o menino mais velho, cada qual que se derramava no cano da arma, as
merecendo um capítulo. Graciliano mostra pancadas surdas da vareta na bucha.
a dificuldade de comunicação entre Suspirou. Coitadinha da Baleia.
eles, somada à miséria do meio físico. (...)
Além destes, merece destaque a cadela Uma noite de inverno, gelada e nevoenta,
Baleia, personagem humanizado que auxilia cercava a criaturinha. Silêncio
o grupo na caça, é companheira das completo, nenhum sinal de vida nos arredores.
crianças nas brincadeiras e dos adultos O galo velho não cantava no
no trabalho. A ela também ó dedicado poleiro, nem Fabiano roncava na cama
um capítulo, transcrito em parte a seguir: de varas. Estes sons não interessavam
Baleia Baleia, mas quando o galo batia as asas
A cachorra Baleia estava para morrer. e Fabiano se virava, emanações familiares
Tinha emagrecido, o pêlo caíra-lhe revelavam-lhe a presença deles.
em vários pontos, as costelas avultavam Agora parecia que a fazenda se tinha
num fundo róseo, onde manchas despovoada.
escuras supuravam e sangravam cobertas Baleia respirava depressa, a boca
de moscas. As chagas da boca aberta, os queixos desgovernados, a
e a inchação dos beiços dificultavamlhe língua pendente e insensível. Não sabia
a comida e a bebida. o que tinha sucedido. O estrondo, a pancada
Por isso Fabiano imaginara que ela que recebera no quarto e a viagem
estivesse com um princípio de hidrofo— difícil do barreiro ao fim do pátio
269 — desvaneciam-se no seu espírito.
bia e amarrara-lhe no pescoço um rosário Provavelmente estava na cozinha,
de sabugos de milho queimados. Mas entre as pedras que serviam de trempe.
Baleia, sempre de mal a pior, roçava-se Antes de se deitar, Sinhá Vitória retirava
nas estacas do curral ou metia-se no dali os carvões e a cinza, varria com
mato, impaciente, enxotava os mosquitos um molho de vassourinha o chão queimado,
sacudindo as orelhas murchas, agitando e aquilo ficava um bom lugar para
a cauda pelada e curta, grossa cachorro descansar. O calor afugentava
na base, cheia de roscas, semelhantes as pulgas, a terra se amaciava. E,
a uma cauda de cascavel. findos os cochilos, numerosos preás
Então Fabiano resolveu matá-la. Foi corriam e saltavam, um formigueiro de
buscar a espingarda de pederneira, lixou- preás invadia a cozinha.
a com o saca-trapo e fez tenção de — 270 —
carregá-la bem para a cachorra não A tremura subia, deixava a barriga
sofrer muito. e chegava ao peito de Baleia. Do
Sinhá Vitória fechou-se na camarinha, peito para trás era tudo insensibilidade
rebocando os meninos assustados, e esquecimento. Mas o resto do corpo
se arrepiava, espinhos de mandacaru e não acompanham as mudanças.
penetravam na carne meio comida pela O romance é estruturado em três
doença. partes. Na primeira, o narrador concentra-
Baleia encostava a cabecinha fatigada se no tempo presente e mostra personagens
na pedra. A pedra estava fria, conflitantes e uma sociedade
certamente Sinhá Vitória tinha deixado organizada em estratos sociais.
o fogo apagar-se muito cedo.
Baleia queria dormir. Acordaria feliz, O protagonista é o mestre José
num mundo cheio de preás. E lamberia Amaro, artesão que só trabalhava para
as mãos de Fabiano, um Fabiano quem o respeitasse, mesmo que não
enorme. As crianças se espojariam com recebesse pagamento.
ela, rolariam com ela num pátio enorme, Veio para o engenho de Santa Fé
num chiqueiro enorme. O mundo ficaria com o pai, que tugiu de Goiânia após ter
todo cheio de preás, gordos, enormes. praticado um crime de morte. O pai também
(Graciliano Ramos, Vidas Secas, São Pauto: Martins era artesão e gozava de grande
Editora, 1969, pp. 127-134) prestígio, coisa que o filho não possuía.
Assim como o pai, ocupava as terras
José Lins do Rego sem pagar, o que resulta em sua expulsão
(1901 - 1 9 5 7) pelo dono do engenho. Contudo, ele
José Lins do Rego nasceu no engenho desobedece e continua morando ali com
Corredor, Município do Pilar, na sua mulher e filha.
Paraíba, em 1901. Graduou-se em Direito A mulher lhe tem nojo e a filha está
no Recife e foi promotor em Minas enlouquecendo, ao passo que ele tem
Gerais. Em seguida transferiu-se para imenso orgulho de si mesmo, por ser
Maceió, com novas funções, passando homem branco, de respeito e livre.
a conviver com Graciliano Ramos, Jorge Sofre muito com a sensação de inferioridade,
de Lima e Rachel de Queiroz. Após de prestígio perdido. Passa
nove anos transferiu-se para o Rio de então a ajudar Antônio Silvino, famoso
Janeiro, onde morreu em 1957. cangaceiro, e seu bando. É a maneira
Segundo o próprio escritor, sua obra que encontra para vingar-se contra os
de ficção pode ser dividida em: "Ciclo da grandes.
cana-de-açúcar" {Menino de Engenho Angustiado, desconta sua insatisfação
- 1932, Doidinho - 1933, Bangüê - batendo na filha e maltratando a
1934, Fogo Morto-1943 e Usina -1936); mulher. A primeira é internada em Recife,
"Ciclo do cangaço, misticismo e seca" devido à sua loucura. Já a mulher
{Pedra Bonita - 1938 e Cangaceiros - tempos depois o deixa em meio à solidão
1953) e obras independentes, como Riacho e profunda tristeza, resultando no
Doce -1939 e Eurídice -1947. Tal suicídio do marido.
denominação foi posteriormente abandonada Na segunda parte, a narração volta-
pelo autor, mas continuou sendo se para o passado do engenho de
utilizada pelos críticos. Santa Fé, quando o Capitão Tomás era o
Grande parte dos livros apresenta proprietário.
um caráter memorialista, fazendo referências O protagonista agora é Lula de Holanda
à infância e à adolescência. Chacon, herdeiro do engenho de
A linguagem utilizada é espontânea Santa Fé, homem calado, extremamente
e marcada pela oralidade. orgulhoso e apegado ao prestígio.
Fogo Morto É casado com Amélia, filha do Capitão
Publicado em 1943, Fogo Morto é o Tomás que toca piano encantadoramente.
último livro do "ciclo da cana-de-açúcar", Aos poucos, o engenho vai entrando
composto pelas obras Menino de Engenho em decadência. O Coronel Lula não
(1932), Doidinho (1933) e Bangüê permite que sua filha Neném namore e
(1934). ela torna-se uma solteirona.
Nestes romances, José Lins do Amélia conforma-se com seu destino
Rego mostra uma sociedade marcada e protege a família, por meio das
pelo poder dos latifundiários, senhores galinhas que cria e da venda dos ovos.
de engenho. Os problemas sociais são Olívia, a outra filha do Capitão Tomás,
apresentados, como o autoritarismo e a não sofre, devido à sua loucura.
reação a este: a rebeldia. O Coronel Lula deixa o comando de
Escrito em terceira pessoa, Fogo suas terras, não moderniza suas máquinas
Morto mostra a trajetória dos habitantes e cada vez mais o engenho vai
do engenho Santa Fé, do Coronel Lula. se estagnando. Um dia chega por lá o
Os engenhos passam por um processo Capitão Antônio Silvino, cangaceiro muito
de decadência, pois vêm sendo respeitado no sertão e apoiado pelo
substituídos pelas usinas, com isso também mestre José Amaro.
sofrem os que dependem do açúcar Na terceira parte, o tempo novamente
é o presente, inserindo apenas
um novo personagem: o Capitão Vitorino, a sua rede por debaixo dum pé de pau.
homem honesto e corajoso, que passa Não temia a desgraça, não queria a riqueza.
a herói do romance. Defende os injustiçados, Lá se foram os três homens que libertara,
quaisquer que sejam eles. Dessa a quem dera toda a sua ajuda. O
forma, dirige-se a Coronel Lula intercedendo tenente se enfurecera com o seu poder.
por José Amaro e não aprova Nunca pensara que existisse um homem
a atitude do cangaceiro em relação ao que fosse capaz de enfrentá-lo como fizera.
senhor de engenho. A sua letra, o papel que assinara
Entretanto, com o passar do tempo com o seu nome, dera com a força do
vai perdendo a satisfação de viver e a miserável no chão. Era Vitorino Carneiro
vontade de lutar por seus ideais. da Cunha. Tudo podia fazer, e nada temia.
(fragmento) Um dia tomaria conta do município. E
A velha deixou o quarto e saiu para tudo faria para que aquele calcanhar-dejudas
o fundo da casa. Vitorino fechou os fosse mais alguma coisa. Então
olhos, mas estava muito bem acordado Vitorino se via no dia de seu triunfo. Haveria
com os pensamentos voltados para a muita festa, haveria tocata de música,
vida dos outros. Ele muito tinha que fa— discurso do dr. Samuel, e dança na
272 — casa da Câmara. Viriam todos os chaleiras
zer ainda. Ele tinha o Pilar para tomar do Pilar falar com ele. Era o chefe, era
conta, ele tinha o seu eleitorado, os seus o mais homem da terra. E não teria as
adversários. Tudo isto precisava de seus besteiras de José Paulino, aquela tolerância
cuidados, da força do seu braço, de seu para com o sujeitos safados, que
tino. Lá se fora o seu compadre José só queriam comer no cocho da municipalidade.
Amaro, com o negro Passarinho, o cego Com Vitorino Carneiro da Cunha
Torquato. Todos necessitavam de Vitorino não haveria ladrões, fiscais de feira
Carneiro da Cunha. Fora à barra do tribunal roubando o povo. Tudo andaria na correta,
para arrastá-los da cadeia. Que lhe na decência. Delegado não seria
importava a violência do tenente Maurício? um mole como José Medeiros. Quem seria
O que valia era a petição que, com a o seu delegado? Que homem iria encontrar
sua letra, com a sua assinatura, botara na vila para ser o seu homem de
para a rua três homens inocentes. Ele era confiança? O escrivão Serafim era muito
homem que não se entregava aos grandes. mole, o capitão Costa apanhava da mulher,
Que lhe importava a riqueza de José Saiu da venda era capaz de roubar
Paulino? Tinha o seu voto e não dava ao a ração dos presos, Chico Frade bebia
primo rico, tinha eleitores que não votavam demais. E ele precisava de um homem
nas chapas do governo. O governo para delegado.
não podia com a sua determinação. Ele {José Uns do Rego. Fogo Morto, São Paulo: Klick
sabia que havia muitos outros tenentes Editora, 1997)
Maurícios na dependência e às ordens Rachel de Queiroz
do governo. Todos seriam capangas, guarda-
costas do presidente. Mas Vitorino (1910-)
Carneiro da Cunha mandava no que era Rachel de Queiroz nasceu na Fortaleza,
seu, na sua vida. As feridas que lhe abriam Ceará, em 1910. Após a seca de
no corpo nada queriam dizer. Não havia 1915 mudou-se com os pais para o Rio
força que pudesse com ele. Os parentes de Janeiro e em seguida para Belém do
se riam de seus rompantes, de Pará. De volta a Fortaleza, formou-se
suas fraquezas. Eram todos uns pobres no curso normal, em 1925. Seguiu a carreira
ignorantes, verdadeiros bichos que não jornalística e em 1930 publicou o
sabiam onde tinham as ventas. Quando livro O Quinze, que trata da seca de
parava no engenho, quando conversava 1915. Depois voltou a residir no Rio de
com um Manuel Gomes do Riachão, via Janeiro, onde se encontra, atuando no
que era melhor ser como ele, homem sem jornalismo e na literatura.
um palmo de terra, mas sabendo que era Escreveu João Miguel (1932); Caminho
capaz de viver conforme os seus desejos. de Pedras (1937); As Três Marias
Todos tinham medo do governo, todos (1939); Dora, Doralina (1975), Memorial
iam atrás de José Paulino e de Quinca de Maria Moura (1993) - romances;
do Engenho Novo, como se fossem carneiros além de teatro e crônicas.
de rebanho. Não possuía nada e Demonstra forte preocupação social
se sentia como se fosse senhor do mundo. e realiza análise psicológica dos
A sua velha Adriana quisera abandoná- personagens . Aborda temas relacionados
lo para correr atrás do filho. Desistiu à política e ao papel da mulher na
para ficar ali como uma pobre. Podia ter sociedade, entre outros.
ido. Ele, Vitorino Carneiro da Cunha, não
precisava de ninguém para viver.Se lhe
Jorge Amado
tomassem a casa onde morava, armaria (1912-)
Jorge Amado nasceu na Bahia, em
1912. Estudou Direito e atuou como jornalista
de Andrade
em Salvador. Em 1931 mudou-se para (1902-1987)
o Rio de Janeiro. Teve participação no Carlos Drummond de Andrade nasceu
movimento de frente popular da Aliança em Itabira, Minas Gerais, em 1902.
Nacional Libertadora, o que provocou sua Graduou-se em Farmácia em Belo Horizonte.
prisão em 1936 e 1937. Entre os anos de Retornou a Itabira, onde foi professor
1941 e 1943 residiu em Buenos Aires. Em de Português e Geografia. Novamente
1945 foi eleito deputado federal em São em Belo Horizonte, segue a carreira
Paulo. Após 1947, deixou o país e passou jornalística e atua como funcionário
a morar na França. Chegou também público. Foi oficial de gabinete do Ministério
a residir na União Soviética e nas Democracias da Educação, chefiou a secção
Populares. É membro da Academia de História da Divisão de Estudos e Tombamento
Brasileira de Letras e suas obras já da Diretoria do Patrimônio Histórico
foram vertidas para mais de trinta línguas. e Artístico Nacional. Integrou o grupo
Entre seus escritos estão Jubiabá modernista de A Revista. Faleceu no
(1935); Mar Morto (1936); Capitães de Rio de Janeiro em 1987.
Areia (1937); Terras do Sem-Fim (1942), Escreveu poesia {Alguma Poesia -
Gabriela, Cravo e Canela (1958), Dona 1930, Brejo das Almas - 1934, Sentimento
Flor e seus dois maridos (1966). do Mundo -1940, A Rosa do Povo
Suas obras denunciam a situação - 1945, Claro Enigma - 1951, Lição de
do trabalhador rural e das camadas populares Coisas - 1962) e prosa (Confissões de
e são ambientadas geralmente Minas - 1944, O Gerente - 1945).
na Bahia. Apesar da grande aceitação Alguns temas foram recorrentes na
por parte do público, muitas obras tiveram obra de Drummond: o cotidiano, a preocupação
sua qualidade literária contestada social e política, as reminiscências
pelos críticos. (terra natal, família, amigos), o amor
Prosa urbana e a metalinguagem (reflexão sobre o próprio
ato de escrever).
Érico Veríssimo O poeta analisou o homem moderno
e seus sentimentos com sensibilidade
(1905-1975) e muitas vezes com ironia. Percebe
Érico Veríssimo nasceu em Cruz as injustiças do mundo (guerras, violência)
Alta, Rio Grande do Sul, em 1905. Foi e as transforma na matéria de sua
funcionário de banco e sócio de uma poesia.
farmácia. Após a falência desta, atuou Os poemas a seguir fazem parte
como secretário e redator da Revista da obra Sentimento do Mundo.
do Globo. Passou em seguida a dedicar- Poema de Sete Faces
se também à Literatura e à tradução. Quando nasci, um anjo torto
Exerceu posteriormente o cargo de desses que vivem na sombra
Diretor do Departamento de Assuntos disse: Vai, Carlos! ser gauche
Culturais da União Pan-Americana. Faleceu [na vida.
em 1975 em Porto Alegre. As casas espiam os homens
Escreveu Caminhos Cruzados que correm atrás de mulheres.
(1935), Música ao Longe (1936), Um Lugar A tarde talvez fosse azul,
ao Sol (1936), Olhai os Lírios do não houvesse tantos desejos.
Campo(1938), O Tempoeo Vento(1949- O bonde passa cheio de pernas:
1961), Incidente em Antares (1971). pernas brancas pretas amarelas.
— 273 — Para que tanta perna, meu Deus,
— 274 — [pergunta meu coração.
Os romances de Érico Veríssimo Porém meus olhos
proporcionam uma leitura agradável e não perguntam nada.
sem dificuldades, pois apresentam uma O homem atrás do bigode
linguagem simples e enredos atraentes. é sério, simples e forte.
Entretanto, foi muitas vezes criticado e Quase não conversa.
acusado de realizar análises sociais e —275—
psicológicas superficiais. Tem poucos, raros amigos
Os principais temas abordados são o homem atrás dos óculos e do
a vida urbana e seus problemas, a fundação [bigode.
social do Rio Grande do Sul e Meu Deus, por que me
questões políticas. [abandonaste
Poesia se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.
Carlos Drummond Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma
[solução.
(1913-1980)
Mundo mundo vasto mundo, Marcos Vinícius de Melo Moraes
mais vasto é meu coração. nasceu no Rio de Janeiro, em 1913. Graduou-
Eu não devia te dizer se em Direito em 1933, ano em que
mas essa lua publicou seu livro de poesia O Caminho
mas esse conhaque para a Distância. Foi crítico, censor
botam a gente comovido como cinematográfico,
[o diabo. jornalista e diplomata.
(Carlos Drummond de Andrade, Sentimento do Mundo, Veio a falecer em 1980.
Rio de Janeiro: Record, 1999. p. 11 -12) Escreveu Novos Poemas (1938),
Infância Elegias (1943), Pátria Minha (1949),
A Abgar Renault entre outras obras.
Meu pai montava a cavalo, ia para Tematizou a oposição entre matéria
[o campo. e espírito; o amor; o desejo; o cotidiano
Minha mãe ficava sentada e questões políticas.
[cosendo. Soneto de Fidelidade
Meu irmão pequeno dormia. De tudo, ao meu amor serei atento
Eu sozinho menino entre Antes, e com tal zelo, e sempre,
[mangueiras [e tanto
lia a história de Robinson Crusoé. Que mesmo em face do maior
Comprida história que não acaba [encanto
[mais. Dele se encante mais meu
No meio-dia branco de luz uma [pensamento.
[voz que aprendeu Quero vivê-lo em cada vão
a ninar nos longes da senzala - e [momento
[nunca se esqueceu E em seu louvor hei de espalhar
chamava para o café. [meu canto
Café preto que nem a preta velha E rir meu riso e derramar meu
café gostoso [pranto
café bom. Ao seu pesar ou seu
Minha mãe ficava sentada [contentamento.
[cosendo E assim, quando mais tarde me
olhando para mim: [procure
- Psiu... Não acorde o menino. Quem sabe a morte, angústia de
Para o berço onde pousou um [quem vive
[mosquito. Quem sabe a solidão, fim de quem
E dava um suspiro... que fundo! [ama
Lá longe meu pai campeava Eu possa me dizer do amor (que
no mato sem fim da fazenda. [tive):
E eu não sabia que minha história Que não seja imortal, posto que é
era mais bonita que a de [chama
[Robinson Crusoé. Mas que seja infinito enquanto
(/b/d, p. 13-14) [dure.
No Meio do Caminho (Apud Antonio Candido e José Aderaldo Castello,
Presença da Literatura Brasileira, p. 410)
No meio do caminho tinha uma
[pedra A Rosa de Hiroshima
tinha uma pedra no meio do Pensem nas crianças
[caminho Mudas telepáticas
tinha uma pedra Pensem nas meninas
no meio do caminho tinha uma Cegas inexatas
[pedra. Pensem nas mulheres
Nunca me esquecerei desse Rotas alteradas
[acontecimento Pensem nas feridas
na minha vida de minhas retinas —276—
[tão fatigadas. Como rosas cálidas
Nunca me esquecerei que no Mas oh não se esqueçam
[meio do caminho Da rosa da rosa
tinha uma pedra Da rosa de Hiroshima
tinha uma pedra no meio do A rosa hereditária
[caminho A rosa radioativa
no meio do caminho tinha uma Estúpida e inválida
[pedra. A rosa com cirrose
(to/cl p. 34) A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Vinícius de Moraes Sem rosa sem nada.
(Ibd,pp.416-417) desprendo-me do balanço
Cecília Meireles que além do tempo me leva.
Só - na treva,
(1901-1964) Fico: recebida e dada.
Cecília Meireles nasceu no Rio de Porque a vida, a vida, a vida,
Janeiro em 1901. Órfã desde tenra idade, a vida só é possível
recebeu educação da avó materna. Conclui reinventada.
o curso primário em 1910 e inicia a (Ibid, p.453)
Escola Normal, vindo a formar-se em 1917. Canção
Atua como professora, escritora e jornaista. Pus o meu sonho num navio
Foi grande divulgadora da cultura e o navio em cima do mar;
brasileira no estrangeiro. Faleceu em 1964. - depois, abri o mar com as mãos,
Escreveu Mar Absoluto (1945); para o meu sonho naufragar.
Romanceiro da Inconfidência (1953); Minhas mãos ainda estão molhadas
Canções (1956); Giroflé, Giroflá (1956); do azul das ondas entreabertas,
Ou isto ou aquilo (1964), e outras obras, e a cor que escorre dos meus dedos
envolvendo literatura adulta e infantil, colore as areias desertas.
ensaios, antologias e biografias. O vento vem vindo de longe,
A escritora escreveu uma poesia a noite se curva de frio;
repleta de musicalidade, demonstrando debaixo da água vai morrendo
influências simbolistas. Além disso, coloca meu sonho, dentro de um navio...
em questão a fugacidade do tempo Chorarei o quanto for preciso,
e a precariedade das coisas, o que resulta para fazer com que o mar cresça
numa profunda melancolia. e o meu navio chegue ao fundo
Motivo e o meu sonho desapareça.
Eu canto porque o instante existe Depois, tudo estará perfeito:
e a minha vida está completa. praia lisa, águas ordenadas,
Não sou alegre nem sou triste: meus olhos secos como pedras
sou poeta. e as minhas duas mãos quebradas]
Irmão das coisas fugidias, ( Ib id,p.45q
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
Outros autores
no vento. Murilo Monteiro Mendes nasceu em
Se desmorono ou se edifico, Juiz de Fora, Minas Gerais, em 1901.
se permaneço ou me desfaço, Realizou os cursos primário e secundário
- não sei, não sei. Não sei se fico em sua cidade e em Niterói. Em 1920,
ou passo. já no Rio de Janeiro, passa a atuar como
Sei que canto. E a canção é tudo. funcionário do Ministério da Fazenda
Tem sangue eterno a asa ritmada. Em seguida, trabalhou no Banco Mercantil
E um dia sei que estarei mudo: e tempos depois em um cartório.
- mais nada. Faleceu em Lisboa em 1975.
{Apuo Massaud Moisés, A literatura brasileira através Escreveu Poemas (1930), História
dos textos, p. 452) do Brasil (1932), Tempo e Eternidade
Reinvenção (1935), Mundo Enigma (1945), entre
A vida só é possível outros.
reinventada. Murilo Mendes
Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada (1901-1975)
pelas águas, pelas folhas... — 279 —
Ah! tudo bolhas Católico, encontrou no cristianismo
que vêm de fundas piscinas a resposta para os problemas políticos
de ilusionismo... - mais nada. e ideológicos do mundo moderno. Integrou
— 277 — o grupo espiritualista da segunda
— 278 — geração, ao lado de Vinícius de Morais
Mas a vida, a vida, a vida, e Cecília Meireles.
a vida só é possível Utilizou em suas poesias o humor e
reinventada. a ironia e abordou temas ligados ao cristianismo,
Vem a lua, vem, retira enfatizando a efemeridade da
as algemas dos meus braços. vida e a figura de Cristo, enfocada do
Projeto-me por espaços ponto de vista humano.
cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira
Jorge de Lima
da lua, na noite escura. (1893-1953)
Não te encontro, não te alcanço... Jorge Matheos de Lima nasceu em
Só - no tempo equilibrada, Alagoas, em 1893. Estudou no Colégio
dos Irmãos Maristas em Maceió. Em seguida, (1950), Morte e Vida Severína (1956),
iniciou seus estudos em Medicina, Uma Faca Só Lâmina (1956).
na Bahia, vindo a formar-se no Rio Escreveu poemas sem retórica ou
de Janeiro. Retornou a Maceió em 1915, derramamentos sentimentais, não deixando
onde iniciou sua carreira como médico. de transmitir emoção. Todavia,
Dedicou-se à literatura, influenciado esta é mais contida, já que seleciona
Inicialmente pelo Parnasianismo e cuidadosamente os vocábulos, compondo
Simbolismo. Em 1935 converteu-se ao uma linguagem precisa, exata.
catolicismo e publicou com Murúo Mendes Os trechos a seguir fazem parte da
Tempo e Eternidade. Foi também obra inspirada em composições medievais,
professor universitário e político. Faleceu Morte e Vida Severína, "auto de
em 1953 no Rio de Janeiro. Natal pernambucano" que tem como tema
Escreveu poesia (XIV Alexandrinos a trajetória de Severino. O personagem
- 1914, Invenção de Orfeu - 1952), é um homem do sertão que busca melhores
romance (O Anjo - 1934, Calunga - condições de vida e sai em direção
1935), ensaio, história e biografia. ao Litoral. Por onde passa deparase
Tematizou o negro e o folclore, a com a morte, o que o faz até pensar
religiosidade como solução para os problemas em desistir da própria vida. Entretanto, já
mundanos e a ligação entre o no Litoral, assiste ao nascimento de um
homem e o universo, utilizando elementos menino, trazendo alegria e esperança a
bíblicos e profanos. todos os homens ali presentes.
Morte e vida severína
Terceira O POETA EXPLICA AO LEITOR QUEM É
Geração do E A QUE VAI
-O meu nome é Severino,
Modernismo não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
(1945 atéa que é santo de romaria,
deram então de me chamar
atualidade) Severino de Maria;
como há muitos Severinos
Alguns historiadores e críticos com mães chamadas Maria,
costumam chamar o período literário fiquei sendo o da Maria
subseqüente a 1945 de Pós-Modernismo, do finado Zacarias.
já outros o consideram como a terceira Mas isso ainda diz pouco:
fase modernista, posição que adotamos. há muitos na freguesia,
Com o término da Segunda Guerra por causa de um coronel
Mundial, os escritores voltam-se novamente que se chamou Zacarias
às questões internas do país. e que foi o mais antigo
A nova geração procurou negar senhor desta sesmaria.
os valores modernistas das gerações Como então dizer quem fala
anteriores e trazer novos elementos à ora a Vossas Senhorias?
literatura. Caracteriza-se pela disciplina Vejamos: é o Severino
formal e retomada de valores tradicionais da Maria do Zacarias,
na poesia. Os escritores valorizam lá da serra da Costela,
a palavra, tanto no que diz respeito limites da Paraíba.
à semântica quanto à sonoridade. Mas isso ainda diz pouco:
João Cabral de Melo Neto se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
(1920-1999) filhos de tantas Marias
João Cabral de Melo Neto nasceu mulheres de outros tantos,
em Recife, Pernambuco, em 1920. Realizou já finados, Zacarias,
os estudos primários e secundários vivendo na mesma serra
em sua cidade, não chegando ao magra e ossuda em que eu vivia.
curso superior. Após trabalhar numa Somos muitos Severinos
companhia de seguros na Associação iguais em tudo na vida:
Comercial de Pernambuco e no Departamento na mesma cabeça grande
de Estatística do Estado, transferiu- que a custo é que se equilibra,
se para o Rio de Janeiro. Foi diplomata no mesmo ventre crescido
e realizou funções consulares em sobre as mesmas pernas finas,
Assunção, Barcelona e Dakar. Foi membro e iguais também porque o sangue
da Academia Brasileira de Letras. que usamos tem pouca tinta.
Faleceu em 1999. — 280 —
Entre suas obras estão Pedra do E se somos Severinos
Sono (1942), O Cão sem Plumas iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual, — 281 —
mesma morte severina: — 282 —
que é a morte que se morre Parecia calma. Desde sábado encolhera-
de velhice antes dos trinta, se num canto da cozinha. Não
de emboscada antes dos vinte, olhava para ninguém, ninguém olhava
de fome um pouco por dia para ela. Mesmo quando a escolheram,
(de fraqueza e de doença apalpando sua intimidade com indiferença,
é que a morte severina não souberam dizer se era gorda ou
ataca em qualquer idade, magra. Nunca se adivinharia nela um anseio.
e até gente não nascida). Foi pois uma surpresa quando a viram
Somos muitos Severinos abrir as asas de curto vôo, inchar o
iguais em tudo e na sina: peito e, em dois ou três lances, alcançar
a de abrandar estas pedras a murada do terraço. Um instante ainda
suando-se muito em cima, vacilou - o tempo da cozinheira dar um
a de tentar despertar grito - e em breve estava no terraço do
terra sempre mais extinta, vizinho, de onde, em outro vôo desajeitado,
a de querer arrancar alcançou um telhado. Lá ficou em
algum roçado da cinza. adorno deslocado, hesitando ora num,
Mas, para que me conheçam ora noutro pé. A família foi chamada com
melhor Vossas Senhorias urgência e consternada viu o almoço
e melhor possam seguir junto de uma chaminé. O dono da casa
a história de minha vida, lembrando-se da dupla necessidade de
passo a ser o Severino fazer esporadicamente algum esporte e
que em vossa presença emigra. de almoçar vestiu radiante um calção de
(João Cabral de Melo Neto, Morte e vida severina. Rio banho e resolveu seguir o itinerário da
de Janeiro: Nova Fronteira,1994, pp.29-30) galinha: em pulos cautelosos alcançou
Clarice Lispector o telhado onde esta hesitante e trêmula
escolhia com urgência outro rumo. A
(1925-1977) perseguição tornou-se mais intensa. De
Clarice Lispector nasceu em Tchetchelnik, telhado a telhado foi percorrido mais de
Ucrânia, em 1925. Quando ela um quarteirão da rua. Pouco afeita a uma
tinha apenas dois meses, seus pais imigraram luta mais selvagem pela vida a galinha
para São Paulo. Realizou os cursos tinha que decidir por si mesma os caminhos
primários e secundários no Recife. a tomar sem nenhum auxílio de sua
Cursou Direito no Rio de Janeiro, vindo raça. O rapaz, porém, era um caçador,
a formar-se em 1944. Casou-se com adormecido. E por mais ínfima que fosse
um diplomata e afastou-se do país por a presa o grito de conquista havia
diversas vezes, não deixando, porém, soado.
de escrever. Faleceu no Rio de Janeiro Sozinha no mundo, sem pai nem
em 1977. mãe, ela corria, arfava, muda, concentrada.
Escreveu romances (O Lustre - Às vezes, na fuga, pairava ofegante
1946, A Cidade Sitiada- 1949, A Maçã num beiral de telhado e enquanto
no Escuro - 1961, A Paixão Segundo o rapaz galgava outros com dificuldade
G. H. - 1964, Uma Aprendizagem ou O tinha tempo de se refazer por um momento.
Livro dos Prazeres - 1969, Água Viva E então parecia tão livre.
- 1973, A Hora da Estrela - 1 9 7 7 ) ; contos Estúpida, tímida e livre. Não vitoriosa
(Laços de Família - 1960, A Legião como seria um galo em fuga. Que é
Estrangeira - 1964, A Via Crucis que havia nas suas vísceras que fazia
do Corpo - 1974); crônicas e livros infantis. dela um ser? A galinha é um ser. É verdade
A autora produziu uma obra de que não se poderia contar com ela
ficção fundamentalmente introspectiva, para nada. Nem ela própria contava consigo,
centrada na intimidade dos personagens. como o galo crê na sua crista. Sua
A prosa aproxima-se da poesia e única vantagem é que havia tantas galinhas
é muitas vezes marcada pelo fluxo psicológico que morrendo uma surgiria no mesmo
dos personagens. Estes, a instante outra tão igual como se fora
partir de fatos do cotidiano, aparentemente a mesma.
sem importância, descobrem-se Afinal, numa das vezes em que
e encontram a própria razão de existir. parou para gozar sua fuga, o rapaz
Um bom exemplo disso é o conto a alcançou-a. Entre gritos e penas, ela
seguir, pertencente ao livro Laços de foi presa. Em seguida carregada em
Família. triunfo por uma asa através das telhas
Uma galinha e pousada no chão da cozinha com
Era uma galinha de domingo. Ainda certa violência. Ainda tonta, sacudiuse
viva porque não passava de nove horas um pouco, em cacarejos roucos e
da manhã. indecisos.
Foi então que aconteceu. De pura fêmeas cantar, ela não cantaria mas ficaria
afobação a galinha pôs um ovo. Surpreendida, muito mais contente. Embora nem
exausta. Talvez fosse prematuro. nesses instantes a expressão de sua
Mas logo depois, nascida que vazia cabeça se alterasse. Na fuga, no
fora para a maternidade, parecia uma descanso, quando deu à luz ou bicando
velha mãe habituada. Sentou-se sobre milho - era uma cabeça de galinha, a
o ovo e assim ficou respirando, abotoando mesma que fora desenhada no começo
e desabotoando os olhos. Seu dos séculos.
coração tão pequeno num prato soleava Até que um dia mataram-na, comeram-
e abaixava as penas enchendo de tepidez na e passaram-se anos.
aquilo que nunca passaria de um (Clarice Lispector. Laços de Família, Rio de Janeiro:
ovo. Só a menina estava perto e assistiu Francisco Alves, 1993, pp. 43-46)
a tudo estarrecida. Mal porém conseguiu Guimarães Rosa
desvencilhar-se do acontecimento
despregou-se do chão e saiu aos ( 1 9 0 8 - 1967)
gritos: João Guimarães Rosa nasceu em
— 283 — Cordisburgo, Minas Gerais, em 1908.
- Mamãe, mamãe, não mate mais a Graduou-se em Medicina, seguindo por
galinha, ela pôs um ovo! Ela quer o nosso um tempo a carreira de médico. Foi também
bem! diplomata e embaixador. Faleceu no
Todos correram de novo à cozinha Rio de Janeiro em 1967.
e rodearam mudos a jovem parturiente. Entre suas obras estão Sagarana
Esquentando seu filho, esta não era nem (1946); Corpo de Baile (1956); Grande
suave nem arisca, nem alegre nem triste, Sertão: Veredas (1956); Primeiras Estórias
não era nada, era uma galinha. O (1962); Tutaméia (Terceiras Estórias)
que não sugeria nenhum sentimento especial. (1967).
O pai, a mãe e a filha olhavam já O escritor expôs, a partir do sertão
há algum tempo, sem propriamente um mineiro, as questões humanas mais profundas.
pensamento qualquer. Nunca ninguém Portanto, sua obra tem caráter
acariciou uma cabeça de galinha. O pai universal.
afinal decidiu-se com certa brusquidão: A linguagem utilizada é fruto de intensa
- Se você mandar matar esta galinha construção formal, agrupando regionalismo,
nunca mais comerei galinha na minha termos científicos, arcaísmos,
vida! expressões estrangeiras e marcada pela
- Eu também! jurou a menina com oralidade. Além disso, o autor de Grande
ardor. Sertão: Veredas soube explorar com
A mãe, cansada, deu de ombros. precisão os vocábulos.
Inconsciente da vida que lhe fora O conto a seguir faz parte do livro
entregue, a galinha passou a morar com Primeiras Estórias e trabalha a questão
a família. A menina, de volta do colégio, da palavra, com seus múltiplos significados,
.ogava a pasta longe sem interromper a conotações. Ela pode provocar
corrida para a cozinha. O pai de vez em lutas, gerar discórdia, trazer raiva,
quando ainda se lembrava: "E dizer que ou mesmo abrandar situações, ser
a obriguei a correr naquele estado!" A motivo de alegria e prazer ao ser ouvida.
galinha tornara-se a rainha da casa. Guimarães coloca frente a frente
Todos, menos ela, o sabiam. Continuou dois homens: um iletrado, temido no lugar
entre a cozinha e o terraço dos fundos, por causa de seus feitos, que deseja
-isando suas duas capacidades: a de saber o significado de um vocábulo,
apatia e a do sobressalto. e um letrado, que o deixa ciente do
Mas quando todos estavam quietos sentido deste, tomando o cuidado de
na casa e pareciam tê-la esquecido, não deixá-lo Insatisfeito ao responder
enchia-se de uma pequena coragem, à pergunta...
resquícios da grande fuga - e circulava Famigerado
pelo ladrilho, o corpo avançando Foi de incerta feita - o evento. Quem
atrás da cabeça, pausado como num pode esperar coisas tão sem pés nem
campo, embora a pequena cabeça a cabeça? Eu estava em casa, o arraial
traísse: mexendo-se rápida e vibrátil, sendo de todo tranqüilo. Parou-me à
com o velho susto de sua espécie já porta o tropel. Cheguei à janela.
mecanizado. Um grupo de cavaleiros. Isto é, vendo
Uma vez ou outra, sempre mais raramente, melhor: um cavaleiro rente, frente à
lembrava de novo a galinha que minha porta, equiparado, exato; e,
se recortara contra o ar à beira do telhado, embolados, de banda, três homens a
prestes a anunciar. Nesses momentos cavalo. Tudo, num relance, insolitíssimo.
enchia os pulmões com o ar impuro Tomei-me nos nervos. O cavaleiro esse
da cozinha e, se fosse dado às - o oh-homem-oh - com cara de nenhum
amigo. Sei o que é influência de sempre na cabeça. Um alarve. Mais
fisionomia. Saíra e viera, aquele homem, os ínvios olhos. E ele era para muito.
para morrer em guerra. Saudou-me seco, Seria de ver-se: estava em armas - e
curto pesadamente. Seu cavalo era alto, de armas alimpadas. Dava para se sentir
um alazão; bem arreado, ferrado, suado. o peso da de fogo, no cinturão, que
E concebi grande dúvida. usado baixo, para ela estar-se já ao nível
Nenhum se apeava. Os outros, tristes justo, ademão tanto que ele se persistia
três, mal me haviam olhado, nem de braço direito pendido, pronto
olhassem para nada. Semelhavam a meneável. Sendo a sela, de notar-se,
gente receosa, tropa desbaratada, sopitados, uma jereba papuda urucuiana, pouco de
constrangidos - coagidos, sim. se achar, na região, pelo menos de tão
Isso por isso, que o cavaleiro solerte boa feitura. Tudo de gente brava. Aquele
tinha o ar de regê-los: a meio-gesto, propunha sangue, em suas tenções.
desprezivo, intimara-os de pegarem o Pequeno, mas duro, grossudo, todo em
lugar onde agora se encostavam. Dado tronco de árvore. Sua máxima violência
que a frente da minha casa reentrava, podia ser para cada momento. Tivesse
metros, da linha da rua, e dos dois lados aceitado de entrar e um café, calmavame.
avançava a cerca, formava-se ali Assim, porém, banda de fora, sem
um encantoável, espécie de resguardo. a-graças de hóspede nem surdez de
Valendo-se do que, o homem obrigara paredes, tinha para um se inquietar, sem
os outros ao ponto donde seriam medida e sem certeza.
menos vistos, enquanto barrava-lhes - "Vosmecê é que não me conhece.
qualquer fuga; sem contar que, unidos Damázio, dos Siqueiras... Estou vindo
assim, os cavalos se apertando, não da Serra..."
dispunham de rápida mobilidade. Tudo Sobressalto. Damázio, quem dele
enxergara, tomando ganho da topografia. não ouvira? O feroz de estórias de léguas,
Os três seriam seus prisioneiros, com dezenas de carregadas mortes,
não seus sequazes. Aquele homem, homem perigosíssimo. Constando
para proceder da forma, só podia ser também, se verdade, que de para uns
um brabo sertanejo, jagunço até na anos ele se serenara - evitava o de
escuma do bofe. Senti que não me ficava evitar. Fie-se, porém, quem, em tais tréguas
útil dar cara amena, mostras de de pantera? Ali, antenasal, de mim
temoroso. Eu não tinha arma ao alcance. a palmo! Continuava:
Tivesse, também, não adiantava. - "Saiba vosmecê que, na Serra,
Com um pingo no i, ele me dissolvia. O por o ultimamente, se compareceu um
medo é a extrema ignorância em momento moço do Governo, rapaz meio estrondoso...
muito agudo. O medo O. O medo Saiba que estou com ele à revelia...
me miava. Convidei-o a desmontar, a Cá eu não quero questão com o
entrar. Governo, não estou em saúde nem idade...
O rapaz, muitos acham que ele é
Disse de não, conquanto os costumes. de seu tanto esmiolado..."
Conservava-se de chapéu. Viase Com arranco, calou-se. Como arrependido
que passara a descansar na sela - de ter começado assim, de
decerto relaxava o corpo para dar-se evidente. Contra que aí estava com o
mais à ingente tarefa de pensar. Perguntei: fígado em más margens; pensava, pensava.
respondeu-me que não estava Cabismeditado. Do que, se resolveu.
doente, nem vindo à receita ou consulta. Levantou as feições. Se é que se
Sua voz se espaçava, querendo-se riu: aquela crueldade de dentes. Encarar,
calma; a fala de gente de mais longe, não me encarava, só se fito à meia
talvez são-franciscano. Sei desse tipo esguelha. Latejava-lhe um orgulho indeciso.
de valentão que nada alardeia, sem Redigiu seu monologar.
farroma. Mas avessado, estranhão, perverso O que frouxou falava: de outras,
brusco, podendo desfechar com diversas pessoas e coisas, da Serra,
algo, de repente, por um és-não-és. Muito do São Ão, travados assuntos, inseqüentes,
de macio, mentalmente, comecei a me como dificultação. A conversa
organizar. Ele falou: era para teias de aranha. Eu tinha de
- "Eu vim preguntar a vosmecê uma entender-lhe as mínimas entoações,
opinião sua explicada..." seguir seus propósitos e silêncios. Assim
Carregara a celha. Causava outra no fechar-se com o jogo, sonso, no
inquietude, sua farrusca, a catadura de me iludir, ele enigmava. E, pá:
canibal. Desfranziu-se, porém quase - "Vosmecê agora me faça a boa
que sorriu. Daí, desceu do cavalo; maneiro, obra de querer me ensinar o que é mesmo
imprevisto. Se por se cumprir do que é: fasmisgerado... faz-me-gerado...
maior valor de melhores modos; por esperteza? falmisgeraldo... familhas-gerado...?
Reteve no pulso a ponta do Disse, de golpe, trazia entre dentes
cabresto, o alazão era para paz. O chapéu
aquela frase. Soara com riso seco. disse:
Mas, o gesto, que se seguiu, imperavase - Olhe: eu, como o sr. me vê, com
de toda a rudez primitiva, de sua presença vantagens, hum, o que eu queria uma
dilatada. Detinha minha resposta, hora destas era ser famigerado - bem
não queria que eu a desse de imediato. famigerado, o mais que pudesse!...
E já aí outro susto vertiginoso suspendia- -"Ah, bem!..." - soltou, exultante.
me: alguém podia ter feito intriga, Saltando na sela, ele se levantou de
invencionice de atribuir-me a palavra de molas. Subiu em si, desagravava-se, num
ofensa àquele homem; que muito, pois, desafogaréu. Sorriu-se, outro. Satisfez
que aqui ele se famanasse, vindo para aqueles três: - "Vocês podem ir, compadres.
exigir-me, rosto a rosto, o fatal, a vexatória Vocês escutaram bem a boa descrição..."
satisfação? - e eles prestes se partiram.
- "Saiba vosmecê que saí ind'hoje Só aí se chegou, beirando-me a janela,
da Serra, que vim, sem parar, essas seis aceitava um copo d'água. Disse: - "Não
léguas, expresso direto pra mor de lhe há como que as grandezas machas duma
preguntaa pregunta, pelo claro..." pessoa instruída!" Seja que de novo, por
Se sério, se era. Transiu-se-me. um mero, se torvava? Disse: - "Sei lá, às
- "Lá, e por estes meios de caminho, vezes o melhor mesmo, pra esse moço
tem nenhum ninguém ciente, nem do Governo, era ir-se embora, sei não..."
têm o legítimo - o livro que aprende as Mas mais sorriu, apagar-se-lhe a inquietação.
palavras... É gente pra informação torta, Disse: - "A gente tem cada cisma
por se fingirem de menos ignorâncias... de dúvida boba, dessas desconfianças...
Só se o padre, no São Ão, capaz, Só pra azedar a mandioca..." Agradeceu,
mas com padres não me dou: eles logo quis me apertar a mão. Outra vez,
engambelam... A bem. Agora, se me faz aceitaria de entrar em minha casa. Oh,
mercê, vosmecê me fale, no pau da peroba, pois. Esporou, foi-se, o alazão, não pensava
no aperfeiçoado: o que é que é, o no que o trouxera, tese para alto
que iá lhe perguntei"? rir, e mais, o famoso assunto.
Se simples. Se digo. Transfoi-seme. (Guimarães Rosa, Primeiras Estórias, Rio de Janeiro:
Esses trizes: Nova Fronteira, 1988, p. 13-17)
- Famigerado? Primeiras Estórias
- "Sim senhor..." - e, alto, repito, Publicada em 1962, Primeiras Estórias
vezes, o termo, enfim nos vermelhões é uma obra que reúne vinte e um
da raiva, sua voz fora de foco. E já me contos, estruturados em pequenas narrativas,
olhava, interpelador, intimativo - apertava- que têm como fio condutor um
me. Tinha eu que descobrir a cara. - único acontecimento.
Famigerado? Habitei preâmbulos. Bem Guimarães trabalha diferentes temas:
que eu me carecia noutro ínterim, em infância, violência, loucura, culpa,
indúcias. Como por socorro, espiei os memória, amor; realizando desde a abordagem
três outros, em seus cavalos, intugidos psicológica, passando pela fantástica,
até então, mumumudos. Mas, Damázio: mística, lírica até a satírica.
- "Vosmecê declare. Estes aí são Pequenos fatos do cotidiano despertam
de nada não. São da Serra. Só vieram no leitor a sensibilidade para as
comigo, pra testemunho..." coisas simples da vida e provocam a
Só tinha de desentalar-me. O homem reflexão sobre o grandioso mistério da
queria estrito o caroço: o verivérbio. existência.
- Famigerado é inóxio, é célebre", Na maior parte dos contos o cenário
"notório", "notável"... é o campo, provavelmente reminiscências
- "Vosmecê mal não veja em minha da infância e juventude do autor
grassaria no não entender. Mais me diga: em Minas Gerais. Já os personagens
É desaforado? É caçoável? É de arrenegar? em geral são loucos ou crianças, criaturas
Farsância? Nome de ofensa?" que encaram de modo peculiar a
- Vilta nenhuma, nenhum doesto. realidade e demonstram maior sensibilidade
São expressões neutras, de outros para o misticismo e a metafísica.
usos... Conseguem transformar episódios cotidianos
- "Pois... e o que é que é, em fala em momentos intensos, de revelação
de pobre, linguagem de em dia-de-semana?" epifânica e mudança de vida.
- Famigerado? Bem. É: "importante", Grande Sertão: Veredas
que merece louvor, respeito... Romance publicado em 1956, mesmo
- "Vosmecê agarante, pra a paz ano da publicação de Corpo de Baile,
das mães, mão na Escritura?" Grande Sertão: Veredas é a obra
— 286 — mais importante de Guimarães Rosa e já
— 287 — foi traduzida para diversas línguas.
Se certo! Era para se empenhar a A narrativa é centrada no discurso
barba. Do que o diabo, então eu sincero de Riobaldo, narrador-personagem que
conta sua experiência de vida a um mulher que se traveste de homem, assumindo
interlocutor, que em momento algum se o papel de um jagunço.
manifesta. (fragmento)
Ex-jagunço do norte de Minas, — Nonada. Tiros que o senhor ouviu
Riobaldo agora vive próximo ao Rio São foram de briga de homem não, Deus
Francisco como fazendeiro e tem o hábito esteja. Alvejei mira em árvores no quintal,
de rezar e conversar com as pessoas no baixo do córrego. Por meu acerto.
que por ali passam, contando casos es— Todo dia isso faço, gosto; desde mal em
288 - minha mocidade. Daí, vieram me chamar.
tranhos, histórias de vingança, de perseguição, Causa dum bezerro: um bezerro branco,
de luta e também de amor. erroso, os olhos de nem ser - se viu
Apesar de jagunço, Riobaldo recebeu -; e com máscara de cachorro. Me disseram;
educação formal, o que pode ser eu não quis avistar. Mesmo que,
percebido em suas reflexões metafísicas por defeito como nasceu, arrebitado de
e na oralidade fluente. beiços, esse figurava rindo feito pessoa.
O narrador-personagem conta várias Cara de gente, cara de cão: determinaram
histórias, conservando sempre a - era o demo. Povo prascóvio.
inquietação em questionar a existência Mataram. Dono dele nem sei quem for.
ou não do diabo. Pouco a pouco o leitor Vieram emprestar minhas armas, cedi.
vai desvendando o motivo desta preocupação: Não tenho abusões. O senhor ri certas
ela está relacionada a um provável risadas... Olhe: quando é tiro de verdade,
pacto feito por Riobaldo com o diabo, primeiro a cachorrada pega a latir,
quando, na juventude, ele almejava instantaneamente - depois, então, se vai
vencer seu inimigo Hermógenes. Dessa — 289 —
forma, o futuro de sua alma depende da ver se deu mortos. O senhor tolere, isto
existência ou não do diabo. é o sertão. Uns querem que não seja:
Ao relatar seus casos, o narrador que situado sertão é por os camposgerais
mistura acontecimentos vividos e imaginados, a fora a dentro, eles dizem, fim de
adquirindo a narrativa o ritmo fragmentário rumo, terras altas, demais do Urucuia.
e não linear das lembranças. Toleima. Para os de Corinto e do Curvelo,
A linguagem tem para o narrador então, o aqui não é dito sertão? Ah, que
um papel fundamental: o de examinar tem maior! Lugar sertão se divulga: é
sua vida e tentar entendê-la, além de onde os pastos carecem de fechos; onde
purgar-se de suas culpas. um pode torar dez, quinze léguas, sem
Merece destaque a personagem topar com casa de morador; e onde criminoso
feminina Diadorim, que exerce forte atração vive seu cristo-jesus, arredado
sobre Riobaldo, mas por outro lado do arrocho de autoridade. O Urucuia vem
traz-lhe grandes preocupações. Isso dos montões oestes. Mas, hoje, que na
porque o narrador pensa que Diadorim beira dele, tudo dá - fazendões de fazendas,
é um homem, o bravo guerreiro Reinaldo, almargem de vargens de bom
vindo a descobrir a verdadeira identidade render, as vazantes; culturas que vão
dessa personagem apenas ao término de mata em mata, madeiras de grossura,
da luta em que ela é morta por Hermógenes. até ainda virgens dessas lá há. O gerais
Segundo os críticos, podemos identificar corre em volta. Esses gerais são sem
três planos no romance: o da vida tamanho. Enfim, cada um o que quer
dos jagunços, mostrando os aspectos aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é
geográficos, econômicos, políticos e questão de opiniães... O sertão está em
sociais dos sertão; o das reflexões, em toda a parte.
que Riobaldo retoma seu passado e resgata No demo? Não gloso. Senhor pergunte
sua própria vida; o plano mítico, caracterizado aos moradores. Em falso receio,
pelos conflitos que se mostram desfalam no nome dele - dizem só: o
através das forças da natureza. Que-Diga. Vote! não... Quem muito se
A leitura do texto dá-nos realmente evita, se convive. Sentença num Aristides
a impressão de um relato oral, pela linguagem - o que existe no buritizal primeiro
e recursos sintáticos utilizados. desta minha mão direita, chamado a Vereda-
Contudo, o discurso sertanejo é enriquecido da-Vaca-Mansa-de-Santa-Rita -
por diversos regionalismos, arcaísmos, todo o mundo crê: ele não pode passar
estrangeirismos e neologismos, em três lugares, designados: porque
resultado de estudos e pesquisas do então a gente escuta um chorinho, atrás,
autor. Dessa forma, a obra assume um e uma vozinha que avisando: - "Eu já
caráter dual, oscilando entre o coloquial vou! Eu já vou!..." - que é o capirote o
e o erudito, caráter também presente no que-diga... E um Jisé Simpilício - quem
conteúdo da mesma: ao discutir a existência qualquer daqui jura ele tem um capeta
ou não do diabo ou mesmo ao em casa, miúdo satanazim, preso obrigado
apresentar personagens como Diadorim, a ajudar em toda ganância que
executa; razão que o Simpilício se empresa o Rasga-em-Baixo, Faca-Fria, o
em vias de completar de rico. Fancho-Bode, um Trecizizno, o Azinhave...
Apre, por isso dizem também que a besta o Hermógenes... Deles, punhadão.
pra ele rupeia, nega de banda, não Se eu pudesse esquecer tantos nomes...
deixando, quando ele quer amontar... Não sou amansador de cavalos!
Superstição. Jisé Simpilício e Aristides, E, mesmo, quem de si de ser jagunço se
mesmo estão se engordando, de assim éntrete, já é por akjuma competência
não-ouvir ou ouvir. Ainda o senhor estude: entrante do demônio. Será não? Será?
agora mesmo, nestes dias de época, De primeiro, eu fazia e mexia, e pensar
tem gente porfalando que o Diabo não pensava. Não possuía os prazos.
próprio parou, de passagem, no Andrequicé. Vivi puxando difícil de difícel, peixe
Um Moço de fora, teria aparecido, vivo no moquém: quem mói no asp'ro,
e lá se louvou que, para aqui vir - não fantaseia. Mas, agora, feita a folga
normal, a cavalo, dum dia-e-meio - ele que me vem, e sem pequenos desassossegos,
era capaz que só com uns vinte minutos estou de range rede. E me
bastava... porque costeava o Rio do que me vem, e sem pequenos desassossegos,
Chico pelas cabeceiras! Ou, também, estou de range rede. E me
quem sabe - sem ofensas - não terá inventei neste gosto, de especular idéia.
sido, por um exemplo, até mesmo o senhor O diabo existe e não existe? Dou o dito.
quem se anunciou assim, quando Abrenuncio. Essas melancolias. O senhor
passou por lá, por prazido divertimento vê: existe cachoeira; e pois? Mas
engraçado? Há-de, não me dê crime, cachoeira é barranco de chão, e água
sei que não foi. E mal eu não quis. Só se caindo por ele, retombando; o senhor
que uma pergunta, em hora, às vezes, consome essa água, ou desfaz o barranco,
clareia razão de paz. Mas, o senhor sobra cachoeira alguma? Viver é
entenda: o tal moço, se há, quis mangar. negócio muito perigoso...
Pois, hem, que, despontar o Rio pelas Explico ao senhor: o diabo vige dentro
nascentes, será a mesma coisa que um do homem, os crespos do homem -
se redobrar nos internos deste nosso ou é o homem arruinado, ou o homem
Estado nosso, custante viagem de uns dos avessos. Solto, por si, cidadão, é
três meses... Então? Que-Diga? Doideira. que não tem diabo nenhum. Nenhum! - é
A fantasiação. E, o respeito de dar a o que digo. O senhor aprova? Me declare
ele assim esses nomes de rebuço, é tudo, franco - é alta mercê que me
que é mesmo um querer invocar que ele faz: e pedir posso, encarecido. Este caso
forme forma, com as presenças! - por estúrdio que me vejam - é de minha
Não seja. Eu pessoalmente, quase certa importância. Tomara não fosse...
que já perdi nele a crença, mercês a Mas, não diga que o senhor, assiado e
Deus; é o que ao senhor lhe digo, à puridade. instruído, que acredita na pessoa dele?!
Sei que é bem estabelecido, que Não? Lhe agradeço! Sua alta opinião compõe
grassa nos Santos-Evangelhos. Em ocasião, minha valia. Já sabia, esperava por
conversei com um rapaz semina— ela - já o campo! Ah, a gente, na velhice,
290 — carece de ter sua aragem de descanso.
rista, muito condizente, conferindo no Lhe agradeço. Tem diabo nenhum. Nem
livro de rezas e revestido de paramenta, espírito. Nunca vi. Alguém devia de ver,
com uma vara de maria-preta na mão - então era eu mesmo, este vosso servidor.
proseou que ia adjutorar o padre, para Fosse lhe contar... Bem, o diabo regula
extraírem o Cujo, do corpo vivo de uma seu estado preto, nas criaturas, nas
velha, na Cachoeira-dos-Bois, ele ia mulheres, nos homens. Até: nas crianças
com o vigário do Campo-Redondo... Me - eu digo. Pois não é ditado: "menino
concebo. O senhor não é como eu? Não - trem do diabo"? E nos usos, nas plantas,
acreditei patavim. Compadre meu Quelemém nas águas, na terra, no vento... Estrumes...
descreve que o que revela efeito O diabo na rua, no meio do redemunho...
são os baixos espíritos descarnados, (Rosa, João Guimarães. GrandeSertão;Veredas, Rio
de terceira, fuzuando nas piores trevas de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, pp. 1 -4)
e com ânsias de se travarem com os Resumo do Modernismo
viventes - dão encosto. Compadre meu
Momento sócio-cultural
Quelemém é quem muito me consola -
• As máquinas e o ritmo acelerado da
Quelemém de Góis. Mas ele tem de morar
civilização industrial se incorporavam
longe daqui, na Jijujã, Vereda do Buriti
à paisagem brasileira.
Pardo... Arres, me deixe lá, que - em
• Problemas sociais antigos continuam
endemoninhamento ou com encosto - o
sem solução, produzindo tensões e
senhor mesmo deverá de ter conhecido
conflitos graves. Os meios intelectuais
diversos, homens, mulheres. Pois não
sentem que é preciso reformar
sim? Por mim, tantos vi, que aprendi. Rincha-
o Brasil, mergulhado numa contradição
Mãe, Sangue-d'Outro, o Muitos-Beiços,
grave: ao mesmo tempo em que
se modernizava, mantinha uma organização Investiga temais universais. Destaques:
social arcaica. Sagarana(1946), Corpo de Baile
Características literárias (1956), Grande Sertão: Veredas
• A 1- fase é a de ruptura com o passado. (1956), Tutaméia (Terceiras Estórfas)(
Humor, uso do coloquial, 1967).
primitivismo, vanguardas, tudo é válido — 291 —
Tendências
para criar uma literatura em
sintonia com os novos tempos.
• na 2- fase se estabelecem o romance
regionalista, que retrata urna certa
região do país, e a prosa intimista,
Contemporâneas
que estuda o homem urbano.
• a 3 8 fase nega algumas das propostas (1960 até a
da \- e retoma o uso cuidadoso
e consciente da palavra. O
número de correntes literárias e autores
atualidade)
A partir das décadas de 50 e 60,
cresce, o que torna difícil classificar
muitos autores falam em Pós-Modernismo
essa fase.
ou tendências contemporâneas. Isso
Autores e obras porque ainda se fazem presentes muitas
• Mário de Andrade: deixou uma obra características modernistas, porém
vasta e muito influente, onde os destaques há várias inovações.
são Paulicéia Desvairada Segundo Domício Proença Filho, a
(1922), Macunaíma (1928), Contos arte pós-modemísta aproxima a arte erudita
Novos (1946), Lira Paulistana (1946). e a arte popular; é marcada pela
• Oswald de Andrade: Incorporou elementos intertextualidade (diálogo entre obras);
das vanguardas européias em realiza uma mistura de estilos; demonstra
seus poemas. Escreveu Memórias forte preocupação com o momento
Sentimentais de João Miramar(1924), presente; faz uso da ironia e da metalinguagem.
Paul Brasil (1925), Serafim Ponte
Grande (1933), O Rei da Vela (1937).
• Manuel Bandeira: deixou obra lírica,
Poesia
precisa e simples, mas muito bem Concretismo e outros
construída. Destacam-se Libertinagem
(1930), Estrela da Manhã
movimentos
(1936), Itinerário de Pasárgada Segundo Philadelpho Menezes, no
(1954), Estrela da Vida /nfe/ra(1966). século XX várias linguagens passam a
• Graciliano Ramos: expoente do romance influenciar a poesia: a tipografia, o desenho,
regional e de análise psicológica. as artes gráficas, a fotografia, o
Principais obras: São Bernardo cinema, a publicidade. Esta passa a utilizar
(1934), Angústia (1936), Wdas Secas elementos visuais, criando a chamada
(1938), Memórias do Cárcere (1953). "poesia visual" e a valorizar mais
• Carlos Drummond de Andrade: a oralidade da palavra falada, originando
considerado o maior poeta da literatura a "poesia sonora".
brasileira, deixou obra que expressa A influência das diversas linguagens
a angústia do homem contemporâneo. na poesia está diretamente relacionada
Destaques: Alguma Poesia aos elementos visuais que passam
(1930), Sentimento do Mundo a compor as grandes cidades e os
(1940), A Rosa do Povo (1945), Claro meios de comunicação de massa.
Enigma (1951), Boitempo (1968). O autor faz questão de ressaltar
• João Cabral de Melo Neto: um dos que "poesia visual" engloba "toda espécie
poetas brasileiros mais importantes, de poesia ou texto que utilize elementos
deixou obra sem exageros sentimentais, gráficos para se somar às palavras,
precisa e seca. Destaques: Pedra em qualquer época da história e
do Sono (1942), O Cão sem Plumas em qualquer lugar; já 'poesia concreta' é
(1950), Morte e Vida Severina um estilo de poesia visual que nasce
(1956), Museu de Tudo (1975). num dado momento histórico, com características
• Clarice Lispector: autora de obra bem definidas."
voltada ao intimismo e ao mergulho O movimento concretista tem sua
na psique dos personagens. Principais origem em 1952, na revista "Noigandres",
obras: A Cidade Sitiada (1949), mas inicia-se oficialmente em
A Paixão segundo G. H. (1964), Água 1956, com a Exposição Nacional de Arte
Viva (1973), A Via-Crúcis do Corpo Concreta, que aconteceu em São Paulo.
(1974), A Hora da Estrela (1977). Foi o primeiro movimento literário no Brasil
• Guimarães Rosa: usando o sertão a utilizar recursos visuais, inovando a
mineiro como cenário, criou obra que idéia de poesia.
O Concretismo prioriza os recursos
gráficos das palavras, enfatizando e a liberdade, pequena.
a comunicação visual entre o texto e o (Ferreira Gullar, Os melhores poemas de Ferreira
leitor. Há um abandono dos versos e do Gullar, São Paulo: Global, 1994.)
lirismo e o espaço do papel é aproveitado, Observe com atenção o poema de
assim como o conteúdo sonoro e Décio Pignatari:
visual das palavras. O significado cede
sua importância ao valor concreto do beba coca cola
poema. Este, por sua vez, permite muitas
possibilidades de leitura. babe cola
— 292 —
—293— beba coca
Os principais poetas concretistas
são Augusto de Campos, seu irmão
Haroldo de Campos e Décio Pignatari.
babe cola caco
Paralelamente à poesia concreta
ocorreu a chamada poesia social, que
caco
resistiu ao formalismo da primeira e criticou
a alienação dos movimentos vanguardistas. cola
Retomou os versos e utilizou
uma linguagem mais simples, tendo cloaca
como tema a realidade social. Podemos — 294 —
citar alguns nomes: Ferreira Gullar,
Thiago de Mello e Alfonso Romano Prosa
de SanfAnna.
A literatura também sofreu grande
Realismo Urbano
influência do Tropicalismo, movimento Os romances de ambientação urbana
no campo da música que, assim como o tematizam a violência e a marginalidade
Manifesto Antropófago de Oswald de nas grandes cidades.
Andrade, propunha a incorporação de Podemos citar como principais autores
quaisquer culturas, sem preconceito. Rubem Fonseca, com seus contos;
Nos anos 70 muitos poetas construíram Dalton Trevisan, com parte de sua
uma poesia denominada "marginal", obra e João Antônio, com seus contos.
pois não tinha sua impressão e Dentro do realismo urbano há o romance-
distribuição realizada por editoras, mas reportagem, que parte de episódios
por meio de mimeógrafos ou off-set. verídicos e utiliza recursos como a
Alguns autores iniciaram sua produção ironia e a paródia. Destacam-se José
poética como "marginais": Chacal, Louzeiro e Ignacio de Loyola Brandão.
Paulo Leminski, Cacaso, Chico Alvim. Prosa Regionalista
Utilizaram linguagem coloquial e procuraram A prosa regionalista retrata as regiões
aproximar poesia e vida. Além brasileiras e suas particularidades
disso, demonstraram fortes influências humanas e sociais. A região Central
concretistas. é explorada por Bernardo Ellis e José
Já outros escritores trilharam diferentes J. Veiga; a região Sul por Moacyr Scliar
caminhos na poesia, não se e a região Norte por Márcio de Souza. A
enquadrando nas tendências já mencionadas. Bahia, particularmente, tem um escritor
São eles: Adélia Prado, Manuel de grande importância na atualidade,
de Barros, José Paulo Paes, Arnaldo além de Jorge Amado: João Ubaldo Ribeiro,
Antunes, Orides Fontela e Fernando que escreve de modo a recriar a
Paixão. linguagem.
Dois e dois: quatro
Como dois e dois são quatro
Romance Psicológico
sei que a vida vale a pena O romance psicológico possui um
embora o pão seja caro tom intimista e centra-se nas inquietações
e a liberdade pequena interiores dos personagens, trabalhando
Como teus olhos são claros temas do cotidiano, relacionados
e a tua pele, morena à família e à afetividade.
como é azul o oceano A literatura intimista aproxima-se do
e a lagoa, serena diário ou das memórias, trabalhando os
como um tempo de alegria grandes conflitos existenciais, muitas
por trás do terror me acena vezes beirando o pessimismo.
e a noite carrega o dia Uma autora que merece destaque
no seu colo de açucena é Lygia Fagundes Telles.
- sei que dois e dois são quatro Crônica
sei que a vida vale a pena Pequenas histórias, baseadas em
mesmo que o pão seja caro fatos do cotidiano, são exploradas por
autores como Stanislaw Ponte Preta, Os historiadores, cronistas e viajantes
Rubem Braga, Otto Lara Resende, Fernando da primeira época, senão de todo
Sabino e Luís Fernando Veríssimo. o período colonial, devem ser lidos à luz
de uma crítica severa. É indispensável
Teatro sobretudo escoimar os fatos comprovados,
O ano de 1943, em que é encenada a das fábulas a que serviam de
peça Vestido de noiva, de Nelson Rodrigues, mote, e das apreciações a que os sujeitavam
é tido como o marco inicial do teatro espíritos acanhados, por demais
moderno no Brasil. imbuídos de uma intolerância ríspida.
Nelson Rodrigues merece destaque Homens cultos, filhos de uma sociedade
por suas peças de caráter psicológico, velha e curtida por longo trato de
abordando temas como suicídios, séculos, queriam esses forasteiros
atropelamentos, achar nos indígenas de um mundo novo
casos de adultério, sempre penetrando e segregado da civilização universal
na intimidade dos personagens. uma perfeita conformidade de idéias e
Gianfrancesco Guarnieri abordou a costumes. Não se lembravam, ou não
temática social e engajou-se politicamente. sabiam, que eles mesmos provinham de
É de sua autoria Eles não usam black-tie. bárbaros ainda mais ferozes e grosseiros
Já as peças de Plínio Marcos enquadram- do que os selvagens americanos.
se no "realismo crítico", como é o caso (P- 11)
de Navalha na carne. — 295 —
Também as peças de Chico Buarque, — 296 —
como Roda viva, e as de Jorge Andrade {A As críticas estendem-se aos missionários,
moratória, Pedreira das almas) são de que, segundo Alencar, encaravam
caráter realista. os índios como "feras humanas"
Por outro lado, as peças de Ariano a serem domesticadas. De modo diverso,
Suassuna inserem-se no "regionalismo de o autor de O Guarani procura analisar
inspiração crítica", adotando elementos a sociedade indígena de um ponto
cômicos e caricatos e trabalhando com temas de vista filosófico, observando o "outro"
populares ou folclóricos. apenas como diferente, não como
De "inspiração popular" são as peças um inferior a ser subjugado.
de Dias Gomes, além de denunciarem injustiças (fragmento das notas)
sociais. Releva ainda notar, que duas classes
Leituras Obrigatórias de homens forneciam informações
acerca dos indígenas: a dos missionários
(Literatura Brasileira) e a dos aventureiros. Em luta uma com
a outra, ambas se achavam de acordo
da UNICAMP 2001- nesse ponto, de figurarem os selvagens
como feras humanas. Os missionários
2002-2003 encareciam assim a importância da sua
catequese; os aventureiros buscavam
Ubirajara justificar-se da crueldade com que tratavam
José de Alencar os índios, (p. 12)
Publicado em 1874, Ubirajara foi o Com isso, procura desfazer certos
último dos romances indianistas de Alencar. preconceitos em relação ao comportamento
Nele, o autor retrata uma época remota indígena, como o que diz respeito
de nossa história, em que o Brasil à poligamia, encarada pelos cronistas
era habitado somente pelos índios. europeus como promiscuidade sexual
Alencar realizou estudos sobre antropologia ou imoralidade conjugal.
indígena, a fim de melhor resgatar Outro preconceito que busca desmistificar
este universo e, conseqüentemente, é o ritual antropofágico, mostrando
nossas próprias origens. que este significa uma incorporação
Paralelamente à narrativa, organizam- da bravura e da força do inimigo,
se notas do autor, resultantes de não um gesto vingativo como se costumava
leituras dos cronistas e que dão embasamento pensar.
teórico ao texto. Além disso, Alencar mostra os valores
Nestas notas, Alencar faz severas cultivados pelos índios, tais como
críticas aos cronistas, tentando mostrar a lealdade e o heroísmo.
que estes procuravam enxergar os índios Segundo o autor, a obra pode ser
à luz de suas Idéias e tradições. Com classificada como lenda, já que é um
isso, não compreenderam a nova cultura texto mítico que narra a origem da comunidade
da qual se aproximavam e perceberam indígena dos ubirajaras.
os índios a partir de seus próprios hábitos O tempo dos acontecimentos é uma
e costumes, calcados numa visão época que antecede o descobrimento e
etnocêntrica do mundo. o contato dos índios com os brancos. O
(fragmento das notas)
espaço envolve as proximidades dos (PP. 26-27)
rios Tocantins e Araguaia. Em seguida, o jovem guerreiro vai
Em meio à floresta, surge o personagem em busca de mais uma conquista; sua
Jaguaré, assim chamado por ter esposa. Araci, virgem tocantim, filha do
vencido todos os animais, inclusive o chefe Itaquê, já havia tocado seu coração.
jaguar. Bravo caçador, ele almeja transformar- Dirige-se à tribo tocantim e é recebido
se em um guerreiro. Após grande com hospitalidade, reconhecido
combate, vence o inimigo Pojucã e como um enviado de Tupã. Passa então
torna-se o "senhor da lança", o guerreiro a se chamar Jurandir, "trazido pela
Ubírajara. Passa a líder dos araguaias, luz do céu", e a disputar a posse de
assim como fora seu pai Camacã, além Araci, "a estrela do dia", com os guerreiros
de ter o reconhecimento da tribo por sua da tribo inimiga. Além de Araci,
bravura e heroísmo. ele também demonstrara interesse por
(fragmento) Jandira, a doce virgem de sua própria
O guerreiro chefe enrista desdenhosamente comunidade.
a lança e caminha para Jaguaré. (...)
Não vai como o guerreiro que marcha ao Jurandir, conduzido pela virgem,
combate, mas como o matador que se caminhou ao encontro de Itaquê e disse;
prepara para imolar a vítima. — Grande chefe dos Tocantins,
— G u e r r e i r o c h e f e , J a g u a r é não te Jurandir não veio à tua cabana para receber
quer matar como a serpente que ataca a hospitalidade; veio para servir
o descuidado caçador. Dez vezes já, se ao pai de Araci, a formosa virgem, a
quisesse, ele te houvera ferido com tua quem escolheu para esposa. Permite que
própria mão. ele a mereça por sua constância no trabalho,
— Abandona a glória do guerreiro, e que a dispute aos outros guerreiros
que não é para ti, nhengaíba. Pojucã pela força de seu braço.
te concederá a vida e te levará cativo à Itaquê respondeu;
taba dos Tocantins para que tu cantes — Araci é a filha de minha velhice.
as suas façanhas na testa dos guerreiros. A velhice é a idade da prudência e da
— Cativo serás tu, mas não para sabedoria. O guerreiro que conquistar
cantar os feitos dos guerreiros. Tu servirás uma esposa como Araci terá a glória de
na taba dos araguaias para ajudar gerar seu valor no seio da virtude. Itaquê
as velhas a varrer a oca. não pode desejar para seu hóspede
Arremessou-se Pojucã avante e maior alegria.
desfechou o golpe; mas a lança rodara Desde esse momento, Jurandir não
e foi o chefe tocantim quem recebeu no foi mais estrangeiro na taba dos Tocantins.
peito a ponta farpada. Pertencia à oca de Itaquê, e devia,
— 297 — como servo do amor, trabalhar para o
Quando o corpo robusto de Pojucã pai de sua noiva.
tombava, cravado pelo dardo, Jaguaré Os guerreiros, cativos da beleza
d'um salto calcou a mão direita sobre o de Araci, conheceram que tinham de
ombro esquerdo do vencido, e brandindo combater um adversário formidável; mas
a arma sangrenta, soltou o grito do seu amor cresceu com o receio de perder
triunfo: a filha de Itaquê.
— Eu sou Ubirajara, o senhor da Jurandir tomou suas armas e desceu
lança, o guerreiro invencível que tem por ao rio. Era a hora em que o jacaré
arma a serpente. Reconhece o teu vencedor, bóia em cima das águas como o tronco
Pojucã, e proclama o primeiro dos morto; e a jaçanã se balança no seio do
guerreiros, pois te venceu a ti, o maior nenúfar.
guerreiro que existiu antes dele. — 298 —
— Se meu valor, que serviu para O manati erguia a tromba para pastar
aumentar a tua fama, merece de ti uma a relva na margem do rio. Ouvindo o
graça, não deixes que Pojucã sofra mais rumor das folhas, mergulhou na corrente,
um instante a vergonha de sua derrota. mas já levava o arpéu do pescador,
— Não, chefe tocantím. Tu me cravado no lombo.
acompanharás à taba dos araguaias Jurandir não esperou que o peixe
para narrar o meu valor. A fama de ferido desenrolasse toda a linha. Puxouo
Jaguaré precisa de um prisioneiro como para terra; e levou-o ainda vivo à cabana
o grande Pojucã na festa da vitória. de Itaquê, onde três guerreiros custaram
— Tu és crel,,gugrreiro da lança; a deitá-lo no jirau.
mas fica certo que se tua arma traiçoeira As mulheres cortaram as postas de
feriu-me o peito; o suplício não vencerá carne e os guerreiros cavaram a terra
a constância do varão tocantim, para fazer as grelhas do biaribi.
que sabe afrontar as iras de Tupã e Jurandir partiu de novo e entrou na
desprezar a vingança dos araguaias. floresta. Ao longe reboavam os gritos
dos caçadores que perseguiam a fera. escudo do herói, que ficou semelhante
Pelo assobio o guerreiro conheceu ao grosso tronco de juçara, eriçado de
que era um tapir. O animal zombara dos espinhos.
caçadores e vinha rompendo a mata Ubirajara embraçou o escudo na altura
como a torrente do Xingu. do ombro, e com o pé brandiu sete
As árvores que seu peito encontrava vezes a corda do grande arco gêmeo.
caíam lascadas. As setas vermelhas e amarelas
Jurandir estendeu o braço. O velho
tapir, agarrado pelo pé, ficou suspenso subiram
na carreira, como o passarinho preso no direitas ao céu e perderam-se nas
laço. Nunca, até aquele momento, encontrara nuvens.
força maior que a sua. Quando voltaram, Agniná e os chefes
Uma vez descer à lagoa para beber. que obedeciam a seu arco, tinham
A sucuri, que espreitava a caça, mordeu- cada um fincado na cabeça o desafio do
a na tromba. Ele fugia, esticando a formidável guerreiro.
serpente; e a serpente encolhendo-se, o Enfurecidos mais pelo insulto do que
arrastava até à beira d'água. pela dor, arremessaram-se contra o inimigo
Assim tornou uma, duas, três vezes. que os esperava coberto com seu vasto
Mas o tigre urrou de fome. O velho escudo.
tapir disparou pela floresta; e a sucuri Agniná era o primeiro na corrida e o
com a cauda presa à raiz da árvore arrebentou primeiro na sanha. Após ele vinham os
pelo meio. outros a dois e dois, lutando na rapidez.
O velho tapir rompeu a serpente Quando o esposo de Araci viu que
como se rompe uma corda de piaçaba; eles se estendiam pela campina, como dois
mas não pôde abalar o braço de Jurandir, ribeiros que se aproximam para confundir
mais firme do que o tronco do guaribu. suas águas; o herói empunhou a lança de
O estrangeiro tornou à cabana com duas pontas e soltou seu grito de guerra,
a caça. Nenhum dos guerreiros da taba, que era como o bramir do jaguar, senhor
nem mesmo o velho Itaquê, pôde agüentar da floresta.
com as duas mãos a fera bravia. Seu pé devorou o espaço; e a lança
Então Jurandir obrigou o animal a de duas pontas girou em sua mão, como a
agachar-se aos pés de Araci e disse: serpente que enrosca-se nos ares, silvando.
— O braço de Jurandir fará cair assim, Então o herói soltou seu grito de triunfo,
a teus pés, o guerreiro que ouse que era como o rugido do vento no
disputar ao seu amor a tua formosura, deserto;
estrela do dia. (pp. 59-60) — Eu sou Ubirajara, o senhor da lança,
Após a luta contra os tapuias, as o guerreiro invencível que tem por arma
duas nações unem-se, originando a nação uma serpente.
dos ubirajaras, que habitava as "Eu sou Ubirajara, senhor das nações,
margens do Rio São Francisco na época o chefe dos chefes, que varre a
do descobrimento. Ubirajara recebe terra, como o vento no deserto."
as duas jovens (Araci e Jandira) como O herói estendeu a vista pela campina,
esposas, tornando-se senhor supremo. e não descobriu mais o inimigo, que
O outro sol rompia, quando oa tapuias sumia-se na poeira.
estenderam pela campina a multidão Ubirajara lançou-lhe seus guerreiros,
de seus guerreiros. que tinham fome de vingança; porém
Na frente assomava Agniné, a montanha o terror de sua lança dava asas aos
dos guerreiros, ainda mais feroz do fugitivos.
que o irmão, o terrível Canicrã. Desde esse dia nunca mais um tapuia
De um lado e do outro seguiam-se as pisou as margens do grande rio.
chefes, cada um à frente de seus guerreiros. Ubirajara voltou à cabana, onde o
Ubirajara escolheu mil guerreiros esperava Araci.
araguaias e mil guerreiros Tocantins, com A esposa despiu as armas de seu
que saiu ao encontro dos tapuias. guerreiro, enxugou-lhe o corpo com o macio
Depois que desdobrou sua batalha cotão da monguba, e cobriu-o do bálsamo
pela campina, o chefe dos chefes caminhou fragrante da embaíba.
só para o inimigo. Encheu depois de generoso cauim a
Quando chegava a meio do campo, Caiu Agniná taça vermelha feita do coco da sapucaia;
do primeiro bote; após e aplacou a sede do combate.
os tapuias levantaram a pocema de guer- ele Enquanto nas grandes tabas se preparava
caíam aos dois os chefes tapuias, a festa do triunfo e o herói repousava
ra, que atroou os ares, como o estrépido como na rede, Araci foi ao terreiro e voltou
caem os juncos talhados pelo dente conduzindo Jandira peia mão.
da cachoeira. afiado da capivara. — 299 —
Um turbilhão de setas crivou o longo — 300 —
— Jandira é irmã de Araci, tua esposa.
Ubirajara é o chefe dos chefes, Esse dom precioso e natural desenvolvera-
senhor do arco das duas nações. Ele se-lhe à força de um exercício
deve repartir seu amor por elas, como continuado que o tornara conhecido em
repartiu a sua força. terra, nos conflitos com soldados e catraieiros,
A virgem Araguaia pôs no guerreiro e a bordo, quando entrava embriagado.
seus olhos de corça. — 301 —
— Jandira é serva de tua esposa; Porque Bom-Crioulo de longe em longe
seu amor a obrigou a querer o que tu sorvia o seu gole de aguardente, chegando
queres. Ela ficará em tua cabana para mesmo a se chafurdar em bebedeiras
ensinar a tuas filhas como uma virgem que o obrigavam a toda sorte de
Araguaia ama seu guerreiro. loucuras.
Ubirajara cingiu o peito, com um e Armava-se de navalha, ia para os
outro braço, a esposa e a virgem. cais, todo transfigurado, os olhos dardejando
— Araci é a esposa do chefe fogo, o boné de um lado, a camisa
tocantim; Jandira será esposa do chefe aberta num desleixo de louco, e então
Araguaia; ambas serão as mães dos era um risco, uma temeridade alguém
filhos de Ubirajara, o chefe dos chefes, aproximar-se dele. O negro parecia uma
e o senhor das florestas. fera desencarcerada: fazia todo mundo
As duas nações, dos araguaias e fugir, marinheiros e homens da praia,
dos tocantins, formaram a grande nação porque ninguém estava para sofrer uma
dos Ubirajaras, que tomou o nome agressão...
do herói. ( . . .)
Foi esta poderosa nação que dominou Diziam uns que a cachaça estava
o deserto. deitando a perder "o negro"; outros, porém,
Mais tarde, quando vieram os caramurus, insinuavam que Bom-Crioulo tornara-
guerreiros do mar, ela campeava se assim, esquecido e indiferente, dês
ainda nas margens do grande rio. (pp. que "se metera" com o Aleixo, o tal grumete,
92-94) o belo marinheiro de olhos azuis,
Bom-Crioulo que embarcara no sul. - O ladrão do negro
Adolfo Caminha estava mesmo ficando sem-vergonha!
Como um típico romance naturalista, E não lhe fossem fazer recriminações,
Bom-Crioulo submete o destino de dar conselhos... Era muito homem
seus personagens ao determinismo dos para esmagar um!
fatores hereditários, do meio e do momento O próprio comandante já sabia daquela
histórico. amizade escandalosa com o pequeno.
Do cientificismo originam-se a linguagem Fingia-se indiferente, como se
precisa e objetiva, as descrições nada soubesse, mas conhecia-se-lhe no
exatas e a valorização dos detalhes. olhar certa prevenção de quem deseja
Além disso, o narrador retrata com surpreender em flagrante...
impessoalidade e frieza as personagens Os oficiais comentavam baixinho o
e a realidade que as circunda. fato e muita vez riam maliciosamente na
A narração é realizada em terceira praça d'armas entre copos de limonada.
pessoa, por um narrador-onisciente, que Tudo isso, porém, não passava de
observa atentamente os fatos e os descreve suspeitas, e Bom-Crioulo, com o seu todo
de modo linear, à medida que vão abrutalhado, uma grande pinta de sangue
se desenrolando. no olho esquerdo, o rosto largo de
Tendo como cenário o mar, a história um prognatismo evidente, não se incomodava
tematiza a perversão sexual entre com o juízo dos outros. - Não
marinheiros. lho dissessem na cara, porque então o
Amaro é o "bom crioulo", negro forte negócio era feio... A chibata fizera-se
e robusto, que é atraído por Aleixo, jovem para o marinheiro: apanhava até morrer,
grumete branco e frágil, seu oposto. como um animal teimoso, mas havia de
(fragmentos) mostrar o que é ser homem!
Com efeito, Bom-Crioulo não era Sua amizade ao grumete nascera,
somente um homem robusto, uma dessas de resto, como nascem todas as grandes
organizações privilegiadas que trazem afeições, inesperadamente, sem precedentes
no corpo a sobranceira resistência de espécie alguma, no momento
do bronze e que esmagam com o peso fatal em que seus olhos se fitaram pela
dos músculos. primeira vez. Esse movimento indefinível
A força nervosa era nele uma qualidade que acomete ao mesmo tempo duas naturezas
intrínseca sobrepujando todas as de sexos contrários, determinando
outras qualidades fisiológicas, emprestando- o desejo fisiológico da posse mútua,
lhe movimentos extraordinários, essa atração animal que faz o homem
invencíveis mesmo, de um acrobatismo escravo da mulher e que em todas as
imprevisto e raro. espécies impulsiona o macho para á fêmea,
sentiu-a Bom-Crioulo irresistivelmente reluzente.
ao cruzar a vista pela primeira vez com O pequeno estacou suspreendido:
o grumetezinho. Nunca experimentara — Sou eu mesmo, rugiu Bom-Crioulo,
semelhante sou eu mesmo! Pensavas que era só
cousa, nunca homem algum ou meter-te com a portuguesa, hein? Olha
mulher produzira-lhe tão esquisita impressão, para esta cara, olha como estou magro,
desde que se conhecia! Entretanto, como estou acabado... Olha, olha!
o certo é que o pequeno, uma criança de E apertava bruscamente o outro,
quinze anos, abalara toda a sua alma, sacudindo-o como se o quisesse atirar
dominando-a, escravizando-a logo, naquele ao chão.
mesmo instante, como a força magnética —Vê lá se me conheces, anda! Olha
de um ímã. (...) (pp.15-16, 21) bem para esta cara!
Já na terra, os dois passam então O efebo debatia-se, pálido, aterrado:
a se encontrar num quarto alugado pela — Me largues! Não me provoque,
prostituta quarentona D. Carolina. Esta senão eu grito!
também sente atração pelo jovem marinheiro, — Anda pr'aí, grita, se és capaz!
pois ele significa a possibilidade Grita, safado, sem-vergonha... mal-agradecido!
do amor desinteressado ou mesmo de Sua voz tomava uma inflexão voluptosa
uma relação maternal, coisas nunca permitidas e terrível ao mesmo tempo; a palavra
a ela. saía-lhe gaguejada, estuporada e trêmula.
— 302 — — Grita, anda!
O protagonista passa então a desenvolver O outro mudava de cores, recuava
um ciúme doentio, porém jamais trôpego, a língua presa, quase a chorar,
suspeitando da possibilidade de numa aflição de culpado, o olhar azul
uma traição com a prostituta portuguesa. submisso refletindo a imagem do negro:
Este ciúme cada vez maior resulta — Me largue, repetiu. Eu lhe peço:
num impulso irracional: o assassinato me largue!
de Aleixo. Com isso, Bom Crioulo perde Transeuntes olhavam-nos de banda
sua própria razão de existir e permanece e voltavam-se para os ver naquela
no mesmo nível de um animal, agindo posição, rosto a rosto, juntinhos, agarrados
puramente pelo instinto, em detrimento misteriosamente. Porque Bom-Crioulo
da razão e dos sentimentos. não falava alto, que todos ouvissem,
O autor trabalha com naturalidade não dava escândalo, não fazia alarme:
o tema do homossexualismo e mostra o sua voz era um rugio cavernoso e histérico,
quanto a profissão exercida por certos um regougo abafado, longínquo e
homens, como os marinheiros, acaba profundo.
por brutalizá-los e deixar como única — Grita, anda, grita pela vaca da
válvula de escape a afetividade, resultando Carolina!
na perversão sexual. — Me solte — continuou o efebo
As cenas sexuais, assim como outros trémulo, acovardado. Me largue!
aspectos da realidade (epilepsia, — Não te largo, não, cousinha ruim,
castigos corporais, crimes) são descritos não te largo, não! Bom-Crioulo, este que
com frieza, ousadia e de modo minucioso, aqui está, não é o que tu pensas...
através de uma linguagem erudita, — Mas eu não fiz nada! Me solte,
permeada de elementos coloquiais, que é tarde!
como palavrões e gírias de bordo. Os olhos do negro tinham uma expressão
(fragmento) feroz e amargurada, muito rubros,
Aleixo ia saindo porta fora, tranqüilamente, cruzando-se, às vezes, num estrabismo
apertado na sua roupa azul e nervoso de alucinado.
branca de marinheiro, a camisa decotada, Um sujeito parou defronte, a olhálos;
a calça justa. vieram depois outras pessoas, outros
O negro teve um daqueles ímpetos curiosos; um marinheiro da Capitania,
medonhos, que o acometiam às vezes; um italiano carregado de flandres,
garganteou um — oh! rouco, abafado, um guarda-municipal, crianças,
comprimido, e, ligeiro, furioso, perdido de mulheres...
coléra, sem dar tempo a nada, precipitou- Houve logo um fecha-fecha, um tumulto,
se, numa vertigem de seta, para a um alvoroço. Trilaram apitos; vozes
rua. Não via nada, não enxergava nada, gritavam — rolo! rolo! e a multidão
tresvairado, como se de repente lhe houvesse crescia no meio da rua, procurando lugar,
fugido a luz dos olhos e a razão empurrando, abrindo caminho, precipitando-
do cérebro. Precipitou-se, e, esbarrando se, formando um grande círculo
com o grumete, fintou-o pelo braço. de gente ao redor dos dois marinheiros,
Tremia numa crise formidável de desespero, invisíveis agora.
os olhos congestionados, um Os bondes paravam. Senhoras vinham
suor frio a porejar-lhe da testa negra e à janela, compondo os cabelos,
numa ânsia de novidade. Latiam cães. retratado como alegre e trabalhador, disposto
Um movimento cheio de rumores, uma a melhorar de vida.
balbúrdia! Circulavam boatos aterradores, O autor utilizou a linguagem telegráfica,
notícias vagas, incompletas. Inventaram- precisa, clara e objetiva, e a linguagem
se histórias de assassinato, de cinematográfica, mostrando as
cabeça quebrada, de sangue. Cada cenas com dinamismo, fazendo cortes
olhar, cada fisionomia era uma interrogação. e deixando de lado as descrições.
Chegavam soldados, marinheiros, Além de registros coloquiais, aparecem
policiais. Fechavam-se portas com elementos da fala do paulistano
estrondo. oriundos da influência do imigrante.
Alguma cousa extraordinária tinha Gaetaninho
havido porque, de repente, o povo recuou, O conto tem como cenário a Rua
abrindo passagem, num atropelo. Oriente, no Brás, onde as crianças sonhavam
— Abre! abre! diziam soldados erguendo em andar de carro, pois o máximo
o refle. que conseguiam era transitar de
De cima, das casas, mãos apontavam bonde.
para baixo. Beppino já andara, na ocasião da
E D. Carolina, que também chegara morte de sua tia Peronetta, no trajeto
à janela com a vozeria, com o barulho, para o Araçá. Agora quem alimentava o
viu, entre duas filas de curiosos, o grumete sonho era Gaetaninho, que chegou a
ensangüentado... sonhar com a morte da tia Filomena e
— Jesus! Meu Deus! depois, com um pouco de culpa, com o
Uma nuvem escureceu-lhe a vista, enterro de Seu Rubino, funcionário da
correu-lhe um frio pelo corpo, e toda ela Companhia de Gás.
tremia horrorizada, branca, imóvel. Um dia o menino consegue realizar
Muitas vistas dirigiam-se para o seu sonho, porém de modo trágico: ele
sobradinho. morre atropelado por um bonde e é levado
Aleixo passava nos braços de dois no carro da frente no cortejo até o
marinheiros, levado como um fardo, o cemitério.
corpo mole, a cabeça pendida para trás, Carmela
roxo, os olhos imóveis, a boca entreaberta. Carmela e Bianca são duas jovens
O azul-escuro da camisa e a calça costureiras que trabalham na Rua Barão
branca tinham grande nódoas vermelhas. de Itapetininga. Carmela é bonita, ao
O pescoço estava envolvido contrário de Bianca, e namora Ângelo,
num chumaço de panos. Os braços caíam- entregador da Casa Clark.
lhe, sem vida, inertes, bambos, numa Um dia, um homem "traquejado" aparece
frouxidão de membros mutilados. dirigindo um carro Buick, chama
— 303 — Bianca e pede que marque um encontro
—304— dele com Carmela, próximo à Igreja de
A rua enchia-se de gente pelas Santa Cecília. A amiga comparece ao
janelas, pelas portas, pelas calçadas. encontro, que dá origem a muitos outros,
Era uma curiosidade tumultuosa e flagrante com direito a passeio de carro. Bianca
a saltar dos olhos, um desejo tece comentários com Ernestina a respeito
irrestível de ver, uma irrestível atração, dos fatos e afirma ironicamente, ao
uma ânsia! ser questionada sobre o Ângelo, que este
Ninguém se importava com "o outro", é para casar. Não deixa de ter uma
com o negro, que lá ia, rua abaixo, certa inveja da sorte da amiga...
triste e desolado, entre baionetas à luz —305—
quente da manhã: todos, porém, todos Tiro-de-guerra nº 35
queriam "ver o cadáver", analisar o O personagem central deste conto
ferimento, meter o nariz na chaga... é Aristodemo Guggiani, nacionalista extremado,
Mas, um carro rodou, todo lúgubre, cujo prazer era cantar o Hino
todo fechado, e a onda dos curiosos foi Nacional no grupo escolar da Barra Funda.
se espalhando, se espalhando, té cair tudo Depois passa a trabalhar na oficina
na monotonia habitual, no eterno vaivém. mecânica do cunhado. Após uma briga
Observe-se o fecho corriqueiro, banal, com este, começa a exercer a função
cotidiano — muito próximo do romance de cobrador de ônibus da linha Praça do
contemporâneo (NE). Patriarca-Lapa. Depois de um tempo não
Brás, Bexiga e Barra Funda se tem mais notícia de Aristodemo, que
Antônio de Alcântara Machado se tomara soldado do "Tiro-de-Guerra".
Publicada em 1927, a obra reúne No primeiro ensaio para o Sete de Setembro
onze pequenos contos, ambientados nos briga com um alemão por este
três bairros paulistanos, de ocupação ter desrespeitado a pátria brasileira.
ítalo-brasileira. Volta, então, a ser cobrador na mesma
O imigrante, sobretudo o italiano, ó linha Praça do Patriarca-Lapa, porém
pede demissão da Companhia Autoviação havia namorado a moça. Esta, depois
Gabrielle d'Annuzio e passa a que acabou o namoro com ele, nunca
trabalhar na Sociedade de Transportes mais dirigiu-se à Sociedade Beneficente
Rui Barbosa Ltda, sendo reconhecido e Recreativa do Bexiga e deixou de ir
por seu patriotismo. às reuniões dominicais, passando a torcer
Amor e sangue pelo Palestra.
Nicolino era namorado de Grazia, A moça pede a Rocco que marque
porém o romance terminou quando um Biagio. Assim ele procedeu e no segundo
dia ele olhou para outra moça. tempo fez um pênalti, que possibilitou
Na barbearia em que trabalhava, a Biagio marcar o segundo gol do Corinthians
Nicolino escutou uma notícia a respeito e garantir a vitória. Miquelina não
de um crime passional. Inspirado pela se conforma, assim como a torcida do
mesma, foi ao encontro de Grazia, que Palestra, que responsabiliza Rocco. Ela
realmente não mais queria o namoro. Então decide então retornar às reuniões da
Nicolino assassinou-a e justificouse Sociedade no Bexiga.
à polícia dizendo: Vale ressaltar que o conto utiliza
"— Eu matei ela porque estava louco, uma linguagem coloquial, típica dos campos
seu delegado". de futebol:
Esta frase, registrada nos jornais, "Alegoá-goá-goá! Alegoá-goá-goá!
resultou numa música de grande repercussão: Urrá-urrá! Corinthians!"
"Eu estava louco, "O'... Ih'agasosa!"
Seu delegado! "Go-o-o-o-ol! Corinthians!"
Matei por isso, Notas biográficas do novo
Sou um desgraçado!" deputado
A sociedade O Coronel Juca Peixoto de Faria é
A esposa do Conselheiro José Bonifácio um rico fazendeiro casado com Dona
de Matos e Arruda não admitia a Nequinha. Os dois, entretanto, não têm
possibilidade de sua filha se casar com filhos. Ao saberem do falecimento do
um "carcamano". Esta, contudo, namora compadre João Intaliano, resolvem acolher
Adriano Melli, Certo dia, o pai do rapaz, o filho deste, o órfão Gennarinho,
Salvatore Melli, resolve visitar o pai de apenas nove anos. O menino encanta
de Teresa Rita, o Bonifácio. Propõe então a todos e tem seu nome mudado para
a ele uma "sociedade", na qual o Januário. Passa então a estudar no Ginásio
Salvatore ajudaria com o capital e Bonifácio de São Bento. O Coronel, muito
com alguns terrenos sem uso. contente, pensa em deixar sua herança
Adriano tomar-se-ia o gerente da firma. para o italianinho.
Passados seis meses, Adriano fica O monstro de rodas
noivo de Teresa e desaparecem todos O "monstro de rodas" a que o conto
os empecilhos. faz referência é o carro responsável
Lisetta pelo atropelamento de uma menina moradora
Este conto tem como personagem da Barra Funda. Dona Nunzia, a
central uma criança: a menina Lisetta. Um mãe, não se conforma, enquanto uma
dia, ao andar de bonde com a mãe admira moça negra reza o terço.
um urso de pelúcia "felpudo", "amarelo" e O autor faz questão de ressaltar
"engraçadinho" no colo de uma menina alguns episódios comuns em enterros:
rica. Esta, de propósito, começa a mexer por um lado, o respeito de homens dentro
no brinquedo, virando-o de um lado para do bonde tirando o chapéu e, por
outro e instigando cada vez mais a vontade outro, a indiferença de Nino, preocupado
da menina de tocá-lo. Contudo, isso em contar o número de "trouxas" que
não foi possível, já que a menina rica não tirariam o chapéu até que o enterro chegasse
deixou e a mãe a impediu com beliscões e ao cemitério.
a promessa de uma surra, que de fato se Armazém Progresso de São
concretizou. O irmão de Lisetta, Ugo, compra
Paulo
um urso para ela. Apesar de ser pequeno
O "Armazém Progresso de São Paulo"
e de lata, a menina fica muito contente
pertence a Natale, comerciante italiano
e não deixa ninguém mexer nele.
muito esforçado e trabalhador. Ao
—306—
lado de sua mulher, Dona Bianca, trabalhava
Corinthians (2) vs. Palestra (1) com esmero e prosperava.
Grande parte do conto centra-se Na confeitaria da frente, o português
num jogo de futebol entre Corinthians e vendia cebolas a preço baixíssimo
Palestra no Parque Antártica, onde estão e tinha grande estoque das mesmas.
Miquelina e Iolanda. Natale fica sabendo através da mulher
Rocco é grande jogador do Palestra que as cebolas subiriam de preço e
e namorado de Miquelina, enquanto pede ao fiscal que lhe confirmara a notícia
Biagio joga no time oposto e também já que se mantenha calado, se quiser
ser recompensado. Dona Bianca sonha A rudeza e hostilidade do cenário
com a ascensão econômica, representada nordestino refletem-se na expressão
por um palacete na Avenida Paulista. dura, incisiva, sem lirismos ou derramamentos
— 307 — sentimentais.
Nacionalidade Luís da Silva é o narrador-personagem,
Este conto também tematiza a questão atormentado pela situação de
do nacionalismo exagerado, agora miséria em que vive. Escreve seu diário
de um italiano: o barbeiro Tranquillo Zampinetti, íntimo a partir de sua memória, que organiza
da Rua do Gasómetro. racionalmente os fatos, e por
Contudo, sua maior tristeza eram outro lado, partindo das alucinações que
seus filhos Lorenzo e Bruno, que não o afligem. Dessa forma, o tempo da narrativa
conservavam o mesmo fervor em relação não é linear, mas caminha de acordo
à pátria do pai, nem mesmo queriam com as lembranças e devaneios do
falar o italiano. narrador.
A guerra européia encontrou Tranquillo — 308 —
Zampinetti proprietário de quatro O protagonista é um funcionário
prédios na Rua do Gasómetro, dois na público, não realizado em sua vida profissional
Rua Rratininga, cabo influente do Partido e desgostoso de sua vida
Republicano Paulista e dileto compadre afetiva. Há algum tempo era noivo de
do primeiro subdelegado do Brás; o Marina, mas não podia casar-se porque
Lorenzo interessado na firma vanzinello as condições financeiras não lhe permitiam.
& Cia. e noivo da filha mais velha do Marina sonhava, tinha ambições
major Antônio Del Piccolo, membro do que as condições do noivo não permitiam,
diretório governista do Bom Retiro; o mas não desmanchava o relacionamento.
Bruno vice-presidente da Associação Vale lembrar que o casamento
Atlética Ping-Pong e primeiro anista do era extremamente valorizado na época,
Ginásio do Estado, (p.71) ainda que não alicerçado no amor e conservando
Tranquilo inscreveu-se para um empréstimo a mulher numa posição submissa.
de guerra, sendo contestado Ao mesmo tempo que procura conservar
por Dona Emília. o noivado com Luís da Silva, ainda
O barbeiro conseguiu mais dois prédios que sem perspectivas, Marina envolve-
na Rua Santa Cruz da Figueira, fechou se com Julião Tavares, filho de rico
o salão e passou a sócio comanditario comerciante.
da Perfumaria Santos Dumont. No decorrer da narrativa, crescem
Bruno forma-se em Direito, dando o ódio e o ciúme de Luís da Silva por
grande satisfação ao pai, e ao irmão causa do triângulo amoroso. Uma das
Lorenzo, já casado e com um filho. formas de vingar-se é atormentando os
O primeiro serviço profissional do pais de Marina, D. Adélia e seu Ramalho,
Bruno foi requerer ao exmo. sr. dr. Ministro dizendo o que pensava a respeito das
da Justiça e Negócios Interiores atitudes da moça.
do Brasil a naturalização de Tranquillo Luís da Silva persegue Marina, sua
Zampinetti, cidadão italiano residente em ex-noiva, motivo de suas aflições e perturbações
São Paulo. (p. 73) interiores. Ela está grávida e
Angústia tenta resolver a situação através de um
Graciliano Ramos aborto, já que Julião Tavares havia lhe
Angústia foi publicada em 1936, abandonado e estava com uma amante.
após a publicação de São Bernardo, em Aumenta ainda mais o ódio de Luís da
1934, ano em que começou a escrever Silva pelo rival, culminando com o ato
a obra quando diretor da Instrução Pública criminoso.
de Alagoas. Contudo, a prisão de Em seguida, o narrador passa a viver
Graciliano Ramos durante o regime do numa profunda crise, alucinado, beirando
Estado Novo leva-o à interrupção do livro, a loucura.
vindo a publicá-lo contra seu desejo, As letras tinham cara de gente e
já que não o tinha revisado como gostaria. arregaçavam os beiços com feracidade.
A obra tem a marca do estilo de A mulher que lava garrafas e o homem
Graciliano: extrema concisão e busca que enche dornas agitavam-se na parede
do essencial, eliminando tudo que não como borboletas espetadas e formavam
se mostra necessário. letreiros com outras pessoas-que
O autor realiza análise psicológica lavavam garrafas, enchiam dornas e
dos personagens, mostrando suas angústias, faziam coisas diferentes. A datilografa
aflições, temores íntimos. Paralelamente, dos olhos agateados tossia, as filhas
observa a situação social dos de Lobisomem encolhiam-se por detrás
mesmos, a influência do ambiente sobre das outras letras. Antônia arrastava as
suas vidas, a exploração dos mais fortes pernas grossas cobertas de marcas de
sobre os mais fracos. feridas, a mulher da Rua da Lama cruzava
as mãos sobre o joelho magro e Sínha Terta, o cego dos bilhetes, o contínuo
curvava-se para esconder as pelancas da repartição, os cangaceiros e
da barriga escura. Um choro longo subia os vagabundos, vinham deitar-se na
e descia: — "Que será de mim? Valha- minha cama. Cirilo de Engrácia, esticado,
me Nossa Senhora." Um moleque amarrado, marchando nas pontas
morria devagar, mutilado, porque havia dos pés mortos que não tocavam o chão,
arrancado os tampos da filha do patrão. vinha deitar-se na minha cama. Fernando
Fazia um gorgolejo medonho e vertia piche Inguitai, com o braço carregado de voltas
das chagas. 16.384. O cego dos bilhetes de contas, vinha deitar-se na minha
batia com o cajado na parede. — cama. As riscas de piche cruzavam-se,
"Afastem esta cadeira." Seu Ivo estava formavam grades. — "José Baía, meu
de cócoras, misturado às outras letras. irmão, há tempo!" As crianças corriam
A calça rasgada e o paletó sujo eram em torno da barca. — "José Baía, meu
cor de piche. Cirilo de Engrácia, carregado irmão, estamos tão velhos!" Acomodavam-
de cartucheiras e punhais, encostava- se todos. 16.384. Um colchão de
se a uma árvore, amarrado, os paina. Milhares de figurinhas insignificantes.
cabelos cobrindo o rosto, os pés com Eu era uma figurinha insignificante
os dedos para baixo. A sentinela cochilava e mexia-me com cuidado para não
no portão do Palácio. Um ventre molestar as outras. 16.384. íamos descansar.
enorme crescia na parede, uma criatura Um colchão de paina.
mal vestida passava arrastando a filha (...)
pequena, um brilho de ódio no olho único. Manuelzão e Miguilim
Sinha Terta gemia: — "Minha santa Guimarães Rosa
Margarida..." O dono da bodega, triste, Manuelzão e Miguilim, assim como
fincava os cotovelos no balcão engordurado. as obras No Urubuquaquá, no Pinhém
As crianças faziam voltas ao redor e Noites do Sertão, inicialmente era parte
da barca de terra e varas. A rapariga integrante do livro Corpo de Baile,
pintada de vermelho espalhava um publicado em 1956.
— 309 — Compõem a obra duas novelas:
cheiro esquisito. O engraxate escutava "Campo Geral" e "Uma Estória de Amor".
histórias de capoeiras. O homem acaboclado Campo Geral
cruzava os braços, mostrando Esta novela tem como personagem
bíceps enormes. O mendigo estirava a principal Miguilim, um garoto de oito anos
perna entrapada e ensangüentada. As que morava na mata do Mutum com a
moscas dormiam, e o mendigo, com a família.
muleta esquecida, bebia cachaça e ria. Dos irmãos, Miguilim era o mais velho.
Passos na calçada. Quem ia entrar? Depois vinha Dito, irmão que tinha a
Quem tinha negócio comigo àquela hora? maturidade de um adulto e fazia reflexões
Necessário Vitória fechar as portas e sobre as coisas da vida. Para tristeza
despedir o hóspede incômodo que não de todos, acabou morrendo de tétano.
se arredava da sala. Mas Vitória contava — 310 —
moedas, na parede, resmungava a Tomé era o irmão caçula. Havia ainda
entrada e a saída dos navios. A placa as irmãs Drelina e Chica e Liovaldo, o
azul de D. Albertina escondia-se a um mais velho, que morava com o tio Osmundo.
canto, suja de piche. Todo aquele pessoal O pai de Miguilim era Nhô Bernardo
entendia-se perfeitamente. O homem Caz, que nutria grande ciúme pela esposa,
cabeludo que só cuidava da sua devido à traição com o tio Terêz,
vida, a mulher que trazia uma garrafa que é expulso de casa.
pendurada ao dedo por um cordão, Além de Tio Terêz, a mãe tem um
Rosenda, cabo José da Luz, Amaro vaqueiro, caso com Luisaltino, trabalhador da lavoura,
as figuras do reisado, um vagabundo assim como o pai. Este, louco de
que dormia nos bancos dos jardins, ciúme, mata Luisaltino e enforca-se.
outro vagabundo que dormia debaixo Posteriormente Tio Terêz casa-se com
das árvores, tudo estava na parede, a mãe e volta a morar com a família.
fazendo um zumbido de carapanãs, Outra personagem que se destaca
um burburinho que ia crescendo e é a vovó Izidra, magra e que se irritava
se transformava em grande clamor. José com tudo.
Baía acenava-me de longe, sorrindo, Miguilim preocupava-se com seu
mostrando as gengivas banguelas e estado de saúde. Achava que ia morrer,
agitando os cabelos brancos. —"José pois estava muito magro.
Baía, meu irmão, estás também aí?" José No entanto, ele não morre, mas tem
Baía, trôpego, rompia a marcha. Um, uma revelação que transforma sua vida.
dois, um, dois... A multidão que fervilhava Um dia o doutor José Lourenço vem caçar
na parede acompanhava José Baía e na Vereda do Tipã e põe óculos no
vinha deitar-se na minha cama. Quitéria, menino, percebendo sua dificuldade
para enxergar. Ele, então, passa a ver a fim de homenagear sua mãe. São
todas as coisas com mais nitidez e encontrar mostrados os preparativos, os sertanejos
beleza no Mutum, em cada elemento advindos de várias regiões, a chegada
da natureza, em cada pessoa. do padre e a festa.
Descoberta sua miopia, Miguilim descobre- A novela valoriza a tradição oral,
se a si mesmo e admira a grandeza misturando casos e questionamentos
do mundo e sua própria existência. metafísicos, como a busca de Manuelzão
(fragmento) pela razão de sua existência.
O doutor chegou. — "Miguilim, você Várias estórias se intercalam, muitas
está aprontado? Está animoso?" Miguilim delas nos remetendo ao folclore sertanejo.
abraçava todos, um por um, dizia adeus Manuelzão, aos sessenta anos, vai
até aos cachorros, ao Papaco-o-Paco, em busca de seu filho Adelço, que se
ao gato Sossõe que lambia as mãozinhas casara e vivia do trabalho na lavoura,
se asseando. Beijou a mão da mãe ao lado de sua família, diferentemente
do Grivo. — "Dá lembrança a seo Aristeu... do pai, mas de modo semelhante ao avô,
Dá lembrança a seo Deográcias..." para desgosto do primeiro.
Estava abraçado com Mãe. Podiam sair. No final da novela, Manuelzão está
Mas, então, de repente, Miguilim prestes a conduzir mais uma boiada, carregando
parou em frente do doutor. Todo tremia, consigo apenas as lembranças
quase sem coragem de dizer o que tinha da festa e de suas próprias experiências.
vontade. Por fim, disse. Pediu. O (fragmento)
doutor entendeu e achou graça. Tirou Foi ordem de se acender festa, com
os óculos, pôs na cara de Miguilim. • tocada de viola e dança: té, té, té, té, té,
E Miguilim olhou para todos, com té, té — até o dia clareou. Fizeram noite,
tanta força. Saiu lá fora. Olhou os matos dançando. As iaiás também. O quando
escuros de cima do morro, aqui a casa, o dia já estava pronto para amanhecer,
a cerca de feijão-bravo e são-caetano; céu já se desestrelando. No seguinte,
o céu, o curral, o quintal; os olhos redondos na rompidinha do dia, a vaqueirama se
e os vidros altos da manhã. formou. O Vaqueiro com o Fazendeiro
Olhou, mais longe, o gado pastando perto — adepartes. Fazendeiro mais atrás, na
do brejo, florido de são-josés, como um sua besta queimada. O Vaqueiro vinha
algodão. O verde dos buritis, na primeira guiando. Jogou o Cavalão adiente, foi
vereda. O Mutum era bonito! Agora bater onde estava o Boi... O Cavalo governava."
ele sabia. Olhou Mãitina, que gostava de — Seo Camilo, a estória é boa!
o ver de óculos, batia palmas-de-mão e — Manuelzão, sua festa é boa!
gritava: — "Cena, Corinta!..." Olhou o redondo — Simião, me preza um laço dos
de pedrinhas, debaixo do jenipapeiro. seus, um laço bom, que careço, a quando
Olhava mais era para Mãe. Drelina a boiada for sair...
era bonita, a Chica, Tomezinho. Sorriu — Laço, lação! Eu gosto de ver a
para o Tio Terêz: — "Tio Terêz, o senhor argola estalar no pé-do-chifre e o trem
parece com Pai..." Todos choravam. O pular pra riba!
doutor limpou a goela, disse: — "Não sei, — Aprecio, por demais, de ajudar
quando eu tiro esses óculos, tão fortes, numa saída de gado. Vadiarmais os
até meus olhos se enchem d'água,.." companheiros...
Miguilim entregou a ele os óculos outra — Ei, eh, epa! A isso, lá?
vez. Um soluçozinho veio. Dito e a Cuca — O João Urúgem, vigia: que veio
Pingo-de-Ouro. E o Pai. Sempre alegre, em ouvir, na beira da escuridão... Oi, o
Miguilim... Sempre alegre, Miguilim... Nem João Urúgem de quatro patas, de sombrio,
sabia o que era alegria e tristeza. Mãe o com todas as mãos no chão...
beijava. A Rosa punha-lhe doces-de-leite — Tenção de caluda, companheiros,
nas algibeiras, para a viagem. Papacoo- deixa a estória terminar.
Paco falava, alto, falava. — "... O Boi estava amarrado, chifres
(...) altos e orvalhados. Nos campos o
sol brilhava. Nos brancos que o Boi vestia,
Uma Estória de Amor linda mais luz se fazia. Foi Bonito
Novela narrada em terceira pessoa, desse berro, não agüentavam a maravilha.
"Uma Estória de Amor" tem como protagonista E esses pássaros cantavam.
Manuel Jesus Rodrigues, o Manuelzão, — Vosmecê, meu Fazendeiro, nade
administrador da fazenda de me atender primeiro, dino. Meu nome
gado Samarra. Este velho vaqueiro vivia hei: Seunavino... Não quero dote em di—
de um lugar para outro, conduzindo 312 —
boiada, vindo a fixar-se num só lugar nheiro. Peço que o Boi seja soltado. E se
apenas no final da vida. me dê este cavalo.
O personagem realiza uma festa de — Atendido, meu Vaqueiro, refiro
inauguração de uma capelinha construída nesta palavra. O Boi, que terá por seus
os pastos do fazendado. Ao Cavalo, é amor platónico pela moça, seguindo-a
já vosso. Beija a mão, meu Vaqueiro. em todos os momentos, desde o namoro
— Deus vos salve, Fazendeiro. até o casamento, vivenciando uma
Vaqueiros, meus companheiros. Violeiros... paixão cada vez maior, que se concretiza
Fim final. Cantem este Boi e o Vaqueiro, somente no plano dos sonhos.
com belo palavreado..." — 313 —
— Espera aí, seo Camilo... Carmélia casa-se com um primo e
— Manuelzão, que é que há? viaja, sendo acompanhada por Belmiro,
— Está clareando agora, está resumindo... mas sem saber da existência do mesmo.
— Uai, é dúvida? A história é ambientada em 1935,
— Nem não. Cantar e brincar, hoje pois há referências à coluna Prestes e
é festa — dançação. Chega o dia declarar! à perseguição aos comunistas. Entre
A festa não é pra se consumir — eles estão alguns amigos do narrador,
mas para depois se lembrar... Com boiada como Redelvim, que é preso.
jejuada, forte de hoje se contando Belmiro não mais vê sentido em sua
três dias... A boiada vai sair. Somos que própria vida nem no ato de escrever,
vamos. pois não tem mais os amigos a seu lado.
— A boiada vai sair! Morre sua irmã Chiquinha, Glicério deixa
(...) a repartição e o trabalho torna-se cada
O amanuense Belmiro vez mais doloroso, até que o deixa.
Ciro dos Anjos Ciro dos Anjos faz uso da intertextualidade
Ciro dos Anjos foi um escritor modernista e da metalinguagem. Além disso,
da segunda geração. Primeiro demonstra ironia e profundo pessimismo,
livro do autor, O Amanuense Belmiro foi já que constrói um protagonista
publicado em 1937 e é considerado uma que se vê imobilizado diante dos obstáculos
de suas mais importantes obras. em seu caminho. Como diria Guimarães
A história é narrada em primeira Rosa, ele "permaneceu com as
pessoa por Belmiro Borges, amanuense bagagens da vida".
(incumbido de fazer cópias ou ofícios) (fragmento)
de uma repartição pública. Tendo verificado que se esgotara
O narrador-personagem escreve minha iprovisão de papel, Carolino me
um diário, estabelecendo um diálogo com trouxe esta manhã uma porção de blocos.
o leitor, refletindo sobre sua própria existência Sangrou rudemente o almoxarifado
e tentando encontrar forças para da Seção do Fomento...
enfrentar a realidade. Previdente e providente amigo! Esquece-
Belmiro é um homem tímido e melancólico, me comunicar-lhe que já não preciso
que observa o mundo exterior, de papel, nem de penas, nem de
mas parece não se apropriar deste, pois boiões de tinta. Esqueceu-me dizer-lhe
apenas relata-Q, colocando-o no plano que a vida parou e nada há mais por
das idéias. Ao mesmo tempo é sonhador escrever.
e gosta de recordar os momentos que Ai de mim! É necessário, porém,
lhe trouxeram alegrias, ainda que estes fazer qualquer coisa, para empurrar os
não passem de puras ilusões. presumíveis trinta e dois anos que me
Não tendo se casado, Belmiro vive restam. Trinta e dois anos, sim. Em média,
em Belo Horizonte em companhia das os Borbas vão até aos setenta,
duas irmãs mais velhas. mesmo com o coração descompensado.
Encontra muito tempo livre em seu Acho-me pouco além do meio da estrada,
emprego, que aproveita para escrever e parece-me, entretanto, que cheguei
suas memórias. Estas não seguem uma ao fim. Negação de Belarmino, de
ordem linear, mas o fluxo das lembranças. Porfírio, de Firmino e de Baldomero...
Numa noite de quarta-feira de cinzas, Dois deles, chegados aos oitenta, ainda
Belmiro recorda seu encontro com pediam mais dez. Viviam com plenitude
a "donzela Arabela", personagem de história os velhos Borbas da linha-tronco. Viviam
infantil que não saía de sua imaginação. a vida. Quando um tombava, parecia
Fora na noite de carnaval, quando queda de gameleira ferida pelo raio.
acompanhava os cordões, já bêbado Não morriam aos poucos, vendo o corpo
e um tanto alucinado. consumir-se lentamente.
O encontro com Arabela dá novo — Que faremos, Carolino amigo?
sentido à vida do personagem. Através (...)
do amigo Glicério, descobre a identidade — 314 —
da jovem: Carmélia Miranda. O amigo
relata-lhe também seu endereço e que Questões de
perdera a mãe. A partir daí o protagonista
passa a idealizá-la e a imaginar um vestibulares
idílio. Mais que isso, passa a nutrir um 1. (FUVEST) Entende-se por literatura
informativa no Brasil: com objetivo pedagógico em relação à
a) o conjunto de relatos de viajantes e catequese, outro por criações desinteressadas
missionários europeus, sobre a natureza - devem ser literariamente
e o homem brasileiros. valorizados, sobretudo o teatro em
b) a história dos jesuítas que aqui estiveram verso".
no século XVI. O texto refere-se aos textos
c) as obras escritas com a finalidade produzidos no século XVI por:
de catequese do indígena. a) José de Anchieta.
d) os poemas do Padre José de Anchieta. b) Pero Vaz de Caminha.
e) os sonetos de Gregório de Matos. c) Antônio Vieira.
2. (UFPA) d) Bento Teixeira.
Texto 1 e) Manuel da Nóbrega.
"De ponta a ponta, é tudo praia... 6. (UFPA) Quanto às manifestações
muito chã e muito formosa. Nela, até literárias brasileiras aparecidas
agora, não podemos saber que haja ouro durante o período colonial:
nem prata... porém a terra em si é de a) refletiam a grandeza da Literatura
muitos bons ares, assim frios e temperados... Portuguesa da época.
Águas são muitas; infindas." b) não havia obras escritas, existia,
Texto 2 pois, como manifestação oral.
"Então estiraram-se de costas na c) eram ainda incipientes, apesar de escritas,
alcatifa, a dormir, sem buscarem maneira pois a metrópole não incentivava
de encobrir suas vergonhas." este tipo de produção.
Sobre o autor dos fragmentos d) o expressivo número de escritores
acima é correto afirmar que: que apareceram obreiam-se com os
a) escreveu documentos oficiais. maiores vultos da literatura universal.
b) é festejado representante da prosa e) representa o esplendor das tendências
modernista. literárias do medievalismo português.
c) criou vasta obra romanesca. 7. (UNISA-SP) A "literatura jesuítica",
d) concedeu textos com finalidade pedagógica. nos primórdios de nossa
e) não propaga em sua obra a fé cristã. história:
3. (UFPA) A gênese da nossa formação a) tem grande valor informativo.
literária encontra-se no b) marca nossa maturação clássica.
século XVI. Dela fazem parte: c) visava à catequese do índio, à instrução
a) as obras produzidas pelos degregados ao colono e sua assistência
que eram obrigados a se instalar religiosa e moral.
no Brasil. d) estava a serviço do poder real.
b) os escritos que os donatários das e) tem fortes doses nacionalistas.
capitanias hereditárias faziam ao rei 8. (UFRN) Sabe-se que a literatura
de Portugal. brasileira do século XVI não primava
c) os relatos dos cronistas e viajantes. pelo valor estético, mas se
d) as produções arcádicas. destacava pelo caráter informativo.
e) as poesias de Gregório de Matos. Dentre os autores daquele
4. (UFPA) Quanto ao sentimento período, podemos citar, com
nativista das primeiras manifestações respectiva obra:
literárias feitas no a) Bento Teixeira, com História do Brasil.
Brasil: b) Frei Vicente Salvador, com Prosopopéia.
a) é um sentimento de apego aos valores c) Pero Magalhães Gândavo, com Tratado
culturais portugueses, conforme se vê da Terra do Brasil.
nos poemas de Anchieta. d) Nuno Marques Pereira, com Compêndio
b) consiste na propagação da mentalidade narrativo do peregrino da América.
colonial portuguesa, sobre o que giram e) Manoel Botelho de Oliveira, com Música
os poemas de Gregório de Matos. do Parnaso.
c) a obra dos cronistas viajantes representa 9. (UFV-MG)
o apogeu deste sentimento. "Meu bem, meu amor,
d) é um sentimento tênue de apego à terra meu esposo, meu senhor,
brasileira que, mais tarde, irá desaguar meu amigo, meu irmão,
no nacionalismo do Romantismo. — 315 —
e) só se observa nos poetas árcades — 316 —
devido ao seu envolvimento na inconfidência centro do meu coração,
Mineira. Deus e pai!
5. (UFPE) Pois com entranhas de mãe
"Se suas cartas não apresentam Quereis de mim ser comigo
valor literário reconhecível, os demais Roubais todo o meu sentido,
aspectos da obra do missionário - um Para vós!"
representado por criações literárias José de Anchieta
Assinale a alternativa que corresponde não ofendeis a Deus com o entendimento;
ao texto: eu quero, mas vós não ofendeis
a) trata-se de um poema barroco, por a Deus com a vontade."
causa do jogo de antíteses. 12. (FUVEST)
b) pertence à fase do Romantismo, como "Entre os semeadores do Evangelho
revela o intenso sentimento religioso. há uns que saem a semear, há outros
c) percebe-se, pelo desejo de exaltação, que semeiam sem sair. Os que
que é um poema épico do período saem a semear são os que vão pregar
quinhentista. à índia, à China, ao Japão; os que semeiam
d) expressa a religiosidade nos padrões sem sair são os que se contentam
simbolistas. com pregar na pátria. Todos terão
e) trata-se de um poema lírico do Quinhentismo. sua razão, mas tudo tem sua conta.
10. (UM-SP) Aponte a alternativa incorreta Aos que têm a seara em casa, pagarlhes-
sobre o "Sermão da Sexagésima": ão a semeadura; aos que vão buscar
a) o autor desenvolve dialeticamente a a seara tão longe, hão-lhes de medir
seguinte tese: "A semente é a palavra a semeadura; e hão-lhe de contar
de Deus". os passos. Ah! Dia do juízo! Ah! Pregadores!
b) o estilo é barroco e privilegia a corrente Os de cá, achar-vos-ei com mais
conceptista de composição. paço; os de lá, com mais passos..."
c) o orador discute no sermão cinco A passagem acima é representativa
causas possíveis que não permitiram de uma das tendências
a entrada da palavra de Deus no coração estéticas da prosa seiscentista, a
dos homens. saber:
d) Vieira baseia-se em parábolas bíblicas, a) o sebastianismo, isto é, a celebração
e sua linguagem se vale de estruturas do mito da volta de D. Sebastião, rei
retóricas clássicas. de Portugal, morto na batalha de Alcácer-
e) pela sua capacidade de argumentação, Quibir.
Vieira consegue, neste sermão, b) a busca do exotismo e da aventura
convencer os indígenas a se converterem. ultramarina, presentes nas crônicas
11. (CARLOS CHAGAS-BA) Assinale e narrativas de viagem.
o texto que, pela linguagem e pelas c) a exaltação do heróico e do épico,
idéias, pode ser considerado por meio das metáforas grandiloqüentes
como representante da corrente da epopéia.
barroca. d) o lirismo trovadoresco, caracterizado
a) "Branco e meigo sorriso se deslizava por figuras de estilo passionais e
em seus lábios; os negros caracóis místicas.
de suas belas madeixas brincavam, e) o conceptismo, caracterizado pela
mercê do zéfiro, sobre suas utilização constante dos recursos da
faces... e ela também suspirava." dialética.
b) "Estiadas amáveis iluminavam instantes 13. (FUVEST) Leia o texto:
de céus sobre ruas molhadas de Goza, goza da flor da mocidade,
pipilos nos arbustos dos squares. que o tempo trata a toda ligeireza,
Mas a abóbada de garoa desabava e imprime em toda flor sua pisada.
os quarteirões." Ó não aguardes, que a madura
c) "Os sinos repicavam numa impaciência [idade,
alegre. Padre Antônio continuou te converta essa flor, essa beleza,
a caminhar lentamente, pensando que em terra, em cinza, em pó,
cem vezes estivera a cair, cedendo [em sombra, em nada.
à fatalidade da herança e à influência Gregório de Matos
do meio que o arrastavam para o Os tercetos acima ilustram:
pecado." a) o caráter de jogo verbal próprio da
d) "De súbito, porém, as lancinantes incertezas, poesia lírica do século XVI, sustentando
as brumosas noites pesadas uma crítica à preocupação feminina
de tanta agonia, de tanto pavor com a beleza.
de morte, desfaziam-se, desapareciam b) o jogo metafórico próprio do Barroca,
completamente como os tênues a respeito da fugacidade da vida,
vapores de um letargo..." exaltando o gozo do momento.
e) "Ah! Peixes, quantas invejas vos tenho c) o estilo pedagógico da poesia neoclássica,
a essa natural irregularidade! A ratificando as reflexões do
vossa bruteza é melhor que o meu poeta sobre as mulheres maduras.
- 317 — d) as características de um texto romântico,
alvedrio. Eu falo, mas vós não ofendeis porque fala de flores, terras,
a Deus com as palavras; eu lembro- sombras.
me, mas vós não ofendeis a Deus e) uma poesia que fala de uma existência
com a memória; eu discorro, mas vós mais materialista do que espiritual,
própria da visão do mundo nostálgico III - A oposição entre Reforma e Contra-
cultista. Reforma expressa, no plano
— 318 — religioso, os mesmos dilemas de
14. (FUVEST) A respeito de Padre que o Barroco se ocupa.
Antônio Vieira, pode-se afirmar: Quais estão corretas?
a) embora vivesse no Brasil, por sua a) apenas I. d) apenas I e III.
formação lusitana não se ocupou de b) apenas II. e) I, lI e III.
problemas locais. c) apenas III.
b) procurava adequar os textos bíblicos 17. (UFBA)
às realidades de que tratava. "Vós, diz Cristo Senhor nosso, falando
c) dada sua espiritualidade, demonstrava com os Pregadores, sois o sal da
desinteresse por assuntos mundanos. terra: e chama-thes sal da terra, porque
d) em função de seu zelo para com quer que façam na terra, o que faz o
Deus, utilizava-o para justificar todos sal. O efeito do sal é impedir a corrupção,
os acontecimentos políticos e sociais. mas quando a terra se vê tão corrupta
e) mostrou-se tímido diante dos interesses como está a nossa, havendo tantos nela,
dos poderosos. que têm ofício de sal, qual será, ou qual
15. (FEBASP) pode ser a causa desta corrupção? Ou
"Basta, senhor, que eu, porque roubo é porque o sal não salga, ou porque a
em uma barca, sou ladrão, e vós, porque terra se não deixa salgar. Ou é porque o
roubais em uma armada, sois imperador? sal não salga, e os Pregadores não pregam
Assim é. O roubar pouco é culpa, a verdadeira doutrina; ou porque a
o roubar muito é grandeza; o roubar terra se não deixa salgar, e os ouvintes,
com pouco poder faz os piratas, o roubar sendo verdadeira a doutrina, que lhes
com muito, os Alexandres... O ladrão dão, a não querem receber; ou é porque
que furta para comer não vai nem leva o sal não salga, e os Pregadores dizem
ao inferno: os que não só vão, mas que uma cousa, e fazem outra, ou porque a
levam, de que eu trato, são os outros — terra se não deixa salgar, e os ouvintes
ladrões de maior calibre e de mais alta querem antes imitar o que eles fazem,
esfera... os outros ladrões roubam um que fazer o que dizem: ou é porque o
homem, estes roubam cidades e reinos; sal não salga, e os Pregadores se pregam
os outros furtam debaixo de seu risco, a si, e não a Cristo; ou porque a
estes, sem temor nem perigo; os outros terra se não deixa salgar, e os ouvintes
se furtam, são enforcados, estes furtam em vez de servir a Cristo, servem a seus
e enforcam". apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda
Padre Vieira. Sermão do Bom Ladrão mal."
Em relação ao estilo empregado Pe. Antônio Vieira
por Vieira neste trecho pode-se A. O autor aponta como causa da
afirmar: corrupção na terra:
a) o autor recorre ao cultismo da linguagem a) a doutrina pregada é fraca ou os homens
com o intuito de convencer o ouvinte não lhe são receptivos.
e por isto cria um jogo de imagens. b) os pregadores pregam uma falsa doutrina
b) Vieira recorre ao preciosismo da linguagem, ou a doutrina é ineficiente.
isto é, através de fatos corriqueiros, c) os homens não são receptivos à doutrina,
cotidianos, procura converter porque ela é verdadeira.
o ouvinte. d) a ação dos pregadores não testemunha
c) Padre Vieira emprega, principalmente, o que eles pregam.
o conceptismo, ou seja, o predomínio e) os homens tentam imitar os pregadores,
das idéias, da lógica, do raciocínio. seguindo-lhes a doutrina.
d) o pregador procura ensinar preceitos B. São características do autor e da
religiosos ao ouvinte, o que era prática época, presentes no textos:
comum entre os escritores gongóricos. a) recursos às antíteses, como suporte
16. (UHRS) Considere-se as seguintes das idéias.
afirmações sobre o Barroco b) argumentação construída através de
brasileiro: jogo de idéias conduzindo a uma resposta.
I - A arte barroca caracteriza-se por c) visão negativa do caráter do homem.
apresentar dualidades, conflitos, d) nilismo temático encobrindo o vazio
paradoxos e contrastes, que convivem de idéias.
tensamente na unidade da e) abordagem da dualidade inerente à
obra. condição humana.
II - O conceptismo e o cultismo, expressões 18.(VUNESP)
da poesia barroca, "Quem vê girar a serpe da irmã no
apresentam um imaginário bucólico, [casto seio,
sempre povoado de pastoras Pasma, e de ira e temor ao mesmo
e ninfas. [tempo cheio,
Resolve, espera, teme, vacila, Caramuru (de Frei José de Santa
[gela e cora, Rita Durão) e O Uraguai (de Basílio
Consulta o seu amor e o seu da Gama), no qual se reconhece a
[dever ignora, qualidade literária destacada em relação
Voa a farpada seta da mão, que ao primeiro.
[não se engana; d) norteou, em termos dos valores éticos
Mas, ai, que já vives, ó mísera básicos, a produção dos versos
[indiana!" de Marília de Dirceu, obra que celebrizou
Nestes versos de Silva Alvarenga, Tomás Antônio Gonzaga e que
poeta árcade e ilustrado, fazse destaca a originalidade de estilo e de
alusão ao episódio de uma obra tratamento local dos temas pelo autor.
em que a heroina morre. Assinale — 321 —
a alternativa correta em que se e) apresentou uma corrente de conotação
— 319 — ideológica envolvida com as
— 320 — questões sociais do seu tempo, como
mencionam o nome da heroína, o a crítica aos abusos do poder da Coroa
título da obra e o nome do autor, Portuguesa.
respectivamente: 22. (VUNESP) Há no Arcadismo brasileiro
a) Moema, Caramuru, Santa Rita Durão uma obra satírica de forma
b) Marabá, Marabá, Gonçalves Dias epistolar que suscitou dúvidas
c) Lindóia, O Uraguai, Basílio da Gama de autoria durante mais
d) Iracema, Iracema, José de Alencar de século. Assinale abaixo a alternativa
e) Marília, Marília de Dirceu, Tomás Antônio que apresenta o nome
Gonzaga dessa obra e seu autor mais
19. (UnB-DF) Marque a opção que provável:
identifica autor, obra e escola a a) O Reino da Estupidez e Francisco
que pertence o seguinte trecho: de Melo Franco.
"Inda conserva o pálido semblante b) Viola de Lereno e Domingos Caldas
Um não sei quê de magoado, Barbosa.
[e triste, c) O Desertor e Manuel Inácio da Silva
Que os corações mais duros Alvarenga.
[enternece d) Cartas Chilenas e Tomás Antônio
Tanto era bela no seu rosto Gonzaga.
[a morte!" e) Os Bruzundangas e Lima Barreto.
a) Gonçalves Dias, l-Juca Pirama, Romantismo. 23. (FUVEST) Assinale a alternativa
b) Castro Alves, Vozes d'África, Romantismo. que apresenta dois poetas que
c) Santa Rita Durão, Caramuru, Arcadismo. participaram da Inconfidência
d) Basílio da Gama, O Uraguai, Arcadísmo. Mineira:
e) N.d.a. a) Cláudio Manoel da Costa e Tomás Antônio
20. (FUVEST) Gonzaga.
"Por fim, acentua o polimorfismo b) Castro Alves e Tomás Antônio Gonzaga.
cultural dessa época o fato de se desenrolarem c) Gonçalves Dias e Cláudio Manuel da
acontecimentos historicamente Costa.
relevantes, como a Inconfidência d) Gonçalves Dias e Gonçalves de Magalhães.
Mineira e a transladação da corte de D. e) Gonçalves de Magalhães e Castro
João VI para o Rio de Janeiro". Alves.
Massaud Moisés 24. (PUCCAMP-SP) Pode-se afirmar
A época histórica a que se refere que Marília de Dirceu e Cartas
o crítico é a do: Chilenas são, respectivamente:
a) Simbolismo. a) altas expressões do lirismo amoroso
b) Arcadismo. e da sátira política, na literatura do
c) Parnasianismo. século XVIII.
d) Realismo. b) exemplos da poesia biográfica e da
e) Romantismo. literatura epistolar cultivadas no século
21. (FATEC-SP) Sobre o Arcadismo XVII.
brasileiro só não se pode afirmar c) exemplo do lirismo amoroso e da poesia
que: de combate, cultivados sobretudo
a) tem suas fontes nos antigos grandes pelos poetas românticos da chamada
autores gregos e latinos, dos "terceira geração".
quais imita os motivos e as formas. d) altas expressões do lirismo e da sátira
b) teve em Cláudio Manuel da Costa o da nossa poesia barroca.
representante que, de forma original, e) expressões menores da prosa e da
recusou a motivação bucólica e os modelos poesia do nosso Arcadismo, cultivadas
camonianos da lírica amorosa. no interior das academias.
c) legou-nos os poemas de feição épica 25. (FEI-SP) Assinale a alternativa
incorreta. subconsciente, nas regiões inexploradas
a) os primeiros textos da literatura brasileira da alma: para isso, usa meios
são informações que viajantes indiretos a fim de sugerir ou representar
e missionários europeus colheram as sensações; funde figura,
sobre a natureza e a gente brasileira. música e cor.
b) Gregório de Matos, que viveu no século e) literatura que visa à perfeição da forma,
XVII, destacou-se como poeta à objetividade, ao equilíbrio, à perfeição
lírico e satírico. absoluta da linguagem; prefere
c) religiosidade, antítese, paradoxos, os temas novos e exóticos.
contraste material X espiritual são 28. (PUCCAMP-SP)
características do Barroco. "Oh! nos meus sonhos, pelas
— 322 — [noites minhas
d) embora anônima, sabe-se que a obra Passam tantas visões sobre
Cartas chilenas foi escrita por Tomás [meu peito!
Antônio Gonzaga no século XVIII. É Palor de febre meu semblante
uma sátira política. Nela, critica-se o [cobre.
governador de Minas Gerais, Luís da Bate me coração com tanto fogo!"
Cunha Meneses, que aparece como — 323 —
Fanfarrão Minésio. Assinale a alternativa em que
e) Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio se considera o clima romântico
Gonzaga destacaram-se como expresso nos versos acima, característico
os grandes poetas épicos do Arcadismo da poesia de Álvares de
brasileiro. Azevedo.
26. (UFPB) Das afirmações abaixo, a) a expressão exaltada serve nitidamente
em torno do Barroco e do Arcadismo ao desejo de sublinhar a indignação
no Brasil, contra os fatores históricos
I - O cultismo (jogo de palavras) e que sufocam a liberdade do homem.
o conceptismo (jogo de idéias) b) a atmosfera noturna, própria ao devaneio,
são típicos do Arcadismo brasileiro, propicia um suave estado de contemplação
preso a uma concepção poética, dentro do qual o
neoclássica de arte. ser se encontra docemente harmonizado
I I - Pessimismo, gosto pelo paradoxo com o mundo e consigo mesmo.
e pelas antíteses, culto do c) a noite significa não apenas enquadramento
contraste são algumas das características natural, mas meio psicológico,
do estilo barroco. tonalidade afetiva correspondente
III - Profundamente relacionado com às disposições do poeta, aos
a Contra-Reforma, o estilo barroco movimentos turvos do eu profundo.
procura a síntese entre o d) os símbolos da luz e do fogo expressam
teocentrismo e o antropocentrismo. o anseio de uma nova Civilização,
IV - Os poetas Gregório de Matos, que o poeta quer ver dirigida pela
Tomás Antônio Gonzaga e Basílio Razão e pela Justiça, suas bandeiras
da Gama são representantes de luta.
típicos do Arcadismo no Brasil. e) amante fascinado da Natureza, o poeta
são corretas, apenas: retrata-a em cores fortes e precisas,
a) I e II. ciente de que ela representa o
plano da harmonia e da serenidade a
b) lI e III.
que todos devemos aspirar.
c) III e IV.
29. (FUVEST)
d) I, II e III.
"Já da morte o palor me cobre
e) II, III e IV.
[o rosto,
27. (ITA-SP) Assinale a alternativa
Nos lábios o alento desfalece,
que caracteriza o Romantismo:
Surda agonia o coração fenece,
a) valorização do eu. O assunto passa
E devora meu ser mortal
a ser manifestado a partir do artista,
[desgosto!"
que traz à tona o seu mundo interior,
No fragmento acima, pertencente a
com plena liberdade; esta liberdade
um poema de Álvares de Azevedo, notam-
se impõe na forma. Sentimentalismo.
se características de qual tendência
b) literatura multifacetada: valorização
romântica?
da palavra e do ritmo: temática humana
a) Mal do século.
e universal.
b) Bucolismo.
c) literatura intrinsecamente brasileira;
c) Poesia Condoreira.
linguagem direta, coloquial, livre das
d) Nacionalismo.
regras gramaticais, imagens diretas;
e) Indianismo.
inspiração a partir da burguesia, da
30. (ITA-SP) Com as "Espumas Flutuantes"
civização industrial, da máquina.
ele se impôs como um
d) literatura que busca inspiração no
poeta original, fortemente impressivo, c) na linguagem literária de Gonçalves
comovente e, pela riqueza Dias, o transbordamento romântico é
verbal, até empolgante. contido e equilibrado por um rigoroso
Entretanto, foram suas veementes senso da necessidade de medida
denúncias contra a nossa legada pelo Neoclassicismo.
"seara vermelha" (alguns poemas: d) o indianismo de Gonçalves Dias baseia-
"Adeus, meu canto", "A se no mito do bom selvagem e
Cruz da Estrada", "A Cachoeira constitui uma simples repetição das
de Paulo Afonso") que lhe deram idéias de Montaingne, Rousseau e
um sentido de presença Chateaubriand.
mais viva na evolução de nossa e) o lado épico e condoreiro é considerado
história, popularizando-o como a melhor realização de Gonçalves
o mais eloqüente, o mais aplaudido Dias.
e o mais influente dos nossos 34. (PUC-RS) Dentro do Romantismo
poetas do abolicionismo e brasileiro, o regionalismo
do republicanismo. foi um tema que representou o
a) Gonçalves Dias. golpe mais vigoroso desferido
b) Castro Alves. contra a literatura de modelos
c) Gonçalves de Magalhães. portugueses. Aponte a alternativa
d) Tobias Barreto. em que todos os autores
e) Casimiro de Abreu. tiveram ligação com este tema
31. (MACK-SP) Sobre a poesia de romântico:
Castro Alves é incorreto afirmar a) Visconde de Taunay / Bernardo Guimarães
que: / José de Alencar.
a) segue a tendência da segunda geração b) José de Alencar/Joaquim M. Macedo /
romântica, limitando-se exclusivamente Manoel A. Almeida.
à morbidez byroniana. — 324 —
b) apresenta traços de evolução à postura c) Franklin Távora / Visconde de Taunay /
temática do movimento em que Álvares de Azevedo.
se encaixa. d) Gonçalves Dias / Bernardo Guimarães
c) acrescenta um certo tom de erotismo / Joaquim M. de Macedo.
a determinadas composições. e) Martins Pena / Casimiro de Abreu / Fagundes
d) manifesta o ponto mais alto do condoreirismo Varela.
na Literatura Brasileira. 35. (PUCCAMP-SP) Pode-se afirmar, a
e) encontra, no abolicionismo, um veio respeito de José de Alencar, que:
fundamental de sustentação temática. a) seus romances de costumes, ambientados
32. (ITA-SP) Marque a opção que identifica na Corte, transplantaram fielmente
autor, obra e escola a que os modelos de romances europeus,
pertence o seguinte excerto: tal como se dá, por exemplo,
"São mulheres desgraçadas em A Moreninha.
Como Agar o foi também, b) sua ficção é sobretudo caracterizada
Quem sedentas, alquebradas, por elementos satíricos e paródicos,
De longe... bem longe vêm, por meio dos quais aponta o
Trazendo com tíbios passos, ridículo das teses nacionalistas então
Filhos e algemas nos braços, em voga.
Nalma - lágrimas e fel" c) sua importância vai além do valor propriamente
a) Fagundas Varela - Vozes da América literário de seus romances:
-Romantismo está numa consciência de escritor
b) Basílio da Gama - O Uraguai- Neoclassicismo que reflete sobre a cultura brasileira
c) Castro Alves - O Navio Negreiro - e desenvolve um projeto ambicioso.
Romantismo d) sua ficção retrata expressivamente a
d) Jorge de Lima - Poemas Negros - sociedade brasileira do fim do século
Modernismo XIX, agitada pela Abolição e pela República,
e) Manuel Bandeira - Cinza das Horas - por cuja implantação, aliás,
Modernismo sempre lutou.
33. (FUVEST) Assinale a alternativa e) sua glória de escritor só se justifica
correta. se pensarmos que o público que consagrou
a) Gonçalves Dias foi o introdutor e o se comprazia, ao lar seus
divulgador do Romantismo na poesia romances, com o tom ameno em que
brasileira, e este fato explica a repercussão se desenvolviam pálidas historietas
de sua obra. sentimentais.
b) o autor de Últimos Cantos trabalhou 36. (MACK-SP) Assinale a alternativa
muitos temas românticos, entre os em que se encontra o nome
quais se destacam o saudosismo, de um romance romântico brasileiro
nativismo, satanismo byroniano. que se preocupa em
apresentar personagens ligados ou Inocência (de que foi extraído o
às camadas mais populares, excerto acima), cuja ação se passa
além de apresentar um em regiões específicas do país e
tom pitoresco à obra. em que se dá relevo a costumes
a) Lucíola. diferenciados, a uma cultura típica,
b) O Ateneu. têm origem durante o:
c) Senhora. a) século XVI.
d) Inocência. b) Barroco.
e) Memórias de um Sargento de Milícias. c) Arcadismo.
37. (ITA-SP) d) Romantismo.
"Esse romance não seguiu os padrões e) Simbolismo
do Romantismo. É considerado um 40. (SANTA CASA-SP) Um dos traços
livro de transição para um novo estilo de caracterizadores da produção
época. O Realismo/Naturalismo. Observa- poética do Romantismo é a:
se nele a preocupação em retratar a) atitude rebelde em face de convenções,
uma classe social que não costumava expressas de acordo com os
aparecer nas obras do estilo de sua época: cânones próprios do Arcadismo.
o povo remediado. As personagens b) posição contrária ao rigor formal clássico,
que aparecem no texto não são idealizadas, visto que o objetivo mais alto era
pois o narrador incorpora também a expressão de idéias e emoções.
as características negativas das c) conciliação do acervo de normas clássicas
personagens." de expressão com a universalidade
As informações acima melhor dos temas.
se ajustam ao romance: d) preferência por uma linguagem seca
a) Memórias Póstumas de Brás Cubas. e despojada, mais adequada à análise
b) O Ateneu. da realidade objetiva.
c) Memórias de um Sargento de Milícias. e) utilização à análise de uma linguagem
d) O Mulato. denotativa, que procura exprimir antes
e) A Moreninha. idéias do que sentimentos.
38. (UNISA-SP) Publicado em 1854, 41. (FUVEST) O índio, em alguns romances
esse romance, escrito por um de José de Alencar,
jovem jornalista de vinte e dois como Iracema e Ubirajara, é:
— 325 — a) retratado com objetividade, numa
—326— perspectiva rigorosa e científica.
anos, descreve um anti-herói, b) idealizado sobre o pano de fundo da
"filho de uma pisadela e de um natureza, da qual é o herói épico.
beliscão", e os tipos e costumes c) pretexto episódio para descrição da
do Rio de Janeiro do tempo natureza.
de D. João VI. O romance e o d) visto com o desprezo do branco
autor a que o texto se refere preconceituoso,
são, respectivamente: que o considera inferior.
a) Memórias de um Sargento de Milícias e) representado como um primitivo feroz
e Manuel Antônio de Almeida. e de maus instintos.
b) Memorial dos Aires e Machado de 42. (VUNESP) Baseando-se na leitura
Assis. do texto de Álvares de Azevedo,
c) Memórias Sentimentais de João Miramar assinale a única alternativa
e Oswald de Andrade. incorreta:
d) Memórias do Sobrinho de Meu Tio e Junto a meu leito, com as
Joaquim Manuel de Macedo. [mãos úmidas,
e) Memórias do Cárcere e Graciano Olhos fitos no céu, cabelos soltos,
Ramos. Pálida sombra de mulher formosa
39. (SANTA CASA-SP) Entre nuvens azuis pranteia
"O sertanejo que de nada cuidou, [orando
que não ouviu as harmonias da tarde, É um relato talvez. Naquele seio
nem reparou nos esplendores do céu, Porventura sonhei doiradas noites.
que não ouviu a tristeza a pairar sobre a Talvez sonhando desatei sorrindo
terra, que de nada se arreceia, consubstanciado Alguma vez nos ombros
como está à solidão, pára, [perfumados
relanceia os olhos ao derredor de si e, Esses cabelos negros, e em
se no lugar pressente uma aguada, por [delíquio
má que seja, apeia-se, desencilha o cavalo Nos lábios dela suspirei tremendo.
e, reunindo logo uns gravetos bem Foi-se minha visão. E resta agora
secos, tira fogo do isqueiro, mais por aquela vaga sombra na parede
distração do que por necessidade". - Fantasma de carvão e pó cerúleo,
Romances como Escrava Isaura Tão vaga, tão extinta e fumarenta
Como de um sonho o recordar 45. (UFMG) "A concretização do abstrato
[incerto. é uma técnica da ironia machadiana."
Álvares de Azevedo, Idéias íntimas Todas as alternativas
a) considerando os aspectos temáticos explicam essa afirmação, exceto:
e formais do poema, pode-se vinculálo a) "A alma do Rubião bracejava debaixo
ao segundo momento do movimento desse aguaceiro de palavras;
romântico brasileiro, também conhecido mas, estava num beco sem saída por
como "geração do spleerf um lado nem por outro. Tudo muralhas.
ou "mal do século". Nenhuma porta aberta, nenhum
b) a presença da mulher amada tornase corredor, e a chuva a cair."
o ponto central do poema. Isso é b) "Vá desapontamento. Misturem-lhe o
claramente manifestado pelas recordações pesar da separação, não esqueçam
do eu-lírico, marcado por um a cólera que o primeiro trovejou surdamente,
passado vivido, que sempre volta em e não faltará quem ache que
imagens e sonhos. a alma deste homem é uma colcha de
c) o texto reflete um articulado jogo entre retalho. Pode ser; moralmente as colchas
o plano do imaginário e o plano inteiriças são tão raras!"
real. Um dos elementos, entre outros, c) "Não esqueça dizer que Rubião tomou
que articula essa construção é a a si dizer uma missa por alma do
alternância dos tempos verbais presente/ finado, embora soubesse ou pressentisse
passado. que ele não era católico.
d) realidade e fantasia tornam-se a única Quincas Borba não dizia pulhices a
realidade no espaço da poesia lírica respeito de padres, nem desconceituava
romântica, gênero privilegiado doutrinas católicas; mas não
dentro desse movimento. falava nem da Igreja, nem dos padres."
e) apesar de utilizar decassílabos, esse d) "A outra que ri a alma do Rubião. Escutai
poema possui o andamento próximo a cantiga alegre, brilhante, com
ao da prosa. Esse aspecto formal que ela desce o morro, dizendo as
é importante para intensificar cousas mais íntimas à estrelas, espécie
certo prosaísmo intimista da poesia de rapsódia feita de uma linguagem
romântica. que ninguém nunca alfabetou,
43. (UCP-PR) Capitu é uma das mais por ser impossível achar um sinal que
bem construídas personagens lhe exprime os vocábulos."
da literatura brasileira. Quem a e) 'Tédio por dentro e por fora. Nada em
criou e em que obra? que espraiasse a vista e descansasse
a) Machado de Assis, Dom Casmurro. a alma. Sofia meteu a alma em um
b) José de Alencar, O Guarani. caixão de cedro, encerrou o cedro
c) Machado de Assis, O Alienista. no caixão de chumbo do dia, e deixou-
d) José de Alencar, Til. se estar sinceramente defunta."
e) José de Alencar, Senhora. 46. (UFPA)
44. (UFSCAR-SP) O que sobressai "Mas o ilustre médico, com os olhos
na atividade criadora de Machado acesos da convicção, trancou os ouvidos
de Assis é: à saudade da mulher, e brandamente
a) a minuciosa busca de soluções a repeliu. Fechada a porta da Casa
aperfeiçoadoras, Verde, entregou-se ao estudo e à cura
que só conseguiu após de si mesmo."
inúmeros e continuados exercícios. Sobre o autor do texto acima é
— 327 — incorreto afirmar que:
— 328 — a) é um dos mais festejados representantes
b) a grande capacidade de inspiração, da prosa literária no Brasil.
uma vez que a quantidade de romances b) autor eclético, destacou-se na produção
que escreveu foi facilitada pela de uma vasta obra constituída de romances,
improvisação. contos, poesia, crônicas etc.
c) o equíbrio entre o improvisador, o inspirado c) são personagens definitivos que nasceram
e o artista, que é demonstrado de sua pena: Simão Bacamarte.
pelas obras de valor desigual que Capitu, Brás Cubas, Quincas Borba etc.
ocorrem no decorrer de sua procução d) produziu uma obra marcada pela fina
literária. ironia e profundo pessimismo.
d) a sinceridade com que manifesta, por — 329 —
linguagem desprovida de metáforas, e) seus principais romances desenvolvem
em cada romance que escreveu, as o tema do amor, colocando os sentimentos
várias fases de sua biografia. mais nobres acima de qualquer
e) ter iniciado a carreira escrevendo romances obstáculo.
realistas, convertendo-se, 47. (PUCCAMP-SP) Identifique o trecho
mais tarde, ao Naturalismo. em que o narrador de Dom
Casmurro introduz o romance e — 330 —
considera seu sentido profundo: faculdade perdida do homem: o senso
a) "Horas inteiras eu fico a pintar o retrato do mistério.
dessa mãe angélica, com as cores 50. (FUVEST)
que tiro da imaginação, e vejo-a "E naquela terra encharcada e fumegante,
assim, ainda tomando conta de mim, naquela umidade quente e lodosa,
dando-me banhos e me vestindo. A começou a minhocar, a esfervilhar,
minha memória ainda guarda detalhes a crescer, um mundo, uma coisa viva,
bem vivos que o tempo não conseguiu uma geração, que parecia brotar espontânea,
destruir. ali mesmo, daquele lameiro, a
b) "O meu fim evidente era atar as duas multiplicar-se como larva no esterco".
pontas da vida, e restaurar na velhice O fragmento de O Cortiço, romance
a adolescência. Pois, senhor, não de Aluísio Azevedo, apresenta
conseguiu recompor o que foi nem o uma característica fundamental
que fui. Em tudo, se o rosto é igual, a do Naturalismo. Qual?
fisionomia é diferente. É o que vais a) compreensão psicológica do Homem.
entender, lendo." b) compreensão biológica do Mundo.
c) "Faz dois anos que Madalena morreu, c) concepção idealista do Universo.
dois anos difíceis. E quando os d) concepção religiosa da Vida.
amigos deixaram de vir discutir política, e) visão sentimental da Natureza.
isto se tornou insurpotável. Foi 51. (UFRS) Leia o seguinte texto:
aí que me surgiu a idéia esquisita "A Praça da Alegria apresentava
de, com o auxílio de pessoas mais um ar fúnebre. De um casebre miserável,
entendidas que eu, compor esta história." de porta e janela, ouviam-se gemer
d) "Suposto o uso vulgar seja começar os armadores enferrujados de uma rede
pelo nascimento, duas considerações e uma voz tísica e aflautada de mulher,
me levaram adotar diferente cantar em fasete a 'gentil Carolina era
método: a primeira é que não não sou bela'; doutro lado da praça uma preta
propriamente um autor defunto, mas velha, vergada por imenso tabuleiro de
um defunto autor; a segunda é que o madeira sujo e seboso, cheio de sangue
escrito ficaria assim mais galante e e coberto por uma nuvem de moscas,
mais novo." as apregoava em tom muito arrastado
e) "Sua história tem pouca coisa de notável. e melancólico: 'Fígado, rins e coração'.
Fora Leonardo algibebe em Lisboa, Era uma vendeira de fatos de boi.
sua pátria; aborrecera-se porém As crianças nuas, com as perninhas
do negócio, e viera ao Brasil. Aqui tortas pelo costume de cavalgar as ilhargas
chegando, não se sabe por proteção maternas, as cabeças avermelhada
de quem, alcançou o emprego de que pelo sol, a pele crestada, os ventrezinhos
o vemos empossado." amarelentos e crescidos, corriam
48. (UCP-PR) São obras da fase realista e guinchavam, empinando papagaios de
de Machado de Assis: papel."
a) Dom Casmurro / Casa de pensão. A descrição acima caracteriza o
b) O mulato / Casa de Pensão. ambiente, focalizando ao mesmo
c) Dom Casmurro / O mulato. tempo a paisagem física e a paisagem
d) Memórias Póstumas de Brás Cubas / humana e acentuando a grande
Dom Casmurro. identidade entre ambas. Ao fazêlo
e) Memórias Póstumas de Brás Cubas / o autor retrata a realidade sem
A mão e a luva. adornos, buscando a exatidão, embora
49. (UFPA) Os personagens realistas- carregue nas tintas para enfatizar
naturalistas têm seus destinos os aspectos mais sórdidos. Tal
marcados pelo determinismo. parágrafo pode pertencer à obra de:
Identifica-se esse determinismo: a) José de Alencar.
a) pela preocupação dos autores em b) Aluísio Azevedo.
criar personagens perfeitos, sem defeitos c) Joaquim Manuel de Macedo.
físicos ou morais. d) Clarice Lispector.
b) pelas forças atávicas e/ou sociais e) Bernardo Guimarães.
que condicionam a conduta dessas 52. (UFRS) Assinale a alternativa em
criaturas. que está Incorreta a relação
c) por ser fruto, especificamente, da imaginação autor/obra/personagem:
e da fantasia dos autores. a) Manuel Antônio de Almeida / Memórias
d) por se notar a preocupação dos autores de um sargento de milícias /Leanardo.
de voltarem para o passado ou para b) Joaquim Manuel de Macedo M Moreninha
o futuro ao criarem seus personagens. I Carolina.
e) por representarem a tentativa dos c) Raul Pompeia / O Ateneu I Carlos.
autores nacionais de reabilitar uma d) José de Alencar / O Guarani/ Cecília.
e) Aluízio Azevedo / O Cortiço I João ao:
Romão. a) Arcadismo - Realismo - Simbolismo.
53. (CARLOS CHAGAS-BA) Assinale b) Simbolismo - Realismo - Barroco.
a alternativa onde estão indicados c) Romantismo - Realismo - Barroco.
os textos que analisam d) Simbolismo - Arcadismo - Barroco.
corretamente alguns aspectos e) Romantismo - Arcadismo - Simbolismo.
do romance realista. 56. (PUC-RS)
— 331 "Esta de áureos relevos,
I . As personagens independem [trabalhada
do julgamento do narrador, reagindo De divas mãos, brilhantes copa,
cada uma de acordo com [um dia,
sua própria vontade e temperamento. Já de aos deuses servir como
II. A linguagem é poeticamente elaborada [cansada,
nos diálogos, mas procura Vinda do Olimpo, a um novo deus
alcançar um tom coloquial, [servia."
com traços de oralidade, nas A poesia que se concentra na
parte narrativas e descritivas. reprodução de objeto decorativo,
III. Observa-se o predomínio da razão como exemplifica a estrofe de Alberto
e da observação sobre o de Oliveira, assinala a tônica da:
sentimento e a imaginação. a) espiritualização da vida.
a) I, lI e III. b) visão do real.
b) I e II. c) arte pela arte.
c) ll e III d) moral das coisas.
d) l e lll. e) nota do intimismo.
e) II. 57. (UFPR)
54. (UCP-PR) Eixos dramáticos ao "Se se pudesse, o espírito que
redor dos quais se desenvolve [chora,
a trama romanesca de O mulato, Ver através da máscara da face;
romance de Aluísio Azevedo: Quanta gente, talvez que inveja
a) a doença sem cura da heroína e a [agora
embriaguez. Nos causa, então piedade nos
b) a marginalidade do mulato e o anticlericallsmo. [causasse!"
c) a saúde deficiente e precária do mulato Raimundo Correia, Mal Secreto
e a decadência da sociedade burguesa. Assinale a alternativa que exprime
d) o comportamento geneticamente a oposição fundamental deste
desavergonhado texto:
do mulato e o fanatismo a) corpo versus espírito.
religioso. b) essência do ser versus aparência.
e) o desprendimento inabalável da heroína c) gente feliz versus gente infeliz.
e a fidelidade à memória do d) piedade versus falsidade.
amado. e) dor versus falsidade.
55. (UFPB) As seguintes afirmações 58. (UFPB) A propósito da poesia
de Alfredo Bosi sobre estilo de parnasiana, é correto afirmar
época: que ela:
"Na França, a partir de 1820, e na a) caracteriza-se como forma de evocação
Alemanha e na Inglaterra, desde os fins de sentimentos e emoções.
do século XVIII, uma nova escritura b) revela-se no emprego de palavras de
substituíra os códigos clássicos em grande valor conotativo e ricas em
nome da liberdade criadora do sujeito." sugestões sensoriais.
"Há um esforço, por parte do escritor c) acentua a importância da forma, concebendo
(...), de acercar-se impessoalmente a atividade poética como a
dos objetos, nas pessoas. E uma sede habilidade no manejo do verso.
de objetividade que responde aos métodos d) faz aluzões a elementos evocadores
científicos cada vez mais exatos de rituais religiosos, impregnando a
nas últimas décadas do século." poesia de misticismo e espiritualidade.
"A poética da novidade tanto no plano e) explora intensamente a cadeia fónica
das idéias (conceptismo) como no da linguagem, procurando associar
das palavras (cultismo) deságua no efeito a poesia à música.
retórico-psicológico e na expressão 59. (UNIP-SP) A negação do positivismo,
do bizarro. O que importa, pois, é não do materialismo e das estéticas
nomear plebeiamente o objeto, mas envolvê- neles fundamentadas, a
lo em agudezas e torneios de engenho, criação poética como fruto do inconsciente,
critérios básicos de valor na arte da intuição, da sugestão,
seiscentista." da associação de imagens e
Correspondem, respectivamente, idéias; o tom vago, impreciso, nebuloso;
o uso acentuado de sinestesias Do claustro, na paciência e no
e intensa musicalidade, [sossego
são características do: Trabalha, e teima, e sofre, e sua!"
a) Realismo. II
b) Simbolismo. "Ó Formas alvas, brancas,
c) Naturalismo. [Formas claras
d) Romantismo. De luares, de neves, de neblinas
e) Parnasianismo. Ó Formas vagas, fluidas,
— 332 — [cristalinas...
60. (FUVEST) Incensos dos turíbulos das aras..."
"E fria, fluente, frouxa claridade — 333 —
flutua como as brumas de
[um letargo" — 334 —
Nestes versos de Cruz e Sousa As estrofes anteriores são, respectivamente,
encontra-se um dos traços característicos dos poetas:
do estilo simbolista: a) Manuel Bandeira e Olavo Bilac.
a) utilização do valor sugestivo da música b) Vinícius de Moraes e Fagundes Varela.
e da cor. c) Olavo Bilac e Cruz e Sousa.
b) rima aproximativa: uso de aliterações. d) Cruz Souza e Castro Alves.
c) presença de onomatopéia. e) Castro Alves e Alphonsus de Guimaraens.
d) uso de antinomia. 64. (PUC-RS)
e) emprego de expressões arcaicas. "Hão de chorar por ela os
61. (UFPA) Na última década do século [cinamomos,
XIX surge, no Brasil, a manifestação Murchando as flores ao tomar
de um estilo de época [do dia
que é o: Dos laranjais hão de cair os pomos
a) Parnasianismo, que reagiu violentamente Lembrando-se daquela que os
contra o estilo então vigente: o [colhia."
simbolismo. Uma das linhas temáticas da
b) Romantismo, que se ajustou perfeitamente poesia de Alphonsus de Guimaraens,
à alma do brasileiro, cujos como se observa no exemplo,
anseios de liberdade política e literária é a:
passou a exprimir. a) amada morta.
c) Impressionismo, que pregava a volta b) religiosidade profunda.
à rigidez formal dos clássicos. c) transfiguração do amor.
d) Arcadismo, que pregava seu ideal de d) atmosfera litúrgica.
felicidade decorrente da vida em contato e) paisagem mariana.
com a natureza. 65. (UFSCAR-SP) A ênfase na seleção
e) Simbolismo, que encontrou uma posição de vocabulário poético,
hostil por parte dos parnasianos, com o objetivo de transferir ao
ao ponto de quase passar despercebido. poema o máximo de correspondência
62. (PUCCAMP-SP) Cruz e Sousa e sensorial, é uma característica
Alphonsus de Guimaraens são do:
poetas identificados com um a) Romantismo, sobretudo na obra de
movimento artístico cujas características Castro Alves.
são: b) Barroco, principalmente em Gregório
a) o jogo de contrastes, o tema da de Matos.
fugacidade da vida e fortes inversões c) Simbolismo, representando pelas
sintáticas. obras de Cruz e Sousa e Aphonsus
b) a busca da transcendência, a preponderância de Guimaraens.
do simbolismo entre as d) Parnasianismo, representado pela
figuras e o cultivo de um vocabulário obra de Alberto de Oliveira.
ligado às sensações. e) Pré-modernismo, principalmente em
c) a espontaneidade coloquial, os temas Jorge de Lima.
do cotidiano e o verso livre. 66. (FEM-PA) Seus poemas sugerem
d) o perfeccionismo formalista, a recuperação um clima de mistério, através
dos ideais clássicos e o vocabulário de uma linguagem rica em
preciso. adjetivos semanticamente vagos
e) o jogo dos sentimentos exacerbados, e imprecisos. Trata-se de
o alargamento da subjetividade e a ... que escreveu ... e, como poeta,
ênfase na adjetivação. está vinculado ao ... .
63. (FUVEST) a) Vinícius de Moraes / Sonetos e Baladas
I I Modernismo.
"Longe do estéril turbilhão da rua b) Ávares de Azevedo / Lira dos Vinte
Beneditino, escreve! No aconchego Anos/Romantismo.
c) Cruz e Souza / Faróis / Simbolismo.
d) Olavo Bilac / O Caçador de Esmeraldas e uma verdadeira obsessão
I Parnasianismo. por brilhos e pela cor branca. E, no plano
e) Cecília Meireles / Vaga Música I Modernismo. específico da expressão, têm destaque
67. (UCP-PR) Assinale a alternativa as sinestesias, as imagens insólitas,
correta. a sonoridade das palavras, a predominância
a) o Romantismo é conseqüência do surto de substantivos e a utilização
de cientificismo e da fadiga da repetição de maiúsculas, com a finalidade de
das fórmulas subjetivas. dar um valor absoluto a certos termos".
b) o poeta parnasiano deixa-se arrebatar O trecho acima refere-se a:
pelo conflito entre o mundo real e a) Cruz e Sousa.
o imaginário, expresso num sentimentalismo b) Cecília Meireles.
acentuado. c) Alphonsus de Guimaraens.
— 335 — d) Gregório de Matos.
c) o Realismo ó conseqüência do surto e) Augusto dos Anjos.
de cientificismo e da fadiga da repetição — 336
das fórmulas subjetivas. 71. (FEI-SP) Marque a única alternativa
d) no Romantismo, o escritor mergulha correta sobre o texto abaixo:
no interior das personagens, mostrando Cárcere das almas
ao leitor seus dramas e sua "Ah! Toda alma num cárcere anda
agonia. [presa,
e) no Simbolismo, predominou a prosa. Solução nas trevas entre as grades
68. (MACK-SP) Do calabouço olhando imensidades,
"Vozes, veladas, veludosas, Mares, estrelas, tardes, natureza."
[vozes, Nesta estrofe, está fortemente
volúpias dos violões, vozes caracterizado um tema simbolista
[veladas, bem ao gosto de Cruz e Sousa.
vogam nos velhos vórtices velozes Trata-se de:
dos ventos, vivas, vãs, a) sofrimento metafísico,
[vulcanizadas". b) espírito de renúncia.
O trecho acima representa um c) tristeza diante de amores impossíveis.
dos momentos mais inspirados da d) sofrimento em decorrência da pobreza
poesía de material.
Assinale a alternativa que completa e) temor diante da injustiça humana.
corretamente as lacunas. 72. (FEI-SP) Escolha a alternativa que
a) simbolista - Alphonsus de Guimaraens. preencha corretamente, na ordem
b) parnasiana - Olavo Bilac. apresentada, as lacunas
c) simbolista - Cruz e Sousa. da frase abaixo:
d) romântica - Alvares de Azevedo. "O Simbolismo se opõe ao [1], aproximando-
e) parnasiana - Alberto de Oliveira. se do [2], no que diz respeito à
69. (MACK-SP) presença do subjetivismo e da emoção,
"Praticam uma poesia predominantemente segundo se observa, por exemplo, em
descritiva, interessada em representar [3], célebre autor de Broquéis.
plasticamente paisagens e [1]
ambientes, reduzindo o mais possível o a) Realismo.
envolvimento emotivo do poeta com os b) Naturalismo.
temas tratados. Por outro lado, há uma c) Arcadismo.
supervalorização da chamada forma poética, d) Romantismo.
onde há busca constante de perfeição e) Naturalismo.
técnica nas rimas, vocabulário [2]
selecionado". a) Romantismo.
Assinale a alternativa em que encontra b) Modernismo.
o nome do movimento literário c) Romantismo.
a que se refere o trecho citado. d) Barroco.
a) Parnasianismo. e) Modernismo.
b) Romantismo. [3]
c) Modernismo. a) Cruz e Souza.
d) Simbolismo. b) Gonçalves Dias.
e) Arcadismo. c) Castro Alves.
70. (MACK-SP) d) Manuel Bandeira.
"Dentre as atitudes mais comuns à e) Olavo Bilac.
sua poesia, no plano temático, destacam- 73. (FEI-SP) Uma das obras citadas
se: a transcendência espiritual, a abaixo foi escrita por Lima Barreto.
integração cósmica, o mistério, o sagrado, Assinale-a:
o conflito entre matéria e espírito, a a) Canaã.
angústia e a sublimação sexual, a escravidão b) Os Sertões.
c) Triste Fim de Policarpo Quaresma. Monteiro Lobato e Euclides da
d) Eu. Cunha. Pode ela ser definida
e) Urupês. como:
74. (UFPB) Sobre as obras da literatura a) a necessidade de superar, em termos
brasileira, abaixo citadas, de um programa definido, as estéticas
não é correto afirmar que: romântica e realista.
a) A Moreninha, de Joaquim Manuel de b) a pretensão de dar um caráter definitivamente
Macedo, é um romance urbano, de final brasileiro à nossa literatura,
feliz, que retrata costumes, cenas que julgavam por de mais europeizada.
e tipos da sociedade pequeno-burguesa c) uma preocupação com o estudo e
do Rio de Janeiro, no século XIX. com a observação da realidade brasileira.
b) Iracema, de José de Alencar, é quase d) a necessidade de fazer crítica social,
poema em prosa, em que se observa já que o Realismo havia sido ineficaz
o encontro da raça branca com nessa matéria.
a indígena, dando lugar ao sugimento e) o aproveitamento estético do que havia
da civilização brasileira, segundo a de melhor na herança literária brasileira,
visão dos românticos. desde suas primeiras manifestações.
— 337 — 77. (MACK-SP) Assinale a alternativa
c) Memórias de um Sargento de Milícias, onde aparece uma característica
de Manuel Antônio de Almeida, que não se aplica à obra
é um romance tipicamente romântico, de Augusto dos Anjos.
cuja ação descreve as intrigas — 338 —
palacianas da corte, no Rio de Janeiro, a) referência à decomposição da matéria.
durante o Primeiro Império. b) pessimismo diante da vida.
d) Triste Fim de Policarpo Quaresma, c) amor reduzido a instinto.
de Lima Barreto, é a história de um d) incorporação de vocabulário científico.
visionário e nacionalista fanático e) nacionalismo exaltado.
que, movido por uma paixão quixotesca 78. (FEI-SP) Leia o texto abaixo.
de patriota exagerado, busca "Para comer, negociar uma barganha,
revolver sozinho os males de seu ingerir um café, tostar um cabo de
tempo. foice, fazê-lo noutra posição será desastre
e) em A Morte e a Morte de Quincas infalível. Há de ser de cócoras.
Berro d'Água, de Jorge Amado, aparecem Nos mercados, para onde leva a
personagens populares, como quitanda domingueira, é de cócoras,
marinheiros, vagabundos, contraventores, como um faquir do Bramaputra, que vigia
prostitutas, como, aliás, os cachimbos de brejaúva ou o feixe
acontece em praticamente toda a de três palmitos.
obra do escritor baiano. Pobre Jeca Tatu! Como és bonito no
75. (UFPB) No romance Triste Fim romance e feio na realidade!
de Policarpo Quaresma: Jeca mercador, Jeca lavrador, Jeca
I. O narrador apresenta-se na terceira filósofo...
pessoa, relatando fatos vividos Quando comparece às feiras, todo
pelo protagonista, sempre mundo logo adivinha o que ele traz; sempre
a se debater por objetivos inatingíveis. coisas que a natureza derrama pelo
II. O narrador, personagem principal mato e ao homem só custa o gesto de
da história, à custa da própria espichar a mão e colher - cocos de
vida, toma consciência da realidade tucum ou jissara, guabirobas, bacuparis,
degradada em que vive. maracujás, jataís, pinhões, cestinhas,
III. O narrador, personagem secundário samburás, tipitis, pios de caçador; ou
da história, conta a trajetória utensílios de madeira mole - gamelas,
do major Quaresma na sua luta pilõezinhos, colher de pau.
em defesa dos valores nacionais. Nada mais.
IV. O narrador, onisciente, revela os Seus grande cuidado é espremer
pensamentos mais íntimos do todas as conseqüências da lei do menor
personagem principal. esforço - e nisto vai longe".
Estão corretas somente as afirmativas: Sobre o criador do célebre Jeca
a) I e II. Tatu é correto afirmar que:
b) l e lll. a) trata-se de Monteiro Lobato, que, por
c) l e lV. meio de textos críticos e sinceros,
d) lI e III. discutiu a realidade brasileira do início
e) II e IV. deste século.
76. (UFRS) Uma atitude comum caracteriza b) trata-se de Menotti del Picchia, poeta
a postura literária de autores e dramaturgo da fase crítica do Modernismo,
pré-modernistas, a exemplo isto é, a primeira geração.
de Lima Barreto, Graça Aranha, c) Monteiro Lobato, autor do fragmento
dado, dedicou-se apenas à literatura c) Realismo - o diálogo
infantil. d) Impressionismo - o historicismo
d) Mário de Andrade, criador também da e) Neo-Realismo - o pitoresco
figura de Macunaíma, é o celebre 82. (MACK-SP)
autor do texto dado. "Em toda a sua obra, ... lutou por
e) poucos autores modernos brasileiros uma língua brasileira que estivesse mais
criaram figuras regionalistas marcantes próxima do falar do povo. Em ... temos,
como Jeca Tatu. Seu criador talvez, a sua criação máxima: a partir
idealizou uma ilha, chamada Pasárgada. desse anti-herói, o autor enfoca o choque
79. (MACK-SP) Assinale a alternativa do índio amazônico (que nascera
incorreta a respeito de Monteiro preto e virou branco - síntese do povo
Lobato. brasileiro) com a tradição e a cultura
a) Moralista e doutrinador, tinha acentuadas européia na cidade de São Paulo, valendo-
tendências para uma concepção se para tanto de profundo estudo do
racionalista e pragmática do homem. folclore".
b) Criador do Jeca Tatu, apontou as mazelas José de Nicola
físicas, sociais e mentais do O item que preenche corretamente
Brasil da Primeira República. as lacunas acima, é:
c) Em sua narrativa, notam-se costumes a) Mário de Andrade - Macunaíma
interioranos, intenção satírica e b) Mário de Andrade - Amar, Verbo Intransitivo
efeitos sentimentais. c) Oswaldo de Andrade -Memórias Sentimentais
d) assumiu posições favoráveis às vanguardas de João Miramar
européias: futurismo, cubismo, d) Oswaldo de Andrade - Serafim Ponte
expressionismo, surrealismo. Grande
e) Apesar de certas ousadias, sua prosa e) Manuel Bandeira - Cinza das Horas
não rompe, no fundo, nenhum molde 83. (FAAP-SP) A prática de um lirismo
convencional. confidencial a que acrescenta
a auto-ironia, comportamento
— 339 — típico do poeta, pode ser encontrada
80. (MACK-SP) no poema:
"Adotando o modelo determinista, a) A Procura da Poesia, de Carlos D.
segundo o qual o meio determina o homem, De Andrade.
a obra divide-se em três partes. — 340 —
Sua publicação foi relevante para a época: b) Pneumotórax, de Manuel Bandeira.
principalmente porque foi a primeira c) Ode ao Burguês, de Mário de Andrade.
obra a retratar um fato histórico contemporâneo d) Retrato, de Cecília Meireles.
com o rigor interpretativo e) Canto do Regresso à Pátria, de Oswaldo
da Ciência; em segundo lugar, porque, de Andrade.
colocando-se nitidamente a favor dos 84. (UFPA) Em fevereiro de 1909,
homens da região, o autor situa o fenômeno Marinetti publicou na Europa um
como problema social, decorrente manifesto cujas idéias desencadearam
do isolamento político do Nordeste em o:
relação ao resto do país". a) Dadaímo.
Assinale a alternativa em que b) Futurismo.
aparece o nome da obra a que se c) Surrealismo.
refere o texto acima. d) Romantismo.
a) Seara Vermelha. e) Simbolismo.
b) Vidas Secas. 85. (UFPA) As idéias de Marinetti
c) Grande Sertão: Veredas. influenciaram muito os nossos
d) O Sertanejo. autores. Dele, os escritores
e) Os Sertões. brasileiros seguiram:
81. (PUC-RS) a) a exacerbação do nacional e a sintaxe
"Caiu a serenata silenciosa e molhou tradicional.
os pastos, as asas dos pássaros e b) a paixão pela metáfora, intelectualista
a casca das frutas. Passou a noite de e rebuscada, e pelas frases de
Deus e veio a manhã e o sol encoberto. efeito.
E três dias houve cerração forte, e c) a negação do passado e o uso de
três noites o estancieiro teve o mesmo palavras com liberdade.
sonho." d) o conceito de felicidade na vida em
Cronologicamente vinculado contato com a natureza, e fé na razão
ao o que dá categoria e na ciência.
artística à obra de João Simões e) o gosto pelo psicologismo na ficção
Lopes Neto, como ilustra o e a supervalorização da natureza.
texto acima, é : 86. (UFPA) O poema "Os Sapos", de
a) Pré- Modernismo - o estilo Manuel Bandeira, contém uma
b) Neo-Simbolismo - a psicologia
crítica à escola: se você dominasse,
a) modernista. se você cansasse,
b) simbolista. se você morresse...
c) parnasiana. Mas você não morre,
d) realista. você é duro, José!
e) literária. Sozinho no escuro
87. (MACK-SP) Assinale a alternativa qual bicho-do-mato,
que corresponde ao nome sem teogonia,
do autor de Paulicéia Desvairada: sem parede nua
a) Machado de Assis. para se encostar,
b) Fernando Pessoa. sem cavalo preto
c) Clarice Lispector. que fuja a galope,
d) Oswaldo de Andrade. Você marcha, José!
e) Mário de Andrade. José para onde?"
As questões 88 a 95 referemse Carlos Drummond de Andrade
ao texto abaixo: 88. (PUCCAMP-SP) José teria, segundo
"E agora José? o poeta, possibilidades
A festa acabou, de alterar seu destino. Essas
a luz apagou, possibilidades estão sugeridas:
o povo sumiu, a) na 5a e 6a estrofes.
a noite esfriou, b) na 1ª, 2a e 3a estrofes.
e agora, José? c) na 3a , 4- e 6a estrofes.
e agora, você? d) na 4a e 5a estrofes.
você que é sem nome, e) n.d.a.
que zomba dos outros, 89. (PUCCAMP-SP) Das possibilidades
você que faz versos, sugeridas pelo poeta para
que ama, protesta? que José mudasse seu destino,
e agora, José? a mais extremada está contida
— 341 — no verso:
Está sem mulher, a) "se você tocasse a valsa vienense".
está sem discurso, b) "se você morresse".
está sem carinho, c) "José, para onde?".
já não pode beber, d) "quer ir para Minas".
já não pode fumar, e) n.d.a.
cuspir já não pode, 90. (PUCCAMP-SP) Para o poeta,
a noite esfriou, José só não é:
o dia não veio, a) alguém realizado e atuante.
o bonde não veio, b) um solitário.
o riso não veio, c) um joão-ninguém frustrado.
não veio a utopia d) alguém sem objetivo e desesperançado.
e tudo acabou e) n.d.a.
e tudo fugiu 91. (PUCCAMP-SP) José é um abandonado.
e tudo mofou, Essa idéia está bem
e agora, José? traduzida:
E agora, José? a) na 4ª estrofe.
sua doce palavra, b) na 5a estrofe.
seu instante de febre, c) no 12ª, 13ª e 1 4 ? versos da 2a estrofe
sua gula e jejum, e nos sete primeiros da 6â estrofe.
sua biblioteca, d) no 8ª e 9ª verso da 1a estrofe.
sua lavra de ouro, e) n.d.a.
seu terno de vidro, 92. (PUCCAMP-SP) "A noite esfriou"
sua incoerência, é um verso repetido. Com
seu ódio - e agora? isso, o poeta deseja:
Com a chave na mão a) deixar bem claro que José foi abandonado
quer abrir a porta, porque fazia frio.
não existe porta; b) traduzir a idéia de que José sentiu
quer morrer no mar, frio porque anoiteceu.
mas o mar secou; c) exprimir que, após o término da festa,
quer ir para Minas, a temperatura caíra.
Minas não há mais. d) intensificar o sentimento de abandono,
José, e agora? tornando-o um sofrimento quase
Se você gritasse, físico.
se você gemesse, e) n.d.a.
se você tocasse 93. (PUCCAMP-SP) O verso que exprime
a valsa vienense, concisamente que José
é "ninguém" é: d) o questionamento da própria poesia.
a) "você que faz versos". e) o pessimismo lírico.
b) "a festa acabou". 98. (CESESP-PE)
c) "você que é sem nome". "Mundo mundo vasto mundo,
d) "que zomba dos outros". se eu me chamasse Raimundo
e) n.d.a. seria uma rima, não seria uma
94. (PUCCAMP-SP) O verso que expressa [solução.
essencialmente a idéia Mundo mundo vasto mundo,
de um José sem norte é: Mais vasto é meu coração."
a) "José, para onde?". Nesta estrofe, o poeta:
b) "sozinho no escuro". a) deixa claro que desejaria mudar de
c) "mas você não morre". nome.
d) "E tudo fugiu". b) declara que seu nome é sonoro por
e) n.d.a. causa da rima.
95. (PUCCAMP-SP) Assinale a afirmativa c) afirma que a questão central não é o
falsa a respeito do texto: nome e sim a sua origem.
a) José é alguém bem individualizado e d) tem dúvida quanto ao tamanho do seu
a ele o poeta se dirige com afetividade. coração.
b) O ritmo dos sete primeiros versos da e) sugere que a atividade poética não
5S estrofe é dançante. consiste em "fazer rimas".
c) "Sem teogonia" significa "sem deuses", 99. (UFPB) A preocupação com o nacionalismo
"sem credo", sem religião". marcou dois movimentos
— 342 — da literatura brasileira:
— 343 — — 344 —
d) Os versos são em redondilha menor em um, acentua-se um nacionalismo
porque tal ritmo se ajusta perfeitamente ufanista; em outro,
à intimidade, singeleza e espontaneidade tem-se o nacionalismo crítico,
das idéias. contestatório.
e) n.d.a. Esses movimentos são, respectivamente,
96. (CARLOS CHAGAS-BA) a) Arcadismo - Romantismo.
I. Moderno e versátil, Vinícius de b) Romantismo - Modernismo.
Moraes compõe, com maestria, c) Arcadismo - Modernismo.
tanto letras para canções populares d) Romantismo - Arcadismo.
como poemas dentro dos e) Modernismo - Romantismo.
mais estritos padrões clássicos. 100. (UFPA)
II. Cecília Meireles caracterizou sua "É certo que desde que me pus na
poesia pela constante sugestão fadiga de escrever brasileiramente, não
de sombra, identificação e ausência; fiz caricatura nem pândega. Todas as
mas soube também incorporar manifestações do brasileirismo lingüístico
a matéria histórica, em uma que empreguei, empreguei sinceramente,
de suas mais importantes obras. não pra fazer comicidade nem
III.A Moreninha narra, em linguagem mostrar burradas de incultos".
presa ao modelo lusitano, a (Mário de Andrade)
história de um amor impossível O trecho citado manifesta a
entre um jovem da aristocracia busca de um ideal lingüístico capaz
imperial do Brasil e uma mestiça. de criar uma estética libertária
Assinale a alternativa correta. em que arte e vida estivessem associadas
a) só a proposição I é correta. na expressão de um Brasil
b) só a proposição II é correta. vivo e diversificado.
c) só a proposição III é correta. Trata-se da estética:
d) são corretas as proposições I e II. a) romântica.
e) são corretas as proposições II e III. b) parnasiana.
97. (PUC-RS) c) realista.
"Não faças versos sobre d) modernista.
[acontecimentos. e) simbolista.
Respostas
Não há criação nem morte
[perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático, 1.a 26. b 5 1 . b 76. c
Não aquece nem ilumina." 2. a 27. a 52. c 77. e
Uma das contantes na obra de 3.c 28. c 53. d 78. a
Carlos Drummond de Andrade, como 4. d 29. a 54. b 79. d
se verifica nos versos acima, é: 5. a 30. b 55. c 80. e
a) a louvação do homem social. 6.c 31. a 56. c 81. a
b) o negativismo destrutivo. 7.c 32.C 57. b 82. a
8.c 33.C 58. c 83. b
c) a violação e desintegração da palavra. 9.e 34. a 59. b 84. b
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