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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA DO

JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS/SP.

PROCESSO: 1012543-38.2020.8.26.0577.

CLAYTON GONÇALVES PALMA NARVAIS​, brasileiro, casado,


serralheiro, inscrito no CPF/MF sob o nº 278.244.248-12 e portador do RG nº
30.276.633-9, SSP/SP, domiciliado na Cidade de São José dos Campos/SP e residente no
endereço à Rua Orlando Sales, 640 - Jd. da Granja - São José dos Campos/SP, por meio de
seu advogado Dr. ​MARCOS DE SOUSA DIACOV GONÇALVES JUNIOR​, inscrito
na OAB/SP sob o nº 324.180, com escritório profissional no endereço à Av. Cassiano
Ricardo, 601, sala 61-63 - Jd. Aquárius - São José dos Campos/SP, CEP 12246-870,
endereço em que receberá intimações, vem diante de Vossa Excelência apresentar

CONTESTAÇÃO CUMULADA COM PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA

contra a ação de obrigação de fazer cumulada com danos morais que lhe move ​FELÍCIO
RAMUTH​, já qualificado nos autos, em respeito ao despacho da fls.26 e nos termos do
art. 30 e seguintes da Lei 9099/95, com base no seguintes fundamentos:
1. DOS FATOS:

1.1. DA SÍNTESE DOS FATOS NARRADOS PELO AUTOR:

Felício Ramuth ingressou com Ação de Obrigação de Fazer cumulada com


Danos Morais contra o réu em razão de manifestação de opinião em rede social: Facebook.

Segundo o autor, em síntese, o réu ultrapassou o seu direito de expressar sua


opinião ao usar termos que - nas suas alegações - são depreciativos e injuriosos. Tenta
sustentar que o objetivo do réu foi somente de ofender a honra e a integridade moral do
requerente. Ainda, afirma que é impossível mensurar o real alcance do seu comentário, em
postagem de uma terceira pessoa, embora, diga ser exponencialmente alto.

Conforme o autor, o réu lhe imputou fato inverídico ao dizer que ele está
preocupado com ponte estaiada. Infere, a partir dessa fala, que o réu acusou o autor de não
se preocupar e atuar em outras áreas de sua competência. Concluindo que o autor não
apenas propagou uma mensagem desabonadora, mas também irreal e que houve, com isso,
um aniquilamento da honra do autor.

Ademais, diz que a repercussão desses fatos estão sendo apurados em sede
de Queixa-Crime. Essa é a síntese dos fatos narrados pelo autor.

1.2. DA SÍNTESE DO PROCESSO:

O autor ingressou com ação e realizou pedido de antecipação de tutela, para


que o réu fosse obrigado a apagar o seu comentário, sob pena de multa diária de R$
2.000,00 (dois mil reais), o que foi negado neste juízo e depois revertido em Agravo de
Instrumento.

O réu, ao ser intimado, tentou encontrar o “post” em que supostamente


realizou o comentário, mas ele já tinha sido apagado, conforme videos enviado por e-mail
ao cartório no dia 23 de outubro de 2020.

1.3. DA CONTESTAÇÃO DOS FATOS:


Antes de rebater os pontos de fato da inicial, vale a pena dizer que o réu se
lembra de ter realizado uma crítica nas redes sociais - em um post da Sra Maria Samilla -
ao atual Prefeito Felício Ramuth, em razão de sua administração, mas não se recorda
exatamente das palavras que usou.

Não foi adicionado ao processo o contexto do comentário, nem ata notarial


para provar aquilo que foi alegado, nem foi dito o alcance real da postagem e nem sequer
descreve especificamente a extensão do dano causado à alma do autor ou o apreço geral
pela sua pessoa.

Dito isto, vamos à contestação dos fatos. O comentário imputado ao réu


como abusivo é o seguinte:

“Mamot vc é um lixo, um prefeito que está preocupado com ponte estaiada vai
quer dizer o que seu lixo vagabundo imprestável e puxa saco do dória outro
lixo”.

O réu é um homem simples, trabalhador, pouco instruído formalmente - o


que verifica no seu comentário - e, por causa disso, pode soar grosseiro na comunicação.
Assim, o comentário - retirado de seu contexto - pode representar algo que não quis
exprimir. Ademais, pessoas como ele costumam não ser imprecisas em seus comentários, o
que nos obriga analisar o comentário à luz do contexto do post.

Segundo informações dadas pelo autor às fls. 28-53, em pedido de


reconsideração, foi juntada ação semelhante contra Maria José de Carvalho Scamilla
Jardim. O réu, pelo o que se pode lembrar, devida a exclusão da postagem, diz que o
comentário foi realizado no post da ré, objeto daquela ação, em que ela noticiava e opinava
sobre o imbróglio da reabertura do comércio da cidade.

Para trazermos Vossa Excelência ao contexto do comentário, é necessário


colocar em tela as circunstâncias noticiadas e discutidas pela sociedade naquele momento.
A Sra. Maria Scamilla é mãe da Excelentíssima Sra. Dra. Juíza de Direito Laís Helena de
Carvalho Scamilla que indeferiu o decreto do “isolamento seletivo” realizado pelo autor.
Aquela Senhora, inconformada com administração da Cidade, se expressou em suas redes
sociais, conforme posto neste processo às fls. 28-53, dois dias antes do processo ser
distribuído à 2ª Vara da Fazenda Pública, em que sua filha atua.

Contudo, o Prefeito, por sua vez, usou as postagens da Maria Scamilla para
insinuar que a motivação da decisão de sua filha foi em razão de viés ideológico e não
técnico. O jornal “O Vale” reportou esse cenário e a seguinte declaração do Prefeito em
suas redes sociais:

“Mesmo assim, Felício disse no vídeo do dia 23: ‘a gente percebe aí um viés
ideológico não só na mãe, mas talvez também na Dra. Juíza. A ideologia cada
um tem a sua, o que a gente não pode é extrapolar os universos ideológicos para
a nossa profissão’, e pediu para que a juíza deixasse de analisar ações
relacionadas a seu governo. ‘Aproveite essa oportunidade para se julgar agora
impedida de qualquer ação perante a prefeitura. Acho que a partir de hoje a
situação dela para julgar ações da prefeitura é, no mínimo, antiética’1”.

Conforme o jornal, na mesma matéria, a ​A​pamagis (Associação Paulista de


Magistrados) deu a seguinte declaração:

“Não se pode aceitar, até como forma de garantir a segurança jurídica, que a
decisão de uma juíza, e da Magistratura como um todo, seja desqualificada
publicamente, nos termos em que fez o prefeito. Eventuais questionamentos das
decisões judiciais devem ser exclusivamente contestados por recurso e não por
meio da internet”

Esse comportamento do autor, no mínimo crítico, é recorrente conforme


trecho de outra reportagem do “O Vale”:

"’Me causa uma certa estranheza que a mesma Justiça, aliás, a mesma Juíza, 15
dias atrás concedeu para os idosos o direito de utilizarem o transporte público.
Tínhamos feito o contrário, para preservá-los em casa teríamos cancelado seus
passes nos ônibus’, disse. ‘A mesma juíza disse que não poderíamos fazer isso e
que os idosos poderiam andar por onde quisessem ao longo da cidade. Essa

1
https://www.ovale.com.br/_conteudo/nossa_regiao/2020/06/105539-mae-de-juiza-que-cha
mou-felicio-de----vagabundo----e----capacho-do-empresariado----tera-que-excluir-posts.html
mesma Justiça, mesma juíza, impede o comerciante de exercer suas atividades.
Parece um grande contrassenso’, afirmou o tucano”2.

Os “posts” de Maria Scamilla, e as supostas ofensas, foram escancarados


pelo próprio autor conforme pode ser visto nas matérias citadas, no vídeo em anexo e no
“link” e “prints” a seguir:

“https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=2862715823845227&id=899
354716848024”

2
https://www.ovale.com.br/_conteudo/nossa_regiao/2020/04/102187-felicio-aponta-vies-id
eologico-em-juiza-que-barrou-reabertura-de-comercios-em-sao-jose.html
É notório o intuito do Autor em manipular a opinião pública contra a justiça,
afim de resguardar sua imagem política - em pleno ano eleitoral - em um momento de
instabilidades. Assim, o eleitor tem a impressão de que a culpa pelo desastre econômico
local não foi de responsabilidade política e administrativa do Prefeito, mas da Justiça.

Para que Vossa Excelência entenda um pouco o espírito do momento que o


réu estava ao escrever seu comentário, veja alguns do comentário no “post” em que o
Prefeito expôs a Maria Scamilla e a juíza, sua filha:
Foi nesse contexto, que esse homem simples, com pouca instrução,
indignado com a postura e a administração do Prefeito, expressou sua opinião.
Ademais, o Sr. Felício não apagou nenhum comentário injurioso contra
Justiça, a juíza e nem a sua mãe. Mas usou das postagens para divulgá-las como se fosse
vítima de perseguição ideológica, colocando em descrédito as instituições desse país. Sua
intenção, com tantas demandas, não é de se fazer justiça, mas de calar os seus opositores.

Dito isto, voltemos à análise da frase. “Mamot”, o termo, por si só, solto não
quer dizer muita coisa. É fato notório que o apelido de Mamute, dado ao Felício Ramuth, é
uma sátira popular que ocorre simplesmente em razão da rima com o seu sobrenome. Isso
ocorre semelhantemente com o apelido dado ao Lula: “molusco”.

Quando o réu diz “você é um lixo”, temos que ter em mente a comunicação
confusa de uma pessoa sem instrução e fazer a interpretação segundo o contexto geral e
específico em que o comentário foi realizado. Se olharmos a expressão diante do contexto,
experimentamos a vontade que o réu tem de dizer que a administração e a postura do
Prefeito diante da Justiça não tem valor e, por isso, deve ser descartada. Não ânimo de
causar dor, sofrimento ou humilhação, mas de realizar juízo de valor sobre aqueles
acontecimentos.

No que diz respeito ao termo “vagabundo”, o que devemos julgar é o


sentido que o réu quis dar e não a palavra em si, de forma isolada, para entendermos se
houve ou não desejo de ofender ou denegrir.

Por exemplo, do ponto de vista de alguém que exerce um trabalho braçal,


bruto e cansativo, alguém que estuda para concursos pode ser visto como um vagabundo,
um encostado etc. Ou, ainda, uma pessoa como esta, pode ter a mesma a opinião sobre
alguém que trabalha na escritório ou como Pastor. O intuito não é diminuir, mas dizer,
dentro da sua visão de mundo, que as atividades daquelas pessoas são leves e que elas não
gostam de trabalho pesado. Ademais, levando em consideração o mesmo tipo de pessoa,
ela pode usar o termo vagabundo para alguém que se dedique a trabalhos duros, mas
voluntários, em razão do seu esforço não trazer proveito econômico
Sob a mesma ótica é que o réu faz a sua crítica, para ele, ao chamar o autor
de vagabundo, ele não quer dizer Felício não trabalhe, mas que seu esforço não tem
proveito algum.

No que diz respeito à ponte estaiada, vem sendo ventilado nas redes sociais
notícias de super-aditamento da obra, uma delas é a página “Sou Mais São José. E a
relação utilidade/custo, ela é muito baixa, mostrando-se basicamente inútil, conforme visão
do Ministério Público noticiada pelo jornal “O Vale” , conforme trecho a seguir:

“Para Promotoria e Defensoria, o relatório da UFABC foi claro ao apontar que a


obra ‘​perderá a qualidade de suas funções já a partir de 2025​’ (ou seja, em
quatro anos e meio já não será capaz de desafogar o trânsito no local), e que ​o
Arco, que custou R$ 60,972 milhões, tem capacidade de absorver apenas
12% a mais de veículos do que um cenário em que fosse realizada apenas
otimização semafórica​. Os órgãos ressaltaram ainda que, segundo a perícia, ​a
ponte estaiada, além de não propiciar ganhos ao transporte público, ainda
deve aumentar o tempo das viagens de ônibus em 23% até 2028. Na proposta
de acordo, o MP sugeriu que, como a obra já foi concluída (protocolada em
dezembro de 2018, a ação visava impedir a construção do Arco), o governo
Felicio deveria realizar um projeto básico e executivo para prever um conjunto
de intervenções para tentar evitar a saturação de tráfego em 2025 e o prejuízo ao
fluxo do transporte coletivo3.

Então, vemos que o pensamento crítico do réu está coadunado com o


pensamento do M.P.

Outra notícia que circulou, foi essa:

“Apesar de todas as denúncias e comprovação de corrupção, a contratação da

Queiroz Galvão pela Prefeitura de São José mostra que as empresas envolvidas

na Lava Jato continuam atuando livremente no país. É preciso dar um basta nesta

3
https://www.ovale.com.br/_conteudo/_conteudo/politica/2020/07/109335-prefeitura-e-mp-divergem-sobre-a
-pericia-do-arco-da-inovacao.html
farra com o dinheiro público, punindo corruptos e corruptores”, afirma o

presidente do Sindicato, Weller Gonçalves4.

Polêmica

A ponte estaiada gerou polêmica na cidade por ser um projeto caro e não

prioritário para a população. Até mesmo especialistas questionam a eficiência do

chamado “Arco da Inovação”.

Em entrevista ao Jornal O Vale, o gerente do projeto do Anel Viário de São José

dos Campos, o engenheiro civil Ronaldo Garcia, afirmou que, apesar de seu alto

custo, a ponte não vai eliminar o ponto de congestionamento entre as avenidas

Jorge Zarur e São João.

“​Esta obra é totalmente desnecessária, considerando-se que a cidade tem

inúmeros problemas sociais a serem resolvidos. Faltam creches, médicos nos

postos de saúde e moradia para a população mais pobre. Enquanto isso,

Ramuth privilegia uma região nobre com uma obra que toda população terá

de pagar​”, finaliza Weller.

O réu, ao se referir ao Prefeito como “puxa-saco”, aponta à aliança política e

o liga à mesma corrente política, às mesmas ideias e às mesmas ações de combate ao

4
https://www.sindmetalsjc.org.br/noticias/n/3839/prefeitura-do-psdb-contrata-empresa-corr
upta-para-construcao-de-ponte
COVID-19, tema das postagem da Sra. Maria. Diante de todo o conjunto, conseguimos

compreender que o réu quis dizer que o Felício ao se alinhar com a política do Dória, vem

administrando a cidade mal, e que suas ações são inúteis e não trazem proveito à

comunidade. Por isso, o Felício não tem condições de questionar a decisão da justiça e nem

a opinião da Maria Scamilla.

Portanto, a crítica está direcionada à política e à administração do autor, de


forma imprecisa e confusa, mas coerente. Fica claro e evidente que não há ânimo de
ofender ou difamar. Se entendermos o contrário, tolemos o direito fundamental de pessoas
simples e sem instrução de manifestar suas opiniões.

Por fim, vale mostrar que o Felício vem usando o judiciário para censurar as
opiniões contrárias ao seu governo, conforme pode ser visto a seguir:

A Justiça de São José dos Campos negou, em caráter liminar, o pedido do

prefeito Felício Ramuth (PSDB) para que fosse excluída uma postagem na

página ‘Sou Mais São José’, no Facebook, com trechos de uma entrevista de

Luiz Carlos de Oliveira, candidato ao Paço Municipal pelo PTC.

Protocolada em agosto pelo tucano, a ação tem como base uma entrevista

concedida por Oliveira a uma rádio comunitária da cidade em julho – alguns dos

trechos foram publicados na página do Facebook.

Na entrevista, segundo Felício, Oliveira atribuiu ao tucano atos de corrupção

passiva, tráfico de influência e de improbidade administrativa – entre outras

coisas, Oliveira fala em obras superfaturadas e diz que o sétimo andar da

Prefeitura, onde fica o gabinete do prefeito, “é um verdadeiro escritório

imobiliário”.

Na decisão que negou a concessão da liminar, o juiz Emerson Norio Chinen, da

6ª Vara Cível, apontou que “o pano de fundo dos autos parece ser de cunho
eminentemente político”, e afirmou que, ao menos nessa fase do processo, não é

possível concluir a existência de irregularidades na postagem.

“Da análise das postagens apontadas na inicial, extrai-se a conclusão de que se

cuida de desabafo corriqueiro por genérica mazela política, suposta

irregularidade em repasse, superfaturamento, benefício imobiliário ou desvio de

conduta de personalidade pública que por se tratarem de lugares comuns tão

historicamente utilizados no baixo jogo da política, em nada sugerem o mais

improvável potencial ofensivo à honra de qualquer homem público político e que

em nada desmerecem seu capital político”, diz trecho da decisão.

PROCESSO.

Após apresentação da defesa dos citados, a Justiça irá analisar o mérito da ação.

Nele, Felicio pede que Oliveira e os dois administradores da página paguem a ele

R$ 10 mil de indenização por danos morais, cada um.

Oliveira diz que não citou o nome de Felício na entrevista. ​Já os

administradores da página afirmam que o prefeito pratica “assédio judicial

como forma de camuflar perseguição política e tentativa de censura5”.

2. DO DIREITO:

2.1. DA JUSTIÇA GRATUITA:

O réu declara não possuir meios suficientes para suportar as custas desse

processo sem comprometer o seu sustento e de sua família, conforme declaração em anexo.

Assim, requer o benefício da justiça gratuita nos termos dos artigos 98 e seguintes.

2.2. DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO:

5
https://www.ovale.com.br/_conteudo/politica/2020/10/114899-justica-nega-liminar-pedida
-por-felicio-para-excluir-trechos-de-entrevista-de-candidato-ao-paco.html
Em respeito à decisão da fl. 23, item 8, oferece como proposta de acordo o

valor de R$ 1.000,00 (mil reais) pagos em 05 (cinco) parcelas iguais de R$ 200,00

(duzentos reais).

Conforme, despacho da fl. 68, informa os seguintes e-mails para a

audiência: ​marcos@diacov.adv.br​, ​marcoslege@gmail.com​ e ​narvaisclayton@gmail.com

2.4. DO MÉRITO:

2.4.1. Da licitude da Manifestação da Opinião ou Pensamento:

O autor alega ter sofrido dano moral em razão de abuso de direito

manifestação de opinião do réu em rede social: o facebook. E pressupõe que esse dano é ​in

re ipsa.

Dirley da Cunha Júnior define o direito fundamento de manifestação de

opinião ou pensamento da seguinte forma:

É o direito de exprimir o que se pensa. É a liberdade de expressar juízo,

conceitos, convicções e conclusões sobre alguma coisa. A Constituição consagra

a liberdade de manifestação do pensamento, sob qualquer forma, processo ou

veículo, sendo vedado o anonimato (art. 5º, IV) e toda e qualquer censura de

natureza política, ideológica e artística (art. 220, §2º) (...).

A liberdade de opinião, portanto, constitui-se em direito fundamental do cidadão,

envolvendo o pensamento, a expressão de fatos atuais ou históricos e a crítica. A

Constituição, porém, visando harmonizar a liberdade de manifestação do

pensamento com outros direitos da personalidade, proibiu o anonimato6.

6
CUNHA JÚNIOR, Dirley da. ​Curso de Direito Constitucional. 5ª edição, Ed.: Juspodivm,
Salvador, 2011, p. 684.
O réu, neste caso, se expressou sem esconder no viés do anonimato e não

usou do seu direito para fins de vindita ou perseguição, mas tão somente, ainda que de

forma imprecisa, para se manifestar o seu juízo sobre temas da atualidade que envolve o

autor.

O autor é agente político, suas ações governamentais não estão protegidas

pelo direito à privacidade, mas devem ser expostas em razão do princípio da publicidade

que envolve os atos administrativos, justamente para que estejam sujeitos à fiscalização do

povo.

O contexto, em que se deu o comentário, torna evidente que o réu se refere

às atividades governamentais e à manifestação do Prefeito de desrespeito com a instituição

jurídica. É uma maneira de demonstrar que está insatisfeito com o governo do Prefeito,

formando juízo de reprovação sobre suas ações. O réu não faz comentário sobre atributos

da personalidade no tocante ao físico, intelectual ou moral, mas ao governo do Prefeito.

Portanto, ainda que de forma imprecisa e confusa, a manifestação do réu

está dentro da legalidade.

2.4.2. DO DANO MORAL SUBJETIVO, OBJETIVO E ​IN RE IPSA​:

O autor alega que sofreu dano moral subjetivo, objetivo e ​in re ipsa.​ Dirley

da Cunha Júnior, citando Paulo José da Costa Jr, diz:

Por honra deve-se entender “não só a consideração social, o bom nome e a boa

fama, como o sentimento íntimo, a consciência da própria dignidade pessoal

refletida na consideração alheia e no sentimento da própria pessoa”.


O direito à honra visa tutelar todo esse conjunto de atributos concernentes à

reputação e ao bom nome da pessoa.

(...)

Imagem é a representação de alguma coisa ou pessoa pelo desenho, pintura,

fotografia ou outro meio de caracterização de seus atributos físicos7.

Por óbvio, dano à integridade física não houve, assim como à sua imagem.

Restando a saber se houve dano à honra.

Já afirmamos que o réu não se dirigiu aos atributos pessoais do autor, mas à

sua governança. No entanto, se vossa excelência entender que houve ato ilícito, isso não

exime o autor da prova do dano e a sua extensão, inclusive para que Vossa Excelência

possa quantificar a indenização.

Ora, se o dano moral é subjetivo, é necessário que o autor demonstre sua

dor, sofrimento e humilhação.

Se ele é objetivo, é necessário que ele prove a mácula à sua reputação e não

apenas o ato ilícito em si, ainda que seja uma situação de presunção do dano. Por exemplo,

uma pessoa que teve o nome inscrito em órgãos de proteção ao crédito de forma indevida,

presume-se o dano moral, no entanto, se a “vítima” tiver seu nome inscrito, antes da

inscrição injusta, não há dano, ainda que haja ilicitude.

Em se tratando de dano ​in re ipsa​ vejamos o seguinte:

A prova da dor deve, por óbvio, ser dispensada, mas ​isso não

dispensa a prova do dano moral em si​, isto é, da lesão a um interesse jurídico

7
CUNHA JÚNIOR, Dirley da. ​Curso de Direito Constitucional. 5ª edição, Ed.: Juspodivm,
Salvador, 2011, p. 702-703.
atinente à personalidade humana. ​Quem alega o dano moral deve demonstrar

a ocorrência da lesão​, tal como ocorre no dano patrimonial. Assim como para

haver dano patrimonial ​não basta à vítima demonstrar que o réu agiu de

forma antijurídica​, trazendo risco à propriedade alheia, ​cumprindo-lhe provar

que o seu patrimônio foi concretamente afetado​, para haver dano

extrapatrimonial não é suficiente que a vítima prove ter o réu se conduzido de

forma indevida. ​Exige-se a prova da concreta afetação (​rectius:​ lesão) da sua

privacidade, da sua imagem, da sua integridade física ou de qualquer

aspecto da sua personalidade​.

(...)

Visto, portanto, como lesão a um interesse jurídico atinente à

personalidade humana, o dano exige a prova da lesão, da mesmíssima forma,

aliás, que a exige o dano patrimonial, como lesão ao patrimônio. (...). Lá, como

aqui, ​a dificuldade não exime a vítima da prova do dano, ou o juiz de sua

verificação. O reconhecimento de que o dano moral, tal como patrimonial, deve

ser demonstrado evita, de um lado, o perigoso risco de uniformização rígida ou

tabelamento de indenizações, que tende a prevalecer sempre que se dispensa a

produção de prova concreta de afetação do interesse existencial da vítima,

contrariando a tendência de reparação à luz das condições da pessoa lesada. De

outro lado, impede uma excessiva abertura que o mito da prova ​in re ipsa traz ao

campo dos danos morais. Com efeito, não pode haver maior estímulo à

propositura de ações infundadas que dispensar o autor do ônus probatório do

elemento mais importante da responsabilidade civil, o dano cuja reparação

consiste na função primordial do instituto8.

Vimos, excelência, que não houve prejuízo à imagem, à privacidade, à

integridade física. Quanto à honra - seja ela objetiva ou subjetiva-, também podemos

8
SCHREIDER, Anderson. ​Manual de Direito Civil Contemporâneo. São Paulo: Saraiva,
2018, p. 628-629
verificar que não houve, uma vez que ele se utilizou delas para modificar a opinião pública

em seu favor e contrária à justiça e a Maria. O comentário do réu, é apenas coadjuvante à

postagem da Sra. Maria.

Em relação ao alcance, conforme o “print” do autor, com apenas uma

curtida no comentário do réu, presume-se que não teve alcance por capacidade própria,

mas pela politização e publicidade que o próprio autor deu em suas redes social. E o vídeo

demonstra que o autor tratou com cinismo as supostas ofensas e, portanto, há ausência de

dor, sofrimento e humilhação.

Conclui-se, portanto, que houve a inocorrência de qualquer dano moral, mas

de manifestação e exercício de direito fundamento de expressar opinião ou pensamento.

4.4.3. DA QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL:

Segundo o Anderson Schreider:

A rigor, o único desses critérios que encontra respaldo

normativo é o critério da gravidade, ou melhor, da extensão do dano. O Código

Civil afirma, de fato, no ​caput d​ o art. 944 que “​a indenização mede-se pela

extensão do dano”​ (...).

No afã de racionalizar o processo de arbitramento do valor do

dano moral, o STJ tem acolhido a utilização do chamado método bifásico,

estruturado, nas palavras do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, da seguinte

forma: “(i) Na primeira etapa, deve-se estabelecer uma valor básico para

indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de

precedentes jurisprudenciais que apreciam casos semelhantes. (ii) Na segunda

etapa, devem ser consideradas as circunstâncias do caso, para fixação definitiva


do valor da indenização, atendendo a determinação legal de arbitramento

equitativo pelo juiz”9.

Se, nesse caso concreto, o réu for condenado ao pagamento de indenização

por danos morais, que se leve em consideração o critério acima.

O valor pedido, leva em consideração uma reputação completamente ilibada

do autor, dolo na conduto do réu em injuriar e difamar, e falsidade no comentário.

Assim sendo, deve-se levar em consideração a reputação do autor antes e

depois do comentário, se for verificado, como dito na tese, que o autor conseguiu se

beneficiar, não há sequer motivo para indenização, mas bonificação. Por outro lado, se for

verificado que as pessoas mudaram de opinião ao seu respeito, deve-se levar em

consideração, quantas pessoas fizeram isso, com base nas visualizações, antes da

publicidade que o autor deu ao post. Conquanto, haja ato ilícito, mas a opinião não tenha

sido capaz de modificar a forma que as pessoas vêem o autor, não há razão para

indenização, por ausência de dano.

Ademais, a reputação do autor deve ser visto sob o conjunto de fatos

noticiados ao seu respeito, principalmente aquelas que geram dúvidas sobre a licitude e a

moralidade de seus atos, tais como a escolha de empresa para a construção da ponte

estaiada e os aditamentos, a questão dos cargos comissionados e as notícias de

irregularidades etc.

9
SCHREIDER, Anderson. ​Manual de Direito Civil Contemporâneo. São Paulo: Saraiva,
2018, p. 629-630.
Se houver o entendimento que a ilicitude é culposa, foi um descuido, isso

deve ser abatido do ​quantum​ máximo e assim por diante.

3. DOS PEDIDOS:

i. ​Preliminarmente, o deferimento do pedido de justiça gratuita;

ii. ​O indeferimento dos pedidos feitos na inicial, por considerar ausência de

ilicitude ou de dano, ou mesmo em razão de falta de demonstração de um ou de

outro;

iii. se houver condenação, que o ​quantum seja calculado pelo critério bifásico do

STJ, e que seja diminuído o valor pedido ao patamar máximo de R$ 1.000,00 (mil

reais);

iv. ​o deferimento de todas as provas, permitidos em Direito dos fatos alegados,

inclusiva testemunhal.

Termos em que pede deferimento.

São José dos Campos, 03 de novembro de 2020.

MARCOS DE SOUSA DIACOV GONÇALVES JUNIOR


OAB/SP 324.180
Advogado

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