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ISBN: 978-65-87127-00-2
Em parceria com
Fundação Ford
Organizadoras
Glaucia Marinho e Daniela Fichino
Autoras/es
Adriana Fernandes, Alexandre Magalhães, Ana Carolina Brandão Vazquez, Ana
Paula da Silva, Anelise dos Santos Gutterres, Betina Sarue, Fábio do Nascimen-
to Simas, Frank Andrew Davies, Fransérgio Goulart, Giovanni Diniz Machado da
Silva, Guilherme de Jesus France, Ivie Soares Garrido, João Rafael da Conceição,
José Rodrigues de Alvarenga Filho, Karyne Cristine Maranhão de Matos, Luan
Carpes Barros Cassal, Luccas Cardoso Real Martins, Mario Brum, Natan Aguilar
Duek, Poliana Monteiro, Raphael Soifer, Taísa Sanches, Thaddeus Gregory Blan-
chette, Thais Lemos Duarte, Veronica Freitas,Viviane Suzano Martinhão.
Fotografias
Bárbara Dias, Kauê Pallone, Wagner Maia (Coletivo Fotoguerrilha)
Projeto Gráfico
Jackson Anastácio
Justiça Global
Coordenadoras: Glaucia Marinho, Isabel Lima, Melisanda Trentin, Sandra Carva-
lho.
Equipe: Ana Esther Santos, Antonio Neto, Daniela Fichino, Danielle Duarte, David
Ramos, Francisca Moura, Guilherme Pontes, Lourdes Deloupy, Milena Teixeira,
Monique Cruz, Raphaela Lopes, Raoni Dias.
www.global.org.br
contato@global.org.br
(21) 2544-2320
38 Cidade sob armas: tráfico, milícia e Exército no Rio de Janeiro dos me-
gaeventos
Frank Andrew Davies e Thais Lemos Duarte
147 Sem clientes e sem capital: o desastre dos megaeventos cariocas para
a prostituição na cidade
Ana Paula da Silva e Thaddeus Gregory Blanchette
151 Sonhos sujos e The Brazilian Dream of the American Way of Life
Raphael (Raphi) Soifer
Resumo:
24
Guilherme de Jesus
As jornadas de junho de 2013 e France
a outra resposta do Congresso Pesquisador do Centro de Jus-
tiça e Sociedade da FGV Direi-
to Rio. Mestre em Direito pela
Nacional UERJ e Mestre em História,
Política e Bens Culturais pelo
CPDOC/FGV. Sua dissertação
tratou das origens da Lei An-
titerrorismo, quando também
analisou experiências de cri-
Resumo minalização de movimentos
sociais em processos legisla-
A resposta do Congresso às jornadas de junho de 2013 que recebeu tivos.
mais atenção foi a chamada “agenda positiva”, por meio da qual
buscou-se responder a alguns dos anseios manifestados nas ruas.
Pretende-se, aqui, trazer um enfoque para uma “agenda negativa”
que também emergiu no rescaldo das jornadas. Trata-se de um
conjunto de propostas, apresentadas por parlamentares diversos,
as quais pretendiam impor uma gama de restrições ao direito de
manifestação e criminalizar diferentes condutas relacionadas a
movimentos sociais e reivindicatórios. Para além de mapear estas
propostas, busca-se sinalizar um padrão de comportamento que
se baseia numa reação imediata e exagerada, por parte da classe
política brasileira, a momentos de ebulição social, o qual poderá
se repetir em momentos futuros.
33
Fransérgio Goulart
Historiador e coordenação
Baixada Fluminense, Mexicanização
executiva da Iniciativa Direito
à Memória e Justiça Racial/
e Racismo
Baixada Fluminense RJ.
Resumo:
Notas:
37
Frank Andrew Davies
Doutor em Ciências Sociais
Cidade sob armas:
(PPCIS-UERJ), pesquisador e
Professor da UFPE tráfico, milícia e Exército no
Thais Lemos Duarte
Doutora em Ciências Sociais
Rio de Janeiro dos megaeventos
(PPCIS-UERJ), pesquisadora de
Pós-Doutorado em Sociologia
da UFMG
Resumo:
44
Jogo de memória na Central: Adriana Fernandes
ocupações de moradia,
Antropóloga e pesquisadora
do Distúrbio (UERJ/UFRRJ/
CNPq); em 2013 defendeu a
destruição, reaparições tese Escuta ocupação: arte do
contornamento, viração e pre-
cariedade no Rio de Janeiro
(PPCIS/UERJ).
Resumo:
61
minado/.
Notas: 13. h t t p s : //e s p o r t e s . e s t a d a o .
c o m . b r/ n o t i c i a s/ j o g o s - o -
limpicos,jogos-olimpicos-
do-rio-2016-reg istram-pre-
1. http://g1.globo.com/rio-de- juizo-milionario,70001785324
j a n e i r o/ n o t i c i a / 2 0 1 6/ 0 7/ https://www.brasildefato.com.
aluno-da-ufrj-e-encontrado- br/2016/08/12/obras-olimpicas-
morto-dentro-do-campus-do- -resultaram-em-desperdicio-
fundao-rio.html de-dinheiro-publico-diz-espe-
2. http://g1.globo.com/rio-de- cialista/.
j a n e i r o/ n o t i c i a / 2 0 1 6/ 0 7/ 14. Palavra que significa amigá-
ele-comprou-uma-briga-afir- vel, receptivo para com pessoas
ma-irmao-de-estudante-mor- LGBT.
to-na-ufrj.html 15. h t t p s : // o d i a . i g . c o m .
3. h t t p : // r j . g o v . b r/ w e b / s e - b r/ _ c o n t e u d o/ r i o - d e - j a -
gov/exibeconteudo?article- n e i ro/ 2 0 1 7- 02-2 2/g u i a -
-id=1899271 de-turismo-apresenta-a- vi-
4. http://redesdamare.org.br/ sitantes-o-rio-gay-friendly.
b l o g /p u b l i c a c o e s/p u b l i c a - html ; https://g1.globo.com/
cao-ocupacao-da-mare-pe- r j /r i o - d e - j a n e i r o/n o t i c i a/
lo-exercito-brasileiro/ ; http:// rio-registra-no-1o-trimestre-
w w w . j b . c o m . b r/ r i o / n o t i - de-2018-mais-denuncias-de-a-
cias/2018/03/14/complexo-da- gressoes-contra-lgbt-do-que-
-mare-teme-volta-do-exercito/ -em-todo-2017.ghtml.
5. https://epoca.globo.com/tem- 16. Monteiro; Cosentino, op. cit.; ht-
po/expresso/noticia/2015/07/ tps://www.cartacapital.com.br/
com-upps-em-crise-pezao-se- revista/858/espremidos-entre-
compromete-dar-mais-r-4-bi- dois-senhores-6954.html .
lhoes-para-policia-militar.html. 17. Monteiro; Cosentino, op. cit.
6. Monteiro, Poliana; Cosentino, 18. Foto IV, fonte: arquivo pessoal.
Renato. Projeto, orçamento e
(des)legados olímpicos. Rio de
Janeiro: Fundação Heinrich Böll,
2017. Disponível em: https://
br.boell.org/sites/default/files/
boll_olimpiada_01_09_17.pdf
7. Monteiro; Cosentino, op. cit.
8. h t t p s : // g 1 . g l o b o . c o m / r j /
r i o - d e - j a n e i ro/n o t i c i a/
obras-do-corredor-brt-trans-
brasil-estao-suspensas-por-fal-
ta-de-pagamento-diz-sindicato.
ghtml.
9. http://www.jb.com.br/rio/noti-
cias/2015/05/19/obras-do-vlt-
continuam-paradas-e-causam-
transtornos-para-a-populacao/
https://oglobo.globo.com/rio/
obra-do-ultimo-trecho-do-vlt-
-esta-parada-na-avenida-mare-
chal-floriano-22602482.
10. Monteiro; Cosentino, op. cit.
11. http://g1.globo.com/rio-de-
j a n e i r o/n o t i c i a / 2 0 1 6/ 0 6/
governo-do-rj-decreta-esta-
do-de-calamidade-publica-de-
vido-crise.html.
12. http://justificando.cartacapital.
com.br/2017/08/09/uerj-fecha-
62 -as-portas-por-tempo-indeter-
Mate(,) a cultura local: Giovanni Diniz Machado
da Silva
impedimentos na Copa de 2014 Especializando em Antropo-
logia Cultural pela Pontifícia
Universidade Católica do Pa-
raná (PUC-PR); Bacharel em
Relações Internacionais pelo
Centro Universitário Curitiba
(UNICURITIBA); Graduando
em Direito pela Universidade
Resumo: Federal do Paraná (UFPR) e
Membro do Núcleo de Estudos
Filosóficos (NEFIL-UFPR) e do
O presente ensaio reflete acerca dos impactos dos megaeventos Grupo de Estudo em Direito
sobre a realidade cultural local, observando-os concretamente Autoral e Industrial (GEDAI-U-
FPR)
a partir do vivenciado pelos vendedores ambulantes de mate na
cidade do Rio de Janeiro em face das restrições impostas a sua
atividade comercial durante a realização da Copa do Mundo da
FIFA em 2014.
Notas:
Referências
Resumo:
Referências
70
O “neodesenvolvimentismo”, as Alexandre Magalhães
Mestre e Doutor em
Olimpíadas e as remoções de Sociologia no IESP-UERJ, Pós-
doutorando em Antropologia
1
Resumo:
Jogos Pan-Americanos 07/2007 Cesar Maia (DEM) Cabral (PMDB) Lula (PT)
Anúncio da
30/10/07 Cesar Maia (DEM) Cabral (PMDB) Lula (PT)
Copa do Mundo
Jornada Mundial da Juventude 7/2013 Eduardo Paes Cabral (PMDB) Dilma Rousseff (PT)
(PMDB)
Copa do Mundo 6-7/2014 Eduardo Paes Pezão (PMDB) Dilma Rousseff (PT)
(PMDB)
Jogos Olímpicos 8/2016 Eduardo Paes Pezão (PMDB) Dilma Rousseff (PT)
(PMDB)
Tabela realizada a partir dos dados da imprensa (O Globo)
NA CIDADE DO RIO DE
JANEIRO PELO COLETIVO
FOTOGUERRILHA
Nos meses que antecederam as DAE pudesse ser privatizada.
Olimpíadas Rio 2016, uma sé- No calor dessas lutas, nodo nós
rie de demandas sociais estavam do coletivo Fotoguerrilha estive-
sendo exigidas nas ruas da “cida- mos de perto documentando às
de olímpica”. O ano começou com lutas, desde a greve às ocupações
uma forte greve dos trabalhado- estudantis. Documentamos tam-
res da Educação Estadual e Ocu- bém os atos contra as Olimpía-
pações estudantis secundaristas, das, e as Batalhas da Alerj. Nossa
que questionavam o Governo proposta é em um ensaio coleti-
prioridade para a educação que vo, mostrar imagens dessa luta
encontrava (e encontra-se) suca- da população do Rio de Janeiro,
teada, e sem reajuste de salários contrária a esse megaevento e de
dos professores há anos, em de- como ele catalisou lutas nos anos
trimento dos fartos investimen- de 2016 e início de 2017.
tos nas obras Olímpicas.
Apesar de acreditarmos que to-
Era o prelúdio do Rio de Caos e das as fotos possuem uma histó-
lutas que ira suceder após os jo- ria que traspassa uma linearidade
gos, passado o grande evento, o cronológica, preferimos separar
Estado do Rio de Janeiro alegan- por temas as nossos registros fo-
do evitar a falência completa, tográficos, da seguinte forma:
impôs medidas de austeridade a
população, principalmente aos
servidores Estaduais, que reagi-
ram com grandes atos realizados 1. Tema 1: Greve da rede Esta-
em frente a Assembleia Legislati- dual 2016 e Ocupações estu-
va do Rio de Janeiro, que ficaram dantis;
conhecidas como “Batalhas da 2. Tema 2: atos contra as Olim-
Alerj”. Apesar da aguerrida luta, píadas;
nada foi capaz de impedir um 3. Tema 3: Batalhas dos servido-
aumento na taxa previdenciária res estaduais na Alerj e atos
de 11% para 14% e a votação dos contra a privatização da CE-
deputados autorizando que a CE- DAE.
94
Estudante secundarista em ato pela educação, protesta pedindo o boicote as olimpíadas.
Em 2016, os estudantes iniciaram uma onda de ocupações, pedindo melhores condições nas
escolas em apoio a greve dos professores.
95
Fotos: Kaue Pallone
96
Estudante secundarista segura cartolina com mensagem sobre a greve em frente à ALERJ
97
Fotos: Wagner Maia
Policiais agridem manifestantes na greve dos professores da rede estadual do estado do Rio de
Janeiro, próximo ao Palácio da Guanabara em Laranjeiras.
98
Ocupação dos estudantes na Secretaria de Estado de Educação(SEEDUC-RJ). Numa visita do
secretário de educação Vagner Victer a ocupação, ele é hostilizado por estudantes.
99
TEMA 2:
100
Homem protesta silenciosamente contra um cordão feito por policiais no estádio do
Maracanã, que impediu a população de se aproximar da festa de abertura nas Olimpíadas Rio
2016.
101
Fotos: Kaue Pallone
Manifestante segura mensagens contra as Olimpíadas em ato na Tijuca na abertura dos jogos.
102
Contra as Olimpíadas - Ato na Cinelândia contra as Olimpíadas no dia 17 de agosto.
103
Fotos: Wagner Maia
Ato dos estudantes contra as Olimpíadas de 2016 e excessivos gastos públicos para o evento.
Manifestantes estudantes protestam no bairro do Méier na Zona Norte do Rio.
104
Ato dos estudantes contra as Olimpíadas de 2016 e excessivos gastos com o evento no bairro
do Méier, após forte repressão, estudantes são presos e levados a Cidade da Polícia.
105
TEMA 3:
Após as Olimpíadas, durante a batalha da Alerj, quando os servidores estaduais lutaram contra
as medidas de austeridade do Governo Pezão, houve forte repressão contra os manifestantes,
com Batalhão de Choque, caveirão lançando jatos de água, bombas e tiros de bala de borracha
contra a população. Restou a resistência popular, na foto um homem revida uma bomba de
gás, lançando-a de volta contra a polícia.
106
Em fevereiro de 2017 passadas os jogos Olímpicos de 2016, o Rio de Janeiro afundando na crise
econômica, pede ajuda ao Governo Federal, que como contrapartida ao plano de recuperação
financeira do Estado exige como garantia a privatização da CEDAE. Enquanto a Alerj votava a
pauta, milhares de pessoas foram as ruas e impuseram uma forte resistência popular e foram
fortemente reprimidos pela polícia.
107
Fotos: Kaue Pallone
108
Bomba da PM explodindo em barricada durante ato dos servidores na ALERJ em 2016.
109
Fotos: Wagner Maia
110
Manifestações contra a Venda da CEDAE e do considerado ajuste fiscal do Governo pezão
“Pacote de maldade”. Policiais são revidados por sua própria bomba, depois da mesma falhar
contra os manifestantes. Comandante da tropa é atingido no rosto.
111
Poliana Gonçalves
Monteiro
O urbanismo olímpico na cidade
Arquiteta e Urbanista (UFJF);
Mestra em Planejamento Ur-
patriarcal:
bano e Regional (IPPUR/UFRJ);
Pesquisadora do Laboratório
Moradia, Remoções e Violência
GPDU (EAU/UFF). Tem expe-
riência em Assessoria Técnica contra a Mulher no Rio de Janeiro
em comunidades ameaçadas
por remoção e Pesquisa e Ex-
tensão na áreas de Planeja-
mento Urbano, Habitação So- Resumo:
cial e Urbanização de Favelas
com foco nas Lutas protagoni- O patriarcado é o regime de dominação-exploração das mulheres
zadas por Mulheres. O presen- pelos homens e atravessa toda a sociedade, inclusive a produção
te artigo foi escrito em 2018, do espaço. Não há, em uma sociedade injusta, espaço cuja ocupa-
com insumos da minha disser- ção, distribuição e significação não seja desigual. A reflexão aqui
tação de mestrado defendida pretendida busca evidenciar o padrão territorial desigual no qual a
no IPPUR em 2015. violência contra a mulher se materializa, como essa seletividade é
estruturada e estruturante pelo/do regime de exploração-domina-
ção patriarcal e capitalista, e como o Urbanismo Olímpico empre-
endido sob a justificativa dos megaeventos esportivos intensificou
esse processo. Com esse objetivo, será destacado como a segrega-
ção urbana e a periferização da moradia confronta as mulheres na
Cidade Patriarcal, assim como as políticas públicas concebidas e
executadas sob a premissa do Machismo Institucional, que vulne-
rabilizam as mulheres e potencializam a violência de gênero.
“O processo de
segregação urbana Não é possível apreender a Com esse objetivo, será destaca-
verdadeira natureza da agressão do como a segregação urbana e
e periferização da sexual sem situá-la em seu a periferização da moradia con-
moradia confronta contexto sociopolítico mais fronta as mulheres na Cidade Pa-
as mulheres de amplo. Angela Davis, 2017. triarcal. Assim como as políticas
públicas concebidas e executa-
forma mais aguda, O patriarcado é o regime de do- das sob a premissa do Machismo
não somente minação-exploração das mulhe- Institucional que vulnerabilizam
as mulheres e potencializam a
pela ausência de res pelos homens, expressão do
violência de gênero, utilizando o
poder que autentica “uma estru-
infraestrutura tura de poder baseada tanto na cruzamento das informações so-
urbana básica e ideologia quanto na violência1 ”. bre a ocorrência de estupros na
cidade do Rio de Janeiro, a locali-
serviços essenciais, Não há, em uma sociedade injus-
zação dos conjuntos do Programa
ta, espaço cuja ocupação, distri-
como creches, buição e significação não seja de- Minha Casa Minha (PMCMV) e as
escolas, hospitais sigual. A reflexão aqui pretendida remoções empreendidas na ges-
busca evidenciar o padrão terri- tão de Eduardo Paes.
e transporte, torial desigual no qual a violência
mas também pela contra a mulher se materializa na
violência urbana.” cidade do Rio de Janeiro, como
A CIDADE PATRIARCAL
essa seletividade é estruturada e
estruturante pelo/do regime de
exploração-dominação patriarcal
e capitalista, e como o Urbanismo O processo de segregação urbana
Olímpico empreendido sob a jus- e periferização da moradia con-
tificativa dos megaeventos espor- fronta as mulheres de forma mais
112 tivos intensificou esse processo. aguda, não somente pela ausência
de infraestrutura urbana básica elemento do complexo regime de
e serviços essenciais, como cre- dominação-exploração.3
ches, escolas, hospitais e trans- A noção de “direito à cidade” tem
porte, mas também pela violência centralizado a crítica contempo-
urbana. A produção de habitação rânea à desigualdade de acesso à
de interesse social no marco do estrutura urbana, mas via de re-
Programa Minha Casa Minha Vida gra adota como base de sua críti-
(PMCMV), cuja inclinação merca- ca um sujeito abstrato, sem sexo,
dológica transferiu a prerrogativa sem cor e sem classe. Nesse sen-
da definição do projeto e da lo- tido, visto a complexidade que
calização dos empreendimentos envolve as desigualdades, qual
para a iniciativa privada, resultou seria o paradigma de efetivação
no deslocamento de significativo do direito à cidade para as mu-
contingente populacional para lheres?
regiões periféricas do Rio de Ja-
neiro. A remoção sistemática de
moradores de favelas e comuni-
dades informais no Rio de Janei- O MACHISMO INSTITUCIONAL DO
ro, devido à preparação da cidade URBANISMO OLÍMPICO
para sediar os megaeventos es-
portivos é outro fator relevante.
As remoções promovidas pela
As demandas para ampliar o
Prefeitura nesse período totali-
acesso das mulheres à cidade
zam 20.299 famílias.2
são dissimuladas pelo direcio-
A remoção implica na descone- namento da questão de gênero
xão com as antigas localidades e para o domínio do privado, ou
na ruptura dos laços de solida- para questões simplificadas e in-
riedade que possibilitavam o tra- dividualizadas. A complexidade
balho feminino diante da inefici- que envolve a definição das dire-
ência e escassez de instituições trizes de uma política pública se
públicas dedicadas ao cuidado relaciona com os múltiplos ob-
e ensino infantil. A insuficiência jetivos e interesses pretendidos.
dos serviços públicos dificulta o Assim, o caráter mercadológico
atendimento médico cotidiano assumido pelo PMCMV limita
e a manutenção das crianças na seu potencial de prover o “di-
escola, que são condicionantes reito à cidade 4 ”. Para além disso,
para o recebimento do Progra- um dado foi completamente in- “Nesse
ma Bolsa Família. Além disso, a visibilizado e desconsiderado na
localização periférica posiciona definição da lógica de localização sentido, visto a
as mulheres em localidades onde da política de habitação social: a complexidade
as oportunidades de trabalho são violência contra a mulher. A Pre- que envolve as
mais escassas e precarizadas, feitura do Rio de Janeiro por meio
reforçando a posição da mulher do Decreto nº 36.960/2013 defi- desigualdades, qual
enquanto exército industrial de niu a localização e as condições seria o paradigma
reserva. A mobilidade focada ex- adequadas para implantação dos
clusivamente no transporte pen-
de efetivação do
empreendimentos. A Área de Pla-
dular casa-trabalho dificulta o
5
nejamento 5 (AP5), localizada no direito à cidade
deslocamento no entorno da re- extremo oeste da cidade, foi con- para as mulheres?”
sidência. O medo das ruas pode vencionada como prioritária para
implicar na reclusão ao ambiente a implantação de conjuntos habi-
privado e não geração de renda tacionais. Nesse contexto, dos 96
autônoma. A violência contra a conjuntos habitacionais do PM-
mulher, portanto tem relação di- CMV,6 49% foram construídos na
reta com todas as estruturas de AP5, destes 53% são destinados à
poder existentes, sendo mais um habitação social. 113
CONJUNTOS DO PMCMV POR ÁREA DE PLANEJAMENTO E FAIXA DE RENDA
Área de 6 – 10
Zona 0 – 3 SM 3 – 6 SM
Planejamento SM
6º 1 990 3,28%
TOTAL 37 30211
116
As ocorrências de estupro regis- O centro da cidade, por seu pa-
tradas demonstram um padrão drão de uso e ocupação diferen-
territorial diferenciado nas ca- ciado, é a região onde mais foram
racterísticas dos crimes. A aná- notificados casos de estupro em
lise da cor das vítimas evidencia locais públicos. Na Zona Oeste,
o padrão de periferização racista por outro lado, a ocorrência de
da produção do espaço capita- estupros em transporte público
lista e patriarcal, pois enquanto representa 43,1% dos casos da ci-
na Zona Sul 39% das vítimas de dade, sendo que 42% dos crimes
estupro são mulheres negras ou ocorreram dentro de vans do
pardas, esse percentual atinge transporte alternativo. É impor-
57% na Zona Oeste. A segrega- tante lembrar que a circulação de
ção territorial também determi- vans foi proibida na Zona Sul pela
na especificidades em relação Prefeitura, ainda na gestão de
ao local do crime. Na Zona Oeste Eduardo Paes, após a repercussão
da cidade, o estupro é um crime do caso de uma turista americana
majoritariamente domiciliar, re- brutalmente estuprada dentro de
presentando 72% dos casos, en- uma van em 2013. No restante da
quanto no Centro, a ocorrência cidade as vans continuaram a cir-
desse tipo de crime em espaços cular apenas com a restrição ao
públicos representa a maioria dos uso de película nos vidros.17
casos cuja notificação informa o Mas na mesma Zona Oeste que
local de ocorrência. O sombrio apresenta graves índices de vio-
padrão de vitimização do estu- lência contra a mulher, re-exis-
pro que atinge mais crianças e tem coletivas feminista potentes.
adolescentes se verifica na Zona Mulheres que sustentam seu per-
Oeste, representando 58% dos tencimento na luta, que produ-
casos, enquanto na Zona Sul e zem cidade e sentidos. Mas ou-
principalmente no Centro, esse tra cidade com outros sentidos,
padrão não se evidencia. Por fim, regida por outra ética, fundada
o padrão da autoria dos crimes na soberania alimentar, na eco-
também é diferenciado. Na Zona nomia feminista comunitária, na
Oeste em 37,3% dos casos havia luta pela moradia popular e na
relação íntima ou familiar entre valorização de práticas e sabe-
a vítima e o autor do crime, en- res ancestrais.18 O sujeito coletivo
quanto no Centro, apenas em “mulheres” e suas estratégias que
20,5% esse tipo de relação foi re- estabeleceram uma nova ética
latada. política baseada no cuidado e nas
“Mas na mesma
CARACTERÍSTICA DOS ESTUPROS POR ZONA
Zona Oeste que
Zona* Cor* Local* Idade*
apresenta graves
Branco Negro Pardo Residên- Local Vul- Ado- Adul-
cia Público nerável les- to índices de violência
cente
contra a mulher,
Oeste 38% 12% 45% 72% 19% 52% 16% 24% re-existem
Norte 43% 13% 39% 66% 24% 50% 15% 30% coletivas feminista
Cen- 49% 13% 34% 42% 45% 31% 10% 53% potentes.”
tro
Sul 57% 11% 28% 55% 32% 37% 12% 44%
Notas: Referências:
Notas:
Referências:
1. “Governo Cabral vibra com vi- BRAGA, Airton; JOFFILY, Tiago. Ain-
tória do Rio para sediar Olim- da a Política Criminal com Derra-
píadas.” Jornal do Brasil, mamento de Sangue (Florianópolis,
02/10/2009. Disponível em: Editora Empório do Direito, 2017).
http://www.jb.com.br/rio/noti- Disponível em: http://emporiodo-
cias/2009/10/02/governo-de- direito.com.br/leitura/ainda-a-po-
cabral-vibra-com-vitoria-do-rio- litica-criminal-com-derramamen-
-para-sediar-olimpiadas/ to-de-sangue-1508246089
2. Importante destacar que os FONTES, Virgínia. O Brasil e o cap-
grandes patrocinadores des- ital-imperialismo: teoria e história.
tes eventos são as expressivas Rio de Janeiro: Fiocruz/Editora
marcas do imperialismo como UFRJ, 2010.
Adidas, Nike, McDonald’s, Sam- HARVEY, David. O novo imperialis-
sung, Coca-Cola, Visa, Samsung, mo. 8ª ed. São Paulo: Editora Loyola.
Hyundai, P &G dentre outros.
JENNINGS, Andrew. “A máfia dos
Jennings (2014) observa como
esportes e o capitalismo global”. In:
exemplo que a empresa esta-
JENINGS, ROLNIK, LASSANCE et
dunidense Coca-Cola tinha sua
al (ORGs). Brasil em jogo: o que fica
imagem vinculada à exploração
da copa e das olimpíadas. São Paulo:
capitalista e acrescentaria à obe-
Boitempo/Carta Maior, 2014.
sidade; com o patrocinadora de
megaeventos esportivos se asso- MARX, Karl. “A chamada acumulação
cia a prática esportiva e ao hero- primitiva” In: O Capital: crítica da
ísmo dos recordistas. Economia Política. Livro 1, volume 2.
7ª ed. São Paulo: DIFEL, 1982
3. As prisões detenções em massa
de manifestantes sem funda- MEPCT - Mecanismo Estadual de
mentação se tornaram práticas Prevenção e Combate à Tortura do
corriqueiras dos atos cujo maior Rio de Janeiro. Megaeventos, re-
símbolo foi a prisão e condena- pressão e privação de liberdade no
Rio de Janeiro. Relatório Temático. 131
Rio de Janeiro: ALERJ, 2014.
_____________________.
Relatório Anual do Mecanismo Es-
tadual De Prevenção E Combate À
Tortura Do Rio De Janeiro. Rio de
Janeiro, 2016. Disponível em https://
drive.google.com/file/d/0ByIg-
DzCTzaAEMUVRSWs5SHZtaUk/
view
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Depar-
tamento Penitenciário Nacional.
Levantamento Nacional de Infor-
mações Penitenciárias – INFOPEN
– junho de 2014. Disponível em
http://www.justica.gov.br/noticias/
mj-divulgara-novo-relatorio-do-in-
fopen-nesta-terca-feira/relato-
rio-depen-versao-web.pdf, acesso
em 01/12/2017.
______. Levantamento Nacional
de Informações Penitenciárias –
INFOPEN. Brasília: DEPEN, 2017.
OLIVEIRA, Pedro Rocha de. Par-
adigmas de política penal e senti-
do econômico da população: das
punições corporais às UPPs. In: Re-
vista Em Pauta. Revista da Faculdade
de Serviço Social da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. 1o Semes-
tre de 2016. N. 37, V. 14, p. 243 – 269
OURIQUES, Nildo. “Acumulação de
capital e futebol na América Latina”.
In: CAPELA & TAVARES (orgs.) Me-
gaeventos esportivos: suas conse-
quências, impactos e legados para
América Latina. Florianópolis: Edito-
ra Insular, 2014.
PRONI, Marcelo. “Megaeventos e
acumulação de capital”. In: CAPE-
LA & TAVARES (orgs.) Megaeven-
tos esportivos: suas consequências,
impactos e legados para América
Latina. Florianópolis: Editora Insular,
2014.
132
Restos da política pública para Luan Carpes Barros
1 Cassal
população LGBT no Rio de Janeiro Doutorando em Psicologia
pela Universidade Federal
Fluminense (Bolsista CAPES),
servidor licenciado da Rede
Municipal de Educação de Ita-
boraí – RJ, militante do movi-
mento LGBT.
Resumo:
Referências:
149
tivado a volta de alguns bordeis
para o Centro da cidade. Todavia,
a crise ainda continua tão forte
que podemos dizer que estamos
testemunhando as piores condi-
ções econômicas do sexo comer-
cializado nas últimas décadas. No
momento presente, parece que
está acontecendo uma concen-
tração do capital envolvido no
mercado do sexo comercial, com
os donos de bordeis mais bem
capitalizados comprando os que
estão fechando. E isto, na última
análise, pode ser o efeito mais
duradouro dos megaeventos do
Rio sob a prostituição na cidade:
um grande número de pequenos
bordeis mais tradicionais, muitas
vezes comandadas por mulheres,
não conseguiram se capitalizar
com os eventos, conforme espe-
rado. Seu lugar está sendo toma-
do, aparentemente, por venues
mais capitalizados, na tradição
dos gentlemen’s clubs dos Estado
Unidos. Enfim, como em tantas
outras áreas econômica cariocas,
os megaventos parecem ter pri-
vilegiado o grande capital ao cus-
to das pequenas empresas e das
empreendedoras individuais.
Em conclusão, queremos fechar
aqui com as imagens que mais
nos impressionaram durante esse
ciclo de megaeventos no Rio: as
portas fechadas de alguns dos
vários dos puteiros do Centro da
cidade na Copa de 2014:
150
Sonhos sujos e The Brazilian Dream Raphael Soifer
Raphael (Raphi) Soifer é per-
of the American Way of Life former, pesquisador e bagun-
ceiro estadunidense radicado,
desde 2010, no Rio de Janeiro,
onde investiga estéticas de
poder e resistência no espaço
urbano. É integrante/colabo-
rador de alguns coletivos de
arte de rua por aí e doutor em
Planejamento Urbano e Regio-
Resumo: nal pelo IPPUR/UFRJ.
Referências:
Resumo:
165
Karyne Cristine Maranhão
de Matos
A Vila Autódromo e a violação dos
Mestre em Urbanismo pelo
Programa de Pós-Graduação
direitos à moradia -
em Urbanismo (PROURB/FAU/
UFRJ) - Dissertação: Transfor- aspectos históricos à época pós
mações urbanas, remoções e
resistências em áreas de fave-
la: a Vila Autódromo e os me-
Olimpíadas
gaeventos no Rio de Janeiro.
Graduada em Arquitetura e
Urbanismo pela Universidade Resumo:
Federal Rural do Rio de Janei-
ro (UFRRJ) - Trabalho Final de
Graduação: Centro de Difusão O presente artigo busca discutir teórica e conceitualmente ques-
Cultural no Complexo de Fave- tões que confrontam as demandas pelo ordenamento territorial
las do Alemão. em face das ações político-administrativas de natureza neoliberal,
que apostam no planejamento estratégico urbano na cidade do
Rio de Janeiro, que tem sido implantado arbitrariamente há mais
de uma década, mas que a partir dos megaeventos esse projeto
urbano se revelou mais agressivo e amplio o espaço da exclusão
social. Durante a Copa do Mundo e, posteriormente, com a rea-
lização dos Jogos Olímpicos Rio-2016, a tônica da administração
pública esteve pautada em reforçar os processos de espetacula-
rização urbana, que assegura e privilegia os interesses do capital
privado em detrimento da gestão democrática. Neste contexto,
um caso exemplar é o da favela Vila Autódromo, que foi direta-
mente afetada pela política de remoções de assentamentos pre-
cários imposta pelo atual governo municipal, que desconsidera,
convenientemente, os fundamentos do direito à cidade.
Em parceria com: