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12615-Texto Do Artigo-18912-1-10-20120506 PDF
12615-Texto Do Artigo-18912-1-10-20120506 PDF
Arnaldo Mont’Alvão
Universidade Federal de Minas Gerais
Luiz Flávio Neubert
Universidade Federal de Juiz de Fora
Márcio Ferreira de Souza
Universidade Federal de Uberlândia
Introdução
próprios meios pelos quais eles se expressam como atores (Giddens, 1989,
p. 2).
1
Giddens se refere, além de outros artigos de Janelle, principalmente a “Spatial reorganisation:
a model and concept”, Annals of the Association of American Geographers, vol.58, 1969.
ESPAÇO E TEMPO NA “TEORIA DA ESTRUTURAÇÃO” 193
Tais trajetórias, por sua vez, podem extrapolar os limites geográficos determinados
pelo pesquisador quando há emigração ou imigração ao longo do período do
tempo determinado para a pesquisa.
Outro aspecto importante que deve ser levado em conta nos estudos com
base no conceito “tempo-geografia” são os períodos de vida naturais e sociais
que influenciam enormemente as trajetórias de vida. A infância e a velhice, que
demandam grande dedicação dos usos do tempo às atividades de cuidados
pessoais, quase sempre realizados com a ajuda de outros, assim como o período
fértil da mulher, são exemplos de ciclos naturais que afetam a vida dos indivíduos
de forma mais ou menos padronizada. Por outro lado, a época de escolha da
profissão, de formação da família, de entrada no mercado de trabalho, ou a
idade para aposentar-se, são exemplos de variáveis intervenientes nas trajetórias
de vida que são determinadas por ciclos sociais ou culturais.
De acordo com Giddens, o conceito “tempo-geografia” propicia: a) atentar
para o caráter rotinizado da vida no dia-a-dia; b) enfatizar as características do
corpo humano e dos meios de mobilidade e comunicação; c) ver o indivíduo
como “projeto biográfico”; d) destacar os limites impostos ao comportamento,
no tempo e no espaço, dadas as características dos corpos e dos contextos físicos
nos quais são desenvolvidos as atividades (como a indivisibilidade do próprio
corpo, a qual limita a percepção e o movimento, o tempo de vida como recurso
escasso, a capacidade humana de realizar um número limitado de atividades ao
mesmo tempo, etc.); e) dar atenção especial aos padrões típicos de movimento,
como as trajetórias circulares realizadas durante o dia e a conseqüente repetição
de atividades; f) levar em conta as características dos contextos físicos e a
capacidade de agir dos indivíduos, limitados pelas necessidades de comer e dormir
em intervalos regulares etc; g) ter em vista o uso da tecnologia na redução do
tempo necessário para percorrer distâncias entre diferentes pontos no espaço
(“convergência de tempo/espaço”); h) construir os cenários de interação levando-
se em conta os outros indivíduos, os objetos externos ao indivíduos e os domínios
de poder; i) o fato de a concepção de ação humana implícita no conceito “tempo-
geografia” possuir o mérito de articular as duas dimensões classicamente separadas
na análise sociológica, qual seja, o “micro” e o “macro”, compreendendo a relação
entre as rotinas pessoais e a organização de sistemas sociais.
independentemente dos cenários sociais em que passa sua vida cotidiana, cenários
esses tidos como dados e desvinculados da ação social (Giddens, 1989, p. 94).
Segundo Giddens, Hägerstrand obteve maior sucesso ao relacionar a teoria social
à temporalidade do que à espacialidade.
Para Urry (1991), o tempo-geografia está baseado numa concepção
defeituosa do indivíduo, já que este enfatiza os constrangimentos em oposição às
possibilidades, o que tem conseqüências para a noção de poder, que acaba sendo
visto simplesmente como um jogo de soma zero. Dirige crítica parecida à teoria
da estruturação, como se a regionalização tempo-espaço fosse dada de antemão,
não havendo variação entre sociedades, o que impede de se perceber que não há
um tempo e um espaço único, mas vários e diferentes tempos e espaços (Urry,
1991, p. 174). A teoria da estruturação não conseguiria assim compreender a
organização variada do tempo no interior de sociedades diferentes, ao passo que
análises substantivas do tempo-geografia efetuam uma tentativa de mostrar como
mudanças na estruturação do tempo afetam a geografia do lugar (Urry, 1991, p.
167).
Segundo Soja (1993), em A Constituição da Sociedade (1989), Giddens reúne
quase tudo numa síntese monumental, que fornece uma ontologia social sistemática
que busca reafirmar o espaço na teoria social crítica. O ponto forte da teoria da
estruturação estaria em não apresentar fórmulas e esquemas simples, nem propor
posturas rigidamente categóricas sobre as vias teóricas a serem seguidas no
tratamento da dimensão espaço-temporal da organização social, sintetizando de
forma elástica a concatenação quase infindável de dualismos associados que se
seguiu à oposição, amiúde demais cristalizada, entre subjetividade e objetividade
(Soja, 1993).
Mas é ideia justamente na permanência do dualismo entre tempo e espaço,
em detrimento da pretensa dualidade proposta por Giddens, que Urry (1991)
percebe um dos principais vazios da teoria da estruturação. Segundo este, apesar
de trazer à tona a centralidade do tempo e do espaço na vida social, uma vez que
apresentam-se como características constitutivas dos sistemas sociais, as
formulações de Giddens não oferecem bases sólidas para se pensar a articulação
entre tempo e espaço e a teoria da estruturação (Urry, 1991, pp. 160-161). Se,
como afirma Soja, a realização de Giddens se estende mais amplamente, através
dos rastros deixados pelos esforços de Edmund Husserl, Martin Heidegger e
Jean-Paul Sartre, para dar “lugar” ao ser (Soja, 1993, p. 178), para Urry (1991) ela
não articula o papel da agência humana na estruturação do tempo e do espaço
que permanecem, assim, como conceitos estruturais. De um lado, é mérito de
Giddens a reunião na teoria da estruturação de pontos importantes na
caracterização de uma ontologia do espaço-tempo da organização social, mas
de outro, segundo Urry (1991), o interesse pela organização espaço-temporal
provavelmente se desenvolveria de qualquer forma, independente de Giddens,
ESPAÇO E TEMPO NA “TEORIA DA ESTRUTURAÇÃO” 197
Considerações Finais
Referências
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pp. 14-25..
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1978, vol. 3.
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______. As consequências da modernidade. São Paulo: Ed. UNESP, 1991.
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PARKES, D; THRIFT, N. Time space and spacing time. London: 1978a, vol. 2.
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KARP, Ivan. Agency and theory: a review of Anthony Giddens. American Ethnologist,
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PIRES, Rui Pena. Árvores conceptuais: uma reconstrução multidimensional dos conceitos
de acção e de estrutura. Sociologia, Problemas e Práticas, n. 53, Jan. 2007, pp. 11-50.
SOJA, Edward. Geografias pós-modernas: a reafirmação do espaço na teoria social crítica.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, c1993.
URRY, John. Time and space in Giddens’s social theory. In BRYANT, C; JARY, D. Giddens
theory of Structuration. Londres e N. York: Routlege, 1991.
Resumo
Este artigo tem por objetivo identificar a importância das dimensões de tempo e espaço na
teoria da estruturação elaborada por Anthony Giddens. Procuramos, além disso, apontar
como Giddens se apropria da noção de “tempo-geografia” cunhada por Hägerstrand e
discutir as críticas de geógrafos e sociólogos a esta apropriação.
Palavras-chave: teoria da estruturação, tempo e espaço, tempo-geografia.
Abstract
This article aims to identify the importance of time and space in Anthony Giddens’ theory
of structuration. We seek to show how Giddens appropriates Hägerstrand’s notion of
“time-geography”, as well as the critique of Giddens’ view on this appropriation by both
geographers and sociologists.
Keywords: theory of structuration, time, space, time-geography.