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SOCIOLOGIA

DA EDUCAÇÃO

Pablo Bes

Ricardo Boklis
Golbspan
As funções da Sociologia
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Definir as principais funções da Sociologia.


„„ Identificar alguns dos principais pensadores da Sociologia e suas ideias.
„„ Reconhecer as metodologias utilizadas nas pesquisas sociológicas.

Introdução
O homem, desde a Antiguidade, preocupou-se em estudar as formas
pelas quais os grupos sociais se organizam e se constituem, atendendo
às mais diversas finalidades, seja para a manutenção de seus territórios,
para combater epidemias, controlar a natalidade, dentre tantas outras
possibilidades. Para que se obtenham análises eficientes, com a utilização
de métodos precisos dentro das Ciências Humanas, surgem as Ciências
Sociais, que se encarregam de tais olhares.

As funções da Sociologia
A Sociologia surge como ciência no século XIX, com o intuito realizar análises
sobre a sociedade em suas inúmeras relações, procurando mapear as causas e
aspectos que contribuíam para a organização social, classificando os fenômenos
e inspirando hipóteses explicativas sobre os objetos pesquisados que, por sua
vez, originam-se na própria sociedade, atendendo ao conceito de fato social
cunhado por Durkheim (1996, p. 12), que afirma:

É fato social toda maneira de agir, fixa ou não, suscetível de exercer so-
bre o indivíduo uma coerção exterior, que é geral na extensão de uma
sociedade dada, apresentando uma existência própria, independente
das manifestações individuais que possa ter.
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Partindo da conceituação dos fatos sociais feita pelo autor, percebemos


que o mesmo pensa a organização da sociedade realizada pelos efeitos de
normalização e padronização sociais estabelecidos nas regras de conduta,
nas ideias e pensamentos que compõem tais fatos. Estes fatos serão sempre
exteriores ao indivíduo, ou seja, não dependem dos aspectos internos destes,
e sim do esforço coletivo e social no estabelecimento destas normas de con-
vivência criadas e impostas desde o nosso nascimento.
Os fatos sociais irão apresentar três características: exterioridade, gene-
ralidade e coercitividade. A generalidade diz respeito ao que comentamos
anteriormente, o caráter coletivo que se faz presente e determina, para todos,
como agir neste grupo social. A exterioridade traduz a condição desse ser
exercido sendo o mesmo estabelecido fora da consciência individual, externo
às questões pessoais intrínsecas ao sujeito. A coercitividade, por fim, remete ao
dever, à obrigação em acatar e seguir as determinações que foram estabelecidas
na sociedade em que vivemos. Lakatos e Marconi (1990, p. 65) comentam que:

A coerção não necessita ser drástica; igualmente são eficazes o riso, a


zombaria, o afastamento dos amigos, quando nosso comportamento
não constitui transgressões às leis, mas às convenções da sociedade.
Exemplo: não se portar corretamente à mesa, vestir-se inadequadamente,
falar de modo impróprio.

Partindo da definição do fato social, tido como o objeto de estudo da Socio-


logia, cabe ao sociólogo a problematização do mesmo, procurando percebê-lo
por diversas maneiras e buscando a sua contextualização mais exata, suas
origens, as causas de seu estabelecimento como regras de conduta, os fatores
que contribuíram para que estes fossem instituídos.
Barros (2008, p. 152) traz o seguinte comentário sobre o que seria a
problematização:

Problematizar é lançar indagações, propor articulações diversas, conectar,


construir, desconstruir, tentar enxergar de uma nova maneira, e uma
série de operações que se fazem incidir sobre o material coletado e os
dados apurados. Problematizar, nas suas formulações mais irredutíveis,
é levantar uma questão sobre algo que se constatou empiricamente ou
sobre uma realidade que se impôs ao pesquisador.

Nossa vida em sociedade apresenta muitas facetas e dimensões diversas


que nem sempre são facilmente observáveis, pois o convívio humano acaba
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disfarçando-as através das inúmeras práticas culturais (com seus símbolos,


valores e normas) dos grupos envolvidos em suas interações. Baseado nestas
questões, Vila Nova (2013, p. 218) comenta que “[...] à Sociologia cumpre
precisamente ir além das aparências físicas da vida social e penetrar nas
camadas mais profundas da sociedade para compreender a “logica” oculta
da sua organização [...]”.
Esta lógica oculta citada pelo autor muitas vezes poderá ser percebida pelo
sociólogo através das problematizações, dos levantamentos e das inserções no
campo social, no qual serão mapeados os detalhes que envolvem as relações
e interações entre as pessoas.
Outra função interessante que pode ser atribuída à Sociologia relaciona-se
com a sua possibilidade de vir a transformar-se em instrumento de interven-
ção social, utilizando-se, para isso, do chamado planejamento social. Porém,
convém observar que:

[...] o planejamento social não é, entretanto, a aplicação apenas da Socio-


logia à intervenção na sociedade, mas, de modo conjugado, das demais
ciências sociais, embora se verifique, sobretudo no Brasil, uma tendência
à supervalorização da Economia na condução dessa atividade (VILA
NOVA, 2013, p. 30).

Dentro da lógica das atribuições do sociólogo que contribuem diretamente


para o planejamento social estão as atividades de avaliação e monitoramento
sobre os projetos públicos que estão sendo colocados em prática pelas esferas
governamentais, por exemplo.

Os pensadores da Sociologia e suas ideias


Quando estudamos a Sociologia a partir de seu contexto histórico, como
viemos fazendo, três grandes autores se destacam, formando uma tríade de
ideias de base para as análises sociológicas posteriores a seu tempo; são eles:
Durkheim, Weber e Marx. Vamos conhecer um pouco as ideias destes três
autores e o modo como entendiam a educação na sociedade.
Émile Durkheim, sociólogo francês nascido em 1858 e que viveu até 1917,
entendia a sociedade como algo que iria sempre prevalecer ao indivíduo. Ou
seja, a sociedade é o conjunto das normas, regras e procedimentos, sentimentos,
ideias e pensamentos que conduzem os indivíduos e que foram construídos
coletivamente, o que vinha a ser a definição de fato social segundo Durkheim.
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Podemos entender mais facilmente esta ideia ao percebermos que a criança,


quando nasce, já se encontra num grupo social, de modo que a sua infância e
a forma como irá crescer e se desenvolver já foram previamente estabelecidas
pelos demais membros adultos desta sociedade.
Podemos visualizar muito bem o conceito de fato social proposto por
Durkheim na educação, uma vez que ela irá se encarregar de ensinar as re-
gras e condutas e educar os membros para viver em sociedade. Podemos nos
questionar, seguindo este viés, sobre o que se aprende na escola. Qual a função
desta instituição em nossas vidas? Durkheim diria que sua principal função
é preparar o indivíduo para a vida em sociedade.
Segundo Tomazi (2000, p. 18), o próprio conceito de instituição, para
Durkheim, leva a estar resposta, uma vez que “para ele, uma instituição é um
conjunto de normas e regras de vida que se consolidam fora dos indivíduos e
que as gerações transmitem umas às outras. Há ainda muitos outros exemplos
de instituições: a Igreja, o Exército, a família, etc.”.
Max Weber, sociólogo alemão nascido em 1864 e falecido em 1920, entendia
que as análises da Sociologia deveriam recair sobre os atores sociais e suas
ações. O principal de suas ideias, em contraposição a Durkheim, é que Weber
não via a sociedade como algo superior e exterior aos indivíduos, e sim como
o resultado de um conjunto de ações recíprocas destes indivíduos. Baseado
nesta ideia, estabeleceu o conceito de ação social.
Nas palavras de Weber (1991, p. 3), a ação social “[...] significa uma ação que,
quanto ao sentido visado pelo agente ou os agentes, se refere ao comportamento
de outros, orientando-se por este em seu curso [...]”. Um exemplo bem simples
e frequentemente adotado na escola que ilustra uma ação social, segundo as
ideias de Weber, seria a fila. Os alunos vão posicionando-se em coluna, um
após o outro, seguindo uma ordem naturalizada de agir socialmente que já
faz parte do sujeito, ou seja, sua subjetividade já internalizou a fila como algo
a ser feito. Esta é a principal diferença entre Weber e Durkheim, pois Weber
entendia que internamente o indivíduo ia significando, dando sentido às coisas
e, assim, ia mudando e condicionando seu comportamento.
Outro conceito muito utilizado por Weber diz respeito à noção de poder,
porém um poder não localizado num lugar específico, como o Estado, por
exemplo, mas que perpassa todos os aspectos sociais e que não se relaciona
somente com a questão econômica. Entendia a sociedade como um sistema
de poder que se manifesta em todas as esferas:

[...] não apenas nas relações entre classes, ou entre governantes e gover-
nados, mas igualmente nas relações da família, na empresa, por exemplo,
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os indivíduos se deparam a todo momento com o fato de que indivíduos


ou conjunto de indivíduos têm maior ou menor possibilidade de impor
a sua vontade a outros. (VILA NOVA, 2013, p. 86).

Podemos depreender do conceito do autor que este sistema de poder também


poderá ser percebido no interior da escola. Poder representado na figura do
professor, dos gestores escolares, dos grupos sociais com suas culturas espe-
cíficas representados por pais e alunos, etc. Assim, o espaço da escola está
sempre em negociação destas relações de poder dos grupos que ali convivem.
Karl Marx, pensador alemão que nasceu em 1818 e viveu até 1883, também
apresentou sua contribuição para os entendimentos das relações entre os
indivíduos e a sociedade empreendidos pela Sociologia.
O que difere radicalmente as ideias de Marx em relação a Durkheim e
Weber é que, para ele, as relações em sociedade não poderiam ser pensadas
separadamente das condições materiais em que essas relações se apoiam. Ou
seja, para viver em sociedade, o homem precisa, num primeiro momento,
valer-se da natureza, transformá-la, erguer suas moradias, fabricar os itens
que farão parte de sua vida cotidiana e que irão garantir sua sobrevivência.
Isto era o que o autor chamava de produção social da própria vida e que irá
embasar seus escritos, procurando explicar a sociedade dividida em classes,
e, posteriormente, sua discussão contrária às ideias do capitalismo.
Segundo as palavras de Marx (1978, p. 129):

O resultado geral a que cheguei e que, uma vez obtido, serviu-me de


fio condutor aos meus estudos pode ser formulado em poucas pala-
vras: na produção social da própria vida, os homens contraem relações
determinadas, necessárias e independentes de sua vontade, relações de
produção estas que correspondem a uma etapa determinada de desen-
volvimento das suas forças produtivas materiais. [...] não é a consciência
dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrário, é o seu ser social
que determina sua consciência.

Por ter este entendimento de como as questões materiais interferem e


condicionam os indivíduos é que Marx irá desenvolver suas análises sobre
as classes sociais existentes, entendendo que os indivíduos agem de acordo
com o que é regulado no interior da classe a que pertencem. Fica nítido em
suas obras o estudo dos embates, sobretudo, entre a classe capitalista e a
trabalhadora. Destas ideias resumidas aqui, irá despontar o materialismo
histórico proposto por Marx e Engels, no qual emerge o caráter revolucionário
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na figura do cientista social como aquele que deveria propor mudanças radicais
na organização social.

Metodologias na pesquisa sociológica


As primeiras pesquisas em Sociologia remontam ao início do século XX, na
chamada Escola de Chicago (Departamento de Antropologia e Sociologia
da Universidade de Chicago). É neste período que irão surgir marcadores
importantes para a pesquisa científica sociológica, estabelecendo os aspectos
também qualitativos como importantes de serem analisados, e não somente os
quantitativos que vinham sempre sendo enfatizados e reforçados pelas Ciências
Exatas como mais confiáveis e como os que levariam com maior exatidão ao
conhecimento da verdade e ao estabelecimento do senso crítico científico.
Este é um aspecto importante a ser destacado: as questões qualitativas
que compõem os indivíduos, que constituem suas subjetividades, que fazem
com que a sociedade também se organize, normalize e estabeleça condutas
de vida devem fazer parte das pesquisas sociológicas para que estas consigam
realizar suas análises com maior eficácia.
Segundo Minayo (1996), as pesquisas qualitativas na Sociologia traba-
lham com significados, motivações, valores e crenças e estes não podem ser
simplesmente reduzidos às questões quantitativas, já que respondem a noções
muito particulares. Entretanto, os dados quantitativos e os qualitativos acabam
se complementando dentro de uma pesquisa.
A escolha do objeto a ser pesquisado pelo sociólogo estará relacionada ao
rol de questões possíveis dentro do grande universo das interações humanas
que ocorrem na sociedade. Sobre este objeto a ser analisado, será aplicada,
num primeiro momento, uma pesquisa bibliográfica minuciosa, seguida, então,
da aplicação dos instrumentos de coleta de dados e das metodologias típicas
da ciência, como os questionários, as entrevistas, observações e pesquisas
de campo.
Segundo Becker (1994), por mais ingênuo ou simples nas suas pretensões,
qualquer estudo objetivo da realidade social, além de ser norteado por um
arcabouço teórico, conforme mencionamos, deverá informar a escolha do
objeto pelo pesquisador e também todos os passos e resultados teóricos e
práticos obtidos com a pesquisa.
Acompanhe o esquema na Figura 1 com os passos mais utilizados numa
pesquisa sociológica:
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1. Definição do 2. Pesquisa 4. Contato com


3. Observação
objeto bibliográfica as pessoas

Qual o fato O que já Etapa em que Etapa em que


social será existe sobre se realiza a podem ser
analisado? o assunto observação utilizadas
na literatura? dos fatos e dos entrevistas,
fenômenos. histórias de
vida e grupos
focais.

Figura 1. Etapas da pesquisa em Sociologia.

As quatro etapas sugeridas pelo esquema anterior são importantes na


condução de um processo sério de pesquisa sociológica e garantem o respaldo
científico dos resultados conquistados com a mesma. Segundo Boni e Qua-
resma (2005, p. 72), “[...] as formas de entrevistas mais utilizadas em Ciências
Sociais são: a entrevista estruturada, semi-estruturada, aberta, entrevistas
com grupos focais, história de vida e também a entrevista projetiva [...]”.
Dependendo do tipo de objeto a ser investigado, do acesso ao público que
se requer e da disponibilidade do pesquisador, um destes tipos específicos
poderá ser escolhido.

Os aspectos éticos relacionados à pesquisa em Sociologia estão descritos em A ética


da investigação em Ciências Sociais (FERREIRA, 2013).

Existem vários tipos de entrevistas. Você conhece todos eles? O artigo Aprendendo a
entrevistar: como fazer entrevistas em Ciências Sociais (BONI; QUARESMA, 2005) descreve
as várias formas de se realizar entrevistas em pesquisas na área da Sociologia.
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O vídeo Os Caminhos das Ciências Sociais reúne depoimen-


tos de professores e alunos de Ciências Sociais sobre o
percurso da Sociologia. Acesse o link ou código a seguir.

https://goo.gl/qTrGGR

BARROS, J. D. As hipóteses nas Ciências Humanas: considerações sobre a natureza, funções


e usos das hipóteses. Sísifo, Lisboa, n. 7, p. 151-162, set./dez. 2008.
BECKER, H. S. Métodos de pesquisa em Ciências Sociais. 3. ed. São Paulo: Hucitec, 1994.
BONI, V.; QUARESMA, S. J. Aprendendo a entrevistar: como fazer entrevistas em ciências
sociais. Em Tese, Florianópolis, v. 2, n. 1, p. 68-80, jan. 2005. Disponível em: <https://
periodicos.ufsc.br/index.php/emtese/article/view/18027>. Acesso em: 03 set. 2017.
DURKHEIM, É. As regras do método sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
FERREIRA, M. F. A ética da investigação em ciências sociais. Revista Brasileira de Ciência
Política, Brasília, n. 11, p. 169-191, maio/ago. 2013. Disponível em: <http://www.scielo.
br/pdf/rbcpol/n11/07.pdf>. Acesso em: 10 set. 2017.
LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. A. Sociologia geral. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1990.
MARX, K. Para a crítica da economia política. In: MARX, K. Manuscritos econômico-
-filosóficos e outros textos escolhidos. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
MINAYO, M. C. S. (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 6. ed. Petrópolis:
Vozes, 1996.
TOMAZI, N. D. Iniciação à sociologia. São Paulo: Atual, 2000.
VILA NOVA, S. Introdução à sociologia. São Paulo: Atlas, 2013.
WEBER, M. Economia e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Brasília:
UnB, 1991.
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Leituras recomendadas
SANTOS, B. S. Um discurso sobre as ciências na transição para uma ciência pós-
-moderna. Estudos Avançados, São Paulo, v. 2, n. 2, p. 46-71, maio/ago. 1988. Disponível
em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0103-40141988000200007&script=sci_art-
text>. Acesso em: 10 set. 2017.
SCHNEIDER, S.; SCHMITT, C. J. O uso do método comparativo nas ciências sociais.
Cadernos de Sociologia, Porto Alegre, v. 9, p. 49-87, 1998. Disponível em: <http://files.
ibijus.webnode.com.br/200000915-4b6864c63f/M%C3%A9todo%20Explicativo%20-
-%20Texto%202.pdf>. Acesso em: 10 set. 2017.
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
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