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Escola Secundária de Pinheiro e Rosa

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS CURSO: Científico-humanísticos

Ciência Política – 12º Ano Ficha de trabalho nº 3

Outubro de 2012 Tema: O significado da dicotomia direita/esquerda.

Subdepartamento Curricular de Filosofia, Psicologia e Sociologia

Tarefa:
A partir da análise do texto, elabore um quadro síntese comparativo com as
características da Direita da Esquerda. Os itens a considerar são os seguintes: 1.
2. 3. 4. Conceção da natureza humana Valores fundamentais Perspetiva do devir
histórico Organização da sociedade

DIREITA E ESQUERDA

DIREITA
1. Noções prévias
«Se o vocábulo direita deriva do latim directa, que significa certa, a terminologia
dicotómica direita/esquerda tem raízes nos alvores das modernas instituições
parlamentares e toma por critério histórico original a localização espacial de
grupos ou tendências nas assembleias legislativas. Na Grã-Bretanha, a partir de
1730, os deputados do partido governamental sentam-se, em Westminster, à direita do
speaker, enquanto os da oposição tomam os seus lugares à esquerda deste; na França,
depois de 1789, os indivíduos ou grupos moderados ou conservadores ocupam a bancada
à direita do presidente da Assembleia, enquanto os mais radicais ou revolucionários
se situam à esquerda. Bastaria a enunciação desta origem «geométrica» para dar
conta da relatividade histórico-espacial destas noções, que, além disso, têm
assumido uma forte carga polémica, pelo que muitos politólogos as acham
«ultrapassadas», equívocas, imprecisas e sempre de desaconselhável e cauteloso
manejo, como todos os conceitos meramente formais. Nestas circunstâncias, uma
resenha histórica da questão parece necessária, como preliminar a qualquer
conceptualização.

2. História
Para Raymond Aron, a França é a pátria do antagonismo direita/esquerda,
identificadas ali, historicamente, a: primeira com os princípios monárquicos,
católicos, tradicionalistas, contra-revolucionários, a segunda com os princípios
republicanos, anticlericais, progressistas, revolucionários. Segundo o mesmo Aron,
os fundamentos ou raízes desta dicotomia (…) filiam-se no carácter violento, de
ruptura institucional, que marca o ciclo histórico-institucional e ideológico
francês a partir de 1789.

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Daqui advém a possibilidade de admissão e extrapolação de tal dicotomia como
compreendendo «tipos de mentalidade", ou «modelos", de conteúdos, estilo e valores
contrapostos (…). A direita, partido da tradição e dos privilégios, contra a
esquerda, partido do futuro e da inteligência» (Aron). Na tradição histórica e
politológica anglosaxónica a terminologia é diversa, centrada na contraposição
inicial tories-whigs, conservadores liberais, ou, para os Founding Fathers
americanos, no maior ou menor valor relativo dos termos dos binómios religião-
razão, ou tradiçãoluzes; ali, a terminologia direita-esquerda é recente e de
importação continental (…). No continente europeu (…) essa dicotomia sofreu a
evolução determinada pelo fluxo das ideias, doutrinas, movimentos e revoluções,
sobretudo a partir de 1848, com o alongamento do leque de alternativas e da
conflitualidade de projectos ideológicos(…) com as áreas mais vastas, sociológica e
eleitoralmente, ocupadas por jacobinos, liberais, nacionalistas, conservadores e
católicos.

3. Algumas características fundamentais da Direita


a) Pessimismo antropológico. A raiz da cosmovisão direitista assenta na recusa da
ideia rousseauniana da bondade natural do homem. Antes tem por ponto de partida,
(…) uma visão augustiniana ou maquiavélica do homem como ser marcado pelo pecado ou
«naturalmente mau; ou seja, em terminologia hobbesiana, o «homem é o lobo do homem»
e «o estado de natureza», anterior à sociedade política, significaria, a ter
existido ou a estabelecer-se, não um paraíso perdido, mas a «luta de todos contra
todos». Esta perspectiva pessimista é, note-se, um ponto de partida, superado e
superável pela participação nos valores ou nos empreendimentos colectivos (…). b)
Anti-utopismo. O pensamento da D. rejeita a «utopia» e põe em questão a
possibilidade de construção teórica e predeterminação de sociedades perfeitas. Há
uma unanimidade no recusar da possibilidade de tais sociedades e no apontar dos
perigos a que conduz o querer realizá-las a qualquer preço, já que tais tentativas
têm conduzido, geralmente, a modelos altamente repressivos e policiais, nos
antípodas as sociedades perfeitas descritas ou pretendidas pelos seus visionários.
Daqui também a rejeição de qualquer forma de linearismo evolutivo e da religião do
progresso, ou seja, da crença na racionalidade imanente do devir histórico, como
algo de valioso em si e por si, geradora da libertação e melhoramento da condição
humana. Para o homem de D. há uma perspectiva da História como ciclo espiral, onde
ordem e caos podem substituir-se ou suceder-se reciprocamente, à mercê de um
conjunto de forças e vontades complexo e irredutível a qualquer princípio unívoco.
c) Direito à diferença. Contra o igualitarismo, a D. proclama o direito natural à
diferença (…). d) Propriedade e antieconomicismo. (…) O pensamento de D. sempre se
afirmou contrário a formas extremas de socialismo. Mas há sobretudo a rejeição do
«economicismo» ou da redução e subordinação dos fenómenos políticos aos económicos;
os grandes agentes da história dos povos são os grandes homens, as forças da
tradição, os choques tecnológicos ou militares e não a luta das classes entendidas
na sua génese a partir do processo da produção. A D (…) sustenta que a iniciativa
individual no campo económico é superior à organização burocrática do mercado (…).
e) Nacionalismo. A consideração da Nação – comunidade histórico-política e unidade
de destino do povo universal – como valor essencial na ordem temporal é também uma
característica comum ao pensamento de D., uma das linhas de justificação da sua
prática política interna e (…) um fundamento da sua política exterior (…). f)
Organicismo. A D. considera o homem e a sociedade interligados por uma teia
orgânica de direitos, deveres, necessidades e ideias, gerados pela história, pelo
costume e pela convivência comunitária. Embora respeite uma «esfera do privado»,
intocável à política – p. ex. a das crenças religiosas –, a D. dá prioridade à
comunidade histórica concreta e às sociedades menores sobre o indivíduo. g)
Elitismo. A D. acentua a perspectiva hierárquica e elitista de qualquer sociedade e
considera a anarquia e o igualitarismo como utopias ou discurso justificativo de
grupos dominantes burocráticos, que governam sociedades desiguais em nome de tais
«fórmulas políticas».

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ESQUERDA
1. Conceito e matriz ideológica
Como conceito formal, de relação e de oposição, a esquerda será, numa primeira
aproximação, a negação e o contrário do que entendemos e significamos por D.,
sendo-lhe aplicável tudo o que de característico se afirmou quer quanto à origem
histórica dos vocábulos quer quanto à sua distinção. (…) A terminologia
direita/esquerda tem um carácter essencialmente moderno e, nesta perspectiva, a
matriz ideológica e intelectual da E. encontra-se na «revolução iluminista»,
extrapolada historicamente para um voluntarismo racionalista que aponta para a
possibilidade e a excelência da utopia. A razão humana, poderosa e sem limites,
impulsionada pela ciência, pela técnica e pelo decurso do próprio tempo histórico,
podia e devia fazer tábua rasa das sociedades tradicionais e construir,
normativamente, sociedades perfeitas, de homens iguais, livres e vocacionados para
a felicidade (…), ou integrar-se nos mecanismos necessaristas que aí conduziam.

3. Algumas características fundamentais da Esquerda


a) Optimismo antropológico. O homem é um ser naturalmente bom, que num «estado de
natureza» inicial desfrutou da felicidade e da paz, mas que se encontra alienado ou
desviado da sua humanidade essencial pelas sociedades históricas e pelos seus laços
de dominação familiar, política e económica. (…) No «estado de natureza» de
Rousseau (ao contrário do de Hobbes) encontramos «o homem livre, com o coração em
paz e o corpo em boa saúde», cuja existência será corrompida pelo aparecimento das
instituições civis, políticas e religiosas que o vão oprimir e alienar. A
reconciliação do homem consigo mesmo vem a traduzir-se numa espécie de utopia
regressiva de volta às origens, suprimindo as cadeias e servidões criadas pelo mito
e pela História, que devem ser reduzidas a tábua rasa para uma nova racionalidade.
(…) b) Utopismo. (…) Localização do bem supremo ou da meta da evolução política
numa sociedade idealmente perfeita e justa, racionalmente construída ou
literariamente imaginada e representada (…). Tal sociedade pode, por vezes, assumir
as funções de mito, isto é, ser apresentada como uma ideia-força dinâmica e
futurista para a qual se devem mobilizar os esforços do presente. (…) Nestes
termos, enquanto projecto intelectual e racionalista de modificação radical de um
determinado sistema social, pode considerar-se o marxismo como «a utopia mais
importante da época contemporânea e a que melhor a caracteriza». c) Racionalismo.
(…) Quando se fala no racionalismo como característica do pensamento de E. tem-se
em vista, especificamente, a ideia de que «a sociedade é composta por indivíduos
que, sendo racionais ou capazes de se tornarem racionais, hão-de impulsionar a
humanidade para novos níveis de civilização» (Robert Bailey); este pensamento faz
parte da tradição iluminista-oitocentista-optimista, à qual, segundo o mesmo autor,
a concepção pessimista responde que «a sociedade é composta de massas que, sendo
não racionais e facilmente influenciáveis, hãode reduzir a humanidade à
mediocridade». (…). d) Linearismo evolutivo. A ideia de «uma evolução social linear
e de um avanço contínuo da civilização do Ocidente para maiores triunfos no
desenvolvimento social e cultural», ou seja, uma concepção prometeica irreversível
do devir histórico, é outra das características do pensamento de E. (…) Tal
concepção, na E., aparece progressivamente ligada a um determinismo de forças
socioeconómicas que subalternizam o papel protagonista que têm os povos, os grandes
homens, as ideias de grandeza e decadência e a vontade e opção humanas, na sua
perspectiva pessimista, que sempre encarou a hipótese de ciclo e de regressão. e)
1gualitarismo. (…) O igualitarismo da E. não respeita à igualdade perante a lei, à
igualdade de oportunidades ou à eliminação de privilégios de casta, reconhecidas
universalmente por direita e esquerda, mas, no ponto de partida, respeita a um
dogma da «natural» igualdade de possibilidades inatas entre os homens e, no ponto
de chegada, ao desejável de uma igualdade político-económica na gestão dos negócios
públicos e na distribuição da riqueza.

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f) Economicismo. A tradição da E. (…) privilegiou os factores de produção,
repartição e consumo de bens e as virtualidades da evolução tecnológica como
conduzindo a uma racionalização e desdramatização progressivas da História. O
saint-simonismo foi a primeira ideologia sistemática «economista», ao proclamar que
o fim do poder político deve ser não o governo das pessoas mas a administração das
coisas (…) O marxismo, quer na sua versão soviética quer na versão do socialismo
evolucionista, acentuou também esta prioridade lógica e histórica dos factores
económicos, na génese das superstruturas políticas e ideológicas (…) g) Socialismo.
Não podemos considerar o socialismo um atributo exclusivo da E., [mas] a ideia de
uma sociedade de tipo comunista integralmente planificada – com o desaparecimento
do mercado e da propriedade privada – é um dos mitos fundacionais da E. marxista e
está hoje em dia associada a todas as formas de E. radical; nos sectores da E.
democrática e pluralista caracteriza-se pela burocratização parcial da economia e
pelo controlo progressivo do mercado através da planificação pública. h)
Internacionalismo. A E., desde a «comunidade de sábios» da Ilustração até às
modernas formas de internacionalismo proletário ou partidário, retomou a ideia de
um mundo sem fronteiras, que teoricamente ainda mantém (…). i) Democratismo. A
crença rousseauniana – possibilidade de determinação do bem e da justiça por uma
vontade geral quantitativamente definida pela maioria transformada em critério de
verdade – é outra característica do pensamento de E.(…). O discurso da E. manteve,
como dogma teórico, a soberania popular, se bem que, nas fórmulas revolucionárias e
ditatoriais de tipo iluminista, caiba à «inteligência» – intelectual, burocrática
ou revolucionária profissional – encarnar e interpretar historicamente, através do
partido, tal vontade e utilizar e instrumentalizar o Estado ao seu serviço. j)
Humanitarismo. (…) considerar a Humanidade como valor primeiro e superior às
colectividades ou comunidades históricas nacionais e concretas, o humanitarismo é
uma característica da E. histórica, utilizado (…) contra os poderes
tradicionalistas e autoritários conservadores.» Jaime Nogueira Pinto in
Enciclopédia Polis, Lisboa: Verbo. (adaptado).

A professora: Sara Raposo.

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