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Curso de Serviço Social

Cristina Ferraz de Andrade

“Família e famílias: um estudo de caso das relações sócio-familiares após a


revelação da homossexualidade da/do filha/o”.

TAGUATINGA – DF
DEZEMBRO 2013
Cristina Ferraz de Andrade

“Família e famílias: um estudo de caso das relações sócio-familiares após a


revelação da homossexualidade do/da filha/a”.

Trabalho apresentado como requisito


parcial de conclusão de curso para
obtenção do grau de Bacharel em Serviço
Social, do Curso de Serviço Social da
Faculdade UNISABER/AD1, sob a
orientação do Professor Marcus Lima.

TAGUATINGA – DF
JULHO 2013
“Época triste a nossa em que é mais
fácil dividir o átomo que quebrar
preconceitos."

(Albert Einstein).
CESSÃO DE DIREITOS

É concedida a Faculdade Unisaber/AD1 permissão para produzir cópias deste trabalho,


emprestar ou vender tais cópias somente para propósitos acadêmicos e científicos. Ao autor se
reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte deste trabalho poderá ser reproduzida sem a
sua prévia autorização por escrito.

CRISTINA FERRAZ DE ANDRADE


Taguatinga (DF), Dezembro de 2013.
BANCA EXAMINADORA

CRISTINA FERRAZ DE ANDRADE


Taguatinga-DF, Dezembro de 2013.

Examinador: Professor
Faculdade Unisaber/AD1

_____________________________________________________

Assinatura

Examinador: Professor
Faculdade Unisaber/AD1

_____________________________________________________

Assinatura

Professor Orientador: MARCUS LIMA


Faculdade Unisaber/AD1

_____________________________________________________

Assinatura
Agradecimentos

Agradeço primeiramente á Deus por ter me dado forças físicas e psicológicas para
prosseguir e alcançar meus objetivos. Ao longo da minha jornada acadêmica onde conheci
pessoas maravilhosas que se tornaram minhas amigas eternas.

Agradeço ao meu esposo Luis Henrique por ter tido em alguns momentos paciência,
durante meus estudos, seminários e até mesmo em meu período de estágio onde tive que me
ausentar de casa em alguns instantes.

Agradeço aos meus pais Floídes Ferraz e Raimundo Valmir que me deram a vida.
Especialmente a minha mãe, uma mulher guerreira e determinada que nos momentos em que
pensei em desistir por um momento ou outro nunca me deixou abater nas adversidades.

Agradeço as minhas grandes amigas Thalita, Nilcimar e Ingrid e demais colegas que
fizeram parte da minha jornada, compartilhando momentos em sala de aula, em momentos
festivos e alegres e em momentos difíceis onde nossa instituição passou por momentos de
grandes transições e dificuldades.

Aos Mestres da faculdade Unisaber/AD1 onde me ensinaram tudo o que hoje sei,
contribuíram substancialmente na minha formação e a um grande amigo que fiz este ano
Marcus Maciel. Gostaria também de agradecer ao meu orientador, professor, Psicólogo
Marcus Lima onde me orientou para tornar esse TCC uma realidade.

Um agradecimento em especial... Ao meu eterno Mestre, amigo Assistente Social


Ricardo Soares por todos os ensinamentos e aprendizados, por ter sido meu supervisor de
estágio onde seus ensinamentos foram essências para o meu dia a dia como profissional a ele
devo boa parte da minha formação onde aprendi a trabalhar com ética, profissionalismo e
respeito, com você mestre aprendi muito! Te admiro lhe serei eternamente grata.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

Sigla Significado

ABC Atinge as cidades de Santo André, São Bernardo, São Caetano em SP

AI 5 Ato Inconstitucional nº 5

AL Alagoas

AM Amazonas

BA Bahia

Ceam Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares

CEDAW Committee on the Elimination of Discrimination against Women

CIM Comissão Interamericana de Mulheres

CNDM Conselho Nacional de Direitos da Mulher

CONTAG Confederação Nacional de Trabalhadores da Agricultura

CS Convergência Socialista

CUT Central Única dos Trabalhadores

DEAM Delegacia Especializada em Atendimento a Mulher

DF Distrito Federal

EAPE Escola de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação

EUA Estados Unidos da América

FPA Fundação Perseu Abramo

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

LGBT Lésbicas,Gays, Bissexuais, Travestis e Transgêneros

MA Maranhão

MG Minas Gerais

Nedig Núcleo de Estudos da Diversidade Sexual e de Gênero

OEA Organização dos Estados Americanos

ONG Organização não governamental

ONU Organização das Nações Unidas

7
Sigla Significado

PAISM Programa de Assistência Integral da Saúde da Mulher

PDT Partido Democrático Trabalhista

PE Pernambuco

PhD Doctor of Philosophy tradução ao pé da letra = Doutor de Filosofia

PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PNAD Pesquisa Nacional de Amostras de Domicilios

PNPM Plano Nacional de Políticas para as Mulheres

PR Paraná

PR Presidência da República

PSOL Partido Socialismo e Liberdade

PT Partido dos Trabalhadores

RGN Rio Grande do Norte

RGS Rio Grande do Sul

RLS Fundação Rosa Luxemburgo Stiftung

RR Roraima

SC Santa Catarina

SDH Secretaria de Direitos Humanos

SE Sergipe

SP São Paulo

STF Superior Tribunal Federal

UnB Universidade de Brasília

USP Universidade de São Paulo

8
LISTA DE FIGURAS

Figura Titulo Página


Figura 1 A Caverna de Lascaux na França, e a Cena do Bisonte e Birdman. 18
Figura 2 Escultura Rupestre intitulada ’Vênus de Willendorf’ 19
Figura 3 ‘Fac-símile’ da Edição da Revista ‘Isto É’ nº 53/1977. 33
Figura 4 ‘Fac-símile’ da primeira e última edição do Jornal “Lampião da Esquina” 34

LISTA DE PLANILHAS

Planilhas Título Página


Planilha 1 Perfil dos indivíduos. 41

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico Título Página


Gráfico 1 Relação entre vítimas e suspeitos, 2011. 44
Gráfico 2 Relações entre vítimas e suspeitos que já se conheciam, 2011. 45
Gráfico 3 Grau de tolerância com filhos gays e filhas lésbicas, 2008. 46

9
Sumário

Introdução .............................................................................................. 11

Capítulo I ................................................................................................ 12

Família na Contemporaneidade ............................................................ 12

1.1. A revolução sexual e seu impacto na vida em família. ................ 12

1.2. As transformações na família brasileira ..................................... 13

1.3. As funções da família pós-moderna ............................................. 16

Capítulo II .............................................................................................. 17

Discutindo Sexualidade .......................................................................... 17

2.1. Os Estudos sobre Sexualidade Humana ...................................... 17

2.2. Pesquisadores e Estudiosos .......................................................... 20

2.3. Os Movimentos Sociais: ............................................................... 25

Capitulo III ............................................................................................. 38

3.Metodologia ......................................................................................... 38

Capitulo IV ............................................................................................. 40

4. A Pesquisa de Campo ......................................................................... 40

4.1 Os Resultados ................................................................................ 41

Capitulo V ............................................................................................... 48

5. Considerações Final ........................................................................... 48

Referências Bibliográficas ..................................................................... 49

10
Introdução

O presente Trabalho de Conclusão de Curso - TCC em Serviço Social tem como


objetivo compreender se há e quais são as alterações nas relações sócio familiares após
a revelação de uma orientação sexual diferente da normativa por parte de uma filha e/ou
de um filho.
Parte-se do pressuposto que por vezes a família restringe o apoio à filha e/ ou ao
filho excluindo-os das dinâmicas familiares por conta do preconceito que há na
sociedade. Tal questão pode ser vista como mecanismo de proteção, mas acaba
discriminando aquele ente que possui uma orientação sexual diferenciada da maioria.
Assim, a proposta de trabalho é compreender quais as funções da família, não de
forma isolada, fatalista, mas contextualizada na sociedade brasileira contemporânea.
Além de intentar analisar se há e qual será o impacto da revelação de uma orientação
sexual homossexual na família brasileira pós-moderna.
Desse modo, pretende-se construir um trabalho qualitativo, com base na
perspectiva crítica dialética, entendo que a análise histórica reflexiva é fundamental ao
se estudar a instituição família. Será eleito o estudo de caso como aporte para este
trabalho.
O capítulo primeiro discorre brevemente sobre as transformações ocorridas na
família brasileira a partir da década de 1960 até a primeira década do século XXI. Serão
abordados os temas referentes à revolução sexual e seu impacto na vida em família, as
transformações na família brasileira e as funções da família pós-moderna.
O segundo capítulo apresenta de forma pontual os Estudos da Sexualidade
humana, elenca os principais pesquisadores e estudiosos, além de trazer uma linha do
tempo simplificada dos Movimentos Sociais da Mulheres e da comunidade LGBTs.
No terceiro capítulo encontraremos a Metodologia do presente estudo e da
pesquisa utilizada.
O quarto capitulo, versa sobre a pesquisa de campo propriamente dita, apresenta
os resultados com o uso de gráficos, comparações e comentários tendo como arcabouço
pesquisas de campo similares.
O derradeiro capitulo, traz as nossas considerações finais a cerca do presente
trabalho.

11
Capítulo I
Família na Contemporaneidade

O objetivo do presente capítulo é: 1) Sinalizar a revolução sexual que modificou


a sociedade e a modifica até o presente; 2) Pontuar as modificações ocorridas no
ambiente familiar, dando destaque à posição da mulher dentro e fora desse ambiente,
bem como 3) Pontuar a construção dos movimentos em prol da liberdade e direitos
sexuais.

1.1. A revolução sexual e seu impacto na vida em família.

A década de 1960 foi um marco de grandes mudanças em diversos aspectos da


vida familiar e social tais como: uso de métodos contraceptivos, o divórcio, a discussão
dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher e o desfraldar de bandeiras prol liberdade
sexual.
Como exemplo disso pode-se destacar que as posições femininas perante o
trabalho a sexualidade e sua participação na sociedade foram colocada em debate,
ganho advindo pela discussão dos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, com a
Conferência do Cairo em 1994.
Destacam-se também mudanças no âmbito da família, principalmente com
relação à concepção e ao casamento, ou seja, difundi-se o uso da pílula, do preservativo
e outros métodos contraceptivos que favoreceram o tardar da gestação, bem como o
direito em decidir sobre a dissolução do matrimonio como o direito ao divorcio
reconhecido de igual valor para homens e mulheres.
Com o fácil acesso aos métodos contraceptivos houve uma diminuição dos
casamentos formais, as mulheres passaram a se vestir de maneira liberal e também a
reivindicarem por igualdade nos salários, de direitos e decisões e aos poucos foram se
desmistificando a noção dos bons costumes e valores assim proclama-se ao direito ao
prazer e a liberdade sexual.
DIAS (2006) observa que diferentemente do modelo em vigor até as primeiras
décadas do século XX, quando as decisões sobre a escolha do cônjuge ainda se pautava
em escolhas por interesses familiares, as uniões foram sendo substituídas pelas escolhas

12
individuais, assim como se deu a redução no número de filhos e demais componentes,
até a constituição da família conjugal moderna.
Com as guerras mundiais as mulheres tiveram que assumir a posição do homem
no mercado de trabalho, pois muitos voltavam sem condições físicas de retornarem ao
trabalho, quando não morriam nas guerras, sendo assim a mulher a provedora do lar.
Para a autora DEL PRIORE (2006) decorrente de toda esta fase de transição
feminina, a família deixa então pra trás o patriarcalismo do século XIX e meados do
século XX, para abrir espaço à individualidade e à liberdade de direitos presentes nos
dias atuais.

1.2. As transformações na família brasileira

Segundo BRUSCHINI (2000), nos primeiros séculos de colonização do Brasil


temos como modelo dominante de organização a família tradicional, patriarcal, extensa,
rural que resultou da adaptação do modelo de família trazido pelos portugueses ao
modelo sócio- econômico em vigor no país.
A Constituição de 1988 adota como fundamento a dignidade humana, que se
irradia aos demais ramos do direito, inclusive ao Direito das Famílias.
É a partir da década de 90 que a família brasileira apresenta mudanças
significativas em todos os seguimentos da população.
Segundo MIOTO (1997), com base na análise da Pesquisa por Amostras de
Domicílios-IBGE (PNAD), a família brasileira dos anos 90 tem uma configuração
marcada pelas seguintes características populacionais:
1 ) Número reduzido de filhos. A família brasileira entra nos anos 90
com uma média de 2,5 filhos em contraposição aos anos 60, cuja
média era de 6,3 filhos. Este dado indica queda acentuada da taxa de
fecundidade das mulheres brasileiras.
2 ) Concentração da vida reprodutiva das mulheres nas idades jovens
(até trinta anos). Demonstra que as mulheres passam menos tempo de
sua vida em função da reprodução e têm mais tempo para se dedicar a
outras atividades (estudos, trabalhos e relação conjugal).

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A família historicamente vem passando por grandes transformações no que
dizem respeito às mudanças estruturais, essas mudanças afetam a dinâmica de
funcionamento da família, as relações entre seus membros, seus papéis sociais,
políticos, econômicos e culturais.
É forçoso para muitos admitirem que as formações familiares já superem as
delimitações legais, sendo uma realidade e uma dinâmica de caráter eminentemente
social, evoluindo a cada dia e a cada nova forma de relacionamento encontrada na
sociedade, sendo imprescindível a difusão dos ideais de respeito e conservação dos mais
diversos tipos de unidades familiares. (MARTINS, P. U. 2009)
A mesma compreensão é apresentada por MASCOTTE (2009):
Já não é mais possível fixar um modelo familiar uniforme, uma vez que a
família passa por uma mutabilidade inexorável, apresentando-se sob tantos e
diversos prismas quantas forem às possibilidades de se relacionar. Ela deixa
de ser compreendida como núcleo econômico e reprodutivo e passa para
uma compreensão sócio-afetiva, com novos padrões e arranjos familiares,
que refletem de forma significativa em vários setores como a arte, ciência,
religião, moralidade, educação, direito, política, vida familiar, etc
(MASCOTTE, L., 2009).

MELLO (2005) afirma que:


... a estrutura familiar pauta-se em relações sociais de poder e hierarquia
entre seus membros homem-mulher-criança. Esta se configura como uma
estrutura moderna de família, como uma “construção econômica, política,
social e cultural demarcada temporal e espacialmente (MELLO, 2005)”.

Atualmente a família deixa de ser uma instituição constituída excepcionalmente


pelo casamento formal, esta agora incorpora diversas formas de sê-la. Há famílias
constituídas fora das relações amorosas e matrimoniais delas hegemônicas. Nasce a
união estável, bem como a “proposta de alargar a família” (UZIEL, 2002).
A saída da mulher de casa para o mercado de trabalho foi um dos fatores que
contribuíram para as mudanças na família, pois segundo as tradições cabia à mulher ser
mãe, cuidadora e educadora dos filhos, e cabia ao homem ser o provedor do lar.
Essas mudanças ocorridas com a família na contemporaneidade tiveram
profundas implicações na configuração familiar originando vários modelos de família.
SZUMANSKI (2002), dentre vários autores que estudavam sobre os grupos
familiares, destaca KASLOW (2001) por citar nove tipos de composição familiar que
podem ser consideradas “famílias”:

14
1) Família nuclear, incluindo duas gerações, com filhos biológicos;
2) Famílias extensas, incluindo três ou quatro gerações;
3) Famílias adotivas, temporárias (Foster);
4) Famílias adotivas, que podem ser bi- raciais ou multiculturais;
5) Casais;
6) Famílias monoparentais, chefiadas por pai ou mãe;
7) Casais homossexuais com ou sem crianças;
8) Famílias reconstituídas depois do divórcio;
9) Várias pessoas vivendo juntas, sem laços legais, mas com forte
compromisso mútuo (SZUMANSKI, 2002).

Assim entendemos que as famílias não são iguais entre si e se estruturam de


maneiras complexas e heterogênicas. Não existe único padrão de organização familiar,
sendo a urbanização e a industrialização, a formação do proletário, a revolução da
mídia, a alteração da condição feminina de vida e de trabalho apontados como fatores
que influenciam a composição de diferentes modelos (ROMANELLI, 1991).
Para MIOTO (1997), as diversidades de arranjos familiares existem hoje na
sociedade brasileira nos leva a definir família como um núcleo de pessoas que
convivem em determinado lugar, durante um lapso de tempo mais ou menos longo e
que se acham unidas (ou não) por laços consanguíneos.
Mesmo com todas essas diversidades podem-se destacar características que as
famílias atuais vêm apresentando em comum como: a diminuição do número de filhos e
de casamentos religiosos, o aumento da participação feminina no mercado de trabalho e
a participação de vários membros da família na economia familiar.
Em 2011, o Supremo Tribunal Federal decidiu a ADI 1 4.277 (julgada em
conjunto com a ADPF2 132) na sessão do STF estendeu a regulamentação da união
estável entre homem e mulher às uniões entre pessoas do mesmo sexo, denominadas de
homoafetivas. A decisão acolheu por fundamento os princípios constitucionais da
igualdade, liberdade e dignidade humana.
O conceito de família está em constante mutação e já foi, inclusive, limitado a
uma formação, de conveniência e baseada em uma sociedade patriarcal e heteroxista.

1
ADI = Ação Direta de Inconstitucionalidade
2
ADPF = Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental
15
1.3. As funções da família pós-moderna

A família se constitui historicamente como a primeira e mais importante


instituição na socialização dos indivíduos e também na construção de relações desiguais
entre seus membros.
Segundo MIOTO (1997), a família tem como tarefa primordial o cuidado e a
proteção de seus membros e se encontra dialeticamente articulada com a estrutura social
na qual está inserida.
Na época industrial os homens, as mulheres e as crianças trabalhavam na casa e
no campo, a família era como uma unidade com função econômica, pois era necessário
para a produção de bens e serviços. Com a revolução industrial ocorrem mudanças na
função econômica: de um lado a unidade doméstica e do outro lado a unidade de
produção, na qual coube à mulher a unidade doméstica (privado) sem remuneração, e ao
homem coube o trabalho de produção (público) ao qual recebe remuneração.
Segundo BRUSCHINI (2000), essa ruptura entre o local de produção e
reprodução trazida pelo capitalismo reduz a função econômica da família à produção de
valores de uso ou de serviços domésticos através do trabalho doméstico já que a
produção de bens propriamente dita passa a ser feita no mercado, nas fábricas e nas
empresas.
A função da família nos dias hoje é a de renda e de consumo, passando a ser
um grupo que compartilha um orçamento com entradas e saídas de
rendimentos e torna-se responsável pela socialização, transmissão de
valores, crenças, costumes e construção social de seus membros, um espaço
indispensável para a garantia de sobrevivência, de desenvolvimento e de
proteção (BRUSCHINI, Cristina, 2000).

Ainda para BRUSCHINI (1990) a família exerce a função socializadora onde e à


responsável por preparar a criança no ingresso à sociedade, transmitindo a herança
social e cultural por intermédio da criação dos filhos. Conforma-se assim, a família
como a instituição que deve propiciar o primeiro contato dos entes com as regras
sociais, inculcar hábitos, produzir e reproduzir padrões culturais, ou seja, ser um agente
socializador.
Na perspectiva de FUKUI (1998) a análise da família deve atentar para três
ângulos complementares: 1) como criadora de condições materiais de vida, 2) como
instituição e 3) como valor de referência.

16
Capítulo II
Discutindo Sexualidade

Neste capitulo serão apresentados e discutidos os estudos que versam sobre a


sexualidade no mundo de forma geral. Conceituaremos a Sexualidade e traremos à tona
a inter-relação com a temática família.
Pontuaremos os Movimentos Sociais das Mulheres bem como o Movimento
LGBT na luta pela liberdade sexual e o respeito às diversidades.
Inúmeros são os autores, filósofos, médicos, psicólogos e psicanalistas que se
dedicaram a pesquisar e deixar algum legado sobre a sexualidade humana. A seguir
apresentaremos, uma ‘linha do tempo’ com o registro dos nomes mais importantes;

2.1. Os Estudos sobre Sexualidade Humana

As curiosidades sobre a sexualidade e os sentimentos que ela desperta sempre


estiveram presentes ao longo da história da humanidade.
Segundo VITIELLO (1998), Na versão bíblica mais antiga que conhecemos; a
tradição javista3 (aproximadamente 950 a.C.):
... não existe nenhum desprezo pela natureza sexual do homem. A leitura do
"Gênesis" permite a interpretação de estar a sexualidade ali exposta apenas
como mais um aspecto da vida, nem inferiorizado nem enaltecido em relação
a qualquer outro (VITIELLO, 1998).

Várias obras de arte da antiguidade, ou mesmo desenhos pré-históricos retratam


o corpo humano com ênfase nos órgão genitais (masculinos principalmente).
Essa afirmação é muito bem ilustrada com a ‘Cena do Bisonte e Birdman’, uma
faceta do que há de mais bem conservado em termos de arte rupestre na Europa. Alguns
autores têm sugerido que esta cena representa o êxtase de um xamã em um ritual
relacionado com a fertilidade (figura humana bisonte-vulva, pênis).

3
“Tradição Javista” (J) – segundo Wellhausen-Graf, “Documento Javista” – assim denominada por
designar a Deus, desde o relato da criação, com o nome “Javé”.
17
Figura 1

A Caverna de Lascaux na França, e a Cena do Bisonte e Birdman.


Fonte: Google Imagens

Os artistas desse período também realizavam trabalho em esculturas. É possível


notar a ausência da figura masculina, tanto nas pinturas quanto nas esculturas. Acredita-
se que presença da representação feminina se dá em razão da crença de que as pequenas
estatuetas femininas seriam amuletos relacionados ao culto à fertilidade, fator decisivo
para a sobrevivência do grupo.
A Venus de Willendorf, hoje também conhecida como Mulher de Willendorf, é
uma estatueta com 11,1 cm de altura representando estilisticamente uma mulher,
descoberta no sítio arqueológico do paleolítico situado perto de Willendorf, na Áustria,
c. de 2500 a 2000 a.C.
Foi desenterrada em 8 de Agosto de 1908, pelo arqueólogo Josef Szombathy.
Está esculpida em calcário oolítico 4, material que não existe na região, e colorido com
ocre vermelho.

Em 1990, após uma revisão da análise estratigráfica deste sítio arqueológico,


estimou-se que tivesse sido esculpida há 22000 ou 24000 anos. Pouco se sabe sobre a
origem, método de criação e significado cultural. A Vênus não pretende ser um retrato
realista, mas uma idealização da figura feminina. A vulva, seios e barriga são
extremamente volumosos, de onde se infere que tenha uma relação forte com o conceito
da fertilidade. Os braços, muito frágeis e quase imperceptíveis, dobram-se sobre os

4
Oólito (do grego: òoion, ovo + lithos, pedra) é a designação dada a grãos arredondados do tamanho de
areia (0,25 a 2,00 mm) formados por precipitação química inorgânica de carbonato de cálcio em águas
agitadas e com pouca deposição de material clástico.
18
seios e não têm uma face visível, sendo a cabeça coberta do que podem ser rolos de
tranças, um tipo de penteado ou mesmo vários olhos.

O apelido com que ficou conhecida causa alguma relutância a alguns estudiosos
atuais, que não conseguem ver nesta figura com características de obesidade a imagem
clássica de uma Vênus. Christopher Witcombe, professor na Sweet Briar College, em
Virgínia, por exemplo: refere que "a identificação irônica destas figuras com Vênus
satisfez de forma prazenteira alguns conceitos correntes, na época, sobre o que era o
homem primitivo, sobre as mulheres e sobre o sentido estético". Outros autores têm
alguma relutância em identificá-la como a deusa Mãe-Terra (Grande Mãe) da cultura
europeia do Paleolítico. Alguns sugerem que a corpulência representa um elevado
estatuto social numa sociedade caçadora-recoletora e que, além da óbvia referência à
fertilidade, a imagem podia ser também um símbolo de segurança, de sucesso e de bem-
estar. (Texto adaptado do Blog/Revista Virtual ‘Tato’, publicado em março de 2012,
disponível em: http://www.maistato.com.br; acessado em 31.out.2013).

Figura 2

Escultura Rupestre intitulada ’Vênus de Willendorf’


Fonte Google Imagens

Referências sobre o estudo do amor e do apetite sexual podem ser encontradas


desde a Idade Antiga, nos escritos do filósofo Platão.

19
2.2. Pesquisadores e Estudiosos

A seguir serão cronologicamente apresentados algumas das personalidades que


possuíam como denominador comum o interesse em decifrar este tão polêmico e
envolvente tema: a sexualidade humana. São pessoas das mais diversas nacionalidades,
formações e profissões, que se destacaram nos estudos e na formulação de teorias que
serviram para quebrar tabus e preconceitos.
Para tanto se aproveitou a citação de alguns estudiosos, filósofos e pesquisadores
que aparecem no artigo Um breve histórico do estudo da sexualidade humana, do
Professor Doutor em Medicina pela USP, Ginecologista Nélson Vitiello; como também
as citações feitas no livro texto do ‘Projeto Vidas Plurais - Enfrentando a Homofobia e
o Sexismo em sala de aula’ que vem sendo desenvolvido pelo Nedig/Ceam/UnB5 na
Escola de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação (EAPE), da Secretaria de
Estado de Educação do Governo do Distrito Federal, desde 2010.
Vejamos:

Platão (428-348 a.C.) Em seu ‘Banquete’ ou ‘Simpósio’, Platão descreve a


Divindade Eros como o Deus do Amor e dos apetites sexuais, Deus do instinto básico
da vida, responsável pela atração entre os corpos. Era a força vital que impulsionava a
vida. Relata também que o pênis já foi idolatrado como o símbolo de fertilidade, de
poder e de liderança pelas mais diversas culturas do globo terrestre e ainda tem vital
importância na atualidade.

Charles Darwin, (1809-1882), naturalista britânico do século XIX, que propôs


uma descendência remota única entre as espécies, colocando-nos na mesma linhagem
dos macacos. Defendeu a seleção natural e a seleção sexual como responsáveis pela
evolução das espécies. A teoria de Darwin de que evolução ocorreu por meio de seleção
natural mudou a forma de pensar em inúmeros campos de estudo da Biologia à
Antropologia. Seu trabalho estabeleceu que a "evolução" havia ocorrido: não
necessariamente por meio das seleções natural e sexual (isto, em particular, só foi

5
Núcleo de Estudos da Diversidade Sexual e de Gênero da Universidade de Brasília.
20
comumente reconhecido após a redescoberta do trabalho de Gregor Mendel no início do
século XX).

Sigmund Freud, (1856-1939), considerado o pai da psicanálise, deixou grandes


contribuições ao estudo da sexualidade humana, descrevendo seu desenvolvimento
desde a infância. Foi o primeiro pesquisador que ousou dizer que as crianças eram
dotadas de sexualidade desde o início da vida, que se automanipulavam em busca de
prazer (prazer inicialmente oral, depois anal e finalmente genital).
O estudo da sexualidade e de seus diferentes aspectos físicos e clínicos passou a
ter relevância a partir de seu trabalho intitulado "Três Ensaios Sobre a Teoria Da
Sexualidade"; publicado em 1905.
A partir de então, uma série de estudiosos, pensadores e cientistas passou a
buscar mais conhecimento a respeito desse complexo fenômeno biopsicossocial, tanto
com referenciais psicanalíticos, quanto comportamentais e biológicos.
Freud referiu-se a esse mesmo deus Eros de Platão como a Libido, força vital de
amor.
Henry Havelock Hellis (1859-1939), conhecido como Havelock Ellis, foi um
médico britânico, escritor e reformador social, que estudou a sexualidade humana. Ele
foi co-autor do primeiro livro de medicina em Inglês sobre a homossexualidade em
1897.
Publicou trabalhos sobre uma variedade de práticas e inclinações sexuais,
incluindo transgêneros psicologia.
Ellis embasou seus estudos na sua terra natal, a Inglaterra, porém, sofreu censura
e difamação, ainda como um ranço do puritanismo vitoriano, sofreu também coação
legal, tendo sido proibido de publicar seus trabalhos.
A ele é creditado a introdução dos conceitos de narcisismo e autoerotismo, mais
tarde adotada pela psicanálise. Atuou como presidente do Instituto de Galton e, como
muitos intelectuais de sua época, apoiava a eugenia.

Alfred Kinsey, (1894-1956), entomologista e zoólogo norte-americano, em


1947, fundou o Instituto de Pesquisa sobre Sexo, hoje chamado de Instituto Kinsey para
Pesquisa sobre Sexo, Gênero e Reprodução, quando era professor titular na
Universidade de Indiana.
21
A publicação em 1948 do ‘Sexual Behavior in the Human Male’
(Comportamento Sexual do Homem) primeiro volume do que seria o famoso ‘Relatório
Kinsey’, deu origem a uma enorme polêmica nos Estados Unidos. O livro foi um dos
mais vendidos naquele ano. Rapidamente, Kinsey se transformou numa celebridade,
considerado até hoje como uma das personalidades mais polêmicas do século XX.
Kinsey foi capa dos principais jornais e revistas do país. O segundo volume,
abordando a sexualidade das mulheres ou ‘Sexual Behavior in the Human Female’, foi
publicado em 1953.
A controvérsia que daí resultou foi inevitável, pois certos dados chocavam a
estrutura clássica da família americana no final da década de 1940/50; a América
acabava de descobrir que, segundo os estudos de Kinsey, 92% dos seus homens e 62%
das suas mulheres se masturbava, e que 37% dos homens e 13% das mulheres já tinham
tido uma relação homossexual que lhes tinha proporcionado um orgasmo.
Neste caso, os fatos foram noticiados pela imprensa sensacionalista como uma
verdadeira bomba.
Os seus relatórios foram vistos por muitos como o início da revolução sexual da
década de 1960.
Ainda hoje, suas obras são consideradas fundamentais para o entendimento da
diversidade sexual humana. Sua história foi retratada em filme de 2004 intitulado:
‘Kinsey - Vamos falar de sexo’.

Simone de Beauvoir (1908-1986), nascida Simone Lucie Ernestine Marie


Bertrand de Beauvoir, foi uma escritora, filósofa existencialista e feminista francesa.
Dentre muitos das suas colocações a mais famosa e que serviu de bandeira para o
movimento feminista está na obra “O segundo Sexo” publicado em 1949; quando foi
categórica: “Não se nasce mulher, torna-se”.

Masters e Johnson (1915-2001/1925-2013), casal de pesquisadores


estadunidenses que esclareceram diversos aspectos da fisiologia da resposta sexual
humana, foram um marco para a compreensão da função sexual.
Através de um grande laboratório humano, descreveram o Ciclo da Resposta
Sexual Humana em quatro diferentes fases, a saber: excitação, platô, orgasmo e

22
resolução. Propuseram uma abordagem terapêutica cognitiva-comportamental para os
Transtornos Sexuais.

Michel Foucault, (1926-1984) Em sua obra História da Sexualidade; uma


trilogia: A vontade de saber (1976), O uso dos prazeres (1984) e O Cuidado de Si
(1984), o conhecido pesquisador francês e importante ativista dos direitos gays, trás o
resultado de uma investigação sobre Sexualidade do ponto de vista histórico. Foucault
pesquisou como a sexualidade se transformou em um elemento tão importante nas
sociedades ocidentais, a ponto de ser utilizada, inclusive, para saber (e determinar) a
verdade sobre as pessoas. Desconfiando de sua naturalização e investigando nossa
compreensão sobre ela, Foucault nos conta que nosso entendimento sobre a sexualidade
surge num contexto histórico específico. Isso pode soar estranho, já que é comum
acreditar que não apenas o sexo é um dado biológico, mas que a sua função ou
finalidade é também já determinada naturalmente: a sexualidade muitas vezes é
entendida como o lado animal do ser humano aflorando.
É comum acreditar que natural e histórico se opõem (ou natural e cultural), a
natureza sendo necessidade e imutabilidade, e a história (ou cultura) sendo liberdade,
possibilidade. A sexualidade, então, passa de um lado ao outro do binarismo
natural/histórico.
No entanto, Foucault alerta que existem normas sociais estritas para não só
controlar, mas incitar um certo tipo de exercício da sexualidade, em que aprendemos um
jeito específico de sermos seres sexuais em comunidade, através das relações sociais
que nos fazem ser como somos.
É pelo sexo efetivamente, ponto imaginário fixado pelo dispositivo de
sexualidade, que todos [e todas] devem passar para ter acesso a sua própria
inteligibilidade (já que ele é, ao mesmo tempo, o elemento oculto e o
princípio produtor de sentido), à totalidade de seu corpo (pois ele é uma
parte real e ameaçada deste corpo do qual constitui simbolicamente o todo),
à sua identidade (já que ele alia a força de uma pulsão à singularidade de
uma história). (FOUCAULT, 1988, pp. 145-6).

Helen Singer Kaplan (1929-1995) foi uma médica austro-estadunidense,


especializada em sexologia da qual foi uma pioneira.
Seus estudos da sexualidade foram desenvolvidos na Payne Whitney Clinic, e
serviram de base para cursos de pós-graduação médica da saúde mental, tratando em
especial de pacientes com desordens psico-sexuais.
23
A Drª Kaplan foi uma pioneira no campo da terapia sexual e fundadora da
primeira clínica americana para desordens sexuais em uma escola médica. Faleceu aos
66 anos, por câncer, em Manhattan.
Na década de 80 do século passado, uma psicanalista também americana,
acrescentou aos estudos de Masters e Johnson a fase do desejo sexual ao ‘Ciclo da
Resposta Sexual Humana’, estabelecendo uma abordagem terapêutica nova e mais
aprofundada para as disfunções sexuais: tratamentos psicodinâmicos focal e cognitivo-
comportamental combinados.
Propôs a existência de um hipotético centro regulador do desejo sexual,
envolvendo mecanismos neurobiológicos no núcleo hipotalâmico, no sistema límbico e
em outros circuitos neurais, que estaria alterado nos transtornos dessa fase.

Alan Bray (1948-2001) Sua mãe morreu quando ele tinha 12 anos, fato que
afetou profundamente nos seus relacionamentos. Ele frequentou a escola secundária em
Leeds, onde conheceu seu parceiro ao longo da vida; Graham Wilson. Frequentou a
Universidade de Bangor e passou um ano num Seminário Anglicano antes de começar
uma carreira no serviço civil.
Ativista pelos direitos dos homossexuais, ele se envolveu com a Frente de
Libertação Gay na década de 1970 e fez campanha ativamente pelos direitos dos
homossexuais. Seu interesse pela política sexual influenciou a sua obra sobre a história,
que culminou em dois livros: ‘Homossexualidade na Inglaterra da Renascença’, onde
afirma, por exemplo, que identificar um indivíduo na Renascença como homossexual ou
não seria um equívoco.
Não por não haver práticas eróticas entre indivíduos do mesmo sexo, mas
porque não vemos na Renascença o sentido que atribuímos hoje à
homossexualidade, de forma particular, e à sexualidade como um todo, de
forma geral. (BRAY A.,1970)

No tempo descrito e analisado por Alan Bray, a homossexualidade era pensada


em função de atos isolados; é somente a partir do século XIX que ela passa a significar
uma definição estável de uma identidade mesmo que ela nunca tenha realizado nenhum
ato com uma pessoa do mesmo sexo, mas apenas manifeste esse desejo.

24
Judith Butler (1956- ) é uma filósofa pós-estruturalista estadunidense, que
contribuiu para os campos do feminismo, Teoria Queer, filosofia política e ética. Ela é
professora da cátedra Maxine Elliot no Departamento de Retórica e Literatura
Comparada da University of California em Berkeley.
Butler obteve seu Ph.D. em filosofia na Yale University em 1984, e sua
dissertação foi subsequentemente publicada como “Assuntos de desejo: reflexões
hegelianos na França do século XX”. Em fins da década de oitenta, entre diversas
centros de ensino e pesquisa (tais como Centro de Humanidades na Johns Hopkins
University), Butler envolveu-se com os esforços "pós-estruturalistas" da teoria feminista
ocidental ao questionar os "termos pressuposicionais" do feminismo. Mais recentemente
passou a ser mencionada também como estudiosa da Teoria Queer 6.

2.3. Os Movimentos Sociais:

MULHERES

Aqui apresentamos alguns fatos de destaque na luta pela igualdade da mulher em


nosso país o levantamento foi encontrado no Livro: Tempos e Memória: Movimento
Feminista no Brasil de autoria de Lurdes bandeira e Hildete Pereira de Melo, editado e
lançado pela Secretaria de Polititicas para as Mulheres em dezembro de 2010,
realizamos uma garimpagem das datas que mais estavam ligadas com nosso trabalho e
fizemos adaptações textuais as vezes agregando num mesmo ano mais de um
acontecimento para evitar uma cronologia muito extensa.

Em 1822 – A princesa do Brasil e arquiduquesa da Áustria Maria Leopoldina de


Habsburgo-Lorena (1797-1826), esposa de D. Pedro II exerceu pela primeira vez a
regência do Brasil. Durante este período presidiu a sessão do Conselho de Estado, o
qual deliberou pela separação entre os dois reinos. Foi coroada imperatriz do Brasil no
dia 1º de dezembro daquele ano.

6
Teoria Queer, oficialmente queer theory (em inglês), é uma teoria sobre o gênero que afirma que a
orientação sexual e a identidade sexual ou de gênero dos indivíduos são o resultado de uma construção
social e que, portanto, não existem papéis sexuais essencial ou biologicamente inscritos na natureza
humana, antes formas socialmente variáveis de desempenhar um ou vários papéis sexuais.
25
No ano de 1827 – Promulgada a primeira lei sobre a educação das mulheres,
permitindo que estas frequentassem as escolas elementares. Todavia, continuava
proibida a frequência de mulheres em instituições de ensino de níveis mais elevados.
Nísia Floresta em 1832 publica, em Recife/PE, o livro, Direitos das mulheres e
injustiça dos homens – primeiro texto a defender os direitos das mulheres a educação e
ao trabalho.
Em 1879 o governo do Império autoriza as mulheres a frequentarem instituições
de ensino superior.
Em 17 de janeiro de 1885, a compositora e pianista Chiquinha Gonzaga (1847-
1935) estreia como maestrina, ao reger a opereta “A Corte na Roça”, musicada por ela e
Libreto de Palhares Ribeiro.
A primeira mulher a se diplomar médica do Brasil, foi: Rita Lobato Velho Lopes
pela Faculdade de Medicina da Bahia em 1887.
A Princesa Isabel sanciona a lei que aboliu a escravatura no Brasil. 1888
É realizada no Rio de Janeiro em 1917 a Passeata de Mulheres reivindicando o
direito ao sufrágio feminino, organizada pelo Partido Republicano Feminina, neste
mesmo ano o Estado brasileiro admite o ingresso de mulheres no serviço público.
Em 1920 Bertha Lutz participa da Conferência Pan-Americana pelo Direito ao
Voto Feminino em Baltimore nos Estados Unidos.
No dia 25 de novembro de 1927, a professora de Mossoró (RGN) Celina
Guimarães Viana alistou-se como eleitora, foi a primeira eleitora do Brasil.
Em fevereiro de 1932 Getúlio Vargas assina o novo Código Eleitoral e concede
o direito de voto às mulheres, maiores de 18 anos e alfabetizadas em igualdade com os
homens.
Pela primeira vez na história do esporte brasileiro, em 1932, uma mulher; a
nadadora paulista Maria Lenk foi incluída na delegação brasileira dos Jogos Olímpicos
de Los Angeles (EUA).
Em 1933 a médica paulista Carlota Pereira de Queiroz, é eleita a primeira
Deputada Federal do Brasil. Ano em que também foi eleita a trabalhadora negra
Almerinda Gama (1899-1992) como Deputada Classista para a Assembleia Nacional
Constituinte de 1934.
A Assembleia Nacional Constituinte de 1934 assegura o princípio da igualdade
entre os sexos, o direito ao voto feminino e a regulamentação do trabalho das mulheres
26
e a igualdade salarial. Neste mesmo ano temos várias vitórias nas eleições estaduais de
candidaturas femininas: Antonieta de Barros (SC), Lili Lages (AL), Maria do Céu
Pereira Fernandes (RGN), Maria Luisa Bittencourt (BA), Maria Teresa Silveira de
Barros Camargo (SP), Maria Teresa Nogueira de Azevedo (SP), Quintina Diniz de
Oliveira Ribeiro (SE), Rosa Castro (MA), Zuleide Bogeá (MA).
Na Legislatura de 1937, a Deputada Federal Bertha Lutz apresenta o projeto de
Lei “Estatuto da Mulher” que incorporava os benefícios da Constituição Federal de
1934 e acrescentava outros direitos as trabalhadoras nacionais.
No ano de 1956 o governo Juscelino Kubitschek suspendeu as atividades de
várias entidades femininas e feministas, como a Associação Feminina do Distrito
Federal e a Federação das Mulheres do Brasil.
O Presidente João Goulart sanciona a Lei 4.121 de 27 de agosto de 1962,
chamada de Estatuto da Mulher Casada que revogou o dispositivo do Código Civil
vigente desde 1916 que considerava as mulheres casadas incapazes como os menores de
idade. Ao longo de toda a década de 1950 o movimento feminista participou desta luta
com a liderança das advogadas Romy Medeiros Orminda Bastos e do deputado Nelson
Carneiro.
Em 1963, o Brasil promulga a Convenção sobre os Direitos Políticos da Mulher,
adotada pela VII Assembleia Geral das Nações Unidas, depois do Congresso Nacional a
ter aprovado em 1953.
Também em 1963 a Revista Claudia iniciou a publicação da coluna “A arte de
Ser Mulher” da jornalista Carmem da Silva que circulou até 1984. Esta coluna teve
grande repercussão na sociedade brasileira e foi uma fonte reflexão para as mulheres.
Promulgada a Constituição de 1967 que concede as mulheres o direito da
aposentadoria integral ao completarem 30 anos de serviço.
Em 1968 em meio a uma série de manifestações estudantis nos Estados Unidos e
na Europa, inclusive com a queima de sutiãs por um grupo de feministas em Paris,
inicia-se a chamada ‘segunda onda do movimento feminista’, com respingos em
algumas capitais brasileiras.
No ano de 1971 acontece a visita da feminista norte-americana Betty Friedam ao
nosso país, para lançar seu livro A Mística feminina, na ocasião a escritora foi
recepcionada pela feminista brasileira Rose Marie Muraro e suas entrevistas à imprensa
tiveram enorme repercussão no país.
27
Organizado em Porto Alegre (RGS) no dia 20 de novembro de 1971, a primeira
comemoração do Dia Nacional da Consciência Negra.
A Organização das Nações Unidas (ONU) proclama 1975 como o ANO
INTERNACIONAL DA MULHER, e organiza uma conferência na cidade do México;
Bertha Lutz chefiou a delegação brasileira.
A repercussão do Assassinato de Ângela Diniz por Doca Street em Búzios no
Rio de Janeiro em 1976 possibilitou a organização de inúmeras entidades de mulheres
na luta contra a violência.
Em 1977 é aprovada a Lei nº 6.515 de 1977 que permite o direito ao Divórcio no
Brasil, projeto do Senador Nelson Carneiro.
Em janeiro de 1979, Eunice Michilles toma posse como Senadora, é a primeira
mulher a ocupar uma cadeira no Senado Federal, tendo assumido em virtude da morte
do senador João Bosco de Lima (AM).
Neste mesmo ano A ONU aprova a Convenção sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW).
No dia 24 de maio de 1979, a TV Globo estreou o seriado MALU MULHER,
este ficou no ar até 22 de dezembro de 1980. Escrito por Euclydes Marinho e dirigido
por Daniel Filho e estrelado por Regina Duarte, abordando os problemas da condição
feminina com enorme repercussão na sociedade.
Em 1980 a TV Globo estreia o programa diário TV MULHER, todas as manhãs
com Nei Gonçalves, Marília Gabriela e Marta Suplicy. Este fica ao ar de 1980/1986.
No ano de 1981, o governo brasileiro ratifica a Convenção sobre a Eliminação
de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), neste ano também é
condenado Doca Street, o movimento de mulheres mobiliza-se para este julgamento.
O governo Figueiredo, nomeia a primeira mulher a ocupar um cargo ministerial
no Brasil, a professora Esther de Figueiredo Ferraz nomeada ministra da Educação, era
1982.
Neste mesmo ano a TV Globo lançou o seriado QUEM AMA NÃO MATA de
Euclydes Marinho, dirigido por Daniel Filho e Denise Bandeira com Marília Pera,
contundente libelo contra a violência doméstica.
O Ministério da Saúde em 1983 cria o PAISM – Programa de Assistência
Integral à Saúde da Mulher, e acontece o assassinato de Margarida Maria Alves (1943-
1983) primeira mulher presidente do Sindicato Rural de Alagoa Grande na Paraíba.
28
Em 9 de agosto de 1984, O movimento feminista e o PMDB Mulher promove,
em Belo Horizonte um encontro com o governador de Minas Gerais Tancredo Neves,
então indicado como candidato a Presidente da República pelo PMDB para discutir a
criação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher
Criado o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), através do
Projeto de Lei 5.778 de 17 de junho de 1985 enviado ao Congresso Nacional pelo
Presidente José Sarney e aprovado em 29 de agosto do mesmo ano, como Lei 7.353/85.
Criada a primeira Delegacia Especializada de Atendimento às Mulheres Vitimas
de Violência (DEAM), em São Paulo, em 1985.
É realizada em 1985, a II Conferência Mundial sobre a Mulher (ONU), em
Nairóbi, e aqui no Brasil o CNDM lança a Campanha Mulher e Constituinte –
Constituinte para Valer tem que ter Palavra de Mulher.
Em 1987, o CNDM entrega a ‘Carta das Mulheres aos Constituintes’ no dia 8 de
março nas Assembleias Legislativas Estaduais e no dia 26 de março ao Deputado
Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte.
O Presidente Sarney em 1989 nomeia para Ministra do Trabalho a professora
Dorothéa Werneck.
Fernando Collor em março de 1990, nomeia a professora de Economia (USP)
Zélia Maria Cardoso de Mello para o cargo de Ministra da Fazenda de seu governo, foi
a primeira mulher a ocupar esta pasta, e nas eleições em outubro, são eleitas as
primeiras mulheres para o Senado Federal: Junia Marise (PDT/ MG) e Marluce Pinto
(PMDB-RR).
Em 1992 toma posse como suplente no Senado Federal, a professora feminista
Eva Blay; ano em que é lançada pelo movimento feminista e de mulheres a Campanha
16 dias de ativismo pelo fim da violência contra a Mulher, está campanha vem sendo
realizada há 20 anos pelo movimento de mulheres e feminista no país.
A Central Única dos Trabalhadores (CUT) aprova a cota mínima de 30% de
mulheres na direção da central, estávamos em 1993.
O Brasil participa da II Conferência Mundial de Direitos Humanos Viena, em
1993.
Nas eleições de 1994, Benedita da Silva é eleita à primeira Senadora negra do
Brasil e Roseana Sarney é eleita governadora do estado do Maranhão e se torna a

29
primeira mulher a assumir este cargo no país. Sendo reeleita em 1998. Nas eleições de
2010 foi eleita pela terceira vez governadora do Maranhão.
No ano de 1994 acontece a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e
Erradicar a Violência contra as Mulheres, realizada em Belém do Pará/PA, Brasil, OEA
e em 1995 a IV Conferência Mundial das Nações Unidas sobre a Mulher em Pequim
(Beijing) na China.
Em 1996, a escritora Nélida Piñon é eleita para presidência da Academia
Brasileira de Letras, a primeira mulher a exercer este cargo.
O Congresso Nacional aprovou e o Presidente da República sancionou a Lei
950.4/1997 que amplia para 30% as cotas e a institui para todas as eleições
proporcionais.
É presidida pela primeira vez uma sessão do Congresso Nacional pela senadora
negra Benedita da Silva (PT/RJ), na legislatura de 1998,
Em 2000 é organizada a primeira Marcha das Margaridas, em Brasília, pela
CONTAG, CUT e em parceria com várias associações sindicais e feministas. A marcha
relembra o assassinato da líder sindical rural Margarida Alves, símbolo da luta das
mulheres por melhores condições de vida, este evento é realizado todos os anos.
No ano 2000, a juíza Ellen Gracie Northfleet foi indicada para compor o
Supremo Tribunal Federal.
Acontece em 2001 a Conferência contra o Racismo, a Discriminação racial, a
Xenofobia e formas correlatas de Intolerância, em Durban, África do Sul.
Em março de 2002, é criada a Secretaria Especial de Direitos da Mulher e em
2003 é transformada na Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, com status de
Ministério no governo do Presidente Luis Inácio Lula da Silva.
O Governo instituiu o ano de 2004 como o ANO DA MULHER organizando a I
Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, pela Secretaria Especial de
Políticas para as Mulheres da Presidência da República, em Brasília/DF com 1.787
delegadas, vindas de todo o País, via um processo que mobilizou 120 mil pessoas.
Neste mesmo ano a Ministra Nilcéa Freire, Secretária Especial de Políticas para as
Mulheres, tornou-se a primeira mulher brasileira a ser eleita Presidente da Comissão
Interamericana de Mulheres (CIM) da Organização dos Estados Americanos (OEA)
com mandato que durou até 2006.

30
Lançando no dia 08 de março de 2005 o I Plano Nacional de Políticas para as
Mulheres.
Promulgação da Lei No. 11.340/06 de 22 de setembro de 2006, nomeada Lei
Maria da Penha, coibindo a violência doméstica no Brasil, neste ano também, foi criada
a Rede Nacional de Lésbicas e Bissexuais Negras.
Inicia-se o funcionamento da Central de Atendimento à Mulher – LIGUE 180,
da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres/PR, com o objetivo de receber
denúncias/relatos de violência, orientar as mulheres sobre seus direitos, encaminhando-
as para os serviços da Rede de Atendimento à Mulher em Situação de Violência,
quando necessário, era 2006.
Acontece em 2007, a II Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres,
organizada pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da
República, em Brasília/DF, no mês de agosto, com 2.800 delegadas, resultado da
mobilização de quase 200 mil brasileiras que participaram, em todo País, das
Conferências municipais e estaduais.
Em 2007, o Presidente da República Luis Inácio Lula da Silvia lança o Pacto
Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, como parte da Agenda
Social do Governo Federal.
Através do Decreto 6.387 de 05 de março de 2008 o Presidente Lula lança o II
Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM), neste mesmo ano a. Campanha
Nacional pelo Enfrentamento da Violência contra as Mulheres do Campo e da Floresta,
slogan “Mulheres donas da própria vida – Viver sem violência é um direito das
mulheres do campo e da floresta” e a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres
lança a campanha “Homens Unidos pelo Fim da Violência contra as Mulheres”.
No ano de 2009, a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres instituiu o
“Prêmio Boas Práticas na Aplicação, Divulgação ou Implementação da Lei Maria da
Penha”. Este prêmio foi criado para estimular a correta aplicação da legislação de
combate à violência contra as mulheres.
Sancionada pelo Presidente da República a Lei 12.034/2009 de 29 de setembro
de 2009, que amplia a participação política das mulheres, tornando obrigatório o
preenchimento das cotas pelos partidos políticos no processo eleitoral e é entregue pela
Ministra Nilcéa Freire ao Congresso Nacional no dia 3 de dezembro a proposta “Lei da
Igualdade no Trabalho”, feita pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres.
31
Em outubro de 2010, nas eleições presidenciais brasileiras pela primeira vez
uma mulher disputa o segundo turno destas eleições no país, a candidata do Partido dos
Trabalhadores e de uma coligação com mais dez partidos, Dilma Vana Rousseff que se
elege no dia 31 de outubro sendo à primeira mulher eleita para ocupar o cargo de
Presidenta da República Federativa do Brasil.

LGBT

Para trazermos uma rápida cronologia do Movimento Homossexual Brasileiro


usamos como base o livro: Homossexualidade da Opressão à Libertação, de Hiro
Okita, seu texto foi publicado pela primeira vez por volta de 1981, como tese da Facção
Homossexual da Convergência Socialista (CS). O valor deste documento está na
contribuição teórica que traz ao debate, a partir de uma abordagem materialista
histórica, que revela, pelas lentes da História, a relação da opressão com o tipo de
sociedade em que vivemos, e do debate que caracterizaram os primeiros passos do
movimento gay no país - e que foi se perdendo ao longo dos anos 1990 ele oferece um
marco histórico. Novamente adaptamos o texto e algumas datas foram suprimidas ou
ajuntadas.
OKITA (1981) afirma que o movimento homossexual não aconteceu no Brasil
enquanto não aconteceram os movimentos de juventude, que a partir dos anos 1960
viriam a questionar todos os valores da sociedade burguesa, como reflexo dos
movimentos europeu e norte-americano, que pelo próprio caráter de suas contestações
impulsionaram o movimento homossexual em nível mundial.
Desta forma o reflexo desse movimento mundial no Brasil foi à radicalização do
movimento estudantil, que se tornaria ponta de lança no enfrentamento com a ditadura.
O Militante e escritor OKITA (1981) prossegue afirmando:
... que em nível cultural, toda essa mobilização vai se refletir no surgimento
do movimento tropicalista, que traz para o campo das artes, e principalmente
o da música, toda a gama de contestações ao sistema. As palavras de
Caetano Veloso, “É proibido proibir”, não só refletiram todo conteúdo
contestatório do movimento estudantil, violentamente reprimido, como
também apontava uma revolta contra toda rigidez moral da sociedade
brasileira (OKITA, HIRO, 1981).

Todo espaço estava preparado para que surgisse o movimento homossexual no


Brasil. No entanto, todo o aparato repressor desencadeado pelo sistema, como a censura,
32
a lei de imprensa, o AI-5, a proibição de qualquer organização de cunho político, foram
limitando esse espaço até abafa-lo.
A partir de 1975, com a crescente deterioração do já falido milagre, começa a
abrir-se um espaço para aprofundamento dessas discussões e críticas do sistema. O
movimento homossexual, então, vai assumir o espaço que lhe foi roubado pela
repressão no fim dos anos 1960.
O primeiro passo é dado em 1976 por um grupo de homossexuais masculinos,
em São Paulo, que tenta se organizar para discutir sua sexualidade e reagir à repressão
ao homossexual. Esse grupo não conseguiu avançar. Desfazendo-se pouco depois.
No fim de 1977, a vinda de Winston Leyland, editor da revista americana Gay
Sunshine, para coletar no Brasil e na América Latina material literário de autores
homossexuais, desencadeou o processo de movimentação dos homossexuais. Leyland
recebeu mais notoriedade do que se esperava por parte da grande imprensa, e a visita
dele provocou uma série de reuniões de um grupo de escritores, jornalistas e
intelectuais, que resolvem editar o jornal Lampião da Esquina que se propõe a discutir,
além da questão homossexual, também o feminismo, a luta contra o racismo e o
movimento em defesa do índio.

Figura 3 ‘Fac-símile’ da Edição da Revista ‘Isto É’ nº 53/1977.

Fonte: Centro de Documentação da Biblioteca do Senado Federal - Brasília/DF

Nesta época de “meia-abertura” a revista Isto É dedica uma capa e extensa


matéria ao tema do homossexualismo (Figura 3), sendo por isso ameaçada de processo
pela Lei de Imprensa; também o jornalista Celso Cury, do jornal Última Hora, por ter
publicado em sua coluna várias matérias sobre homossexualismo, foi vítima da mesma
Lei.
33
O governo pretendia acabar com toda a imprensa alternativa, por vias indiretas,
ou seja, pela fiscalização e pressão. Dentre as publicações indicadas no relatório do
Centro de Inteligência do Exército, como alvo deste plano de governo, encontrava-se o
jornal Lampião, que segundo o relatório, dispunha-se “a defender as atitudes
homossexuais como atos normais da vida humana”. O governo abriu inquérito contra os
editores do jornal, baseado na Lei de Imprensa, alegando um “atentado à moral e aos
bons costumes”.
Ao mesmo tempo em que o Lampião surgia (Figura 4), começaram a aparecer
grupos homossexuais baseados na experiência vivencial de seus integrantes, como, por
exemplo, o grupo que se autodenominava Núcleo de Ação pelos Direitos do
Homossexual, que através da consciência individual procurava criar uma identidade
enquanto grupo de homossexuais. Além de discussões internas sobre homossexualidade,
o grupo fez uma denúncia do jornal Notícias Populares, órgão reconhecidamente anti-
homossexual dentro da imprensa paulista.

Figura 4 ‘Fac-símile’ da primeira e da última edição do Jornal “Lampião da Esquina”

Fonte: Centro de Documentação Prof. Dr. Luiz Mott - Curitiba/PR

No começo de 1979, com o nome “Somos – Grupo de Afirmação Homossexual”


participava de debates na USP sobre “mostras”, que estimulariam a formação de outros
grupos na Grande São Paulo. O Grupo ‘Somos’ cresce muito neste período, e uma das
primeiras atividades externas foi a formação de um comitê em defesa do jornal
Lampião, quando do processo que este sofria pelos órgãos de segurança.
O ‘Somos’ fez circular um abaixo-assinado nos meios artísticos e intelectuais
pela causa do jornal (o mesmo jornal que três anos depois de sua criação, distante das
34
feministas, do negro, do movimento em defesa do índio e do proletário, colocou-se
contra a mobilização do próprio movimento homossexual, criticando setores e grupos
mais ativos do movimento, acabando por fazê-lo retroceder no seu Ascenso, dividindo
os grupos e boicotando os informes da luta).
O ano de 1979 marcou a participação das mulheres no Grupo ‘Somos’, que
passaram a se organizar dentro do grupo, enfrentando barreiras de machismo entre os
homossexuais masculinos. A discussão surgida em torno da questão do machismo levou
as lésbicas a organizarem-se com uma semi-autonomia dentro do grupo, para poderem
colocar as suas questões específicas. Surge, então, dentro do Somos, o grupo Lésbico-
feminista, que vai desenvolver todo um trabalho com o movimento feminista e que em
maio de 1980 se desligaria da totalidade do grupo.
A primeira participação do Somos em mobilizações, como grupo de
homossexuais, foi no dia 20 de novembro de 1979, na comemoração do dia de Zumbi,
promovida pelo Movimento Negro Unificado, quando portou uma faixa contra a
discriminação racial, assinada: “Somos – Grupo de Afirmação Homossexual”.
Em fins de 1979, há três grupos em São Paulo e começam a surgir grupos no Rio
e em outras cidades.
O Lampião chama, então, estes grupos ao Rio de Janeiro, para organizarem o I
Encontro Brasileiro de Grupos Homossexuais, que seria realizado em São Paulo,
durante a Semana Santa de 1980.
O I Encontro foi fechado aos grupos nos dois primeiros dias, tendo no terceiro
dia uma plenária aberta ao público, com mais de 800 participantes. Na abertura da
plenária, foi lida uma moção de apoio aos metalúrgicos do ABC, em plena greve, tendo
sido muito aplaudida.
A discussão da relação do movimento homossexual com outros setores
oprimidos e explorados ocupou grande parte dos dois dias anteriores, e acabaria por
tumultuar a plenária diversas vezes.
Uma proposta de participação no Primeiro de Maio foi levada à votação,
perdendo por um voto. Foi um divisor de águas dentro do movimento homossexual,
enquanto questionava os rumos que o movimento tomaria.
Logo depois do Encontro a discussão sobre a participação no Primeiro de Maio
polarizou o Grupo ‘Somos’, que não conseguiu chegar a um consenso sobre uma
atuação unitária no Dia do Trabalhador. Formou-se, então, uma comissão de
35
homossexuais pró-Primeiro de Maio para organizar o primeiro contato do movimento
homossexual com os trabalhadores do ABC.
Havia uma certa apreensão em relação à reação dos operários a essa atuação
inédita na história do país, mas quando os cinquenta homossexuais (homens e mulheres)
entraram no Estádio de Vila Euclides, a reação dos cem mil operários ali reunidos foi
das mais inesperadas. Aplaudiram vivamente o grupo que portava duas faixas: “Contra
a intervenção nos sindicatos” e “Contra a discriminação do trabalhador(a)
homossexual”.
Enquanto isso, os membros do Somos que se opuseram à participação no ABC
faziam um piquenique no Zoológico.
A polarização do grupo não se restringiu às discussões sobre o Primeiro de
Maio. Nas reuniões que se seguiram, deu-se início a uma verdadeira “caça as bruxas”,
dirigida a certos ativistas acusados de serem membros da Convergência Socialista, que
teriam se infiltrado no grupo para levar o movimento homossexual a lutas que nada
tinham a ver com a questão homossexual. Os elementos do Somos que sustentavam as
acusações, ao invés de levarem uma discussão interna sobre a questão, retiraram-se do
grupo.
Em fins de maio de 1980, culminando numa sutil campanha moralista na
imprensa, é desencadeada em São Paulo a operação Rondão, encaminhada pelo
delegado Wilson Richetti, que através de prisões arbitrárias impõe o terror ao gueto
homossexual, prendendo travestis, homossexuais, lésbicas, prostitutas e desempregados.
Os grupos, mesmo divididos pelas questões ideológicas, organizaram junto com
o Movimento Negro Unificado e grupos feministas uma série de atividades contra a
onda de repressão policial, culminando com um ato público nas escadas do Teatro
Municipal no dia 13 de junho. Quase quinhentas pessoas se acercaram do autofalante ali
instalado, saindo logo após numa passeata pelas principais ruas do gueto homossexual
masculino.
Gritando palavras de ordem como “Abaixo a repressão, mais amor e mais
tesão”, a passeata foi engrossada no caminho, terminando na boca do lixo com
aproximadamente mil pessoas.
Depois dessa manifestação contra a violência, o Movimento Homossexual
entrou num processo de desaceleração, voltando-se para dentro, repensando suas
posições. Pode-se dizer que ele está entrando definitivamente na sua maturidade.
36
Três anos depois do início do movimento os grupos ainda parecem estar num
processo de perplexidade quanto aos rumos de atuação. Não chegaram a um acordo
sobre o II Encontro Brasileiro de Grupos Homossexuais, que deveria se realizar no Rio,
em abril de 1981; mal conseguiram dar uma resposta à onda de repressão às lésbicas
que ocorreu em São Paulo em novembro de 1980.
Essa inatividade é reflexo, principalmente, das diferenças ideológicas. Mas não
significa, absolutamente, a estagnação. Prova disso foi o Encontro Regional, realizado
na USP em abril de 1981, onde, superando essas diferenças, os grupos paulistas optaram
pela unidade de ação, atuando juntos contra a repressão e a discriminação.
Nesse Encontro Regional, foi tirado um ato comemorativo em 13 de junho,
quando houve a mobilização contra Richetti e a repressão policial. Esta data está sendo
proposta como Dia Nacional da Luta Homossexual.
No Nordeste, realizou-se também um encontro regional para discutir as
atividades em comum entre os vários grupos que surgiram no último ano e meio.
Às vésperas do Primeiro de Maio deste ano, formou-se o grupo de militantes
homossexuais, construindo o PT, Partido dos Trabalhadores, que, além de ter
participado do Dia do Trabalhador no ABC, tem uma proposta de levar a discussão da
homossexualidade à classe trabalhadora, através do Partido dos Trabalhadores.
Esse projeto de trabalho dentro de um partido político, proposto por militantes
de vários grupos homossexuais, poderá abrir um novo espaço de atuação para os
homossexuais, num terreno privilegiado, por tratar-se de um partido de trabalhadores –
único setor social cujos interesses coincidem com a necessidade de transformação
radical da sociedade, caminho da libertação definitiva dos homossexuais.

37
Capitulo III
3.Metodologia

Esta foi uma pesquisa de base qualitativa pautada na teoria social critica que
afirma ser a família uma instituição social hegemônica, porém que apresenta várias
cofigurações e modo de sê-la (BRUSCHINI, 1993). A escolha do método recaiu sobre a
técnica de estudo de caso, e coleta de dados com entrevista semiestruturada e para o
tratamento dos dados/informações utilizou-se a análise do discurso.
Que segundo FOUCAULT (2005) o discurso é um conjunto de enunciados na
medida em que se apoia na mesma formação discursiva. Ele é constituído de um
número limitado de enunciados para os quais podemos definir um conjunto de
condições de existência.
Esta foi uma pesquisa qualitativa. Conforme apregoa GODOY (1995):
Uma vez que a pesquisa qualitativa não procura enumerar e/ou medir os eventos
estudados, nem emprega instrumental estatístico na análise dos dados, envolve a
obtenção de dados descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo
contato direto do pesquisador com a situação estudada, procurando compreender os
fenômenos segundo a perspectiva dos sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em
estudo (GODOY, 1995).
O presente trabalho de pesquisa teve como problemática o reação da família de
uma pessoa homossexual: lésbica, gay, bissexual, travesti ou transexual, após a
declaração da orientação sexual diferenciada e como este núcleo familiar passa a se
comportar com relação ao ator social agora homossexual assumido.
Para embasar a interpretação e melhor analisar os questionários de entrevista
semiestruturada com cinco questões centrais do estudo de campo, foram desenvolvidas
pesquisas bibliográficas, observações e coleta de dados através. A quantidade de
questionários aplicados equivale a dez por cento daqueles aplicados (30) durante o
projeto; quando estávamos estagiando na ONG Elos.
Segundo as autoras, (MARCONI & LAKATOS), temos a seguinte definição
para perguntas abertas:
Perguntas abertas – também chamadas livres ou delimitadas, são as que
permitem ao informante responder livremente, usando linguagem própria, e emitir
opiniões (MARCONI & LAKATOS, 2005).
38
A entrevista é definida por HAGUETTE (1997) como um “processo de interação
social entre duas pessoas na qual uma delas, o entrevistador, tem por objetivo a
obtenção de informações por parte do outro, o entrevistado”.
A abordagem metodológica do tipo qualitativa faz com que o pesquisador reduza
a distância entre a teoria e os dados, entre o contexto e a ação, usando a lógica da
análise fenomenológica; isto é, da compreensão dos fenômenos pela sua descrição e
interpretação. Neste caso, as experiências pessoais vividas pelo pesquisador são
elementos importantes na análise e compreensão dos fenômenos estudados. É uma
pesquisa que enfatiza o processo dos acontecimentos, ou seja, a sequência dos fatos ao
longo do tempo; seu enfoque é mais desestruturado; não há hipóteses fortes no início da
pesquisa. Isso confere à pesquisa bastante flexibilidade e geralmente emprega mais de
uma fonte de dados.

39
Capitulo IV
4. A Pesquisa de Campo

O interesse pelo tema se deu a partir da experiência vivida durante o estágio


supervisionado I e II. Este foi na organização não governamental (ONG) ELOS,
instituição que luta em prol da defesa dos direitos humanos e cidadania de lésbicas,
gays, travestis e transexuais do Distrito Federal e entorno.
No estágio, pode-se perceber, a partir dos relatos dos participantes da ONG, que
há um “cisma”, uma “crise”, um “impacto” quando uma filha ou um filho revela sua
homossexualidade aos familiares, principalmente aos pais.
Concluímos que só com uma pesquisa de campo poderia definir com precisão
qual seria esta transformação nas relações sócio-familiares.
Para investigar e compreender se há e quais são as alterações nas relações sócio
familiares após a revelação da homossexualidade por uma/um filha/o, pensava-se em
realizar entrevistas com pais e mães de homossexuais que se assumiram recentemente;
ou no jargão da moda ‘saíram do armário’.
Contudo, do decorrer dos contatos para aplicar os questionários deparamos com
um cenário onde as/os possíveis entrevistadas/os por se encontrarem emocionalmente
abaladas/os ou para evitar o enfrentamento do ocorrido se escusaram das entrevistas.
Partimos então para a alternativa de entrevistarmos um parente próximo: uma tia/o,
cunhada/o, irmã/ão.
As entrevistas foram realizadas entre a primeira quinzena do mês de setembro e
a ultima semana do mês de outubro do corrente ano; foram aplicados três
questionários/entrevista; sendo dois junto a uma tia e uma cunhada de homossexuais
masculinos e um/uma junto a uma tia de uma lésbica.
No intuito de enriquecer o presente trabalho, trouxemos também para corroborar
com os resultados que encontramos; alguns dados do Relatório sobre Violência
Homofóbica no Brasil, divulgado em julho de 2012 e produzido pela Secretaria de
Direitos Humanos da Presidência da República, bem como da pesquisa: Diversidade
Sexual e Homofobia no Brasil Intolerância e respeito às diferenças sexuais 7; realizada

7
Disponível em: http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/direitos-sexuais-e-
reprodutivos/combate-a-homofobia-discriminacao-por-orientacao-
sexual/Pesquisa_LGBT_fev09_FUNDPERSEUABRAMO_1.pdf
40
pela Fundação Perseu Abramo (FPA), em pareceria com a Fundação Rosa Luxemburgo
Stiftung (RLS) em 2008.

4.1 Os Resultados

A criteriosa observação dos dados apurados com os questionários proporcionou


a confecção da Tabela abaixo e das afirmações que se seguem, que nada mais são do
que um resumo pontual de cada item das perguntas respondidas pelas/os
entrevistadas/os.
Segundo dados do IBGE, o Brasil possui, nesta virada do milênio, por volta de
18 milhões de amantes do mesmo sexo população assaz significativa – se compararmos,
por exemplo, com os 400 mil índios existentes no país.

Planilha 1 Perfil dos indivíduos.

INDIVIDUO ENTREVISTA IDADE ETNIA ESCOLARIDADE PROFISSÃO NASCEU EM: MORA EM: RELIGIÃO
A♂ Cunhada 22 B Superior (Cursando) Vendedor Brasília Ceilândia Não Tem
B♀ Tia 22 N Ensino Médio Vendedora Brasília Recanto Católica
C♂ Tia 20 N Ensino Fundamental Não Tem Brasília Ceilândia Não Tem
Fonte: ANDRADE Cristina Ferraz de. Serviço Social, Unisaber/AD1, 2013.

Durante as leituras, chegamos à conclusão que esta não aceitação, expulsão do


lar e outras atitudes realizadas pela família têm um nome: homofobia intrafamiliar.
Dados de outra pesquisa recente, realizada em janeiro do ano passado, no Centro
de Referência do RJ, nos alertavam que 22% dos casos de homofobia acontecem no
âmbito da família, e em sua maioria atingem a adolescentes e jovens.
Partiu-se do pressuposto que, por vezes, a família restringe o apoio aos filhos,
excluindo-o das dinâmicas familiares, por conta do preconceito que há na sociedade,
como mecanismo de proteção, mas acaba discriminando a filha/o.

41
Ou seja, há um processo de segregação e, consequentemente, exclusão
desta/deste das relações sócio-familiares, podendo ser exemplificado nos casos de
expulsão de casa, uma dinâmica corriqueira, principalmente no caso das transvestis e
das/dos transexuais.
Assim, a proposta de trabalho é compreender quais as funções da família, não de
forma isolada, fatalista, mas contextualizada na sociedade brasileira contemporânea.
Além de intentar analisar se há e qual será o impacto da revelação de uma orientação
sexual homossexual na família brasileira pós-moderna.
Seria a revelação de uma sexualidade destoante da heteronormativa a vinculação
necessária para o desfalecimento da instituição ‘família’?
Sabe-se, a partir do senso comum e confirmado pela teoria de gênero (SCOTT,
1995), que antes do nascimento, já está delimitados o futuro e anseios dos filhos.
Mostrando que o gênero é uma construção social instituída antes do nascimento da
criança, ou seja, se menino será macho, viril, vai torcer para tal time, vai ser médico,
engenheiro, etc. Se for menina será doce, meiga, submissa, irá usar rosa, vai ser uma
boa mãe, excelente dona de casa, casará virgem, etc. A homossexualidade de uma/um
filha/a seria o suficiente para o cisma familiar, já que ele rompe com estes
condicionantes sociais?
A pesquisa tem sua valia ao se pensar que na atualidade há uma expansão das
políticas sociais que visam como objetivo a centralidade na família e identificar as
relações sociais que as fortalecem ou fragilizam é um mecanismo para trabalhar a
proteção da família como um meio de atenção integral preventiva. O que falta nas
políticas sociais na contemporaneidade como afirma MIOTO (2008), já que o Estado só
age quando a família sinaliza seu fracasso em proteger seus membros e a si.
Borrillo afirma que a homofobia seja algo familiar e, ainda, consensual, sendo
percebida como um fenômeno banal; e questiona: quantos pais ficam inquietos ao
descobrir a homofobia de um (a) filho (a) adolescente, ao passo que simultaneamente, a
homossexualidade de um (a) filho (a) continua sendo fonte de sofrimento para as
famílias, levando-as, quase sempre a consultar um psicanalista? (BORRILLO, 2010).
Certifica-se com o resultado das diversas pesquisas sobre homossexualidades
produzidas recentemente em nosso país (ABRAMOVAY, BOKANY, JUNQUEIRA
ETC) que violências homofóbicas são cometidas por uma variada gama de atores

42
sociais, em relações interpessoais familiares, domésticas, de trabalho, estudo, lazer e
também entre desconhecidos.
Em nossa entrevista/questionário semiestruturada tínhamos o questionamento
seguinte como primeira pergunta: De que maneira ficou sabendo da orientação
sexual de seu familiar?
O indivíduo A♂ confidenciou a entrevistada sua orientação sexual em
determinado momento, já os indivíduos B♀ e C♂ tiveram sua homossexualidade
presumida pelos gestos que praticavam, ou seja: o estereotipo que se mantém no senso
comum: trejeitos masculinos praticados por uma moça/mulher = lésbica e trejeitos
femininos praticados por um rapaz/homem = gay. No caso da Lésbica as outras ‘tias’ já
comentavam com a entrevistada a sexualidade diferenciada da sobrinha, até que a
própria se declarou a Tia.
No questionamento seguinte a segunda pergunta era: Assumir a
homossexualidade para as pessoas é algo muito difícil, afinal não, é algo que
aprendemos na escola ou em livros, como foi que seu familiar contou essa nova fase
em relação a sua homossexualidade?
A cunhada do indivíduo A♂ contou que este só falou aos familiares quando em
suas palavras “não podia mais esconder sua sexualidade, pois queria viver livremente a
minha ‘escolha’...”, já para o indivíduo B♀ a lésbica, conta a Tia que foi uma revelação
tranquila sem constrangimentos ou preocupação enquanto que a Tia do individuo C♂
afirma que este foi provocado pela família com diversas indagações até que ele
contasse.
Dados referentes ao Relatório sobre Violência Homofóbica no Brasil no ano de
2011, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH) divulgado
em julho de 2012 mostram como importante aspecto na caracterização das violações de
direitos humanos a relação existente entre vítimas e agressores, onde 61,9% eram
conhecidos, enquanto 29,4% eram desconhecidos e 8,7% não informados.

43
Gráfico 1 Relação entre vítimas e suspeitos, 2011.

Fonte: Relatório sobre Violência Homofóbica no Brasil no ano de 2011.


SDH/PR – Brasília Julho-2012

BORRILLO (2010) é taxativo ao afirmar que a homofobia intrafamiliar interfere


historicamente tão fortemente na vida da comunidade LGBT a ponto destes serem
excluídos de forma sistematizada de direitos mais elementares, tais como o referido
agrupamento familiar e o acesso aos direitos sociais.
Resultado que vai ao encontro dos nossos resultados, mesmo que de forma
velada ou momentânea. 100% das entrevistadas quando questionadas sobre a relação
familiar ‘antes’ da revelação da homossexualidade do parente afirmam que era uma
relação normal e cordial (Pergunta 3).
Entretanto, SCHULMAN (2010) afirma que a família está mais propensa a
“tolerar” as/os ditas/os não heterossexuais tradicionais 8, ou seja:
[...] mantê-los em uma posição de menor valor do que aprender com
eles e se inspirar em seu conhecimento. É mais provável ver um
político que tenha um filho abertamente gay se opondo ativamente aos
direitos gays do que vê-lo exaltando aquele filho por ter tido a
sensibilidade pessoal e integridade de se assumir (SHULMAN, 2010).

Para o questionamento sobre o ‘depois’ da revelação, duas pesquisadas afirmam


que houve uma deteriorização temporária na relação o que equivale a aproximadamente
66% do universo, e uma entrevistada, 33% da mostra; categoricamente declara uma

8
O termo “tradicional” foi adicionado ao termo “não heterossexual” para restringir-se aos heterossexuais
que nascem com sexo compatível com o gênero diferentemente das pessoas transexuais, nesse contexto.
44
rejeição e um rompimento total dos pais; inclusive relatando que sua sogra; mãe do
individuo ‘A♂’, pediu para que este saísse de casa e seu (dele) padrasto até hoje NÃO
aceita. Tios e Tias também cortaram relações e pararam de falar com ele (Pergunta 4).
Na analise das relações existentes entre suspeitos e vítimas de violação dos
direitos humanos entre os que se conheciam, do Relatório da SDH/2012, percebe-se que
familiares e vizinhos compões a maioria dos agressores como ilustra o gráfico 2.
E aqui, nossos resultados são coincidentes com os do Relatório sobre Violência
Homofóbica no Brasil no ano de 2011 da SDH/PR já que consta a informação que entre
os familiares, destacam-se as mães que cometem violações contra suas/seus filhas/os,
com 9,5% das ocorrências, seguidas pelos pais, com 4,8% (grifos nossos).

Gráfico 2 Relações entre vítimas e suspeitos que já se conheciam, 2011.

Fonte: Relatório sobre Violência Homofóbica no Brasil no ano de 2011.


SDH/PR – Brasília Julho-2012

O derradeiro questionamento pedia para a parente entrevistada: defina em


poucas palavras como é ser familiar de uma pessoa com orientação homossexual?
A cunhada do indivíduo A♂ conta que a relação dele com ela é saudável,
conversam bastante e ela se preocupa muito com ele, já que a família toda o abandonou.
Vê a homossexualidade dele de forma tranquila se relacionando inclusive com os
namorados e torce para que ele seja feliz!
A Tia da Lésbica, o indivíduo B♀ considera a homossexualidade da sobrinha
uma coisa natural e diz que todos são iguais perante a Lei.
45
Já a Tia do indivíduo C♂ considera bastante ‘estranho’ a homossexualidade do
sobrinho e afirma ter um ‘certo sentimento de anormalidade’.
Em 2008 a Fundação Perseu Abramo (FPA), em pareceria com a Fundação Rosa
Luxemburgo Stiftung (RLS) realizou a pesquisa: Diversidade Sexual e Homofobia no
Brasil Intolerância e respeito às diferenças sexuais; em 150 municípios brasileiros
(pequenos, médios e grandes) distribuídos nas cinco macrorregiões (Sudeste, Nordeste,
Sul, Norte e Centro-Oeste) aplicando 2.014 questionários junto a maiores de 16 anos.
As perguntas 21a e 21b da citada pesquisa se assemelham com o nosso
questionamento “compreender se há e quais são as alterações nas relações sócio
familiares após a revelação da homossexualidade por uma/um filha/o”.

Gráfico 3 Grau de tolerância com filhos gays e filhas lésbicas, 2008.

Fonte: Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil Intolerância e respeito às diferenças sexuais.


Fundação Perseu Abramo (FPA) & Fundação Rosa Luxemburgo Stiftung (RLS)

As perguntas eram as seguintes: P21a: E se um filho seu fosse ou virasse gay,


o/a sr/a. (leia até a interrogação, enumerando as alternativas) e P21b: E se uma

46
filha sua fosse ou virasse lésbica, o/a sr/a. (leia até a interrogação, enumerando as
alternativas mais do que o/a sr/a. sente pelo fato de ter chefe(s)...
Assim, em ambas as interpelações chegam-se praticamente ao mesmo
denominador de descontentamento 72%, de indiferença 13% e de atitude drástica
(expulsava de casa) 7%, as coincidências acontecem também nas outras opções com
exceção do questionamento do filho gay que apresenta um percentual de 5% para a
procura de ajuda médica/tratamento enquanto para a filha lésbica, esse percentual é
mais baixo 4%, concluindo-se que a aversão ao filho/macho se assumir homossexual é
maior.

47
Capitulo V

5. Considerações Final

O presente Trabalho de Conclusão de Curso foi bastante gratificante para a


pesquisadora, pois tive a oportunidade de me sentir realizada no meio acadêmico e
social.
Foi uma experiência uno, quando em contato com pessoas que tive a
oportunidade de colocar em pratica todo o ensinamento da graduação, bem como
praticar aquilo que será meu bê-á-bá doravante, quer seja: o juramento e a ética
profissional de uma Assistente Social
O estudo apresentado nas análises dos gráficos e as consequentes comparações
com a argumentação teórica comprovam em parte as afirmações encontradas na
pesquisa bibliográfica e na pesquisa de campo.
Pressupostos são ideias não expressas de maneira explícita, todavia podem ser
percebidas a partir de certas palavras ou expressões utilizadas. Quanto da utilização de
pressupostos, estes devem ser sempre verdadeiros ou aceitos como verdadeiros, pois
eles que construirão informações explícitas.
Fazemos eco à fala do Deputado Federal Jean Willys (PSOL-RJ) que no
Seminário LGBT-2012 na Câmara Federal em palestra afirmou que a família e alguns
grupos religiosos radicais têm contribuído para discriminar, segregar, desrespeitar,
ocultar potencialidades, e acentuar as dificuldades. “Perversamente excluindo,
enquanto proclamam a inclusão”.
Por fim, se for colocado em prática todas as estratégias que o Governo Federal,
através do Ministério da Educação e a Secretaria dos Direitos Humanos tem divulgado
como Políticas Públicas para as pessoas que compõem a comunidade LGBTs;
acreditamos que num futuro não muito distante, poderemos vivenciar o respeito e a
inclusão dessa parcela da sociedade em toda a extensão da palavra.

48
Referências Bibliográficas

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