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PARA UMA TEORIA ETNOGRÁFICA

DA DISTINÇÃO NATUREZA E CULTURA


NA COSMOLOGIA JURUNA*

Tânia Stolze Lima

Em seu célebre paralelo entre os estudos da his- dos que ela pode assumir segundo as épocas e as
teria e do totemismo, Lévi-Strauss reporta-se a uma si- culturas. Primeiro farei algumas observações bre-
tuação em que o pensamento do cientista contaria ves a respeito dessa distinção na Antropologia, para
mais do que aquele das pessoas estudadas, as quais se depois passar à etnografia juruna.1
tornam, por isso mesmo, “mais diferentes do que são”
(Lévi-Strauss, 1974, p. 5). Essa imagem me vem à men-
Natureza e cultura segundo nós
te quando me encontro diante de certas caracteriza-
mesmos
ções das cosmologias indígenas amazônicas através de
noções como antropocentrismo ou animismo, que Quando consideramos os dois termos como
lembram diretamente a ilusão totêmica, quer dizer, a macroclasses entre as quais todas as coisas podem
idéia de que seria possível deduzir dos materiais etno- sem distribuídas, situamos os humanos em ambas
gráficos a identidade entre animalidade e humanida- as classes e, nesse lance, submetemos a distinção a
de, natureza e cultura. um esquema concêntrico. Quem melhor ilustra
Partindo do fato óbvio de que as definições esse método é, talvez, Lévi-Strauss (1967 e 1976). A
em extensão e em compreensão dos termos nature- natureza compreende (possibilita e em certo senti-
za e cultura são produtos culturais ou históricos, do determina) a cultura; esta é parte e uma certa
argumentarei que a diferença entre os regimes de modalidade de expressão da natureza. Mesmo para
funcionamento dessa distinção é um fato etnográfi- um antropológo que, como Sahlins (1976), recuse o
co mais significativo que a diversidade de conteú- reducionismo abstrato de Lévi-Strauss e sustente
que é a cultura que determina a natureza, parece
impossível escapar de uma leitura concêntrica da
* Este trabalho foi apresentado no GT de Etnologia
Indígena, coordenado por Dominique Gallois e Denise distinção. De resto, encontra-se na obra de Lévi-
Fajardo, XXII Encontro Anual da Anpocs, Caxambu, Strauss não apenas ambas as maneiras de conceber
MG, outubro de 1998. Quero agradecer-lhes e aos a relação mas também uma síntese dos dois mode-
demais participantes do GT por seus comentários, e
também a Stela Abreu, por sua cuidadosa leitura crítica, los, exprimindo a idéia de que a natureza exige ser
e a Aparecida Vilaça. determinada pela cultura.

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É verdade que a distinção também pode ser regra é nada menos do que não acreditar nos
representada por um esquema segmentar, uma vez cientistas e na epistemologia, e romper com a
que pode ser transportada para o campo da cultura, (auto)definição de mundo moderno (Latour, 1994;
gerando a dicotomia entre “sociedade” e “cultura”. Latour e Woolgar, 1997). Em outras palavras, é
Nesse caso, é geralmente a “sociedade” que recebe preciso antes de tudo romper a grande divisória
os valores atribuídos à natureza, enquanto a “cultu- natureza/cultura.
ra” pode vir a ser novamente dicotomizada como Considerando que distinções como Nós e
uma oposição entre “cultura material” e “simbolis- Eles, Modernos e Pré-Modernos, Modernidade e
mo”. Tradição, efetuadas pela cosmologia moderna (da
Esta segmentaridade não deve servir para qual a Antropologia faria parte), derivam da trans-
ocultar o fato de que, em cada um de seus níveis, posição dessa grande divisória para o conjunto da
os termos obedecem a um regime concêntrico. Para humanidade, Latour argumenta que esta operação
Durkheim ou Radcliffe-Brown, por exemplo, a confere um caráter assimétrico à Antropologia.
“cultura” é claramente englobada e determinada Penso que a Antropologia simétrica por ele profes-
pela “sociedade”, enquanto para Sahlins ocorre o sada dependa antes de tudo de uma forma de
inverso. pensar a distinção natureza e cultura segundo um
Exprimindo então uma leitura hierárquica da regime não-concêntrico, e por conseguinte não-
distinção, a Antropologia compartilha com o senso hierárquico. 2
comum a estranha idéia de que a natureza é mais O que aqui merece destaque é o deslocamen-
real que a cultura, que a natureza é objetiva e a to significativo que, com isso, Latour permite intro-
cultura, não. É, aliás, com base nisso que Lévi- duzir na Antropologia: a pluralização da natureza!
Strauss formula o curioso paradoxo da oposição Em um gesto que não deixaria de evocar a figura de
natureza e cultura. Começa observando que sua Boas, poder-se-ia dizer que, após a operação plu-
simplicidade cairia por terra caso ela fosse obra ralista a que foram submetidas as noções de civili-
(como os antropólogos afirmam) do próprio ho- zação e história da humanidade, propõe-se agora
mem, pois então, ele prossegue, “não seria nem um estender a operação à natureza. A conseqüência
dado primitivo, nem um aspecto objetivo da ordem sendo duplamente significativa: (a) a natureza não
do mundo” (Lévi-Strauss, 1967, p. XVII). Ou seja, se é natural mas feita; (b) a cultura não é cultural
a Antropologia estivesse correta ao dizer que os mas... real. Tão real quanto a natureza, qualquer
humanos se afastam a si mesmos da natureza, então que seja o nível em que nos situemos.
a oposição seria estritamente imaginária. A saída A argumentação de Latour é, por outro lado,
desse paradoxo é bem conhecida: Lévi-Strauss conduzida de tal modo que, lida sob a ótica da
afirma a existência de uma continuidade real e de etnografia juruna, pareceria se enredar em um
uma descontinuidade lógica entre natureza e cultu- paradoxo. À força de transformar a distinção em um
ra, e o resultado disso é a utilização da oposição verdadeiro traço identitário dos (autodenomina-
como instrumento de análise. dos) modernos, Latour parece sugerir um retrato
Se um antropólogo como Lévi-Strauss pode dos ameríndios como sociedades que não separari-
não acreditar na oposição natureza e cultura em am natureza e cultura... assim recolocando a mes-
nome de um “naturalismo superior” (Sahlins, 1976), ma divisão Nós e Eles, por ele próprio condenada
também se pode recusá-la em nome de um novo no ponto de partida.
culturalismo, baseado no princípio do “relativismo Seus trabalhos são sem dúvida interessantes
natural” (Latour, 1994). para quem estuda as cosmologias amazônicas, e
Numa atitude que, à primeira vista, destoaria minha impressão é que o que se anuncia hoje é
da retórica antropológica corrente, Bruno Latour uma tendência a afirmar, “com base em Latour”,
sustenta que, se existe uma regra a ser respeitada que essas cosmologias ignoram a distinção nature-
na pesquisa etnográfica da ciência e da cosmologia za e cultura. Tentarei mostrar por que não concordo
das sociedades autodenominadas modernas, essa com essa tendência, e que mais importante do que
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a questão da presença ou ausência dessa distinção humanos propriamente ditos como seus semelhan-
é a questão da diversidade dos regimes por meio tes; as almas dos mortos, por sua vez, se pensam
dos quais ela opera. como vivos.
A hipótese que acompanhará de maneira Cultura denota aqui uma função universal
subjacente a minha análise é a de que a grande definida a um só tempo como pensamento e
divisão consiste em um regime específico de trata- sociabilidade (nem, portanto, um domínio isolado
mento da distinção natureza e cultura que se pode de uma realidade exterior, nem uma função distin-
caracterizar provisoriamente assim: aplicando-se tiva da humanidade em oposição ao animal).3 Esse
de um só golpe a vários níveis de realidade, a fato sugeriria uma visão de mundo profundamente
grande divisão impõe obrigatoriamente a sobrepo- antropocêntrica e corresponderia ao que se con-
sição desses níveis, sobrecodificando, como diriam vencionou chamar animismo. De Tylor a Descola,
Deleuze e Guattari, as distinções geradas em cada está colocada a questão da aplicabilidade da distin-
nível. Em outras palavras, as distinções Natureza e ção natureza e cultura aos sistemas ditos pré-
Cultura, Objetividade e Subjetividade, Verdade e modernos. A questão é se nos convém seguir
Erro, Escrita e Oralidade, Modernos e Pré-Moder- aplicando tais rótulos às cosmologias amazônicas,
nos, Futuro e Passado etc. articulam-se de um e, apesar do argumento de Descola (1992), eu
modo tal que os modernos detêm a natureza, a penso que não.
objetividade, a verdade e o próprio tempo, sobran- Primeiramente, porque a questão da cultura
do para as demais sociedades o resto. não se coloca apenas no nível de generalidade que
É bem diferente o que se passa na cosmologia acabei de apontar. Há um outro, para o qual
juruna. Distinções como Rio e Floresta, Vivos e convém empregar o termo civilização, definido
Mortos, Humanos e Animais, Consangüinidade e pela diversidade de regimes alimentares, instru-
Afinidade, Queixada e Caititu não se sobrepõem: o mentos musicais e artefatos diversos, categorias de
queixada não é um consangüíneo nem os mortos espíritos e regiões do cosmos, senão o próprio
são da floresta. ambiente onde se desenrola a vida dos humanos e
dos animais. Um diferencial entre selvagem e
civilizado introduz-se aqui: certas sociedades hu-
Natureza e cultura segundo os Juruna
manas têm práticas que lembram as do jaguar.
Abordando a questão com um olhar bem É verdade que no primeiro nível os humanos
distanciado, pode-se afirmar que as noções de de que se trata são os Juruna: os porcos e os
natureza e cultura não têm correspondentes na guaribas pensam e agem como se fossem Juruna.
cosmologia juruna. Tal afirmação apóia-se sobretu- Porém, no que toca ao gênero humano, todo grupo
do em duas evidências etnográficas: os humanos social é dotado de seus próprios modos de ação, e
não pertencem à classe dos animais nem destes se sua experiência subjetiva não é a réplica da ação e
distinguem exatamente pela posse de cultura, lin- subjetividade dos Juruna.
guagem ou vida social. Em segundo lugar, o que aprendi a respeito
As três últimas funções estão relacionadas de alma e civilização passava por duas lições muito
primeiramente não com os humanos, mas — como elementares: (a) os animais e as almas dos mortos
dizer? — com os seres vivos que habitam as têm pontos de vista diferentes do nosso a respeito
diferentes regiões do cosmos, dos quais alguns são da realidade, e (b) os Juruna não estão necessaria-
definidos como tendo e outros como sendo alma. mente de acordo com o que eles pensam de si
Para os animais, os espíritos e os humanos, ser próprios e dos Juruna.
dotado de alma significa ter consciência de si e de Acredito, então, que forjar uma caracteriza-
outrem, pensar, ser um sujeito. Quem pensa ou ção geral da cosmologia juruna mediante noções
vive procede como os humanos: os animais têm, como antropocentrismo e animismo é perder o
nesse sentido, consciência de sua própria humani- essencial, porque ali a relação de identidade entre
dade, agem de acordo com isso e consideram os humanidade e animalidade é dada primeiramente
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como condição para se pensar sua diferença (Lima, lhantes enquanto formam um só e mesmo grupo
1996). social; são diferentes também, dado que se unem
Para definir as relações de semelhança e por relações cruzadas de parentesco e por estatutos
diferença (ou identidade e alteridade) os Juruna sociais distintos — respectivamente, capitão-xamã,
empregam um dispositivo conceitual formado pe- guerreiros e tias paternas. Em certo sentido, é
los termos nana e imama. também o que acontece com animais como os
Entre dois gatos, existe semelhança; entre um porcos ou o guariba: pensando sua diferença com
gato e um cachorro, diferença. Entre dois primos os Juruna como um caso de diversidade política,
paralelos existe semelhança; entre dois primos mostram-se inclinados a tomar os Juruna como
cruzados, diferença. Nana serve para distinguir a parceiros.
relação de parentesco classificatória da relação Por outro lado, imama é um epíteto que
plena, enquanto imama serve para distinguir, no significa “selvagem” quando ligado ao jaguar e a
domínio do parentesco como um todo, a consan- um grupo humano desconhecido, os quais se
güinidade e a afinidade plena da relação entre distinguem como “Outro de qualidade jaguar” e
primos cruzados, marcando esta última como uma “Outro de qualidade humana”. Mas, ligado ao
relação de alteridade. Além disso, aplicadas ao nome de uma pessoa conhecida, o epíteto indica
domínio sociológico, as duas noções são graduá- que se tem com ela uma relação de sociabilidade
veis: existe mais semelhança entre dois primos altamente elaborada e ritualizada, marcada como
paralelos de primeiro grau que entre os de segundo uma relação de alegria.4
grau; existe mais alteridade entre não-parentes que Com efeito, são duas as formas que a alterida-
entre primos cruzados. Resumindo: (a) nana ex- de pode assumir: o trato selvagem (matar ou
prime a similaridade entre indivíduos da mesma morrer) e o trato civilizado. O que os Juruna, em
espécie e imama, a alteridade entre indivíduos de uma situação que não ameace sua integridade
espécies diferentes; (b) existe um paralelismo entre física, se disporiam a fazer diante de um “índio
a diversidade dos animais e a diversidade das selvagem” é adotar uma conduta amistosa e civili-
relações sociais. zada, assim como (simetricamente) um xamã, em
Que um só e mesmo dispositivo permita sua vida onírica, agiria diante de um jaguar. Diz-se
pensar conjuntamente os dois tipos de diversidade que quando uma pessoa sonha com jaguar (equiva-
não há de surpreender após a crítica ao totemismo lente a um caçador selvagem na vida onírica do
desenvolvida por Lévi-Strauss. Aliás, a melhor evi- xamã), isso significa, na vida desperta, que a
dência que a etnografia juruna oferece a respeito do pessoa será atacada por índio selvagem.
método totêmico são duas sociedades animais em É importante observar que se enfocarmos a
que as diferenças entre relações de parentesco, relação dita imama de um modo tal que nos
acrescidas de diferenças de estatuto social, ligam tornamos impossibilitados de observar os termos
pessoas que pertencem a espécies distintas. por ela ligados, seremos levados a construir um
Esta homologia entre as diferenças dos ani- artefato etnográfico: a alteridade, e por conseguinte
mais e das relações sociais implica não somente a própria sociabilidade, mostrar-se-á contraditória e
que os humanos possam (devam, segundo a men- paradoxal. Talvez uma cosmologia seja relativa-
sagem de determinados mitos) apreender a alteri- mente análoga a um sistema fonológico, no sentido
dade política entre grupos sociais pelo modelo da de que abrir mão dos termos representa perder a
diversidade animal, como também que animais própria realidade para uma falsa identidade que
possam apreender sua relação com outros, dos não significa mais nada. No caso da cosmologia
quais são relativamente próximos por sua espécie, juruna, é preciso também considerar o estatuto do
como uma relação social de alteridade. É o que sujeito (se humano, se animal desta ou daquela
acontece com a sociedade dos urubus: formada por espécie, se alma desta ou daquela categoria), bem
um urubu-rei, urubus-de-cabeça-vermelha e uru- como o nível de realidade (se na vigília ou no
bus-de-cabeça-amarela, as três espécies são seme- sonho, se neste mundo ou nos mundos celeste,
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subterrâneo ou aquático), para os quais (ou em oposição: humano/não-humano, animal/não-ani-


função dos quais) as relações em jogo ganham mal, espírito/não-espírito; atingiríamos assim um
realidade. nível etnográfico no qual, ao invés de (as esperadas
Em um outro trabalho, eu afirmava que as três mas inexistentes) classes definidas por sua oposi-
categorias básicas de seres vivos do cosmos juruna ção recíproca, teríamos acesso ao regime que
(os humanos, os animais e os espíritos) comunica- vigora no sistema cosmológico como um todo;
vam-se de um modo tal que cada uma podia conter c) a tríade de oposições pode se aplicar a
ou estar contida na outra. É que a humanidade cada ente ou tipo de ser, de modo que, então, cada
também caracteriza seres que designaríamos como ente consiste em “um feixe de oposições”; por
espíritos; a divindade e a animalidade também exemplo, um caititu pode não ser um caititu, não
distinguem certos humanos; dentre os (por nós ser animal, mas espírito;
chamados) espíritos, alguns são concebidos como d) isso significa que, do ponto de vista etno-
vivendo na condição de alma mas outros são tão gráfico, o diferencial entre as espécies animais não
palpáveis quanto nós; além disso, todos os animais deve ser eliminado por seu pertencimento comum
podem se transfigurar em humanos. Parecia-me à classe dos animais;
que enquanto nós pretendemos dar conta da tota- e) a mesma exigência se impõe para a huma-
lidade do universo distinguindo de um golpe as três nidade; exemplificando: esta se divide em Juruna,
ordens do Homem, da Natureza e da Sobrenature- povos da floresta e Brancos; os Juruna são simples-
za, os Juruna procediam de outro modo. Utilizando mente humanos, os segundos apresentam valores
noções análogas, seu pensamento parece proceder ligados ao animal (beber apenas água, comer carne
por partes, inventariando cada caso e distinguindo quase crua) e os últimos, por seu poderio tecnoló-
o que é humano, divino e animal na classe dos gico e viagens espaciais, valores ligados ao xamã
humanos, na classe dos animais e na dos espíritos. divino que criou a humanidade;
Exemplificando, o caititu e o porco são animais, f) como ocorre com o gênero humano, há
mas não o são da mesma forma, pois o porco “gêneros” formados por espécies animais tidas
também é parecido com as almas dos mortos, o que como próximas; por exemplo, o dos macacos, que
indubitavelmente o aproxima dos humanos. O compreende (dentre outras) quatro espécies im-
macaco-prego é um animal, porém o macaco-da- portantes: o macaco-prego e o coatá, que são
noite é um fantasma. Em suma, cada uma das três animais no duplo sentido — são chamados como
categorias que ordenam a visão de mundo compre- tais e são considerados caça —; o macaco-da-noite,
ende seres marcados com valores das outras duas que não é animal mas fantasma; e o guariba, que é
(Lima, 1995, pp. 59-60). um animal no sentido próprio do termo mas so-
Na ocasião, parecia-me que a tripartição natu- mente os antigos Juruna — diz-se — tratavam-no
reza, cultura e sobrenatureza não se aplicava sem como caça (atualmente, as pessoas acham-no “pa-
problemas aos materiais juruna, e, involuntaria- recido com fantasma” e não sentem desejo de
mente, acabei definindo um quadro que exprime comê-lo; narram um mito sobre a vida conjugal dos
mais uma teoria antropológica concêntrica e taxo- guaribas no qual o marido provoca ciúmes na
nômica da relação natureza e cultura do que a esposa ameaçando ir a uma cauinagem dos Juru-
teoria etnográfica que viso aqui. Penso poder agora na);
argumentar que: g) ressalte-se, portanto, que as três oposições
a) dado que a classe dos humanos compreen- são aplicadas para traçar uma relação diferencial
de humanos, animais e espíritos, e que isso se entre os termos de um mesmo gênero;
repete para as duas outras classes, essas categorias h) por outro lado, as relações entre os termos
não representam classes no sentido estrito e usual (os Juruna e os porcos, e os urubus, e os mortos
da palavra; etc.) apresentam um potencial assimétrico conside-
b) um procedimento analítico mais adequado rável: se um ponto de vista humano tem grandes
seria examinar se não dispomos de três relações de chances de prevalecer sobre um ponto de vista
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animal (na caça, por exemplo), essas chances traduziria melhor pelos qualificativos selvagem e
diminuem significativamente em face de um ponto civilizado.5
de vista de espírito (no festival dos mortos, por Para caracterizar esse regime cosmológico
exemplo); vou apoiar-me em Deleuze e Guattari (1995).
i) por assimetria entende-se aqui a capacida- Segundo afirmam os autores, há dois modos possí-
de de um sujeito (humano, animal ou espírito) de veis de se tratar uma variável: fazendo-a operar
impor seu ponto de vista a outrem; como uma constante ou colocando-a em estado de
j) sendo que assim como os Juruna conside- variação contínua. Penso ser esta uma via mais justa
ram que o ponto de vista animal, em tese, pode para a caracterização de uma cosmologia na qual a
prevalecer sobre o seu (p. ex., com o caçador diferença significativa dos humanos para com os
tornando-se primeiro um inimigo e em seguida um porcos, por exemplo, não é a mesma que existe
cativo da caça), também um ponto de vista de para com o caititu, o jaguar, ou o guariba. E isso
espírito pode mostrar-se impotente para dominar acarreta algumas conseqüências para a análise.
um humano; Destaque-se, primeiramente, que as relações dife-
k) ou seja, a assimetria é uma relação reversí- renciais não podem ser analisadas em termos de
vel, e isto significa que não se pode considerá-la esquemas concêntricos, hierarquizantes e atempo-
como sendo determinada aprioristicamente; ao me- rais; em segundo lugar, evita-se a projeção sobre os
nos em princípio, a dominação de um sobre o outro materiais juruna de um princípio que vigora apenas
só se determina a posteriori; em nossa própria cosmologia, a saber, a idéia de
l) acrescente-se que a tripla oposição permite que a diferença ou distância entre humanos e
distinguir o fenômeno comum e o fenômeno singu- animais é uma constante.
lar, correspondendo isso a um diferencial entre a Em um mundo no qual as relações diferenci-
vida humana ordinária, dominada pelo ponto de ais são postas em estado de variação contínua, um
vista humano, e o insólito, isto é, a situação em que homem, sob certas condições, pode tornar-se um
um ponto de vista de animal ou de espírito transfor- porco, sendo que esse tornar-se porco é um proces-
ma a realidade humana para os próprios humanos; so que jamais atinge seu fim; mesmo no espaço
m) isso evidencia a presença fundamental de mítico onde o estado de variação contínua encontra
uma quarta oposição, a saber, a distinção eu/ maiores chances de realização, persiste a relação
outrem, melhor dizendo, Outro/não-Outro; diferencial. É também um mundo em que um
n) finalmente, a diferença entre os pontos de caititu que invade a aldeia pode não ser mais
vista nada tem a ver com a teoria do relativismo simplesmente um animal.
cultural, porquanto não está baseada em nenhuma A questão fundamental da etnografia juruna é
das noções características da Antropologia, a saber: menos o animismo que o perspectivismo: a noção
parcialidade, arbitrariedade, equivalência, incomen- de alma representa somente o ponto de apoio para
surabilidade e antinomia entre objeto e sujeito, isto uma teoria específica da relação entre pontos de
é, natureza e cultura (Lima, 1995); vista que são a um só tempo análogos e determina-
o) o que a teoria juruna enfatiza é a luta entre dos localmente como assimétricos. E essa teoria
os pontos de vista e que a realidade é o que o ponto exprime menos uma noção de humanidade geral
de vista afirma. de todos os seres que um certo dualismo, do qual
Creio, assim, que o ponto de vista dos animais tratarei agora.
represente menos a inaplicabilidade de um diferen- Esse dualismo traduz um diferencial entre
cial entre natureza e cultura do que a inexistência Vida e Sonho, entre a realidade do sujeito e a
da sobreposição que, segundo nós mesmos, é realidade da sua alma. Sendo o sonho marcado
possível conceber entre as dicotomias natureza/ com valores ligados à morte e à alteridade, a
cultura e animal/humano. Insisto em enfatizar que realidade da alma é geralmente determinada por
esses termos não designam domínios estanques da um ponto de vista alheio (o daquele com quem se
realidade, mas uma relação diferencial que se sonha). Compreender essa distinção como Nature-
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za e Sobrenatureza não é distorcer os materiais que esse rótulo não passa de um maneirismo, e que
etnográficos, mas estas são aqui metacategorias o princípio diante do qual nos encontramos é
essencialmente relacionais, variáveis segundo o meramente um contextualismo; no máximo, um
ponto de vista, isto é, segundo a realidade vivenci- exemplo de segmentaridade ou “relatividade estru-
ada como tal por um sujeito. tural” (Dumont, 1975). Ora, meu argumento é
O que isso quer dizer? Imaginemos que em justamente que se trata menos de um sistema global
nossa própria cosmologia os mortos nos concebes- de segmentaridade (de maneira que em algum
sem como almas e a si mesmos, como vivos! Na momento a distinção cariocas e paulistas se dissol-
economia cosmológica juruna é assim: os mortos veria em benefício da distinção brasileiros versus
aplicam a si próprios a distinção corpo e alma e outras identidades nacionais) que de um esquema
concebem os vivos como sendo puramente alma... para o qual o ponto de vista da definição das
A relação com os animais não é diferente, mas o categorias da alteridade pertence aos próprios ter-
fato pode soar extremamente complexo, em fun- mos, não a um termo situado em um ponto de vista
ção, provavelmente, de não conferirmos às almas o superior. Pois é evidente que, em nosso sistema
mesmo grau de realidade que conferimos aos sociocosmológico, a distinção cariocas e paulistas é
animais. permitida por um ponto de vista deslocado com
A relação com o animal é tal que, sendo relação aos termos e que lhes é superior: o ponto de
verdadeiro que ele se vê como humano (e vê os vista do todo. O rótulo perspectivismo é útil e,
Juruna como humanos também), seu lado animal, segundo creio, necessário para traduzir a ausência
por ele ignorado, representa o lado sobrenatural da de ponto de vista do todo,8 e portanto de hierar-
sua existência. Nesse sentido, a realidade sensível quia definida a priori.
dos humanos é coextensiva com a sobrenatureza Uma outra objeção seria a seguinte. Consi-
do animal, e vice-versa. Ou seja, o que para os derando-se que a perspectiva antropológica mais
Juruna apresenta a função de corpo do animal tem adequada seja aquela capaz de permitir que o
para este a função de alma.6 mundo vivido (Gow, 1998) produzido pelos gru-
Imaginemos agora que os cariocas se definis- pos que estudamos possa dizer a última palavra
sem como tais em oposição aos paulistas, os quais, sobre os jogos de simetrias dos textos etnográfi-
por sua vez, definiriam a si mesmos como cariocas! cos, pode-se objetar que o perspectivismo oculta
Isso pode soar engraçado, mas exprime um dispo- um “resíduo não-perspectivista”, entendendo-se
sitivo demasiado corrente em nossa experiência, e por isso o fato de que, para os Juruna, o tucunaré
dele só não tomamos imediata consciência porque é simplesmente o tucunaré! Para os Piro, o porco
tratamos as categorias de alteridade como substan- é exatamente o porco! A objeção procede mas
tivos. O modelo por excelência das categorias não é incontornável, uma vez que esse problema
relacionais são os pronomes pessoais da primeira e não é alheio aos Juruna, que a ele conferem um
da segunda pessoa (Viveiros de Castro, 1996), e a tratamento justamente perspectivista, conforme
pequena experiência de manejar os termos “cario- vou mostrar agora.9
ca” e “paulista” como pronomes coletivos análogos Tomado no sentido estrito, o ser humano,
a “eu” e “tu” rapidamente lembra a estranha facili- vivo e desperto, apresenta uma irredutibilidade
dade com que os humanos caem em processos que eu não poderia deixar de ressaltar: sua inimi-
alienantes de reificação. Entre nós, mesmo catego- tável “sabedoria”. O antônimo da sabedoria tra-
rias temporais conhecem desde alguns séculos um duz os mais variados conceitos: “incesto, bestiali-
processo incessante de substancialização, e agora é dade, adultério, incontinência sexual e verbal, in-
o próprio moderno que se tenta congelar no passa- trepidez, estupidez mental e troca de palavras
do e ultrapassar no presente.7 com animais”, todos relacionados com a incredu-
A relatividade das categorias cosmológicas lidade, e que evocam direta ou metaforicamente
e/ou sociológicas define o perspectivismo (Lima, uma qualidade ou afeto anta, senão a própria
1996; Viveiros de Castro, 1996). Poder-se-ia objetar transformação da pessoa em anta.
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A sabedoria humana consiste naquilo que nós atemporal onde todos os entes ocupariam uma
mesmos chamamos de reflexividade: os vivos sa- posição predefinida.
bem que os mortos consideram o tucunaré como 3) Mauss mostrou que o “dar” produz uma
um cadáver, mas os mortos não sabem que se sabe assimetria (uma obrigação ou subordinação) e que,
isso a seu respeito, nem que os vivos consideram o no regime da dádiva, a única maneira de liberar-se
tucunaré como tal. Essa sua relativa insensatez, ou disso é o “retribuir”. Como os sistemas de dádiva
seja, essa incapacidade de perspectivar a si mesmos implicam parcerias relativamente duradouras, isso
caracteriza também a nossa existência onírica e os significa que a retribuição cancela a assimetria
animais. O porco se sabe humano, sabe que um somente ao preço da produção de uma nova. Ora,
Juruna é um semelhante, mas não sabe que é um dar-e-retribuir pode ser interpretado como uma
porco para os Juruna. simetria entre duas relações assimétricas. Por outro
É desse tipo a relação moral dos Juruna com lado, Deleuze e Guattari (1976) caracterizam a
os animais. Um pouco como disse Rimbaud, “Se a dádiva como um regime de dívida finita, enquanto
madeira se descobre violino, pior para ela”. Bourdieu (1996) mostra que, no mundo capitalista,
a dádiva apresenta uma feição distinta, criando
assimetrias duráveis, isto é, tornando impossível
Conclusões
retribuir! Nos termos de Guattari e Deleuze, este é
Para terminar, é preciso ressaltar alguns pon- um regime onde a dívida se revela infinita. Espero
tos: ter conseguido mostrar que também a hierarquia
1) No estudo das cosmologias indígenas, é pode ser finita.
impossível situar a questão da distinção natureza e 4) Proponho caracterizar como perspectivis-
cultura, humano e animal, em um nível de genera- tas os sistemas contra-hierárquicos, nos quais, de
lidade tal que a diversidade interna a cada um um lado, a hierarquia só pode operar em um
desses termos perca sua relevância. Tentei mostrar regime de finitude e, de outro lado, a parte, como
que podemos compreender esse fenômeno como a sugere Henry James (1994), compreende toda a
manifestação de uma propriedade positiva da cos- realidade. Pois, na verdade, a noção de ponto de
mologia juruna, a saber, o perspectivismo, que, vista juruna diverge imensamente da nossa noção,
formulado em termos negativos, consiste em au- uma vez que não é limitada por nenhum caráter de
sência de um ponto de vista do todo, aquela parcialidade (isto é, falsidade). É, pois, necessário
espécie de ponto de vista de Sirius que gera as definir mais precisamente o que quer dizer ausên-
ilusões de objetividade e absoluto. As operações cia de ponto de vista do todo em regimes contra-
classificatórias que pudemos observar não supõem hierárquicos. É ainda Deleuze e Guattari (1976, p.
um distanciamento do sujeito com relação ao mun- 61) que oferecem a possibilidade de compreender
do constituído, mas, pelo contrário, sua interação aquilo de que aqui se trata: “Só acreditamos em
com o que se trata de classificar, interação que é totalidades ao lado”. Existiria um tipo de todo que
sempre cambiante e, como mostrou Lévi-Strauss, não totaliza nem unifica as partes, um todo cujo
atenta às qualidades sensíveis e também, como funcionamento é bem diferente do de uma totalida-
mostrou Lévy-Bruhl, ao insólito. de transcendente, pois ele se dispõe como “uma
2) A relação hierárquica entre natureza e parte ao lado das partes”, “se aplica a elas, instau-
cultura caraterística de nossa maneira de pensar rando somente comunicações aberrantes entre va-
não se opõe à ausência de hierarquia na cosmolo- sos não comunicantes, unidades transversais entre
gia juruna. O que ali se observa é a hierarquia elementos que guardam toda a sua diferença nas
operando em um regime que impede a codificação suas dimensões próprias” (idem, p. 62).
a priori das relações, impondo-se apenas a posteri- 5) Não são relações de oposição privativa que
ori, e a dinâmica cosmológica dependendo muito devem ser invocadas no estudo comparativo das
mais de um princípio de variação dos entes e de cosmologias. Mesmo a diferença de regimes que
suas relações recíprocas do que de um sistema aqui afirmei não pode ser tomada como uma
PARA UMA TEORIA ETNOGRÁFICA DA DISTINÇÃO NATUREZA E CULTURA ... 51

oposição entre os Juruna e nós. Quem garante que preservação de práticas culturais dadas desde a origem
a relação com um animal de estimação seja uma da humanidade atual.

constante, independentemente de ser ele um ca- 6 Se é verdadeiro que na cosmologia juruna a expressão
desse perspectivismo revela-se suficientemente abstra-
chorro, um gato ou tartaruguinha? Quem garante ta, outros sistemas amazônicos o fazem de uma maneira
que, para o vaqueiro, a diferença significativa entre relativamente mais concreta: segundo os Makuna ou os
o homem e o gado seja a mesma que existe para Wari’ (Århem, 1996; Vilaça 1996), o diferencial entre os
humanos, representados como predadores, e os ani-
com o cavalo? A distinção proposta por Deleuze e mais, representados como presas, é expresso direta-
Guattari não é para ser aplicada a duas espécies de mente por meio de duas categorias relacionais. Nesse
cosmologias, mas a dois usos de uma mesma sentido, poder-se-ia dizer que os humanos são os
cosmologia, um uso “maior” e outro “menor”.10 Em animais dos animais! Uma equação do mesmo tipo vale,
em parte, para os mortos juruna, não, porém, para os
todo caso, a análise que precede deve ser conside- animais juruna.
rada como uma etapa que prepara uma análise 7 Para uma crítica às tentativas contemporâneas de essen-
mais fina e capaz de romper com a unidade ilusória cialização da modernidade, ver os textos gêmeos de
em que consiste falar em “a” cosmologia juruna, em Foucault (1994).
benefício da apreensão de regimes semióticos mais 8 Para um exame dessa questão em um contexto etnográ-
diferenciados. fico diferente ver Strathern (1992). Minha distinção
entre contextualismo (partes integradas em um todo
maior, que é por sua vez parte de um todo maior e assim
sucessivamente) e perspectivismo não significa, eviden-
NOTAS temente, que os Juruna sejam incapazes de pensar em
termos de contexto. Tampouco significa que ignoramos
o perspectivismo em outros campos que o das artes
1 Os Juruna são um pequeno povo tupi que vive no alto plásticas: a obra de Henry James (1994) é cheia disso.
Xingu. Canoeiros, agricultores e caçadores, habitavam Considere-se também o exemplo de Nietzsche.
até o final do século XIX as ilhas do médio Xingu. Meu
trabalho de campo com este grupo foi realizado entre 9 Agradeço a Peter Gow as críticas que me permitiram
1984 e 1990 e contou com financiamentos da Fundação desenvolver esse ponto.
Ford e da Finep. 10 “Maioria implica uma constante, de expressão ou de
2 “Quando digo que a distinção interior/exterior não conteúdo, como um metro padrão em relação ao qual
existe, quero dizer que não devemos acreditar na ela é avaliada. Suponhamos que a constante ou metro
existência de interior e exterior. Devemos situar-nos seja homem-branco-masculino-adulto-habitante das ci-
exatamente no ponto em que são definidos o interior e dades-falante de uma língua padrão-europeu-heteros-
o exterior da rede. Assim a questão é exatamente a sexual qualquer (o Ulisses de Joyce ou de Ezra Pound)
mesma: temos que encarar interior-e-exterior como […] Pois a maioria, na medida em que é analiticamente
uma categoria ativa, criada pelos próprios atores, e ela compreendida no padrão abstrato, não é nunca alguém,
tem que ser estudada como tal” (Latour e Crawford, é sempre Ninguém — Ulisses —, ao passo que a minoria
1993). é o devir de todo mundo, seu devir potencial por
desviar do modelo. Há um ‘fato’ majoritário, mas é o fato
3 Pensamento e linguagem implicam-se mutuamente: o analítico de Ninguém que se opõe ao devir-minoritário
primeiro é linguagem silenciosa, sem voz. Registre-se de todo mundo” (Deleuze e Guattari, 1995, p. 52).
que mesmo no quadro dos mitos cosmogônicos, em
que se destaca a inscrição mítica da diferença entre os
humanos e os animais, (a) os humanos transformados BIBLIOGRAFIA
em animais já traziam prefigurações de sua animalidade
específica, e (b) o que o mito retira dos animais não é ÅRHEM, Kaj. (1996), “The cosmic food web: human-
bem exatamente a linguagem mas a possibilidade de se
nature relatedness in the Northwest Amazon”,
comunicarem com os humanos no mundo da vida
desperta. in P. Descola e G. Pálsson (orgs.), Nature and
society: anthropological perspectives, Londres,
4 Esse duplo significado do termo imama exprime-se no Routledge.
português dos Juruna por intermédio de dois termos:
brabo e Outro. BOURDIEU, Pierre. (1996), “Marginália. Algumas no-
5 Penso, de fato, que a distinção selvagem e civilizado tas adicionais sobre o dom”. Mana, 2 (2): 7-20.
nem é estranha aos Juruna, nem é destituída de impor-
DELEUZE, Gilles e GUATTARI, Félix. (1976), O anti-
tância. Mas ela nada tem a ver com a distinção antropo-
lógica evolucionista: o selvagem não é o primitivo e a Édipo. Capitalismo e esquizofrenia. Rio de
civilização consiste antes de tudo em conhecimento e Janeiro, Imago.
52 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

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