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Indivuo e Sociedade

para o alemão Karl Marx (1818 — 1883), os indivíduos devem ser


analisados de acordo com o contexto de suas condições e situações
sociais, já que produzem sua existência em grupo. O homem primitivo,
segundo ele, diferenciava-se dos outros animais não apenas pelas
características biológicas, mas também por aquilo que realizavam no
espaço e na época em que vivia. Caçando, defendendo-se e criando
instrumentos, os indivíduos construíram sua história e sua existência
de grupo social.

Ainda segundo Marx, o indivíduo isolado só apareceu efetivamente na


sociedade de livre concorrência, ou seja, no momento em que as
condições históricas criaram os princípios da sociedade capitalista.
Tomemos um exemplo simples dessa sociedade. Quando um operário é
aceito numa empresa, assina um contrato do qual consta que deve
tantas horas por dia e por semana e que tem determinados deveres e
direitos, além de um salário mensal. Nesse exemplo, existem dois
indivíduos se relacionando: o operário, que vende sua força de
trabalho, e o empresário, que compra essa força de trabalho.
Aparentemente se trata de um contrato de compra e venda entre
iguais. Mas só aparentemente, pois o “vendedor” não escolhe onde
nem como vai trabalhar. As condições já estão impostas pelo
empresário e pelo meio social.
Essa relação entre os dois, no entanto, não é apenas entre indivíduos,
mas também entre classes sociais: a operária e a burguesa. Eles só se
relacionam, nesse caso, por causa do trabalho: o empresário precisa de
força de trabalho do operário e este precisa de salário. As condições
que permitem esse relacionamento são definidas pela luta que se
estabelece entre as classes, com a intervenção do Estado, por meio das
leis, dos tribunais ou da polícia.

Essa luta vem se desenvolvendo há mais de duzentos anos em muitos


países e nas mais diversas situações, pois empresários e trabalhadores
têm interesses opostos. O Estado aparece aí para tentar reduzir o
conflito, criando leis que, segundo Marx, normalmente são a favor dos
capitalistas.

O foco da teoria de Marx está, assim, nas classes sociais, embora a


questão do indivíduo também esteja presente. Isso fica claro quando
Marx afirma que os seres humanos constroem sua história, mas não da
maneira que querem, pois existem situações anteriores que
condicionam o modo como ocorrem a construção. Para ele, existem
condicionantes estruturais que levam o indivíduo, os grupos e as
classes para determinados caminhos; mas todos têm capacidade de
reagir a esses condicionamentos e até mesmo de transformá-los.

Marx se interessou por estudar as condições de existência de homens


reais na sociedade. O ponto central de sua análise está nas relações
estabelecidas em determinada classe e entre as diversas classes que
compõem a sociedade. Para ele, só é possível entender as relações dos
indivíduos com base nos antagonismos, nas contradições e na
complementaridade entre as classes sociais. Assim, de acordo com
Marx, a chave para compreender a vida social contemporânea está na
luta de classes, que se desenvolve à medida que homens e mulheres
procuram satisfazer suas necessidades, “oriundas do estômago ou da
fantasia”.
Cultura

Estabilizado pelo discurso antropológico, definido em termos de totalidades integradas no espaço


e contínuas no tempo, o conceito antropológico de cultura tem sido amplamente questionado e
revisto desde que foi formulado como objeto da antropologia5 . Nos anos 1970, a antropologia
interpretativa de Clifford Geertz se aproximou da teoria literária e da hermenêutica para colocar
em questão a escrita etnográfica e as possibilidades de representação dos outros povos na
antropologia. A distinção entre cultura e razão prática, proposta por Marshall Sahlins (1976), era
uma crítica forte das concepções utilitaristas e pragmáticas da cultura, contrapondo-as àquelas
que concebem a ordem cultural a partir dos esquemas significativos ou simbólicos desde os quais
o mundo é vivido. Conferindo ao pensamento indígena um estatuto epistemológico equivalente
ao do pensamento ocidental, Lévi Strauss (1962) havia produzido uma síntese particular da
relação entre a ordem do significado e a das organizações sociais. Retomando o estruturalismo
levistraussiano em outras bases, Sahlins investigou ainda o modo como as sociedades não
ocidentais interpretam os processos de colonização e de contato cultural em seus próprios termos
(SAHLINS, 1985). Com isso, sua obra aponta para uma espécie de descolonização
epistemológica em relação aos discursos hegemônicos do Ocidente, em particular o discurso
histórico.

Em A invenção da Cultura, obra publicada em 1975 que, entretanto, só seria incorporada ao


debate acadêmico mais amplo muito mais tarde, Roy Wagner propôs uma definição estritamente
antropológica da noção de cultura, entendendo-a como um dispositivo acionado no encontro
entre diferentes experiências, povos ou pessoas. A cultura, nesse sentido, é aquilo que é colocado
em ação tanto no trabalho de campo do antropólogo quanto no encontro entre diferentes
sociedades. Trata-se de um dispositivo que pressupõe um duplo movimento, ou o que Wagner
chamou de uma “invenção” e uma “contra-invenção”. O antropólogo precisa de alguma forma
“inventar” uma cultura para aqueles que estuda, isto é, produzir, por meio de uma atividade
criativa, uma descrição do que seria a vida do grupo ao qual se vinculou na experiência
etnográfica. Obviamente, essa experiência tem relação com alguma coisa que “está lá”, com o
modo de vida daqueles que o antropólogo está descrevendo, mas é evidente também que ele só é
capaz de fazer isso a partir de seu ponto de vista particular, do ponto de vista situado e localizado
de sua própria cultura (WAGNER, 2010,). Além disso, quando se entra em contato com outros
povos, como todos sabemos, experimentamos de um modo novo e diferente aquilo que é o lugar
de onde viemos; ou seja, percebemos, no contato com o diferente, quais são os elementos
específicos de nossa própria experiência, os modos de comportamento e as visões de mundo que
antes tomávamos como naturais. Nesse sentido, diante da alteridade nós necessariamente
“contrainventamos” - e essa é também uma experiência criativa - uma cultura para nós mesmos

Natureza

Vivemos em uma cultura, assim como os outros, porém sempre consideramos que a nossa cultura
– justamente ao separar a natureza da cultura – produz um acesso privilegiado ao mundo, às
coisas, por meio do pensamento científico. Roy Wagner chamou a isso de um jogo de dois contra
um: os outros teriam apenas cultura, e nós teríamos natureza e cultura. A universalidade da
natureza seria, nesse sentido, o argumento que permitira aos ocidentais reduzirem as outras
culturas a sistemas de representações ou de crenças, enquanto concebiam a sua própria cultura
em termos objetivos e universais. O autor chama atenção, neste caso, para o papel da
antropologia como uma espécie de Grande Inquisidor epistemológico, que nos torna incapazes
de ver algo além da nossa própria história, de uma história em que não há uma alteridade
significativa. Partindo de uma problemática diferente, associada à filosofia da ciência, Bruno
Latour usa argumentos análogos quando se refere ao papel da concepção da natureza na
expansão e a dominação promovida pelo Ocidente diante dos outros povos do mundo.

De acordo com Latour, ao acusarem os “primitivos” de fetichistas (que acreditam em entidades


que eles próprios fabricaram), os modernos acreditam na universalidade de sua própria cultura, e
encobrem o fetichismo inerente às suas próprias práticas. A antropologia simétrica proposta por
ele teve como finalidade justamente libertar a antropologia do paradoxo de se constituir como
uma ciência da não ciência. O ponto de partida é a ideia de que o discurso antropológico precisa
se tornar capaz de mobilizar a natureza, e não apenas da cultura, para que a experiência
etnográfica não fique no plano da representação. É nesse sentido que Latour questiona a
oposição e propõe uma antropologia comparada capaz de colocar lado a lado o que chama de
“naturezas-culturas”
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A sugestão de Lévi-Strauss abalou, mas não liquidou por completo, o que Descola e Pálsson
chamaram de paradigma dualista, modelo de interpretação da realidade social e cultural
caracterizado por uma notável resistência e durabilidade no interior da Antropologia. Por esta
razão, muito do que se produziu após as considerações teoricamente sofisticadas de Lévi-Strauss,
se tomaram as várias vias sugeridas pelo grande pensador francês quanto às formas de
conhecimento não ocidentais, não lograram, entretanto, criticar a oposição Natureza e Cultura
como um construto cultural - ocidental e, portanto, apenas passível de ser ferramenta para a
reflexão, e nunca objeto em si mesmo e, desta forma, ultrapassar a noção de uma natureza fixa e
imutável sobre a qual se constroem incontáveis visões de mundo culturalmente diferentes. Novos
caminhos, no entanto, surgiam para contornar esta limitação a partir dos anos 60; aqui, no
entanto, limitar-nos-emos, por questões de espaço, aos desenvolvimentos que alteram
substantivamente a questão da dicotomia natural/cultural dos anos de 1980 em diante.

O primeiro deles via um conjunto de pesquisas que passaram a questionar a própria objetividade
da dicotomia nas sociedades ocidentais modernas e contemporâneas, especialmente a partir de
leituras críticas da ciência, com especial atenção à biologia e à física; tais trabalhos partiram do
muito justo posicionamento de Bruno Latour (1994) quanto a "jamais fomos modernos".
Latour, assim, revê a existência de uma noção de natureza como algo objetificado, fixo e
imutável (ou seja, regido por leis gerais que poderiam ser descritas cientificamente) mesmo nas
ciências mais "duras" e avançadas, ao destrinchar os mecanismos do que chamou de máquina
purificadora, o conjunto de pressupostos ontológicos que opera, continuamente, a separação
entre seres naturais e objetos culturais no mundo ocidental, mascarando a impressionante e
sempre-presente proliferação de híbridos natural-culturais que cortam fronteiras e funcionam
indistintamente nos dois domínios que nós, ideologicamente, separamos.

O segundo dos desenvolvimentos que se seguiram à recensão de Descola e Pálsson (1996)


refere-se também a uma radicalização dos questionamentos sobre a validade da distinção
natureza e cultura, e também deve muito a Bruno Latour - inclusive pelo fato de que é da
cosmologia animista dos Achuar da Amazônia equatoriana, através da etnografia de Philippe
Descola, que Latour pode desvelar alguns dos mecanismos secretos da máquina purificadora-.
Com efeito, se o mundo habitado pelas sociedades ocidentais é coalhado de híbridos natural-
culturais, assim também funcionam outros mundos, o que implica na necessidade de deixarmos
de lado todo e qualquer pressuposto - importado das divisões disciplinares das ciências modernas
e mesmo do senso comum ou, dito de outra forma, da ontologia nativa do ocidente - a respeito de
onde ocorre a separação entre seres humanos e suas produções, isto é, a "cultura" - e não
humanos - ou seja, a "natureza". Desta forma, oposições como humano e animal, ser vivo e
artefato ou máquina, e povo e paisagem perdem muito de seus sentidos originais devendo ser
reconstituídas a partir das ontologias locais por meio de investigação etnográfica

BACHELARD, G. A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise do


conhecimento. Tradução de Estela dos Santos Abreu. Rio de Janeiro: Editora Contraponto, 1996.
FREIRE, P. Conscientização: teoria e prática da libertação, uma introdução ao pensamento de
Paulo Freire. Tradução de Kátia de Melo e Silva. São Paulo: Moraes, 1980.
SILVA e PINTO. Metodologias das ciencias Humanas, edições afrontamento. Rcosta
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TRINDADE, A. Ciência e senso comum: uma reflexão ilustrada por comentários sobre o filme O
Carteiro e o Poeta. Pró Ciência. São Paulo, 29 de julho de 2001. Disponível em:
http://www.prociencia.com.br/default.htm> . Acesso em: maio. 2022.
WAGNER, Roy. (2010) [1975]. A invenção da cultura. São Paulo, Cosac Naify.
Conclusão

Em contraste com a ideia do multiculturalismo característico do relativismo cultural


antropológico, Viveiros de Castro cunhou o termo “multinaturalismo” (2002; 2015). O conceito
se referia originalmente ao mundo de perspectivas cruzadas das cosmologias indígenas, em que
condições como a de humano, gente, animal ou planta de determinada espécie, ou espírito, não
são substantivas e determinadas, mas antes transformacionais e definidas a parir das relações
entre os seres. As consequências filosóficas, políticas e existenciais do multinaturalismo têm sido
discutidas por seu autor desde que propôs o termo e estabeleceram diálogos e conexões com
autores de diferentes campos de conhecimento. O multinaturalismo articula-se com as discussões
de Bruno Latour acerca da destituição da Natureza como território do Um, como substrato
contínuo da existência, entidade transcendental e contínua em torno da qual orbitam culturas e
sujeitos (LATOUR, 2005).

Enquanto o etnocentrismo é um preconceito, e suas derivações doutrinárias (racismo,


evolucionismo cultural etc.) são ideologias (consciência falsa e falsa ciência), o relativismo
cultural pertence à esfera da ciência. Por um lado surgiu depois que a antropologia adotou como
método a observação participante ; quando quis ir além da etnografia descritiva e da etnologia
histórica e comparativa e tratou de compreender, isto é, de produzir conceitos, construir modelos
que dessem conta da diversidade das sociedades e culturas. Não foi pura coincidência que outras
ciências do homem que então se estabeleciam (lingüística, psicanálise, análise marxista das
formações sociais) tivessem atitude análoga na abordagem dessas “totalidades complexas”, cujas
articulações, sintaxe, significação tratavam de detectar. Cada época tem suas “revoluções
científicas” suas “rupturas epistemológicas” deslocando a problemática e exigindo nova
metodologia que corresponda aos objectos novos que a teoria define
.

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