Você está na página 1de 4

A CRIMINALIZAÇÃO DA POBREZA

A criminalização das classes sociais mais desfavorecidas se deve, por se deve


por dois motivos superficiais: Dominação social e estabelecimento do discurso
conservador das elites. Esse processo, que é executado pelo Estado e
reproduzido pela mídia sobre o imaginário da sociedade é mais uma medida
reducionista que visa abordar problemas estruturais da sociedade como a
desigualdade social e o desemprego. Criminalizar o cidadão não justifica a
ausência de serviços básicos tutelados pela carta magna às pessoas da classe
pobre. A cerca disso,

Castro diz o seguinte: Criminalizar o pobre, ou estigmatizá-lo, torna-


se mais fácil do que resolver o problema da desigualdade social tão
característica no Brasil. Para a sociedade é mais viável culpabilizar a
pessoa que mora no bairro periférico do que exigir que o estado
garanta seus direitos. (Castro, 2010, pp. 54-55).

Isto é, a sociedade enxerga o pobre como uma patologia social a ser sanada. E
o Estado tenta atribuir ao pobre a culpa por sua condição social, como se os
resultados obtidos no meio em que este reside fosse fruto das decisões
tomadas por esta população, que por mais controverso que possa ser, não tem
escolha.

A desigualdade social aumenta de acordo com a consolidação do sistema


capitalista, mais especificamente o modelo socioeconômico neoliberal adotado
pelo Governo brasileiro nas últimas décadas.

O descaso por parte do Estado acabou tornando as favelas territórios de


ninguém contribuindo para o crescimento da criminalidade em alguns desses
locais, a percepção da ausência de lei, normas e regras tende a levar à quebra
dos códigos de convivência.

Assim, o crime é maior em zonas onde o descuido, a sujeira e o maltrato são


maiores, a ideia se associa a teorias relacionadas à desordem física, como a
tese das janelas quebradas, de Wilson e Kelling (1982) Publicada em 1982,
esta teoria acredita que se pequenos delitos não forem contidos, outros
maiores podem surgir. Isto pelo fato de que o agressor percebe a desordem
social a partir de cenários degradados. Ou seja, o delito é maior nas zonas
onde o descuido, a sujeira, a desordem e o maltrato são maiores. Se por
alguma razão racha o vidro de uma janela de um edifício e ninguém o repara,
muito rapidamente estarão quebrados todos os demais. Se uma comunidade
exibe sinais de deterioração, e esse fato parece não importar a ninguém, isso
fatalmente será fator de geração de delitos. Esta teoria demonstra a relação
entre criminalidade e fatores sociais, tais como segregação racial e territorial.

Esse processo de ocupação das comunidades pobres pelo crime acelerou o


processo de criminalização do morador enraizada no imaginário social pela
mídia, sobretudo pela estigmatização das favelas como lugares criminogênicos,
e consequentemente a estigmatização de seus moradores, que são vistos
como criminosos ou cúmplices da violência.

Rocha (2006) afirma o seguinte:

No caso dos moradores de favela, o imaginário social dominante


brasileiro interpreta o ‘favelado’ como um tipo social homogêneo e a
favela como um lugar de ausência caos social. A favela é quase
sempre definida pelo que ela não teria: Um lugar sem infraestrutura
urbana - água, luz, esgoto, coleta de lixo - sem ruas pavimentadas e
bem delimitadas, globalmente miserável, sem ordem, sem lei, sem
regra, sem moral, enfim, o lugar da carência, do vazio, do perigo.
(Rocha, 2006, p.11)

A citação traz uma alusão a imagem da favela que foi erguida e utilizada pelo
imaginário coletivo, de predominância elitista e preconceituosa, com elementos
construídos por intermédio de experiências artificiais, buscando correlacionar a
todo tempo a criminalidade com a pobreza como se um fosse fator
preponderante do outro, usando argumentos que variam: desde a tentativa de
estigmatizar as moradias dos favelados-alegando que elas são imorais, e
visualmente perigosas. Este postulado está fundamento nas ações que
poderiam vir a ocorrer justificando os aspectos do meio social, tendo a
educação e a cultura como índices definidores da personalidade do sujeito que
de acordo com o argumento, nasce com o destino pré-determinado ao crime.

No Brasil, é comum em diversas regiões do país, a transmissão de programas


de baixa qualidade que visam a exposição massiva dos pobres e das mazelas
da sociedade de forma preconceituosa, esses programas ocupam um espaço
da programação diária dos canais da tv aberta para noticiar fatos relacionados
a criminalidade, tencionando ridicularizar a pobreza e a miséria desses
indivíduos oprimidos socialmente, construindo uma ideia deturpada das
periferias, sob a ótica da mídia sensacionalista.
Antes a analisar o formato de um destes programas sensacionalistas da tv
aberta, precisamos definir o conceito de sensacionalismo. O sensacionalismo é
caracterizado por um tipo de viés editorial na mídia em massa em que os
eventos e temas em notícias e partes são mais exageradas para aumentar os
números de audiência ou de leitores.
Buscamos analisar o programa “se liga bocão” exibido pela Record TV, como
exemplo de programa sensacionalista por exibir matérias que abordam ações
policiais durante o período do dia e madrugada na Região Metropolitana de
Salvador. Ocorre que durante a divulgação das matérias o programa insere
pre-julgamentos e discursos em defesa da violência policial. E para ocultar o
discurso preconceituoso, o programa utiliza da “satirização dos fatos
dramáticos” das populações periféricas.
Ao parecer engraçado, o telespectador não identifica a discriminação nas
notícias; pelo contrário, ao não perceber a banalização da dor, do trágico, da
exclusão, da pobreza e da violência, o telespectador generaliza uma
concepção que associa à determinadas classes estereótipos sociais.
O programa “se liga bocão “que se apoia na espetacularização da pobreza e
no sensacionalismo, atuando decisivamente para a construção e disseminação
da ideia de que os sujeitos perigosos são oriundos das classes sociais menos
favorecidas, usando um discurso violento submetido a uma concepção e
maneira de ver e pensar da sociedade
Um dado interessante dentro da análise é a questão da alienação do próprio
profissional que apresenta o programa, promovido pelo formato da notícia
produzida pelo programa. Em uma entrevista com um jornalista desse tipo de
jornal, Costa (2007), colheu o seguinte depoimento:

“O sensacionalismo é um lado que prende! até o fundo musical. Eu


detesto quando estou trabalhando e o operador não coloca as
músicas, os efeitos, [...] Aquilo emociona [...]. A pessoa, o ouvinte
viaja no tempo, chora, ri [...]. A mulher foi violentada, o operador de
áudio larga o grito: “aii!”, a mulher gritando. Pai levou dois tiros na
cabeça, “Pá, Pá!”[...] eu acho fascinante.” José luíz silva, rádio
Marajoara.

Esta alienação do profissional que apresenta o programa, se dá, talvez, pelo


engessamento do enquadramento das matérias produzidas e de seu
direcionamento único de criminalizar, espetacularizar e entreter o público, há
uma espécie de padronização onde a notícia é colocada para ser adaptada ao
padrão exigido por uma parcela da sociedade mudam-se os cenários, mas a
essência discursiva é a mesma. Estarão presentes sempre o marginal, o
bandido, o criminoso, os instrumentos do crime, a polícia, as testemunhas e a
vítima e seus familiares, tudo isso envolvido em narrativas que se encaixam
referidos moldes para que ele tome a forma da notícia nesse tipo de meio
enviesado do sensacionalismo.

Você também pode gostar