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QUESTÃO RACIAL E

SERVIÇO SOCIAL:
AVA N Ç O S E D E S A F I O S D A
FORMAÇÃO
PROFISSIONAL

Profa. Dra. Zelma Madeira


15/04/2021
ESTUDO E PESQUISA DA QUESTÃO RACIAL
NUAFRO/UECE ( DESDE 2010)

15/04/2021
QUESTÃO RACIAL – RAÇA E RACISMO

A raça é um dos eixos centrais para explicar a formação social brasileira


– juntamente com classe social e gênero, define as posições de homens e
mulheres na mesma sociedade.
Eixos estruturantes como categorias analíticas dos fatores históricos,
econômicos, sociais e das contradições que se relacionam com o projeto
de colonialidade moderna, cuja base foi o sistema escravista, para
melhor entender as desigualdades sociorraciais persistentes na
contemporaneidade.

O racismo é determinante da pobreza e da riqueza, se estabelece nas


relações políticas institucionais. O Estado funciona a partir das
distinções de raças, da naturalização dos grupos humanos classificados.
O colonialismo tem o racismo como elemento fundamental e a raça
como elemento primordial.

O racismo produz imaginário social, modos de pensar, cria mentalidades


para nortear a produção da vida. Produz convicções, a ponto de
15/04/2021 convencer que é justo que algumas pessoas merecem viver e outras não.
COLONIALIDADE MODERNA – RAÇA E RACISMO

• Para Nancy Fraser(2020) não tem nada mais distante da


realidade conceber o capitalismo, o patriarcado, e a
supremacia branca como sistemas separados, ao
contrário todos são modos de opressão (classe, gênero e
raça) estruturalmente ancorados no capitalismo como
formação social, enquanto uma ordem social
institucionalizada.

• Raça, classe e gênero são eixos de dominação que se


atravessam, ocupam posições contraditórias. O
capitalismo sempre precisa de sujeitos a explorar e a
expropriar. Devemos considerar os processos de
produção, reprodução, exploração e expropriação. E o
campo da reprodução e expropriação tem a raça e o
gênero designado - as populações feminilizadas e
racializadas
23/08/2023
PROCESSO DE DESPERSONALIZAÇÃO QUE AS
TRANSFORMOU EM MEROS CORPOS-OBJETOS,
DESPROVIDOS DE QUALQUER HUMANIDADE
• Classe perigosa • Associação entre prática de delitos as
• Marginais características físicas dos supostos
delinquentes
• Mau sujeito /mau elemento • Função e força do discurso cientifico ,
• Delinquentes desajustados medicina legal, jurista e da policia
• Criminosos serviram de ferramentas de legitimação do
• Grupo desviante racismo.
• Degenerados • Exemplo - Xuxa defendendo o "uso" de
corpos negros encarcerados para
• Desordeiros experimentos científicos.
• Preguiçosos • O que significa pertencer a um grupo
• Selvagens étnico que foi desraizado, inferiorizado e
• Incivilizados ter de conviver cotidianamente com
acusações de incapaz, incompetente ?

23/08/2023
ESCRAVIDÃO E RACISMO


No dizer de Silvio Almeida (2018) não podemos fazer
uma ligação direta, linear entre escravidão e racismo.

É preciso compreender que não estamos vivendo numa
escravidão, com o pós- abolição o jeito de tratar o/as
negro/as se reconfigurou em forma de racismo.


O racismo não é resquício da escravidão, pois assim
podemos crer que a solução estará em termos um choque
de modernidade.

O jeito como os negros/as foram tratados na escravidão se
reconfigura estruturalmente, no pós-abolição, sobressai o
Racismo.
ABOLIÇÃO
(...) Para a consciência nacional, resgata-se com extinção
da escravidão a dívida brasileira para com os negros, que
a partir de então, puderam se integrar à sociedade como
homens livres, com iguais direitos aos demais, sendo que
seu futuro neste país, a partir de então, dependeria
apenas do seu esforço(CONSORTE; 1991:p. 86)

(...) o Estado brasileiro transferiu aos ex-escravizados e


seus descendentes inteira responsabilidade pela sua
sobrevivência, expressando seu total desinteresse pela
sua reprodução física e cultural. Seu projeto de nação
moderna, branca, ocidental e cristã não comportava tão
expressiva população de negros (CONSORTE,
1991:p.92)
SOCIEDADE CAPITALISTA- A QUESTÃO RACIAL SE CONSTITUIU (E
SE CONSTITUI) COMO O NÓ QUE AMARRA A QUESTÃO SOCIAL

Não foram tratados como classe laboriosa ,


nem classe trabalhadora , ne sequer puderam
compor o exercito industrial de reserva ,
foram classificada como classes perigosas,
tratadas como um perigo à ordem burguesa. (
GONÇALVES : 2018)
População permaneceu escanteada, diluída na
condição de pobre e miserável, tornou-se
objeto de uma caridade que, mais do que
flertar, estabeleceu ligações perigosas com a
política eugenista do Estado brasileiro.
PROCESSO DE MISCIGENAÇÃO NO BRASIL-
BRANQUEAMENTO
RACISMO ESTRUTURAL

• O racismo é uma forma sistemática de


discriminação que tem a raça como
fundamento e que se manifesta por meio de
práticas conscientes ou inconscientes que
culminam em desvantagens ou privilégios para
indivíduos, a depender do grupo racial ao qual
pertençam (ALMEIDA, 2018, p. 25).

• Precisamos tratar o racismo para além de uma


análise individualista ou institucionalista: ele
estrutura vidas, aparece como normal, molda a
maneira de ver o mundo, os afetos, introjetando
a naturalização da raça.
23/08/2023
RACISMO DA CEGUEIRA DE COR
RACISMO SEM RACISTA
• A ênfase recai não mais no discurso de inferioridade biológica ou
moral, mas na ideia de desempenho.

• Bonilla-Silva chama de racismo da cegueira de cor. Para os


defensores do liberalismo o problema reside na dinâmica do
mercado, nos fenômenos que ocorrem naturalmente e nas limitações
culturais típicas dos negros e latinos

• A falsa promessa liberal

• Considera a igualdade, liberdade e fraternidade para todos,


pressupondo que todas as pessoas são tratadas de forma igual,
solidária e fraterna, desconhecendo os tensionamentos, dentre eles
os conflitos raciais existentes entre os diferentes grupos étnicos, que
provocam
15/04/2021 as desigualdades entre brancos e negros.
DESIGUALDADES RACIAIS
• A população negra no Brasil representa 56,10%, segundo a Pnad Contínua
(IBGE/2019).

• Dos 209,2 milhões de habitantes do país, 19,2 milhões se assumem como pretos,
enquanto 89,7 milhões se declaram pardos, e a junção de pretos e pardos equivale à
população negra.

• A Pesquisa de Orçamento Familiar (POF/IBGE, 2018) revela que no Brasil a pobreza


é negra, ou seja, 77,8% de toda a pobreza no país se concentra na população cujo/a
chefe de família é preto/a ou pardo/a.

• Mercado de trabalho 68,6% dos cargos gerenciais são ocupados por brancos e apenas
29,9% por negros.

• Quanto à distribuição de renda 15,4% das pessoas brancas estão abaixo da linha de
pobreza em contrapartida os negros representam 32,9%.

•23/08/2023
3,9% de brancos são analfabetos e a taxa de analfabetismo entre os negros é de 9,1%.
O RACISMO É DETERMINANTE DA POBREZA
E DA RIQUEZA
 A raça funciona como fator de classificação dos seres humanos,
denotando hierarquias raciais naturalizadas e o racismo silenciado,
que perversamente afeta a vida das pessoas com violência nas
relações interpessoais e institucionais.

 Historicamente a pauta racial tem sido desprezada pelas pessoas que


tem poder de decisão, pela academia como lugar de produção de
conhecimento, pelos economistas, pela mídia os meios de
comunicação, principalmente de massa, são fundamentais para
reproduzir o imaginário social racista, pelos juristas, pela maioria do
parlamento.

 As consequências são sistematicamente negadas pela maioria das


pessoas, interditando a denúncia e as formas de superação do racismo
estrutural.
15/04/2021
SERVIÇO SOCIAL - O QUE TEM A VER COM ISSO?

• O Serviço Social é uma profissão institucionalizada no Brasil na década de 1930,


cuja legitimidade está em trabalhar com as expressões da questão social, com os
problemas reveladores das desigualdades: econômica, social, política e cultural,
bem como as formas como os sujeitos as enfrentam
• Fundamentos da estrutura sincrética do Serviço social (Objeto ( questão social ) -
Horizonte- cotidiano e Natureza – Interventiva )
• Desafios postos aos profissionais no seu cotidiano institucional: desemprego,
aumento da pobreza, miséria e vulnerabilidades de um lado, e de outro as
redefinições das políticas públicas. O corte dos gastos públicos em áreas
essenciais como educação, geração de trabalho e renda, saúde, assistência social,
previdência social e outras, compromete a qualidade de vida daqueles que
precisam dos serviços públicos, e no tempo presente todos impactos da pandemia
da covid-19 e tudo que ela escancarou de desigualdades.
• Os indicadores revelam a população negra e indigenas como as mais afetadas,
portanto
23/08/2023
a desigualdade racial é objeto de intervenção do/as assistentes sociais
MARIA DE LOURDES NASCIMENTO – LIDERANÇADO
MOVIMENTO NEGRO NOS ANOS DE 1940 E 1950

Fundadora em 1944 Teatro Experimental do Negro • “Se nós mulheres negras do Brasil, estamos
(TEN) no RJ mesmo preparadas para usufruir os benefícios
Assistente social, jornalista, professora e ativista da civilização e da cultura, se quisermos de
contra o “preconceito de cor”, ao menos entre 1948 fato alcançar um padrão de vida compatível
e 1950, quando, lutando contra as hierarquias de
com a dignidade da nossa condição de seres
gênero e raça conduziu a coluna “Fala a Mulher” no
Jornal Quilombo. humanos, precisamos sem mais tardança fazer
política.... Precisamos constituir um exército
“É inacreditável que numa época em que tanto se de eleitoras pesando na balança das urnas, usar
fala em justiça social possa existir milhares de o máximo as franquias democráticas que nos
trabalhadoras como as empregadas domésticas, sem asseguram o direito que é também o sagrado
horário de entrar e sair do serviço, sem amparo na dever cívico de votar e sermos votadas para
doença e na velhice, sem proteção no período de qualquer pleito eletivo nas próximas eleições
gestação e pós parto sem maternidade sem creche de 3 de outubro
para abrigar seus filhos durante as horas de trabalho
23/08/2023
O DEBATE SOBRE A QUESTÃO RACIAL E O RACISMO

• A inserção histórica da questão racial na literatura da profissão é pouco


valorizada e reconhecida no Serviço Social. Esse fato pode ser explicado
pelo vínculo do Serviço Social com perspectivas analíticas hegemônicas que
restringem o campo de pensamento e de atuação profissional ao estudo do
impacto social das relações capital-trabalho.”(Ruby Esther León Díaz/2016)

• O pouco impacto se deve para alguns, à invisibilização do estudo das


relações raciais no bojo das análises de classe (Ribeiro, 2004).

• A marginalidade da discussão sobre a problemática racial derivada da


agenda intelectual do Serviço Social: “questões tidas como muito subjetivas
ou particularistas –a exemplo dos debates sobre gênero e raça–
negligenciadas e consideradas “conservadoras” ou, principalmente a partir
dos anos 90, tomadas pejorativamente como “pós-modernas”” (Góis, 2006,
p. 11)

15/04/2021
FALTA DE ESTUDOS SOBRE AS "QUESTÕES
RACIAIS" NO SERVIÇO SOCIAL

1) pouca quantidade de professores • Eventos internacionais marcantes na luta


universitários do Serviço Social mundial contra o racismo
com pesquisas sobre a “questão • III Conferência Mundial de Combate ao
racial”; Racismo, Discriminação Racial,
Xenofobia e Intolerância Correlata
2) subalternidade dessa questão frente a realizada em Durban em 2001 – o Brasil
outras consideradas prioritárias; saiu signatário

3) ideologia da democracia racial


presente no contexto nacional (Marques
Júnior, 2013).

23/08/2023
CAMPANHA DE COMBATE AO RACISMO – CRESS 7 A.
REGIÃO RIO DE JANEIRO- OUTUBRO DE 2003 ( MAGALI
ALMEIDA, MARLISE VINAGRE E OUTRAS )

23/08/2023
AÇÕES DESENCADEADAS PELAS ENTIDADES ORGANIZATIVAS
DA CATEGORIA (CFESS/CRESS, ENESSO E ABEPSS)
 Criação e o desenvolvimento do GTP “Serviço Social, Relações de Exploração/Opressão de Gênero, Raça/Etnia e
Sexualidades” da ABEPSS;
 Campanha do CFESS “O Serviço Social: Mudando o rumo da história”, de 2003;
 “39º Encontro Nacional do Conjunto CFESS/CRESS” que aprovou a defesa das políticas afirmativas e cotas
raciais por parte do Serviço Social;
 a brochura do CFESS publicada em 2016: “Assistente Social no combate ao preconceito - Caderno 3 ‘Racismo’”;
 Elaboração e mobilização em torno do documento “As cotas na pós-graduação: orientações da ABEPSS para o
avanço do debate” (2017);
 Lançamento da mais recente campanha de gestão do conjunto (2018-2021): “Assistentes Sociais no combate ao
racismo” lançada pelo CFESS em 2018;
 edições do “CFESS Manifesta”, em alusão ao 20 de novembro;
 defesas de teses e dissertações; e,
 as produções em periódicos como as revistas Libertas (2013), Temporalis (2014), Argumentum (2017), Ser Social
(2017) e Serviço Social e Sociedade (2018)

23/08/2023
PUBLICAÇÕES

23/08/2023
“SUBSÍDIO AO DEBATE DA QUESTÃO ÉTNICO-RACIAL NA
FORMAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL” DA ABEPSS

• XVI ENPESS- Vitória/ES em dezembro 2018


• Desafio às entidades da profissão de construir táticas e estratégias
de consolidação do projeto profissional crítico.
• Oferecer subsídios para a inclusão e o fortalecimento do debate da
questão étnico-racial contribuindo para uma formação em Serviço
Social antirracista a partir do desenvolvimento de atividades de
ensino, pesquisa e extensão (graduada e pós-graduada);
• O debate sobre o conceito de raça/etnia é fundamental para a
compreensão da questão social na dialética da formação social
brasileira
• e efetiva superação da secundarização ou “tematização” da
questão étnico-racial na formação, muitas vezes apreendida no
viés culturalista e/ou como um segmento a ser abordado no
conjunto da sociedade.
23/08/2023
CONSTRUINDO UMA PLATAFORMA
ANTIRRACISTA- DEZEMBRO/2020

23/08/2023
SIMPÓSIO SERVIÇO SOCIAL E RELAÇÕES ÉTNICO-
RACIAIS
• Existe um histórico de demandas de espaços para o debate e a sistematização de pesquisas científicas, difusão de
conhecimento produzido, experiências sobre a temática étnico-racial e sua interface com o Serviço Social
• Passados mais de 80 anos de surgimento da profissão, muita coisa mudou, em especial com a entrada massiva de
estudantes negros/as no Ensino Superior, que insistem em conhecer uma outra história
• Chegada de docentes negros/as pesquisadores/as do assunto, aos poucos, novos estudos reforçam que o modo de
produção capitalista foi beneficiário do escravismo e amparou as bases da opressão racial, possibilitando que está
se mantenha e, num movimento circular, continue a sustentar a reprodução do capital.
• Problematizam a naturalização de uma formação acadêmica que reproduz a brancura capitalista e patriarcal como
modelo, que apaga a contribuição dos povos africanos e indígenas na construção da cultura da brasileira e de
todas as américas.
• Total de submissões no sistema 361 (entre resumos e textos finais).
• Anais serão 103 trabalhos completos (escritos por 1, 2, 3 ou 4 pessoas).
• De inscritos mais de 1500.
• 800 pessoas se inscreveram diretamente nos minicursos.
• 20 GTs - uma média de 10 trabalhos apresentados por GT
• Contamos com um dia para a oficina para a graduação.

23/08/2023
CONSIDERAÇÕES FINAIS –RECONHECIMENTO ÉTNICO ,
JUSTIÇA RACIAL E DESENVOLVIMENTO
 Um desenvolvimento sustentável para a América latina só será possível
mediante um enfoque inclusivo, multidimensional e interseccional que
enfrente as desigualdades, o racismo, elitismo e sexismo. Passa pela
construção de estruturas socialmente mais justas, democráticas e
inclusivas.

 Fortalecer a discussão da questão racial de modo sério, crítico e


propositivo na universidade, em particular no curso de Serviço Social, é
algo de grande valia para todes ( para nós negros , os não negros, os
brancos) que terão uma possibilidade de formação politica que até o
momento foi feito de modo exclusivo pelos movimentos sociais negros.
Movimento Negro Educador ( Nilma Lino)
 A universidade tem negado, inviabilizado, e deslegitimado os
conhecimentos dos grupos étnicos minorizados como povos originários ,
população negra e povos e comunidades tradicionais – é o que chamamos
de epistemicídio – rechaçam os saberes construídos fora da Europa e os
construídos fora dos muros acadêmicos.

 Precisamos de uma ambiência democrática para alterar o cenário atual


rumo a transformação social.
23/08/2023
OBRIGADA

• zelma.madeira@uece.br
zelma.madeira@casacivil.ce.gov.br
Professora da Graduação e do Mestrado em Serviço Social da UECE
Assessora Especial de Acolhimento aos Movimentos Sociais do Ceará

23/08/2023

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