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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

PROPRAGAM DE PÓS GRADUAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS


DISCIPLINA: ESTADO, POLÍTICA E TEORIA DE DIREITOS HUMANOS
ESTUDANTE: TAINARA CRISTINA DOS SANTOS

Fichamento n°1: ALMEIDA, Silvio. Raça e Racismo e Racismo e Ideologia. In:


ALMEIDA, Silvio. O que é Racismo Estrutural? Belo Horizonte, Letramento, 2018.
Páginas: 15 a 63.

RAÇA E RACISMO

Silvio Almeida inicia o livro expondo que o conceito de raça faz parte da história
de formação política e econômica das sociedades contemporâneas. Foram as condições
mercantilistas do século XVI que ressignificaram o conceito com a transformação do
homem europeu no homem universal. Se antes, os seres humanos se relacionavam a partir
da sua posição política e religiosa agora também teriam a raça como determinante das
relações sociais.

É com a ascendência da filosofia do Iluminismo, impulsionando a classificação


entre seres humanos e posteriormente a comparação, que as grandes revoluções ascendem
ao passo que também uma dita civilização tem vitória. Então é nesse desejo de expansão
dessa civilização que ascende o colonialismo.
Para Achille Mbembe o colonialismo tinha como objetivo a universalização para levar a
modernidade, porém a violência e o genocídio causado para tal transformaram-no em um
“antiliberalismo”, sendo um de seus grandes obstáculos a Revolução Haitiana.

Negros haitianos escravizados pelo colonialismo reivindicaram a liberdade que a


Revolução Francesa prometera uma vez que ela não havia se estendido aos escravizados.
Eis que a população negra desse país toma o poder, da até então colônia, e declara o Haiti
independente em 1804. É nesse contexto que raça emerge como central nas relações
sociais fazendo com que os franceses vissem a Revolução Haitiana com desconfiança e
medo.
Nesse processo que se constrói o estereótipo, de indivíduos de determinadas culturas,
como sendo “feroz, “bestiais” e “sem história” que é caso dos indígenas e dos negros
africanos. Baseado nessa justificativa que se toma impulso o processo de eliminação
desses povos.
Neste sentido a classificação dos seres humanos serviria como o principal mecanismo do
colonialismo destruindo povos nas Américas, na África, na Ásia e na Oceania.
O espirito positivista surgido do sec. XIX se utilizou de diversas áreas de
conhecimento para justificar as diferenças entre seres humanos, bem como o
determinismo biológico que seria capaz de explicar as diferenças psicológicas, morais e
intelectuais entre as raças. Pele não branca e clima tropical seriam capazes de produzir
comportamentos imorais e violentos e pouca inteligência. Esse pensamento denominado
como racismo cientifico no Brasil tem seus representes Silvio Romero e Raimundo Nina
Rodrigues.

Nesse período, em que o positivismo se utiliza da ciência para justificar o racismo,


o capitalismo entra na sua primeira grande crise e leva as grandes potências mundiais ao
imperialismo. Esse imperialismo, que resulta em um neocolonialismo e invasão da África,
se apoia justamente nesse racismo cientifico ao dizer que esses povos estavam fadados a
desorganização e ao subdesenvolvimento. Raça, então, opera de duas formas:
1) Como característica biológica: onde a identidade é atribuída por algum fenótipo, como
por exemplo a cor da pele.
2) como característica étnico cultural: onde a identidade é associada a origem geográfica
e a outros costumes a “uma forma de existir”.

Preconceito Racismo e Discriminação:

Racismo: É designado uma forma de discriminação que tem a raça como norte
podendo resultar em práticas conscientes ou inconscientes que se concretizam em
desvantagens para determinados indivíduos a depender do grupo que façam parte.
Preconceito Racial: O preconceito é baseado em juízos a partir de estereótipos de
determinado grupo como por exemplo considerar negros violentos, judeus avarentos e
etc.
Discriminação Racial: A discriminação racial está no tratamento diferenciado a
determinados indivíduos. Tem como base o poder onde se atribui vantagens e
desvantagens a determinados grupos raciais. Há discriminação direta e indireta. A direta
é quando há discriminação ostensiva contra determinados grupos como por exemplo a
proibição da entrada de negros em determinados países. A indireta é quando a situação
especifica de determinados grupos raciais é ignorada e caracterizada pela ausência de
intencionalidade explicita. Um grande exemple é a situação de pobreza da população
negra na maioria dos países hoje.
As consequências da discriminação direta ou indireta levam a estratificação social onde
o caminho de vida de grupos de determinadas raças – que inclui ascensão social e
mobilidade social – é afetado.
Ainda há a discriminação positiva, que é o caso da política de cotas, por exemplo, que
tem como objetivo eliminar a discriminação negativa (direta e indireta).
O racismo, portanto, se trata de algo sistêmico onde situações de subalternidade e
privilégio se expressam na política, na economia e em situações do cotidiano.

Três Concepções de Racismo

A fim de entender, de forma didática, Silvio Almeida classifica em três as formas


de racismo: individualista, institucional e estrutural.
O racismo individualista está relacionado a subjetividade de cada pessoa. Segundo essa
concepção não haveriam instituições racistas e sim pessoas racistas. Uma concepção
frágil e limitada. Já o racismo institucional nos diz que as instituições são racistas,
superando a concepção individualista do racismo. As instituições, que são hegemonizadas
por determinados grupos raciais, se utilizam do poder para impor seus interesses políticos
e econômicos. Por último, o racismo estrutural expõe que as instituições são apenas a
concretização de uma estrutura social racista. As instituições são racistas porque a
sociedade é racista. Desse modo as instituições irão reproduzir o racismo de forma
explícita ou implícita.
Quando pensamos o racismo de forma estrutural superamos analises superficiais e
reducionistas e entendemos que o mesmo não necessita de intenção para existir. Não
necessita de intenção uma vez que raça faz parte das relações sociais que se manifesta em
atos concretos (racistas) no interior de uma estrutura, que também é racista, marcada por
conflitos antagônicos.

Racismo Como Processo Político e Histórico

Racismo é processo político uma vez que o sistema estrutural de discriminação


necessita de poder político para se manter, se reproduzir e praticar discriminação caso
contrário seria uma prática impossível. Por isso a ideia de racismo reverso é equivocada
uma vez que minorias podem praticar o preconceito, mas, ainda assim, pessoas brancas
não perdem vagas de emprego por serem brancas. Por isso a ideia de racismo reverso
tem como pano de fundo a vitimização cada vez o privilégio da branquitude é tocado.
A politicidade do racismo se manifesta em duas dimensões:
a) Dimensão institucional: através de regulação jurídica e extrajurídica que tem o Estado
como principal executor uma vez que somente ele pode criar os meios necessários para
que o racismo seja colocado em pratica no cotidiano.
b) Dimensão ideológica: a produção do sentimento de unidade ideológica entre os
indivíduos cujo a criação e recriação é papel do Estado, das universidades, escolas, meios
de comunicação e etc. É nessa dimensão que se mantem a coesão social diante do racismo.

Racismo Como Processo Histórico

Cada sociedade tem sua trajetória que dará ao econômico, ao político e ao jurídico
uma determinada particularidade que só pode ser entendido quando observado a partir de
um olhar histórico, o mesmo acontece com o racismo. Por exemplo, devido ao processo
de formação sócio histórica do Brasil, aqui a discriminação racial está relacionada ao
fenótipo do indivíduo. Já nos Estados Unidos, devido a sua particularidade de formação
sócio-histórica, basta apenas uma gota de sangue negro para ocorrer a discriminação
racial.

RACISMO E IDEOLOGIA
Como Naturalizamos o Racismo?

Silvio Almeida inicia o capitulo com um questionamento: porque pessoas negras


encontram-se em espaços subalternos da hierarquia trabalhista?
Dentre os quatro motivos que o autor cita, dois são baseados em ideias racistas e outros
dois, que são a falta de oportunidades histórica para pessoas negras e a supremacia branca
que está presente em todos os espaços, são meias verdades uma vez que não explicita
estruturalmente o porquê de pessoas não brancas estarem nessa condição e o porquê de
pessoas brancas não estarem.
Além disso o autor faz mais duas indagações: como essas ideias acima podem ser
naturalizadas e justificarem a desigualdade racial e como ele, um home negro, só foi
entender sua negritude após exercer atividade política e pelos estudos?
Essas duas questões podem ser respondidas se entendermos o racismo, além de um
processo político e histórico, como um mecanismo que constrói subjetividades. Na prática
o racismo só consegue se perpetuar se:
1) Fornecer um sistema de ideias que justifiquem a desigualdade.
2) Constituir sujeitos cujo os sentimentos não sejam abalados pela discriminação e
violência racial e ainda normalizarem um mundo separado de brancos e não brancos.
Racismo Ideologia e Estrutura Social

O racismo, ainda que os indivíduos tenham ações conscientes, como ideologia molda o
inconsciente. Suas ações se moldam em uma sociabilidade de constituição historicamente
inconsciente racista.
O racismo como ideologia também constitui todo um complexo de imaginários. A mídia,
por exemplo, é um pilar desses imaginários quando representa mulheres negras como a
empregada doméstica e o homem negro como o bandido. Tanto reproduz esse estereótipo
que em determinado momento convence que esse é o lugar do homem e da mulher negra.
A escola também é outro pilar racista fundamental quando reforça que o processo de
abolição do trabalho escravo foi devido à boa vontade da princesa Isabel e não um
processo de lutas e resistências que tem grandes heróis negros.

Eis que se analisarmos os dados das condições sociais da população negra surge
o seguinte questionamento: não estaria a mídia retratando a realidade já que mulheres
negras são a maioria no emprego doméstico e homens a maioria dos encarcerados?
Não! Pois o que nos é apresentado é uma representação do imaginário social das pessoas
negras. A ideologia não é real é, portanto, a relação que temos com as relações concretas.
A ideologia é mais que tudo uma prática. O imaginário do negro criminoso não poderia
sustentar-se sem um sistema de justiça seletivo, sem a guerra as drogas e sem o
encarceramento em massa da população negra.
O racismo é ideologia desde que seja ancorado por práticas concretas. As mulheres
negras, por exemplo, são consideradas “pouco capazes” pois na prática existe todo um
sistema jurídico, econômico e político que propaga essa condição de subalternidade das
mesmas.

Um último ponto ressaltado por Silvio Almeida, neste tópico, é sobre a construção de
branquitude e negritude. Uma pessoa branca não nasce branca assim como uma pessoa
negra não nasce negra mas sim, torna-se a partir do momento em que sua mente é
conectada a toda uma rede de estereótipos produzidos pelos meios de comunicação, pelo
sistema educacional, pelo sistema de justiça em conjunto com a realidade.

Racismo Ciência e Cultura


A ciência, dotada de grande autoridade inquestionável, tem um grande papel na
irracionalidade racista. Produzindo um discurso autorizado sobre a verdade, os filósofos
tiveram grande importância para a construção do nazismo, do colonialismo e do
apartheid. No Brasil, o racismo contou com as faculdades de medicina, com as escolas de
direito e com os museus de história nacional para se legitimar, a partir da ciência,
inicialmente.

Branco Tem Raça?

A existência do racismo também se dá a partir da dominação de um grupo racial


sobre o outro, a questão é que devemos entender em que circunstâncias em que essa
dominação se dá. A ideia de supremacia branca (supremacia do grupo racial
branco/dominação do grupo racial branco) nos ajuda a entender o racismo quando
associadas a ideia de hegemonia branca e branquidade/branquitude.

A branquitude pode ser entendida como uma posição, que sujeitos brancos
ocupam, onde foram sistematicamente privilegiados ao acesso de recursos materiais e
simbólicos. Já a supremacia branca pode ser entendida como uma forma de dominação
que além de utilizar o poder também se utiliza da força em si e, principalmente, estabelece
consensos ideológicos a cerca dessa dominação.
Portanto, o ser branco e o ser negro são construções sociais. Assim como os privilégios
fazem alguém branco são as desvantagens sociais e as condições sócio-históricas que
fazem alguém negro.

O ser branco se torna uma contradição uma vez que nega sua identidade e atribui
identidade a outros povos. É uma raça que não tem raça, por isso o fato do ser branco
chamar outros grupos, não brancos, de identitários uma vez que esse modo de lidar com
a questão é uma forma de afirmar sua própria identidade.
Isso se dá de forma diferente para pessoas brancas que fazem parte de países da periferia
do capitalismo. Além de negarem suas identidades precisam, também, afirmar sua
branquitude uma vez que ela é sempre questionada. O branco periférico não está no topo,
como o europeu e o norte-americano, ainda que seja branco em sua linhagem sempre terá
um negro e/ou um índio.
Neste sentido a formação cultural, político institucional e econômica de cada país será
essencial para que a condição de negro ou de brancos seja atribuída aos indivíduos.
Racismo e Meritocracia
A meritocracia é eficaz a economia, mas também a política uma vez que a pobreza,
a falta de empregos e a privação material é atribuída a falta de mérito dos indivíduos. No
Brasil a negação do racismo e a ideologia da democracia racial se sustentam pela
meritocracia. Aqui, segundo a afirmação anterior, não há racismo e a desigualdade entre
pessoas negras e brancas é exclusivamente responsabilidade de pessoas negras, que não
fizeram de tudo que estava em seu alcance. A meritocracia, no Brasil, é altamente eficaz
para produzir e reproduzir a ideologia de conformação das desigualdades raciais.

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