RESUMO: O conceito de raça é dinâmico, moldado pelo tempo e contexto político,
cultural e econômico. Originou-se na expansão comercial europeia, transformando o homem europeu em padrão universal. O colonialismo justificou destruição em nome da civilização, embasada em supostas diferenças biológicas. Racismo é discriminação baseada em raça, enquanto discriminação envolve tratamento diferenciado, direto ou indireto. Racismo pode ser individualista, institucional ou estrutural, relacionando-se com subjetividade, Estado e economia. A discriminação institucional mantém padrões discriminatórios, perpetuando o domínio racial. O conceito de racismo reverso é questionado, destacando a importância das experiências históricas na compreensão do fenômeno.
A raça e o racismo são temas complexos e debatidos, com raízes históricas
profundas. A visão antropológica oferece uma perspectiva valiosa para analisar essas questões. A antropologia destaca a natureza social da raça, evidenciando que não é uma categoria biológica, mas uma construção social moldada por fatores culturais e históricos. Além disso, essa disciplina ajuda a examinar as origens históricas do racismo e suas implicações contemporâneas, incluindo desigualdades sociais e discriminação. A antropologia desempenha um papel importante na desconstrução de estereótipos e na promoção da igualdade, contribuindo para uma compreensão mais profunda da diversidade humana. Neste estudo, aprofundaremos esses temas da perspectiva antropológica, visando uma sociedade mais justa e inclusiva.
2 DESENVOLVIMENTO
O conceito de raça é um termo dinâmico que sofre diversas alterações
com o passar do tempo, o que mostra que o mesmo está intrinsicamente ligado ao contexto em que estamos inseridos, seja político, cultural ou econômico. A classificação da raça humana surge com a expansão comercial da burguesia e da cultura renascentista europeia que irá transformar o homem europeu, no homem universal, a versão ideal da humanidade, e todos aqueles que não são condizentes a essa raça, são variações menos evoluídas. Surge então a distinção filosófico- antropológica entre civilizado e selvagem, que no século seguinte daria lugar para o dístico civilizado e primitivo. Com as grandes navegações e o choque cultural do encontro do “homem ideal” com os primitivos, em um processo, denominado colonialismo, onde o homem europeu busca levar a civilização para onde ela não existia para apresentar todos os benefícios da liberdade, da igualdade, do Estado de direito e do mercado irá despontar um processo de destruição, morte, desvalorização em nome da civilização dos povos “sem cultura”. Os atos de destruição tornam visíveis que por trás da busca da civilização, o projeto liberal-iluminista não tornava de fato todos os homens iguais, e nem sequer reconheciam os mesmo como seres humanos, já que muitos foram escravizados ou sofreram diversos tipos de humilhações. Para justificar os acontecimentos, o europeu se apoia a biologia e a física, buscando na ciência respostas para a diversidade humana, dando origem a ideia de que características biológicas (determinismo biológico) e condições ambientais (determinismo geográfico), seriam capazes de explicar as diferenças morais, psicológicas, culturais e intelectuais, bem como toda a diferença entre as raças. A pele não branca, clima tropical eram justificativas de comportamentos imorais, violentos, além de indicarem pouca inteligência, justificando assim os atos do homem europeu, contra as outras raças, já que essas eram menos desenvolvidas e até perigosas ao homem ideal, e por isso, deveriam “servir” e “aprender” com o homem europeu, isso seria racismo? O racismo é uma forma de discriminação, que tem a raça como fundamento, podendo se manifestar por meio de práticas conscientes e inconscientes que irão trazer a determinados grupos de pessoas desvantagens, ou privilégios para indivíduos, dependendo do grupo racial ao qual pertencem, no entanto, racismo, discriminação racial, e o preconceito racial, embora haja relação, são conceitos que trazem diferentes entendimentos, sendo de suma importância entender os mesmos, para então combater eles. O preconceito racial são os estereótipos acerca dos indivíduos que pertencem a determinados grupos, que pode ou não resultar em práticas discriminatórias. Já a discriminação racial é a atribuição de um tratamento diferenciado a indivíduos de determinados grupos racialmente identificados, então essa, exige necessariamente que haja poder na relação, ou seja, há a possiblidade efetiva do uso da força, pois sem ela, não seria possível atribuir vantagens ou desvantagens. A Discriminação pode ser ainda, direta ou indireta. Na primeira, a discriminação direta, requer que haja a intenção de discriminar através da imposição de um tratamento desvantajoso, é o repúdio ostensivo aos sujeitos, sem nenhuma máscara, como países que proíbem a entrada de determinados imigrantes. Todos são discriminados a partir de um único vetor. Por isso, para Adilson José Moreira, é um conceito “incompleto” para definir a complexidade desse fenômeno, a discriminação. Já a discriminação indireta, é marcada pela ausência explícita da intenção de discriminar, ou seja, a situação de grupos específicos é ignorada, ou enfrentada sobre a visão da neutralidade racial, não levando em conta as diferenças sociais significativas que diversos grupos enfrentam dentro de um espaço geográfico. O fato é que há consequências da discriminação, seja direta ou indireta, e a principal delas, é a estratificação social. Um fenômeno que afeta todas as gerações de um grupo discriminado, o qual terá suas chances de ascensão social, e a construção do materialismo histórico prejudicados devido a um processo de discriminação. Além da segregação racial, que se torna ainda mais visível, pois há a divisão geográfica dos grupos discriminados, seja as periferias, guetos e bairros afastados, e o reconhecimento e definição de determinados estabelecimento comerciários, ou serviços públicos (hospitais ou escolas), para determinados grupos. Com a definição da diferença de discriminação, racismo e preconceito, precisamos elencar as concepções de racismo, sendo elas, individualista, institucional e estrutural. Essas seguem aos seguintes critérios, respectivamente: a) relação entre racismo e subjetividade; b) relação entre racismo e Estado; c) relação entre racismo e economia. Na concepção individualista, o racismo é entendido como uma patologia, ou anormalidade no comportamento humano, seria um fenômeno ético isolado, de caráter individual, ou coletivo, mas atribuído a pequenas porcentagens da população, sob este ângulo, não existe uma sociedade, ou instituição racista, mas indivíduos que não representam a sociedade, está ligado à sua educação e formação particular, não sendo um problema do Estado, ou das instituições. Já a concepção institucional, significa um importante avanço no entendimento acerca do estudo das relações raciais. Nela, não se resume a um comportamento individual e isolado, mas é tratado como um problema do Estado e também das instituições, já que as mesmas, são atravessadas pelo primeiro. É entendido como o resultado do funcionamento das instituições e como a estabilidade dos sistemas sociais dependem da capacidade dessas instituições de absorver, e normalizar os conflitos inerentes da vida social, estabelecendo normas que irão orientar as ações dos indivíduos, moldando os mesmos como sujeitos, e também seus comportamentos. Os conflitos raciais também são parte das instituições. E a desigualdade social se torna uma característica da sociedade, não apenas pela atitude de grupos isolados, mas também, porque as instituições são hegemonizadas por determinados grupos raciais que utilizam mecanismos institucionais para impor seus interesses políticos e econômicos. No racismo institucional, o domínio se dá com o estabelecimento de parâmetros discriminatórios, os quais farão com que o grupo racial que esteja no poder, permaneça sempre o mesmo, e ainda, que se tornem o horizonte civilizatório da sociedade, ou seja, os padrões estéticos e culturais se tornam exemplo de ser bem- sucedido e de possuir poder. O domínio de homens brancos em cargos de instituições públicas e privadas, não é de hoje, pois, desde sempre, existem regras e padrões que dificultam a ascensão de negros e mulheres, sendo esse, o primeiro motivo de porquê o mesmo grupo racial se mantém no poder, e o segundo, é a inexistência de lugares, para a discussão sobre os padrões e a desigualdade racial, tornando normal o domínio do grupo de homens brancos. Na concepção estrutural compreendemos que as instituições são apenas a materialização de uma estrutura social ou de um modo de socialização que tem o racismo como um de seus componentes orgânicos, ou seja, as instituições são racistas porque a sociedade é racista. O racismo é parte da ordem social, não é algo criado pela instituição ou pelos seus grupos dominadores, mas é reproduzido por estes, ou seja, é de opção da instituição se posicionar, ou não, contra os conflitos de ordem social. Com isso, apresentamos o racismo como processo político e como processo histórico, respectivamente. O racismo é um processo político, pois como todo processo, depende de um poder político, pois caso contrário, se não houvesse poder, não haveria a discriminação sistemática de grupos inteiros sociais, o mesmo tem grande influência no processo de organização da sociedade. Com isso, trazemos a ideia do racismo reverso e como sua execução na prática seria impossível, pois, grupos minoritários podem até ser preconceituosos ou terem atitudes discriminatórias, porém, como apresentado anteriormente, o racismo necessita de poder para acontecer, sendo assim, os grupos que estão no poder são sempre os mesmos, e com isso, grupos minoritários, não possuem poder para de fato serem racistas. O próprio termo “reverso” traz um questionamento interessante, já que, para ser reverso, algo tem de estar fora da normalidade, tem de haver uma inversão de valores normais, sendo assim, o racismo contra a minoria é algo tido como normal. O racismo reverso, é um conceito criado apenas para deslegitimar as demandas por igualdade racial. Já o racismo como processo histórico, se dá, devido ao fato de que o mesmo também é estrutural, com isso, não podemos compreender o racismo apenas através de uma derivação automática dos sistemas econômicos e políticos, cada sociedade possui uma trajetória singular que dará ao econômico, ao político e ao jurídico, particularidades que só podem ser apreendidas quando observadas as respectivas experiências históricas. Com isso, o racismo se transforma durante sua jornada e durante a jornada de construção de cada Estado, sendo assim, as classificações raciais tiveram suma importância para definir as características sociais e a legitimidade na condução do poder estatal.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em conclusão, o texto proporciona uma análise minuciosa sobre a dinâmica
do conceito de raça, revelando sua estreita ligação com o contexto sociopolítico. Ao explorar a trajetória desde a expansão comercial europeia até as justificativas científicas para o racismo, evidencia-se a construção ideológica que perpetuou desigualdades e discriminações. A distinção entre preconceito e discriminação, assim como as diferentes concepções de racismo, enriquecem nossa compreensão do fenômeno. A análise estrutural ressalta o papel crucial das instituições na manutenção do racismo, destacando sua natureza política e histórica. Diante disso, compreender a complexidade desses fenômenos é essencial para enfrentar e transformar as estruturas que perpetuam a injustiça racial em nossa sociedade.
4 REFERÊNCIAS
ALMEIDA, S. Racismo estrutural. São Paulo: Pólen, 2019. 264 p. ISBN 978-85- 98349-75-6.