Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Espiritualidade Ou Teologia Espiritual
Espiritualidade Ou Teologia Espiritual
ou
TEOLOGIA ESPIRITUAL
HISTÓRIA DA ESPIRITUALIDADE
PRIMEIROS SÉCULOS
É evidente que a primeira escola espiritual é a de
Jesus, de Maria, dos apóstolos, discípulos, evangelis-
tas, mártires, virgens, pregadores, carismáticos refe-
ridos no Novo Testamento e na História da Igreja.
Todos eles seguiram de perto as pegadas do Mestre,
cumprindo sua palavra: “Sede perfeitos como o Pai
celeste é perfeito” (Mt. 5, 48). Mas é bom lembrar que
já S. Paulo advertia que, em Corinto, nem todos eram
tão perfeitos (1Cor 5-6; 2Cor 10-11). É a realidade da
Igreja, que reaparecerá nestes vinte séculos.
A IGREJA PRIMITIVA
Na Igreja primitiva surgem santos e escritores,
que não só exercitam mas apontam as exigências do
evangelho no mundo greco-romano. São os mártires,
as virgens, os fundadores de igrejas. Devido às per-
seguições, que logo começam, há dispersão para ou-
tras cidades, e até para os desertos. As igrejas mais
organizadas, como de Roma, Antioquia e Alexandria,
já vão registrando não só as Atas dos Mártires, mas
os escritos espirituais, principalmente cartas, trata-
dos, sermões.
É bom assinalar um fenômeno que mais tarde vai
dar origem ao monaquismo e à vida religiosa: as vir-
gens e os anacoretas (S. Antão, S. Pacômio), mais
tarde monges que “fogem do mundo” e se dedicam à
dura ascese, muitas vezes por necessidade. É preci-
8
PATROLOGIA LATINA
S. CIPRIANO (+258): escreve Sobre as virgens;
O Pai-nosso; Os lapsos. S. AMBRÓSIO (+397): So-
bre os ministros; Sobre as virgens; Sobre as viúvas.
S. JERÔNIMO (+420): Cartas; Tradução da Bíblia.
STO. AGOSTINHO (+430): Confissões. CASSIANO
(+433): Os Cenobitas; Conferências. S. LEÃO (+461):
Sermões. S. GREGÓRIO (604): Livros Morais; Co-
mentário de Jó. S. ISIDORO de Sevilha (+636): Re-
gra dos Monges. S. BENTO (480-543) deixou sua
célebre “Regra” para seus monges. Com razão é
chamado “Pai dos Monges”, “Patriarca do Ocidente”.
Enfrentou “com a cruz e o arado”, os bárbaros, com o
lema: “Ora e trabalha”. “Nobre que se fez camponês,
fundou a nova Europa”.
IDADE MÉDIA
Séculos 8º-9º : S. BEDA, Venerável (+735): Ho-
milias. S. TEODORO Estudita (+826): Catequese.
JOÃO Aurelianense (+843): Manual para leigos. Ab-
don SMARAGDO (+843): Vida de S. Bento. S. PE-
DRO DAMIÃO (+1072): Cartas e Sermões. SIMEÃO,
o Teólogo: Sermões.
Escola Beneditina: Sistematiza elementos da es-
piritualidade dos séculos anteriores: Sto. ANSELMO:
(+1109): Meditações, Orações. S. BERNARDO
(+1153), da abadia de Cister: Sermões e vários escri-
tos espirituais. Pregador da Segunda Cruzada. Sta.
HILDEGARDA (+1179), Sta. GERTRUDES, Sta. MA-
TILDE, Sta. BRÍGIDA: Revelações. JOÃO DE CAS-
TEL, LUÍS BARBO (+1443).
10
1
Ver A. TANQUEREY, Compêndio de Teologia Ascética e Mística, Porto,
1932, Ed. Apostolado, p. XIII-XLVIII. ROYO MARIN, Teologia de la Perfectión
Cristiana, Madrid, 1962, BAC. p. 1 – 24.
2
Obras de Sto. Afonso em português: Veja Catálogo da Ed. Santuá-
rio,em http://www.redemptor.com.br/site/index.php?id_secao=26
17
I. PARTE
ASCESE E MÍSTICA
1. D E U S
3
Veja “Leituras”, mais abaixo.
20
LEITURAS
Sto. Agostinho: “O pôr-do-sol dourava a vastidão
das águas. Perguntei: Ó grande oceano, és tu meu
Deus? E o bramido das ondas responde: - Não sou;
suba mais alto. E as estrelas surgiram a brilhar no
firmamento Perguntei: Sois vós o meu Deus? - Não,
suba mais alto. E vós, bem-aventurados do céu?
Fascinado pergunto: Sois vós o meu Deus? - Não, vai
mais alto. Enfim, chegando ao trono da majestade, da
luz, da felicidade: SOU EU, disse.”
S. Francisco, Cântico do Sol : “Louvado sejas,
meu Senhor, com todas a tuas criaturas, especial-
mente o senhor irmão sol, que clareia o dia. Louvado
23
4
J. BETING: Teologia das Realidades Celestes, pg. 21.
25
2. O HOMEM
− Depois de considerar Deus, a espiritualidade
moderna olha logo o homem, destinatário da revela-
ção, objeto da redenção, do amor de Deus. Enfim, é
ele o rei da criação, mesmo com todas as limitações
e misérias. “Ó feliz culpa, que nos mereceu um tal
Salvador”, canta a Liturgia.
Evidentemente, conforme a linguagem antiga,
homem (homo) significa homem (vir) e mulher. Usa-
mos também aqui mais a antropologia tradicional. É
esta imprescindível para entender a espiritualidade
antiga. A espiritualidade atualizada sente dificuldade
com uma antropologia e psicologia eivadas de mate-
rialismo, que nega a alma e professa o evolucionis-
mo, determinismo. Uma aproximação bíblica também
cria dificuldades, pela idéia unitária do semita sobre o
homem, contrário ao dualismo grego tradicional. Com
efeito, na Bíblia, termos como carne, alma e espírito,
embora poucas vezes nomeados, têm um sentido
impreciso para nossa cultura greco-latina.
Também para entender os santos e autores da
bibliografia clássica do início, é preciso conhecer a
antropologia e psicologia da Patrística e da Escolásti-
ca, usadas na filosofia e teologia. Conceitos como
composição, potência, virtude do homem, bem como
aspectos negativos e limitações como: tentação, ví-
cio, pecado, unidade e divisões do homem, e a pró-
pria morte são conceitos estranhos a muitos. Até a
ressurreição fica difícil de explicar e, mais ainda o
que diz o Credo: “Desceu aos infernos”. Fica difícil
também achar um equilíbrio entre otimismo e pessi-
26
LEITURAS
Gênesis: “Então o Senhor Deus formou o homem
do pó da terra, soprou-lhe nas narinas o sopro da vi-
da e o homem tornou-se ser vivo. Deus criou o ho-
mem à sua imagem, macho e fêmea os criou” (Gn 2,7
e 1, 27).
Jó: “Pereça o dia em que nasci. Porque não morri
ao deixar o ventre materno? (3,3). (Mas) sei que meu
Redentor vive e no último dia verei a Deus, meu Sal-
vador” (19,25).
Eclesiastes: “Vaidade das vaidades! Que proveito
tira o homem de todo o trabalho? (1,2-3). Por mais
anos que o homem viva, deve lembrar-se que os a-
nos sombrios serão muitos (11,8). Lembra-te do Cri-
ador, antes que cheguem os dias de achaque (12,1).
Teme a Deus, pois Ele julgará todas as coisas, mes-
mo ocultas” (12,13-14).
Tauler: “Ó alma, apressa-te a voltar para casa.
Esquece tudo que viste cá fora. Vais encontrar Deus
5
R. ZAVALLONI: Le struture umane della vita spirituale, Morcelliana, 1971.
30
6
Boa bibliografia sobre o homem: ALEJANDRO ROLDÁN: Ascética e Psico-
logia, Livro Ibero Americano, Rio, 1969. LÉON BONAVENTURE: Psicologia e Vida
Mística, Vozes, 1975.
31
3. JESUS CRISTO
Foi no final da Idade Média que os autores espiri-
tuais e os santos começaram a dar uma orientação
mais cristocêntrica à espiritualidade. Começam as
conhecidas devoções ao presépio, Paixão, SS. Sa-
cramento e, tempos depois, ao Coração de Jesus.
Além de indicar tais meios e outras devoções, deve-
se destacar o papel fundamental de Jesus na santifi-
cação dos fiéis. O princípio é a configuração com
Cristo. Seremos santos na medida em que vivemos a
vida de Cristo. São aduzidas três razões: Jesus é
causa meritória da vida espiritual. É também causa
exemplar. Exerce um influxo poderoso no Corpo Mís-
tico.
Os temas cristológicos que interessam à espiritu-
alidade, além de muitos outros que dizem respeito à
cristologia, são os sugeridos por J. Maritain:
A VIDA DE CRISTO
O primeiro passo é conhecer bem, pela leitura
freqüente, os evangelhos. Ler atentamente os outros
livros do Novo Testamento, principalmente as cartas
de S. Paulo, onde se pode descobrir as interpreta-
ções teológicas da Igreja Primitiva sobre os fatos
principais da vida de Jesus: em Belém, Nazaré, vida
pública, Jerusalém, Judéia, Galiléia, Samaria e final
de sua vida. Aí veremos seu peregrinar, sua missão.
Entre muitas interpretações, Paulo vai falar do
“sacramento escondido. Do mistério de Cristo... no
qual habita a plenitude da divindade”. Fala da “exce-
lência do conhecimento de Cristo Jesus”. Pedro e Jo-
32
4. O ESPÍRITO SANTO
Falar de espiritualidade é falar do Espírito Santo.
Nas primeiras páginas da bíblia “um vento impetuoso
soprava sobre as águas”.
Jesus logo afirma que “o Espírito sopra onde
quer”. Esta ação muito subtil e poderosa vai esten-
der-se na História, desde a Igreja primitiva até nossos
dias, com uma ação privilegiada nas almas místicas.
Remeto à dogmática e ao CIC quanto às doutri-
nas fundamentais.
Um motivo, talvez, da dificuldade do Espírito San-
to sejam as imagens muito subtis usadas: a pomba –
que lembra o Gênesis − e o vento tempestuoso, o
ruído, as línguas de fogo, fenômenos próprios das
teofanias. A renovação carismática trouxe de volta o
Espírito Santo, com seus carismas, seus dons de o-
ração, de línguas, de cura. As Igrejas Orientais têm
em grande conta o Espírito Santo. Vejamos alguns
pontos importantes, inclusive para a mística.
S. Paulo, citando Is 32,15 diz aos Coríntios que
todo cristão tem o Pneuma e seus dons (1Cor 12)
Cita os efeitos extraordinários dos quais dá exem-
plos. Toda a força da comunidade depende dele. Le-
va o fiel a clamar: Abbá, Pai! Dá testemunho que Je-
sus é Filho de Deus (Gl 4,6; Rm 8,14). Sua ação mo-
ve a missão. E ressalta: “O Senhor é o Espírito”. O
Senhor opera pela força do Pneuma. A unidade dos
membros é operada por Ele.
36
OS FRUTOS
Os frutos distinguem-se dos dons, como os frutos
dos ramos. São estudados com relação às virtudes,
como veremos logo. Sto. Tomás (II-II, 8, 7) estuda
detalhadamente os frutos, relacionando-os com as
bem-aventuranças e dons. Assim, a fé e a alegria
correspondem ao entendimento e à segunda bem-
aventurança, à qual corresponde também o dom da
ciência. À terceira bem-aventurança correspondem o
dom do temor e os frutos da continência e castidade.
E assim Sto. Tomás vai tecendo um nexo muito razo-
ável das bem-aventuranças, dons e frutos, mostrando
também os vícios opostos.
40
LEITURAS
Os Santos Padres, principalmente orientais, têm
constantes e excelentes testemunhos sobre a Santís-
sima Trindade e o Espírito Santo presentes em nós.
Sto. Inácio de Antioquia chama os cristãos de
theóphoroi, ou portadores de Deus. Sta. Luzia: “As
palavras não podem faltar àqueles que têm em si o
Espírito Santo”. S. Basílio: “O Espírito Santo, por sua
presença, torna-nos mais e mais espirituais e con-
formes à imagem do Filho Único.” Sto. Ambrósio diz
que o recebemos no batismo. Sto. Agostinho: “Não
só a graça, mas Deus nos deu o Santo Espírito e
seus sete dons. Sto. Epifânio: “O Espírito Santo, que
falou nos apóstolos e habita nos santos...”7
Sto. Tomás: “Os dons distinguem-se das virtudes:
estas realizam atos de um modo humano; os dons,
de modo sobrenatural. Assim, os dons são superiores
às virtudes: agem de modo mais alto. Os dons me-
dem-se por regra distinta daquela da virtude humana:
a divindade, participada pelo homem, para que não
opere humanamente, mas por Deus. O dom não é
mais perfeito em todas as condições, mas no modo
de operar” (III das Sentenças, d. 34, q. 1 e seguintes).
Leão XIII: “O justo, que vive da vida da graça e
opera pelas virtudes, tem absoluta necessidade dos
sete dons. Por eles o espírito do homem fica elevado
e apto para obedecer com mais facilidade e presteza
às inspirações e impulsos do Espírito Santo. São eles
7
GARRIGOU-LAGRANGE, Les trois âges . . . , cap. IV, pg. 129s.
42
5. A IGREJA
Este tema, muito rico, geralmente é remetido para
a Eclesiologia, parte da Teologia Dogmática. Aqui
entendemos por Igreja tanto a Igreja universal, como
a particular, local e mesmo as comunidades.
Na vida concreta, tanto cristã como espiritual, a
idéia de Igreja é a pedra de toque para a vida cristã e
espiritual. Assembléia, esposa, mãe, mestra, escola
de fé, amor e muita esperança, e fonte de todas as
virtudes, tem chamado a atenção do mundo. Talvez
bastasse ler a “Lumen Gentium”, a Constituição sobre
a Igreja, mas cito um exemplo: J. Maritain, que era
conhecido na Igreja, recolheu-se como leigo na hu-
milde comunidade dos Irmãozinhos de Jesus. São
dele as teses que seguem, sobre a Igreja.
1. Os membros da Igreja, nesta terra, são todos
pecadores, mas a Igreja é sem pecado.
2. A Igreja tem personalidade: é uma pessoa.
3. É infalível.
4. É a plenitude do Cristo: o pléroma.
5. É penitente e sofredora.
6. A Igreja está no tempo e na glória.
7. Pedro é a autoridade espiritual e temporal.
8. A Igreja tem uma estrutura.
9. Tem presença visível e invisível.
10. A pessoa da Igreja é indefectível; as pessoas,
não.
11. Ela tem uma História.
12. Deve-se distinguir entre Igreja e pessoas da
Igreja.
44
6. MARIA
MARIA, EXEMPLO DE PERFEIÇÃO.
A Mariologia trata dos aspectos teológicos bási-
cos de Maria, como os privilégios da Imaculada Con-
ceição e da Maternidade Divina, das virtudes, da in-
tercessão, do culto. Aqui trataremos apenas de dois
aspectos: Maria, como modelo de perfeição e culto
mariano. Isto é, veremos como Maria se reflete em
nossa vida e como podemos responder com nossa
devoção.
Maria, por assim dizer, está entre Jesus e os san-
tos, como exemplo de mulher simples de Nazaré,
mas mulher cheia de fé em Deus, e de confiança em
Jesus, seu filho. A Mariologia, em seus princípios, foi
tratada com especial atenção no célebre capítulo VIII
da Constituição Lumen Gentium e, assim, inserida no
conjunto da Igreja. O culto mariano foi objeto da exor-
tação de Paulo VI, Marialis Cultus, de 1974. 8
Em que sentido Maria é exemplo de santidade e
perfeição para nós? A pergunta é muito pertinente
pois, se olharmos Maria como Mãe de Deus, Imacu-
lada, Sempre Virgem, Perfeitíssima, Assunta aos
Céus, sua vida e exemplos podem parecer inacessí-
veis. A Lumen Gentium tratou indiretamente desta
questão quando fala da missão de Maria na econo-
8
É enorme a bibliografia mariana, nem sempre acessível em portu-
guês. Indicamos: SANTO AFONSO: Glórias de Maria Santíssima, Ed. Santuário.
RANIERO CANTALAMESSA: Maria, um espelho para a Igreja, Ed. Santuário,
1992. CARLOS IGNACIO GONZÁLES: Maria, evangelizada e evangelizadora, Ed.
Loyola, 1990. RENÉ LAURENTIN: A questão marial, Ed. Paulistas, Lisboa, 1966.
JOSÉ CEGALLA: Maria, exemplo do cristão, Ed. Santuário, 1976.
46
7. OS SANTOS
QUE É SANTIDADE
Eis um tema que lembra Abraão: “Olha para o
céu e conta as estrelas se fores capaz!” (Gn 15,5).
Fácil para nós, católicos; difícil para um evangélico.
Aqui já lembro a delicadeza do tema ante a exigência
do ecumenismo. (Vat.II, UR, 5s)
Acho que os santos foram aqueles que acultura-
ram, em sua vida e em seu tempo o evangelho, e
praticaram perfeitamente o que aqui se expõe. Na
Bíblia é fácil achar o termo santo ou um correspon-
dente. Santo é aquilo que está afastado, separado do
impuro ou profano, reservado para o serviço de Deus.
Deus é Santíssimo por estar nos altos céus: “Santo,
Santo, Santo”. Jesus é santo porque é o Verbo En-
carnado. No Monte Tabor mostrou ele sua glória, ao
mesmo tempo que conversava com os santos Moisés
e Elias. Os três santos apóstolos, separados dos ou-
tros, entenderam a glória e a paixão só depois da
ressurreição.
Os cristãos freqüentemente são chamados san-
tos porque, pelo batismo, foram consagrados a Cristo
(Rm 1,7; 1Cor1,2).
O Vaticano II diz que “Cristo, com o Pai e o Espí-
rito Santo, é o único santo” e que “todos são chama-
dos à santidade”. Os teólogos explicam, distinguindo
a santidade ontológica, que é de todos fiéis, e a san-
tidade moral, que é a dos Santos, principalmente os
reconhecidos pela Igreja.
51
LEITURAS
Sta. Teresa fala do pecado venial deliberado: “É
como se alguém dissesse: Senhor, apesar de esta
ação vos desagradar, não deixarei de a fazer. Não
ignoro que vós a vedes, sei que vós não a quereis,
mas eu prefiro a minha fantasia e a minha inclinação.
E seria coisa de nada proceder desta sorte? Quanto
a mim, por mais leve que seja a falta em si mesma,
acho, pelo contrário, que é grave e muito grave”.9
Sta. Catarina de Gênova: “Se a alma descobrisse
outro purgatório mais terrível, nele se precipitaria, im-
pelida pela impetuosidade do amor entre Deus e ela,
a fim de se livrar rapidamente de tudo o que a separa
do Sumo Bem”.10
Pe. Lallemant: “A ruína das almas vem da multi-
plicação dos pecados veniais, que causam a diminui-
ção das luzes e inspirações divinas, das graças e
consolações interiores, do fervor e coragem para re-
sistir aos ataques do inimigo. Donde se segue a ce-
gueira, a fraqueza, as quedas freqüentes, o hábito, a
insensibilidade, porque, contraída a enfermidade, pe-
ca-se sem sentimento do próprio pecado”.11
9
Caminho da Perfeição, cap. 41.
10
Purgatório cap. 9.
11
A Doutrina Espiritual, 3º. princípio, cap. II.
60
9. A GRAÇA
12
M. SCHMAUS: Teologia Dogmática, V, pg. 21.
62
13
M. SCHMAUS: ibid. p. 253.
65
14
J. BETTING, o. c. p. 37s.
66
10. SACRAMENTOS
15
Veja, por ex., M. M. PHILIPON: Os Sacramentos na Vida Cristã, Ed. A-
gir, 1959.
69
EUCARISTIA
É o sacramento e a devoção por excelência dos
santos, místicos. Seria exceção rara encontrar no úl-
timo milênio um santo, principalmente místico, que
não tivesse devoção eucarística.
− Sto. Afonso escreveu suas célebres Visitas ao
Santíssimo Sacramento: um liturgista criticou-as co-
mo um empecilho para a reforma litúrgica. Também
os santos e místicos têm suas razões e seus limites.
− Tanto a preparação para a comunhão como a
ação de graças têm caído em desuso: é bom lembrar
o que se disse do “maior fervor” exigido nos sacra-
mentos.
− Interessante ver como uma santa teve tanta in-
fluência na devoção eucarística: a festa de Corpus
Christi foi criada por inspiração da Beata Juliana, no
século 13; para essa festa Sto. Tomás de Aquino
compôs belíssimos hinos.
MATRIMÔNIO
É hoje um sacramento muito valorizado. O Concí-
lio Vaticano II dedicou-lhe um capítulo na Gaudium et
spes (n. 47ss.). Também a nova visão e dinamização
do apostolado leigo tem levado os leigos e suas as-
sociações a olhar mais a espiritualidade do sacra-
mento, que é “princípio e fundamento da sociedade”
(A.A. 11). Na segunda parte, ao se tratar da espiritua-
lidade moderna, voltará o tema do apostolado leigo e
do matrimônio.
72
LEITURAS
Sto. Tomás (+1274) e sua doutrina sobre o méri-
to:
− Mérito é o valor de uma obra que se faz digna
de recompensa.
− O homem não pode, só com suas forças natu-
rais, fazer obras meritórias para a vida eterna. O mé-
rito supõe a graça.
− O justo pode merecer, por suas obras, o au-
mento da graça e dos dons e virtudes, que levam à
vida eterna e aumento de glória.
− Não importa a classe de obra que se faz, mas o
motivo e modo. A obra mínima, feita com grande a-
mor, para agradar a Deus, é mais meritória que gran-
de empresa com menor caridade ou mesclada de
motivos imperfeitos.
− Para aumento efetivo da caridade é necessário
um ato mais intenso que o habitual.
− Ninguém pode merecer a primeira graça e a
graça da perseverança, mas pode merecer para os
outros.
− A dificuldade de uma obra boa não aumenta o
mérito a não ser indiretamente.
− É ilusão o cristão, que peca gravemente, pen-
sar que, com a penitência, vai recuperar todos os mé-
ritos, ou no mesmo grau.
73
11. AS V I R T U D E S
Eis aí um tratado muito valorizado nos manuais
tradicionais de teologia moral e espiritual, mas hoje
meio esquecido: abandono da ética do tipo grego.
Mas, para se entender a espiritualidade tradicional,
este tratado é imprescindível. Basta conferir a biblio-
grafia do início. Difícil é abarcar aqui as cinqüenta
virtudes assinaladas por Sto. Tomás. Veremos aqui
apenas alguns tópicos.
Parece-me que a pedagogia antiga se baseava
na aquisição das virtudes através da repetição dos
atos. Os psicólogos modernos andam meio descren-
tes disto. Dê-se espaço para as inclinações naturais,
dizem. Toda pressão prejudica.
Para lembrar a história, foi a cultura grega que
começou a sistematizar a teoria da dínamis. Com Pi-
tágoras, Platão, Aristóteles aparecem as virtudes
cardeais, teoria que os Santos Padres aceitaram, A-
gostinho e Tomás de Aquino comentaram. Este últi-
mo relacionou as virtudes com as bem-aventuranças
e os dons. Nos séculos 18-19 tentou-se substituir a
antiga teoria ética pela teoria do homem do dever, de
Kant, do homem novo de Marx e muitas outras teori-
as. Veremos este assunto na Segunda Parte; aqui
ficamos com a ética tradicional.
Pela virtude o homem é inclinado a fazer o bem:
“o bem deve ser feito”; é o imperativo da consciência.
É um hábito que nos leva a fazer com facilidade o
que é bom. Aperfeiçoa o ato: é o que chamavam de
potência (dínamis). É algo próprio da criatura racio-
75
− Fortaleza:
Martírio, magnanimidade, magnificência, paciên-
cia, longanimidade, perseverança, constância.
Vícios opostos: Timidez, impassibilidade, audá-
cia, presunção, vanglória, pusilanimidade, avareza,
desperdício, insensibilidade, impaciência, inconstân-
cia, pertinácia.
− Temperança:
a) vergonha, honestidade
b) abstinência, sobriedade, castidade, virgindade
c) continência, mansidão, clemência, humildade,
estudiosidade, modéstia corporal, eutrapelia, modés-
tia no ornamento.
Vícios opostos: Insensibilidade, intemperança,
gula, embriaguez, luxúria, incontinência, ira, cruelda-
de, soberba, curiosidade, negligência, afetação, rusti-
cidade, alegria néscia, austeridade excessiva, luxo,
desalinho.
Esse é o cortejo que acompanha sempre a graça
santificante. Com essas virtudes todas as energias do
homem ficam elevadas. Tal cortejo majestoso de cin-
qüenta virtudes não deixa de preocupar: será alguém
capaz de observá-las todas? Note-se que o cortejo
sombrio dos vícios também é preocupante, mas não
deixa de oferecer um amplo material para um bom
exame de consciência e para a nossa humildade.
Note-se, porém, que não há motivo para desâ-
nimo. 1) As virtudes são comunicantes entre si. 2)
78
16
P. J. BETTING: Teologia das Realidades Celestes, 182s.
91
17
P. J. BETTING, op. cit. , pg. 90-100.
92
13. DEVOÇÕES
Entramos aqui num capítulo pastoral e prático: as
devoções. Estas se vêem tanto nos meios populares,
como entre os maiores santos. Encontram-se tam-
bém devoções imperfeitas, viciadas,
Sto. Tomás diz que a devoção é “prontidão do
ânimo para entregar-se às coisas que são de Deus”.
É, como a oração, um ato interno, um ato de religião.
Há devoções essenciais como as dirigidas à San-
tíssima Trindade, a Jesus, a Maria, aos Santos, mas
elas podem tomar uma feição própria da chamada
religiosidade popular, como no caso da devoção ao
Divino Pai Eterno, ao Espírito Santo, ao Bom Jesus.
Toda devoção, como ensina Sto. Tomás, deve
terminar na prontidão e disponibilidade ao serviço de
Deus, ao culto divino. Há dezenas delas que procu-
ramos resumir aqui. Qualquer coordenador de comu-
nidade tem conhecimento deste fenômeno. Aqui ve-
mos as devoções como um meio de santificação. Não
esquecer a história de S. . João Vianey e o sitiante.
Qualquer vigário do interior, ou missionário já teve
surpresas com pessoas simples.
DEVOÇÃO A DEUS
Embora muitos sintam dificuldade em rezar dire-
tamente a Deus, com exceção daqueles que rezam
salmos ou seguem a liturgia, a devoção a Deus apa-
rece em muitos gestos simples: o nome do Pai, o tirar
o chapéu ao nome de Deus, no “se Deus quiser”, no
olhar para o céu.
96
LEITURAS
S. JOÃO VIANNEY conta: Observou na igreja
que, logo cedo, um lavrador: depois de encostar a
enxada na porta, se assentava num banco e fica
tempo olhando para frente. O Santo perguntou o que
fazia, já que nem mexia a boca para rezar. “Não faço
nada, não sei rezar”, respondeu o sitiante, “mas eu
olho para Ele e Ele olha para mim”. E o santo elogiou
tal oração tão elevada.
102
FASES DA ORAÇÃO:
-De quietude: árida e suave.
-De união plena.
-De união transformante ou matrimônio místico.
QUIETISMO
Antes de concluir, vejamos duas formas aberran-
tes nesta área :
MOLINOS (1628-1696) foi o promotor da heresia
do quietismo que, entre outras afirmações, ensinava:
-A via da contemplação passiva como única via pos-
sível, que se adquire por si mesmo, com a graça co-
mum. –O ato da contemplação pode durar anos ou
toda a vida. –Dispensam-se todos os atos explícitos
de virtude. –É necessário estar indiferente a tudo, até
à própria salvação. –Não é preciso resistir às tenta-
ções.
O quietismo foi condenado pela Igreja.
Fenelon defendeu um semi-quietismo ou quietis-
mo suavizado, sendo combatido por Bossuet. Seu
erro principal foi inculcar disposições de passividade
em pessoas de pouco progresso espiritual, tentando
simplificar a vida espiritual, a oração. Favorecia o
amor desinteressado, prejudicando a esperança. In-
sistia demais em deixar agir Deus em nós, o que fa-
zia desmerecer o lado humano, as boas obras, na
ótica luterana. Também havia falhas quanto aos mei-
os de santificação. (Fenelon se retratou destas opini-
ões, mais tarde).
138
18
JUAN MARTÍN VELASCO: Doze Místicos Cristãos, Ed. Vozes, 2003.
139
LEITURAS
A mística é rica em textos de valor. Aqui reúno
frases lapidares, curtas, meio ao acaso. Foram tira-
das da "Teologia das Realidades Celestes", do P. Jo-
ão Betting.
-Deus comunica à alma o seu ser, de tal sorte
que a pessoa parece ser Deus mesmo. Poder-se-ia
dizer que a alma mais parece ser Deus do que alma.
(Sta. Teresa, Subida 2,5).
-A alma vê a SS. Trindade por uma visão intelec-
tual, vê a distinção entre as Pessoas divinas. As 3
Pessoas comunicam-se e falam à alma. Sta. Tere-
sa, Moradas, 7.
-Santa Teresa, uma santa desabrida: Nas funda-
ções, numa difícil travessia de um rio, a santa se
queixa a Jesus, que diz: -“É assim que trato os meus
amigos". –E a santa: “Por isso é que os tem tão pou-
cos!"
-Orígenes era filho de Leônidas que, a caminho
do martírio, beijou o coração do filho, dizendo: Aqui
mora Deus! O mesmo Orígenes escreveu: Ó cristão,
tu és um céu e tu irás ao céu! Id. op. cit. 32.
-Deus nos criou à sua imagem e semelhança. Tal
foi o sonho do Criador: contemplar-se em sua obra,
ver aí brilharem todas as suas perfeições. Isabel da
Trindade, Carta.
-Congratulemo-nos e demos graças a Deus, pois
nos tornamos não somente cristãos e, sim, Cristo.
148
II PARTE
ESPIRITUALIDADE ATUAL
Vimos na primeira parte a espiritualidade antiga,
tradicional; tenta-se visualizar agora a espiritualidade
ainda em formação, da segunda metade do século
20, pós Vaticano II.
Um autor moderno resumiu muito bem toda a
questão, como mostro a seguir. Acho que, para en-
tender toda a problemática, é bom estar atento à I
Parte, para entender a evolução.19
INTRODUÇÃO
A espiritualidade ou teologia espiritual, nas últi-
mas décadas, passou por uma fase de crise, questio-
namentos, atualização de seus fundamentos teóricos
e práticos como, aliás, toda a teologia.
Os nossos leigos eram bons cristãos, com algum
apostolado, praticavam a oração, as devoções, rece-
biam os sacramentos e as decisões do padre sem
muitas perguntas. Pertenciam, os mais ativos, à Ação
Católica, Apostolado da Oração, Congregação Mari-
ana, Legião de Maria, Vicentinos e a outras associa-
ções paroquiais, à catequese.
Nas últimas décadas, depois do Vaticano II, e
mesmo antes, a espiritualidade que servia de suporte
à piedade e à pastoral, começou a ser questionada.
19
SEGUNDO GALILEA: O caminho da espiritualidade, EP, l985.
154
20
Dicionário de Espiritualidade; SECONDIN-GOFFI: Curso de Espirituali-
dade.
157
BIBLIOGRAFIA ELEMENTAR
Dicionários Bíblicos e Teológicos: León-Dufour, J.
McKenzil, Van den Born.
Dicionário de Espiritualidade, EP, 1989.
B. Secondin-T. Goffi (Edit): Curso de espirituali-
dade, Paulinas, 1994.
Thomas Merton: Contemplação num mundo de
ação, Ed. Vozes, 1975.
Diário: Viagem da Ásia, Ed. Vega, 1978.
Segundo Galilea: O caminho da espiritualidade,
EP, 1985.
Romano Zavalloni: Le strutture umane della vita
spirituale, Morcelliana, 1971.
CNBB: Espiritualidade presbiteral hoje, EP, 1974.
René Voillaume: Com Cristo Jesus, EP. 1972.
Vitorio Morero: Concílio e vida interior, EP. 1971.
Chiara Lubich: L’ attrativa del tempo moderno,
Città Nuova, 1978.
Albert Nolan OP: Espiritualidade do serviço aos
pobres, EP, 1992.
Bernhard Häring: Vida em Cristo plenificada, Ed.
Santuário, 1998.
J. B. Libânio: Discernimento espiritual, Ed. Loyo-
la, 1983.
158
LEITURAS
1. EXPERIÊNCIA RELIGIOSA.
“Em Deus descobrem-se novos mares, quanto
mais se navega”, escreveu Frei Luís de León. A ex-
periência espiritual, seja na Bíblia, seja na vida, é
uma aventura, como dizia Orígenes: “Fiar-se numa
pequena tábua num oceano de mistérios”! É o que
tentamos fazer aqui: “Navegar é preciso!”
A EXPERIÊNCIA DE DEUS é feita de dois mo-
dos: lendo nas Escrituras as maravilhosas experiên-
cias que, desde Adão e Eva, os Patriarcas, Moisés,
Profetas e até Reis fizeram, do Deus de Israel, aque-
le que marchava com seu povo. Desta experiência
trataremos a seguir.
O segundo modo é o caminho da razão. Com a
ajuda de Platão, seu mundo das idéias, chegou-se,
numa prova, baseada na ordem do mundo, da exis-
tência de um Demiurgo ou Deus. Já Aristóteles, com
sua metafísica e seus princípios de causa e efeito,
fim, ordem, chegou à causa das causas. Ambas filo-
sofias dominaram a Idade Média, na chamada Esco-
lástica, chegando, com o tomismo, até nossos dias.
Acontece que Descartes (“Penso, logo existo”)
estabeleceu a experiência psicológica. Bacon estabe-
leceu a ciência positiva ou do concreto, introduzindo
as observações, matéria das induções, as experiên-
cias. Kant vai colocar alma e Deus nos postulados da
razão prática. Os idealistas posteriores, materialistas
e existencialistas vão negar qualquer experiência –
mesmo psicológica- ou postulado de Deus.
162
21
SECONDIN-GOFFI: Curso de Espiritualidade, c. I, p. 47s.
163
2. EXPERIÊNCIA ESPIRITUAL
BÍBLIA E CULTURA.
Para uma racionalização da espiritualidade hoje
não podem faltar a fonte que é Bíblia, nem a exigên-
cia histórica que é a inserção na cultura.
Uma volta à Bíblia é sempre o melhor caminho
para uma atualização: volta às fontes, como pediu o
Vaticano II. Mas, já no século 11, avisava o sábio Ba-
hia Ibn Pakuda: “É loucura extrair da Bíblia um senti-
do, omitindo o outro”, pois é grande a tentação de ser
unilateral.
De fato, o A.T. não tem um termo para espiritua-
lidade e mesmo religião mas, na sua linguagem sim-
bólica, indica muito bem o modo de o povo de Deus
devoto cultuar a Deus. Já começa com a Torah, lei,
doutrina.
A Bíblia não demonstra que Deus existe: para
aquele povo era evidente: ante toda a criação, ante o
êxodo. É uma idéia “a priori”. A experiência de Deus
começa no paraíso, e prossegue em toda sua Histó-
ria. A palavra de Deus é a água, chuva e neve que
“descem do céu e para lá não voltam sem fecundar a
terra e fazê-la germinar” (Is. 55, 10).
Outro simbolismo é o da luz que aparece logo no
início da criação. Aparece também o espírito, pairan-
do sobre as águas. Ezequiel evocará este símbolo:
“Vou fazer que sejais penetrados pelo Espírito e vive-
reis” (Ez. 37,5).
164
LEITURA
Haveria textos célebres a flux que tratam de
Deus. Cinjo-me a dois. o primeiro de um grande san-
to convertido, na versão de outro convertido, Giovan-
ni Papini.
170
22
C. O. RIBEIRO: A teologia da libertação morreu? REB, abril/2003,
p.320s.
178
23
B. SECONDIN – T. GOFFI: Curso de Espiritualidade.
185
4. QUESTÕES DE ATUALIZAÇÃO.
24
B. SECONDIN - T. GOFFI (ed.): Curso de Espiritualidade, 1994, p.670.
Às páginas 677-689 encontra-se bibliografia de 246 obras de espiritualidade.