2019-2020-1.º Teste Do 11.º ano-OUT2019

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ESCOLA SECUNDÁRIA FERNANDO NAMORA

Exercício Presencial Escrito de Português


11º. Ano — Outubro Prof. Maria José Almeida
GRUPO I
PARTE A
Leia atentamente o excerto do Sermão de Santo António aos Peixes.

Começando, pois, pelos vossos louvores, irmãos peixes, bem vos pudera
eu dizer, que entre todas as criaturas viventes, e sensitivas, vós fostes as
primeiras, que Deus criou. A vós criou primeiro que as aves do ar, a vós
primeiro que aos animais da terra, e a vós primeiro que ao mesmo homem.
5 [...]
Vindo pois, irmãos, às vossas virtudes, que são as que só podem dar o
verdadeiro louvor; a primeira, que se me oferece aos olhos hoje, é aquela
obediência, com que chamados acudistes todos pela honra de vosso Criador, e
Senhor, e aquela ordem, quietação, e atenção, com que ouvistes a palavra de
10 Deus da boca de Seu servo António. Oh grande louvor verdadeiramente para
os peixes, e grande afronta e confusão para os homens! Os homens
perseguindo a António, querendo-o lançar da terra, e ainda do mundo, se
pudessem, porque lhes repreendia seus vícios, porque lhes não queria falar à
vontade, e condescender com seus erros, e no mesmo tempo os peixes em
15 inumerável concurso acudindo à sua voz, atentos e suspensos às suas palavras,
escutando com silêncio, e com sinais de admiração, e assenso (como se
tiveram entendimento) o que não entendiam. Quem olhasse neste passo para
o mar, e para a terra, e visse na terra os homens tao furiosos e obstinados, e
no mar os peixes tão quietos, e tão devotos, que havia de dizer? Poderia
20 cuidar que os peixes irracionais se tinham convertido em homens, e os homens
não em peixes, mas em feras. Aos homens deu Deus uso de razão, e não aos
peixes; mas neste caso os homens tinham a razão sem o uso, e os peixes o uso
sem a razão.
Padre António Vieira, “Sermão de Santo António”, in Obra completa (Dir. José Eduardo Franco e Pedro Calafate),
tomo II, vol. X, Lisboa, Círculo de Leitores, 2014, pp. 140-141.

1. Indique a parte da estrutura interna onde se insere este excerto e as


virtudes dos peixes enumeradas por Padre António Vieira.
2. Explicite a oposição entre os homens e os peixes referida pelo orador.
3. Explique o sentido do segmento textual “mas neste caso os homens tinham
a razão sem o uso, e os peixes o uso sem a razão” (ll. 20-21).

PARTE B

Leia o texto seguinte, constituído pelas estâncias 96 a 98 do canto VIII de Os


Lusíadas, bem como a contextualização apresentada. Se necessário, consulte
as notas.

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Contextualização: Esta reflexão do poeta surge após a detenção de Vasco da
Gama em Calecute, quando o capitão português regressava às naus.

96 98
Nas naus estar se deixa1, vagaroso, Este rende munidas fortalezas;
Até ver o que o tempo lhe descobre; Faz trédoros7 e falsos os amigos;
Que não se fia já do cobiçoso Este a mais nobres faz fazer vilezas,
Regedor, corrompido e pouco nobre. E entrega Capitães aos inimigos;
Veja agora o juízo curioso Este corrompe virginais purezas,
Quanto no rico, assi como no pobre, Sem temer de honra ou fama alguns
Pode o vil interesse e sede imiga perigos;
Do dinheiro, que a tudo nos obriga. Este deprava às vezes as ciências,
Os juízos cegando e as consciências.
97
A Polidoro2 mata o Rei Treício,
Só por ficar senhor do grão tesouro;
Entra, pelo fortíssimo edifício,
Com a filha3 de Acriso4 a chuva d'ouro;
Pode tanto em Tarpeia5 avaro vício
Que, a troco do metal luzente e louro,
Entrega aos inimigos a alta torre,
Do qual quási6 afogada em pago morre. Luís Vaz de Camões, Os Lusíadas
(prefácio de Álvaro Júlio da Costa Pimpão),
Lisboa, Ministério dos Negócios Estrangeiros – Instituto
Camões, 2000, canto VIII.

Notas:
1
Referência a Vasco da Gama │ 2 Filho de Príamo, rei de Troia. Quando esta cidade estava prestes a cair
em poder grego, Polidoro é enviado, com ouro, ao Rei de Trácia. Este apodera-se do metal e mata
Polidoro. │ 3 Dánae. │ 4Soberano de Argos (Grécia) que tenta anular uma profecia (que um neto o
mataria), prendendo a filha numa torre; todavia, Júpiter introduz-se na torre (sob a forma de chuva de
ouro) e toma Dánae, mãe de Perseu, que veio a assassinar Acrísio. │ 5 Rapariga romana que, na
esperança de obter anéis de ouro dos Sabinos (que sitiaram Roma), lhes abre as portas da cidade;
contudo, os inimigos não a poupam, esmagando-a sob as joias e os escudos. │ 6 Como que │ 7 Traidores.

4. Descreva as atitudes reveladoras da prudência de Vasco da Gama,


justificando-as.
5. Demonstre que a ânsia pelo dinheiro leva à traição, exemplificando
com duas situações da mitologia clássica.

GRUPO II
Nas respostas aos itens de escolha múltipla, selecione a opção correta.
Escreva, na folha de respostas, o número do item e a letra que identifica a
opção escolhida, depois da leitura atenta do texto.

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Se há um elemento fundador e unificante da civilização ocidental é a palavra. Em
grego, palavra traduz-se por logos, significando, simultaneamente, «palavra» e
«razão». Na cultura judeo-cristã, a palavra está no princípio, sendo verbo e pessoa
divina, fundadora do princípio da ação criadora. De facto, a palavra é o motor da ação
5 que torna a realidade texto e o texto realidade. A palavra é performativa 1, por ter a
capacidade para realizar o que enuncia. Neste sentido, o Padre António Vieira é, por
excelência, o nosso mestre da palavra e da palavra «empreendedora», aquela que nos
resgata da inércia e nos move a transformar a história que a cada dia somos
convidados a construir.
[…] Vieira é um dos maiores pensadores mundiais da Época Moderna e, sem dúvida,
10 o imperador da língua portuguesa, como genialmente o definiu Fernando Pessoa.
Também José Saramago, que não era propriamente um entusiasta dos Jesuítas,
afirmou que a nossa língua nunca foi tão bela como quando falada e escrita pelo Padre
António Vieira. Estes dois nomes maiores da literatura portuguesa destacam o patamar
15 estético a que chegou Vieira como cultor da língua: mais do que um escritor, Vieira foi
um artista da língua. […]
Se, no plano da qualidade e da beleza, Vieira elevou a língua portuguesa a uma
mestria nunca antes atingida, de tal modo que os seus textos se tornaram uma
verdadeira escola até hoje frequentada pelos grandes escritores nacionais, este nosso
20 maior orador de todos os tempos foi também um exímio pensador. O génio e a vida
aventurosa, frequentemente muito atribulada, quando não testando os limites da
existência, a experiência de cenários extremos, desde as inóspitas 2 regiões do sertão
brasileiro e da selva amazónica até ao luxo das grandes cortes e dos palácios
europeus, tornaram-no um mestre de vida, o que o levaria hoje, certamente, a
25 superar, em qualidade e elevação, alguns dos livros de autoajuda e autoconhecimento
que superabundam nas estantes das nossas livrarias. […] A escrita de Vieira, ao
contrário de outros grandes autores do seu tempo, não está ao serviço da estética (do
belo), mas da ação (da verdade). O que move Vieira, quando escreve, é a intenção de
persuadir o ouvinte de uma verdade (fundamentalmente humana e teológica) e de
30 constrangê-lo a uma ação (sempre de ordem ética/moral e de «conversão»). […]
Vieira testou as possibilidades e os limites da nossa língua, forçando-a a expressar,
com grande beleza, pensamentos inimagináveis no quadro mental e católico da sua
época. Tanto desafia, sob uma encenação retórica que finta a vigilância inquisitorial,
o próprio Deus, querendo ensiná-lo e corrigi-lo, como arrisca dizer o que no Evangelho
35 estaria incompleto e o que os portugueses, com as suas navegações e o conhecimento
global da Terra e da humanidade, lhe acrescentaram. Faz a Bíblia — e muitos autores
célebres que conhece e cita, muitas vezes de cor — dizer o que pretende, para
sustentar os seus diagnósticos, as suas soluções e alicerçar a sua idealização de um
mundo maravilhoso na utopia do Quinto Império. […]
40 Vieira foi um domador de palavras, um ginasta e um trapezista da argumentação.
As palavras são como barro que Vieira molda como um mestre oleiro, criando formas
espantosas, inauditas3 e deleitosas. Se há uma palavra que o caracteriza, tendo
potenciado o seu génio, é, precisamente, a «ousadia». Ele ousa, com a palavra e com
a vida, afrontar os problemas dos homens e das mulheres do seu tempo, mas também
45 os do seu país e os da humanidade no seu todo.
O Padre António Vieira é, pois, um mestre da palavra e um mestre de vida.
Os leitores perguntam, Padre António Vieira responde, org. Aida Sampaio Lemos, Joana Balsa de Pinho, José Eduardo Franco, Porfírio Pinto,
Temas e Debates, Círculo de Leitores, 2019, pp. 13-15 (texto com supressões).
1
performativa: que, ao ser proferida, corresponde à ação a que se refere. 2inóspitas: que apresentam más condições
para a existência do homem; de acesso difícil. 3inauditas: nunca ouvidas; de que não há memória, de que não há
exemplo; novo, desconhecido

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1. De acordo com o primeiro parágrafo do texto, a palavra
(A) é um elemento inibidor da transformação do mundo.
(B) permite ao homem a realização daquilo que exprime.
(C) torna o homem capaz de operar uma escolha racional.
(D) teve um papel primordial na criação do mundo.

2. O Padre António Vieira é considerado um «mestre de vida» (l. 24)


devido
(A) às parcas experiências em lugares recônditos do mundo.
(B) ao marasmo evidenciado nas grandes cortes e palácios europeus.
(C) à conjugação do seu talento com as numerosas experiências por que
passou.
(D) ao conhecimento adquirido nas experiências vividas em locais tão
similares.

3. A referência a «alguns dos livros de autoajuda e autoconhecimento» (l.


25) encerra
(A) uma constatação da sua presença nas livrarias.
(B) um incentivo à produção destes livros.
(C) uma apologia da produção deste tipo de literatura.
(D) uma crítica à quantidade e à qualidade dos mesmos.

4. A palavra «ousadia» caracteriza o Padre António Vieira, pois


(A) controlou a ação da Inquisição direta e abertamente.
(B) manipulou, através da palavra, a Inquisição e moldou a leitura da
Bíblia.
(C) completou a Bíblia com o contributo das navegações portuguesas.
(D) criou um novo mundo maravilhoso: o Quinto Império.

5. Nas orações «que a cada dia somos convidados a construir» (l. 8) e «que
a nossa língua nunca foi tão bela» (l. 13), as palavras sublinhadas são
(A) um pronome, no primeiro caso, e uma conjunção, no segundo caso.
(B) uma conjunção, no primeiro caso, e um pronome, no segundo caso.
(C) pronomes em ambos os casos.
(D) conjunções em ambos os casos.

6. Indique as funções sintáticas desempenhadas pelas expressões:


a) «um mestre de vida» (linha 24).
b) «de um mundo maravilhoso» (linhas 38 e 39).

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7. Classifique a oração sublinhada em «[…] Vieira elevou a língua portuguesa a
uma mestria nunca antes atingida, de tal modo que os seus textos se
tornaram uma verdadeira escola […]» (ll. 18 e 19).

GRUPO III
Escreva um texto expositivo, entre 150 e 200 palavras, sobre a sátira na
literatura portuguesa, fazendo apelo à sua experiência enquanto leitor.
Apresente um texto devidamente estruturado (introdução,
desenvolvimento e conclusão), com uma organização cronológica da exposição
e respetiva ilustração das obras e dos autores lidos. Apresente uma seleção
vocabular adequada, respeite os mecanismos de coerência e coesão.

Observações:

1. Para efeitos de contagem, considera-se uma palavra qualquer sequência delimitada por espaços em branco,
mesmo quando esta integre elementos ligados por hífen (ex.: /dir-se-ia/). Qualquer número conta como uma
única palavra, independentemente do número de algarismos que o constituam (ex.: /2019/).

2. Relativamente ao desvio dos limites de extensão indicados – entre duzentas e trezentas e cinquenta palavras –, há
que atender ao seguinte:

– um desvio dos limites de extensão indicados implica uma desvalorização parcial (até 5 pontos) do texto
produzido;
– um texto com extensão inferior a oitenta palavras é classificado com zero pontos.

Grup Item
o Cotação (em pontos)
1. 2. 3. 4. 5.
I
20 20 20 20 20 100
1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.
II
8 8 8 8 8 8 8 56

III Item único


44
TOTA
200
L

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