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Manual de Apoio à Formação

de

Primeiros Socorros Psicológicos

Manual de Primeiros Socorros Psicológicos - 2015


Índice

1. Conceitos Enquadradores da Psicologia de Emergência 3


1.1. O que é o stresse - conceito
1.2. Modelo compreensivo do stresse
1.3. Stressores nos bombeiros
1.4. Incidente crítico
1.5. Incidente traumático

2. Comportamento Humano em Situações de Emergência 8


2.1. Crise psicológica
2.2. Reação aguda ao stresse
2.3. Fatores mediadores do impacto
2.4. Reações normativas Vs Reações patológicas

3. Primeiros Socorros Psicológicos 11


3.1. Primeiros socorros psicológicos versus Psicoterapia
3.2. Recomendações na aplicação dos primeiros socorros psicológicos

4. Comunicação de Suporte nos Primeiros Socorros Psicológicos 14


4.1. Estar atento
4.2. Escuta activa
4.3. Responder
4.4. Questionar
4.5. Gerir silêncios

5. Técnicas de Intervenção nos Primeiros Socorros Psicológicos 17


5.1. Modificação da ativação fisiológica
5.2. Modificação da ativação emocional
5.3. Modificações da ativação cognitiva

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1. Conceitos Enquadradores da Psicologia de Emergência

Uma questão central em qualquer área de estudo é a sua terminologia específica. No


campo da Psicologia de Emergência, tal como em muitos campos das ciências sociais em geral,
existe um claro défice em termos de uma nomenclatura estandardizada.

1.1. O que é o stresse – Conceito

O stresse pode ser definido como uma resposta fisiológica, psicológica, cognitiva e
comportamental, que ocorre sempre que precisamos de nos adaptar às mudanças (pressões
internas e externas), ou simplesmente como o desgaste nas pessoas, causado pela sociedade
de rápidas mudanças. Os bombeiros não estão excluídos do desgaste diário produzido pela
nossa sociedade. Adicionalmente ao stresse do dia-a-dia, os bombeiros estão sujeitos a um
grande número de stressores negativos (ou potencialmente traumáticos) no desempenho da
sua missão.

O stresse está implicado na perda de motivação, absentismo, decréscimo de


produtividade e da qualidade do desempenho, e na utilização de estratégias desadequadas de
lidar com as situações. O stresse provoca outras manifestações negativas como servir de
mediador ou agravamento de todo o tipo de doenças.

Contudo, existe uma crescente evidência de que o stresse não deve ser totalmente
evitado. O stresse é usualmente definido pelas suas capacidades de alimentar doenças e dor,
no entanto um aspeto igualmente importante é a sua capacidade desafiar e providenciar
estímulo para um bom crescimento e desenvolvimento ao longo da vida. O stresse é essencial
para a vitalidade e bom funcionamento.

Na década de 40, o médico e investigador Hans Selye foi o primeiro a introduzir o


conceito de stresse de forma sistematizada, onde o definiu como o “estado manifestado por
um síndroma específico, que consiste na totalidade das alterações inespecíficas induzidas num
sistema biológico”.

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A totalidade das alterações inespecíficas é o Síndroma de Adaptação Geral (SAG). De
outra forma, stresse é definido como a manifestação do SAG.

O Síndrome de Adaptação Geral desenvolve-se em três fases:

1ª- Fase de Alarme: ocorre após exposição súbita a um estímulo nocivo a que o organismo não
está adaptado. Esta fase inclui duas subfases: a reação ao choque, ou seja, a reação inicial ao
agente nocivo com vários sintomas característicos como a taquicardia, diminuição do tónus
muscular, da temperatura e da pressão sanguínea. A segunda subfase, fase de contrachoque,
consiste na fase de reação marcada pela mobilização das forças defensivas em que o córtex
adrenal e a secreção das hormonas adrenocorticóides aumentam.

2ª- Fase de Adaptação ou Resistência: esta fase caracteriza-se por uma adaptação completa
ao stressor, durante a qual os sintomas diminuem ou desaparecem, existindo uma diminuição
na resistência a outros estímulos. Se o indivíduo não conseguir lidar ou adaptar-se à situação
que induz o stresse, surge a 3ª fase.

3ª- Fase de Exaustão: que se caracteriza por um retorno dos órgãos ao estado normal. A
resistência do indivíduo do indivíduo diminui substancialmente.

Figura 1. Síndrome Geral de Adaptação (SGA)

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Podemos dizer que o stresse é o processo de adaptação aos desafios e mudanças da
vida. No entanto, nem todo o stresse é prejudicial:

1- Sem stresse (astress), a vida seria monótona, não haveria desafios nem crescimento;
2- Algum stresse (eustress) é benéfico, podendo providenciar oportunidades de mudanças
positivas nas nossas vidas. Este tipo de stresse está associado ao pico de desempenho.
3- Com um excesso de stresse (distress) nós ficamos sobrecarregados. A nossa capacidade de
gerir fica limitada e sentimo-nos mal.

Figura 2. Stresse – conceito e modelo explicativo.

O que faz mal ao ser humano é localizar-se num dos dois extremos, ou seja, levar uma vida
demasiado monótona ou com um número demasiado elevado de exigências desgastantes com
as quais não consegue lidar adequadamente.

1.2 - Modelo compreensivo do stresse

Os acontecimentos e condições que desencadeiam o stresse são chamados de stressores.


Estes são inúmeros, diferentes, e mudam ao longo do tempo. Usualmente são acontecimentos
ou condições que introduzem algum grau de mudança funcional no nosso corpo ou no nosso
meio. Quando essa mudança provoca uma quebra no nosso equilíbrio, ou seja quando o
indivíduo avalia que não tem controlo sobre o ocorrido, é desencadeada a resposta de stresse
numa tentativa de recuperar o equilíbrio. Podemos definir stressor como um estímulo que
desencadeia a resposta de stresse.
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O processo de avaliar um acontecimento como stressante é chamado avaliação cognitiva.
Os acontecimentos são “filtrados”, por cada indivíduo, através deste processo de avaliação,
que o vai fazer sentir se tem ou não controlo sobre o ocorrido. Se a pessoa considera que a
circunstância é importante para si e sente que não tem aptidões nem recursos pessoais ou
sociais para ultrapassar as exigências por ela criadas então “entra em stresse”.

A intensidade do stresse é atenuada em função do apoio social a que o indivíduo tem


acesso, está disponível, responde às suas necessidades e é considerado suficiente. O stresse
evoca vários tipos de respostas no indivíduo, de natureza biológica, cognitiva, comportamental
e emocional.
As estratégias para lidar com o stresse são usualmente designadas por coping, que podem
ser orientadas para a resolução de problemas, para o controlo das emoções ou para aspetos
do relacionamento com pessoas da rede social a que a pessoa pertence. As estratégias podem
ser adequadas, deixando o indivíduo de estar “em stresse”, ou inadequadas, sendo o stresse
mantido e tornando-se desgastante.

Figura 3. Modelo compreensivo do Stresse

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1.3 – Stressores nos bombeiros

Embora os stressores sejam muitas vezes pessoais e particulares, para o indivíduo e que os
mesmos possam mudar com o passar do tempo, existem vários stressores que ocorrem com
grande regularidade entre os bombeiros, nomeadamente:

 Pressão pelo tempo


 Exigências físicas
 Exigências cognitivas
 Exigências emocionais
 Sobrecarga de responsabilidades
 Condições ambientais
 Área de trabalho
 Recursos limitados
 Expectativas elevadas
 Acontecimentos traumáticos

1.4. - Incidente crítico

Um incidente crítico consiste num acontecimento que gera uma resposta emocional
intensa, que condiciona a capacidade de resposta do individuo ou grupo para lidar com a
situação, interferindo com o seu desempenho no trabalho e/ou nas suas atividades pessoais,
resultando num sentimento devastador de vulnerabilidade ou perda de controlo.

São características dos incidentes críticos o facto dos mesmos serem inesperados, de
despertar no indivíduo um reduzido sentimento de controlo e uma elevada perceção de
ameaça, bem como risco de perdas físicas ou emocionais.

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1.5. – Incidente Traumático

O trauma psicológico consiste num tipo de dano emocional que ocorre como resultado de
um acontecimento, que prevê uma experiencia de dor e sofrimento emocional ou físico.

Como experiência dolorosa que é, o trauma traz uma intensificação do medo, o que pode
conduzir a uma elevação do nível de stresse, causando alterações físicas no cérebro afetando o
comportamento e o pensamento da pessoa, uma vez que face a intensidade do mesmo, os
mecanismos de coping (gestão do stresse) colapsam.

Pode igualmente pode causar depressão, comportamentos obsessivos compulsivos e


outras fobias ou transtornos, como o de pânico.

O incidente traumático pode ser causado por diversos tipos de vivências, no entanto o
sentimento de abandono diante de uma ameaça real ou subjetiva à própria vida, ou à vida de
pessoas amadas, ou à integridade do corpo. Um incidente traumático pode, também profanar
as ideologias de um indivíduo desencadeando no mesmo, um estado de extrema confusão e
insegurança.

2. Comportamento Humano em Situações de Emergência

2.1. Crise psicológica

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS, 1992), as reações que um


individuo apresenta no seguimento de um desastre serão classificadas como patológicas ou
normais dependendo da intensidade dos sintomas, do momento de aparecimento dos
sintomas e da duração dos mesmos.

2.2. Reação aguda ao stresse

Dependendo da forma como o indivíduo interpreta, ou avalia cognitivamente um evento,


algumas emoções ou sentimentos vão sofrer mudanças. Os sentimentos não são nem bons

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nem maus; a maneira como eles são expressados e as circunstâncias da expressão é que os vai
definir como sendo apropriados, inapropriados, saudáveis ou doentios.
Quando o nosso sistema neuro-endócrino está estimulado pelo stresse, existem
sinais/sintomas que nos indicam que estamos a experienciar stresse, que incluem:

Figura 4. Stresse – sinais e sintomas.

2.3. Fatores mediadores do impacto

A forma como determinado acontecimento influencia a vivência do mesmo está


diretamente relacionada com os fatores mediadores do impacto, nomeadamente:
 Proximidade afetiva das vítimas (vítima conhecida, familiar ou
bombeiro);
 Grau de identificação com a vítima (criança com a mesma idade de um
filho, idoso com mesma idade do pai, entre outros);
 Experiências anteriores com o mesmo cenário “mal resolvidas”;
 Vulnerabilidade Psicológica” no momento do incidente (bombeiro em
próprio processo de luto, divórcio, em exaustão física);
 A morte de um dos pais, do cônjuge ou de um filho é geralmente mais
grave que a morte de um amigo;

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 Testemunhar a morte violenta de uma pessoa amada é pior do que ser
informado;
 Ser parcialmente responsável por uma morte é pior do que ser apenas
um espectador;
 Quanto mais as necessidades básicas de uma pessoa são ameaçadas,
maior será a intensidade da experiência.

2.4. Reações normativas Versus Reações patológicas

Aquando da vivência de um acontecimento que desencadeia várias reações ao nível


emocional, cognitivo e comportamental. Sendo que quando existem alterações agravadas nas
mesmas, passam de reações normativas a reações patológicas, requerendo uma intervenção
especializada ao nível médico e psicológico.

 Sintomas Emocionais

 Sintomas Comportamentais

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 Sintomas Cognitivos

3. Primeiros Socorros Psicológicos

A vida quotidiana tem associada a ocorrência de acidentes, que podem consistir em


emergências, desastres ou catástrofes, de acordo com a tipologia da Gestão de Emergências. A
resposta a estes acidentes é multidisciplinar, e a Psicologia também possui um papel específico
neste contexto, o qual tem subjacente a ocorrência de incidentes críticos e traumáticos.

Na intervenção em crise está incluído o conceito de “primeiros socorros psicológicos”, que


consiste numa abordagem imediatamente após uma emergência ou desastre e que tem por
objetivo reduzir o distresse inicial provocado por eventos traumáticos e desenvolver o
funcionamento adaptativo e o coping a curto e médio prazo.

Os primeiros socorros psicológicos visam proporcionar cuidados e suporte com


sensibilidade às vítimas bem como aos seus familiares e também aos profissionais de
emergência que atuam em momentos/cenários de crise.
Os primeiros socorros psicológicos suportam o conceito de resiliência individual e grupal,
que incentiva a autoeficácia e diminui a vitimização e dependência. Sendo o seu princípio
essencial baseado na premissa, “Em primeiro lugar não causar dados”.

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Os princípios básicos, para a aplicação dos primeiros socorros psicológicos assenta nas
seguintes bases:
• Segurança: Assegurar a proteção e o bem-estar físico, como oferecer
água, ou um agasalho;
• Proximidade: A intervenção tem lugar no local do incidente;
• Urgência: Intervenção o mais precoce possível com vista a aliviar os
sintomas e prevenir a sua cronicidade;
• Normalizar: é fundamental não “rotular” as vítimas ou diagnosticá-las
como “doentes”. Reação normal a uma situação “anormal”;
• Ativar: O objetivo é ativar os recursos da pessoa para gerir a situação,
a sua rede social, apoiando-a na recuperação;
• Simplicidade: Transmitir mensagens simples, breves e diretas quando
for possível;
• Flexibilidade: Se as circunstâncias permitirem, adaptar-se às
necessidades da situação, em complemento ao plano pré-
estabelecido.

Figura 5. Princípios básicos de primeiros socorros psicológicos.

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3.1. Primeiros socorros psicológicos Versus Psicoterapia

Existem grandes diferenças entre os primeiros socorros psicológicos e a psicoterapia, a


começar pelo interventor. No caso dos primeiros socorros psicológicos qualquer pessoa com
formação no tema pode intervir, já no caso da psicoterapia que consiste num ato terapêutico
exclusivo da classe profissional dos psicólogos clínicos com formação específica para o efeito.

Figura 6. Diferenças entre psicoterapia e primeiros socorros psicológicos.

3.2. Recomendações na aplicação dos primeiros socorros psicológicos

Para uma correta aplicação dos primeiros socorros psicológicos é importante seguir
algumas linhas orientadoras, nomeadamente:
• Cumprir os requisitos de urgência, proximidade, simplicidade e expectativa de
uma rápida recuperação;
• Não “etiquetar” as vítimas como doentes mentais pelo simples facto de
apresentarem condutas ansiogénicas e agressivas perante as circunstâncias
que acabaram de viver;

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• A necessidade mais urgente é restabelecer o equilíbrio emocional;
• Apresentar uma atitude calma e comportamentos tranquilizadores;
• Primeiro observar, não ser intrusivo. Depois, com respeito, fazer questões que
determinem como pode ajudar;
• Relativamente à postura, deve estar ao nível do indivíduo, inclinado na sua
direção;
• Seja sensível à diversidade cultural e étnica;
• Fale devagar, de forma clara, paciente e sensível;
• Realce as ações positivas que o sobrevivente fez no decorrer do Incidente
Crítico;
• Preste informação que vá ao encontro das necessidades imediatas da vítima e
clarifique a resposta as vezes que forem necessárias;
• O objetivo é reduzir o distresse e não saber os pormenores da experiência
traumática;
• Não assuma que todas as vítimas estão traumatizadas;
• Nem tudo é patologia “existem comportamentos normais, numa situação
anormal que é a crise”.
• É difícil saber o que fazer, mas já é uma grande sabedoria saber o que não
fazer:
 Estabilizar emocionalmente uma vítima dizendo…
“tenha calma”;
 Durante o contato: Contar a sua própria história; tomar
partido, julgar e ignorar factos e sentimentos;
 Não “abrir” processos que não vai “encerrar”.
 Evitar dizer:
• “Eu compreendo”
• “Não se sinta mal”
• “Não chore”
• “É a vontade de Deus”
• “Podia ser pior”
• “Pelo menos ainda tem...”

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4. Comunicação de suporte nos primeiros socorros psicológicos

Para poder compreender as dinâmicas que por vezes surgem entre o profissional de
emergência e a vítima, e poder escolher entre as diversas possibilidades de comunicação que
podemos estabelecer a via mais eficaz é importante ter em conta alguns dos princípios básicos
da comunicação de suporte em situações de emergência, nomeadamente:
 Empatia: comunicar uma capacidade de ver e sentir a partir do ponto
de vista da pessoa afetada.
 Respeito: comunicar um respeito sincero pela dignidade e valor das
pessoas afetadas;
 Autenticidade: ser uma pessoa muito genuína que possa ganhar a
confiança em condições difíceis. Isto significa dizer o que se pensa e
acreditar no que se diz;
 Postura de Não-Julgamento: evitar cuidadosamente julgar as pessoas
afetadas;
 Capacitar: ao terminar a intervenção a pessoa deve sentir-se mais
resiliente e capaz na resolução dos seus problemas;
 Ser prático: ser prático sobre o que pode ou não ser realizado por uma
pessoa que está em crise;
 Confidencialidade: manter privadas as informações que são
partilhadas pela pessoa afetada.

4.1. Estar atento

As competências ao nível da comunicação de suporte são igualmente fundamentais


para o sucesso da mesma. Na competência de estar atento é importante que o interventor,
evidencie comportamentos que demonstram que se está interessado no que a outra pessoa
está a partilhar, através do contato ocular, manter a cabeça ligeiramente inclinada em direção
à pessoa (vítima), postura corporal de abertura (não cruzar os braços) mantendo a distância
interpessoal adequada.

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4.2. Escuta ativa

A escuta ativa consiste num processo que permite perceber às pessoas envolvidas numa
conversa, que estas estão reciprocamente interessadas e comprometidas no processo de ouvir
e se entender, o que facilita a troca de informações vantajosas, melhorando assim as relações
interpessoais.
Podemos adotar alguns comportamentos úteis que vão facilitar a escuta ativa:
 Manter uma aproximação adequada com o interlocutor (nem muito perto, nem
muito afastado), de preferência sem a existência de barreiras físicas entre os dois;

 Manter contacto visual constante e mostrar interesse no que está a ser dito,
acompanhando o decorrer do discurso com ações que demonstrem que está a
entender (acenar afirmativamente com a cabeça, dizer sim ou ok…);

 Reduzir outros estímulos que possam interferir com este processo, como mexer no
telemóvel, gesticular demasiadamente, distrair-se com uma caneta…;

 Usar expressões faciais que demonstrem o seu interesse no assunto (como um


sorriso);
 Evitar fazer muitas perguntas e interrupções enquanto o interlocutor não tiver
terminado o raciocínio e evite mudar de assunto abruptamente.

4.3. Responder

É crucial que num contexto de comunicação de suporte em intervenção em crise, que


o interventor não dê conselhos à vítima, nem ofereça soluções pessoais, do género: “Se fosse
eu, fazia….”.
É completamente desadequado dar conselhos, uma vez que:
 Cada pessoa é única e tem em si todo um conjunto de vivências singulares que
a solução que resultou connosco pode não resultar com a outra pessoa;
 Pode não estar perante todos os dados necessários para avaliar a situação;
 Se a solução proposta “falhar”, a pessoa perde confiança em si e no serviço de
suporte de pares;
 Se a proposta causar ainda mais problemas pode ser culpabilizado por isso.

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 As alternativas a dar conselhos, assentam em estar disponível para escutar sem
procurar oferecer soluções e uma outra forma de apoio mais ativo, é ajudar a pessoa
a encontrar a sua própria resposta ao problema e solução.

4.4. Questionar

No processo de comunicação de suporte é igualmente importante questionar a vítima


para melhor podermos ajudar. A tendência natural é fazer um interrogatório sobre factos, o
que não é correto. As questões dirigidas devem de ter uma finalidade no processo de ajuda
que está a ser aplicado.
Não se devem fazer perguntas por “não se saber o que fazer”, ou para “evitar o
silêncio”.
Fazer questões que ajudem a pessoa a expressar o que sente, através do recurso a
Perguntas Fechadas: Perguntas que limitam a resposta a “sim” ou “não” e a Perguntas
Abertas: incentivam a pessoa a explorar e não fazem suposições sobre o significado da
experiência ou de sentimentos evocados.

4.5. Gerir silêncios

O silêncio é também um recurso para a relação de ajuda. O silêncio como estratégia


implica transmitir à vítima que se está presente e não é necessário torná-lo explícito. A sua
combinação com um contacto físico adequado, um olhar, um gesto, pode ser num
determinado momento, mais potente que um discurso que pode soar a “vazio”, formalista ou
de caridade, perante o embaraço da situação mais para o interventor do que para a vítima.

5. Técnicas de intervenção em primeiros socorros psicológicos

A intervenção psicossocial em crise pode ser praticada quer por profissionais de saúde
mental (psicólogos), quer por bombeiros com formação na área.
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O suporte de pares tem também um papel fundamental após incidentes críticos, fonte de
apoio emocional (estar, falar) e instrumental (partilha de estratégias) e também valorizar o
bombeiro que também é uma pessoa. Dar o exemplo, na valorização das emoções.

5.1. Modificação da ativação fisiológica

É característico das situações de stresse agudo a emissão de intensas respostas


fisiológicas, que:
• Produzem uma sensação de grande mal-estar;
• Desenvolvimento de somatizações no indivíduo (transformação de problemas
psíquicos em sintomas orgânicos de maneira involuntária);
• Alteram a avaliação cognitiva da situação e a emissão de respostas para a controlar.

Figura 7. Modificação da ativação fisiológica.

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5.1.1. Relaxamento respiratório / Respiração diafragmática abdominal

Consiste em aprender a respirar de forma Lenta – Constante – Profunda; respirando de


“baixo para cima” (respiração diafragmática) e não de “cima para baixo” (respiração torácica);
focalizando a atenção nas sensações de relaxamento que a própria respiração produz.
Utilização de instruções e de modelagem por parte do interventor.

Para a execução desta técnica deve seguir-se os seguintes passos:


1º Colocar uma mão sobre o peito e outra no estômago;
2º Respirar pelo nariz enchendo os pulmões desde o abdómen até às clavículas - 5
segundos;
3º Manter a respiração por cerca de 3 segundos;
4º Expirar o ar lentamente, cerca de 5 segundos, sem mover o peito;
5º Ir relaxando o abdómen e o tórax, concentrando-nos nas sensações de prazer.

5.2. Modificação da ativação emocional

É característico das situações de stresse agudo a emissão de intensas respostas


emocionais que se manifestam da seguinte forma:
 Olhar “vidrado e vazio”, sem estar focalizado;
 Ausência de resposta a questões verbais ou vozes de comando;
 Exibir respostas emocionais fortes, como choro descontrolado,
hiperventilação, rigidez corporal e comportamento “regressivo”.

Se a pessoa evidenciar estar demasiado perturbado, agitado, “retirado”, com diálogos


desorientados ou revelar ansiedade, medo ou pânico extremos, considerar, em caso da pessoa
estar acompanhada de colegas ou familiares, que estejam estabilizados, solicitar a sua
colaboração no seu “reconforto”.

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Se estiver a chorar, evidenciar pânico, tiver “flashbacks”,etc, ao intervir focar nas suas
preocupações ou dificuldades imediatas, em vez de o tentar convencer a “acalmar-se” ou
“sentir-se seguro”.

Ao nível da estabilização emocional podem ser utilizadas as seguintes técnicas:

Figura 8. Técnicas de estabilização emocional.

Em termos genéricos, os seguintes passos contribuem para a estabilização da maioria


dos indivíduos com distresse agudo:
1) Respeitar a privacidade da pessoa, e dar-lhe alguns minutos antes de
intervir.
2) Permanecer calmo, sossegado e presente, em vez de tentar abordar
diretamente a pessoa, uma vez que tal pode contribuir para uma
“sobrecarga” cognitiva/emocional.
3) Oferecer apoio e ajudar a pessoa a focar-se no imediato e no que é
possível gerir.

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5.3. Modificação da ativação cognitiva

Se a forma como nos comportarmos e sentimos depende na maioria das ocasiões da


forma como valorizamos uma situação, é importante dispor de estratégias para redefinir as
situações, quando a definição que adotámos não é adaptativa.

5.3.1. Técnica da distração cognitiva

Pode sem aplicado em vítimas ilesas que revelam muitas vezes um estado de elevada
absorção e em vítimas que experienciam frequentemente ruminações, ideias irracionais ou
encontram-se oprimidos pelos seus sentimentos. Uma ruminação mental consiste em
repetições constantes e involuntárias de pensamentos relacionados com o incidente crítico, tal
como uma série de imagens visuais, e um breve diálogo interno normalmente com conteúdos
irracionais.

Para a aplicação desta técnica deve seguir-se os seguintes passos:


 Abordar a vítima com uma informação “inócua” de última hora,
oferecer água, logística, etc;
 Fazer perguntas “inócuas” que afastem o pensamento e o diálogo do
incidente crítico;
 Realizar contas de matemática mentalmente, por exemplo contar a
partir de 100 para trás, de 3 em 3 números;
 Centrar a atenção da vítima de forma intensa num objeto.

Se não conseguirmos fazer cessar na vítima a recordação recorrente ou a ideia


irracional, os sinais externos de dor irão aumentar podendo mesmo resultar num desmaio ou
fraqueza.

5.3.2. Técnica do grounding

É a abordagem técnica mais importante para lidar com qualquer forma de dissociação
ou de flashback. Esta técnica tem por objetivos:
• Refocalização da atenção em estímulos exteriores;
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• Orientar a pessoa para o aqui e agora;
• Conectá-la ao seu corpo e recuperar a sensação de controlo sobre os seus
pensamentos.
O grounding visa desviar a atenção dos pensamentos (“mundo interno”) para o mundo
exterior. Sendo a vítima convidada a olhar à sua volta e a descrever o que vê (objetos, cores,
etc), para além da focagem sensorial, devem ser-lhe colocadas questões simples até que seja
capaz de lhes responder corretamente.

Para a aplicação desta técnica deve seguir-se os seguintes passos:


1. Peça à vítima para se sentar numa posição confortável, com os braços e pernas
descruzados;
2. Inspire e expire lentamente;
3. Olhe em seu redor e identifique 5 objetos neutros (sem estarem associados ao
incidente) que veja;
4. Inspire e expire lentamente;
5. Enunciar 5 sons neutros … Inspire e expire lentamente.

Se não resultar…, pode ser necessário recorrer a outro tipo de intervenção mais
específica com um técnico com formação em saúde mental (psiquiatra ou psicólogo clínico).

IMPORTÂNCIA DOS

PRIMEIROS SOCORROS PSICOLÓGICOS

“ Tratar o Ferido... e não apenas a Ferida”

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