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MANUEL CASTELLS
A QUESTÃO URBANA
Edição revisada,
acompanhada de um posfácio (1975)
111/1111111/11/1111111111111111111
33eae311
Urbanização, desenvolvimento e
dependência
Com efeito, se o crescimento demográfico é forte, o da po Com efeito, wna interpretação tão freqüenre quanto errónea,
pulação urbana é espetacular, bem como as formas espaciais que derivada das constatações empíricas às quais nos referimos, con
ele toma - profundamenre expressivas e carregadas de significa sidera a urbanização como uma conseqüência mecânica do cresci
ção política. O objetivo COmum das análises que ultrapassam a mento económico e, em particular, da industrialização. Explica-se
descrição' parece ser o de extrair estes significados, com relação enrão o rirmo atual da urbanização nos países "subdesenvolvi
ao lugar que eles ocupam e o papel que desempenham na estru dos" pela etapa inicial do processo onde eles se encontram. O
ntra social. desenvolvimento seria então um caminho já traçado que seguem
À primeira vista, urbanização e desenvolvimento económi as sociedades, na medida em que elas manifestam um espírito de
co aparecem ligados. Numa pesquisa tecnicamente aprimorada,
emprcendimento.5
Brian J.L. Berry3 estabeleceu uma análise fatorial colocando em
Os dados estatísticos disp0lÚveis permitem rejeitar sem dú
relação, para noventa e cinco países, quarenta e três índices de de
vida esta proposição. A urbanização em curso nas regiões "subde
senvolvimento económico, escolhidos em torno de duas dimen
senvolvidas" não é uma réplica do processo que atravessam os
sões: progresso técnico e econôn1ico, por um lado, características
países industrializados. No mesmo estágio de população urbana al
demográficas, por outro. As duas dimensões possuem uma cor
cançado hoje em dia peÚJs países "subdesenvolvidos", o nível de indus
relação negativa, quer dizer, quanto Inaior é o nível cconâmico e
trialização dos países "desenvolvidos" era bem mais alto. 6 As taxas de
recnológico, tanto menor é o crescimento demográfico. A partir
crescimento das cidades indianas do século XX não é muito dife
desta análise, Berry constrói uma escala de desenvolvimento onde
renre da taxa das cidades européias da segunda metade do século
colocamos os diferentes países numa só dimensão, e ele estuda a
XIX, mas se fixamos um nível de urbanização aproximativo para
relação entre esta escala e o indicador de urbanização (porcenta
a Índia e para alguns países ocidentais, a composição da popula
gem da população residente nas cidades de mais de 20.000 habi
ção ativa, no entanro, é extremamente diferente (cf. quadro la).
tantes). O resultado é uma correlação positiva entre nível de
desenvolvimento económico e grau de urbanização. O fenómeno ilustrado por estas cifras é conhecido na lite'
Paralelamente, uma análise que ficou clássica, de Gibbs e ratura especializada sob o termo de hiperurbanização, que conota
do nível de urbanização com relação à diversificação industrial hiperurbanização aparece como wn obstáculo ao desenvolvimento,'
(indicador da divisão do trabalho), ao desenvolvimento tecnoló na medida em que ela imobiliza os recursos sob a forma de in
gico e à pluralidade de rrocas exteriores das sociedades. Quanto vestimentos não produtivos, necessários à criação e à organização
mais estas variáveis são elevadas, tanto maior também a porcen de serviços indispensáveis às grandes concentrações de população,
tagem da população nas zonas metropolitanas. enquanto estas não se justificam como centros de produção? Mais
Conntdo, se estas pesquisas constatam uma co-variação histo ainda, a concentração num mesmo espaço, de wna população
ricamente dada, entre nível técnico-económico e nível de urbani com baixo nível de vida e uma taxa elevada de desemprego, é
zação, não fornecem uma explicação do processo e, sobretudo, considerada ameaçadora, pois cria condições. favoráveis à propa
vão de enconrro a uma outra constatação importanre, a da acele ganda política "extremista"... !S Desta análise deduz-se a distinção
ração do crescimento urbano nas regiões "subdesenvolvidas", com um entre cidades "geradoras" ou "parasitárias", conforme elas pro
ritmo superior à arrancada urbana dos países industrializados, e isto, movam ou retardem o crescimenro econômico:9
scm crescimento concomitante. É este fenómeno que cabe tentar Se esta situação é altamente significativa e deve ser consi
explicar, providenciando-se os meios teóricos de colocar o pro derada como ponro de partida de nossa reflexão, ela se torna
blema em termos não tautológicos. incompreensível, se analisada por meio da categoria de "hiperur-
80 Manuel CasteUs A QUESTÃO URBANA 81
estrutura complexa em relação com o processo de desenvolvi O processo de urbanização torna-se então a expressão, em
mento.13 Não se trata de seqüências diferentes de um desenvol- . nível do espaço, desta dinâmica social, isto é da penetração, pelo
vimento único, mas de formas de expansão de uma estrutura modo de produção capitalista historicamente formado nos paí
histórica dada, o sistema capitalista avançado, no qual as forma ses ocidentais do resto das formações sociais existentes, situadas
ções sociais diferentes preenchem funções diversas e apresentam em níveis diferentes do ponto de vista técnico, econômico e so
traços característicos correspondentes a estas funções e à sua for cial, indo e culmras extremamente complexas como as da Chi
ma de articulação.14 Diremos então, com Charles Bettelheim, na ou da Ind!a, às organizações de base tribal, particularmente
que, em vez de falar de países "subdesenvolvidos", caberia espe vigorosas na Mrica central.
cificá-los enquanto "países explorados, dominados e com economia Os tipos de dominação historicamente fornecidos são em
deformada". 15 número de três, que podem coexistir, sempre, no entanto, com
Estes efeitos são produzidos pela inserção diferencial des o predomínio de um deles.
tes países numa estrutura, transbordando as fronteiras instituci 1. Dominação coúmial tendo, por objetivos essenciais, a adminis
onais e organizada em torno de um eixo principal de dominação e tração direta de uma exploração intensiva dos recursos e a
dependência com relação ao desenvolvimento.16 Quer dizer, se afirmação de uma soberania política.
todas as sociedades são interdependentes, suas relações são assi 2. Dominação capitalista-comercial, através dos termos da troca,
métricas. Não se trata de relançar a caricatura de lil1 "irnperialismo" adquirindo matérias-primas abaixo de seu valor e abrindo novos
responsável por todos os males, mas de determinar rigorosa mercados para os produtos manufamrados por preços acima
mente seu alcance verdadeiro. do valor.
O essencial, do ponto de vista analítico, não é a subordina
3. Dominação imperialista industrial c financeira, através dos inves
ção política dos países "subdesenvolvidos" às metrópoles impe
timentos especulativos e a criação de indústrias locais tendendo
rialistas (o que é apenas a conseqüência de uma dependência
a controlar o movimento de substituição das importações, se
estrutural), mas a expressão desta dependência na organização
gundo uma estratégia de lucro adotada pelos trustes interna
interna das sociedades enl questão c, nlais concretamente, na ar
cionais no conjunto do mercado mundial.
ticulação do sistema de produção e das relações de classes. 17
A urbaniZ<1ção dependente exprime, nas suas formas e nos
Uma sociedade é dependente, quando a articulação de sua es
seus rirmos, a articulação concreta destas relações econômicas e
trutura social, em nível econhnico, político e ideológico, exprime rela
políticas.
ções asJimétricas com uma outra formação social que ocupa, frente à
Antes de sofrer a penetração das formações sociais exteriores,
primeira, uma situação de poder. Por situação de poder, entendemos o
onde existem cidades, elas desempenham unl papel essenciahllente
fato de que a organização das relações de classe na socieclade depen
político e administrativo,18 de gestão do excedente de produção
dente exprime a forma de supremacia social adotacla pela classe no
agrícola e de fornecimento de serviços para a classe dominante.
poder na sociedade dominante.
A oposição cidade-campo, que certos autores interpretam ingenua
Tratar do "subdesenvolvimento" equivale portanto a anali mente, como se as formas espaciais pudessenr ser assimiladas aos
sar a dialética desenvolvimento/dependência, quer dizer, estudar a fatores sociais, I 9 manifesta a especificidade da relação de classes,
penetração de uma estrumra social por uma outra, o que implica: que pode ir de certas variantes do feudalismo (Japão) às formas
1. A análise da estrutura social preexistente na sociedade dependente. burocráticas de exploração conhecidas sob o termo de "despotis
mo asiático", passando pelas siações de origem mais comple
2. A análise da estrutura social da sociedade dominante.
xa, como o sistema de castas na India. A função religiosa alia-se
3. A análise de seu tipo de articulação, quer dizer do tipo de dominação. ao papel achninistrativo e, freqüentemente, suscita a sua implan-
,
tação_ Ao contrário, o comércio só tem uma influência secundá haver wn impacto da industrialização sobre o crescimento urbano
ria e se localiza muito mais no tempo (feiras e mercados) que no de um país, sem modificação sensível da proporção de mão-de
espaço. -obra empregada no secundário, através do aumento da produ
Sobre esta armadura urbana fraca, cujos únicos progressos ção de um ramo industrial da metrópole, repousando sobre wna
importantes foram aS cidades administrativas do Japão e da Chi matéria-prima obtida no país dependente.
na,2° organiza-se, aO nível do espaço, o sistema de dominação,
Há portanto uma relação a estabelecer, por um lado, entre
com duas variantes essenciais:
industrialização dominante e urbanização dependente, por ou
1. A implantação do tipo colonial, caracterizada por uma função tro lado, entre a urbanização e o crescimento, no país, das ativi
I
!: sobretudo administrativa e pela organização de ronas urbanas dades manufatureiras tecnologicamente modernas.
"reservadas", que reproduzem as cidades da metrópole. Esta A partir deste apelo das estruturas sociais subjacentes ao
variante, da qual as cidades espanholas na América constituem processo de urbanização, podemos adiantar hipóteses explicati
a melhor ilustração, apresenta poucas modificações com rela vas com respeito aos dados fundamentais que apresentamos:
ção às funções das cidades que existiam anteriormente no seio
1. O crescimento acelerado dos aglomerados deve-se a dois fatores:
das civilizações rurais. Todavia, a nova dominação exprime-se
pelo aumento em número e porte destas cidades, por seu u'a a) o awnento das taxas de crescimento natural, tanto urbano
çado interior, predeterminado segundo wn plano colonial es quanto rural; b) a migração rural-urbana.
tandartizado, e pela sua relação muito mais estreita com a O primeiro fator é primordialmente uma conseqüência da
metrópole do que com o território circunvizinho. diminuição da taxa de mortalidade, provocada pela difusão súbi
2. A segunda variante fundamental é o centro de negócios direta ta dos avanços da medicina. A taxa de natalidade é elevada pela
mente ligado à metrópole, escala nas rotas comerciais (quase estrutura da idade da população, particularmente jovem, como é
sempre um porto) e que é ele próprio um centro comercial normal nwna situação de explosão demográfica.
em face das zonas do interior. Trata-se das "gateway cities",2' Mas o fenômeno essencial que determina o crescimento
forma urbana da economia de tráficos, início de uma íntima urbano é o das migrações. A fuga para as cidades é, em geral,
conjunção entre a burocracia comerciante local e os homens considerada muito mais como O resultado de um push rural do
de negócios imperialistas e seu aparelho protetor. O exemplo que de um pull urbano quer dizer, muito mais como uma de
clássico é dado pelas cidades cridas pelos ingleses ao longo composição da sociedade rural do que como expressão do dina
de suas rotas comerciais para a India. Mas encontramos ex mismo da sociedade urbana. O problema é saber a razão pela
pressões também claras nas implantações portuguesas no Bra qual, a partir da penetração de uma formação social por uma
sil e na África, e holandesas na Ásia do Sudeste. outra, irrompe um movimento migratório, quando as possibili
À medida que o tipo de produção capitalista se desenvolve dades de emprego urbano são muito inferiores às dimensões da
no Ocidente, e o processo de industrialização se acelera, seus migração e as perspectivas de nível de vida são bem reduzidas.
efeitos fazem-se sentir na organização espacial e na estrutura de Com efeito, se a renda urbana por cabeça, apesar de fraca, é
mográfica das sociedades dominadas. Mas é necessário afastar em geral mais elevada que o lucro rural, a capacidade de consu
logo um equívoco muito difundido na literatura especializada: mo real diminui muito nas cidades, na medida em que o conswno
não se trata do impacto da indústria sobre a urbanização, pois direto de produtos agrícolas se torna raro e que toda uma série
no início da implantação industrial é rara e pouco significativa, de novos tributos se soma ao orçamento (o transporte em parti
mas do impacto do processo de industrialização ocidental através cular), sem considerar o consumo supérfluo induzido por uma
de uma relação de dependência específica. Poderá, por exemplo, economia de mercado em vias de afirmação.
•
Mais que W11 balanço econômico cm nível individual, trata-se Assim, poderíamos multiplicar os exemplos. Mas o essencial
portanto da decomposição da estrutura social rural. Freqüente é perceber a ligação estreita dos processos urbanos e da estrutura
mente insistimos no papel dos novos valores culturais ocidentais social, e romper com o esquema ideológico de wna sociedade dua
e na atração exercida pelos novos tipos de consumo urbano di lista rural/urbana, agrícola/industrial, tradicional/moderna. Pois,
timdidos pelos mass media22 Se estas mudanças nas atitudes ex se este esquema responde a W113 certa realidade social nas formas
primem a reorganização da personalidade numa nova situação de relafM c nas expressões culturais, esta realidade é simplesmente
social, elas não podem ser consideradas como motor do proces o reflexo de uma estrutura única, na qual os efeitos num dos pó
so, a menos que se aceite o postulado ideológico-liberal do indi los são produzidos pelo tipo particular e determinado de sua ar
víduo como agente histórico essencial. Qual é, então, esta nova ticulação com o outro pólo.
situação social? Trata-se da crise geral do sistema econômico da 2. A urbaniZllflÚJ dependente provoca uma superconcentrarM nos aglo
formação social preexistente. Com efeito, é impossível, a partir merados (primate cities); uma distância considerável entre estes
de uma certa fase no processo de penetração social, que funcio aglomerados e o resto do país e a ruptura ou a inexistência de
nem paralelamente dois sistemas comerciais diferentes, ou que a uma rede urbana de interdependências funcionais no espaço. 25
economia de troca direta possa desenvolver-se ao mesmo tempo
Já vimos que esta desarticulação é, em parte, o resultado
que a economia de mercado. Com exceção do caso de regiões
da ligação estreita dos primeiros centros urbanos com a metró
geográfica e culturalmente isoladas, o conjunto do sistema pro
pole. Mas há ainda uma outra razão de grande importância: a
dutivo se reorganiza em função dos interesses da sociedade do
revitalização das cidades médias, sua inserção numa hierarquia
minante. É lógico que, nestas condições, o sistema econômico
urbana exigiria uma política de impulsão de pequenas unidades
interno seja "desarticulado" ou deformado. Mas esta "incoerên
de produção, não diretamente rentáveis em termos de relação
cia" é apenas o resultado de uma rede econômica perfeitamente
capital/produto, mas justificadas pela criação de postos de traba
coerente, se examinarmos a estrutura social no seu conjunto (so
lho e do dinamismo social suscitado. Ora, isto supõe uma plani
ciedade dominante e sociedade dependente).
ficação industrial, uma política do emprego e um regionalismo
Se a pressão demográfica sobre a terra cultivada deteriora
arunínistrativo. E é evidente que, 111esnlO quando instauramos
o nível de vida rural, provocando a emigração, não é apenas de
uma burocracia formalmente dedicada a estes objetivos, a simação
vido a uma irrupção pontual e não integrada de novas técnicas
de dependência com relação à dinâmica do sistema em geral im
sanitárias, mas, sobretudo porque o sistema de propriedade e de
pede toda realização efetiva?6 Por outro lado, como a migração
utilização da terra tem como base a exploração extensiva e pou
para as cidades não responde a uma demanda de mão-de-obra,
co produtiva, mas bastando amplamente para os próprios inte
mas à tentativa de encontrar uma saída vital num meio mais di
resses do proprietário da terra.23 Ora, este sistema faz parte das
versificado, o processo só pode ser cumulativo e desequilibrado.
relações de classe da sociedade dominada e elas são sobredeter
minadas por sua relação de dependência com respeito ao con 3. Finah11ente, podemos compreender, agora, a estrutura irltere
junto da estrutura. cológica dos grandes aglomerados, basrante diferente das regiões
Se o sistema familiar se enfraquece enquanto instituição metropolitanas ocidentais. Elas caracterizam-se pela justaposi
econômica de base, isto se deve, freqüentemente, à existência de ção, à primeira massa urbana, de uma massa crescente de po
um emprego ocasional na produção intensiva e de safra de um pulação não empregada e sem função precisa na sociedade
produto agrícola intimamente ligado às flutuações do mercado urba?a, depois de ter rompido seus elos com a sociedade ru
mundial. Uma vez rompido, o circuito da produção agrícola tra ral. E perfeitamente ideológico qualificar de mar;ginalidade o
dicional não pode ser restabelecido, quando a baixa dos preços que é situação de tensão entre duas esnuturas sociais interpe
internacionais ocasiona o desemprego.24 netradas. Como a migração para a cidade é o produto da de-
88 Manuc:l Casrclls A QUESTÃO URBANA 89
composição das estrururas mrais, é normal que ela não seja Em tal nível de complexidade, não é possível formular ge
absorvida pelo sistema produtivo urbano e que, conseqüente neralizações e cabe.nos, mesmo para um simples enunciado de
mente, os migrantes só se integrem parcialmente no sistema perspectivas, abordar a análise de siruações concretas.
social. Mas isto não quer dizer que estes gmpos estejam "por
fora", "à margem" da sociedade, como se a "sociedade" fosse o
equivalente de um sistema instirucional historicamente siruado. III. Desenvolvimento e dependência no procso de
Seu modo de articulação é específico, mas esta mesma especifi urbanização na América Latina.
cidade é wn traço característico e não patológico, salvo se nos
colocamos como médicos da ordem estabelecida. A América Latina, exemplo típico de "hiperurbanização"?
Resumamos as orientações teóricas a partir das quais con Siruação intermediária entre "desenvolvimento" e "subdesenvol.
vêm abordar o problema. A análise da urbanização nas forma vimento"? Coexistência de um crescimento automantido e da
ções sociais dependentes pode ser eferuada considerando-se a "marginalização progressiva de uma parte importante da popu
matriz das relações entre quatro processos fundamentais: lação?27
O florescimento dos mitos "sociológicos" concemindo às soci
1. A história política da formação social na qual a cidade (ou
edades latino-americanas é tal, que é necessário pmdência e precisão
sistema urbano) está inserida, e, em particular, o grau de au
especiais na organização dos dados e na formulação das hipóteses.28
tonomia da camada burocrática política com relação aos inte
Para começar, é útil lembrar que, se a América Latina possui
resses exteriores.
uma singularidade teoricamente significativa, além de enormes
2. O tipo de sociedade agrária na qual o processo de urbanização diferenças internas e algumas semelhanças com outras regiões
se desenvolve. Mais concret31nente, as formas espaciais serão ditas do "Terceiro Mundo", é justamente porque as sociedades
diferentes, conforme sua decomposição seja mais ou menos que a compõem apresentam uma certa identidade na estmrura
adiantada, conforme sua estrumra agrária seja feudal ou tri ção de sua siruação de dependência. Com efeito, as formações
bal, conforme a maior ou menor concordância de interesses sociais existentes na América Latina antes da penetração colonia
entre gmpos dominantes urbanos e mrais. lista ibérica, foram praticamente destruídas, e, em todo caso, de
sintegradas socialmente durante a conquista. 29
3. O tipo de relação de dependência mantido e, em particular, a
articulação concreta dos três tipos de dominação - colonial,
É portanto no interior de uma siruação de dependência
que se constiruíram novas sociedades, sem quase apresentar par
comercial e industrial.
ticularidades relativas à estmrura social preexistentes, como foi o
4. O impacto autónomo da industrialização própria à sociedade caso da Ásia. A evolução posterior do conjunto e sua diversifica
dependente. Por exemplo, no caso de uma indústria local, ha ção interna resultam das diferentes articulações regionais da me.
verá efeitos específicos do tipo de indústria sobre o tipo de trópole, bem como da reorganização das relações de força entre
residência e, em especial, sobre o meio socioculrural formado os países dominantes: substiruição da dominação espanhola pela
pela conjunção de indústrias e de moradias. É o caso dos inglesa, depois pela americana. As relações "privilegiadas" políti.
aglomerados industriais latino-americanos dominados pela pre co-económicas da América Latina com os Estados Unidos refor
sença de manufaruras ou de minas. Mas podemos igualmente çam uma certa unidade de problemas e fundamentam a trama
descobrir, às vezes, no processo de urbanização derivado do das formas sociais em transformação. 30
crescimento industrial, a influência de uma burguesia e de um A urbanização na América Latina, enquanto processo social,
proletariado naeional, que vão marcar o espaço com a dinâ pode ser compreendida a partir desta especificação histórica e
mica de suas relações contraditórias. regional do esquema geral da análise da urbanização dependente.31
90 Manuel Castclls
A QUESTÃO URBANA 91
Os dados existentes indicam um nível elevado de urbanização trialização nitidamente inferiores aos de outras regiões também
e um titmo cada vez mais acelerado do crescimento das cidades urbanizadas. Além disso, no interior da América Latina, ainda
que os países mais urbanizados sejam também os mais industria
(cf. quadros II e 12). Se tomamos como critério de população
lizados, não há correspondência direta entre o ritmo dos dois
urbana o limiar de 100.000 habitantes, a taxa de urbanização da
processos no interior de cada país.
América Latina em 1960 (27,4%) é quase igual à da Europa
Se, para o conjunto da América Latina, a popUlação urba
(29,6%) e a taxa de "metropolitanização" (população das cida
na (aglomerado de mais de 2.000 habitantes) passou de 29,5%
des de mais de um milhão de habitantes) ll1e é superior (14,7%
em 1925 a 46,1% em 1960, a porcentagem da população ativa
para a América Latina contra 12,5% para a Europa - segundo
empregada na manufatura ficou praticamente estável: de 13,7%
Homer Hoyt).
em 1925 a 13,4% em 1960.34
Como o demonstram os quadros II e 12, as disparidades À primeira vista existe, portanto, wna disparidade cntrc in
internas são muito grandes e a situação da América Central tcm dustrialização e urbanização. Mas as coisas são mais complica
pouco em comum com a da América austral. A comparação de das, pois esta análise baseia-se num artifício estatístico: a fusão,
resultados tão diferentes no interior de uma mesma estruntra sob a denominação global de "América Latina", de conjunturas
coloca-nos no caminho de sua compreensão. A "explosão urbana" sociais muito diferentes. Por exemplo, uma análise fatorial reali
latino-americana é a conseqüência, em grande parte, da explosão zada por G. A. D. Soares, sobre dados concernentes ao Brasil e
demográfica, mas a distribuição ecológica deste, crescimento é à Venezuela, mostra uma variância COmUlTI de 64% entre urba
altamente significativa. O ritmo já alto, no que diz \espeito ao nização e industrialização, mesmo que o autor conclua pela não
conjunto da população, é muito mais elevado ainda nas cidades identidade das duas variáveis.3s
(cf. quadro 12). Este processo produz-se não só no conjunto do Por outro lado, a proporção da população ativa empregada
país, como também no interior de cada província: as cidades na indústria não é absolutamente o melhor indicador da indus
concentram o crescimento demográfico da região circunvizinha, trialização, pois ele esconde um fenômeno essencial: a moderni
atraindo o excedente da população rural. 32 zação do setor manufatureiro e o aumento da produtividade.36
I
A aceleração do crescimento urbano toma em geral a for Sc, de 1925 a 1960, a população ativa empregada nas manufa
ma de um desequilíbrio na rede urbana de cada país, já que ela turas manteve-se estável, ela baixou dê 10,2% a 6,8% no setor
artesanal e mais que duplicou (de 3,5% a 7,5%) no setor indus
I
se concentra no aglomerado dominante, quase sempre a capital.
Esta tendência, todavia, parece diminuir no período recente: tra trial moderno.
ta-se, de toda forma, de uma diminuição relativa das diferenças Para avaliar a possível relação entre o aumento da produ
entre as cidades, sem que elas desapareçam, em termos absolutos ção industrial real e o ritmo de urbanização, ordenamos onze
,
(cf. quadro 13). Com efeito, com exceção da Colômbia, em medi países, para os quais dispomos de dados pertinentes, segundo
,
I
constatação, para a América Latina, de uma disparidade entre
emprego industrial, e que, conseqüentemente, o conteúdo social
um ritmo de mbanização alto e um nível e um ritmo de indus-
_•.•..-•.•
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...-
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_=...,.===_.
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Quadro II
'O
...
Populaçáo ttrbaJla e populaçáo total, América Latilla, por país, 1960, 1970, 1980.
olíviJ 3.696 4.658 6.006 1.104 29,8 1.682 35,4 2.520 41.9
rasil 70.327 93.244 124.003 28.292 40,2 44.430 47,6 67.317 54,2
:Olômbia 17.485 22.160 31.366 8.987 51,3 12.785 57,6 20.927 66,7
".o5u. Rica 1.336 1.798 2.650 428 32,0 604 33,5 968 36,5 :s:
:uba 6.819 8.341 10.075 3.553 52,1 4.450 53,3 5.440 53,9 g
:hilc: 7.374 9.760 12.214 4.705 63,8 6.886 70,4 9.205 75,3 !!.
.qllJdor 4.476 6.028 8.440 1.700 137,9 2.756 45,7 4.563 54,0 n
alvador 2.511 3.441 4.904 804 32,0 1.305 37,9 2.259 46,0
;lutemala 4.204 5.179 6.913 1.242 28,9 1.593 30,7 2.342 33,8 !i
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biti
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4.138
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6.838 517 12,3 907 17,3 1.684 24,6
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londurJ.S 1.885 2.583 3.661 405 21,3 716 27,7 1.280 34.9
amaic. 1.610 2.003 2.490
1éxico 34.923 50.718 71.387 18.858 53,9 31.588 62,2 49.313 69,0
icaráguJ. 1.536 2.021 2.818 4.808 35,8 808 39,9 1.338 47,4
'an.llná 1.076 1.463 2.003 550 42.3 733 50,1 1.142 57,0
'amguai 1.819 2.419 3.456 456 31,0 872 36,0 1.494 43,2
'cnl (1961) 49,2 10.791 50,2
9.907 13.586 18.527 564 39,8 6.690
lepública Dominic:.uu 3.047 4.348 6.197 3.943 28,8 1.603 36,8 2.815 45,4
:ril\ittd.TobJgo 834 1.085 1.348 878 40,0
JruguJi (1963)
2.593 2.889 3.251 334 76,5 2.308 79,8 2721 83,6
lenezuda 7.524 10.755 14.979 1.984 63,9 7.737 71,9 11.807 78,8
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Rural oI
Taxa de urbanização
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Quadro 14
Quadro 13 A primazia dasgrandes metrópoles na América Latina, 1950
O crescimento urbano na América La#na)
Porcenragein Número de
segundo o tamanho do aglomerado
da população vezes maior que
Taxa anual de crescimento se :?;undo o tamanho das cidades (habitantes)
Áreas Metropolitanas Ano metropolitana o segundo
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Montevidéu 1954 32,7 17,0
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<u Assunção 1950 15,4 12,9
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São José 1950 19,7 10,5
Panamá 1940-50 2,8 2,2 - 3,0 Cidade do Palumà 1950 23,9 3,1
1950-60 4,4 2,1 - 5,2 C'1I\lC;1S 1950 15,7 2,9
Porto Rico 1940-50 5,1 3,1 - 6,6 Bogotá 1951 6,2 2,0
1950-60 1,3 0,2 - 1,9 Guaiaquil 1950 8,3 1,3
Rl"<lsiJ 1940-50 ... 4,4 4,6 Rio de Janeiro 1950 5,9 1,2
1950-60 5,2 6,4 5,5 3,9 Fnntes: HARLEY L. BRüWN1NG, "RC(CJ1( Tr(lld_ ill l-1rill Amcric.m Urb;lnil[ioll". 111C AIlI1.11.,
Chile 1940-52 2,6 2,7 1,4 3,1 março de 1958, pp. III. 126, tabeIa 3.
Colômbia 1938-51 5,7 5,0 6,1 6,2 desta urbanização é muito diferente daquele dos países capitalis
1951-64 ... 6,7 tas adiantados, Com efeito, como assinala Anibal Quijano,37 a re
1950-62 5,2
Equador ...
Quadro 15 \O ("I") 0\ 00 lO M lO o
Escala dc classificação dos paíscs scgundo seus ritlmJs de crescimento '#- o\óo\ôôooô
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industrial (produtos industriais) e scus ritlmJs de crescimento urbano. o
8 OC! oc!l':c!
1950.60 1950-60 lf)f'O'<:f'I,.....(N
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1.70 2 1 6.3 o
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Nicarágua 1.42 5 3 4.9 to-:ÔOÔ...çOOMÔ
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Costa Rica 1.26 6 7 4.0
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Chile 1.18 7 8
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Salvador 1.04 9 10 3.3
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Sob a denominação engan,dora de "serviços", reagrupam ::l
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se essencialmente três gêneros de atividades: comércio, adminis ." 00'0
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tração e, em particular, "serviços diversos"... É fácil imaginar como \Ci r'..oeOr'
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urbana não exprime apenas a relação de dependência do mo 86,5% da população da América do Sul se concentram na coroa
mento,. mas também os remanescentes de outros sistemas de de costeira, que compreende apenas 50% da superfkie.43
pendência, bem como seu tipo de articulação.
2. As funções urbanas de uma vasta região concentram-se no
Trata-se então de precisar, brevemente, de forma concreta,
núcleo de um povoamento inicial, lançando assim as bases da
como é que O esquema teórico apresentado organiza e explica os
primazia de um grande aglomerado. A cidade e seu rerrirório
traços característicos da história urbana da América Latina.
estabelecem relações estreitas e assimétricas: a cidade gera e
(Observação importante: não se trata absolutamente de ex
consome o que o campo produz.
plicar o "presente" pelo "passado", mas de mostrar a organiza
ção das diferentes estruturas sociais confundidas ao nível de uma B. A substiruição da dependência política em face da Espanha,
realidade social concreta. É evidente que uma pesquisa concreta por uma dependência comercial com relação a outras porênci
. que ultrapasse o esquema geral de análise apresentado aqui de as européias, em particular ii Inglaterra, a partir do século
veria começar por efetuar esta especificação.) XVIII e sobrerudo depois da independência, afeta a siruação
anterior, mas sem modificar qualitativamente suas grandes li
A. As bases da estrutura urbana arual refletem em grande parte
nhas. Ao contrário, do ponto de visra quantitativo, a ativida
o tipo de dominação sob a qual se formaram as sociedades latino
de comercial e a extensão das atividades produtoras suscitadas
-americanas, quer dizer as colonizações espanhola e porruguesa.
pela ampliação do mercado estão na base de um forte cresci
As cidades coloniais espanholas na América Latina preen
mento demográfico e urbano (ver quadro 18).
chem duas funções essenciais: 1. a administração dos territórios
conquisrados, a fim de explorar seus recursos para a Coroa e de A partir da inserção completa do conjunto do continente
reforçar uma dominação política por meio de um povoamento; na esfera do mercado mundial, sob a hegemonia britânica, se
2. o comércio com a área geográfica circunvizinha, mas sobretu entabulam a exploração sisremática dos recursos do setor primá
do com a metrópole. Segundo as formas concretas da coloniza rio solicirado pelas novas economias industriais e, paralelamen
ção uma ou outra função é preponderante. Em geral as cidades te, a constiruição da rede de serviços e rransportes necessários às
atividades. A conseqüência mais direra desra situação sobre a ur
i espanholas tinham essencialmente um papel de governo, corres
banização foi a diversificação regional da produção. Assim, a
I pondente ii política mercantilista da Coroa de Castilha, enquan
Argentina e o Uruguai, fundamentados num progresso extra
I to as implantações portuguesas no Brasil eram mais centradas
ordinário da escolaridade" e na fusão dos interesses entre a bur
!
sobre a rentabilidade da troca de produtos e das explorações in
guesia comerciante de Buenos Aires e os proprietários do interior,
tensivas nas regiões próximas aos portos."
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I, Disto resultam duas conseqüências fundamentais no que
tiveram um forte crescimento econômico, com a concentração
de todas as funções terciárias na capital, já um lugar privilegiado
diz respeito ao processo de urbanização:
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1. A, cidades estão diretamente ligadas ii metrópole e não ultra
enquanto porto de exportação.
Podemos assinalar um fenômeno paralelo no Chile, com
passam quase nada os limites da região circunvizinha nas suas uma arrancada espetacular fundamentada na extração mineira
comunicações e dependências funcionais. Isto explica a fra dora e apoiada na solidez da máquina burocrática de que Porta
queza da rede urbana na América Latina e O tipo de implan les soube dotar a burguesia nascente"s
tação urbana, afastado dos recursos naturais do interior do Ao contrário, os países do interior e os do norte dos Andes,
continente. J. Cole efetuou um cálculo ponderado Com relação em particular O Peru, ficaram quase à margem da nova estrutura
aos centros urbanos das unidades administrativas territoriais que econômica - sociedades dominadas pela oligarquia latifundiá
permire dividir a área espacial em três coroas progressivamente ria e reduzidas, em seu sistelna urbano, às coletividades munici
disrantes da costa. Os resultados são e1oqüentes: em 1950, pais herdadas da colonização espanhola.46
102 Manuel Clsrells
A QUESTÃO URBANA 103
Quadro 18
criar indústrias centradas no conswnO local47• Dadas as característi
Evolução da população na América Latina (1570-1950)
cas destas indústrias - fraca composição orgânica do capital e ne
cessidade imediata de rentabilidade - sua implantação depende inti
Ano População mamente da mão-de-obra w'bana, e sobremdo, do mercado potenci
(milhões de pessoas) ai dos grandes aglomerados. 'Esta industrialização, mesmo limita
1570 10,2 da, suscita U1na expansão excessiva dos "serviços", pois presta-se a
dência entre o código do emissor e o código do receptor com resses, em última instáncia, das classes dominantes respectivas.
relação a uma mensagem. Quer dizer, as mensagens são percebi Não se trata portanto de um simples desequiUbrio de nível, mas do
das e selecionadas em função do sistema culmral do agente, o impacto diferencial da industrialização nas sociedades rural e urba
qual está determinado por seu lugar na estrumra social. na, decrescendo e aumentando respettivamente sua capacidade pro
Conseqüentelnente, se em certas zonas rurais, ocorre "a di dutiva, enquanto as trocas entre os dois setores Se tornam maisfáceis.
fusão urbana", isto se deve ao fato de que as bases estrumrais da Finalmente, o afluxo de população nos centros urbanos trans
nova si mação desorganizaram os sistemas culmrais tradicionais. forma profundamente as formas ecológicas, mas só afeta relati
Em nível puramente infra -estrumraJ, nós podemos dizer que os vamente as atividades improdutivas. O relatório da C.E.P.A.L. 55
determinantes essenciais da decomposição da sociedade agrária mostra de fato, uma tendência muito nítida da indústria e do co
são a contradição entre o aumento acelerado da população, con mércio artesanal para criar empregos pouco produtivos, freando
seqüência da baixa recente da taxa de mortalidade, e a manuten os progressos da produtividade pela utilização de uma mão-de-obra
ção das formas improdutivas da propriedade latifundiárias4 abundante e barata. Da mcsma forma, em torno dos organismos
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administrativos nascem verdadeiros sistemas de clientela que não 8. cr B.E HOSELITZ, "Url"UliZ<ltion and Economic Growth in Asi.".
respondem a um aumento real da atividade, mas ao desenvolvi Economic Dcvelopment and Cultural Change) t. VI, n° 1, outubro, 1957,
mento de redes de influência pessoal. pp. 42-54.
A urbanização na América Latina não é a expressão de um 9. B.E HOSELITZ, "The Role of the Ciries in the Economic Growth
processo de "modernização", mas a manifestação, a nível das rela of Underdevcloped Counrries", Journal of Politicai Economy, 61, 1953,
ções sócio-espaciais, da acenmação das contradições sociais ine pp. 195-203.
rentes a seu modo de desenvolvimento - desenvolvimento de
10. N.V. SOVANI, "The Analysis of Over UrbaniZ<1tion", Eco"omic Dc
terminado por uma dependência específiea no interior do siste
l'clopm£1ltand Cultural Change, 12, n°, 2, janeiro de 1964, pp. 113-122.
ma capitalista mundial.
11. Certos autores recorrem ao subrerfügio altamente sintomático de
chamar estes aglomerados de "metrópoles premamras"; cf. entre ou
tros, NIRMAL KUMAR BOSE, "Caleurra: A Premamre Merropolis",
Notas
Scienrific American, serembro de 1965,91-102.
1. Cf. KUAN-I-CHEN, H-Vrld Population Growth and Liping Standard, 12. CfP GEORGE, La Vil/e, Paris, PU.E, 1950.
University Prcss, New Haven, 1960. 13. Cf. para as perspectiv,ts teóricas fundamentando LIma compreensão
2. A melhor fonte recente de m:lteri:lis sociológicos sobre este tcm;'l é a real do desenvolvimenro, E H. CARDOSO, Questiones de SocioÚi.qia dei
obra dirigida por G. BREESE, Thc city in NeJVly Del'elopi'!./f Coulltries, Dcsarrollo CIl Amcrim LatinaJ Editorial Universitário, Santiago de Chile,
I Prentie< Hall, Englewood ClitTs, New Jersey, 1969, 555 p. Ver r,unbém
S. GREER, DENNIS, L. MC ELBRATH, D. W. MINAR e P
1968,180 p. (rraduzido em francês por Anthropos em 1969). No plano
da análise econômica, um texto fundamental é o de P.A. BARAN. Eco
i
ORLEANS (editores), The Neli' Urbaniz..tion, Neli' York, Sr. Marrin's nomie Politique de la croissancc, Paris, Maspero (primeira edição ingles."
,
I Press, 1968; P MEADOWS e E. H. MIZUCHI (editores), Urbanism, 1954) e sobre os mecanismos inrcrn.lcionais há o de A. EMMANUEL,
Urballizatioll a"d Change, Reading (Mass), Addison-Wesley, 1969, e o I1Échange Inégal, Maspero, 1969 e de S. AMIN, UAcummulation du ca
inreressame tr"b.llho colerivo de A. GUNDER FRANK, CEPAL; L. pit,,1 à I'echelle mOlldiale, Paris, Anrhropos, 1970.
PEREIRA; G. GERMANI e ). GRACIARENA, Urbanização e Subde
14. O problema em seu conjunto é tratado de forma clara, precisa, do
scnvoll'imcnto, Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1969.
cumentada por P )ALÉE em sua obra Uimpérialüme m 1970, E Maspe
3. BRlAN). L. BERRY (University ofChicago), "Some relarions ofUrba rO,Paris, 1969,231 p.
nizarion and Ba.<;ic P"ttCIl1S of Economic Dcvclopmcm", artigo apresentado
15. Cf. CH. BETTELHEIN, Pltlniftcation et Croissanee accélm!c, Mas
no Seminário sobre Problemas Urb.U1os, Universidade de Oregon, 1962.
pera, Paris, 1967, cap. 3.
4. ). P GIBBS e W. T. MARTIN, "Urbanizarion, Technology and rhe
Divisioll of Labor: Intcrnational Patterns", American Sociological Rel'icu 16. Cf. EH. CARDOSO e E. FALETTO, Desarrollo y Depmdmcia m
27 de Oumbro de 1962, 667-677. Cf. também ). A. KAHL, "Some American Latina, Siglo XXI, Mcxico. 1970.
Social Concomitants ofIndustrialization and Urbanization: A Research 17. Esta análise apóia-se teoricamente nas contribuições de N. POU
Review", Human Orga"ization, XVIll, n° 2, verão de 1959, pp. 53-74. LANTZAS em sua obra, de extrema importância, Pouvoir politique ct
5. Segundo a perspectiva perfeitamente sinretizada por w.w. ROSTOV, classes sociales, Maspero, Paris, 1968, 398 p.
The stages ofEconomic Growth. A Non Communist Manifesto, Cambridge 18. G. NORTON, S. GINSBURG, "Urban Geography and Non-Western
The University Press, 1960. Areas", em PH. H. HAUSER e L.E SCHNORE, op. cir. (1965), pp.
6. Cf. KINGSLEY DAVIS e HILDA H. GOLDEN, "Urbanization a"d 311-347.
thc J)el'clopment ."d Cultural Change, III. Oct. 1954, pp. 6-26.
19. Por exemplo, N. KEYFITZ, "PoliticaI Economic Aspeets ofUrbaniZ<l
7. Cf. PH. M. HAUSER (editor). UUrba"ization cn Amérique Lati"e, rion in South and Sourheasr Asia", em PR. HAUSER e E SCHNORE
UNESCO, Paris, 1961, pp. 149-151. (eds) op. cir. 1965, pp. 265-311.
108 M,nuc1 Casrells A QUESTÃO URBANA 109
20. Ver >< especiticações que GINSBURG oferece cm seu artigo citado 32. Ver a respeito deste ponto, os dados 'presentados sobre os Estados
lU l10ta 85. brasileiros por 1: LYNN SMITH, Why the Cities? Observatiom on Urba
21. Cf. A. PIZZORNO, op. cit., 1962. nization in Latin America, em PH. L. ASTIITO e R.A. LEAL, Latin
Ammcan Problems, St-John's Univ. press, N.Y., 1964, pp. 17-33.
22. Tendência representada, entre outras, por E.C. HAGEN.
33. Para o México e o Chile, cf. R.M. MORSE, op. cit., 1965, p. 17;
23. Cf. S. BARRACLOUGH, Notas ,obre tendência de la tierra en Ame.
H.L. BROWNING apresenta dados interessantes, no conjunto, em "Rc
rica Latina.IClRA, Santiago de Chile, 1968.
cent trendsll in Latio American Urbanization '" The AnnaLs, março de
24. cr. r.A. BARAN, op. cit., 1954. 1958, pp. Ill-I26.
25. A.S. LINSKY. "Some Generaliz.1rions Cancerning Primare Cicies", 34. Cf. CARDOSO, op. cit., 1968, pp. 74.
Thc Annals of the Association of American Geographm, t. 55, setembro
35. Cf. G.A.D. SOARES, Congruency and Incongruency Among Indicators
1965, pp. 506-513.
ofEconomic D<vdopmcnt, Institute of Internacional Studies, Berkeley.
26. Cf. HOSELITZ. op. cit., 1957.
36. C. FURTADO, Obstáculos políticos ao crescimento econômico do
27. Podemos encontrar um bom repertório desta perspectiva no estudo Br><il, Revista Civilização Brasileira, I, I, março de 1965, pp. 133-141.
bem documentado de ). DORSBLAER e A. GREGORY, La Urbaniza.
37. A. QUIJANO, Depcndencia, Cambie Social y Urbanizacitin en Latino
cÚJn en Ammca Latina, 2 vaI. FERES.CRSR, Friburgo.Bogotá, 1962.
Ammca, CEPAL, Division de Estudios Soci.tks, noVo de 1967, 44 p. mimeo.
28. Felizmente dispomos de três excelentes textos de síntese. O primeiro
38. Cf. CARDOSO, op. cit., 1968, p. 74.
expõe os resultados mais marcantes da pesquisa sobre o assunto:R. M.
MORSE, "Urbanization in Latin America", Latin American Restarch 39. Cf J. WEISSLITZ, Lu migratiom am Phvu, Soroonne, Paris, 1969.
RepielV, Aummn 1965 (consultado na edição espanhola, sob forma de 40. HAUSER, op. cir., 1961.
brochura e com bibliografia ampliada, Universidade do Texas, 1968,
41. HAUSER, op. cit., 1961, pp. 88-90.
56 p.). Os dois outros enf,tizam os dados estatísticos disponíveis: C.A.
MIRO, "The population of Lltin America", Demography, 1964, vaI. I, 42. Cf. MARIA EUGENIA ARAVENA, Dependincia y urbanizacion en
pp. 15.41; ).D. DURAND e C.A. PELAEZ", P.merns ofUrbanization in America Latina: d período colonial, FLACSO, Santiago do Chile, 1968
Lacin America", cm Milkbanll Mmwriai Fund Quaterly, 43, nO 4, Outubro (mimeo).
1965, pgs. 166-196. Enfim, citemos, por um lado, mais recente compi. 43. ). r COLE, Latin America. An Economic and Social Geography, Lon
laçâo de dados estatísticos: O.E.A., Situaâón Dtmo...qrafica de America don, Batterwarths, 1965,468 p.
Latlna, Washington, 1970; por outro lado, o nlunero em preparo sobre
44. R. CORTES CONDE e E. GALLO, La formación de la Argentina
«rmperillisme ct Urbanisatioll ell Amériquc Latine", da revista. Espacts
moderna, Paidos, Buenos Aires, 1967.
ct Soâétés".
45. A. PINTO, Chile: un caso de desarrollofrustrado.
29. Cf. sobre este pomo e para a análise de conjumo, um livro essenci
46. A. QUIJANO, Tendencial de cambÚJ en la sociedad peruana, Universi.
al, de A ..G. FRANK, Capitalisme <t ,ou,.d",doppement ai Amérique Lati.
dad do Chile, mimeo, 1967.
ne, M.lspero, Paris, 1968, 302 p.; também sobre este ponto específico:
R. M. MüRSE, "Some Characteristics of L'tin American Urban His. 47. Cf. M. HALPER!N, Growth and m,is in Latin Ammcan Economy,
tor)''', Am<rican Historical Repiew, LXVII, 2, 1962, pp. 317-338. em PETRAS e ZEITLIN (cds), op. cit., 1968, pp. 44-76.
30. Cf. A.G. FRANK, op. cit., bem como O conjunto dos ,m,ilises com. 48. Cf. A. G. FRANK, op. cit., 1968.
pilad,lS por). PETRAS eM. ZEITLIN em Latin America: Riform or Rc.
49. Cf. ). GRACIARENA, Podcr Y dasu Sociaiu en el Duarrollo de
l'olurion? E\\vcett Publications, Greenwich, Cann, 1968, 510 p. Amenca Latina, Paidos, Buenos Aires, 1967.
31. Nós nos aproximamos aqui d.l perspectiv.l desenvolvida pelo soció 50. Ver HAUSER, op. cit., e t,mbém A. SOLAR!, Sociologia rural lati.
logo peruano A. QUI/lu'10. noamericana) Paidos, Buenos Aires, 1968, p. 40.
110 Manuel Cascells