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Resumo técnico do documentário “Quebrando o tabu” e reflexões sobre a

atuação do psicólogo

A opinião da sociedade mundial em relação ao uso de drogas é algo


intensamente moralista e conservador, a qual permanece enraizada na maioria dos
indivíduos e, dessa forma, acaba por dificultar o debate inclinado para outras visões
voltadas a essa problemática. Nos anos 70, a grande potência estadunidense declarou
Guerra às drogas, definindo o consumo de drogas como um crime a ser punido em
cadeia. A partir disso, diversos países se inspiraram e criaram uma política contra o uso
de drogas cada vez mais forte, na tentativa de trazer benefícios e evitar que novos
usuários surgissem.

Entretanto, a realidade trazida pelo documentário “Quebrando o tabu” é


totalmente distinta. A criminalização do consumo de drogas trouxe um aumento
considerável da violência, pelo fato de que parte do dinheiro adquirido pelo tráfico
ilegal é utilizado para comprar armas, facilmente obtida pelas gangues criminosas que
movimentam o negócio. Além disso, existe a ineficiência da Polícia Federal no combate
ao tráfico, que são gratificados financeiramente por cada pessoa presa por causa de
entorpecentes. Os policiais são preparados para ter, de maneira evidente, a liberdade de
extermínio para com os indivíduos envolvidos.

É necessário que se observe as provas claras de discriminação racial nas leis do


nosso país com relação à criminalização do uso de narcóticos. A maioria dos indivíduos
encarcerados, independente do gênero, é de cor preta e originados de periferias. Logo,
existe a facilidade do acesso às drogas, além de que a maioria não tem estrutura familiar
e orientação educacional para evitar o consumo. A situação traz um peso para a
realidade social a qual muitos brasileiros estão inseridos, e infelizmente, o Estado não
enxerga a possibilidade de modificá-la a partir da inclusão.

A questão social envolve diversos fatores que podem justificar o envolvimento


dos jovens no tráfico de drogas, sendo este o meio de ascensão financeira e
sobrevivência mais acessível para eles. Através do documentário, é possível
compreender que o investimento exacerbado no combate as drogas gera intensos
prejuízos e a situação continua estática. Na atualidade, existem países que debatem
outras possibilidades que possam findar o crime organizado e oferecer um tratamento
adequado aos dependentes químicos.

Anteriormente, a principal estratégia utilizada para cuidar dos dependentes


químicos era fazê-los se abster da droga de modo repentino e abrupto, pensamento que
se manteve presente na maioria das propostas de tratamento nas instituições de
assistência dos dias atuais. Contudo, em determinado momento, os profissionais de
medicina criaram resistência para estudar os aspectos causados pelas drogas, justamente
pelo senso comum que se constituiu em relação aos usuários, os quais eram
considerados uma ameaça à sociedade. Dessa forma, a questão jurídica tomou espaço e
tais indivíduos foram tratados não mais como doentes, mas criminosos.

Diversos profissionais de saúde, incluindo o Dr. Drauzio Varella, afirmam que a


dependência química é um problema de saúde pública e, portanto, não deve ser
criminalizada. Se o Estado criar medidas de aproximação dos usuários e oferecer
serviços de tratamento e cuidados básicos, existe a possibilidade deles adquirirem uma
vida menos prejudicial e, por consequência, se recuperarem. O governo Holândes, por
exemplo, pode auxiliar 90% de todos os dependentes que buscam ajuda em programas
de desintoxicação. Por isso, é importante analisar criticamente se a verba
disponibilizada pelo Estado está sendo usada com sabedoria, tendo em vista que outros
países que optam pela discriminalização têm resultados bem mais favoráveis.

A política de redução de danos é uma das medidas mais eficazes para que
ocorra a possível recuperação dos usuários de drogas. No Brasil, surgiu na década de 80
e tem como objetivo o fortalecimento de vínculo com as pessoas que fazem uso de
substâncias para, desta maneira, estimular o autocuidado e a reflexão sobre o uso de
drogas, além de prevenir a transmissão de doenças. Por exemplo, se o indivíduo está
viciado e não consegue evitar o uso, é necessário que se ofereça, pelo menos, um lugar
higienizado, onde ele não vá usar uma seringa compartilhada com outros usuários.
Ademais, evita que haja a possibilidade do uso exarcebado da substância, ocasionando
uma overdose.

Por meio da análise e de grandes reflexões, deve-se trazer a importância da


participação dos profissionais de psicologia no tratamento de dependentes químicos.
Primeiramente, compreender o contexto histórico do uso de drogas é imprecindível para
qualquer psicólogo da área social, o qual necessita ter noção da ideia de que a
dependência de substâncias é algo voltado para o conceito de doença, tendo como
obrigação estar livre de crenças e preconceitos. No Brasil, o trabalho do psicólogo se
inicia dentro do Centro de Referência a Assistência Social (CRAS), o qual oferta o
serviço de Proteção e Atendimento Integral às Famílias (PAIF) e desenvolve o trabalho
de fortalecimento de vínculos com as famílias, promovendo a reflexão sobre a temática
drogas na sociedade; e, também, no Centro de Referência Especializado de Assistência
Social (CREAS), o qual oferta atendimento as famílias e aos indivíduos em situação de
risco pessoal e social.

Além disso, existe o Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS


AD), o qual oferece atendimento para indivíduos com transtornos decorrentes do uso
abusivo de álcool e outras drogas, devendo estimular a sua integração familiar, cultural
e social, apoiar as suas buscas por autonomia e oferecer atendimento médico e
psicológico. A criação do CAPS se deu no final da década de 80, logo após o intenso
movimento social que denunciou a situação precária dos hospitais psiquiátricos e, a
partir desse contexto, tinha como objetivo oferecer aos usuários um tratamento mais
humanizado. Se o município não obtiver o CAPS, é necessário que se procure a Atenção
Básica (AB), que se torna a opção preferencial dos usuários, a principal porta de entrada
e o centro de comunicação de toda a Rede de Atenção a Saúde, instituída pelo Sistema
Único de Saúde (SUS).

Aliás, deve haver a interdisciplinaridade entre os profissionais de saúde e


assistência social. Para que o trabalho do psicólogo realmente funcione, ele precisa estar
em contato com os demais profissionais, como os assistentes sociais, terapeutas
ocupacionais, pedagogos, fonoaudiólogos, psiquiatras, enfermeiros, entre outros os
quais também têm a sua importância no processo. O contato entre eles traz a
possibilidade de haver uma discussão interdisciplinar dos casos, avaliação conjunta,
compartilhamento de experiências e de suas respectivas angústias geradas pelas
demandas; podendo, dessa forma, facilitar o trabalho e acolher os profissionais. A
promoção da saúde mental deles é de intensa valia, pelo fato de que o auxílio de suas
angústias tem efeitos sobre o seu acolhimento e escuta ao usuário do SUS.

Em relação à atuação do psicólogo dentro desse contexto, existem discussões


acerca da sua dificuldade em se inserir e de estabelecer um plano de trabalho que
concilie o conhecimento das práticas psicológicas com a atuação neste campo. Isso
acontece porque os profissionais têm como desafio a adaptação às novas exigências
estabelecidas no contexto atual de saúde. Logo, cabem a eles ter uma visão clara sobre a
diversidade social, cultural e econômica dos usuários para que se realizem práticas
humanizadas que vão além do diagnóstico. Ter consciência de todo o caminho
percorrido pelos pacientes até se encontrarem como indivíduos dependentes de
substâncias são de extrema importância para elaborar um tratamento específico.

Para que haja eficiência no tratamento, o psicólogo necessita trabalhar as


questões do usuário tanto de forma individual, como também coletivamente. Ademais,
deve existir uma extensão para o trabalho com a família e as visitas domiciliares, tendo
em vista que, na maioria das vezes, a família é o motivo principal para o uso abusivo de
substâncias. É fundamental estabelecer intervenções na dinâmica e no sistema familiar.

A proposta da intervenção psicossocial é, justamente, reinserir o sujeito na


sociedade. É preciso reconstruir o olhar individual e social sobre o mesmo como sujeito
digno de cidadania e respeito. O Ministério da Saúde criou a Clínica Ampliada, a qual
tem ações voltadas para o compromisso radical o usuário de serviço, assumindo a
responsabilidade sobre ele e buscando ajuda em outros setores. Temos que ter em mente
que o objetivo da ação clínica é cuidar e, para que esse cuidado em saúde mental vá ao
encontro da perspectiva da clínica ampliada, o profissional deve ter como instrumento
de trabalho a rede de relações do sujeito. Dessa forma, é preciso reforçar o vínculo com
a comunidade para que possam ser ativados a comunicação e os recursos disponíveis
“para manter um canal cooperativo com os usuários que formam a rede”, pois
fortalecendo as redes de assistência em saúde mental constroem-se espaços de
transformação (ALVES; FRANSCISCO, 2009, p.776).

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