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LITERATURA INGLESA alguns anos – na Bretanha, levando os

A primeira literatura inglesa bretões para oeste e reivindicando o país


para eles.
Os primeiros ingleses eram
estrangeiros. Em outras palavras, vieram A Inglaterra anglo-saxã
para a Inglaterra de longe quando a região
já era habitada por uma raça que se fixará Entre esses povos, estavam os
há longo tempo e abençoada por uma anglos e os saxões, que dão seus nomes ao
civilização bastante desenvolvida. Essa raça que se designa às vezes como raça anglo-
ainda existe, encontrando-se saxã. Sua língua, ou grupo de dialetos, é às
principalmente no País de Gales, a oeste da vezes chamada de anglo-saxã, mas, no
Inglaterra, falando uma língua bem interesse da unidade, vamos manter o
diferente do inglês, diferente pelo nome de inglês arcaico.
temperamento e pela cultura do inglês Possuímos poucos detalhes históricos
invasor, cultivando ainda uma literatura sobre essas invasões e processos de
que nunca influenciou – nem foi muito fixação, que devem ter sido completados
influenciada – a literatura que estamos no fim do século VII. As lendas do rei Artur
estudando. É irônico que esse povo seja e dos cavaleiros da Távola Redonda falam a
chamado hoje de galês (Welsh, uma respeito dos defensores da antiga
palavra do inglês arcaico para civilização romana em sua luta contra os
‘estrangeiro’), quando era muito menos novos bárbaros. Os anglos e os saxões e,
estrangeiro do que os ingleses. Os romanos juntos com eles, os jutos eram bárbaros
da Antiguidade os chamavam ‘Britanni’ e a talvez apenas no sentido em que não eram
sua região, ‘Britannia”. Nós os chamamos cristãos. O império romano terminou como
bretões. um império cristão, e o cristianismo tinha
se estabelecido como a religião da
A Bretanha romana Bretanha. Mas os anglos e os saxões
adoravam os velhos deuses germânicos
Esses bretões foram governados que ainda dão seus nomes aos dias da
durante alguns séculos pelos romanos, e a semana – Thor e Wodin e todo o resto.
Britânia – ou Bretanha – era a província Portanto, possuíam alguma civilização.
situada mais ao oeste e ao norte do império Eram fazendeiros e homens do mar,
romano. Os romanos trouxeram sua língua sabiam algo a respeito do direito e da arte
(cujos traços ainda sobrevivem nos nomes de governar e parece que trouxeram com
das cidades inglesas), seus arquitetos e eles uma literatura da Europa para a
engenheiros, assim como suas legiões e Inglaterra, como o país deve ser chamado
governadores. A Bretanha foi aquinhoada de agora em diante.
com cidades, vilas com aquecimento Já pelo fim do século VI, os novos
central, banhos públicos, teatros e um senhores da Inglaterra haviam se tornado
sistema viário que ainda existe aqui e ali. um povo cristão, principalmente por causa
Mas, como sabemos, o império romano da energia dos evangelistas cristãos da
acabou caindo, as legiões romanas se Irlanda, que vieram convertê-los. E todos
retiraram, e um povo domesticado pela os registros da primeira literatura dos
civilização e pelo domínio colonial ficou anglo-saxões pertencem à Inglaterra cristã,
entregue a si mesmo e a qualquer invasor escritos por monges e guardados em
brutal que quisesse vir da Europa. A época monastérios, e que só vieram à luz na
da queda do império romano é também a época da Reforma, quando Henrique VIII
época das migrações dos povos do leste da dissolveu os monastérios. Devemos
Europa – povos como os godos e os considerar essa literatura como oral,
vândalos, que liquidaram o poder de Roma. transmitida verbalmente de uma geração a
Perturbados por esse movimento de hordas outra, com criadores desconhecidos em sua
bárbaras e implacáveis vindas do leste, maioria, e que recebeu a forma escrita
certos povos do noroeste da Europa muito tempo depois de sua composição.
atravessaram o mar e se fixaram – durante Essa literatura é quase que exclusivamente
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em verso. Há prosa, mas não é literatura um manuscrito do século X, apresenta
em sentido estrito – história, teologia, muitos aspectos da cultura pagã germânica
cartas, biografia – e os nomes dos desses povos colonizadores, uma sociedade
escritores da maior parte dessa prosa heróica baseada em condutas militares e na
permaneceram desconhecidos. Há muita memória oral.
poesia anônima no mundo, mas muito
pouca prosa anônima. O som é a essência o Fruto de um poeta cristão anônimo,
verso, e por isso o verso é sobretudo um não se sabe ao certo se foi genuinamente
objeto criado pela boca e pelo ouvido. Mas composto ou apenas adaptado de um
a prosa é um assunto para a pena e tem poema de tradição pagã oral anterior. O
que ser composta no papel. Quando um poema possui um tom claramente épico, foi
homem compõe no papel, ele geralmente composto em 3182 versos, que são
assina seu nome. Um poema é recitado, divididos em fitts, umas espécies de
lembrado, transmitido, e sua origem é capítulos, com a ressalva de que não
esquecida – pelo menos no que diz respeito necessariamente encerram aquela parte da
à literatura mais antiga. narrativa.

Beowulf A trama e as principais personagens


do poema se referem às tribos germânicas
Composição da Obra: e escandinavas do continente antes de sua
chegada às Ilhas Britânicas, dentre os quais
Aproximadamente a partir do ano estão os antepassados dos anglo-saxões.
285 d.C. os germanos do mar do norte
descobriram sua vocação marítima, Beowulf - o mais antigo poema da
infestando a costa da Gália, Bretanha e do língua inglesa - não foi composto na
norte da Espanha com piratas oriundos do Inglaterra, mas no continente europeu: os
território, que atualmente designa a novos colonos o trouxeram junto com suas
Alemanha e Dinamarca. Essa pirataria esposas, bens e posses. É um poema
primitiva que era intensiva sobre as Ilhas tumultuoso, guerreiro, violento. Beowulf é
Britânicas foi rapidamente transformada essencialmente a história de um guerreiro.
em núcleo de povoação, o que Fala do herói que dá o nome ao poema e
posteriormente se figurou como de sua luta com um monstro hediondo –
colonização. Em 407 d.C o imperador meio demônio, meio homem – chamado
romano Constantino III buscando engrossar Grendel, que durante muito tempo andou
as defesas fronteiriças de Roma contra os atacando a sala de banquetes do rei
“bárbaros”, fez a transferência das tropas Hrothgar da Jutlânia (terra dos jutos) e
romanas das Ilhas Britânicas para o seqüestrando e devorando os guerreiros de
continente, deixando o território livre para Hrothgar. Seus combates com Grendel – e
as incursões germânicas, que tiveram de a igualmente horrível mãe de Grendel – são
enfrentar os povos celtas que habitaram o assunto do poema, um poema cuja
aquela região após o domínio romano. música severa é o ranger de dentes, o
chacoalhar de ossos e cuja cor é o cinza do
Dessa invasão de povos germânicos inverno do norte, manchado pelo vermelho
às Ilhas Britânicas, duas tribos se do sangue. É comida forte, não é obra para
sobressaíram, os anglos e saxões, que os delicados, mas não é de forma alguma
posteriormente como o inglês antigo uma composição crua e primitiva. Mostra
confirma se sintetizariam. O inglês antigo grande habilidade de construção, suas
ou anglo-saxão é como a segunda imagens e sua linguagem são sofisticadas.
denominação sugere, uma síntese da língua Não é um poema cristão – apesar do sabor
anglo e saxão. cristão dado a ele pelo escriba do
monastério (por exemplo, Grendel é da
O poema Beowulf, escrito em inglês raça maldita do primeiro assassino, Caim) –
antigo por entre os anos de 680 e 729 d.C, mas o produto de uma civilização pagã
mas que só nos foi preservado através de avançada.
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História funeral de Beowulf, que é enterrado com o
O poema narra as aventuras de tesouro numa mamoa num monte junto ao
Beowulf, herói com força sobrehumana, mar, de onde os navegantes a pudessem
originário da tribo dos gautas (na atual ver.
Götaland, Suécia). Ao ouvir as desventuras
que afligem a corte do rei Hrothgar, na Estrutura do poema
Dinamarca, Beowulf viaja com um pequeno
grupo de guerreiros a esse país, onde é A narrativa do poema pode ser
recebido pelo rei em Heorot, o grandioso superficialmente dividida em seus três
salão da corte. Logo ao chegar o herói se conflitos e no resultado da morte do Herói,
oferece para livrar Hrothgar e seu povo dos sendo assim nessas quatro partes:
ataques de Grendel, uma criatura
monstruosa, descrita como descendente do 1. A Viagem de Beowulf a terra dos
clã de Caim e verdadeiro símbolo do mal Danos, onde enfrenta uma criatura
encarnado, que devora homens inteiros. O chamada Grendel que tem amaldiçoado o
herói vence e mata Grendel em duelo, recém construído salão Heorot. O monstro
utilizando como arma apenas as suas mãos consegue fugir da batalha mesmo que
nuas. Seguidamente, a mãe de Grendel, mortalmente ferido (do fitt 1 ao 12).
também uma criatura monstruosa, vem
vingar a morte do filho com novas 2. Após o herói ser recompensado
carnificinas. Beowulf segue seu rastro até junto aos seus companheiros pelo rei dos
uma caverna submarina, localizada num Danos uma nova ameaça surge: a mãe de
lago habitado por monstros aquáticos, onde Grendel, sedente de vingança pela morte
a combate e vence com uma poderosa do seu filho. Beowulf a mata em seu
espada, criada para matar gigantes. Depois próprio lar (do fitt 13 ao 24).
desta aventura, Beowulf e seus guerreiros
retornam por mar à terra dos gautas. 3. Após novo banquete Beowulf
O relato então é cortado por um volta ao seu lar, terra dos Getas. É narrado
longo hiato temporal e encontramos o como ele obteve o titulo de rei. Em seguida
mesmo Beowulf, já idoso e rei entronado após 50 anos de seu reinado ele tem de
do seu país. A chegada de Beowulf ao trono enfrentar um Dragão que ataca o seu povo,
é explicada rapidamente: o rei Higelac neste combate ambos oponentes são
morre numa batalha contra os frísios, mortos (do fitt 25 ao 38).
sendo sucedido por seu filho Heardred. Este
é mais tarde morto numa batalha contra as 4. São narradas as implicações que
tropas suecas do rei Onela, deixando vazio a morte do rei Beowulf vai causar ao povo
o trono gauta, que é ocupado por Beowulf. danês, entre elas a principal é o fim da
Cinquenta anos após ser entronado, trégua com povos inimigos sedentos de
Beowulf necessita livrar seu reino de um vingança por derrotas passadas (do fitt 39
dragão, que fora despertado por um servo ao 43).
que roubara uma taça do seu tesouro
ancestral, guardado sob a terra numa Os 43 fitts do poema apresentam as
mamoa (um monte funerário feito pelo seguintes narrativas:
homem). Beowulf, munido de uma espada
e um escudo de ferro, entra na caverna Prefácio- Começo da linhagem dos reis de
onde se encontra o tesouro e o dragão um povo conhecido como Dano.
cuspidor de fogo, travando com ele uma
feroz batalha. Wiglaf, o mais fiel dos seus I- Um rei danês chamado Hrothgar constrói
guerreiros, entra na caverna e ajuda o rei a um suntuoso salão de festas conhecido pelo
matar a criatura, derrubada por uma nome de Heorot.
estocada fatal de Beowulf. Esta termina
sendo a última aventura do herói, que II- Um monstro denominado Grendel
morre devido às terríveis feridas causadas começa a atacar o salão durante as noites,
pelo monstro. O poema termina com o
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por se machucar com a felicidade que é XVII- Banquete no salão com o poeta
emanada de lá todos os dias. cantando antigas histórias dos Danos.

III- Beowulf um nobre do povo Geta ao XVIII- A rainha dos Danos agradece
ouvir falar das dificuldades dos Danos Beowulf por ter derrotado o terrível
resolve ajudá-los. monstro.

IV- Ao chegar a costa marítima dos Danos, XVIIII- Logo após o banquete enquanto
os Getas se apresentam como aliados. dormiam a mãe de Grendel, sedenta de
vingança pela morte do filho ataca o salão
V- Beowulf pede para falar com o Rei dos e mata um nobre conselheiro e confidente
Danos. de Hrothgar.

VI- Beowulf se apresenta ao rei, dizendo XX- Hrothgar pede a Beowulf que se livre
que foi escolhido pelos Getas para matar o da mãe de Grendel, prometendo mais
inimigo dos daneses. tesouros e honra.

VII- O rei se queixa a Beowulf das XXI- Os nobres vão com Beowulf ao lago,
desgraças que Grendel trouxe ao seu povo. lar da mãe de Grendel.

VIII- Durante o banquete no salão Unferth, XXII- Beowulf entra no lago, após ser
um nobre danês provoca Beowulf atacado por muitas criaturas, após ser
questionando seus resultados em ocasiões imobilizado dentro d’agua é levado pela
passadas. mãe de Grendel ao seu salão submerso.

VIIII- Beowulf se defende da provocação de XXIII- Beowulf vence a mãe de Grendel, no


Unferth. salão ao qual está encontra o corpo de
Grendel morto e arranca-lhe a cabeça,
X- O banquete é encerrado e os viajantes levando como troféu.
esperando a aparição do inimigo dormem
no salão. XXIV- O herói se apresenta no salão Heorot
como vencedor da batalha e com a cabeça
XXI- Grendel adentra o salão e começa de Grendel como troféu.
uma batalha contra Beowulf.
XXV- Banquete no salão com outra
XII- A batalha continua, ao perceber a distribuição de tesouros.
força do herói o monstro consegue fugir do
salão mortalmente ferido. XXVI- Despedida entre Beowulf e Hrothgar,
vai voltar a sua terra.
XIII- No dia seguinte a batalha todos os
nobres vão ao salão contemplar a garra do XXVII- Retorno de Beowulf a sua terra,
monstro arrancada por Beowulf que havia território Geta.
ficado presa ao teto.
XXVIII- Beowulf conversa com Hygelac, Rei
XIV- Hrothgar aclama em discurso no salão dos Getas.
a vitória de Beowulf.
XXVIIII/XXX- O herói repassa ao rei a
XV- O rei recompensa Beowulf com situação dos Danos com os povos vizinhos,
tesouros por livrar os daneses de um além de narrar seus atos heróicos em terra
grande infortúnio. estrangeira.

XVI- Continuação da distribuição de XXXI- É narrado como Beowulf chega ao


tesouros para os companheiros de Beowulf. trono dos Getas e reinar por 50 anos.

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XXXII- Um súdito do rei dos Getas rouba O poema reflete a época violenta em
uma peça do tesouro escondido de um que foi escrito, cheio de sangrentas
Dragão, este desperta e começa a atacar batalhas, em que os valores mais
todo o reino em busca de vingança pelo estimados são a honra, a coragem e a
tesouro ao qual protege ter sido violado. fortaleza. Outro valor central na época e
refletido no texto é a lealdade e respeito
XXXIII- Beowulf deseja vingar o povo Geta entre os guerreiros vassalos e seu rei. Em
dos ataques da criatura, por isso pede ao recompensa pelos serviços prestados pelos
súdito causador do problema que o leve seus guerreiros, o soberano lhes oferece
juntamente com os nobres ao qual riquezas (jóias, ouro, armas, cavalos) e
escolheu para o covil do monstro. terras. No poema, Beowulf demonstra
frequentemente sua extrema lealdade ao
XXXIV- Beowulf enquanto espera o monstro rei dinarmarquês Hrothgar e os reis gautas
conta sobre a sua vida desde a infância aos Hygelac e Heardred.
atos heróicos que fez. Vários personagens, tribos e
acontecimentos do poema revelam que o
XXXV- O Dragão ao ver o herói junto ao relato se passa no século VI. Personagens
seu tesouro o ataca. Os companheiros de semi-lendários como os reis Hrothgar e
Beowulf fogem da batalha, restando apenas Hygelac (mas não Beowulf), aparecem em
Wiglaf. crônicas e sagas escandinavas, e a batalha
contra os frísios em que morre Hygelac é
XXXVI- Ao ver seu Rei correndo risco de possivelmente histórica, coincidindo com
vida e seus companheiros fugindo, Wiglaf uma batalha travada no ano de 516 dC
socorre Beowulf. referida por Gregório de Tours. Beowulf,
porém, deve ser visto como um poema
XVII- O Dragão é cortado em dois por criado para o entretenimento e não como
Beowulf, mas este é envenanado pela crônica histórica.
criatura. Na época dos eventos narrados no
poema os povos escandinavos eram ainda
XXXVIII- Após dizer como quer seu rito pagãos, mas o texto contém algumas
funerário Beowulf morre. referências a Bíblia e a Deus, sem dúvida
pelo fato de que os escribas eram já
XXXVIIII- Wiglaf censura os covardes por cristãos. Muitos aspectos da narrativa são,
só voltarem após o fim da batalha e a porém, mais condizentes com valores
morte do rei. germânicos pagãos. Beowulf entra nas suas
batalhas convencido de que não é apenas
XL- É anunciada a morte do rei Beowulf ao sua capacidade que decide o resultado,
povo Geta. mas também a força sobrenatural do
destino, um aspecto típico das sociedades
XLI- Se narra como a morte do rei pode ser germânicas guerreiras da época. Em outros
recebida com felicidade pelos povos trechos, porém, o narrador atribui o
inimigos dos Getas, que sabendo da morte resultado favorável das batalhas à vontade
do seu protetor irão tentar vingança contra de Deus.
esse povo. O poema épico “Beowulf” é um longo
poema de temática heróica que apresenta
XLII- Se distribui o tesouro do Dragão as principais características épicas anglo-
como herança de Beowulf ao seu povo. saxãs – sobretudo a dicção típica da
narrativa dos feitos bélicos e os valores
XLIII- É narrado o funeral crematório de específicos de conduta militar – mescladas
Beowulf, o mais nobre de todos os Getas a uma amálgama de material histórico,
enquanto esteve vivo. elemento mitológicos comuns aos povos
Análise germânicos antigos e preceitos do
cristianismo. (RAMALHO, 2007, p. XI).

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treinando todos os dias para a batalha do
Algumas questões do Herói “juízo final” dos deuses. Como o poema foi
escrito por um cristão e o paganismo foi
1- O fado (destino) suprimido, as almas dos gloriosos vão para
o paraíso que seria o lugar dos gloriosos.
- Uma das principais características do Quando Beowulf morre:
herói em Beowulf é sua confiança no fado
(destino), têm-se a idéia de que ele é “Sua alma
traçado no nascimento e o dia final já está partiu do peito para procurar
fixado por Deus. Na tradição escandinava e o juízo (grande glória) dos justos.”
de forma mais abrangente na tradição da (Beowulf – XXXVIII)
Europa setentrional o destino era fixado na
Orlog - lei fixada na origem – pelas nornas, - A glória é ganha não apenas em nome do
três entidades divinas chamadas Urd, herói, mas de todo o seu povo e
Verdandi e Skuld, que assim como as principalmente de seu rei. Durante o
parcas gregas representavam poema Beowulf exemplifica isso quando
respectivamente o passado, presente e pede pra Hrothgar, rei dos Danos mandar
futuro. Por já estar fixado não deveria se os tesouros ao qual recompensou o herói
temer a escolha de Deus (no caso do poeta para o rei dos Getas, Hygelac; e ao morrer
cristão) no destino do homem, pois ele não quando o tesouro do Dragão ao qual
falha. conquista é dividido aos nobres do seu
povo.

“Assim, aqueles a quem “Honrei, príncipe, teu povo com mi’a obra”
Deus protege escapam, pois, do pesar (Beowulf – XVIIII-XXX)
e do exílio – a falecer não fadados.”
(Beowulf – XXXII) “Ao senhor, pelos ornatos
que vejo, graças verto em verbos (Lorde
“Há de ditar o destino o fado- este, eterno, Rei da glória) enfeites ganhos,
criado por Deus pra criaturas.” por mim, pro meu povo, antes de partir.”
(Beowulf – XXXV) ( Beowulf – XXXVIII)

2- Morte e Glória 3- As armas

- A morte era algo alegre se gloriosa, já - Como a sociedade do poema é baseada


que o destino era fixado por Deus, assim em condutas aristocráticas e guerreiras,
no universo do poema o que se deve fazer típicas dos povos nórdicos, as armas
em vida enquanto o fado não chega é tinham um destaque em vingança de
buscar a fama, quando ela é famílias, resolução de problemas pessoais,
experimentada a morte pode ser guerras e etc.; por isso possuíam grande
considerada plena. valor, além disso, serviam para distinguir o
nobre do gentio comum. Dessa forma o
“Melhor mesmo é a morte equipamento bélico do herói no qual se
de amigo desforrar que deplorá-la inclui espadas, escudos e cotas de malha
com grandeza. Hemos de experimentar, servem para identificá-lo em relação aos
todos no mundo a morte. Quem merece demais nobres. Principalmente porque seus
que faça, antes do fim da vida, fama – equipamentos foram ganhos em atos
pro varão não mais vivente é o melhor. “ heróicos passados.
( Beowulf – XXI)
“Nunca vi cá virem varões co’escudos
- Os gloriosos mortos na mitologia tão patentes. (…)
escandinava iam para Valhalla, um salão Jamais vi maior varão que, dos vossos,
em que apenas os grandes guerreiros este que arnês traja. A julgar pelo ar,
escolhidos pelo deus Odin ficariam, não é serviçal.
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(Beowulf – III) Verdade: No fitt VIII, Unferth duvida dos
feitos heróicos de Beowulf e diz ter pena do
“Ao guerreiro destino do mesmo ao enfrentar Grendel. No
o monstro tocou, mas não fez mal: malha fitt seguinte Beowulf defende sua honra e
de prélio (elos de laço) protegia-lhe faz o nobre danês se calar ao dizer que se
o corpo (…).” Unferth fosse tão bom na espada quanto é
(Beowulf – XXII) em difamar os outros ele mesmo derrotaria
- Nesse tipo de sociedade a qualquer a criatura aterrorizante.
momento se poderia ser atacado, por
múltiplos motivos: desde inimigos pessoais Lealdade: Tanto ao rei quanto aos
a confronto de povos. Portar uma arma era companheiros de batalha a lealdade é algo
uma necessidade, o único meio de se sentir honroso e por isso glorificante. Quando ao
seguro, por isso não se separava dela. lutar contra o Dragão os nobres escolhidos
por Beowulf fogem eles quebram o laço de
“No salão, dentre os nobres, sobressaíam lealdade e por isso são duramente
poderosa lança, elmo (em prélio excelso) criticados por Wiglaf que permaneceu ao
e cota de correntes. Costumava-se lado do seu rei até a sua morte.
sempre pronto a prélio estar, precisasse
(seja em casa, seja no campo) seu “Eu hei de então, os trazer,
soberano. Era aquele seu bom povo.” rei-guerreiro, pra, de bom grado, rendê-los
(Beowulf – XVIII) a ti, pois é de ti que nos vêm todos
os favores.”
4- Código de honra (Beowulf – XXXI)

- O herói épico serve para traçar as “Assim amigos agem:


características boas e ruins dentro da sem tecer sórdidas tramas – secretas
sociedade na qual esta inserido. Como em artimanhas não articulam eles
Beowulf é exemplificado uma sociedade pra aliados co’elas assassinar.”
guerreira e aristocrática, algumas de suas (Beowulf – XXXI)
virtudes ideais são a:
-Coragem: Confiante em seu destino o
Justiça: O herói enfrenta os inimigos em herói pode entrar em batalhas sem
nível de igualdade, no confronto contra qualquer temor, caso seu destino
Grendel ele tira sua armadura e pede que terminasse ali, seria uma morte gloriosa
guardem sua espada, pois o inimigo não em combate. Além disso, o herói confiava
usa nenhum desses equipamentos bélicos. no sangue de seu povo e nas suas armas
Essa igualdade se torna necessária para a que eram artefatos ganhos em outras
luta ser justa, só em batalha de condições circunstâncias. Um exemplo disso é que
iguais entre os oponentes é que pode haver Beowulf adentra o lago onde vive a mãe de
glória, pois só assim a coragem pode ser Grendel, com uma esplêndida cota de
medida. O herói confia que o seu destino é malha que o protege de diversos golpes de
vencer a criatura: monstros, empunhando uma espada
lendária entregue por Unferth ele tenta
“Não venho para deixá-lo sem vida matar a mãe de Grendel, após a espada
com esta espada minha, embora isso eu falhar ele encontra outra arma no salão
pudesse. Posto, pois, que não possui submerso, com a qual consegue derrotar a
prática criatura.
de armas alguma, não há de atacar-me (…)
Se não temer ele lutar desarmado,
sem lâmina enfrentar-nos-emo. Que
escolha
Deus sábio (senhor Sacro) o sobrevivente.”
(Beowulf – X)

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