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Clássicas do pensamento social

a diferença entre espaço público e esfera A História é um saber inaugurado na moder-


privada, o direito à educação, as obrigações nidade a fim de orientar o progresso da
Alex andr a Kollontai | Alfonsina Storni
morais e as limitações da sexualidade, as humanidade em direção a um futuro melhor,
exigências familiares, o casamento e o ingres- Anna Julia Cooper | Charlotte Perkins Gilman mais digno e emancipador. É também, ou por
so no mercado de trabalho, a maternidade Ercília Nogueira Cobra | Harriet Martineau isso mesmo, a história de grandes narrativas,
e o racismo contra as mulheres negras. Pandita Ramabai Sarasvati | Olive Schreiner a história de vencedores. Essa definição ex-
Numa palavra, o direito de existir. Para elas, plica, pelo menos em parte, por que mulheres
tornar-se mulher era tornar-se cidadã. têm estado à margem dessa construção, em
A questão pode até ter sido legada ao que pese os esforços de considerar o gêne-
feminismo do século XX, cuja luta é por uma Clássicas do pensamento social é uma coletânea de tex- ro como categoria útil para análise histórica,
cidadania não condenada à segunda classe, tos de oito pensadoras, de diferentes localidades, entre sobretudo a partir do trabalho da pesquisa-
mas persiste no século XXI, o que confere dora Joan Scott.
profunda atualidade ao Clássicas do pensa-
os séculos XIX e XX, que obtiveram nenhuma ou pou-
mento social e à pro-posição da argentina ca circulação no Brasil. Em provocação (e certa ironia), O livro Clássicas do pensamento social
Alfonsina Storni (1892-1938): “Não há mulher as organizadoras Verônica Tostes Daflon e Bila Sorj tecem responde, em primeiro lugar, a uma neces-

Clássicas
normal de nossos dias que não seja mais ou comentários e, ao mesmo tempo, questionam o que define sidade histórica: recuperar ao cânone das
Ciências Sociais as ideias, a visão crítica
menos feminista.” um “clássico”, retirando da marginalidade mulheres cientis-
e as elaborações teóricas de mulheres que
Carla Rodrigues, tas sociais ainda hoje muito relevantes.

do pensamento
não entraram para a História do pensamen-
professora e pesquisadora na UFRJ/Faperj to social, cuja bibliografia, como acontece
“Como seria uma sociologia clássica produzida por mulhe- em tantas outras áreas de saber, é formada

social
Verônica Toste Daflon é doutora em res e sobre mulheres? Essa pergunta foi feita pouquís- apenas por homens. As autoras aqui reto-
simas vezes. [...] Uma das principais causas é que os

Verônica Toste Daflon e Bila Sorj


Sociologia pelo Instituto de Estudos Sociais Mulheres e feminismos madas, Harriet Martineau, Anna Julia Cooper,
e Políticos, IESP-Uerj. É professora adjunta do autores considerados clássicos trabalharam com definições Pandita Ramabai Sarasvati, Charlotte Perkins
Departamento de Sociologia e Metodologia
no século XIX Gilman, Olive Schreiner, Alexandra Kollontai,
do mundo social que reforçam o androcentrismo [...].
em Ciências Sociais da UFF e pesquisadora Ercília Nogueira Cobra e Alfonsina Storni,
Se dependêssemos deles, poderíamos encerrar por aqui
visitante no Instituto de Estudos Avançados, viveram entre o final do século XIX e o início
nosso exercício de imaginação sobre as mulheres nas Organização e comentários Verônica Toste Daflon e Bila Sorj do século XX. São herdeiras dos ideais das
IAS-Princeton. Seus interesses de pesquisa
e trabalho são: sociologia das desigualdades, teorias sociológicas do século XIX. Isso se não fosse por mulheres que estiveram na Revolução Fran-
sociologia das relações étnicas, raciais e de um detalhe: mais de cinco décadas antes de surgirem as cesa lutando por cidadania e que foram pre-
gênero e políticas de ação afirmativa. primeiras revistas científicas, os cursos universitários e as cursoras das sufragistas, que conquistaram
sociedades de sociologia, uma mulher de fato imaginou o direito ao voto. Mesmo atuando na perife-
Bila Sorj é doutora em Sociologia pela um método científico para o estudo do mundo social. ria do saber, essas mulheres conseguiram
Universidade de Manchester, Grã-Bretanha. enfrentar os imensos obstáculos de seu tem-
E, mais que isso, demonstrou ter um olhar extremamente
É Professora titular de Sociologia da UFRJ, po, mas ficaram à margem, exigindo uma es-
aguçado para questões de gênero.” pécie de arqueologia epistêmica, função que
pesquisadora do CNPq e Cientista do Nosso
Estado, da Faperj. Coordena o Núcleo de Es- este livro desempenha com maestria.
tudos de Sexualidade e Gênero da Pós-Grad- Apesar das diferenças regionais em que
uação em Sociologia e Antropologia da UFRJ. cada autora desenvolveu seu pensamento,
Tem pesquisado e publicado trabalhos nos há nelas um solo comum de questões que
seguintes temas: gênero, trabalho e família, ainda marcam a vida social das mulheres:
políticas públicas e movimentos feministas.

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