Você está na página 1de 5

1- A neurociência está presente em inúmeras especialidades dentro da medicina.

A exemplo da obstetrícia, o
sulfato de magnésio pode ser utilizado em algumas condições pós-parto para o tratamento da eclâmpsia.
Porém, é fundamental se atentar ao seu efeito depressor do sistema nervoso central: em altas doses esse
fármaco é capaz de reduzir a frequência respiratória, além de também diminuir os reflexos miotáticos, visto que
o magnésio compete com o cálcio, tanto no mecanismo celular que permite a liberação de neurotransmissores,
quanto no influxo de cálcio para as células pós-sinápticas da placa motora.

a- Baseado nisso, em que nível ou níveis da integração dos reflexos miotáticos


pode ocorrer inibição por esse fármaco em excesso?

Para determinar os níveis nos quais o sulfato de magnésio poderia causar


alterações, por conta de sua relação de "competição" com o cálcio, é importante
delimitar a ação deste íon no mecanismo referido.
O reflexo miotático, resumidamente, ocorre quando há estiramento muscular,
o que altera a frequência de disparo dos neurônios aferentes que inervam os fusos
musculares deste músculo, transduzindo o estiramento em sinal elétrico. Tal sinal,
partindo inicialmente do músculo, chega à medula espinal pela raiz dorsal e, para o
exemplo mais simples do reflexo miotático, esse neurônio aferente faz sinapse com
o neurônio motor alfa que será responsável por contrair o mesmo músculo cuja
aferência detectou estiramento. Nesse processo, o cálcio está envolvido
diretamente tanto na transmissão sináptica do neurônio aferente para o neurônio
motor, quanto na sinapse entre o neurônio motor alfa e o músculo estriado
esquelético em questão.
Em ambos os casos, por intermédio dos canais de cálcio dependentes de
voltagem, a concentração de cálcio no interior da célula neuronal é aumentada, e
esse íon terminará por causar a fusão das vesículas de neurotransmissores do
neurônio pré sináptico à sua membrana, fazendo com que as concentrações desse
determinado neurotransmissor aumente na sinapse e esta molécula acople-se a
receptores específicos na membrana do neurônio pós sináptico, desencadeando os
efeitos fisiológicos esperados.
Como o magnésio procedente do fármaco citado apresenta função
antagonista ao cálcio, ele impedirá o cálcio de realizar corretamente sua função no
processo de exocitose do neurotransmissor, nesse caso, a acetilcolina, tanto na
sinapse entre o neurônio aferente e o neurônio motor alfa (eferente), quanto na
junção neuromuscular. Como a acetilcolina é o neurotransmissor padrão em ambos
os processos, e o fármaco, em excesso, pode interferir na sua liberação, os níveis do
reflexo miotático descritos serão afetados, ocasionando na não realização do arco
reflexo pela não liberação ou baixa liberação da acetilcolina em algumas das duas
sinapses apresentadas. Essa baixa liberação de acetilcolina pode gerar potenciais
graduados insuficientes para atingir o limiar de excitação, culminando na não
contração reflexa do músculo.
Como não foi pauta da aula, o mecanismo de ação de antagonismo do
magnésio não deve ser eixo central da pergunta, mas provavelmente ele inibe os
canais cálcio dependentes de voltagem pela ligação do Mg++ ao sítio onde deveria
acoplar-se o Ca++.

2- Você está acompanhando um neurologista no Hospital das Clínicas. Nesse ambulatório acaba de chegar um
paciente vítima de um acidente de trânsito que é acompanhado há 2 anos no hospital. Na história clínica desse
paciente é relatado a lesão total a nível do segundo segmento medular lombar que levou a apresentação clínica
de paralisia espástica de ambos os membros inferiores onde os músculos possuem a sua capacidade de força
reduzida e o tônus elevado, o que provoca enrijecimento. Além disso, o paciente apresenta certa preservação da
flexão da coxa.

a- O interessante no casos de lesões em segmentos medulares é o fato de haver


uma apresentação mista das respostas aos reflexos miotáticos investigados a
depender do nervo examinado. Dessa forma, nesse paciente apresentado, como a
neurofisiologia justifica o fato de o reflexo patelar estar HIPOATIVO, mas o reflexo
aquileu estar HIPERATIVO, e ainda, o reflexo cremastérico (que é a tração superior
do testículo por suave toque na face interna da coxa) estar ABOLIDO? Justifique
essas três respostas obtidas durante a avaliação desses reflexos.

A contração dos músculos envolvidos no reflexo cremastérico é mediada


pelos neurônios motores localizados nos segmentos medulares L1 e L2. O reflexo
aquileu está relacionado ao segmento medular S1 e o reflexo patelar corresponde
aos segmentos de L2 a L4.
Analisando o caso clínico por fases, pode-se inicialmente determinar que a
hiperatividade muscular no reflexo aquileu se deve a uma lesão que aconteceu em
algum segmento medular acima de S1, interrompendo a modulação cortical desse
reflexo. O que é confirmado pelo histórico do paciente, que teve uma lesão em L2.
O controle da flexão da perna(fêmur) se dá por segmentos medulares
torácicos, o que confirma a possibilidade desse controle mesmo com lesão em L2.
O problema ganha corpo quando tenta-se analisar a relação entre o reflexo
cremastérico (L1 e L2) e patelar (L2 e L4). Como o reflexo cremastérico está abolido,
quem analisa o caso é levado inicialmente a pensar que todos os reflexos abaixo de
L2 estarão hipeativos. Todavia, a presença de movimento reflexo patelar hipoativo
ainda é intrigante. Considerando que há apenas lesão no segmento medular L2, o
segmento medular L1 (responsável também pelo reflexo cremastérico) não possui
vias aferentes e eferentes para o arco reflexo, possui ou só aferentes, e assim o
reflexo não seria completado pela falta de unidades motoras funcionais, ou
eferentes, e o reflexo não ocorreria por falta de integração do estímulo.
Uma das explicações para a hipoatividade do reflexo patelar é a da falta das
unidades motoras de L2 que contraem o extensor do joelho pois, já que esse
segmento foi afetado, suas unidades motoras não funcionarão (arreflexivas) e a
extensão do joelho seria realizada pelo reflexo patelar das unidades motoras apenas
de L3 e L4. Outro agravante para a hipoatividade seria a falta de força dos
extensores. Por conta da paralisia espástica, que põe os músculos sempre em
flexão reflexamente, os músculos extensores estariam mais “fracos” e o reflexo
hiperativo esperado não aconteceria por déficit muscular.

b- Caso houvesse uma lesão parcial da medula no mesmo nível de segmento


medular, caracterizando a Síndrome de Brown-Sequard à direita, quais os sinais
clínicos visíveis acima da lesão, ao nível da lesão e abaixo da lesão durante a fase
de CHOQUE MEDULAR e durante a fase de AUTOMATISMO MEDULAR?

Durante o choque-

Abaixo do mesmo lado da lesão- perda da motricidade, perda da sensibilidade


profunda e sensibilidade geral normal, reflexos hiperativos.

Abaixo do lado oposto à lesão- motricidade voluntária normal, sensibilidade


profunda normal e sensibilidade profunda perdida, reflexos normais exceto os
reflexos cujas fibras nervosas decussam, como o reflexo de retirada.

No nível da lesão (mesmo lado)- reflexos unilaterais abolidos. Sensibilidade


profunda e motricidade voluntária abolida. Sensibilidade geral abolida.

No nível da lesão ( lado oposto)- reflexos unilaterais normais, perda da sensibilidade


geral. Motricidade e sensibilidade profunda normais.

Acima do nível da lesão (ambos os lados) - normal

Após o choque-

Abaixo do mesmo lado da lesão- perda da motricidade, perda da sensibilidade


profunda e sensibilidade geral normal, reflexos hiperativos.

Abaixo do lado oposto à lesão- motricidade normal, sensibilidade profunda normal e


sensibilidade geral perdida, reflexos normais exceto os reflexos cujas fibras
nervosas decussam, como o reflexo de retirada.
No nível da lesão (mesmo lado)- perda da motricidade, dos reflexos e da
sensibilidade profunda.

No nível da lesão ( lado oposto)- tudo normal.

Acima do nível da lesão (ambos os lados)- normal

3- É seu primeiro dia como interno no ambulatório de neurologia, quando o primeiro paciente chega ao
consultório com uma fraqueza motora acentuada nos membros inferiores e uma intensa dor na região
lombossacra bilateralmente. Em sua anamnese é relatado que no dia de início da dor, o paciente havia feito
grande esforço físico para "arrancar ervas daninhas do quintal de casa". Nos antecedentes pessoais é relatado
um passado de Acidente Vascular Encefálico, mas o paciente relata não ter apresentado sequelas motores. No
exame físico neurológico, você realiza a avaliação dos reflexos miotáticos em todos os segmentos musculares.
Ao examinar os reflexos patelares, você se depara com uma aparente hiporreflexia à esquerda. Além disso, ao
realizar a avaliação do reflexo aquileu, não há resposta motora aparente bilateralmente.

a- Com suas palavras, qual o mecanismo neurofisiológico que explica o porquê da


Manobra de Jendrassik ser realizada após ser constatada essa hiporreflexia patelar
à esquerda?
A manobra de Jendrassik é uma manobra de “distração” para a modulação
cortical dos reflexos da medula. Nesse caso, tal hiporreflexia poderia estar sendo
causada pelo córtex, que diminuiria, em certo grau, o reflexo patelar. É pedido para
que o paciente realize a manobra de Jendrassik porque, caso a hiporreflexia seja
causada por modulação cortical, após realizar a manobra a magnitude do
movimento reflexo deverá ser maior. Caso a magnitude do movimento continue
fraca (hiporreflexia), mesmo com a manobra, o avaliador é levado a cogitar uma
hiporreflexia causada por problemas na própria medula.

b- As respostas avaliadas dos reflexos miotáticos te levam à suspeita de


comprometimento de nervos espinhais. Sendo assim, qual hipótese justifica a
resposta abolida do reflexo patelar apenas ao lado esquerdo?

Uma hipótese que justifica tal resposta é a de comprometimento parcial do


segmento medular associado ao reflexo patelar. Como a lesão medular pode ser
apenas unilateral, em relação ao segmento medular, apenas o reflexo de um dos
lados seria comprometido. Pelo que foi passado, pode-se concluir que o paciente
ainda está na fase de choque da lesão medular, pois caso estivesse na fase de
automatização da medula, os reflexos aquileus estariam hiperativos pela falta de
modulação cortical. Possíveis justificativas para a presença de reflexo patelar em
apenas um lado podem ser a de presença de uma hérnia de disco que está
comprimindo a lateral do segmento medular responsável pela extensão do joelho
ou de algum trauma por hiperextensão ou queda (causada pelo AVE) que
comprometeu o segmento medular em questão e colocou o paciente em estado de
choque medular.

c- Você recebe mais uma informação não relatada anteriormente, mas que ficou
claro durante a consulta, de que o paciente se encontra numa condição de
incontinência fecal e urinária. Isso te leva a duas hipóteses : Acometimento do
Cone Medular ou Síndrome da Cauda Equina. Que sinal relatado acima descartará
uma das duas hipóteses e qual o motivo deste sinal ocorrer?

Como o paciente apresenta “dor na região lombossacral bilateralmente"


significa que as funções de aferência dessas regiões não foram afetadas. Um
acometimento do cone medular teria causado

LESAO_MEDULAR.pdf (abrafin.org.br)

Você também pode gostar