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AULA 5

EXAME DA MOTRICIDADE
VI CURSO DE REVISÃO DE FUNDAMENTOS EM NEUROLOGIA
EXAME DA MOTRICIDADE
PROF. JÚLIO SANTOS

INTRODUÇÃO

O exame do sistema motor compreende a avaliação do trofismo (volume e contorno dos

músculos), do tônus muscular (estado de contração basal), movimentos voluntários e a


determinação da força. Os exames da marcha, reflexos, coordenação e movimentos anormais estão

estritamente ligados ao exame do sistema motor e devem ser interpretados em conjunto. Tanto o

sistema nervoso central (SNC) quanto o sistema nervoso periférico (SNP) participam da execução

dos movimentos voluntários. Estes são mediados pela contração de músculos estriados que levam

à movimentação de uma determinada articulação.

ORGANIZAÇÃO DAS VIAS MOTRAS

A via motora direta é a principal responsável pela execução de movimentos voluntários. É


constituída pelo trato corticospinhal (axônios do 1° neurônio motor) e pelos motoneurônios alfa,

cujos corpos celulares se localizam no corno anterior da medula (2° neurônio motor). O termo trato

piramidal é frequentemente empregado como sinônimo do trato corticospinhal lateral, o que

configura uma imprecisão, uma vez que outras vias, como, por exemplo, o trato rubroespinhal,
também compõem o trato piramidal. Aproximadamente metade dos axônios que compõe o trato

corticospinhal se origina do córtex motor primário (giro pré-central), enquanto a outra metade se

origina de regiões corticais diversas dos lobos frontal e parietal.

Os axônios do trato corticoespinhal deixam essas regiões corticais, constituindo em parte a

substância branca profunda ou coroa radiada. Ao nível dos núcleos da base, este trato se compacta,

passando pela perna posterior da cápsula interna. O trato corticoespinhal continua pelos
pedúnculos cerebrais, no mesencéfalo, até a base da ponte e, a seguir, no bulbo, onde ocorre a

decussação de cerca de 85% de suas fibras. As fibras cruzadas constituem o trato corticoespinhal

lateral, enquanto as demais, não cruzadas, constituem o trato corticospinhal anterior. O trato

corticoespinhal continua pelo funículo lateral da medula até fazer sinapse com o 2° neurônio motor,

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que se organizam em subnúcleos com somatotopia definida, os mais laterais inervam as porções

mais distais dos membros.

Esta via é a principal responsável pela execução de movimentos apendiculares, sendo

essencial na execução de movimentos que demandam velocidade e destreza. O trato corticoespinhal


anterior termina majoritariamente em interneurônios que se projetam bilateralmente na medula

espinhal, controlando movimentos axiais e multisegmentares. Lesões unilaterais do trato

corticoespinhal anterior, em geral, não produzem déficit perceptível, enquanto lesões unilaterais do

trato corticoespinhal lateral geram incapacidade significativa.

Fig. 1. Organização somatotópica do corno anterior da medula espinhal.

O segundo neurônio motor emerge da raiz ventral da medula espinhal e percorre um nervo
espinhal misto ou um nervo motor puro, até fazer sinapse com um número variável de fibras

motoras. Conceitos importantes para a semiologia são: o do miótomo, ou seja, o conjunto de

músculos inervados por uma raiz ventral e o de uma unidade motora, que é constituída pelo

neurônio motor alfa na medula espinhal (ou nos núcleos motores dos nervos cranianos) e as fibras

musculares por ele inervadas.

TROFISMO MUSCULAR

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O trofismo muscular é garantido pela inervação normal e pelas características do músculo

esquelético.

TÉCNICA DE EXAME

É composta pela inspeção, palpação, percussão e, por vezes, medida dos músculos,

determinando, assim, seu volume, contornos e excitabilidade. Deve-se examinar o paciente

idealmente despido, e de maneira sistemática observar os contornos musculares em direção


rostrocaudal, com os membros homólogos na mesma posição, buscando identificar assimetrias e

desproporções. Nesta etapa do exame neurológico, é útil atentar para deformidades esqueléticas

que frequentemente acompanham disfunções do sistema motor, como escápula alada, hiperlordose

ou outras posturas anormais da coluna vertebral e retrações fibrotendíneas. A percussão muscular


direta, em condições fisiológicas, desencadeia contração muscular discreta, focal abaixo do ponto

de percussão (resposta idiomuscular).

ALTERAÇÕES TRÓFICAS

A palpação visa determinar o volume e consistência dos músculos. Um músculo normal tem

consistência semielástica. Em casos de substituição fibroadiposa, o músculo adquire consistência


mais firme, enquanto que músculos apenas atrofiados têm consistência amolecida. A atrofia pode

resultar tanto de transtornos do neurônio motor inferior, quanto dos músculos. No primeiro caso, a

atrofia e a fraqueza são proporcionais. Nas doenças musculares e neuropatias desmielinizantes, os

músculos aparentam estar pouco ou nada atrofiados e se revelam fracos. Por último, em casos de
atrofia por desuso (secundária à imobilidade, como, por exemplo, em casos de transtornos

articulares), a atrofia é mais significativa do que a fraqueza.

A pseudo-hipertrofia se refere ao aumento aparente do volume muscular que, na verdade, se

deve a excesso de deposição de gordura ou tecido conjuntivo. Esta alteração, presente mais

frequentemente nas panturrilhas, é típica da Distrofia muscular de Duchenne. Hipertrofia muscular

verdadeira pode ocorrer tanto em situação fisiológica (p. ex.: atletas), quanto em doenças que levam
à contração muscular excessiva, como as miotonias congênitas, onde os pacientes podem

apresentar fenótipo hercúleo, denominação que se refere à hipertrofia muscular generalizada.

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A resposta idiomuscular pode, em condições de hiperexcitabilidade, revelar sinais, como

fasciculações, miotonia, rippling entre outros. Fasciculações são contrações involuntárias de uma

unidade motora, podendo ser percebidas pelo paciente (referido como “tremor” ou pulinhos na
carne”), ou visualizadas pelo examinador, constituindo um sinal importante de disfunção neuronal.

Em regra, a fasciculação é insuficiente para gerar movimento articular, exceto quando ocorre em

músculos faciais ou intrínsecos da mão.

A não geração de movimento articular permite diferenciar fasciculação de tremor, pois o

último gera movimento articular rítmico. A miotonia expressa o relaxamento lento do músculo. Pela

clínica, distinguem-se dois tipos de miotonia:

1. Aquela desencadeada pela contração (miotonia de ação) que pode ser observada em mãos e

músculo orbicular dos olhos. A fala pode sugerir miotonia da língua por alteração da dicção.

2. A miotonia de percussão, usando o martelo de reflexos, identificada na língua e músculos

intrínsecos das mãos.

A fasciculação pode ser vista durante inspeção cuidadosa, tornando-se mais evidente pela

percussão muscular direta.

TÔNUS MUSCULAR

O tônus é definido pelo grau de resistência muscular à movimentação passiva e expressa dois

importantes componentes funcionais, um neural e outro muscular. Impulsos descendentes


provenientes dos centros motores modulam a atividade do neurônio motor gama na medula, e este,

por sua vez, modula o tônus muscular. O componente muscular depende das condições

viscoelásticas do efetor. A distribuição das alterações do trofismo e tônus são fundamentais para a

elaboração de uma hipótese clínica adequada. Lesões do TCEL, cerebelo, núcleos da base, SNP e

dos próprios músculos podem afetar o tônus.

TÉCNICA DE EXAME

Tem início com a observação da postura do paciente e obrigatoriamente pela movimentação

passiva de suas articulações. Com o paciente relaxado, o examinador movimenta cada uma das

articulações por toda a amplitude do movimento, primeiro de maneira lenta e, em seguida, de

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maneira rápida. Devem-se realizar em cada articulação todos os movimentos que lhe são possíveis,

como flexão, extensão, adução, abdução e rotações. Em decúbito dorsal, pode-se realizar a manobra

de rolar passivo dos membros inferiores, atentando-se para os movimentos laterolaterais dos pés,

que se mostram com maior amplitude em casos de hipotonia.

A avaliação do tônus é mais interessante, quando os movimentos passivos são realizados em

velocidade variável, obedecendo a um protocolo conhecido apenas pelo examinador, para que o

paciente não preveja quais movimentos serão realizados, facilitando o seu relaxamento. O paciente

ansioso ou apreensivo pode ter dificuldade em relaxar, simulando um aumento patológico do tônus.
É útil tentar distrair o paciente por meio de perguntas, fechamento dos olhos ou solicitando que ele

execute cálculos. É importante lembrar que dor, independente da causa, pode restringir o

movimento e simular hipertonia.

Uma manobra interessante para observar o tônus dos membros superiores consiste em

mover rápida e alternativamente cada ombro para trás e para frente algumas vezes e observar as
oscilações dos braços, com o paciente em pé. O amplo balanço dos braços sugere hipotonia. O teste

de pêndulo de Wartemberg consiste em empurrar rapidamente para trás as pernas pendentes do

paciente. Em condições fisiológicas, esta manobra desencadeia oscilações das pernas que diminuem

progressivamente em amplitude e velocidade até a parada gradual do movimento. Em casos de

espasticidade, onde há aumento do tônus por disfunção do trato corticoespinhal lateral, os


movimentos se tornam bruscos e irregulares. Na hipotonia, a amplitude da resposta e a sua duração

são aumentadas.

ALTERAÇÕES TONÍGENAS

A hipotonia sobrevém tanto em lesões da unidade motora, quanto em distúrbios sensitivos,

cerebelares ou até em alguns casos de disfunção dos núcleos da base, como na coreia aguda. Nela,

ocorre aumento da amplitude do movimento e diminuição da resistência à movimentação, podendo

ser generalizada, em um hemicorpo ou segmentar. No caso de lesões focais do SNP, a hipotonia


respeita o sítio de lesão. Nas radiculopatias, por exemplo, a hipotonia estará restrita ao miótomo

correspondente.

A hipertonia pode ser do tipo plástico ou elástico. A hipertonia plástica decorre de disfunção

dos núcleos da base, sendo o aumento do tônus verificado ao longo de toda extensão do

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movimento, não variando a depender de sua velocidade ou direção. O predomínio tonígeno dá-se

principalmente em músculos flexores, induzido à postura clássica parkinsoniana ou

hemiparkinsoniana. Em casos de tremor sobreposto à rigidez plástica, o membro mobilizado pode


ceder em uma série de pequenas etapas, imitando o movimento de uma roda denteada (de Negro),

possivelmente uma evidência indireta de tremor. Este sinal é mais facilmente identificado quando o

movimento passivo é feito de maneira lenta.

A hipertonia elástica, também chamada de espasticidade, ocorre em pacientes com lesão do

primeiro neurônio motor no trato corticoespinhal lateral e, quase sempre, é acompanhada de um


aumento patológico da intensidade dos reflexos profundos. Neste caso, a hipertonia é mais evidente

no início do movimento, tornando-se ainda mais intensa quando este é executado de maneira

rápida. O sinal do canivete se refere à grande dificuldade de mobilizar um membro espástico no

início do movimento, seguido por relativa facilidade, conforme o segmento corporal avaliado se
aproxima de sua máxima amplitude. A espasticidade envolve de maneira diferente os grupos

musculares, sendo, portanto, eletiva: nos membros superiores resulta em hipertonia dos flexores

dos dedos e oponente do polegar (segundo ao quinto dedos fletidos sobre os polegares fletido e

aduzido – figa), flexores e pronadores do punho, flexores do cotovelo; e, nos membros inferiores os

adutores do quadril, extensor do joelho, flexores e inversor do tornozelo.

Como resultado ocorrem posturas características, como é o caso da atitude de decorticação


ou atitude de Wernicke-Mann. Em resumo, as afecções piramidais proporcionam hipertonia elástica,

eletiva (predomínio em flexores e pronadores nos MMSS e extensores e inversores no MMII), e as

lesões de núcleos da base (parkinsonismo) determinam hipertonias plástica e global.

MANOBRAS DEFICITÁRIAS (PROVAS PARÉTICAS)

As manobras deficitárias são especialmente úteis quando há suspeita clínica de lesão do SNC,

especialmente do sistema piramidal (composto predominantemente pelo trato corticoespinhal).


Consistem na adoção de uma postura e em sua manutenção por dois minutos. Tais manobras

podem evidenciar déficit motor sutil, que, embora não seja capaz de reduzir a força muscular, afeta

a velocidade e destreza dos movimentos, em especial dos segmentos distais.

Déficits motores verdadeiros e graves são mostrados pela incapacidade de adotar a postura

indicada.

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É importante notar não só se ocorrem desvios com relação à postura inicial, mas a velocidade,

direção e ordem em que ocorrem tais desvios. A execução de movimentos que requerem grande

precisão e velocidade também pode revelar déficit sutil por lesão do TCE. Entretanto, disfunção de
vias motoras indiretas, como as vias cerebelares e os núcleos da base, também interfere nas

manobras, embora de maneira diversa e característica para cada uma delas.

MEMBROS SUPERIORES

Manobra dos Braços Estendidos (ou Mingazzini dos Membros Superiores)

O paciente deve manter os braços estendidos horizontalmente à frente do corpo, mãos e

olhos abertos, dedos abduzidos, preferencialmente sentado ou em pé. Esta prova foi descrita

originalmente por Mingazzini com as mãos pronadas, modernamente, é realizada com as mãos
supinadas, pois torna a manobra mais sensível e específica, uma vez que o aumento do tônus
pronador, que ocorre na disfunção piramidal sutil, é assim evidenciado. Em caso de paresia mais

significativa, o membro afetado desenvolve uma mudança lenta e gradual de posição na seguinte

ordem: adução dos dedos, pronação da mão, queda do punho, flexão do cotovelo e queda do braço.

Quando a prova é realizada com os olhos fechados, estamos avaliando não só a motricidade, como
também a propriocepção, acrescentando dificuldades na interpretação dos resultados, pois desvios

posturais podem ocorrer exclusivamente por disfunção proprioceptiva. Daí termos preferido

executar a prova com olhos abertos.

Manobra de Raimiste

Esta manobra é executada em decúbito dorsal ou sentado, 10 com os braços ao longo do corpo e

cotovelo fletido a 90°, posição neutra do punho (semipronada) e dedos maximamente abduzidos, como se
as palmas das mãos estivessem em espelho. A prova é mais sensível quando realizada com o paciente em

decúbito dorsal horizontal. Em caso de paresia, ocorre adução dos dedos, seguida de flexão do punho e
posterior queda do braço.

Manobra do Rolamento

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A execução de movimentos que requerem grande precisão e velocidade sensibiliza a identificação de
lesões do TCE. Neste teste, validado por Sawyer, em 1993, (ensinado por Monrad-Krohn), o paciente é
solicitado a cerrar os punhos e manter os antebraços à frente do corpo dispostos horizontalmente, de modo
que a parte distal dos braços se sobreponha. O paciente deve, então, realizar movimentos circulares dos

antebraços, hora no sentido horário e após no sentido anti-horário, ou vice-versa. Em caso de lesão unilateral,
o lado envolvido não se move com a mesma amplitude e velocidade que o contralateral. 19 Variante desta

manobra consiste no rolamento dos dedos índices um sobre o outro.

MEMBROS SUPERIORES

Manobra de Mingazzini

Paciente permanece em decúbito dorsal, flexão do quadril sobre o tronco e flexão do joelho e tornozelo,

todos a 90°. Nas plegias, há incapacidade de adotar a posição de prova; nas paresias, ocorrem oscilações e
queda gradual do membro afetado, em geral do distal para o proximal.

Manobra de Barré

Com o paciente em decúbito ventral, o examinador flexiona os joelhos do mesmo. Em sua descrição

original, esta prova foi apresentada em 3 tempos:

1. O examinador posiciona a perna em um ângulo de 90°, e o paciente é solicitado a manterse

imóvel por dois minutos;

2. Caso o primeiro tempo não revele alterações, mas persista a hipótese de déficit motor, o

examinador orienta o paciente a flexionar ao máximo os joelhos e tornozelos, buscando tocar

os glúteos com os pés. O lado afetado não consegue manter a posição no tempo de dois

minutos;

3. O examinador estende as pernas do paciente, mantendo-as em um ângulo maior que 90°,

havendo queda gradual do membro do lado. A manobra de Barré exige mais da musculatura

flexora da coxa, isto a torna especialmente sensível, tendo em vista que a disfunção piramidal

afeta predominantemente o compartimento posterior da coxa.

Prova da Queda do Membro Inferior em Abdução

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Esta manobra, descrita por Sanvito, em 1972, é de grande utilidade por poder ser realizada,

quando há alteração do nível de consciência, inclusive em pacientes comatosos. Com o sujeito em

decúbito dorsal, o examinador flete suas coxas e pernas, mantendo a região plantar apoiada sobre
o leito e segurando o dorso dos pés do paciente. Em caso de déficit, quando o examinador solta as

pernas do paciente, ocorre abdução da coxa seguida por extensão da perna. A queda gradual e

simétrica dos membros inferiores é esperada em paciente incapaz de cooperar. Em caso de paresia,

o membro afetado apresenta queda mais rápida e abdução mais significativa que o contralateral.
Esta manobra também é útil para detectar assimetrias em c asos de paraparesia de intensidade grave

e em pacientes torporosos ou comatosos.

MANOBRAS DE OPOSIÇÃO DE FORÇA

É imprescindível executar manobras de oposição de força quando se suspeita de lesão do

SNP. Tais manobras se prestam a avaliar a ação predominante de um grupo muscular ou de um


músculo específico. Quando se avalia um movimento de uma articulação, esta deve estar fixada,

evitando-se a movimentação de articulações mais proximais ou outros movimentos da mesma

articulação, que não o movimento que está sendo avaliado. Por exemplo, quando se avalia a força

do bíceps, o cotovelo deve estar apoiado pelo examinador, e a mão deve ser mantida
completamente supinada. Caso contrário, um paciente com fraqueza do bíceps pode fazer a

semipronação do punho, e o bíceps aparenta ter força normal, quando, na realidade, a fraqueza

estará sendo compensada. Com o antebraço em posição neutra, o principal músculo envolvido na

flexão do cotovelo é, na verdade, o braquiorradial.

Podem interferir na avaliação da força muscular transtornos que alterem a capacidade de

cooperação por parte do paciente, como: alteração do nível de consciência, deficiência intelectual
ou transtornos de humor. Na presença de doença sistêmica grave, a avaliação pode ser prejudicada

tanto por caquexia muscular, quanto por uma redução da capacidade cardiopulmonar. Nestes

cenários, a avaliação do tônus e trofismo muscular, além do exame de reflexos e da sensibilidade

contribui muito para determinar se há acometimento associado do SNP. Alternativamente, a


avaliação do sistema motor pode ser feita de maneira pausada ou intercalada com outras etapas do

exame neurológico que não requeiram vigor físico. A ocorrência de assimetrias ou gradiente

(fraqueza mais proeminente em músculos proximais ou distais) aponta para comprometimento

neurológico em detrimento de um quadro astênico.

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Os músculos são mais fortes, quando maximamente encurtados. Por isto, para testar um

músculo de força moderada de maneira mais acurada, inicia-se a avaliação com o músculo

maximamente encurtado. Para testar um músculo muito forte é útil colocá-lo em situação de
desvantagem mecânica, mantendo-o maximamente alongado. Esta regra pode ser empregada,

quando o paciente e o examinador apresentam composição corporal distinta, sendo esperado que

apresentem força desigual em situação fisiológica. Quando é esperado que o paciente, em

condições normais, apresente força inferior à do examinador, como no caso de uma paciente que
apresente idade mais avançada ou peso corporal muito inferior, os músculos devem ser avaliados

na posição maximamente encurtada. O oposto deve ocorrer quando, por exemplo, uma médica

idosa examina um paciente jovem do sexo masculino.

A escala de força mais utilizada é a do Medical Research Council (MRC) (Quadro 9-1). A seguir,

o leitor encontrará instruções que o capacitarão a avaliar a força dos principais grupos musculares.
Os músculos omitidos neste texto são aqueles, cuja avaliação clínica é pouco prática ou de menor

importância, em razão da localização ou da ação conjunta de outros músculos. A escolha dos

músculos a examinar depende das hipóteses possíveis para o caso em questão, entretanto, uma

avaliação mínima proximal e distal de cada membro é desejável.

Fig. 2. Escala de força MRC.

PALPAÇÃO DE NERVOS

A palpação de nervos constitui parte fundamental do exame neurológico, especialmente nos

pacientes com suspeita de neuropatias periféricas. A pesquisa é feita por meio de palpação gentil
do nervo em sentido transversal ao seu trajeto. Podemos palpar os nervos em suas porções mais

superficiais: ulnar na fossa cubital, mediano medialmente e acima da inserção do bíceps, fibular

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posteriormente à cabeça da fíbula e tibial na fossa poplítea. Em condições normais, essas estruturas

são roliças, tenras e palpáveis, apenas em pequenas porções de seu trajeto. Quando anormal, o

nervo apresenta aspecto cilindroide, consistência e espessura aumentadas, além de se tornarem

palpáveis em maior extensão.

Não raro está presente o sinal de Tinel. Além da palpação dos maiores troncos nervosos, os

ramos cutâneos são de particular interesse, sendo acessíveis: nervo supraorbitário (região

superomedial da órbita); nervo grande auricular (desde sua saída posterior ao m.

esternocleidomastóideo e em direção à orelha, facilitada pela rotação cervical contralateral); ramo


superficial do radial (na tabaqueira anatômica sobre o tendão do extensor longo do polegar); ramo

cutâneo dorsal do ulnar (região inferodorsal à apófise estiloide da ulna); n. sural (atrás e ligeiramente

inferior ao maléolo lateral) e o n. fibular superficial (no dorso do pé).

A hipertrofia neural ocorre na desmielinização/remielinização crônicas (aspecto

histopatológico em bulbo de cebola), conferindo, particularmente aos ramos cutâneos palpáveis, a


sugestão de uma das neuropatias desmielinizantes crônicas. Os troncos nervosos podem estar

aumentados de maneira isolada em casos de neuropatias compressivas.

PADRÕES DE FRAQUEZA

O exame detalhado do sistema motor tem como objetivo fundamental a identificação de um


padrão de fraqueza. Este é fundamental na elaboração de uma hipótese diagnóstica topográfica e

possivelmente etiológica. A fraqueza pode ser generalizada ou aproximadamente focal. O

acometimento completo do trato corticoespinhal lateral acima da decussação das pirâmides leva à

hemiparesia ou hemiplegia contralateral. A hemiparesia/plegia é incompleta quando poupa um


segmento do hemicorpo. Aquela em que todo o dimídio é afetado, incluindo face, é completa. O

déficit pode ser ainda desproporcionado, acometendo mais intensamente um segmento em relação

aos outros (p. ex., predomínio braquiofacial). O acometimento do trato corticoespinhal lateral

também pode provocar monoparesia, como, por exemplo, no Acidente Vascular Cerebral que

acomete a artéria cerebral anterior, com monoplegia/paresia do membro inferior contralateral.

O comprometimento do trato corticoespinhal lateral abaixo da decussação das pirâmides se

manifesta por fraqueza ipsolateral à lesão. As lesões medulares podem ser bilaterais, causando

tetraplegia/paresia ou paraplegia/paresia (dependendo do nível da lesão) ou unilaterais, causando

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hemiplegia/paresia incompleta ou ainda plegia/paresia monomélica. A lesão do neurônio motor

superior na via piramidal se expressa preferencialmente nos músculos distais. O aumento do tônus

e exaltação dos reflexos de estiramento muscular são características das lesões do trato
corticoespinhal lateral. A exceção constitui a fase aguda da lesão, que pode-se manifestar por

hipotonia e abolição de reflexos (em geral até 4 semanas). A lesão do segundo neurônio pode gerar

padrões de fraqueza muito diversos. A região acometida apresenta hipo ou arreflexia com atrofia

precoce. É importante examinar múltiplos músculos dos segmentos corporais, pois o padrão de
fraqueza identificado pode respeitar o território de uma raiz, plexo (completo ou incompleto) ou

nervo periférico (mono, multi ou polineuropatia). O exame da sensibilidade contribuirá

significativamente com o diagnóstico topográfico.

Nas polineuropatias, a lesão é dependente do comprimento axonal com a característica de

simetria, afetando inicialmente apenas os membros inferiores. Quando os sinais e sintomas evoluem
ao nível dos joelhos, as mãos também apresentarão anormalidades. As polineuropatias podem

acometer fibras motoras e sensitivas associadamente ou haver predomínio ou exclusividade de uma

delas. Com relação ao calibre das fibras sensitivas afetadas, a neuropatia pode ser preferencial ou

exclusiva de fibras finas ou grossas.

Nas doenças de junção neuromuscular, os exames de oposição de força e reflexos podem ser

normais. A fatigabilidade, característica da disfunção pós-sináptica que ocorre na miastenia gravis,


pode ser evidenciada após sustentação de um segmento corporal por 2-4 minutos. Ptose e diplopia

podem-se revelar após 1 minuto de mirada para cima.

As miopatias se manifestam mais frequentemente por fraqueza simétrica e de predomínio proximal.


Atrofia é mais tardia que nas lesões nervosas. Outros padrões de fraqueza podem ocorrer, como o
acometimento de músculos bulbares ou da face, que representam importantes pistas diagnósticas.

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Fig. 3. Padrões de fraqueza mais frequentemente relacionados com os diferentes sítios de lesão.

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CASO 1
Paciente CFL, 5 anos, branco, residente no município de Quixadá, Ceará. Sua mãe o levou ao

consultório médico após perceber que ele apresentava problemas para deambular corretamente,

projetava o corpo para frente e não conseguia segurar alguns brinquedos pouco mais pesados.
Segundo relato da mãe, por volta dos 3 anos, CFL tinha dificuldades para levantar o próprio corpo

quando era posto em decúbito dorsal, bem como quedas frequentes, mas ela não procurou auxílio

médico por achar que não era um problema efetivo e não ter casos de doenças desse tipo na família,

sendo suas duas filhas clinicamente normais, ultrapassando a primeira e a segunda décadas de vida.
A mãe relata que o paciente aparenta ter traços de deficiência intelectual, retificados pela professora

da escola a qual CFL frequenta desde os 4 anos.

Ao exame físico o paciente apresentava hipertrofia das panturrilhas e sinal de Gowers.

Exames laboratoriais mostraram Creatinoquinase-total de 4.567 U/I (valores de referência: 26 a 189

U/I). Além disso, a biópsia muscular mostrou a falta de distrofina. Mediante o exame físico, foi

possível diagnosticar o paciente com a Distrofia Muscular de Duchenne, mas exames

complementares foram pedidos e confirmaram o diagnóstico para tal condição. Ademais, foi traçado
o heredograma familiar e viu-se que a mãe possui o alelo para a doença, bem como a avó do

paciente.

Pontos para discussão:

1. Como é a genética da Distrofia Muscular de Duchenne (DMD)?

2. Quais as principais manifestações clínicas da DMD?

3. Qual fator está relacionado às dores crônicas na DMD?

4. Qual o tratamento para a DMD?

5. Qual o prognóstico de um paciente acometido pela DMD?

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QUESTÕES
(EXTRAÍDAS DE PROVAS DE CONCURSOS, RESIDÊNCIAS E USLME STEP 1 E STEP 2)

1. Ao examinar um paciente com suspeita de hérnias de disco na coluna cervical, observou-se


alteração de sensibilidade em duas regiões do membro superior esquerdo. Assinale a opção

em que se indicam, respectivamente, os dermátomos dos segmentos C5 e C8.

a) face lateral do ombro e face medial da mão

b) face medial da mão e face medial do cotovelo


c) face lateral da mão e face lateral do ombro

d) dedo médio e face lateral da mão

e) face medial do cotovelo e dedo médio

2. Na avaliação da força muscular de um paciente, constatou-se que em um grupo muscular a

força foi classificada como grau três e em outro grupo muscular como grau dois. Assinale a

opção em que se indicam, respectivamente, as características desses músculos.


a) contração muscular palpável ou visível; movimento completo contra a ação da gravidade

e moderada resistência adicional

b) movimento completo contra a ação da gravidade e moderada resistência adicional;

movimento completo contra a ação da gravidade


c) movimento completo contra a ação da gravidade; movimento completo com a ação da

gravidade abolida

d) contração muscular palpável ou visível; movimento completo contra a ação da gravidade

e máxima resistência adicional


e) movimento completo contra a ação da gravidade e máxima resistência adicional;

movimento completo com a ação da gravidade abolida

3. Os músculos do corpo humano desempenham várias funções que são de fundamental

importância para o bom funcionamento do nosso organismo. É nas áreas de movimentação

e força que eles mais atuam. Assim, existem várias funções que os músculos em nosso corpo

podem desempenhar. O papel muscular agonista encontra-se na opção:


a) músculo(s) que realiza(m) força para estabilizar uma parte do corpo.

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b) músculo(s) que produz(em) contração excêntrica ao mesmo tempo que o motor primário

realiza o movimento.

c) músculo(s) que previne(m) ação acessória indesejada durante o movimento.


d) músculo(s) que contrai(em) para produzir o movimento em uma articulação.

e) músculo(s) com ação(s) oposta(s) ao músculo que produz o movimento.

4. Um menino de 4 anos de idade chega ao posto médico com queixa principal de quedas

frequentes ao tentar correr. Durante a avaliação fisioterapêutica observa-se a presença de


hiperlordose lombar com protrusão do abdome, hipertrofia da panturrilha, fraqueza da

musculatura da cintura pélvica e escapular além de realizar a manobra Gowers para levantar-

se do chão. O provável diagnóstico desta criança é:

a) Paralisia Cerebral.
b) Mielomeningocele.

c) Osteogênese imperfeita.

d) Distrofia muscular de Duchene.

e) Doença de Charcot-Marie-Tooth

5. A marcha miopática e a pseudohipertrofia de panturrilha está presente na:

a) Poliomielite.

b) Síndrome de Turner.

c) Distrofia de Duchenne.

d) Paralisia Cerebral.

VI CURSO DE REVISÃO DE FUNDAMENTOS EM NEUROLOGIA – EXAME DA FORÇA - PROF. JÚLIO SANTOS

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