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Espasticidade
Curso de pós Graduação em Enfermagem de Reabilitação
2017/2018
I –Espasticidade. Definição
Temos assim um conceito mais lato que o de Lance que define espasticidade como
uma desordem motora caracterizada por reflexos osteotendinosos vivos (por vezes
acompanhados de clónus) e uma hipertonia elástica velocidade dependente, que afecta
1
Lance J W Simposium synopsis. In Feldman RG, Young, RR, Koella WP, eda, Spasticity: disordered
motor control, Chicago, Yearbook Medical, 1980: 485-494.
2
2
Delwaide PJ. Spasticity Motor control course. Presented at 1993 American Academy of Neurology
Annual Meeting. Minneapolis, Minn: American Academy of Neurology, April 1993
3
II -Fisiopatologia
O reflexo de estiramento é um reflexo monosinaptico que autorregula o comprimento do
músculo. Tanto o grau de estiramento como a velocidade são detectados no fuso
muscular pelos aferentes Ia e II, e pelos orgâos tendinosos de Golgi através dos
aferentes Ib, que estimulam o motoneuronio alfa levando á contracção do musculo
estirado. Os aferentes Ia fazem sinapse ainda com motoneurónios inibitórios levando a
inibição do musculo antagonista- inibição reciproca. O fuso é ainda inervado por fibras
eferentes gama que regulam a sua tensão e limiar de estimulação. Alem destes
mecanismos intraespinais de regulação do tónus : inibição recorrente de Renshaw,
inibição reciproca Ia, inibição aferente II, inibição não reciproca Ib e inibição pré-
sináptica, intervêm ainda sistemas inibitórios e excitatórios supra-espinais . Existem 5
importantes sistemas descendentes: corticoespinal, reticuloespinal, vestibuloespinal,
rubroespinal e tectoespinal. Existem dois principias sistemas excitatorios e inibitórios
sobre o reflexo de estiramento: o trato reticuloespinal dorsal ( formação reticular
ventromedial medular) com efeito inibitório e o trato reticulospinal medial e
vestibuloespinal com efeito excitatório.
Poderá haver um aumento da excitabilidade primária dos alfa motoneurónios
(hipersensibilidade de desnervação) e crescimento das sinapses Ia, no entanto as teorias
principais actuais advogam que a espasticidade seria devida mais a diminuição da
inibição do que aumento da excitação. Existem evidências mais ou menos indirectas de
uma diminuição da inibição pré-sináptica dos terminais Ia, diminuição da inibição
recíproca do motoneurónio antagonista e diminuição da inibição Ib. No entanto
4
3
Gracies JM: Pathophysiology of spastic paresis. II: emergence of muscle overactivity, Muscle Nerve 31:552–571,
2005
4
Dietz V. Ketelsen UP Berger W Quintern J. Motor unit involvment in spastic paresis; relationship
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5
Gioux M. Petit J: Effectsof immobilising the cat peroneus longus muscle on the activity of its own
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5
6
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7
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7
0 – ausência de espasmos
1 – sem espasmos expontâneos. Presença se espasmos moderados induzidos por
estimulação sensorial ou mobilização passiva
2 – espasmos expontâneos ocasionais ( menos de 1/h)
3 – espasmos expontâneos entre 1 e 10 por hora.
4 – mais de 10 espasmos expontâneos por hora
3) Escala de reflexos
0 – reflexos ausentes
1 - hiporreflexia
2 – normal
3 – hiperreflexia moderada
4 – clonus com 3 ou 4 batimentos
5 - clonus
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P Bramanti, MD; E, Sessa, MD; C. Rigici; MD; G D`Aleo, MD; Floridia, MD; P. Di Bella, MD; and F
Lublin, MD: Enhanced spasticity in primary progressive MS patients treated with interferon beta – 1b;
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8
3 Avaliação funcional10
9
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basis for assessing effectiveness of therapeutic intervention, Arch Phys Med Rehabil 1989. 70: 6 – 15.
10
Steven R. Hinderer, MD, PT, Samir Gupca, BA : Functional Outcome Measures to Assess
Interventions for Spasticity, Archc Phys Med Rehabil Vol 77, October 1996.
9
V Tratamento
A decisão acerca de quando e como tratar doentes espásticos depende de inúmeros
factores e pode não obedecer á pirâmide estratégica habitual:
- cronicidade da lesão- lesões mais recentes podem melhorar com recuperação
neurológica, enquanto que lesões crónicas podem ser menos acessíveis a tratamento se
houverem contraturas estabelecidas ou o paciente tenha desenvolvido estratégias
compensatórias para manter função.
- Severidade – espasticidade moderada pode ser tratada com exercícios de AMM,
ortóteses e medicação PO enquanto que espasticidade severa pode necessitar de
medidas mais agressivas como cirurgia ortopédica.
- Distribuição – determina tipo de tratamento localizado ou geral. Ex alguns
hemiplégicos espásticos melhoram com quimiodesnervação dos gémeos enquanto que
um paraparético espástico pode beneficiar mais de administração de baclofeno
intratecal.
11
Berman B. Vaughan CL, Peacock, WJ, The effect of rhizotomy on movement in patients with cerebral
palsy. Am J Occup Ther 1990 44: 511 - 16
12
Dudgeon Bj, Libby AK McLaughlin JF, Hays RM Bjornson KF, Roberts TS, Prospective
measurement of functional changes after selective dorsal rhizotomy, Arch Phys Med Rehabil 1994; 75 ,
46 – 53.
10
Objectivos:
- melhorar mobilidade
- diminuir a dor
- diminuir espasmos
- aumentar grau de movimento
- melhorar cosmética
- melhorar posicionamento
- atrasar ou prevenir cirurgia
11
13
Warren E, Carlson, MS, Chritopher L. Vaughan, PhD, Diane L.Damiano, PhD and Mark F. Abel, MD:
Orthotic management of gait in spastic diplegia. Am J Phys Med Rehabil 1997; 76: 219-225
14
Miglietta º Action of cold on spasticity. Am J Phys Med Rehabil 1973; 52:198 - 205
15
Knutson E, Matson E. Effects of local cooling on monosynaptic reflexes in man. Scan J Rehabil Med
1969; 1.126-32
12
Tratamento medicamentoso
Baclofeno
Actua a nível dos receptores GABA – B reduzindo a libertação de neuromediador
excitatório nos terminais aferentes pré-sinápticos. O local major de acção parece ser a
medula espinal aliviando a hipertonia e os espasmos em lesões rostrais á medula.
Efeitos laterais: sedação, sonolência, fadiga, tonturas, fraqueza muscular, ataxia,
depressão, confusão mental, náuseas e vómitos ocasionais, hipotensão.
Diazepan
Tal como outras benzodiazepinas (Alprazolam, clonazepam, tetrazepanam)
aumenta a afinidade do GABA para receptores GABA – A aumentando a inibição pré-
sináptica mediada pelo GABA. Assim como a inibição do sistema facilitatório
descendente. São mais eficazes em diminuir os espasmos e distonia espástica em lesões
medulares mas também podem ajudar doentes com lesão cerebral.
Efeitos laterais: tonturas, sedação, depressão, irritabilidade, perda de coordenação
e fadiga.
16
Robert Price, MSME, Justus F. Lehman, MD, Sherlyn Boswell-Bessette, AAS, Anne Burleigh, BS,
Barbara j. deLateur, MD : Influence of Cryotherapy on Spasticity at the Human ankle, Arch Phys med
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17
Yarconi GM, Roth EJ, Cybulski GR, Jaeger RJ: Neuromuscular stimulation in spinal cord injury II.
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18
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19
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13
Tizanidina
É um agonista alfa 2 noradrenérgico reduzindo a hipertonia por facilitação da
inibição pré-sináptica. Diminui o tónus muscular, reflexos polissinápticos e excitação
polissináptica dos interneurónios espinhais em animais intactos e descerebrados.
Efeitos laterais: boca seca, sedação, fadiga, tonturas, fraqueza, vertigem,
hipotensão, halucinações visuais.
Clonidina –agonista alfa 2 noradrenérgico aprovado pela FDA para o tratamento
da hipertensão.
Efeitos laterais: tonturas, hipotensão fraqueza muscular, obstipação, boca seca,
bradicardia, hipertensão de retirada.
Dantroleno
Bloqueia a libertação de cálcio do retículo sarcoplasmático impedindo a
contracção quando surge um potencial de acção. Leva a fraqueza muscular de todos os
músculos incluindo os hipertónicos não sendo tão usado a não ser nas lesões
neurológicas mais graves, em particular nas lesões supra-espinhais.
Efeitos laterais: fraqueza, diarreia e náusea, hepatoroxicidade em particular no
idoso.
Gabapentina
Aprovada como droga antiepilética pela FDA. É estruturalmente semelhante ao
GABA não tendo sido provado que actue nos seus receptores. O seu mecanismo de
acção é desconhecido, parece ter um papel importante na modulação da corrente de
cálcio nos canais e aumentar a síntese do GABA. É consideravelmente segura e tem
poucos efeitos laterais (fadiga e diminuição da concentração).
Três estudos recentes20-21-22 mostraram que gabapentina reduz a espasticidade em
doses elevadas entre 400 a 1200 mg PO 3x/dia.
20
Mueller ME, Gruental M. Olson WL. Gabapentinafor relief of upper motor neuron symptoms in
múltiple sclerosis. Arch Phys Med Rehabil 1997; 78, 521 - 4
21
Gruenthal M. Mueller M. Olsen WL, Prieb MM Sherwood AM, Olson WH. Gabapentine for treatment
of spasticity in patients with spinal cord injury. Spinal Cord 1997; 35, 686 - 9
22
Priebe MM. Sherwood AM,. Graves DM., Mueller M, Olson WH. Effectivness of gabapentine in
controlling spsticity: a quantitative study. Spinal Cord 1997; 35, 171 – 5.
14
Antes do aparecimento da toxina botulinica eram usados dois tipos de agentes, uns
de acção curta e totalmente reversível: anestésicos locais e outros de acção mais
prolongada: etanol e fenol.
O bloqueio pode ser próximo de um tronco nervoso ou perineural ( bloqueio misto
ou sensoriomotor ou bloqueio de nervo motor) ou no ponto motor do músculo –
bloqueio de ponto motor ou neuromuscular. Os primeiros são preferidas em músculos
proximais ou quando envolvem vários músculos no mesmo território nervoso e
implicam cirurgia para individualização do nervo ou uso de guias anatómicos. Os
segundos são feitos mediante exploração eléctrica do ponto motor, feita com a mesma
agulha que é usada para a infiltração, ou mediante cartas musculares.
Anestésicos locais
Actuam por bloqueio dos canais de sódio dos nervos sensitivos e motores.
Afectam também a transmissão na junção neuromuscular por um mecanismo ainda não
totalmente clarificado. O início de acção ocorre em minutos e a duração de acção é
proporcional ao tempo em que o anestésico fica em contacto com o nervo
Tipos de anestésicos: Lidocaína ( Xilocaína) Etidocína (Duranest) e a
Bupivacaína ( Marcaína)
Indicações: testes funcionais antes do bloqueio a longo termo, auxiliar na
compreensão da disfunção ( diferenciar espasticidade de contratura, quais os músculos
responsáveis por uma postura patológica, qual o nível de actividade do músculo
antagonista)., relaxamento muscular anterior á colocação de gessos.
23
Tardieu C. Tardieu G. HarigaJ. Gagnard L. Vélin J. Fondements experimentale d´une terapeutique des
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l´animal décérebré) Arch Fr Pédiatr 1964 ; 21 : 5 -. 23.
15
Toxina botulínica
24
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25
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26
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27
Friedmand A, Diamond M, Johnston MV, Daffner C: Effets of botulinum toxin A on upper limb
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28
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16
Tratamento cirúrgico
A- Neurológico
B – Ortopédico
A- Tratamento neurológico
Podem ser classificados em procedimentos periféricos (rizotomias, neurectomias,
bloqueios de nervo ou ponto motor) ou centrais (cordotomias, procedimentos ablativos
estereotáticos ou implantação de estimuladores ou cateteres subdurais para infusão de
fármacos que aumentem influências inibitórias)
29
Santamato A, Notarnicola A, Panza F, et al: SBOTE study: extracorporeal shock wave therapy versus electrical stimulation after
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30
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31
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32
Simpson DM, Gracies JM, Graham HK, et al: Assessment: botulinum neurotoxin for the treatment of spasticity (an evidence-based
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33
17
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35
Patrick Van Schaeybroeck, MD e col Neurosurgery, Vol 46 no 3, March 2000
36
Jay M. Meythaler, JD, MD, Anne McCary, RN, MSN, CRNP, Mark N. Hadley, MD. Prospective
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37
18
B -Tratamento Ortopédico
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Terapias emergentes
A acupunctura, vibração, estimulação não invasiva cerebral, espinal e
transcutanea, ondas de choque são opções terapêuticas em estudo havendo ainda pouca
evidencia cientifica que suporte o seu uso na prática clinica.38 39
38 Krewer C, Hartl S, Muller F, Koenig E: Effects of repetitive peripheral magnetic stimulation on upper-limb spasticity and
impairment in patients with spastic hemiparesis: a randomized, double-blind, sham-controlled study, Arch Phys Med Rehabil
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39
Kumru H, Murillo N, Samso JV, et al: Reduction of spasticity with repetitive transcranial magnetic stimulation in patients with
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