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INTRODUÇÃO
No XIX ENDIPE realizado em 2018, cujo tema foi “Para onde vai a Didática? O
enfrentamento às abordagens teóricas e desafios políticos da atualidade”, Candau (2018) apresentou
questões consideradas fundamentais no processo de ressignificação da Didática, entre elas a
possibilidade de explorar o potencial das mídias digitais para facilitar processos de ensino-
aprendizagem ativos e reflexivos. Entendendo que as mídias afetam os modos de construir
conhecimentos, as formas de nos relacionarmos, as subjetividades e comportamentos, Candau
(2018) indaga como integrar as mídias às práticas pedagógicas de modo consistente. A autora
questiona que nos processos de ensino-aprendizagem, em geral, o uso das mídias não chega a afetar
a dinâmica do professor, servindo apenas como uma ferramenta de apoio ao trabalho já
estabelecido. Nesse sentido, observa-se que, não apenas no Brasil, mas também em outros países, o
foco das políticas públicas mídia-educativas têm se restringido ao acesso aos meios e às
capacidades técnicas de utilização (BUCKINGHAM, 2013; CASTRO, 2016; DUARTE; MILLIET;
MIGLIORA, 2019; PEREIRA; FILLOL; MOURA, 2019), ignorando a concepção das mídias
enquanto cultura e, por isso, sem uma orientação voltada para o pensamento crítico-analítico.
Buckingham (2010) menciona que, se fora da escola as crianças e adolescentes estão interagindo
com as mídias não como tecnologias, mas como formas culturais, os educadores que desejam usar
essas mídias nas escolas não podem negligenciar essas experiências, pelo contrário, precisam
fornecer aos alunos meios de compreendê-las.
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O título provisório da pesquisa é Práticas pedagógicas de letramento midiático para o desenvolvimento de habilidades
necessárias à aprendizagem escolar
apresento uma compilação dos principais modelos conceituais para o letramento midiático
propostos por autores de referência no campo, com o objetivo de estreitar o debate entre os campos
da Didática e da Mídia-educação e favorecer os processos de construção de conhecimento e
aprendizagem, em direção ao que chamo de uma Didática mídia-educativa (MILLIET, [s.d.], no
prelo).
Com o crescimento do uso das mídias, principalmente com a centralidade da internet e das
redes sociais, vários problemas como incitação ao ódio, cyberbullying, fakenews etc. têm gerado
discussões de como gerenciar melhor o ambiente da mídia, inclusive colocando em foco o urgente
debate de como regular a internet. Livingstone (2019) ressalta que diante do cenário das
dificuldades regulatórias, com empresas globais poderosas e conveniência política de curto prazo, o
apelo transforma-se em uma solução que supostamente gera menos desgaste: educar o público que
usa a internet. “A motivação é raramente pedagógica, mas sim a política do último recurso"
(LIVINGSTONE, 2019, tradução nossa). A autora sinaliza ainda para o risco que há de, na
educação, essa demanda adiar os aspectos positivos do uso das mídias, como aprendizagem
autônoma, criatividade, colaboração e participação, uma vez que com o ritmo acelerado da
inovação tecnológica acabamos apenas lutando contra os novos danos que surgem inesperadamente.
Desse modo, o letramento midiático corre o risco de se limitar à proteção e segurança.
consciência dos códigos e convenções mais amplos de determinados gêneros. Isso significa adquirir
habilidades analíticas e uma metalinguagem para descrever como a linguagem funciona; (3)
Produção - entender quem está se comunicando com quem e por quê. Estar ciente das influências
comerciais, que são muitas vezes invisíveis para o usuário, o papel global da publicidade e como
eles influenciam a natureza da informação que está disponível; (4) Audiência - consciência da
própria posição como audiência, entendendo como a mídia é direcionada ao público e como
diferentes públicos usam e respondem a eles.
Eshet-Alkalai (2004, 2012), professor do Tel Hai Academic College, aborda, além das
habilidades cognitivas, motoras e sociais para o letramento digital, a importância das habilidades
socioemocionais. O autor sugere um modelo conceitual que compreende seis habilidades para o uso
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O Artigo estabelece que “Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a
liberdade de opinar livremente e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios,
independentemente de fronteiras”.
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O termo original, em inglês, é Media and Information Literacy – MIL. Na versão para o português a UNESCO optou
por usar a palavra alfabetização.
Assim, Jenkins (2006) defende que os novos letramentos envolvem habilidades sociais
desenvolvidas por meio de colaboração e trabalho em rede. Essas habilidades baseiam-se na
alfabetização tradicional, habilidades de pesquisa, habilidades técnicas, e habilidades de análise
crítica e incluem: (1) Jogo - capacidade de usar o entorno como forma de resolução de problemas;
O conceito de letramento transmídia é abordado por Carlos Alberto Scolari (2018a, 2018b),
professor do departamento de Comunicação da Universidade Pompeu Fabra em Barcelona, e
expande os postulados do letramento midiático, complementando-os a partir de sua leitura da
realidade midiática dos jovens. O letramento transmídia tem como foco principal o que os jovens
fazem com as mídias fora do contexto escolar, considerando-os prosumers (produtores +
consumidores), capazes de partilhar e gerar conteúdos midiáticos de diferentes tipos e níveis de
complexidade. As capacidades transmidiáticas4 são uma série de competências no contexto das
novas culturas colaborativas relacionadas com a produção, partilha e consumo de mídias digitais
interativas, que vão desde processos de resolução de problemas em games até a produção e partilha
de conteúdo em plataformas web e redes sociais.
De forma geral, os conceitos sobre os letramentos midiáticos trazidos pelos diversos autores
apontam para a necessidade de adquirirmos competências e habilidades de ordens diversas. O
presente levantamento mostrou que os modelos conceituais propostos possuem diferenças
importantes, mas também muitos pontos em comum. O quadro elaborado (Quadro 1) sintetiza os
modelos conceituais levantados pelos diferentes pesquisadores e tem o intuito de subsidiar a
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A pesquisa Transmedia Literacy, realizada de 2015 a 2018, envolveu 8 países e criou uma taxonomia de capacidades
transmidiáticas. “Trata-se de um dos mapas mais exaustivos de capacidades relacionadas com a produção, consumo e
pós-produção de media já realizados no contexto da cultura transmediática dos jovens. As capacidades transmediáticas
identificadas durante a investigação foram divididas em 9 dimensões (produção, prevenção de risco, performance,
gestão de conteúdo individual e social, media e tecnologia, ideologia e ética, narrativa e estética), incluindo cada uma
delas 44 capacidades principais e, num segundo nível, 190 capacidades específicas” (SCOLARI, 2018b, p.9).
construção de modelos conceituais próprios pelos professores, que possam guiar suas práticas
pedagógicas em direção a uma Didática mídia-educativa5 (MILLIET, [s.d.], no prelo).
REFERÊNCIAS
BUCKINGHAM, D. Defining digital literacy: what young people need to know about digital media. In: BACHMAIR,
B. (Ed.). . Medienbildung in neuen Kulturräumen. Wiesbaden: VS Verlag fur Sozialwissenschaften, 2010. v. 1p.
263–276.
BUCKINGHAM, D. The Success and Failure of Media Education. Published in Media Education Research Journal,
v. 4, n. 2, p. 5–18, 2013.
BUZATO, M. E. K. Cultura digital e apropriação ascendente: apontamentos para uma educação 2.0. Educação em
Revista, v. 26, n. 3, p. 283–303, 2010.
CASTRO, M. C. E. Correlações entre uso pedagógico de tecnologias de informação e comunicação e desempenho
escolar : análise envolvendo dados da TIC Educação 2011 e Prova Brasil. Tese (Doutorado em Educação)—Rio de
Janeiro: Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2016.
DUARTE, R.; MILLIET, J.; MIGLIORA, R. Projetos e práticas de mídia-educação nas escolas públicas municipais do
Rio de Janeiro. Educação e Pesquisa, v. 45, n. e202710, p. 1–19, 2019.
ESHET-ALKALAI, Y. Digital Literacy: A Conceptual Framework for Survival Skills in the Digital Era. Journal of
Educational Multimedia and Hypermedia, v. 13, n. 1, p. 93–106, 2004.
ESHET-ALKALAI, Y. Thinking in the digital era: A revised model for digital literacy. Issues in Informing Science &
Information Technology, v. 9, p. 267–276, 2012.
JENKINS, H. Confronting the Challenges of Participatory Culture: Media Education for the 21st Century.
Chicago: The MacArthur Foundation, 2006.
JENKINS, H. Cultura da Convergência. São Paulo: Aleph, 2009.
LIVINGSTONE, S. Internet literacy: a negociação dos jovens com as novas oportunidades on-line. Matrizes, n. 2, p.
11–42, 2011.
LIVINGSTONE, S. Media literacy: what are the challenges and how can we move towards a solution? Disponível
em: <https://blogs.lse.ac.uk/parenting4digitalfuture/2019/03/13/media-literacy-what-are-the-challenges/>. Acesso em:
20 mar. 2019.
MILLIET, J. Por uma didática mídia-educativa. Goiânia: Polyphonia, [s.d.].
PEREIRA, S.; FILLOL, J.; MOURA, P. El aprendizaje de los jóvenes con medios digitales fuera de la escuela: De lo
informal a lo formal. Comunicar, v. 27, n. 58, p. 41, 2019.
SCOLARI, C. A. Adolescentes, medios de comunicación y culturas colaborativas. Aprovechando las
competencias transmedia de los jóvenes en el aula. Barcelona: Carlos A. Scolari, 2018a.
SCOLARI, C. A. Literacia Transmedia na nova ecologia mediática (C. Stonehouse, Ed.). [s.l.] Programa de
Investigação e Inovação da União Europeia Horizonte 2020, 2018b. Disponível em: <http://transmedialiteracy.upf.edu/
sites/default/files/files/TL_whit_port.pdf>.
SOARES, M. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na cibercultura. Educ. Soc., v. 23, n. 81, p. 143–160, 2002.
WILSON, C. et al. Alfabetização Midiática e Informacioal: currículo para formação de professores. Brasília:
UNESCO, 2013.
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Para a construção de uma Didática mídia-educativa, Milliet ([s.d.], no prelo) aponta um caminho a partir da
implementação de políticas públicas mídia-educativas com diretrizes claras e mecanismos que garantam sua
implementação na didática em sala de aula, incorporando fundamentalmente: 1 – infraestrutura; 2- formação continuada
de professores; 3 - incentivos para que os professores implementem a política, com autonomia para criarem práticas
pedagógicas diversas, liberdade para a invenção e espaço para o erro.
Resumo
Sendo parte da revisão teórica sobre letramentos midiáticos feita para minha pesquisa de doutorado em
andamento, apresento os diversos conceitos sobre os letramentos midiáticos trazidos por diferentes autores
do campo, que apontam para a necessidade de adquirirmos competências e habilidades de ordens diversas.
No último ENDIPE realizado em 2018, Candau (2018) apresentou questões consideradas fundamentais no
processo de ressignificação da Didática, entre elas a possibilidade de explorar o potencial das mídias digitais
para facilitar processos de ensino-aprendizagem ativos e reflexivos. Se fora da escola as crianças e
adolescentes estão interagindo com as mídias não como tecnologias, mas como formas culturais, os
educadores precisam fornecer aos alunos meios de compreendê-las (BUCKINGHAM, 2010). Nesse
sentido, busca-se dar subsídios para o estreitamento entre os campos da Didática e da Mídia-educação a
partir de uma compilação dos principais modelos conceituais para o letramento midiático propostos por
autores de referência. Os novos letramentos exigem novas práticas e habilidades de leitura e escrita para se
atribuir sentido, selecionar e avaliar o que se vê nas telas, incluindo textos, imagens, sons, hipertextos, etc. e
também para se produzir conteúdo através dessas múltiplas linguagens (SOARES, 2002). Assim, ser letrado
seria participar desse conjunto de práticas sociais nos quais os sentidos dos conteúdos codificados
culturalmente através das mídias são gerados, disputados, negociados e transformados (BUZATO, 2010).
Ao final apresenta-se um quadro sintetizando os modelos conceituais de letramentos midiáticos levantados,
com o intuito de servir como base para a construção, pelos professores, de modelos conceituais próprios de
forma a guiar suas práticas pedagógicas em direção a uma Didática mídia-educativa (MILLIET, [s.d.], no
prelo).
Palavras-chave: letramentos midiáticos; didática; mídia-educação; didática mídia-educativa.