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CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO – FAVENI

VIOLÊNCIA, CONFLITOS E TÉCNICAS CONSTITUCIONAIS EM


SEGURANÇA PÚBLICA

ESPÍRITO SANTO
1 SUMÁRIO

1 VIOLÊNCIA, CRIME E CONTROLE SOCIAL ............................................. 2

1.1 Violências e dilemas do controle social nas sociedades da


"modernidade tardia" ............................................................................................... 2

1.2 A violência difusa na modernidade tardia ............................................. 6

1.3 As conflitualidades sociais no processo de mundialização ................ 10

1.4 A produção do Estado de controle social penal ................................. 12

1.5 Possibilidades de um controle social democrático ............................. 15

2 GESTÃO DE CONFLITOS E SEGURANÇA PÚBLICA ............................ 18

3 COMUNICAÇÃO E NOVAS TECNOLOGIAS EM SEGURANÇA PÚBLICA


21

3.1 Especial: tecnologia a favor da segurança ......................................... 21

3.2 Sociabilidade, tecnologia da internet e comunicação ......................... 25

3.3 A importância da inovação para a segurança pública ........................ 30

3.4 Inovações tecnológicas a favor da segurança pública ....................... 30

3.5 A importância da inovação para a segurança pública ........................ 32

4 TÉCNICAS E PROCEDIMENTOS POLICIAIS E DE SEGURANÇA


PÚBLICA 33

4.1 Técnicas e tecnologias não-letais na atuação das forças de segurança


33

4.2 A atividade do agente prisional e o uso da força não-letal ................. 37

4.3 Polícia e cidadania ............................................................................. 42

4.4 Polícia comunitária ............................................................................. 44

5 BIBLIOGRAFIA ......................................................................................... 48

1
1 VIOLÊNCIA, CRIME E CONTROLE SOCIAL

1.1 Violências e dilemas do controle social nas sociedades da "modernidade


tardia"

O fenômeno da violência difusa consiste em um processo social diverso do


crime, anterior ao crime ou ainda não codificado como crime no Código Penal.
Durkheim considera o crime um fenômeno social normal, pois, em toda sociedade, um
certo número de crimes é cometido e, por consequência, se nos referimos ao que se
passa regularmente, o crime não é um fenômeno patológico. Igualmente, uma certa
taxa de suicídios pode ser considerada normal (Aron, 1967:340). Ainda assim, o crime
é considerado por Durhkeim uma ruptura com a consciência coletiva, razão pela qual
sofre punição pela lei penal. Ao contrário, afigura-se que a violência difusa nas
sociedades do século XXI é, em larga medida, legitimada pela consciência coletiva,
instituindo-se como norma social, ainda que controversa e polêmica.

Fonte: blogdoenem.com.br

Entre os conflitos sociais atuais, crescem os fenômenos da violência difusa e


as dificuldades das sociedades e dos Estados contemporâneos em enfrentá-los
(Giddens, 1966). Tal dificuldade expressa os novos limites da formação política da

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"modernidade tardia", pois os laços de interação social são orientados por modos
violentos de sociabilidade, invertendo as expectativas do processo civilizatório
(Harvey, 1993:17). Afirma Sousa Santos (1994:271): "(...) o Estado perde o monopólio
da violência legítima que durante dois séculos foi considerada a sua característica
mais distintiva. (...) Em geral os Estados periféricos nunca atingiram na prática o
monopólio da violência, mas parecem estar hoje mais longe de o conseguirem do que
nunca". As raízes sociais desses atos de violência difusa parecem localizar-se nos
processos de fragmentação social, os quais refletem "a desagregação dos princípios
organizadores da solidariedade e a crise da concepção tradicional dos direitos sociais
em oferecer um quadro para pensar os excluídos". (Rosanvallon, 1995:9). Em outras
palavras, estamos diante de processos de massificação paralelos a processos de
individualização — "Somos células em uma sociedade de massas. A globalização é
celular", pois a "multidão solitária" vive em uma pluralidade de códigos de conduta
(Díaz, 1989:89-91). A cultura pós-moderna privilegia o acontecimento: "A realidade
pós-moderna assume a existência de conflitos irresolúveis" (Díaz, 1989:37).
Desenvolve-se a vivência de uma incerteza: "O mundo pós-moderno está se
preparando para a vida sob uma condição de incerteza que é permanente e
irredutível" (Bauman, 1998:32).
Esta é uma das facetas da lógica cultural do capitalismo avançado: a
pluralidade, a descontinuidade, a dispersão (Jameson,1996). Como evoca Díaz
(1989:17): "Nossa época, desencantada, se desembaraça das utopias, reafirma o
presente, resgata fragmentos do passado e não possui demasiadas ilusões a respeito
do futuro". As relações de sociabilidade passam por uma nova mutação, mediante
processos simultâneos de integração comunitária e de fragmentação social, de
massificação e de individualização, de ocidentalização e de desterritorialização (Ianni,
1996). Repõe-se o problema de qual é o lugar da alteridade cultural na sociedade em
processo de mundialização: "Nas sociedades do capitalismo tardio, o culto da
liberdade individual e o desdobramento da personalidade se reformam e se localizam
no centro mesmo das preocupações" (Díaz, 1989:17). Retoma-se uma inquietação
que estava presente nos primeiros sociólogos, pois: "O projeto sociológico nasceu de
uma inquietude sobre a capacidade de integração nas sociedades modernas: como
estabelecer ou restaurar os laços sociais em sociedades fundadas na soberania do
indivíduo?" (Schnapper, 1998: 15). Rompe-se a consciência coletiva da integração
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social, um "declínio dos valores coletivos e com o crescimento de uma sociedade
extremamente individualista" (Hobsbawm, 2000:136).
As questões sociais, desde o século XIX centradas em torno do trabalho
(Castel, 1998), tornam-se questões complexas e mundiais, pois várias são as
dimensões do social que passam a ser questionadas, entre elas a questão dos
vínculos sociais. Trata-se de uma ruptura do contrato social e dos laços sociais,
provocando fenômenos de "desfiliação" e de ruptura nas relações de alteridade,
dilacerando o vínculo entre o eu e o outro.
No limiar do século XXI, o panorama mundial é marcado por questões sociais
mundiais que se manifestam, de forma articulada e com distintas especificidades, nas
diferentes sociedades. Paradoxalmente, o internacionalismo está fundado em
problemas sociais globais, tais como a violência, a exclusão, as discriminações por
gênero, os vários racismos, a pobreza, os problemas do meio ambiente e a questão
da fome. As transformações do mundo do trabalho, mediante as mudanças
tecnológicas, com novas possibilidades de emprego em determinados setores as
quais vêm acompanhadas pela precarização do trabalho, pelo desemprego e pelo
processo de seleção/exclusão social (Laranjeira, 1999). Instaura-se um modo de
organização da produção pós-fordista, caracterizado pela desregulamentação, pela
crise do salariado: a precarização do assalariamento como princípio da conflitualidade
social, redução do mercado de emprego formal, provocando a "desfiliação" dos
trabalhadores em relação às estruturas coletivas do mundo do trabalho (Castel, 1998;
Taylor, 1999:224; Garland, 2001:81-82).
Conforme situa Hespanha (1999): "E não só as velhas desigualdades baseadas
nas diferenças de classes e de estatuto social em termos de rendimento, capital
educacional ou prestígio não desapareceram como emergiram (ou tornaram-se mais
visíveis) novas desigualdades baseadas em outros fatores de distinção como o sexo,
a etnia, a religião ou os modos de vida" (Hespanha, 1999:70). Neste contexto,
emergem diferentes formas de desigualdade e de subordinação, seja em trabalhos
temporários, seja pelo surgimento dos "novos pobres" ou pela vivência da "miséria do
mundo" (Taylor, 1999:12; Bourdieu, 1993).
Também são relevantes as mudanças no mundo rural, desde a questão global
da fome até as inovações tecnológicas, e as novas formas de organização produtiva,
como a agricultura familiar e as atuais lutas sociais pela terra em diferentes países. A
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importância para o futuro da relação do homem com a natureza, indicando a questão
ecológica, a discussão sobre as tecnologias intermediárias e a noção de
desenvolvimento com sustentabilidade (Sachs, 1993). Desencadeiam-se processo de
exclusão social: os "sem classe", "sem terra", aqueles que vivem a exclusão digital,
os "sem teto", aqueles que passam fome ou os "sem trabalho".
Um novo espaço social mundial de conflitualidades está se desenhando nos
espaços e nos tempos da globalização (Ianni, 1996; Sousa Santos, 1994; Harvey,
1993; Giddens, 1991), com a predominância da mercantilização do social e a
destruição das sociabilidades coletivas, ou seja, "o mercado é agora a fundamental
força motor das práticas e discursos sociais e políticos contemporâneos", com o
"desenvolvimento de novas formas de desigualdade social (Taylor, 1999:54).
As instituições socializadoras vivem um processo de crise e
desinstitucionalização, a família, escola, processos de socialização, fábricas,
religiões, e o sistema de justiça criminal (polícias, tribunais, manicômios judiciários,
prisões).
A crise da família avoluma-se, seja pela desnaturação da ordem patriarcal
realizada pelo movimento feminista, a crítica da dominação masculina (Bourdieu,
1998), seja pelo registro da violência doméstica (Saffioti; Almeida, 1995; Gregori,
1992). Analisa Garland (2001:82-83): "A estrutura da família foi substancialmente
transformada. Houve um acentuado declínio (e concentração no tempo) da fertilidade,
com as mulheres se casando mais tarde, tendo poucos filhos e reentrando no trabalho
remunerado imediatamente após dar à luz. Houve também um súbito e notável
aumento dos divórcios". Também as dificuldades da identidade de gênero (Taylor,
1999:37-41) e as transformações da posição das mulheres na sociedade
contemporânea.
A crise da família cristaliza tais mudanças nos laços sociais, pois as funções
sociais desta unidade social marcada por relações de parentesco — assegurar a
reprodução da espécie, realizar a socialização dos filhos, garantir a reprodução do
capital econômico e da propriedade do grupo, assegurar a transmissão e reprodução
do capital cultural — estão atualmente ameaçadas.
Por um lado, em decorrência da própria diversidade de tipos de família no Brasil
atual — família nuclear, família extensa em algumas áreas rurais, famílias
monoparentais, famílias por agregação. Por outro, os tipos de relações de
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sociabilidade que nela se realizam são variadas, marcadas originalmente pela
afetividade e pela solidariedade, agora reaparecem como largamente conflitivas,
como o demonstram os fenômenos da violência doméstica. Finalmente, as funções
de socialização são compartilhadas pela escola e pelos meios de comunicação. Dessa
forma, identifica-se uma desorganização do grupo familiar, com as funções de
reprodução econômica ameaçadas pela crise do emprego assim como pelos efeitos
da crise do Estado-Providência.

1.2 A violência difusa na modernidade tardia

Os fenômenos da violência difusa adquirem novos contornos, passando a


disseminar-se por toda a sociedade. Essa multiplicidade das formas de violência
presentes nas sociedades contemporâneas — violência ecológica, exclusão social,
violência entre os gêneros, racismos, violência na escola — configuram-se como um
processo de dilaceramento da cidadania. A compreensão da fenomenologia da
violência pode ser realizada a partir da noção de uma microfísica do poder, de
Foucault, ou seja, de uma rede de poderes que permeia todas as relações sociais,
marcando as interações entre os grupos e as classes (Foucault, 1994:38-39).
Deparamo-nos com as dimensões subjetivas e objetivas das variadas formas de
violências: violência na escola, violência social, ecológica, exclusão, gênero,
racismos. Configura-se uma "microfísica da violência" na vida cotidiana da sociedade
contemporânea (Tavares dos Santos, 2002b).
Efetiva-se uma pluralidade de diferentes tipos de normas sociais, algo mais do
que o próprio pluralismo jurídico, levando-nos a ver a simultaneidade de padrões de
orientação da conduta muitas vezes divergentes e incompatíveis, como, por exemplo,
a violência configurando-se como linguagem e como norma social para algumas
categorias sociais, em contraponto àquelas denominadas de normas civilizadas,
marcadas pelo autocontrole e pelo controle social institucionalizado (Elias, 1990;
1993). Fortalece-se a prática de fazer justiça pelas próprias mãos, um traço de uma
cultura orientada pelo hiperindividualismo (Díaz, 1898, 107). Nas palavras de Bauman
(1998:26): "A busca da pureza moderna expressou-se diariamente com a ação
punitiva contra as classes perigosas; a busca da pureza pós-moderna expressa-se
diariamente com a ação punitiva contra os moradores das ruas pobres e das áreas
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urbanas proibidas, os vagabundos e os indolentes". Adquirindo a cultura uma
centralidade na "modernidade tardia", a disseminação de uma cultura de "ganhadores
ou perdedores" (Taylor, 1999: 34-37) acentua os valores do individualismo competitivo
e a criação de uma cultura popular unidimensional, hedonista e imediatista (Young,
1999:10; Taylor, 1999:90), induz as populações a viverem em novos grupos sociais
eletivos e auto referidos (Garland, 2001:89).
O período atual pode ser denominado de Processo de Mundialização, marcado
pela pós-modernidade como forma cultural, pela expansão da produção industrial em
nova distribuição do trabalho planetária, com o avanço do capital especulativo e pelas
conflitualidades sociais mundiais.
A herança do Estado de Bem-Estar Social e do Modernismo Penal (1946-1978)
começou a ser abalada durante a crise global do final do século XX (1978-1991), como
comprova Hobsbawm (1994; 2000): assistimos ao final do "Estado de Bem-Estar"
(1946-1973), no qual as instituições sociais tinham um funcionamento regular, ao
menos nos países desenvolvidos. O controle social formal (as polícias, o judiciário, o
sistema da justiça criminal, as prisões) era orientado para a reabilitação dos
delinquentes, com uma intenção "correcional" e ressocializadora. Porém, também
nessa época as instituições de controle social informal funcionavam regularmente: a
família, a escola, os grupos sociais, as associações, os movimentos sociais definiam
normas de conduta, reproduziam valores e disseminavam orientações para a ação
social. Estávamos vivendo o modelo de controle social "correcional", pois todos os
controles sociais, informais e formais, estavam em funcionamento, conforme a
interpretação de Garland (2001:44): "O bem-estar penal retirava suporte de uma
particular forma de Estado e de uma particular estrutura de relações de classes.
Funcionava em um ambiente específico de políticas sociais e econômicas e interagia
com uma série de instituições contíguas, as mais importantes das quais eram o
mercado de trabalho e as instituições do Estado de Bem-estar Social". Por outro lado,
o controle social distribuía-se pelas instituições societárias: "Os controles sociais
informais exercidos pelas famílias, vizinhanças e comunidades, junto com as
disciplinas impostas pelas escolas, locais de trabalho e outras instituições criavam um
cotidiano de normas e sanções que embasavam as demandas legais e garantiam
suporte às intervenções do bem-estar penal" (Garland, 2001:44). Uma das novas
questões sociais mundiais tem sido a violência no espaço escolar, marcada pela
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violência simbólica e pela territorialização do crime organizado (Tavares dos Santos,
1999), também um sintoma da crise da juventude masculina (Taylor, 1999:65-85;
Zaluar, 1994).
O crime seria um epifenômeno da sociedade capitalista, diziam em 1973 os
autores da New Criminology, denominados, ao longo dos anos 90, de "realistas de
esquerda" na Inglaterra (Taylor; Walton; Young; 1990). Entretanto, acompanhando as
mudanças sociais no final do século XX, três décadas depois os "realistas de
esquerda" chegariam a perceber os dilemas da "modernidade tardia": as crescentes
taxas de criminalidade; a revelação das invisíveis vítimas; a problematização do
fenômeno criminal; a universalidade do crime; e a seletividade da justiça; os
problemas da punição e da culpabilidade (Young, 1999: 35-43).
As características da "modernidade tardia" seriam a repetição da exclusão
social, a disseminação das violências, a ruptura de laços sociais e a "desfiliação" de
algumas categorias sociais, como a juventude, uma das grandes vítimas da
civilização, analisa Pais: "Nas décadas imediatas ao pós-guerra, as transições dos
jovens assemelhavam-se a viagens de comboios nas quais os jovens, dependendo
da sua classe social, gênero e qualificações acadêmicas, embarcavam em diferentes
comboios com destinos pré-determinados". Atualmente, "o terreno onde as transições
têm lugar é de natureza cada vez mais labiríntica. No labirinto da vida, como num
labirinto rodoviário, surgem frequentemente sentidos obrigatórios e proibidos,
alterações de trânsito, caminhos que parecem já ter sido cruzados, várias vezes
passados: essa retomada de caminhos que parecem que provoca uma sensação de
perda, de confusão" (Pais, 2001:10).
Houve profundas alterações no espaço urbano, modificando a visão da
ecologia urbana da Escola de Chicago, pois a hegemonia "da sociedade de mercado"
envolve um crítico processo de retirada da autoridade pública da supervisão e
manutenção dos espaços públicos na cidade" (Taylor, 1999:61). Completa Garland:
"Os projetos de renovação urbana dos anos de 1960 continuaram o processo
demolindo muitas vizinhanças das áreas urbanas centrais, o que resultou em novos
sistemas de tráfico e autoestradas, com a realocação dos moradores em projetos
habitacionais concentrados. O efeito frequentemente, foi concentrar as famílias
pobres e de minorias em áreas muito afastadas da cidade nas quais faltavam os

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serviços básicos tais como lojas, empregos e bom transporte público" (Garland,
2001:84-85).
Produziu-se uma urbanização sociopática, com espaços urbanos fragmentados
e segmentados, seguindo um mesmo padrão geral: centros deteriorados e bairros
periféricos carentes, habitados por populações vulneráveis; bairros de populações de
altas rendas, com forte presença de segurança privada assim como a implementação
de condomínios fechados (Caldeira, 2000); territórios controlados pelo "crime
organizado"; espaços privados de comércio, com controle social por segurança
privada; desigualdade social e espacial; violência cotidiana nas ruas; e violência no
espaço escolar (Taylor, 1999:110). Em suma, a falência do poder público regulatório.

Vivemos em um contexto societário no qual as concepções do crime passam


por grandes metamorfoses (Young, 1999:46-47): a definição do crime passa a ser
problemática, seja pelas novas modalidades de crime — criminalidade violenta; crime
organizado, tráfico de armas e de drogas; crimes de "colarinho branco", crimes
informacionais, seja por fenômenos sociais de violência contra a pessoa ainda não
consideradas, por exemplo, as violências contra as crianças, sob a ideologia da
educação pelo castigo físico; os infratores da lei não são mais uma minoria mas
podem ser extensos continentes sociais; a probabilidade de alguém ser vítima, de
excepcional, passa a ser prevalecente e contingente; as causas do crime são difusas,
eminentes ou por "escolha racional", nos casos de delitos contra o patrimônio ou de
extorsão por sequestro; há uma continuidade entre o fato social normal e o crime,
transformado em fenômenos societários; o assaltante deixa de ser profissionalizado
para tornar-se um ofensor sem especialização, realizando a ação delituosa quase ao
acaso (Pegoraro, 1999); a relação entre agressores e vítimas passa a ser uma relação
complexa, pois o agressor não é mais somente o estranho, mas alguém conhecido ou
do próprio grupo da vítima, estranhos e íntimos, habitantes locais e de outras regiões;
as causas do crime passam a ser multidimensionais; o crime passa a ser societal, em
um contínuo na vida social, sendo o lugar da ocorrência ser tanto privado quanto
público; e o controle social formal não mais é monopólio do sistema de justiça criminal
mas passa a ser compartilhado por outras agências sociais.
Por conseguinte, os "impactos da modernidade tardia sobre as taxas de crime
foram multidimensionais: aumento das oportunidades para o crime; redução dos
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controles situacionais; aumento da população em risco; redução da eficácia dos
autocontroles sociais, como consequência das mudanças na ecologia social e nas
normas culturais" (Garland, 2001:90).
Estaríamos diante de uma crise da modernidade tardia, na qual a privação
relativa combina-se com o individualismo, transformando-se em "uma comparação no
interior da divisão do trabalho e entre aqueles que estão no mercado e os excluídos,
conformando uma grande vulnerabilidade social, pobreza e miséria. Assiste-se, nesse
quadro, a uma ruptura dos controles sociais tradicionais (Young, 1999:46-48),
substituídos por uma invasão dos meios de comunicação na esfera da socialização.
Cabe falar, então, de um tempo histórico não linear, pontual, repetitivo, de uma
sociedade de risco (Young, 1999:68-72), na qual a falência do controle social formal
se expressa na crise mundial das polícias (Reiner, 2000; Bayley, 1996; Soares, 2000).

1.3 As conflitualidades sociais no processo de mundialização

No início do século XXI, a questão das conflitualidades — das formas de


violência, das metamorfoses do crime, da crise das instituições de controle social e
dos conflitos sociais — configura-se pela emergência de novas modalidades de ação
coletiva, com lutas sociais protagonizadas por outros agentes sociais e diferentes
pautas de reivindicações.
As questões substantivas — emergentes de pesquisas tanto no espaço urbano
quanto no espaço rural — para o futuro da transformação social das sociedades latino-
americanas, podem ser assim formuladas (Tavares dos Santos, 2002c): "Quais as
formas de violências que predominam na América Latina no início do século XXI?
Quais as origens sociais, econômicas e políticas das violências? Qual a relação entre
juventude e violência? Como se conforma a crise do sistema de Justiça Penal? Quais
as experiências inovadoras e as lutas sociais pela cidadania que se configuram
atualmente na América Latina?"
A observação de um fato social — as violências disseminadas pelo espaço
social — possibilita a construção de um objeto sociológico, mediante a ótica espaço-
temporal da conflitualidade, tecendo uma explicação sociológica da violência, a partir
da experiência latino-americana, mas com alcance teórico para várias sociedades

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contemporâneas, pois nos encontramos diante da mundialização da violência e da
injustiça (Tavares dos Santos, 2002a).
Na sociedade brasileira, a Constituição de 1988, denominada de Constituição
Cidadã, representou a instauração do Estado Democrático de Direito, com inúmeras
possibilidades de aumento no acesso à Justiça, abrindo um processo de
informalização da Justiça (Azevedo, 2000). Entretanto, foi escassa a discussão sobre
o direito à segurança, prevalecendo o ponto de vista dos comandos das Polícias
Militares estaduais, o qual garantiu a definição constitucional dessas polícias como
força auxiliar das forças armadas (Constituição Federal de 1988, art. 144) (Caldeira,
2000).
As forças sociais democráticas vinham fazendo a denúncia de graves violações
de direitos humanos desde os anos de "chumbo" da ditadura militar. Por um lado, os
liberais consideravam que o Estado de Direito superaria tanto a violência do Estado
quanto a criminalidade. Por outro, as forças de esquerda falavam em violência
estrutural do modo de produção capitalista, considerando o crime um epifenômeno
das relações de exploração. Poucos percebiam as relações entre cultura e violência
como estratégia de sobrevivência para algumas camadas populares (Oliven, 1982).
Somente nos anos 90, a violência veio a tornar-se um problema social e uma
questão sociológica. Os estudos sobre o crime já estavam presentes na historiografia
brasileira (Bretas, 1991), os processos da violência política rural já vinham sendo
analisados, com larga tradição nos estudos sociológicos (Tavares dos Santos, 1991),
e a denúncia da violência contra os trabalhadores rurais e camponeses passou a ser
sistemática (CPT, 1989a-2002). A noção de "criminalidade violenta" passou a ser um
instrumento chave para explicar a junção do crime com a violência, inaugurando uma
larga série de pesquisas e estudos de caso (Adorno, 1993; Zaluar, 1999; Kant de Lima
et al., 2002). Em outras palavras, a publicação de uma série de resenhas sobre o
estado da arte dos estudos sociológicos sobre crime e violência, incluindo os estudos
sobre as polícias, a segurança pública, o poder judiciário penal, as prisões e os
fenômenos de violência na escola (Sposito, 2001). A diversidade regional dos estudos
já possibilita também uma visão comparativa entre cidades e Estados, acrescendo a
visibilidade social e a compreensão sociológica das conflitualidades na sociedade
brasileira.

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No início do século XXI, a questão das conflitualidades — das formas de
violência, das metamorfoses do crime, da crise das instituições de controle social e
dos conflitos sociais — configura-se pela emergência de novas modalidades de
conflitos sociais: "Estamos em presença de um social heterogêneo, no qual nem
indivíduos nem grupos parecem reconhecer valores coletivos. Esse contexto dá
origem a múltiplos arranjos societários, a múltiplas lógicas de condutas.
Predominando tal situação é válido falar em sociedade fragmentada, plural,
diferenciada, heterogênea" (Grossi Porto, 1994). Conformam-se novas questões
sociais mundiais, seja porque "os processos de transformação pelas quais vem
passando o trabalho afetam sua característica de integração social, com uma
configuração fundamentalmente marcada pela fragmentação" (Grossi Porto, 1994),
seja pela expansão dos fenômenos da violência difusa, para cuja explicação poderia
ser útil uma microfísica da violência (Tavares dos Santos, 2002). Retomamos esta
definição de violência difusa: as diferentes formas de violência presentes em cada um
dos conjuntos relacionais que estruturam o social podem ser explicadas se
compreendermos a violência como um ato de excesso, qualitativamente distinto, que
se verifica no exercício de cada relação de poder presente nas relações sociais de
produção do social. A ideia de força, ou de coerção, supõe um dano que se produz
em outro indivíduo ou grupo social, seja pertencente a uma classe ou categoria social,
a um gênero ou a uma etnia, a um grupo etário ou cultural. Força, coerção e dano, em
relação ao outro, enquanto um ato de excesso presente nas relações de poder. Pode-
se verificar empiricamente na sociedade brasileira a seletividade social das vítimas:
trabalhadores urbanos, moradores de bairros populares, pais, crianças, mulheres,
jovens, negros, índios. Do sexo masculino: acidentes de trânsito, homicídios, armas
de fogo; jovens e adolescentes: abuso sexual; violência doméstica (contra crianças,
idosos, mulheres): contra crianças, castigos corporais e maus-tratos; violência sexual
contra as mulheres e o aumento do registro da violência doméstica.

1.4 A produção do Estado de controle social penal

A violência como nova questão social global está provocando mudanças nos
diferentes Estados, com a configuração de Estado de Controle Social repressivo: em
outras palavras, estamos diante de formas contemporâneas de controle social, com
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as características de um Estado repressivo acompanhando a crise do Estado-
Providência. Alguns elementos possibilitam caracterizar este estado penal:
- O discricionarismo e a violência policial aparecem como umas das novas
questões sociais globais, em grande parte ainda impensada pela sociologia, na
perspectiva da conflitualidade. Na última década, a questão policial tornou-se mais
complexa, seja pela suposta ineficácia e ineficiência frente ao crescimento e
diferenciação das ações sociais socialmente criminalizadas, seja pelos novos
fenômenos criminalizados na "modernidade tardia" nos países centrais do mundo
capitalista (Young, 1999). Expande-se, pelo planeta, a opção pelo crescimento das
funções de controle social repressivo da polícia, com o apelo sistemático ao uso da
violência ilegal e ilegítima.

- A produção social do sentimento de insegurança: "Os homens e as mulheres


pós-modernos trocaram um quinhão de suas possibilidades de segurança por um
quinhão de felicidade. Os mal-estares da modernidade provinham de uma espécie de
segurança que tolerava uma liberdade pequena demais na busca da felicidade
individual. Os mal-estares da pós-modernidade provêm de uma espécie de liberdade
de procura do prazer que tolera uma segurança individual pequena demais" (Bauman,
1998:10). Tal incerteza tem sido produzida pelo enfraquecimento dos laços sociais,
desde a insegurança no emprego à crise das relações sociais entre as pessoas
(Hobsbawm, 2000:138-194; Bauman, 1998:32-35; Garland, 2001:92). A reação do
público seria marcada pelo "medo do crime" e pelo "pânico moral", a "sensação de
insegurança" (Young, 1999), o "medo de falhar" similar ao "medo do outro", uma crise
da civilidade na vida cotidiana (Taylor, 1999:17-19).

- O programa de "tolerância zero", da polícia de Nova York, somente em seu


aspecto de reforço do policiamento ostensivo, mas desprezando toda a rede de
serviços de associações que, naquela cidade, faz parte do programa (Young,
1999:121-148).

- O controle social do crime não é mais apenas das agências estatais, mas
também das polícias privadas, formais ou precárias, configurando um "complexo de
serviços privados de segurança".
13
- O encarceramento dos "consumidores falhos", pois "a busca da pureza pós-
moderna expressa-se diariamente com a ação punitiva contra os moradores das ruas
pobres e das áreas urbanas proibidas, os vagabundos e os indolentes" (Bauman,
1998:26). Consolidou-se a indústria carcerária: "Durante os últimos vinte e cinco anos,
a população de encarcerados e de todos os que obtêm a sua subsistência da indústria
carcerária — a polícia, os advogados, os fornecedores de equipamento carcerário —
tem crescido constantemente. O mesmo aconteceu com a população de ociosos —
exonerados, abandonados, excluídos da vida econômica e social.
Consequentemente, como seria previsível, aumentou o sentimento popular de
insegurança" (Bauman, 1998:49; Wacquant, 2000). Finalmente, a barbárie das
prisões enquanto depósito de "hombres infames", nas quais passa a predominar uma
orientação repressiva, aumenta a duração das penas privativas de liberdade,
restringindo-se a vida dos apenados nos presídios de segurança máxima, com o
abandono dos ideais "correcionais" da época anterior.
Em síntese, o Estado do controle social penal apresenta as seguintes
características: a polícia repressiva, o Judiciário penalizante, a privatização do
controle social, fazendo com que o crescimento das polícias privadas e das prisões
privadas seja acompanhado pelo "complexo industrial-policial", ou todos os ramos
industriais envolvidos com equipamentos e instalações de prevenção e repressão ao
crime, tais como seguros, segurança privada, viaturas, equipamentos de
comunicação, sistemas de informação, etc. (Taylor, 1999:213-222).
As dificuldades políticas advindas dos processos de transição democrática na
América Latina, nos últimos 20 anos, pois não só permanece o desconhecimento e a
surpresa, em face da expansão dos fenômenos de violência, como nos esforços de
reconstrução institucional visando a plenitude do Estado de Direito não foi colocada
em questão várias dimensões do controle social institucional, em particular, a situação
das prisões e os modos de funcionamento das polícias. Cabe salientar as dificuldades
de acesso à justiça, a seletividade social da justiça penal e a perda de legitimidade
das instituições de controle social.
As lutas sociais contra a violência expressam as possibilidades de uma
governamentalidade, fundada na sociedade civil e na construção social da cidadania,

14
buscando-se a reconstrução das relações de sociabilidade mediante outras bases da
solidariedade social.
Entre os agentes da transformação, podemos identificar as instituições da
sociedade civil que promoveram tais lutas: a campanha de Hélio Bicudo contra os
"grupos de extermínio" em São Paulo, nos anos 70; a campanha pela Anistia, de 1975
a 1979; o grupo ecumênico, católico, luterano e judeu, do movimento "Tortura Nunca
Mais", no início dos anos 80; a Campanha Nacional contra a Violência, levada adiante
pela OAB; e a Campanha sobre a Violência contra a Criança, organizada pela
Confederação Nacional dos Bispos do Brasil — CNBB, Igreja Evangélica de Confissão
Luterana do Brasil — IECLB e Comissão Pastoral da Terra — CPT.
Nos anos 90, assistimos a sucessivas campanhas contra a violência no campo,
protagonizadas pela Comissão Pastoral da Terra, da CNBB, Confederação dos
Trabalhadores na Agricultura — Contag e Instituto Brasileiro de Análise Sociais e
Econômicas — Ibase, desde 1985; as Comissões de Direitos Humanos; as ONG,
como o Movimento Viva Rio; as campanhas contra a violência à mulher; os
movimentos de homossexuais denunciando a violência contra gays, lésbicas e
travestis; as lutas do movimento negro, e tantas outras.
Também as campanhas contra a violência nos presídios, levadas adiante pela
Comissão de Justiça e Paz Teotônio Vilela, da Arquidiocese de São Paulo; a
mobilização pela desmilitarização das polícias militares estaduais, capitaneada por
Hélio Bicudo e pelo Núcleo de Estudos da Violência da USP, dirigido por Paulo Sérgio
Pinheiro; a Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Deputados, as Comissões
de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul (Relatório Azul,
1994-2002); e a Campanha pela Paz nas Escolas, capitaneada pela Unesco.

1.5 Possibilidades de um controle social democrático

Neste nascente século XXI, multiplicam-se os projetos para prevenir as


violências e reduzir a criminalidade violenta, na perspectiva de novas alternativas de
políticas públicas de segurança que possam garantir o direito de segurança dos
cidadãos e cidadãs nas sociedades do século XXI. São efeitos múltiplos da

15
mundialização da questão dos direitos humanos, desde a II Conferência Internacional
de Direitos Humanos, reunida em Viena, em 1995.
Estamos, desde 2001, em um período de proposições para "um outro mundo
possível", como aconteceu durante o Fórum Social Mundial de Porto Alegre, nos anos
de 2001, 2002 e 2003. Entretanto, se muito se discutiu sobre a violência, em particular
a violência doméstica e a violência contra os jovens, o debate sobre a questão da
segurança foi escasso, e sobre a questão da reforma das polícias foi nulo.
Assistimos a uma virtual impossibilidade do ofício de policial, seja pelas
dificuldades em garantir a ordem pública, por ela estar internacionalizada e
privatizada, seja pelas limitações em contribuir à construção do consenso, pois as
bases da comunidade não mais existem em sociedades complexas e com o mundo
do trabalho desestruturado. A análise de várias situações reais pode levar a perceber
a vigência, na sociedade brasileira, de uma representação social baseada em
tecnologias de poder repressivas, mas também cabe salientar a emergência de ações
coletivas e de trabalhos institucionais enquanto expressões de um movimento contra
a violência.
Tal movimento de reforma do trabalho policial tem sido, por um lado, marcado
por uma colaboração entre universidades e escolas de Polícia, em vários estados
brasileiros, nos últimos anos, que tem sido franca e profícua, indicando um movimento
de transformação de currículos, de conteúdos e de concepção do ofício de policial (em
Minas Gerais, a UFMG e a Fundação João Pinheiro; no Rio Grande do Sul, a
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, desde 1992; no Rio de Janeiro, a UERJ
e a Universidade Federal Fluminense; em São Paulo, a USP; na Bahia, a UFBA; em
Pernambuco, a UFPE; no Pará, a Universidade Federal do Pará, no Ceará, a
Universidade Federal do Ceará).
Na mesma perspectiva, estão as experiências e as discussões acerca do
modelo da polícia comunitária, ou da polícia de proximidade, mediante a análise das
experiências no Canadá, na França, na Espanha, nos Estados Unidos e na Inglaterra,
assim como em São Paulo, no Rio de Janeiro, na Bahia, no Amapá, no Espírito Santo
e no Rio Grande do Sul (Mesquita Neto, 1998; Muniz, 1997). Também está em curso,
no Brasil, uma discussão sobre a reforma das polícias estaduais, tendo sido lançado,
em dezembro de 1999, um projeto de emenda constitucional que propõe um "novo
modelo de polícia no Brasil", com os seguintes itens: unificação das polícias civis e
16
militares em cada estado; extinção dos tribunais militares estaduais; eliminação do
inquérito policial; e controle externo das polícias por ouvidorias.
Desta forma, para responder a tais processos sociais planetários, impõe-se
propor uma diversificação nas alternativas de desenvolvimento para as sociedades
contemporâneas, tanto no centro como na periferia do sistema global. Contra essa
sociedade normalizadora e programada, efeito de uma tecnologia de poder centrada
na vida, e de um Estado orientado para o controle social penal emergem, aparecem,
no jovem século XXI, forças sociais de resistência, novos movimentos sociais, a crítica
aos processos sociais de construção da violência simbólica e das "representações
sociais da insegurança" e as concepções de uma polícia cidadã orientada para a
mediação de conflitos.
Seria, então, possível, pensar a construção de uma cidadania transnacional ou
mundial, marcada pela criação institucional e pela difusão e comunicação de práticas
sociais, jurídicas e simbólicas, inovadoras e globais, no âmbito da sociedade civil: "É
no âmbito da sociedade civil mundial, vista como o novo palco da história, que os
indivíduos e as coletividades, as classes e os grupos, os gêneros e as etnias, as
línguas e as religiões adquirem outros e novos significados, envolvendo movimentos
de integração e fragmentação, acomodação e contradição, reforma e revolução"
(Ianni, 2003:129).
Por um lado, a reinvenção das formas de solidariedade; por outro, a redefinição
do trabalho, em múltiplas relações sociais, tanto no espaço rural como no espaço
urbano; enfim, a prevenção e erradicação das formas de violência social; e a
construção de um outro tipo de trabalho policial.
Estamos no limiar de um processo político no qual a questão da segurança
retoma as origens da polis e da politeia, como conjunto das instituições necessárias
ao funcionamento e à conservação da cidade, incluindo-se o direito coletivo da
segurança dos cidadãos e cidadãs.
Em outras palavras, a emergência de uma noção de segurança cidadã, na
perspectiva da mundialização, supõe a construção social de controle social
democrático, mediante o qual tanto as instituições de socialização — a família, a
escola, as associações locais, os meios de comunicação — quanto as organizações
do controle social formal — as polícias, o sistema judiciário, as instituições prisionais
— reconstruam o objetivo de uma governamentalidade preocupada com as práticas
17
de si, emancipatórias, dos conjuntos de cidadãos e cidadãs em suas vidas cotidianas,
em suas trajetórias sociais e em seus sonhos de sociedade. Tais possibilidades estão
presentes nas lutas sociais mundiais pela construção de uma sociedade democrática,
com novas modalidades de controle social orientadas pelo respeito à dignidade
humana.1

2 GESTÃO DE CONFLITOS E SEGURANÇA PÚBLICA

Há algum tempo, uma grande expectativa foi construída em torno da atuação


de policiais estaduais de todo o Brasil. Nada tão inimaginável para eles, que em suas
bases nos estados passaram a se mobilizar de forma tão incisiva que hoje todos
voltam seus olhares para manifestações em busca da realização desse sonho de
servir à expectativa da população e construir uma força policial forte e prestativa.

Fonte: www.informeblumenau.com

Tudo começou em 2008, quando o Deputado Federal Arnaldo Faria de Sá, do


PTB de São Paulo, criou um projeto de emenda constitucional que visava criar
tratamento isonômico no quesito salarial para policiais de todos os estados da
federação que exercem a mesma função, possuem a mesma patente, passam por

1 Extraído do link: www.scielo.br


18
situações similares no enfrentamento do crime e, no entanto, recebem salários
diferenciados.
A PEC 300, como ficou conhecido o projeto do deputado, apresenta um texto
muito simples, porém impactante que estabelece que “a remuneração dos Policiais
Militares dos estados não poderá ser inferior à da Polícia Militar do Distrito Federal,
aplicando-se também aos integrantes do Corpo de Bombeiros Militar e aos inativos.
Altera a Constituição Federal de 1988. ”
A legalidade da proposta se fundamenta na CF/88, que em seu artigo 47 diz
que “a Lei disporá sobre a isonomia entre as carreiras de policiais civis e militares,
fixando os vencimentos de forma escalonada entre os níveis e classes, para os civis,
e correspondentes postos e graduações, para os militares”. Com esse fundamento, a
Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados declarou a PEC
como constitucional.
No seio das polícias militares de todo o país, além da expectativa por melhorias
salariais também cresceu uma grande insatisfação pela postergação da aprovação
desse projeto. No bojo deste processo, vemos uma mobilização que merece
destaque: a atual movimentação realizada pelos policiais militares da Bahia desde o
dia 30 de janeiro último que conta com a Associação dos Policiais, Bombeiros e de
seus Familiares do Estado (ASPRA), cuja força pode ser medida pela liderança e
atuação seu presidente Marco Preço, que foi expulso da PM em 2002 (por conta da
greve dos policiais em 2001), e ainda pelo número de filiados e outras entidades
representativas que apoiam esta greve.
Após a greve ter sido declarada ilegal por uma decisão judicial, a vontade de
reprimi-la surgiu com força total, encabeçada pelo governador da Bahia, Jaques
Wagner (PT), que após retornar de viagem a Cuba e ao Haiti com a presidente Dilma
Rousseff, declarou: “Não admitirei que a segurança da população baiana seja
colocada em risco por um pequeno grupo de pessoas...” referindo-se à ASPRA.
Com a paralisação, houve tumulto na capital da Bahia. Eventos foram
cancelados, falou-se em aumento do número de assassinatos e roubos, embora
nenhum boletim oficial confirmasse esses fatos. O ponto alto da comoção nacional,
no entanto, aconteceu no momento em que o Exército e a Força Nacional foram
convocados para dar um fim ao movimento. A convocação do Exército já era esperada

19
pelos manifestantes, mas a convocação da Força Nacional carrega uma carga
simbólica digna de nota ao movimento.
Para os manifestantes, a Força Nacional pode ser entendida como um
grupamento formado por policiais militares de todos os estados da federação que
passaram por treinamento especial e são convocados em ocasiões especiais, mas,
ainda assim, são policiais militares, tal qual os grevistas que se encontram do outro
lado deste pêndulo. Uma das principais diferenças em relação à Força Nacional é o
fato de que os policiais militares que servem neste grupamento vivem destacados para
outras regiões e complementam, portanto, seus salários com as diárias recebidas por
estes deslocamentos. O montante empreendido no custeio de longos deslocamentos
a este grupamento especial por diferentes regiões do país pode ser ponto passível de
discussão junto ao poder estadual, uma vez que onera os cofres públicos e, assim,
contribui para alguns dos principais argumentos que barram as propostas de
elevação/equiparação de salários policiais.
Para evitar a propagação nacional da greve, ações no âmbito federal foram
também tomadas e a Polícia Federal foi acionada, através do Comando de Operações
Táticas da Polícia Federal – COTE, para cumprir os 12 mandados de prisão expedidos
pela Justiça para os comandantes da paralisação no estado.
A greve na Bahia já acabou, mas não restam dúvidas que outras surgirão. A
insatisfação geral das polícias militares não vai acabar. O uso da Força Nacional foi
um duro golpe, pois colocou policiais da mesma força uns contra os outros. A prisão
dos líderes pode dar ainda mais força ao movimento, pois esses homens passam a
ser considerados heróis da causa.
A habilidade de negociação das diversas instâncias do governo falhou. Acordos
que poderiam ter sido feitos não foram nem sequer discutidos. A gestão de segurança
pública foi levada ao limite de uma ação drástica que não abrevia uma solução.
Homens e mulheres das forças policiais de todo Brasil arriscam diuturnamente
suas vidas pelo dever de “proteger e servir”. Levam seu dever de ofício às últimas
instâncias e todos os dias vemos relatados casos de algum deles que tombaram em
serviço, no cumprimento de suas obrigações.
Para além da isonomia dos salários e da aprovação da PEC 300, é preciso
discutir a falta de efetivo, a carência de equipamentos de proteção individual, o
provimento de boas condições de trabalho, entre outros.
20
Novas políticas para gestão dos profissionais de segurança pública precisam
ser adotadas, um estudo íntimo da situação de cada estado faz-se necessário e deve
ser encabeçado pela instância federal, como forma de superar a inabilidade manifesta
das instâncias estaduais em lidar com esses profissionais.
Enquanto o atual cenário de gestão das políticas de segurança pública e de
suas forças perdurar, não veremos solução próxima para as demandas das polícias
estaduais e teremos que aprender a gerir seus conflitos.2

3 COMUNICAÇÃO E NOVAS TECNOLOGIAS EM SEGURANÇA PÚBLICA

3.1 Especial: tecnologia a favor da segurança

Os versos “A cidade não para, a cidade só cresce/ O de cima sobe e o debaixo


desce” eternizados por Chico Science & Nação Zumbi, representam bem a sociedade
em que vivemos, onde somente nos últimos anos a diferença entre ricos e pobres vem
diminuindo.

Fonte:www.mtitecnologia.com.br

2 Extraído do link: www.cartacapital.com.br


21
Mesmo assim, a falta de perspectiva de uma vida digna de muitos cidadãos
acaba gerando sérios problemas de segurança pública. Para combater estes e
diversos outros problemas de segurança, diversas tecnologias têm sido desenvolvidas
e empregadas, principalmente em grandes metrópoles do Brasil e do Mundo.

Enxergar através das paredes

Enxergar do outro lado da parede já não é mais um privilégio somente do Super


Homem desde que a empresa francesa Cambridge Consultants desenvolveu o
equipamento Prism 200. Ele é um radar que utiliza emissões de raio-x para monitorar
eventos ocorrendo do outro lado da parede, algo ideal para casos negociação da
polícia com sequestradores.
Seu funcionamento se dá através de um radar, encostado na parede (seja ela
de madeira, tijolos ou concreto), que consegue identificar a posição de pessoas,
animais e móveis com alcance de até 20 metros. Assim seria possível planejar o
melhor local para a invasão, tendo certeza do posicionamento das vítimas e também
de objetos que podem ajudar ou atrapalhar a ação da polícia.

Observador de tiros

Infelizmente em grandes cidades tem se tornado cada vez mais troca de tiros
entre policiais e bandidos. A sociedade toda acaba se tornando refém de sua própria
ineficiência na hora de atuar na direção de corrigir os problemas sociais e votar em
governantes comprometidos com este tema, e nessa guerra não tão silenciosa, muitos
inocentes perdem a vida.
Está chegando ao Brasil um sistema desenvolvido nos Estados Unidos e que
promete reduzir em até 40% a taxa de homicídios e em mais de 70% a troca de tiros
em áreas públicas, possibilitando assim revisão e reordenação das políticas públicas
para a área de segurança.
Este é o Sistema de Detecção de Disparos de Armas de Fogo (SDD) que
através de um sistema acústico com sensores de áudio camuflados instalados em
diversas regiões de áreas urbanas, captará as ondas e identificará de onde tiros são
disparados. O sistema é inteligente e possui mecanismos de assinaturas acústicas
22
para distinguir disparos de armas de fogo de outros barulhos “semelhantes”, como
fogos de artifício.
O sistema é simples: em caso de disparo dentro do perímetro coberto pelo
captador de áudio, o barulho do tiro é captado e então é a central telefônica da polícia
ou de qualquer outro órgão de segurança pré-programado é acionada.
A utilidade deste equipamento está justamente no fato de permitir uma ação
rápida da polícia, pois o local do disparo é conhecido no momento em que ele
acontece. Deste modo encurta-se o caminho entre a central de polícia e o local de
onde partiu o projétil, pois um simples contato com uma viatura próxima pode
surpreender e evitar uma série de contratempos.

Choques contra bandidos

Uma arma “não-letal” para combater bandidos em fuga, cujo conteúdo do


projétil é gás nitrogênio comprimido. Essa é a Taser, equipamento desenvolvido pela
Taser International e que deve chegar ao Brasil em breve. Ela é chamada de uma
arma “não-letal”, mesmo sob afirmações da Anistia Internacional de que desde 2001
já morreram 330 pessoas morreram pelos efeitos desta arma.
De qualquer modo, a Taser age da seguinte forma: quando seu gatilho é
pressionado ela dispara um cartucho que ao se colidir com outra superfície (no caso
o corpo de alguém) libera o gás nitrogênio, que se expande e gera pressão, permitindo
que eletrodos sejam lançados através de fios condutores ligados à arma.
Por estes fios uma descarga elétrica de 50.000 volts, durante 5 segundos, são
transmitidos para o atingido, afetando seu sistema nervoso central e deixando-o
completamente paralisado por alguns instantes. Em cada disparo, após este período,
caso o atirador continue com o gatilho pressionado os impulsos duram 1,5 segundo.
A arma é alimentada por 8 pilhas AA de 1,2 volts e é por meio destas pilhas e
também de condensadores e transformadores presentes na pistola que ela gera os
50.000 volts de cada disparo. Além disso, as pilhas servem também para fazer
funcionar a memória interna das pistolas que, segundo a fabricante Taser
International, armazenam data e hora dos últimos 585 disparos.
Além disso, outro controle de disparos são confetes (semelhantes aos confetes
de carnaval) liberados pelo cartucho no momento em que ele colide com algo. Como
23
as munições são numeradas, cada uma delas possui seu próprio “número de
identidade” impresso também nos confetes. Desta maneira, bastaria um deles
recolhidos em torno de onde houve o disparo para comprovar qual autoridade foi o
seu autor.

Sorria, o Grande Irmão zela por ti dentro do ônibus

A insegurança existente nas ruas acaba fazendo com as pessoas aceitem


pacificamente a troca de sua privacidade por uma suposta segurança oferecida por
câmeras de vídeos em locais públicos. Se você já estava acostumado a encontrar
aparelhos filmando a todos em praças e esquinas mais movimentadas de grandes
cidades, saiba que os ônibus públicos estão trilhando o mesmo caminho.
Em cidades como Curitiba (PR), Campina Grande (PB) e Rio de Janeiro (RJ)
já é possível encontrar ônibus de grande circulação equipados com câmeras de
segurança. No caso curitibano, a imagem é transmitida diretamente para dentro do
próprio ônibus com o intuito de coibir a ação de bandidos em momentos de lotação.
Estações de metrô, terminais e pontos de ônibus de várias cidades já contam
com equipamentos semelhantes e devem, até certo ponto, inibir pequenos assaltos
nestes locais. Se isso acontece já é um grande ganho para a população. Quem sabe
ainda estejamos um pouco longes do futuro preconizado pelo escritor britânico George
Orwell em 1984, onde as teletelas (televisões gigantes presentes em todas as casas,
que não tinham como ser desligadas) filmavam os cidadãos em tempo integral, mas
cada vez mais equipamentos assim fazem parte de nossa rotina.

INFOSEG e a rede integrada de informação

Em um país de dimensões continentais como o Brasil, uma rede nacional de


segurança pública cujo conteúdo esteja disponível para os vários órgãos de
segurança atuantes no país seria ideal, não é mesmo? Pois é isso mesmo o que
propõe a INFOSEG, um sistema nacional da Secretaria Nacional de Segurança
Pública (SENASP).
Lançada no final de 2004, a rede utiliza a tecnologia da informação e a
comunicação para integrar informações como inquéritos policiais, dados de armas de
24
fogo e processos judiciais, mandatos de prisão, informações sobre condutores de
veículos e sobre veículos, etc. as últimas reformulações da INFOSEG permitiu que
seu conteúdo seja acessado por membros da segurança pública não somente através
do computador, mas também de celulares, palms e viaturas.3

3.2 Sociabilidade, tecnologia da internet e comunicação

No processo histórico contemporâneo, a comunicação é o agente construtor da


realidade, nossa percepção do mundo é uma construção cultural, sendo a
comunicação quem produz e interfere nas percepções. A partir da inserção das
tecnologias informacionais no cotidiano, os indivíduos interagem entre si,
independentemente das distâncias geográficas. Com o surgimento da internet, que é
o mais completo meio de comunicação já concebido pela tecnologia humana, temos
assistido uma reconfiguração das culturas e o nascimento de uma nova estrutura da
sociabilidade contemporânea.
Organizando a informação que conhecemos sobre este tema, e tentando tirar
conclusões destes conhecimentos para propor algumas hipóteses acerca dos
esquemas de sociabilidade que estão a surgir nas nossas sociedades, irei dialogar
com os estudos realizados por Manuel Castells e Pierre Lévy, no sentindo de sintetizar
e interpretar os dados disponíveis acerca da relação entre Internet e a sociedade.
O surgimento da internet como novo meio de comunicação gerou um conflito
acerca do aparecimento de novos padrões de interação social. A partir dessa origem,
o filósofo Pierre Lévy diz que a revolução contemporânea é apenas uma das
dimensões de uma transformação antropológica ampla. Lévy afirma que ainda
estamos na “infância da cibercultura”, e que, para ele, as principais transformações
sociais provocadas pela tecnologia ainda estão por vir. Lévy coloca que a cibercultura
é um movimento que oferece novas formas de comunicação. Como tal, reflete a
“universalidade sem totalidade”, algo novo se comparado aos tempos da oralidade
primária e da escrita. É universal porque promove a interconexão generalizada, mas
comporta a diversidade de sentidos, dissolvendo a totalidade. Em outras palavras: a

3 Extraído do link: www.tecmundo.com.br


25
interconexão mundial de computadores forma a grande rede, mas cada nó dela é fonte
de diversidade de assuntos.

Escolhas e estratégias

A criação e desenvolvimento da internet é uma extraordinária aventura


humana. Mostra a capacidade das pessoas para transcender as regras institucionais,
superar as barreiras burocráticas e subverter os valores estabelecidos no processo
de criação de um novo mundo. Delas resulta o mundo “virtual” e o que hoje chamamos
de cibercultura.
O sociólogo Manuel Castells em seus estudos, diz que a formação de
comunidades virtuais, baseadas principalmente na comunicação online, foi
compreendida com o culminar de conexões transversais e interativas, sendo
individuais ou comunitárias. Ainda para Castells (2006, p.255), “a internet é – e será
ainda mais – o meio de comunicação e de relação essencial sobre o qual se baseia
uma nova forma de sociedade que nós já vivemos”. As redes interativas de
comunicação estruturam uma nova geografia de conexões e sistemas. Castells
centraliza seu estudo na chamada Era da Informação, ou Era Digital, em algumas
questões específicas correspondentes à sociedade conectada de forma global.
O impacto que a internet causou, e ainda causa, sobre os demais meios de
comunicação é significativo. Porque ao menos até o presente, não há centros diretivos
nem comandos decisórios na web. A rede universal da internet possibilita a circulação
instantânea de informações e elimina a centralização e o controle pelo poder político.
Apesar das nossas sociedades terem muitas coisas em comum, são também produto
de diferentes escolhas e identidades históricas. A realidade parece indicar que muitos,
a maioria dos utilizadores sociais da internet, criam suas próprias identidades online
coerentes com as suas identidades off-line. De fato, a crescente diversidade de
modelos de sociabilidade é o que determina a especificidade da evolução social nas
nossas sociedades. As redes constroem-se de acordo com as escolhas e estratégias
de pessoas, grupos ou entidades que se movem na web de acordo com seus valores
e conveniências, consignados em escolhas individuais ou comunitárias. Neste
contexto, a comunicação de valores constrói-se em torno de sistemas de comunicação

26
porque esta é a principal via que estes encontram para chegar àquelas pessoas que
podem partilhar os seus valores, e partir daí, atuar na consciência da sociedade.

Interação entre os participantes


A internet não é apenas uma tecnologia: é um meio de comunicação e constitui
a infraestrutura material de uma forma organizativa concreta: a rede. Logo, mais que
o surgimento de uma sociedade online, presenciamos uma apropriação da internet
por redes sociais. Com isso, uma nova forma de organização comunitária está
surgindo utilizando-se das novas tecnologias: as comunidades virtuais, que são redes
de laços interpessoais que proporcionam sociabilidade, apoio, informação, um senso
de integração e identidade social.
A internet tem, hoje, profunda relação com os movimentos sociais e políticos
do mundo e converteu-se no componente indispensável do tipo de movimentos sociais
que estão a surgir na sociedade em rede. A tecnologia da internet permite expressões
de protestos, mobilização em torno de valores culturais e age para mudar os códigos
de significados nas instituições e na atividade social. Por outro lado, Lévy destaca que
a conexão da humanidade não acarreta igualdade no sentido mais favorável aos
princípios de liberdade e de fraternidade, mas que também é um poder nascido da
capacidade de aprender e de trabalhar de maneira cooperativa num contexto social.
Os movimentos sociais são confrontados com a necessidade de contrariar o
alcance local com o impacto global. A tecnologia da internet permite a estes
movimentos mobilizarem-se na construção da nova sociedade. Com efeito, a Internet
proporciona, em princípio, um canal de comunicação sem centro de comando e,
assim, a interatividade permite aos cidadãos solicitar informação e expressar sua
opinião. Pierre Lévy diz que em vez de existir um centro emissor todo-poderoso como
também afirma Castells, a comunicação na internet emerge da interação entre os
participantes.

O processo de transformação

O papel mais importante da internet na reestruturação das relações sociais é a


sua contribuição para o novo modelo de sociabilidade, baseado no individualismo –
que, a princípio, conduz ao aperfeiçoamento do ser enquanto agente individual desse
27
processo de comunicação. Pierre Lévy diz que a melhor forma de manter e
desenvolver uma coletividade não é mais construir, manter ou ampliar fronteiras, mas
alimentar e melhorar a qualidade das relações em seu próprio seio bem como com
outras coletividades.
O uso da internet potencializava a sociabilidade, tanto à distância como no
ambiente da comunidade local. As pessoas ligam-se e desligam-se da rede, mudam
de interesses, e, além disso, mudam de companheiros on-line quando querem. De
acordo com os estudos de Castells, o conjunto de dados disponíveis não sustenta a
ideia de que a utilização da Internet conduz a uma menor interação e a um maior
isolamento social, mas existem indícios de que, em determinadas circunstâncias, o
seu uso pode agir como substituto de atividades sociais. Lévy diz que essa reconexão
da humanidade é acompanhada de um certo número de “revoluções” de um único
fenômeno de transformação.
A chegada da internet e dos novos meios de comunicação, que são também
novas formas do pensamento coletivo e de acesso ao conhecimento, vão acelerar o
processo de transformação da sociedade. Mas não devemos achar que as coisas vão
acontecer de forma mágica e imediata. Não pela proeza técnica em si, mas porque há
uma relação profunda entre o progresso das formas de comunicação, o progresso da
democracia e de transformação do ser humano.

Ações coletivas

São incontáveis as observações a serem feitas sobre a internet como fator


modificador da sociabilidade. Neste artigo, procuro explanar os principais elementos
da sociedade que têm sofrido considerável mudança a partir da influência da rede. As
novas tecnologias de comunicação têm, como é natural, agido de modo a reconfigurar
os espaços como os conhecemos, bem como a estrutura da sociedade. Os modos de
comunicação alteram-se bruscamente, propagando um volume incalculável de
conteúdo. A própria vida social se encontra imersa numa rotação incessante.
O surgimento da sociedade em rede não pode ser entendido sem a interação
entre essas duas tendências relativamente autônomas: o desenvolvimento de novas
tecnologias da informação e a tentativa da antiga sociedade de readaptar-se com o
uso dessa ferramenta tecnológica. Cabe enfatizar que as relações online estão
28
baseadas em interesses compartilhados do homem, onde ele se agrupa com seus
semelhantes e vai estabelecendo relações. Esses relacionamentos são também
diferenciados: alguns constroem vínculos mais fortes; outros, relações mais
superficiais. O ser humano, portanto, aspiraria à união e ao mesmo tempo, seria contra
ela, oscilaria entre a conexão e a separação, o coletivo e o individual. As redes de
relações pessoais não são nenhuma novidade, pois o formato de rede é
extremamente atrativo para relacionamentos, pois tudo se torna descentralizado,
transparente e autônomo, ao mesmo tempo em que é otimizado em conjunto. A rede
funciona muito bem na manutenção das relações e na intermediação de laços entre
pessoas que não podem se ver pessoalmente com frequência. Além disso, permite o
exercício da solidariedade em várias situações, ameaças, riscos, problemas coletivos
ou individuais.
Na contramão, o surgimento das tecnologias informacionais, principalmente a
internet, aumentou a dificuldade de discutir o tópico de privacidade. Com a internet,
os indivíduos que na época da TV eram apenas receptores de informação passaram
a ser produtores de informação, disseminando-se por meio das tecnologias, que
possibilitam que as informações – dentre elas as que se referem a algo particular dos
indivíduos – ganham amplitude global rapidamente. Tal acesso poderia, também,
constituir um clima de hostilidade entre grupos que possuem interesses distintos,
interesses esses que estariam disponíveis para conhecimento.
As atividades humanas estão ficando, a cada dia, mais dependentes da
tecnologia e, portanto, susceptíveis às suas vulnerabilidades e seus efeitos. É certo
que estamos na “infância da cibercultura” como afirma Lévy, e que as principais
transformações sociais provocadas pela tecnologia ainda estão por vir. Entretanto, há
muito ainda o que pensar no que se refere a todas as questões polêmicas e
importantes que surgiram com o advento da internet. Talvez sejam essas polêmicas
o motivo de conflitos como pontua Manuel Castells: o aparecimento de novos padrões
de interação social que, cada vez mais densa entre os indivíduos realmente contribui
para ações coletivas, transformadoras e democráticas.4

4 Extraído do link: observatoriodaimprensa.com.br


29
3.3 A importância da inovação para a segurança pública

Ultimamente o assunto violência tem sido frequente nos noticiários, mostrando


que são frequentes os assaltos a mão armada, crimes contra a mulher, ao patrimônio
público e privado e em muitas cidades o homicídio é frequente; incluindo os de
agentes da segurança pública.
Devido a este fato, o poder público e a sociedade civil organizada procuram
encontrar soluções inovadoras para a segurança pública, que sejam eficientes para
combater ou evitar a criminalidade. Para amenizar o problema de segurança pública,
é essencial usar a tecnologia como uma ferramenta.
Uma das tecnologias mais usadas frequentemente são as de informação e
comunicação. Essas ferramentas auxiliam o público a ter uma abordagem direta e
dinâmica com as instituições públicas, dando voz aos cidadãos e ajudando o Governo
a aprimorar a segurança pública.
Uma ferramenta tecnológica que vem apresentando bons resultados, é o uso
de redes sociais como forma alertar seus participantes sobre eventos ocorridos
naquela localidade. Embora ainda restrito em pequenas cidades, grupos organizados
procuram manter a informação em tempo real e com isso auxiliando cada vez mais
autoridades locais que acompanham o grupo com viés de monitoramento. Os
resultados são práticos e eficientes.

3.4 Inovações tecnológicas a favor da segurança pública

O uso de dispositivos móveis, tal como câmera de vídeo, feita pelos cidadãos,
são fundamentais para aumentar ainda mais a relação da população com os órgãos
públicos, devido ao acesso à internet e contribui para o empoderamento da sociedade.
Um dos modelos de inovações para a segurança pública, são os aplicativos de
smartphones que são desenvolvidos com o objetivo de melhorar a comunicação entre
o cidadão e os órgãos governamentais para gerar um melhor atendimento à
população.
Já a algum tempo a polícia europeia e norte-americana, repensou as suas
atribuições como a formação e o planejamento de suas estratégias de acordo com o
relacionamento com as comunidades.
30
Essa mudança aconteceu não apenas pelo fracasso dos modelos que eram
adotados anteriormente e considerados reativos, mas também pelas descobertas
científicas e muitas evidências sobre o assunto, como o sistema chamado de polícia
comunitária, com a finalidade de mapear o crime e a violência.
Isso é possível aliando os recursos tecnológicos que permitem uma boa
evolução para a segurança pública com novas técnicas de controle, investigação e
perícia contra o crime, como por exemplo o uso de câmeras em espaços públicos,
softwares de reconhecimento visual e voz, satélites para rastreamento e utilizando o
DNA como produção de provas, entre outros.
No Brasil alguns dos recursos e técnicas falados acima, estão sendo
empregados pela polícia, ainda que de forma parcial e/ou como projeto-piloto. O nosso
país está reconhecendo que inovações tecnológicas na segurança pública são
importantes e a implementação desta inovação está acontecendo pela comprovação
dos seus benefícios, e também pelo entendimento de que a mudança na segurança
pública é necessária.
Atualmente existe uma série de inovações práticas para a segurança pública
na prevenção e redução de violência na América Latina, que são implementadas pelo
governo e cidadãos, com o objetivo de diminuir ou acabar com a violência ligada ao
crime organizado e a gangues envolvidas com narcóticos.
Essas inovações são feitas através de estudos na América Latina e em outras
regiões da África (África do Sul e Quênia), da Ásia (Singapura e Tailândia) e do Oriente
Médio, que comprovam que as novas tecnologias de informação e comunicação,
através dos dispositivos móveis, as câmaras de vídeo e o fácil acesso à internet, são
utilizadas para dar voz a cidadãos e aprimorar a segurança pública.
O uso da tecnologia como aliada da segurança da população no Brasil ainda
precisa crescer, mas existe um grande avanço no desenvolvimento do combate à
violência e na parceria entre sociedade e os órgãos públicos para atender a
necessidade da população, e lutar por uma sociedade organizada e segura.
Podemos concluir que as inovações tecnológicas auxiliam a promover a
segurança pública, pois há um grande desenvolvimento da parceria entre a sociedade
e órgãos públicos em diversos países devido aos estudos que comprovam este fato.5

5 Extraído do link: tecnocopa.com.br


31
3.5 A importância da inovação para a segurança pública

Nos últimos tempos, infelizmente, o assunto violência não tem saído dos
noticiários. Dia após dia, as estatísticas mostram que são crescentes os casos de
assaltos a mão armada, crimes contra a mulher e contra os patrimônios públicos e
privados e, em grande parte das cidades, é crescente o número de homicídios.
Neste contexto, não faltam discussões entre os poderes públicos e a sociedade
civil organizada para encontrar soluções que se mostrem eficientes para combater a
criminalidade. Entre elas, está a importância do uso da tecnologia como uma das
ferramentas essenciais para amenizar este problema.
De acordo com o sócio fundador da Mooh Tech, Everton Cruz, cada vez mais,
os três níveis de governos no Brasil e a sociedade civil vêm buscando maneiras de
aproveitar a revolução digital a fim de desenvolver abordagens inovadoras e
dinâmicas para resolver esta questão. “E as novas Tecnologias de Informação e
Comunicação (TICs) têm sido utilizadas para dar voz aos cidadãos e aprimorar as
práticas das instituições”, complementa.
Segundo Cruz, entre as novas TICs estão os dispositivos móveis, como, por
exemplo, as câmeras de vídeo e os tão conhecidos smartphones. E, sem deixar de
considerar, claro, o devido acesso à internet. “As TICs têm sido fundamentais para
estreitar ainda mais a relação entre a população e os órgãos governamentais. Elas
também têm contribuído para o empoderamento da sociedade civil em locais onde o
poder público está distante dos cidadãos”, diz.

INOVAÇÕES

Entre as iniciativas que contam com a participação efetiva dessas tecnologias


estão o uso de aplicativos como o Sempre Alerta, criado pela empresa pernambucana
Mooh Tech. “Ele foi desenvolvido como um instrumento cujo objetivo é, ao utilizar a
tecnologia, melhorar a comunicação, gerando um melhor atendimento à população.
Assim, quando alguém faz alguma denúncia por meio dele, estará ajudando a reduzir
a violência”, explica Cruz, também idealizador da ferramenta.
Para ele, a participação da população é decisiva na captura e na disseminação
das informações. “Inovações como o Sempre Alerta promovem o envolvimento dos
32
usuários na revolução digital e auxilia o poder público em diversas frentes como a
filtragem, a análise e a interpretação dos dados. A partir disso, se tornará possível
distribuir os recursos destinados à segurança de forma mais assertiva e planejada,
além de mensurar os resultados mais eficazmente”, afirma.
“Como podemos perceber, os avanços tecnológicos estão mudando a
arquitetura das relações entre os poderes públicos e a sociedade como um todo.
Contudo, ainda é preciso que grande parte da população esteja envolvida com as
evoluções do mundo digital, incentivando, assim, a cultura da denúncia. Dessa forma,
os cidadãos, igualmente afetados pelo aumento da violência em todo o mundo,
poderão se sentir um pouco mais conscientes do seu papel na sociedade”, finaliza
Everton Cruz.6

4 TÉCNICAS E PROCEDIMENTOS POLICIAIS E DE SEGURANÇA PÚBLICA

4.1 Técnicas e tecnologias não-letais na atuação das forças de segurança

Observando a atuação policial, nota-se que durante o passar dos tempos a


violação aos mais diversos tipos de direitos fundamentais é nítida, tendo surgido,
como um meio de atenuar as tecnologias não letais, objeto deste estudo.
Toda vez que se inicia uma rebelião em presídio, lembra-se do lamentável fato
ocorrido no ano de 1992, no antigo complexo penitenciário do Carandiru, onde uma
briga de presos no Pavilhão 9 que inicialmente parecia ser apenas mais um tumulto
no local, tomou caminhos desastrosos e após uma intervenção policial o saldo foi de
mais de 100 mortes, episódio que ficou conhecido como “O Massacre do Carandiru”.
Diante deste fato, e de tantos outros, onde a obrigatoriedade do uso da força
pelo Estado, para conter algum tipo de distúrbio em unidade prisional, acabou em
morte de detentos, a sociedade civil e os organismos de proteção aos direitos
humanos, cobraram uma resposta quanto à verdadeira necessidade da utilização de
armamentos letais para o combate a este tipo de intempérie, começando a surgir
então, constantemente à utilização das tecnologias não letais, que vem se
aperfeiçoando cada vez ao longo dos últimos anos.

6 Extraído do link: www.techdicas.net.br


33
Cabe destacar aqui que cada vez mais tem se atido a questão de como
estabelecer parâmetros acerca da utilização de armas pelas policias, e sabiamente a
Organização das Nações Unidas – ONU elaborou um documento denominado
Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo (P.B.U.F.A.F.) elaborado
no Oitavo Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento
dos Infratores, realizado em Havana, Cuba, de 27 de agosto a 7 de setembro de 1990,
vejamos:

Fonte:fbsp.memoriaseguranca.org.br

“[...] os policiais, no exercício das suas funções, devem, na medida do possível,


recorrer a meios não violentos antes de utilizarem a força ou armas de fogo. Só
poderão recorrer à força ou a armas de fogo se outros meios se mostrarem ineficazes
ou não permitirem alcançar o resultado desejado. Paralelamente instrumentos de
controle das polícias são instituídos, a exemplo de ouvidorias, julgamentos de policiais
militares em tribunais civis, cursos de direitos humanos, empregos de armas não letais
e reformas curriculares”. Disponível em www.forumseguranca.org.br/artigos/uso-nao-
letal-da-forca-na-acao-policial, acessado em 30/06/2010.
Destaquemos que mesmo não se tratando de um tratado, o documento
elaborado no oitavo congresso da ONU em Havana tem como escopo principal
fornecer normas orientadoras aos Estados-membros na tarefa de assegurar e
34
promover o papel adequado dos encarregados da aplicação da lei, reconhecendo a
importância e a complexidade do trabalho destes, frisando seu papel importante na
preservação da vida.
Observemos assim, que antes de usar a arma de fogo, o policial ou o agente
do presídio, conforme o caso deverá dispor de todos os outros meios que estiverem
ao seu alcance, inclusive utilizando as tecnologias não-letais e somente se estes se
mostrarem ineficazes é que poderá fazer uso da arma de fogo.
Podemos dizer então que o principal fator da substituição das armas letais por
equipamentos de técnicas e tecnologias não-letais é o fato de se buscar uma
conscientização entre os profissionais da Segurança Pública em geral,
especificamente aqui o agente de presídio, de que a utilização de outros mecanismos
para conter as intempéries do dia a dia desta profissão é tão eficaz quanto à utilização
das armas letais, mas possui uma diferença essencial, prioriza a preservação do bem
maior, a vida!

No decurso do tempo, as civilizações procuraram criar meios para a proteção


e defesa de seus direitos, sendo criadas então diversas instituições, são as forças de
segurança pública, tendo como objetivo a proteção e garantia dos direitos individuais
e coletivos.
De plano, para refletirmos um pouco sobre a função das forças de segurança
estatal, mister se faz mencionar aqui alguns autores citados por Wilquerson Felizardo
Sandes, em seu artigo Uso não-letal da força na ação policial: formação, tecnologia e
intervenção governamental, vejamos:
Segundo Elias (1994), a necessidade de uma sociedade constituir instrumentos
de controle para sua proteção conduz à construção de um monopólio de força,
centrado na figura do Estado. Este, através de seus agentes, regula a conduta social
de maneira uniforme e estável em espaços pacificados, que normalmente estão livres
de atos de violência. Ao mesmo tempo em que o Estado protege o indivíduo, força-o
a reprimir em si qualquer impulso emocional para cometer violência contra outras
pessoas. Na perspectiva de Foucault (1991), a sociedade recorre a uma série de
instrumentos de controle social para adestrar o indivíduo, tornando-o submisso e
controlável – “corpos dóceis”. Para evitar atitudes inconvenientes no sistema, cada
corpo é classificado e controlado em locais heterogêneos, como colégios e
35
organizações, recebendo uma localização funcional, um cadastro, e tarefas
específicas. O controle da atividade do indivíduo é realizado através de horários,
ritmos, programas, atitudes e gestos. Em qualquer sociedade o corpo está preso ao
interior de poderes que lhe impõem limitações, proibições e obrigações, por uma série
de recursos disciplinadores, como vigilância, coerção e controle.
Observando os dizeres de Foucault, percebemos que a área prisional é
exatamente isso, ou seja, temos o controle do indivíduo realizado através de horários,
ritmos, programas, atitudes e gestos, ocorrendo alguns casos em que certos seres
tendem a desrespeitar estas normas, momento então que a força policial do Estado,
nesse caso os agentes de presídios, terão que atuar para manter a ordem e disciplina
do local.
Na atuação destes agentes, por diversas vezes a força terá que ser utilizada,
sendo que em tempos remotos, em casos extremos, as tropas de choque eram
acionadas para intervir de posse de armas letais, sujeitando à ação a ocorrência de
muitas baixas de vidas humanas.
Notemos que estamos regidos por um Estado Democrático de Direito, garantido
por nossa Constituição Federal de 1988, tendo a atuação das forças policiais sido
regulada pelo artigo 144 da mesma, onde temos que a Segurança Pública é direito de
todos e dever do Estado, vejamos:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de
todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal;

III - polícia ferroviária federal;

IV - policias civis;

V - policias militares e corpos de bombeiros militares.

36
Temos então elencados aí os integrantes das Forças de Segurança Pública, e
mesmo não estando elencado expressamente, o agente de presídio tão é um
colaborador desta, exercendo de fato uma atividade policial no desenvolver de suas
atribuições diárias, coibindo as ações de organizações criminosas e combatendo os
tumultos diários das unidades prisionais.
Ressaltemos que o termo polícia abrange ainda uma vasta gama de atividades
estatais, conforme De Freitas, 1987, vejamos:
Segundo De Freitas (1987), o termo polícia abrange a atividade estatal voltada
para a defesa dos interesses da coletividade concernentes à tranquilidade, segurança
e salubridade pública. É o poder assegurado por lei ao Estado para defesa do
interesse coletivo, condicionando ou restringindo o uso e gozo de direitos individuais
que afetem o bem-estar social em um sentido mais amplo. No Brasil, a expressão
Poder de Polícia teve seu primeiro conceito no Código Tributário Nacional.
Temos então, a efetivação de mais uma força para auxiliar as forças de
segurança, os agentes de presídio, que passaram a ser responsáveis pelas ações de
contenção imediata destes tumultos, sendo, no entanto, capacitados desde o início
para terem suas atuações voltadas para o uso das tecnologias não-letais, visto que
seu contato é muito direito com multidões em tumulto e a utilização de forças letais
poderia ter resultados catastróficos.

4.2 A atividade do agente prisional e o uso da força não-letal

A atividade do agente de presídio, e o consequente uso da força têm amparo


legal, sendo que esta deverá ser usada para manter o controle social e garantir as
medidas imperativas da administração, vejamos os dizeres de Wilquerson Felizardo
Sandes, in verbis:
Ao policial é atribuído o poder de polícia, legitimado pelo Estado para manter o
controle social. Este poder é a imposição coativa das medidas adotadas pela
administração do Estado, sendo ato imperativo e obrigatório ao seu destinatário, e
quando este opõe resistência, admite-se até o uso da força pública para o seu
cumprimento, inclusive aplicando as medidas punitivas que a lei indique. O poder não
é ilimitado, suas barreiras e limites são, entre outros, os direitos dos cidadãos no
regime democrático, as prerrogativas individuais e as liberdades públicas garantidas
37
pela Constituição. O poder de polícia deixa de ser exercido com legalidade quando
ultrapassa os limites impostos pela lei, tornando-se uma arbitrariedade (Lazzarini,
2001).
Estando amparado para o uso da força quando necessário, o agente utilizando
o poder de polícia estatal coíbe diversas afrontas ao patrimônio público causadas
pelos internos e ainda garante a cumprimento das normas da unidade, devendo cuidar
para o exercício não ser realizado fora da legalidade, tornando-se nestes casos uma
arbitrariedade.
Com o exercício dentro da legalidade, as operações penitenciárias realizadas
por estes servidores, buscam a efetiva solução do problema, e para isso os meios
utilizados atualmente são as técnicas e tecnologias não-letais, com o emprego de
diversos materiais como munições de borracha e granadas de gás de pimenta e
lacrimogêneo, além de espargidores de pimenta.
Observemos que muitos estudiosos humanistas têm criticado a utilização
destes materiais, por acharem que estes meios ferem de alguma maneira a dignidade
dos internos, no entanto, o que deve ser ressaltado é que estes materiais são
utilizados por profissionais capacitados e treinados para este uso, sendo que a
utilização ocorre ainda para conter situações que estão fugindo da normalidade e
infringindo a normas da unidade.
Observemos que a utilização dos materiais não-letais é realizada exatamente
com o fim de preservar a vida daquele contra quem a ação será direcionada, tendo
em vista que são meios escalonados e proporcionais e se utilizados dentro das
recomendações são não-letais.
Destaquemos que a ONU também se pronunciou acerca dos meios de atuação
dos funcionários encarregados pelo cumprimento da legislação, vejamos o que a
Resolução nº 36/169 destaca, citada por Wilquerson Felizardo Sandes, em seu artigo:
Em 1979, a Resolução 36/169, da ONU, instituiu o Código de Conduta para
Funcionários Encarregados de Fazer Cumprir a Lei. Esta resolução recomenda o
respeito aos direitos humanos e a garantia das liberdades fundamentais de todos os
cidadãos. Em destaque: Artigo 1 – Os funcionários encarregados de fazer cumprir a
lei deverão cumprir em todo momento os deveres que lhes impõem a lei, servindo a
sua comunidade e protegendo a todas as pessoas contra atos ilegais, em consonância
com o alto grau de responsabilidade exigido por sua profissão; Artigo 2 – No
38
desempenho de suas tarefas, os funcionários encarregados de fazer cumprir a lei
devem respeitar e proteger a dignidade humana e manter e defender os direitos
humanos de todas as pessoas; Artigo 3 – Os funcionários encarregados de fazer
cumprir a lei poderão usar a força apenas quando estritamente necessário e na
medida em que seja exigida para o desempenho de suas tarefas. [...] (CEPIA, 2001).
Desta forma, a preocupação com os direitos humanos e com a garantia da
dignidade humana sempre é ressaltada, e qual garantia maior a ser preservada? A
vida. Razão esta que se desenvolvem atualmente as técnicas e tecnologias não-letais,
ultimamente é o que se tem de mais eficaz para a contenção de tumultos, com os
melhores resultados, pois temos a efetivação do resultado com a preservação máxima
deste bem maior.
Observemos ainda que a utilização de qualquer meio de contenção passará
por uma escala de proporcionalidade, sendo usado de maneira progressiva, iniciando
sempre com uma verbalização para a tentativa do controle da situação, passando por
diversas outras etapas como imobilizações quando possível, chegando à utilização da
tecnologia não-letal, que certamente será capaz de solucionar o problema.
Segundo Costa e Sandes (2006), os níveis de força podem ser descritos como:
na “verbalização” ocorre diálogo; o policial interpela o cidadão em conduta
inconveniente, buscando a mudança de atitude, a fim de evitar o aforamento de
infração. A mudança de comportamento encerra a ação do policial; o “contato físico”
ocorre em caso de a verbalização não surtir o efeito desejado diante de uma conduta
inconveniente, Como medida de cautela e demonstração de força para desencorajar
a ação, o policial verbaliza realizando contato físico (toque no ombro). A mudança de
comportamento encerra a ação do policial; a “imobilização” ocorre em caso de
resistência física ao se efetuar uma condução coercitiva, caracterizada geralmente
pela recusa no cumprimento de ordem legal, agressão não física ou tentativa de fuga;
a “força não-letal” é empregada em caso de resistência ativa ao se efetuar uma
condução coercitiva, caracterizada geralmente pela agressão física contra o policial
ou terceiros. É admissível que o policial empregue força física, sempre sem violência
arbitrária ou abuso de poder. A verbalização deve ser mantida sempre no sentido de
desencorajar o comportamento do agressor; a “força letal” só se justifica no caso de
legítima defesa e no estrito cumprimento do dever legal em inevitável risco de vida do

39
policial ou de terceiros, diante de uma ação deliberada do infrator. A verbalização deve
ser mantida sempre no sentido de desencorajar o comportamento do agressor.
Temos daí que a utilização das forças não-letais passa ainda por um sistema
de uso progressivo, até chegar a seu uso, fato este que preserva de maneira efetiva
os princípios constitucionais e as garantias legais do cidadão.
Enfim, podemos observar então que a tendência é a adoção da força não-letal,
sendo usada não somente para contenção de rebeliões em presídios, mas em
diversas outras situações como as que envolvem suspeitos armados, controle de
manifestações, suspeitos entrincheirados, sendo adotado pelas policias dos mais
diversos países.
Cumpre mencionar aqui rapidamente os dizeres de Alexander (2003),
mencionado por Wilquerson Felizardo Sandes, que endossa o fato de que as
tecnologias não-letais são utilizadas pelas mais diversas policias e ainda demonstra e
explica alguns tipos de equipamentos desta ramificação, vejamos:
(...) armas não-letais já são usadas por órgãos policiais de vários países,
principalmente em situações envolvendo: suspeitos armados; controle de
manifestações; rebeliões prisionais; suspeitos entrincheirados; prisões de alto risco;
libertação de reféns; combate às drogas; e também “suicídio-via-policial”, quando o
suspeito deseja morrer, mas quer que isso aconteça pelas mãos do policial. Conforme
o autor, existem várias opções em conceitos e aplicações tecnológicas em armas não-
letais: o “laser atordoante” utiliza luzes brilhantes que ofuscam a visão
temporariamente na direção geral do laser iluminado. A aplicação original visa
perturbar e desorientar suspeitos há cerca de 17 metros. O equipamento ainda está
restrito ao uso militar; o “feixe de energia direcionada” atua por ondas que causam dor
no suspeito. O uso é muito polêmico devido ao fato de feixe de radiofrequência causar
o aquecimento da área em exposição; a “arma eletrônica de atordoamento (Taser)”,
projetada em 1960 e empregada pelo Departamento de Polícia de Los Angeles desde
1980, incapacita pelo descontrole eletromuscular, por meio de lançamento de dardos
conectados à facão da arma de ar comprimido. Esta arma é utilizada em vários
departamentos de polícia. Um microchip registra todas as ocasiões em que a arma é
testada ou disparada, evitando, assim, o uso criminoso; os “lançadores de bean bag
(saco de feijão) ” utilizam armas com calibre 12, que disparam pequenos pacotes de
malha com carga de projeção dentro. Possui baixa energia cinética que tende a causar
40
ferimento não-letal; os “sistemas pepperball” são armas de gás comprimido que
arremessam projéteis fragmentáveis de plástico, do tamanho de uma bola de gude,
carregados de gás de pimenta, atingindo o alvo até dez metros. Além do impacto de
baixa energia cinética, libera pó químico que produz uma pequena nuvem de poeira
fortemente irritante (ALEXANDER, 2005); Os “Sistemas Acústicos” visam assustar,
irritar e surpreender um sujeito-alvo provocando alguma dor no sistema auditivo e
causando vibração física. As frequências operam em infrassom, som audível e
ultrassom. Conforme Alexander, as armas não-letais não têm o papel de substituir
totalmente as armas letais, mas sua principal finalidade é permitir o uso da força em
uma escalada sem produzir mortes. Não deve restar dúvida na mente do agressor
sobre a existência de força suficiente para cumprir a missão que a situação exigir. Um
contraponto em relação ao emprego de armas não-letais surge do argumento de que
tais equipamentos podem ser letais ou usados para tortura, o que talvez não tenha
relação com o instrumento, mas sim com despreparo para o uso e a intenção de
emprego. O fato de equipamentos serem mal-empregados não é razão suficiente para
bani-los. Uma solução para controlar o uso criminoso da força constitui-se no
treinamento constante e na supervisão adequada. No Brasil, o Ministério da Justiça
lançou o Programa Nacional de Segurança com Cidadania (Pronasci), que, entre as
diversas ações, prevê, a partir de 2008, três milhões de reais para capacitação de 600
policiais em tecnologias não-letais em um período de quatro anos. Talvez a iniciativa
tenha contribuição do seminário internacional de armas não-letais ocorrido no Brasil
em 2006, com um amplo debate sobre o tema e consolidação de propostas. Esta
temática já está sendo objeto dos cursos de educação à distância do Ministério da
Justiça via Secretaria Nacional de Segurança Pública. A abordagem sobre o assunto
continua sendo apenas em ações sócio educativas. Recursos também precisam ser
destinados para a construção de uma política sobre o uso da força e desenvolvimento
de produtos e serviços inovadores, em parceria com outras áreas científicas.
Por fim, observamos então que as tecnologias não-letais estão substituindo o
uso das armas letais nas atuações penitenciárias e nas atuações das policias do Brasil
e do mundo, dando-se isto pelo fato de que a aplicação destes objetos tem sido muito
eficaz na solução dos conflitos, principalmente na área penitenciária onde temos que
atualmente quase todas, senão todas, as forças penitenciárias brasileira utilizam desta
tecnologia na contenção dos tumultos diários entre os internos, tendo como fim
41
principal a preservação da dignidade dos mesmos e acima de tudo a manutenção da
vida destes, garantindo ainda a ordem e a disciplina na unidade prisional.7

4.3 Polícia e cidadania

A Declaração Universal dos Direitos Humanos não faz diferença de cidadãos,


fica claro que todas as pessoas são iguais em direitos e deveres e veda qualquer
forma de distinção. O profissional de segurança assim como qualquer cidadão possui
direitos e obrigações, no entanto, a ele se atribui o solene dever de figurar como
agente promotor de Direitos Humanos. Os agentes de segurança possuem o poder
de representar o Estado e se tornam, por isso, talvez, a classe de trabalhadores com
mais notoriedade em sua atuação.
Dessa forma, é necessário que se invista, vigilantemente, nas ações policiais
esperando dos agentes uma atuação pautada sempre no estrito cumprimento da lei,
já que atuam para garanti-la. É importante cobrar profissionalismo nas ações.
Em sua atuação vigilante, a população deve reconhecer que o policial também
é um cidadão com deveres, obrigações e direitos. Já o policial deve sentir-se inserido
e participante dessa sociedade na mesma medida da cidadã o comum. A partir da
Revolução Francesa cidadania se tornou sinônimo de igualdade, o que significa que
independente da profissão exercida, a pessoa não perde seu status de cidadão
perante a sociedade.
Não há diferenças entre sociedade civil e sociedade policial, essa nem mesmo
existe. O agente de segurança detém uma responsabilidade ímpar frente à
população, já que a sociedade deposita confiança naquele diante da insegurança que
se vive atualmente. É a representação mais intima do Estado que a nação possui; é a
sua frente de atuação, nela se deposita todas as frustrações e esperanças no governo.
Espera-se muito do agir policial, porquanto a missão é nobre. Entretanto, a
sociedade muda o discurso a toda hora. A polícia se vê perdida nos anseios da
população, que em determinado momento deseja que o agente de segurança seja
polido em suas ações, já em outras situações pede que a polícia seja uma instituição
de vingança social, fazendo justiça com as próprias mãos como acontecia nos

7 Extraído do link: www.direitonet.com.br


42
primórdios da humanidade. As pessoas estão aterrorizadas pela violência que assola
o país. Vive-se o clima de guerra urbana que gera insegurança. O policial não se
deve levar por anseios ilegítimos que possam desprestigiar seu trabalho. A sociedade
que deseja ações desmedidas por parte do agente será a mesma que proporcionará
a ele o repúdio quando atender aos seus próprios anseios primitivos.
O uso da força é apenas uma das características da atividade policial, ela não
pode resumir o agir policial como um todo. Suas atribuições e responsabilidades vão
além, nem sempre é escolha do profissional o uso dessa prerrogativa para executar
suas tarefas.
Como defende Balestreri (1998), o policial é um pedagogo de cidadania, ele
deve ser incluído no rol dos profissionais pedagógicos, ao lado das profissões
consideradas formadoras de opinião. Dessa forma, o agente de segurança é um
educador, o qual educa por meio de suas atitudes ao de lidar com situações
cotidianas. O policial educador transmite cidadania, a partir de exemplos de conduta;
de comportamentos baseados em moderação e bom senso.
O agente de segurança pública não pode mais ser visto, nos dias de hoje, como
agente de repressão a mando do Estado. A Constituição Federal de 88, em seu artigo
144, declara que a segurança pública é exercida pelas polícias e que suas atribuições
são a preservação da ordem pública, a incolumidade das pessoas e do patrimônio.
Visto desse modo, a atividade de polícia consiste em desempenhar funções
policiais, e ao mesmo tempo proteger os direitos humanos. Violar os direitos humanos,
desrespeitar as normas legais como propósito de aplicar a lei não é considerado uma
prática policial eficiente – apesar de algumas vezes se atingirem os resultados
desejados. Quando a polícia viola a lei com o intuito de aplicá-la, não está reduzindo
a criminalidade, está se somando a ela.
Espera-se dos agentes de segurança o vigor necessário no desenvolvimento
de suas atividades, porém que haja preocupação em agir no estrito cumprimento da
lei. É necessária a admiração da sociedade por essa classe de trabalhadores. O
policial não é inimigo da população, deve ser visto como agente promotor de direitos
humanos, sobretudo, de cidadania.

43
4.4 Polícia comunitária

O policiamento comunitário baseia-se em uma concepção de cooperação entre


agentes de segurança e a população, delimitando estratégias as quais aproximem
esses dois atores no intuito de juntos resolverem os problemas de insegurança. Nas
palavras de Skolnick e Bayley (2006, p.69) “Este conceito de uma cooperação maior
entre a polícia e a comunidade é o que tem sido considerado, em todo o mundo, como
sendo “policiamento comunitário”.
Para que se efetive a polícia comunitária é preciso firmar parceria entre a
comunidade e instituição policial. Unidas devem buscar soluções para os problemas
que geram violência na comunidade. Marceneiro e Pacheco (2005, p.84) alertam que
“é preciso comprometimento de ambas as partes na solução dos problemas, na busca
da melhoria da qualidade de vida da comunidade”. A polícia não deve apenas ser
ouvinte dos problemas da sociedade e essa não deve apenas transmitir aqueles seios
anseios. Para que seja eficiente e eficaz o modelo comunitário é preciso que as duas
sejam parceiras atuantes na resolução dos problemas identificados na localidade que
estão inseridas.
O policiamento comunitário baseia seu objetivo principal em atribuir a
sociedade parcela de responsabilização na prevenção ao crime. Incluir a comunidade
na solução de seus problemas locais e pedir a ela que explane suas opiniões e, além
disso, fazer com que ela trabalhe para prevenir o crime e diminuir suas mazelas
sociais é função e objetivo maior da polícia que trabalha com o programa de
policiamento comunitário. A partir daí, pode-se formular o pensamento de que
policiamento comunitário é expressão máxima de valorização de direitos humanos, é
interiorizar no íntimo policial a ideia de profissional pedagogo de cidadania e promotor
de direitos humanos.
Aumentar a responsabilização da polícia implica em se abrir às críticas da
população, porquanto terá que ouvi-la e saber que nem sempre é agradável o que ela
irá dizer. Quando o cidadão diz a polícia sua impressão a respeito do trabalho de seus
profissionais e essa se preocupa, gera a cumplicidade de que a instituição
necessita para a efetividade do policiamento comunitário e seu objetivo maior de
prevenção do crime.

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Se o profissional de segurança não conhece a comunidade à qual está
servindo, e senão conhece, principalmente, seus problemas, não atenderá aos
princípios do programa comunitário. Os Conselhos Comunitários de Segurança
funcionam com esse intuito, a comunidade se reúne com representantes da polícia
para explanar suas opiniões a respeito do trabalho policial e ajudar a polícia em
soluções para os problemas do bairro. Observa-se valorização da dignidade humana,
efetivação de cidadania e expressão democrática.
As comunidades compõem-se cada uma em sua complexidade, o
policiamento comunitário leva em consideração essas questões e acredita que modelo
de patrulhamento deve ser adaptado as necessidades de cada localidade. A proposta
de descentralização do comando leva em consideração as diferenças que
cada comunidade possui. Assim o comandante subordinado que tem liberdade
para coordenar de acordo com as prioridades que lhes são apresentadas poderá
adaptar de melhor forma o programa comunitário da área na qual atua.
A efetiva ação está no dia a dia, conhecendo as dificuldades e problemas da
comunidade, diferente do comando centralizado que se mantém distante e,
consequentemente, o atendimento se torna insuficiente. Assim Skolnick; Bayley
declaram que “a descentralização do comando é necessária para ser aproveitada a
vantagem que traz o conhecimento particular, obtido e alimentado pelo maior
envolvimento da polícia na comunidade”.
Resumidamente, polícia comunitária é a filosofia teórica de estudar o problema
e buscar soluções junto à comunidade; policiamento comunitário é a filosofia em ação
de buscar soluções para prevenir o problema antes que aconteça, também com apoio
da comunidade.
Polícia comunitária é uma filosofia nova no Brasil. A implantação do programa
busca resgatar a tão manchada história das forças de segurança no país, que por
erros do passado e também recorrentes nos dias de hoje prejudicou o contato com o
cidadão. Pelo fato de em outros países a iniciativa ter tido sucesso, o Brasil adotou a
implantação em todas as polícias do país. No Distrito Federal os Postos Comunitários
são a expressão mais latente de policiamento comunitário, entre outras iniciativas da
polícia como, teatro nas escolas e incentivo a esportes nas regiões mais pobres e
violentas da capital.

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A relação entre polícia e direitos humanos está centrada nas noções de
proteção e respeito, e pode ser uma relação muito positiva. De fato, é função da polícia
a proteção dos direitos humanos. Tal proteção se faz de maneira genérica, mantendo
a ordem social, de modo que todos os direitos humanos, de todas as categorias
possam ser gozados. Quando há uma quebra na ordem social, a capacidade e
habilidade do Estado em promover e proteger os direitos humanos são
consideravelmente diminuídos ou destruídos. Ainda, é parcialmente por meio da
atividade policial que o Estado atinge suas obrigações legais de proteger alguns
direitos humanos específicos – o direito à vida, por exemplo.
Dentre as profissões públicas pode-se dizer que a polícia é uma das que possui
maior responsabilidade em relação à imagem do Estado. É necessário que os agentes
públicos de segurança resgatem os anos perdidos de autoritarismo e
distanciamento da sociedade brasileira. A história da origem policial no Brasil explica
o porquê de seus traços de violência.
Tendo em vista esse histórico, cada policial ao entrar na corporação deve estar
consciente de que a polícia não é mais a mesma, agora mais que nunca; deve-se
fortalecer o sentido de fazer de sua missão um ato nobre. Policiais devem respeitar
os direitos humanos no desenvolvimento de suas atividades profissionais. Em outras
palavras, considerando que é função da polícia a proteção dos direitos humanos, o
requisito de respeito a esses direitos afeta diretamente o modo como a polícia
desempenha todas as suas funções.
Diante dos anos que macularam a imagem policial as instituições de
segurança pública e as políticas governamentais acenam para mudança nas diretrizes
de policiamento em todo Brasil, seguindo assim uma tendência mundial. Os cursos
de integração das normas de direitos humanos na atividade policial são de extrema
importância, pois conscientiza o profissional policial de que o poder a ele atribuído
deve ser utilizado sempre em benefício da sociedade.
Quanto ao programa de policiamento comunitário, sua efetivação
depende do entendimento de que a ideia é que haja a participação da comunidade
nas formulações, implementações e avaliações das políticas de segurança pública e
estratégias de policiamento. A instalação de cada Posto Comunitário de Segurança
pode tornar-se um instrumento avançado entre o relacionamento da Polícia Militar e
comunidade na redução dos índices de criminalidade, no aumento da confiança dos
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serviços prestados, maior eficácia nas ações e adoção de estilo de gerenciamento
participativo.
Diante do exposto conclui-se que a formação dos profissionais da Segurança
Pública é fundamental para a qualificação das polícias brasileiras e o ensino dos
Direitos Humanos no Curso de Formação de policiais é uma alternativa que se
apresenta adequada, uma vez que propicia a percepção dos policiais como sujeitos e
defensores dos Direitos Humanos garantindo a efetiva aplicabilidade do conhecimento
desenvolvido na prática policial.8

8 Extraído do link: www.apcn.org.br


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