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Inteligência Policial

Brasília-DF.
Elaboração

Maurício Viegas Pinto

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................. 5

ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA..................................................................... 6

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 8

UNIDADE I
FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL..................................................................... 11

CAPÍTULO 1
CONCEITO E SEGMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL ..................................... 11

CAPÍTULO 2
A LINGUAGEM EMPREGADA PELA INTELIGÊNCIA POLICIAL E O CONHECIMENTO DE
INTELIGÊNCIA POLICIAL .......................................................................................................... 14

CAPÍTULO 3
OS DIFERENTES TIPOS DE CONHECIMENTO PRODUZIDOS PELA INTELIGÊNCIA POLICIAL............ 19

CAPÍTULO 4
AS FONTES DE DADOS .......................................................................................................... 22

CAPÍTULO 5
PRINCÍPIOS E CARACTERÍSTICAS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL ............................ 25

UNIDADE II
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL........................................................... 28

CAPÍTULO 1
SITUAÇÕES QUE ENSEJAM A PRODUÇÃO DE UM CONHECIMENTO DE INTELIGÊNCIA POLICIAL . 28

CAPÍTULO 2
METODOLOGIA DA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO DE INTELIGÊNCIA POLICIAL................... 31

CAPÍTULO 3
TÉCNICA DE AVALIAÇÃO DE DADOS ..................................................................................... 41

CAPÍTULO 4
O RELATÓRIO DE INTELIGÊNCIA POLICIAL .............................................................................. 44
UNIDADE III
CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL........................................................................................................... 47

CAPÍTULO 1
CONCEITO DE CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL E ASPECTOS LEGAIS ...................................... 49

CAPÍTULO 2
RAMOS DA CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL: A SEGURANÇA ORGÂNICA ............................... 53

CAPÍTULO 3
CONTRAENGENHARIA SOCIAL .............................................................................................. 59

PARA (NÃO) FINALIZAR...................................................................................................................... 62

REFERÊNCIAS................................................................................................................................... 63
Apresentação
Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem
necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela
atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade
de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos
a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma
competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para
vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar
sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a
como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

5
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa
Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de
forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões
para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao
final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e
pesquisas complementares.

A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos
e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Praticando

Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer


o processo de aprendizagem do aluno.

Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

6
Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Exercício de fixação

Atividades que buscam reforçar a assimilação e fixação dos períodos que o autor/
conteudista achar mais relevante em relação a aprendizagem de seu módulo (não
há registro de menção).

Avaliação Final

Questionário com 10 questões objetivas, baseadas nos objetivos do curso,


que visam verificar a aprendizagem do curso (há registro de menção). É a única
atividade do curso que vale nota, ou seja, é a atividade que o aluno fará para saber
se pode ou não receber a certificação.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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INTRODUÇÃO
O que é a atividade de Inteligência Policial? Como ela está estruturada? Qual é a sua finalidade?
Qual a sua importância para o assessoramento das ações policiais? Quais são as diferenças entre os
vários tipos de conhecimento empregados na atividade de Inteligência Policial? Aliás... O que são
conhecimentos no contexto da atividade de Inteligência Policial?

Para que possamos responder a essas e outras questões, devemos ter em mente que um tomador de
decisão precisa, antes de qualquer outra coisa, estar bem informado a respeito daquilo que pretende
decidir.

Imaginem, a título de exemplo, as seguintes situações:

a. uma pessoa comum, como eu ou você, que precise escolher com qual médico irá se
submeter a uma delicada cirurgia cardíaca;

b. o Diretor de uma conhecida multinacional que precisa decidir sobre a fusão com um
complexo empresarial de grande porte;

c. um Secretário de Segurança Pública que precisa decidir sobre como ou quando


deflagrar uma operação policial em uma área de alto risco.

O que há de comum em todos esses exemplos? Simples, para que a melhor decisão seja tomada, é
imprescindível que o decisor (a pessoa que irá tomá-la) esteja muito bem informado ao seu respeito.
Concordam?

Pois bem, podemos dizer então que a probabilidade de êxito em uma decisão cresce na medida em
que aumentam a quantidade e a qualidade das informações disponibilizadas ao decisor, sobre o
assunto que será decidido.

É por esse prisma que desenvolveremos nossos estudos sobre a Inteligência Policial: uma atividade
destinada a efetuar, de forma útil e oportuna, o assessoramento do processo decisório no contexto
das ações policiais.

Objetivos
»» Conceituar Inteligência Policial.

»» Identificar os segmentos da Inteligência Policial.

»» Diferenciar os conhecimentos produzidos pela Inteligência Policial.

»» Classificar as fontes de dados empregadas na Inteligência Policial.

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»» Conhecer os princípios e características da Inteligência Policial.

»» Conhecer a metodologia de produção do conhecimento.

»» Assimilar a técnica empregada na avaliação de dados.

»» Conhecer os elementos de um Relatório de Inteligência Policial.

»» Conceituar Contrainteligência Policial.

»» Destacar aspectos legais referentes aos documentos sigilosos.

»» Conhecer as medidas de Segurança Orgânica.

»» Proteger-se da Engenharia Social.

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FUNDAMENTOS
DA ATIVIDADE DE UNIDADE I
INTELIGÊNCIA
POLICIAL

CAPÍTULO 1
Conceito e segmentos da atividade de
Inteligência Policial

“As atividades criminosas têm passado por uma série de mudanças, que culminaram
em ações cada vez mais organizadas por parte de delinquentes e organizações
criminosas. A partir da segunda metade da década de 1970, com o fortalecimento
do narcotráfico e o desenvolvimento de grandes mercados consumidores – em
especial EUA e Europa Ocidental – as organizações criminosas aperfeiçoaram seu
modus operandi, atualmente com caráter muito mais complexo e transnacional.”

(JOANISVAL BRITO GONÇALVES)

Antes de conceituarmos propriamente o que é a atividade de Inteligência Policial, para que não
sejamos influenciados em nosso estudo pelos falsos mitos que pairam sobre o assunto, convém
destacarmos aquilo que a atividade de Inteligência não é.

Inicialmente, precisamos lembrar que trabalhar com atividade de Inteligência não significa viver
como um agente secreto. Sem dúvida alguma, os diversos livros e filmes produzidos sobre o assunto
colaboraram para que essa visão ficasse arraigada no senso comum. Contudo, e a bem da verdade, o
trabalho desenvolvido pela atividade de Inteligência possui uma grande carga de pesquisa e análise,
a qual geralmente não aparece nas aventuras vividas por personagens do tipo James Bond.

É importante registrar também que a atividade de Inteligência não pode ser reduzida a fazer
bisbilhotagem. Lamentavelmente, termos como araponga, dedo-duro e X-9, continuam sendo
indiscriminadamente associados aos operadores dessa atividade, em grande parte por pessoas que
simplesmente comentam sobre um assunto que desconhecem em sua totalidade; mas, em certas
ocasiões, por indivíduos que deliberadamente pretendem denegrir o trabalho do profissional de
Inteligência.

Bem, mas se a atividade de Inteligência não é nada disso, você poderia se perguntar: Então, o que é
a atividade de Inteligência?

11
UNIDADE I │ FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL

De forma ampla, podemos conceituar a atividade de Inteligência como sendo o exercício permanente
de ações especializadas, objetivando a obtenção e análise de dados, para a produção e disseminação
de conhecimentos destinados ao assessoramento do processo decisório. Abrange ainda a proteção
dos conhecimentos sensíveis da organização, bem como das áreas e dos meios que os retenham ou
em que transitem.

No que tange especificamente à atividade de Inteligência Policial, a Doutrina da Polícia Federal a


define da seguinte maneira:

Atividade interativa exercida pelo órgão policial, fundamentada em preceitos legais


e padrões éticos, que consiste na produção e proteção de conhecimentos, por meio
do uso de metodologia própria e de técnicas acessórias, que permitam afastar
a prática de ações meramente intuitivas e a adoção de procedimentos sem uma
orientação racional.

Ao analisarmos esse conceito, percebemos que a atividade de Inteligência Policial ocupa-se tanto da
produção quanto da proteção dos conhecimentos.

De fato, da forma como é concebida doutrinariamente, a Inteligência Policial encontra-se estruturada


em dois segmentos principais, aos quais denominamos respectivamente de Inteligência (produção
dos conhecimentos) e Contrainteligência (proteção dos conhecimentos).

Contudo, seria um erro pensar que toda a produção de conhecimentos da atividade de Inteligência
Policial ocorra exclusivamente no âmbito do seu segmento Inteligência. De modo análogo, também
seria equivocado pensar que a proteção de conhecimentos cabe unicamente ao segmento da
Contrainteligência Policial.

Na realidade, os dois segmentos da atividade de Inteligência Policial (Inteligência e Contrainteligência)


encontram-se intimamente relacionados e interagem mutuamente entre si, desempenhando
atribuições de produção e proteção dos conhecimentos que interessem às ações policiais; sendo que
o aspecto preponderante do segmento Inteligência é a produção do conhecimento, enquanto que a
ênfase do segmento Contrainteligência reside na proteção do conhecimento.

Podemos ainda abstrair do conceito apresentado acima que a atividade de Inteligência Policial faz
uso de uma “metodologia própria e de técnicas acessórias”. De fato, é o emprego de uma metodologia
própria que vai permitir ao profissional de Inteligência transformar dados brutos em conhecimentos
elaborados.

Contudo, o que seriam dados e conhecimentos no contexto da Inteligência Policial?

Para responder a essa questão, trabalharemos com os conceitos expressos por (ANNÍBAL, 2007).
De acordo com esse autor, dado é toda e qualquer representação de fato, situação, comunicação,
notícia, documento, extrato de documento, fotografia, gravação, relato ou denúncia, que ainda não
tenha sido submetida a uma metodologia de análise por um profissional de Inteligência.

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FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE I

Ainda segundo (ANNÍBAL, 2007) o conhecimento consiste no resultado final que se obtém, seja na
forma escrita ou oral, após os dados anteriormente reunidos serem submetidos a uma metodologia
de análise por um profissional de Inteligência.

Em síntese, os dados são a matéria bruta, que após ser devidamente selecionada e
processada, converte-se em conhecimento de Inteligência.

Registre-se, por fim, que são os conhecimentos – e não os dados – que são empregados no
assessoramento do processo decisório da atividade de Inteligência Policial.

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CAPÍTULO 2
A linguagem empregada pela
Inteligência Policial e o conhecimento
de Inteligência Policial

Antes de nos aprofundarmos ainda mais nos aspectos essenciais dos conhecimentos produzidos
pela atividade de Inteligência Policial, convém discutirmos um pouco sobre a linguagem utilizada
na elaboração desses conhecimentos.

A atividade de Inteligência Policial pressupõe a utilização de uma linguagem específica entre os


profissionais que a desempenham e os destinatários finais dos conhecimentos que são produzidos,
de modo que os tomadores de decisão possam compreender de forma imediata e integral o conteúdo
dos conhecimentos que recebem, podendo efetivamente empregá-los no processo decisório.

É importante destacar que a linguagem empregada pela atividade de Inteligência Policial é constituída
a partir da linguagem comum. A maioria dos autores concorda com o fato de que isso assegura
que não haja uma ruptura no processo de comunicação universal utilizado pela sociedade como
um todo. No entanto, como forma de assegurar a qualidade dos textos produzidos, são adotados
padrões para garantir que as relações de comunicação ocorram sem distorções ou incompreensões.

Entre outras coisas, isto significa que na produção de um conhecimento o profissional de Inteligência
Policial deve sempre optar por um texto claro, simples e objetivo, que não possua ambiguidades ou
trechos obscuros.

Além disso, ao elaborar conhecimentos de Inteligência, o profissional de Inteligência Policial deve


sempre empregar tempos verbais que expressem com exatidão o estado de sua mente perante a
verdade dos fatos que analisou.

O conhecimento de inteligência policial


Podemos compreender o conhecimento de Inteligência Policial sob duas perspectivas diferentes,
quais sejam: processo e produto.

Como processo, esse conhecimento consiste na formação da imagem de um fato ou de uma situação
na mente do analista, podendo ocorrer de diferentes modos.

Como produto, esse conhecimento consiste na representação (oral ou escrita) dos acontecimentos.
Desse modo, corresponde à exteriorização de uma imagem sobre um fato ou uma situação, antes
restrita aos limites da mente do analista de Inteligência.

Assim, podemos definir o conhecimento na atividade de Inteligência Policial como:

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FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE I

A representação de um fato ou de uma situação, de natureza real ou hipotética,


que seja de interesse para esta atividade, e que tenha sido processada por um
profissional de Inteligência Policial.

A verdade
A Teoria do Conhecimento nos ensina que a verdade consiste na correspondência exata entre o
conteúdo do pensamento e o objeto que é pensado. Para a atividade de Inteligência Policial, a verdade
é um atributo que se vincula à relação entre o conteúdo do pensamento e os fatos ou situações que
são estudados pelo analista.

Contudo, vários autores nos recordam que a relação da mente com o objeto nem sempre se efetiva
de forma perfeita, pois, algumas vezes, a mente encontra obstáculos que a impedem de formar
uma imagem que se molde perfeitamente ao objeto. Em razão disso, e sendo a verdade a grande
aspiração da atividade de Inteligência, os profissionais que a exercem devem acautelar-se contra a
mera ilusão da verdade, ou seja, contra o erro. A título de exemplo, observe a figura abaixo:

Figura 1.

Agora responda... Quantos cavalos você conseguiu enxergar? Você tem certeza (plena convicção) de
que o número de cavalos que você enxergou corresponde à realidade? Ou você admite a possibilidade
de que o número de cavalos que você identificou não esteja correto?

Perceba que em face da imperfeição da mente humana e da complexidade da realidade, a relação


entre ambas naturalmente assume gradações.

Desse modo, podemos identificar as seguintes situações:

1. Certeza - A mente adere integralmente à imagem por ela mesma formada de um


objeto (fato ou situação);

2. Opinião – A mente adere parcialmente à imagem por ela mesma formada de um


objeto (fato ou situação);

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UNIDADE I │ FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL

3. Dúvida – A mente se mostra incapaz de optar por imagens alternativas que ela
tenha formado de determinado objeto (fato ou situação);

4. Ignorância – A mente é incapaz de formar qualquer imagem de determinado


objeto (fato ou situação).

Para (ANNÍBAL, 2007) os diferentes estados da mente são assim definidos.

Certeza
A certeza consiste no acatamento integral, pela mente, da imagem por ela mesma formada, como
correspondente a determinado fato ou situação.

Dessa forma, a certeza é o estado em que a mente adere à imagem de um objeto, por ela mesma
formada, sem temor de enganar-se. Há que se acrescentar que esta adesão é consequência da plena
clareza com que o objeto se mostra ao espírito, sendo, portanto, a evidência o motivo supremo da
certeza.

A mente, quando conduzida ao estado da certeza pelas evidências, tenderá a


encontrar a verdade!

Opinião
Neste estado a mente acata, contudo com reservas, a imagem por ela mesma formada, como
correspondente a determinado fato ou situação.

No estado de opinião a mente se define por um objeto, contudo, considera a possibilidade do


equívoco. Em razão disso, o estado de opinião expressa-se sempre em termos de indicadores de
probabilidades.

Dúvida
Diferentemente da opinião, na dúvida a mente encontra-se impossibilitada de se definir sobre as
várias imagens que ela tenha formado sobre determinado objeto.

O que se passa na mente do analista é algo como: tanto pode ser “isso”, quanto pode ser “aquilo”...

Desse modo, a dúvida é o estado da mente que traduz a suspensão provisória da capacidade de
decidir, induzindo-a a procurar novas evidências.

O encontro de novas evidências permitirá ao analista migrar da dúvida para o estado de opinião ou
de certeza.

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FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE I

Ignorância
O estado de ignorância caracteriza-se pela inexistência de qualquer imagem de determinado fato
ou situação. Desse modo, a ignorância é o estado em que a mente humana se encontra privada de
qualquer imagem sobre uma realidade específica.

A essa altura, você pode estar se perguntando... De que forma tudo isso se relaciona com a Inteligência
Policial?

Bem, se recapitularmos os conceitos que foram apresentados no início desta unidade, veremos que
a Inteligência Policial destina-se a efetuar, de forma útil e oportuna, o assessoramento do processo
decisório no âmbito das ações policiais.

Ora, não é difícil imaginar que a melhor maneira de prestar esse assessoramento é através da produção
e disseminação de conhecimentos que reduzam o grau de incerteza associado a essas ações.

Imagine, a título de exemplo, a deflagração de uma operação policial em uma área de alto risco.
Certamente você concordará que para que essa operação seja bem sucedida, seria preciso – dentre
outras coisas – identificar previamente quais são os criminosos que atuam naquele local, que
armamento eles utilizam, qual é o seu poder de fogo, quais são as possíveis rotas de fuga etc.

Evidentemente, um conhecimento que informasse tudo isso ao responsável por deflagrar tal
operação policial teria que ser escrito em nível de certeza ou, no mínimo, de opinião (expressando
probabilidade).

De que adiantaria ao responsável por esta operação policial receber um documento onde o próprio
analista que o escreveu encontra-se em dúvida, ou pior, ignora completamente as respostas a essas
questões?

Assim sendo, é imprescindível que o analista de Inteligência Policial saiba identificar e expressar
adequadamente qual é o estado de sua mente ao produzir um conhecimento de Inteligência.

Apenas os dados que provoquem na mente do analista de Inteligência Policial os


estados de certeza ou de opinião devem ser empregados na elaboração dos seus
conhecimentos!

Bem, agora que nós compreendemos claramente a importância deste conteúdo para a Inteligência
Policial, podemos nos aprofundar um pouco mais em outros aspectos que caracterizam o
conhecimento de Inteligência.

Ainda de acordo com (ANNÍBAL, 2007), a mente humana, para conhecer determinados fatos
ou determinadas situações, pode realizar três operações intelectuais distintas: conceber ideias,
formular juízos ou elaborar raciocínios.

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UNIDADE I │ FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL

Vejamos como este autor define essas três operações intelectuais.

»» Ideia - é a simples concepção na mente da imagem de determinado objeto (fato ou


situação), sem adjetivá-lo; ou seja, sem atribuir a ele uma característica específica.

»» Juízo – corresponde à operação pela qual a mente estabelece uma relação entre
diferentes ideias.

»» Raciocínio – consiste na operação pela qual a mente, a partir de dois ou mais


juízos conhecidos, alcança outro que deles decorre logicamente.

Obviamente, dessas três operações intelectuais, o raciocínio é a mais complexa.

Vamos ilustrar um raciocínio simples com o exemplo a seguir:

1. Sócrates é homem.

2. Todo homem é mortal.

3. Logo, Sócrates é mortal.

Perceba que a terceira sentença indica um novo juízo (relação entre ideias), o qual
decorre logicamente dos outros dois que foram enunciados anteriormente.

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CAPÍTULO 3
Os diferentes tipos de conhecimento
produzidos pela Inteligência Policial

Os conhecimentos produzidos pela atividade de Inteligência Policial diferenciam-se pelos seguintes


fatores:

a. O estado da mente do analista em relação à verdade.

Como vimos anteriormente, esses podem ser de certeza, opinião, dúvida ou


ignorância. Contudo, apenas os dados que se encontrem nos estados de certeza e
opinião são empregados na elaboração dos conhecimentos de Inteligência.

b. A operação intelectual empregada para a produção do conhecimento.

De acordo com o que acabamos de estudar, essas operações podem ser a concepção
de ideias, a formulação de juízos ou a elaboração de raciocínios.

c. O horizonte temporal abordado.

Basicamente, significa saber se o conhecimento refere-se ao passado, ao presente


ou ao futuro.

A seguir, trataremos de definir os diferentes tipos de conhecimentos utilizados na Inteligência


Policial de acordo com os fatores acima mencionados.

Informe
De acordo com Anníbal (2007), o conhecimento informe consiste na narração de um fato ou de
uma situação, referente ao passado ou ao presente, resultante exclusivamente de juízos elaborados
pelo analista de Inteligência Policial, onde ele expressa o seu estado de certeza ou opinião perante
a verdade.

Na elaboração do Informe, o analista de Inteligência Policial não ultrapassa os limites do juízo, por
não ter configurado uma base mínima sobre a qual possa desenvolver um raciocínio.

Dentre os atributos exigidos do analista de Inteligência Policial para a elaboração de um Informe,


destacam-se como necessários a capacidade de julgamento e de análise e síntese, em níveis
compatíveis com a complexidade desse tipo de conhecimento.

Observe que o Informe admite uma gradação no que diz respeito ao estado em que se situa a mente
em relação à verdade. Assim, o Informe pode expressar certeza ou opinião, estados que são indicados
através do uso de uma linguagem apropriada.

19
UNIDADE I │ FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL

São objetos do Informe apenas os fatos e as situações passadas ou presentes. Esta característica do
Informe deixa claro que este conhecimento não pode se referir a qualquer tipo de fato futuro.

Informação
Para Anníbal (2007), a Informação é o conhecimento resultante de raciocínios elaborados pelo
analista de Inteligência Policial, sobre fato ou situação referente ao passado ou ao presente, onde
ele expressa o seu estado de certeza perante a verdade.

Para este autor, a Informação decorre da operação mais elaborada da mente: o raciocínio. Portanto, é
um conhecimento que extrapola os limites da simples narração dos fatos ou das situações, contendo
uma interpretação (conclusão) destes fatos ou destas situações.

Dentre os atributos exigidos do analista de Inteligência Policial que elabora uma Informação,
destaca-se como necessário o raciocínio lógico e flexível, em níveis compatíveis com a complexidade
desse tipo de conhecimento.

A Informação não admite gradação no que diz respeito ao estado em que se posiciona a mente em
relação à verdade. Dessa forma, a Informação expressa unicamente o estado de certeza.

Registre-se ainda que a Informação retrata, apenas, fatos ou situações passadas ou presentes, não
comportando quaisquer projeções destes fatos ou destas situações para o futuro.

Apreciação
Conforme esclarece Anníbal (2007), a Apreciação consiste no conhecimento resultante de raciocínios
elaborados pelo analista de Inteligência Policial, sobre fato ou situação referente ao passado ou ao
presente, onde ele expressa o seu estado de opinião perante a verdade.

A Apreciação guarda grande semelhança com a Informação, tanto no aspecto da operação


intelectual empregada em sua elaboração, quanto no horizonte temporal abordado. Em virtude
disso, detalharemos apenas o ponto onde estes dois tipos de conhecimento diferem.

A diferença fundamental entre Apreciação e Informação reside no estado em que se posiciona a


mente do analista de Inteligência Policial no ato de produzi-las: enquanto na Apreciação o estado
da mente é o de opinião; na Informação, conforme visto anteriormente, o estado é exclusivamente
o de certeza.

A Apreciação é um conhecimento produzido quando se faz impositiva a consideração de frações


que, embora não representem o estado de certeza, são essenciais à compreensão de um fato ou de
uma situação, de forma que o analista de Inteligência Policial possa atender integralmente a uma
necessidade do usuário (tomador de decisão).

20
FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE I

Apesar de a Apreciação ter essencialmente como objeto fatos e situações passadas ou presentes, este
conhecimento pode admitir a realização de breves projeções para o futuro.

Tais projeções, de acordo com Anníbal (2007) resultam da percepção do analista de Inteligência
Policial sobre os desdobramentos dos fatos e situações que esteja analisando, e não do emprego de
técnicas prospectivas, ou seja, voltadas especificamente para estudar os eventos futuros.

Estimativa
Conforme assinalado por Anníbal (2007), trata-se do conhecimento resultante de raciocínios
elaborados pelo analista de Inteligência Policial, sobre a evolução futura de um fato ou de uma
situação, onde ele expressa o seu estado de opinião perante a verdade.

Como ocorre na Informação e na Apreciação, o tipo de operação intelectual desenvolvida pela mente
do analista de Inteligência Policial durante a produção da Estimativa é o raciocínio.

Dentre os atributos exigidos do analista de Inteligência Policial para a elaboração de Estimativas,


destaca-se como necessária a capacidade de raciocínio prospectivo, em níveis compatíveis com a
complexidade desse tipo de conhecimento.

De fato, a característica que a Estimativa possui de destinar-se especificamente ao estudo prospectivo


(relacionado a eventos futuros), torna o raciocínio necessário à produção deste tipo de conhecimento
dos mais complexos possíveis.

Deve-se registrar ainda, conforme destacado por Anníbal (2007), que a produção de uma Estimativa
requer não só o pleno domínio de uma metodologia específica, mas também a aplicação de técnicas
de prospecção de cenários complementares a esta metodologia.

Só há sentido em se cogitar o futuro em termos de probabilidade. Em razão da


imprevisibilidade que se encontra intrinsecamente associada ao futuro, ninguém
pode se referir a ele em termos de certeza!

Desse modo, o estado da mente do analista de Inteligência Policial, na produção de uma Estimativa,
deve ser – obrigatoriamente – o de opinião.

Quadro 1. Resumo dos diferentes tipos de conhecimento empregados na inteligência policial.

Tipo de conhecimento Estado da mente Operação mental Horizonte temporal


Informe Certeza/Opinião Juízo Fatos passados e presentes
Informação Certeza Raciocínio Fatos passados e presentes
Apreciação Opinião Raciocínio Fatos passados e presentes *
Estimativa Opinião Raciocínio Fatos futuros
* Este conhecimento admite o estudo dos desdobramentos futuros de fatos presentes.

21
CAPÍTULO 4
As fontes de dados

Ao longo dos capítulos anteriores deve ter ficado claro para você que os dados são a “matéria bruta”
a partir da qual o analista de Inteligência Policial produz o conhecimento de Inteligência. Contudo,
você ainda pode se perguntar; onde o analista obtém os dados que irá processar? Quais são as
diferentes fontes empregadas pelo analista de Inteligência Policial?

De um modo geral, as fontes de dados podem ser pessoas, equipamentos ou documentos.

Conforme o entendimento de Gonçalves (2009), podemos diferenciar as fontes de dados quanto à


sua origem (natureza), em técnicas ou humanas, e quanto à sua confidencialidade, em classificadas
ou abertas.

Quadro 2.

Quanto à sua Quanto à sua


natureza confidencialidade

Fontes técnicas Fontes classificadas

Fontes humanas Fontes abertas

As chamadas fontes técnicas englobam, dentre outras, as tecnologias de Inteligência de Imagens


(IMINT) e de Inteligência de Sinais (SIGINT).

De fato, essas tecnologias têm sido largamente empregadas como forma de subsidiar o planejamento
e a execução de operações de Inteligência Policial no Brasil.

De acordo com Ferro Júnior (2008), a Inteligência de Imagens consiste em uma “atividade
desenvolvida para a interpretação de informações obtidas por meio de recursos de captação de
radiações luminosas (fotografias, filmagens, imagens orbitais, aéreas, biométricas). Contém o
registro de imagem de pessoas, lugares e acontecimentos”.

Ainda segundo Ferro Júnior (2008), a Inteligência de Sinais “é um método sistemático que procura
analisar os sinais oriundos das emissões eletromagnéticas, decorrentes de rádio e telefonia, com o
objetivo de produzir informações numa operação policial”.

22
FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE I

Um exemplo do emprego de fontes técnicas (Inteligência de Sinais) no âmbito da Inteligência


Policial seria o uso do Sistema Guardião.

Vejamos como Anníbal (2007) descreve esse sistema (sic):

O Sistema Guardião já é uma realidade nos Departamentos de Polícia Civil Paulista


e trata-se de uma excelente solução para centros de operações de inteligência que
necessitem realizar escutas telefônicas.

Foi desenvolvido para capturar e registrar as chamadas de números de telefones


preestabelecidos e permite aos policiais ou agentes de inteligência o monitoramento
on-line das chamadas.

É composto de interface de operação, configuração e gerência disponibilizadas em


ambiente gráfico de fácil utilização (interface gráfica amigável), utilizando plataforma
de comutação Dígitro para acesso à rede telefônica.

Basicamente funciona da seguinte maneira: a operadora programa um desvio de


todas as chamadas realizadas ou recebidas de um determinado alvo (telefone)
para um DDR do sistema. Assim que a plataforma recebe esta chamada é iniciada a
gravação. Simultaneamente, o agente cuja configuração inclui este telefone, recebe
automaticamente o áudio da chamada. Este áudio poderá ser direcionado para a
posição de atendimento associada ao seu terminal ou a qualquer outro telefone
por meio de siga-me (redirecionamento). Após encerrada a chamada, as gravações
estarão disponíveis para consulta.

Durante a reprodução, será permitido ao agente os comandos para avançar,


retroceder e pausa da mensagem.

Durante o monitoramento e reprodução são disponibilizadas informações a respeito


da chamada, dos telefones que estão sendo utilizados, bem como as suas ERB`s
(telefones celulares), policiais que estão na escuta, informações sobre o alvo e o seu
interlocutor (caso o mesmo esteja cadastrado no sistema), operações e alvarás que
envolvam o alvo...

Embora sejam extremamente precisas no que dizem respeito aos dados obtidos, deve-se ressaltar o
fato de que as fontes técnicas apenas coletam os dados para os quais foram previamente programadas,
sendo, portanto, limitadas neste aspecto.

Por fontes humanas entende-se as pessoas que, de algum modo, contribuem repassando dados
que chegam ao analista de Inteligência. Neste grupo encontram-se os colaboradores e informantes
empregados pela atividade de Inteligência Policial. Incluem-se também as pessoas que reportam
dados de forma anônima, utilizando-se de serviços do tipo disque-denúncia.

Embora sempre haja o risco de que uma fonte humana relate um dado improcedente ou incorreto
(por erro ou esquecimento), deve-se destacar o fato de que elas são as únicas capazes de emitir um

23
UNIDADE I │ FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL

juízo de valor sobre os dados que estão sendo repassados. Esse aspecto, por si só, faz com que essas
fontes sejam extremamente valorizadas pelos profissionais de Inteligência Policial.

As fontes classificadas, por sua vez, referem-se aos meios que veiculam conteúdos com algum grau
de sigilo, e que, em razão disso, devam receber um tratamento adequado por parte do analista de
Inteligência Policial.

Por fim, as fontes abertas – como o próprio nome indica – englobam todos os meios nos quais os
dados são disponibilizados diretamente (sem qualquer restrição de acesso), a quem quer que deseje
obtê-los, por exemplo: jornais, revistas especializadas e internet.

Fontes abertas não significam necessariamente fontes gratuitas. Em vários casos é


preciso pagar para que se possa ter acesso aos dados que se encontram disponíveis
em fontes abertas!

Embora apresentem um alto grau de oportunidade (permitem que o analista possa acessar os
dados de forma imediata), as fontes abertas possuem uma significativa vulnerabilidade: facilitam a
inserção e divulgação de dados de baixa qualidade ou, até mesmo, intencionalmente falsos.

Portanto, o analista de Inteligência Policial deve ter bastante cautela quando empregar dados
provenientes de fontes abertas na produção dos seus conhecimentos.

24
CAPÍTULO 5
Princípios e características da atividade
de Inteligência Policial

É imprescindível que a atividade de Inteligência Policial esteja pautada em determinados princípios


norteadores. Estes princípios orientam e delimitam o trabalho do analista de Inteligência Policial na
elaboração dos conhecimentos que são produzidos.

Vejamos a seguir quais são os princípios elencados pela Doutrina Nacional de Inteligência de
Segurança Pública – DNISP:

Princípio da objetividade
As ações da atividade de Inteligência Policial devem ser executadas de acordo com planejamentos
previamente definidos.

Princípio da oportunidade
A atividade de Inteligência Policial deve observar rigorosamente os prazos estabelecidos na fase
do Planejamento. Um conhecimento disseminado fora do tempo oportuno deixa de cumprir seu
objetivo principal que é o assessoramento do processo decisório.

Princípio da interação
A atividade de Inteligência Policial deve buscar uma atuação em rede, para tanto, é imprescindível
que se estabeleça relações sistêmicas de cooperação com os demais órgãos que integram a
comunidade de Inteligência.

Princípio da permanência
A atividade de Inteligência Policial deve propiciar um fluxo constante de dados e conhecimentos
voltados ao assessoramento do processo decisório.

Princípio da precisão
A atividade de Inteligência Policial deve buscar um conhecimento que alcance precisamente, e
plenamente, os seus objetivos.

25
UNIDADE I │ FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL

Princípio da imparcialidade
A atividade de Inteligência Policial pressupõe a adoção de uma postura imparcial durante a produção
dos conhecimentos. É inadmissível que posicionamentos ou ideologias pessoais interfiram no
conhecimento que esteja sendo produzido.

Princípio do controle
A atividade de Inteligência Policial requer o acompanhamento constante das ações que estejam
sendo executadas.

Princípio do sigilo
A atividade de Inteligência Policial deve preservar a identidade do órgão, bem como dos seus
integrantes e colaboradores.

Princípio da simplicidade
A atividade de Inteligência Policial deve priorizar o emprego de procedimentos simples em
detrimento de outros mais complexos.

Princípio da amplitude
Na elaboração do conhecimento, o analista de Inteligência Policial deve buscar esgotar todos os
aspectos do assunto tratado.

Princípio da compartimentação
Com o objetivo de evitar os danos decorrentes de vazamentos ou comprometimentos, a atividade
de Inteligência Policial deve buscar restringir o acesso aos conhecimentos sensíveis apenas a quem
tenha a real necessidade de conhecê-los.

As características que relacionamos a seguir, também expressas na DNISP, são aspectos essenciais
da atividade de Inteligência Policial:

Quadro 3.

Produção do conhecimento Economia de meios


Assessoria Iniciativa
Verdade com significado Abrangência
Busca de dados protegidos Dinâmica
Ações especializadas Segurança

26
FUNDAMENTOS DA ATIVIDADE DE INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE I

Registre-se o fato de que para Ferro Júnior (2008) as características fundamentais da atividade de
Inteligência Policial são as seguintes:

Previsão
Exercício diário e mental do analista de Inteligência Policial, percebendo e detectando situações
definidas como problemas para a Segurança Pública.

Antecipação
Ação que se concretiza no momento em que a Inteligência elabora, difunde e propaga o conhecimento
pertinente na organização policial por meio de sistemas e relatórios de Inteligência. De forma
oportuna, expressa certeza ou opinião sobre fatos e situações que afetam a Segurança Pública e tem
valor estratégico pela visão do contexto e avaliação global do crime.

Assessoramento
Começa no momento em que um determinado fato ou acontecimento se torna fato gerador para as
ações de Inteligência e sujeito à investigação criminal. Crimes e situações diversas (movimentos de
grupos ou subgrupos sociais) exigem avaliação e monitoramento pela atividade, com o deslocamento
e disponibilidade dos recursos de Inteligência. Setores operacionais de Inteligência participam da
solução do problema, coletando e produzindo informações para gerar significado. Com o apoio técnico
e especializado, auxilia a unidade policial na elucidação de ocorrências e na produção de provas.

27
A PRODUÇÃO DO
CONHECIMENTO UNIDADE II
NA INTELIGÊNCIA
POLICIAL

A produção do conhecimento é a atividade realizada pelo analista de Inteligência Policial onde, a


partir da reunião de dados e outros conhecimentos previamente obtidos, e por meio da aplicação
de uma metodologia específica, obtém-se um conhecimento útil e oportuno, com a finalidade de
assessorar as ações policiais.

Nesta unidade estudaremos como o conhecimento de Inteligência Policial é produzido e quais as


metodologias são empregadas nesta produção.

CAPÍTULO 1
Situações que ensejam a produção de
um conhecimento de Inteligência Policial

Um conhecimento de Inteligência Policial é produzido nas seguintes situações:

1. Em atendimento a um Plano de Inteligência Policial

Neste caso, o analista de Inteligência Policial obedece às determinações de um plano


previamente estabelecido, onde constam os assuntos que devem ser estudados.

2. Em decorrência de um estímulo específico

Nesta situação, o analista de Inteligência Policial é acionado para produzir um


conhecimento por meio de um documento interno (da sua própria organização
policial), ou externo (de outro órgão congênere).

3. Por iniciativa do próprio analista de Inteligência Policial

Ocorre toda vez que o analista de Inteligência Policial entenda que o usuário deva
conhecer sobre um determinado assunto.

Vejamos a seguir, para exemplificar, um fato que poderia ensejar a produção de um conhecimento
de Inteligência Policial:

28
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE II

PM encontra em Paraisópolis lista de 40


policiais marcados para morrer
Papéis achados em Paraisópolis incluem descrição física e endereços de vítimas,
detalhes de como funcionam tribunais do crime e organograma do PCC

31 de outubro de 2012 | 2h 03

ARTUR RODRIGUES , MARCELO GODOY, WILLIAM CARDOSO - O Estado de S.Paulo

A Polícia Militar estourou uma central de espionagem do Primeiro Comando


da Capital (PCC) na Favela de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo, onde eram
planejados ataques contra policiais do Estado. Foi encontrada uma mala cheia de
anotações feitas por bandidos da quadrilha de Francisco Antônio Cesário da Silva,
o Piauí. Em cadernos com páginas preenchidas à mão, havia nomes, endereços e
características físicas de policiais civis e militares marcados para morrer.

A lista de policiais que deveriam ser assassinados tinha pelo menos 40 nomes de
homens que atuam em todo o Estado. Documentos revelam que os criminosos
seguiam os policiais por tempo suficiente para saber tudo sobre sua rotina. O nível
de detalhamento era tão grande que os criminosos sabiam até o percurso feito por
policiais do trabalho para casa e os locais onde passavam seus momentos de lazer,
como no caso de um sargento que gostava de assistir a jogos de futebol em um bar. A
documentação também inclui penas aplicadas contra bandidos que não praticaram
as ações determinadas pela facção contra as forças de segurança do Estado.

Pela primeira vez, foram encontrados indícios de que a organização criminosa


pretendia atacar policiais civis. Nomes de dois homens do Grupo Armado de
Repressão a Roubos e Assaltos (Garra) constavam da lista.

Os homens do 16o Batalhão da PM descobriram os documentos do PCC na Avenida


Independência, após monitorarem dois adolescentes no bairro. Depois que a polícia
cercou a favela, traficantes tentaram usar os gêmeos de 17 anos para retirar os
dados da facção de Paraisópolis. O material foi entregue à dupla pelo zelador do
prédio onde funcionava a central de espionagem do PCC. Os adolescentes, porém,
acabaram flagrados com todos os documentos dentro de uma mala de viagem com
rodinhas. Se não fossem pegos, eles tentariam sair da favela tomada por mais de 600
policiais. No local, ocorre desde anteontem a Operação Saturação. Todas as saídas de
Paraisópolis estão fechadas pela PM desde as 5h de segunda-feira.

Contabilidade. Na mala, também foi encontrada movimentação financeira do


tráfico de drogas na região. Além de dados da organização criminosa em nível
nacional. Eles revelam a atuação de Piauí em Minas Gerais e em Mato Grosso do Sul.

A PM ainda encontrou na mala um organograma do PCC. E o documento que prova


que saiu de Paraisópolis a ordem para matar PMs – o “salve”, como é chamado entre

29
UNIDADE II │ A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL

os criminosos. No papel está escrito que, para cada criminoso morto, dois policiais
devem morrer. O motivo da ordem seriam as “execuções covardes” de criminosos,
supostamente cometidas por policiais militares.

A central também funcionava como uma espécie de fórum do crime. Ali, havia
detalhes de todos os processos do chamado tribunal do PCC. A documentação
incluía o nome dos responsáveis por conduzir os julgamentos (disciplinas), as
testemunhas e as sentenças aplicadas aos réus. Em um dos casos, por exemplo, a
sentença para um rapaz que furtou dois tênis foi ressarci-los à vítima.

Além disso, foram achados documentos que comprovam que o PCC pagava pensão
às famílias de pessoas mortas durante os ataques da facção em 2006. Os familiares
tinham de assinar uma folha atestando o recebimento da cesta básica – ainda não se
sabe se o pagamento era em dinheiro ou produtos.

Seria natural, após a descoberta dessa lista, que os setores de Inteligência Policial fossem acionados
para produzir um conhecimento sobre o assunto, não é mesmo? Tal conhecimento, dentre outros
aspectos, poderia identificar:

»» Quem seriam os autores dessa lista?

»» Quem teria dado a ordem para a execução dos policiais?

»» Qual teria sido a motivação deste fato?

»» Como os dados estavam sendo levantados?

»» Desde quando este fato estaria ocorrendo?

»» Existiriam outras listas semelhantes a esta?

30
CAPÍTULO 2
Metodologia da produção do
conhecimento de Inteligência Policial

Como destacam (SANTOS; FRANCO, 2011), o conhecimento de Inteligência é alcançado a partir


da utilização de um método. Os autores entendem por método um conjunto sistematizado de
procedimentos realizados pelo analista de Inteligência Policial, fundamentados na metodologia
científica e no raciocínio lógico, com o intuito de produzir um conhecimento objetivo, preciso
e oportuno.

A metodologia apresentada a seguir, baseada na consagrada Doutrina de Inteligência, é aplicável


aos quatro tipos de conhecimento estudados na unidade anterior, respeitando-se, evidentemente,
as especificidades de cada um.

A metodologia de produção do conhecimento de Inteligência Policial compreende as seguintes fases:

»» Planejamento.

»» Reunião.

»» Análise e Síntese.

»» Interpretação.

»» Formalização e Difusão.

Vale ressaltar que essas fases não constituem procedimentos rigorosamente ordenados e nem
possuem limites claramente definidos entre si.

Fase do Planejamento

A produção de um conhecimento é iniciada por um planejamento. Nesta fase, o


profissional de Inteligência procura, de forma ordenada e racional, sistematizar o
trabalho a ser desenvolvido, tendo em vista os fins a atingir.

De acordo com (SANTOS; FRANCO, 2011), a fase do planejamento abrange, essencialmente, os


seguintes procedimentos:

»» Definição do assunto a ser estudado.

»» Determinação da faixa de tempo em que o assunto deve ser considerado.

»» Identificação do usuário do conhecimento.

31
UNIDADE II │ A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL

»» Verificação da finalidade que vai ter o conhecimento.

»» Definição do prazo disponível para a produção do conhecimento.

»» Determinação dos aspectos essenciais do assunto (conhecidos e a conhecer).

A seguir, trataremos de detalhar cada um desses procedimentos.

Definição do assunto a ser estudado


Este procedimento consiste em determinar o fato ou situação, objeto do conhecimento a ser
produzido pelo analista de Inteligência Policial, através de uma expressão oral ou escrita.

O assunto deve ser preciso e específico. Desse modo, torna-se necessário proceder à sua delimitação.

Neste sentido, o analista de Inteligência Policial deve se aprofundar no assunto, em lugar de deter-
se a temas muito genéricos, os quais podem gerar análises superficiais e induzir o usuário final a
tomar decisões incorretas.

Como forma de manter o analista de Inteligência Policial atualizado sobre assuntos que são
sistematicamente abordados por sua organização, o ideal é que todos os conhecimentos produzidos
sejam arquivados em “pastas” específicas, permitindo assim que ele ofereça uma pronta resposta
quando seja acionado, atendendo ao princípio da oportunidade, uma vez que a produção do
conhecimento para a tomada de decisões geralmente carece de ações rápidas para que possam ser
eficazes.

Na fase do planejamento, a determinação do assunto é muitas vezes provisória, uma vez que, ao
término do trabalho, poderá ser necessário redefini-lo de acordo com a representação final do fato
ou da situação enfocada.

Determinação da faixa de tempo em que o


assunto deve ser considerado
Este procedimento consiste em estabelecer limites para que o assunto seja considerado no tempo.
Trata-se, por tanto, de determinar a abrangência temporal do assunto.

A determinação da faixa de tempo é feita levando-se em conta, sobretudo, as necessidades do


usuário do conhecimento em produção.

Ressalte-se que, à semelhança do que ocorre com as fases da metodologia de produção do


conhecimento, os procedimentos que compõem cada uma delas não são rigorosamente ordenados.
Deste modo, como exemplo, observa-se que a determinação do assunto, da faixa de tempo e, como
se segue do usuário e da finalidade, são procedimentos intimamente relacionados, interdependentes
e de execução quase simultânea.

32
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE II

Identificação do usuário do conhecimento


A identificação do usuário do conhecimento produzido objetiva identificar o tomador de decisão que
receberá o conhecimento de Inteligência.

Na atividade de Inteligência Policial não é raro que um conhecimento seja difundido para mais de
um usuário, considerando-se a complexidade que é intrínseca ao seu processo decisório.

Quando houver a necessidade de diversificar a difusão, deve-se informar a cada destinatário sobre
os demais usuários que estão recebendo o conhecimento.

Verificação da finalidade do conhecimento


Trata-se da possível utilização, pelo usuário, do conhecimento em produção. Este tópico, assim
como o anterior, não é indispensável.

Convém destacar que nem sempre é possível se determinar a finalidade específica do conhecimento.
Neste caso, o planejamento deve ser orientado a esgotar o assunto tratado, de tal modo que o usuário
venha a encontrar, em algum ponto do conhecimento que está sendo produzido subsídios úteis à
sua atuação.

O correto entendimento do processo decisório facilita a determinação da finalidade e do usuário do


conhecimento.

Definição do prazo disponível para produção do


conhecimento
Nos casos de produção do conhecimento em cumprimento a Planos de Inteligência ou estímulos
específicos, é normal que o prazo seja previamente estabelecido.

Quando isso não ocorre, ou quando a iniciativa de produção do conhecimento é do próprio analista
de Inteligência Policial, os prazos são estabelecidos observando-se o princípio da oportunidade.

Determinação dos aspectos essenciais do assunto


Neste ponto, procede-se a um levantamento dos aspectos que deverão ser abordados de modo que
o assunto possa ser devidamente esclarecido. Essa dimensão do trabalho tem como essência levar
o profissional de Inteligência a verificar o que ele deseja saber para responder ao assunto e atender
plenamente à necessidade do usuário final.

Os aspectos essenciais não devem ser confundidos com o problema, definido quando da determinação
do assunto.

33
UNIDADE II │ A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL

Pode ocorrer que o analista de Inteligência Policial não consiga obter respostas a um ou outro
aspecto essencial listado. Neste caso, ele deve produzir o conhecimento com base no material que
foi reunido, a fim de atender ao princípio da oportunidade.

Observe que os aspectos essenciais podem ser redimensionados ao longo do trabalho de produção
do conhecimento.

Verificação dos aspectos essenciais conhecidos


Consiste em se verificar, dentre os aspectos essenciais já determinados, aqueles para os quais já se
tenha algum tipo de resposta, antes do desencadeamento de qualquer medida para a reunião de
novos dados. Este procedimento é comum quando o analista de Inteligência já possui uma pasta na
qual acompanha sistematicamente determinado assunto, ou mesmo valendo-se de sua experiência
pessoal ou profissional.

Sendo o planejamento de uso estritamente pessoal do elaborador do conhecimento, o seu


equacionamento é livre. Em razão disto – especificamente quanto à verificação dos aspectos
essenciais conhecidos – poderá este procedimento variar desde a simples indicação dos aspectos
já conhecidos, até o relacionamento de todas as respostas que a eles se vinculem. É importante,
porém, que se separem as respostas completas das incompletas e as que expressam certeza das que
não a expressam.

A correção deste procedimento é fundamental para execução do que se segue.

Verificação dos aspectos essenciais a conhecer


Neste ponto, verificam-se os aspectos essenciais em relação aos quais o elaborador do conhecimento:

»» deve obter respostas, uma vez que não as possui;

»» necessita de novos elementos de convicção para as respostas já disponíveis;

»» deve obter complementos para as respostas que já possui.

Este procedimento permite ao analista de Inteligência Policial preparar-se com objetividade para a
próxima fase da metodologia de produção do conhecimento.

Em outras palavras, a determinação dos aspectos essenciais a conhecer irá direcionar o esforço para
a obtenção de dados na fase da Reunião.

Fase da Reunião

A reunião é a fase da produção do conhecimento na qual o profissional de Inteligência


Policial procura obter dados ou conhecimentos que respondam ou complementem
os aspectos essenciais a conhecer.

34
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE II

Dois tipos de procedimentos podem ser aplicados nesta fase: a coleta e a busca.

A coleta consiste na obtenção dos dados disponíveis em fontes abertas. A busca, por sua vez,
compreende os procedimentos para obtenção dos dados negados.

Recordemos que o profissional de Inteligência Policial deve estar atento à grande


quantidade de materiais de baixa qualidade disponível na internet. Não é raro
encontrarmos dados imprecisos ou mesmo errados, em razão da facilidade com que
são inseridos na rede sem que se proceda a qualquer tipo de filtro preliminar!

Em razão disso, é essencial que o analista verifique a origem da fonte e o conteúdo do dado que por
ela foi repassado, valendo-se, por vezes, da experiência pessoal que detém sobre o assunto para
fazer uma primeira avaliação.

Sequência de procedimentos adotados na Fase da


Reunião
Na fase da reunião, o profissional de Inteligência pode recorrer aos seguintes procedimentos,
sempre partindo do mais simples para o mais complexo:

»» consulta aos arquivos da própria organização policial;

»» pesquisa em órgãos externos;

»» acionamento do Elemento de Operações (ELO);

»» contato com órgãos congêneres.

O “Elemento de Operações” corresponde, por assim dizer, à fração operacional do órgão de


Inteligência Policial.

Trata-se, portanto, da fração responsável pelo emprego de Técnicas e Ações Operacionais na busca
pelo dado negado.

De acordo com o que ensina Ferro Júnior (2008):

As técnicas operacionais são ações especializadas devido ao emprego de


pessoal capacitado e possuidor de habilidade para a utilização de equipamentos
eletrônicos. Englobam orientações técnicas, práticas e racionais sobre pessoal e
material empregados na ação e se destinam a ordenar procedimentos operacionais
necessários para atingir de maneira eficaz os objetivos pretendidos.

Ainda segundo Ferro Júnior (2008), as técnicas operacionais tradicionais são:

»» Estória Cobertura.

»» Reconhecimento.

35
UNIDADE II │ A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL

»» Entrevista.

»» Vigilância.

»» Disfarce.

»» Entrada.

»» Recrutamento.

»» Infiltração.

»» Aplicação de equipamentos eletrônicos.

Este mesmo autor inclui ainda as seguintes habilidades neste conjunto:

»» Observação, Memorização e Descrição (OMD).

»» Confecção de croquis descritivos.

»» Fotografias e Filmagens.

Vale ressaltar que a Doutrina Nacional de Inteligência de Segurança Pública – DNISP estabelece
uma diferenciação entre Ações de Busca e Técnicas Operacionais.

A DNISP entende como Ações de Busca, todos os procedimentos realizados pelo setor de operações de
uma Agência de Inteligência, envolvendo ambos os ramos (segmentos) da Inteligência de Segurança
Pública, a fim de reunir dados protegidos ou negados, em um universo antagônico. As Técnicas
Operacionais, por outro lado, seriam as habilidades desenvolvidas por meio de emprego de técnicas
especializadas, que viabilizariam a execução das Ações de Busca, maximizando potencialidades,
possibilidades e operacionalidades.

Desse modo, de acordo com a DNISP, temos a seguinte configuração:

Quadro 4.

AÇÕES DE BUSCA TÉCNICAS OPERACIONAIS


»» Reconhecimento »» Processos de Identificação de Pessoas (PIP)
»» Vigilância »» Observação, Memorização e Descrição (OMD)
»» Recrutamento operacional »» Estória-Cobertura
»» Infiltração »» Disfarce
»» Desinformação »» Comunicações Sigilosas
»» Provocação »» Leitura da Fala
»» Entrevista »» Análise de Veracidade
»» Entrada »» Emprego de Meios Eletrônicos
»» Interceptação de Sinais e de Dados »» FotoInterpretação

36
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE II

Ainda segundo a DNISP, as Ações de Busca que necessitam de autorização judicial (Infiltração,
Entrada e Interceptação de Sinais e de Dados) são denominadas Ações de Inteligência Policial
Judiciária (AIPJ). Tais ações são de natureza sigilosa e envolvem o emprego de técnicas especiais
para a obtenção de dados.

Fase da Análise e Síntese

Consiste na determinação do valor dos dados e/ou conhecimentos reunidos e em


sua posterior integração, formando um conjunto coerente e ordenado de dados
com base nas frações significativas devidamente avaliadas.

Analisar significa decompor algo em suas partes constituintes e observar como cada uma dessas
partes relaciona-se com o todo e com as demais partes.

Assim sendo, esta fase compreende os seguintes procedimentos:

Determinação do valor dos dados e/ou


conhecimentos reunidos
Este procedimento compreende a verificação da pertinência e da credibilidade dos dados ou
conhecimentos reunidos.

A verificação da pertinência é realizada estudando-se o interesse dos dados ou conhecimentos


reunidos para o trabalho.

Este estudo é iniciado por um exame preliminar do relacionamento dos dados ou conhecimentos
obtidos com o assunto que o analista esteja estudando. Esgota-se pela decomposição de cada um
destes dados ou conhecimentos em frações significativas, isto é, frações que tenham relação com
os já citados aspectos essenciais.

Por vezes, partes dos dados ou conhecimentos reunidos são considerados de utilidade para o
trabalho em andamento, embora não tenham correspondência com qualquer aspecto essencial
levantado no planejamento. Neste caso, o rol de aspectos essenciais deve ser alterado por meio da
inclusão destes novos itens.

A verificação da credibilidade é inicialmente realizada através de um estudo das frações significativas


contidas nos conhecimentos reunidos e de um trabalho de julgamento das fontes e dos conteúdos
dos dados obtidos. No próximo capítulo apresentaremos com mais detalhes a Técnica empregada
para a Avaliação de Dados – TAD.

Sua consolidação é feita comparando-se as frações significativas entre si e com o que o elaborador
do trabalho sabe sobre o assunto.

37
UNIDADE II │ A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL

Ao final do procedimento de determinação do valor dos dados ou conhecimentos reunidos, será


obtida uma série de frações significativas devidamente verificadas em relação ao seu grau de
credibilidade.

Esse resultado poderá ensejar novas medidas de reunião, se julgado que certas frações significativas
não têm credibilidade suficiente para serem aproveitadas.

Integração dos dados e/ou conhecimentos


reunidos
O procedimento em questão resume-se em montar um conjunto coerente e ordenado de dados com
base nas frações significativas já devidamente avaliadas.

Para a montagem de um conjunto coerente e ordenado de dados, é importante observar o rol de


aspectos essenciais previamente determinados no planejamento. Os aspectos essenciais constituem
uma orientação a ser observada no procedimento de integração.

Fase da Interpretação

É a fase da produção do conhecimento em que o analista de Inteligência Policial


esclarece o significado final do assunto que esteja sendo tratado.

Na unidade anterior, quando estudamos os tipos de conhecimento que são empregados na atividade
de Inteligência Policial, destacamos que o conhecimento Informe caracteriza-se por ser uma
narração de um fato ou situação, na qual o analista de Inteligência Policial não encontra uma base
mínima sobre a qual possa desenvolver um raciocínio.

Perceba que a interpretação (extração de um significado subjacente aos dados que foram reunidos e
analisados pelo analista de Inteligência Policial) resulta diretamente de uma operação mental mais
elaborada, ou seja, de um raciocínio.

Portanto, podemos afirmar que:

No caso de produção do conhecimento Informe, esta fase é suprimida, passando-se


diretamente para a fase seguinte: formalização e difusão.

Feito esse breve esclarecimento, podemos seguir adiante.

Como já visto anteriormente, a metodologia de produção de conhecimento não é composta por fases
e procedimentos rigorosamente ordenados e com limites precisos. Essa observação é particularmente
válida para a fase da interpretação, onde qualquer tentativa de ordenação e delimitação se torna difícil.

38
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE II

Contudo, apenas para fins didáticos, podemos dizer que os principais procedimentos realizados na
fase da Interpretação são os seguintes: delineamento da trajetória, estudo dos fatores de influência
e o desvelamento do significado final.

Delineamento de trajetória

Este procedimento nada mais é do que o encadeamento sistemático, com base na


integração, dos aspectos relacionados com o assunto que esteja sendo estudado.

Ao realizar o delineamento da trajetória, o analista de Inteligência Policial integra todos os elementos


essenciais para se compreender a trajetória do assunto que esteja sendo estudado, em uma cadeia
de causa e efeito.

Estudo dos fatores de influência

Este procedimento consiste em se identificar e ponderar os fatores que modelaram


a trajetória da situação e que possuam potencialidade para influenciá-la no futuro.

O estudo dos fatores de influência compreende, portanto, a identificação e ponderação dos chamados
Fatos Portadores de Futuro, bem como dos fatores que, embora não estejam presentes na situação
estudada, dela sejam inferidos como virtualmente integrados em seus desdobramentos futuros.

Desvelamento do Significado Final

O desvelamento do significado final será muito mais um procedimento de


aperfeiçoamento do esboço que o analista já tem em sua mente, do que
propriamente um procedimento de descoberta integral do significado do fato ou
situação em estudo.

A experiência na atividade nos ensina que, a rigor, quando o analista de Inteligência Policial chega a
este ponto da fase da interpretação, ele já tem em sua mente ao menos um esboço da interpretação
que dará ao fato ou situação em estudo.

Fase da Formalização e Difusão

É a fase na qual se dá a forma final ao conhecimento que foi produzido e se realiza a


sua difusão ao usuário.

39
UNIDADE II │ A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL

A formalização do conhecimento de Inteligência admite as seguintes situações:

a. Mediante a redação de um relatório.

b. Mentalmente para, quando necessário, transmitir de forma oral o conhecimento.

Obviamente, por se tratar de um documento destinado ao assessoramento do processo decisório,


a opção preferencial para a formalização e difusão dos conhecimentos de Inteligência será sempre
pela forma de um relatório escrito. No capítulo 4 desta unidade apresentaremos os principais
elementos constituintes de um Relatório de Inteligência Policial – RELINT.

Vejamos a seguir um esquema da metodologia que foi apresentada neste capítulo:

Quadro 5.

40
CAPÍTULO 3
Técnica de Avaliação de Dados

Creio que a esta altura você já seja capaz de inferir a importância de se realizar a avaliação dos dados
obtidos, não é mesmo?

Pois bem, o analista de Inteligência Policial necessita de uma técnica que lhe permita verificar o grau
de credibilidade que pode ser atribuído aos dados obtidos, e assegurar, deste modo, que somente
aqueles com maior credibilidade sejam empregados na produção dos conhecimentos.

A avaliação dos dados compreende os procedimentos de julgamento da fonte e de julgamento do


conteúdo, vejamos cada um deles em detalhes.

Julgamento da fonte
O julgamento da fonte é realizado com a finalidade de se estabelecer o grau de idoneidade dessa
fonte. Neste julgamento, a fonte é considerada sob três aspectos:

a. Autenticidade;

b. Confiabilidade;

c. Competência.

Sob o aspecto da autenticidade, procura-se primeiro verificar se o dado provém realmente da fonte
presumida. Este trabalho é desenvolvido através do estudo das particularidades e dos eventuais
indicativos que permitam caracterizar a fonte. A seguir, verifica-se se foi nela que o dado foi gerado.
Cuidados especiais são observados para distinguir fonte de canal de transmissão (fonte primária de
fonte secundária), já que, muitas vezes, surge entre a fonte e o avaliador a figura do intermediário do
dado. Esse intermediário é considerado como canal de transmissão, e não deve ser confundido com a
fonte do dado, embora tenha que ser submetido aos mesmos critérios de avaliação de fonte primária.

Sob o aspecto da confiabilidade, entre outros, são considerados os seguintes indicadores que a ela
se relacionam:

»» Antecedentes (criminal, político, lealdade, honestidade etc.).

»» Padrão de vida compatível ou não com o seu poder aquisitivo.

»» Contribuição já prestada anteriormente (precisão de dados etc).

»» Motivação (pagamento, patriotismo, ideologia, interesse pessoal, vingança etc.).

41
UNIDADE II │ A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL

»» Sob o aspecto da competência, a fonte é julgada levando-se em conta,


essencialmente, os seguintes indicadores:

»» Habilitação.

»» Condições de obtenção do dado.

O primeiro indicador diz respeito aos atributos pessoais da fonte presumida para perceber,
memorizar e descrever especificamente o fato ou a situação objeto do dado. A fonte é, portanto,
julgada com base no estudo de sua capacidade pessoal para perceber o fato ou a situação.

O segundo indicador se refere à possibilidade da fonte (por si mesma) perceber o fato ou a situação
que descreve.

Ressalte-se que os indicadores aqui relacionados, embora sejam mais adequados para o julgamento
de pessoas como fonte, podem ser adaptados para o julgamento de organizações como fonte.
Porém, na eventualidade de ter que julgar um documento como fonte de dados, o profissional de
Inteligência terá que se valer de outros indicadores e técnicas específicos.

Julgamento do conteúdo
O julgamento do conteúdo considera o dado sob os seguintes aspectos:

a. coerência;

b. compatibilidade;

c. semelhança.

A coerência consiste em determinar se o dado em julgamento não apresenta contradições em seu


conteúdo; busca-se, assim, verificar a harmonia interna do dado, o seu encadeamento lógico.

A compatibilidade é aferida estabelecendo-se o relacionamento do dado com o que se sabe sobre


o fato ou situação que é objeto do mesmo; procura-se, deste modo, examinar o grau de harmonia do
dado com o que se sabe sobre o assunto.

A semelhança consiste em verificar se há outro dado, oriundo de fonte diferente, cujo conteúdo
esteja em conformidade com o conteúdo do dado em julgamento.

Atribuição de um grau de credibilidade ao dado

A credibilidade das frações que compõem o conhecimento deve ser indicada,


quando de sua formalização, através de recursos de linguagem que expressem o
estado de certeza ou de opinião do profissional de Inteligência.

42
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE II

Desse modo, as frações que indiquem o estado de certeza por parte do analista de Inteligência
Policial são registradas no tempo Presente, ou no Pretérito Perfeito. Já as frações que indicam o
estado de opinião, são escritas utilizando-se o Futuro do Pretérito.

Observe nos exemplos a seguir como os tempos verbais foram empregados, e


identifique o estado da mente do analista em relação às frações que ele produziu.

a. A lista contendo os nomes e endereços dos policiais que seriam executados teria
sido elaborada pelo traficante Fulano de Tal.

b. A lista contendo os nomes e endereços dos policiais que seriam executados foi
elaborada pelo traficante Fulano de Tal.

A seguir, apresentamos um quadro-resumo com os indicadores utilizados para o julgamento da


fonte e do conteúdo dos dados:

Quadro 6. Julgamento da fonte

Aspecto Pergunta Verificação


Autenticidade A fonte é realemnte a origem do dado? Identificação da fonte
Confiabilidade Qual o interesse da fonte? Motivação da fonte
Competência A fonte tem condições de ser a origem do dado? Caracterização da fonte

Quadro 7. Julgamento do conteúdo

Aspecto Pergunta Verificação


Coerência Existe contradição no conteúdo do dado? Harmonia interna do dado.
Compatibilidade O dado é compatível com o que se sabe sobre o assunto? Hamonia externa com o que se sabe.
Semelhança Existe semelhança com dados obtidos de outras fontes? Harmonia externa com outros dados.

43
CAPÍTULO 4
O Relatório de Inteligência Policial

Embora, como visto anteriormente, a atividade de Inteligência Policial admita a possibilidade de que
um conhecimento seja difundido oralmente ao tomador de decisão (via de regra, para que se possa
atender ao princípio da oportunidade), o mais comum é que esse conhecimento seja devidamente
formalizado em um documento escrito, antes de sua difusão final.

Denominamos Relatório de Inteligência Policial (RELINT) ao documento empregado para se


veicular conhecimentos de Inteligência.

A atividade de Inteligência Policial adota um conjunto de elementos textuais e macrotextuais com o


objetivo de assegurar a autenticidade e facilitar a elaboração dos Relatórios de Inteligência. Vejamos
a seguir quais são esses elementos:

Classificação sigilosa
Consiste na atribuição de um grau de sigilo ao Relatório de Inteligência Policial, conforme as normas
internas do órgão ao qual pertence a unidade de Inteligência e de acordo com a legislação vigente.
Esta indicação deve ser grafada na cor vermelha e inserida em uma moldura de cor idêntica, em
letras maiúsculas, de forma centralizada, no topo e no rodapé de todas as páginas.

Observe que se não houver classificação sigilosa (documentos ostensivos) não há a necessidade de
se grafar nada nesse campo.

Numeração de páginas
O número da página do documento é sempre indicado no seguinte formato: (número da página
atual) / (número total de páginas do documento), ambos separados por uma barra. Esta forma
de numeração permite ao destinatário final do RELINT identificar de forma rápida a ausência de
alguma página que tenha sido destacada do documento.

Indicação do órgão e das unidades


hierarquicamente superiores
Logo abaixo do respectivo logotipo, deve-se grafar o nome do órgão ao qual pertence a unidade de
Inteligência que produziu o conhecimento, bem como das unidades administrativas que lhe sejam
hierarquicamente superiores, os quais devem ser escritos por extenso, de forma centralizada e com
letras maiúsculas.

44
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE II

Indicação da unidade de Inteligência que


produziu o conhecimento
O nome da unidade de Inteligência que produziu o conhecimento também deve ser grafado por
extenso, de forma centralizada, com letras maiúsculas, logo abaixo de suas unidades hierarquicamente
superiores.

Tipo de conhecimento
Trata-se da indicação do tipo de conhecimento que esteja sendo veiculado pelo Relatório de
Inteligência Policial: Informe, Informação, Apreciação ou Estimativa.

Numeração do documento
Consiste na indicação do número do Relatório de Inteligência Policial, o qual deve ser atribuído pela
própria unidade que o produziu.

Data
Trata-se da data em que se finalizou a redação do Relatório de Inteligência Policial. Deve ser indicada
no seguinte formato: DD MMM AA. Ou seja, dois dígitos para o dia e o ano e três letras maiúsculas
para o mês, sendo que todos os campos são separados por um espaço.

Assunto
Trata-se do assunto elencado no Planejamento, ou seja, a expressão escolhida pelo analista para
sintetizar o conteúdo do conhecimento que foi produzido. Conforme alertam Santos e Franco
(2011) o analista deve ter cuidado para que o assunto reflita a realidade dos fatos abordados no
conhecimento produzido.

Difusão
Refere-se à autoridade para a qual será encaminhado o Relatório de Inteligência Policial. Havendo
mais de uma difusão, todas devem ser escritas neste campo.

Referência
Consiste na indicação de outros documentos de Inteligência que estejam relacionados com o
conhecimento que foi produzido.

45
UNIDADE II │ A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA INTELIGÊNCIA POLICIAL

Anexos
Refere-se à indicação de outros documentos ou objetos que acompanhem o conhecimento que foi
produzido (laudos, pareceres, mapas, fotografias etc.).

Indicação de continuidade
Todas as páginas, a partir da segunda, devem indicar que são continuação de um relatório específico.
Esta indicação deve ser escrita no topo da página, entre parênteses, abaixo da classificação sigilosa.

Estrutura do texto em um relatório de


inteligência policial
Com relação ao texto propriamente dito, as seguintes técnicas podem ser utilizadas na elaboração
dos conhecimentos de Inteligência:

»» Narração: consiste em um relato de fatos e acontecimentos, envolve ação e


movimento e pode abordar aspectos do passado e do presente. É empregada na
elaboração de conhecimentos do tipo Informe.

»» Dissertação: se caracteriza por uma exposição de ideias, seguidas da apresentação


de argumentos que as comprovem. É utilizada na elaboração dos seguintes
conhecimentos: Informação, Apreciação e Estimativa.

Os textos que apresentam uma estrutura dissertativa devem, obrigatoriamente, apresentar uma
conclusão ao final. Esta conclusão deve ser uma decorrência lógica dos fatos e acontecimentos
(premissas) que foram mencionados ao longo do texto.

46
CONTRA-
-INTELIGÊNCIA UNIDADE III
POLICIAL

Nos capítulos anteriores, vimos que a atividade de Inteligência Policial destina-se à obtenção de
dados e à sua respectiva transformação, por meio da aplicação de uma metodologia específica, em
conhecimentos que sejam úteis e oportunos ao assessoramento do processo decisório no âmbito das
organizações policiais.

Alguns dos conhecimentos produzidos pelo analista de Inteligência Policial certamente abordarão
temas de alta sensibilidade, com grande potencial para causar dano aos diversos atores envolvidos,
caso sejam divulgados de maneira indevida. Vejamos o exemplo a seguir:

Suponha que um analista de Inteligência de uma determinada unidade policial esteja produzindo
um conhecimento sobre a atuação de uma poderosa organização criminosa, com base em dados que
lhe são repassados por agentes infiltrados.

Dentre os dados que esse analista manipula constantemente, encontram-se o nome desses agentes,
bem como a estória-cobertura que eles adotam nesta operação.

Até aqui não há problema algum, não é mesmo?

Agora imagine que ao atender a um chamado para manutenção nos computadores da unidade de
Inteligência Policial, o técnico de uma empresa terceirizada de informática tenha acidentalmente
acessado os arquivos (que por erro do analista não estavam criptografados) relativos a esta operação.

Assustado com o conteúdo de um dos arquivos, o técnico da empresa terceirizada imediatamente


comunica o fato ao seu supervisor.

O supervisor, por curiosidade, solicita ao técnico que abra todos os outros arquivos que vieram da
referida unidade de Inteligência Policial.

Para a surpresa de ambos, todos os arquivos continham dados altamente sigilosos, como o nome e
o contato dos líderes da organização, e ainda dos agentes que operam infiltrados. Novamente, por
erro, esses dados não estavam criptografados.

Vamos supor agora que o supervisor, altamente preocupado com o ato que acabou de tomar e
pensando que vá ser demitido por ter feito tal solicitação ao técnico que era seu subordinado, resolva
comunicar o ocorrido ao diretor de sua empresa.

Até agora, quantas pessoas já tiveram acesso aos arquivos sigilosos?

»» o técnico em informática;

47
UNIDADE III │ CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL

»» o seu supervisor;

»» o diretor da empresa.

Pelo menos três pessoas, e isso considerando que todos tenham guardado o devido sigilo sobre o
ocorrido!

Mas a “informação” se espalha rapidamente.

Imagine o que poderia acontecer, por exemplo, se esta “informação” chegasse – de algum modo – ao
ouvido dos criminosos.

Caso esse exemplo ocorresse na realidade, você certamente concordaria comigo que toda a operação
estaria comprometida, e que a vida dos agentes que operam infiltrados estaria correndo um grave
perigo, não é verdade?

Pois bem, com este exemplo (que não está muito distante de fatos que já aconteceram na realidade),
eu quero ilustrar que os assuntos com os quais o analista de Inteligência Policial trabalha merecem
receber medidas especiais de proteção.

48
CAPÍTULO 1
Conceito de Contrainteligência Policial
e Aspectos Legais

A proteção dos dados e conhecimentos, conforme estudamos no capítulo 1 da unidade 1, é a ênfase


do trabalho desenvolvido por um segmento específico da atividade de Inteligência Policial, ao qual
designamos Contrainteligência Policial.

O risco aos dados e conhecimentos sensíveis pode ser expresso em função da existência de
vulnerabilidades (fragilidades internas da unidade policial) e ameaças (eventos ou agentes externos
que intencionem causar danos à unidade policial). A Contrainteligência Policial atuará nestes dois
fatores, procurando minimizá-los.

De um modo amplo, podemos dizer então que cabe à Contrainteligência Policial prevenir, detectar,
obstruir e neutralizar as ações adversas de qualquer natureza que constituam ameaça aos ativos da
organização policial.

Compartilhando esse mesmo entendimento Ferro Júnior (2008) conceitua a Contrainteligência


Policial da seguinte maneira:

Atividade que objetiva prevenir, detectar, obstruir e neutralizar atividade adversa e


ações de qualquer natureza que constituam ameaça à instituição policial, na proteção
da estrutura organizacional, das informações e dos conhecimentos produzidos de
interesse da Segurança Pública e do Estado.

Aspectos legais referentes ao tratamento dado


aos documentos sigilosos no Brasil
Os procedimentos que devem ser adotados no tratamento de documentos sigilosos são estabelecidos
em um conjunto de leis e decretos.

Recentemente houve a edição da Lei no 12.527/2011, conhecida como Lei de Acesso à Informação,
a qual provocou alterações significativas nestes procedimentos, ao revogar alguns dos dispositivos
que os regulamentavam.

Antes de estudarmos essas alterações de forma mais detalhada, é interessante consolidarmos alguns
conceitos importantes para a compreensão do assunto.

49
UNIDADE III │ CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL

Documentos Sigilosos
Incluem todos aqueles aos quais tenha sido atribuída uma classificação, de acordo com a legislação
vigente e as normas específicas de cada órgão.

Necessidade de Conhecer
Consiste em uma condição pessoal, inerente ao efetivo exercício de cargo, função, emprego ou
atividade, indispensável para que uma pessoa, possuidora de uma credencial de segurança de nível
igual ou superior ao conteúdo desejado, tenha acesso a dados ou conhecimentos sigilosos.

Compartimentação
É a restrição de acesso a dados ou conhecimentos sigilosos com base na Necessidade de Conhecer.
Trata-se de uma eficiente medida de segurança, capaz de minimizar os danos resultantes de um
eventual vazamento.

Comprometimento
Consiste na perda de segurança resultante do acesso não autorizado a dados ou conhecimentos
sigilosos. Um documento sigiloso que foi acessado por uma pessoa não autorizada torna-se
comprometido. Do mesmo modo, a pessoa não autorizada que teve acesso ao documento sigiloso
fica comprometida com a preservação do sigilo do referido documento.

Vazamento
Consiste na divulgação pública e não autorizada de dados ou conhecimentos sigilosos. Perceba que
o comprometimento não implica necessariamente no vazamento de um documento sigiloso, uma
vez que este último implica necessariamente na divulgação pública do seu conteúdo.

Bem, agora que consolidamos esses conceitos iniciais, podemos nos aprofundar um pouco mais nas
alterações provocadas pela edição da Lei no 12.527/2011.

A Política Nacional de Arquivos Públicos e Privados, que trata do acesso e do sigilo dos
documentos públicos, foi definida pela Lei no 8.159/1991. Esta norma já previa, em seu artigo 23, a
edição de um decreto que regulamentasse as categorias de sigilo que deveriam ser obedecidas pelos
órgãos públicos na classificação dos seus documentos.

Vejamos o texto da Lei:

Art. 23 Decreto fixará as categorias de sigilo que deverão ser obedecidas pelos
órgãos públicos na classificação dos documentos por eles produzidos.
[Decreto Revogado]

50
CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE III

Este decreto levaria onze anos para ser editado. Trata-se do Decreto no 4.553/2002, o qual dispunha
sobre a salvaguarda de dados, informações, documentos e materiais sigilosos de interesse da
segurança da sociedade e do Estado, no âmbito da Administração Pública Federal.

O Decreto no 4.553/2002 previa, no §1o, do seu Artigo 37, a incidência de sanções para eventuais
divulgações de documentos sigilosos (vazamentos). Vejamos:

Art. 37

§1o Todo aquele que tiver conhecimento, nos termos deste Decreto, de assuntos
sigilosos fica sujeito às sanções administrativas, civis e penais decorrentes da
eventual divulgação dos mesmos.

Outro dispositivo que merecia destaque no Decreto no 4.553/2002 era o seu Artigo 65, o qual
estabelecia que toda e qualquer pessoa que tomasse conhecimento de documento sigiloso ficaria
automaticamente responsável pela preservação do seu sigilo. Tratava-se, por assim dizer, de uma
regulamentação do comprometimento que acabamos de estudar anteriormente.

Vejamos o que dizia o texto do Artigo 65 do Decreto no 4.553/2012:

Art. 65 Toda e qualquer pessoa que tome conhecimento de documento sigiloso,


nos termos deste Decreto fica, automaticamente, responsável pela preservação
do seu sigilo.

Creio que vocês tenham percebido o quanto o Decreto no 4.553/2002 era importante para os
profissionais que trabalhavam diretamente com assuntos sigilosos, não é mesmo?

De fato, tal era a sua importância, que em vários documentos de Inteligência os trechos mencionados
acima apareciam expressamente, na forma de notas de confidencialidade.

Contudo, é importante que você saiba que o Decreto no 4.553/2002 perdeu absolutamente a sua
eficácia, tendo sido tacitamente revogado com a entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação.

Isso ocorreu porque a Lei no 12.527/2011, em seu Artigo 46, revogou expressamente os Artigos 22
a 24 da Lei no 8.159/1991. Recordemos, como visto anteriormente, que o Decreto no 4.553/2002
regulamentava especificamente o Artigo 23 desta Lei.

Vejamos então o que diz o texto do Artigo 46 da Lei de Acesso à Informação:

Art. 46 Revogam-se:

I – a Lei no 11.111, de 5 de maio de 2005;

II – os arts. 22 a 24 da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991.

Para suprir a lacuna decorrente da revogação do Decreto no 4.553/2002, houve a edição do Decreto
no 7.845/2012, o qual apresenta, dentre outras, as seguintes inovações:

51
UNIDADE III │ CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL

»» Algoritmo de Estado: função matemática utilizada na cifração e na decifração,


desenvolvido pelo Estado, para uso exclusivo em interesse do serviço de órgãos ou
entidades do Poder Executivo Federal;

»» Código de indexação: código alfanumérico que indexa documento com


informação classificada em qualquer grau de sigilo;

»» Órgão de registro nível 1: ministério ou órgão de nível equivalente habilitado


pelo Núcleo de Segurança e Credenciamento;

»» Órgão de registro nível 2: órgão ou entidade pública vinculada a órgão de


registro nível 1 e por este habilitado;

»» Posto de controle: unidade de órgão ou entidade pública ou privada, habilitada,


responsável pelo armazenamento de informação classificada em qualquer grau de
sigilo.

A Lei no 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação) revogou tacitamente o Decreto


no 4.553/2002, que regulava o tratamento dispensado aos documentos sigilosos
no Brasil. Para suprir a lacuna deixada por esse ato, houve a edição do Decreto no
7.845/2012, o qual trouxe algumas inovações em relação à norma anterior.

52
CAPÍTULO 2
Ramos da contrainteligência policial: a
segurança orgânica

Aprofundando um pouco mais o nosso estudo sobre a Contrainteligência Policial, trataremos agora
da chamada Segurança Orgânica.

Preliminarmente, cumpre destacar que a Contrainteligência Policial encontra-se estruturada em


dois ramos distintos, os quais compreendem, respectivamente, um conjunto de medidas passivas
e outro de medidas ativas.

Enquanto as medidas passivas apresentam um caráter eminentemente defensivo, e têm como


finalidade prevenir e obstruir as ações adversas de qualquer natureza que tenham como alvo o
conhecimento sensível da organização policial; as medidas ativas, por outro lado, possuem um
caráter essencialmente ofensivo, e destinam-se a detectar e neutralizar essas mesmas ações adversas.

O ramo que corresponde às medidas passivas da Contrainteligência Policial é usualmente


denominado como Segurança Orgânica.

Vejamos agora como a Segurança Orgânica pode ser empregada para minimizar as vulnerabilidades
de uma organização policial e, consequentemente, dificultar a materialização de eventos danosos
que tenham como alvo o conhecimento sensível desta organização.

De acordo com a classificação apresentada por Ferro Júnior (2008), a Segurança Orgânica
compreende os seguintes grupos de medidas:

»» Segurança do Pessoal.

»» Segurança das Áreas e Instalações.

»» Segurança da Documentação e do Material.

»» Segurança dos Sistemas de Informação.

»» Segurança da Comunicação.

Segurança do Pessoal
Esta é a mais importante de todas as medidas de Segurança Orgânica, uma vez que não se pode falar
em segurança sem se considerar o seu elemento mais fraco: o homem.

Geralmente, é mediante a exploração de pessoas desprovidas de uma cultura de segurança


institucional que os criminosos atuam para obter dados e conhecimentos sensíveis sobre as
organizações.

53
UNIDADE III │ CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL

Nesse sentido, deve-se assegurar a salvaguarda dos conhecimentos sensíveis evitando que sejam
expostos a pessoas que não tenham a devida necessidade de conhecer.

Deve-se ainda identificar todas as pessoas que, em algum momento, possam ter contato com
os dados e conhecimentos sensíveis da organização. Essas pessoas devem assinar termos de
confidencialidade, comprometendo-se a manter o devido sigilo em relação aos assuntos sigilosos
com os quais venham a ter contato.

Segurança das Áreas e Instalações


De acordo com Ferro Júnior (2008), objetiva promover a segurança física dos locais onde são
realizadas as atividades policiais.

Após identificar, classificar e delimitar quais são as áreas sensíveis da organização, deve-se
assegurar que elas estejam devidamente protegidas por meio da adequada implantação de barreiras
e mecanismos eficientes de controle de acesso.

Segurança da Documentação e do Material


Objetiva proteger os documentos e materiais sigilosos da organização. Os seus procedimentos
incidem sobre todas as fases de existência dos documentos.

Segundo Ferro Júnior (2008) as principais ameaças aos documentos e materiais sigilosos advêm da
ação do crime organizado, comprometendo a segurança da instituição policial.

A Segurança da Documentação e do Material compreende os seguintes procedimentos:

a. Segurança na Produção.

b. Segurança na Remessa e no Recebimento.

c. Segurança no Manuseio.

d. Segurança no Arquivamento.

e. Segurança na Destruição.

Implica ainda um cuidado especial para evitar a produção do chamado lixo classificado, ou seja, de
eventuais rejeitos que contenham dados ou conhecimentos sensíveis sobre a organização policial.

Segurança dos Sistemas de Informação


Objetiva promover a salvaguarda dos sistemas que contenham dados ou conhecimentos sensíveis
da organização policial.

54
CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE III

Implica a sensibilização dos usuários quanto aos critérios de escolha, utilização e alteração de senhas
(política de senhas), as quais devem possuir diferentes níveis de acesso com base nos conceitos de
compartimentação e necessidade de conhecer, apresentados no capítulo anterior.

Abrange ainda a proteção de dados e conhecimentos sensíveis por recursos de criptografia, bem
como a implantação de uma adequada política de backups que proteja os arquivos da organização
policial contra a ocorrência de sinistros, como incêndios ou sabotagens, por exemplo.

Segurança da Comunicação
Objetiva assegurar a salvaguarda dos meios de comunicação empregados pela organização policial.

Compreende as regras de segurança para o tráfego de dados pela internet, bem como o uso de
dispositivos que assegurem uma comunicação segura por rádio ou telefone.

Implica ainda, em determinados ambientes, o uso de sistemas bloqueadores como forma de se


impedir o vazamento indevido de dados ou conhecimentos sensíveis da organização policial.

Estudo de caso
O caso que reproduziremos a seguir é real. Ocorreu na Secretaria de Segurança Pública do Rio de
Janeiro:

3/4/2011 22h51

Falso coronel revela como enganou a polícia


do Rio e chegou à Secretaria
Carlos da Cruz Sampaio Júnior chegou a ser coordenador de subsecretaria.

Em entrevista exclusiva, ele conta que nunca cursou a Academia Militar.

Do G1, com informações do Fantástico

Para Carlos da Cruz Sampaio Júnior, o Exército era um sonho de infância. Quando
jovem, ele tentou entrar para a Academia Militar, mas não passou no teste. “Eu acho
que uma série de fatores de natureza pessoal me levaram a não chegar na Academia
Militar. Tentei. Mas acabou que ficou esquecido”, conta o homem que se fez passar
por coronel e conseguiu enganar a Polícia Militar, a Polícia Civil e a Secretaria de
Segurança do Rio de Janeiro.

Entrevistado com exclusividade para o “Fantástico”, Carlos Sampaio conta como


conseguiu chegar a ocupar o cargo de coordenador da subsecretaria de Planejamento
e Integração Operacional da Secretaria de Segurança do Rio  sem nunca ter cursado

55
UNIDADE III │ CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL

a Academia Militar por um único dia e nem mesmo ter concluído o bacharelado em
Direito, sua segunda opção profissional.

Após permanecer no cargo por três meses, o falso coronel foi finalmente descoberto
pelo secretário José Mariano Beltrame e acabou sendo preso em outubro de 2010.

O início da falsa carreira

Depois de largar a faculdade de direito, Carlos da Cruz Sampaio Júnior se tornou


funcionário do Zoológico do Rio, na área administrativa. Foi ali que o homem que
iria virar coronel sem nem ser do Exército teve o primeiro contato profissional com
a organização de um esquema de segurança. “Eu refiz o plano de segurança do
zoológico, criei uma série de barreiras. Eu questionava tanto a eficiência da empresa
de segurança, que quando pedi a exoneração do zoológico por motivos pessoais fui
convidado a participar de uma empresa de segurança em 98”, conta.

Carlos Sampaio ainda trabalhou com esportes de aventura, limpeza predial, até
conseguir um emprego na Secretaria de Segurança. Era um trabalho administrativo,
como assessor do subsecretario. Mas ele queria mais.

Aficionado pelo tema, estudou livros sobre segurança e manuais de polícias de


diversos países, inclusive manuais russos, idioma que ele diz ter aprendido na internet.
Depois de três anos, elaborou seu próprio projeto para melhorar o patrulhamento
nas ruas. “Eu desenvolvi um sistema de controle de indicadores criminais e aplicação
operacional destes indicadores”, diz o falso militar. “Apresentei esse projeto e
absolutamente ninguém se interessou por ele”, lembra.

“Existe um termo pejorativo que se chama ‘PI’, pé inchado, é aquele cidadão que
não é policial civil, nem militar. Constantemente fui chamado de ‘PI’. De certa forma
ofende, claro que ofende”, contou. Com a troca de governo, ele deixou a secretaria,
mas não a ideia de implantar seu sistema de segurança.

Três anos depois, em 2009, voltou à ativa, agora diretamente na organização do


patrulhamento das ruas. Sob a falsa patente de major, Sampaio apresentou seu
projeto ao 6o BPM (Tijuca), responsável pelo policiamento em vários bairros da
Zona Norte do Rio. Depois de três meses, ele decidiu “se promover” e trocou major
por tenente-coronel. “Quando você passa a ser tenente coronel e apresenta o seu
trabalho, nossa, todo mundo diz amém e funciona”, brinca.

A ascensão

Daí em diante, a carreira deslanchou. O falso coronel implantou seu projeto em


outros três batalhões e começou a ser requisitado para palestras. Ele planejava o
policiamento, redistribuía carros da polícia pelos bairros e treinava agentes. Chegou
a comandar, armado, operações nas ruas.

56
CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE III

A popularidade de Sampaio cresceu tanto que ele foi convidado a trabalhar na


Secretaria de Segurança. O militar que nunca existiu apresentava um currículo
que incluía curso na Academia das Agulhas Negras, comando de um batalhão de
fronteira, na Amazônia, e até a Guarda Presidencial. Tudo mentira.

Na carteira do Exército, Carlos Sampaio tinha uma foto com farda de gala. “Não
falsifiquei. Criei. É diferente, porque você falsificar é pegar qualquer documentação
e transformar os dados, eu simplesmente editei a carteira toda no Photoshop. Então,
eu criei. Não é uma falsificação? Isso aí depende do seu ponto de vista”, diz.

Depois que Sampaio foi preso, a polícia analisou o documento. Encontrou dez erros
grosseiros, como a data de validade, até 2031. Em um documento do Exército ela
seria indeterminada. Quem assina a carteira é um capitão, o que não aconteceria
na identidade de um coronel. E até o próprio posto, tenente-coronel está escrito
errado, sem hífen. Mesmo com erros tão básicos ninguém na secretaria percebeu a
falsificação.

O falso coronel conta que não teve que apresentar nenhum documento ao ser
contratado. “Eu já tinha uma série de documentações apresentadas na secretaria de
Segurança. Da primeira vez que eu havia estado lá. Você tem um cadastro lá. Eu já
tinha tudo lá, minha carteira, CPF, PIS, tinha tudo lá”, explica.

A nomeação para o cargo de coordenador da subsecretaria de Planejamento


e Integração Operacional foi assinada no dia 12 de julho de 2010 pelo secretário
de segurança, José Mariano Beltrame. Instalado no centro do comando, Sampaio
recebia informações dos batalhões, tinha reuniões com coronéis e fiscalizava
operações nas ruas.

Em agosto de 2010, chegou a participar de uma operação para prender traficantes


que tinham invadido um hotel em São Conrado, na Zona Sul do Rio. Sampaio
acompanhou a negociação para que os bandidos se entregassem e libertassem os
reféns. De colete, ele estava dentro da área de isolamento, na porta do hotel.

A queda

Em nota, a secretaria de Segurança afirma que Sampaio ficou três meses empregado
e que o serviço de inteligência precisou desse tempo para reunir provas suficientes
contra ele. No dia 7 de outubro, Beltrame procurou o Exército e descobriu que Carlos
Sampaio nunca tinha sido militar. Na semana seguinte, o falso coronel foi preso na
sala que ocupava na secretaria. Ele passou dois meses na prisão e agora responde
a processos de falsidade ideológica e porte ilegal de arma de uso restrito. Ele pode
pegar até seis anos de prisão.

Sampaio só lamenta que o seu projeto de policiamento não é mais seguido nos
batalhões. E resume como conseguiu passar tanto tempo enganando as pessoas. “Eu
acho que as pessoas acreditam na forma como você se coloca e o que você coloca.

57
UNIDADE III │ CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL

Se você chegar pra mim e falar que é o Presidente da República, souber se colocar
como presidente e se portar como tal e tiver representatividade e ter resultado como
tal, eu acredito. Eu podia me passar por presidente, você não”, brinca.

Tomando como referência o caso acima, e com base nas medidas de Segurança Orgânica apresentadas
anteriormente, responda:

1. Quais medidas você acredita que poderiam ter sido tomadas para que esse caso
não ocorresse? Justifique a sua resposta.

2. Você considera que este caso poderia ter resultado no vazamento ou


comprometimento de assuntos sigilosos? Justifique a sua resposta.

58
CAPÍTULO 3
Contraengenharia Social

Ao que tudo indica, a expressão engenharia social teria sido cunhada inicialmente pelo lendário
hacker americano, Kevin Mitnik.

Após ter sido preso e sentenciado nos Estados Unidos, hoje em dia Mitnik ganha a vida realizando
palestras e consultoria em Segurança da Informação.

De acordo com o que o próprio Mitnik relata em seu livro A Arte de Enganar, em muitos casos o
método que ele utilizou para obter as senhas que lhe permitiriam invadir sistemas corporativos foi,
simples. Perguntar!

Uma conversa inocente, um alvo desprevenido, alguns dados estratégicos obtidos anteriormente
etc. E tudo o que ele precisava saber lhe era repassado sem dificuldade.

O caso Robin Sage


Na verdade, as habilidades relatadas por Mitnik são constantemente utilizadas por criminosos com
o objetivo de planejar e viabilizar a prática de atos delituosos.

A maior parte das vítimas de engenharia social possui uma característica em comum:
não se visualizava como um alvo

Ao analisar casos de pessoas que foram alvo de atos dessa natureza, percebemos com facilidade que
a não percepção do risco foi um fator crucial para que elas não detectassem que estavam sendo
exploradas por engenheiros sociais.

Em 2009, Thomas Ryan, um analista de ameaças cibernéticas, resolveu fazer uma experiência.
Ele queria identificar se os profissionais da comunidade norte-americana de Inteligência estavam
realmente protegidos contra ataques de engenharia social.

Ryan criou então um falso perfil, ao qual denominou Robin Sage.

Utilizando a foto de uma mulher atraente, a qual havia encontrado na internet, Ryan inseriu este
falso perfil em diversas redes sociais, sempre associando o nome de Robin Sage a eventos na área
de Inteligência e Segurança.

Não demorou muito tempo para que diversos membros da comunidade norte-americana de
Inteligência entrassem em contato, revelassem os seus verdadeiros nomes, o local onde trabalhavam
e as atividades que desenvolviam em suas respectivas unidades.

59
UNIDADE III │ CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL

Figura 2.

O caso Robin Sage se tornou emblemático e revelou que, mesmo profissionais que tratavam
diretamente com assuntos sigilosos, não estavam devidamente preparados para lidar com ataques
de engenharia social.

Existe uma máxima em segurança que diz: “uma corrente é tão resistente quanto o seu elo mais
fraco”. Desse modo, devemos trabalhar constantemente para desenvolver e manter uma cultura de
segurança no âmbito de nossa organização.

Obviamente, de nada adianta uma unidade de Inteligência Policial adotar os mais modernos
procedimentos de segurança da informação, se os seus agentes não estão devidamente preparados
para se defender contra ataques dessa natureza.

Pense na forma como você se comporta em seu dia a dia, e tente descobrir se você
está protegido contra ataques de engenharia social.

O que é engenharia social?


Para a atividade de Inteligência Policial, a engenharia social pode ser definida como:

Um conjunto de métodos utilizados para enganar, manipular ou explorar a


confiança de pessoas, para obter informações privilegiadas que facilitem o acesso
não autorizado a sistemas corporativos.

60
CONTRAINTELIGÊNCIA POLICIAL │ UNIDADE III

E qual é o perfil de um engenheiro social?


Praticantes de engenharia social sempre se destacam pelas seguintes características:

»» simpatia;

»» gentileza;

»» inteligência;

»» versatilidade.

E como posso me proteger contra ataques de


engenharia social?
Os seguintes procedimentos devem ser adotados:

1. Conscientize-se de que você pode ser um alvo.

2. Sensibilize os seus colegas de trabalho sobre o assunto.

3. Aplique medidas de segurança orgânica.

4. Aplique os conceitos de compartimentação e necessidade de conhecer.

5. Monitore constantemente os interesses adversos.

61
PARA (NÃO) FINALIZAR

Considerada por muitos autores como a segunda “profissão” mais antiga do mundo, a atividade
de Inteligência acompanha o homem desde os primórdios da civilização, sempre se adaptando às
características próprias de cada época.

Na atualidade, onde a criminalidade se manifesta de forma estruturada e empregando tecnologias


cada vez mais modernas, a atividade de Inteligência Policial revela-se como uma ferramenta
extremamente eficaz no combate aos delitos de alta complexidade.

Nos últimos anos, a mídia vem retratando os diversos embates travados pelo Estado brasileiro
no intuito de recuperar áreas que haviam sido absolutamente tomadas por grupos criminosos.
O sucesso nesses confrontos deve-se, em grande parte, aos conhecimentos produzidos pelas
unidades de Inteligência Policial, sem os quais o planejamento e a execução dessas ações estariam
significativamente comprometidos.

Como em um jogo de xadrez, onde vence quem consegue visualizar o maior número de jogadas a
frente, a Inteligência Policial procura antecipar-se às ações criminosas, identificando tendências e
padrões, de forma a direcionar, da melhor maneira possível, os recursos das organizações policiais.

Quais serão as características da criminalidade que enfrentaremos nos próximos anos? Como podemos
nos preparar para enfrentá-la? Esse deve ser o pensamento de um gestor que conta com o suporte de
uma unidade de Inteligência Policial na estrutura de sua respectiva organização.

Espero que este material tenha contribuído, ainda que minimamente, para demonstrar o valor e a
importância da Inteligência Policial nos dias atuais.

INTELIGÊNCIA!

62
REFERÊNCIAS

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Importância para a Investigação Policial. Revista da Associação dos Delegados de Polícia do
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