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TEXTO PARA DISCUSSÃO

MERCADOS ILÍCITOS TRANSNACIONAIS, CRIME ORGANIZADO E SEU IMPACTO NA REGIÃO DAS


AMÉRICAS

Leandro Piquet Carneiro

Roberto Troncon

Fabio R. Bechara

Cristian Gabriel Taboada

João Henrique Martins


S​OBRE​ ​OS​ ​AUTORES​:

Leandro Piquet Carneiro: Professor do Instituto de Relações Internacionais – Universidade


de São Paulo.

Roberto Troncon: Delegado de Polícia Federal (1995-2020, aposentado); Gerente Sênior de


Segurança Estratégica Coca-Cola Brasil.

Fabio R. Bechara: Professor da Faculdade de Direito Universidade Presbiteriana Mackenzie


de São Paulo e Ministério Público de São Paulo

Cristian Gabriel Taboada: Chefe da Seção de Segurança e Justiça da Organização dos


Estados Americanos.

João Henrique Martins: Investigador do Centro de Investigação de Políticas Públicas da


Universidade de São Paulo.
Sumário

1 Introdução 1
2 Ações baseadas em incentivos e a dinâmica dos mercados ilícitos 2
3 Mercados ilícitos locais, nacionais e transnacionais 4
4 Definição de “organização criminosa” nas convenções internacionais e na lei 7
5 Como colocar esses conceitos em prática no trabalho policial? 13
6 A relação entre mercados ilícitos e crime organizado 17
6.1 Drogas 20
6.2 Armas 23
6.3 Tráfico de pessoas e contrabando de migrantes 25
6.4 Novos mercados ilícitos 26
7 Crime organizado e terrorismo 27
8​ Comentários finais 30
Bibliografia 34
Mercados Ilícitos Transnacionais, Crime Organizado e seu impacto na região das Américas 37
1 Introdução

Este texto integra o acervo didático do curso de extensão Segurança Multidimensional


nas Fronteiras, Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo.
Abordaremos a seguir dois problemas diretamente relacionados: o funcionamento dos
mercados ilícitos e o crime organizado. Juntos, eles representam uma nova ameaça ao
sistema de segurança pública e defesa nacional dos países da região das Américas.

Organizações criminosas surgem e atuam nos mercados de bens e serviços que, de


acordo com as leis do país, são considerados ilícitos. Os bens e serviços comercializados
ilicitamente têm natureza muito diversa, tais como: produtos industrializados falsificados,
drogas como a maconha e a cocaína, prostituição, armas e munições, espécies animais, para
citar alguns exemplos.

A comercialização desses produtos viola regulamentos impostos pelo Estado, como a


lei penal, leis sanitárias, ambientais e de racionamento, leis contra certos produtos e
serviços e a regulação do sistema financeiro. Esse problema é monitorado por vários
organismos internacionais. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) organizou, em 2013, uma força conjunta com o objetivo de conter em
escala global a expansão do comércio ilícito. Essa força conjunta já realizou cinco reuniões
anuais e publicou diversos relatórios e estudos sobre o problema​1

Em resumo, quando falamos “mercados ilícitos”, queremos descrever um tipo de


atividade econômica na qual se identifica a presença de uma ou mais das seguintes
operações:

1
Link para o site da OCDE: ​http://www.oecd.org/governance/risk/oecdtaskforceoncounteringillicittrade.htm
acesso em 28/11/2020.

1
1. produção, distribuição, venda e compra de produtos e serviços proibidos,
como narcóticos, animais silvestres e comércio sexual;

2. venda irregular de ​commodities​, como antiguidades e pedras preciosas, de


produtos que infrinjam os direitos intelectuais e de produtos não adequados aos
padrões dos códigos locais;

3. venda de produtos fora de seu mercado de destino, sem pagar os impostos de


importação e de consumo local, como cigarros e bebidas alcoólicas;

4. venda de mercadorias roubadas, como carros e eletrônicos.

Se há algum tipo de demanda, haverá sempre alguém ou alguma organização dedicada a


atender essa demanda. A organização dos mercados ilícitos, a formação de preços e o
comportamento dos grupos criminosos que atuam nesses mercados podem ser analisados
segundo um modelo econômico de custos e benefícios.

Existem muitas teorias que explicam o comportamento criminoso. Neste módulo,


assumiremos que criminosos respondem a incentivos: calculam o custo e o benefício de
cada ação e decidem como vão agir. Precisamos entender quais incentivos são esses e como
são produzidos.

2 Ações baseadas em incentivos e a dinâmica dos mercados ilícitos

Segue um exemplo para ilustrar o que é o comportamento baseado em incentivos. Pense


em uma organização criminosa local que se dedica ao furto e à comercialização de
automóveis. Uma inovação tecnológica que dificulte, por exemplo, a ignição do veículo no
momento do furto pode fazer com que esse negócio fique menos lucrativo, pois o custo em
termos de tempo investido para furtar o veículo aumenta muito, assim como o risco de ser
apanhado enquanto o crime é cometido. Portanto, a inovação tecnológica introduzida
funciona como um incentivo negativo para a organização criminosa. Isso não acaba com o
crime, mas muda o comportamento dos infratores. Sem alternativas de ganho, a
organização que atua nesse nicho buscará atuar em outro ou deixará de existir.
Vamos falar um pouco mais sobre os diferentes mercados e bens ilícitos e tentar
entender o que eles têm em comum e como podem ser analisados.

A lei de cada país define o que é lícito ou ilícito produzir, comercializar e consumir. O
Uruguai foi o primeiro país do mundo a legalizar a produção, o comércio e o cultivo dos
diferentes tipos de ​cannabis​; portanto, é legal cultivar, portar, comercializar e consumir
uma substância que em todos os países vizinhos é proibida. Em alguns países do mundo, as
bebidas alcoólicas são proibidas; a cocaína já foi comercializada legalmente em todo o
mundo por quase setenta anos; a prostituição é tratada de forma muito diferente entre os
países. A legislação que regula e proíbe o comércio de determinados bens e serviços cria
também os mercados ilícitos.

Neste módulo, abordaremos o problema do crime organizado como um


empreendimento criminal contínuo que racionalmente busca o lucro com as atividades
ilícitas de grande demanda pública. Sua existência é mantida por meio do uso de força, de
ameaças ou da corrupção de funcionários públicos. Essa definição foi oferecida pelo
criminólogo Jay Albanese, um dos principais pesquisadores sobre o tema em atividade​2​.

A proibição de bens e serviços para os quais há demanda gera a possibilidade de ganhos


ilícitos e propicia o desenvolvimento de organizações que funcionam da mesma forma que
as firmas que se dedicam a atividades legais. Um destaque importante: um bem não precisa
ser proibido para se tornar objeto de interesse das organizações criminosas. As políticas de
racionamento também criam restrições que propiciam a atuação de organizações
criminosas, as quais se dedicam a equalizar a distribuição dos bens e serviços escassos. O
comércio desses bens burlando as leis de racionamento permite que as organizações
criminosas tenham ganhos cobrando mais do que os preços legais para garantir a oferta.

A proibição e o racionamento geram nichos de mercado nos quais organizações


criminosas burlam os controles legais e comercializam o bem ilícito ou escasso. Até mesmo
a taxação excessiva de alguns produtos, como cigarro e álcool, cria nichos para a atividade
ilícita, podendo propiciar a falsificação e o contrabando.

2
Outro criminólogo influente nesse debate é Klaus Von Lampe; ele construiu um ​website​ que reúne 200
definições de “crime organizado”: <http://www.organized-crime.de/organizedcrimedefinitions.htm​>​.
Os mercados ilícitos podem ser locais, nacionais ou transnacionais. Vamos ver alguns
exemplos.

3 Mercados ilícitos locais, nacionais e transnacionais

A atividade criminal segue uma lógica econômica, e a criminalidade cotidiana é


exercida por atores racionais, motivados por incentivos. Crimes como roubo, contrabando,
tráficos, falsificação, furto, descaminho, receptação, corrupção, latrocínio alimentam
mercados ilícitos, nacionais e transnacionais de diferentes dimensões e estrutura, formando
uma lucrativa economia ilícita global, geradora de externalidades negativas para a
sociedade.

A natureza econômica do crime já era destacada pelo economista Gary Becker ainda
em 1968: ​“Em geral, o ‘crime’ é uma atividade ou ‘indústria’ economicamente
importante, apesar da negligência quase total dos economistas.” ​(BECKER, 1968)​3​.

A economia de bens e serviços ilícitos conheceu uma expansão nos últimos trinta
anos, incentivada pela alta lucratividade​ p​ roporcionada pelas redes criminais que
viabilizam a oferta contínua de produtos e serviços ilegais, como o tráfico de drogas,
animais silvestres ou pessoas, órgãos humanos; de produtos lícitos desviados ou fabricados
na ilegalidade, como tabaco, armas, defensivos agrícolas, eletrônicos, alimentos, vestuário,
audiovisual, fertilizantes, automóveis, bebidas, medicamentos e combustíveis; ou de
serviços como TV a cabo, energia elétrica, entre outros com demanda garantida ou
crescente.

Trata-se, portanto, de um tipo de problema público complexo e crônico,


potencializado pela sua natureza eminentemente transnacional. O enfrentamento desse
problema exige polícias e órgão públicos de controle das atividades econômicas
modernizados e focados na produção de inteligência sobre as estruturas econômicas do

3
BECKER, G. S. Crime and Punishment: an Economic Approach. ​Journal of Political Economics​, n. 76,
1968.
crime transnacional, bem como o aprimoramento dos marcos e estruturas de regulação,
controle e fiscalização do comércio internacional.

A ​Task Force on Countering Illicit Trade da Organização para a Cooperação e


Desenvolvimento Econômico (OCDE), em seu relatório ​Converging Criminal Networks
(OECD, 2016), adotou, a partir da definição formulada por Willians (2015)​4​, um importante
parâmetro técnico para a classificação dos mercados ilícitos. Esses mercados podem ser
definidos a partir da presença, combinada ou isolada, da oferta coordenada de uma das
quatro categorias de produtos e serviços ilegais:

1. produtos e serviços proibidos, como narcóticos e comércio sexual;


2. venda irregular de ​commodities​, como antiguidades ou espécies nativas da
fauna e flora, produtos que infrinjam os direitos intelectuais (pirataria) e
produtos não adequados aos padrões locais;
3. venda de produtos fora de seu mercado de destino, sem pagar os impostos
de consumo local, como cigarros e álcool (contrabando e descaminho);
4. venda de mercadorias roubadas (ou furtadas), como carros e eletrônicos.

A definição de ​transnacionalidade ​é outro parâmetro técnico importante, que


depende da capacidade dos criminosos e suas “firmas” (organizações criminosas
funcionam, em parte, como as firmas do setor legal) de atuarem simultaneamente em vários
países. A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional definiu
a transnacionalidade quando o crime é cometido

1. em mais de um Estado;

2. em um Estado mas com preparação substancialmente feita em outro;

3. em um Estado com o estabelecimento da organização criminal do grupo


em outro Estado;

4
​WILLIANS, P. Crime, illicit markets, and money laundering, carnegie endowment. In: TASK FORCE ON COUNTERING
ILLICIT TRADE/ ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Converging Criminal Networks,
2015. p. 107. Disponível em: http://carnegieendowment.org/pdf/files/mgi-ch3.pdf. Acesso em: 20/07/2016.
4. em um Estado com efeitos substanciais em outro.

A oferta combinada de produtos (conceito 1) de forma transnacional (conceito 2)


permitiu a redução drástica dos custos e riscos logísticos das operações criminais de vários
mercados ilícitos.

Os mercados ilícitos tendem a reduzir o custo médio de suas operações​5 por meio da
formação de redes criminais, as quais fornecem, por exemplo, serviços de transporte,
proteção e informações. Essa nova forma de cooperação em rede permite que as
organizações criminosas ampliem o atendimento de novas demandas pelo
compartilhamento das cadeias logísticas e a terceirização de serviços (organizações
criminosas contratam outras organizações, ou indivíduos, para executar parte de sua cadeia
de produção e comercialização).

O sucesso das “firmas”, das organizações criminosas que operam os mercados


ilícitos depende da sua capacidade de controlar os custos de produção e transações e,
principalmente, minimizar os riscos das operações. Os governos, por meio do sistema de
justiça criminal, podem desestimular o crime à medida que alteram o custo de produção,
transporte e comercialização dos bens e serviços ilícitos, assim como atribuem impostos,
regulações e proibições de práticas aos setores legais da economia – a aplicação eficiente da
sanção penal é o fator determinante para o controle das atividades ilícitas. Quando o crime
se torna mais eficiente, a capacidade de controle e repressão pelo sistema de justiça
criminal ​precisa também aumentar sua eficiência, e na mesma velocidade. Como ensinava
Jeremy Bentham, já no século XIX (BENTHAM,1843)​6​,

[...] a lucratividade ou os ganhos de um crime são as forças que incentivam ou levam os


homens à delinquência; a dor e as perdas oriundas da punição são as forças usadas para
afastar os homens de realizar atos ilegais. Se as primeiras forças forem maiores do que as
segundas, o crime será realizado; se as segundas forças forem as maiores, racionalmente o
crime não acontecerá.

5
O principal componente do custo para as organizações criminosas que atuam nos mercados ilícitos é o risco
de serem detectadas pela polícia.
6
​Bentham, J. Principles of Penal Law, 1 Works, 399 p, 1843
4 Definição de “organização criminosa” nas convenções internacionais e na lei

Questões-chave para a seção:

Qual é o marco regulatório internacional do


crime organizado?
Como certos crimes são definidos
internacionalmente?
Que ferramentas eles nos fornecem na luta
contra o crime organizado?

A Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional


(Convenção de Palermo), e seus três protocolos​7​, apresenta a seguinte definição para o
conceito de “crime organizado”, com destaque a sua forma estrutural, como disposto no seu
art. 2º:

a) “grupo criminoso organizado” é um grupo estruturado de três ou mais pessoas,


existente há algum tempo e atuando de forma coordenada com o propósito de
cometer uma ou mais infrações graves, com a intenção de obter, direta ou
indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material;

b) “infração grave” é todo ato que constitua infração punível com uma pena de
privação de liberdade, cujo máximo não seja inferior a quatro anos ou com pena
superior;

c) “grupo estruturado” é grupo de pessoas formado de maneira não fortuita para a


prática imediata de uma infração, ainda que os seus membros não tenham funções
formalmente definidas, que não haja continuidade na sua composição e que não
disponha de uma estrutura elaborada.

7
Protocolo para prevenir, reprimir e punir o tráfico de pessoas, especialmente mulheres e crianças
(promulgado no Brasil como Decreto Presidencial n. 5.017 de 2004. Disponível em:
<​http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5017.htm​>); Protocolo contra o
contrabando de migrantes por terra, mar e ar (promulgado no Brasil como Decreto Presidencial n. 5.016 de
2004. Disponível em: <​http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5016.htm​>); e
Protocolo contra a fabricação e o tráfico ilícito de armas de fogo, suas partes e componentes e munições
(promulgado no Brasil como Decreto da Presidência da República n. 5.941 de 2006. Disponível em
<​http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/D5941.htm​>).
O conceito de “grupo estruturado” possibilita a diferenciação entre a associação de
duas ou mais pessoas que se unem de forma não permanente, com um vínculo temporário e
volátil, ​para a prática imediata de ilícito penal, punível com uma pena inferior a quatro
anos, e o grupo criminoso organizado, formado por três ou mais pessoas, com vínculo
associativo perene, para a prática de crimes graves, punidos com pena máxima de prisão
não inferior a quatro anos.

A definição ​apresentada na Convenção de Palermo permite desenvolver um


conceito geral sobre as organizações criminosas a partir da sistematização de seus
componentes principais:

1. apresentam e​ struturas ordenadas de coordenação​, n​ ão necessariamente na


forma tradicional com hierarquia rígida, podendo ser redes difusas e fluidas;

2. t​êm um caráter racional de exploração dos mercados ilícitos​, fundado no


cálculo do ganho em relação ao risco da atividade;

3. exploram ​as vantagens ilícitas d​ isponíveis de qualquer natureza


economicamente aferível, podendo ser um benefício ou privilégio;

4. apresentam capacidade de atuação supranacional de caráter transnacional​:


não respeitando as fronteiras dos Estados.​ 8

Esses quatro componentes permitem entender a Convenção de Palermo não apenas


como um marco normativo, mas como a base para uma teoria sobre o funcionamento dos
mercados ilícitos e do crime organizado. Segundo essa teoria, o crime organizado pode ser
entendido como um conjunto de agentes que buscam maximizar seus ganhos e que atuam
em um mercado global.

Há esforços importantes também no âmbito dos países da região das Américas, que
estão empenhados em tipificar o crime organizado em seus regulamentos internos e
promover a cooperação internacional para combater o crime organizado, compromisso
ratificado na Declaração sobre Segurança nas Américas de 2003​9​.
8
Conceito desenvolvido em WERNER, Guilherme Cunha. Teoria Interpretativa das Organizações
Criminosas: Conceito e Tipologia. In: ORGANIZAÇÕES Criminosas: Teoria e Hermenêutica da Lei n.º
12.850/2013. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2015.
9
Declaração sobre Segurança na Américas de 2003. Disponível em:
Nessa declaração, a OEA faz um chamado aos países membros para lutarem contra
o crime organizado transnacional por meio ​da plena implementação das obrigações
contraídas pelos Estados Partes na Convenção de Palermo e seus três protocolos, em
especial para que a lavagem de dinheiro, o tráfico ilícito de pessoas, a corrupção e outros
delitos conexos sejam criminalizados no hemisfério. A OEA preconiza, também, que os
países implementem leis que permitam ágil identificação, rastreamento, apreensão e
confisco dos bens e recursos financeiros obtidos por meio das infrações praticadas pelas
organizações criminosas.

A Declaração da OEA reconhece que os países da região estão expostos a “novas


ameaças” à segurança representadas pelo terrorismo, o crime organizado transnacional, as
drogas ilícitas, a corrupção, a lavagem de dinheiro, o tráfico ilícito de armas, o tráfico
humano e os crimes cibernéticos. As medidas contra essas ameaças estão contidas no Plano
de Ação Hemisférico contra o Crime Organizado Transnacional de 2006​10​, que propõe uma
série de ações com os objetivos de

1. prevenir e combater o crime organizado transnacional, com pleno respeito aos


direitos humanos, tomando como referência a Convenção de Palermo e seus
três protocolos;

2. aprofundar a cooperação internacional na prevenção, investigação e ações


judiciais relacionadas ao crime organizado transnacional;

3. incentivar a coordenação entre os respectivos órgãos da OEA com competência


em assuntos relacionados à luta contra o crime organizado transnacional, bem
como a cooperação entre eles e o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e
Crime (UNODC);

4. fortalecer as capacidades e habilidades nacionais, sub-regionais e regionais para


enfrentar o crime organizado transnacional.
<​http://www.dereitoshumanos.usp.br/index.php/OEA-Organiza%C3%A7%C3%A3o-dos-Estados-Americ
anos/declaracao-sobre-seguranca-nas-americas.html​>. Acesso em: 28 nov 2020.
10
Plano de Ação Hemisférico contra o Crime Organizado Internacional. Disponível em:
<http://www.oas.org/consejo/pr/resolucoes/res908.asp>. Acesso em: 28 nov 2020.
O respeito aos direitos humanos, a cooperação internacional, a coordenação e a
construção de capacidades institucionais são conceitos que fazem parte, portanto, do núcleo
de valores da nova doutrina de segurança multidimensional, da qual a OEA é uma das
vozes mais importantes na região.

Ainda no âmbito da Organização dos Estados Americanos, durante as seis


Reuniões de Ministros em Matéria de Segurança Pública das Américas, foram aprovadas
recomendações que explicitamente reconhecem a importância do fortalecimento da
cooperação entre seus países membros para se aprimorar o enfretamento da criminalidade
transnacional na região. Dentre as recomendações aprovadas, destacam-se as seguintes:

1. cooperação, coordenação e assistência técnica entre as instituições de


segurança pública dos Estados Membros, como meio adequado de resposta à
criminalidade, à violência e à insegurança;

2. desenvolvimento de mecanismos regionais e bilaterais de intercâmbio de


informações operacionais e/ou de inteligência com o fim de prevenir e
investigar, em conformidade com a legislação interna, a criminalidade
organizada transnacional e a insegurança que afetam o hemisfério;

3. fortalecimento da cooperação judicial que permita aos Estados Membros, em


conformidade com a legislação interna e as convenções internacionais
firmadas, dar uma resposta efetiva ao cometimento, à execução, ao
planejamento, à preparação ou ao financiamento de atos delitivos que atentem
contra a segurança pública;

4. estimular e consolidar as iniciativas de cooperação regional e sub-regional


entre as polícias em matéria de luta contra a criminalidade organizada
transnacional;

5. fomentar a cooperação bilateral e com organismos multilaterais de cooperação


e desenvolvimento, a fim de promover iniciativas de programas que incluam
segurança, justiça e desenvolvimento, na luta contra a criminalidade, a
violência e a insegurança.
A região também tem sido pioneira no combate a algumas manifestações específicas
do crime organizado: principalmente armas de fogo, tráfico de pessoas e de drogas. Em
1997, foi sancionada a Convenção Interamericana contra a Fabricação e o Tráfico Ilícitos
de Armas de Fogo, Munições, Explosivos e Outros Materiais Correlatos (CIFTA)​11​, um
instrumento regional que estabeleceu uma estrutura internacional com a prerrogativa de
conceder autorizações e licenças para exportação, importação e o trânsito de armas de fogo;
a obrigação de classificar como crime o tráfico e a fabricação ilícita de armas de fogo,
munições, explosivos e outros materiais correlatos; e o reforço no controle dos pontos de
importação e exportação desses produtos. O instrumento também facilita a cooperação e o
intercâmbio de informações e experiências entre os Estados Partes sobre armas de fogo.

A convenção entrou em vigor em 1998 e, desde então, os Estados Partes aprovaram


uma série de leis-modelo para facilitar a incorporação das obrigações assumidas no direito
interno dos países. No âmbito das Nações Unidas, em 2014, entrou em vigor o Tratado de
Comércio de Armas, que reforça muitas das medidas que a região vem adotando no âmbito
da Convenção Interamericana contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo.

Com relação ao Protocolo para prevenir, reprimir e punir o tráfico de pessoas,


especialmente mulheres e crianças, a região aprovou em 2015 o II Plano de Trabalho de
Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Hemisfério Ocidental 2015-2018​12​. O plano de
trabalho adota a definição de “tráfico de pessoas” do Protocolo das Nações Unidas,
entendendo esse crime como “[...] o recrutamento, transporte, transferência ou recepção de
pessoas, mediante o emprego de ameaça, violência ou outras formas de coerção, sequestro,
fraude, engano, abuso de poder ou da situação de vulnerabilidade da vítima ou ainda por
meio da concessão ou recebimento de pagamentos ou benefícios para obter o
consentimento de uma pessoa que tem autoridade sobre outra, para fins de exploração.”

11
​Convenção Interamericana Contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo, Munições,
Explosivos e Outros Materiais​. Disponível em:
<http://www.oas.org/juridico/portuguese/treaties/a-63.htm>. Acesso em: 28 nov 2020.

12
​Pl​ ano de Trabalho de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Hemisfério Ocidental (​2015-2018).
Disponível em : ​https://www.oas.org/csh/portuguese/traficopessoas.asp
Na mesma Reunião de Autoridades Nacionais em Matéria de Tráfico de Pessoas em
que foi aprovado o Plano de Trabalho 2015-2018, foi aprovada a “Declaração
Interamericana de Combate ao Tráfico de Pessoas” ou “Declaração de Brasília” (2014).

Em matéria de delito cibernético, em 2004, os Estados Membros da OEA aprovaram


a Estratégia Interamericana Integral de Combate às Ameaças à Segurança Cibernética. A
estratégia emprega uma abordagem abrangente para a construção de capacidades,
reconhecendo que a responsabilidade nacional e regional pela segurança cibernética recai
sobre uma ampla gama de entidades dos setores público e privado, que trabalham em
aspectos políticos e técnicos para proteger o ciberespaço. A estratégia visa ao
estabelecimento de grupos nacionais de “alerta, vigilância e prevenção”, também
conhecidos como Equipes de Resposta a Incidentes (CSIRT) em cada país; cria uma rede
de alerta hemisférica; promove o desenvolvimento de estratégias nacionais de segurança
cibernética e o desenvolvimento de uma cultura que permita o fortalecimento da segurança
cibernética no hemisfério.

Por fim, deve-se observar que o arcabouço jurídico internacional para


enfrentamento do tráfico ilícito de drogas é regido principalmente por três tratados
internacionais: a Convenção Única sobre Entorpecentes de 1961 (emendada em 1972), a
Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971 e a Convenção das Nações Unidas
contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas de 1988. Nesse
quesito, a região também esteve na vanguarda. Prova disso é a Declaração de Antígua, na
Guatemala, de 2013​13​, que visa “uma política integral frente ao problema mundial das
drogas nas Américas”, por meio da qual se questionou de forma construtiva a atuação da
abordagem tradicional dominante até então.

Conhecer o marco normativo internacional sobre os mercados ilícitos e o crime


organizado é fundamental para desenvolvermos uma visão mais abrangente dos fenômenos
que, como profissionais de segurança, temos que conhecer para poder prevenir e controlar.

13
Declaração de Antígua, na Guatemala​, de 2013.Disponível em:
<​https://www.oas.org/pt/centro_midia/nota_imprensa.asp?sCodigo=PG-010​>.
5 Como colocar esses conceitos em prática no trabalho policial?

Perguntas-chave para a seção:


Quais são as características dos grupos do crime organizado?
Que estruturas​ ​os grupos do crime organizado apresentam?

A partir da breve revisão apresentada sobre o marco normativo, é possível apontar


dois caminhos possíveis a orientar o esforço de mapeamento e diagnóstico da atuação de
grupos criminosos organizados ou organizações criminosas nos diferentes contextos
nacionais.

O primeiro deles coloca foco na organização criminosa em si: suas características


elementares, estrutura organizacional, divisão de tarefas, hierarquia, dentre outros aspectos
organizacionais e funcionais característicos. Este foi o caminho seguido nas primeiras
iniciativas contra a máfia, principalmente nos EUA, e segue como uma vertente importante
da literatura que se dedica a classificar e analisar o padrão organizacional dos grupos
criminosos​14​.

O segundo caminho, por sua vez, dirige seu foco para as atividades ilícitas e suas
externalidades. No primeiro caminho, identifica-se a organização e chega-se às atividades
ilícitas às quais a organização se dedica; no segundo caminho, que estamos seguindo como
linha principal do presente módulo, identifica-se a atividade ilícita e a partir daí chega-se à
organização ou às organizações que realizam essa atividade ou que dela se aproveitam de
alguma forma.

O crime organizado tem uma presença difusa em toda a Região, atuando em


atividades como tráfico de armas e drogas, roubo a bancos e de cargas, biopirataria,
contrabando de produtos falsificados e tráfico de pessoas. Há, também, extensas

14
Albanese (2011) aponta cinco espécies de grupos criminosos organizados: (a) hierarquia rígida: chefe
individual com uma forte disciplina interna com muitas divisões; (b) hierarquia descentralizada: estruturas
regionais, cada qual com a sua própria hierarquia e nível de autonomia; (c) conglomerado hierarquizado:
uma associação de grupos criminosos organizados; (d) grupo criminoso central: estrutura horizontal de
indivíduos que se autodescrevem como trabalhando para uma mesma organização; (e) rede criminosa
organizada: engajamento individual em atividades criminosas na modificação de alianças, não
necessariamente afiliadas a algum grupo criminoso, mas agindo de acordo com as suas respectivas
habilidades para realizar atividades ilícitas.
ramificações do crime organizado no comércio legal, no setor de serviços (incluindo os
serviços financeiros), na burocracia estatal, nas polícias e na política. Diante desse cenário,
fica evidente a necessidade de se buscar novas formas de análise do fenômeno e também da
adoção de novos modelos de organização, operação e articulação das forças de segurança,
principalmente por meio da maior interação entre os sistemas de inteligência e informação
das polícias, dos órgãos de controle interno, do Ministério Público, dentre outras instâncias,
com vistas a permitir a gestão estratégica do problema.

Como temos enfatizado, as organizações criminosas são muito diversificadas e


podem ser inicialmente identificadas como uma associação perene de indivíduos que visa
ao cometimento de atos ilícitos para obter vantagens econômicas da exploração de bens e
serviços ilícitos.

A aproximação do tema no âmbito do trabalho policial exige, no entanto, reflexões


adicionais sobre o uso do conceito de “crime organizado”, o qual é comumente empregado
como se denotasse um fenômeno claro e coerente, mas que de fato se trata de um conceito
temporalmente mutável e difuso (LAMPE 2003)​15​. Nos estudos acadêmicos sobre o tema,
encontramos exemplos de aplicação do conceito de “crime organizado” derivados de
diferentes modelos criminológicos e que refletem pontos de vistas muitas vezes conflitivos,
expondo a dificuldade de se conceber uma definição universalmente aceita do fenômeno
(LAMPE, 2016; NAYLOR, 2004)​16​.

Mesmo sem uma definição clara do que constitui o problema, as agências policiais
são chamadas a desenvolver análises prospectivas para entenderem e se prepararem
antecipadamente para enfrentarem as novas tendências, dinâmicas e ameaças advindas do
crime organizado.

Dessa forma, um caminho possível para se contornar a dificuldade posta pela falta
de um conceito compartilhado sobre o fenômeno do crime organizado é considerar a
atividade ilícita (o empreendimento e o mercado no qual os grupos criminosos atuam) e

15
​ Ver Lampe, 2003.

16
​Ver Naylor, 2004.
não somente a ​estrutura da organização como ponto de partida para a análise e
investigação policial.

Estudos científicos podem ajudar na reflexão sobre os desafios do trabalho policial


diante do problema do crime organizado. O sociólogo Howard Abadinsky (2000) destacou
as características centrais do crime organizado: (a) não apresenta objetivos políticos; (b)
organização hierarquizada; (c) participação de seus membros definida através das
qualidades individuais especificas; (d) formam uma ​subcultura,​ os participantes aceitam
padrões e regras comportamentais; (e) perpetuação da organização criminosa com a
agregação de novos membros; (f) uso da força e da corrupção visando à impunidade; (g)
especialização e divisão das tarefas; (h) monopólio das atividades ilícitas objetivando a
hegemonia; (i) comando através de normas e regras preestabelecidas. Essas características
guardam um paralelo com os elementos constitutivos do crime organizado indicados por
Donald R. Cressey.

As ideias defendidas por Abadinsky de que o crime organizado apresenta


necessariamente algum tipo de hierarquia e produz uma subcultura própria têm sido
questionadas nos trabalhos mais recentes sobre o tema. Nesse sentido, outro caminho que
começa a ser percorrido envolve a análise das ​redes criminais e o conceito de “vínculos
sociais que podem ser criminalmente explorados” ​(​criminally exploitable ties)​ ,
desenvolvido pelo criminólogo Klaus von Lampe em diferentes trabalhos ​17​. A vantagem
desse conceito é que ele pode ser empregado para analisar tanto agentes que são fixos na
sua conduta criminosa (criminosos de carreira e organizações criminosas de vários tipos)
quanto agentes que são híbridos (atuam em atividades legais e ilegais de forma simultânea
ou transitam de uma para outra em diferentes momentos).

Outra questão importante diz respeito à forma como se dá a mudança de escala das
organizações criminosas do âmbito local e nacional para o transnacional. Aqui também
existem visões conflitivas sobre esse processo: três modelos distintos podem ser utilizados
para explicar as mudanças na escala de operação.

17
​Ver Lampe 2003 y 2016.
O primeiro modelo pode ser descrito como o modelo evolucionário do crime
organizado​18​(LUPSHA, 1996; BEATTO E ZILLI, 2012).

, no qual as organizações criminosas evoluem desde o nível mais simples (gangues e


quadrilhas locais), no qual basicamente há uma relação de conflito permanente entre grupos
criminosos e desses com a polícia. No segundo estágio de evolução, algumas organizações
se mostram mais adaptadas ao ambiente social e criminal no qual atuam e se estabelecem
territorialmente (ou em algum segmento de atividade ilícita) como uma força dominante.
Em seguida, passam a “se envolver em modalidades criminosas mais complexas”
(BEATTO e ZILLI, 2012)​19​, como também a desenvolver relações parasitárias com as
organizações do Estado e da sociedade civil​20 . No último estágio de evolução, não apenas
as conexões criminais normalmente se expandem além das fronteiras nacionais como a
relação com o Estado sofre mudanças profundas no sentido de se tornar simbiótica.

O segundo modelo explora a relação entre crime e política de forma distinta do


modelo evolucionário: os grupos políticos representados no Estado exploram diretamente
as atividades ilícitas e “taxam” ilicitamente as organizações criminosas, com elas
estabelecendo um verdadeiro conluio (PIMENTEL, 2000)​21 . Há, portanto, uma relação
endógena entre o crime organizado e a elite político-econômica que explora a atividade
ilícita com o objetivo de obter moedas fortes, financiar campanhas e alavancar fundos para
investimentos privados em atividades lícitas. A passagem da escala local de operação para a
escala transnacional ocorre, nesse caso, como consequência de uma associação entre as
elites político-econômicas de Estados fracos ou falidos, por um lado, e as organizações
criminosas, por outro, que são economicamente exploradas ao mesmo tempo que são
apoiadas nas suas operações ilícitas.

Por fim, o terceiro modelo procura explicar a emergência do crime transnacional


como decorrente de um processo de formação de redes entre organizações criminosas locais
incentivadas por processos econômicos e tecnológicos como o aumento do comércio e das
18
Lupsha 1996; Beato y Zilli 2012; Pimentel 2000

19
​ ​Beato, Zilli 2012, p 91

20
Pimentel 2000, p. 56

21
Ibid., p 56
viagens internacionais e o crescimento e barateamento dos sistemas de informação e
comunicação via internet, telefones celulares, ​e-mails e redes sociais (LAMPE, 2003 E
​ .
2016) 22​

Organizações e redes criminais não são independentes, à medida que evoluem a


partir do território ou segmento em que estão inseridas. Isso significa dizer que
organizações criminosas locais não precisam necessariamente modificar suas estruturas
funcionais internas e “evoluir” para formas mais complexas de organização, mas podem
contribuir, a partir da conexão e do compartilhamento de recursos e operações, para a
produção de um ambiente criminal mais complexo e agressivo contra as organizações do
Estado e da sociedade.

Esses três modelos pretendem explicar como o crime se modifica


organizacionalmente e supera as fronteiras nacionais.

Outro problema distinto diz respeito à evolução dos mercados de bens e serviços
ilícitos. É evidente que as organizações criminosas e os mercados são entes
inter-relacionados, mas, no caso das atividades ilícitas em particular, há mais possibilidade
de observação do comportamento do mercado do que do comportamento e da estrutura
organizacional dos grupos criminais. Vejamos a magnitude e as características dos
principais mercados ilícitos na região.

6 A relação entre mercados ilícitos e crime organizado

Perguntas-chave para a seção:


Quais são as principais manifestações do crime organizado?
Como isso afeta cada país?
Que novas tendências podem ser identificadas?

22
​Lampe, 2003 e 2016.
Mercados ilícitos transnacionais são ou constituem-se a partir da oferta, em escalas
regional e internacional, de bens e serviços como drogas, armas, órgãos humanos, pessoas,
criptomoeda, serviços sexuais, animais silvestres e plantas, minérios, produtos roubados,
furtados, contrabandeados, falsificados ou pirateados. A oferta desses bens atende a uma
demanda crescente vinda de consumidores de diferentes países do mundo. Infratores se
organizam e se conectam em redes para atuar nesses mercados, utilizando-se da corrupção,
da violência e de ameaças contra agentes públicos e a sociedade. Essas atividades geram
também um fluxo de recursos financeiros que precisam ser reintroduzidos na economia
após serem “lavados”. Portanto, os mercados ilícitos e suas cadeias globais constituem um
problema público que precisa ser enfrentado e controlado de forma sistêmica. Não basta
atuar contra os crimes como o contrabando, o tráfico ou o roubo de carga isoladamente.
Tanto do ponto de vista prático, da investigação policial e da prevenção, quanto da análise
de inteligência, é preciso entender como se conectam os diferentes agentes envolvidos nas
cadeias logísticas dos mercados ilícitos. Essa é a forma principal pela qual os órgãos
policiais passaram a lidar com o problema dos novos tipos de crime globais, principalmente
desde os anos 2010.

Compreender a base econômica do problema criminal contemporâneo significa que


a polícia e a justiça criminal precisam redirecionar o foco de suas ações, hoje voltadas para
a conduta criminal do infrator e sua tipificação, para o quadro mais abrangente no qual se
desenvolve o crime. A função desempenhada pelo infrator em suas conexões com outros
agentes (que atuam em atividades lícitas ou ilícitas) precisa ser devidamente compreendida.

A emergência e o barateamento de novas tecnologias de comunicação, a


digitalização do dinheiro e a expansão do comércio internacional que a globalização
econômica viabilizou fizeram do comércio de bens e serviços ilícitos uma opção com
custos decrescentes e retornos crescente para a maioria dos criminosos em qualquer país do
mundo. Essa opção racional dos infratores pelos mercados ilícitos não significa que
estamos assistindo à substituição dos criminosos de antes por novos criminosos mais
capazes intelectualmente. As oportunidades mudaram, igualmente a escala dos ganhos e o
impacto na sociedade, mas o perfil dos infratores não mudou da mesma forma. Esses
continuam a ser recrutados nos grupos sociais de menor renda e entre segmentos
marginalizados em diferentes países do mundo e, além dessa presença persistente de fatores
como a pobreza e a falta de oportunidades econômicas como motores do engajamento no
crime, o gosto e a capacidade de exercer a trapaça e a violência​23 continuam a ser
pré-requisitos básicos para qualquer um que queira ter uma carreira nos novos negócios
ilícitos globais.

Devido à natureza clandestina dos mercados de bens e serviços ilícitos, há uma


grande dificuldade de se estabelecer suposições confiáveis sobre a magnitude e o
funcionamento desses mercados. As estimativas disponíveis diferem, muitas vezes, de
forma acentuada, embora possam oferecer algumas informações úteis para o trabalho de
inteligência e de investigação.

Para fins da análise que faremos a seguir, vamos classificar os mercados ilícitos
segundo suas cadeias de suprimentos. O primeiro grupo é constituído por bens e serviços
que são integralmente ilícitos, ou seja, toda a cadeia de produção e suprimentos, a entrada e
a venda desses bens e serviços nos países é ilícita, sem exceções. Esse é o caso das drogas e
do contrabando de cigarro, celulares, bebidas, entre outros. O segundo grupo é composto
por bens e serviços que são parcialmente lícitos. Nesse caso, os produtos foram fabricados
ou entraram no país de forma legal, mas foram roubados de seus donos (carros, relógios,
celulares, etc.) ou, após serem produzidos legalmente, foram comercializados de forma
ilícita (como no caso das armas de fogo, por exemplo).

Esses dois segmentos dos mercados ilícitos são altamente lucrativos, como veremos.

O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime publicou em 2011 a pesquisa
“Estimating Ilicit Financial Flows Resulting from Drug Trafficking and Other
Transnational Organized Crimes” (UNODC, 2011)​24​, em que examina a magnitude dos
fundos ilegais gerados pelas atividades ilícitas, a partir de parâmetros técnicos estabelecidos
pelo Fundo Monetário Internacional. Nesse estudo, os produtos ou receitas provenientes de
crimes somam aproximadamente 3,6% do Produto Interno Bruto global. Vejamos quais são
os principais segmentos dos mercados ilícitos globais e suas respectivas magnitudes.

23
​O comportamento violento e o gosto pela trapaça nas interações sociais são fatores associados à baixa
inteligência (FREEMAN, 2012)​.
24
UNODC, 2011. “Estimating Ilicit Financial Flows Resulting from Drug Trafficking and Other Transnational
Organized Crimes” .​ Disponível em:
<​https://www.unodc.org/documents/data-and-analysis/Studies/Illicit_financial_flows_2011_web.pdf​>
6.1 Drogas

A principal fonte de dados e informações sobre o problema global das drogas ilícitas
no mundo é o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, conhecido pela sigla em
inglês UNODC. Essa agência da ONU estima que aproximadamente 35,6 milhões de
pessoas no mundo sofrem algum tipo de problema de saúde associado ao consumo de
drogas.

Embora o valor do mercado de drogas ilícitas seja extremamente difícil de se


estimar (KILMER; PACULA, 2009), o UNODC avalia que o mercado ilícito das drogas
produziu uma receita equivalente a U$650 bilhões por ano na primeira década do novo
milênio, o que é equivalente a 1,5% do PIB global. Na maior parte, esses recursos são
lavados no sistema financeiro (aproximadamente 1% do PIB global, ou U$580 bilhões em
2009) e o restante é reinvestido nas próprias atividades ilícitas (UNODC, 2011). Os Estados
Unidos ainda são o maior mercado de cocaína no mundo: embora tenha ocorrido um
declínio importante entre 2006 e 2011, as pesquisas de epidemiológicas indicam que o
consumo da cocaína permanece em níveis muito altos naquele país (UNODC, 2020b, p.
25).

Na América do Sul, o consumo da cocaína também se apresenta como um problema


grave. Na região, segundo as estimativas do Relatório Mundial sobre Drogas 2020, 2,8
milhões de pessoas, ou quase 1% da população com idade entre 15 e 64 anos, fizeram uso
da cocaína no ano de 2018. O Brasil é o maior mercado de cocaína da América do Sul, com
quase 1,5 milhão de usuários de cocaína e “crack” no mesmo ano.

Segundo os dados disponíveis no Relatório Mundial sobre Drogas (2017),


aproximadamente um bilhão de pessoas, ou cerca de 15% da população global, usou drogas
pelo menos uma vez em 2015 (ano de referência da pesquisa). Ainda mais preocupante é o
fato de que cerca de 29,5 milhões desses usuários de drogas, ou 0,6% da população adulta
global, sofrem de transtornos de uso de drogas.

Com base nas pesquisas de prevalência de uso de drogas pela população, Reuter e
Greenfield (2001) estimaram o consumo ​per capita e, levando em conta o valor de varejo
da cocaína nos EUA e na Europa, construíram um intervalo com o valor mínimo de 35
bilhões e máximo de U$115 bilhões de gasto com a droga. Kilmer e Pacula (2009)
apresentam uma estimativa mais conservadora para a receita gerada pelo comércio
internacional de cocaína: entre U$7 e U$8 bilhões de dólares (p. 70).

As estimativas do UNODC são bem mais elevadas. Os lucros obtidos com a venda
da cocaína foram estimados, por essa agência, em U$84 bilhões de dólares para o ano de
2009, sendo que aproximadamente um bilhão corresponde aos custos de produção. A maior
parte dos lucros dessa cadeia produtiva foi gerada não na região produtora, a região andina
da América do Sul, mas na América do Norte e na Europa. Os cálculos derivados dessas
estimativas do tamanho do mercado e da estrutura do mercado sugerem que
aproximadamente 92% da receita proveniente da comercialização da cocaína no mundo
estiveram aptos para a lavagem em 2009. A pesquisa revela ainda que, do total mencionado
de U$84 bilhões de lucro, U$56 bilhões estão disponíveis para lavagem, sendo que, destes,
aproximadamente U$26 bilhões deixaram as jurisdições onde os lucros foram obtidos.

Outro mercado de drogas ilícitas de grande importância regional e global é o da


Cannabis.​ As estimativas globais do mercado de ​Cannabis apresentadas por Kilmer e
Pacula (2009), seguindo a mesma metodologia com base em dados de demanda, indicam
que o consumo global dessa droga é apenas a metade do valor estimado pelo UNODC. As
estimativas sobre a ​Cannabis são ainda mais precárias do que as que estão disponíveis para
a cocaína, devido ao fato de o cultivo dessa droga encontrar-se bastante disseminado no
mundo.

O World Drug Report de 2017 indica que 135​25 países no mundo relataram a
presença de cultivo ilícito da droga, sendo que na região das Américas, Canadá, EUA,
México, Paraguai, Colômbia e Brasil, entre outros países, produzem grande quantidade da
droga; aproximadamente 24% da produção mundial ocorrem na América do Sul, e 31%, na
​ (WORLD DRUG REPORT​, ​2017, Booklet 2, p. 39).
América do Norte 26​

25
World Drug Report, 2017; “​A estimativa do número de países é feita com base em um questionário em
que os Estados Membros informam sobre a existência de cultivo no próprio país e nos países do entorno.
“.​
26
​World Drug Report, 2017. Booklet 2, p. 39.
O relatório de 2017 confirma essa característica disseminada do cultivo da ​Cannabis
e a forte presença da droga na região das Américas. O Paraguai, segundo o WDR 2017, é o
primeiro país do mundo com maior número na erradicação de plantas de ​Cannabis,​ com 12
​ (WORLD DRUG REPORT​, ​2017)​ .​
milhões de pés erradicados 27​

As estimativas devem ser lidas com cautela. Embora ofereçam uma base útil para o
planejamento de ações de prevenção e controle do problema, segundo alguns especialistas,
esses procedimentos têm várias falhas metodológicas, principalmente em função do fato de
que o preço das drogas no varejo é estimado com base em uma média de uma distribuição
que apresenta grande variação (REUTER; GREENFIELD, 2001; ARKES, 2008;
PACULA, 2007). O preço de qualquer droga varia enormemente entre países e entre
cidades e regiões de um mesmo país​28​. A validade dessas estimativas globais do mercado
de bens e serviços ilícitos e a metodologia empregada são objeto de intensa disputa entre os
especialistas (NAYLOR, 2004; KILMER; PACULA, 2009).

Mesmo diante das dúvidas sobre a qualidade das estimativas oferecidas pelo
UNODC, há algumas vantagens na utilização desses dados em estudo sobre tendências e
principalmente na comparação entre países. Em primeiro lugar, os levantamentos
oferecidos pela UNODC apresentam metodologia padronizada para a mensuração (de
validade discutível, mas razoavelmente confiáveis) de aspectos como o cultivo e a
produção de drogas, entre outros, o que permite estabelecer comparações longitudinais
(como as que faremos a seguir) sobre a evolução de diversas atividades ilícitas. Em
segundo lugar, as estimativas do UNODC têm abrangência global, ao contrário dos estudos
acadêmicos, que geralmente apresentam estimativas pontuais baseadas em protocolos
metodológicos que dificilmente são aplicados em mais de um momento no tempo e em
mais de um país ou região. Em terceiro lugar, essas estimativas têm sido crescentemente
utilizadas na definição de estratégias governamentais diante do problema do crime
27
​World Drug Report, 2017, Dados Tabla “Cannabis cultivation, production and eradication, latest year
available from the period of 2011-2016. Disponível em:
<​https://www.unodc.org/wdr2017/field/6.3.1_Cannabis_cultivation_production_eradication.pdf​” >.

28
​Por exemplo, Reuters e Greenfield (2001) relatam estimativas sobre o preço da cocaína na Espanha:
entre 1988 e 1993, o preço teria caído de U$84 par​a U$44; enquanto na França, no mesmo período, teria
ocorrido um movimento contrário: um aumento de $72 para $107. Variações internas nos EUA mostram
também diferenças muito acentuadas. O preço da cocaína em Pittsburgh em 1992 era de U$80 contra
U$54 em Miami.
organizado. É claro que estimativas exageradas podem levar à alocação ineficiente de
recursos, mas são adequadas para se avaliar a motivação dos governos na definição de
políticas ou, no mínimo, para analisar a sensibilidade das lideranças políticas diante do
problema.

6.2 Armas

Nenhuma análise dos mercados ilícitos estaria completa sem uma referência ao
mercado de armas de fogo. Há uma conexão entre os mercados ilícitos de armas e drogas
que precisa ser detalhada analiticamente e que tem grande impacto na forma como a
distribuição da droga e o tráfico de armas ocorrem nas áreas urbanas. Os mercados ilícitos
de armas e drogas têm, no entanto, uma diferença importante: armas são produzidas
legalmente para então serem transferidas ao mercado ilegal em algum ponto do processo de
comercialização.

O valor global do comércio autorizado de armas de fogo foi estimado pela ONU em
US$5,8 bilhões no ano de 2013, um aumento de 17% em relação a 2012​29​. A análise de
tendências revelou que o valor do comércio global de armas leves e de pequeno porte quase
dobrou entre 2001 e 2011 (de US$2,38 bilhões para US$4,634 bilhões)​30​. A tabela 1 mostra
o peso que os EUA e o Brasil têm no comércio legal de armas entre os países da região das
Américas. Os EUA são os maiores exportadores e importadores de armas da região:
sozinhos, movimentam mais do que todos os demais países da região. O Brasil é o segundo
exportador e o quinto importador de armas leves na região das Américas e, globalmente,
está entre os dez maiores produtores mundiais de armas leves (SMALL ARMS SURVEY,
2016). O grande desafio das políticas para o setor não é propriamente o de regular o acesso
legal às armas, mas a capacidade de controle das transferências ilegais de armas. A zona
cinzenta entre o segmento legal e o comércio ilícito é o grande problema a ser enfrentado
pela legislação e pelas polícias.

29
PAVESI,I. In: ​Trade Update 2016: Tranfers and Transparency​. Small Arms Survey: Geneva, 2016. Disponível
em: <htttp://www.smallarmssurvey.org/fileadmin/docs/S-Trade-Update/SAS-Trade-Update.pdf> .
30
AUTHORIZED Trade. Small Arms Survey, Geneva, 2016. Disponível em:
<​http://www.smallarmssurvey.org/weapons-and-markets/transfers/authorized-trade.html>
Quadro 1

O mercado mundial de armas ilícitas tem passado por transformações importantes.


Os Estados Unidos e a Rússia já não dominam o mercado mundial de armas leves (como
ocorria durante o período da Guerra Fria), mas foram substituídos por países da África,
Ásia, e América Latina que desenvolveram suas próprias indústrias de armas e tornaram-se
exportadores globais importantes. Embora a maior parte dos negócios ocorra legalmente, o
fato é que a participação desses novos países produtores no mercado de armas alterou
substancialmente as cadeias logísticas dessa indústria e facilitou o processo de transferência
para o segmento ilegal.

O tráfico de armas leves é uma atividade ilícita global em expansão. Esse é um


mercado diretamente afetado pelas novas tecnologias disponíveis nas áreas de transporte,
comunicação e produção, as quais permitem que as armas de pequeno porte sejam
negociadas de forma muito mais fluida.

6.3 Tráfico de pessoas e contrabando de migrantes

O tráfico de pessoas deve ser analisado entre os grandes vetores das atividades
ilícitas globais. Essa atividade é considerada pelo Escritório das Nações Unidas sobre
Drogas e Crime como o terceiro maior comércio ilegal do mundo, somente atrás do tráfico
de armas e de drogas. Essa atividade geralmente é dividida em nichos específicos: (a) para
fins de exploração sexual do indivíduo; (b) para a realização de trabalhos escravos ou em
regime de semiescravidão: a finalidade é a utilização do indivíduo como mão de obra, sem
o seu consentimento; (c) para o tráfico de órgãos: quando há o transporte de indivíduos para
retirada de seus órgãos, seja por rapto, morte ou venda; (d) para a adoção de crianças:
compra e venda de menores para adoção ilegal; (e) fins militares: utilização de indivíduos
em conflitos armados; (f) tráfico de esposas, o que é diferente do tráfico sexual, pois a
finalidade deste tráfico é o fornecimento de mulheres para o casamento forçado a regiões
do mundo onde esse tipo de prática ocorre.

A organização não governamental norte-americana Polaris​31​, em parceria com o


Departamento de Estado dos Estados Unidos, apresentou o ​Human Trafficking Statistics​, no
qual identificou que 800 mil pessoas são traficadas através de fronteiras todos os anos e que
50% desse contingente são compostos por crianças e adolescentes. Estima-se que 1 milhão
de crianças são exploradas no comércio sexual anualmente, sendo 80% do sexo feminino, e
que quase a totalidade dos países é afetado pelo problema. O tráfico de pessoas gera
anualmente um montante de US$32 bilhões de receita.

Por sua vez, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima as vítimas do


trabalho forçado em todo o mundo em 21 milhões, das quais 11,4 milhões são mulheres e
meninas, gerando lucros de 150 bilhões por ano globalmente.

É importante notar que o tráfico de pessoas pode ocorrer tanto nacional quanto
internacionalmente. Grande parte dos negócios ligados ao tráfico de pessoas ocorre

31
HUMAN Trafficking Statistics. Polaris Project, Washington D. C., 2016. Disponível em:
<​http://www.polarisproject.org/human-trafficking/overview​>. Acesso em:28 de nov 2020.
localmente dentro dos países, sem a necessidade de cruzar fronteiras. Em relação ao
contrabando de migrantes, estima-se que mais de 232 milhões de pessoas em todo o mundo
são migrantes internacionais, dos quais 57,5 milhões vivem nas Américas. Destes, 19,15
milhões de pessoas vêm do México e da América Central, e estima-se que metade está sem
documentos pessoais. Este negócio ilícito traz lucros de US$6,6 trilhões por ano
globalmente​32​.

6.4 Novos mercados ilícitos

Novos mercados ilícitos têm-se mostrado extremamente dinâmicos e em forte


expansão. Os avanços da biotecnologia e a facilidade de se registrar marcas e patentes em
âmbito internacional têm facilitado, nos últimos anos, o contrabando de recursos biológicos
para fins comerciais ou científicos, atividade denominada “biopirataria”. A exemplo do que
ocorre no mercado das drogas, os dados sobre biopirataria têm baixa confiabilidade;
entretanto, os levantamentos disponíveis revelam prejuízos econômicos significativos.

Estima-se que 12 países no mundo concentram 70% de todas as espécies de


vertebrados, insetos e plantas conhecidas. Desses países, cinco estão na América Latina,
sendo o Brasil líder do ​ranking,​ com cerca de 150 mil espécies já pesquisadas e
catalogadas, ou 13% de todas as espécies de flora e fauna que existem no mundo. Porém,
ainda falta identificar até 90% desse potencial, o que torna o País alvo profícuo para a
atividade de diversos grupos organizados nessa atividade. O ​modus operandi tradicional
nesse setor envolve a apropriação indevida de espécies que ainda não são conhecidas e que,
portanto, demoram a ser reivindicadas por pesquisadores e empresas que atuam no País.

Quanto à extração ilegal de madeira, segundo estimativas de estudo do Banco


Mundial, esta atividade criminosa gera receitas entre US$10 e US$15 bilhões por ano em
todo o mundo (GONÇALVES, PANJER et al., 2012). Dados de estudos mais recentes, de
2014, apontam para valores ainda maiores, segundo os quais a indústria de madeira ilegal
movimenta em torno de US$100 bilhões por ano, representando cerca de 30% da atividade
​MANUEL, O.; MALLOY, M. In: ​Trabajo de instrucción. Seguridad y Migración en México y América
32

Central
de comércio de madeira mundial (GLOBAL INITIATIVE AGAINST TRANSNATIONAL
ORGANIZED CRIME, 2014).

Esses dados indicam que os governos e as sociedades, principalmente dos países em


desenvolvimento da região, enfrentam desafios muito concretos diante do aumento do
poder dos grupos criminosos que atuam nos principais mercados ilícitos globais.

Há um enorme acervo de informações disponível ​on-line sobre todas as atividades


ilícitas analisadas neste módulo, que pode e deve ser explorado no planejamento das ações
de prevenção e de investigação contra o crime organizado. Nosso objetivo foi o de
apresentar a morfologia geral do problema e induzir uma reflexão sobre as conexões
existentes entre as diversas atividades ilícitas, com o intuito de impulsionar o debate sobre
as políticas públicas de resposta ao fenômeno, o que faremos a seguir.

7 Crime organizado e terrorismo

Perguntas-chave para a seção:


Como o crime organizado e o terrorismo estão ligados?
Quais são as diferenças entre esses fenômenos?

O terrorismo, cuja classificação é variada, apresenta diversos pontos de


convergência com as organizações criminosas quanto à sua estruturação em cadeias
logísticas e à utilização das redes de lavagem de dinheiro. No entanto, os grupos terroristas
divergem das organizações criminosas quanto a sua motivação, finalidade e uso da
violência.

O caráter político do terrorismo é o ponto central para o enfrentamento da questão e


vem sendo abandonado como elemento caracterizador, tendência observada desde 1919
com a ​Convenção de Prevenção e Punição do Terrorismo editada pela ​Liga das Nações​33 e
destinada ao combate dos movimentos anarquistas do início do século XX. Desde então, as

33
A Liga das Nações, em 16 de novembro de 1937, promulgou a Convenção de Prevenção e Punição do
Terrorismo da Liga das Nações contra o terrorismo anárquico que assolava o continente europeu, e definiu o
terrorismo como sendo todos ​os ​atos criminosos dirigidos contra um Estado e com a intenção premeditada de
criar um estado de terror nas mentes de pessoas específicas ou de um grupo de pessoas ou do público em geral
(art. 1º), sendo os atos de terror especificados como aqueles aptos a atacar funcionários públicos, chefes de
Estado e seus familiares, bem como pôr em risco ou destruir as instalações públicas.
medidas ​antiterrorismo tendem a afastar tal característica, como pode ser observado na
postura adotada pela Organização das Nações Unidas, que identifica o terrorismo como

Qualquer ato intencional voltado a causar a morte ou grave lesão física a civis ou
não combatentes, quando o propósito desse ato, pela sua natureza ou contexto, seja
intimidar a população ou compelir um governo ou uma organização internacional a
fazer ou se abster de fazer algum ato​.34​
​ 35​

No mesmo sentido é a Convenção Interamericana Contra o Terrorismo,​36 no


âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA), ao estabelecer a inaplicabilidade
da exceção por delito político e reafirmar a necessidade na adoção de medidas para a
supressão do financiamento ao terrorismo.​37

Os países da região têm paulatinamente aumentado sua adesão aos instrumentos


internacionais contra o terrorismo, particularmente em matéria de seu financiamento.

As dificuldades que os países da região enfrentam em promover ações


coordenadas contra o terrorismo, tanto no plano doméstico quanto no internacional, são
analisadas em profundidade no relatório do Grupo de Ação Financeira, o GAFI. Segundo o
documento, há importantes deficiências nas informações disponíveis em todas as
instituições envolvidas com o processo criminal e que atuam na prevenção à lavagem de
dinheiro. Os Estados não conseguem alcançar o mínimo de consenso sobre as ações
práticas que precisam ser desenvolvidas para conter o risco de atentados terroristas e para a
34
Report of The Secretary-General’s High-level Panel on Threats, Challenges and Changes. A more secure
world: Our Shared Responsibility. United Nations 2004 pp.52 Disponível em:
<http://www.un.org/en/peacebuilding/pdf/historical/hlp_more_secure_world.pdf>. Acesso em: 16 ago.
2016.
35
Destaca-se o avanço legislativo proposto com a Resolução n. 2195/2014 ao identificar o vínculo existente
entre as atividades terroristas e as organizações criminosas e especificamente na Resolução n. 2199/2015
em relação ao terrorismo fundamental​ista.
36
​Conforme previsto no art. 11: Inaplicabilidade da exceção por delito político. Para os propósitos de
extradição ou assistência judiciária mútua, nenhum dos delitos estabelecidos nos instrumentos
internacionais enumerados no artigo 2 será considerado delito político ou delito conexo com um delito
político ou um delito inspirado por motivos políticos. Por conseguinte, não se poderá negar um pedido de
extradição ou de assistência judiciária mútua pela única razão de que se relaciona com um delito político ou
com um delito conexo com um delito político ou um delito inspirado por motivos políticos. (Disponível em:
<​http://www.oas.org/pt/topicos/terrorismo.asp​>. Acesso em: 10 jul. 2016).
37
Conforme se observa nas publicações do Banco Mundial, e especificamente em Reference Guide to
Anti-Money Laundering and Combating the Financial of Terrorism The World Bank. (Disponível em:
<​http://siteresources.worldbank.org/EXTAML/Resources/396511-146581427871/Reference_Guide_AMLCF
T_2ndSupplement.pdf​>. Acesso em:​ 10 jul. 2016).
construção de um modelo de cooperação entre agências capaz de gerenciar esses riscos de
forma permanente e eficaz.

São conhecidas as enormes facilidades operacionais para a atuação de


organizações terroristas na região, como a extensa e crescente presença do crime
organizado e as fronteiras porosas por onde fluem continuamente drogas, armas e outros
produtos e serviços ilícitos. Embora o crime organizado e o terrorismo sejam fenômenos
distintos, conectam-se constantemente no uso comum da mesma cadeia logística de
serviços ilegais.

A literatura acadêmica mais aplicada que se dedica a avaliar as respostas dos


governos ao terrorismo destaca o desafio da coordenação entre agências e o controle de
fatores facilitadores (CLUTTERBUCK, 1986; FORST, 2009; ENGLISH, 2009). A agenda
derivada dessas reflexões pode ser resumida nas seguintes cinco etapas: (1) identificar
fatores causais e dos agentes facilitadores em cada contexto específico (redes de apoio,
ativos financeiros utilizados, relações com o crime organizado, etc.); (2) evitar a
militarização excessiva da resposta; (3) reconhecer a inteligência como o elemento mais
importante para orientar as ações de contraterrorismo; (4) desenvolver uma infraestrutura
legal que respeite as características dos regimes jurídicos construídos democraticamente;
(5) coordenar as medidas preventivas de segurança, controle de ativos e segurança
cibernética.

Os grupos terroristas organizam-se à semelhança de organizações criminosas,


interessados na criação ou na exploração de um ambiente operacional hospitaleiro. A
maioria dos atentados promovidos por grupos terroristas exige uma intensa cooperação
entre seus integrantes e fornecedores de bens e serviços logísticos, quase sempre de
natureza ilícita. As armas utilizadas nos atentados de novembro de 2015 em Paris, por
exemplo, segundo os resultados das investigações já divulgados, foram compradas pelos
terroristas de ​dealers​ que atuam no mercado ilegal de armas na Europa.

O monitoramento dos recursos que sustentam financeiramente os grupos


terroristas é outra frente que demanda atenção e pode ser considerada de grande
complexidade pela forma como o ilícito e a economia formal se articulam. Sob a
perspectiva da atividade de controle, o ponto crítico é garantir a atuação interdisciplinar
(policiais, fiscais aduaneiros, agentes de imigração, membros do Ministério Público,
economistas e analistas de risco, dentre outros) e uma forte rede de colaboração
público-privada para a construção de indicadores que permitam monitorar os fluxos
financeiros suspeitos (KEENE, 2012). Para que esse monitoramento seja viável, torna-se
essencial levar em consideração a transnacionalidade desse fenômeno, o que impõe a
ampliação da atuação dos órgãos nacionais para além das suas fronteiras, bem como a
criação de instituições internacionais e regionais como o Grupo de Ação Financeira contra
a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (GAFI).

8 Comentários finais

Perguntas-chave para a seção:


Quais são os resultados esperados das políticas de enfrentamento ao crime organizado?
Como as instituições de diferentes países cooperam?

O enfrentamento operacional do crime organizado na região e a mensuração do


impacto das iniciativas em curso dependem fundamentalmente de um crescente esforço de
integração entre agentes públicos situados em diferentes níveis de governo.

Embora as polícias de vários países da região tenham demonstrado capacidades de


reduzir as taxas dos crimes mais graves de forma significativa ao longo da última década
(como foi o caso das principais cidades dos EUA, Colômbia e de alguns estados do Brasil),
resta ainda o desafio representado pela presença e pelo aumento da atuação do crime
organizado na região a ser superado.

Uma das tarefas práticas mais urgente nessa área envolve a construção de sistemas
de informação compartilhados e o desenho de indicadores que permitam minimamente
avaliar a incidência do problema e os resultados obtidos por meio das políticas públicas
adotadas.

Em segundo lugar, o enfrentamento dos reflexos das atividades ilícitas globais


impõe aos países a necessidade de atuar internacionalmente em prol de uma agenda que
transcenda os esforços hoje limitados à produção de normas internacionais, mas que avance
na direção do desenvolvimento de estruturas capazes de viabilizar um novo modelo de
cooperação internacional.

Os principais documentos internacionais relacionados com os mercados ilícitos


globais – notadamente as Convenções de Viena contra o Tráfico de Drogas, de Palermo
contra o Crime Organizado Transnacional e de Mérida contra a Corrupção – reconhecem a
cooperação como fundamento, mas também como instrumento essencial para a efetivação
dos compromissos. No entanto, esses mesmos documentos não são acompanhados de
procedimentos e protocolos relacionados à implantação e ao monitoramento da execução
dos compromissos assumidos.

Nesse sentido, deve-se considerar que a expressão “cooperação jurídica


internacional”, a qual inclui a ação das polícias, abrange outros termos como “assistência”,
“ajuda” ou “auxílio mútuo internacional” – todas equivalentes entre si. A amplitude da
expressão abrange o intercâmbio não somente entre órgãos judiciais, mas também entre
órgãos judiciais e administrativos dos Estados – notadamente as instituições policiais.

Importante destacar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948


dispõe, no seu preâmbulo, que o respeito universal aos direitos e liberdades fundamentais
da pessoa e a observância desses direitos e liberdades têm como base a cooperação dos
Estados. Nesse ponto, cabe destacar que a proteção dos direitos humanos não pode ser
considerada um obstáculo para a cooperação jurídica internacional, mas o caminho para
reforçar as normas jurídicas, de modo que os Estados façam prevalecer as suas obrigações
de respeito aos direitos humanos, recusando a assistência, impondo condições ao outro
Estado envolvido, ou buscando entendimento quanto ao interesse das pessoas envolvidas.
Isso significa dizer que, no processo de elaboração de novos instrumentos de cooperação
internacional em matéria penal, os Estados devem se atentar para a definição e a proteção
dos direitos individuais na aplicação desses instrumentos. Em outras palavras, quanto maior
o esforço de incorporação e concretização do padrão normativo universal dos direitos
humanos, menor a resistência, maiores a fluidez e a segurança no relacionamento.

A transnacionalidade do crime organizado e seu crescente impacto na segurança da


região exigem uma resposta coordenada dos países. Essa resposta envolve a cooperação por
meio de marcos jurídicos homogêneos, a capacidade de produzir e trocar informações sobre
a ação do crime organizado, a capacidade de desenvolver inteligência prospectiva para se
antecipar às ações do crime organizado e a capacidade de cooperar e coordenar
investigações entre diferentes jurisdições.

A partir do mapeamento apresentado, é possível reconhecer nos esforços de


cooperação internacional a principal tendência para o enfrentamento dos mercados ilícitos
globais. Do ponto de vista dos interesses criminosos, a expansão das economias no plano
global e o crescimento das atividades ilícitas para além das fronteiras de um determinado
país são estímulos a maiores ganhos ilegais, à existência de diversidade de grupos e
produtos, à corrupção e à cooptação do poder político, à lavagem de dinheiro e à formação
de alianças criminosas estratégicas.

O impacto das atividades ilegais é particularmente grave na região das Américas,


onde têm sido observados recorrentes casos de corrupção de agentes públicos pelo crime
organizado. Até a década de 1990, o fenômeno estava circunscrito a um grupo de países
relativamente pequeno na região, mas atualmente é possível reconhecer a presença intensa
do crime organizado em todo o hemisfério, atuando em atividades que vão do cultivo de
coca e maconha à intermediação financeira. Tendências recentes indicam a elevação do
consumo de drogas nos mercados consumidores da região e o aumento da área cultivada de
coca, depois de mais uma década de tendência de queda.

Da mesma forma que as alianças e as fusões são frequentes no mundo corporativo


lícito, são igualmente comuns entre as organizações criminosas transnacionais.
Similarmente às empresas, as organizações criminosas tendem a usar serviços
especializados de segurança, transporte, lavagem de dinheiro, engenheiros químicos e
outros profissionais para garantir o sucesso de suas operações ilegais.

Em resumo, as empresas criminosas estão interessadas na criação de um ambiente


operacional que seja favorável à existência e à expansão de seus mercados ilícitos,
valendo-se, para tanto, da corrupção de agentes públicos e da infiltração no poder político,
além da intimidação por meio de ameaças graves ou da violência.

Nesse sentido, a cooperação dos órgãos públicos entre si e destes com o setor
privado, tanto no plano doméstico como no internacional, contribui para a consolidação dos
atuais mecanismos de governança, assegurando mais eficiência no enfrentamento dos
mercados ilícitos globais e permitindo o desenvolvimento de modelos estruturantes que
favoreçam a gestão mais qualificada do problema.

Assim, parece-nos que a solução de longo prazo para o enfrentamento ao crime


organizado transnacional passa necessariamente pela redução da demanda por produtos e
serviços dos mercados ilícitos. Por outro lado, no curto prazo, os esforços precisam ser
direcionados à prevenção e à persecução penal ágil e efetiva das organizações criminosas
que exploram tais mercados ilícitos. Da mesma forma, é importante ampliar a assistência às
vítimas dessas organizações criminosas para reduzir as oportunidades de sua captura, além
de elevar o custo operacional do mercado ilícito ao redor do mundo (ALBANESE, 2011).

Em síntese, a cooperação entre os órgãos de segurança pública e demais atores dos


sistemas de justiça criminais domésticos com seus pares de outros países, por meio de
mecanismos bilaterais ou multilaterais, e com o apoio de organismos regionais e
internacionais, constitui a melhor aposta democrática contra a ameaça do crime organizado
na região.
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​ AS​
REGIÃO​ D A​MÉRICAS

Leandro Piquet Carneiro

Roberto Troncon

Fabio R. Bechara

Cristian Gabriel Taboada

João Henrique Martins

N​OVEMBRO​ ​DE​ 2020

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