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A Profecia dos Dragões

TUI T. SUTHERLAND

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Para Jonah,
meu pequeno bigwings

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UM GUIA DE
ASAS DA NOITE AOS

DR AGÕES DE

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GÕES DE PYRRHIA

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A Profecia dos
Dragonetes
Quando 20 anos tiver durado a guerra...
os dragonetes virão.
Quando encharcada de sangue e lágrimas estiver a terra...
os dragonetes virão.

Procure o ovo de Asa do Mar do mais profundo azul.
Asas da Noite lhe encontrarão não importa se norte ou sul.
O maior ovo, que no alto da montanha está,
Asas do Céu a você dará.
Para ter Asas da Terra, procure na lama
um ovo da cor do sangue de dragão, como flama.
O ovo de Asa de Areia espera,
escondido das rainhas rivais severas.

Das três rainhas que queimam como brasa,
duas devem morrer, e uma deve aprender
que ao se curvar a um destino maior que a todos arrasa,
terá Asas de Fogo como poder.

Cinco dragões nascerão por fim à guerra


para trazer de volta a paz à Terra
e mostrar a luz que a noite encerra
Os dragonetes estão chegando...

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A Profecia dos Dragões

PRÓLOGO
Um dragão tentava se esconder na tempestade.
Relâmpagos atravessavam as nuvens escuras. Em pleno voo,
Hvitur segurou ainda mais fortemente a frágil carga que transpor-
tava. Se conseguisse ultrapassar as montanhas, estaria a salvo. Tinha
escapado do palácio dos dragões do céu. E a caverna secreta estava
tão perto...
No entanto, olhos escuros como a rocha obsidiana o observa-
vam de baixo.
Sobre uma saliência da montanha, a fêmea de dragão tinha es-
camas de um dourado suave que o calor fazia brilhar como o ho-
rizonte do deserto. Ela apertou os olhos negros para ver melhor as
asas prateadas lá no alto, entre as nuvens.
Bastou que provocasse um estalo com a cauda, para dois ou-
tros dragões surgirem de trás, saltando até o centro da tempestade.
Quando suas garras aprisionaram em pleno voo o dragão gelado,
um grito agudo ecoou pelas montanhas.
– Fechem a boca dele! – a dragão fêmea ordenou, quando seus
soldados largaram Hvitur diante dela, sobre o chão escorregadio.
– Depressa! – ela insistiu, ao ver que ele tomava fôlego, pronto
para atacar.
Um dos guardas pegou uma corrente no meio dos carvões em
brasa e atirou no dragão do gelo, prendendo­‑lhe o focinho e as pa-
tas. Hvitur soltou um grito abafado, enquanto se espalhava o cheiro
de escama queimada. O máximo que conseguia era deslizar a lín-
gua bifurcada para dentro e fora da boca.
– Tarde demais! – o guarda disse. – Não vai disparar contra nós
a sua mortal baforada congelante, dragão!

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– Ele carregava isto, Rainha Brasa – disse o outro guarda, mos-
trando um ovo de dragão.
Brasa apertou os olhos, para ver melhor através da chuvarada.
– Isso não é um ovo de Asas de Gelo – ela falou entre dentes. – Foi
roubado do palácio dos Asas do Céu.
Com o focinho cercado de vapor, que subia do local onde a
corrente aquecida encontrava as escamas geladas, o dragão Asas de
Gelo sustentou o olhar da rainha.
– Pensou que fosse escapar sem ser visto? – Brasa perguntou.
– Minha aliada Asas do Céu não é boba. A Rainha Escarlate sabe
de tudo que acontece no reino. Uma vez que seus vigias relataram
a fuga de um Asas de Gelo, achei que isso pudesse temperar minha
monótona visita com um pouco de violência.
Brasa ergueu o ovo e o girou lentamente contra a luz do fogo.
Tons de vermelho e dourado se destacaram sob a superfície clara
e lisa.
– Exatamente. Um ovo de Asas do Céu prestes a eclodir – ela
raciocinou. – Por que minha irmã o mandaria roubar um ovo de
dragonete Asas do Céu? Brabeza detesta todo e qualquer dragão
mais novo e mais bonito do que ela.
E depois de pensar mais um pouco, enquanto a chuva tambo-
rilava em torno, continuou:
– A não ser que... A noite mais brilhante é amanhã...
Com um movimento brusco, ela fez os espinhos da cauda ve-
nenosa passarem pertinho dos olhos de Hvitur, ao concluir:
– Você não pertence ao exército de Brabeza... É um daqueles
chatos pacifistas secretos.
– Garras da Paz? – um dos guardas perguntou. – Quer dizer
que eles existem mesmo?
Brasa suspirou.

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A Profecia dos Dragões

– Uns vermes brigando por causa de um pouco de sangue.


Solte a corrente. Ele não pode nos congelar enquanto as escamas
não esfriarem.
A enorme fêmea de dragão da terra se aproximou, enquanto o
guarda retirava a corrente, e dirigiu­‑se ao preso:
– Diga­‑me, dragão do gelo, acredita mesmo naquela velha e
pretensiosa profecia dos Asas da Noite?
Devido à dor no queixo, Hvitur falou com dificuldade:
– Não bastam as mortes de dragões provocadas pela guerra?
Não basta o sofrimento de Pyrrhia pelos últimos 12 anos? A pro-
fecia diz que...
– Não me importa. Nenhuma profecia decide o que me acon-
tece – Brasa interrompeu. – Não permitirei que simples palavras
ou filhotes de dragão determinem quando vou morrer ou a quem
devo servir. Haverá paz quando minhas irmãs morrerem e eu for a
rainha dos Asas de Areia.
Para enfatizar as palavras finais, ela aproximou ainda mais do
dragão de prata a cauda venenosa.
Com as escamas castigadas pela chuva, ele ergueu os olhos ao falar:
– Quer isso seja ou não do seu agrado, os dragonetes estão che-
gando. Eles escolherão a próxima rainha da tribo de Asas de Areia.
Brasa deu um passo atrás, girou novamente o ovo entre as gar-
ras e, com a língua bifurcada entrando e saindo, perguntou com
um sorriso:
– Verdade? Então, Asas de Gelo, este ovo faz parte da sua paté-
tica profecia?
Hvitur permaneceu imóvel.
Brasa bateu de leve com a garra na casca do ovo.
– Alguém aí? Dragonete do destino, é você? Está pronto para
acabar com esta grande e malvada guerra?

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– Deixe o ovo quieto – Hvitur falou com dificuldade.
– Diga... o que acontece à sua rica profecia, se... um dos cinco
dragonetes não nascer?
Com os olhos azuis fixos desesperadamente nas garras de Brasa,
ele mal conseguiu responder:
– Você não tem coragem. Ninguém faria mal a um ovo de dragão.
– Sem “asas do céu” para ajudar a salvação do mundo... Uma
história triste, muito triste... – ela disse, enquanto jogava o ovo de
uma garra para a outra. – Segundo acredito, isso significa que se
deve ter muito, muito cuidado com este terrivelmente importan-
te... Opa!
Com um movimento exagerado, Brasa fingiu que o ovo mo-
lhado pela chuva escorregou entre suas garras, passou pela borda do
rochedo e mergulhou na escuridão abaixo.
– Não! – Hvitur gemeu.
Depois de se livrar dos guardas, ele fez menção de ir atrás do
ovo, mas Brisa o agarrou pelo pescoço.
– É exagero – ela falou com um sorriso forçado. – O destino
não merece esse seu pequeno e trágico gesto.
– Seu monstro! – o dragão Asas de Gelo falou arquejante.
Ele se debatia, tentando livrar­‑se. Sua voz saiu carregada de de-
sespero, ao dizer:
– Nunca desistiremos. Os dragonetes... Os dragonetes virão
acabar com a guerra.
Brasa se curvou, para sussurrar no ouvido dele:
– Ainda que venham, será tarde demais para você.
Com as garras, ela rasgou as asas de Hvitur, que gemeu de dor.
Então, com um movimento brusco, cravou­a cauda venenosa na ca-
beça dele, atirando seu corpo prateado penhasco abaixo.

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A Profecia dos Dragões

Os gritos do dragão do gelo cessaram bem antes que seu corpo


batesse nas rochas.
A fêmea de dragão da tribo dos Asas de Areia voltou os olhos
negros para os guardas, dizendo:
– Perfeito. Que seja esta a última vez que ouvimos falar da tal
profecia ridícula.
E, depois de erguer as garras, para que a chuva lavasse os restos
de sangue de dragão, concluiu:
– Vamos em busca de outra coisa para matar.
As três criaturas abriram as asas e levantaram voo, rumo às nu-
vens escuras.
Algum tempo mais tarde, bem abaixo, uma grande fêmea de
dragão cor de crepúsculo avançou penosamente sobre as pedras até
o corpo em pedaços de um dragão do gelo. Ao levantar a cauda
dele, encontrou um fragmento de casca de ovo. Como nada havia
a fazer, arrastou­‑se de volta para o labirinto de cavernas sob os ro-
chedos.
Obrigada a percorrer passagens estreitas, ela apertava as asas con-
tra as paredes de pedra e precisou soprar uma pequena chama para
iluminar o caminho, rumo ao coração da montanha.
– Estou com os Garras da Paz – falou uma voz saída das som-
bras. – Francelha? É você?
– Aguardamos as asas de fogo – a dragão fêmea respondeu.
Ao ver que o dragão da tribo Asas do Mar, azul esverdeado
surgia de uma das cavernas, ela jogou aos pés dele o pedacinho de
casca de ovo e falou em tom sombrio:
– Não que isso nos ajude em alguma coisa. Hvitur está morto.
– Mas... O ovo de Asas do Céu ...
– Quebrou. Acabou, Liame.
– Não pode ser. A noite mais brilhante é amanhã. As três luas

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vão estar cheias pela primeira vez neste século. Os dragonetes da
profecia têm de nascer amanhã.
– Um deles está morto – Francelha respondeu, com os olhos
apertados de raiva. – Eu deveria ter ido pessoalmente roubar o ovo
de Asas do Céu. Conheço bem o Reino Celeste. Eles não me pe-
gariam pela segunda vez.
Liame fez uma careta, coçando o pescoço com a cauda, e deu
a notícia:
– Asha morreu.
– Asha? Como? – Francelha perguntou, soltando um jato de
fogo pelo nariz.
– Foi ferida durante uma batalha entre as forças de Brabeza e
Escarlate, a caminho daqui. Mesmo assim, conseguiu transportar o
ovo de Asas de Lama, mas acabou morrendo logo depois, por causa
dos ferimentos.
– Então, somos só eu, você e Areal para criar as minhoqui-
nhas – Francelha resmungou. – Para uma profecia que nunca vai
se realizar. Vamos quebrar agora os malditos ovos e dar o assunto
por encerrado. Já estaremos longe, quando os Garras da Paz vierem
buscar os dragonetes.
– Não! – Liame protestou com veemência. – A missão mais
importante é manter os dragonetes vivos pelos próximos oito anos.
Se não quiser colaborar...
– Ora, cale­‑se – Francelha interrompeu. – Sou a criatura mais
forte dos Garras da Paz. Sou necessária. Minha opinião sobre aque-
les dragonetes não vem ao caso.
Depois de observar por instantes a casca de ovo no chão, ela
esfregou as palmas cheias de cicatrizes e completou:
– Embora tenhamos perdido pelo menos um deles. Um da tri-
bo Asas do Céu.

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A Profecia dos Dragões

– Vou arranjar um quinto dragonete – Liame se adiantou,


espremendo­‑se entre as pedras.
– Não há como voltar ao Reino Celeste, seu cabeça­‑oca. Os
guardas agora vigiam melhor a chocadeira.
– Posso pegar um ovo em outro lugar – ele falou sério. – Os
Asas de Chuva nem contam os ovos. Se eu apanhar um na floresta
tropical, ninguém vai notar.
– Que ideia horrível! – Francelha exclamou, com um arrepio. –
Asas de Chuva são criaturas infelizes. Muito diferentes de Asas do Céu.
Liame suspirou, usando a cauda para atirar longe a casca de ovo,
e falou:
– Temos de fazer alguma coisa. Em oito anos, os Garras da Paz
virão procurar cinco dragonetes. É o que diz a profecia, e vamos
cumprir. Custe o que custar.

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PARTE 1
SOB A MONTANHA

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Seis anos depois...

Capítulo 1

L amur não se considerava o dragão adequado a um destino


heroico.
Ele até gostaria de ser. Queria transformar­‑se no bravo
e glorioso salvador dos dragões. Queria realizar todas as façanhas
maravilhosas que se esperavam dele. Queria olhar o mundo, desco-
brir o que estava errado e corrigir.
Não se sentia, porém, dono de uma personalidade naturalmen-
te heroica. Não possuía qualidades legendárias. Gostava mais de
dormir que de treinar e vivia perdendo de vista as aves nas caver-
nas, durante a prática da caça, porque prestava mais atenção aos
colegas.
Nas lutas, era razoavelmente bom. No entanto, “razoavelmente
bom” não acabaria com a guerra nem salvaria as tribos. Precisava ser
extraordinário. Na qualidade de maior dos dragonetes, esperava­‑se
que fosse durão, assustador. Os cuidadores queriam fazer dele um
dragão terrivelmente perigoso.
Lamur se sentia capaz de oferecer o mesmo perigo de uma
couve-flor.
– Lute! – a cuidadora mandou, empurrando­‑o pela caverna.
Ele tentou abrir as asas cor de lama para melhorar o equilíbrio,

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mas saiu cambaleando enquanto tentava proteger a face das garras
vermelhas da cuidadora.
– Vamos! – ela gritou. – Solte­‑se! Você precisa ser cruel!
Encontre e liberte o matador que tem dentro de si!
– Estou tentando! – Lamur protestou. – Talvez, se pudéssemos
parar e conversar...
Francelha não deu ouvidos e continuou:
– Finja que vai pela esquerda e ataque pela direita! Solte fogo!
Ele se abaixou, para investir contra a cuidadora de baixo para
cima, mas errou o golpe e foi derrubado. Ao vê­‑lo gemendo de
dor, ela gritou mais ainda:
– QUE GOLPE FOI ESSE, SEU INÚTIL? Será que todos
os dragões da tribo Asas de Lama são incompetentes assim? OU
VOCÊ É SURDO?
“Se continuar gritando comigo, vou ficar surdo logo, logo”,
Lamur pensou. Somente quando a cuidadora o deixou livre ele
pôde lamber as garras doloridas e responder.
– Claro que não sei quanto aos outros Asas de Lama. Em todo
caso, talvez fosse bom tentar uma luta sem gritaria e...
Ele parou, ao ouvir o assobio que precedia sempre os jatos
de fogo de Francelha. Na tentativa de proteger­‑se, ergueu as asas
acima da cabeça, cobriu com elas o pescoço comprido e rolou em
direção ao labirinto de estalagmites formadas em um canto da ca-
verna. As chamas atingiram só as pedras, mas chamuscaram a ponta
da cauda dele.
Ela golpeou uma das formações rochosas, provocando uma
chuva de pedrinhas escuras e gritou:
– Covarde!
Lamur protegeu os olhos, enquanto sentia um pisão na cauda.
– Ai! Você disse que pisar na cauda é golpe sujo!

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A Profecia dos Dragões

Em seguida, usou as garras como apoio e saltou para o topo


de uma estalagmite.Vista do ponto de observação perto do teto, a
enorme Asas do Céu vermelha parecia ainda maior.
– Sou a sua cuidadora e nada que eu faça é golpe sujo. Desça
daí e lute como um representante dos Asas do Céu.
“Mas eu não sou Asas do Céu”, ele protestou em pensamento.
“Sou um Asas de Lama! Não gosto de andar por aí provocando
incêndios nem mordendo pescoços de dragões.” Seus dentes ainda
doíam, por causa da mordida nas escamas duríssimas de Francelha.
– Não podemos lutar entre nós? – Lamur perguntou. – Eu me
sairia bem melhor.
Os dragonetes tinham aproximadamente o mesmo tamanho
e não trapaceavam (pelo menos a maior parte do tempo). Ele, na
verdade, gostava de lutar contra os companheiros. No entanto, nun-
ca vencia quando Francelha estava olhando. Ela o deixava muito
nervoso.
– É mesmo? Quem gostaria de enfrentar? A Asa de Areia ma-
grela ou a Asa de Chuva preguiçosa? Porque vai ter de escolher
no campo de batalha – ela pressionou, balançando a cauda, que
brilhava feito brasa.
– Glória não é preguiçosa – ele defendeu. – Só não nasceu
para lutar. Liame diz que Asas de Chuva encontram todo tipo de
alimento nas florestas tropicais; assim, não precisam brigar. É por
isso que nenhuma das rainhas rivais quer Asas de Chuva em seus
exércitos. Segundo ele...
Francelha deu um passo para trás, ficou de pé nas pernas trasei-
ras e abriu as asas. De repente, pareceu muito maior.
– PARE DE TAGARELAR E DESÇA DAÍ! – gritou.
Com uma exclamação de susto, Lamur tentou saltar para a es-
talagmite mais próxima, mas custou a abrir as asas e errou o alvo.

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O atrito de suas garras com a superfície rochosa chegou a provocar
faíscas. Ele não conteve outro grito de dor quando Francelha meteu
a cabeça entre as elevações, cravou­os dentes na cauda dele e puxou­
‑o de volta, sussurrando em seu orelha:
– Onde está aquele monstrinho violento que saiu do ovo? É
daquele dragão que preciso para cumprir a profecia.
No fim das sessões de treinamento com Francelha, Lamur sem-
pre estava caído e passava os dias seguintes mancando ou sentindo
alguma dor. De nada adiantava dizer para si mesmo “Reaja! Fique
com raiva! Faça alguma coisa!” Embora fosse o mais crescido do
grupo, ele ainda levaria um ano para se desenvolver completamen-
te, bem como os outros dragonetes. A cuidadora tinha a vantagem
do tamanho.
Lamur gemeu mais uma vez. Ainda tentou se revoltar, mas a
ideia de que faltava pouco para o fim da sessão de treinamento, e
ele poderia jantar, tomou conta de seus pensamentos.
De repente, Francelha soltou um rugido e largou Lamur, que
caiu no chão com um baque surdo. Com isso, o jato de fogo desti-
nado a ele passou sobre sua cabeça.
Francelha se voltou. Atrás dela estava Tsunami. Depois de cus-
pir uma escama vermelha que tinha entre os dentes, a dragonete
Asas do Mar falou em tom desafiador:
– Pare de implicar com Lamur ou vai ganhar outra mordida!
Suas escamas, de um azul profundo, brilhavam como vidro de
cobalto, à luz das tochas. As ondulações do longo pescoço pulsa-
vam, como sempre acontecia quando ela estava furiosa.
Francelha se sentou, para examinar melhor a mordida na cauda,
e mostrou os dentes para Tsunami.
– Não é fofa? Defendendo um dragão que tentou matá­‑la
quando ainda estava no ovo...

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