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PATOLOGIA

PROF.A DRA. MARIANA APARECIDA LOPES ORTIZ


Prof. Me. Ricardo Benedito de Oliveira
REITOR

Reitor:
Prof. Me. Ricardo Benedito de
Oliveira
Pró-reitor:
Prof. Me. Ney Stival
Gestão Educacional:
Prezado (a) Acadêmico (a), bem-vindo Prof.a Ma. Daniela Ferreira Correa
(a) à UNINGÁ – Centro Universitário Ingá.
PRODUÇÃO DE MATERIAIS
Primeiramente, deixo uma frase de Só-
crates para reflexão: “a vida sem desafios não Diagramação:
vale a pena ser vivida.” Alan Michel Bariani
Thiago Bruno Peraro
Cada um de nós tem uma grande res-
ponsabilidade sobre as escolhas que fazemos, Revisão Textual:
e essas nos guiarão por toda a vida acadêmica Gabriela de Castro Pereira
e profissional, refletindo diretamente em nossa Letícia Toniete Izeppe Bisconcim
vida pessoal e em nossas relações com a socie- Luana Ramos Rocha
dade. Hoje em dia, essa sociedade é exigente
e busca por tecnologia, informação e conheci- Produção Audiovisual:
mento advindos de profissionais que possuam Heber Acuña Berger
novas habilidades para liderança e sobrevivên- Leonardo Mateus Gusmão Lopes
cia no mercado de trabalho. Márcio Alexandre Júnior Lara

De fato, a tecnologia e a comunicação Gestão da Produção:


têm nos aproximado cada vez mais de pessoas,
Kamila Ayumi Costa Yoshimura
diminuindo distâncias, rompendo fronteiras e
nos proporcionando momentos inesquecíveis.
Fotos:
Assim, a UNINGÁ se dispõe, através do Ensino
Shutterstock
a Distância, a proporcionar um ensino de quali-
dade, capaz de formar cidadãos integrantes de
uma sociedade justa, preparados para o mer-
cado de trabalho, como planejadores e líderes
atuantes.

Que esta nova caminhada lhes traga


muita experiência, conhecimento e sucesso.

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UNIDADE ENSINO A DISTÂNCIA

01
DISCIPLINA: PATOLOGIA

RESPOSTAS CELULARES AO ESTRESSE E AOS


ESTÍMULOS NOCIVOS
PROF.A DRA. MARIANA APARECIDA LOPES ORTIZ

SUMÁRIO DA UNIDADE

INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................. 5
1 - ADAPTAÇÕES DO CRESCIMENTO E DIFERENCIAÇÃO CELULAR ................................................................... 6
1.1. ATROFIA ............................................................................................................................................................... 6
1.2. HIPERTROFIA ..................................................................................................................................................... 7
1.3. HIPERPLASIA ..................................................................................................................................................... 8
1.4. METAPLASIA ...................................................................................................................................................... 8
2 - LESÃO CELULAR ................................................................................................................................................... 9
2.1. CAUSAS DE LESÃO CELULAR ............................................................................................................................ 9
2.2. MECANISMOS DE LESÃO CELULAR ............................................................................................................... 10
2.2.1. DEPLEÇÃO DE ATP .......................................................................................................................................... 11
2.2.2. INFLUXO DE CÁLCIO ..................................................................................................................................... 12
3 - ACÚMULO DE RADICAIS LIVRES (ESPÉCIES REATIVAS DE OXIGÊNIO) ..................................................... 13

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3.1. DEGENERAÇÕES ............................................................................................................................................... 14
3.1.1. DEGENERAÇÃO HIDRÓPICA ......................................................................................................................... 15
3.1.2. DEGENERAÇÃO HIALINA .............................................................................................................................. 15
4 - DEGENERAÇÃO MUCOIDE ................................................................................................................................ 15
5 - ESTEATOSE ........................................................................................................................................................ 15
6 - LIPIDOSES ........................................................................................................................................................... 17
7 - GLICOGENOSES ................................................................................................................................................... 17
8 - MUCOPOLISSACARIDOSES .............................................................................................................................. 18
9 - MORTE CELULAR ............................................................................................................................................... 18
9.1. NECROSE .......................................................................................................................................................... 19
9.1.1. ASPECTOS MORFOLÓGICOS MICROSCÓPICOS ......................................................................................... 19
9.1.2. NECROSE POR COAGULAÇÃO OU NECROSE ISQUÊMICA ........................................................................ 19
9.1.3. NECROSE POR LIQUEFAÇÃO ........................................................................................................................ 19
9.1.4. NECROSE CASEOSA ...................................................................................................................................... 20
9.1.5. NECROSE GORDUROSA ................................................................................................................................ 20
10 - EVOLUÇÃO ........................................................................................................................................................ 20
10.1. APOPTOSE ........................................................................................................................................................ 21
10.2. APOPTOSE EM SITUAÇÕES FISIOLÓGICAS ................................................................................................. 21
10.3. APOPTOSE EM CONDIÇÕES PATOLÓGICAS ................................................................................................ 21
10.4. ALTERAÇÕES MORFOLÓGICAS DA APOPTOSE .......................................................................................... 22
10.5. MECANISMOS DA APOPTOSE ..................................................................................................................... 22
10.5.1. VIA INTRÍNSECA DA APOPTOSE ................................................................................................................ 22
10.5.2. VIA EXTRÍNSECA DA APOPTOSE ............................................................................................................... 23
10.5.3. A FASE DE EXECUÇÃO DA APOPTOSE ...................................................................................................... 24
10.5.4. REMOÇÃO DAS CÉLULAS MORTAS ........................................................................................................... 24
11 - DISTÚRBIOS ASSOCIADOS À APOPTOSE DESREGULADA ........................................................................... 24
11.1. DISTÚRBIOS ASSOCIADOS À APOPTOSE DEFEITUOSA E AUMENTO DA SOBREVIDA CELULAR (FALTA
DE APOPTOSE) ........................................................................................................................................................ 24
11.2. DISTÚRBIOS ASSOCIADOS AO AUMENTO DE APOPTOSE E MORTE CELULAR EXCESSIVA ................. 25
12 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................ 25

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INTRODUÇÃO
Analisando a etiologia da palavra, a patologia é o estudo (logos) das doenças (pathos), e
pode ser definida, mais especificamente, como “o estudo das alterações estruturais, bioquímicas
e funcionais na células, tecidos e órgãos que fundamentam a doença” (KUMAR et al., p. 5, 2010).
Dessa forma, nessa disciplina discutiremos lesões comuns à diferentes doenças, abordando suas
etiologias (causas), seus mecanismos de desenvolvimento (patogenia ou patogênese) e suas
alterações morfológicas e funcionais.
Na prática, toda doença se inicia com alterações moleculares, funcionais ou estruturais nas
células. Assim, iniciaremos nossa abordagem de patologia, com o estudo das causas, mecanismos
e correlações morfológicas e bioquímicas das lesões celulares.
A homeostasia é conhecida como um estado em que as células se encontram capazes de
realizar suas atividades metabólicas e fisiológicas em equilíbrio. Porém, alguns estresses podem
fazer com que essas células se adaptem, permitindo que elas continuem vivas e funcionais. Essas
adaptações consistem em diminuição (atrofia) ou aumento (hipertrofia) do tamanho e atividade
funcional das células, aumento do número (hiperplasia) ou mudança de fenótipo (metaplasia).
O que caracteriza essas adaptações é que quando o estresse é eliminado, a célula retorna ao seu
estado original, sem sofrer danos.
Caso a célula sofra um estresse ou receba um estímulo lesivo e não seja capaz de se adaptar,

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ela pode sofrer mudanças metabólicas e morfológicas em seus constituintes, que constituem uma
lesão celular. Quando esses estímulos são leves e temporários, é caracterizada uma lesão celular
reversível, em que a célula ainda pode retornar ao estado normal. Porém, se esses estímulos
forem intensos, progressivos e acontecerem por um período prolongado, pode acontecer uma
lesão irreversível e finalmente a morte celular (Figura 1).
Nessa unidade, abordaremos como as células respondem ao estresse e estímulos tóxicos, os
mecanismos e consequências das várias formas de lesão, incluindo lesões reversíveis, irreversíveis
e morte celular.

Figura 1 - Etapas da resposta celular ao estresse e estímulos nocivos. Fonte: Kumar et al. (2016).

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1 - ADAPTAÇÕES DO CRESCIMENTO E DIFERENCIAÇÃO


CELULAR
Adaptações celulares são alterações, em sua maioria reversíveis, que podem modificar
as células em tamanho, número, função ou atividade metabólica. Essas adaptações acontecem
em resposta a estresses ou alterações do ambiente onde a célula se encontra. São exemplos de
adaptação celular: atrofia, hipertrófica, hiperplasia e metaplasia.

1.1. Atrofia
A atrofia celular pode ser definida como a diminuição do tamanho e do número de células,
que pode levar à diminuição do tamanho e função de um órgão. A atrofia pode ser fisiológica,
quando acontece durante o desenvolvimento normal de um indivíduo, como por exemplo após o
parto, em que o útero da mulher reduz o seu tamanho. Porém, também pode ser patológica, que
pode acontecer em decorrência de diferentes causas, como:

• Redução da carga de trabalho: Esse tipo de atrofia também é conhecido como atrofia
por desuso, em que as células de um órgão ou tecido diminuem de tamanho, como uma
forma de economia de energia por não estarem sendo usadas. Por exemplo: quando ocorre

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uma fratura óssea e um braço precisa ser imobilizado com gesso, após a retirada do gesso
é possível verificar que aquele membro está bem mais fino que o outro (que não estava
engessado), devido à uma atrofia dos músculos esqueléticos. Essa atrofia é reversível,
assim que o músculo voltar a ser usado as células retornam ao seu estado anterior.

• Perda de inervação: A atrofia decorrente da perda do suprimento nervoso afeta,


principalmente, os músculos esqueléticos, uma vez que estes necessitam desse suprimento
para realizar suas funções normais. Visto que não conseguem desempenhar suas funções,
acontece a atrofia das fibras musculares.

• Diminuição do suprimento sanguíneo: Uma diminuição da irrigação sanguínea em


um tecido compromete diretamente as funções e a disponibilidade energética das células.
Esse comprometimento leva as células a se adaptarem à nova condição, diminuindo de
tamanho e consequentemente de função. Por exemplo: em idosos é comum visualizarmos
uma atrofia progressiva no cérebro e no coração, uma vez que esses órgãos passam a
receber menos suprimento sanguíneo especialmente em decorrência da aterosclerose
(deposição de gordura nos vasos sanguíneos).

• Deficiências nutricionais: Casos de desnutrição severa podem levar o organismo a


utilizar o músculo esquelético como fonte de energia. Inicialmente o organismo tenta
outras fontes de reserva, como o tecido adiposo, porém, em casos graves de deficiência
proteico-calórica em que o tecido adiposo já foi utilizado, os músculos passam a ser
usados e sofrem atrofia.

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• Perda de estimulação endócrina: Diversos tecidos respondem à estimulação de


hormônios, como por exemplo os órgãos reprodutores. Caso essa estimulação seja
perdida, como por exemplo quando a mulher entra na menopausa, ocorre a atrofia
fisiológica.

• Pressão: A compressão de um tecido também pode levar à atrofia. Nesses casos a atrofia
está intimamente relacionada à diminuição do fluxo sanguíneo causada pela compressão
de vasos sanguíneos. Um exemplo dessa situação é o desenvolvimento de tumores
benignos, que durante o seu crescimento podem comprimir vasos sanguíneos e causar a
atrofia de tecidos circunjacentes.

Para que a célula tenha seu tamanho reduzido, acontece a diminuição da síntese de
proteínas e o aumento da degradação das proteínas que já estão dentro da célula. O processo de
degradação das próprias proteínas acontece, principalmente, pela via ubiquitina-proteossoma,
em que as causas mencionadas anteriormente podem levar à ligação da ubiquitina às proteínas
presentes no interior das células, ativando o proteossoma e, consequentemente, a degradação.
Normalmente, na atrofia também acontece um aumento da autofagia, que é um processo em
que as células que tiveram seu aporte de nutrientes comprometido digerem seus próprios
componentes, por meio da ação das enzimas dos lisossomos.

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Em condições que demonstrem atrofia significativa, como no envelhecimento e
em algumas doenças degenerativas, as células acumulam um pigmento carac-
terístico, chamado de lipofuscina ou pigmento do desgaste. Microscopicamente
a lipofuscina aparece como um pigmento citoplasmático, frequentemente peri-
nuclear, finamente granular e castanho amarelado. A lipofuscina não é nociva à
célula e às suas funções.

1.2. Hipertrofia
A hipertrofia é caracterizada pelo aumento do tamanho das células, o que resulta em
um aumento do tamanho do órgão. A célula aumenta de tamanho em decorrência do aumento
da síntese dos componentes estruturais, especialmente proteínas. Vale lembrar que o órgão que
sofreu hipertrofia apresenta apenas células maiores e não uma maior quantidade de células.
Na hipertrofia, ao contrário da atrofia, existe um aumento da produção de proteínas
celulares. Esse aumento de produção pode ser, então, estimulado por diversas vias, como a
estimulação mecânica decorrente do aumento do trabalho ou pela ação de fatores de crescimento.
Esse aumento de produção de proteínas e, consequentemente, do tamanho da célula pode
acontecer em decorrência de estímulos fisiológicos ou patológicos. Um caso em que a hipertrofia
é fisiológica, é durante a gravidez, quando o útero aumenta drasticamente de tamanho,
especialmente pelo aumento do tamanho das células que sofreram maior estimulação hormonal,
portanto, maior produção de componentes estruturais. Já um exemplo de hipertrofia patológica,
é a que acontece no músculo cardíaco, decorrente da hipertensão arterial, em que o coração
precisa aumentar sua carga de trabalho para bombear o sangue através dos vasos, levando ao
aumento do tamanho das células e, consequentemente, do órgão.

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1.3. Hiperplasia
A hiperplasia é o aumento do número de células e, consequente, aumento do tamanho
do órgão. Nem todos os órgãos são capazes de sofrer hiperplasia, uma vez que ela acontece em
células que possuem a capacidade de divisão celular, o que é mais comum em órgãos considerados
glandulares. O aumento do número de células, também, pode ser decorrente de processos
fisiológicos ou patológicos. A hiperplasia é resultado da proliferação de células maduras induzidas
por fatores de crescimento ou a partir de células-tronco teciduais.

• Hiperplasia fisiológica: A hiperplasia fisiológica pode ser dividida em: hiperplasia


hormonal e hiperplasia compensatória. A hiperplasia hormonal, normalmente, objetiva
o aumento da capacidade funcional de um órgão, por meio do aumento do estímulo
hormonal, que é o que acontece, por exemplo, nas mamas durante a gravidez. Já a
hiperplasia compensatória tem a intenção de aumentar a massa de um órgão através do
aumento do número de células. Como exemplo clássico da hiperplasia compensatória
podemos citar a que acontece no fígado, um órgão conhecido por sua capacidade de
“regeneração”. Após perda parcial do órgão por lesão ou ressecção, as células que sobraram
se proliferam e o órgão volta a crescer e retorna ao tamanho original.

• Hiperplasia patológica: A hiperplasia patológica é, normalmente, causada por


estimulação excessiva por hormônios ou fatores de crescimento. Na hiperplasia prostática
benigna, por exemplo, acontece o aumento da proliferação de células da próstata em

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decorrência de aumento dos hormônios androgênios. É muito comum algumas pessoas
relacionarem hiperplasia com neoplasias (tumores), porém na hiperplasia não existe
nenhuma disfunção ou mutação que comprometa o controle da divisão celular, que é
o que acontece nos tumores. Vale ressaltar que a hiperplasia regride caso a estimulação
hormonal diminua.

1.4. Metaplasia
A metaplasia é uma adaptação celular, em que um tipo celular diferenciado (maduro)
é substituído por outro tipo celular diferenciado (maduro), em que, normalmente, este último
apresenta maior resistência a estresses.
Um exemplo bastante comum de metaplasia é aquela em que células colunares são
substituídas por células escamosas. Ela acontece, por exemplo, no útero feminino, em que com o
passar do tempo e com a presença de alguns estresses, como utilização de hormônios, infecções,
alterações de pH, as células colunares endocervicais vão sendo substituídas por células escamosas
estratificadas, que são mais resistentes. Outro exemplo é o caso dos fumantes, em que as células
normais da traqueia, que são colunares e ciliadas, são substituídas por células escamosas,
que são mais resistentes às agressões causadas pelas substâncias tóxicas presentes no cigarro.
Porém, a metaplasia não é de todo boa, visto que muitas vezes as novas células não conseguem
desempenhar as mesmas funções da célula anterior. Como por exemplo no caso dos fumantes,
em que as novas células não conferem a mesma proteção contra infecções (produção de muco
e proteção mecânica dos cílios) que as células ciliadas conferiam. Além disso, as influências que
favorecem o desenvolvimento de metaplasia, caso não cessem, podem iniciar uma transformação
maligna, o que pode levar ao desenvolvimento de um câncer.

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As adaptações celulares sempre acontecem de modo isolado, sendo assim, um


órgão ou tecido só pode sofrer um tipo de adaptação celular de cada vez? De-
terminados órgãos podem sofrer hiperplasia e hipertrofia ao mesmo tempo, de-
sencadeadas pelos mesmos estímulos, resultando, obviamente, em aumento do
tamanho do órgão. Esse acontecimento estará especialmente relacionado à capa-
cidade da célula em questão de dividir e aumentar em quantidade.

2 - LESÃO CELULAR
Uma vez que as células sofrem estresse excessivo, que não conseguem se adaptar, ou são
expostas a agentes capazes de causar danos à sua estrutura, ocorre uma lesão celular. Essa lesão
pode ser reversível ou irreversível.

• Lesão reversível. Quando a exposição ao agente lesivo é leve ou temporária as alterações


sofridas pela célula são reversíveis, ou seja, a célula volta ao estado normal assim que o
estímulo nocivo cessa.

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• Lesão irreversível. Caso o estímulo nocivo permaneça, a lesão pode se tornar irreversível
e a célula pode evoluir para a morte celular. Existem dois tipos de morte celular, necrose
e apoptose, que se diferem em morfologia e mecanismos, e suas particularidades serão
abordadas mais à frente nessa unidade.

2.1. Causas de Lesão Celular


As causas de lesão celular podem ser as mais diversas. Kumar et al. (2016), agruparam e
categorizaram as causas de lesão celular da seguinte forma:
• Privação de oxigênio: A hipóxia ou redução da quantidade de oxigênio é uma causa muito
importante de lesão celular. Entre as causas de redução da quantidade de oxigênio, podemos citar
a isquemia (diminuição do fluxo sanguíneo), a insuficiência cardiorrespiratória, grave perda de
sangue ou a diminuição da capacidade de transporte de oxigênio pelo sangue, como nas anemias
ou intoxicações por monóxido de carbono.

• Agentes físicos: Os agentes físicos incluem traumatismos mecânicos, alterações bruscas


de pressão atmosférica, exposição à extremos de temperatura e radiações.

• Agentes químicos e drogas: Existem inúmeras substâncias químicas que podem causar
lesão, sejam elas lícitas ou ilícitas. Substâncias como cianeto, arsênico, inseticidas e
herbicidas já são reconhecidos como substâncias tóxicas capazes de causar algum mal.
Porém, simples substâncias, como sal e açúcar, em excesso, são frequentemente agentes
de lesão celular. Podemos incluir aqui, também, as drogas sociais, como o álcool e os
medicamentos.

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• Agentes infecciosos: Os agentes infecciosos são os vírus, bactérias, fungos e protozoários,


os quais possuem as mais diversas formas de causar lesão celular, seja através da liberação
de toxinas ou da fusão de seu material genético com o da célula hospedeira, entre outros.

• Reações imunológicas: O sistema imunológico possui como função principal defender


o nosso organismo de ameaças, especialmente na defesa contra agentes infecciosos.
Porém, muitas vezes a própria resposta imunológica é responsável pelo surgimento de
lesões, como no caso das doenças autoimunes ou na própria resposta inflamatória.

• Defeitos genéticos: Alterações genéticas que comprometam a produção de proteínas


estruturais ou que modifiquem a atividade de alguma enzima, por exemplo, são causas de
lesão celular. As alterações genéticas podem causar consequências sutis às células, como
redução da sua capacidade funcional, mas muitas vezes podem ser incompatíveis com a
vida e induzir à morte celular.

• Desiquilíbrios nutricionais: Ainda hoje, os desequilíbrios nutricionais constituem as


principais causas de lesão celular. Deficiências de vitaminas ou a desnutrição proteico-
calórica são responsáveis por grande número de mortes em países ou locais com
populações menos favorecidas. Entretanto, o que mais assusta hoje em dia, é o crescente
número de lesões celulares decorrentes do excesso nutricional. O consumo excessivo de
alimentos gordurosos aumenta os índices de aterosclerose, o que pode comprometer o
fluxo sanguíneo. A obesidade e o diabetes também estão associados às diversas doenças

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e, consequentemente, lesões celulares.

2.2. Mecanismos de Lesão Celular


Qualquer que seja a causa ou natureza da lesão celular, elas normalmente irão reduzir a
oferta de oxigênio e nutrientes para a célula, alterar vias metabólicas que produzem energia, gerar
radicais livres ou modificar e agredir diretamente macromoléculas como o DNA. Além disso, é
importante ressaltar que as lesões celulares e as respostas a elas não são sempre iguais.
O mesmo agente lesivo pode desencadear uma lesão reversível ou irreversível. Períodos
curtos de privação de oxigênio, por exemplo, podem ser suportados pela célula, enquanto uma
hipóxia prolongada pode levar a morte celular.
O tipo de célula que está sofrendo a agressão também pode reagir diferente. Células
musculares esqueléticas apresentam uma maior resistência a períodos de privação de oxigênio
do que as células nervosas, por exemplo.
Características do próprio indivíduo influenciam na resposta. Características nutricionais,
metabólicas e genéticas podem levar a mesma substância a ser inofensiva em um organismo e
causar morte celular em outro.

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2.2.1. Depleção de ATP


Um dos principais mecanismos bioquímicos de lesão celular está relacionado à depleção
de ATP e redução da sua síntese. Essa depleção é intimamente relacionada principalmente a
lesões isquêmicas e químicas.
Existem duas vias de produção de ATP. A principal via, nos mamíferos, é a fosforilação
oxidativa, uma reação que leva à redução do oxigênio através do transporte de elétrons das
mitocôndrias. A segunda forma, é por meio da utilização de glicose ou da hidrólise do glicogênio,
que pode gerar ATP na ausência de oxigênio. Dessa forma, as principais causas de depleção de
ATP são a falta de suprimento de oxigênio e danos mitocondriais, os quais comprometem a
fosforilação oxidativa.
O ATP é utilizado praticamente em todos os processos de síntese e degradação dentro da
célula. Situações que diminuam a quantidade de ATP em 5 a 10% já produzem danos críticos à
célula.
Usando como exemplo a redução do suprimento sanguíneo e, consequentemente, de
oxigênio e nutrientes causado pela isquemia, podemos entender as consequências morfológicas
e funcionais que a depleção de ATP causa as células (Figura 2).
Com a redução da irrigação sanguínea, a fosforilação oxidativa é comprometida,
resultando em diminuição do ATP celular. Essa diminuição de ATP estimula o aumento da
glicólise anaeróbica, com a intenção de manter as fontes de energia da célula. A glicólise anaeróbica,
consome o glicogênio e produz ácido lático, o que diminui o pH intracelular, resultando em
redução da atividade enzimática e morfologicamente em agregação da cromatina nuclear.

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Figura 2 - Consequências morfológicas e funcionais da diminuição do ATP na célula. RE: retículo endoplasmático.
Fonte: Kumar et al. (2016).

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• Com a diminuição do ATP celular, processos dependentes de energia, como a bomba de


sódio na membrana plasmática, ficam comprometidos e têm sua atividade reduzida. Com
isso, ocorre a entrada de sódio e cálcio dentro da célula e saída de potássio. O aumento
dos solutos intracelulares faz com que aconteça a entrada de água, gerando tumefação
celular, como consequente perda de microvilosidades da célula e dilatação do retículo
endoplasmático. O influxo de cálcio na célula também desencadeia outras alterações
celulares que serão discutidas adiante.

• A depleção prolongada de ATP causa o destacamento dos ribossomos do retículo


endoplasmático rugoso e consequente comprometimento e redução da síntese de
proteínas.

2.2.2. Influxo de Cálcio


Em condições normais, a quantidade de cálcio livre no citosol é muito pequena. Em
algumas situações, como na isquemia ou com a ação de algumas toxinas, ocorre o aumento
do cálcio citosólico, inicialmente pela liberação do cálcio que se encontra sequestrado nas
mitocôndrias e retículo endoplasmático e, posteriormente, pelo aumento do influxo através da
membrana.
Esse acumulo de Ca+2 no interior das células pode causar lesão celular, uma vez que
ocorre a ativação de diversas enzimas, com efeitos lesivos. Entre essas enzimas encontram-se as
fosfolipases, proteases, endonucleases e as ATPases (Figura 3).

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Figura 3 - Papel do aumento do cálcio citosólico nas lesões celulares. Fonte: Kumar et al. (2010).

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A liberação de enzimas fosfolipases e proteases está relacionada diretamente a danos na


membrana. Já a liberação de endonucleases ocasiona a fragmentação da cromatina e o DNA,
ocasionando lesão nuclear. Por sua vez, as ATPases contribuirão ainda mais para a depleção de
ATP.
Além disso, o aumento da permeabilidade mitocondrial ocasionada pelo acúmulo de
cálcio também contribuirá para a diminuição da produção de ATP.

3 - ACÚMULO DE RADICAIS LIVRES


(ESPÉCIES REATIVAS DE OXIGÊNIO)
Esse tipo de lesão pode acontecer em diversas condições, como: lesão química ou por
radiação, destruição de microrganismos pela fagocitose e, até mesmo, pelo processo respiratório
normal e envelhecimento celular. “Os radicais livres são espécies químicas que possuem um único
elétron não pareado em uma órbita externa” (KUMAR et al., p. 20, 2010). Por possuírem essa
configuração instável, essas moléculas são capazes de reagir substâncias orgânicas ou inorgânicas,
como proteínas, lipídios, ácidos nucleicos e carboidratos. As espécies reativas de oxigênio
(ERO) são um tipo de radical livre que são produzidas normalmente dentro da célula, durante
a respiração e geração de energia pela mitocôndria, porém, são removidas para que não fiquem
excessos. Um desequilíbrio nesse sistema, ou pelo excesso de produção de ERO ou pela falta de

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remoção, causa um excesso de radicais livres que é conhecido como estresse oxidativo (Figura
4). O estresse oxidativo é ligado a diversos processos patológicos, incluindo o envelhecimento, as
lesões celulares, o câncer e, até mesmo, doenças degenerativas, como o Alzheimer.

Figura 4 - Papel das espécies reativas de oxigênio (ERO) na lesão celular. Fonte: Kumar et al. (2010).

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Os efeitos patológicos das ERO estão intimamente relacionados com as substâncias com
as quais eles reagem:

• Oxidação de ácidos graxos: A peroxidação de lipídeos e ácidos graxos pelas ERO


pode desencadear o rompimento da membrana de organelas e da própria membrana
plasmática.

• Oxidação de proteínas: A oxidação de aminoácidos e proteínas pode levar à perda de


atividade de diversas enzimas e pode romper a conformação de proteínas estruturais,
intensificando a degradação pelos proteossomas, tendo como resultado destruição por
toda a célula.

• Oxidação de ácidos nucleicos: Os radicais livres causam oxidação do DNA, o que pode
ocasionar em mutações ou quebra do material genético. O que pode estar intimamente
relacionado ao envelhecimento e à transformação maligna das células. A instabilidade dos
radicais livres, como o superóxido, faz com que a sua decomposição também aconteça
facilmente. Além disso, as células desenvolveram diversos mecanismos de remoção de
radicais livres, como:

• Antioxidantes: Essas substâncias bloqueiam o início da formação ou fazem a remoção


dos radicais livres. Como exemplos de antioxidantes podemos citar as vitaminas E e A,
o ácido ascórbico e a glutationa no citosol.

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• Proteínas que se ligam aos íons ferro e cobre: O ferro e o cobre podem favorecer
a formação de radicais livres, uma vez que doam ou aceitam elétrons livres durante
reações intracelulares. Dessa forma, proteínas de armazenamento e transporte como a
transferrina, ferritina, ceruloplasmina, se ligam aos íons livres, diminuindo a formação
das ERO.

• Enzimas: Enzimas como a catalase, as superóxido desmutases (SODs) e a glutationa


peroxidase atuam como sistemas de remoção de radicais livres e realizam a degradação
de H2O2 e O2 (os quais estão intimamente relacionados com a formação das ERO).

3.1. Degenerações
As degenerações podem ser definidas como “lesão celular reversível secundária a alterações
bioquímicas que resultam em acúmulo de substâncias no interior das células” (BRASILEIRO
FILHO, 2014, p. 87).
Essas degenerações são classificadas de acordo com a natureza da substância acumulada.
Dessa forma, podemos dividi-las em: degeneração por acúmulo de eletrólitos e água (degeneração
hidrópica); degeneração por acúmulo de proteínas (degeneração hialina e degeneração mucoide);
degeneração por acúmulo de lipídios (esteatose e lipidoses); degeneração por acúmulo de
carboidratos (glicogenoses e mucopolissacaridoses).

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3.1.1. Degeneração hidrópica


A degeneração hidrópica é uma lesão reversível, caracterizada pelo acúmulo intracelular
de eletrólitos e água. Como consequência, as células se apresentarão tumefeitas e aumentadas de
volume.
Entre as diversas etiologias possíveis de uma degeneração hidrópica podemos destacar:
hipóxia, hipertermia exógena ou endógena, toxinas com atividade ATPases ou fosfolipases. Todas
essas causas têm em comum a diminuição da quantidade de ATP ou danos às membranas, o que
causa a retenção de sódio e aumento do influxo de água (mecanismo já detalhado anteriormente).
Assim que a causa da degeneração for eliminada, as células retornam ao aspecto normal.

3.1.2. Degeneração hialina


É o acúmulo de material proteico acidófilo. Essa alteração pode ser produzida por
uma variedade de alterações e não representa um padrão específico. Ela pode ser resultante da
condensação de filamentos e proteínas no interior das células, do acúmulo de material viral ou,
até mesmo, por proteínas endocitadas.

4 - DEGENERAÇÃO MUCOIDE

PATOLOGIA | UNIDADE 1
Pode acontecer em decorrência da superprodução de muco, especialmente no
trato digestivo e respiratório ou devido a produção exagerada de mucinas em adenomas e
adenocarcinomas.

5 - ESTEATOSE
A esteatose é o acúmulo anormal de triglicerídeos no interior das células. O órgão mais
comumente associado à essa degeneração é o fígado, uma vez que ele é o principal órgão envolvido
no metabolismo lipídico, mas também pode acontecer no coração, rins, entre outros órgãos. A
esteatose acontece devido à interferência dos agentes lesivos no metabolismo dos lipídeos, como:
aumento da síntese de ácidos graxos decorrente de lipólise ou ingestão excessiva; produção de
ácidos graxos a partir do excesso de Acetil coA; redução da utilização de triglicerídeos para a
síntese de lipídeos complexos, devido à carência de fatores nitrogenados e de ATP; menor formação
de lipoproteínas por deficiência na síntese de apoproteínas, os quais podem ser visualizados na
Figura 5. Entre as causas mais comuns de esteatose, podemos citar o abuso de álcool, a obesidade,
a desnutrição proteico-calórica e a ação de substâncias hepatotóxicas.

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PATOLOGIA | UNIDADE 1
Figura 5 - Possíveis mecanismos de acúmulo de triglicerídeos no fígado. Fonte: Kumar et al. (2016).

• Esteatose por abuso de álcool: O consumo excessivo de álcool é uma das causas mais
comuns de esteatose hepática. O álcool, quando metabolizado, produz acetaldeído,
essa substância, em excesso, é tóxica tanto para as mitocôndrias quanto para o retículo
endoplasmático, o que compromete a metabolização de substâncias tóxicas e também
a produção de proteínas. Esses danos favorecem o acúmulo de triglicerídeos, uma vez
que eles deixam de ser utilizados na produção de outras substâncias que necessitam
de proteínas. Ao mesmo tempo, existe um aumento de ácido acético e Acetil CoA. O
excesso de Acetil CoA promove a síntese de ácidos graxos, o que aumenta ainda mais a
quantidade de triglicerídeos e faz com que eles se acumulem nas células. Além disso, a
esteatose induzida pelo abuso de álcool é frequentemente agravada pela desnutrição que,
muitas vezes, acompanha o alcoólatra crônico.

• Esteatose e a desnutrição proteico-calórica: A deficiência de proteínas leva a redução da


síntese de apoproteínas e lipoproteínas, o que compromete a excreção dos triglicerídeos.
Já a ingestão calórica deficiente causa mobilização de lipídeos que estavam armazenados
no tecido adiposo, gerando lipólise e aumento de aporte de ácidos graxos para o fígado.

• Morfologia da esteatose: A esteatose é observada mais frequentemente no fígado e no


coração. Em todos os órgãos ela aparece na forma de vacúolos claros dentro das células.
Macroscopicamente pode demorar um pouco para conseguir se observar as alterações.
No fígado, com o acúmulo progressivo, o órgão aumenta de tamanho e torna-se cada
vez mais amarelado. Em casos extremos, chega a pesar até quatro vezes mais que o peso
normal.

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• Evolução e consequências da esteatose: Embora seja uma lesão reversível, em casos


graves a esteatose pode evoluir para a morte celular. No fígado, por exemplo, os hepatócitos
podem romper-se e gerar uma reação inflamatória. Pode haver ainda embolia gordurosa,
o que é facilitado por traumatismos. A esteatose, especialmente decorrente do alcoolismo
crônico, pode evoluir para a cirrose.

O Kwashiorkor é o nome utilizado para descrever uma condição de desnutrição


proteico-calórica grave. Esse nome foi dado a partir de um dos dialetos de Gana,
que descreve a condição nutricional do filho mais velho, quando nasce um irmão
mais novo. O filho mais velho deixa de ser amentado e ter acesso aos nutrientes
necessários e passa a ter uma alimentação pobre em proteínas e calorias, o que
caracteriza a desnutrição. O Kwashiorkor é a mais grave e comum das deficiên-
cias nutricionais em países subdesenvolvidos. Além da degeneração gordurosa,
caracterizada pelo abdômen distendido, ocorre também inchaço dos pés e torno-
zelos, queda de cabelo, perda de dentes, despigmentação da pele e irritabilidade.
Ocorre ainda a descoloração do cabelo devido à baixa ingestão proteica, por isso,
crianças com Kwashiorkor apresentam cabelos brancos ou avermelhados.

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6 - LIPIDOSES
Nas lipidoses, ocorre o acúmulo de lipídeos, especialmente colesterol. Esse acúmulo pode
acontecer em diversos locais e recebe nomes específicos:

- Aterosclerose: É o acúmulo de colesterol e ésteres de colesterol nas células e macrófagos


que estão dentro artérias.

- Xantomas: São aglomerados de células cheias de colesterol que se encontram no tecido


conjuntivo subepitelial da pele e tendões, formando uma massa amarelada.

7 - GLICOGENOSES
São doenças genéticas, caracterizadas pelo acúmulo de glicogênio nas células, e,
normalmente, acontece devido a deficiência de enzimas que participam do seu processo de
degradação. Esse acúmulo é visto especialmente nas células do fígado, rins, músculos esqueléticos
e coração.

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8 - MUCOPOLISSACARIDOSES
Acontecem devido a deficiências enzimáticas e podem apresentar características diferentes
dependendo da enzima que está em falta. Sintomas comuns à maioria das mucopolissacaridoses
são: anormalidades no esqueleto, artérias e válvulas cardíacas, retardamento mental e opacificação
da córnea.

9 - MORTE CELULAR
Como visto anteriormente, quando as células não são capazes de se adaptar a um estresse,
elas podem sofrer uma lesão. A lesão celular pode ser reversível ou irreversível, dependendo da
natureza do agente agressor e da intensidade e duração da agressão. A morte celular, dessa forma,
é o resultado de uma lesão irreversível.

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Figura 6 - Alterações morfológicas da lesão celular que resultam em necrose e apoptose. Fonte: Kumar et al. (2010).

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A morte celular pode acontecer por necrose ou por apoptose. Quando a morte acontece
e é seguida de autólise, ou seja, degradação enzimática dos componentes celulares por enzimas
produzidas pela própria célula liberadas pelo lisossomo, recebe o nome de necrose. Já quando a
célula sofre contração, condensação da sua estrutura, fragmenta-se e é fagocitada por macrófagos
ou células vizinhas e não sofre o processo de autólise, recebe o nome de apoptose (Figura 6).

9.1. Necrose
O aspecto morfológico da necrose resulta da digestão enzimática sofrida pelas células.
Quando a lesão sofrida pela célula é suficiente para interromper as funções vitais (produção de
energia, comprometimento das sínteses celulares), os lisossomos perdem a capacidade de conter
as enzimas no seu interior e essas são liberadas para o citosol e, dessa forma, iniciam a autólise.
Os lisossomos possuem enzimas capazes de digerir praticamente todos os substratos celulares e
é da ação dessas enzimas que resultam as alterações morfológicas observadas após a morte da
célula.

9.1.1. Aspectos morfológicos microscópicos


As células que sofrem necrose se mostram com eosinofilia aumentada, quando coradas
por hematoxilina e eosina, o que se deve às proteínas citoplasmáticas desnaturadas e à perda do
RNA. Quando as organelas já foram digeridas, o citoplasma apresenta-se vacuolizado e, com a

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evolução, toma aspecto granuloso e tende a formar massas amorfas, devido à mistura do material
citoplasmático decorrente do rompimento das membranas. As alterações nucleares podem
aparecer em três padrões, todos devido à degradação inespecífica do DNA.
Quando o núcleo aparece intensamente basófilo, condensado e com tamanho bem menor
que o normal, recebe o nome de picnose. A digestão da cromatina pode fazer a afinidade tintorial
desaparecer, caracterizando a cariólise. E, por último, o núcleo pode se fragmentar e dispersar no
citoplasma, fenômeno chamado de cariorrexe.
Basicamente, qualquer agente lesivo pode causar necrose, porém, o aspecto da lesão varia
de acordo com a causa. A necrose dos tecidos possui vários padrões morfológicos distintos, cujo
reconhecimento fornece pistas sobre a causa básica.

9.1.2. Necrose por coagulação ou necrose isquêmica


Macroscopicamente a área apresenta-se esbranquiçada. Essa necrose apresenta como
características a perda do núcleo e a manutenção da arquitetura básica dos tecidos, pelo menos
por alguns dias. É comum em órgãos como coração, rins, baço, pulmões e intestino.

9.1.3. Necrose por liquefação


A região necrosada apresenta uma textura mole ou até mesmo liquefeita devido à digestão
das células mortas. É observada em infecções bacterianas, devido ao acúmulo de leucócitos e
liberação de enzimas.

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9.1.4. Necrose caseosa


Recebe esse nome pois a área necrosada adquire aspecto macroscópico de massa de queijo
(latim: caseum). Microscopicamente observa-se a transformação de células necróticas em uma
massa homogênea e acidófila, contendo núcleos picnóticos e fragmentados (cariorrexe). Esse
tipo de necrose é comum na tuberculose e em infecções fúngicas como a paracoccidioidomicose.

9.1.5. Necrose gordurosa


Áreas focais de destruição gordurosa. Por ação lipases sobre os triglicerídeos, os ácidos
graxos sofrem saponificação na presença de sais alcalinos, originando depósitos esbranquiçados,
parecidos com “pingos de vela”, visíveis macroscopicamente.

10 - EVOLUÇÃO
Dependendo do tipo de tecido acometido, do órgão e da extensão da área a necrose pode
seguir diferentes caminhos.

- Regeneração: Quando o tecido possui capacidade de regeneração, os restos celulares são

PATOLOGIA | UNIDADE 1
reabsorvidos e fatores de crescimento liberados pelas células vizinhas e por leucócitos induzem a
multiplicação de células. Caso o estroma tenha sido pouco alterado há regeneração completa do
tecido. Caso a área de necrose seja extensa, ocorre a regeneração, porém a arquitetura do órgão
tende a ficar distorcida.

- Cicatrização: Processo em que o tecido que sofreu necrose é substituído por tecido
conjuntivo cicatricial. Os restos celulares são fagocitados e células endoteliais e fibroblastos
surgem e ocupam o espaço antes pertencente ao tecido necrosado.

- Encistamento: Quando o tecido necrótico não pode ser reabsorvido, por ser muito
volumoso ou por que a migração de leucócitos é impedida, a reação inflamatória acontecerá na
periferia da lesão. Ocorre então o encistamento da área de necrose que será, então, absorvida
lentamente.

- Eliminação: Caso o local que sofreu necrose tenha comunicação com o meio externo, esse
material é eliminado, originando, assim, uma cavidade. Esse processo é comum na tuberculose,
em que o material da necrose caseosa é eliminado pelos brônquios e forma as chamadas cavernas
tuberculosas.

- Gangrena: A gangrena pode ser considerada um padrão morfológico de necrose


(KUMAR et al., 2010), ou uma evolução da necrose que resulta da ação de agentes externos sobre
a área necrosada (BRASILEIRO FILHO, 2014). Quando a região necrosada sofre desidratação
intensa, especialmente quando em contato com o ar, origina a gangrena seca, que também é
conhecida como mumificação, devido à aparência da área lesada. A gangrena seca acontece
especialmente nas extremidades, como pontas dos dedos e, na maioria das vezes, é decorrência
de lesões vasculares, como no diabetes melito.

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Caso o tecido necrosado seja invadido por microrganismos anaeróbios produtores de


enzimas que tendem a liquefazer o tecido e produzir bolhas, ele recebe o nome de gangrena
úmida. Esse tipo de gangrena é comum no tubo digestivo, pulmões e pele, em que as condições
de umidade a favorecem. Por sua vez, a gangrena gasosa é secundária à contaminação do tecido
necrosado por microrganismos do gênero Clostridium, os quais produzem enzimas lipolíticas e
proteolíticas e grande quantidade de gás.

10.1. Apoptose
A apoptose é uma via de morte celular também conhecida por morte programada, uma
vez que ela é estimulada a acionar mecanismos que culminam com a sua morte. Diferentemente
da necrose, as células em apoptose não sofrem autólise, elas se quebram em fragmentos, também
chamados de corpos apoptóticos, que contém porções de núcleo e citoplasma. Esses fragmentos
são, então, fagocitados rapidamente, sem que ocorra o extravasamento do conteúdo celular, não
havendo, dessa forma, reação inflamatória no hospedeiro.

10.2. Apoptose em situações fisiológicas


A apoptose é um fenômeno normal e frequente que funciona para eliminar células que
já não são mais necessárias e, também, como mecanismo de remodelação de órgãos durante a
embriogênese e na vida pós-natal. Podemos citar como exemplos:

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• Involução de tecidos hormônio-dependentes: Um bom exemplo é o das glândulas
mamárias, terminada a fase de lactação as células que haviam se proliferado e secretado
leite entram em apoptose e restam apenas as células dos ductos mamários.

• Eliminação de linfócitos autorreativos potencialmente nocivos: Forma de controlar e


impedir reações contra os tecidos da própria pessoa.

• Morte de células que já tenham cumprido seu papel: Por exemplo, os neutrófilos após
o término da resposta inflamatória. Eles sofrem apoptose pois já foram provados dos
sinais de sobrevivência.

10.3. Apoptose em condições patológicas


Pode ser desencadeada por inúmeros agentes, como vírus, hipóxia, radicais livres,
substâncias químicas, agressão imunitária, radiações etc., que causam modificações celulares que
são irreparáveis sem produzir reação no hospedeiro, limitando, assim, lesão paralela.

• Lesão de DNA: Radiação, hipóxia ou drogas citotóxicas podem lesar o DNA diretamente
ou por meio da produção de radicais livres. Caso os mecanismos de reparo não consigam
ser efetivos, a célula dispara os sinais que induzem a apoptose. É melhor a célula ser
eliminada do que arriscar manter uma célula que possa ter sofrido mutações que podem
progredir para uma transformação maligna.

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• Acúmulo de proteínas anormalmente dobradas: Essas proteínas surgem principalmente


de lesões por radicais livres. Esse processo leva a uma condição conhecida como estresse
do retículo endoplasmático, o que culmina em morte apoptótica das células.

• Morte células por infecções: Acontece particularmente em infecções virais, em que


os próprios vírus induzem a célula à apoptose ou ela acontece pela resposta imune do
hospedeiro.

10.4. Alterações morfológicas da apoptose


A apoptose atinge células individualmente, durante o processo ela se encolhe e o citoplasma
fica mais denso; a cromatina torna-se condensada e disposta em grumos acoplados à membrana
nuclear. O núcleo pode romper-se, produzindo dois ou mais fragmentos. Ao mesmo tempo, o
citoplasma emite projeções e forma brotamentos que contêm partes do núcleo, o que termina
com a fragmentação da célula em diversos pedaços, que constituem os corpos apoptóticos. Os
corpos apoptóticos são rapidamente ingeridos pelos fagócitos e degradados.

10.5. Mecanismos da apoptose


Todas as células possuem mecanismos que sinalizam sobrevivência ou morte. A apoptose
é resultado do desequilíbrio desses sinais. O início da apoptose ocorre de duas formas, pela via

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intrínseca (mitocondrial) e pela via extrínseca (por receptores). Elas são ativadas por diferentes
estímulos, porém convergem para a ativação das caspases, que são os mediadores da morte
celular, como podemos ver na Figura 7.

Uma revisão interessante a respeito das diferentes vias de apoptose pode ser vis-
ta no vídeo: Vias da apoptose (Legendado).
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=FuRFpYnY1aE>.
Acesso em 24 set. 2018.

10.5.1. Via intrínseca da apoptose


Para uma célula se manter viva ela necessita de sinais de sobrevivência. Enquanto a célula
produz esses sinais, a mitocôndria produz proteínas anti-apoptóticas, ou seja, que não deixam a
célula morrer. Essas proteínas, por exemplo, Bcl-2 e Bcl-x, fecham os canais das mitocôndrias,
não permitindo a saída de citocromo C, o qual é responsável pelo início da apoptose.

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Já quando a célula perde esses sinais de sobrevivência ou o DNA é lesado, ativam os


sensores de lesão ou estresse. Esses sensores também são chamados de “proteínas apenas BH3”
que agem como antogonistas ao Bcl-2 e Bcl-x, ativando, assim, efetores pró-apoptóticos críticos,
Bax e Bak, que se inserem na membrana mitocondrial e criam canais permitindo que proteínas
extravasem para o citoplasma. Entre essas proteínas, encontra-se o citocromo c. Quando
liberado no citosol, o citocromo c se liga a uma proteína chamada Apaf-1 (fator-1 de ativação
de apoptose) que forma um complexo chamado de apoptossoma. Esse complexo é capaz de se
ligar à caspase-9 enzima, desencadeando, assim, a cascata de caspases e a apoptose. As caspases
(de cysteine asparargil specific proteases) são enzimas que possuem cisteína no sítio ativo e que
clivam proteínas em locais com resíduos de ácido aspártico. Em humanos são conhecidas 12
caspases, mas nem todas estão envolvidas na apoptose. As caspases envolvidas na apoptose
podem ser divididas em ativadoras (8, 9 e 10) e efetuadoras (3, 6 e 7). A caspases ativadoras
fazem a proteólise das caspases 3, 6 e 7, que, por sua vez, ativam outras enzimas que degradam
diferentes substâncias intracelulares, incluindo o DNA.

10.5.2. Via extrínseca da apoptose


Esta via é iniciada através da ligação de receptores de morte presentes na membrana
plasmática de várias células. Esses receptores são membros da família do receptor TNF. Os mais
conhecidos são o TNF tipo 1 (TNFR1) e uma proteína denominada Fas. O ligante para Fas, por
exemplo, é o Fas ligante (FasL).

PATOLOGIA | UNIDADE 1

Figura 7 - Vias intrínseca e extrínseca da apoptose. Fonte: Kumar et al. (2010).

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Ele é expresso por células T, que reconhecem antígenos próprios (utilizados para eliminar
linfócitos autorreatores) e alguns linfócitos T citotóxicos. Quando receptor e ligante se unem
formam um sítio de ligação para uma proteína que contém um domínio de morte, denominada
FADD. A FADD, liga-se a uma forma inativa da caspase-8 ou caspase-10 (em humanos). Essas
caspases ativadas, acionam, então, caspases efetoras 3, 6 e 7, responsáveis pela ativação de
proteases. Além disso, a ativação da caspase-8 origina, através da clivagem de BH3, um fragmento
que se liga às proteínas Bcl-2 e Bcl-x, alterando a permeabilidade da mitocôndria e favorecendo
a saída de citocromo c para o citosol e, consequente, a ativação da caspase-9. Portanto, a ativação
da caspase-8 também aciona o mecanismo mitocondrial de apoptose.

10.5.3. A fase de execução da apoptose


Como vimos anteriormente, as duas vias de ativação da apoptose acionam caspases
desencadeantes. A via intrínseca ativa a caspase-9 e a via extrínseca a caspase-8 (caspase-10 em
humanos). Depois que essas caspases desencadeantes são clivadas e geram suas formas ativas,
as caspases efetoras são ativadas. As caspases efetoras clivam inibidores de DNases, tornando-as
ativas e induzindo, então, a clivagem do DNA. A clivagem de DNA gera fragmentos com 200
pares de bases e seus múltiplos, o que faz da análise de DNA através de eletroforese em gel um
método de reconhecimento da apoptose. As caspases também promovem a fragmentação do
núcleo e alterações no citoesqueleto e em proteínas de sustentação, o que será responsável pela
formação de bolhas na membrana citoplasmática. A retração do citoplasma acontece devido à
desidratação, por ativação de cinases e fosfatases que alteram o transporte de eletrólitos.

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10.5.4. Remoção das células mortas
As células que estão sofrendo apoptose produzem fatores solúveis que recrutam os
fagócitos. Alguns corpos apoptóticos expressam proteínas que também são reconhecidas pelos
fagócitos ou podem estar revestidos de anticorpos naturais e proteínas do sistema complemento,
que são reconhecidos pelos fagócitos. Esse processo é muito rápido e eficiente, as células mortas
desaparecem dentro de minutos e a inflamação é ausente.

11 - DISTÚRBIOS ASSOCIADOS À APOPTOSE


DESREGULADA

11.1. Distúrbios associados à apoptose defeituosa e aumen-


to da sobrevida celular (falta de apoptose)
A apoptose defeituosa pode falhar ao eliminar células potencialmente danosas, como
linfócitos autorreativos. Essa falta de apoptose pode ser a base de doenças autoimunes. Uma
das proteínas mais importantes da regulação do ciclo celular é a p53. Células que apresentem
mutações em p53 e que não morram, poderão dar origem ao câncer, uma vez que mutação no
p53 é a anomalia genética mais comum encontrada em cânceres humanos.

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11.2. Distúrbios associados ao aumento de apoptose e morte


celular excessiva
Nesse caso, as doenças serão caracterizadas pela falta de células importantes, onde
podemos incluir doenças neurogenerativas, manifestadas por perda de grupos específicos de
neurônios. Infecções virais também podem induzir a apoptose excessiva, como no caso das
infecções pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), que envolve a destruição apoptótica
de linfócitos.

Diversas doenças vêm sendo associadas à apoptose desregulada, seja pela falta
dela ou excesso. Maiores informações e detalhes sobre a apoptose podem ser
observados no texto de FERRARI, C.K.B.: Apoptose: A importância da maquinaria
de morte celular no controle e na patogênese de doenças. Revista de Ciências
Médicas, Campinas, 2000, p. 21-31.
Disponível em: <http://periodicos.puc-campinas.edu.br/seer/index.php/ciencias-
medicas/article/viewFile/1338/1312>.

PATOLOGIA | UNIDADE 1
12 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com essa primeira unidade pudemos visualizar que nosso organismo trabalha de forma
organizada e possui diversos mecanismos para evitar problemas e danos maiores. Entendemos
como nossas células reagem aos mais diversos estímulos e que o tempo de duração, o tipo de
estímulo e a estrutura celular danificada podem causar diferentes consequências e reações.
Em estresses diferentes, que podem envolver falta de oxigênio e irrigação sanguínea,
mudanças de temperatura, sobrecarga de trabalho, entre outros, a primeira resposta do nosso
organismo é tentar adaptar nossas células para a nova realidade, alterando seu tamanho, forma
ou número. Quando essa adaptação não é possível, ocorrem as lesões celulares e, dependendo
da intensidade e do tempo, podem ser reversíveis ou irreversíveis, sendo que estas últimas
correspondem à morte celular.
A morte celular, especialmente a apoptose, é muito importante para o funcionamento
normal do nosso corpo, uma vez que é através dela que muitas células que não estão mais
correspondendo às necessidades são eliminadas.
Compreender os mecanismos de adaptação, lesão e morte celular serão fundamentais
para o entendimento das abordagens dos processos patológicos que serão estudados nas próximas
unidades.

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UNIDADE ENSINO A DISTÂNCIA

02
DISCIPLINA: PATOLOGIA

INFLAMAÇÃO AGUDA E
CRÔNICA
PROF.A DRA. MARIANA APARECIDA LOPES ORTIZ

SUMÁRIO DA UNIDADE

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................... 28
1 - INFLAMAÇÃO AGUDA ......................................................................................................................................... 29
1.1. REAÇÕES DOS VASOS SANGUÍNEOS NA INFLAMAÇÃO AGUDA ................................................................. 29
1.2. REAÇÕES CELULARES DA INFLAMAÇÃO AGUDA ......................................................................................... 31
1.3. RESOLUÇÃO DA INFLAMAÇÃO AGUDA .......................................................................................................... 34
1.4. MEDIADORES DA INFLAMAÇÃO .................................................................................................................... 34
1.4.1. HISTAMINA E SEROTONINA ......................................................................................................................... 35
1.4.2. DERIVADOS DO ÁCIDO ARAQUIDÔNICO ..................................................................................................... 35
1.4.3. FATOR ATIVADOR DE PLAQUETAS (PAF) .................................................................................................... 38
1.4.4. ÓXIDO NÍTRICO (NO) .................................................................................................................................... 38
1.4.5. CITOCINAS E QUIMIOCINAS ........................................................................................................................ 38

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1.4.6. IL-1 E A TNF .................................................................................................................................................... 38
1.4.7. SISTEMA COMPLEMENTO ........................................................................................................................... 39
1.4.8. SISTEMAS DE COAGULAÇÃO E DAS CININAS ........................................................................................... 40
1.5. RESULTADOS DA INFLAMAÇÃO AGUDA ........................................................................................................ 40
2 - INFLAMAÇÃO CRÔNICA .................................................................................................................................... 41
2.1. MACRÓFAGOS NA INFLAMAÇÃO CRÔNICA ................................................................................................... 41
2.2. INFLAMAÇÃO GRANULOMATOSA .................................................................................................................. 43
3 - EFEITOS SISTÊMICOS DA INFLAMAÇÃO ....................................................................................................... 43
4 - CURA POR REPARO, FORMAÇÃO DE CICATRIZ E FIBROSE ......................................................................... 44
4.1. FORMAÇÃO DO COÁGULO SANGUÍNEO ......................................................................................................... 45
4.2. FORMAÇÃO DO TECIDO DE GRANULAÇÃO ................................................................................................... 45
4.3. PROLIFERAÇÃO CELULAR E DEPOSIÇÃO DE COLÁGENO ........................................................................... 45
4.4. FORMAÇÃO DA CICATRIZ ................................................................................................................................ 46
4.5. CONTRAÇÃO DA FERIDA ................................................................................................................................ 46
4.6. REMODELAMENTO DO TECIDO CONJUNTIVO ............................................................................................. 46
4.7. FATORES LOCAIS E SISTÊMICOS QUE INFLUENCIAM A CURA DE FERIDAS ........................................... 46
4.8. ASPECTOS PATOLÓGICOS DO REPARO ........................................................................................................ 47
4.9. FIBROSE ........................................................................................................................................................... 48
5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................ 49

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INTRODUÇÃO
A inflamação é uma resposta do hospedeiro, com a intenção de eliminar, neutralizar ou
diluir possíveis agentes estranhos. Em sua essência, é uma resposta totalmente protetora, visando
acabar com a causa inicial do dano, como, também, com as possíveis consequências desses
danos. Sem as reações inflamatórias, infecções pelos mais diversos microrganismos passariam
despercebidas, feridas dificilmente cicatrizariam e danos teciduais nunca seriam reparados.
As respostas inflamatórias não são tão simples quanto parecem e envolvem diversos
mecanismos e ações, que incluem reações vasculares, celulares e a liberação de uma infinidade
de mediadores químicos. As reações inflamatórias podem ser agudas ou crônicas, dependendo
do estímulo lesivo, da duração e da efetividade de reações iniciais.
Resumidamente, uma inflamação aguda é uma reação rápida e de curta duração, porém
bastante intensa. Ela envolve alterações vasculares e celulares. Caso a resposta aguda falhe ela
pode evoluir para a inflamação crônica, que é de longa duração, podendo durar muitos anos e
apresenta por característica principal a presença de células mononucleares.
Nesta unidade descreveremos os eventos e mediadores relacionados a inflamação aguda
e suas possíveis consequências. Em seguida, veremos como funciona a inflamação crônica e suas
principais características. Uma vez que o processo de eliminação de agentes nocivos através da
inflamação, muitas vezes, causa danos ao próprio tecido, finalizaremos descrevendo as principais

PATOLOGIA | UNIDADE 2
etapas da cura por reparo, formação de cicatriz ou fibrose, suas possíveis complicações e
características.

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1 - INFLAMAÇÃO AGUDA
A inflamação aguda é uma resposta rápida do hospedeiro, que possui como finalidade
levar proteínas e células do plasma até o tecido que está sofrendo a injúria. Essa resposta pode ser
desencadeada pelos mais diversos estímulos:

• Infecções: As infecções, sejam elas bacterianas, virais, parasitárias ou fúngicas são as


causas mais comuns de inflamação. As células possuem diversos receptores que servem
como sensores para a presença desses microrganismos e a ocupação desses receptores
dispara a produção dos mediadores que darão início à inflamação.

• Necrose tecidual: Como visto na unidade anterior, uma das características da necrose
é a presença de reação inflamatória. Essa reação pode ser desencadeada por diversas
moléculas liberadas pelas células necróticas, como: ácido úrico, ATP e, até mesmo, o
próprio DNA, quando é liberado no citoplasma.

• Corpos estranhos: Sujeiras, pedaços de madeira, fios de sutura etc. são capazes de
iniciar uma resposta inflamatória tanto pela injúria causada pelo trauma, quanto pela
eventual contaminação microbiana existente nessas substâncias.

PATOLOGIA | UNIDADE 2
• Reações imunes: A reação imunológica do próprio indivíduo é capaz de causar danos
aos tecidos. Essas reações podem ser direcionadas a antígenos próprios, como nos casos
de doenças autoimunes ou reações excessivas contra microrganismos. Nessas doenças, a
reação inflamatória é a principal responsável pelos danos aos tecidos.

Apesar dos estímulos serem diversos, as reações inflamatórias compartilham de


características comuns. Essas reações podem ser divididas em: reações dos vasos sanguíneos
e reações celulares à inflamação aguda. E, como resultados, essas reações produzem sinais e
sintomas típicos, considerados sinais cardinais: calor, rubor, tumor, dor e perda de função.

1.1. Reações dos Vasos Sanguíneos na Inflamação Aguda


As reações dos vasos sanguíneos são as primeiras a acontecer e são responsáveis por
maximizar e direcionar células e proteínas plasmáticas para fora da circulação em direção ao
local injuriado.
O líquido que sai dos vasos sanguíneos em direção aos tecidos, recebe o nome de exsudato.
O exsudato é um líquido com alta concentração de proteínas, restos celulares e alta densidade,
resultado do aumento da permeabilidade vascular e é característico de uma reação inflamatória.
Já o transudato é um fluido vascular pobre em proteínas, com pouco material celular e baixa
densidade, normalmente está relacionado à desequilíbrios osmóticos ou hidrostáticos, sem
aumento de permeabilidade vascular. Essas diferenças estão ilustradas na Figura 1.

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Figura 1 - Mecanismos de transudação e exsudação. Fonte: Kumar et al. (2010).

• Mudanças no fluxo e calibre vascular: As mudanças vasculares se iniciam com a


vasodilatação, tendo como resultado o fluxo sanguíneo aumentado. A vasodilatação
acontece devido à ação de mediadores químicos que são liberados. Entre os vários
mediadores envolvidos na vasodilatação, podemos destacar a histamina e o óxido nítrico
(NO). Logo em seguida, a vasodilatação é rapidamente acompanhada de aumento da
permeabilidade da microvasculatura, o que resulta no extravasamento de fluido rico em
células e proteínas para os tecidos.

• Permeabilidade vascular aumentada: A característica responsável pelo extravasamento


do exsudato rico em proteínas pode ser desencadeada de diversas formas: (1) contração de
células endoteliais: é o mecanismo mais comum e acontece devido à ação de mediadores
como a histamina, bradicinina e leucotrienos. Possui como característica ser rápida e de
curta duração; (2) injúria endotelial: é resultado de dano direto às células do endotélio,
como em queimaduras ou ação direta de microrganismos. Nesse caso, o extravasamento
pode durar vários dias, até que ocorra a reparação dos vasos lesados; (3) transicitose:
acontece devido ao trânsito aumentado de fluidos e proteínas e podem envolver canais
de transporte, que são estimulados pela liberação de fatores de crescimento. Muitas
vezes, esses mecanismos de extravasamento acontecem ao mesmo tempo, como em
queimaduras, por exemplo, o que pode levar a perda excessiva de fluidos e risco à vida
do paciente.

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1.2. Reações Celulares da Inflamação Aguda


A fase efetora da reação inflamatória é realizada pelos leucócitos, especialmente os
neutrófilos e macrófagos, que possuem a capacidade de realizar a fagocitose do agente agressor.
Chegando ao local da lesão, essas células são ativadas com a finalidade de englobar os patógenos
ou tecidos danificados e torná-los inofensivos.
Muitas vezes, esse processo pode acontecer de forma bastante intensa e os produtos
produzidos pelas próprias células são capazes de induzir dano tecidual. Para que essas células
não liberem substâncias bioativas de forma sistêmica, é necessária uma interação mútua entre os
neutrófilos e a lesão, o que assegura que a reação acontecerá em torno do local da lesão.
A jornada dos leucócitos até o local da lesão é constituída por diversas fases, que
acontecem dentro do vaso e fora dele. Dentro do vaso acontecem a marginação, o rolamento e a
adesão. Seguidos do deslocamento através do endotélio e migração nos tecidos, para, finalmente,
realizarem suas funções de eliminação do agente agressor.

• Marginação, rolamento e adesão: O primeiro evento celular é a marginação, que


consiste no processo em que os leucócitos deixam o centro dos vasos e passam a
ocupar a periferia. Logo em seguida eles são capturados e se aderem firmemente ao
endotélio para, finalmente, migrar através da parede das vênulas. A captura, rolamento
e adesão dos leucócitos são mediados por moléculas de adesão presentes tanto na
superfície do endotélio quanto dos leucócitos. As moléculas presentes no endotélio
são da superfamília das imunoglobulinas (ICAM-1 e 2, VCAM-1, CD-31, JAM-31), as

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selectinas P e E e resíduos de carboidratos em glicoproteínas do glicocálice (PSGL-1,
CD-34, Mad-CAM, Gly-CAM). Os macrófagos teciduais, mastócitos e células endoteliais
que encontram os agentes injuriantes respondem secretando várias citocinas, incluindo
fator de necrose tumoral (TNF), interleucina-1 e quimiocinas, as quais agem nas células
endoteliais de vênulas e capilares, estimulando a expressão de moléculas de adesão. Os
leucócitos expressam L-selectina e ligantes para selectinas P e E e se ligam às moléculas
complementares no endotélio. Essas interações possuem baixa afinidade, o que faz com
que os leucócitos se liguem e desliguem sucessivas vezes com a ação do fluxo sanguíneo,
o que caracteriza o rolamento.

O rolamento e as fracas ligações desaceleram os leucócitos e dão oportunidade de


ocorrerem ligações mais firmes. As ligações mais firmes acontecem da interação das integrinas
leucocitárias às moléculas endoteliais ICAM-1 e VCAM-1. Dessa forma, os leucócitos param de
rolar e começam a se reorganizar para migrar para fora dos vasos (Figura 2).

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Figura 2 - Eventos celulares intravasculares. Fonte: Kumar et al. (2010).

• Migração através do endotélio: O próximo passo é a migração através do endotélio, que


recebe o nome de diapedese. Quimiocinas agem nos leucócitos e estimulam a migração das
células. Para isso, ocorre a reorganização do citoesqueleto celular, que emite pseudópodes

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em direção à parede vascular. Moléculas presentes nas junções intercelulares também
estão envolvidas na migração e incluem a CD-31, também conhecida como PECAM-1.
Os leucócitos atravessam o espaço interendotelial aderidos às células endoteliais por meio
da ligação integrinas-CD-31 e, quando terminam de atravessar, as CD-31 vão se unindo
atrás como um “zíper”.

• Migração até o tecido lesado: Após sair da circulação, os leucócitos migram para o
tecido lesado, o que recebe o nome de quimiotaxia. Esse processo depende da liberação
de substâncias quimiotáticas, as quais orientam o movimento das células através de
um gradiente de concentração. A medida que os leucócitos avançam, o gradiente de
concentração do quimiotático aumenta. As substâncias quimiotáticas podem ser trazidas
pelo próprio agente inflamatório, ou seja, exógenas, ou endógenas, quando geradas
no foco da inflamação. Os principais agentes endógenos são produtos da ativação do
complemento, substância P, leucotrienos, citocinas e quimiocinas. O tipo de célula ou
de infiltrado varia de acordo com o tipo de estímulo e idade da resposta inflamatória.
Nas primeiras 24 horas da inflamação aguda predominam os neutrófilos e esses são
substituídos posteriormente por monócitos. Os neutrófilos, além de responderem
mais rápido as quimiocinas, são mais numerosos no sangue, por isso surgem mais
precocemente, porém possuem meia vida curta e entram em apoptose em, no máximo,
48 horas. Já os monócitos sobrevivem por mais tempo e podem se proliferar nos tecidos,
dessa forma, são as células predominantes da inflamação crônica, a qual será abordada
adiante nesse material.

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• Fagocitose: A fagocitose pode ser definida como a ingestão de partículas grandes e


formação de um fagossomo. É o principal mecanismo efetor de eliminação de agentes
agressores na inflamação aguda. Ela envolve algumas fases, que são: (1) o reconhecimento
e ligação da partícula que será ingerida; (2) sua ingestão e formação do fagossomo e (3)
morte ou degradação da partícula englobada.

Diversos receptores presentes nos leucócitos são responsáveis pela ingestão dos
microrganismos, entre eles receptores de manose, receptores limpadores e receptores para várias
opsoninas. Os receptores de manose, por exemplo, ligam-se a resíduos de manose e fucose,
que são encontrados tipicamente em células microbiana, e não em células de mamíferos, o que
impede que células próprias sejam reconhecidas e fagocitadas. As principais opsoninas, ou seja,
substâncias capazes de sinalizar uma partícula como alvo da ingestão (opsonização), são os
anticorpos IgG, o produto da quebra de C3b do complemento e certas lectinas (especialmente a
lectina ligante de manana).
Após a ligação entre receptor e partícula, extensões do citoplasma dos leucócitos são
lançadas e fluem ao redor da partícula, até se fechar e formar um vacúolo chamado de fagossomo.
Durante esse processo, os lisossomos se aproximam do fagossomo e despejam nele seu conteúdo.
Uma vez que o vacúolo ainda não está totalmente fechado, pode acontecer o extravasamento de
parte das enzimas lisossômicas, o que pode explicar lesões teciduais frequentes em regiões onde
acontece a fagocitose. A fusão entre fagossomo e lisossomo recebe o nome de fagolisossomo, e
pode ser inibida por substâncias produzidas por alguns microrganismos patogênicos que, assim,
conseguem escapar da morte.

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A morte microbiana ou a eliminação de células necróticas no interior do fagócito pode
acontecer de diversas formas, mas é executada largamente por espécies reativas de oxigênio
(ERO) e espécies reativas de nitrogênio, derivadas do NO. A geração dos ERO é resultado da
ativação de um componente conhecido como fagócito oxidase. O NADPH reduz o oxigênio a
ânion superóxido. O superóxido origina H2O2 e O2 por ação da superóxido desmutase (SOD),
abundante no citoplasma dos fagócitos. Como a membrana do fagolisossomo é impermeável à
SOD, a reação fica restrita aos agentes lesivos e as organelas da própria célula estão protegidas.
Esse processo é conhecido como explosão respiratória e seus efeitos microbicidas estão
relacionados a: (1) superóxido que produz lesão por peroxidação ao atuar diretamente sobre os
microrganismos; (2) H2O2 é um agente oxidante e pode matar bactérias diretamente na presença
de ácido ascórbico; (3) produção de hipo-halitos dentro do fagossomo que desnatura proteínas
por oxidação de carboidratos.
O NO também participa da morte microbiana, ao reagir com o superóxido forma um
radical livre altamente reativo, o peroxinitrito. Eles atacam e danificam lipídeos, proteínas e
ácidos nucleicos dos microrganismos.
Substâncias contidas nos grânulos dos leucócitos também podem levar a morte
microbiana. Enzimas como a elastase e substâncias como as defensinas, catelicidinas, lisozima,
lactoferrina, proteína básica principal e proteína bactericida que aumenta a permeabilidade estão
presentes nesses grânulos e também são importantes auxiliares, especialmente contra bactérias.

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1.3. Resolução da Inflamação Aguda


Como vimos anteriormente, a resposta inflamatória possui uma capacidade inerente de
causar dano tecidual, dessa forma, não é interessante que ela tenha uma duração excessiva. Os
mecanismos responsáveis pelo término da inflamação aguda são vários e envolvem de forma
geral: (1) modificações em receptores de células do exsudato e dos tecidos; (2) geração local
de mediadores com efeito anti-inflamatório; (3) mudança no comportamento das células que
tendem a apoptose ou que quando sobrevivem passam a exercer atividade anti-inflamatória.

• Mudança em receptores: O início da inflamação se deve, principalmente, ao fato de


haver um predomínio de mediadores pró-inflamatórios como, também, à existência de
um maior número de receptores para esses mediadores nos leucócitos. Os leucócitos
que migraram em direção aos tecidos, passam a expressar maior números de receptores
indutores de respostas anti-inflamatórias, como: receptores adrenérgicos e colinérgicos,
receptores purinérgicos p2 para adenosina e receptores H2 para histamina. Dessa forma,
um mediador pró-inflamatório, como a histamina, passa a ter efeito anti-inflamatório
quando ligada a receptores H2. O aumento na expressão de receptores anti-inflamatórios
também é responsável por causar redução na expressão de receptores para moléculas
pró-inflamatórias.

• Mediadores anti-inflamatórios: Prostaglandinas e leucotrienos, ambos derivados


do ácido araquidônico, são liberados em grande quantidade no início da inflamação,

PATOLOGIA | UNIDADE 2
atuando especialmente nos fenômenos vasculares. A síntese dessas substâncias ativa,
também, fatores de transcrição que induzem a expressão de substâncias importantes na
síntese de lipoxinas e resolvinas, que são importantes mediadores anti-inflamatórios.

• Mudança no comportamento das células: Os estímulos a favor da sobrevivência


dos linfócitos tendem a diminuir e estímulos pró-apoptóticos começam a aumentar.
Após a apoptose, leucócitos, especialmente neutrófilos, liberam substâncias com efeito
quimiotático e são endocitados por macrófagos. As células que não sofreram apoptose,
especialmente macrófagos M2, produzem substâncias com atividade anti-inflamatória,
como TGF-β e IL-10, que inibem a atividade de mediadores e macrófagos pró-
inflamatórios (M1).

1.4. Mediadores da Inflamação


Como visto ao longo do texto, para que as alterações vasculares e celulares da inflamação
aconteçam, diversas substâncias são liberadas, as quais recebem o nome de mediadores. Os
mediadores mais importantes da inflamação serão discutidos com mais detalhes a partir de agora.

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1.4.1. Histamina e Serotonina


São as duas principais aminas vasoativas, ou seja, produzem ações importantes nos vasos
sanguíneos. Elas são armazenadas como pré-moléculas e são um dos primeiros mediadores a
serem liberados na inflamação.
A histamina causa tanto dilatação das arteríolas quanto aumento da permeabilidade das
vênulas. Ela está presente, principalmente, nos mastócitos, mas é encontrada, também, nos
basófilos e nas plaquetas.
A serotonina possui atividades similares às da histamina, porém ela é encontrada,
principalmente, nas plaquetas e é liberada quando ocorre agregação plaquetária

1.4.2. Derivados do ácido araquidônico


O ácido araquidônico (AA) é um ácido graxo, sintetizado a partir dos fosfolipídeos
de membrana após a lipólise, por meio da ativação da fosfolipase A2 em um mecanismo. Os
eicosanoides, como também são conhecidos os derivados do AA, participam tanto da fase
vascular quanto da fase celular da inflamação e são sintetizados por duas classes de enzimas, as
ciclo-oxigenases e as lipoxigenases (Figura 3).
As prostaglandinas são produzidas pelas mais variadas células, como os macrófagos,
mastócitos, células endoteliais e outras células. Elas são produzidas por ação das enzimas ciclo-
oxigenases (COX). A COX ocorre em duas isoformas, COX-1 e COX-2. A COX-1 é uma enzima

PATOLOGIA | UNIDADE 2
constitutiva amplamente expressa e é responsável pela produção de tromboxano (TXA2) (potente
agregador plaquetário e mediador de trombose) por plaquetas, macrófagos e outros leucócitos.
Por sua vez, a COX-2 é uma enzima indutível produzida no local da inflamação, cujo principal
produto é a prostaglandina E2 (responsável por vários efeitos pró-inflamatórios, incluindo febre,
dor e reações vasculares).

Estudos mais recentes demonstraram a presença de uma terceira variante da


COX, a COX-3, que é possivelmente uma variante da COX-1. Encontra-se principal-
mente no córtex cerebral, medula espinhal e coração. A inibição dessa COX por
AINEs, como o paracetamol, por exemplo, poderiam explicar o mecanismo central
pelo qual esses medicamentos reduzem a dor e a febre.

A prostaglandina E2 (PGE2) desempenha papel principal na inflamação aguda,


produzindo vasodilatação e aumento da permeabilidade microvascular. Sua atividade é mediada
por receptores celulares específicos que diferem na distribuição celular e nas vias de sinalização
que ativam. Em alguns casos a PGE2 pode ter ação anti-inflamatória.
A prostaciclina (PGI2) é predominantemente sintetizada por células endoteliais e
musculares lisas dos vasos em que atua localmente e é rapidamente inativada. Ela é vasodilatadora
e, também, potencializa o aumento na permeabilidade e efeitos quimiotáticos de outros
mediadores, além de ser um potente inibidor da agregação plaquetária.

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A prostaglandina D2 é produzida predominantemente nos mastócitos e está relacionada


tanto com vasodilatação quanto com aumento da permeabilidade vascular.
O tromboxano (TXA2), como já dito anteriormente, é um potente mediador da adesão
e agregação de plaquetas e vasoconstrição. Ele é sintetizado, predominantemente, por plaquetas
COX-1 mas também pode ser produzido por macrófagos ativados por COX-2.

PATOLOGIA | UNIDADE 2
Figura 3 - Visão geral da síntese de eicosanoides. Fonte: Kumar et al. (2010).

Os leucotrienos também são derivados do AA, porém são gerados através da enzima
5-lipoxigenase (5-LO). A 5-LO converte o AA a ácido-hidroxieicosatetraenoico, que é o
precursor dos leucotrienos. Eles são secretados, principalmente, pelos leucócitos e atuam como
quimioatraentes para outros leucócitos, além de possuírem efeitos vasculares.
O LTB4 é um dos mais potentes fatores quimiotáticos e possui ação fundamental no
início da inflamação. Esse LT promove a passagem dos neutrófilos para o local da inflamação,
ativa essas células e promove degranulação. O LTB4 estimula a liberação de diversas proteínas
antimicrobianas, além de recrutar outras células, como monócitos/macrófagos e precursores de
mastócitos.
As lipoxinas também são geradas a partir do AA, pela via da lipoxigenase, mas, ao
contrário dos outros derivados vistos até agora (prostaglandinas e leucotrienos), elas são
consideradas mediadores anti-inflamatórios ou inibidores da inflamação. Entre suas principais
ações encontram-se a capacidade de inibir o recrutamento de leucócitos e os componentes
celulares da inflamação.

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Entre os diversos fármacos anti-inflamatórios que agem inibindo a síntese de eico-


sanoides, qual deles é a melhor escolha? Muitos anti-inflamatórios não esteroidais
(AINES) produzem sua ação inibindo tanto a COX-1 quanto a COX-2. Inibidores não
seletivos ou não específicos da COX, como os salicilatos, são bastante eficazes
como anti-inflamatórios, analgésicos e antipiréticos, porém seu uso prolongado
não é recomendado, especialmente em decorrência dos efeitos colaterais. A COX-
1 é uma enzima constitutiva, ou seja, ela é produzida, também, em situações não
inflamatórias com função homeostática, como por exemplo na citoproteção do
trato gastrointestinal. Sua inibição e a baixa especificidade de inibição sobre a
COX-2 relaciona esse tipo de inibidores com efeitos gastrointestinais bastante de-
sagradáveis, como dor abdominal, sangramento, dispepsia e até perfuração gás-
trica ou duodenal. Inibidores seletivos da COX-2, como nimesulida, celecoxibe e
outros coxibes, são mais interessantes, uma vez que ela é induzida por estímulos
inflamatórios e está ausente na maioria dos tecidos. Porém, inibidores específi-
cos da COX-2 reduzem a produção de PGI2, que é antitrombótica e importante na
regulação do sistema renina-angiotensina no rim, levando a preocupação sobre a
segurança cardiovascular de tais agentes quando utilizados por períodos prolon-
gados. Por outro lado, os corticosteroides são considerados inibidores de amplo
espectro, eles podem agir pela redução da transcrição de genes que codificam a

PATOLOGIA | UNIDADE 2
COX-2, fosfolipase A2, citocinas pró-inflamatórias e NO.

Maiores informações e detalhes a respeito dos inibidores específicos da Cox-2


podem ser obtidos no texto de CARVALHO W. A. et al.: Analgésicos Inibidores Es-
pecíficos da Ciclooxigenase-2: Avanços Terapêuticos. Revista Brasileira de Anes-
tesiologia, 2004, p. 448-464.
Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rba/v54n3/v54n3a17.pdf>.

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1.4.3. Fator ativador de plaquetas (PAF)


Quando estímulos inflamatórios são liberados, o PAF é rapidamente sintetizado. Ele
também é outro mediador derivado de fosfolipídeos, que tem como principal função a agregação
de plaquetas. Entretanto, possui múltiplos efeitos inflamatórios, como efeitos de vasoconstrição
e broncoconstrição, em contrapartida, em baixas concentrações pode causar vasodilatação e
aumento da permeabilidade com uma potência muito superior à da histamina. O PAF também
causa aumento na adesão de leucócitos ao endotélio e quimiotaxia.

1.4.4. Óxido Nítrico (NO)


O NO é um gás solúvel que é produzido tanto pelas células endoteliais, quanto por
macrófagos. Ele é sintetizado a partir da L-arginina pela ação de NO-sintetases (NOSs). O NO
relaxa a musculatura lisa, promovendo vasodilatação e produz diversas substâncias microbicidas,
o que o torna importante na defesa do organismo contra infecções. Além disso, possui algumas
ações de controle de inflamação, como a inibição da agregação plaquetária e do recrutamento de
leucócitos.

1.4.5. Citocinas e quimiocinas


As citocinas são proteínas produzidas por diversos tipos celulares que regulam a atividade

PATOLOGIA | UNIDADE 2
de outros tipos celulares (na Tabela 1 podemos observar as principais citocinas da inflamação
aguda e suas funções). Entre as principais citocinas podemos citar a interleucina-1 (IL-1) e o fator
de necrose tumoral (TNF), que terão suas atividades descritas com mais detalhes.

1.4.6. IL-1 e a TNF


São produzidos principalmente por macrófagos ativados e possuem como principais
funções seus efeitos sobre o endotélio, os leucócitos, fibroblastos e a indução de reações sistêmicas.
No endotélio aumentam a expressão de moléculas de adesão, estimulam a produção de mais
citocinas e quimiocinas, além de aumentarem a atividade pró-coagulante. Nos leucócitos, são
responsáveis por sua ativação e a produção de mais citocinas. Nos fibroblastos, aumentam sua
proliferação e estimulam o aumento da síntese de colágeno, auxiliando, assim, no reparo tecidual.
Já em relação aos efeitos sistêmicos da inflamação, estão associados à febre, leucocitose, aumento
de proteínas de fase aguda, além de diminuírem o apetite e aumentarem o sono.
As quimiocinas (palavra derivada da contração das palavras citocina e quimiotáxica) são
pequenas proteínas que agem como atraentes para leucócitos. Elas são definidas pela conservação
da estrutura e pela localização das pontes dissulfeto entre os resíduos de cisteína. Atualmente, são
descritas quatro classes: CC, com cisteínas-chave adjacentes, CXC e CX3, em que os resíduos de
cisteína são separados por um ou três aminoácidos intervenientes, e C (ou XC), com ausência de
uma das cisteínas. A atividade das quimiocinas depende da interação com receptores. De forma
geral, elas estimulam o recrutamento de leucócitos e o os direcionam na migração pelos tecidos.

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1.4.7. Sistema complemento


Esses mediadores se enquadram nos mediadores derivados de proteínas plasmáticas. Ele
consiste em uma série de reações em cascata, envolvendo mais de 40 proteínas que, quando
desencadeada, produz diversos mediadores inflamatórios (Figura 4). Essas proteínas estão
presentes nas formas inativas no plasma e dependem de sua ativação para se tornarem enzimas
proteolíticas que degradam outras proteínas do sistema complemento, formando, assim, a
cascata. Entre as principais funções desse sistema estão: a estimulação da liberação de histamina
e a ativação da via da lipoxigenase do metabolismo de AA, aumentando, assim, a vasodilatação
e a permeabilidade vascular, além de auxiliarem na quimiotaxia; atuam como opsoninas,
promovendo a fagocitose de células bacterianas por neutrófilos e macrófagos; lise celular pela
deposição de complexo de ataque à membrana (MAC) nas células, o que as deixa permeáveis à
agua e íons, resultando em morte celular.

PATOLOGIA | UNIDADE 2
Figura 4 - Ativação e funções do sistema complemento. Fonte: Kumar et al. (2010).

O sistema complemento pode ser ativado por três diferentes vias: via clássica, via da
lectina e via alternativa. A via clássica é, também, conhecida como “anticorpo-dependente” e é
disparada pela fixação de C1 ao anticorpo. A ligação de C1 ativa novas enzimas que clivam C4
em C4b e C4a. A ligação de C4b a C2 formam a C3 convertase, que leva à clivagem de C3 em
múltiplos peptídeos ativos. A via da lectina é semelhante a via clássica, porém não utiliza C1,
mas, sim, uma lectina ligante de manose para o reconhecimento de substâncias estranhas, como
consequência também desencadeiam a ligação entre C4b e C2, gerando C3-convertase. Já na via
alternativa, a cascata é ativada por moléculas presentes na superfície bacteriana, por exemplo. O
importante é que independentemente da via, todas levam à formação de C3-convertase.

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1.4.8. Sistemas de coagulação e das cininas


A coagulação está frequentemente associada à inflamação. Ela possui duas vias que
convergem, resultando em ativação de trombina e produção de fibrina. O fator XII atua em
conjunto com o cininogênio e a calicreína plasmática, ativando a via intrínseca da coagulação.
O fator XII circula como um zimogênio inativo que, quando em contato com uma superfície
carregada negativamente, sofre uma alteração de conformação que leva à ativação de fator XII
a Fator XIIa, ativando trombina e desencadeando, assim, a cascata de coagulação. Os possíveis
ativadores in vivo desse processo são o colágeno ou componentes da membrana basal de vasos
expostos ou danificados e, no caso de infecções, a superfície bacteriana. O FXIIa tem papel
direto na inflamação, ativando a via do complemento, além disso, ele converte a pré-calicreína
na sua forma ativa, que quebra o cininogênio para produzir a bradicinina. A bradicinina é um
potente agente inflamatório que produz vasodilatação, leva à produção de NO e aumenta a
permeabilidade vascular. O Fator XIIa além de induzir a formação de coágulo, também ativa o
sistema fibrinolítico, produzindo plasmina, que degrada a fibrina e produz fibrinopeptídeos, que
induzem a inflamação.

Um resumo do processo de inflamação aguda pode ser visto no vídeo:


Inflamação Aguda Animação.

PATOLOGIA | UNIDADE 2
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=5mmzDyrL-Ng>.
Acesso em 25 set. 2018.

1.5. Resultados da inflamação aguda


Após todo esse processo, a inflamação aguda pode ter três resultados possíveis:

• Resolução completa: O agente injuriante foi eliminado e o local da inflamação foi


restaurado à sua condição normal. Isso acontece quando a inflamação foi curta e os
danos celulares foram brandos e puderam ser reparados. O reparo ou a regeneração
acontecem em tecidos ou órgãos que possuem células que se renovam continuamente,
como epitélios de revestimento e medula óssea. No fígado, por exemplo, a regeneração
é a regra após pequenas lesões, desde que haja preservação do estroma reticular. Com
a morte de pequeno número de hepatócitos, os vizinhos são estimulados e entram em
mitose, ocupando o lugar dos que desapareceram.

• Cura pela substituição do tecido conjuntivo: Esse resultado acontece quando os danos
aos tecidos foram grandes demais para serem reparados totalmente ou ocorreram em
tecidos incapazes de serem regenerados. Nesses casos, ocorre o crescimento do tecido
conjuntivo para as áreas de lesão, convertendo-se em um tecido fibroso. Assim sendo,
o primeiro passo é a instalação de uma reação inflamatória, cujo exsudato de células
fagocitárias reabsorve o sangue extravasado e o tecido danificado. Em seguida, há
proliferação fibroblástica e endotelial, formando, assim, a cicatriz ou tecido conjuntivo
cicatricial. Posteriormente, esse tecido sofre remodelação, resultando em diminuição do
volume da cicatriz.

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• Evolução para inflamação crônica: Uma inflamação crônica pode ser decorrente de
uma inflamação aguda malsucedida, em que houve a persistência do agente injuriante ou
pode, em algumas situações, ser crônica desde o início.

2 - INFLAMAÇÃO CRÔNICA
A inflamação crônica é aquela que tem uma duração prolongada, que pode variar de
poucas semanas a vários anos, em que o processo de eliminação do agente agressor, a injúria
tecidual e as tentativas de reparo acontecem simultaneamente. Uma inflamação crônica pode
surgir em diferentes situações:

• Infecções persistentes: Alguns microrganismos são bastante difíceis de se erradicar.


Entre esses microrganismos podemos incluir as microbactérias, alguns fungos, vírus
e parasitas. Esses organismos desencadeiam uma reação mais tardia, característica da
inflamação crônica.

• Doenças inflamatórias imunomediadas: O sistema imunológico, algumas vezes,


pode ser ativado de forma excessiva ou inapropriada. Em alguns casos, o organismo
produz respostas contra as células do próprio hospedeiro, o que caracteriza as doenças
autoimunes. Em outros casos, a inflamação pode ser resultado de respostas exageradas

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e desreguladas contra alguns microrganismos ou contra agentes ambientais comuns,
causando doenças alérgicas, como a asma.

• Exposição prolongada a agentes potencialmente tóxicos: A exposição, muitas vezes


ocupacional, a substâncias tóxicas resulta em uma resposta inflamatória. Um exemplo é
a exposição à sílica particulada, algodão ou poeiras orgânicas que, quando inaladas por
períodos prolongados, podem causar doença inflamatória pulmonar.

Para o patologista, o marco da inflamação crônica é a transição de uma população de


células neutrofílicas para uma população mononuclear, especialmente de macrófagos no início
e linfócitos com o passar do tempo. Além disso, a presença de fibroblastos e de novos vasos
sanguíneos são indicativos de resolução e reparo.

2.1. Macrófagos na Inflamação Crônica


O macrófago é o protagonista da inflamação crônica (Figura 5). Porém, ele não pode ser
tratado como um único tipo celular.

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Figura 5 - Papéis dos macrófagos na inflamação crônica. Fonte: Kumar et al. (2010).

No sangue eles são os monócitos e nos tecidos, os macrófagos. Vários órgãos possuem
populações específicas de macrófagos com denominações específicas (fígado: células de Kupffer;
pulmão: macrófagos alveolares; tecido conectivo: histiócitos; cérebro: micróglia). Os produtos
dos macrófagos são responsáveis tanto pela eliminação do agente agressor quando para iniciar o
processo de reparo, além de serem os principais responsáveis pela injúria tecidual da inflamação
crônica. Outras células também estão envolvidas na inflamação crônica, como os linfócitos,
plasmócitos, eosinófilos e mastócitos.

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2.2. Inflamação Granulomatosa


A inflamação crônica possui como uma forma característica de resposta a inflamação
granulomatosa. Ela acontece em algumas condições infecciosas e não infecciosas. Um granuloma
pode ser definido como “um esforço celular para conter um agente agressor que é difícil de
erradicar” (KUMAR et al., 2010, p. 73). O exemplo clássico dos granulomas é a inflamação
causada pela tuberculose, mas eles também acontecem em doenças como a sífilis, hanseníase,
sarcoidose, algumas micoses, entre outras situações.
Um granuloma nada mais é do que um aglomerado de células. No meio do granuloma
encontram-se os macrófagos que são transformados em células epiteliodes (que eventualmente
se fundem, formado células gigantes), seguidos por linfócitos e, ocasionalmente, plasmócitos.
Granulomas antigos apresentam um anel de fibroblastos e tecido conjuntivo, característico da
tentativa de reparo do tecido lesado.
Os granulomas podem ser subdivididos em dois tipos, de acordo com a sua patogênese.
Os granulomas de corpo estranho são causados ou desencadeados por substâncias ou partículas
relativamente inertes, ou seja, materiais que, normalmente, são grandes demais para serem
fagocitados e que não incitam resposta imune. São exemplos de substâncias assim os fios de sutura
ou, até mesmo, o talco. Esses materiais estranhos serão identificados no centro do granuloma,
envoltos por células gigantes ou epitelioides. Esses granulomas, normalmente, são frouxos e com
menor número de linfócitos e outros leucócitos, os macrófagos sofrem poucas transformações e
eles tendem a se curar por fibrose. Quanto mais inerte for o corpo estranho, menor será a indução
de inflamação granulomatosa. Próteses valvares ou vasculares são fabricadas com materiais cada

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vez mais inertes, com a finalidade de evitar que induzam inflamação e fibrose.
Já os granulomas imunes são causados por agentes que possuem a capacidade de induzir
resposta imune mediada por células. Nesse tipo de granuloma, os macrófagos englobam antígenos
das proteínas estranhas, as processam e fazem a apresentação aos linfócitos T, causando a sua
ativação. Os linfócitos produzem substâncias que ativam outros linfócitos (IL-2) e substâncias
importantes na ativação dos macrófagos e na sua transformação em células epitelioides ou células
gigantes (IFN-γ). Pode ocorrer necrose típica no interior dos granulomas, de acordo com a
etiologia. No granuloma tuberculoso, por exemplo, ocorre a necrose caseosa. Esses granulomas
evoluem para a cura por fibrose, em que as células produzem citocinas que induzem a síntese
de proteínas da matriz extracelular, levando à deposição de colágeno, formando cicatrizes que,
normalmente, apresentam formatos circulares.

3 - EFEITOS SISTÊMICOS DA INFLAMAÇÃO


Além das reações que acontecem no local da lesão, como vimos anteriormente, as
inflamações, especialmente as inflamações agudas, podem causar mudanças sistêmicas, que são
reações às citocinas, cuja produção é estimulada por componentes das células bacterianas ou
outros estímulos inflamatórios.

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• Febre: É uma manifestação bastante comum na inflamação, especialmente quando


ela está associada a uma infecção. A febre acontece devido a liberações de substâncias
pirogênicas que agem pela estimulação das prostaglandinas. Produtos bacterianos
estimulam a produção de citocinas, que aumentam a conversão de AA em prostaglandinas.
Prostaglandinas, especialmente PG2, estimulam a produção de neurotransmissores (por
exemplo: monofosfato cíclico de adenosina) que mantem a temperatura mais alta.

• Leucocitose: É uma característica muito comum em inflamações, especialmente quando


envolvem infecção bacteriana. A contagem de leucócitos sobe, podendo chegar a valores
extremos, como 100.000 células/µL. O aumento dos leucócitos acontece, especialmente,
pela liberação acelerada de células que estão presentes nos estoques da medula óssea.
Essa liberação acelerada faz com que ocorra, também, a liberação de células imaturas, o
que caracteriza um desvio para a esquerda. Infecções bacterianas estimulam o aumento
de neutrófilos, infecções virais estão relacionadas ao aumento de linfócitos, por sua vez,
as alergias e doenças parasitárias estão relacionadas ao aumento de eosinófilos.

• Aumento de volume dos linfonodos: O aumento dos linfonodos acontece tanto pela
liberação de antígenos pelos agentes inflamatórios que são levados aos linfonodos, onde
promovem uma reação imune com proliferação celular, ou quando o agente etiológico
é de natureza infecciosa e chega aos linfonodos, produzindo uma reação inflamatória,
caracterizando o inchaço.

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• Outras respostas: Podemos incluir, também, como manifestações da inflamação o
pulso e a pressão sanguínea aumentados, suor diminuído, principalmente por causa
do direcionamento do fluxo de sangue para os vasos profundos; tremores, calafrios,
anorexia, sonolência e mal-estar, provavelmente, são resultado da ação de citocinas em
células cerebrais.

4 - CURA POR REPARO, FORMAÇÃO DE CICATRIZ E


FIBROSE
Como vimos anteriormente, situações em que a lesão do tecido é muito grave e a
regeneração não pode ser efetuada, a cura é realizada por meio da deposição de colágeno e
formação de uma cicatriz. O reparo tecidual ocorre em uma progressão de fases. Para um melhor
entendimento desse processo utilizaremos como exemplo o reparo e a cicatriz de lesões cutâneas,
que é um modelo bastante estudado e de evidente importância clínica.
As feridas de pele podem ser divididas basicamente em dois tipos: (1) aquelas que possuem
um reparo mais simples, em que a incisão provoca morte de pequena quantidade de células
epiteliais e do tecido conjuntivo. São normalmente feridas limpas, não infectadas e sofrerão o
tipo de cicatrização denominado de cura por união primária ou por primeira intenção; (2) feridas
grandes, em que acontece perda excessiva de células e tecidos que criam grandes defeitos na
superfície da pele, as quais sofrerão uma cicatrização denominada de cura por união secundária
ou segunda intenção.

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Apesar dessas diferenças, os mecanismos de cura são semelhantes, e compreendem


basicamente as mesmas fases.

4.1. Formação do coágulo sanguíneo


O primeiro passo para a cura e cicatrização é a formação do coágulo, por meio da ativação
de vias de coagulação. Além de estancar o sangramento, o coágulo funciona como um reservatório
para as células em migração, que são atraídas por substâncias ali liberadas, como fatores de
crescimento, citocinas e quimiocinas. O coágulo contém fibrina, fibronectina e componentes do
complemento. Em feridas maiores, que tiveram grandes perdas de células, o coágulo é maior e
há mais exsudato e restos necróticos na região. Dentro de 24 horas, aparecem neutrófilos nas
bordas da lesão e migram para o coágulo, usando aquele reservatório produzido pela fibrina. Os
neutrófilos serão responsáveis pela remoção dos restos necróticos e bactérias.

4.2. Formação do tecido de granulação


O principal indicador de reparo é a formação do tecido de granulação, que tem início em
3 a 5 dias após a lesão. Ele é caracterizado por: muitos novos vasos sanguíneos decorrentes do
processo de angiogênese; numerosas células mononucleares, predominantemente macrófagos M2
e linfócitos; fibroblastos, responsáveis pela síntese dos componentes da nova MEC e, também, pela
fibrose; nova MEC, contendo colágeno, glicoproteínas e proteoglicanos. Os vasos neoformados

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são bastante permeáveis, o que normalmente faz com que esse novo tecido apresente edema
em decorrência do extravasamento de líquido e proteínas plasmáticas. Com o passar do tempo,
o tecido de granulação começa a invadir o espaço da incisão. Em feridas de cura por segunda
intenção a quantidade de tecido de granulação será bem maior, uma vez que ele é diretamente
proporcional ao defeito criado no tecido e a intensidade da inflamação.
A angiogênese corresponde a produção de novos capilares. Esse processo pode acontecer
de duas formas, a partir do “brotamento” de vasos pré-existentes ou por recrutamento de células
progenitoras endoteliais da medula óssea. As células endoteliais são ativadas pelos estímulos da
lesão e migram para o local da ferida, estimuladas por fatores de crescimento, como o fator de
crescimento vascular endotelial (VEGF). Os novos “brotos” formam pequenos canais tubulares
que, com o tempo, se diferenciam na circulação madura. Esses novos capilares permitem
o extravasamento de líquido devido sua alta permeabilidade, o que denota a característica
edematosa das lesões.

4.3. Proliferação celular e deposição de colágeno


Por volta de 96 horas após a lesão, os macrófagos já substituíram quase todos os neutrófilos.
Como já foi dito na inflamação crônica, os macrófagos são as células centrais do reparo tecidual
e atuam removendo os resíduos extracelulares, fibrina e outros materiais estranhos, promovendo
a angiogênese e a deposição da MEC. Quimiocinas, como TNF, PDGF, TGF-β e FGF, orientam a
migração dos fibroblastos, sua proliferação acontece pela ação de múltiplos fatores de crescimento
de citocinas. Estas, produzidas, principalmente, pelos macrófagos, mas que, também, podem ser
produzidas por outras células inflamatórias e plaquetas.

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4.4. Formação da cicatriz


Com a formação contínua do tecido de granulação no leiro na ferida, a superfície é
reepitelizada nas bordas por queratinócitos locais e por células-tronco derivadas de hastes de
bulbos dos folículos pilosos e glândulas sudoríparas. Os queratinócitos migram pela superfície
e pelas camadas superiores em direção ao centro até que as células se toquem, sinalizando
a cobertura da ferida. Com o tempo, o infiltrado de leucócitos, o edema e o aumento da
vascularização desaparecem. A ferida começa a empalidecer devido ao acúmulo de colágeno e
regressão dos novos vasos sanguíneos.

4.5. Contração da ferida


Normalmente essa etapa acontece em feridas que tiveram grandes perdas de células
(feridas de segunda intenção), para que diminua a distância entre as bordas e ajude a fechar a
lesão. Para que aconteça a contração, é necessária uma rede de miofibroblastos, que expressam
α-actina.

4.6. Remodelamento do tecido conjuntivo


Essa é a fase mais demorada do processo de cicatrização, podendo durar meses. Esse

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processo envolve mudanças da organização do colágeno, a partir das ligações cruzadas do colágeno
fibrilar tipo III, organizado em pequenos feixes paralelos. Embora a ferida nunca atinja a força
tênsil pré-lesão, ela pode alcançar 75% da força original com maturação e contração contínuas.
Durante esse processo, a degradação é mediada por metaloproteinases de matriz (MMP) e é
equilibrada pelo inibidor tecidual de metaloproteinase (TIMP).

4.7. Fatores Locais e Sistêmicos que Influenciam a Cura de


Feridas
A cura das feridas pode ser influenciada por fatores locais e sistêmicos, que incluem:

• Infecção: É a causa local que mais interfere na cicatrização, pois resultará em lesão e
inflamação por um tempo muito prolongado.

• Isquemia: Isquemia local, por lesões ou compressão, além de diminuir a quantidade de


nutrientes que chegam até o local, também inibe a produção de colágeno, reduz o pH e
aumenta a quantidades de catabólitos que possuem efeitos anti-inflamatórios, retardando
a cicatrização.

• Fatores mecânicos: Aquela mania de mexer em uma ferida, “retirar a casquinha”,


retarda a cura, pois pode comprimir vasos sanguíneos e separar as margens da ferida que
já haviam sido ligadas.

• Corpos estranhos: Fragmentos de aço, vidro e, até mesmo, osso são obstáculos para a
cicatrização, retardando-a.

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• Tamanho, localização e tipo de ferida: Feridas pequenas e que tiveram pouca perda
celular, como visto anteriormente, demoram mais para cicatrizar. Feridas que acontecem
em regiões bastante vascularizadas, como a face, por exemplo, tendem a cicatrizar mais
rápido.

• Nutrição: Deficiências de proteínas e vitaminas, em especial a vitamina C, inibem a


síntese de colágeno e retardam a cicatrização.

• Metabolismo: Doenças que afetam o corpo como um todo podem, também, retardar a
cicatrização. O diabetes melito é o principal exemplo em que os pacientes apresentam uma
dificuldade muito grande de cicatrização, devido, principalmente, ao comprometimento
vascular que é frequente. A neuropatia diabética também prejudica a cicatrização, devido
à redução de estímulos inflamatórios liberados por terminações nervosas.

• Tabagismo: A nicotina possui efeito vasoconstritor, além disso, o monóxido de carbono


possui efeitos anti-inflamatórios.

• Circulação: O suprimento sanguíneo deficiente causado, por exemplo, por acúmulo


de gorduras ou anomalias venosas que retardem a drenagem venosa também retardam o
processo de cicatrização.

• Hormônios: Hormônios corticoides, utilizados por seus efeitos anti-inflamatórios,

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também inibem a síntese de colágeno, retardando a cicatrização.

4.8. Aspectos Patológicos do Reparo


Desequilíbrios ou anormalidades nos componentes que formam a cicatriz e a fibrose
podem causar diversas alterações patológicas. Essas alterações podem ser divididas em três
categorias:

• Formação deficiente da cicatriz: A formação deficiente de tecido de granulação pode


levar a deiscência da ferida e a ulceração. A primeira é o resultado de esforços físicos
excessivos, tosse, vômitos, que podem induzir a separação das bordas da lesão. Já a
ulceração pode acontecer devido à falta de vascularização durante o processo de cura e
são bastante comuns em pacientes diabéticos.

• Formação excessiva de componentes de reparo: Excesso de colágeno que gera uma


cicatriz saliente recebe o nome de cicatriz hipertrófica, já quando a cicatriz cresce além
das margens é conhecida como queloide (Figura 6). Formação de quantidades exageradas
de tecido de granulação, que se sobrepõem ao nível da pele e bloqueiam a reepitelização,
também é uma condição patológica, denominada granulação exuberante. Essa granulação
excessiva pode ser retirada por cirurgia ou cauterização, permitindo, assim, que o epitélio
seja restaurado.

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Figura 6 - Queloide com seus contornos elevados e irregulares. Fonte: Reisner et al. (2016).

• Contrações: As contrações fazem parte do processo normal de formação da cicatriz,


como visto anteriormente. Porém, um exagero desse processo, origina a contratura e causa
deformidades na ferida e nos tecidos circunjacentes. As contraturas são mais comuns

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após queimaduras graves e podem comprometer o movimento do membro afetado.

4.9. Fibrose
A fibrose é definida, segundo Brasileiro Filho (2014, p. 127), como “condições em que há
aumento do estroma conjuntivo de um órgão decorrente de: (a) cicatrização de lesão prévia; (b)
processo reacional em que a produção de MEC não está relacionada com o processo reparativo”.
Nos locais onde acontece a fibrose, muitas vezes podem ser observados problemas funcionais.
Em relação aos tipos de lesão que levam a fibrose, aquelas que se originam de processos
cicatriciais por lesões traumáticas ou inflamatórias são bastante frequentes, porém se restringem
à região atingida pela inflamação. Fibroses por lesões sistematizadas, tendem a ser difusas e
comprometer grande parte ou o órgão todo. Especialmente nesses casos, o órgão pode sofrer
modificações drásticas de sua arquitetura, o que leva alterações funcionais.
Durante muito tempo a fibrose foi considerada algo irreversível, porém ela pode involuir
ou até mesmo desaparecer caso o estímulo responsável pelo aparecimento da fibrose deixe de
existir. A involução depende de fatores fibrolíticos, caso o estímulo desapareça, metaloproteases
podem iniciar a completa degradação da matriz.

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5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pudemos conhecer nessa unidade os mecanismos e eventos que envolvem tanto as


inflamações agudas quanto as crônicas. As inflamações agudas são aquelas que acontecem de
forma mais rápida e intensa e envolvem, principalmente, reações vasculares. Já as inflamações
crônicas são mais demoradas, algumas duram alguns anos e envolvem, principalmente, as
respostas celulares. Os processos inflamatórios não devem ser vistos como algo ruim, uma vez
que eles são parte fundamental no combate a agressores e na manutenção do equilíbrio em nosso
corpo.
Já a cura de feridas compreende uma série de eventos, que se iniciam com a formação
do coágulo e terminam com o remodelamento do tecido. O processo é influenciado por diversas
características e fatores que envolvem tanto a própria ferida quanto o indivíduo como um todo.

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03
DISCIPLINA: PATOLOGIA

DISFUNÇÕES
HEMODINÂMICAS
PROF.A DRA. MARIANA APARECIDA LOPES ORTIZ

SUMÁRIO DA UNIDADE

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................... 52
1 - EDEMA ................................................................................................................................................................. 53
1.1. EDEMA GENERALIZADO ................................................................................................................................... 54
1.2. EDEMA LOCALIZADO ........................................................................................................................................ 55
2 - HIPEREMIA ....................................................................................................................................................... 55
3 - HEMORRAGIA ................................................................................................................................................... 56
3.1. DIÁTESE HEMORRÁGICA ................................................................................................................................. 57
4 - HEMOSTASIA E TROMBOSE ............................................................................................................................ 58
4.1. HEMOSTASIA NORMAL .................................................................................................................................. 58
4.1.1. ENDOTÉLIO .................................................................................................................................................... 60
4.1.2. PLAQUETAS ................................................................................................................................................... 60

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4.1.3. CASCATA DE COAGULAÇÃO .......................................................................................................................... 61
4.2. TROMBOSE ...................................................................................................................................................... 62
4.2.1. LESÃO ENDOTELIAL ..................................................................................................................................... 62
4.2.2. ALTERAÇÕES NO FLUXO SANGUÍNEO ....................................................................................................... 63
4.2.3. HIPERCOAGULABILIDADE .......................................................................................................................... 63
4.2.4. ASPECTOS MORFOLÓGICOS ....................................................................................................................... 64
4.2.5. EVOLUÇÃO E CONSEQUÊNCIAS .................................................................................................................. 64
4.2.6. COAGULAÇÃO INTRAVASCULAR DISSEMINADA ...................................................................................... 65
5 - EMBOLIA ............................................................................................................................................................ 66
5.1. EMBOLIA PULMONAR .................................................................................................................................... 66
5.2. EMBOLIA DE LÍQUIDO AMNIÓTICO ............................................................................................................... 66
5.3. EMBOLIA GASOSA ........................................................................................................................................... 67
5.4. EMBOLIA GORDUROSA .................................................................................................................................. 67
6 - INFARTO ............................................................................................................................................................. 67
6.1. FATORES QUE PODEM INFLUENCIAR NO DESENVOLVIMENTO DE UM INFARTO ................................... 69
6.2. REPERFUSÃO .................................................................................................................................................. 69
7 - CHOQUE ............................................................................................................................................................. 70
7.1. FASES HEMODINÂMICAS DO CHOQUE ......................................................................................................... 73
8 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................ 74

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INTRODUÇÃO
As doenças cardiovasculares lideram o ranking de causas de morte em vários lugares do
mundo, inclusive no Brasil. Podemos incluir em doenças cardiovasculares, aquelas que afetem o
coração, os vasos sanguíneos e o próprio sangue.
Nessa unidade abordaremos as principais características do funcionamento normal
do organismo e também as alterações que acontecem no desenvolvimento de doenças. Cada
distúrbio que afete o equilíbrio hemodinâmico do organismo será abordado de forma separada
para melhor entendimento, porém, vale ressaltar que em muitas situações mais de uma das
alterações abordadas nessa unidade acontecem ao mesmo tempo.
Estudaremos as alterações que compreendem o equilíbrio hídrico e o desequilíbrio,
favorecendo o edema; as alterações que resultam em aumento da quantidade de sangue,
caracterizando as hiperemias; os distúrbios vasculares que resultam em extravasamento de
sangue, que é a hemorragia; as formas de equilíbrio entre os componentes sanguíneos, conhecida
como hemostasia e, também, o seu desequilíbrio, caracterizado especialmente pela trombose e a
embolia; por fim, o infarto, caracterizado pela interrupção do fluxo de sangue e o choque que tem
por característica a hipotensão sistêmica e dificuldade de perfusão dos tecidos.

PATOLOGIA | UNIDADE 3

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1 - EDEMA
A maior parte do nosso peso corporal magro é composto de água. Parte da água está
localizada intracelularmente e parte nos compartimentos extracelulares. O edema é caracterizado
pelo acúmulo de líquido no interstício ou em cavidades do organismo. Para entendermos como o
edema acontece, primeiramente, precisamos entender como os líquidos corporais se equilibram.
Duas pressões controlam o movimento da água e dos solutos de baixo peso molecular entre
os espaços intravascular e intersticial, a pressão hidrostática vascular e a pressão coloidosmótica
plasmática (também conhecida como pressão osmótica do plasma ou oncótica). A diferença entre
essas pressões é o que movimenta os líquidos. Quando a pressão hidrostática é maior, ocorre a
saída de líquido dos vasos, e quando a pressão coloidosmótica é maior, favorece a entrada de
líquidos para os vasos. Pequenas quantidades de líquidos que sobram no espaço intersticial são
reabsorvidas pelos vasos linfáticos e depois retornam para a circulação. A filtração acontece na
parte arterial e a reabsorção do lado venoso de um mesmo capilar.
Durante a contração do vaso, a pressão hidrostática aumenta, favorecendo a saída de
líquido, o que promove a filtração; logo em sequência ocorre a dilatação, diminuindo a pressão
hidrostática, fazendo com que a pressão coloidosmótica seja maior, favorecendo a reabsorção no
mesmo vaso. Estima-se que os capilares e vênulas reabsorvam cerca de 85% do filtrado e 15%
sejam drenados pelo sistema linfático. Dessa forma, diversos fatores podem levar ao surgimento
do edema, são eles:

PATOLOGIA | UNIDADE 3
• Aumento da pressão hidrostática: Diversos fatores podem levar ao aumento da
pressão hidrostática intravascular, aqui, destacamos a insuficiência cardíaca congestiva e
a obstrução do retorno venoso (trombos, compressão externa dos vasos, imobilização).
Com o aumento da pressão hidrostática, especialmente do lado venoso, ocorre a
diminuição da reabsorção e o sistema linfático não é capaz de reabsorver todo o excedente,
caracterizando, assim, o edema.

• Redução da pressão coloidosmótica do plasma: A regulação da pressão osmótica


acontece, especialmente, através da quantidade de albumina presente no plasma, ou seja,
grandes concentrações de albumina estimulam a reabsorção de líquido, quantidades
diminuídas reduzem a pressão osmótica e, consequentemente, a reabsorção de líquidos.
A diminuição da concentração de albumina pode ser decorrente da perda excessiva,
como nos casos de glomerulopatias (perda excessiva de proteínas na filtração renal) ou
por deficiência de produção ou síntese, o que acontece nos problemas hepáticos graves,
como a cirrose ou na desnutrição proteica.

• Obstrução linfática: Drenagem deficiente resulta em um edema normalmente


localizado. As causas de obstrução incluem inflamações, tumores malignos, danos por
radiação, entre outros.

• Retenção de sódio e água: O aumento da retenção de sódio faz com que ocorra,
obrigatoriamente, um aumento de água dentro dos vasos. Essa expansão de líquido leva
ao aumento da pressão hidrostática e, também, à diminuição da pressão osmótica, devido
à diluição das proteínas.

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1.1. Edema Generalizado


O edema generalizado também recebe o nome de anasarca e caracteriza-se pelo acúmulo
de líquido intersticial em muitos órgãos, ele pode ser desencadeado por diversas causas, como
podemos visualizar na Figura 1, mas destacaremos, no texto, duas principais.

PATOLOGIA | UNIDADE 3
Figura 1 - Eventos que podem levar ao edema generalizado. Fonte: Kumar et.al. (2016).

• Insuficiência cardíaca: É uma das principais causas de edema generalizado. A


insuficiência cardíaca leva ao edema pelo aumento da pressão hidrostática dos capilares
(devido a hiperemia passiva que acontece dentro dos vasos) e, também, por estimular a
retenção de sódio e água, uma vez que a redução do fluxo sanguíneo renal leva à ativação
do sistema renina-angiotensina, com consequente aumento do volume sanguíneo.

• Cirrose hepática: Leva a edema por diversos motivos, que incluem a redução da
síntese de proteínas no fígado, dilatação arterial periférica que estimula o sistema renina-
angiotensina-aldosterona e reflexo hepatorrenal que estimula a retenção de sódio pelos
rins.

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1.2. Edema Localizado


Desencadeado por fatores que atuam localmente e, muitas vezes, pode ser o primeiro
sinal de um edema generalizado.

• Edema de membros inferiores: Pode ser decorrente de uma insuficiência cardíaca,


mas, também, de alterações locais como a obstrução de veia cava inferior, a obstrução
linfática ou a insuficiência valvular venosa. A musculatura esquelética e as válvulas
existentes nas veias profundas contribuem para bombear o sangue e manter o fluxo
sanguíneo em direção ao átrio direito. Pessoas com varizes e com possíveis deficiências
nessas válvulas sofrem com edemas nos membros inferiores, uma vez que os músculos
não são mais capazes de bombear o sangue como antes e, dessa forma, existe aumento da
pressão hidrostática e, consequente, extravasamento de líquido.

• Edema cerebral: É caracterizado pelo acúmulo de líquido no tecido nervoso. Esse


tipo de edema é muito importante, uma vez que o cérebro não dispõe de drenagem
linfática, pequenos volumes de líquido são suficientes para causar aumento da pressão
intracraniana.

• Edema pulmonar: Pode acontecer em decorrência de aumento da pressão hidrostática


capilar, redução da pressão osmótica ou agressão aos capilares. O acúmulo de líquidos no
pulmão pode comprometer a distensibilidade do órgão, causando prejuízos na aeração e

PATOLOGIA | UNIDADE 3
trocas gasosas.

2 - HIPEREMIA
A hiperemia consiste no aumento da quantidade de sangue ou do fluxo sanguíneo, em uma
determinada região ou órgão. A hiperemia pode ser ativa, quando o aumento do fluxo sanguíneo é
resultado de dilatação arteriolar. Esta pode ser de origem simpática ou humoral e, como resultado
do intenso fluxo de hemácias e sangue oxigenado nos vasos, a região apresenta-se avermelhada e
muitas vezes com temperatura aumentada. A hiperemia ativa pode ser fisiológica, quando existe
a necessidade de maior irrigação, como ocorre nos músculos esqueléticos durante o exercício
físico, no trato gastrointestinal durante a digestão, no rosto quando a pessoa fica envergonhada.
Porém também pode ser patológica, especialmente durante processos inflamatórios agudos,
como já foi visto na unidade anterior.
Já a hiperemia passiva, que também é conhecida como congestão, decorre na redução da
drenagem venosa. Nesse caso, os tecidos adquirem uma coloração que pode variar do vermelho
escuro ao azul, devido à alta concentração de hemoglobina desoxigenada. A congestão pode
acontecer em decorrência da obstrução de uma veia (compressão, trombose etc.) ou por redução
do retorno venoso, o que acontece na insuficiência cardíaca, por exemplo. Na congestão aguda ou
de curta duração ocorre a distensão dos vasos, já na congestão crônica o impedimento do fluxo
sanguíneo pode levar a lesão tecidual e cicatrização. As congestões mais importantes são as que
acontecem nos pulmões, baço e fígado.

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3 - HEMORRAGIA
Kumar et al. (2010, p. 114) define hemorragia como “o extravasamento de sangue no espaço
extravascular”. A hemorragia pode ser interna, quando o sangue extravasa para cavidades ou para
o interstício, ou externa, quando extravasa para fora do organismo. Além disso, as hemorragias
recebem nomes específicos dependendo da sua localização, como podemos visualizar na Tabela
1.

Nomenclatura Definição

Epistaxe Hemorragia nas fossas nasais


Equimose Sangramento em pequenos focos (1 a 2cm)
Hemartrose Sangue nas articulações
Hematêmese Vômito com sangue
Hematoma Sangramento volumoso
Hematúria Sangue na urina
Hemopericárdio Sangue na cavidade pericárdica
Hemoperitôneo Sangue na cavidade peritoneal
Hemoptise Expectoração com sangue
Melena Sangue digerido nas fezes

PATOLOGIA | UNIDADE 3
Menorragia Menstruação prolongada ou profusa
Metrorragia Sangramento uterino irregular entre os ciclos
Otorragia Sangramento pelo conduto auditivo externo
Petéquia Sangramento puntiforme (1 a 2mm)
Púrpura Pequenos focos de sangramento (entre 3mm e 1cm)

Tabela 1 - Nomenclatura das hemorragias Fonte: adaptado de Brasileiro Filho (2014).

As hemorragias podem acontecer de duas formas, que são conhecidas como: hemorragia
por rexe e hemorragia por diapedese. A hemorragia por rexe é aquela que acontece devido a
ruptura da parede do vaso e as principais causas são: traumatismos, enfraquecimento da parede
vascular e aumento da pressão sanguínea. Por sua vez, na hemorragia por diapedese não ocorre
o rompimento do vaso e as hemácias saem individualmente através dos espaços entre as células
endoteliais. Como evolução da hemorragia, as hemácias extravasadas podem sofrer lise ou ser
fagocitadas por macrófagos. A hemoglobina liberada nesse processo sofre alguns processos de
transformação que caracterizam as cores de hematomas que podemos observar na pele.

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Por que os hematomas mudam de cor com o passar do tempo? Inicialmente o he-
matoma apresenta-se avermelhado ou arroxeado em decorrência da hemoglobina
desoxigenada que foi liberada, em seguida adquire coloração esverdeada devido
a transformação da hemoglobina em biliverdina, em seguida se transforma em
bilirrubina, que possui coloração amarelada, e em torno de 10 dias depois ele de-
saparece. Paralelamente a esse processo, o ferro liberado é captado pela hemos-
siderina, que pode apresentar-se como grânulos castanhos no interior das células.

As consequências das hemorragias podem ser as mais diversas e vão depender da


quantidade de sangue perdida, da velocidade da perda e do local afetado. Entre as principais
consequências podemos citar: (1) choque hipovolêmico – quando ocorre perda de grande
volume de sangue em um curto período de tempo (os choques serão abordados mais adiante
nessa unidade); (2) anemia – é resultado, especialmente, da perda crônica de sangue, como em
úlceras, metrorragia etc.

3.1. Diátese Hemorrágica

PATOLOGIA | UNIDADE 3
Brasileiro Filho (2014, p. 156) define diátese hemorrágica como “a tendência ao
sangramento sem causa aparente ou hemorragia mais intensa ou prolongada após traumatismo”
e ela pode acontecer devido a anormalidades diversas, que incluem a parede vascular, as plaquetas
e os sistemas de coagulação.

• Distúrbios da parede vascular: Algumas pessoas apresentam distúrbios que tornam a


parede vascular muito frágil e, com pequenos traumatismos, podem ocorrer sangramentos
de intensidade variável. Entre as causas dessa fragilidade vascular podemos citar: (1)
a telangiectasia hemorrágica hereditária – que é uma doença genética, caracterizada
por anormalidades nas fibras elásticas e colégenas; (2) deficiência de vitamina C – essa
vitamina é uma coenzima importante na síntese do colágeno, na sua falta o colágeno é
defeituosos, resultando em fragilidade vascular; (3) elastose senil – em indivíduos idosos
é muito comum ocorrerem alterações na síntese de elastina e colágeno na pele, nessas
pessoas, pequenos traumatismos levam ao aparecimento de púrpuras e equimoses; (4)
púrpura de Henoch-Schönlein – é desencadeada por antígenos bacterianos, toxinas ou
medicamentos, ocorrendo uma reação de hipersensibilidade do tipo III e formação de
imunocomplexos que se depositam na parede de pequenos vasos, levando a necrose de
arteríolas e consequentemente a púrpuras, equimoses, entre outros sangramentos que
podem variar dependendo do órgão afetado.

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• Alterações plaquetárias: Deficiências na quantidade de plaquetas, conhecidas como


trombocitopenia, ou deficiência na função das plaquetas, que levam à formação de
petéquias na pele, mucosa e em órgãos internos. A trombocitopenia pode acontecer
em decorrência da produção diminuída (podendo ser congênita ou adquirida) ou por
excesso da destruição. Já as alterações funcionais acontecem em decorrência de alterações
quantitativas ou qualitativas dos seus componentes. Na trombastenia de Glanzmann, por
exemplo, ocorre redução da agregação plaquetária devido à baixa concentração de ADP
ou de distúrbios na sua liberação.

• Fatores de coagulação: Defeitos congênitos ou adquiridos que podem resultar em


hemorragia. Entre os defeitos congênitos, podemos destacar a hemofilia A, decorrente
da diminuição da atividade do fator VIII, em que os pacientes apresentam hematomas
e equimoses espontâneas em tecidos moles e articulações; a doença de von Willebrand
acontece devido a uma deficiência na síntese do fator que recebe esse mesmo nome,
é caracterizada por sangramento anormal após traumatismos. Entre os transtornos
adquiridos, o principal é a deficiência de vitamina K, essencial para a síntese de fatores de
coagulação como o II, VII, IX e X.

4 - HEMOSTASIA E TROMBOSE

PATOLOGIA | UNIDADE 3
Kumar et al. (2010, p. 115) definem a hemostasia normal como “uma consequência
de um processo altamente regulado que mantém o sangue em um estado líquido nos vasos
normais, mas também permite a formação rápida de um tampão hemostático no local de uma
lesão vascular”. Quando essa hemostasia não funciona como deveria, ocorre a trombose, que é a
formação de coágulos sanguíneos dentro de vasos intactos. Assim como na diátese hemorrágica,
os componentes que envolvem a hemostasia e a trombose são: a parede vascular, as plaquetas e a
cascata de coagulação.
Inicialmente veremos os eventos que compõem a hemostasia normal e como ela é
regulada.

4.1. Hemostasia Normal


Quando ocorre uma lesão vascular o organismo inicia uma série de eventos hemostáticos
para garantir o equilíbrio novamente (Figura 2).
O primeiro acontecimento após a lesão é um curto período de vasoconstrição arteriolar,
que tem como função bloquear o sangramento, de modo transitório, até que se inicie a ativação
das plaquetas e coagulação.
A lesão expõe a matriz extracelular (MEC) o que facilita a aderência e ativação das
plaquetas. Essa ativação é caracterizada por uma alteração da forma dessas estruturas, que
passam de discos arredondados para placas planas, o que garante um aumento acentuado da
área de superfície e, também, a liberação de grânulos secretores. Em poucos minutos, ocorre
o recrutamento de novas plaquetas, o que garante a agregação e a formação de um tampão
hemostático. Esse processo recebe o nome de hemostasia primária.

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PATOLOGIA | UNIDADE 3

Figura 2 - Hemostasia normal. Fonte: Kumar et al. (2010).

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Além da MEC, o fator tecidual também foi exposto durante a lesão. Esse fator é uma
glicoproteína pró-coagulante, em conjunto com o fator VII dão início à cascata de coagulação,
que gera trombina. A trombina cliva fibrinogênio circulante em fibrina insolúvel, criando uma
rede. Essa segunda sequência é denominada de hemostasia secundária.
A junção da fibrina com a agregação plaquetária dá origem a um tampão permanente e
sólido. Mecanismos contra regulatórios são utilizados para garantir que o tampão se restrinja à
região de lesão.

4.1.1. Endotélio
As células endoteliais são as principais reguladoras da hemostasia. São as atividades
antitrombóticas e pró-trombóticas do endotélio que determinam se ocorre a formação, a
propagação ou a dissolução de um trombo.
Quando não existe nenhuma lesão as células endoteliais previnem a trombose por meio
da liberação de diversas substâncias que bloqueiam a adesão e agregação plaquetárias, inibem a
coagulação e lisam o coágulo.
Quando existe a lesão ou um processo inflamatório as células endoteliais induzem um
estado pró-trombótico. Esse estado permite o contato das plaquetas com a MEC, a adesão que
acontece através de interações com o fator de von Willebrand (vWF) (produto normal das células
endoteliais e essencial para a ligação das plaquetas). Ao ter contato com citocinas inflamatórias
ocorre a síntese do fator tecidual, além disso acontece a inibição da fibrinólise, favorecendo,
assim, a formação de trombos.

PATOLOGIA | UNIDADE 3
4.1.2. Plaquetas
As plaquetas desempenham o papel de formar o tampão hemostático quando ocorre
lesão endotelial. Além disso, sua superfície vai servir para acomodar os fatores de coagulação
ativados. Sua função é dependente de receptores de glicoproteínas, um citoesqueleto contrátil e
dois tipos de grânulos citoplasmáticos. Os grânulos α contém fibrinogênio, fibronectina, fatores
V e VIII, fator plaquetário 4, fator de crescimento derivado de plaquetas e fator de crescimento
transformador-β (TGF-β). Os grânulos densos contêm ADP, ATP, cálcio ionizado, histamina,
serotonina e epinefrina.
Logo após a lesão ocorre, então, a adesão e mudança na conformação, mediada pela
ligação com vWF, que é responsável por ligar os receptores da superfície das plaquetas ao
colágeno exposto. Como já citado anteriormente nessa unidade, pessoas com deficiência no
vWF apresentam tendência ao sangramento. Logo após a adesão, os grânulos são liberados
e, especialmente, os componentes dos grânulos densos serão fundamentais para a ativação
da cascata de coagulação (cálcio) e para a agregação plaquetária (ADP). Durante a agregação
também ocorre a liberação de tromboxano A2 (TxA2), que é um importante estímulo para a
agregação, levando à formação do tampão primário.

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A utilidade da aspirina como forma de prevenir eventos de trombose ou a forma-


ção de coágulos se deve ao fato dela ser um inibidor irreversível das ciclo-oxigena-
ses (COX), bloqueando permanentemente a síntese de TxA2, nas plaquetas.

Em seguida, o início da cascata de coagulação e a liberação de trombina faz com o que


o tampão plaquetário torne-se algo permanente, através de agregação plaquetária adicional e
de contração plaquetária, o que cria uma massa coesa de plaquetas que caracteriza o tampão
hemostático secundário definitivo.

4.1.3. Cascata de coagulação


Terceiro componente do processo de hemostasia. A cascata de coagulação é composta
por uma série de conversões enzimáticas, em cada etapa ocorre a clivagem de uma pró-enzima
em uma enzima ativada, culminando com a produção de trombina, que pode ser considerada o
fator mais importante da cascata de coagulação.
Cada reação da cascata envolve uma enzima, um substrato e um cofator. Esses
componentes são mantidos unidos por íons cálcio (liberados pelos grânulos plaquetários). Essa
característica garante que, normalmente, a coagulação seja localizada na superfície de plaquetas

PATOLOGIA | UNIDADE 3
ou no endotélio.
A coagulação pode acontecer por via intrínseca ou extrínseca, sendo que as duas convergem
na clivagem de fator X. A via extrínseca necessita de desencadeador exógeno, fornecido pelos
extratos dos tecidos e é ativada pelo fator tecidual, já via intrínseca necessita apenas da exposição
do fator XII para a superfície trombogênica.

A avaliação da hemostasia secundária de um paciente pode ser realizada por tes-


tes conhecidos como tempo de protrombina (TP) e tempo de tromboplastina par-
cial ativada (TTPa). O TP normalmente é utilizado em exames pré-operatórios ou
para monitorar a atividade de anticoagulantes orais e avalia a via extrínseca da
coagulação. O teste é realizado por meio da adição de tromboplastica-cálcica,
que faz o papel do fator III. A tromboplastina ativa o fator VII, que, por sua vez,
ativa o fator X, o qual transforma a protrombina em trombina, que atua, então,
sobre o fibrinogênio formando o coágulo de fibrina. O resultado desse teste deve
ser expresso em segundos. O TTPa, também conhecido como KPTT, é utilizado
como exame pré-operatório e avalia a via intrínseca da coagulação. Ele detecta as
deficiências dos fatores VIII, IX, XI e XII, precalicreína e cininogênio de alto peso
molecular. Assim como o TP, o resultado também deve ser expresso em segundos
e comparado com valores de referência.

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Uma vez que a cascata foi ativada, ela deve ser restrita ao local da lesão, que é regulado
por meio da ação de anticoagulantes endógenos como: as antitrombinas, que inibem a atividade
da trombina e de outras proteases; as proteínas C e S, que atuam no complexo proteolítico que
inativa os fatores Va e VIIIa; o inibidor da via do fator tecidual (TPPI), que é produzido pelo
próprio endotélio e inativa o complexo fator tecidual-fator VIIa.

4.2. Trombose
Segundo Brasileiro Filho (2014, p. 158) “a trombose é o processo patológico caracterizado
pela solidificação do sangue dentro dos vasos ou do coração, em indivíduo vivo” (Figura 3).
Os trombos podem acontecer tanto em veias quanto em artérias, sendo que os venosos são
compostos, basicamente, por hemácias presas em uma rede de fibrina e algumas plaquetas e
são formados, normalmente, em áreas de estase após a ativação da cascata de coagulação. Já os
arteriais contêm principalmente plaquetas, pouca fibrina e são resultado de lesão endotelial e
fluxo sanguíneo de alta velocidade.
A trombose vai ser o resultado da ativação patológica do processo normal de coagulação
(visto anteriormente) que pode acontecer em decorrência de três alterações que são chamadas de
tríade de Virchow: (1) lesão endotelial; (2) alteração do fluxo sanguíneo (estase ou turbulência);
(3) hipercoagulabilidade sanguínea.

PATOLOGIA | UNIDADE 3
Figura 3 - Representação esquemática de um trombo. Fonte: Brasileiro Filho (2014).

4.2.1. Lesão endotelial


As lesões endoteliais são responsáveis pela formação de trombos, especialmente, em
artérias e no coração, onde o fluxo sanguíneo intenso pode impedir a coagulação por prevenir a
agregação plaquetária e diluir os fatores de coagulação ativados. As lesões endoteliais acontecem,
especialmente, sobre placas de ateroma, por agressões diretas de bactérias ou fungos, pela
presença de leucócitos ativados em processos inflamatórios agudos e por traumatismos. A lesão
pode levar à exposição da MEC e, consequente, à agregação plaquetária e à ativação da cascata de
coagulação, como já vimos anteriormente, porém, vale ressaltar que o endotélio não precisa estar
fisicamente rompido para contribuir para o desenvolvimento de trombose.

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Disfunções no endotélio podem levar a produção de mais fatores pró-coagulantes e


menos fatores anticoagulantes. Essas disfunções podem ser induzidas pela hipercolesterolemia ou
pelo tabagismo que, também, promovem alterações na superfície celular, facilitando a agregação
plaquetária.

4.2.2. Alterações no fluxo sanguíneo



O fluxo sanguíneo normal é do tipo laminar, ou seja, plaquetas e outros elementos celulares
fluem centralmente na luz do vaso, separadas do endotélio por uma camada de plasma. Dessa
forma, alterações no fluxo sanguíneo podem comprometer esse fluxo organizado e favorecer a
trombose.
O fluxo sanguíneo lento, ou estase sanguínea, favorece a agregação de hemácias e
plaquetas e é comumente responsável por trombose venosa. Além disso, com o sangue fluindo
mais devagar, os fatores de coagulação ativados permanecem por mais tempo no mesmo lugar.
Pensando nisso, é de extrema importância que pacientes acamados sejam movidos de tempos em
tempos, especialmente após a realização de cirurgias, prevenindo, assim, a formação de trombose
venosa.
Já nos casos de aceleração do fluxo sanguíneo e de turbulência, ocorre o rompimento
do fluxo laminar, o que permite que plaquetas entrem em contato com o endotélio. Além disso,
a turbulência pode ser responsável por lesão endotelial e consequente ativação e agregação
plaquetária.

PATOLOGIA | UNIDADE 3
4.2.3. Hipercoagulabilidade
A hipercoagulabilidade pode envolver (1) modificações quantitativas ou funcionais das
plaquetas; (2) alterações dos fatores de coagulação que podem ser hereditários (primários) ou
adquiridos (secundários).
Entre as alterações hereditárias, a mais importante é a chamada mutação de Leiden, que é
uma mutação no gene do fator V. Essa mutação torna o fator V resistente à clivagem e inativação
pela proteína C, uma das moléculas envolvidas na regulação antitrombótica. Essa mutação é
relativamente comum e atinge aproximadamente 2% a 15% dos caucasianos. Os indivíduos que
são heterozigotos para esse gene apresentam aumento de cinco vezes no risco relativo de uma
trombose venosa, já os que são homozigotos tem um aumento de cinquenta vezes.
A protrombina G20210A, que representa a segunda causa mais frequente de trombofilia
hereditária, é associada a níveis aumentados de protrombina e um aumento de três vezes do risco
de trombose.
Níveis aumentados de homocisteína contribuem tanto para o desenvolvimento de
trombose arterial e venosa quanto para a aterosclerose. A homocisteína forma ligações com
diversas proteínas incluindo o fibrinogênio e causam inibição da antitrombina III. Essas alterações
são causadas por deficiência hereditária da cistationina β-sitetase ou por uma variante da enzima
metilenotetraidrofolato redutase, que causa homocisteinemia leve em 5 a 10% dos caucasianos e
das populações do leste asiático.
Causas mais raras incluem as deficiências de anticoagulantes como a antitrombina III,
proteína C e proteína S. Nesses casos, os indivíduos apresentam casos de trombose venosa e
tromboembolismo desde a adolescência.

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Os casos adquiridos também causam aumento do risco de trombose. Os contraceptivos


orais levam a hipercoagulabilidade, provavelmente por aumentar a síntese hepática de fatores
de coagulação e pela síntese reduzida de fatores anticoagulantes. Nos casos de câncer ocorre
a liberação de substâncias pró-coagulantes pelo próprio tumor. A trombose venosa profunda
é uma complicação importante em pacientes acamados, especialmente depois de cirurgias.
Traumas prévios ou ocasionados pelo próprio procedimento cirúrgico estimulam a liberação
de tromboplastina. A associação da imobilização e procedimento cirúrgico levam a trombose
venosa profunda em 10% a 15% dos pacientes que realizaram cirurgia de grande porte, 30%
dos internados em unidades de terapia intensiva e 40% a 60% dos indivíduos após cirurgia por
fraturas da pelve.

4.2.4. Aspectos morfológicos


Como já foi dito anteriormente, os trombos podem se formar em qualquer local do
sistema cardiovascular. Os trombos arteriais tendem a crescer em uma direção retrógrada do
ponto de ligação, já os trombos venosos crescem na direção do fluxo sanguíneo. Sendo assim,
ambos se propagam em direção ao coração.
Nas cavidades cardíacas e na aorta os trombos, de forma geral, são pouco oclusivos
devido ao grande calibre e fluxo rápido, recebem o nome de trombos murais. Os trombos murais
formam massas cinza-avermelhadas compostas por áreas pálidas de fibrina e plaquetas alternadas
com regiões escuras contendo hemácias. Esse aspecto é resultado da deposição rítmica dos
componentes seguindo a pulsação do sangue.

PATOLOGIA | UNIDADE 3
Já em artérias menores, os trombos são frequentemente oclusivos e as localizações mais
comuns são as artérias coronárias, cerebrais e femorais. Eles consistem de malha friável de
plaquetas, fibrina, hemácias e leucócitos, apresentando coloração mais esbranquiçada.
A trombose venosa, também conhecida como flebotrombose, é quase sempre oclusiva,
com o trombo formando um logo trajeto na luz do vas. Amiúde, são vermelho-azulados por serem
formados predominantemente por hemácias e fibrina. De forma geral, os trombos sempre ficam
aderidos à parede, além disso, são secos, opacos, friáveis e se fragmentam com certa facilidade.
Os coágulos, diferente dos trombos, são brilhantes, úmidos, elásticos e não aderidos à parede.

4.2.5. Evolução e consequências


Após a formação do trombo, nos dias subsequentes, ele é submetido a algum dos seguintes
eventos:

• Crescimento: Caso o processo de coagulação predomine sobre a trombólise, ocorre


um aumento do tamanho do trombo. O aumento do trombo pode provocar a oclusão de
artérias ou veias e causar isquemia. No caso específico das veias, pode dificultar o retorno
venoso e provocar edema devido ao aumento da pressão hidrostática.

• Lise (Dissolução): Quando o sistema fibrinolítico é muito ativo, pode conduzir a uma
rápida diminuição e desaparecimento parcial ou total do trombo. Os trombos recentes
são mais propensos à lise. Já trombos antigos, em que a deposição de fibrina já é bastante
intensa, a lise é mais difícil.

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• Organização: Nos casos em que existe um equilíbrio entre coagulação e trombólise,


o volume do trombo permanece constante. Alguns dias depois, os trombos tornam-
se organizados pela entrada de células endoteliais. A parte central do trombo, por não
ser adequadamente irrigada, acaba sofrendo necrose e algum tempo depois ocorre a
fagocitose dos restos de fibrina e hemácias, além de proliferação de fibroblastos e células
endoteliais, muito semelhante ao tecido de granulação visto na unidade anterior. O que
pode acontecer é a recanalização, onde os vasos formam canais no interior do trombo
que permitem a volta parcial do fluxo sanguíneo ou o trombo pode ser convertido a uma
pequena massa de tecido que se incorpora à parede do vaso.

• Embolia: Por se tratarem de substâncias friáveis, os trombos podem se descolar ou se


fragmentar e percorrer outros locais. Processo que será melhor discutido mais adiante.

4.2.6. Coagulação intravascular disseminada



A coagulação intravascular disseminada (CID) é um processo que consiste na coagulação
do sangue em diversos pequenos vasos, formando milhares de microtrombos.

PATOLOGIA | UNIDADE 3

Figura 4 - Fisiopatologia da coagulação intravascular disseminada. Fonte: Brasileiro Filho (2014).

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Esse processo pode ser desencadeado por traumatismos grandes que causam a destruição
de muitas células endoteliais e liberação de tromboplastina na circulação. A CID se inicia com a
ativação do sistema de coagulação, logo em seguida, a trombina é gerada em abundância, o que
promove a transformação de fibrinogênio em fibrina. Pequenas quantidades de fibrina podem
ser lisadas, porém, quando a atividade fibrinolítica se esgota, ocorre a formação de múltiplos
microtrombos, o que pode provocar isquemia e pequenos infartos, além disso, o consumo dos
fatores de coagulação e de plaquetas pode evoluir para um sangramento intenso em diversos
locais (Figura 4).
As manifestações clínicas irão variar de acordo com a quantidade de trombos formados e
dos órgãos comprometidos. Além das manifestações neurológicas diversas, insuficiência renal e
distúrbios respiratórios, o que mais chama a atenção é a diátese hemorrágica, que pode provocar
sangramentos múltiplos, que incluem, especialmente, o trato gastrointestinal e o sistema nervoso.

5 - EMBOLIA
Kumar et al. (2010, p. 125) definem um êmbolo como “uma massa intravascular solta,
sólida, líquida ou gasosa que é transportada pelo sangue para um local distante do seu ponto de
origem”. Na maioria dos casos os êmbolos se originam de trombos e menos comumente podem
originar-se de placas de ateroma ou bolhas de gases. Trombos originados nas veias são levados
aos pulmões e trombos arteriais formam êmbolos que se alojam, principalmente, no cérebro,

PATOLOGIA | UNIDADE 3
intestinos, rins, baço e membros inferiores.

5.1. Embolia Pulmonar


Na maioria dos casos acontece decorrente de trombos formados em veias profundas das
pernas, especialmente em indivíduos acamados após cirurgias ou fraturas. Quando a embolia
é ocasionada por êmbolos grandes, que obstruem o tronco da artéria pulmonar, podem causar
aumento da pressão pulmonar e sobrecarga aguda do ventrículo direito. Obstrução de artérias de
médio calibre pode ocasionar ruptura vascular e, consequente, hemorragia pulmonar. Já os êmbolos
pequenos, os quais são a maioria, geralmente são silenciosos e muitas vezes são incorporados à
parede dos vasos. Quando a embolia se torna frequente pode ocasionar hipertensão pulmonar e
insuficiência ventricular direita.

5.2. Embolia de Líquido Amniótico


É causada basicamente por infusão de líquido amniótico na circulação materna por meio
de rompimento das membranas placentárias ou ruptura de veias uterinas. O líquido amniótico
possui prostaglandina F2 e componentes fetais, que possui grande capacidade pró-coagulante e,
por isso, com frequência instala-se a CID.

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5.3. Embolia Gasosa


A embolia gasosa pode acontecer tanto em veias quanto em artérias e possui diferentes
causas. Situações de alto risco envolvem: punções, traumatismos e cirurgias na região da cabeça,
pescoço e tórax, com abertura de uma grande veia que possibilite a entrada de ar; parto ou aborto
com entrada de ar em grandes veias do útero por causa das contrações; bolhas de ar em sistemas
de infusão.
Uma forma particular é a denominada doença da descompressão que ocorre em
indivíduos que sofrem mudanças bruscas de pressão atmosférica. Quando o ar é inalado em
pressão, quantidades grandes de gás são dissolvidas no sangue e nos tecidos. Caso haja uma
subida muito brusca ou rápida, o nitrogênio sai de sua forma de solução nos tecidos e sangue,
levando a formação de bolhas.

5.4. Embolia Gordurosa


Caracteriza-se pela presença de gotículas de gordura na circulação. Essas gotículas podem
ser consequência de fraturas ósseas, especialmente de ossos longos; traumatismo extenso e
queimadura de tecido adiposo; lipoaspiração. Além de poderem obstruir capilares, a liberação de
ácidos graxos é lesiva para o endotélio, o que pode levar ao aumento da permeabilidade vascular
e CID.

PATOLOGIA | UNIDADE 3
6 - INFARTO
Brasileiro Filho (2014, p. 169) diz que “infarto consiste em uma área circunscrita de
necrose tecidual causada por isquemia absoluta prolongada por obstrução arterial ou venosa”. Os
infartos são eventos comuns e apresentam extrema importância clínica.
Geralmente os infartos acontecem devido a oclusão arterial trombótica ou embólica,
porém, ocasionalmente, acontecem devido a vasoespasmo local, hemorragias dentro de uma
placa ateromatosa, compressão intrínseca de vasos e torções vasculares. Trombose venosa
dificilmente leva a um infarto, normalmente o resultado é uma congestão, porém os órgãos mais
suscetíveis a esse tipo de infarto são aqueles com uma única veia eferente, como os testículos e
ovários, por exemplo.
Morfologicamente os infartos são classificados pela sua cor e podem ser vermelhos ou
brancos. Os infartos vermelhos acontecem (1) principalmente por oclusões venosas, (2) em
tecidos frouxos em que o sangue pode acumular-se (pulmões), (3) em tecidos com circulação
dupla que permitem o fluxo sanguíneo para a zona necrótica (pulmões e intestino delgado), (4) em
tecidos previamente congestionados por fluxo venoso lento. Já os infartos brancos normalmente
ocorrem (1) devido a oclusões arteriais, (2) em órgãos sólidos com circulação arterial terminal e
onde a densidade limita a penetração de sangue na zona necrótica (coração, baço, rins).
“Os infartos tendem a apresentar um formato de cunha, com o vaso ocluído no ápice e
a periferia do órgão formando a base” (KUMAR et al., 2010, p. 128). Os infartos considerados
brancos, tornam-se progressivamente pálidos e mais bem definidos com o tempo, como podemos
observar na Figura 5.

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Figura 5 - Infarto branco renal. Forma de cunha bem delimitada. Fonte: Kumar et al. (2010).

Já os infartos vermelhos apresentam aparência hemorrágica, com coloração vermelho-


escura (Figura 6). O infarto é caracterizado por necrose de coagulação, com exceção do cérebro
em que a necrose é liquefativa.

PATOLOGIA | UNIDADE 3

Figura 6 - Infarto vermelho pulmonar. Fonte: Kumar et al. (2010).

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6.1. Fatores que Podem Influenciar no Desenvolvimento de


um Infarto
As oclusões vasculares podem causar poucos ou nenhum dano, mas também podem
levar à morte de uma pessoa ou tecido em particular. Esses resultados são influenciados por
algumas situações:

• Natureza do suprimento vascular: Órgãos que possuem um suprimento alternativo


possuem menor probabilidade de sofrerem um infarto, ou seja, são mais resistentes. Caso
uma via de suprimento seja comprometida, a outra continua a suprir o órgão, evitando
danos maiores. São exemplos de órgãos com circulação dupla os pulmões e o fígado. Já
órgãos que possuem circulação arterial terminal, como os rins e o baço, são facilmente
danificados por uma obstrução vascular, o que acarreta em morte dos tecidos.

• Taxa de desenvolvimento da oclusão: Quanto mais lento for o desenvolvimento de


uma oclusão, maior a chance de novas vias alternativas de perfusão serem criadas. Dessa
forma, quando a oclusão inicial for completa, o fluxo sanguíneo recém-criado pode ser
capaz de suprir as necessidades e evitar o infarto.

• Vulnerabilidade à hipóxia: Cada tipo de célula possui uma vulnerabilidade à falta


de oxigenação. Os neurônios, por exemplo, são pouco resistentes e já sofrem danos

PATOLOGIA | UNIDADE 3
irreversíveis em 3 a 4 minutos, quando existe privação do fluxo sanguíneo. Células
miocárdicas também são bastante vulneráveis e morrem dentro de 20 a 30 minutos de
isquemia.

• Taxa de oxigênio sanguíneo: Pacientes que possuam menor concentração de oxigênio


sanguíneo, como os anêmicos, por exemplo, podem sofrer um infarto mesmo com uma
oclusão vascular parcial, uma vez que a quantidade de oxigênio chegando ao tecido não
é suficiente para mantê-lo vivo.

6.2. Reperfusão
Em casos de isquemia, tentar restabelecer a circulação perdida é uma prática importante
para evitar a instalação de um infarto ou pelo menos diminuir os danos. Esse processo é
conhecido como reperfusão e pode ser feito utilizando substâncias trombolíticas, com a intensão
de dissolver o trombo ou através de cirurgias de revascularização.
Embora esses procedimentos possam salvar os tecidos, eles também são conhecidos por
causarem a lesão de reperfusão. As possíveis causas dessas lesões são: (1) a formação excessiva de
radicais livres após a reoxigenação do tecido previamente isquêmico; (2) níveis elevados de Ca+2
que, juntamente com os radicais livres, podem abrir poros das mitocôndrias e prejudicar a síntese
de ATP, o que resulta em necrose ou apoptose.

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7 - CHOQUE
O choque pode ser definido como a condição em que há falência circulatória caracterizada
por queda abrupta na pressão arterial, hipoperfusão generalizada de tecidos e órgãos e hipóxia
celular. Como resultado da hipoperfusão, os tecidos recebem menos oxigênio e nutrientes, o que
faz com que o metabolismo celular mude de aeróbio para anaeróbio. O choque inicialmente é
reversível, porém, caso não seja revertido logo, entra em fase irreversível que é frequentemente
fatal.
De forma geral (com exceção ao choque séptico), o paciente apresenta pele pálida,
extremidades frias, hipotensão arterial, distúrbios do estado de consciência e insuficiência
respiratória e renal. Já no choque séptico, que será abordado com bastantes detalhes mais adiante,
o paciente apresenta-se com pele incialmente rosada, quente e bem irrigada e, somente depois de
algum tempo, surgem os sinais relatados para os outros tipos de choque.
O choque é causado ou por distúrbios na macrocirculação ou por distúrbios na
distribuição do volume sanguíneo. Com base nas causas, podemos dividir os choques em cinco
tipos, que serão abordados logo a seguir, estes possuem um resultado comum, a baixa perfusão
generalizada.

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O vídeo Produção de Vídeo Aula – Choque resume brevemente as principais ca-
racterísticas do choque.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=xXcd0GCIMuk>.
Acesso em: 26 set. 2018

• Choque cardiogênico: Tem como causa a falha da bomba cardíaca, ou seja, o coração
torna-se incapaz de bombear o sangue de forma adequada. Essa falha pode acontecer por
danos intrínsecos ao miocárdio, como um infarto, arritmias ventriculares, tamponamento
cardíaco ou pela obstrução do fluxo, como no caso de embolia pulmonar. Em todas essas
situações o débito cardíaco fica bastante reduzido.

• Choque hipovolêmico: Ocorre quando há perda de quantidade significativa do volume


sanguíneo ou plasmático em um curto período de tempo, levando ao baixo débito
cardíaco. Pode ser ocasionado por sangramento intenso, queimaduras e desidratação
intensa.

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• Choque anafilático: Resulta de uma reação antígeno-anticorpo mediada por anticorpos


da classe IgE, provocando a liberação de diversas substâncias. Os efeitos mais graves
dessas substâncias são a vasodilatação sistêmica e aumento da permeabilidade vascular,
o que resulta em queda de pressão arterial, diminuição do retorno venoso ao coração,
hipoperfusão tecidual e hipóxia.

• Choque neurogênico: É resultado da perda do tônus vascular, o que gera queda na


resistência vascular, diminuição do retorno venoso ao coração e acúmulo de sangue
periférico. As principais causas dessa perda de tônus são episódios de acidente anestésico,
lesões na medula espinal e afecções agudas do sistema nervoso central.

• Choque séptico: O choque séptico é causado, principalmente, por infecções por bactérias
Gram-negativas produtoras de endotoxinas e, menos frequentemente, por bactérias
Gram-positivas, fungos e outras toxinas bacterianas. Essa condição tem índices de
mortalidade de aproximadamente 20% e encontra-se entre as principais causas de morte
nas unidades de terapia intensiva. As infecções liberam diversos mediadores químicos,
o que leva a uma ativação generalizada de leucócitos em uma condição conhecida como
síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS). A SIRS é uma resposta exagerada do
organismo a uma agressão. É desencadeada por moléculas encontradas em bactérias, que
são conhecidas como PAMPs. Estas são moléculas liberadas pelo microrganismo após a
sua morte ou presentes na sua própria superfície, que são reconhecidas como algo estranho
pelo organismo. Após esse reconhecimento e ligação a receptores, dá-se início a uma

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reação inflamatória, liberando citocinas, derivados do ácido araquidônico, fator ativador
de plaquetas e NO. Quando a quantidade de microrganismos é muito grande, a resposta
inflamatória é mais intensa, com maior liberação de mediadores pró-inflamatórios, o que,
geralmente, vem acompanhado de febre e leucocitose. Esses fatores liberados, além das
próprias substâncias microbianas, ativam as células endoteliais e são responsáveis por um
estado pró-coagulante sistêmico que leva a (1) trombose, (2) aumento da permeabilidade
vascular e (3) vasodilatação. A sepse altera a expressão de inúmeros fatores que favorecem
a coagulação e diminui a produção de fatores anticoagulantes, o que favorece a deposição
de trombos ricos em fibrina nos pequenos vasos por todo o corpo, caracterizando a CID.
A ativação endotelial leva, também, à liberação de substâncias com atividade vasodilatora,
o que diminui a perfusão sanguínea. Ao mesmo tempo, citocinas pró-inflamatórias
promovem resistência à insulina, levando à hiperglicemia. A hiperglicemia diminui a
atividade bactericida pois diminui a atividade dos neutrófilos. A hipotensão sistêmica, o
edema e a trombose de pequenos vasos prejudicam o suprimento de sangue para diversos
órgãos. Os altos níveis de citocinas e mediadores secundários diminuem a contratilidade
miocárdica e, consequentemente, o débito cardíaco. A junção de todos esses fatores pode
levar a falência de múltiplos órgãos o que pode culminar com o óbito. Todos os processos
envolvidos no choque séptico estão resumidos na Figura 7.

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Figura 7 - Principais vias patogênicas no choque. CID, Coagulação vascular disseminada; HMGB1, proteína 1 do

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grupo de alta mobilidade; NO, óxido nítrico; PAF, fator de ativação plaquetário; PAI-1, inibidor do ativador do plas-
minogênio 1; sTNFR, receptor do TNF solúvel; TF, fator tecidual; TFPI, inibidor da via do fator tecidual.
Fonte: Kumar et al. (2010).

A gravidade e a forma como o choque séptico irá evoluir dependem da virulência da


infecção e do estado geral do hospedeiro, que incluem o estado imunológico e a presença de
outras doenças associadas. O melhor tratamento para a sepse continua sendo a administração de
um antibiótico adequado que tenha ação sobre as bactérias que estão causando a sepse, além do
controle da hiperglicemia com a administração de insulina. Entretanto, o tratamento do choque
séptico ainda continua sendo um desafio, especialmente com o alarmante aumento do número
de bactérias resistentes a diversos antibióticos.

Leia mais sobre as características do choque séptico no artigo de HENKIN. C. S. et


al.: Sepse: uma visão atual. Scientia Medica, Porto Alegre, 2009, p. 135-145.
Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/scientiamedi-
ca/article/viewFile/4716/4285>.

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7.1. Fases Hemodinâmicas do Choque


O choque é um distúrbio progressivo e que, se controlado no início, pode ser revertido,
mas caso não seja corrigido leva ao óbito. Dessa forma, podemos dividir o choque de acordo com
o comportamento hemodinâmico do paciente.

• Forma hiperdinâmica: É visualizada no início do choque séptico-tóxico, em que


inicialmente não ocorre alterações na macrocirculação (comprometimento do débito
cardíaco). Como resposta à vasodilatação inicial, o organismo ativa o sistema adrenérgico
e renina-angiotensina-aldosterona. Como resultado dessas ativações ocorre taquicardia
e retenção de líquidos para tentar manter o equilíbrio hemodinâmico e garantir que
coração e cérebro continuem a receber fluxo sanguíneo. Se a causa não for eliminada ou
controlada, leva a falha nesses mecanismos de controle e evolução para a próxima forma
de choque, a forma hipodinâmica.

• Forma hipodinâmica: Um choque já pode iniciar nessa forma ou suceder a forma


hiperdinâmica. Ela apresenta-se de duas formas: (1) compensada – que é considerada
reversível. No início de todos os tipos de choque, com exceção do choque séptico-
tóxico, ocorre queda da pressão arterial e do retorno venoso e, como resposta, existe a
ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona, o que, como visto anteriormente,
estimula a vasoconstrição e retenção de líquido e sódio para tentar manter o volume
intravascular. Ao mesmo tempo existe estimulação simpaticoadrenérgica, com liberação

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de vasopressina e adrenalina, o que, de forma geral, diminui o fluxo sanguíneo em locais
menos “importantes”, como pele, rins, mesentério, e garantem fluxo sanguíneo normal
no cérebro e coração, órgãos vitais. Esse processo recebe o nome de centralização da
circulação. Com o comprometimento da irrigação periférica, o metabolismo passa a
ser anaeróbio, levando ao aumento da produção de ácido lático e consequentemente
diminuição do pH. (2) Na fase descompensada, essa alteração no metabolismo aeróbio
para anaeróbio é determinante para a evolução do paciente. Quanto maior for a duração
e a intensidade da acidose lática, pior é o prognóstico do paciente. A acidose por períodos
muito longos leva à paralisação da musculatura dos vasos arteriais, o que causa o aumento
da saída de líquido pelas vênulas, agravando a hipovolemia e aumentando a viscosidade
sanguínea. Essas alterações acabam entrando em um círculo vicioso levando, cada vez
mais, a uma maior acidose, maior perda de líquidos, maior viscosidade do sangue, o
que leva a SIRS (vista anteriormente na explicação sobre o choque séptico), culminando
em hipoperfusão generalizada, coagulação intravascular disseminada, sangramentos em
vários órgãos (devido ao consumo dos fatores de coagulação), o que pode resultar em
falência múltipla de órgãos.

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8 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vimos nessa unidade que as disfunções hemodinâmicas podem envolver os vasos
sanguíneos, o coração e o próprio sangue. A manutenção da hemostasia é muito importante para
que o sangue consiga fluir pelos vasos sanguíneos e para que ele coagule quando for necessário,
evitando uma hemorragia. A perda desse equilíbrio é responsável por algumas das disfunções
vistas, como a trombose e a embolia. Vimos também que o edema pode acontecer em situações
não inflamatórias e que o infarto não acontece só no coração, mas em vários órgãos em que o fluxo
sanguíneo é interrompido e acontece necrose tecidual. Por fim, vimos que diversos estímulos,
quando não controlados a tempo, como a insuficiência cardíaca e as hemorragias, podem levar
o paciente ao choque que, na verdade, é uma hipotensão generalizada que acarreta em falta de
aporte sanguíneo para os órgãos.

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UNIDADE ENSINO A DISTÂNCIA

04
DISCIPLINA: PATOLOGIA

NEOPLASIAS
PROF.A DRA. MARIANA APARECIDA LOPES ORTIZ

SUMÁRIO DA UNIDADE

INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................ 77
1 - NOMENCLATURA ................................................................................................................................................ 78
2 - CARACTERÍSTICAS DAS NEOPLASIAS BENIGNAS E MALIGNAS ................................................................ 79
2.1. DIFERENCIAÇÃO E ANAPLASIA ..................................................................................................................... 80
2.2. TAXA DE CRESCIMENTO TUMORAL ............................................................................................................... 81
2.3. INVASÃO LOCAL .............................................................................................................................................. 82
2.4. METÁSTASES .................................................................................................................................................... 84
2.4.1. VIA LINFÁTICA ............................................................................................................................................... 85
2.4.2. VIA SANGUÍNEA ............................................................................................................................................ 85
2.4.3. OUTRAS VIAS ................................................................................................................................................. 87
2.4.4. ASPECTOS MORFOLÓGICOS DAS METÁSTASES ..................................................................................... 87

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2.4.5. ASPECTOS CLÍNICOS ................................................................................................................................... 87
3 - EPIDEMIOLOGIA ............................................................................................................................................... 89
3.1. INCIDÊNCIA ....................................................................................................................................................... 89
3.2. FATORES DE RISCO ........................................................................................................................................ 90
4 - CARCINOGÊNESE ............................................................................................................................................. 92
4.1. ATIVAÇÃO DE ONCOGENES ............................................................................................................................. 92
4.2. INATIVAÇÃO DE GENES SUPRESSORES DE TUMOR ................................................................................... 92
4.3. ALTERAÇÃO NOS GENES QUE REGULAM A APOPTOSE ............................................................................. 93
4.4. INIBIÇÃO DO REPARO DO DNA ...................................................................................................................... 94
5 - AGENTES CARCINOGÊNICOS .......................................................................................................................... 94
5.1. CARCINOGÊNESE QUÍMICA ........................................................................................................................... 96
5.2. CARCINOGÊNESE POR RADIAÇÃO ................................................................................................................ 96
5.2.1. RADIAÇÃO ULTRAVIOLETA ............................................................................................................................ 97
5.2.2. RADIAÇÃO IONIZANTE .................................................................................................................................. 97
5.3. CARCINOGÊNESE BIOLÓGICA ........................................................................................................................ 98
6 - MARCADORES TUMORAIS ............................................................................................................................... 99
7 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................................... 100

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INTRODUÇÃO
O câncer já se encontra, hoje, como uma das principais causas de morte em todo mundo.
Por se tratar de uma doença que demora para dar indícios ou sintomas, seu diagnóstico, muitas
vezes, acontece em fases muito avançadas o que compromete o tratamento e, normalmente,
confere um mau prognóstico ao paciente. Além de tudo isso, o câncer é uma doença que mexe de
forma muito intensa com o emocional do paciente e, também, dos familiares e pessoas próximas.
Os tumores, de forma geral, podem ser definidos como um crescimento anormal e
descontrolado. Conhecer as características dos tumores e as formas que eles se desenvolvem
podem contribuir para que a tão esperada cura esteja cada vez mais próxima.
Nesta unidade, iremos discutir as características que determinam a formação e o
crescimento dos tumores, diferenciando o comportamento dos tumores benignos e malignos.
Além disso, veremos quais os fatores que podem influenciar no desenvolvimento de tumores e
quais são seus mecanismos genéticos de formação. Finalizaremos falando a respeito dos principais
agentes carcinogênicos e de que forma eles interagem com as células.

PATOLOGIA | UNIDADE 4

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1 - NOMENCLATURA
Neoplasia, se olharmos o significado real da palavra, é um “crescimento novo”. Os novos
crescimentos também são chamados de neoplasmas, embora a palavra mais utiliza para designar
esses novos crescimentos é tumor.
Um tumor ou um neoplasma pode ser definido, segundo Kumar et al. (2010, p. 260),
como “uma massa anormal de tecido, cujo crescimento é excessivo e não coordenado com aquele
dos tecidos normais, e persiste da mesma maneira excessiva após a interrupção do estímulo que
originou as alterações”. Apesar de serem um assunto muito recorrente nos dias de hoje, relatos
de doenças conhecidas como câncer ou doenças sem cura já existem desde de centenas de anos
antes de Cristo.
De forma bem simples, os tumores considerados benignos são aqueles que apresentam
características muito parecidas com os tecidos normais, além de permanecerem localizados, não
conseguirem se disseminar e, na maioria das vezes, não levam o paciente à morte. Por sua vez, os
tumores chamados de malignos, também conhecidos como “câncer”, são tumores que possuem a
capacidade de invasão e de se espalharem para locais distantes.
Independentemente de serem benignos ou malignos, os tumores são compostos por dois
componentes básicos: (1) as próprias células tumorais, que constituem o parênquima, e (2) toda
a estrutura que dá suporte à essas células, como os vasos sanguíneos e tecido conjuntivo, que
constituem o estroma.

PATOLOGIA | UNIDADE 4
• Tumores benignos: De forma geral, a nomenclatura dos tumores benignos é feita
através da adição do sufixo –oma à nomenclatura da célula de origem do tumor. Por
exemplo, um tumor benigno de origem óssea é chamado de osteoma, um que surge nos
tecidos cartilaginosos recebe o nome de condroma. Porém, alguns tumores recebem uma
nomenclatura que não está relacionada à célula de origem, mas, sim, com características
físicas micro e macroscópicas do próprio tumor. Tumores derivados de glândulas,
normalmente, recebem o nome de adenoma e aqueles que possuem uma aparência
verrucosa, com projeções, recebe o nome de papiloma.

• Tumores malignos: Os tumores malignos são divididos entre aqueles que surgem no
tecido mesenquimal e aqueles que surgem no tecido epitelial. Os de origem mesenquimal
recebem a adição da palavra sarcoma (por exemplo, fibrossarcoma, condrossarcoma,
osteossarcoma). Por outro lado, os de origem epitelial recebem o nome de carcinomas
(ex. carcinoma de células escamosas, adenocarcinomas).

• Exceções: Algumas nomenclaturas podem ser usadas tanto para tumores benignos quanto
malignos. Um exemplo são os pólipos que são projeções visíveis na mucosa do intestino ou
do estômago e podem apresentar-se como tumores benignos ou malignos. Os teratomas,
apesar do sufixo –oma, são tumores que, também, podem ser benignos ou malignos e
que apresentam, como característica principal, a presença de células totipotentes, que
podem diferenciar-se em diversos tecidos, fazendo com que os neoplasmas possuam
características dos mais variados tipos de tecido de forma desorganizada, como pedaços
de osso, gordura, pelos e outros tecidos. Outras exceções são os linfomas, seminomas e
melanomas que, apesar da nomenclatura compatível com os tumores benignos, sempre
foram utilizados para designar tumores malignos. Na Tabela 1, podemos encontrar as
formas mais comuns de neoplasias.

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Tecido de origem Benigno Maligno

Tecido epitelial
Revestimento Papiloma Carcinoma
Glandular Adenoma Adenocarcinoma

Tecido conjuntivo
Fibroso Fibroma Fibrossarcoma
Mixóide Mixoma Mixossarcoma
Adiposo Lipoma Lipossarcoma
Cartilagem Condroma Condrossarcoma
Vasos sanguíneos Hemangioma Hemangiossarcoma
Vasos linfáticos Linfangioma Linfangiossarcoma
Meninge Meningioma Meningioma maligno

Tecido hemolinfopoiético
Mieloide Leucemia
Linfoide Leucemia, linfomas, mieloma

Tecido Muscular
Liso Leiomioma Leiomiossarcoma
Estriado Rabdomioma Rabdomiossarcoma

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Tecido nervoso
Neuroblasto ou neurônio Ganglioneuroma Ganglioneuroblastoma,
Células gliais neuroblastoma, simpaticogonioma
Neuroepitélio Gliomas
Melanócitos Nevus melanocítico Ependioma
Trofoblastos Mola hidatiforme Melanoma
coriocarcinoma

Tabela 1 - Resumo da origem e nomenclatura dos nomes. Fonte: a autora.

2 - CARACTERÍSTICAS DAS NEOPLASIAS BENIGNAS E


MALIGNAS
Tumores benignos e malignos possuem características distintas, fazendo com que seja
possível diferenciá-los. Além disso, ao saber que possui um tumor, a informação mais importante
para o paciente, naquele momento, é saber se ele é benigno ou maligno, o que interfere muito
no prognóstico da doença. De forma geral, os tumores são diferenciados com base nas seguintes
características: diferenciação e anaplasia, taxa de crescimento, invasão local e metástase. Cada
uma dessas características será abordada a partir de agora.

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2.1. Diferenciação e Anaplasia


O termo diferenciação, quando aplicado às células, corresponde ao processo em que
uma célula inicia seu processo de transformação, desde a célula de origem, mais imatura, até sua
característica final, mais madura e diferenciada. Dessa forma, células diferenciadas são aquelas
que passaram por seu processo de maturação e são consideradas funcionais.
Quando aplicamos esse termo às células neoplásicas, dizemos que um tumor diferenciado
é aquele em que as células parenquimatosas neoplásicas são bastante parecidas ou lembram
as células parenquimatosas normais correspondentes. De forma geral, tumores benignos são
considerados bem diferenciados, ou seja, mantêm muitas semelhanças com as células normais.
Em alguns casos, apenas pelas características microscópicas, é quase impossível diferenciar um
tumor de um tecido normal, o reconhecimento só é feito através de técnicas moleculares. Já os
tumores malignos possuem uma maior variação de características.
Eles podem se apresentar como células bem diferenciadas ou completamente
indiferenciadas. Essa ausência de diferenciação recebe o nome de anaplasia e os tumores com
essas características são denominados como anaplásicos.
O grau de diferenciação das células neoplásicas influencia na funcionalidade dessas
células. Tumores bem diferenciados de glândulas endócrinas, normalmente, continuam a
produzir os hormônios característicos de sua origem. Muitos tumores são diagnósticos através
da dosagem de hormônios que passam a ser produzidos em maiores quantidades. Já as células
pouco diferenciadas ou anaplásicas, uma vez que não possuem semelhanças com o tecido de
origem, deixam de realizar as antigas funções ou passam a exercer funções novas e inesperadas.

PATOLOGIA | UNIDADE 4
A falta de diferenciação ou anaplasia está relacionada com diversas alterações morfológicas
que ajudarão na hora do diagnóstico. Entre essas alterações podemos citar:

- Pleomorfismo: Um conjunto de células normais, de maneira geral, apresentam formas


e tamanhos muito parecidos, elas são uniformes. Em tumores anaplásicos tanto o citoplasma
quanto o núcleo das células apresentam uma grande variação de tamanhos e formas (Figura 1).

- Morfologia nuclear: Na maioria dos casos, os núcleos tornam-se excessivamente


grandes e a relação núcleo citoplasma altera-se bastante. A forma do núcleo passa a ser irregular
e a cromatina se encontra grosseiramente espalhada. Nucléolos também estão visíveis.

- Mitoses: As células de tumores benignos normalmente não apresentam tanta mudança


na quantidade de mitoses quando comparadas às células normais. Já as células anaplásicas ou
pouco diferenciadas, possuem um número muito elevado de mitoses.

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Figura 1 - Ependioma anaplásico. Observa-se núcleos grandes com atipias, pseudoinclusões, nucléolo proeminente
e eosinófilo. Fonte: Departamento de Anatomia Patológica (2018).

2.2. Taxa de Crescimento Tumoral


A velocidade de crescimento de um tumor influencia tanto no desfecho clínico quanto nas
respostas às terapias. Um dos maiores problemas para o tratamento dos tumores, especialmente
os malignos, é a demora na sua detecção. De forma geral, quando a maioria dos tumores pode ser

PATOLOGIA | UNIDADE 4
detectada pela maioria dos exames, seu tamanho já é bastante grande ou o tumor já está em fase
avançada do seu ciclo de vida, o que compromete especialmente o tratamento.
O crescimento de um tumor depende de três fatores principais: tempo de duplicação das
células tumorais, fração de células que se encontram no grupo replicativo e taxa de células que
se perdem ou morrem. Caso a quantidade de células que estejam se proliferando ultrapasse a
quantidade de células que estão em morte celular, ocorre o crescimento tumoral (Figura 2).

Figura 2 - Representação esquemática do crescimento tumoral. Fonte: Kumar et al. (2010).

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Na maioria das vezes, no início do tumor, a grande maioria das células encontra-se no
grupo replicativo. Com o passar do tempo, conforme o tumor continua a crescer, muitas células
deixam esse compartimento e, cada vez mais, passam para a fase não proliferativa do ciclo celular.
Normalmente, isso acontece devido à diminuição da quantidade de nutrientes, necrose, apoptose,
entre outras situações. Dessa forma, quando um tumor se apresenta clinicamente detectável a
maioria das células não está no grupo replicativo, mesmo em tumores de crescimento rápido.

O grupo que as células se encontram pode influenciar no tratamento de um tu-


mor? O fato de um número maior ou menor de células encontrar-se no grupo repli-
cativo tem influência direta no tratamento. A maioria dos agentes anticâncer age
nas células que estão no ciclo, ou seja, fase de replicação. Dessa forma, quanto
menos células estiverem nesse grupo, menos células serão atingidas por esse
tipo de tratamento. Uma estratégia utilizada para aumentar a resposta do tumor
a esses medicamentos é tentar fazer um maior número de células entrarem no
grupo replicativo, o que pode ser conseguido pela redução do tumor através de
cirurgia ou radioterapia. Por isso, na maioria das vezes, o tratamento de tumores
é feito por meio da combinação de diferentes estratégias, garantindo que células
em diferentes estágios sejam atingidas.

PATOLOGIA | UNIDADE 4
A taxa de crescimento não é a mesma para todos os tipos de tumores. Em geral, ela está
relacionada com o grau de diferenciação celular, ou seja, tumores bem diferenciados tendem a
apresentar crescimento mais lento que os tumores pouco diferenciados. Porém, em alguns casos,
é possível observar tumores benignos e bem diferenciados apresentando taxas de crescimento
maiores que tumores malignos. Isso se deve ao fato do crescimento não estar apenas relacionado
às características celulares, mas, também, às características do local onde o tumor está instalado,
como a estimulação hormonal e a irrigação sanguínea.

2.3. Invasão Local


De forma geral, a invasão é uma característica de tumores malignos. Os tumores benignos
crescem como uma massa coes que permanece localizada, não infiltrando e nem afetando os
tecidos circunjacentes. Essa característica justifica o fato de que a maioria dos tumores benignos
são passíveis de serem retirados cirurgicamente.
Já os cânceres ou tumores malignos são acompanhados por infiltração progressiva,
invasão e, muitas vezes, destruição dos tecidos adjacentes. Essa característica torna a retirada
cirúrgica difícil ou até impossível. Além da capacidade de invasão, os tumores malignos também
são capazes de se metastizar, ou seja, apresentarem um crescimento em outro local sem conexão
com o local de origem. Essas duas características (invasão e metástase) são as características mais
confiáveis para diferenciar tumores benignos de tumores malignos.
No processo de invasão as células tumorais interagem com a matriz extracelular (MEC)
em diversos estágios. Um carcinoma primeiro rompe a membrana basal subjacente, então
atravessa o tecido conjuntivo intersticial e, só no final, consegue ter acesso à circulação.

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A Figura 3 mostra as etapas do processo de invasão, que compreendem: o afrouxamento


das junções intercelulares; a degradação da MEC; a ligação a novos componentes da MEC; e, por
fim, a migração das células.

• Afrouxamento das junções intercelulares: As células encontram-se ligadas umas às


outras por uma diversidade de moléculas de adesão. As moléculas que medeiam essas
interações fazem parte de uma família de glicoproteínas chamadas de caderinas. Em alguns
tumores observou-se uma expressão diminuída dessas caderinas, o que provavelmente
reduz a capacidade das células se aderirem umas às outras e facilita o descolamento e
futura invasão dessas células.

• Degradação da MEC: Para que ocorra a degradação dos componentes da MEC é


necessária a secreção de enzimas proteolíticas que podem ser produzidas pelas próprias
células tumorais ou por células estromais (que são induzidas pelas células tumorais). Além
da degradação da MEC, células tumorais podem migrar, também, através dos espaços da
matriz, se apertando em um processo conhecido como migração ameboide.

• Ligação a componentes da MEC: As células normais possuem diversos receptores,


como as integrinas, já discutidas em unidades anteriores. Caso as células normais percam
a ligação, elas são direcionadas para a apoptose. As células tumorais são resistentes a
essa forma de morte celular. As mudanças sofridas pela matriz favorecem a invasão e
metástase, uma vez que surgem novos sítios para ligação entre as células tumorais.

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• Locomoção: A última etapa do processo de invasão também é dependente da ligação e
desligamento entre as células tumorais de diversos receptores. Essa movimentação parece
ser direcionada por meio de citocinas derivadas das próprias células tumorais. Produtos
da clivagem de componentes da matriz e alguns fatores de crescimento também possuem
atividade quimiotática para células tumorais. Além disso, a clivagem proteolítica libera
fatores de crescimento que favorecem a mobilidade das células.

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Figura 3 - Etapas do processo de invasão. Fonte: Kumar et al. (2010).

2.4. Metástases
Segundo Kumar et al. (2016, p. 269) “a metástase é definida pela propagação de um tumor
para áreas que são fisicamente descontínuas com o tumor primário e de forma inequívoca marca
um tumor maligno, pois por definição, neoplasias benignas não formam metástases”. Brasileiro
Filho (2014, p.238) define metástase como

a formação de uma nova lesão tumoral a partir da primeira, mas sem


continuidade entre as duas. A formação de metástases é um processo complexo
que depende de inúmeras interações entre as células malignas e componentes
dos tecidos normais, especialmente do estroma.

A maior gravidade do câncer se deve justamente à capacidade de sofrer metástases, o


que dificulta o tratamento e torna o prognóstico do paciente muito ruim. De maneira geral todos
os tumores malignos são capazes de se metastizar, embora algumas exceções são observadas
(carcinoma basocelular de pele e gliomas normalmente são capazes de invadir, mas não dão
metástases).
A formação de metástases é um processo complexo e envolve diversas etapas que incluem:
o destacamento das células da massa tumoral inicial, a invasão de vasos sanguíneos ou linfáticos,
a sobrevivência dessas células na circulação, a saída dos vasos no órgão em que irão se instalar
(diapedese), indução de vasos para o suprimento sanguíneo do novo tumor (Figura 4). Diferente
do que se era pensado, a metastização não acontece de forma aleatória.

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Observações realizadas no final do século XIX mostraram que certas neoplasias formam
metástases em determinados órgãos, enquanto alguns órgãos, normalmente, não sofrem
metástase, o que demonstra um padrão e não que simplesmente a célula tumoral alcance os vasos
sanguíneos e se desenvolva em qualquer órgão aleatoriamente.
Os tumores podem se disseminar pelas seguintes vias:

2.4.1. Via linfática


É a principal via de disseminação dos carcinomas, embora sarcomas também utilizem
essa via. De forma geral, o sítio da metástase é o primeiro linfonodo situado na via de drenagem
do tumor, conhecido como linfonodo sentinela. Esse padrão é importante para a monitorização
de evolução dos tumores e o linfonodo sentinela normalmente é mapeado para avaliar a presença
ou ausência de metástases.
Muitas vezes, os linfonodos funcionam como barreiras para a proliferação dos tumores,
conferindo certa resistência ao seu crescimento. Mas isso não dura muito tempo. Geralmente os
linfonodos atingidos apresentam-se aumentados de volume e, dependendo da localização, podem
ser palpáveis. Porém, também pode representar uma hiperplasia reativa ao tumor primário,
devido aos componentes antigênicos que são drenados pelas vias linfáticas.

2.4.2. Via sanguínea

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É a via de disseminação típica dos sarcomas, mas também é observada nos carcinomas.
Artérias são menos propensas a esse processo, uma vez que possuem parede mais espessa, quando
comparadas às das veias.
Após penetrarem os vasos sanguíneos, as células tumorais podem ser levadas para
qualquer parte do corpo, embora, como vimos anteriormente, esse processo não é aleatório.
Além disso, o simples fato da célula alcançar a corrente sanguínea não implica em uma metástase
iminente. A imensa maioria das células que atingem a circulação morrem em decorrência de
apoptose, resposta imunológica do hospedeiro, defesa não imunitária e outros fatores.
Ao atingirem a circulação as células tumorais tendem a formar agregados celulares. Além
de se ligarem entre si, as células tumorais podem, também, se ligar a outras células do sangue,
especialmente plaquetas. Essas ligações favorecem a sobrevivência das células tumorais.
O tropismo por regiões específicas, já mencionado nessa unidade, pode estar relacionado
às moléculas de adesão presentes nas células tumorais, as quais só se ligarão caso encontrem seus
receptores no órgão-alvo.

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Figura 4 - Cascata metastática. Fonte: Kumar et al. (2010).

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Quimiocinas que se ligam a receptores presentes nos tumores também apresentam relação
com os órgãos-alvo. Um exemplo são células cancerosas de mama que expressam os receptores
CXCR4 e CCR7, para os quais encontra-se as quimiocinas correspondentes superexpressas nos
tecidos em que os tumores de mama normalmente metastizam.

2.4.3. Outras vias


As células tumorais também podem ser transportadas por canais, ductos ou cavidades
naturais do corpo, o movimento dos líquidos ou das vísceras presentes nessas cavidades é o
suficiente para o deslocamento das células para diferentes lugares. Como principal exemplo
podemos citar a cavidade peritoneal.

2.4.4. Aspectos morfológicos das metástases


Macroscopicamente as metástases apresentam-se como nódulos numerosos, de tamanhos
diversos (Figura 5). Microscopicamente, as características das metástases podem ser as mesmas
do tumor de origem, porém, em grande parte das vezes, eles são ainda menos diferenciados e
mais atípicos do que o tumor original. O que muitas vezes torna difícil determinar qual é o tumor
de origem das metástases.

2.4.5. Aspectos clínicos

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Brasileiro Filho (2014, p. 243) classifica os padrões de manifestação das metástases da
seguinte forma:

(a) o tumor primitivo é identificado e removido cirurgicamente, sem se


identificarem metástases, as quais aparecem meses ou anos depois; (b) o tumor
primitivo é diagnosticado e já existem metástases; (c) identificam-se metástases
mas não se encontra o tumor primitivo; (d) o tumor primitivo é identificado
e extirpado, não se identificando metástases, que aparecem anos depois
(metástases dormentes); (e) o tumor primitivo é identificado já com metástases
e, após sua remoção cirúrgica as metástases regridem.

Toda essa variação não é muito bem esclarecida, pois depende de fatores do hospedeiro,
do próprio tumor e da interação entre o tumor primário e as metástases.

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Figura 5 - Fígado tomado por câncer metastático. Fonte: Kumar et al. (2010).

No Quadro 1 podemos observar, resumidamente, as características que distinguem os


tumores benignos dos malignos.

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Características Benigno Maligno

Diferenciação e Bem diferenciado; estrutura às Certa falta de diferenciação


Anaplasia vezes típica do tecido de ori- com anaplasia; estrutura
gem. frequentemente atípica.

Taxa de Geralmente progressiva e lenta; Instável e pode ser desde


crescimento pode chegar a um ponto de lenta a rápida; figuras mitóti-
paralização ou regredir; figuras cas podem ser numerosas e
mitóticas raras e normais. anormais.

Invasão local Geralmente são massas co- Localmente invasivo, infil-


esivas, expansivas, bem deli- trando o tecido circunjacen-
mitadas, que não invadem ou te; algumas vezes pode ser
infiltram o tecido normal cir- aparentemente coesivo e
cunjacente. expansivo.

Metástases Ausente. Frequentemente presentes;


quanto maior e mais indife-
renciado maior a probabilida-
de de metástases.

Quadro 1. Características dos tumores benignos e malignos. Fonte: Kumar et al. (2010).

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3 - EPIDEMIOLOGIA
A incidência de câncer não é algo que seja padronizado, ou seja, todos os tipos de
câncer existem na mesma quantidade em todos os lugares do mundo. Alguns tipos de câncer
são comuns em populações de um determinado país, enquanto são raros em outras. Certos
tumores são bastante comuns em crianças, outros acometem especialmente adultos. Todas essas
informações mostram que os fatores ambientais e comportamentais exercem muita influência no
desenvolvimento dessas doenças.
Estudos epidemiológicos envolvendo o câncer são especialmente úteis para se conhecer as
origens da doença e identificar quais populações apresentam maior ou menor risco para o câncer.
Além disso, o conhecimento a respeito da incidência dos diversos tipos de câncer é importante
para que sejam desenvolvidas campanhas de conscientização, prevenção e controle dos fatores
de risco.

3.1. Incidência
O câncer já pode ser considerado, inquestionavelmente um problema de saúde pública,
especialmente nos países em desenvolvimento. Uma estimativa mundial, realizada em 2012,
mostrou que entre os 14 milhões de novos casos estimados, mais de 60% ocorreram em países
em desenvolvimento. Quando se leva em conta a mortalidade, 70% dos óbitos aconteceram

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nesses mesmos países. Os tipos de câncer mais incidentes a nível mundial foram pulmão, mama,
intestino e próstata. Sendo que nos homens os mais frequentes foram pulmão, próstata, intestino,
estômago e fígado. Enquanto em mulheres as maiores taxas visualizadas foram mama, pulmão,
colo do útero e estômago (INCA, 2018).
Quando comparamos os dados de incidência dos países desenvolvidos com os países
em desenvolvimento, o perfil de alguns tipos de câncer se assemelha, porém, nos países em
desenvolvimento ainda prevalecem os cânceres relacionados a condições socioeconômicas
menos favoráveis, como colo do útero e estômago (INCA, 2018).
Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA), a estimativa para o Brasil,
nos anos de 2018-2019 é de que ocorram cerca de 600 mil novos casos, sendo que desses
aproximadamente 170 mil são câncer de pele não melanoma. O câncer de próstata será o mais
frequente em homens, enquanto o de mama será o mais frequente em mulheres. A distribuição
proporcional dos dez tipos de câncer mais incidentes estimados para 2018 pode ser observada
na Figura 6.

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Figura 6 - Distribuição proporcional dos dez tipos de câncer mais incidentes estimados para 2018 por sexo, exceto
pele não melanoma. Fonte: INCA (2018).

3.2. Fatores de Risco


Muitos são os fatores de risco associados ao desenvolvimento do câncer. Embora os fatores
genéticos influenciem muito no seu desenvolvimento, os fatores ambientais e comportamentais
ainda são os maiores contribuintes para a ocorrência da maioria dos cânceres.

• Fatores ambientais e comportamentais: São os mais diversos possíveis e estão


distribuídos por todos os lugares, incluindo o local de trabalho, os alimentos e práticas
pessoais. Entre os principais podemos citar os raios UV e a poluição do ambiente; os
medicamentos (metotrexato); a exposição ocupacional a substâncias tóxicas; o consumo
excessivo de álcool e de alimentos ricos em gorduras; a exposição a vírus, como o HPV, que
são notadamente relacionados ao desenvolvimento de câncer; e o fumo, principalmente
de cigarros, que é relacionado com diversos tipos de câncer, especialmente com o de
pulmão.

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• Idade: A maioria dos casos de câncer acontecem em pacientes adultos, normalmente


após os 40 anos. Isso acontece provavelmente devido ao maior acúmulo de mutações
que vão acompanhando o envelhecimento. Porém, crianças também são acometidas e,
normalmente, os tipos de câncer que as afetam são diferentes daqueles vistos em adultos.
Os carcinomas, categoria mais comum em adultos, são raros em crianças. Enquanto
leucemias e tumores do sistema nervoso central são comuns na infância.

• Predisposição genética: Muito já se sabe a respeito da relação entre genes e tumores,


porém a quantidade de cânceres que acontecem em decorrência de herança genética
corresponde a menos de 10% do total de cânceres. A presença de mutações ou a herança
de determinados genes, sabidamente, estão relacionadas com o desenvolvimento de
certos tumores (Tabela 2).

Gene Predisposição hereditária

RB Retinoblastoma

p53 Síndrome de Li-Fraumeni

P16/INK4A Melanoma

APC Câncer de polipose adenomatosa familiar

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NF1/NF2 Neurofibromatose tipos 1 e 2

BRCA1/BRCA2 Tumores de mama e ovários

MEN1, RET Neoplasia endócrina múltipla 1 e 2

MSH2, MLH1, MSH6 Câncer colorretal hereditário sem polipose

PTCH Síndrome do carcinoma basocelular nevóide

PTEN Síndrome de Cowden (cânceres epiteliais)

LKB1 Síndrome de Peutz-Jegher (cânceres epiteliais)

VHL Carcinomas de células renais


Tabela 2 - Síndromes neoplásicas hereditárias (autossômicas dominantes). Fonte: adaptado de Kumar et al. (2010).

Um dos casos mais conhecidos foi o da atriz Angelina Jolie que, ao fazer um mapeamento
genético, descobriu ser portadora de um gene que aumentava a probabilidade de ter um câncer
de mama a níveis bastante elevados. Com base nesses resultados, ela retirou as mamas para
evitar que o câncer se desenvolvesse algum dia. O que deve ser levado em consideração também
é associação entre os fatores genéticos e os fatores ambientais e comportamentais que podem
elevar a chance de desenvolvimento de um tumor.

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4 - CARCINOGÊNESE
A lesão genética é a base da carcinogênese, ou seja, início da transformação ou do
surgimento de células cancerígenas. Essa lesão genética, como visto anteriormente, pode ser
adquirida por ação de agentes ambientais ou pode ser herdada da linhagem germinativa.
As células normais passam por um rigoroso processo de controle dentro do ciclo celular,
que direciona se as células continuarão a proliferação ou se serão direcionadas para a morte
celular programada (apoptose). Qualquer fator que interfira nesse equilíbrio e nesse rigoroso
controle pode desencadear o desenvolvimento de uma neoplasia.
Alguns fatores podem levar ao desenvolvimento de uma neoplasia ou à carcinogênese:

4.1. Ativação de oncogenes


Antes de falarmos dos oncogenes, vamos falar dos proto-oncongenes. Os proto-oncogenes
são os genes responsáveis pela divisão normal das células. Eles participam das vias de sinalização
que regulam a proliferação celular, e de forma geral favorecem o controle da proliferação e a
apoptose de células defeituosas. Porém, quando os proto-oncogenes sofrem mutações eles se
transformam em oncogenes, que são genes que quando expressos favorecem o desenvolvimento
de uma neoplasia.
Os oncogenes agem de forma dominante, ou seja, apenas um alelo do gene é suficiente

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para que eles estimulem a divisão celular. De forma geral, eles agem de modo contrário aos proto-
oncogenes, aumentando a proliferação celular.

4.2. Inativação de Genes Supressores de Tumor


Enquanto os oncogenes agem favorecendo a proliferação descontrolada de células. Os
genes supressores aplicam freios nessa proliferação.
A proteína RB possui um papel muito importante no controle do ciclo celular. Ela
funciona como um ponto crítico na fase de checagem G1-S do ciclo celular. Células consideradas
anormais, ao chegarem nesse ponto de checagem, podem deixar o ciclo de forma permanente
ou temporária e são impedidas, dessa forma, de avançar e completar a mitose. Caso a proteína
RB não esteja funcionando, os freios são liberados e a célula pode seguir através do ciclo celular.
Um outro exemplo de supressor do tumor é o gene TP53 e seu produto, a proteína p53,
conhecida como guardiã do genoma. Ela está envolvida nos processos de proliferação celular,
reparo e síntese de DNA, diferenciação celular e apoptose. Sua função mais conhecida é a
manutenção da fidelidade da replicação do DNA (Figura 7).

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Figura 7 - O papel da p53 na integridade do genoma. Fonte: Kumar et al. (2010).

Células que tenham sofrido algum tipo de mutação, lesão ou erros durante a replicação
de DNA estimulam a fosforilação da p53. A ativação da p53 atua como estimulante para a ação
de genes de proteínas inibidoras do ciclo celular, o que leva a um bloqueio das células em G1.
Essa parada permite que sistemas de reparo tenham tempo para corrigir eventuais problemas
no DNA, impedindo que ele passe para as próximas gerações celulares. Caso os defeitos não
possam ser corrigidos, a p53 induz a célula à apoptose. Mutações na p53 que façam com que ela
não consiga desempenhar seu papel fazem com que mutações que surjam sejam transmitidas
para as próximas gerações celulares, o que pode ir se acumulando e se tornar suficiente para
desencadear a transformação maligna de uma célula. Defeitos nesse gene são as causas mais
comuns de alterações genéticas em tumores.

4.3. Alteração nos genes que regulam a apoptose


O controle de apoptose é muito importante dentro do ciclo celular normal, tanto
para eliminar células defeituosas ou que sofreram lesões, quanto para eliminar células que já
desempenharam seu papel, mas que não apresentam mais função.
Diversos genes controlam a apoptose, inclusive a p53, e alterações ou falhas nesses genes
estão intimamente relacionadas com o desenvolvimento de câncer ou sua propagação, uma vez
que o maior número de células de uma neoplasia pode ser decorrente da falta de apoptose.

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4.4. Inibição do reparo do DNA


Alguns genes possuem a capacidade de corrigir danos ou defeitos do DNA das células.
Defeitos nesses genes, como mutações, fazem com que mutações ou lesões no DNA sejam
propagadas para futuras linhagens. Entre os genes de reparo podemos citar BRCA-1 e 2, que
quando mutados são relacionados a tumores de mama e ovários. Genes MMR, que quando
alterados provocam aumento do número de mutações. Família UVDR, responsável pelo reparo
de lesões causadas por exposição a raios UV. Mutações nesses genes favorecem o aparecimento
de diversos tipos de tumor, especialmente os tumores de pele.

5 - AGENTES CARCINOGÊNICOS
O desenvolvimento de uma neoplasia não acontece pelo simples fato do contato
com a substância potencialmente carcinogênica. Esse processo é complexo e acontece em
etapas. Processos de iniciação, promoção e propagação são visualizados em diversos agentes
carcinogênicos e serão discutidos antes de conhecermos os principais agentes carcinogênicos.
O processo de iniciação pode ser induzido por uma única exposição a um agente
carcinogênico, mesmo que em doses mínimas. Já a promoção necessita de exposições maiores
e mais prolongadas e devem suceder a iniciação. A Figura 8 ilustra as etapas de iniciação e
promoção na gênese de tumores experimentais.

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Figura 8 - Representação esquemática das etapas de iniciação e promoção na gênese de tumores experimentais.
Fonte: Kumar et al. (2010).

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O que podemos observar na Figura 8 é que: (1) a iniciação isoladamente não é capaz de
levar a formação de tumores, mas quando seguida da promoção sim; (2) a iniciação promove
alterações irreversíveis no DNA, ou seja, mesmo que a promoção aconteça muito tempo depois da
iniciação ainda ocorre o desenvolvimento do tumor; (3) a promoção sozinha ou antes na iniciação
não é capaz de produzir um tumor; (4) a promoção é reversível, o que pode ser observado no
grupo 6, em que o espaçamento do tempo entre a aplicação do promotor não levou à formação
de tumores. Apesar desses dados serem experimentais, há evidências de que os tumores humanos
seguem essa mesma sequência.

• Iniciação: É a fase correspondente à transformação celular, ou seja, mudanças induzidas


pelos mais variados agentes químicos, físicos ou biológicos irão causar modificações
irreversíveis nas células. De forma geral, células iniciadas tornam-se menos responsivas
a fatores que inibem a proliferação celular e à apoptose. Os agentes iniciadores têm efeito
cumulativo e somatório.

• Promoção: A promoção corresponde na expressão ou proliferação das células iniciadas.


Como visto anteriormente, a iniciação sozinha não é capaz de levar ao surgimento de uma
neoplasia, por isso a fase de promoção é bastante importante. Esse processo, diferente da
iniciação, é reversível e demorado. Caso a exposição ao agente promotor seja interrompida
antes da promoção estar completa, o efeito não é manifestado. As substâncias promotoras
não afetam o DNA diretamente e são substâncias que induzem a proliferação celular e
a inflamação. Dessa forma, diversas substâncias podem ser agentes promotores, como:

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hormônios, traumatismos, calor, medicamentos, fenóis, entre outros.

• Progressão: É a etapa do processo que faz com que os tumores sejam mais agressivos
ou invasivos. Normalmente a progressão acontece tanto por influências do hospedeiro
(resposta imunológica principalmente) quanto por modificações que as células
cancerígenas sofrem, que conferem a elas maior capacidade de invasão e malignidade. Essas
modificações são, na verdade, sucessivas mutações, resultado da intensa instabilidade das
células cancerígenas. Com o passar do tempo clones mais agressivos são selecionados, o
que favorece o desenvolvimento de metástases, por exemplo.

A Figura 9 exemplifica os processos de iniciação, promoção e propagação e facilitam seu


entendimento.

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Figura 9 - Modelo de carcinogênese. Fonte: Brasileiro Filho (2014).

5.1. Carcinogênese Química

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Diversas substâncias químicas já foram classificadas como carcinogênicas, especialmente
por trabalhos realizados em animais. O primeiro registro de relação entre uma substância
química e o câncer foi feito quando Percival Pott, um cirurgião inglês, observou que limpadores
de chaminé, que apresentavam exposição crônica à fuligem, desenvolviam câncer de escroto.
Os carcinógenos químicos são divididos em agentes diretos e agentes indiretos. Os
diretos são agentes alquilantes ou alcilantes que possuem atividade eletrofílica intrínseca, ou
seja, podem provocar câncer diretamente. Os agentes diretos, normalmente, são considerados
carcinógenos fracos. Já os agentes indiretos, classe em que a maioria dos agentes químicos se
encontram, precisam primeiro sofrer modificações químicas dentro do organismo para depois
se tornarem eletrofílicos e ativos. Vias metabólicas são utilizadas para a ativação de agentes, a via
do citocromo p450 está entre as mais importantes. Ao mesmo tempo outras vias podem levar
à inativação dos pró-carcinógenos. Dessa forma, a potência carcinogênica de uma substância
é influenciada tanto pela substância em si quanto pela capacidade do organismo de ativar ou
inativar sua transformação. Tanto agentes diretos ou indiretos, no DNA, causam mutações,
especialmente nos genes RAS e p53.
Entre os diversos agentes químicos podemos citar algumas classes: hidrocarbonetos
policíclicos aromáticos, aminas aromáticas, azocompostos, alquilantes, nitrosaminas, aflatoxinas,
asbesto, cloreto e vinil e carcinógenos inorgânicos como o arsênico.

5.2. Carcinogênese por Radiação


Radiações, sejam elas ionizantes ou não ionizantes, são amplamente reconhecidas como
carcinógenos. Da mesma forma que na carcinogênese química as radiações agem provocando a
ativação de oncogenes ou inibindo a ação de supressores de tumor ou de genes responsáveis pelo
reparo.

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5.2.1. Radiação ultravioleta


Os raios ultravioletas (UV) derivados do sol são, provavelmente, o agente carcinogênico
ao qual as pessoas estão mais expostas. O risco da exposição a esses raios depende do tipo de
raio UV, da intensidade e tempo de exposição, quantidade de melanina presente na pele (que
funciona como proteção) e da utilização ou não de fatores de proteção (roupas, protetores solares
etc.). Esses fatores explicam o fato, por exemplo, de pessoas de origem europeia, que possuem
pele clara, estarem entre as maiores incidências de câncer de pele no mundo. Os cânceres de
pele do tipo não melanoma estão relacionados a uma exposição cumulativa à radiação UV,
já os do tipo melanoma estão relacionados à uma exposição intensa e intermitente. Entre os
comprimentos de onda existentes UVA (320-400nm), UVC (280-320nm) e UVC (200-280nm).
Acredita-se que o UVB seja o principal causador de câncer de pele, uma vez que o alvo principal
desse tipo de radiação é o DNA. Os raios UVC, apesar de também serem mutagênicos, são, na
sua maioria, filtrados pela camada de ozônio (pelo menos enquanto ainda temos uma camada de
ozônio). Esses raios induzem a formação de dímeros de pirimidina no DNA, o que normalmente
é reparado através da excisão de nucleotídeos. Porém, acredita-se que, com a exposição solar
excessiva, a capacidade de reparo pela via de excisão de nucleotídeos é superada e os mecanismos
de reparo mais passíveis de erro passam a ser utilizados, o que gera a sobrevivência da célula.
Entretanto, com a presença de mutações genômicas que, em algumas situações, podem levar
ao câncer. Além disso, alguns estudos realizados em animais demonstraram que a exposição à
radiação UV estimula linfócitos T supressores a inibir a resposta imunológica.

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5.2.2. Radiação ionizante
As radiações ionizantes, sejam elas eletromagnéticas (raios x e gama) ou particuladas
(partículas alfa e beta, prótons e nêutrons), são todas carcinogênicas.
Diversas evidências mostram essa ação das radiações: (1) maior incidência de câncer
cutâneo ou leucemias em radiologistas ou operadores de aparelhos de raios X, especialmente
quando ainda não usavam a devida proteção; (2) pessoas que foram expostas excessivamente
aos raios X na infância tem mais chance de desenvolverem leucemias e outros cânceres; (3)
trabalhadores de minas que contém compostos radioativos tem mais chance de desenvolver câncer
broncopulmonar; (4) a aplicação experimental de radiações induz a formação de neoplasias em
diferentes animais.
O poder mutagênico das radiações ionizantes é influenciado por diversos fatores como:

- Tipo de célula alvo: Diferentes tecidos têm sensibilidade variada às radiações. De modo
geral, os tecidos ou células menos diferenciados e com maior taxa de renovação, como a medula
óssea, por exemplo, são mais suscetíveis.

- Idade: Quando mais jovem for, mais suscetível o indivíduo é.

- Eficiência dos mecanismos de reparo: Indivíduos que já possuam mutações herdadas


em genes de reparo, como RAD e BRCA serão mais suscetíveis aos efeitos da radiação.

- Resposta imunológica e estado hormonal: Como em todos os processos patológicos, o


indivíduo que possui um estado imunológico melhor tem menor propensão ao desenvolvimento
de doenças.

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Em 1986, o acidente nuclear de Chernobyl, na Ucrânia, chocou o mundo todo. Com


o acidente houve a liberação de radiação equivalente a 400 vezes da bomba atô-
mica de Hiroshima. Após o acidente houve um aumento da incidência de câncer
de tireoide nas pessoas que eram crianças ou adolescentes na época do acidente.
Além disso, a incidência de leucemia dobrou, afetando principalmente os trabalha-
dores e pessoas que receberam as doses mais altas de radiação. Mais de 30 anos
já se passaram após o acidente e diversos estudos ainda mostram que o risco
de câncer não diminuiu. Outro acidente nuclear importante foi o que aconteceu
no Japão em decorrência do ataque com bombas nucleares. Pesquisas mostram
que entre os sobreviventes do ataque à cidade de Hiroshima, 63% haviam morrido
em decorrência de casos de câncer até 2014. Já na cidade de Nagasaki, cerca de
56% morreram devido à doença.

Leia mais sobre o acidente de Hiroshima e Nagasaki e os efeitos na população no


texto de: EMICO, O.: As bombas atômicas podem dizimar a humanidade – Hiroshi-
ma e Nagasaki, há 70 anos. Estudos Avançados, São Paulo, 2015, p. 209-218.

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Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
d=S0103-40142015000200209>.

5.3. Carcinogênese Biológica


Diversos microrganismos possuem associação com a carcinogênese. Entre os micror-
ganismos, diversos vírus, sejam eles de RNA ou DNA, são agentes carcinogênicos bastante
conhecidos. Os vírus são capazes de provocar modificações no material genético das células,
causando mutações e alterações nos proto-oncogenes.

• Vírus da Leucemia de Células Humanas Tipo 1 (HTLV-1): É um vírus que, de forma


muito semelhante ao vírus da imunodeficiência humana (HIV), apresenta predileção por
células T CD4+ e é transmitido por meio de contato sexual, amamentação ou contato
com sangue.

• Papiloma Vírus Humano (HPV): É o vírus que está envolvido na transformação


maligna e formação do câncer de colo de útero e região anogenital. O vírus também
é transmitido por meio do contato sexual. Entre os mais de 70 tipos de HPV, alguns
subtipos são associados à transformação maligna, os mais conhecidos são o 16 e o 18.
Os tipos relacionados ao câncer apresentam interação do DNA do vírus com o DNA da
célula hospedeira. As células que apresentaram essa interação tornam-se mais instáveis e
suscetíveis a mutações e alterações.

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Além disso, proteínas do vírus degradam proteínas p53 e BAX, a primeira já citada
como a guardiã do genoma e está envolvida em diversos controles do ciclo celular, e a
segunda, uma proteína pró-apoptótica. A simples infecção pelo vírus não é certeza do
desenvolvimento do câncer, a interação com outros fatores, como fatores ambientais,
que incluem tabagismo, infecções microbianas, alterações hormonais e outras alterações
genéticas influenciam na progressão para a malignidade.

• Vírus de Epstein-Barr: Membro da família herpes, é ligado a diversos tipos de câncer,


especialmente alguns linfomas. O seu mecanismo de carcinogênese está relacionado com
a transformação do DNA da célula ocasionada pelo vírus, o que tornam a célula instável e
sujeita a um maior número de mutações.

• Vírus das Hepatites B e C: Associados a quase 80% dos carcinomas hepatocelulares.


Nesse caso, o processo de carcinogênese é desencadeado pelo processo inflamatório
crônico ocasionado por esses vírus. O processo inflamatório, além de papel protetor,
possui também a capacidade de induzir a célula à carcinogênese, através da produção de
diversas substâncias genotóxicas, ou seja, tóxicas para os genes. No processo inflamatório
muitos hepatócitos morrem e induzem a proliferação de novos hepatócitos. Essas novas
células em proliferação, associadas ao bloqueio da apoptose, ocasionada pela liberação de
mediadores da própria resposta, favorecem o estresse celular e o acúmulo de mutações.
Além disso, os vírus podem, de forma direta, provocar rearranjos dos cromossomos,
causando mutações.

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A bactérias Helicobacter pylori, causadora de gastrites e úlceras pépticas, é a que vem
sendo, atualmente, classificada como carcinogênica. O seu mecanismo de carcinogênese é muito
parecido com aquele causado pelos vírus das hepatites, descrito anteriormente. O processo
inflamatório, desenvolvido pela infecção por H. pylori, induz a produção de agentes tóxicos para
o material genético. O processo, que se inicia na gastrite crônica e passa pelas fases de atrofia
gástrica, metaplasia, displasia até chegar ao câncer, pode levar muitos anos para acontecer e,
felizmente, só acontece em uma minoria dos pacientes (aproximadamente 3%).

6 - MARCADORES TUMORAIS
O diagnóstico do câncer é difícil, principalmente, porque a doença não dá muitos sinais, a
não ser quando já está em fases mais avançadas. Além dos exames de imagem e genéticos, alguns
exames de rotina podem e devem ser realizados, eles contribuem e muito para o diagnóstico
precoce e melhor prognóstico da doença. Entre os exames de rotina podemos citar, como o mais
famoso, o exame conhecido como preventivo ou exame de Papanicolaou, que nada mais é do
que um esfregaço de células da cérvice e endocérvice do colo uterino feminino, em que se busca,
através da visualização das células, possíveis alterações que possam indicar lesões malignas,
suspeitas ou, até mesmo, a infecção pelo HPV, processo já descrito anteriormente, e que tem forte
relação com o desenvolvimento do câncer de colo de útero.

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O uso de marcadores tumorais também é algo que pode ser feito de rotina. Diversas
substâncias apresentam sua secreção aumentada quando existe a presença de um determinado
tumor. A pesquisa dessas substâncias no sangue não é utilizada como diagnóstico definitivo, mas
sim como uma triagem, detecção precoce e avaliação da efetividade do tratamento. Diversos
marcadores podem ser utilizados, porém o que mais se destaca e que já é usado de forma rotineira
é o PSA (antígeno prostático específico), utilizado na triagem de adenocarcinomas de próstata.
A dosagem do PSA, associada ao exame de toque retal, garante uma eficácia de quase 90% na
detecção dos cânceres de próstata. Além disso, ele é utilizado para a determinação do estágio da
doença e na detecção de recorrência ou metástase.

Um resumo sobre o desenvolvimento de um câncer pode ser visto no vídeo: Como


o câncer se desenvolve.

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=_7weBsPCBj0>.


Acesso em 27 set. 2018.

7 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

PATOLOGIA | UNIDADE 4
Finalizamos o conteúdo da disciplina de Patologia abordando um assunto que tem cada
vez mais importância dentro da saúde, as neoplasias. As doenças e agravos não transmissíveis já
são as principais causas de adoecimento da população e, entre elas, destacam-se principalmente
as doenças cardiovasculares (abordadas na unidade anterior) e o câncer (assunto dessa unidade)
Conhecer os mecanismos pelos quais os tumores se desenvolvem, as principais causas, as
diferenças entre tumores benignos e malignos é fundamental para o entendimento dessa doença
que cada vez atinge mais pessoas e que, muitas vezes, é considerada como uma sentença de morte.
A disciplina de Patologia pode ser considerada uma ponte entre as disciplinas básicas
e as disciplinas profissionalizantes da área da saúde. Dessa forma, entender os mecanismos de
desenvolvimento das doenças é fundamental para o profissional da saúde.

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REFERÊNCIAS
BRASILEIRO FILHO. G. Bogliolo Patologia. 8a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014.

CARVALHO. W. A.; CARVALHO. R. D. S.; RIOS-SANTOS. F. Analgésicos inibidores específicos


da ciclooxigenase-2: avanços terapêuticos. Rev Bras Anestesiol. Vol. 54, nº 3, p. 448-464, 2004.

FERRARI. C. K. B. Apoptose: a importância da maquinaria de morte celular no controle e na


patogênse de doenças. Rev. Ciênc. Med. Vol. 9, nº 1, p. 21-31, 2000.

HENKIN. C. S.; COELHO. J. C.; PAGANELLA. M. C.; SIQUEIRA. R. M.; DIAS. F. S. Sepse: uma
visão atual. Scientia Medica. Vol. 19, nº 3, p. 135-145, 2009.

KUMAR, V. et al. Robbins & Cotran Patologia: bases patológicas das doenças. 8ª ed. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2010.

______. Robbins & Cotran Patologia: bases patológicas das doenças. 9ª ed. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2016.

REISNER. H. M. Patologia: uma abordagem por estudos de casos. Porto Alegre: Artmed, 2016.

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