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Manual de Curso de licenciatura

em

Direito

1º Ano

Disciplina: HISTÓRIA DE DIREITO MOÇAMBICANO


Código: ISCED11 – HISC001

TOTAL HORAS: 100/1o SEMSTRE

CRÉDITOS (SNATCA): 4

Número de Temas: 11

Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância (ISCED).


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Instituto Superior de Ciências e Educação a Distância  Coordenação do Programa das


licenciaturas e os autores que elaboraram o presente manual, agradecem a colaboração dos
seguintes indivíduos e instituições na elaboração deste manual:

Coordenação Direcção Académica do ISCED

Pelo Design Direcção de Qualidade e Avaliação do ISCED.

Financiamento e Logística IAPED – Instituto Africano para a Promoção da

Educação a Distância.

Pela Revisão final Dr. Zacarias Mendes Magibir

Elaborado Por:

MSc. Edmar Gerúsio Barreto Jorge – Mestre em Ciências Politicas e Relações Internacionais
pelo ISCTAC, Licenciado em Direito pela UEM, Licenciado em Historia pela UP.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Índice

Visão geral 1
Bem-vindo ao Módulo de Contabilidade Geral ................................................................ 1
Objectivos do Módulo....................................................................................................... 1
Quem deveria estudar este módulo ................................................................................. 1
Como está estruturado este módulo ................................................................................ 2
Ícones de actividade ......................................................................................................... 3
Habilidades de estudo ...................................................................................................... 3
Precisa de apoio? .............................................................................................................. 5
Tarefas (avaliação e auto-avaliação) ................................................................................ 5
Avaliação ........................................................................................................................... 6

Tema – I: Introdução – Conceito E Objecto Da Historia Do Direito 7


UNIDADE Temática 1.1.: conceito, objecto, importância, métodos de estudo e Fontes
da Historia do Direito. ....................................................................................................... 7
Introdução......................................................................................................................... 7
1.1.1. Conceito e conteúdo da Historia do Direito ............................. 7
1.1.2. Método de Investigação e Fontes da Historia do Direito ....... 10
1.1.3. Classificação das Fontes da Historia do Direito ...................... 11
Sumário ........................................................................................................................... 11
Exercícios de Auto-Avaliação .......................................................................................... 12
Exercícios ........................................................................................................................ 12

TEMA – II: História de Direito Primitivo 13


UNIDADE Temática 2.1. O Direito dos Povos Sem escrita . ............................................ 13
Introdução ............................................................................................................. 13
2.1.1.- O Problema da origem do Direito Primitivo ............................. 13
2.1.2. Características gerais dos direitos dos povos sem escrita ........ 14
2.1.3. Fontes de Direito ....................................................................... 16
Sumário ........................................................................................................................... 17
Exercícios de Auto-Avaliação .......................................................................................... 17
Exercícios ........................................................................................................................ 17

TEMA - III: História do Direito na Antiguidade Clássica 19


UNIDADE Temática 3.1. Historia do Dirwito na Grecia Antiga. ...................................... 19
Introdução ............................................................................................................. 19
3.1.6. Os grandes Legisladores Gregos ................................................ 38
Sumário ........................................................................................................................... 39
Exercícios de Auto-Avaliação .......................................................................................... 40
Exercícios ........................................................................................................................ 40
UNIDADE Temática 3.2: O Direito Romano .................................................................... 41
Introdução....................................................................................................................... 41
3.2.1. A Realeza................................................................................... 41
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

3.2.1.1. Rei ........................................................................................... 42


3.2.1.2. Senado .................................................................................... 43
3.2.1.3. Comicios Curiatos ................................................................... 44
3.2.2. República ................................................................................... 44
3.2.2. Magistraturas............................................................................. 45
3.2.3. Imperium ................................................................................... 46
3.2.3.1. Magistrados cum império....................................................... 47
3.2.3.1. Magistrados sine imperio ....................................................... 48
3.2.4. Principado .................................................................................. 52
3.2.4. Dominato ................................................................................... 57
Sumário ........................................................................................................................... 59
Exercícios de Auto-Avaliação .......................................................................................... 59
Exercícios ........................................................................................................................ 60
UNIDADE Temática 3.3.: As fontes do Direito Romano.................................................. 61
Introdução....................................................................................................................... 61
3.3.1. Fontes Do Direito Romano ........................................................ 62
3.3.2. Origens ....................................................................................... 63
3.3.2. Antigo Direito ............................................................................ 63
3.3.3. Período Clássico ......................................................................... 65
3.3.4. Período Do Baixo Império Ou Bizantino .................................... 69
Sumário ........................................................................................................................... 73
Exercícios de Auto-Avaliação .......................................................................................... 73
Exercícios ........................................................................................................................ 74
Exercícios Gerais do Tema .............................................................................................. 74

TEMA - IV: História do Direito na Idade Media 75


UNIDADE Temática 4.1. O Direito Canonico. .................................................................. 75
Introdução ............................................................................................................. 75
5.1.1. Jurisdição Eclesiástica: Competência na Época do apogeu
(Séculos X a XV).................................................................................... 76
5.1.2. Formação do Direito Canónico ............................................... 77
5.1.3. Desenvolvimento do Direito Canónico ................................... 79
5.1.4. Colecções de Cânones ............................................................ 82
4.1.5. O Decreto de Graciano .............................................................. 84
4.1.6. O Corpus Iuris Canonici.............................................................. 86
Sumário ........................................................................................................................... 88
Exercícios de Auto-Avaliação .......................................................................................... 88
Exercícios ........................................................................................................................ 89
UNIDADE Temática 4.2. Historia do Direito Hebraico. ................................................... 89
Introdução ............................................................................................................. 89
5.2.1. O Direito Hebraico Antigo: Características ............................. 90
Sumário ........................................................................................................................... 99
Exercícios de Auto-Avaliação ........................................................................................ 100
Exercícios ...................................................................................................................... 100
UNIDADE Temática 4.3. O Direito no Egipto e na Mesopotamia ................................. 102
Introdução ........................................................................................................... 102
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4.3.1. O Direito no Antigo Egipto....................................................... 102


4.3.2. O Direito na Mesopotâmia: Características Gerais ................. 105
Sumário ......................................................................................................................... 109
Exercícios de Auto-Avaliação ........................................................................................ 110
Exercícios ...................................................................................................................... 111
Exercícios da Tema:....................................................................................................... 111

TEMA - V: História do Direito na Idade Moderna 112


UNIDADE Temática 5.1. A idade Moderna sec (XV - XVIII) ........................................... 112
Introdução ........................................................................................................... 112
5.1.1. Marcos da Era Moderna .......................................................... 112
5.1.2. Condições, Objectivas e Subjectivas que Propiciaram a
Formulação dos Direitos Fundamentais e Estatais ........................... 116
5.1.3.A Ascensão e a Consolidação da Ordem Jurídica- Política
Burguesa do Século XVII ao Século XX............................................... 118
Sumário ......................................................................................................................... 123
Exercícios de Auto-Avaliação ........................................................................................ 123
Exercícios ...................................................................................................................... 124

TEMA - VI: História do Direito na Idade Contemporânea 125


UNIDADE Temática 6.1. Os Principais Sistemas Juridicos Contemporaneos. .............. 125
Introdução ........................................................................................................... 125
Sumário ......................................................................................................................... 129
Exercícios de Auto-Avaliação ........................................................................................ 130
Exercícios ...................................................................................................................... 130

TEMA - VII: O Direito anterior á Colonização Portuguesa em Moçambique 131


UNIDADE Temática 7.1. As Sociedades Primitivas e o Direito Cosuetidinario ............. 131
Introdução ........................................................................................................... 131
7.1.1. Características do Direito anterior a presença portuguesa .... 131
Sumário ......................................................................................................................... 133
Exercícios de Auto-Avaliação ........................................................................................ 133
Exercícios ...................................................................................................................... 134

TEMA - VIII: O Direito Durante a Colonização Portuguesa. 135


UNIDADE Temática 8.1. Caracteristicas Gerais do Direito e das Instituicoes Politicas no
Periodo Colonial. ........................................................................................................... 135
Introdução ........................................................................................................... 135
8.1.2. O Aparelho Politico e Administrativo ...................................... 136
8.1.3. Os Prazos ................................................................................. 139
8.1.4. As Fontes de Direito ................................................................ 140
8.1.4.1. Os Costumes locais ............................................................... 140
8.1.4.2. As Leis Gerais ........................................................................ 141
8.1.2. O Direito Colonial depois da conferência de Berlim ............... 141
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8.1.3. O regime de dominação e exploração colonial ....................... 143


8.1.4. A Organização dos Regulados.................................................. 145
8.1.5. O Direito Colonial Em Moçambique no período do Estado Novo
........................................................................................................... 147
8.1.6. O Acto Colonial e a Carta Orgânica de 1930 ........................... 148
8.1.8. Características das Leis para Ultramar .................................... 159
Sumário ......................................................................................................................... 161
Exercícios de Auto-Avaliação ........................................................................................ 162
Exercícios ...................................................................................................................... 163

TEMA - IX: O Direito após a Independência Nacional: a Construção do Paradigma Socialista


de Regulação Social. 164
UNIDADE Temática 9.1. Construcao de uma Justica Popular ....................................... 164
Introdução ........................................................................................................... 164
9.1.1. Contextualização ..................................................................... 164
9.1.2. Organização judiciária a Luz da constituição de 1975 ............. 170
9.2.2. Competência do Tribunais ....................................................... 171
9.2.2. Composição e co........................................................................................ 171
9.2.2.1.Tribunal Popular Supremo ............................................................. 171
9.1.2.2. Os Tribunais Populares Provinciais (TPP)...................................... 173
9.1.2.3. Os Tribunais Populares Distritais (TPD) ........................................ 175
9.1.2.4. Tribunais Populares de Localidade e Tribunais Populares de Bairro
.................................................................................................................... 176
Sumário ......................................................................................................................... 177
Exercícios de Auto-Avaliação ........................................................................................ 178
Exercícios ...................................................................................................................... 178

TEMA - X: A Hegemonia do Neoliberal e ascensão do Paradigma neoliberal do direito na II


Republica 180
UNIDADE Temática 10.1. A Economia Neoliberal e a Democracia em Mocambique e
sua Influencia no Direito ............................................................................................... 180
Introdução ........................................................................................................... 180
10.1.3. Organização Judiciaria a Luz da Constituição da Republica de
1990 ................................................................................................... 185
10.1.3.1. Composição e 10.1.3.1. competências dos tribunais ........................ 186
b) Tribunais Judiciais de Província (TJP) ................................................ 187
c) Tribunal Judicial de Distrito ............................................................... 188
10.1.4. A Organização judiciária a luz de constituição de 2004. ....... 188
10.1.4.1. Tribunais existentes a luz da constituição .................................. 188
10.1.4.2. Composição e Competências dos Tribunais judiciais ................. 190
b) Tribunais Superiores de Recurso ....................................................... 192
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Sumário ......................................................................................................................... 194


Exercícios de Auto-Avaliação ........................................................................................ 195
Exercícios ...................................................................................................................... 196

TEMA XI – Crise da Historicidade Jurídica, Novos Paradigmas e Teorias Criticas. 197


UNIDADE Temática 11.1. Questoes paradigmaticas para se repensar a Historia ........ 197
Introdução ........................................................................................................... 197
11.1.1. Questões paradigmáticas para se repensar a história .......... 197
11.1.2. Historiografia Jurídica Tradicional: Natureza é Função......... 200
11.1.3. Novos marcos na historicidade do direito............................. 203
Sumário ......................................................................................................................... 210
Exercícios de Auto-Avaliação ........................................................................................ 210
Exercícios ...................................................................................................................... 211
Exercícios Geral ............................................................................................................. 212
BIBLIOGRAFIA .................................................................................... 213
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Visão geral

Bem-vindo ao Módulo de Contabilidade Geral

Objectivos do Módulo
Ao terminar o estudo deste módulo de Contabilidade Geral
deverás ser capaz de: ter a capacidade de reflectir sobre a
causalidade e finalidade das normas jurídicas consoante o
aprimoramento da sociedade. Desenvolver uma visão pluralista do
Direito e, consequentemente, a capacidade de assumir uma
postura crítica frente ao Direito, para adequá-la à realidade sócio-
económica emergente. Aproximar, ainda, as questões Históricas
do Direito com a Antropologia Jurídica, aportando ao estudante
instrumentos básicos para a compreensão da realidade jurídica
contemporânea.

 Identificar a importância do estudo da Historia de direito

 . Descrever as instituições politicas e as fontes de Direito em


cada período histórico.
Objectivos
Específicos  Analisar a evolução do Direito Moçambicano: na era anterior a
colonização, durante a colonização e pós-independência.

Quem deveria estudar este módulo


Este Módulo foi concebido para estudantes do 1º ano do curso de licenciatura
em Direito, etc. Poderá ocorrer, contudo, que haja leitores que queiram se
actualizar e consolidar seus conhecimentos nessa disciplina, esses serão bem-
vindos, não sendo necessário para tal se inscrever. Mas poderá adquirir o
manual.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Como está estruturado este módulo


Este módulo de Contabilidade Geral, para estudantes do 1º ano do curso de
licenciatura em Contabilidade e Auditoria, à semelhança dos restantes do
ISCED, está estruturado como se segue:
Páginas introdutórias

 Um índice completo.
 Uma visão geral detalhada dos conteúdos do módulo, resumindo os
aspectos-chave que você precisa conhecer para melhor estudar.
Recomendamos vivamente que leia esta secção com atenção antes
de começar o seu estudo, como componente de habilidades de
estudos.
Conteúdo desta Disciplina / módulo

Este módulo está estruturado em Temas. Cada tema, por sua vez
comporta certo número de unidades temáticas visualizadas por um
sumário. Cada unidade temática se caracteriza por conter uma
introdução, objectivos, conteúdos. No final de cada unidade temática
ou do próprio tema, são incorporados antes exercícios de auto-
avaliação, só depois é que aparecem os de avaliação. Os exercícios de
avaliação têm as seguintes características: Puros exercícios teóricos,
Problemas não resolvidos e actividades práticas algumas incluído estudo
de casos.

Outros recursos
A equipa dos académicos a e pedagogos do ISCED pensando em si, num
cantinho, mesmo o recôndito deste nosso vasto Moçambique e cheio de
dúvidas e limitações no seu processo de aprendizagem, apresenta uma
lista de recursos didácticos adicionais ao seu módulo para você explorar.
Para tal o ISCED disponibiliza na biblioteca do seu centro de recursos
mais material de estudos relacionado com o seu curso como: Livros e/ou
módulos, CD, CD-ROOM, DVD. Para além deste material físico ou
electrónico disponível na biblioteca, pode ter acesso a Plataforma digital
para alargar mais ainda as possibilidades dos seus estudos.
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Auto-avaliação e Tarefas de avaliação


Tarefas de auto-avaliação para este módulo encontram-se no final de
cada unidade temática e de cada tema. As tarefas dos exercícios de
auto-avaliação apresentam duas características: primeiro apresentam
exercícios resolvidos com detalhes. Segundo, exercícios que mostram
apenas respostas.
Tarefas de avaliação devem ser semelhantes às de auto-avaliação mas
sem mostrar os passos e devem obedecer o grau crescente de
dificuldades do processo de aprendizagem, umas a seguir a outras. Parte
das tarefas de avaliação será objecto dos trabalhos de campo a serem
entregues aos tutores/docentes para efeitos de correcção e
subsequentemente nota. Também constará do exame do fim do
módulo. Pelo que, caro estudante, fazer todos os exercícios de avaliação
é uma grande vantagem.

Comentários e sugestões
Use este espaço para dar sugestões valiosas, sobre determinados
aspectos, quer de natureza científica, quer de natureza dia dáctico-
Pedagógica, etc deveriam ser ou estar apresentadas. Pode ser que
graças as suas observações, o próximo módulo venha a ser melhorado.

Ícones de actividade
Ao longo deste manual irá encontrar uma série de ícones nas margens das
folhas. Estes ícones servem para identificar diferentes partes do processo de
aprendizagem. Podem indicar uma parcela específica de texto, uma nova
actividade ou tarefa, uma mudança de actividade, etc.

Habilidades de estudo
O principal objectivo deste capítulo é o de ensinar aprender a aprender.
Aprender aprende-se.

Durante a formação e desenvolvimento de competências, para facilitar a


aprendizagem e alcançar melhores resultados, implicará empenho,
dedicação e disciplina no estudo. Isto é, os bons resultados apenas se
conseguem com estratégias eficientes e eficazes. Por isso é importante
saber como, onde e quando estudar. Apresentamos algumas sugestões
com as quais esperamos que caro estudante possa rentabilizar o tempo
dedicado aos estudos, procedendo como se segue:

1º Praticar a leitura. Aprender a Distância exige alto domínio de leitura.


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2º Fazer leitura diagonal aos conteúdos (leitura corrida).

3º Voltar a fazer leitura, desta vez para a compreensão e assimilação


crítica dos conteúdos (ESTUDAR).

4º Fazer seminário (debate em grupos), para comprovar se a sua


aprendizagem confere ou não com a dos colegas e com o padrão.

5º Fazer TC (Trabalho de Campo), algumas actividades práticas ou as de


estudo de caso se existirem.

IMPORTANTE: Em observância ao triângulo modo-espaço-tempo,


respectivamente como, onde e quando...estudar, como foi referido no
início deste item, antes de organizar os seus momentos de estudo reflicta
sobre o ambiente de estudo que seria ideal para si: Estudo melhor em
casa/biblioteca/café/outro lugar? Estudo melhor à noite/de manhã/de
tarde/fins de semana/ao longo da semana? Estudo melhor com
música/num sítio sossegado/num sítio barulhento!? Preciso de intervalo
em cada 30 minutos, em cada hora, etc.

É impossível estudar numa noite tudo o que devia ter sido estudado
durante um determinado período de tempo; Deve estudar cada ponto da
matéria em profundidade e passar só ao seguinte quando achar que já
domina bem o anterior.

Privilegia-se saber bem (com profundidade) o pouco que puder ler e


estudar, que saber tudo superficialmente! Mas a melhor opção é juntar o
útil ao agradável: Saber com profundidade todos conteúdos de cada
tema, no módulo.

Dica importante: não recomendamos estudar seguidamente por tempo


superior a uma hora. Estudar por tempo de uma hora intercalado por 10
(dez) a 15 (quinze) minutos de descanso (chama-se descanso à mudança
de actividades). Ou seja que durante o intervalo não se continuar a tratar
dos mesmos assuntos das actividades obrigatórias.

Uma longa exposição aos estudos ou ao trabalho intelectual obrigatório,


pode conduzir ao efeito contrário: baixar o rendimento da aprendizagem.
Por que o estudante acumula um elevado volume de trabalho, em
termos de estudos, em pouco tempo, criando interferência entre os
conhecimento, perde sequência lógica, por fim ao perceber que estuda
tanto mas não aprende, cai em insegurança, depressão e desespero, por
se achar injustamente incapaz!

Não estude na última da hora; quando se trate de fazer alguma avaliação.


Aprenda a ser estudante de facto (aquele que estuda sistematicamente),
não estudar apenas para responder a questões de alguma avaliação, mas
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sim estude para a vida, sobre tudo, estude pensando na sua utilidade
como futuro profissional, na área em que está a se formar.

Organize na sua agenda um horário onde define a que horas e que


matérias deve estudar durante a semana; Face ao tempo livre que resta,
deve decidir como o utilizar produtivamente, decidindo quanto tempo
será dedicado ao estudo e a outras actividades.

É importante identificar as ideias principais de um texto, pois será uma


necessidade para o estudo das diversas matérias que compõem o curso: A
colocação de notas nas margens pode ajudar a estruturar a matéria de modo
que seja mais fácil identificar as partes que está a estudar e Pode escrever
conclusões, exemplos, vantagens, definições, datas, nomes, pode também
utilizar a margem para colocar comentários seus relacionados com o que está a
ler; a melhor altura para sublinhar é imediatamente a seguir à compreensão do
texto e não depois de uma primeira leitura; Utilizar o dicionário sempre que
surja um conceito cujo significado não conhece ou não lhe é familiar;

Precisa de apoio?
Caro estudante, temos a certeza que por uma ou por outra razão, o material de
estudos impresso, lhe pode suscitar algumas dúvidas como falta de clareza,
alguns erros de concordância, prováveis erros ortográficos, falta de clareza, fraca
visibilidade, página trocada ou invertidas, etc). Nestes casos, contacte os serviços
de atendimento e apoio ao estudante do seu Centro de Recursos (CR), via
telefone, sms, E-mail, se tiver tempo, escreva mesmo uma carta participando a
preocupação.
Uma das atribuições dos Gestores dos CR e seus assistentes (Pedagógico e
Administrativo), é a de monitorar e garantir a sua aprendizagem com qualidade e
sucesso. Dai a relevância da comunicação no Ensino a Distância (EAD), onde o
recurso as TIC se torna incontornável: entre estudantes, estudante – Tutor,
estudante – CR, etc.
As sessões presenciais são um momento em que você caro estudante, tem a
oportunidade de interagir fisicamente com staff do seu CR, com tutores ou com
parte da equipa central do ISCED indigitada para acompanhar as sua sessões
presenciais. Neste período pode apresentar dúvidas, tratar assuntos de natureza
pedagógica e/ou administrativa.
O estudo em grupo, que está estimado para ocupar cerca de 30% do tempo de
estudos a distância, é muita importância, na medida em que permite lhe situar,
em termos do grau de aprendizagem com relação aos outros colegas. Desta
maneira ficará a saber se precisa de apoio ou precisa de apoiar aos colegas.
Desenvolver hábito de debater assuntos relacionados com os conteúdos
programáticos, constantes nos diferentes temas e unidade temática, no
módulo.

Tarefas (avaliação e auto-avaliação)


O estudante deve realizar todas as tarefas (exercícios, actividades e
autoavaliação), contudo nem todas deverão ser entregues, mas é importante
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

que sejam realizadas. As tarefas devem ser entregues duas semanas antes das
sessões presenciais seguintes.
Para cada tarefa serão estabelecidos prazos de entrega, e o não cumprimento
dos prazos de entrega, implica a não classificação do estudante. Tenha sempre
presente que a nota dos trabalhos de campo conta e é decisiva para ser admitido
ao exame final da disciplina/módulo.
Os trabalhos devem ser entregues ao Centro de Recursos (CR) e os mesmos
devem ser dirigidos ao tutor/docente.
Podem ser utilizadas diferentes fontes e materiais de pesquisa, contudo os
mesmos devem ser devidamente referenciados, respeitando os direitos do
autor.
1
O plágio é uma violação do direito intelectual do(s) autor(es). Uma transcrição à
letra de mais de 8 (oito) palavras do testo de um autor, sem o citar é considerada
plágio. A honestidade, humildade científica e o respeito pelos direitos autorias
devem caracterizar a realização dos trabalhos e seu autor (estudante do ISCED).

Avaliação
Muitos perguntam: Com é possível avaliar estudantes à distância, estando eles
fisicamente separados e muito distantes do docente/tutor? Nós dissemos: Sim é
muito possível, talvez seja uma avaliação mais fiável e consciente.
Você será avaliado durante os estudos à distância que contam com um mínimo
de 90% do total de tempo que precisa de estudar os conteúdos do seu módulo.
Quando o tempo de contacto presencial conta com um máximo de 10%) do total
de tempo do módulo. A avaliação do estudante consta detalhada do
regulamentado de avaliação.
Os trabalhos de campo por si realizados, durante estudos e aprendizagem no
campo, pesam 25% e servem para a nota de frequência para ir aos exames.
Os exames são realizados no final da cadeira disciplina ou modulo e decorrem
durante as sessões presenciais. Os exames pesam no mínimo 75%, o que
adicionado aos 25% da média de frequência, determinam a nota final com a qual
o estudante conclui a cadeira.
A nota de 10 (dez) valores é a nota mínima de conclusão da cadeira.
Nesta cadeira o estudante deverá realizar pelo menos 2 (dois) trabalhos e 1 (um)
(exame).
Algumas actividades práticas, relatórios e reflexões serão utilizados como
ferramentas de avaliação formativa.
Durante a realização das avaliações, os estudantes devem ter em consideração a
apresentação, a coerência textual, o grau de cientificidade, a forma de conclusão
dos assuntos, as recomendações, a identificação das referências bibliográficas
utilizadas, o respeito pelos direitos do autor, entre outros.
Os objectivos e critérios de avaliação constam do Regulamento de Avaliação.

1
Plágio - copiar ou assinar parcial ou totalmente uma obra literária, propriedade
intelectual de outras pessoas, sem prévia autorização.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Tema – I: Introdução – Conceito E Objecto Da Historia Do


Direito
Unidade 1: Conceito, objecto, importância, métodos e Fontes da Historia do Direito

UNIDADE Temática 1.1: conceito, objecto,


importância, métodos de estudo e Fontes da Historia
do Direito.

Introdução
Nesta Unidade pretende-se discutir, notas introdutórias da Historia do
Direito Moçambicano, para tal começamos por discutir o conceito
objecto e características da Historia do Direito, abordamos ainda a
importância e por fim as fontes da Historia do Direito.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conceptualizar a Historia do direito

 Identificar o objecto de estudo da Historia de Direito;


Objectivos
 Explicar a importância do estudo da Historia do direito
Moçambicano

 Identificar as fontes do Direito Moçambicano.

1.1.1. Conceito e conteúdo da Historia do Direito

Segundo FERNANDES e REGO (1941) Historia de Direito “é a descrição


e explicação de como se formou e transformou no passado o sistema
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jurídico de um grupo social”. Neste caso o que nos interessa é a


descrição e explicação de como se formou e transformou o sistema
jurídico Moçambicano, mas para entender-se torna-se necessário
estudar vários outros contextos de formação do direito no Mundo.
Para se conseguir reconstituir nos seus trâmites e causas a origem e
evolução de um dado sistema jurídico é porem, necessário:

a) O conhecimento das normas Jurídicas que em cada momento


constituíram esses sistemas.
Ora os modos por que se revelam as normas jurídicas tem o nome de
fontes de direito. Precisamos saber quais eram as leis, os costumes, as
praticas as jurisprudências da época cuja história queremos fazer, é o
estudo da Historia das fontes de Direito.

b) O conhecimento da disciplina que dessas normas brotava os


diversos grupos de relações sociais.
o Objecto da norma jurídica é regular ou disciplinar relações sociais.
Essas relações são classificadas, segundo as suas afinidades em grupo
e cada grupo de relações sociais se rege por certos princípios comuns.
A disciplina jurídica de um grupo de relações social afim, chama-se
instituição jurídica.

Há assim, por exemplo instituições de direito publico e de direito


privado, instituições de direito civil e de direito comercial, instituições
de direito das obrigações, de direitos reais, de direitos de família, de
direito sucessório, etc. o historiador deve aproveitar as fontes de
direitos de uma dada época passada para construir o sistema das
instituições dessa época. É o estudo da história das instituições
jurídicas.

c) O conhecimento da forma como, na época, se aplicava o


direito.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Não basta conhecer as normas impostas pelo poder, não basta


conhecer as fontes de direito: é preciso saber como é que na prática
se observa os imperativos legais. Uma coisa é o que a lei impõe, outra
efectivamente se pode aplicar, por via de regra o legislador exprime na
lei ideias em avanço sobre o estado social do povo. Os dirigentes
querem conduzir a nação para mais perfeitas formas de vida, mas a
massa continua apegada a usos tradicionais. Outras vezes a lei ignora
fora dos centros em que o poder reside, ou a prepotência dos agentes
do próprio poder a atropela e esquece. O historiador do direito não
deve, pois, contentar-se com o conhecimento do direito legislado
(como devia ser a vida jurídica, segundo as autoridades legislativas):
tem de conhecer o direito aplicado (como efectivamente era a vida
jurídica na pratica popular).

d) O conhecimento da ciência do direito, das ideias do século e


do sentimento jurídico popular.
Nas outras épocas cultivou-se a ciência do direito, isto é : houve quem
procurasse achar os fios dos conceitos que informavam o sistema
jurídico, formulando os princípios gerais a que se subordinavam as
normas concretas.

As normas que têm de ser observadas sob ameaça de coações são


dogmas para o cientista (que não pode nega-las nem altera-las). A
introdução de princípios por generalizações sucessivas construídas
sobre dados conteúdos das normas, forma a construção dogmática do
direito. Mas os juristas não se limitam a investigar as normas os
elementos comuns susceptíveis de conduzirem a regras gerais de uma
instituição ou do sistema: formulam aspirações, tendências, ideias de
compreensão e de evolução do direito, são filósofos, em fim, existe
difuso em todas as consciências bem formadas um indefinido, mas
firme sentimento de justiça.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

O historiador do direito deve procurar saber se na época que estuda,


existiu uma construção dogmática do direito, quais os ideais ou
tendências dos jurisconsultos e qual o sentimento de justiça do povo.
O conteúdo da história de Direito é por conseguinte:
 A Historia das fontes de Direito;
 A história das instituições;
 A história da prática do direito;
 A história da ciência e das doutrinas jurídicas.

1.1.2. Método de Investigação e Fontes da Historia do Direito

Para fazer a história é preciso reviver pela imaginação (isto é por meio
de imagens) factos passados que, em geral o historiador não viu nem
tem forma de sujeitar á sua observação directa. Mas a história só terá
um carácter científico desde que haja a probabilidade de que a
reconstituição do passado seja exacta, isto é, corresponde ao que
realmente os factos foram.

Para isto é indispensável que o historiador trabalhe segundo certas


regras técnicas que constituem um método investigativo. Mas o que
são fontes da Historia do Direito? Fonte de história de direito é tudo
quanto traga ao conhecimento actual qualquer facto passado que
interesse para a reconstituição do sistema jurídico.

Apesar da semelhança das expressões, não há que confundir fontes


de direito com fonte da história do direito. Há fontes de direitos que
não fontes da história de direitos (todas a leis e costumes que
vigoraram e que hoje desconhecemos de todo ou de que só temos
vaga noticias) e inversamente há muitas fontes da história jurídica que
não são fontes de direito (todas as inscrições, escritos e tradições que
nos dão noticia dos factos jurídicos passados e que todavia não são a
própria forma tangível da norma revelada para ser observada).
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

1.1.3. Classificação das Fontes da Historia do Direito


As Fontes da história classificam-se segundo FERNANDES e REGO
(1941) em Jurídicas e não Jurídicas, e por sua vez as jurídicas
classificam-se em principais e secundárias.
a) As fontes jurídicas – são as que resultam directamente da vida
e cultura do Direito, e podem ser:
- Principais: são as fontes de Direito (código, leis avulsas,
costumes escritos, estatutos) que chegaram aos nossos dias.
- Secundarias: são os documentos ou monumentos que
tiveram origem na prática corrente ou na cultura do Direito
(Diplomas régios, cartas probatórias de actos jurídicos –
contratos, testamento, sentenças dos tribunais, formulários
tratados de doutrinas, etc.).
b) Fontes não jurídicas – são as que, representando o fruto de uma
actividade social não especificamente jurídica, trazem ao nosso
conhecimento normas ou praticas de direito. Tais são as obras
literárias, históricas, filosóficas, artísticas, os usos, as lendas, os
provérbios, etc.

Sumário
Nesta Unidade temática estudamos e discutimos notas introdutórias
da Historia do Direito Moçambicano, onde começamos por discutir o
conceito objecto e características da Historia do Direito, abordamos
ainda a importância e por fim as fontes da Historia do Direito, onde
abordamos a classificação das fontes: em jurídicas e não jurídicas,
principais e secundárias.
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Exercícios de Auto-Avaliação
1. Diga os elementos fundamentais para o estudo e
conhecimento da Historia de Direito?
Resposta: O conhecimento das normas Jurídicas que em cada
momento constituíram esses sistemas; O conhecimento da
disciplina que dessas normas brotava os diversos grupos de
relações sociais; O conhecimento da forma como, na época, se
aplicava o direito; O conhecimento da ciência do direito, das ideias
do século e do sentimento jurídico popular.

Exercícios
1. Defina Historia do Direito.
2. Classifique as fontes da Historia do Direito.
3. Explique a importância do estudo da Historia do Direito
Moçambicano.
4. Diga os elementos fundamentais para o estudo e
conhecimento da Historia de Direito.
5. Na sua óptica julga importante estudar a história de Direito?
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TEMA – II: História de Direito Primitivo


UNIDADE Temática 2.1. O Direito dos Povos sem Escrita
.

UNIDADE Temática 2.1. O Direito dos Povos Sem escrita

Introdução
Não se pode estudar a historia do direito se não a partir da época em
relação á qual remotam os mais documentos escritos conservados,
esta época é diferente para cada povo. Nesta unidade, iremos
apresentar características geras dos povos primitivos (chamados povos
sem escrita). É preciso distinguir a pré-historia do Direito e historia do
Direito, distinção que repousa no conhecimento ou não da escrita. .

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Caracterizar o direito dos povos sem escrita;

 Descrever a importância do costume como fonte de Direito


Objectivos na sociedade primitiva;

 Diferenciar a pré-historia e historia do Direito.

2.1.1.- O Problema da origem do Direito Primitivo


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Antes do período, cada povo já tinha, no entanto, percorrido uma


evolução jurídica. Esta “pré-historia do Direito” escapa quase
inteiramente, ao nosso conhecimento; pois se os vestígios deixados
pelos povos permitem ao especialista reconstituir, é certo que a
maneira muito aproximativa, a evolução militar, social, económica e
artística dos grupos sociais. Antes da sua entrada na história, estes
mesmos vestígios não podem de forma alguma fornecer indicações
úteis para o estudo das suas instituições. No momento em que os
povos entram na história a maior parte das instituições civis já
existiam, nomeadamente o casamento, o poder parental,
propriedade, a sucessão, doação.

É preciso distinguir a pré-historia da historia do Direito distinção que


repousa no conhecimento ou não da escrita. O aparecimento da
escrita e consequentemente dos primeiros textos jurídicos situa-se em
épocas diferentes para diversas civilizações. As origens do direito
situam-se na época pré-histórica, o que quer dizer que delas não se
sabe quase nada.

2.1.2. Características gerais dos direitos dos povos sem escrita

a) São, por definição, direitos não escritos, pois trata-se do direito dos
povos sem escrita. Os esforços de formulação de regras jurídicas
abstractas são, neste caso, necessariamente muito limitados.

b) Estes direitos são numerosos: cada comunidade tem seu próprio


direito costume pois ela vive isolada, quase sem contacto com outras
comunidades; e raros contactos com os vizinhos têm por origem a
vingança e levam a guerras interclanicas ou intertribais. Cada
comunidade vive dos seus próprios recursos do que produzem os seus
próprios membros. O sistema de economia fechada, autárquica, quer
dizer, sem trocas com outros grupos. A extensão das comunidades que
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tinham o seu direito próprio é muito variável por vezes um clã, mais
frequentemente uma etnia.

c) Os Direitos dos povos sem escritas são relativamente diversificados.


Há diferenças muitas vezes importantes, por mínimas de um costume
para o outro.

d) Nas sociedades Primitivas, o direito esta ainda impregnado de


religião. A distinção entre regra jurídica e regra religiosa é muito difícil,
porque o homem vive no temor constantes ao pode sobrenatural.
Estes tipos de sociedade são caracterizados pelo que se chama na sua
indiferenciação, ou seja as diversas funções sociais que nós
distinguimos nas sociedades evoluídas – religião, moral e direito, estão
ai confundidas.

e) o Direito dos povos primitivos são direitos em nascimento:


distingue-se ainda mal o que é jurídico do que não é jurídico.
Numerosos juristas constataram mesmo que os povos sem escrita
possam ter um sistema jurídico porque eles não encontraram ai
instituições definidas tais como são nos sistemas romanistas ou
common law. Mas os trabalhos sociológicos e etnológicos admitem
que os costumes destes povos tinham um carácter jurídico porque
existem ai, meios de constrangimento para assegurar o respeito das
regras de comportamento. Admite-se assim que não existe uma noção
universal e eterna de justiça, podendo esta noção variar com o tempo
e espaço. Na comunidade primitiva o direito é justo tudo aquilo que
interessa para a manutenção da coesão social do grupo, e não o que
tende para o respeito do direito individual.

Os etnólogos jurista distinguem no entanto uma fase de pré-direito


antes da fase do nascimento do direito. O direito não apareceria se
não com a organização de um poder politico diferenciado do das
hierarquias ligadas ao parentesco e capaz de assegurar a regulação
social por aparelho jurídico de normalização, de prevenção e de e
repressão. Na fase do pré-direito, esta regulação não resulta senão da
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

tendência dos grupos sociais e conformarem-se com a tradição, a


adquirirem as maneiras de viver do grupo pelo medo de reprovação
social, da censura do grupo, e sobretudo das forcas sobrenaturais. A
passagem do pré-direito ao direito corresponde geralmente á
passagem do comportamento inconsciente puramente reflexo ao
comportamento consciente, reflectindo, senão inteligente.

2.1.3. Fontes de Direito


Fontes de direitos – são as diversas formas de revelação do direito.
São fontes de direito primitivo: O costume, o precedente judiciário,
provérbios e adágios.

Em todos os direitos dos povos sem escritas, a fonte do direito é quase


exclusivamente o costume, ou seja a maneira tradicional de viver na
comunidade, a conduta habitual e normal dos membros do grupo. É
por isso que se chama de direito consuetudinário.2 A obediência ao
costume é aqui assegurada pelo temo dos poderes sobrenaturais, por
isso aqui o direito e religião.

O costume não é, no entanto, a única fonte de direito dos povos


primitivos. Nos grupos sociais mais evoluídos, acontece que aqueles
que detêm o poder impõem regras de comportamentos, dando ordens
de carácter geral e permanente. Trata-se então de verdadeiras leis, no
sentido jurídico e moderno do termo; mas são leis não escritas, pois
elas são enunciadas em grupos sociais que não conhecem a escrita.
Estas leis, enunciadas pelo chefe ou por grupos de chefes (anciãos) do
clã ou da etnia.

O precedente judiciário – pode ser também considerado uma fonte de


Direito nos povos primitivos, os que julgam sejam eles chefe ou
anciãos, tendências voluntarias ou involuntárias, para aplicar aos
litígios, soluções dadas precedentemente a conflitos do mesmo tipo.

2
GILISSEN, John. Introdução Histórica do direito (2011)
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Por fim os provérbios e adágios são um modo frequente de


expressão do costume, ainda que sejam dificilmente acessíveis aos
profanos. Não é todavia possível ignora-los nos sistemas orais em
que a memoria colectiva, sub esta forma ou outra (poemas, lendas,
etc) desempenha um papel primordial

Sumário
Nesta unidade estudamos a história dos povos sem escrita,
onde se fez perceber como o direito se manifestou nos
primórdios da sociedade. Destacamos as fontes de Direitos
nesta altura onde os provérbios, adágios e o costume
desempenharam uma grande função, e tradição oral era o
garante do desenvolvimento nessa altura.

Exercícios de Auto-Avaliação
1. Explique a importância do costume como fonte de Direito nos
povos sem escrita?
Resposta: O Direito dos povos sem escrita, caracteriza-se
essencialmente por ser um direito claramente sem escrita, nesta
vertente a tradição oral, o costume vai desempenhar um papel
muito importante na regulação da conduta social enquanto grupo
social.

Exercícios
1. Nas sociedades primitivas o direito este ainda fortemente
impregnado de religião. Comente.
2. Quais são as fontes do Direito das comunidades primitivas?
3. Etnólogos te sociólogos do Direito têm dividido a historia do
Direito em duas etapas: a pré-historia do direito e a Historia de
direito. Diferencie estas duas etapas.
4. Qual era a diferença entre a “lei” e o costume no direito primitivo.
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5. Qual o maior problema na elaboração da história do direito


primitivo.
6. O direito dos povos sem escritas (primitivo) é relativamente
diversificado. Por que razão?
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TEMA - III: História do Direito na Antiguidade Clássica


UNIDADE 3.1. História do direito na Grécia antiga

UNIDADE 3.2. O Direito Romano

UNIDADE 3.3. O as Fontes do Direito Romano

UNIDADE Temática 3.1. Historia do Direito na Grecia Antiga.

Introdução
Nesta Unidade pretende-se que o estudante conheça a importância do
direito na antiguidade Clássica, sobretudo o direito grego, conhecer as
obras dos principais filósofos gregos, perecendo o âmago da lei nas
duas principais cidades estados (Atenas e Esparta), para depois fazer
uma relação sobre a influenciar o direito na actualidade.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Descrever o problema da exiguidade das fontes de direito na


Grécia.
Objectivos
 Caracterizar o Direito ateniense, tendo como base o ideal
democrático.

 Descrever o Direito espartano tendo como base o militarismo e


a constituição de Licurgo.

 Caracterizar de formal geral o direito na Grécia antiga

 Explicar as contribuições do direito grego para o direito


moderno.

3.1. 1. O problema da exiguidade das fontes


ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

O Direito nas cidades-estado da Grécia Antiga ainda foi muito pouco


estudado no Brasil, apesar de sua inquestionável importância. Vale ressaltar
que, persistem muitas lacunas sobre o tema em questão, o que gerou entre
os desavisados a crença de que a actividade legislativa na Grécia Antiga
tenha sido incipiente e, na percepção de alguns, até mesmo inexistente.

A principal razão a corroborar para o alastramento desta equivocada opinião


consiste na exiguidade de fontes. Sabe-se que nem sempre tem sido possível
contar com um conjunto de leis cuidadosamente registadas, como no caso
do Código de Hamurrabi, cuja estela está exposta no Louvre, ou em rolos de
pergaminhos devidamente sistematizados, como ocorre com a Torah de
Moisés.

“As fontes para o conhecimento do Direito Helénico, de outra sorte, quase


sempre se apresentam de maneira fragmentária, desconexa e não-
sistematizada. Como bem destacou Gilissen, na actualidade, melhor se
conhece o Direito Privado de Atenas”3.

Deste modo, achados arqueológicos como aquele efectivado por Frederik


Hallbherr, que encontrou na cidade-estado de Gortina, na ilha de Creta, um
verdadeiro "código de leis", são extremamente raros.

Assim, não havendo muitas vezes as fontes directas, recorrer-se-á aos


escritos filosóficos para se tentar reconstruir esse imenso quebra-cabeças
que é o direito grego antigo.

Em função disso, torna-se praticamente impossível descartar obras da


importância de A Política, de Aristóteles. O referido pensador, homem
curioso por excelência, cuidou de esboçar um quadro significativo permeado
por comentários sobre algumas das constituições vigentes nas principais
cidades-estado gregas.

3.1.2. A Percepção do Fenómeno Jurídico entre os Gregos

3
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São também exíguas as informações sobre o Direito Grego em


períodos distantes. Fustel de Coulanges, porém, realizou um feito
digno de nota ao estudar as percepções jurídicas de romanos e gregos
em tempos imemoriais.

A princípio, trata-se de um direito essencialmente consuetudinário,


ritualístico, fundado no culto aos antepassados e desenvolvido no seio
da própria família4. Na literatura, bem como nos escritos filosóficos, a
palavra grega que se aproxima à idéia de "direito" édikáion, que está
etimologicamente associada à diakaiosúne, que pode ser traduzida
como "justiça". Os gregos desenvolveram também a consciência da
existência de uma lei eterna, imutável, a reger o homem
indistintamente. Ora, trata-se de uma ideia embrionária do que
convencionamos chamar hoje de direito natural.

Igualmente, é creditado aos gregos o mérito de terem contribuído


para o florescimento de uma noção preliminar de constitucionalismo,
especialmente em Atenas, onde os cidadãos, por serem mais
politizados, acabavam possuindo uma experiência mais apurada da
condução da vida pública.

Deste modo, quando se trata de estudar o "direito grego", não se


pode jamais perder de vista o fato de que inúmeras cidades-estado
helênicas eram regidas por um ordenamento jurídico próprio, uma vez
que as mesmas gozavam de plena soberania.

O "universo grego", pois contava com unidades políticas


completamente independentes umas das outras. As cidades-estado,
nesta conjuntura, só se prestavam a estreitar suas relações em função
da formação de alguma aliança estratégica (anfictionia).

4
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Assim, nesta perspectiva, o direito costumeiro da belicosa Esparta é


muito diferente da sofisticação das leis escritas de Atenas, cidade-
estado de efervescência cultural ímpar5.

Entretanto, não é devido esperar dos gregos uma espécie de culto à lei
similar àquele que angariou espaço em Roma. Destarte, não se deve
requerer das gentes da Hélade uma apreciação sistemática, precisa e
dogmática do fenómeno jurídico.

O direito era tão-somente parte do regime de governo da cidade e, na


visão grega, tão-somente nisso residia sua utilidade. Isso não quer
dizer que os gregos vivessem alheios às questões legais como um
todo. José Reinaldo de Lima Lopez, por exemplo, chama a atenção
para:

"...o costume de aprender de cor (recitando em


forma poética) alguns textos jurídicos, assim como os
poemas de Homero. As leis de Sólon eram ensinadas
como poemas, de modo que o ateniense bem-
educado terminava por conhecer sua tradição
político-jurídica comum. A literatura "jurídica " era
fonte de instrução e prazer. Em geral no tempo da
filosofia socrática sabia-se ler. As técnicas
propriamente jurídicas eram próprias do logógrafo, o
redactor de discursos forenses: pedidos, defesas,
etc.. O direito, presumia-se, devia ser aprendido
vivenciando-o. As leis deveriam fazer parte da
educação do cidadão. As discussões sobre justiça na
cidade, entre os cidadãos e iguais. As
leis menores não importavam para discussão
pública"6.

3.1.3. O direito ateniense - O Ideal Democrático no Âmago da Lei

Atenas foi, por certo, uma das mais importantes cidades da


Antiguidade. Berço da erudição e do conhecimento, este centro
cosmopolita alcançou notável desenvolvimento na Grécia Antiga.

5
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6
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Por suas ruas transitavam, diariamente, vários filósofos atraídos pela


extremada valorização concedida ao saber. Não por acaso, aqui
despontam, pela primeira vez na história da humanidade, os nítidos
contornos dos ideais democráticos.

Ademais, o profícuo comércio marítimo mantido com praticamente


todos os povos do Mediterrâneo permitiu a ascensão de um estado
pujante e potencialmente hegemónico. A natural inclinação do país à
cultura, às letras e artes fez brotar uma aristocracia bem articulada
politicamente, que se fazia imitada e ditava padrões de
comportamento para o mundo antigo. Em virtude disso, o Direito
Ateniense é, sem dúvida alguma, aquele mais bem servido de fontes
dentre todas as cidades que pontilharam a imensa Hélade.

O primeiro aspecto a chamar a atenção de qualquer interessado no


estudo das leis da Grécia Antiga diz respeito ao sofisticadíssimo
modelo de organização judiciária de Atenas, onde já havia tribunais
com competências jurisdicionais completamente distintas.

Assim, o Areópago, nas palavras de Jardé, era o mais antigo tribunal


de Atenas: de acordo com a lenda, foi instituído pela deusa Atena, por
ocasião do julgamento de Orestes. Suas atribuições primitivas, mal
definidas, mas muito amplas, transformaram-no numa corte de justiça
e num conselho político, que exercia intensa vigilância sobre toda a
cidade e suas leis. Tinha Carácter aristocrático, porque era formado
por antigos arcontes, que sempre eram escolhidos entre os cidadãos
das duas classes mais altas, e, porque as funções de seus membros, os
AREOPAGITAS (areopagítes) eram vitalícias.

Por essas mesmas razões é que foi particularmente visado pelas


reformas dos democratas: em 462, Efialtes conseguiu tirar do
Areópago todo o poder político, reduzindo as suas funções apenas às
judiciárias.
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Com o tempo, até essas atribuições judiciárias foram-se restringindo


com a criação e desenvolvimento de outros tribunais.

No século IV, o Areópoago só conservava o julgamento dos casos de


homicídios com premeditação, de incêndios e de envenenamento"7.

Interessante notar que este famoso tribunal ateniense continuou


desenvolvendo suas actividades, ainda que reduzidas, até o século I da
Era Cristã, mesmo quando a Grécia, já em franco declínio, tinha
inevitavelmente sucumbido ao poderio romano e as suas cidades
haviam perdido todo o seu antigo esplendor.

Tem-se notícia, inclusive, de que o apóstolo Paulo, em dado momento,


fora intimado a prestar esclarecimentos às autoridades locais sobre a
doutrina religiosa que pregava, a qual, segundo consta, estaria
causando certos tumultos entre os cidadãos.

A mais democrática corte de Atenas, porém, foi aquela conhecida


por Heliaia ou Tribunal dos Heliastas, um "júri popular composto de
até 6.000 cidadãos, escolhidos por sorte, entre os que tivessem mais
de trinta anos e se colocassem à disposição da cidade para exercer
importantes funções.

Além disso, de acordo com S. C. Todd, é possível falar da existência de


pelo menos mais duas cortes na cidade de Atenas, que teriam
funcionado até a metade do século IV a.C.. Trata-se de um tribunal
específico par apreciar causas em que pelo menos uma das partes era
estrangeira – o Xenicon Dikasterion – e também uma espécie de
tribunal marítimo – o Nautodikai.

É certo, pois, que a transposição dos costumes para um direito escrito


facilitou a consolidação das instituições democráticas de Atenas. Sob
este prisma, o legado da cidade ao direito público de ser mensurado.
Ora, o poder na sociedade ateniense, pelo menos até o final do século

7
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VIII a.C., como bem observou Claude Moussé8, era partilhado entre
uma aristocracia guerreira (que possuía o monopólio da terra) e os
sacerdotes (os quais, não obstante o eventual controle de todos os
assuntos relacionados à religião, também cuidavam de distribuir a
justiça e aplicar o direito).

Destarte, quando a oralidade é abandonada e as leis passam a ser


registradas em pedra, as comunidades ganham automática
estabilidade e, naturalmente, se afastam da prática de julgamentos
arbitrários e de decisões inconsistentes.

É o que se vê quando os atenienses aprimoram seu ordenamento


jurídico, definindo as condições para a validade das leis e o rechaço ao
direito ancestral de carácter consuetudinário:

"As autoridades não têm permissão para usar uma lei não escrita,
em caso algum. Nenhum decreto do Conselho ou da assembleia
deve prevalecer sobre uma lei. Não é permitido fazer uma lei para
um indivíduo se ela não se estender a todos os cidadãos atenienses
9
e se não for votada por seis mil pessoas, por voto secreto " .

As leis de Atenas, agora escritas, revelam a preocupação dos


governantes com a conservação da cidade e o bem-estar de seus
cidadãos. O elemento público, pois, se torna primordial, o tema
central de muitas dessas regras. É o que se pode notar a partir da
leitura da regra relativa à limpeza (cerca de 440-439 a. C.) que se
segue: "...não é permitido autorizar que peles apodreçam no rio Ilissos
acima do templo de Heracles; ninguém tem permissão para curtir
peles ou jogar lixo no rio.

Ou, ainda, neste outro exemplo, a regulamentação sobre a utilização


dos frutos da oliveira (azeitonas), legislação esta que assume,
inevitavelmente, um teor ambientalista (meados do século IV a. C.):

8
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9
idem
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"Quem quer que despoje uma oliveira em Atenas, não sendo por
algum propósito religioso do povo ateniense ou de seus demos, ou
para uso próprio até o limite de duas por ano, ou com vista a
atenderas necessidades de uma pessoa falecida, será devedor ao
tesouro de cem dracmas por cada oliveira, e um décimo dessa
quantia caberá à deusa. Também deverá pagar cem dracmas por
cada oliveira ao denunciante. E as acusações relativas a esta
matéria serão levadas aos arcontes, de acordo com a instância
pertinente. E o denunciante deverá pagar os emolumentos que lhe
correspondem. E quando uma pessoa for considerada culpada, os
magistrados aos quais foi levada a questão devem informar por
escrito aos colectores (práktores) o montante devido ao tesouro
público e o devido ao tesouro da deusa. Se não o fizerem, sobre
10
eles recairá o débito" .

Não seria de se estranhar o zelo dos atenienses para com a


manutenção de seus olivais. É sabido que estas árvores crescem até
mesmo em terras menos férteis. A azeitona, assim, é extremamente
valorizada por toda a Antiguidade.

O azeite extraído do fruto compõe a dieta obrigatória das civilizações


que se desenvolveram às margens do Mediterrâneo. Ao denunciante
do ato de degradação, conforme viu-se, caberia o recebimento da
quantia equivalente a cem dracmas por cada oliveira.

No vigor desse processo legislativo que tomou conta de Atenas


tornam-se célebres dois arcontes; cada qual representava a mais
completa antítese ao outro. Comecemos por Drácon (cerca de 620
a.C.), que foi o artífice de leis pautadas na construção de um ambiente
de tamanha severidade, que passou à História como um pérfido
legislador.

A vileza de intenções deste famoso personagem da política ateniense


e a impiedade habitual eram vícios que acompanhavam, de modo
absolutamente trágico, a feitura de leis encomendadas por seus pares.

10
Op.Cit.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Estas regras jurídicas rigorosas ao extremo, não encontraram apoio


popular na cidade mais erudita da Antiguidade Clássica.

Como bem ressaltou Pinheiro, a tónica da legislação de Drácon


consistia na aplicação da pena de morte para a grande maioria dos
delitos, o que lhe valeu a reputação de "sanguinário.

Vale lembrar que termo "lei draconiana" é corrente na actualidade


entre os operadores do direito, principalmente quando o objectivo é o
de se referir a uma regra cruel, desumana ou excessiva. Por estes
motivos, sabe-se que seria Sólon (638-558 a.C.) o homem designado a
promover uma grande reforma que se estenderia ao campo jurídico.

É bem conhecido o fato de que o intelecto de Sólon, aliado às suas


boas intenções, foi chamado a corrigir os desvarios de seu
predecessor. Como bem destacou Moussé, in verbis:

Sólon, eleito arconte em 594 a.C., tomaria a si a tarefa de enfrentar a


crise. Ele próprio pertencente à aristocracia, mas por temperamento
ou por necessidade, fora levado a viajar, o que o colocava um pouco à
margem da aristocracia tradicional. Consciente da ameaça
representada por uma agitação camponesa, que poderia desembocar
na tirania, e recusando-se tornar-se tirano, , ou seja, a suspensão dos
encargos, arrancando dos campos, os marcos que tornavam concreto
o estado de dependência de seus proprietários, ao mesmo tempo em
que anula as dívidas e revoga o direito do credor de mandar prender o
devedor, fazendo retornar à Ática todos aqueles que, como escravos,
haviam sido vendidos no exterior.

O fato é que, por estas populares iniciativas, Sólon faria, a partir daí,
seu nome ser sempre lembrado pelas gerações que se seguiriam,
tendo sua legislação sido festejada como sinônimo de justiça e
equidade em diversas póleis helêncicas, mesmo decorridos três
séculos desde o ano de seu falecimento. Enfim, como disseram V.
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Diakov e S. Kovalev: A Constituição de Atenas reflectia um regime


social novo que, para o seu tempo, era progressista.

Do mesmo modo, o Direito Penal Ateniense parecia ser bem menos


severo que aquele produzido entre os povos da Antiguidade Oriental.
Klabin acredita que as formas de punição mais usuais eram as multas,
o desterro, o confisco e a prisão.

Pode-se perceber uma nítida intenção de abrandamento das penas,


onde se evitava, até onde fosse julgada oportuna, uma sentença de
morte. Isto não quer dizer que nesta famosa cidade-estado as penas
eram totalmente destituídas de crueldade. Contudo, pesquisas como
aquelas de Margaretha Debrunner Hall informam sobre a prática de
uma espécie de crucificação – apotympanismos – em plena Atenas.

É bem verdade que não se tem todas as informações sobre o Direito


Ateniense. Por isso, os estudiosos caminham apenas até aonde as
fontes permitem chegar. Mesmo assim, algumas conclusões já podem
ser obtidas graças ao bom logro das escavações arqueológicas. Na
actualidade é possível dizer que, em Atenas, havia uma clara distinção
entre homicídio doloso e homicídio culposo.

Ainda pairam dúvidas quanto à pena aplicada ao primeiro caso.


Entretanto, no que concerne ao segundo, sabe-se que se previa o
abatimento. O perdão da parentela eximia o condenado de cumprir a
sentença, porém, a recusa de um só desses familiares era suficiente
para que fosse levada a cabo a dita punição. O adultério era
considerado crime em Atenas. A disposição abaixo remonta,
provavelmente, ao século V antes de Cristo: Veja-se a mesma na
íntegra:

"E àquele que pega em flagrante o adúltero, não lhe é lícito continuar
vivendo com sua mulher; se o fizer, será privado de seus direitos civis.
E à mulher que cometeu adultério não é dado assistir ao sacrifício
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público; se o fizer, poderá sofrer qualquer castigo, com excepção da


morte, e quem lhe aplicar o castigo não sofrerá qualquer punição"11.

Note-se que o legislador se esquiva de pronunciar qualquer pena para


o adúltero. A mulher, no entanto, estava impedida de participar de
cerimónias religiosas, bem como, poderia sofrer qualquer investida
nas ruas por seus algozes em razão de um comportamento execrado
pela sociedade. Igualmente, não era lícito ao marido traído continuar
vivendo com sua esposa. As relações extraconjugais, neste caso,
determinavam o automático dever do marido de requerer o divórcio.

A recusa em admitir sua necessidade gerava o ostracismo, sanção esta


que, numa cidade politizada e democrática como Atenas, gerava um
sério inconveniente social.

Havia também em Atenas uma interessante lei restringindo os direitos


civis a todos aqueles que se prostituíam:

"Se qualquer ateniense se prostituir, não terá permissão para se


tornar um dos nove arcontes, para exercer qualquer sacerdócio,
para actuar como advogado do povo ou exercer qualquer ofício,
em Atenas ou outro lugar, por sorteio ou votação; não terá
permissão para ser enviado como arauto, para fazer qualquer
proposta na assembleia dos cidadãos e em sacrifícios públicos,
para usar florão, quando todos usarem, para entrar em local de
reunião purificado para a assembleia. Qualquer pessoa que, tendo
sido condenada por prostituição, desobedecer a qualquer dessas
12
proibições, será condenada à morte” .

Neste caso, as interdições são previstas unicamente para os casos de


prostituição masculina, pois boa parte dos cargos enumerados
somente podia ser preenchida por homens. Assim, aquele que alguma
vez já havia se prostituído estava impedido de exercer diversas
funções públicas e religiosas. Aqui o castigo era severo: a não
observância dessas proibições acarretava a pena capital. Da mesma

11
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12
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forma, também algumas questões sobre o Direito Civil Ateniense já


podem ser descortinadas. Eis duas regras do direito sucessório:

Com excepção daqueles que foram adoptados quando Sólon assumiu


sua magistratura, e, que, portanto, ficaram inaptos para reclamar uma
herança ou renunciar a ela, qualquer homem terá direito de dispor de
sua propriedade por via testamento e de acordo com seu desejos, se
não tiver filhos legítimos do sexo masculino, a menos que sua mente
tenha sido incapacitada por loucura, velhice, drogas ou doença, ou a
menos que ele esteja sob a influência de uma mulher, ou sob coação,
ou tenha sido privado de sua liberdade.

Se alguém morre sem testar, e se tiver deixado filhas, vai para elas sua
propriedade; se não, farão jus à propriedade os que se seguem: irmãos
que sejam filhos do mesmo pai e filhos legítimos de irmãos terão a
parte correspondente a seu pai. Se não há quaisquer irmãos ou filhos
de irmãos, seus descendentes herdarão do mesmo jeito. Os (parentes)
de sexo masculino e seus descendentes masculinos terão a
precedência, quer sejam da mesma parentela, quer o parentesco seja
mais remoto. E se não há consanguíneos do lado do pai, até o grau de
filhos de primos, os parentes do lado materno herdarão igual modo. E
se não houver parente nesse grau mencionado, herdará o mais
próximo aparentado do lado paterno. Nenhum filho ilegítimo, de um
ou outro sexo, terá direitos sagrados ou seculares de parentesco, a
contar do arcontado de Euclides (403-2 a.C.).

Não é nenhum segredo o fato de que nas sociedades da Antiguidade,


especialmente naquelas mediterrâneas, eram mantidos, vias de regra,
os privilégios sucessórios para os herdeiros do sexo masculino. No
Direito Ateniense não parecem prevalecer aquelas prerrogativas
próprias da primogenitura, tão ao gosto dos orientais em geral,
entretanto, os varões, indubitavelmente, alcançam maiores vantagens
e o seu quinhão está garantido. Mas as filhas também podem herdar,
na ausência de irmãos legítimos.
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Note-se que em momento nenhum se menciona a condição da viúvas.


As disposições acima informam o quão corriqueiro era o recurso ao
testamento entre os gregos. A segunda lei, basicamente, sintetiza a
essência do Direito Sucessório ateniense.

3.1.3.2.O Direito Espartano - O Militarismo na Constituição de


Licurgo

Esparta desenvolveu-se às margens do rio Orontes, nas terras da


Lacônia. Sua história começa a ser contada a partir da invasão de um
povo de origem germânica, os dórios. Estes subjugam os aqueus e
seus vizinhos. Inicia-se aqui a saga de uma das mais belicosas e
militaristas que o mundo já conheceu.

O homem espartano, desde os sete anos de idade, ingressava no


período de treinamento das forças armadas. Na juventude já era um
exímio e perigoso guerreiro. As leis da cidade autorizava o rechaço
paterno às crianças portadoras de deficiências. O pai poderia também
lançar o bebé de qualquer penhasco se imaginasse que a compleição
física do mesmo fosse um eventual empecilho à carreira militar.

Os espartanos eram mestres no cultivo das tradições cívicas e amavam


com fervor a sua pátria. Dedicavam-se até à morte no combate e
tinham repugnância dos covardes e desertores. Eram xenófobos por
excelência, pois se julgavam "iguais entre si", mas "superiores a
qualquer outro povo da Hélade". Usavam uma longa cabeleira e bem
forjados apetrechos de guerra. Uma longa capa vermelha tocava-lhes
o calcanhar. Um escudo e um elmo que protegia, além da cabeça,
também os maxilares, traziam pavor aos adversários.

A coragem espartana foi imprescindível à manutenção da cultura


grega. Entre os anos de 500 e 449 a.C. Esparta alia-se a Atenas, a fim
de refrear a fúria do invasor nas chamadas "Guerras Médicas". Os
soldados comandados pelo legendário Leônidas lutaram com ânimo
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redobrado contra os persas. Em 431 a.C. eclode o conflito contra


Atenas. A guerra só terminaria em 404 a.C. com a vitória de uma
enfraquecida e desgastada Esparta.

Quanto ao sistema político, sabe-se que Esparta tinha dois reis que
provinham de duas importantes famílias aristocráticas locais: a dos
Ágidas e a dos Euripôntidas. Estes, apesar de serem "reis" não
possuíam irrestrita autonomia no campo da política interna e, nem
tampouco, da externa.

Encontravam-se eternamente resignados a vontade superior dos


aristocratas que compunham a Assembleia do Povo, chamada em
Esparta de Apella ou o Conselho de Anciãos, a Gerúsia, composto
apenas por vinte e oito gerontes com idade igual ou superior a
sessenta anos e por dois reis. Portanto, estes dois monarcas mais se
assemelhavam a chefes militares do que propriamente a monarcas.
Jaeger assim os define:

"Os dois reis heráclitas, sem poder político na época histórica


e que só no campo de batalha retomavam a importância
original, eram um remanescente dos antigos reis dos
exércitos do tempo das invasões dóricas e proviriam talvez
do fato de se proclamarem reis conjuntamente, os dois
chefes das duas hordas. A assembleia do povo espartano não
é outra coisa senão a antiga comunidade guerreira. Não há
nela qualquer discussão. Limita-se a votar SIM ou NÃO em
face de uma proposta definida no Conselho de Anciãos. Este
tem o direito de dissolver a assembleia e pode retirar da
votação propostas com resultado desfavorável. O eforato é a
autoridade mais poderosa do Estado e reduz ao mínimo o
poder político da realeza. A sua organização representa um
poder moderador no conflito de forças entre os senhores e o
povo. Concede ao povo um mínimo de direitos e conserva o
carácter autoritário da vida pública tradicional. É significativo
que o eforato seja a única instituição não atribuída a
legislação de Licurgo".

Todavia, não tem sido possível conhecer o Direito Espartano da


mesma forma que o direito de sua maior rival, Atenas. O maior desafio
é a inexistência de fontes diretas, o que nos leva a buscar aquelas
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informações prestadas por filósofos da estirpe de Aristóteles,


Xenofonte, Plutarco, Tucídides, Heródoto e Políbios. Vale dizer que o
próprio Corpus Iuris Civilis, de Justiniano, já atentava para essa
realidade ao ressaltar que os espartanos, ao contrário dos atenienses
e romanos, preferiam "confiar à memória aquilo que observavam
como lei.

Destarte, devido ao carácter eminentemente consuetudinário das leis


de Esparta, somente poderemos considerar seu sistema legal de forma
genérica. Na opinião de Aristóteles, o Direito Espartano sofreu alguma
influência do Direito Cretense, apesar de não explicar as motivações
que o levaram a chegar a tais conclusões.

De qualquer modo, já sabemos que os espartanos possuíam um


vocábulo específico para se referir ao seu conjunto de leis. O direito
era nomeado pela palavra rhetra, cujo sentido etimológico, consoante
a lição de Jacqueline de Romilly, alcançava o mesmo significado do
verbo "dizer".

Segundo Werner Jaeger, autor da célebre Paidéia, "esta pretensa


legislação é o contrário do que os gregos costumavam entender por
legislação.

Não é uma compilação de leis particularizadas, civis e públicas, mas


sim o nomos, no sentido original da palavra: uma tradição oral válida,
da qual apenas algumas leis fundamentais e solenes – as rhetra –
foram fixadas por escrito. Entre estas estão as que se relacionam com
as atribuições das assembleias populares, mencionadas por Plutarco.
As fontes antigas não consideram esta faceta como resíduo de um
estágio primitivo.

Pelo contrário, e em oposição à mania legisladora da democracia do


séc. IV, têm-na como obra da sabedoria previdente de Licurgo, o qual,
como Sócrates e Platão, dava maior importância à força da educação e
à formação da consciência de seus cidadãos do que às prescrições
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escritas. Com efeito, quanto maior importância se concede à educação


e à tradição oral, menor é a coação mecânica e externa da lei sobre os
detalhes da vida.

No entanto, a figura do grande estadista e pedagogo Licurgo é uma


interpretação idealizada da vida de Esparta, vista pelos ideais de
educação da filosofia posterior. Paralelamente ao direito oral, havia
também um exíguo direito escrito. Tratava-se da própria "Constituição
da Lacedemônia", à qual Aristóteles se refere num comentário
específico incluído em sua obra maior – A Política.

Os autores da Antiguidade Clássica sempre aludiam a um homem


chamado Licurgo, que teria sido o autor destas leis. Apesar disso,
pouco sabemos sobre o mesmo. Ao que parece, tratava-se de um
aristocrata, alguém aparentado à realeza, não obstante o fato de
ainda permanecerem vivas muitas especulações sobre o assunto. O
estagirita o menciona sem jamais questionar sua historicidade.
Xenofonte (427 – 355 d.C.), por sua vez, teve acesso a fontes bem mais
antigas e também escreveu sobre o tema em questão.

Nenhuma delas, entretanto, foi tão detalhista quanto A Vida de


Licurgo, de Plutarco (45 – 120 d.C.), o que não lega aos seus escritos
maior confiabilidade, pois o mesmo teve acesso apenas a fontes bem
mais tardias. Heródoto, chamado "o pai da história", chega a nos
informar ter havido um antigo santuário onde Licurgo foi venerado por
gerações a fio.

O teor costumeiro e casuístico do Direito Espartano é uma constante


nos comentários dos filósofos. Vejamos o parecer de Aristóteles sobre
a questão:

"Outro absurdo não menos lamentável é ver pessoas colhidas ao acaso


julgando em última instância os maiores casos. Seria necessário, pelo
menos, que tivessem um código e julgassem de acordo com leis
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escritas, em vez de decidir, como fazem, de acordo com seus


caprichos"13.

Os atenienses credenciavam a feitura de suas leis a legisladores como


Dracón e Sólon. Os cidadãos, ao passearem pelas ruas, sabiam que
aquelas regras registadas em placas de bronze e à vista de todos eram
obra de meros homens.

O espírito democrático a nortear a vida em sociedade impunha que as


leis em extremo cruéis, como as de Dracón, deveriam ser revogadas
por um novo arconte eleito pela assembleia. Como vimos, coube a
Sólon levar a cabo tal tarefa.

Em Esparta, do contrário, não se pode falar o mesmo. Heródoto dá


entender que as leis ainda estão adstritas ao universo do sagrado.
Nesse contexto, o papel de Licurgo seria o de se servir de interlocutor
entre o povo e uma suposta inspiração "recebida" junto ao famoso
oráculo de Delfos.

Aristóteles percebeu uma clara interdição ao comércio de imóveis em


Esparta. O filósofo esclarece que a cultura espartana julgava ser o
comércio uma prática "pouco honrosa".

Esta opinião é compartilhada por Políbios, que ressalta a constância do


escambo de bens de consumo no quotidiano da cidade.

Ensina Aristóteles que os bens eram transmitidos por testamento ou


doação. A lei. Assim, havia contribuído para gerar o incremento da
pobreza do país cujas riquezas se concentravam nas mãos de alguns.

Outra curiosidade apontada pelo estagirita diz respeito a uma regra


que isentava o indivíduo da prestação do serviço militar se o mesmo
tivesse três filhos. Quatro filhos isentariam o pai de família do
pagamento de tributos do estado. O ideal de civismo, profundamente
arraigado às instituições da cidade, explica a promoção de banquetes

13
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públicos, ocasião esta em que os habitantes da pólis festejam juntos,


apesar de que os menos favorecidos eram naturalmente excluídos
pela falta de recursos para participar dos tais eventos.

Destarte, Licurgo deve ser sempre lembrado como o modelador de um


Estado aristocrático e militarista. As virtudes cultivadas pelos cidadãos
estavam ligadas à condução da guerra.

Os espartanos jamais se sobressaíram no campo da política, não


obstante terem ficado eternamente lembrados por seus feitos
heróicos, dentre os quais a batalha das Termófilas (480 a. C.) serve
como exemplo maior.

3.1.4. Características do direito grego

 Os gregos não elaboraram tratados sobre o direito, mas apenas


legislaram (criaram leis) e administraram a aplicação da justiça
(direito processual).
 O direito era laico; não havia uma classe de juristas.
 Havia muitas diferenças de classes.
 Nos tribunais era preciso provar o direito (a lei, o costume) além
dos fatos.
 Era excedentemente retórico, mas o advogado como o
conhecemos hoje ainda não existia, mas havia muitos redactores
jurídicos, conhecidos como logógrafos.
 Inexistia órgão público de acusação – quando um podia denunciar
os crimes públicos.
 A lei começou a ser escrita e usada como instrumento de poder.
 Surgiram inovações em termos de processo (direito processual).
 O grego preferia falar a escrever. A escrita se desenvolveu
paralelamente ao direito, mas só atingiu a sua maturidade quando
a civilização já não tinha mais tanto poderio no mundo antigo.
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 Os gregos não aceitavam a profissionalização do direito – o direito


era leigo; não havia uma classe jurídica.
 Pouquíssimo material escrito sobreviveu que pudesse servir para o
estudo do direito.
 O direito está intimamente relacionado à sua escrita, pois não é
possível ter um sistema jurídico estabelecido sem um sistema de
escrita.
 O direito grego só ganhou força quando o povo começou a exigir
leis escritas para melhor assegurar a justiça por parte dos juízes. As
palavras de Teseu nas Suplicantes de Eurípedes ilustram este
ponto: “Quando as leis são escritas, o pobre e o rico têm justiça
igual”.

3.1.5. Contribuições do direito grego para o direito moderno:

 Regulamentação da propriedade privada


 Criação de alguns tipos básicos de contratos
 Criaram a democracia
 Valorização do direito público
 Rigidez das penas no direito penal
 Criação de figuras jurídicas como a hipoteca

Atenas se tornou um paradigma do direito grego, principalmente por


ter sido ali que a democracia se desenvolveu e o direito atingiu uma
forma mais aperfeiçoada quanto à legislação e processo.

Em Esparta nasceu a ideia dos “Três Poderes” constitucionais: O


Eforato – Supremo Tribunal; O Conselho de Anciãos – Senado; A
Apela – Assembleia dos Cidadãos.
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3.1.6. Os grandes Legisladores Gregos

Licurgo
a) Licurgo viveu entre os anos 1000 e 850 a.C. É considerado o
legislador mítico de Esparta, não escrevia coisa alguma e suas leis
consistiam em máximas e sentenças (rêtrai) que de viva voz se
transmitiam. O fim de Licurgo foi perpetuar a liberdade do pequeno
número, tanto no sentido moral como no político, destruindo as
inclinações vis e conservando o antigo governo patriarcal.
Aconselhando-lhe alguém que estabelecesse em Esparta a
democracia, ele lhe respondeu: Então comece por estabelecê-la em
tua casa‖.

Drácon
b) Drácon e Sólon foram os dois mais importantes legisladores de
Atenas, surgiram depois de várias manifestações dos elementos
enriquecidos do povo, no século VI a.C., contra os aristocratas em
busca de reformas. Drácon viveu mais ou menos em 600 a.C. apenas
escreveu leis que até então seguiam a tradição oral, esse fato foi
importante porque retirou o poder de justiça das mãos dos
eupátridas, transferindo-o para o Estado; as leis pelo menos
teoricamente passaram a ser reconhecida por todos através da
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legislação escrita. As leis estabelecidas eram muito duras e severas,


prevendo até a escravidão por dívidas, por isso ficaram conhecidas
como draconianas.

Sólon

Sólon por volta do ano 500 a.C. foi o legislador que de fato
estabeleceu algumas reformas moderadas e mais justas procurando
atender as duas classes. Terminou com a escravidão por dividas;
devolveu as terras perdidas por dividas, aos camponeses; limitou a
extensão da propriedade e fez uma divisão baseada na renda dos
indivíduos da sociedade. A sociedade ateniense ficou dividida em 4
camadas, estratificada de acordo com a renda anual. Nessa divisão
estavam todos os cidadãos, isto é, aqueles que tinham direito de
participação política. Fora dessa estratificação, portanto sem nenhum
direito político ficaram os estrangeiros e os escravos.

Sumário
O Direito nas cidades-estado da Grécia Antiga ainda foi muito pouco
estudado, apesar de sua inquestionável importância. Vale ressaltar
que, persistem muitas lacunas sobre o tema em questão, o que gerou
entre os desavisados a crença de que a actividade legislativa na Grécia
Antiga tenha sido incipiente e, na percepção de alguns, até mesmo
inexistente.

Grécia é caracterizada pela existência de duas Cidades-estado


importantíssimas com características diferentes, o direito em Atenas
segue o ideal democrata, já o direito em Esparta o direito o direito
sofre influência do carácter militar e ditador, esse condicionalismo faz
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com que este direito tem características divergentes em cada uma


desta.

Exercícios de Auto-Avaliação
1. Apresente três características do Direito na Grécia.

Resposta: Os gregos não elaboraram tratados sobre o direito, mas


apenas legislaram (criaram leis) e administraram a aplicação da
justiça (direito processual); O direito era laico; não havia uma
classe de juristas; Havia muitas diferenças de classes.

2. De forma clara aponte 2 contribuições do direito grego para o


direito moderno.
Resposta: Regulamentação da propriedade privada; Criação de
alguns tipos básicos de contratos

Exercícios

1. Caracterize o Direito, ateniense tendo em conta o seu ideal


democrático.

2. Caracterize o Direito, Espartano.

3. Diferencie o direito espartano, do Direito Espartano?

4. O direito Grego apesar se remontar da antiguidade clássica,


esse trás algumas contribuições para o direito moderno.
Apresente 4 contribuições deste para o direito moderno.

5. Identifique os principais legisladores na Grécia antiga


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UNIDADE Temática 3.2: O Direito Romano

Introdução
Nesta Unidade pretendemos fazer da Estrutura Política de Roma
vamos seguir a periodização tradicional já mencionada quando
focalizamos a História Externa do D. Romano: Realeza, República,
Império (Principado e Dominato).

Estudaremos ainda (Fontes do Direito Romano) é na estrutura política


de Roma que encontramos as chamadas Fontes de Produção em
sentido material, a saber, os órgãos que, segundo a estrutura política
do Estado em determinada época, têm a função de criar as normas de
direito.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Identificar os regimes políticos existentes na Roma antiga.

 Caracterizar as instituições políticas da Roma antiga


Objectivos

3.2.1. A Realeza

A história da fundação de Roma e dos acontecimentos que se


enquadram dentro do período chamado Realeza constitui um amplo
campo de dúvidas e de controvérsias. Vale aqui repetir a observação
de Gaudemet: “A realeza romana só é conhecida por fontes de
informação indiretas e imperfeitas, principalmente pelas narrações ou
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alusões dos autores literários romanos que escreveram muitos séculos


após o desaparecimento desse regime. A parte das lendas nessas
narrações é considerável. Mas sob a forma pitoresca que a história da
realeza reveste, ocultam-se muitos dados reais”14. Um fato deve ser
sublinhado no estudo da estrutura política romana sob a Realeza : a
influência etrusca : “a realeza etrusca dotou o Estado Romano de seus
órgãos políticos essenciais”. Com base nas informações transmitidas
por Tito Lívio, Dionísio de Halicarnasso, Cícero e Plutarco, a estrutura
política da Realeza apresentaria o seguinte esquema: o rei, a
assembléia curiata e o senado.

3.2.1.1. Rei
Com base nas supracitadas fontes a realeza pode ser caracterizada
como eletiva, vitalícia e não hereditária: A escolha do monarca
obedeceria ao seguinte processo: “o rei é eleito pela assembléia
curiata que, em virtude de um ato distinto e complementar, a lex
curiata de imperio, investe-o do imperium, totalidade do poder
executivo e confirmado pelo Senado, em virtude da auctoritas patrum.
À sua morte, a autoridade volta ao Estado, à comunidade
representada a título permanente pelo Senado que sorteia em seu
próprio seio, e pela duração limitada de cinco dias, um rei interino, o
inter-rei; decorrido o prazo, este inter-rei se nomeia um sucessor e
assim por diante o número dos inter-reis eventuais é ilimitado até o
dia em que um deles reúne a assembléia curiata que procede à eleição
do novo rei”15. Quais as atribuições do rei? Ainda aqui paira a
incerteza e surgem as controvérsias, o que se explica pela imprecisão e
até mesmo contradições das fontes.

14
Gaudement, Institutions de 1'Antiquité, p. 136. Sobre a História da Realeza ver
nossa História de Roma e os autores aí citados como Homo, Piganiol, Raymond
Bloch, etc.
15
Homo, Les Institutions, p. ll. Ver também Raymond Bloch, Les origines, p. 68:
“Selon la tradition la royauté aurait été attribuée par élection et aurait été viagère.
C'est 1'assemblée curiate qui choisit le roi, puis lui attribue le pouvoir. exécutive,
l'imperium par une loi spéciale dite lex curiata de imperio: ensuite le Sénat, de par
l'auctoritas patrum, confirme le pouvoir royal.”
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O rei desempenhava funções religiosas (era intermediário entre os


homens e os deuses), exercia funções judiciárias (dava soluções de
direito: jura dare). Segundo Leo Bloch “era o juiz supremo contra cujas
decisões não havia apelação ao povo”345. O rei detinha o poder de
comando: conduzia os homens ao combate e “depois de uma guerra
vitoriosa dispunha do país conquistado bem como de seus
habitantes”.

Gaudemet sublinha que o papel essencial do rei é o de comandar (dar


ordens, dicere, interdicere), Em face da coletividade o rei possui
grandes poderes: organiza a civitas, detém o jus belli ac pacis, o jus
vitae necisque; pode repartir as terras públicas entre particulares.

Encerremos esta breve (e suscetível de discussão ) caracterização da


realeza lembrando que a autoridade real sofria limitações pelo fas
(direito religioso) e pelos mores (costumes tradicionais).

3.2.1.2. Senado
O senado era integrado pelos chefes (patres) das grandes famílias
(gentes). O número de senadores, de acordo com a tradição, teria
atingido a casa dos trezentos nos últimos tempos da Realeza. Conselho
do Rei, o senado era convocado e consultado pelo soberano que,
entretanto, não estava obrigado a seguir-lhe a orientação.

Entre as atribuições do Senado na Realeza, podemos citar, a título de


exemplo:

1. A já mencionada interferência por ocasião da morte do rei e a


confirmação do poder real em virtude da auctoritas patrum
(autoridade dos pais).

2. Assentimento especial em face de expedições militares.

3. Manutenção aos costumes dos antepassados (mos maiorium).


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3.2.1.3. Comicios Curiatos

A tradição atribui a Rômulo a divisão do povo em cúrias que,


distribuídas em número de dez para cada tribo, integravam as três
tribos: Ramnes, Tities e Luceres.

Note-se que o vocábulo Curia designa tanto a reunião de homens


como o local da reunião. As cúrias fornecem o quadro para os
chamados comícios curiatos. Raymond Bloch assim resume as
atribuições da assembléia curiata: “tem por prerrogativas a eleição do
rei, certos direitos legislativos e judiciários...”350 As Assembléias
Curiatas eram também convocadas para imprimirem um caráter
público a determinados atos de direito privado tais como testamentos
e adoções.

Gaudemet anota sobre essas assembléias: “Seu papel de resto não


está melhor definido que o do Senado. Reunida pelo rei, quando ele
julga oportuno, e consultada sobre o que ele deseja submeter-lhe, a
assembléia é, antes, convidada a aprovar do que a tomar iniciativas”16.
Eis aí em rápidos traços a estrutura política da Realeza, segundo as
fontes tradicionais que devem ser usadas com cuidado. Homo julga
que desse quadro constitucional pouca coisa deve ser retida.

3.2.2. República
A História dos inícios da República Romana apresenta aspectos
obscuros. Grosso não dá crédito à tentativa da lenda de atribuir a uma
revolução a transformação institucional que teria marcado a passagem
brusca e imediata da ordem monárquica à ordem republicana já
perfeitamente delineada.

Dois fatos, entretanto, devem ser sublinhados no processo de


substituição da monarquia pela república: a reacção nacional latina
dirigida pelo patriciado e a consequente queda da dominação etrusca.

16
Gaudemet, Les Institutions, p. 143.
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Nas linhas seguintes pretendemos traçar um rápido quadro da


constituição política republicana que apresenta uma tríplice estrutura:
magistratura, senado e assembleias populares.

À magistratura, cujos quadros, via de regra, preenchiam-se por eleição


popular e estavam abertos a todos os cidadãos (havia magistraturas
patrícias reservadas em princípio aos patrícios mas depois acessíveis
aos plebeus; havia magistraturas plebeias, o tribunato da plebe e a
edilidade plebeia), correspondia o exercício dos poderes
governamentais.

O senado, integrado por antigos magistrados, revestia, em virtude da


vitaliciedade de seus membros, um carácter de estabilidade que
assegurava uma continuidade de governo e detinha várias atribuições
que genericamente podem ser definidas como direcção política,
iniciativa e controle em face à actividade dos demais órgãos
constitucionais. Era o verdadeiro centro de governo da Roma
republicana.

“As assembleias populares, de que participam teoricamente todos


os cidadãos com plenitude de direitos, competem funções
legislativas, funções de eleição dos diferentes magistrados, funções
judiciais em matéria criminal. A todo cidadão se assegura, no
desenvolvimento normal da vida constitucional e salvo
circunstâncias excepcionais, a fundamental garantia da provocatio
ad populum, ou seja, o direito de recorrer ao juízo da assembleia
popular contra a actividade dos magistrados de repressão criminal
que implique a imposição de sanções particularmente graves.
Produz-se um singular equilíbrio entre os diversos elementos
constitucionais que já maravilhava Políbio, induzindo-o a ver
harmonizados na constituição romana todos e cada um dos três
princípios de governo, teorizados e clarificados pelo pensamento
grego e em particular por Aristóteles, respectivamente expressos,
o monárquico pelo poder dos magistrados, o aristocrático pelo
17
senado e o democrático pelas assembleias do povo” .

3.2.2. Magistraturas

O termo magistratus (de magister) significa quer a própria


magistratura (e neste caso equivale a honor) quer o próprio cidadão

17
Burdese, Derecho Publico, p. 61.
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investido no cargo. Dois poderes caracterizam as magistraturas


romanas: a potestas e o imperium.

Potestas designa de um modo geral toda forma de autoridade


reconhecida pelo direito e que uma pessoa exerce sobre outra ou
sobre coisas. Assim, por exemplo, o paterfamilias detém a potestas
sobre os filhos (patria potestas) e sobre os escravos (dominica
potestas). Em direito público potestas é um poder comum a todos os
magistrados em virtude do qual estes representam a Res publica e
podem estabelecer prescrições (jus edicendi), que serão obrigatórias
enquanto o magistrado estiver no exercício de suas funções, e exercer
uma certa coerção, por exemplo, através de multas (coercitio minor),
no sentido de que sejam observadas suas prescrições.

3.2.3. Imperium
Os mais altos magistrados de Roma (ditadores, cônsules e pretores)
dispunham de uma vasta soma de poderes compreendida sob a
designação de imperium. Segundo Homo, este poder “comportava ao
mesmo tempo a administração civil do território, o comando das
tropas, o exercício da justiça, numa palavra, o conjunto de atribuições
civis, militares e judiciárias”.18

Três princípios dominam a organização das magistraturas


republicanas: anualidade, colegialidade e responsabilidade. Em
princípio o mandato do magistrado é anual (com excepção do ditador
e do censor). Ao término deste prazo os poderes do magistrado
cessam automaticamente.

O princípio da colegialidade constitui um dos traços mais originais da


magistratura romana e encontra sua expressão mais típica no
exercício da magistratura consular. As magistraturas, via de regra
(excepção é, por exemplo, o ditador) são exercidas por vários
magistrados: dois cônsules, dois pretores (número ampliado

18
Homo, Les Institutions, p. 270.
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posteriormente) dois edis curuis, etc. Uma das razões da multiplicação


do número de magistrados integrantes de um mesmo colégio explica-
se, entre outras, pelo acúmulo de serviço e pela preocupação em
evitar a concentração de poderes em uma mesma mão.

Alcance da responsabilidade dos magistrados romanos. Gaudemet


observa que ao término de sua magistratura os magistrados devem
jurar que nada fizeram contra as leis. “Devem dar conta de sua gestão
e podem ser julgados pelo Senado. Esta responsabilidade permaneceu
assaz teórica pois o próprio Senado é composto de antigos
magistrados: Juízes e acusados pertencem muitas vezes ao mesmo
meio social e as alianças familiares evitam uma condenação”. As
magistraturas não eram, em princípio, remuneradas.

3.2.3.1. Magistrados cum império


Os inícios do Consulado são obscuros e remontam à época de
transição da monarquia para a república.

Inicialmente são chamados praetores ou judices (juízes) e


posteriormente consules. Em 367 um dos cargos consulares é
reservado aos plebeus. Eleitos pelos comícios centuriatos, os cônsules
possuem vastas atribuições: convocam os comícios (jus agendi cum
populo) e o senado (jus agendi cum patribus); comandam as tropas em
tempo de guerra, etc., etc.

O ditador foi um magistrado supremo de carácter extraordinário talvez


desde os inícios da constituição republicana. Designado por um ou por
ambos os cônsules em caso de perigo externo (belli gerundi ou rei
gerundae causa) ou interno (seditionis sedandae causa), o ditador
exerce o mandato pelo período máximo de seis meses durante os
quais está revestido de um imperium maius, isto é, de poderes mais
amplos que os dos cônsules. O ditador escolhe um auxiliar, o magister
equitum, que está também revestido de imperium.
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3.2.3.1. Magistrados sine imperio


A tradição fixa a instituição da censura em 443 a.C. Estamos aqui
diante de uma verdadeira magistratura moral. Eleitos em número de
dois pelos comícios centuriatos cada cinco anos, os censores exerciam
seus poderes durante dezoito meses.

“Os censores careciam de imperium mas seu cargo era considerado,


sob alguns aspectos, a dignidade mais elevada que um cidadão
romano podia alcançar; assim é que somente os consulares, isto é, os
que haviam sido cônsules, eram eleitos ordinariamente para o cargo
(...)”19

a) Edilidade

Os edis da plebe (aediles plebis) foram instituídos ao mesmo


tempo que os tribunos da plebe (494 a.C.) dos quais foram
auxiliares. Entre as atribuições dos edis figuravam o abastecimento
da cidade (cura annonae), o cuidado das vias públicas (cura
viarum), dos edifícios e construções públicas (cura aedium). Cabia-
lhes também a realização dos jogos públicos (cura lutorum), tarefa
esta de grande influência na carreira política.

b) Questura

Os questores como auxiliares dos cônsules em suas funções


administrativas da cidade foram criados em 447 a.C. em número de
dois. Entre as atribuições dos questores (cujo número aumentou) na
época republicana podemos lembrar: guardar o tesouro conservado
no templo de Saturno; acompanhar os cônsules em campanha,
providenciando o pagamento das despesas e cuidando das presas de
guerra. Fundamentalmente a órbita da actuação desses magistrados,
quer em Roma, quer nas províncias, girava em torno da administração
das finanças.

19
Piganiol, Historie de Rome, p. 47. Ver nossa História de Roma, p. 93.
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c) Tribunato da plebe

Os tribunos da plebe (tribuni plebis) aparecem, segundo a tradição, em


494 a. C. A princípio em número de dois, seu número elevou-se a dez
em 457 a.C. Não eram magistrados propriamente ditos. Careciam de
potestas (no mesmo sentido da potestas dos demais magistrados) e de
imperium. Originariamente a missão dos tribunos foi a de proteger os
plebeus em face da prepotência dos cônsules contra os interesses dos
plebeus: auxilum latio adversus cônsules. Entre as prerrogativas dos
tribunos da plebe figurava o jus agendi cum plebe, isto é, o direito de
convocar a plebe e falar-lhe.

O tribunato degenerou em um cargo político solicitado pelos membros


jovens da classe senatorial; incorporou-se ao cursus honorum (carreira
política) depois da questura e, amiúde, mais que titulares de uma
magistratura eram instrumentos de que se valia a aristocracia
senatorial para a consecução de seus programas políticos mais
reaccionários.

d) O Senado

Estamos aqui em face do órgão-chave da constituição da República


Romana, a escolha dos senadores competia originariamente aos
supremos magistrados da República A partir do fim do século IV a.C
cabia aos censores a escolha dos senadores.

As atribuições do senado republicano foram as mais variadas. Vejamos


alguns exemplos:

 Interregnum - em caso de vacância da magistratura suprema o


interrex, sobrevivência da monarquia, é escolhido entre os
senadores patrícios.

 Auctoritas patrum - é uma ratificação das deliberações comiciais


por parte dos patres expressando assim a soberania do senado
patrício que se reserva o direito de confirmar as deliberações
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legislativas tanto eleitorais como judiciais, levadas a cabo pelas


assembleias populares.

 Função legislativa - sua função legislativa reveste caracteres


amplíssimos. Realiza-a mediante as discussões e aprovações dos
projectos de lei que o correspondente magistrado submete ao
conhecimento e voto das assembleias.

 Guardião dos cultos - o senado decide sobre a admissão de novos


deuses, a proibição de cultos estrangeiros, etc.

 Actuação no campo militar - exerce a direcção suprema da guerra


e controla o imperium militae dos magistrados. Autoriza o
recrutamento, licenciamento ou a permanência dos soldados nas
fileiras, etc.

 Actuação financeira e administrativa - Fiscaliza o tesouro, autoriza


as despesas, especialmente a guerra e obras públicas. Administra
as terras públicas (ager publicus) que são importante fonte de
renda.

 Política externa - abriu-se, anota Bloch, o campo de mais brilhante


actuação para o Senado. Recebe embaixadas e envia seus legados
ao exterior. Prepara e autoriza a conclusão de tratados.

e) Os Comícios

 Comícios curiatos

Estas assembleias cuja origem remonta à Realeza, tornam-se no século


III a.C. “um simples simulacro e uma pura formalidade”386. Entre suas
atribuições figuram: 1) votar a Lex curiata de imperio que confere o
imperium aos magistrados superiores; 2) em matéria de direito
privado aprovam o testamento comicial e autorizam a adrogatio
(adopção de um paterfamilias por outro).
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 Comícios centuriatos

Os comícios centuriatos (comitia centuriata) constituem a assembleia


por excelência (comitiatus marimus) da Constituição Republicana.
Entre as atribuições dos comícios centuriatos podemos lembrar:

1. Eleger os magistrados superiores: censores, cônsules, pretores,


tribunos militares com poder consular (tribuni militum consulari
potestate, substitutos, de maneira intermitente, dos cônsules entre
444 a.C. e 367 a.C.). Gaudemet (obra citada, p.168) observa que só
tardiamente, em parte por influência de doutrinas políticas gregas,”o
magistrado aparecerá como uma criação da assembléia”. Segundo a
concepção republicana antiga a assembleia apenas confirmaria a
creatio feita pelo magistrado anterior.

2. Votar as leis sob o controle rigoroso dos magistrados.

3. Possuíam uma jurisdição em matéria penal.

4. Intervinham em grau de recurso (provocatio ad populum) interposto


contra sentença que condenasse à pena capital.

 Comícios tributos

Os comícios tributos originaram-se, provavelmente, dos antigos


concilia plebis (assembleias compostas exclusivamente de plebeus).
Entre as atribuições dos antigos concilia plebis figurava a de votar
plebiscitos, decisões que, emanadas da plebe, só tinham validade
entre os plebeus. Figuram entre as atribuições dos comícios tributos:

1. Eleger os tribunos da plebe, os edis e os questores.

2. Julgar em grau de recurso (provocatio) contra as sentenças que


cominavam multas elevadas (multa suprema),

3. Votavam os plebiscitos que, como já vimos, adquiriram força de lei.


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3.2.4. Principado

A transição da República Romana para a Monarquia tem dado margem


às mais diversas interpretações. A perfeita compreensão da estrutura
política que então se desenvolve (primeiramente no Principado e
depois no Dominato) exige um conhecimento de todo o contexto
histórico de Roma em seus múltiplos aspectos: políticos, sociais,
financeiros, económicos, religiosos, etc. Homo assim caracteriza o
aparecimento do regime imperial: “O regime pessoal nasceu de causas
distantes e de necessidades profundas. Podemos resumi-las todas em
uma palavra: a conquista. Chegou um momento em que Roma, esta
cidade que, por um destino único, havia conquistado um mundo, teve
que escolher entre a manutenção de suas instituições tradicionais e a
conservação de seu império”20.

O regime instituído por Otávio repousa sobre dois actos fundamentais:

1. A concentração de dignidades e de poderes republicanos entre as


mãos de uma só pessoa, o princeps.

2. A criação de novos órgãos políticos administrativos estreitamente


dependentes do princeps. Deve-se observar que a estrutura
política republicana (magistraturas, senado e comícios)
sobrevive mas com as modificações que assinalaremos mais
adiante399.

Poderes de Octávio

Piganiol, sublinhando que Octávio procura inserir seus poderes nos


quadros constitucionais, indica os seguintes passos de concentração
de poderes: É cônsul todos os anos desde 31, recebe em 30 o poder
tribunício vitalício, o direito de julgar em grau de recurso (a provocatio
ao povo é substituída pela provocatio ao príncipe), o direito de criar
patrícios (lex Saenia) e, em uma data desconhecida, a censoria
20
Homo, Les Institutions, pp. 243-244.
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potestas. Gaudemet observa que “do fim do triunvirato até a sessão


do senado de 13 de Janeiro de 27, a base dos poderes de Octávio é
incerta.

Nas vésperas da batalha de Actium, ele exigira da Itália e das


províncias um juramento de fidelidade à sua pessoa. Tratava-se de um
fato importante, senão absolutamente novo. Estabelecia um elo
pessoal entre Octávio e os habitantes do mundo romano. Fora deste
juramento, a autoridade de Octávio repousa sobre a força de seu
exército, o prestígio de suas vitórias, as riquezas do Oriente e a
herança de César. Habilmente ele se apresentou como um libertador
da República e fez da luta contra a facção de António o fundamento de
sua legitimidade.

Em 13 de Janeiro de 27 a.C. Octávio declara no Senado sua intenção


de restituir ao próprio Senado e ao povo o governo do Estado (lê-se
nas Res gestae: rem publicam ex mea potestate in senatus populique
Romani arbitrium transtuli). O Senado, entretanto, unanimemente
pede a Octávio que conserve o poder e ele aceita.

Em 28 a.C. Octávio se inscrevera no album senatorial como princeps


senatus (considerava-se o primeiro dos senadores e também o
primeiro dos cidadãos; donde o nome de Principado); em 27 assume o
imperium proconsulare nas províncias mais importantes sob o ponto
de vista militar; recebe o título de Augustus (título religioso que
passará a ser usado pelos imperadores); em 23 o imperium
proconsulare é estendido a todo o império; este imperium é vitalício e
sem limites cronológicos ou territoriais; em 12 obtém o cargo de
Pontifex Maximus e com ele a direcção oficial da vida religiosa.

A tribunicia potestas (poderes tribunícios vitalícios) e o imperium


proconsulare (sem limites no tempo e no espaço) constituirão as bases
jurídicas essenciais do poder imperial. A essas bases podemos
acrescentar o Pontificado Máximo que dá ao imperador além de
autoridade moral, uma série de atribuições no campo religioso. Depois
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

desta sucinta exposição dos poderes do princeps passemos a um


rápido estudo do destino dos antigos órgãos republicanos tradicionais
e do aparecimento de novas instituições.

Os comícios republicanos entram irremediavelmente em decadência.


Com efeito, seus poderes legislativos, eleitorais e judiciários vão-se
extinguindo. O poder legislativo transforma-se em mera formalidade
pois as leis são inspiradas pelo imperador, e as assembleias vão
limitar-se a aclamar a proposição feita quer pelo próprio soberano,
quer pelos magistrados a ele subordinados. O último exemplo de lei
comicial data do reinado de Nerva (96-98)402. O poder eleitoral das
assembleias já havia sofrido sério golpe quando César introduziu a
recomendação oficial (commendatio) dos candidatos. Embora as
assembleias continuem elegendo magistrados, sob Augusto e seus
sucessores, a indicação do candidato parte do imperador.

As atribuições judiciárias das Assembleias haviam sofrido um golpe já


no último século da República com a instalação dos júris permanentes
(quaestiones perpetuae). “Sob o Império esses júris persistiram por
algum tempo. Mas a jurisdição criminal passou de fato para o senado
e para o imperador (ou seus funcionários). Neste domínio igualmente
as assembleias não mais tiveram a desempenhar papel algum”21.

Quanto ao senado, não é mais aceitável a teoria de Mommsen


segundo a qual o poder, nos inícios do Império, fora repartido entre o
senado e o príncipe. Na realidade não existiu essa diarquia. O papel do
imperador na escolha dos magistrados assegurava-lhe desde logo o
controle sobre o senado.

O senado imperial abriga um bom número de membros naturais das


províncias. Esta adaptação ao universalismo do Império contribuiu
para assegurar ao senado um papel às vezes eficaz. “O senado herdou
o poder eleitoral dos comícios e até certo ponto seu poder legislativo;
em matéria criminal ele veio a ser, com apoio em precedentes

21
Gaudemet, Les Instituions, p. 274.
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republicanos, um tribunal senatorial-consular, porquanto se lhe


atribuiu competência facultativa (pois podia recusá-la), para, por
iniciativa do cônsul, conhecer de quaisquer delitos; mas que
notadamente se exercia quando se “tratava de atentado contra o
Estado ou à pessoa do imperador, assim como dos crimes de
concussão dos funcionários provinciais e das acusações capitais contra
os senadores. Retirou-se-lhes, porém, a direcção dos negócios
estrangeiros: o senado não superintendia mais as declarações de
guerra, os tratados de paz e de aliança.

Não sendo o principado uma magistratura hereditária, competia ao


senado o direito de designar o sucessor do príncipe falecido; mas na
realidade esse direito era menos exercido pelo senado do que pelo
exército, que impunha um dos seus chefes à escolha senatorial.

Das magistraturas republicanas o consulado foi a que perdeu a maior


parte de seu conteúdo, embora tivesse conservado grande prestígio. A
redução de duração do mandato consular pelo imperador facilitava a
este a designação de maior número de familiares que ambicionavam
as honras do cargo. Os antigos cônsules são designados governadores
das províncias mais importantes e fornecem também o quadro dos
mais altos funcionários.

Os pretores continuaram sendo os magistrados. Judiciários por


excelência tanto no cível como no crime. Sua jurisdição criminal
extinguiu-se, entretanto, com o desaparecimento das já mencionadas
quaestiones perpetuae (séc. III) que eles presidiam. As atribuições da
censura, já em decadência no final da República, vão ser assumidas
pelo imperador. Domiciano liga a censura à dignidade imperial
fazendo assim desaparecer a magistratura dos censores.

Os edis conservam sua jurisdição mas perdem suas funções


administrativas que são absorvidas pelos funcionários imperiais.
Depois do século III não há mais menção aos edis. Os questores
perdem a guarda do Tesouro.
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O tribunato encontra-se em plena decadência: o imperador detém a


potestas tribunicia dissociada do cargo de tribuno. A intercessio
perdeu boa parte de sua importância pois não pode ser usada contra o
imperador nem seus funcionários. Os tribunos conservaram o direito
de convocar e presidir o Senado.

Entre os novos órgãos que integram a estrutura política do Principado


figuram o consilium principis e os funcionários imperiais.

Sob Augusto o consilium não possui composição e atribuições


claramente definidas. O princeps convoca seus amigos (amici) e
companheiros (comites): parentes, altos funcionários, especialistas em
administração e juristas. Os assuntos tratados no consilium são os
mais variados: política externa, questões militares, administrativas e
judiciárias.

Sob Tibério o consilium torna-se permanente. Sob Adriano sofre


profunda reforma com a introdução de um elemento permanente, os
jurisconsultos, cuja presença se tornava indispensável em virtude do
exercício das prerrogativas legislativas e judiciárias por parte do
princeps. A partir dos Severos o Consilium tornou-se “o centro do
governo e o grande motor da administração imperial.

Os funcionários imperiais diferem dos magistrados republicanos por


serem nomeados e demissíveis a critério do princeps que lhes delega
poderes. Os principais funcionários eram:

Praefectus praetorio (prefeito do pretório). Seu número e atribuições


variaram. Os praefecti praetorio foram instituídos por Augusto em
número de dois para comandarem a guarda pessoal do imperador.
(Praetorium era o quartel- general do comandante militar.) Sob a
dinastia Júlio-Claudia os prefeitos do pretório ampliam suas
atribuições e adquirem notável influência no governo. Especialmente a
partir do século II são-lhes conferidas importantes funções judiciárias,
o que explica o fato de encontrarmos neste cargo juristas famosos
como Papiniano, Ulpiano e Paulo.
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Praefectus urbi (prefeito da cidade encontra-se também o genitivo


urbis). Compete-lhe a administração de Roma, especialmente no
tocante à manutenção da ordem pública. Possui, assim, atribuições de
polícia (comando das coortes urbanas) e atribuições no campo
judiciário. O cargo era confiado a um senador que exercera o
consulado e considerava-se o coroamento da carreira senatorial.

Praefectus vigilum. Era o responsável pelo policiamento nocturno de


Roma.

Praefectus annonae. Era encarregado do abastecimento de Roma


(cura annonae).

Praefecti aerarii. Administravam o tesouro público.

A burocracia imperial possui um grande número de servidores que


atendem às mais variadas necessidades e estão distribuídos entre os
diversos scrinia (secretarias). Havia, por exemplo, a secretaria “a
rationibus” encarregada de assuntos financeiros, “ab epistulis” (para a
correspondência oficial), a libellis (encarregada de examinar as
questões (preces, libelli) propostas por particulares), etc.

3.2.4. Dominato
O Principado estabelecido por Augusto encerrava em si duas
tendências que levariam inexoravelmente a uma monarquia absoluta
de tipo oriental: a fossilização e decadência dos órgãos da estrutura
republicana ao lado da progressiva centralização de poderes na pessoa
do imperador. Este vai deixar de ser o princeps (primeiro dos cidadãos)
para tornar-se o dominus (o senhor). Estudemos sucintamente os
poderes do imperador e os novos órgãos da estrutura político-
administrativa.

O Imperador assume títulos que denotam uma nova concepção do


poder: Dominus Noster, Sacratissimus Dominus, etc. “Não é mais um
magistrado romano, é um monarca universal de um tipo novo”408. O
imperador é o único legislador. As constituições imperiais chamam-se
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Leges. O monarca detém a totalidade do poder judiciário: é o juiz


supremo e os demais juízes são apenas seus delegados. O imperador é
também o chefe militar supremo, decidindo sozinho da paz e da
guerra.

É curioso notar que sob o Dominato ainda subsistem vestígios das


velhas magistraturas republicanas: há cônsules nomeados pelo
imperador e pretores eleitos pelo senado. Esses magistrados não
exercem funções importantes. Neles o que mais importa é o título
honorífico.

No campo da administração, Constantino estabeleceu como princípio


estável a separação entre funções civis e militares. Os prefeitos do
pretório e governadores de província tiveram atribuições puramente
civis. Eis; a seguir, uma sucinta relação dos principais órgãos e cargos
sob o Dominato.

O Senado - A partir de Constantino há dois senados respectivamente


em Roma e em Constantinopla. Embora “conservando notável
prestígio, especialmente no Ocidente, não realizaram substanciais
funções nem políticas nem legislativas, sendo raramente ouvidos em
questões políticas e limitando-se comumente em matéria de
legislação, a servir de instrumento de publicidade das leges
imperiais”22.

Consistorium - órgão consultivo do imperador em matéria política e


administrativa, possui também atribuições judiciárias. Integram-no
altos funcionários e jurisconsultos.

Secretarias - (scrinia) como, por exemplo, secretaria da


correspondência (epistolarum), dos julgamentos (libellorum), etc.

Entre os principais funcionários, podemos lembrar:

Praepositus sacri cubiculi. Era o chefe da casa imperial e como tal


supervisionava toda a administração da corte.

22
Burdese, obra citada, p. 283.
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Magister officiorum. Chefiava diversos serviços entre os quais os


citados scrinia.

Quaestor sacri palatus. Era o intérprete do pensamento imperial em


matéria judicial. Cabia-lhe preparar os projetos de constituições.

Comes sacrarum largitionum. Administrava o tesouro do Estado.

Comes rerum privatarum. Administrava o domínio privado (resprivata)


do imperador.

Magistri militum. Eram os chefes militares, dois na corte e quatro à


frente das grandes circunscrições: Oriente, Ilíria, Itália, Gália.

Praefectus praetorio. Alto funcionário com atribuições administrativas,


financeiras e judiciárias. Cabia-lhe julgar em nome do imperador.
Foram colocados prefeitos do pretório à frente das grandes
circunscrições territoriais.

Sumário
Nesta unidade apresentamos as instituições politicas das
diversas etapas do Direito romano, explicamos as funções de
cada instituição politica: Na Realeza, na Republica, principado e
dominado, cartelizamos as alterações das instituições em cada
período histórico do desenvolvimento do Império Romano.

Exercícios de Auto-Avaliação
1. Identifique as instituições políticas na Realeza?
Resposta: as instituições políticas da realeza são: O rei, O senado e
comício curiato.

2. Quais eram as atribuições do senado na Realeza?


Resposta: A já mencionada interferência por ocasião da morte do rei e
a confirmação do poder real em virtude da auctoritas patrum
(autoridade dos pais); Assentimento especial em face de expedições
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

militares.; Manutenção àos costumes dos antepassados (mos


maiorium).

Exercícios
1. Identifique os regimes políticos existentes em Roma?

2. Caracterize as atribuições do senado na Republica?

3. Explique a diferença entre os três Regimes políticos que


estiveram em vigor em Roma (Realeza, República e Império)
usando, para demonstrar as diferenças, as instituições políticas
de cada um dos regimes.

4. Explique as diferenças do «Imperium» ao longo dos três


regimes políticos de Roma: Realeza, República e Império.

5. Caracterize as atribuições do comício curiato.


ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

UNIDADE Temática 3.3: As fontes do Direito Romano

Introdução
Nesta Unidade pretendemos, demonstrar as fontes de direito em cada
período histórico da evolução do direito Romano. Na linguagem do
Direito, o vocábulo fonte possui um sentido peculiar: indica tanto a
nascente donde promana o direito objectivo como “as formas de que
se recobre o preceito, porque o preceito assume diferentes aspectos
exteriores, revestindo-se de roupagens diversas, que variam segundo
sua natureza e segundo a própria fonte, isto é, segundo sua
proveniência, derivando de tal ou qual órgão”23.

Nas seguintes linhas vamos fazer um sucinto estudo das fontes de


produção no sentido amplo de acordo com os períodos estabelecidos
por Giffard (ver, a divisão da História Interna):

Origens - Costume e leis régias; Antigo Direito - Lei das XII Tábuas e
legislação posterior; Período Clássico – Leis Costume Éditos dos
Magistrados, Responsa Prudentium ,Senatusconsultos, Constituições
Imperiais ,Período do Baixo-império ou Bizantino - Constituições
Imperiais antes de Justiniano A Jurisprudência As compilações de
Justiniano

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Identificar as fontes de Direito no período do direito antigo.

 Caracterizar as fontes do direito Romano no período da realeza;


Objectivos

23
Oliveira Filho, Introdução à Ciência do Direito, p. 299.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

 Caracterizar as fontes no período do Principado e Dominado.

 Diferenciar as diversas fontes de Direito em cada período do


Histórico.

3.3.1. Fontes Do Direito Romano


Na linguagem do Direito, o vocábulo fonte possui um sentido
peculiar: indica tanto a nascente donde promana o direito
objectivo como “as formas de que se recobre o preceito, porque o
preceito assume diferentes aspectos exteriores, revestindo-se de
roupagens diversas, que variam segundo sua natureza e segundo a
própria fonte, isto é, segundo sua proveniência, derivando de tal
ou qual órgão”24.

Estamos aqui diante das chamadas Fontes de Produção que


podemos dividir em Fontes de produção em sentido restrito e
Fontes de produção em sentido amplo.

As primeiras são os órgãos de expressão do direito, isto é, os


órgãos que, segundo o ordenamento jurídico do tempo, têm a
função de criar a norma jurídica. São também chamadas fontes
em sentido material. Exemplo: os comícios, o senado, as
magistraturas, etc. As segundas são os modos, as várias maneiras
pelas quais se declara, ou se manifesta, a regra jurídica. São
também chamadas fontes em sentido formal. Assim, por exemplo,
a lei, o Senatusconsultos, o édito dos magistrados, etc.

Nas seguintes linhas vamos fazer um sucinto estudo das fontes de


produção no sentido amplo de acordo com os períodos
estabelecidos por Giffard (ver, a divisão da História Interna):

Origens - Costume e leis régias

Antigo Direito - Lei das XII Tábuas e legislação posterior

Período Clássico – Leis Costume Éditos dos Magistrados, Responsa


Prudentium ,Senatusconsultos, Constituições Imperiais ,Período

24
Oliveira Filho, Introdução à Ciência do Direito, p. 299.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

do Baixo-império ou Bizantino - Constituições Imperiais antes de


Justiniano A Jurisprudência As compilações de Justiniano

3.3.2. Origens

a) Costume

Na Realeza a principal fonte do Direito foi o costume dos


antepassados (mos maiorum, jus non scriptum), normas
consuetudinárias transmitidas de geração em geração, não
desligadas de todo da norma religiosa (fas) e completadas, quanto
ao Direito público, pelos tratados (foedem) intergentilícios que
estruturaram a cidade.

Sobre as leis régias Gaudemet anota:

1. Não existiam verdadeiras leis votadas pela assembleia na época


real.

2. Não se pode tratar de leis escritas porque a escrita na época


real era excepcional e porque no início da república os
plebeus reclamaram no sentido de que o direito fosse
redigido. “As ‘leis régias’ não são leis nem mesmo regras
jurídicas escritas”435. Seriam, antes, “expressão de antigos
costumes, colocados pela tradição sob o patrocínio dos
lendários reis de Roma”436.

Arias Ramos observa que a actividade legislativa dos comícios


curiatos no tempo dos reis era uma dessas antecipações de que
tanto usa a historiografia romana em seu afã de dar antiguidade a
suas instituições políticas.

3.3.2. Antigo Direito

a) Lei das XII Tábuas

No período do Antigo Direito a primeira fonte a ser mencionada é a Lei


das XII Tábuas, a mais importante das leis republicanas. Segundo a
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tradição histórica, os plebeus, insatisfeitos com a interpretação dos


costumes pelos pontífices, escolhidos entre os patrícios, e desejosos
de verem escritos e divulgados esses mesmos costumes, teriam
pleiteado (462 a.C.), por intermédio do tribuno da plebe Terentilius
Arsa, a nomeação de uma comissão para efectuar a almejada
redacção.

Em 450 ou 451 teriam sido redigidas as dez Tábuas da Lei. A


codificação foi completada no ano seguinte (450 ou 449) com a
redação de mais duas tábuas, formando se assim a Lex duodecim
Tabularum (Lei das XII Tábuas) conhecida também como Lex
decenviralis (Lei decenviral) ou apenas Lex.

A reconstituição da Lei das XII Tábuas, baseada nos textos disponíveis,


apresenta um duplo aspecto: restauração quanto possível do próprio
conteúdo da Lei e o ordenamento deste conteúdo nas doze
Tábuas449. O primeiro, evidentemente o mais importante, é facilitado
pela grande quantidade “de textos precisos que nos fazem conhecer
numerosas disposições da lei quer em seus termos quer em seu
sentido.

O segundo baseia-se: 1) em alguns testemunhos positivos que indicam


a que tábua determinada pertencem certas disposições; e 2) na ordem
geral seguida por Gaio em seus comentários cujos fragmentos se
encontram no Digesto. Encontramos na Lei das XII Tábuas matéria de
Direito público e de Direito privado.

b) Legislação posterior à Lei das XII Tábuas

Antes de enumerarmos algumas das principais leis que se situam entre


a Lei decenviral e o iníciodo período clássico convém dizer algumas
palavras sobre o plebiscito e sua equiparação à lei, complementando o
que já escrevemos ao focalizarmos os comícios tributos. O vocábulo
plebiscitum significa “ordem da plebe. Plebiscita eram pois as
deliberações da plebe (plebs) reunida no concilium plebis (ver no
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

capítulo VII, as atribuições dos comícios tributos). Os plebiscita valiam


somente para a plebe enquanto as leges valiam para todo o populus
(patrícios e plebeus).

O costume continuou sendo fonte do Direito durante a época em foco.


Vamos estudá-lo com mais minúcias no Período Clássico. Sobre a
interpretação da lei pelos pontífices e pelos jurisconsultos leigos, ver,
adiante, item “Responsa Prudentium”.

3.3.3. Período Clássico


a) Leis

Como fonte do direito Lex “é qualquer deliberação que possui


conteúdo normativo tomada pelo populus romanus reunido nos
comícios por proposta do magistrado e confirmada pelo senado”454.
Os textos apresentam-nos diversas definições de Lex.

Na elaboração da lei cooperavam a magistratura, o senado e o


comício: a lei é uma publica pactio: um público acordo entre os vários
elementos constitucionais da República. Nenhuma lei podia ser
proposta a não ser por um magistrado (os membros da assembleia
não tinham o poder de apresentar uma proposta legislativa. Quando o
plebiscito foi equiparado à lei, a iniciativa legislativa passou, de fato,
para os tribunos da plebe.

O projecto de lei era afixado (promulgatio) para que os cidadãos o


discutissem com o magistrado em reuniões não oficiais (contiones). A
proposta do magistrado chamava-se rogatio. Aos participantes do
comício distribuíam-se duas pequenas tábuas, uma com a letra A, O
votante depositava a tábua de sua preferência na urna (cistula)
limitando-se a aprovar ou rejeitar integralmente os projectos de lei ou
ainda a abster-se (non liquet) A lei aprovada pelos comícios
necessitava da ratificação do senado: auctoritas patrum. “A partir da
lei Publilia a auctoritas do senado passou a ser dada por antecipação,
qualquer que fosse o resultado da votação comicial (incertus eventus) ;
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tornou-se assim mera formalidade e com esse carácter subsistiu


enquanto subsistiram os próprios comícios. No período pós-clássico
aparece numa constituição (codex theodosianus, 1.1.3) de Teodósio I
(393)

b) Costume

O costume (usus, mos; consuetudo) contínuo como fonte do Direito no


período clássico.

c) Éditos dos Magistrados

Uma das fontes essenciais do direito clássico e observa que se trata


aqui de uma fonte muito original que não se encontra, sob esta forma,
em qualquer outro sistema jurídico. O pretor que assumia o cargo não
tinha a obrigação de acolher o edito de seu antecessor.
Ordinariamente porém aceitava as disposições do édito anterior que
haviam sido aprovadas pela prática e acrescentava novas disposições.
Assim é que o edictum perpetuum continha sempre uma parte que
passava de pretor a pretor e que recebeu a designação de edictum
vetus ou edictum translaticium (pars transaticiu) em oposição ao
edictum novum (pars novus), obra pessoal do novo pretor. O edito
comporta essencialmente promessas de acções. Ao prometer uma
acção, o pretor cria um direito, pois reconhece que uma situação
determinada merece ser juridicamente protegida. Transforma o que
não era senão uma situação de fato em uma situação de direito. Com
efeito, é na medida em que podem obter uma acção na justiça que os
cidadãos podem dizer-se titulares de um direito.

Lex A lei tinha validade permanente; A lei estendia-se a todo o


Império; A lei podia revogar uma regra de direito civil. Já os Edictum
O édito tinha em princípio, validade anual. Seu autor podia modificá-lo
ou revogá-lo. Note-se que esta faculdade foi-lhe retirada pela Lex
Cornelia (67 a.C.). Este plebiscito obrigou os magistrados a exercerem
a jurisdição segundo seus editos: ex edictis suis jus dicere; O édito só
se aplicava no território sob a jurisdição do magistrado que o
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promulgara; O édito não revogava diretamente: podia apenas chegar


praticamente ao mesmo resultado, neutralizando, na aplicação, a lei
existente ou suprindo a omissão dela.

d) Responsa Prudentium

Resposta dos prudentes, A jurisprudência clássica apresenta entre


outras as seguintes características:

 É eminentemente criativa - Em oposição aos antigos jurisconsultos


republicanos, que se apegavam demasiadamente aos antecessores
e à letra da lei e só timidamente ousavam introduzir novidades, os
jurisconsultos clássicos actuam com mais liberdade e segurança,
inspirando-se diretamente nas necessidades da vida e superando
muitas vezes com um simples aequum est ou sed verius videtur
(me parece mais verdadeiro) as dificuldades apresentadas pela
letra da lei.
 Respeito à tradição - Esta característica não se opõe à anterior. A
criatividade e o progresso dos clássicos pisavam o chão firme da
obra da jurisprudência antiga. Os jurisconsultos clássicos inovaram
mas com o olhar voltado também para o passado cuja contribuição
aproveitavam e ampliavam.
 É eminentemente prática. O jurisconsulto romano propunha-se
sempre um fim prático que consistia em apresentar soluções
convenientes e justas ou ainda em formular princípios ou regras
que contribuíssem para essas soluções.
 É universal, cosmopolita. Este traço característico encontra-se
especialmente na última fase do período clássico. Os jurisconsultos
procuram criar um direito humano, aequum e bonum apto a
satisfazer às exigências de diversas nacionalidades integradas nos
amplos horizontes do Império Romano
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e) Senatusconsultos

Senatusconsultos como “o que o senado ordena e constitui”


(Senatusconsultum est quod se natus jubet atque constituit).
senatusconsulto tem força de lei (legis vicem obtinet) mas acrescenta
que isto foi posto em dúvida (quamvis fuerit quaesitum).

f) Constituições Imperiais

Gaio (1. 5) enumera três espécies de constituições: decreto, édito e


epístola (Constitutio principis est, quod imperator decreto, vel edicto
vel epistula constituit). Assim, pois, tudo o que o imperador decide por
uma epístola, julga por um decreto ou ordena por um edito, tem o
valor de lei; estas são o que se chama Constituições.

Edicta - eram disposições de ordem geral tomadas pelo imperador e


aplicáveis, segundo a vontade do soberano, a todo o Império, a uma
província, a uma cidade ou a uma determinada categoria de pessoas.
O edito imperial distinguia-se do edito dos magistrados quer por sua
própria natureza (formulava regra geral obrigatória para todos) e pela
duração de sua vigência (em princípio continuava em vigor mesmo
depois da morte de seu autor, a não ser que fosse expressamente
revogado).

Decreta - eram as sentenças que, no exercício da sua função judiciária,


o imperador prolatava em seu tribunal (auditorium principis), com o
auxílio de seus conselheiros ou assessores. O imperador podia avocar
causas ou julgar em grau de recurso. A força obrigatória do decretum
restringia-se à espécie prevista na decisão, constituindo coisa julgada
(res judicata).

Rescripta - eram respostas dadas por escrito pelo Imperador (ou por
seu conselho) à consulta de um particular ou de um magistrado sobre
determinada matéria jurídica.
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Mandata - eram instruções de carácter administrativo expedidas pelo


imperador a seus funcionários, especialmente aos governadores de
províncias. O conteúdo dos mandatos versa geralmente sobre matéria
administrativa ou fiscal.

3.3.4. Período Do Baixo Império Ou Bizantino


Nessa fase somente uma fonte era actuante as Constituições Imperiais
até então chamadas leges, todavia, continua firme o costume, como
fonte espontânea do direito, que se limitava a preencher as lacunas
das constituições, sendo que para o direito privado, sua importância
era muito pouca. Não há grandes juristas, mas sim, práticos, a
decadência da jurisprudência é notória. As normas tornam-se
conhecidas através das obras dos jurisconsultos clássicos.

Ao lado das constituições imperiais (leges) vigorava também o Direito.


Os imperadores tentaram, combater através das constituições
imperiais, o uso abusivo do Direito pelos advogados, que muitas vezes,
confundiam os juízes. Teodésio II e Valentinano III, através da ―lei das
citações, estabeleciam que somente poderiam ser invocados em juízo,
os escritos dos jurisconsultos, Gaio, Papiniano, Ulpiniano, Paulo e
Modestino, desde que houvesse concordância da maioria, caso
contrário o juiz seguia a orientação que lhe parecesse melhor.
Antes de Justiniano, para solucionar vários problemas, foi elaborada
uma série de compilações, chamadas ―Compilações Pré-
Justinianéias‖, para melhor diferenciá-las das elaboradas por ordem
do imperador Justiniano. Entre essas codificações devemos distinguir
os Códigos: Gregoriano, Hermogeniano, Teodasiano (dois primeiros
elaborados por particulares, restaurando poucas informações); de
grande importância e o Código Teodosiano, elaborado por ordem do
Imperador Teodósio II e tornado obrigatório no Ocidente por
Valentiniano III, distingue-se por ser a primeira codificação oficial do
Império Romano.
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Antes de Justiniano temos duas Leis Romanas dos Bárbaros que


merecem ser destacadas: A Lex romana Wisigothorum ou Breviário de
Alarico e a: A Lex romana Borgundionum ou Lei dos Borgúndios, são
compilação de leis romanas feitas pelos Bárbaros, pois eles
respeitavam os costumes dos povos vencidos e por isso, organizaram
os vencedores um código que ofereceram aos vencidos.

3.3.4.1. Figura de Justiniano.


Por ironia da vida, o grande Imperador Justiniano, o homem que deu o
mais alto valor aos estudos e à sistematização do Direito Romano, não
nascera em Roma, não era culto e mal sabia enunciar as primeiras
letras.

O Imperador foi um homem dotado de grande conhecimento


empírico, incrível capacidade de trabalho e um profundo amor ás
artes, ás ciências e ao Direito, casa-se com Teodora, ambiciosa,
corajosa, considerada por muitos como a alma e esteio do governo de
Justiniano.
Justiniano governou de 527 a 548 da era cristã. Foi o último Imperador
do Baixo-império e o primeiro dos Imperadores Bizantinos. No século
VI, o estudo do direito volta a florescer devido as escolas do Império
Romano da Oriente dentre elas, destacando-se a de Constantinopla,
cujos juristas auxiliaram a Justiniano a empreender e sistematizar,
reunindo em uma só obra o seu Corpus Júris. No século XII, glosadores
da Escola de Bolonha, passaram a denominar a obra de Justiniano de
Corpus Júris Civilis, para distinguir do denominado Corpus Júris
Canonici.
Após assumir o governo, Justiniano formou uma comissão de dez
membros, para compilar as constituições imperiais vigentes; entre
esses membros, encontrava-se Triboniano e Teófilo grandes
jurisconsultos. Sob a presidência de Triboniano a comissão deveria
refundir os códigos anteriores – Gregoriano, Hermogeniano e
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Teodosiano e acrescentar-lhes as constituições recentes. Esse


primeiro Codex (529) não chegou até nós, sendo substituído por outro
em 534. A obra de Justiniano, ou seja, Corpus Júris Civilis que chegou
até nos consta de quatro partes:
1ª - Digesto (compilação dos jura);
2ª - Institutas (manual escolar);
3ª - Código (compilação das leges);
4ª - Novelas (reunião das constituições).

Digesto, feita a compilação da leges (Codex Vetus – 529, hoje


perdido), faltava agora compilar os juras; projecto que ficou a cargo
de Triboniano que formou uma comissão de professores de direito e
advogados, entre os quais se inscreviam Constantino, Teófilo e
Cratino de Constantinopla, Doroteu, Isidoro e Anatólio, da
Universidade de Berito que concluíram o trabalho em trás anos
(governo calculou dez anos), era o Digetos ou Pandectas.

Na Constituição ―Deo auctore de conceptione Digestorum‖, de


15/12/530, Justiniano expôs seu programa referente à obra, que se
diferenciava do Código, por não ter havido anteriormente trabalho do
mesmo género. A massa da jurisprudência era enorme, foram
pesquisados mais de 1500 livros escritos por jurisconsultos da época
clássica Ao todo o trabalho forma um texto de 150 000 linhas. O
Digesto teve um terço tirado das obras de Ulpiano, um sexto das de
Paulo. Já em 426 a Lei das Citações tinha dado força de lei aos escritos
de cinco dos juristas da época clássica: Gaio, Papiniano, Paulo,
Ulpiano e Modestino

O Digesto continua a ser a principal fonte para o estudo e


aprofundamento do Direito Romano, o compreendem 50 livros,
distribuídos em 7 partes. Os livros são divididos em títulos, os títulos
em fragmentos estes em principium e parágrafos. Os fragmentos são
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numerados e indicam o nome do jurisconsulto que os redigiu, bem


como o livro da obra originária.

As Institutas ou Institutiones Justiniani ou Elementa formam um


Manual de Direito Privado Romano, destinado ao ensino do Direito
em Constantinopla. As Institutas tiveram por modelo os Comentários
de Gaio. Obra muito mais clara e sistemática que o Digesto, foi
redigida por dois professores, Doroteu e Teófilo, sob a orientação de
Triboniano. Em 533 Justiniano aprovou o texto e deu-lhe força de lei.

O Novo Código ou Segundo Código tornou-se necessário, por que


entre a publicação do Codex Vetus e o Digesto, várias novas
constituições foram publicadas. Esse segundo Código foi publicado em
534, seguindo o mesmo sistema do anterior é dividido em 12 livros,
subdivididos em títulos e estes em constituições.

O Código começa por uma invocação a Cristo, afirmando a fé de


Justiniano. Os outros Títulos do Livro I são consagrados às fontes do
Direito, ao direito de asilo a às funções públicas. O Livro II trata do
processo. Os Livros III a VIII trata do direito privado, o Livro IX cuida
do Direito Penal e os Livros X a XII tratam de Direito Administrativo e
Fiscal.

As Novelas ou Autênticas são formadas por um conjunto de novas


Constituições Imperiais, decretadas por Justiniano, entre 535 e 565. A
maioria foi escrita em língua grega e contém reformas importantes, no
direito hereditário e matrimonial. Elas foram registadas e conservadas
nos arquivos do palácio, sendo divulgadas, mais tarde em colecção
sem o cunho oficial.

Entre essas colecções se distingue a elaborada por Juliano, professor


de Constantinopla. Essa é a mais antiga colecção acompanhada de 125
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novelas intitulada Juliani Novellarum Epítome, e a organizada por


João de Antioquia. Merece destaque, também, o Corpus
Authenticarum, tanto na versão latina como na grega, pois respeita
integralmente a letra e o espírito das novelas de Justiniano. As
Novelas latinas e gregas, acrescidas de outros elementos, passaram a
fazer parte do Corpus Juris com o nome de Authenticae seu Novellae
Constitutiones Divi Justiniani.

Sumário
A questão das fontes em direito é os elementos essencial, entendemos
fontes no sentido jurídico como as diversa formas de revelação do
direito, de acordo com a evolução historia e alteração das instituições
políticas do direito romano foi evoluindo, e em cada período foram
identificadas diversificadas fontes.

Assim em Roma desenvolveram-se as seguintes fontes: Origens -


Costume e leis régias, Antigo Direito - Lei das XII Tábuas e legislação
posterior; Período Clássico – Leis Costume Éditos dos Magistrados,
Responsa Prudentium, Senatusconsultos, Constituições Imperiais
,Período do Baixo-império ou Bizantino - Constituições Imperiais antes
de Justiniano A Jurisprudência As compilações de Justiniano

Exercícios de Auto-Avaliação

1. Identifique a primeira «lei» escrita romana. Lei redigida a


pedido dos plebeus que se sentiam desprotegidos face aos
patrícios que aplicavam a justiça baseados no costume oral.
Resposta: A lei das XII Tabuas.
2. No Império Romano do século VI d.C., o Imperador Justiniano,
desenvolveu um importante trabalho legislativo. No século XVI
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d.C., esses trabalhos foram compilados. Identifique o «nome»


dado à compilação.
Resposta: Corpo Juris Civil

Exercícios
1. Na linguagem jurídica o quei são fontes de direito
2. Nos períodos Clássico e Pós-Clássico, o Imperador romano
criava direito. Identifique a «fonte de direito» descrita No
contexto do período clássico do direito romano, explique as
diferenças entre estas três fontes de direito: Édito do
Magistrado Senatusconsultos e «Respostas dos Prudentes».
3. No Império Romano do século VI d.C., o Imperador Justiniano,
desenvolveu um importante trabalho legislativo. No século XVI
d.C., esses trabalhos foram compilados. Identifique o «nome»
dado à compilação.
4. A jurisprudência é uma das mais importantes heranças que nos
deixou o Direito Romano. Explique a diferença entre a
Jurisprudência Clássica, a Jurisprudência nos dois períodos pós-
clássicos (antes e depois de Justiniano).
5. Na sua opinião o direito Romano influenciou de alguma forma
o direito moderno.
6. No direito actual em Moçambique, é possível encontrarmos
marcas ou traços de Direito Romano? Justifique apresentando
exemplos.

Exercícios Gerais do Tema


1. Caracterize o direito da Grécia antiga?
2. Identifica a influência Grega no Direito Romano.
3. Identifica as fontes de Direito Romano no Período da Realeza.
4. Identifique as Instituições políticas no direito romano durante
o período de Dominado.
5.Identifique no direito Romano as magistraturas com e sem império
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TEMA - IV: História do Direito na Idade Media


UNIDADE Temática 4.1. O Direito Canónico

UNIDADE Temática 4.2. Historia do Direito Hebraico

UNIDADE Temática 4.3. O Direito no Egipto e na Mesopotâmia

UNIDADE Temática 4.1. O Direito Canonico.

Introdução
Esta unidade pretende dotar os estudantes no concernente ao direito
canónico, fornecer subsídio sobre as várias etapas do direito canónico,
identificar a área de jurisdição do direito canónico.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Caracterizar a área de jurisdição do eclesiástico.

 Identificar a competência dos tribunais eclesiásticos.


Objectivos
 Descrever a evolução do direito Canónico

 Caracterizar as Fontes de Direito no Direito Canónico

 Explicar a Jurisdição Eclesiástica


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5.1.1. Jurisdição Eclesiástica: Competência na Época do apogeu


(Séculos X a XV)
Nesta época, as jurisdições laicas estão em plena decadência na
sequência do enfraquecimento do poder real pelo feudalismo. A igreja
na maior parte da Europa ocidental, atinge o seu apogeu e teve a
possibilidade de conhecer um largo domínio de poder judicial, mesmo
em relação ao leigos.

Os tribunais eclesiásticos eram competentes para julgar em razão da


Personalidade ou em razão da matéria.

Em razão da personalidade os tribunais eclesiásticos eram


competentes para julgar:

 Os eclesiásticos, tanto clérigos regulares como clérigos seculares,

 Os cruzados (aqueles que tomaram a cruz, que partem em


cruzadas);

 Os membros da universidade (professores e estudantes), uma vez


que as universidades eram eclesiástica até então.

 As viúvas e órfãos quando pediam protecção a igreja.

Em razão da matéria eram competentes em:

 Em certas matérias penais e civis, julgavam todas as pessoas, leigos


e clérigos. Em matéria penal julgam todas as pessoas:

 Em caso de alguma outras infracções, desde que atentassem


contra as regras canónicas. Ex. Adultério, usura.

 Em caso de infracções contra a religião (heresia, feitiçaria, etc)

Em matéria civil, as jurisdições eclesiástica são competentes para


julgar todas constatações que digam respeito á:

 Beneficio eclesiástico (rendimentos atribuídos a um eclesiástico


sobre os bens da igreja para permitir exercer a sua missão),
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

 Ao casamento e todas as matérias conexas,

 Aos testamentos (quando estes continham um legado pio a favor


de uma instituição eclesiástica).

5.1.2. Formação do Direito Canónico


Desde as decisões do Concílio de Jerusalém (Act. 15, 1-33), e perante
os problemas surgidos no decorrer da sua expansão, a Igreja viu-se na
necessidade de definir a doutrina e de estabelecer regras de conduta.

Do Século I ao Século IV, os membros da Igreja sofreram perseguições


e torturas. Cada comunidade cristã era dirigida por um Bispo. O Bispo
e os seus colaboradores formavam o Clero, que se reunia em Concílios
ecuménicos, universais e regionais. As decisões desses Concílios
receberam o nome de Cânones8 ou Decretos.
Com a oficialização da Religião Cristã no Império Romano (a. 380),
deu-se a cristianização das instituições jurídicas, por um lado, e a
romanização das instituições jurídicas da Igreja, por outro. A Igreja
passou a ser uma instituição do Império Romano; daí que as
organizações eclesiásticas se tenham adaptado ao sistema de
organização do próprio Império. (p. e., diocese era uma circunscrição
administrativa do Império Romano e é uma circunscrição eclesiástica
administrada por um bispo ou por um arcebispo.) O Direito Divino (Ius
Divinum) contido nas Sagradas Escrituras já não era suficiente para o
governo da Igreja e das relações com os povos que constituíam ou
vinham chegando ao Império.
A Igreja, espalhada pelo vasto Império, teve que legislar sobre muitas
situações concretas, leis que algumas vezes foi alterando e adaptando
às diversas regiões do mesmo Império. Apareceram heresias que se
tornou necessário combater.
A Igreja sempre foi realizando Concílios Ecuménicos, quer para
condenar essas heresias, quer para debater e fixar verdades de fé e
normas eclesiásticas.9 Fez-se a distinção entre pecado e delito. Por
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

isso, tratou de maneira diferente o que dizia respeito ao foro interno,


envolvendo dispensas e graças, e aquilo que conduzia a julgamento e
condenação, ou seja, que dizia respeito ao foro externo. E surgiram os
tribunais eclesiásticos para dirimir conflitos e a Penitenciaria para
atender às questões do foro interno.
Nessa época, a legislação canónica mais importante era constituída
pelos Cânones dos Concílios e pelas Cartas Decretais do Bispo de
Roma.
A partir do século V, a par do Direito Romano clássico, conservado no
Código de Teodósio e no Corpus Iuris Civilis (530-565), compilação esta
mandada executar pelo Imperador Justiniano composta por quatro
livros (Codex Justiniano,10 Digesto ou Pandectas, Institutiones
Justiniani e Novellae ou leis novas), foi-se formando um Direito
Canónico já bem delineado, provindo sobretudo dos Concílios e
Pontífices Romanos11 e posteriormente elaborado pelos Canonistas.
Lembremos que é a partir do século VIII que ao conjunto das leis
eclesiásticas se começa a chamar Direito Canónico. Até Graciano, o
Direito Canónico não aparecia separado da Teologia. Desde o Decreto
de Graciano (1140) até ao Concílio de Trento, a ciência canónica foi
ganhando forma. A partir de Trento até ao Código de 1917 é o período
das Institutiones Canonicae. Depois do Código de 1917, começa o
período dos grandes Comentários. A própria jurisprudência canónica
contribuiu para profunda reflexão pós-conciliar acerca da revisão do
Código.
Hoje podemos dizer que o Direito Canónico é constituído pelo direito
divino, natural positivo contido na Sagrada Escritura e na tradição e
que a Igreja propõe ou declara, pelas leis e decretos do Papa e dos
concílios ecuménicos, pelas concordatas entre a Santa Sé e as nações,
pelas leis civis que a Igreja faz suas, dando-lhes valor no foro canónico,
e pelas leis e decretos de certas autoridades como sejam concílios
particulares, bispos superiores e capítulos de certos institutos
religiosos.
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5.1.3. Desenvolvimento do Direito Canónico


A partir dos séculos VII e VIII, com as invasões dos povos que possuíam
um direito consuetudinário, a Igreja sofreu grande impacto e no século
XI começou a acentuar-se uma certa tendência para a centralização na
pessoa do Papa. Essa centralização contribuiu para que as Cartas
Decretais do Bispo de Roma tivessem ainda maior importância.
Lembremos, a esse propósito, a importância da chamada Reforma
Gregoriana que se deve ao Papa Gregório VII. O poder espiritual e
pontifical do Papa atingiu, então, o seu apogeu, suplantando, muitas
vezes, o poder dos Reis das Nações da Europa.
O Direito da Igreja, em constante construção e produzido em função
das necessidades que iam surgindo, passou a ser o Direito Novo que
mantinha a ideia de unidade nos povos da Europa Ocidental, já que o
Direito Romano, com a queda do Império Romano do Ocidente, em
476, e com a pulverização de Estados, perdera o seu vigor e passou a
ser considerado o Direito Antigo.

A subsistência do Direito Romano e da sua influência ao longo dos


tempos deve-se à sua recepção pelo próprio Direito Canónico e ao seu
estudo nas Universidades25. Por influência do Cristianismo, o antigo
Direito Romano foi suavizado e modificadas algumas das suas
prescrições menos conformes com a doutrina cristã. Foram os
próprios canonistas que estudaram o direito civil romano e iniciaram o
movimento de formação do Ius Commune ou Utrumque Ius, ao longo
do século XII, considerado o Direito Comum da Cristandade e da
Europa pós-clássica ou medieval.
Podemos referir que também dos Povos invasores do Império e nele
fixados, por direito de conquista ou acordo com os Romanos,
provieram algumas normas, embora de reduzida projecção, como, por
exemplo, do direito germânico acerca do regime beneficial (benefícios
eclesiásticos) e o cômputo dos graus de parentesco, ou do Código
Visigótico ou Liber Iudicialis para a Península Ibérica.

25
Códigos de Teodósio e das leis de Justiniano.
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Com efeito, o Utrumque Ius formado pelo Direito Romano e pelo


Direito Canónico era o direito comum pelo qual se regia a Cristandade
do Ocidente. As pessoas eram simultaneamente súbditas dos Estados
e membros da Igreja. Por isso, podemos afirmar que a ideia de
unidade, nomeadamente ao nível espiritual, não desapareceu graças à
Igreja e ao próprio Direito Canónico.
Nessa época, o Direito Canónico era integrado por um conjunto de
princípios e doutrinas que foram passando para os direitos modernos
dos Estados, sobretudo latinos, como o reconhecimento da liberdade
e igualdade de todos os cidadãos, a regulamentação do casamento e
muitas normas do direito processual civil e criminal. Assim, para uma
completa compreensão e interpretação do conteúdo desses direitos,
tem que se ter em conta aquele elemento básico da sua formação
histórica, já pelas relações com o Direito Canónico, já pelo papel que a
Igreja desempenhou ao longo dos tempos. Através dos textos
legislativos eclesiásticos conhecem-se os principais factos da vida
social dos povos.
Actualmente podemos encontrar nos ordenamentos jurídicos civis
normas de recepção do Direito Canónico ao nível do matrimónio
canónico e das pessoas jurídicas canónicas, assim como encontramos
no Direito Canónico normas que remetem para as leis civis, a
denominada canonização de leis civis, que se verifica por acto pelo
qual a autoridade eclesiástica competente declara que certas leis civis
são também obrigatórias no foro canónico.

Assim, no Código de Direito Canónico de 1917 já pudemos encontrar


exemplos de canonização de leis civis relativas aos contratos nos
cânones 33 § 2 e 1529, à adopção como impedimento matrimonial nos
cânones 1059 e 1180, à prescrição no cânone 1508, à transacção no
cânone 1926, à dispensa de certas testemunhas comparecerem nos
tribunais eclesiásticos no cânone 1770 §2 1.º, ao carácter público de
certos actos e sua força probatória nos cânones 1823 § 2 e 1814, à
forma dos testamentos e outras disposições de última vontade nos
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cânones 581 § 2, 1301 e 1513 § 1, à administração de bens


eclesiásticos no cânone 1523.
No Código de 1983 também encontramos exemplos de canonização
de leis civis. O cânone 22 reza que:
"As leis civis para que remete o direito da Igreja, observem-se no
direito canónico com os mesmos efeitos, desde que não sejam
contrários ao direito divino e a não ser que outra coisa se determine
no direito canónico."
Outros exemplos se encontram nos cânones 98 § 2 e 1479, relativos à
constituição de tutores, no cânone 110, relativo à adopção, no cânone
197, relativo à prescrição, no cânone 1105 § 2, relativo a procurações
para matrimónio, no cânone 1290, relativo a contratos, no cânone
1500, relativo a acção possessória, no cânone 1714, relativo a
transacção, compromisso e juízo arbitral, e no cânone 1716, relativo a
confirmação e impugnação de sentença arbitral.
Importa referir que o Direito Canónico regulava as matérias em
relação ao direito privado, até há pouco mais de um século. Por
exemplo, os registos de nascimento, de casamento e de óbito era a
Igreja que os fazia e possuía nos seus arquivos. Em Portugal, até 1911,
a única lei que regulamentava a celebração do matrimónio era a da
Igreja. Aliás, deste o século XVI, ainda antes mas sobretudo a partir do
Concílio de Trento, que a Igreja tem normas precisas sobre a
celebração e registo dos matrimónios26.
A própria divisão administrativa do território em freguesias ou
paróquias teve por base a do foro eclesiástico. Freguesia era a parte
do território de uma diocese sob a direcção de um pároco e o
conjunto dos seus habitantes, os fregueses ou paroquianos. Diremos
que a freguesia é uma entidade de origem eclesiástica que durante
muitos séculos não teve qualquer influência na administração civil.
Com efeito, desde a ocupação romana até 1830, a freguesia não era

26
Pelo decreto Tametsi, de 1563, o Concílio de Trento decidiu que o consentimento
dos noivos deveria ser perante duas testemunhas e pedido pelo pároco, terminando,
assim, os chamados casamentos surpresa.
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uma autarquia local. De 1830 até 1878 houve grande indecisão e


turbulência civil. A partir de 1878, com o Código Administrativo de
Rodrigues Sampaio, as freguesias são incorporadas no sistema
nacional da Administração Pública consolidando-se como autarquias
locais e tendo à frente a Junta de Parochia.
Como diz o Professor Freitas do Amaral:
"Gradualmente, na área da freguesia (paróquia religiosa), a
comunidade de pessoas que aí viviam foi sentindo a
necessidade de encarregar alguém de resolver os problemas
comuns para manter a ordem, a paz, a boa convivência entre
todos quantos ali habitavam. Começaram então a surgir
órgãos eleitos pela população residente, pelos vizinhos. E
assim nasceu o fenómeno autárquico."27
Hoje existe a freguesia como autarquia local, de direito civil, e a
paróquia como jurisdição eclesiástica, de direito canónico.
Para regular as relações entre os Estados e a Santa Sé, no respeito não
só pela liberdade religiosa mas também pelas tradições e cultura dos
povos, existe o direito internacional corporizado em Concordatas,
Acordos, Tratados ou Concórdias. Entre a Santa Sé (Igreja) e o Estado
Português (Portugal), celebraram-se muitas concordatas, pactos, para
resolver problemas entre os dois poderes, estabelecer modus vivendi,
conceder privilégios, estabelecer a paz, questões de jurisdição
eclesiástica e civil e dos bens da Igreja. Os mais antigos pactos
bilaterais estipulados entre a Santa Sé e os Monarcas portugueses
datam da Primeira Dinastia. A última Concordata entre o Estado
Português e a Santa Sé foi assinada na cidade do Vaticano em 18 de
Maio de 2004.

5.1.4. Colecções de Cânones


A palavra cânone vem do grego que significa regra ou bitola. Daí o
"Cânone dos livros da Bíblia" colecção normativa dos Livros Sagrados e
da Fé, a contrapor a quaisquer outros.
27
Cf. Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, pp. 517-519.
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Para os primitivos escritores cristãos cânones eram as normas da fé e


as normas da verdade
Para o direito canónico os cânones podem ser as normas de vida de
certas comunidades clericais ou religiosas e formas breves e
condensadas das definições dogmáticas dos concílios. Mas o sentido
principal e o mais antigo e generalizado de cânone é o de lei
eclesiástica ou de cada um dos seus artigos, distinguindo-se, assim,
das leis civis. Já desde o Concílio de Niceia (325) os cânones se
distinguiam das leis civis. Todavia, quer os cânones, quer as leis civis
são direito. Ubi homo, ibi ius.

Sabemos que desde os tempos da Igreja primitiva se estabeleceu o


costume de coligir os sagrados cânones, a fim de os tornar conhecidos
e mais facilmente poderem ser aplicados, nomeadamente pelos
ministros sagrados a quem não era lícito ignorar os cânones, como
advertia o Papa Celestino em carta aos Bispos da Apúlia e da Calábria
(dia 21 de Julho de 429).

O Clero estudava as Sagradas Escrituras, os Cânones e as Cartas


Decretais. O IV Concílio de Toledo (a. 633) prescreveu "os sacerdotes
saibam as sagradas escrituras e os cânones" porque "se deve evitar,
principalmente nos sacerdotes de Deus, a ignorância, mãe de todos os
erros" (cân. 25; Mansi, X, col.627).

Os primeiros códigos de leis estão datados dos tempos antes da


entrada da era cristã. As leis do Antigo Testamento foram sendo
codificadas ao longo dos séculos, figurando especialmente no
Pentateuco (a Thorah). O mais importante deste código é o Decálogo
(Ex 20,2-17; Dt 5,6-21; cf. Mt 5,17-48), seguindo-se o "Código da
Aliança" (Ex 20,22-23,19), o "Código Deuteronómico" (Dt 11,29 a
26,15), o "Código da Santidade" (Lv 17,1 a 26,46) e o "Código
Sacerdotal" (Lv 1,1 a 16,34).
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As colecções de normas escritas na Igreja surgiram logo de início com


o objectivo de transmitir ciência a todos sobre a existência dessas
normas e zelar pela sua uniformidade. Há sinais de codificação destas
leis desde o Papa Celestino (século V) e do Concílio de Toledo do ano
633. Ao longo dos séculos foram aparecendo diversas colecções de
cânones.

Nos dez primeiros séculos, floresceram numerosas colectâneas de leis


eclesiásticas, na sua maior parte de alcance particular ou regional, nas
quais se continham normas dadas principalmente pelos Concílios e
pelos Romanos Pontífices e outras tiradas de fontes menores. Era
bastante comum surgirem algumas normas contrárias em diversas
colecções de uma região que entravam em conflito com as de outra.

4.1.5. O Decreto de Graciano


Dada a diversidade de normas e colecções, o Clero, que devia
conhecer os Cânones dos Concílios e as Cartas Decretais, sentia
alguma dificuldade. Havia, na verdade, várias colecções de Cânones e
de Cartas Decretais já compiladas. Essas colecções eram necessárias
para o ensino dos Cânones nas escolas20 e nas Universidades28 que a
Igreja ia fazendo desabrochar por toda a Europa.

Pessoas interessadas na conservação dessas colecções foram fazendo


compilações das mesmas. Porém, para além da sua conservação e
estudo, era necessário harmonizá-las, sistematizá-las e codificá-las,
dar-lhes uma nova e coerente organização.

Ora, no século XII, o monge camaldulense João Graciano, mestre de


Teologia que ensinava Direito Canónico em Bolonha, no Mosteiro de S.
Félix e Nabor, tomou a iniciativa de compilar de novo o acervo destas

28
As mais antigas Universidades são: Bolonha, Paris, Oxford e Salamanca. Em
Portugal, no final do século XIII, foi acordado entre o Rei D. Dinis e o Papa Nicolau
IV (Bula De Statu Regni Portugaliae,
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colecções e normas existentes. Uniu as diversas compilações de


normas, harmonizou-as e deu-lhes uma organização que até aí não
tinham, ou seja, para além de compilar os cânones conciliares, as
decretais e outros textos patrísticos, introduziu simultaneamente
comentários de natureza consuetudinária com que procurava
encontrar um sentido de coerência entre os vários cânones. A esses
comentários aos cânones estabelecidos chamou "Dictum". A essa obra
deu o título de Concordia Discordantum Canonum, mas é vulgarmente
conhecida por Decretum ou Decreta.

Bolonha já era célebre pelos estudos de Direito Romano, mas os


teólogos ainda não tinham uma codificação como os romanistas. O
Decreto de Graciano, colecção privada que alcançou notoriedade no
foro e nas escolas, veio marcar o início de uma nova época na história
do Direito Canónico. O seu êxito fez esquecer todas as colecções
canónicas existentes. Trata-se, na verdade, de um trabalho de grande
valor intrínseco e perfeição, uma séria concordância de leis e de
colecções.

O Decreto de Graciano foi dividido pelos seus comentadores em três


partes. A primeira compreende 101 distinções que tratam de uma
maneira geral das fontes do Direito Canónico, dos clérigos e da
disciplina eclesiástica. A segunda divide-se em 36 causas subdivididas
em questões sobre direito patrimonial, procedimento judicial, simonia,
direito matrimonial e um tratado sobre a Penitência. A terceira,
denominada De consecratione, compreende 5 distinções e trata de
matéria sacramental e matéria litúrgica.

Graciano não pretendeu fazer um Código, mas os seus sucessores


tomaram-no como uma Corporis Iuris Canonici pars prima, um
verdadeiro tratado para o ensino do Direito. Os decretistas eram os
juristas que comentavam o Decretum. Pouco a pouco, as margens dos
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manuscritos do Concordia Discordantum Canonum foram-se enchendo


de glosas que depois se organizaram numa glosa ordinária tornada de
uso comum nas escolas e a que, depois do IV Concílio de Latrão
(1215), João Teutónico deu redacção definitiva. Foi refundida, mais
tarde, por Bartolomeu de Bréscia, passando a acompanhar o texto do
Decretum mesmo nas primeiras edições impressas.

A Igreja nunca o promulgou como autêntico e, por isso, a obra


conservou sempre o carácter de colecção privada, embora de grande
valor doutrinal e histórico e de uso constante nas Universidades e nos
tribunais. Certo é que, nos séculos seguintes, outras normas foram
acrescentadas sem que tenha havido a preocupação de uni-las num
único compêndio.

4.1.6. O Corpus Iuris Canonici


Depois do Concordia Discordantum Canonum, e seguindo o modelo
estabelecido por Graciano, destacam-se as seguintes colecções:
Decretais de Inocêncio IV e Gregório IX, Decretales extra Decretum
Gratiani vagantes (Extravagantes), coligidas por S. Raimundo de
Peñaforte, por ordem de Gregório IX (1230), que este Papa promulgou
como autêntica pela Bula Rex pacificus (5.9.1234); o Liber Sextus de
Bonifácio VIII promulgada autenticamente pela Bula Sacrosanctae
(3.3.1298); e as Compilationes antiquae (Latrão IV, 1215).

As Decretais promulgadas por Gregório IX, mediante a Constituição


Rex Pacificus, de 5.9.1234, são uma colecção autêntica, unitária,
exclusiva e universal, dividida em cinco livros redigidos por S.
Raimundo de Peñafort.

O Decreto de Graciano veio a constituir a primeira parte da grande


colecção das leis da Igreja (Corporis Iuris Canonici pars prima) que, a
exemplo do Corpo de Direito Civil (Corpus Iuris Civilis) do Imperador
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Justiniano, foi chamada Corpus Iuris Canonici (Corpo de Direito


Canónico), um trabalho muito importante que deu um forte
contributo para a formação do que mais tarde veio a ser o Código de
Direito Canónico.

Podemos dizer que o Corpus Iuris Canonici constitui o direito clássico


da Igreja Católica. Contém as normas mais antigas, ou seja: o "Decreto
de Graciano"; o "Livro Extra" de Gregório IX; o Liber Sextus de
Bonifácio VIII; a colecção de Clemente V, conhecida por "Clementinas"
e promulgada por João XXII pela Bula Quoniam nulla (25.10.1317); as
Decretais "Extravagantes" de João XXII e as Decretais "Extravagantes
Comuns" de vários Romanos Pontífices nunca reunidas numa colecção
autêntica, que são colecções meramente privadas começadas a
organizar por professores de Direito Canónico e, finalmente, dispostas
em duas colecções sistemáticas pelo editor João Chappuis, em 1500.

Contudo, cada volume continuou a manter o título das colecções


respectivas até que o Papa Gregório XIII, depois de ter mandado fazer
uma revisão, aprovou o texto emendado pelo Breve Quum pro munere
pastorali (1.7.1580). Só a partir dessa data se passou a usar a
expressão Corpus Iuris Canonici. A 1.ª edição é a de Lião, 1671.

De certo modo, ao Corpo de Direito Canónico (Corpus Iuris Canonici)


da Igreja Latina corresponde a Colecção de Cânones Syntagma
Canonum ou "Corpo Oriental de cânones" da Igreja Grega.
As leis seguintes, quer as promulgadas no tempo da Reforma católica
pelo Concílio de Trento22, quer as emanadas posteriormente dos
diversos Dicastérios da Cúria Romana, nunca foram compiladas numa
colecção, o que provocou uma incerteza jurídica e pôs em perigo a
disciplina da Igreja.
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Sumário
O direito canónico aparece no período do feudalismo, as
relações sociais eram baseadas nas relações de vassalagem,
numa altura em que vigora a descentralização do poder e o
enfraquecimento do poder Real, nessa época o clero ganha
importância, marcando toda a idade média, todas as fontes
vão estar intimamente ligado a religiosidade, varias foram as
fontes de direito nessa época, as concordatas, os decretos
(Canos), os decretais, acreditasse se tratar de um direito divino,
o costume e os princípios do direito Romano, este conjunto de
legislação extravagante vão dar origem ao movimento
codificador onde vamos encontrar o corpus iuris canonici com
5 parte: decreto de Graciano, os decretais de Gregório, o livro
sexto, as clementinas e as leis extravagantes de João e as
extravagantes comum, outra codificação importante foi o
codex iuris canonici.

Exercícios de Auto-Avaliação
1. Identifique que «compilação de direito canónico» é
constituída pelo Decretum de Graciano, pelas Decretais de
Gregório IX, pelo Livro VI, pelas Constituições Clementinas
e pelas Extravagantes do Papa João XII?
Resposta: Corpo Ius cânones.
2. Diferencia nas fontes do direito Canónico as Decretais e
Decretos.
Resposta: Decretais – são escritos dos papas, respondendo a uma
consulta ou a um pedido emanado de um bispo ou uma alta
personalidade eclesiástica enquanto os Decretos ou Cânones são
decisões dos consílios. Entre estes os mais importantes são os
concílios ecuménicos, assembleias-gerais de todos os bispos da
cristandade
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Exercícios
1. Identifica as fontes de direito no direito canónico.
2. Explica o princípio de personalidade, nas competências das
jurisdições dos Tribunais eclesiástico.
3. Identifica a fonte de Direito elaborado pelos Papa.
4. Identifica a Fonte de Direito elaborado pelos Bispos.
5. Como era composto o corpus ius cânones.
6. Os crimes de sacrilégio, heresias, feitiçarias onde eram Julgados,
no tribunal comum ou eclesiástico. Justifica.

UNIDADE Temática 4.2. Historia do Direito Hebraico

Introdução
Nesta Unidade pretendesse ampliar os horizontes no que concerne ao
Direito praticado na sociedade hebraica antiga, bem como conhecer
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um pouco de sua história, costumes e a influência que suas práticas


legais e morais têm nas diversas culturas da sociedade actual.

Abordaremos inicialmente os aspectos históricos e religiosos do povo


hebreu na era pré-cristã e a forma como a religião influenciou
directamente no surgimento das leis hebraicas. Em seguida, faremos
uma análise das fontes do direito hebraico, incluindo algumas citações
do Talmud e do Torah, que são os principais registos do ordenamento
hebreu.

No capítulo seguinte, faremos uma análise de alguns exemplos da


aplicação das normas em casos concretos e concluiremos com
observações de como o direito hebraico influencia o direito
contemporâneo.

Ao completar esta unidade , você será capaz de:

 Descrever as características do Direito Hebraico

 Caracterizar as Fontes de Direito


Objectivos

5.2.1. O Direito Hebraico Antigo: Características

O Direito Hebraico Antigo tem base religiosa, foi dado por Deus ao
seu povo através de Moisés. As suas normas são, portanto,
imutáveis. Encontramos essa mesma característica também do
direito canónico e no direito muçulmano, nos quais os rabinos ou
sacerdotes dotados de autoridade interpretavam-no, adaptando
as leis de acordo com a evolução social.
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O Direito Hebraico Antigo possuía um sistema judiciário complexo,


composto por três tribunais, com funções específicas:

 Tribunal dos três: julgava alguns delitos e todas as causas


de interesse financeiro;

 Tribunal dos vinte e três: Julgava as apelações e processos


relativos a crimes punidos com pena de morte;

 Tribunal dos Setenta: Magistratura suprema dos hebreus.


Tinha a incumbência de interpretar a lei e julgar
senadores, profetas, chefes militares e tribos rebeldes.

Além das Leis Mosaicas, um amplo conjunto de normas régia a


sociedade hebraica, presentes no Torah (Pentateuco), cuja escrita
é atribuída a Moisés e é composto por cinco livros:

- Géneses; Êxodo; Levítico; Números; Deuteronômio.

4.2.2.Fontes Da Lei

Diferentemente de algumas outras sociedades da antiguidade,


que nos deixaram diversos registos de suas leis, a única fonte para
o estudo do direito hebraico é o Torah (Pentateuco). Além da lei
positivada, os hebreus também adoptavam um amplo conjunto de
costumes e normas morais, que eram transmitidas oralmente. A
partir do segundo século da nossa era, iniciou-se um registo
escrito dessa tradição, que foi chamado de Mishna. Dos estudos
do Mishna surgiu aGuemara, a junção de ambos originou
o Talmud.

Imagem 1: TORAH
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Fonte: Araujo (2011)

4.2.2.1.Talmud

O Talmud é a compilação de toda a tradição oral dos Hebreus, foi


transmitida por Moisés aos seus sacerdotes e sábios, que
transmitiram de geração em geração. Observamos que, enquanto
o Torah consiste basicamente em um código de leis, o Talmud é
muito mais uma compilação de preceitos e costumes da sociedade
hebraica antiga.

A Estrutura do Tamud é dividida em sei Ordens, cada Ordem se


subdivide em tratados e os tratados se dividem em Capítulos. Ao
todo são 63 tratados que abordam assuntos de naturezas diversas
como crimes, família e moral. Apresentamos a seguir alguns
trechos do Talmud:

“Quem salva uma vida salva o mundo inteiro." “A máxima


sabedoria é a bondade." “O maior herói é aquele que faz do
inimigo um amigo.” “Não consideres o vaso, mas o seu conteúdo.”
“Não escolhas para amigo um homem de mau caráter.” “Uma
palavra vale uma moeda. O silêncio, duas.” “O homem que
cometeu um erro e se sente envergonhado tem a sua falta
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perdoada.” (CITAÇÕES DO TALMUD - Disponível em


<http://pt.wikiquote.org/wiki/Talmud> Acesso em: 01 abr. 2011).

4.2.2.2. Torah

Apesar de ser a única fonte disponível para o estudo do direito


Hebraico, o Torah é originalmente um livro de relatos históricos.
Em alguns trechos encontramos especificamente os códigos de
leis, principalmente no livro Êxodo e em alguns trechos de
Deuteronômio.

a) O Decálogo

O Decálogo constitui o cerne do direito hebraico, é composto


pelas leis gravadas em pedra e entregue por Deus a Moisés.

1. Então falou Deus todas estas palavras, dizendo:

2. Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa


da servidão.

3. Não terás outros deuses diante de mim.

4. Não farás para ti imagem esculpida, nem figura alguma do que


há em cima no céu, nem em baixo na terra, nem nas águas
debaixo da terra.

5. Não te encurvarás diante delas, nem as servirás; porque eu, o


Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais
nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me
odeiam.

6. E uso de misericórdia com milhares dos que me amam e


guardam os meus mandamentos.
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7. Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão; porque o


Senhor não terá por inocente aquele que tomar o seu nome em
vão.

8. Lembra-te do dia do sábado, para o santificar.

9. Seis dias trabalharás, e farás todo o teu trabalho;

10. Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor teu Deus. Nesse dia
não farás trabalho algum, nem tu, nem teu filho, nem tua filha,
nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o
estrangeiro que está dentro das tuas portas.

11. Porque em seis dias fez o Senhor o céu e a terra, o mar e tudo
o que neles há, e ao sétimo dia descansou; por isso o Senhor
abençoou o dia do sábado, e o santificou.

12. Honra a teu pai e a tua mãe, para que se prolonguem os teus
dias na terra que o Senhor teu Deus te dá.

13. Não matarás.

14. Não adulterarás.

15. Não furtarás.

16. Não dirás falso testemunho contra o teu próximo.

17. Não cobiçarás a casa do teu próximo, não cobiçarás a mulher


do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi,
nem o seu jumento, nem coisa alguma do teu próximo. (Êxodo
20:1-17)

4.2.3 – Institutos e Normas


ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

O código da aliança, registado no livro Êxodo e reiterado nos


demais livros do Pentateuco, possui diversas normas e directrizes
que regem diversos institutos sociais. Veremos a seguir alguns dos
principais institutos, e algumas passagens que exemplificam as
normas aplicadas.

a) Direito à vida e à integridade física

O Direito à vida e à integridade é assegurado em diversos trechos


do livro sagrado.

1. Quem ferir a seu pai, ou a sua mãe, certamente será morto.

2. Quem furtar algum homem, e o vender, ou mesmo se este for


achado na sua mão, certamente será morto.

3. Quem amaldiçoar o seu pai ou a sua mãe, certamente será


morto.

4. Se dois homens brigarem e um ferir ao outro com pedra ou


com o punho, e este não morrer, mas cair na cama,

5. Se ele tornar a levantar-se e andar fora sobre o seu bordão,


então aquele que o feriu será absolvido; somente lhe pagará o
tempo perdido e fará que ele seja completamente curado.

6. Se alguém ferir a seu servo ou a sua serva com pau, e este


morrer debaixo da sua mão, certamente será castigado. (Ex.
21:15-20)

b) Trabalho e dignidade

Encontramos no Torah normas que asseguram aos trabalhadores


o direito a receber o fruto do seu trabalho, e regulamentam a
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escravidão que era permitida em algumas situações.

1. Se te for vendido um teu irmão hebreu ou irmã hebréia, seis


anos te servirá, mas no sétimo ano o libertarás.

2. E, quando o libertares, não o deixarás ir de mãos vazias;

3. Liberalmente o fornecerás do teu rebanho, e da tua eira, e do


teu lagar; conforme o Senhor teu Deus tiver abençoado te
darás.

4. Pois lembrar-te-ás de que foste servo na terra do Egito, e de


que o Senhor teu Deus te resgatou; pelo que eu hoje te ordeno
isso. (Dt. 15:12-15)

5. Não oprimirás o trabalhador pobre e necessitado, seja ele de


teus irmãos, ou seja dos estrangeiros que estão na tua terra e
dentro das tuas portas.

6. No mesmo dia lhe pagarás o seu salário, e isso antes que o sol
se ponha; porquanto é pobre e está contando com isso; para
que não clame contra ti ao Senhor, e haja em ti pecado. (Dt.
24:14-15)

C) Herança e Sucessão

Por tradição, o direito à herança era do filho primogénito que


eram beneficiados em detrimento dos outros filhos.

1. Se um homem tiver duas mulheres, uma a quem ama e outra a


quem despreza, e ambas lhe tiverem dado filhos, e o filho
primogénito for da desprezada,

2. Quando fizer herdar a seus filhos o que tiver, não poderá dar a
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

primogenitura ao filho da amada, preferindo-o ao filho da


desprezada, que é o primogénito;

3. Mas ao filho da aborrecida reconhecerá por primogénito,


dando-lhe dobrada porção de tudo quanto tiver, porquanto
ele é as primícias da sua força; o direito da primogenitura é
dele. (Dt. 21:15-17)

d) Casamento e Família

O Instituto da família está entre as principais bases da sociedade


hebraica, a lei pregava então o carácter sagrado e inviolável do
casamento, bem como preceitos morais relativos ao adultério.

1. Quando um homem tomar uma mulher e se casar com ela, se


ela não achar graça aos seus olhos, por haver ele encontrado nela
coisa vergonhosa, far-lhe-á uma carta de divórcio e lha dará na
mão, e a despedirá de sua casa.

2. Se ela, pois, saindo da casa dele, for e se casar com outro


homem,

3. e este também a desprezar e, fazendo-lhe carta de divórcio, lha


der na mão, e a despedir de sua casa; ou se este último homem,
que a tomou para si por mulher, vier a morrer;

4. Então seu primeiro marido que a despedira, não poderá tornar


a tomá-la por mulher, depois que foi contaminada; pois isso é
abominação perante o Senhor. Não farás pecar a terra que o
Senhor teu Deus te dá por herança.

5. Quando um homem for recém-casado não sairá à guerra, nem


se lhe imporá cargo público; por um ano inteiro ficará livre na sua
casa, para se regozijar com a sua mulher, que tomou. (Dt. 24:1-5)
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

10. O homem que adulterar com a mulher de outro, sim, aquele


que adulterar com a mulher do seu próximo, certamente será
morto, tanto o adúltero, como a adúltera.

11. O homem que se deitar com a mulher de seu pai terá


descoberto a nudez de seu pai; ambos os adúlteros certamente
serão mortos; o seu sangue será sobre eles.

12. Se um homem se deitar com a sua nora, ambos certamente


serão mortos; cometeram uma confusão; o seu sangue será sobre
eles. (Lv. 20:10-12)

e) Lei e Punição

Em caso de violação das normas, o Torah também previa como os


julgamentos e decisões deveriam ser proferidas, e como os
castigos e sanções deveriam ser aplicados.

1. Se no meio de ti, em alguma das tuas cidades que te dá o


Senhor teu Deus, for encontrado algum homem ou mulher que
tenha feito o que é mau aos olhos do Senhor teu Deus,
transgredindo o seu pacto [...],

2. E isso te for denunciado, e o ouvires, então o inquirirás bem; e


eis que, sendo realmente verdade que se fez tal abominação
em Israel,

3. Então levarás às tuas portas o homem, ou a mulher, que tiver


cometido esta maldade, e apedrejarás o tal homem, ou
mulher, até que morra.

4. Pela boca de duas ou de três testemunhas, será morto o que


houver de morrer; pela boca duma só testemunha não
morrerá [...].
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

5. Se alguma causa te for difícil demais em juízo, entre sangue e


sangue, entre demanda e demanda, entre ferida e ferida,
tornando-se motivo de controvérsia nas tuas portas, então te
levantarás e subirás ao lugar que o Senhor teu Deus escolher;

6. Virás aos levitas sacerdotes, e ao juiz que houver nesses dias, e


inquirirás; e eles te anunciarão a sentença do juízo.

7. Depois cumprirás fielmente a sentença que te anunciarem no


lugar que o Senhor escolher; e terás cuidado de fazer
conforme tudo o que te ensinarem.

8. Conforme o teor da lei que te ensinarem, e conforme o juízo


que pronunciarem, farás da palavra que te disserem não te
desviarás, nem para a direita nem para a esquerda. (Dt. 17:2,
4-6, 8-11).

9. Se houver contenda entre alguns, e vierem a juízo para serem


julgados, justificar-se-á ao inocente, e ao culpado condenar-se-
á.

10. E se o culpado merecer açoites, o juiz fará que ele se deite e


seja açoitado na sua presença, de acordo com a gravidade da
sua culpa.

11. Até quarenta açoites lhe poderá dar, não mais; para que,
porventura, se lhe der mais açoites do que estes, teu irmão
não fique envilecido aos teus olhos. (Dt. 25:1-3)

Sumário
O Direito Hebraico Antigo tem base religiosa, foi dado por
Deus ao seu povo através de Moisés. As suas normas são,
portanto, imutáveis. Encontramos essa mesma característica
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

também do direito canónico e no direito muçulmano, nos quais


os rabinos ou sacerdotes dotados de autoridade
interpretavam-no, adaptando as leis de acordo com a evolução
social.

Exercícios de Auto-Avaliação
1. O Direito Hebraico Antigo possuía um sistema judiciário complexo,
composto por três tribunais, com funções específicas. Identifique e
caracterize-os:

Resposta: Tribunal dos três: julgava alguns delitos e todas as causas de


interesse financeiro; Tribunal dos vinte e três: Julgava as apelações e
processos relativos a crimes punidos com pena de morte; Tribunal dos
Setenta: Magistratura suprema dos hebreus. Tinha a incumbência de
interpretar a lei e julgar senadores, profetas, chefes militares e tribos
rebeldes.

2. Diferencia o Talmud e Torah.

Resposta: Talmud é a compilação de toda a tradição oral dos Hebreus,


foi transmitida por Moisés aos seus sacerdotes e sábios, que
transmitiram de geração em geração. Enquanto o Torah consiste
basicamente em um código de leis, o Talmud é muito mais uma
compilação de preceitos e costumes da sociedade hebraica antiga.

Exercícios
1. Identifica Identifique as fontes de Direito no Direito
hebraico?
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

2. Identifique a principal fonte do direito hebraico e


caracterize-as
3. O sistema jurídico hebraico possui uma característica de
complexidade na organização judicial. Como era
caracterizada esta estrutura judiciária.
4. Seria possível no mundo actual em Moçambique a

aplicação de normas religiosas.


5. Porque que o adultério era considerado um crime muito
grave no direito hebraico?
6. Como era tratado o direito sucessório no direito hebraico?
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

UNIDADE Temática 4.3. O Direito no Egipto e na Mesopotamia

Introdução
Nesta Unidade pretendesse ampliar os horizontes no que concerne ao
conhecimento do direito nas primeiras sociedades de estratificação
social, tanto no Egipto como na mesopotâmia, foi desenvolvido um
sistema judicial baseado na religião e na moral, abordaremos nesta
unidades como se manifestava este direito no que diz respeito ao
Egipto e Mesopotâmia.

Ao completar esta unidade , você será capaz de:

 Explicar a relação entre a religião e o direito no Egipto,


 Analisar as fontes do direito no Egipto antigo e na
Mesopotâmia,
Objectivos
 Descrever a influencia da escrita no processo legislativo,
 Explicar a importância do Código de Hamurrabi na
Mesopotâmia.

4.3.1. O Direito no Antigo Egipto

No Egipto Antigo a manifestação do dever ser estava ligado à


moral, à religião e à magia. Os princípios morais orientavam tanto
o elaborador quanto o aplicador da norma. Esta era legitimada
pela crença de que emanava da divindade, e a conduta contrária à
prevista era considerada não só anti-jurídica mas também
herética, pois assim descumpria-se a vontade dos deuses. A arte
de fazer direito é mágica assim como sua interpretação e
aplicação. Ritualística tal qual a cultura jurídica mesopotâmica, o
Direito entre os egípcios seguia sob o símbolo de Maet. Esta,
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

conforme explica António Brancaglion Junior, é uma “ordem moral


e cósmica que abrangia as noções de ‘verdade’, ‘justiça’,
‘equilíbrio’ e ‘ordem’, personificada como uma deusa, filha do
deus-sol *Rá ou Ré+” (2004, p.59).

Este princípio divino de ordem protegia a sociedade do caos e da


destruição. Não é a toa que o controle omnipresente de Maet (ou
Maat) era tido como a razão para o Egipto ter-se constituído como
o mais duradouro império da antiguidade oriental, quando por
volta de 3000 a.C. constituiu-se como Estado soberano e
unificado, sob méritos de Menés. Esta simbologia, também
compreendida como um princípio jurídico e filosófico actuava não
só entre os vivos como também na vida post mortem. Ela “é
protagonista da maior importância no julgamento dos mortos, no
Tribunal de Osíris; [era] colocada na balança para equilibrar o
coração do julgado” *CUNHA: (s.d.), p.13+.

Na Mesopotâmia o campo jurídico restringia-se à experiência em


vida, até porque os mesopotâmicos não acreditavam na vida pós-
morte. No Egipto a experiência pós túmulo também pretendia o
controle da ordem, pois na cultura egípcia acreditava-se que o
mundo dos vivos e o mundo dos mortos mantinham estreita
relação. Se porventura a desordem reinasse numa dessas
dispensações, a outra parte poderia ser afectada. Daí porque Maat
está tanto num quanto noutro mundo para manter o equilíbrio na
inter-relação entre ambos.

A normatividade pré-jurídica da Civilização do Nilo além de ser


indissociável do mito e da religião, também se mostra sintonizada
com o poder. A cultura jurídica desse povo favorecia o domínio do
Estado sobre o indivíduo e, por consequência, do social, pois como
esclareceu Weber a sociedade é feita de indivíduos portadores da
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

unidade compreensível da acção que mantém referência à


conduta de outrem. A sacralidade do Direito egípcio garantiu aos
faraós longos anos de reinado com raros períodos de turbulência.
A organização político religiosa do Império consagrava o rei como
uma espécie de divindade. Ele era a principal fonte do Direito e da
religião. Desobedecê-lo era conduzir-se contra os deuses e ignorar
a ordem, a justiça e a verdade (Maet).

A promulgação de uma sentença não carecia de apelação haja


vista ter-se definido-a em cooperação com os deuses,
omnipresentes e omniscientes. Eles vêem e sabem de tudo, logo,
suas decisões são verdadeiras e justas. Mas esta constatação não
pode ocultar o fato de que possivelmente em algumas situações
uma decisão jurídica tenha sido questionada e o réu tenha
solicitado o veredicto do próprio Faraó. O poder divino dessa
figura podia ser considerado a “Constituição” do Egipto Antigo. Daí
porque para uma segurança jurídica ele deveria ser evocado.

O Vizir era o principal encarregado de aplicar a lei. Esse era o título


dado ao bem-aventurado que era concomitante sacerdote da
deusa Maat e funcionário real, incumbido de ser juiz na solução
das lides.

Como esclareceu Cristiano Pinto “a jurisdição era titularizada pelo


Faraó que poderia a seu critério, delegar funcionários
especializados para a tarefa de decidir questões concretas” (2002,
p.52). Como não havia um código sistematizado de leis escritas, tal
qual o Código de Hamurrabi, o guia para orientar o aplicador do
direito consistia basicamente nas prescrições do rei para o plano
do sollen (dever ser) e nas instruções para o campo do sein (ser).
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Muito mais que isso, o corpo das decisões dos especialistas


(chamados não só a aplicar a norma mas também a pensar sobre o
próprio fenómeno jurídico) contava no momento do julgamento e
constituída conteúdo de novas normas. Ou seja, dado um fato
novo seria submetido a uma valoração subjectiva, no que
resultava em proposições normativas objectivadas. É a dialéctica
da polaridade do tridimensionalismo de Miguel Reale: Fato, Valor.

Norma numa relação dinâmica. Além de tudo isso, também se


desenvolveu no Egipto, como produto cultural, um sistema de leis
baseadas no costume. Desde o período pré dinástico (5500-3050
a.C) o direito costumeiro teve sua importância a ponto de
posteriormente se impor até mesmo ao Faraó. “No Egipto, então,
havia um direito consuetudinário (a permanência do “ontem
eterno”, como diria Weber) e corpos de leis , orientados de acordo
com a determinação do soberano” (NASCIMENTO: 2002, p.21).

O Rei era o juiz supremo e podia julgar qualquer questão. Mas


também havia “juízes singulares, que julgavam as causas menores,
e um tribunal composto de 31 membros, que julgava as causas
mais importantes” (Ibidem, p.122). O povo egípcio concebeu essa
forma jurídica que foi o retrato de sua época, espaço e cultura.
Não só isso mas a própria forma daquela civilização enxergar o
mundo circundante. “O direito será sempre uma manifestação
cultural. Inserido invariavelmente no mundo da cultura, ele
implica, nessa vocação para a ordem, a cosmisação do mundo”
(POLETTI: 1996, p.85)

4.3.2. O Direito na Mesopotâmia: Características Gerais

Na Mesopotâmia encontraremos um direito menos fragmentário e


uma ideologia normativa mais consolidada. Naquela região
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banhada pelos rios Tigres e Eufrates desenvolveu-se não uma


civilização, mas civilizações das quais as mais importantes foram
os sumérios e acádios (2800-2000 a.C), paleobabilônio (amoritas;
2000-1600 a.C), assírios (1300-612 a.C) e neobabilônios (caldeus;
612- 539 a.C). Caracterizada por um território frequentemente
invadido e de uma instabilidade política, Ciro, em 539 antes de
nossa era, comandou os persas na invasão e domínio definitivo
sobre a região.

No que tange à cultura (na qual está inserido o direito) sua


essência não foi destruída pelos invasores, tendo estes na verdade
incorporado-a às suas próprias expressões culturais. O sistema
jurídico mesopotâmico, por exemplo, apresentou uma influência
para muito além de sua época e espaço. Para se ter ideia, muitas
das questões normatividades no nosso actual Código Penal
estabelecem uma equivalência comparativa com o Código de
Hamurrabi: o papel da testemunha; o furto; a difamação; o
estrupo; a vingança etc. Este código jurídico antigo, promulgado
aproximadamente em 1750 a.C, compõe-se de três partes:
introdução, texto propriamente dito e conclusão. Há nos 282
artigos determinações respeitantes aos delitos, à família, à
propriedade, à herança, às obrigações, muitos artigos de direito
comunitário e outros relativos à escravatura.

Essas leis defendiam, especialmente, os direitos e interesses de


cúpula da sociedade babilónica. Esta, à época de Hamurábi, estava
dividida em três classes sociais: Awilum (homens livres, cidadãos);
Muskênum (funcionários públicos); Wardum (escravos,
prisioneiros de guerra). No topo da pirâmide social estava o
Imperador e sua família, seguidos pelos nobres, sacerdotes,
militares e comerciantes. Artesãos, camponeses e escravos
compunham as camadas não privilegiadas. O direito, nesse
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

contexto, objectivava manter a ordem estabelecida e garantir a


permanência da estrutura sociopolítica das Cidades-Estado.

Haja vista a divisão da sociedade em classes e o desejo de poder


dos líderes políticos, não seria difícil constatar o princípio da
desigualdade perante a lei. Mas não podemos esquecer que este
conjunto de leis sistematizadas apresentou algumas tentativas
primeiras de garantias dos direitos humanos.

Vale aqui a anotação de Walter Viera do Nascimento de que no


sistema babilónico a posição da mulher na sociedade já lhe
concedia direitos equiparados aos do homem (2002, p.23). “
Legislador babilónico consolidou a tradição jurídica, harmonizou
os costumes e estendeu o direito e a lei a todos os súbitos29”.

Outros estudiosos preferem afirmar que o referido rei foi não o


legislador mas o compilador. “Tudo indica, na verdade, que se
trata de uma grande compilação de normas anteriormente
dispostas em outros documentos e de decisões tomadas em casos
concretos, que serviram de base para a elaboração dos artigos”
(PINTO: 2002, p.48).

De uma ou de outra forma o certo é que esse sistema jurídico


serviu de orientação aos aplicadores do direito e manteve por um
considerável período a coesão social. Como destacou Jayme de
Altavila (2001, p.59), o rei jurista deixou em seu código muita
punição, muita justeza e muito rigor. Dada a inexistência da
gradação da pena, crimes das mais diversas espécies (uns menos
outros mais graves) eram punidos com a pena de morte, e a lei de
talião (“olho por olho e dente por dente”) era o princípio básico
que regia a aplicação das leis. Mas em tudo a finalidade é fazer

29
Disponível em Biblioteca Virtual de Direitos Humanos. USP.
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justiça, ou nas palavras do próprio Hamurábi registradas no


preâmbulo de seu código, “trazer justiça à Terra” (apud
GAVAZZONI:2005, p.34).

Se no Egipto a deusa Maat simbolizava a justiça e a verdade, na


Mesopotâmia esse papel era desempenhado por UTU (Shamasch
em acádio) 4, o deus do Sol e da justiça. O conjunto de leis do rei
Hamurábi não foi o mais antigo já descoberto. “Ao longo dos três
milénios de história, os mesopotâmicos criaram os mais antigos
códigos de leis conhecidos: Ur-Nammu (2100 a.C); Lipit-Istar (1930
a.C); Leis de Esnunna 1800 a.C); e o Código de Hamurábi (1750
a.C), sendo os dois primeiros escritos em sumério e os dois últimos
em acádio” *POZZER: (s.d.), p.12+.

Imagem 1: Códigos da Babilónia

Código de Ur-Nammu Código de Hamurrabi

Código de Lipit-Ishtar

A arte de fazer direito na Mesopotâmia também se caracterizou


pelos aspectos simbólicos da cultura jurídica da região. Assim
como no Egipto, a sacralização da justiça mesopotâmica ou ainda
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a expressão jurídica do sagrado permitiu a interconexão entre o


Universo Jurídico (da esfera real) e o Universo Sobrenatural (da
esfera mágica), representadas por suas práticas marcadas por essa
íntima ligação. Marcelo Rede5 apresenta como os principais
elementos simbólicos: o juramento em nome dos deuses,
entendidos como a fonte do direito; e o ordálio, um ritual em que
a pessoa mergulha no rio6 para ser julgada: se sobrevivesse, era
inocente; se morresse afogada, era culpada e recebia o castigo
merecido (2006, p.2 e 3).

Por vezes a solução das lides era remetida ao julgamento divino.


Mas, a Assembleia dos magistrados (UNKIN em sumério e puhrum
em acádio) tinha competência para julgar os casos civis, penais,
políticos ou administrativos. Dessa assembleia também
participavam membros do Conselho de Anciãos da cidade e
cidadãos comuns. “Os juízes eram homens letrados, que teriam
frequentado a escola dos escribas.” *POZZER: (s.d.), p.3+.

Eles eram chamados de DIKU e não eram remunerados, recebiam


apenas presentes (sulmânu) das partes requerentes. Muitas
outras considerações poderiam ser feitas, mas as já apresentadas
são suficientes para compreendermos que as formas do direito se
apresentar são delineadas no processo histórico. Para entendê-las
é preciso conhecer a cultura dos povos numa relação espácio-
temporal. Por isso, a Teoria do Culturalismo Jurídico permite-nos
vislumbrar o Direito em sua inter-relação necessária com a
História.

Sumário
A normatividade pré-jurídica da Civilização do Nilo além de ser
indissociável do mito e da religião, também se mostra sintonizada com
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

o poder. A cultura jurídica desse povo favorecia o domínio do Estado


sobre o indivíduo e, por consequência, do social, pois como esclareceu
Weber a sociedade é feita de indivíduos portadores da unidade
compreensível da acção que mantém referência à conduta de outrem.
A sacralidade do Direito egípcio garantiu aos faraós longos anos de
reinado com raros períodos de turbulência. A organização político
religiosa do Império consagrava o rei como uma espécie de divindade.
Ele era a principal fonte do Direito e da religião.
Na Mesopotâmia encontraremos um direito menos fragmentário e
uma ideologia normativa mais consolidada, Caracterizada por um
território frequentemente invadido e de uma instabilidade política,
Ciro, em 539 antes de nossa era, comandou os persas na invasão e
domínio definitivo sobre a região.
No que tange à cultura (na qual está inserido o direito) sua essência
não foi destruída pelos invasores, tendo estes na verdade
incorporado-a às suas próprias expressões culturais. O sistema jurídico
mesopotâmico, por exemplo, apresentou uma influência para muito
além de sua época e espaço

Exercícios de Auto-Avaliação
1. Qual era o objectivo do código de Hamurrabi?
Resposta: o Objectivo do código de Hamurrabi era de unificar o
reino de acordo com a mesma cultura e mesmas leis.
2. Quais os códigos criados pelos povos da mesopotâmia?
Resposta: Ao longo dos três milénios de história, os
mesopotâmicos criaram os mais antigos códigos de leis
conhecidos: Ur-Nammu (2100 a.C); Lipit-Istar (1930 a.C); Leis
de Esnunna 1800 a.C); e o Código de Hamurábi (1750 a.C),
sendo os dois primeiros escritos em sumério e os dois últimos
em acádio”.
3. No Egipto o que simbolizava deusa Maat?
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Resposta: A Deusa Matt era símbolo de justiça

Exercícios
1. Apresente as semelhanças do direito Egípcio e o Direito na
Mesopotâmia.

2. Qual a importância do código de Hamurrabi na


mesopotâmia?

3. Caracterize o código de Hamurrabi.

4. Qual a influência do Faraó no direito Egípcio.

5. Ate que ponto o modelo jurídico usado na Mesopotâmia e


Egipto favorecia a submissão do povo ao estado.

6. No Egipto a deusa Maat simbolizava a justiça, identifique


na mesopotâmia a figura que desempenhava o mesmo
papel.

Exercícios da Tema:
1. Identifique as fontes do Direito Canónico.

2. Qual a competência dos tribunais eclesiásticos em


razão de matéria civil.

3. Explique a relação entre a religião e o direito no Egipto.

4. Identifique as fontes do Direito hebraico.

5. O que entende por corpo do Direito canónico.


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TEMA - V: História do Direito na Idade Moderna


UNIDADE 5.1. A Idade Moderna Séc. (XV - XVIII)

UNIDADE Temática 5.1. A idade Moderna sec (XV - XVIII)

Introdução
Esta unidade pretende dotar os estudantes de conhecimentos
inerentes a principais factores que ditaram a entrada nessa nova fase
histórica que é a era moderna. A idade moderna traz consigo uma
grande mudança em todos os aspectos da vida que directamente vai
influência a formação dos direitos dos Estados.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Descrever os principais fenómenos da era moderna.

 Caracterizar o direito face as novas tendências globais


Objectivos
 Explicar a influências dos novos fenómenos para a evolução do
Direito.

 Explicar a influência do iluminismo na evolução e Estado de


direito.

5.1.1. Marcos da Era Moderna


Os séculos XV e XVI marcam o começo de um período histórico
chamado Idade Moderna, que se estende até o final do século
XVIII. Os grandes acontecimentos se destacam nesse período são:
a Expansão Marítima, o Absolutismo Monárquico o Renascimento
a Reforma Protestante, o Novo Cristianismo e Jusnaturalismo.
Estudaremos nesta unidade a influencia destes fenómenos de uma
forma generalizadas sobre o Direito.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Expansão Marítima - A Expansão Marítima européia é o processo


histórico ocorrido entre os séculos XV e XVII, contribuindo para
que a Europa superasse a crise dos séculos XIV e XV, mas
principalmente para a formação embrionária dos Estados
Nacionais e das Monarquias Absolutistas, que ocorreram não de
forma linear, mas sim, sempre respeitando as peculiaridades de
cada povo.

Absolutismo Monárquico – O Absolutismo monárquico é a


primeira forma de Estado Nacional, burocrático e centralizado, em
que o rei avoca a si as funções executivas, legislativa e judiciária,
fazendo prevalecer um só direito sobre as dispersas normas
consuetudinárias locais.

Renascimento - Renascimento, Renascença ou Renascentismo são


os termos usados para identificar o período da História da Europa
em que ela sai da época das trevas para a retomada da cultura
humana que por séculos ficou aprisionada nos mosteiros da Igreja
Católica Apostólica Romana. O Renascimento apesar de estas
transformações serem bem evidentes na cultura, sociedade,
economia, política e religião, ela é a maior característica da
transição do feudalismo para o capitalismo

Em resumo podemos afirmar que o Renascimento cultural firmava


novos valores e princípios, contestando os valores medievais e
feudais. Trata-se de uma volta deliberada, que propunha a
ressurreição consciente (o re-nascimento) do passado,
considerado agora como fonte de inspiração e modelo de
civilização.

Reforma Protestante foi o movimento político sob disfarce


ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

religioso, ou seja, luta das classes abastadas, principalmente os


novos proprietários rurais capitalistas, contra os monopólios
altamente lucrativos da Igreja Católica Apostólica Romana.
Durante a Reforma Protestante O homem renascentista,
começava a ler mais e formar uma opinião cada vez mais crítica.
Trabalhadores urbanos, com mais acesso a livros, começaram a
discutir e a pensar sobre as coisas do mundo surgem as nações-
estados.

A Europa começa a se fragmentar em países independentes


politicamente uns dos outros. Surgem países como a Inglaterra,
França, Espanha, Portugal, etc. Com isso é natural o desejo de
cada governante de sentir-se livre de um poder central e
dominador que era o papado. No campo político, os reis estavam
descontentes com o papa, pois este interferia muito nos
comandos que eram próprios da realeza. E o resultado foi a
nascimento do Direito desligado das imposições centralizadas do
Papado e o aparecimento de um direito laico e tipicamente
nacional, pois a missão central do governante era manter a
segurança e a paz. Maquiavel sustentava que a virtú (a força
criativa) do governante era a chave para a manutenção da sua
posição e o bem-estar dos súbitos.

Novo Cristianismo. A Igreja até o séc. XVIII era favorável à


monarquia absoluta, oferecendo a ideologia que sustentava a tese
da origem divina do poder. Já o cristianismo primitivo, ao
contrario, continha uma mensagem de libertação do homem na
sua afirmação da dignidade eminente da pessoa humana. A
doutrina do Direito Natural dos séculos XVII e XVIII, fundada na
natureza racional do homem, sustentava as teses dos direitos
inatos, ou seja, direitos comuns a todos os homens, situados no
plano dos valores absolutos, universais e intemporais.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

O conceito de dignidade da pessoa humana, como categoria


espiritual, como subjectividade, que possui valor em si mesmo,
como ser de fins absolutos, e que, em consequência, é possuidor
de direitos subjectivos ou direitos fundamentais e possui
dignidade, surge da ideia de Igualdade Humana, ensinada
inicialmente pelos Estóicos30 e aprofundada por Paulo que em sua
carta aos gálatas afirma: não pode haver judeu nem grego; nem
escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós
sois um só em Jesus Cristo31.Da ideia da igualdade humana o
Cristianismo, desenvolveu com maior profundidade e força a
teoria da dignidade da pessoa humana com a chamada filosofia
patrística78e posteriormente com a escolástica32

O Jusnaturalismo. A Teoria do Direito Natural é muito antiga, vem


da civilização grega e está presente entre nós desde o nascimento
da civilização europeia. O Direito Natural, seja expressão da
natureza humana, seja dedutível dos princípios da Razão, sempre
foi considerado como superior ao Direito Positivo.

Direito Natural é o Direito concebido sob a forma abstracta,

30
O Estoicismo foi fundado no século III a.C., por Zenão de Cítio, é uma doutrina filosófica que
propõe viver de acordo com a lei racional da natureza e aconselha a indiferença (apathea) em
relação a tudo que é externo ao ser. O homem sábio obedece a lei natural reconhecendo-se
como uma peça na grande ordem e propósito do universo. A ética estóica influencior o
pensamento ético cristão nos seus primórdios.Cf. PAULO, Apóstolo de Jesus, Bíblia Sagrada -
Novo Testamento, (GL. 3.28).
31
A Patrística, termo que designa a filosofia cristã nos primeiros séculos da nossa era, ou seja,
o período do pensamento cristão que se seguiu à época neotestamentária, e chega até ao
começo da Escolástica: isto é, os séculos II-VIII da era vulgar. Este período da cultura cristã é
designado com o nome de Patrística, porquanto representa o pensamento dos Padres da
Igreja, que são os construtores da teologia católica, guias, mestres da doutrina cristã.
Portanto, se a Patrística interessa sumamente à história do dogma, interessa assaz menos à
história, em que terá importância fundamental a Escolástica.
32
A Escolástica, pode ser definida como o conjunto de doutrinas teológico-filosóficas
dominantes na Idade Média, dos séc. IX ao XVII, caracterizadas, sobretudo pelo problema da
relação entre a fé e a razão, problema que se resolve pela dependência do pensamento
filosófico, representado pela filosofia greco-romana, à teologia cristã. Desenvolveram-se na
escolástica inúmeros sistemas que se definem, do ponto de vista estritamente filosófico, pela
posição adotada quanto ao problema dos universais e dos quais se destacam os sistemas de
Santo Anselmo (anselmiano), de São Tomás (tomismo) e de Guilherme de Occam
(occamismo).
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

correspondendo a uma ordem de justiça; não é criação do


homem, pois não depende de ato de vontade. O Direito Natural
pode ser considerado como a Génese do Direito, por reflectir
exigências sociais de natureza humana e servir de paradigma em
que se deve inspirar o legislador, ao editar suas normas, pois é
nele que o Estado, a colectividade e o próprio homem vão buscar
os princípios fundamentais de respeito à vida, à liberdade e aos
seus desdobramentos lógicos.

“O Direito Natural é revelado pela conjugação da experiência e


razão. É constituído por um conjunto de princípios, e não de
regras, de carácter universal, eterno e imutável33 O Direito Natural
tem influenciado reformas jurídicas e políticas, que mudaram os
rumos da humanidade, como, por exemplo, é o caso da
Declaração de Independência dos Estados Unidos (1776);
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução
Francesa (1789); Declaração Americana dos Direitos e Deveres do
Homem, da OEA (1948); e a Declaração Universal dos Direitos
Humanos, da ONU (1948).

Do exposto, poderemos concluir que o jusnaturalismo é a mais


tradicional corrente do pensamento jurídico, sustentando sempre
a existência de um Direito Natural, superior ao Direito Positivo.
Apesar das várias crises e críticas, ela tem-se mantido fiel ao
princípio de que o direito Natural, como direito justo por natureza,
independente da vontade do legislador, derivado da natureza
humana (jusnaturalismo) ou dos princípios da razão
(jusracionalismo), sempre presente na consciência de todos os
homens e superior ao Direito Positivo.

5.1.2. Condições, Objectivas e Subjectivas que Propiciaram a

33
PAULO Nader, Introdução ao Estudo do Direito, , op. Cit. p. 77.
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Formulação dos Direitos Fundamentais e Estatais

a) Condições Objectivas (materiais, reais ou históricas)


a evolução do capitalismo, que primeiramente apoiou o Estado
Absolutista do séc. XVII e em seguida (séc. XVIII), se revoltou
contra ele; a contradição entre uma superestrutura atrofiada do
Estado e a sociedade progressista resultante do capitalismo,
posteriormente, a Revolução Industrial e a Convocação dos
Estados Gerais, ou seja, a monarquia feudal convidando o terceiro
estado (povo) para colaborar com o governo.

b) Condições Subjectivas (ideais ou lógicas).


-A doutrina do Direito Natural dos séculos XVII e XVIII, fundada
na natureza racional do homem, sustentava as teses dos direitos
inatos, ou seja, direitos comuns a todos os homens, situados no
plano dos valores absolutos, universais e intemporais.

Pensamento Iluminista surgiu na França do século XVII e defendia


o domínio da razão sobre a visão teocêntrica que dominava a
Europa desde a Idade Média.

Processo Histórico-dramático das Condições Económicas - o


aparecimento do proletariado, sujeito ao domínio da burguesia,
deu novas condições materiais para fundamentar a origem dos
direitos Sociais e Económicos. Essas novas fontes de Direitos
Públicos e, principalmente, os Direitos Fundamentais são:

Manifesto Comunista e as doutrinas marxistas - crítica ao


capitalismo burguês e ao sentido puramente formal dos direitos
do homem (séc. XVIII), postulando liberdade e igualdade material.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Doutrina Social da Igreja ou Pensamento Social Cristão é o


conjunto de ideias baseadas nos valores do cristianismo
procurando fundamentar uma ordem mais justa ao capitalismo .

5.1.3.A Ascensão e a Consolidação da Ordem Jurídica- Política


Burguesa do Século XVII ao Século XX

Estado de Natureza e Estado de Direito:


a) - O Estado de Natureza ou Estado Natural - para vários autores
é apenas uma construção teórica, nunca existiu, mas que era
preciso fazer essa construção para entender a formação da
Sociedade Civil. Com o aparecimento dos Estados Nacionais as
pessoas, apenas, eram submetidas à Lei da Natureza, pois elas
eram dotadas de razão e como ensina Locke, pelos princípios do
Direito Natural o ser humano tem direito sobre sua vida, liberdade
e bens. Visando a permanente protecção do Estado eles abdicam
dos seus Direitos Naturais em beneficio do Bem Comum e
mutuamente á formarem uma comunidade única e constituir um
único corpo político.

b) - O Estado de Direito - Estado de Direito é aquele em que o


poder exercido é limitado pelo Ordenamento Jurídico. É enfim
uma fórmula prestigiosa usada para definir a própria imagem da
civilização ocidental e para contrapô-la às outras civilizações, por
isso mesmo, é vista por várias culturas, principalmente as orientais
como uma pretensão universalista de inspiração neocolonial.

O Estado, assim, não poderá impor suas vontades que não tiverem
fixado em lei, e nem poderá actuar contra as leis existentes. Dessa
forma, o Estado deverá, além de acatar as leis, proteger sua
população, concedendo-lhe segurança, e sendo eficiente na busca
do bem comum.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

c) Do Iluminismo á Acção Concreta e Criadora do Direito


Publico.
Segundo os filósofos iluministas, esta forma de pensamento tinha
o propósito de iluminar as trevas em que se encontrava a
sociedade. Entre os principais filósofos do Iluminismo podemos
citar: John Locke (1632-1704), ele acreditava que o homem
adquiria conhecimento com o passar do tempo através do
empirismo; Voltaire (1694-1778), ele defendia a liberdade de
pensamento e não poupava crítica a intolerância religiosa; Jean-
Jacques Rousseau (1712-1778), ele defendia a ideia de um estado
democrático que garanta igualdade para todos; Montesquieu
(1689-1755), ele defendeu a divisão do poder político em
Legislativo, Executivo e Judiciário; O Iluminismo atingiu o seu
apogeu no século XVIII, que passou a ser conhecido como o Século
das Luzes. Ele foi mais intenso na França, onde influenciou a
Revolução Francesa através de seu lema: Liberdade, igualdade e
fraternidade. Também teve influência em outros movimentos
sociais como na independência das colónias inglesas na América
do Norte.

d) Liberalismo.
O liberalismo foi teoricamente defendido em 1689 por John Locke
em sua obra clássica, dois Tratados sobre Governo, ensinava que
o Estado foi criado para servir ao povo, e não para servir-se do
povo. Os liberais consideram o exercício da liberdade individual
como algo intrinsecamente bom, ou seja, um modo de entender a
natureza humana e uma proposta destinada a possibilitar que
todos alcancem o mais alto nível de prosperidade de acordo com
seu potencial, condição insubstituível para alcançar níveis óptimos
de progresso. Consideram, também, que a liberdade de possuir
bens (o direito à propriedade privada) parece-lhes fundamental, já
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

que sem ela o indivíduo se encontra permanentemente à mercê


do
Estado.

Outro expoente do liberalismo foi o escocês Adam Smith (1723-


1790) que no seu famoso trabalho, A Riqueza das Nações (1776),
tentou explicar como o mercado com certas precondições
naturalmente se auto-regularia por intermédio da agregação das
decisões individuais e produziria muito mais eficientemente do
que os pesados mercados regulados pelo Estado. Alguns
defendem que foi Adam Smith o verdadeiro criador do Liberalismo
Económico, ou seja, a Economia de Livre Mercado. Mas não
podem esquecer que foi John Locke o criador das bases
doutrinárias do Liberalismo Político que, inquestionavelmente,
inclui o Liberalismo
Económico.

Estado Liberal de Direito. Ele nasce no mundo das ideias da


filosofia política do liberalismo, preconizada por John Locke (1632
– 1704), barão de Montesquieu (1689 – 1755) e Immanuel Kant
(1724 – 1804) e cuidou de salvar a liberdade decompondo a
soberania na pluralidade dos poderes. A teoria tripartida dos
poderes, como princípio de organização do Estado constitucional,
é uma contribuição de Locke e Montesquieu. O Estado Liberal de
Direito apresenta três características básicas que são:

 Submissão ao imperio da lei, que era a nota primária de seu


conceito, sendo a lei considerada como ato emanado
formalmente do Poder Legislativo;
 Divisão de poderes, que separe de forma independente e
harmónica os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário;
 Enunciado e garantia dos direitos individuais. Essas
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

exigências continuam a ser postulados básicos do Estado de


Direito, que configura uma grande conquista da civilização
liberal.

Estado Social de Direito e Estado Democrático de Direito.


Pela peculiaridade do nosso trabalho, resumidamente, trataremos
desses tipos de Estados, pois os consideramos como uma evolução
natural da Codificação do direto Publico, principalmente do
Direito Constitucional.

a) - Estado Social de Direito. O Estado Liberal de Direito, debaixo


das pressões sociais e ideológicas do marxismo não sucumbiu, mas
se transformou no Estado Social de Direito, onde o qualificativo
social refere-se à correcção do individualismo clássico liberal pela
afirmação dos chamados direitos sociais e realização de objectivos
de justiça social, isto é, compatibilizar, em um mesmo sistema dois
elementos básicos: o capitalismo, como forma de produção, e a
consecução do bem-estar social geral, servindo de base ao
neocapitalismo, típico do Welfare State (Estado de Bem-Estar
Social) ou Estado-Providência.

b) - Estado Democrático de Direito é o estágio mais avançado da


evolução do Estado de Direito, ele tem a legitimidade justa (ou
Estado de Justiça material), fundante de uma sociedade
democrática qual seja a que instaure um processo de efectiva
incorporação de todo o povo nos mecanismos do controle das
decisões, e de sua real participação nos rendimentos da produção.
Poderíamos afirmar que Estado Democrático de Direito garante
não somente a protecção aos direitos de propriedade, mais que
isso, defende através das leis todo um rol de garantias
fundamentais, baseadas no chamado "Princípio da Dignidade
Humana.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Princípios básico do Estado Democrático de Direito:


 Democracia como processo de convivência numa sociedade
livre, justa e solidária;
 Soberania popular em que todo poder emana do povo, que
deve ser exercido em proveito do povo, directamente ou por
representantes eleitos;
 Direitos Fundamentais como um processo de liberação da
pessoa humana das formas de opressão que não depende
apenas do reconhecimento formal de certos direitos
individuais, políticos e sociais, mas especialmente da vigência
de condições económicas susceptíveis de favorecer o seu pleno
exercício”.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Sumário
Na presente unidade abordamos a respeito do direito na era
moderna, a era moderna considera a era dos descobrimentos,
varias movimentos culturais e sociais deram origem a um novo
paradigma social, todos contornos vão dar origem ao Estado
democráticos, estados de Direito, o iluminismo, a revolução
francesa, e as revoluções burguesas vão influenciar
directamente o direito na época.

Exercícios de Auto-Avaliação
1. Por palavras tuas explica a influência do iluminismo na
materialização e consolidação dos Estados democráticos e
de Direito.
Resposta: O iluminismo trás consigo, novos paradigmas,
sobretudo o lema que serve de base, liberdade, igualdade e
fraternidade, isso vai ajudar, na defesa das garantias e
contribuir para a queda do absolutismo monárquico e
instauração de uma monarquia constitucional e mais tarde
o estado democrático.

2. Identifica os principais iluministas.


Respostas: John Locke, Voltaire, Montesquieu, Jean-Jacques Rousseau.

3. Apresente 1 característica dos estados Liberais de Direito.


Resposta: O Estado Liberal de Direito apresenta três características
básicas que são: Submissão ao imperio da lei, que era a nota primária
de seu conceito, sendo a lei considerada como ato emanado
formalmente do Poder Legislativo; Divisão de poderes, que separe de
forma independente e harmónica os poderes Legislativo, Executivo e
Judiciário; Enunciado e garantia dos direitos individuais. Essas
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

exigências continuam a ser postulados básicos do Estado de Direito,


que configura uma grande conquista da civilização liberal.

Exercícios
1. Identifica os princípios básicos dos estados Democrático e de
Direito.
2. Qual foi a influência do liberalismo para a concretização do
estado liberal e de direito
3. Qual a importância do Montesquieu, na consolidação do
estado democrático e de Direito.
4. Identifique os marcos da idade moderna
5. Quais as condições objectivas e subjectivas que
proporcionaram a formulação dos Direitos fundamentais.
6. Identifique os princípios básicos do Estado democrático de
Direito.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

TEMA - VI: História do Direito na Idade Contemporânea


UNIDADE Temática 6.1. OS PRINCIPAIS SISTEMAS JURIDICOS CONTEMPORÂNEOS

UNIDADE Temática 6.1. Os Principais Sistemas Juridicos


Contemporaneos.

Introdução
Esta unidade pretende discutir, o direito na era contemporânea, mas
para um melhor debate cientifico nessa era muito se discute a questão
dos sistemas jurídicos, na presente unidade apresentaremos todos os
sistemas jurídicos mas iremos desenvolver apenas dois o common law
e o civil law, o primeiro pelo facto do nosso pais estar rodeado de
países que seguem este sistema o segundo, porque é o sistema
seguido por Moçambique.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Conceptualizar sistemas jurídicos.


Objectivo
s  Identificar os sistemas Jurídicos que vigoram no mundo,

 Destacar as principais diferenças entre o sistema common law e Civil Law

6.1.1. Conceito de Sistemas Jurídico

Sistema jurídico é o conjunto de normas jurídicas interdependentes, reunidas


segundo um princípio unificador, ou seja, a unidade lógica das regras, conceitos
princípios jurídicos que regem a aplicação do Ordenamento Jurídico de um país.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

O professor Canotilho ensina que o sistema jurídico deve ser visto como um
sistema normativo aberto de regras e princípios:
a) - É um sistema jurídico porque é um sistema dinâmico de normas;
b) - É um sistema aberto porque tem uma estrutura dialógica (Caliess) traduzida
na disponibilidade e capacidade de aprendizagem das normas constitucionais para
captarem a mudança da realidade e estarem abertas às concepções cambiantes
da verdade é da justiça;
c) - É um sistema normativo, porque a estruturação das expectativas referentes a
valores, programas, funções e pessoas, é feita através de normas;
d) - É um sistema de regras e de princípios, pois as normas do sistema tanto
podem revelar-se sob a forma de princípios como sob a sua forma de regras‖.
Cada país tem o seu sistema, mas levando em conta os princípios informadores
dos sistemas e os conceitos dos vários países. Eles podem ser estudados em
sistemas cujas unidades lógicas apresentam similitudes, como exemplo citamos:

 Sistema Romano-Germânico ou Continental (Civil Law);


 Sistemas mistos com o Civil Law;
 Sistema anglo-saxônico ou Common Law;
 Sistemas mistos com o Common Law;
 Sistema Consuetudinário;
 Sistemas mistos com o sistema consuetudinário;
 Sistema Mulçumano etc.
Dos sistemas citados estudaremos o Sistema Romano-Germânico ou Continental
(Civil Law) e o Sistema anglo-saxônico ou Common Law, o primeiro por ser o
sistema seguido por Moçambique eo segundo pelo facto de Moçambique estar
rodeado de países que seguem este sistema, falaremos apenas para percebermos
a dinâmica em direito comparado.

a) - Sistema Romano-Germânico ou Continental (Civil Law) - Notabiliza-se o


sistema germânico pela observância da lei, extraindo-se dela definições e
princípios gerais de maior ou menor abstracção que subsidiam a interpretação a
ser dada para o caso concreto. O juiz também pode se valer da analogia. O
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

costume é fonte legal, porém acessória de aplicação do direito, na Alemanha. A


doutrina não é propriamente considerada uma fonte de direito, mas é muito
respeitada e suas teses são objectos de discussão em processos judiciais. A
jurisprudência só possui a mesma força que uma norma legal quando oriunda do
Tribunal Constitucional sub forma de acórdão. Predominância do direito escrito.

O marco mais importante para a consolidação do Sistema Romano-Germânico foi


o início da sistematização ordenada, unificando as normas em um código
garantindo a partir daí a segurança do Direito. O movimento codificador europeu
que provocou uma verdadeira luta entre os corifeus da Escola Histórica,
principalmente Savigny e os juristas franceses liderados por Thibaut . Com a
codificação napoleônica em 1804 foi vencida resistência dos romanistas. Em 1° de
Janeiro de 1900 entrou em vigorou Código Civil alemão, conhecido pela sigla BGB.

Ensina Paulo Dourado de Gusmão:


“Dessas codificações resultou o que se convencionou chamar de sistema
continental, por dominar no continente europeu, também conhecido por sistema
de direito codificado ou, ainda, civil-law, cujas raízes encontram-se no direito
romano e no direito consuetudinário germânico. Daí ser também denominado
Sistema Romano-germânico. Compreende o grupo francês, tendo por ponto de
referência o Código Civil francês, e o grupo alemão, cuja fonte c influência é o
Código Civil alemão. Característica desses sistemas é ser a lei a fonte principal do
direito, sendo subsidiárias as demais fontes. Fora isso, a presença neles do direito
34
romano, do direito canónico e dos direitos germânicos”

.
Pertencem à família romano-germânica os direitos de toda a América Latina, de
toda a Europa continental, de quase toda a Ásia (excepto partes do Oriente
Médio) e de cerca de metade da África.

b) - Sistema Anglo-Saxônico, Common Law ou Sistema Anglo-Americano. O


Common Law é o sistema jurídico elaborado na Inglaterra a partir do Século XII,
em que o Direito se desenvolveu por meio das decisões dos tribunais, e não

34
Cf. PAULO DOURADO de Gusmão, Introdução ao Estudo do Direito, Rio de Janeiro:
Forense, 2002, p.307
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

mediante actos legislativos ou executivos como no Sistema Romano-Germânico. O


Common Law é o Direito criado ou aperfeiçoado pelos juízes: uma decisão a ser
tomada num caso depende das decisões adoptadas para casos anteriores e afecta
o direito a ser aplicado a casos futuros. Ensina John Gilissen:
“O common law é um judge-made-law, um direito jurisprudencial, elaborado
pelos juízes reais e mantido graças à autoridade reconhecida aos precedentes
judiciários. Salvo na época da sua formação, a leí não desempenha qualquer
papel na sua evolução. Mas, em consequência, o common law não é todo o
direito inglês; o statute law (direito dos estatutos, isto é, das Leis promulgados
pelo legislador) desenvolveu-se à margem do common law e retomou, sobretudo
no século XX, uma importância primordial, Anteriormente aos séculos XV e XVI,
tinha-se desenvolvido ao lado do common law, considerado então demasiado
arcaico, um outro conjunto de regras jurídicas, as de equity, aplicadas pelas
jurisdições do Chanceler; o common law conseguiu no entanto resistir à
influência da equity e mesmo dominá-la no século XVÍI; mas o direito inglês
conservou uma estrutura dualista até 1875, quando os dois sistemas foram mais
ou menos fundidos por uma reforma da organização judiciária. O direito inglês
moderno é por consequência muito mais históricos que os direitos dos países da
Europa Continental; não houve ruptura entre o passado e o presente, como a que
a Revolução de 1789 provocou em França e noutros países. Os juristas ingleses do
35
século XX invocam ainda leis e decisões judiciárias dos séculos XIII e XIV‖”.

Nesse sistema, quando não existe um precedente, os juízes possuem a autoridade


para criar o direito, estabelecendo um precedente. O conjunto de precedentes é
chamado de common law e vincula todas as decisões futuras. O precedente
judicial (sentença-padrão), fundado no princípio de dever haver julgamento
similar quando análogos forem os casos (ride ofprecedeni), é a fonte principal do
Direito em que a lei (statute law) desempenha papel secundário. Um precedente e
vinculará os tribunais futuros com base no princípio do stare decisis. Esse é o
cerne de todos os sistemas de common law O sistema de common law foi adotado
por diversos países do mundo, especialmente aqueles que herdaram da Inglaterra
o seu sistema jurídico, como o Reino Unido, a maior parte dos Estados Unidos e do
Canadá e as ex-colônias do Império Britânico.

35
Cf. John Gilissen, ―Introdução Histórica do Direito” Fundação Calouste
Gulbenkian – Lisboa,1986, p208.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Mapa 1: Divisao dos sistemas juridicos por paises

Fonte: Google Mapa

Sumário
A era contemporânea é claramente marcada pelo
desenvolvimento e consolidação dos sistemas jurídicos,
entendido como Sistema jurídico é o conjunto de normas
jurídicas interdependentes, reunidas segundo um princípio
unificador, ou seja, a unidade lógica das regras, conceitos
princípios jurídicos que regem a aplicação do Ordenamento
Jurídico de um país.
Actualmente vigoram os seguintes sistemas jurídicos: Romano-
Germânico ou Continental (Civil Law); Sistemas mistos com o
Civil Law; Sistema anglo-saxônico ou Common Law; Sistemas
mistos com o Common Law; Sistema Consuetudinário; os
temas mistos com o sistema consuetudinário; Sistema
Mulçumano etc
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Exercícios de Auto-Avaliação
1. O que entende por sistema Jurídico?.
Resposta: Sistema jurídico é o conjunto de normas jurídicas
interdependentes, reunidas segundo um princípio unificador,
ou seja, a unidade lógica das regras, conceitos princípios
jurídicos que regem a aplicação do Ordenamento Jurídico de
um país.
2. Quais os sistemas jurídicos contemporâneos?
Resposta: Sistema Romano-Germânico ou Continental (Civil
Law); Sistemas mistos com o Civil Law; Sistema anglo-saxônico
ou Common Law; Sistemas mistos com o Common Law;
Sistema Consuetudinário; sistemas mistos com o sistema
consuetudinário; Sistema Muçulmano etc.

Exercícios
1. Identifica no mapa 1, os 5 países que adoptam o common Law,
e 5 que adoptam o Civil Law (Direito Romano-Germano).
2. Apresente os principais marcos que diferenciam o sistema
Common Law do Romano-Germano.
3. No sistema Common Law, ser bom jurista (advogado) passa por
conhecer precedentes judiciários. Concorda. Justifica.
4. A codificação foi um dos aspecto muito importante na
consolidação dos sistemas jurídicos contemporâneos. Explique
porque.
5. Quais as vantagens e desvantagens da codificação.
6. Identifique o sistema jurídico o Estado moçambicano adoptou,
e apresente os traços fundamentais que o caracteriza.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

TEMA - VII: O Direito anterior á Colonização Portuguesa em


Moçambique
UNIDADE 7.1. As sociedades Primitivas e o direito Consuetudinário

Unidade Temática 7.1. As Sociedades Primitivas e o Direito


Cosuetidinario

Introdução
Esta unidade pretende dotar os estudantes no concernente ao
conhecimento do direito, anterior a chegada do Português, importa
salientar que antes da chegada dos português, vigora um direito
costumeiro, baseado em princípios e regras definidos a nível local,
tanto é que mesmo apois a chegada dos Portugueses o direito teve um
carácter dualista, como veremos mais adiante. Mas nesta unidade
importa desenvolver o Direito das comunidades primitivas e dos
primeiros Reinos e Impérios que vigoravam em Moçambique antes da
penetração portuguesa.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Caracterizar o Direito Moçambicano anterior a presença


portuguesa;
Objectivos
 Identificar as fontes do direito anterior a chegada dos
portugueses.

7.1.1. Características do Direito anterior a presença portuguesa.

Moçambique é um país da África Austral, situado na costa


do Oceano Índico, com cerca de 20 milhões de habitantes (2004).
Foi uma colónia portuguesa, que se tornou independente em 25
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

de Junho de 1975.

A história de Moçambique encontra-se documentada pelo menos


a partir do século X, quando um estudioso viajante árabe, Al-
Masudi descreveu uma importante actividade comercial entre as
nações da região do Golfo Pérsico e os"Zanj" (os negros) da "Bilad
as Sofala", que incluía grande parte da costa norte e centro do
actual Moçambique.

No entanto, vários achados arqueológicos permitem caracterizar a


"pré-história" de Moçambique (antes da escrita) por muitos
séculos antes. Provavelmente o evento mais importante dessa
pré-história terá sido a fixação nesta região dos povos bantu que,
não só eram agricultores, mas introduziram aqui a metalurgia do
ferro, entre os séculos I a IV.

A penetração portuguesa em Moçambique, iniciada no início


do século XVI, só em 1885 - com a partilha de África pelas
potências europeias durante a Conferência de Berlim - se
transformou numa ocupação militar, ou seja, na submissão total
dos estados ali existentes, que levou, nos inícios do século XX a
uma verdadeira administração colonial.

Antes da Chegada dos portugueses existiam no território que


actualmente chama-se Moçambique unidade políticas (Reinos
Impérios e Chefaturas). O Direito nesta altura era consuetudinário
aliado ao carácter religioso.

O costume não é, no entanto, a única fonte de direito dos povos


primitivos. Nos grupos sociais mais evoluídos, acontece que
aqueles que detêm o poder impõem regras de comportamentos,
dando ordens de carácter geral e permanente. Trata-se então de
verdadeiras leis, no sentido jurídico e moderno do termo; mas são
leis não escritas, pois elas são enunciadas em grupos sociais que
não conhecem a escrita. Estas leis, enunciadas pelo chefe ou por
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

grupos de chefes (anciãos) do clã ou da etnia.

O precedente judiciário – pode ser também considerado uma


fonte de Direito nos povos primitivos, os que julgam sejam eles
chefe ou anciãos, tendências voluntarias ou involuntárias, para
aplicar aos litígios, soluções dadas precedentemente a conflitos do
mesmo tipo.

Sumário
O direito anterior a colonização, esta ligado quanto as
características ao direito do povos sem escrita, isto por que
antes da chegada dos Portugueses encontravam-se no actual
território Moçambicano, pequenas unidades politicas (Reinos e
impérios), cuja a actividade jurídica não fora registada pelo
carácter oral deste direito, era basicamente um direito
consuetudinário, onde a tradição oral desempenhava um papel
muito importante, o direito estava intimamente ligado a
religiosidade.

Exercícios de Auto-Avaliação
1. Apresente as características principais do direito
Moçambicano no período anterior a colonização?
Resposta: O direito anterior a colonização, esta ligado quanto
as características ao direito do povos sem escrita, isto por que
antes da chegada dos Portugueses encontravam-se no actual
território Moçambicano, pequenas unidades politicas (Reinos e
impérios), cuja a actividade jurídica não fora registada pelo
carácter oral deste direito, era basicamente um direito
consuetudinário, onde a tradição oral desempenhava um papel
muito importante, o direito estava intimamente ligado a
religiosidade
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Exercícios
1. A tradicional oral desempenhou um grande papel no direito
Moçambicano anterior a colonização. Concorda? Justifique

2. O Direito anterior a colonização tem sido comparado ao


direito dos povos sem escrita. Concorda, justifica a sua posição.

3. O direito é factor de coesão social. Concorda.

4. Identifique as fontes do direito no período anterior a


colonização em Moçambique

5. Apresente os principais traços característicos do direito em


Moçambique antes da chegada dos Portugueses.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

TEMA - VIII: O Direito Durante a Colonização Portuguesa.


UNIDADE Temática 8.1. Características do Direito e das Instituições politica no período
colonial

Unidade Temática 8.1. Caracteristicas Gerais do Direito e


das Instituicoes Politicas no Periodo Colonial.

Introdução
Para uma melhor abordagem sobre a Historia do Direito Colonial
Português torna-se necessário dividir esta em períodos e para tal
fazemos em três períodos: o primeiro período desde a chegada dos
Portugueses em 1948 ate 1886 altura da conferência de Berlim e a
ocupação efectiva isto é o período pré-colonial, o segundo período
que vai de 1886 á 1926 -1930, período do domínio do capital
estrangeiro não português e o terceiro e ultimo período de 1930 á
1974.

O estado colonial Português em Moçambique foi montado para servir


os diversos interesses do capital internacional, pelo menos toda a
legislação publicada ate 1930 destinou-se a colocar os moçambicanos
nessa posição de explorado na condição de indígena, por isso foi
usado mais o aparelho repressivo em detrimento do aparelho
ideológico.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Caracterizar o direito Durante a era colonial

 Identificar as Principais instituições politicas do direito na era


Objectivos
colonial;

 Caracterizar as Leis no período colonial


ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

8.1.2. O Aparelho Politico e Administrativo

Antes de 1675, a Coroa portuguesa institui, na colónia de


Moçambique, um sistema específico de “governo” – a
“capitania”36 - com a finalidade de administrar o monopólio real
do ouro e do marfim37. Um contrato complexo celebrado entre a
Coroa e o “capitão” determinava as obrigações de cada parte, mas
particularmente, o último devia controlar os navios, os fortes e os
assentamentos, zelar pela feitoria real e pagar uma contribuição
anual algo avulta enquanto a primeira, comprometeu-se a
conceder direitos sobre vastos, embora bem definidos, sectores
do comércio efectuado na África Oriental38. Assim, a grande
preocupação de todo e qualquer capitão era levar a Coroa a
conceder-lhe os privilégios comerciais que transformavam o seu
cargo de valia para ocupar.

Na prática, muitos problemas levantaram-se. As querelas entre os


vários capitães rivais e respectivos seguidores eram frequentes.
Além disso, nasceram vários conflitos, quer no próprio seio desta
administração/capitania, quer entre a Coroa ou o vice-rei, sediado

36
“As capitanias”, escreve MARCELLO CAETANO, “eram colónias administradas por
concessão, em que o Estado não delegava poderes soberanos numa companhia
majestática – como sucede na forma moderna da concessão – mas num fidalgo
notável, em regra o descobridor”, em, Estudos de história da Administração Pública
Portuguesa, Coimbra ed., 1994, p. 455.
37
A Coroa portuguesa teve o projecto criar um império a Oriente inspirado numa
estrutura burocrática unificada, pronta a reflectir as tendências centralistas de que
os governantes da Europa Renascentista tanto se orgulhavam; como escreve MALYN
NEWITT: “O rei de Portugal reivindicava extensos direitos e poderes, entre os quais
se incluía o monopólio comercial de uma série de artigos orientais, como pimenta,
canela, cavalos, ouro e marfim; o direito de emitir salvo-condutos a todos os navios
que cruzassem o oceano Índico, bem como o de cobrar direitos alfandegários; e o
controlo completo sobre a Igreja no Oriente, e mesmo proceder às nomeações
eclesiásticas e à cobrança do dízimo. Estes poderes absolutos deveriam ser
administrados a leste do cabo de Boa Esperança por um vice-rei – título aragonês
que indicava ser o seu detentor o alter ego do Rei no Oriente”, História de
Moçambique, op. cit., p. 104;SERRA C. (Direcção), História de Moçambique, Vol. 1,
op. cit., p. 64 e seguintes.
38
NEWITT M., op. cit., p. 108.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

no Estado da Índia cujo dependia a capitania de Moçambique e


Sofala, e o próprio capitão até entre a Coroa e o vice-rei no que diz
respeito a nomeação deste último.

O modo de governo da capitania não podia ser, nesta altura,


senão um governo pessoal feudal típico. A estrutura burocrática
ainda que reduzida, continha uma hierarquia de funcionários e
outro pessoal com um ouvidor (juiz) responsável perante o
capitão.

Assim, o ouvidor era o aplicador do direito aplicava


essencialmente o “direito privado”. De qualquer forma, o juiz local
era sujeito à autoridade do capitão o que limitava a sua
independência e a eficácia das suas próprias decisões.

A existência do monopólio comercial do capitão entrava em


choque com a política defendida pela Coroa. Assim, foram vários
os esquemas no sentido de reformular este monopólio.
Finalmente, este sistema terminou em 1675; o monopólio deu
lugar a uma Junta do Comércio, que operava a partir de
Moçambique em nome da Coroa. O fim do monopólio do capitão,
observa MALYN NEWITT: “significou também o fim de toda uma
fase na história administrativa da Europa – uma fase durante a
qual, e devido à falta de recursos, os governos deviam (ser)
obrigados a passar os seus direitos fiscais, bem como muitos
outros poderes, para as mãos de contratadores privados. O facto
de estes serem quase sempre membros da nobreza apenas serviu
para criar um elemento de continuidade com as formas de
governo feudal que haviam sobrevivido à Idade Média”39.

A partir da segunda metade do Séc. XVII, acentua-se o processo de

39
NEWITT M., op. cit., p. 113.
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centralização do poder central (cristalização do absolutismo da


realeza que iniciou desde o Século XVI40) que se manifestará nas
colónias pelo fim do monopólio comercial do capitão41 – o capitão
torna-se, exclusivamente, um simples funcionário executivo que
tratava de obedecer ao vice-rei de Goa - e pela política de abolição
dos prazos que culminara, um século mas tarde, com aprovação
do Decreto de 22 de Dezembro de 1856 que “Abole os prazos da
coroa”42. O estudo da regulamentação relacionada com a abolição
dos Prazos da Coroa e o seu processo de indemnização permite
confirmar, pelo menos, que o seu contencioso é da competência
do Poder Judicial e que, não houve, ainda, nesta altura,
“publicitação” dos órgãos encarregados de julgar os litígios
relacionados a esta matéria. Com efeito, nos termos do Artigo 4.º
do despacho do Ministério da Marinha e Ultramar. Secção do
Ultramar N.º 1414, “Sempre que os donatários se julguem
ofendidos em seu direito pelas decisões da Junta de Fazenda, ora
se a com respeito à indemnização poderá recorrer ao Poder
Judicial, a fim de se estatuir pelos meios competentes sobre o
ponto controvertido...”.

Todavia, apesar deste processo, até 1752, os territórios

40
CAETANO M., Estudos de história da Administração Pública Portuguesa, op. cit., p.
456.
41
Todavia, até às reformas administrativas de 1752, o capitão de Moçambique
acumulou as funções militares e administrativas com as de superintendente da Junta
do Comércio, a qual controlava todo o comércio praticado pelos assentamentos da
região da Zambézia. Sobre o “Domínio Zambeziano”, vide, PÉLISSIER R., História de
Moçambique, Vol. I, op. cit., p. 74 e seguintes.
42
Decreto de 22 de Dezembro de 1856 – Abole os prazos da coroa, B.O. n.º 14. Nos
termos do referido decreto: “Sendo reconhecido pela experiencia de muitos anos
que a instituição dos prazos denominados da Coroa, na Província de Moçambique,
longe de produzir os benefícios que dela se esperavam, tem, pelo contrario, obstado
poderosamente ao desenvolvimento da agricultura nos mais importantes distritos da
mesma Província, pelos graves abusos a que tem dado lugar, e que não é possível
remediar sem alterar completamente as condições da aquisição, possessão e
transmissão dos vastos terrenos que constituem os ditos prazos (...) Art 1.º Fica
abolida em todos os territórios da Província de Moçambique a instituição
denominada – Prazos da Coroa”. A abolição dos prazos destinava-se, em princípio, a
ter como efeito o restabelecimento da autoridade do Estado na Zambézia e a
supressão da escravatura neles implícita. “Mas”, como escreve RENÉ PÉLISSIER,
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

controlados pela Coroa continuaram a ser administrados de um


modo muito pessoal, quase medieval22. A justiça era administrada
por magistrados nomeados pelo rei: os ouvidores que assistiam os
capitães23. Os capitães subordinados actuavam todos como juízes
nas áreas por si controladas (Tete, Zumbo e Manica). Assistia-se
assim a uma certa confusão dos poderes administrativos e
judiciais.

Em 1752, o Governo de Moçambique foi, formalmente, separado


de Goa, e o governador, agora chamado capitão-geral e,
posteriormente, governador-geral, passou a estar sob o controlo
directo da metrópole.

8.1.3. Os Prazos
Os prazos devem ter tido a sua origem no fim do século XVII,
quando D. Maria Guerra aforrou algumas terras a uma avalanche
de aventureiros, soldados e mercadores. Os prazos foram
inicialmente quer terras conquistadas por esses homens a custa de
exército cativos, quer terras que chefes locais lhes consideram em
troca de agradecimentos ou de ajuda militar contra chefes rivais,
pode-se afirmar que os prazos nasceram com a penetração
portuguesa no vale do Zambeze a partir de 1530.

Inicialmente, as terras destes senhores tão simples não se


chamavam de prazos, este termo parece ter surgido no século
XVII, oriundo de Portugal ou da índia. Nesse século terse-á
instituído na índia a pratica de aforar ou conceder terras da Coroa
portuguesa obtidas por conquista, com obrigação de o foreiro
nelas viver e ter sempre preparados soldados e cavalos de guerra.
Chamou-se Prazo a concessão, porque a terra era concedida
mediante uma renda anual durante duas ou três gerações, findo o
prazo a terra voltava a Coroa, podendo continuar na mesma
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família, em novo prazo de três vidas como novo foro, se tivesse


sido convenientemente administrada. Era o Vice-Rei português da
Índia que concedia as terras em nome do Rei e as concessões
eram, depois confirmadas em Lisboa.

Os Prazos não foram mais do que a síntese do cruzamento de dois


sistemas sociais de produção: uma pré-existentes das
comunidades locais Karanga-Chona e outro que sobrepôs ao
primeiro formada pelo Senhor e os seus soldados A-chicunda.

Ao introduzir em Moçambique a obrigatoriedade de os Senhores


Prazeiros, pagarem foros pelos seus prazos, é muito provável que
a coroa portuguesa tivesse pretendido dar aquelas terras o
estatuto de feudo e a natureza feudal que dominava a sociedade
portuguesa erigindo-se como uma espécie de Senhor feudal na
colónia que mal controlava.

O certo é que os senhores de terras do Zambeze raramente


pagavam os tais foros ou se sentiam vassalos da Coroa
portuguesa. Cada um deles era rei de si próprio, e eventualmente
inimigos uns dos outros e dos governantes portugueses

8.1.4. As Fontes de Direito


O Direito colonial trás consigo um carácter dualista, isto porque o
colonizador ao longo de todo o tempo vai deixar vigorar as ordens
normativas nativas e o Direito Europeu (português), nesta
perspectiva neste período as fontes do Direito vão ser os
costumes locais associado as leis gerais.

8.1.4.1. Os Costumes locais


Costume Segundo Santos “é uma prática reiterada com convicção
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

de obrigatoriedade.” O Costume vai ser uma das fontes de Direito


neste período, sobretudo para os nativos, cada localidade, pode-
se dizer, tinha as suas normas para regular as suas relações entre
os vizinhos, normas transmitidas por tradição oral de geração em
geração e que eram consideradas como obrigatórias, de tal modo
que a sua violação justifica a aplicação de sanções aos infractores.

Na verdade tratava-se de uma justiça conciliatória, visa


necessariamente buscar o equilíbrio geral e fazer a justiça por isso
é que se diz que o costume era o factor da coesão social. Por
exemplo nos prazos alguns Senhores Prazeiros vão adoptar o
aparato ideológico locar isso é vai aproveitar dos costumes locais
para mater a ordem e a paz social no seu prazo.

8.1.4.2. As Leis Gerais

Se por um lado, aos nativos os portugueses mantiveram o uso e


costumes locais, logicamente que as leis da metrópole não
poderiam ser aplicadas do mesmo jeito como na metrópole, neste
período vigorava alguma parte da legislação específica feita para
os territórios ultramar.

De salientar que este período em que a ocupação portuguesa se


limitava no litoral, e mais tarde é que começa-se a penetrar ao
interland, as leis gerais adaptadas ao território ainda não
aparecem em grande peso, mas nos períodos posteriores como
veremos em diante a actividade legislativa para os Moçambique
será mais intensa.

8.1.2. O Direito Colonial depois da conferência de Berlim

As primeiras tentativas sistemáticas para criar em Moçambique


ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

um sistema de administração colonial foram levadas a efeito após


a Conferencia de Berlim. O passo inicial consistiu na ocupação
militar, primeira manifestação do capital; o segundo passo,
corolário lógico conduziu a instalação dos aparelhos do estado
colonial. De acordo com os principais teóricos do colonialismo
português, antes de 1890 teriam imperado, no quadro de uma
filosofia governativa não sistemática, os principais estritos de
assimilação.

A partir de 1984, ao mesmo tempo que prosseguiam a ocupação


efectiva, a potência colonizadora fez a publicação de um corpo de
leis que conduzissem não apenas a construção das infra-estruturas
do estado colonial, mas ao enraizamento da filosofia governativa e
dos princípios administrativos.

António Enes é nomeado comissário-regio de Moçambique, neste


mesmo ano criou a circunscrição indígena, unidade administrativa
onde o colonizador, substituiu o poder despótico dos chefes
tradicionais, exercia cumulativamente, as funções de
administrador e de juiz. Quer dizer: a autoridade administrativa,
aquela que zelava pelo inventário e pela distribuição da mão-de-
obra, tinha também, a seu cargo, o julgamento e a punição de
todos aqueles que se furtassem a obrigação moral e legal de
procurar adquirir pelo trabalho meios que lhe faltem, de substituir
e de melhorar a própria condição social.

a) Aparecimento das companhias


Segundo Serra “ Portugal não era uma potência capitalista, mas
sim uma potência imperialista atrelado ao capitalismo sobretudo o
Inglês”, desta feita Portugal não tinha suporte financeiro suficiente
para aguentar os encargos da ocupação efectiva dos seus
territórios, para tal optou por alienar cerca de 1/3 do território
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Moçambicano.

Neste contexto em 1890 foi pública um decreto, que criava o


trabalho rural obrigatório, e a ocupação efectiva, esse factor deu
rapidamente a origem á formação de sociedades por acções, as
companhias, com capital predominantemente inglês, francês,
alemão e suíço.

Para o estado português, uma forma de aliciamento e


minimização de despesas consistiu em transferir os encargos da
administração para as companhias (administração civil e judiciaria,
cobrança de impostos e obras publicas).

Em Moçambique, a transferência de poderes públicos ou atributos


de soberania para o capital tomou duas formas:
A) As companhias majestáticas (Companhia de Moçambique e
Companhia do Niassa);
B) Companhias arrendatárias (companhia da Zambézia,
Borror, Luabo e outras).

8.1.3. O regime de dominação e exploração colonial


As relações entre os governos coloniais e as instituições e os
direitos africanos foram concebidas sob duas variantes principais:
o governo directo e o governo indirecto. Em regra, o primeiro é
associado às colónias francesas, o segundo às britânicas, o que
nem sempre coincidiu com a realidade.

O governo directo pressupõe a existência de uma única ordem


jurídica, assente nas leis da Europa, não reconhecendo qualquer
instituição ou direitos africanos. O domínio concretizava-se num
sistema colonial centralizado e hierárquico e na sujeição da
maioria da população ao regime do indigenato, que definia as
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regras para os não cidadãos. Este regime previa que os indígenas


pudesse obter o estatuto de assimilados, adquirindo, desse modo,
direitos de cidadania, mas o número dos que adquiriam esse
estatuto permaneceu sempre muito reduzido. O governo indirecto
parte de uma concepção oposta à universalista, assentando na
diferenciação. Na base desta forma de governo esteve sempre a
distinção entre não nativos e nativos, cuidadosamente separados
pelas ordens normativas e pelas instituições a que estavam
sujeitos: os primeiros ao direito civil da metrópole e às instituições
da mesma; os segundos aos direitos costumeiros e às autoridades
tradicionais, ambos selectivamente reconstituídos ou criados à
medida das necessidades do poder colonial.

Ainda que Portugal tenha estado presente em Moçambique desde


o século XVI, só nos últimos anos do século XIX veio a ocupar e
administrar efectivamente o território. Como afirma Ana Maria
Gentili, o exemplo britânico fez escola, principalmente perante os
sucessos produtivos da Nigéria e da Costa do Ouro atribuídos à
capacidade de visão política de governo indirecto. O regime do
indigenato, introduzido formalmente nos anos 1920’, apesar da
designação, aproximava-se mais do sistema de governo indirecto,
ainda que apresentasse alguns traços assimilacionistas.
Caracterizava-se pela divisão entre cidadãos e indígenas e
assentava em dois modelos administrativos e duas formas de
direito.

As áreas dos colonos seguiam o modelo administrativo


metropolitano, com concelhos e freguesias; as áreas indígenas
estavam divididas em regedorias ou chefaturas, supostamente a
reencarnação das tribos pré-coloniais, e eram administradas pelos
chefes tradicionais aliados do poder colonial – os régulos. A justiça
espelhava a sociedade racial, oferecendo regimes diferenciados a
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indígenas, sujeitos às leis costumeiras, administradas pelas


autoridades tradicionais, e a cidadãos e assimilados, sujeitos ao
direito moderno e às instituições do Estado de direito ainda que o
direito indígena não tenha chegado a ser codificado, estava
subordinado à legislação específica estatal que visava
compatibilizá-lo com os interesses do Estado colonial capitalista.

As divisões estabelecidas pelos colonizadores portugueses não


assentaram apenas no que existia, implicando uma reconfiguração
que servisse os seus interesses. As chefaturas maiores, por
exemplo, foram divididas, de modo a serem menos ameaçadoras;
os chefes menos dispostos a colaborar foram afastados ou mortos
e substituídos por outros mais maleáveis.

Tal como nas outras colónias africanas, as autoridades tradicionais


procuravam equilibrar as exigências do governo colonial com a
necessidade de manter a legitimidade na comunidade. Assim, em
muitos casos encontravam formas de resistência passiva ou activa.
No norte de Moçambique, por exemplo, os régulos sabotaram
uma plantação de algodão fervendo as sementes antes se as
plantarem. Outras formas de resistência passavam pela migração
colectiva ou por dar informação errada sobre a idade dos jovens
para que escapassem do exército colonial ou do trabalho forçado

8.1.4. A Organização dos Regulados


A situação colonial não podia indefinidamente reproduzir-se pela
forca bruta, porque a destruição física do colonizado que valia,
naturalmente a destruição do próprio colonialismo. Por isso na
mira de um mínimo de conceso ideológico, o colonizador procurou
reduzir os custos da brutalidade, interpondo entre si e o
campesinato, chefes negros que fossem ao mesmo tempo, chefes
tribais e funcionários administrativos subalternos do regime, nos
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escalões mais baixos da rede administrativa colonial levada a cabo


nas circunscrições, isto é, nas áreas administrativas reservadas a
negros.

Foi fundamental para o colonialismo português, no sul de


Moçambique, a maneira como as instituições tradicionais foram
integradas na hierarquia política colonial. Os principais agentes
desta integração foram o administrador e o régulo ou chefe
tradicional africano conforme afirmamos acima. A circunscrição
passou a ser a unidade administrativa, com base territorial nas
antigas terras da Coroa.

Para melhor administrar e se fazer obedecer contava com esse


apoio, os regedores ou régulos passaria a ser, nas aldeias as
carreiras de transmissão da brutalidade do estado colonial, as
obrigações do régulo, como eram determinadas pelas leis
coloniais em 1908 incluíam:
1. A indicação, dentre os seus subordinados, de
trabalhadores, carregadores e recrutas para o exercito,
para satisfazer as requisições do Governo;
2. A responsabilidade na colecta do imposto de palhota;
3. O controlo dos estranhos que entrassem no regulado sem
um passe válido;
4. O impedimento do comércio de bebidas alcoólicas, com
excepção dos vinhos portugueses.

Pelo desempenho destas funções, o régulo não era pago pelo


regime colonial, mas era autorizado a cobrar uma taxa de meia
libra por cada mineiro que regressava das minas, desta maneira, o
régulo podia, por um lado, obter benefícios consideráveis pela sua
aquiescência ao trabalho migrante, e por outro, pala manutenção
da lei consuetudinária, nestas condições, era um aliado essencial
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da aceitação dos mecanismos de exploração colonial. A função do


regulo era em parte, ideológica, nela estava inerente a sanção da
tradição e a autoridade á nova ordem colonial.

Os pilares da sobrevivência dos régulos ou regedores como


tentáculos do Estado-policia foram os sipaios, o cambo de terra, o
chicote, a palmatória e a espingarda.

Toda a politica indígena da administração colonial e toda a


violência que lhe for inerente, tiveram origem no papel que o
estado colonial português assumiu entre 1886 e 1930:
essencialmente o de um fornecedor de mão-de-obra e o de árbitro
das diversas fracções do capital. A sua aliança com o capital
internacional foi especialmente evidente no sul.

8.1.5. O Direito Colonial Em Moçambique no período do Estado


Novo

Em 26 de Maio de 1926, deu-se um golpe militar em Portugal,


apoiado de imediato por vastos sectores da burguesia portuguesa.
A partir de Outubro do mesmo ano, foram promulgadas leis que
revelaram a intenção do novo regime de estreitar as relações
entre as colónias e a metrópole, corrigindo as fraquezas das
relações económicas existentes até então. Para o efeito propôs-se
a imposição de controlo mais directo e rígido sobre os recursos
das colónias, isto seria feito através de varias medidas, dentre as
quais: a unificação territorial, que significava a abolição das
companhias.

O Estado Novo, saído do golpe de estado, ganhou vulto a partir de


1930 e solidificou-se a partir de 1932 com a chamada de Salazar,
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Ministro das Finanças entre 1928 e 1932, para a Presidência do


conselho. O governo de Salazar surgiu com uma política agrária
muito forte, criando aqui um proteccionismo económico, o que
muitos historiadores chamaram de Nacionalismo económico de
Salazar. A década 30 representou de facto um momento de
transição em algumas das bases político-administrativa tanto
como a nível judicial.

A expressão real do “nacionalismo económico” manifestou-se no


acto colonial e na carta orgânica do império português de 1930
parte integrante da Constituição de 1931.

8.1.6. O Acto Colonial e a Carta Orgânica de 1930

Estes dois instrumentos desenvolveram rigorosamente os


princípios já delineados em 1926, essa legislação marcou o fim da
autonomia formal da província de Moçambique que passou a
designar-se colónia. Concretamente o nacionalismo económico,
centralizou o poder legislativo e financeiro nas mãos do Ministro
das colónias, e visava colocar Portugal a par das restantes
potências colonizadoras, em termos de capacidade de dominar a
exploração dos territórios ultramar.

Foi a partir da promulgação do Acto Colonial, em 1930, que se


inaugurou uma nova fase na administração colonial e no projecto
político de Salazar. Tratava-se do Decreto nº 18.570, de 8 de Julho,
elaborado pelo advogado Quirino de Jesus e por Armindo
Monteiro, que assumiu, de 1931 a 1935, o Ministério das Colónias.
O Acto Colonial substituiu o Título V da Constituição de 191143 e
foi, posteriormente, incorporado ao texto da Constituição de

43
O artigo 67.o do título V da Constituição de 1911, diz: “Na administração
das províncias ultramarinas predominará o regime de descentralização, com
leis especiais adequadas ao estado de civilização de cada uma delas”.
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1933.

Antes do estabelecimento do Acto Colonial, outros documentos já


haviam sido publicados com o intuito de fortalecer uma estrutura
jurídica capaz de racionalizar e também legitimar a actuação
portuguesa nas colónias, como o Estatuto político, civil e criminal
dos indígenas de Angola e Moçambique e as Bases orgânicas da
administração colonial, ambas de Outubro de 1926.

No entanto, o arcabouço legal da política implementada pelo


Estado Novo estava presente no Acto Colonial, na Carta Orgânica
do Império Colonial Português44, promulgados em 1930, e na
Constituição de 1933. Como afirma Omar Ribeiro Thomaz, essa
legislação era produto de uma ideologia e uma tradição do poder
colonial português, que tinha por objectivo traduzir como o
Império deveria ser e actuar em seus territórios.45

O Acto Colonial e a Carta Orgânica do Império Colonial Português,


reforçaram os princípios legais estabelecidos em 1926. Esses
documentos foram pensados como uma espécie de Constituição
para os territórios de além-mar e tinham como característica
principal o ultra nacionalismo, típico do governo de Salazar.

Foi a partir desses diplomas que os territórios ultramarinos


portugueses passaram a ser considerados integrantes do “Império
Colonial”, cuja administração deveria estar centralizada pelo
governo de Lisboa, conforme definiam os artigos 3º, 5º e 6º do
Acto Colonial e o 18.º da Carta Orgânica:

44
Como afirma A. H. Marques de Oliveira, a Carta Orgânica do Império
Colonial Português era um desdobramento do Acto Colonial e uma adaptação
da Constituição Portuguesa às colónias. Cf. A. H. de Oliveira Marques, Breve
História de Portugal. Lisboa: Editorial Presença, 2006.
45
Omar Ribeiro Thomaz, Ecos do Atlântico Sul: Representações sobre o terceiro
império português. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/FAPES, 2002, p.71.
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Art. 3.º O domínio ultramarino de Portugal denomina-se colónias e


constituem o Império Colonial Português.

Art. 5.º O Império Colonial Português é solidário nas suas partes


componentes com a metrópole.

Art.6.º A solidariedade do Império Colonial Português abrange


especialmente a obrigação de contribuir de forma adequada para
que sejam assegurados os fins de todos os seus membros e a
integridade e defesa da Nação.46

Art. 18.º Cada colónia é superiormente administrada, sob a


superintendência do Ministro das Colónia, por um governador; a
função que lhe pertence exerce-as este directamente ou por
intermédio dos serviços, autoridades e funcionários seus
subordinados, com a consulta do Conselho de Governo ou da
secção permanente deste, sempre que for de lei.10

De acordo com o Acto Colonial, a metrópole e as colónias


formariam uma “comunidade e solidariedade natural” em suas
relações económicas, e seria função de Portugal garantir os
interesses em comum, considerando as particularidades de todos
os territórios, criando uma organização económica subordinada à
unidade nacional.

Apesar de o artigo 26.º do Acto Colonial assegurar que as colónias


possuíam descentralização administrativa e autonomia financeira,
que fossem compatíveis com a Constituição, com o seu estado, o
seu desenvolvimento e os seus recursos, na prática a autonomia

46
Acto Colonial, 1945. In: Colectânea de Legislação Colonial. Lisboa: Divisão de
Publicações e Biblioteca Agência Geral das Colónias, 1948.
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financeira foi extinta e o orçamento geral passou a depender da


aprovação do Ministro das Colónias, segundo o princípio do
equilíbrio de contas.

Além da extinção da autonomia, as colónias foram proibidas de


contratar empréstimos em países estrangeiros, que, em caso de
necessidade, deveriam ser feitos pela metrópole. As concessões às
empresas estrangeiras passaram a ser restritas, tanto no que diz
respeito ao domínio territorial, quanto à exploração de portos
comerciais. O Estado deixaria de conceder a empresas particulares
funções de soberania, como era na 1ª República. Ainda que o
Estado fizesse concessões ao Capital estrangeiro, esse ficaria
subordinado às determinações nacionais.

A figura dos altos-comissários nas colónias foi extinta e


substituída pela dos governadores-gerais ou de colónia, de quem
os poderes e a autonomia de decisão foram consideravelmente
reduzidos e centralizados, em tudo o que era essencial, no
Ministério das Colónias ou no governo de Lisboa.

No que diz respeito às populações locais das colónias, desde o


período republicano (1910-1926), com as Leis Orgânicas (que
eram uma espécie de texto constitucional aplicado às colónias) o
governo estabeleceu normas básicas para a relação com os
nativos, reconhecendo o direito indígena, aplicado de acordo com
o estágio de civilização Moçambicana, distinto do metropolitano.
Este ideal de que as leis deveriam ser aplicadas de acordo com o
grau evolutivo dos povos era inspirado em António Enes,
organizador da política colonial em Moçambique no século XIX.
Para ele, as sociedades locais não possuíam capacidade de se
auto-governar a partir de um sistema de liberdade política, e que
apenas a tutela dos “mais civilizados” sobre os “primitivos”
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poderia retirar os nativos da incivilidade. De acordo com Enes, não


era possível colonizar as populações locais a partir das mesmas leis
que vigoravam na metrópole. Sendo assim, era fundamental que
existisse uma legislação que estivesse de acordo com os hábitos e
costumes dos povos.

A distinção entre direito metropolitano e colonial e a aplicação das


leis de acordo com o estágio “evolutivo” das sociedades também
foram mantidas pelo Acto Colonial, que oferecia, de maneira mais
sistematizada, os diferentes direitos e deveres entre os colonos,
que eram os nascidos na metrópole, os assimilados e os indígenas.

Além disso, o Acto Colonial esclarecia os princípios gerais a serem


seguidos por Portugal na sua relação com as colónias, de maneira
que, considerando os seus distintos estágios de evolução, o
governo pudesse contribuir para uma transição gradual do
indígena ao cidadão português. A nova legislação instituía também
a “tutela” em relação às populações nativas de São Tomé e
Príncipe, Guiné, Angola, Moçambique e Timor, e, assim, acabava
por estabelecer as diferenças e as hierarquias entre os habitantes
do chamado “império colonial português”.

Ao examinarmos os artigos do Título II – Dos indígenas do Acto


Colonial e a Carta Orgânica do Império Colonial Português,
podemos perceber as contradições da legislação portuguesa, que
tinha por intuito proteger os indígenas da exploração de mão-de-
obra, silenciando assim as reivindicações internacionais sobre os
abusos do trabalho nativo e, ao mesmo tempo, abria espaço para
diferentes interpretações e assegurava a manutenção do trabalho
nativo para obras do império, conforme se comprova nos trechos
a seguir:
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Art. 231.º O Estado garante a protecção e defesa dos indígenas


das colónias, conforme os princípios de humanidade e da
soberania nacional, as disposições legais e as convenções
internacionais que actualmente vigoram ou venham a vigorar. As
autoridades coloniais impedirão e castigarão conforme a lei os
abusos contra a pessoa e bens dos indígenas.

Art. 233.º Todas as autoridades e colonos devem protecção aos


indígenas. É seu dever velar pela conservação e desenvolvimento
das populações, contribuindo, em todos os casos, para melhorar
as suas condições de vida; têm obrigação de amparar e fornecer as
iniciativas que se destinem a civilizar o indígena e aumentar o seu
amor pela Pátria portuguesa.

Art. 240.º O Estado não impõe nem permite que se exija aos
indígenas das suas colónias qualquer espécie de trabalho
obrigatório ou compelido para fins particulares, embora não
prescinda de que eles procurem pelo trabalho meios de
subsistência.47

No entanto, tanto o Acto Colonial como a Carta Orgânica do


Império Colonial Português apresentavam em seus artigos 20.º e
241.º, respectivamente, a seguinte norma:

Art. 20.º O Estado somente pode compelir os indígenas ao


trabalho em obras públicas de interesse geral da colectividade, em
ocupações cujos resultados lhes pertençam, em execução de
decisões de carácter penal ou para cumprimento de obrigações
fiscais.48

47
Acto Colonial, 1945. In: Colectânea de Legislação Colonial. Lisboa: Divisão de
Publicações e Biblioteca Agência Geral das Colónias, 1948.
48
Acto Colonial. In: Colectânea, op. cit.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Diante da ambiguidade em relação aos indígenas, é possível


constatar que, embora fossem considerados “súbditos
portugueses”, eles não faziam parte da nação, nem como
comunidade cultural, nem como uma associação política de
cidadãos.

A legislação relativa aos indígenas tinha como discurso principal


levar a civilização europeia aos africanos e aos Moçambicanos e
incorporá-los à nação portuguesa, através de uma transformação
gradual de seus costumes e valores considerados pelos
portugueses, como incivilizados. Desde o século XIX, diversos
códigos e regulamentos foram criados na tentativa de sistematizar
de maneira eficaz o trabalho dos classificados indígenas. Mas para
se regulamentar o trabalho, era necessário definir o que seria o
indígena.

O primeiro diploma da legislação colonial portuguesa, que se


preocupou em caracterizar quem seria classificado como indígena
e quem estaria isento de tal classificação, foi o Decreto de 27 de
Setembro de 1894, referente à pena de trabalhos públicos49. O
decreto afirmava em seu 1º artigo que “somente são considerados
indígenas os nascidos no Ultramar, de pai e mãe indígenas e que
não se distinguem pela sua ilustração e costumes do comum de
sua raça.”

Outros decretos e regulamentos também foram implementados


com este objectivo, como o Regulamento do Trabalho dos
Indígenas nas Colónias, de 1899, e o Regulamento Geral do
trabalho indígenas nas colónias portuguesas, de 191450. No

49
Valdemir Donizette Zamparoni. Entre Narros & Mulungos: Colonialismo e
paisagem social em Lourenço Marques c. 1890- C.1940. USP, 1998 (Tese de
doutorado) p. 465
50
Outros decretos e regulamentos, Cf. Valdemir Donizette Zamparoni. Op. cit
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entanto, foi somente em 1917, com o Alvará do Assimilado ou


Portaria do Assimilado51, que se criou uma distinção jurídica e
hierarquizada entre indígenas e não indígenas, os chamados
assimilados.

De acordo com o 1º artigo da Portaria seria considerado indígena


“o indivíduo da raça negra ou dela descendente que pela sua
ilustração e costumes se não distingue do comum daquela raça”. O
Assimilado seria o indivíduo da raça negra ou dela descendente
que: tivesse abandonado inteiramente os usos e costumes
daquela raça; que falasse, lesse e escrevesse a língua portuguesa;
adoptasse a monogamia; exercesse profissão, arte ou ofício,
compatíveis com a “civilização europeia” ou que tivesse “obtido
por meio lícito” rendimento que fosse suficiente para alimentação,
sustento, habitação e vestuário dele e de sua família. Conforme
indica Zamparoni52, aqueles que julgavam estar em condições de
atender aos requisitos para receber o alvará de assimilado,
deveriam redigir e assinar um requerimento que seria
acompanhado ainda de um atestado emitido pelas autoridades
administrativas que comprovasse o seu local de residência, o
abandono dos “usos e costumes” da raça negra e a fluência em
língua portuguesa.

Além disso, deveriam apresentar a certidão de aprovação no


exame de instrução primária; a certidão civil do casamento ou,
caso fossem solteiros, deveriam apresentar uma declaração de
próprio punho em que se comprometiam adoptar a monogamia.
No caso dos filhos mestiços, eles não necessitariam do alvará
enquanto vivessem na companhia do pai, europeu, ou se
estivessem residindo em institutos de educação. A Portaria de

51
Portaria Provincial Nº 317, de 9 de Janeiro de 1917, publicado no Boletim
Oficial n° 02/1917 e promulgado pelo Governador-geral Álvaro de Castro.
52
Valdemir Donizette Zamparoni. Op. Cit. p. 470
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1917 era considerada extremamente rígida e restritiva. Seguindo


estes padrões, nem mesmo grande parte dos colonos brancos
conseguiria atender aos requisitos exigidos, considerando que um
terço deles eram analfabetos, outros muitos desempregados e
outros polígamos. Este decreto gerou inúmeros protestos por
parte das elites africanas, que percebiam o conteúdo deste
documento como racista e inconstitucional. A indignação das
elites locais gerou algumas alterações na portaria, que em 1927
tornou-se extensiva a Angola e Guiné.53

A separação da sociedade entre indígenas e assimilados,


permaneceu no Estado Novo. Sob o pretexto de protecção do
trabalho indígena justificava-se ainda mais a segregação e a
exploração da mão-de-obra local, legitimado pelo Acto Colonial.
Apenas em 1953, foi criado um novo Estatuto dos Indígenas
Portugueses da Guiné, Angola e Moçambique.

A política da assimilação apresentava muitos problemas. O


primeiro de todos estava na classificação arbitrária dessa
categoria. Muitos africanos, que poderiam se enquadrar no status
de assimilado recusava-se a requerer, pelo fato terem que pagar
mais impostos. Além disso, um assimilado dificilmente poderia ser
considerado um cidadão de 1ª classe, pois era alvo permanente de
discriminação económica e social, sendo também ameaçado
quotidianamente de
Perder o seu status de assimilado.

Apesar das dificuldades de implantar uma política efectiva de


actuação nas colónias diante de um cenário de falta de recursos,

53
Sobre os protestos Cf. Fernanda do Nascimento Thomaz. Os “Filhos da
Terra”: discurso e resistência nas relações coloniais no sul de Moçambique (1890-
1930).UFF, 2008 (Dissertação de mestrado) e Valdemir Donizette Zamparoni.
Entre Narros & Mulungos: Colonialismo e paisagem social em Lourenço Marques
c. 1890- c.1940. USP, 1998 (Tese de doutorado).
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da fraca presença portuguesa em seus territórios coloniais e da


dificuldade de lidar com as populações locais, era necessário
transmitir o discurso de que o pequeno e pobre Portugal era uma
nação forte, que tinha por missão levar o cristianismo e a
civilização. Esses ideais foram insuflados pela construção de uma
ideologia nomeada Mística Imperial.

8.1.7. As Leis Laborais e a Politica Laboral

Como vimos, a actuação do capital no território e, particularmente


a sua acção na esfera produtiva resultou do desenvolvimento de
novas formas de produção e numa transformação das relações de
produção. Em 1907, entrou em vigor a principal legislação de
trabalho aprovada pelo governo português para o território
nomeadamente:
a) O regulamento Geral do trabalho dos indígenas no
território da companhia de Moçambique;
b) O regulamento para fornecimento de indígena a
particulares no território de Manica e Sofala;
c) Regulamento para o recrutamento de indígena de Manica
e Sofala.
Três aspectos essenciais ressaltam desses regulamentos:
1. A institucionalização do trabalho forcado. Impunha-se pela
lei a obrigatoriedade de prestação de trabalho assalariado
a todos indivíduos em idade activa,
2. Estabelecimento de um sistema de controlo rigoroso da
forca de trabalho. Para facilitar a fiscalização do
cumprimento da chamada “obrigação moral de trabalho”
pelos trabalhadores moçambicanos, o governo determinou
que cada trabalhador devia ser portador de um certificado
declarando o tempo de serviço prestando e as respectivas
datas de inicio e de termo de contrato.
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3. Interdição de recrutamento para serviços fora dos


territórios concedidos as companhias.

O código do indigenato foi formalmente imposto em 1928, mas,


de acordo com O’Laughlin, sistematizava um conjunto de normas
anteriores que definiam a cidadania em relação ao trabalho
forçado. A Lei do Trabalho de 1899 articulou, pela primeira vez, a
distinção entre cidadão e súbdito, não nativo e nativo.

A lei estabelecia que «todos os nativos das províncias


ultramarinas portuguesas estão sujeitos à obrigação, moral e legal,
de tentar obter através de trabalho os meios de que necessitam
para subsistir e melhorar as suas condições sociais». Previa, ainda,
que se tal não acontecesse, o governo tinha o direito de forçar os
nativos a prestar serviços quer ao governo, quer a privados. Havia
poucos empregos disponíveis com salários que atraíssem os
africanos por sua livre vontade e só os que possuíam terrenos
grandes e férteis seriam considerados agricultores.

Assim, a lei afectava a maioria da população as autoridades


tradicionais cabia o controlo da população e o recrutamento para
trabalho forçado daqueles que não tivessem a iniciativa de
trabalhar ou que não cumprissem a lei. Dessa forma, pôs-se fim ao
debate sobre como as colónias continuariam a ser desenvolvidas
uma vez abolida a escravatura. A base de exploração permanecia a
coerção e as autoridades tradicionais desempenhariam um papel
fundamental estava estabelecida a divisão entre indígenas,
sujeitos ao trabalho forçado, e não indígenas, isentos daquele. O
Estado Novo de Salazar intensificou e aperfeiçoou esta politica,
nomeadamente com a Constituição de 1933, que incorporava o
Acto Colonial. Este é, muitas vezes, considerado o ponto de
viragem, que marca o início de um Estado colonial.
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Na década de 1960, com as pressões internacionais contra o


trabalho forçado e o movimento de independência das colónias
africanas, Portugal, ao mesmo tempo que transformou a
designação «colónias» por «províncias ultramarinas», aboliu
formalmente o regime do indigenato. Apesar de todos passarem a
ser cidadãos portugueses e a terem, em teoria, o direito de optar
pela justiça civil, o dualismo manteve-se na prática, com a
continuação dos regulados e da obediência ao régulo e ao direito
costumeiro Os moçambicanos continuaram a possuir cartões de
identidade diferentes, a ser banidos dos centros urbanos, sujeitos
a abusos policiais e a discriminação económica e social e até a
trabalho forçado (ainda que o trabalho forçado tenha sido abolido
em 1961, a legislação permitia a coerção em situações de
emergência).

Como afirma André C. José «a tardia e cosmética transformação


dos indígenas em cidadãos e a apropriação ideológica das teses do
luso tropicalismo não foram suficientes para disfarçar o regime de
forte segregação que vigorava». E, como conclui, «a metamorfose,
simplesmente, tornou os indígenas em cidadãos sem cidadania».

8.1.8. Características das Leis para Ultramar


As leis que eram feitas para o Ultramar tinham algumas
características especiais: Primeiramente, na sua grande maioria,
por autorização constitucional, não eram votadas pelo
parlamento; depois, eram leis que tinham aplicações exclusivas, e
marcadas pelo que se denominou de urgência, todas estas
características, todavia, aparecem com mais intensidade, quando,
através do texto constitucional, autoriza-se o Governo a legislar
para o Ultramar, isto com edição do Acto Adicional de 1852, que
no seu art. 15º, estabeleceu o princípio da especialidade, isto é da
edição de leis especiais para as colónias.
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O art. 15º do Ato mencionado autorizava a edição de leis especiais


e sem a apreciação preliminar das Câmaras, esta última
providência, em função da urgência em que tais leis eram
editadas. Mas que urgência era esta a que se reportava a lei?
Como entender a urgência para a edição das leis ultramarinas,
quando qualquer lei, seja ela regulando matéria administrativa,
tributária, económico-social, era a qualquer momento editada
pelas autoridades competentes? Que tipo de urgência era essa
que permitia que, mudada a direcção do Ministério da Marinha e
Ultramar, muitas leis fossem publicadas modificando as
existentes, tão somente para que o novo Ministério, algumas
vezes somente para contrariar a política anterior, e para satisfação
de quem o dirigia, criasse novas medidas54, por vezes voltando a
aplicar medidas anteriores que já não tinham dado certo, apenas e
tão somente para demonstração do poder.

O facto é que, a partir da edição do Acto Adicional, as leis


ultramarinas começaram a observar princípios diversos dos que
eram utilizados para a criação das leis aplicáveis na metrópole. Os
princípios assegurados pelo Acto Adicional eram: especialização, a
urgência, que, aliados aos da observação dos usos e costumes dos
indígenas e o da missão civilizadora, este último consistente em
elevar o nível moral e material dos indígenas, internacionalizado
pela Conferência de Berlim, nortearam, ao menos teoricamente, a
administração colonial portuguesa.

Dentre esses princípios, o da especialidade das leis parece-nos o


que mais abrangência teve; isto porque engloba, de uma maneira

54
Tito de Carvalho, “Revista Ultramarina”, Revista Portuguesa Colonial e Marítima,
Terceiro Ano, 1899-1900, 1º Semestre, nº 25, Lisboa, Ferin, 1900 p, 49; Manuel
Moreira Feio “A Colonização de Moçambique” I Congresso Colonial Nacional, Vol.
I, Conferências Preliminares e Actas, Lisboa, Sociedade de Geografia, 1901, p. 19
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ou de outra, os demais, além de resultar da observância daqueles


que viveram e conheceram, ou pensavam conhecer, mais de
perto, as dificuldades e problemas que existiam no ultramar,
determinados pelos diferentes costumes e usos dos diversos
povos que povoavam a África portuguesa, que não comportavam
soluções provenientes do direito comum.

Se assim não fosse, não se teria colocado a ressalva, no decreto


que autorizou a aplicação do Código Civil de 1867 no ultramar55,
do respeito aos costumes dos indígenas, art. 8º. Uma prova
inequívoca de que a observação dos usos e costumes era uma
forma especial, diferente da metrópole, de resolver as questões,
de acordo com as tradições e, de uma maneira ou de outra, uma
forma encontrada pela doutrina, e apropriada pela administração,
para alcançar o “Outro”. Analisemos, pois, “de per si”, cada um
desses princípios.

Sumário
O Direito durante a colonização foi marcado por carácter
dualista: Um direito aplicável ao Indígena e um direito aplicável
aos cidadãos portugueses, as leis ultramarinas tinham um
carácter urgente. Mas este direito foi divido em dois
momentos pos-coferencia de Berlim, caracterizado por uma
fraca influência de Portugal, sobretudo na zona centro e norte
entregue as companhias, e uma segunda fazer apois o estado
novo, que caracteriza-se por uma grande influência dos
Portugueses, varias leis foram elaboradas com vista a satifazer
esse condição, o acto colonial e carta orgânica de 1930 foram
dois instrumentos legais bastantes importantes, a política

55
Decreto de 18 de novembro de 1869.
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laboral tinha como base o carácter de segregação racial:


indígena assimilado.

Exercícios de Auto-Avaliação
1. O Direito durante o período da colonização teve um
carácter dualista. Comente.
Resposta: é de concordar partindo do pressuposto que o
direito aplicável aos indígenas e as ao colonos eram
diferenciados, não era possível aplicar de igual forma o direito
porque os nativos não estavam preparados para receber e
cumprir cabalmente com as orientações, as leis não
produziriam os efeitos pretendido, por isso devia-se aplicar um
direito próprio aos nativos associando elementos modernos
com elementos costumeiros.
2. No Direito colonial português, a aplicação do Direito era
feita com base no princípio de personalidade por via disto,
existia três estatutos de cidadãos: o indígena, assimilado e
o colono. Explique a diferença entre os três estatutos tendo
por base, o referido principio.
Resposta: O indígena era o indivíduo que não renunciava os
hábitos e costumes locais continuavam a viver segundo os
sistemas locais, a este indivíduos era aplicado o sistema
jurídico local isto é hábito e costumes locais.
 O assimilado era o individuo nativo que renunciava a cultura
local e assimilava a cultura portuguesa, a esse individuo
aplicava-se o direito português, mas já mais atingia o
estatuto de colono mas sim assimilado.
 Colono era o indivíduo português, regido pelo Direito português.
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Exercícios
1. Qual era a função jurídica do capitão?
2. Caracterize o direito colonial Português em Moçambique
anterior ao Estado Novo?
3. Caracterize o direito colonial Português em Moçambique
durante ao Estado Novo?
4. Caracterize as leis do Ultramar.
5. Caracterize o princípio de especialidade nas leis para o
ultramar.
6. O colonial publicado em 1930 foi um instrumento legal
bastante importante. Destaque a importância deste para
Moçambique.
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TEMA - IX: O Direito após a Independência Nacional: a


Construção do Paradigma Socialista de Regulação Social.
UNIDADE 9.1. Construção de uma Justiça Social

UNIDADE Temática 9.1. Construcao de uma Justica Popular

Introdução
Esta unidade pretende dotar os estudantes organização judiciaria de
Moçambique após a independência, caracterizar qual era o
funcionamento do sistema de justiça popular num pais recem
independente, perecendo os desafios e o contexto que o pais
enfrentou nos primeiros anos da independência.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Descrever a Organização Judiciaria a Luz da Constituição de


1975
Objectivos
 Explicar Composição de cada Tribunal Popular

 Explicar a Competência das várias categorias de Tribunais apois


a independência.

9.1.1. Contextualização

Depois de uma luta armada de cerca de dez anos, conduzida pela


Frente de Libertação Nacional (FRELIMO), uma união de vários
grupos de resistência ao colonialismo, Moçambique tornou-se
independente em 25 de Junho de 1975. A FRELIMO, transformada
em partido político, governou em regime de partido único até
1994, data das primeiras eleições democráticas. Como a afirmam
Albie Sachs e Gita Welch, ao contrário de outros estados africanos
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independentes que optaram pela continuidade e pela menor


ruptura possível, «a teoria era clara: desmantelar completamente
o aparato do Estado colonial e substitui-lo por um novo,
desenhado para servir os interesses das massas populares». Ainda
durante a guerra de libertação nacional, largas zonas no norte de
Moçambique dominadas pela FRELIMO, as designadas zonas
libertadas, tinham experimentado modelos de governo, que
deveriam ser expandidos para o restante país.

Era necessário desenvolver uma cultura nacional, construindo um


país unido. No que diz respeito ao crescimento económico,
acreditava-se que, «apoiando-se nas próprias forças e utilizando
formas colectivas de produção, veriam a curto prazo melhoradas
as respectivas condições de vida». No âmbito da justiça, se o
sistema jurídico colonial era fascista, colonial e elitista; tinha que
ser transformado num sistema popular, moçambicano e
democrático A concretização dessa tarefa passava pelo fim das
autoridades e da justiça tradicionais e pela implementação de uma
organização judiciária que se estendesse a todas as circunscrições
territoriais e promovesse a participação popular.

Nas zonas libertadas, tinha sido já experimentado um modelo de


justiça popular, que devia substituir o papel das autoridades
tradicionais e do direito costumeiro. Com base nessa experiência,
em 1978, foi aprovada a Lei Orgânica dos Tribunais Populares, que
previa a criação de tribunais populares em diferentes escalões
territoriais. O Tribunal Popular Supremo ocupava o topo da
hierarquia e era seguido pelos tribunais populares provinciais,
pelos tribunais populares distritais e, finalmente, pelos tribunais
populares de bairro ou localidade. Em todos os escalões
participavam, no exercício da actividade judicial, juízes eleitos, isto
é, juízes desprofissionalizados, eleitos pelas assembleias populares
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para exercerem funções judiciais.

Estes exerciam funções verdadeiramente jurisdicionais, intervindo,


nos casos penais, sobre matéria de facto e de direito. Na base da
pirâmide, os tribunais populares de localidade e de bairro
funcionavam exclusivamente com juízes eleitos, que conheciam
das infracções de pequena gravidade e decidiam «de acordo com
o bom senso e a justiça e tendo em conta os princípios que
presidem à construção da sociedade socialista», sempre que não
fosse possível a reconciliação das partes.

A ideia, afirmam Sachs e Welch, era construir um sistema que, em


vez de pressupor um dualismo entre um direito estatal para a elite
e outros direitos para a população, assentasse no princípio de um
sistema de direito único para toda a sociedade, do norte ao sul,
«do Rovuma ao Maputo». Os autores definem o sistema como
sendo simultaneamente indígena e anti-tradicional, baseado em
aspectos democráticos da tradição africana, mas transformando-
os e rejeitando os divisionismos. Citam, como esclarecedora, a
frase de Samora Machel: «para a nação nascer, a tribo deve
morrer».

O papel dos juízes eleitos era fundamental na organização


judiciária. Esperava-se que conhecessem os problemas da
comunidade e as pessoas. Os tribunais distritais e superiores
aplicavam em larga medida o direito português, cabendo aos
juízes leigos garantir que o sentido de justiça popular era
reflectido na prática dos tribunais Em casos de família, tornou-se
prática comum, as partes colocarem o problema aos juízes eleitos,
antes de o apresentarem formalmente no tribunal. Com
frequência, os casos eram assim resolvidos por reconciliação,
evitando o formalismo e a morosidade do tribunal. Aos tribunais
populares de base cabia um papel determinante na promoção do
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acesso à justiça, na medida em que constituíam a instância


judiciária mais próxima dos cidadãos. Os procedimentos
formalistas eram reduzidos ao mínimo.

A participação da população, ainda que relevante em todos os


níveis da hierarquia do judiciário, era aqui ainda mais importante.
As pessoas que conheciam o caso deviam ajudar a esclarecer os
factos e a encontrar uma solução justa. Se, por um lado, não
existiam advogados profissionais, por outro, esse papel não
deixava de existir, cabendo à população

O governo moçambicano pretendia, assim, pôr fim à utilização do


direito costumeiro, opressivo e associado ao colonialismo e, em
simultâneo, garantir instâncias sensíveis aos cidadãos e às suas
noções de justiça. A ideia de uma justiça de reconciliação e a
forma de resolução na base «do bom senso e da justiça» garantia
o último objectivo.

Ao mesmo tempo, abria espaço à subsistência do direito


costumeiro, que se interligava agora com os princípios do novo
Estado. Ainda que a Constituição devesse enquadrar a resolução
de litígios, nem sempre o direito do Estado prevalecia. Subsistiam,
por exemplo, situações de discriminação contra as mulheres,
ainda que a Constituição previsse a igualdade de género e a
emancipação feminina. Isto não equivale a afirmar que a justiça
popular tenha sido sempre mal sucedida na transformação do
direito costumeiro, mas sim a existência de espaços de
interlegalidade.

Por vezes, o termo justiça informal foi usado para designar a


justiça popular. A designação de justiça informal é, contudo,
inconsistente com a realidade da justiça popular moçambicana.
Como nota Aase Gundersen, o que muitas vezes foi designado por
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«informal» foram sistemas de justiça com procedimentos


diferentes dos tribunais formais de estilo ocidental. Ainda que os
tribunais populares usassem procedimentos informais, faziam
parte do sistema formal de justiça, divergindo das instâncias
informais da comunidade, como a família e as igrejas. Assim, os
tribunais populares estão na fronteira entre o formal e o informal

Os tribunais populares de base deveriam substituir as autoridades


tradicionais ao nível das funções judiciais. Contudo, a estas
cabiam, ainda, funções administrativas, que, na estrutura
estabelecida pelo Estado moçambicano, passariam a ser
desempenhadas pelos Grupos Dinamizadores (GDs).

Logo no período de transição para a independência, que duraria


entre 20 de Setembro de 1974 e 24 de Junho de 1975, a FRELIMO
enfrentava os problemas da falta de experiência organizativa em
centros urbanos, bem como da não compreensão dos objectivos
do movimento por parte de operários e camponeses fora das
zonas libertadas. Foram assim formalizados os GDs, comités
compostos por oito a doze pessoas, que passaram a desempenhar
um conjunto de tarefas.

Para além de funções como a mobilização das populações para a


participação político-partidária, a segurança nacional, a
organização de processos de produção colectiva e a execução de
programas de educação, foram-lhes atribuídas inicialmente
funções na área da justiça. Cabia-lhes difundir e explicar os novos
valores e as novas normas comportamentais e dirimir pequenos
conflitos. Ainda que, logo após o III Congresso da FRELIMO em
1977, e a criação dos tribunais populares em 1978, as suas tarefas
tenham sido reestruturadas e lhes tenha sido retirado o papel de
resolução de conflitos, fazia parte das suas funções «promover as
relações de boa vizinhança entre os moradores, e procurar a
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solução de pequenos conflitos, desde que estes não sejam da


competência do tribunal popular local».

Assim, no que diz respeito à justiça, o papel dos GDs e dos


tribunais populares de base tende, por vezes, a confundir-se, o
que permanecerá uma constante, mesmo quando, nos anos 1990’,
estes são substituídos pelos tribunais comunitários

Apesar do esforço para lhes pôr fim, autoridades tradicionais não


desapareceram, podendo falar-se de situações de continuidade
nas estruturas do poder rural entre o período colonial tardio e a
pós-independência. Alice Dinerman mostra que a criação de
instituições sancionadas pela FRELIMO, nem sempre significou a
passagem de poder para fora das autoridades tradicionais.

Em alguns casos, os funcionários do governo local mantiveram a


aliança com as autoridades que haviam servido a administração
colonial «em nome da ordem social, do bem-estar, do
desenvolvimento rural ou de uma combinação destes três
factores», noutros as autoridades tradicionais desenvolveram
estratégias de manutenção do controlo.

A autora analisa mais pormenorizadamente o caso de Namapa,


distrito de Erati, província de Nampula, argumentando que «os
antigos régulos tiveram oportunidade de continuar a reinar por
outros meios». Em Namapa, a FRELIMO manteve a divisão
administrativa herdada, mudando apenas o nome de regedoria
para círculos. Além disso, a nova administração estatal trabalhou
com as antigas estruturas para configurar as novas. Durante vários
anos, em todo o distrito, os chefes arranjavam estratégias para
colocar no poder familiares seus, de modo a conseguirem manter
o controlo. Mesmo quando eram colocadas no poder outras
pessoas, nem sempre se viravam contra o régulo.
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O próprio Estado veio a sentir necessidade de se apoiar


fortemente nos régulos, assumindo e reforçando a sua
importância nas hierarquias locais. Na segunda metade da década
de 1980’, face à crise económica que o país enfrentava, na
província de Nampula, os régulos foram chamados a desempenhar
o papel de «chefes de produção», voltando a actuar como
controladores da economia camponesa, à imagem do que era o
seu papel no período colonial.

9.1.2. Organização judiciária a Luz da constituição de 1975

De acordo com a CRM de 1975 a função jurisdicional era exercida


pelos tribunais, através do tribunal popular supremo (TPS) e dos
demais tribunais determinados na lei sobre a organização
judiciária56, que relativamente aos tribunais, para além dos já
citados TPS, previa os Tribunais Populares Provinciais, os Tribunais
Populares Distritais, os Tribunais Populares de Localidade, e ainda
os Tribunais Populares de Bairro quando excepcionalmente nas
cidades a densidade populares populacional ou outra
circunstancia o justificassem57.

No exercício das suas actividades, aos tribunais cabia a


prossecução de certos fins com vista a realização da justiça,
designadamente: garantir, reforçar a legalidade, defender e
salvaguardar os princípios determinados na constituição e na
legislação avulsa, defender os direitos e legítimos interesses dos
cidadãos e dos diferentes órgãos com existência legal, reprimir e
combater as violações da legalidade; e educar os cidadãos no
cumprimento voluntario e consciente das leis estabelecendo uma
justa e harmoniosa convivência social58.

A CRPM de 1975, consagrava o princípio da independência dos

56
Lei 12/78 de 12 de Dezembro
57
Art. 10/1 e 2, Lei 12/78 de 2 de Dezembro
58
Arts. 70 e 71, ambos da CRPM de 1975 e ns 1, 2 e 3 da LOJ
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juízes, por força do qual este no exercício das suas funções eram
independentes e apenas deviam obediência a lei.59 Por força do
referido princípio “…os Juízes estão apenas subordinados a lei.,
não podendo deixar-se influenciar por quaisquer pressões, nem
podendo receber ordens de qualquer órgão.60

Além do princípio da independência a LOJ então em vigor também


consagrava a garantia de inamovibilidade, por força do qual o
afastamento do juiz, das funções judiciais só poderia ser feito em
virtude de fundamentos estabelecidos legalmente.61 As
entendidas públicas e privadas tinham o dever de apoiarem os
órgãos judiciais na descoberta da verdade e na realização da
justiça, para além de que deviam, outrossim obrigatoriamente
respeitar, observar e aplicar as decisões dos tribunais.

9.2.2. Competência do Tribunais

9.2.2. Composição9.2.2.1.Tribunal Popular Supremo

O TPS era o mais alto órgão judiciário cuja jurisdição compreendia


todo o território nacional, cabendo-lhe garantir a aplicação
uniforme da lei por todos os tribunais ao serviço do povo
moçambicano62. Ao mesmo cabia garantir a aplicação uniforme da
lei por todos os tribunais, quer emanando instruções ou directivas
de carácter geral de cuja observância estavam sujeitos os tribunais
de escalão inferior, mediante uniformização da jurisprudência
quando, no domínio da mesma legislação e sobre uma mesma
questão fundamental de direito tivessem sido proferidas soluções
contraditórias nas suas secções.63

Para além de nomear os juízes do TPS, o Ministério da Justiça

59
Art.65 da CRPM de 1975 conjugado com o art .5 da LoJ
60
NOTICIAS, ANO III – n 17.568 de Maio de 1978, Citado Ribeiro José Cuna
61
Art 5 da LOJ.
62
CUNA, José Ribeiro (2013, p.32) “ o TPS entrou em funcionamento a partir de
1988, com a nomeação para alem dos Juízes conselheiros, dos respectivos Presidentes
e vice-presidente
6363
Art. /1 e 2, e alínea a) do art 18 da LOJ.
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tinha ao abrigo do nº 6 do art. 15 competência para sob proposta


do Presidente do TPS e quando as condições do seu
funcionamento o justificassem, fixar por Portaria a especialização
das competências das secções.

Relativamente a sua composição, o TSP era constituído por um


mínimo de seis Juízes nomeados pelo MINJUS, os quais deveriam
ter como requisitos, a licenciatura em Direito e idade não inferior
a 25 anos. Era composto ainda por um mínimo de 18 Juízes eleitos,
quais 9 eram suplentes como se pode constatar nº 1 do art. 14 da
LOJ.

No que toca as competências, é preciso ter em conta que o TPS


funcionava em secções como tribunal de 2ª instância (arts. 13/2 e
15/1 ambos do LOJ).

Constituía competência do TPS como pleno, designadamente:


uniformizar a jurisprudência quando no domínio da mesma
legislação e sobra a mesma questão fundamental de direito
tivesse sido proferida soluções contraditórias nas varias instancias
do próprio TPS, decidir os conflitos de jurisdição entre tribunais e
outras autoridades, decidir os conflitos de competência cujo
conhecimento não pertencia a outros tribunais, julgar os
processos-crime em que fosse arguido membro do Comité Central
da FRELIMO64, deputados da Assembleia Popular, entidades
nomeadas pelo PR, Juízes do TPS os magistrados do MP junto do
mesmo tribunal, ordenar as suspensão, a requerimento do PGR,
da execução das sentenças proferidas pelos tribunais de escalão
inferior, desde que a decisão fosse manifestamente injusta ou
ilegal.

Anular as sentenças manifestamente injustas ou ilegais, ordenar a


suspensão ou anular a requerimento do PGR, da execução das

64
No período pós independência a FRELIMO era partido único cunha linha politica
orientava a RPM e era a forca dirigente do Estado e da Sociedade (art. 3 da CRPM)
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sentenças proferidas por tribunais de escalões inferior, quando os


juízes que intervenham nos julgamentos tenham sido acusados de
prática de crime susceptíveis de terem influído na decisão,
ordenar que a causa seja julgada no tribunal diferente do
competente, quando tal justifique e seja requerido pelos
interessados ou pelo MP, e emanar instruções ou directivas de
carácter geral, para os tribunais de escalão inferior com vista a
garantir uniformidade da aplicação das lei e no desenvolvimento
da actividade processual.65

De acordo com o disposto no artigo 20 da LOJ, o funcionamento


em secções ao TPS competia: julgar os recursos interpostos das
decisões proferidas pelos TPP’s e todos os que, de acordo com a
lei deviam para ele ser interposto, conhecer os conflitos de
competência entre TPP’s ou entre estes e o TPD’s; julgar os
processos-crime que tivessem sido instaurados contra Juízes e
magistrados do MP junto dos TPP’s e ainda contra juízes eleitos
dos mesmo tribunais, por factos relacionados como o exercício
das suas funções, rever as sentenças proferidas nos tribunais
estrangeiro, proceder a revisão das sentenças penais, propor ao
plenário a adopção de instrumentos ou directivas de carácter
geral, para os tribunais de escalão inferior, para garantir a
uniformidade na aplicação na aplicação das leis e no
desenvolvimento da actividade processual.

9.1.2.2. Os Tribunais Populares Provinciais (TPP).

O TPP no que refere a sua composição, nos termos dos nºs 2 e 3


do art. 21 da LOJ, era constituído por um juiz nomeado pelo
Ministro da Justiça, a quem competia presidi-lo, e por quatro
juízes eleitos, e nos casos em que o volume de trabalho o

65
Art.18 da LOJ al. a),b),c),d),e) f), g),h) e I.
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justificava organizavam-se em secções com igual composição.

Eram competências do TPP em matéria cível: conhecer das causas


que não fossem da competência de outros Tribunais, conhecer dos
recursos interpostos das decisões dos TPD’s, e conhecer dos
conflitos de competência entre os Tribunais Distritais da Província
de sua jurisdição.66

Em matéria criminal, de acordo com as disposições supracitada


constituíam competências do TPP nomeadamente: julgar as
infracções criminais cujo conhecimento não fosse atribuído a
outros tribunais, conhecer dos recursos interposto das decisões
dos TPD’s, e conhecer das infracções cometidas pelos juízes
nomeados e magistrados do MP junto dos TPD’s e ainda as
cometidas pelos juízes eleitos junto dos mesmos tribunais por
factos relacionados com o exercício das suas funções.

O TPP também competia emanar instruções ou directivas ou


instruções de carácter geral, a que estavam sujeitos os tribunais
de escalão inferior para garantir uniformidade na aplicação das
leis e no desenvolvimento da actividade processual, como se
constata do prescrito no nº 3 do art. 23, com referência ao art.7
ambos da LOJ.

No exercício das suas competências, o TPP ou cada uma das suas


secções tomava deliberações e realizava julgamentos em
conferência, na qual intervinha o juiz nomeado e quatro juízes
eleitos, e não podiam deliberar sem que estivessem presentes,
pelo menos, dois juízes eleitos, além do juiz nomeado sendo que a
intervenção dos juízes eleitos nos processos cíveis limitava-se
apenas á decisão sobre a matéria de facto67.

Ao Juiz nomeado eram conferidas, pela lei, competências próprias

66
Alíneas a,b, e c do nº1 do art.23 da LOJ
67
Art.22/1 e 3, LOJ
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que as exercias individualmente, sendo de referir as competências


para despachar, até a fase de julgamento, nos termos da lei todos
os processos cíveis e criminais, elaborar sentenças, preparar e
julgar providências cautelares, e decidir os processos de inventário
para que não sejam competentes outros tribunais e quando não
tenha lugar produção de prova.68Junto dos TPP’s o MP era
representado por delegados do PGR.69

9.1.2.3. Os Tribunais Populares Distritais (TPD)

O TPD, no que refere a sua composição, era constituído por um


Juiz nomeado pelo Ministro da Justiça, ouvido o Governador da
Província e juízes eleitos, o seu funcionamento era em colectivo,
intervindo nos julgamentos o Juiz nomeado e os quatro Juízes
eleitos, sendo que não podia deliberar sem que estivessem
presente, pelo menos, dois juízes eleitos e o presidente, que era o
juiz nomeado, que tinha a competência de dirigir as sessões e a
audiência do julgamento70.

De acordo com o art. 32 al. a) e b) do nº1 da LOJ, em matéria cível


era competência do TPD julgar questões relativas ás relações da
família e todos as demais cujo valor não excedesse cinquenta mil
escudos71, para que não fossem competentes outros tribunais e
conhecer dos recursos das decisões dos TPLʼs.

Em matéria criminal, constituía competência dos TPD: julgar as


infracções criminais cujo conhecimento não fosse atribuído a
outros tribunais, nem a pena aplicável fosse superior a dois anos
de prisão, conhecer as infracções cometidas pelos juízes do TPL
por facto praticado no exercício das suas funções e julgar os

68
Alíneas a, b, c, e g do art. 25 da LOJ.
69
Alínea c do art. 43 da LOJ.
70
Art. 30, 31 nºs 1 e 2, art. 47 todos da LOJ
71
De referir que o escudo nessa altura era moeda oficial, pois o metical só foi
adoptado e criado em 1980.
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recursos interpostos das decisões proferidas pelos TPL72.

Quanto ao Presidente do TPD, que era o juiz nomeado pelo


Ministro da Justiça, eram conferidas pela lei a generalidade das
competências atribuídas ao presidente do TPP, com limitação de
valor nos casos em que a competência respeitasse a um processo
cível tendo em conta o seu escalão.

A Jurisdição dos TPD incidia sobre o distrito, nas áreas onde


coincidia o distrito ser a capital da província a competência
pertencente aos TPD era exercida pelos TPP73.

9.1.2.4. Tribunais Populares de Localidade e Tribunais Populares


de Bairro

Diferentemente das competências dos tribunais acima abordados


os TPL eram constituídos apenas por juízes eleitos, na sua
actividade, o TPL devia privilegiar a reconciliação das partes em
todas as questões que fossem levadas ao seu conhecimento,
contanto aquela não contrariasse as disposições legais em vigor, e
sempre que não se conseguisse a reconciliação ou esta não fosse
possível devia julgar de acordo com o bom senso e com justiça.

Em matéria cível a competência dos TPL limitavam-se as causas


até o valor de dez mil escudos e as questões relativas a menores, e
em matéria criminal também de acordo com bom senso e justiça,
julgava infracções de pequena gravidade e que ajustasse as
seguintes medidas: crítica pública, privação por um certo período
de dias, não superior a trinta dias de exercício direito cujo o uso
imoderado originou a infracção, prestação de serviço ao povo por
um período não superior a trinta dias, multa no valor máximo de
mil escudos, e indemnizações de prejuízos causados pela

72
Cit. Art. 32 al. a), b) e c) do nº2
73
Art. 24 conjugado com o art.31 nº2 da LOJ
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infracção, na medida esta podia ser aplicada automaticamente ou


acompanhada qualquer das outras74.

Podemos dizer que o TPL julgava casos valor baixo e infracções de


pequena gravidade e, como tais não passíveis de pena privativa de
liberdade.

Por via do art. 40 da LOJ, os tribunais Provinciais de Bairro tinham


a mesma composição e competência dos TPL.

Sumário
Depois de uma luta armada de cerca de dez anos, conduzida pela
Frente de Libertação Nacional (FRELIMO), uma união de vários grupos
de resistência ao colonialismo, Moçambique tornou-se independente
em 25 de Junho de 1975. Era necessário desenvolver uma cultura
nacional, construindo um país unido.

Nas zonas libertadas, tinha sido já experimentado um modelo de


justiça popular, que devia substituir o papel das autoridades
tradicionais e do direito costumeiro. De acordo com a CRM de 1975 a
função jurisdicional era exercida pelos tribunais, através do tribunal
popular supremo (TPS) e dos demais tribunais determinados na lei
sobre a organização judiciária75, que relativamente aos tribunais, para
além dos já citados TPS, previa os Tribunais Populares Provinciais, os
Tribunais Populares Distritais, os Tribunais Populares de Localidade, e
ainda os Tribunais Populares de Bairro quando excepcionalmente nas
cidades a densidade populares populacional ou outra circunstancia o
justificassem

74
Art 38 nº 1 e2 al. a), b), c) e d) do LOJ
75
Lei 12/78 de 12 de Dezembro
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Exercícios de Auto-Avaliação
1. No exercício das suas actividades quais irão as atribuições dos
tribunais?

Resposta: aos tribunais cabia a prossecução de certos fins com vista a


realização da justiça, designadamente: garantir, reforçar a legalidade,
defender e salvaguardar os princípios determinados na constituição e
na legislação avulsa, defender os direitos e legítimos interesses dos
cidadãos e dos diferentes órgãos com existência legal, reprimir e
combater as violações da legalidade; e educar os cidadãos no
cumprimento voluntario e consciente das leis estabelecendo uma
justa e harmoniosa convivência social

2. Quais as atribuições do Tribunal Popular Superior

Resposta: O TPS era o mais alto órgão judiciário cuja jurisdição


compreendia todo o território nacional, cabendo-lhe garantir a
aplicação uniforme da lei por todos os tribunais ao serviço do povo
moçambicano. Ao mesmo cabia garantir a aplicação uniforme da lei
por todos os tribunais, quer emanando instruções ou directivas de
carácter geral de cuja observância estavam sujeitos os tribunais de
escalão inferior, mediante uniformização da jurisprudência quando, no
domínio da mesma legislação e sobre uma mesma questão
fundamental de direito tivessem sido proferidas soluções
contraditórias nas suas secções

Exercícios
1. Quais as Atribuições do Tribunal Popular De Província?

2. Qual o papel dos juízes eleitos nos tribunais populares?

3. Para alcançar os Democrático de Direito era necessário morrer a tribo e


nascer uma nação, segundo o Presidente Samora Machel, segundo os
conhecimentos adquiridos como seria isto possível?

4. Quais as Atribuições do Tribunal Popular De Distrito?

5. Quais as Atribuições do Tribunal Popular De Bairro?

6. Em que consistia a justiça popular?


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TEMA - X: A Hegemonia do Neoliberal e ascensão do


Paradigma neoliberal do direito na II Republica
UNIDADE 10.1. A Economia Neoliberal e a Democracia em Moçambique e sua Influencia.

Unidade Temática 10.1. A Economia Neoliberal e a Democracia


em Mocambique e sua Influencia no Direito

Introdução
Esta unidade pretende analisar a influência da economia neoliberal no
direito Moçambicano. Dotando o estudante de conhecimento sobre a
evolução da organização jurídica e judicial de Moçambique com a
introdução do sistema democrático multipartidário

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Explicar as razoe da mudança do paradigma Socialista para o


neoliberal e as influências directas na organização do Direito
Objectivos em Moçambique;

 Caracterizar a organização judiciária a luz da constituição de


1990.

 Identificar as evoluções da organização judiciária a luz das


Constituições de 1990 e 2004

10.1.2. A economia neoliberal e a democracia

Ainda na década de 1980’, a FRELIMO vê-se obrigada a reconhecer


o fracasso do seu desempenho em termos económicos. Se os
efeitos da guerra não podiam ser subestimados, era impossível
continuar a acreditar na estratégia económica socialista nos
moldes que até então vinha sendo conduzida. A tendência foi,
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então, aderir à ideologia que viria a tornar-se dominante em


termos globais: o neoliberalismo. Em 1984, o governo aderiu às
Instituições de Breton Woods, nomeadamente ao Banco Mundial
e ao Fundo Monetário Internacional.

Ao novo modelo económico impunha-se um modelo político


assente na democracia representativa multipartidária. Em 1990 foi
aprovada uma nova Constituição, que visava adequar o quadro
legal ao novo contexto económico e político, reconhecendo o fim
da República Popular e a substituição do sistema de economia
centralmente planificada pela economia de mercado. Em 1994,
decorreram as primeiras eleições multipartidárias. É, pois, neste
contexto que os papéis atribuídos aos tribunais populares,
nomeadamente aos de base, e às autoridades tradicionais têm
vindo a ser reconfigurados.

A Constituição de 1990 consagra os princípios da separação de


poderes, da independência, da imparcialidade, da
irresponsabilidade e da legalidade, lançando bases para a
produção de alterações substanciais na organização judiciária.
Assim, com a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, os juízes eleitos
passam a intervir apenas nos julgamentos em primeira instância e
sobre matéria de facto (art. 10.º). Seguindo uma interpretação
restritiva da norma constitucional, segundo a qual «os tribunais
decidem pleitos de acordo com a lei», os tribunais de base foram
excluídos da organização judiciária, passando os tribunais distritais
a funcionar como primeira instância. Ainda no mesmo ano foram
criados, por lei própria, os tribunais comunitários.

No preâmbulo da lei dos tribunais comunitários pode ler-se que


«as experiências recolhidas por uma justiça de tipo comunitário no
país apontam para a necessidade da sua valorização e
aprofundamento, tendo em conta a diversidade étnica e cultural
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

da sociedade moçambicana».

Assim, considerou-se necessária «a criação de órgãos que


permitam aos cidadãos resolver pequenos diferendos no seio da
comunidade, contribuam para a harmonização das diversas
práticas e para o enriquecimento das regras, usos e costumes e
conduzam à síntese criadora do direito moçambicano».

A lei prevê que os TCs deliberem sobre pequenos conflitos de


natureza civil, conflitos que resultem de uniões constituídas
segundo os usos e costumes e delitos de pequena gravidade, que
não sejam passíveis de penas de prisão e se ajustem a medidas
definidas na lei (art. 3.º). Prevê, ainda, que os tribunais procurem,
em primeiro lugar, a reconciliação das partes e, em caso de
insucesso, julguem de acordo com «a equidade, o bom senso e a
justiça» (art. 2.º). A regulamentação destes tribunais está por fazer
até hoje.

Se Gundersen colocava os tribunais populares de base na fronteira


entre o formal e o informal, Boaventura de Sousa Santos classifica
os tribunais comunitários como o híbrido jurídico por excelência,
por se encontrar num limbo institucional, na medida em que são
reconhecidos por lei, mas estão fora do sistema judicial e não
estão regulamentados.

No que diz respeito às autoridades tradicionais, foi anunciado no


ponto anterior que opção política de as abolir veio a constituir um
problema para o governo, que para além de não dispor de
recursos para criar, de raiz, novas estruturas político-
administrativas, quando as constituía, estas não eram
automaticamente aceites pela população.

A verdade, como foi referido, é que as ATs mantiveram, em


grande medida, a sua legitimidade, trabalhando muitas vezes em
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conjunto com os tribunais populares e até com os grupos


dinamizadores e encontrando na oposição da RENAMO uma
alternativa à recuperação do seu prestígio. O novo quadro
democrático e multipartidário abria agora espaço à
descentralização do Estado, sendo no âmbito desse processo
pouco pacífico, de avanços e recuos, que se rediscute o papel a
atribuir às ATs.

A nível nacional, a urgência desta discussão passou não só pela


necessidade de reconhecimento de práticas locais que nunca
deixaram de existir, mas também, pela preocupação do partido
FRELIMO, num contexto de aproximação de eleições
multipartidárias, com a importância das autoridades tradicionais
no controlo social e político das populações. Assim, nos primeiros
anos da década de 1990’, o Núcleo de Desenvolvimento
Administrativo (NDA) do Ministério da Administração Estatal deu
inicio à elaboração de um conjunto de estudos sobre o papel que
efectivamente as autoridades tradicionais desempenhavam no
país e reconheceu que «dentro das diferenças que existem de
região para região, a autoridade tradicional está presente e é
importante em todo o território nacional».

A institucionalização e o reconhecimento formal das autoridades


tradicionais ocorreram com a Lei 3/94, de 13 de Setembro, o
primeiro diploma legal em matéria de descentralização, que
atribuía um papel às autoridades tradicionais no processo de
consulta e tomada de decisões locais e no arbítrio de conflitos e
questões relacionadas com o uso da terra. No entanto, nas
primeiras eleições multipartidárias ocorridas no mês de Outubro
de 1994, ainda que se tenham reunido as condições de pacificação
e democratização necessárias para proceder ao processo de
descentralização do país, os bons resultados obtidos pela
RENAMO fizeram a FRELIMO sentir-se ameaçada no que toca à sua
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

hegemonia ao nível local.

Esta situação, associada a divergências entre a FRELIMO e a


RENAMO sobre o teor da legislação, acabou por conduzir à
substituição da Lei 3/94, pela Lei n.º 2/97, de 18 de Fevereiro, que
limita a participação das autoridades tradicionais e a sujeita a
regulamentação ministerial.

O debate das ATs foi reintroduzido com a discussão em torno da


Lei de Terras, onde surgiu a expressão «líderes locais» e se lhes
atribuiu um papel de intervenção na gestão dos recursos naturais,
na resolução de conflitos, no processo de titulação e na
identificação das terras ocupadas e a ocupar.

Os condicionantes internacionais mostravam-se favoráveis ao


fortalecimento das autoridades tradicionais, bem como dos
tribunais comunitários. As receitas dos Planos de Reestruturação
Económica, aplicadas em vários países «em desenvolvimento»
vieram a ser reconsideradas na década de 1990.

Ainda que os programas de ajustamento estrutural tenham levado


a uma certa estabilização económica, não promoveram
crescimento, tiveram um impacto social negativo e,
consequentemente, um impacto político ao afectar a legitimidade
dos governos africanos. Assim, o Banco Mundial foi obrigado a
reformular a filosofia dos seus programas, incorporando uma
dimensão social na sua intervenção, articulando os Programas de
Ajustamento Estrutural com o objectivo do combate à pobreza e
colocando a ênfase na democracia e na boa governação.

É neste contexto que surge o interesse pela descentralização, que


aos olhos do Banco Mundial possibilita uma maior eficiência da
distribuição de recursos ao nível local.[49] O relatório de 1997 do
Banco Mundial (1997 World Development Report. The state in a
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

changing world) constituiu um marco fundamental na mudança de


política, ao aceitar que o Estado é central para o desenvolvimento
económico, social e sustentável.

A revigoração da capacidade institucional é tida como


fundamental e um dos meios da sua realização é a aproximação
do Estado aos cidadãos por via de uma maior participação e da
descentralização

10.1.3. Organização Judiciaria a Luz da Constituição da Republica


de 1990
Neste ponto se faz abordagem da organização judiciária a luz da
constituição de 1990, tal como a anterior trata-se de competência
e composição dos tribunais judiciais e porque do ponto de vista da
sua hierarquia eram três categorias: Tribunal Supremo, os
Tribunais Judiciais de Província e Tribunais Judiciais de Distrito,
sem deixar e falar dos tribunais comunitários.

A CRM de 1990 consagrou, grosso modo, os objectivos dos


tribunais que a CRPM de 1975 que lhe antecedeu consagrara
designadamente: garantir e reforçar a legalidade como
instrumento de estabilidade jurídica, garantir o respeito pelas leis,
a defesa os direitos e liberdades dos cidadãos, assim como
interesses jurídicos dos diferentes órgãos e entidades com
existência legal, reprimir e combater, isto é penalizar as violações
da legalidade, e educar os cidadãos no cumprimento voluntário e
consciente das leis estabelecendo uma justa e harmoniosa
convivência social76 .

Foi reafirmada a obrigatoriedade do cumprimento das decisões


dos tribunais para todos os cidadãos, o princípio da independência
dos juízes, os quais no exercício das suas funções deviam
obediência apenas a lei. Aspecto marcante foi a consagração dos

76
podemos constatar nos nºs 1, 2 e 3 do art.161 da CRM de 1990 e nºs 1, 2, e 3 do
art.3da lei 10 3 de 6 de Maio (Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais) já revogada.
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tribunais como órgãos de soberania, consequentemente a


separação dos poderes.

10.1.3.1. Composição e 10.1.3.1. competências dos tribunais

Importa referir que neste ponto, iremos apenas trazer os aspectos


gerais não trazendo aspectos de fundo, por uma questão de
tempo e rigor científico nos reservando a aprofundar a grande
temática em discussão.

a) Tribunal Supremo (TS)

O TS era, por definição o mais alto órgão judicial com jurisdição


em todo território nacional, cabendo-lhe garantir o cumprimento
uniforme da lei ao serviço dos interesses do povo moçambicano,
bem como direcção do aparelho judicial77.

O TS era constituído por juízes profissionais e juízes eleitos, em


número estabelecido por lei, sendo que os primeiros eram
nomeados pelo PR, ouvido o CSMJ e a eleição dos segundos
competia a AR78. Houve uma evolução no que toca as
competências para nomear os Juízes com a anterior organização.
Segundo a LOJ constituía também o TS, o respectivo Presidente e
Vice-presidente.

Os TS funcionava em secções, como tribunal da primeira e


segunda instância, e em plenário como tribunal de segunda
instância e tribunal de instância única, nos casos especialmente
previstos na lei, sendo que nos julgamentos a matéria de direito
era sempre decidida pelos juízes profissionais, e os juízes eleitos
participavam somente nos julgamentos em primeira instância
conforme as as disposições das alíneas a) e b) do art.169
conjugado com os nºs 1 e 2 do art.171, ambos da CRM de 1990

77
Nº 2 e 3 do art 168 da CRM de 1999 e art.28 nç1,2 e 3 da LOTJs
78
De acordo com os nºs 1, 2 e 4 do art. 70 da CRM de 1990
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b) Tribunais Judiciais de Província (TJP)

O TJP e de cidade tinham, ao abrigo do art. 48, da LOTJs, jurisdição


na área territorial da província e da cidade capital e no que
respeita a sua composição, funcionava como Tribunal de segunda
instância era composto por três juízes profissionais e funcionava
como Tribunal de primeira instância integrava um juiz profissional
quatro Juízes eleitos de acordo com as alíneas a) e b) do nº 1 do
art.49 do mesmo diploma legal.

Segundo a mesma lei, o quórum de deliberações do TJP, que era


de pelo menos dois juízes, além do juiz profissional, quando
funcionavam em primeira instância, e todos os juízes profissionais,
que eram três como anteriormente mencionamos, neste caso
funcionava a segunda instância79.

Constituíam suas competências ao abrigo do art. 51 e 52 ambos


do LOTJs, como tribunal de primeira instância: conhecer causas
que não fossem da competência de outros tribunais, julgar e
conhecer acções de perdas e danos intentados no exercício das
suas funções contra juízes de escalão inferior e magistrados do MP
dos TJDs isto em matéria cível.

Em matéria criminal competia julgar infracções criminais cujo


conhecimento não fosse atribuído a outros tribunais e conhecer
das infracções praticadas por juízes e magistrados de MP junto dos
TJDs.

No que diz respeito a segunda instância competia conhecer dos


recursos interpostos das decisões dos TJDs e dos demais que por
lei, lhe devessem ser submetidos e conhecer dos conflitos de
competência entre os TJDs da sua área de jurisdição.

79
Art. 50 nº 1 e 2 da LOTJs
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

c) Tribunal Judicial de Distrito

Os TJD exerciam jurisdição na área territorial de distritos. Quanto


a sua composição a lei não prescrevia o número de juízes eleitos.

Por sua vez os TJD desdobram-se em: tribunal de 1ª e 2ª classe,


diferendo nas competências, estas previstas no art. 59 nº1 al. a) e
b) e nº2 da LOTJs conjugado com o art. 60 nº1 al. a) e b) e nº 2 da
mesma lei.

Segundo CUNA80 as competências em matéria cível dos TJD de 1ª


e 2ª classe conheceram actualizações introduzidas pelo Decreto nº
24/98, de 2 de Junho. Dado que á data da entrada da então LOTJs,
a Lei nº 10/92, de 6 de Maio, a classificação dos tribunais ainda
não tinham sido aprovada e aplicada, os tribunais distritais
assumiam, a título transitório ao abrigo do art. 83 da LOTJs, as
competências próprias dos tribunais da 2ª classe.

Aos Juízes presidentes dos TJDs eram conferidas as competências


consagradas no artº 61 e as respectivas alíneas da LOJTs.

10.1.4. A Organização judiciária a luz de constituição de 2004.


Neste ponto, irá se abordar a organização judiciária a luz da actual
Constituição, a abordagem não será muito diferente a dos pontos
anteriores, mas aqui iremos aprofundar um pouco mais, tocando
alguns aspectos como a independência dos tribunais e as garantias
da independência e imparcialidade dos juízes. Salientar que não
tocaremos questões ligadas a nomeação e cessação de funções do
Presidente e Vice-presidente.

10.1.4.1. Tribunais existentes a luz da constituição


A luz da CRM vigente, em Moçambique os tribunais existente são os
seguintes: o TS, o TA e os tribunais judiciais, ainda prevê também a

80
CUNA, José Ribeiro. Organização Judiciaria em Moçambique: Continuidades e
Rupturas. 2013, p.70
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

possibilidade de existirem tribunais administrativos, de trabalho,


fiscais, aduaneiro, marítimo, arbitrais e comunitários81.

Está prevista, ainda a existência na primeira instância de tribunais com


competência específica e tribunais especializados para julgamento de
determinadas matérias, como é o caso de tribunal de menores e de
polícia. São também tribunais de competência especializados tribunais
de trabalho, marítimo, aduaneiros, fiscais e tribunais administrativo.

A luz da Constituição82 não é permitida a existência de tribunais com


competência exclusiva para julgamento de certas categorias de crime,
ressalvadas a constituição de tribunais militares durante a vigência de
estado de guerra com competência para julgar crimes de natureza
estritamente militar.

Face a diversidade dos tribunais acima mencionados Segundo


CUNA83:ʺ…resulta a afirmação de que o ordenamento jurídico
moçambicano acolhe em matéria de organização judiciária, o principio
de pluralidade de jurisdições, pois as funções judiciais são atribuídas
uma pluralidade de órgãos enquadrados em jurisdições diferenciadas
e independentes entre siʺ.

No que diz respeito aos órgãos de gestão e disciplina, para além do


CSMJ relativo à magistratura judicial prevê o Conselho Superior da
Magistratura Judicial Administrativa, Fiscal e Aduaneira84.

A CRM ainda consagra o conselho constitucional que, apesar da sua


designação, é na verdade órgão de soberania com funções
jurisdicionais, competindo-lhe especial administrar a justiça em
matéria de natureza jurídico-constitucional85.

81
Art. 223 nº 1 e 2 da CRM de 2004. Importa referir que já foram criados os tribunais
de trabalho, tribunais aduaneiros, tribunais fiscais e tribunais administrativos, embora
alguns ainda não se encontrem efectivamente instalados e em funcionamento.
82
Vide arts. 223 nº6 e 224 da CRM
83
CUNA, José Ribeiro. Organização Judiciaria em Moçambique: Continuidades e
Rupturas. 2013, p.79
84
Segundo os arts. 220 e 232 da CRM
85
Sobre a composição e competência do CC vide os arts. 241, 242 e 244 da CRM
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

Reconhecendo a importância do papel das demais instâncias de


composição de resolução de conflitos, a CRM previu a possibilidade de
definição, por lei de mecanismos institucionais e processuais de
articulação entre estes e os tribunais dando assim aos cidadãos a
possibilidade de recorrerem a meios alternativos de resolução de
conflitos.

10.1.4.2. Composição e Competências dos Tribunais judiciais


A LOJ, aprovada pela lei nº 24/2007, de 20 de Agosto prevê exercício
da função judicial através do TS e demais tribunais estabelecidos na
lei. Esta lei regula a organização judiciária dos tribunais judiciais, os
quais reconduzem-se a quatro categorias de acordo com a sua
hierarquia, do topo á base designados os seguintes tribunais: o TS, os
TSR’s, os TJP’s e os TJD’s que se desdobram de 1ª e 2ª Classe86.

De seguida vamos debruçar detalhadamente as categorias dos


tribunais referidos, no que toca a sua composição e competência.

a) Tribunal Supremo.

O TS é definido como sendo o mais alto órgão judicial com jurisdição


em todo território nacional, cabendo-lhe garantir a aplicação uniforme
da lei ao serviço dos interesses do povo moçambicano bem como a
direcção do aparelho judicial.

No que diz respeito a composição deste tribunal, segundo o disposto


no art. 226 nº1 da CRM e art.42 da LOJ, é constituído pelo Presidente,
Vice-presidente, juízes profissionais e juízes profissionais e eleitos,
estabelecendo a lei um número mínimo de sete e dezassete,
respectivamente para juízes profissionais e juízes eleitos.

86
De acordo com o artigo 29 nº1 al. a, b, c e d da LOJ
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

A integração de juiz eleito no TS, bem assim nos tribunais de escalão


inferior, segundo CUNA·, traduz a participação popular na
administração da justiça. O Juiz presidente e Vice-presidente como os
juízes profissionais são nomeados pelo PR, havendo em qualquer dos
casos uma participação do CSMJ.

Na nomeação do Presidente e Vice-presidente, tomando em


consideração o disposto no art. 226 da CRM, a participação do CSMJ se
resume em ser ouvido pelo órgão competente para nomeá-lo e não
sendo vinculativo o pronunciamento daquele órgão de gestão e
disciplina da magistratura judicial, resulta daí que o PR pode nomear
determinada pessoa, ainda que o CSMJ não tenha sido favorável.

Relativamente aos juízes profissionais ou juízes conselheiros, a


participação do CSMJ no processo que culmina com a sua nomeação,
consiste em propor a nomeação, após concurso público, de avaliação
curricular aberto a magistrados e outros cidadãos nacionais, de
reputado mérito87, quanto aos requisitos esses são determinados nos
nºs 3 e 4 do art. 226 da CRM.

No que tange ao funcionamento e competência, com vista ao seu


funcionamento ou exercício da função jurisdicional, o TS organiza-se
em plenário e em secções, deferindo aos níveis de instância num e
noutro caso, bem como a respectiva composição no que toca a
integração do presidente, vice-presidente e juízes conselheiros ou
juízes profissionais e juízes eleitos.

Assim em plenário o TS funciona como tribunal de segunda instância e


de instância única, e em secção funciona como tribunal de primeira
instancia e segunda instancia como resulta do art. 43 al. a) e b) da LOJ.

Sem prejuízo das competências conferidas pela LOJ, que permite o TS


conhecer tanto da matéria de facto quanto da matéria de direito, em
regra os seus poderes de cognição limitam-se á matéria de direito.

87
Art. 226 nº3 da CRM
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

b) Tribunais Superiores de Recurso

Segundo TIMBANE88: ʺ desde a independência que a organização


judiciaria em Moçambique deixou de compreender tribunais de
escalão intermédio entre TS e os tribunais de nível provincial, tribunais
que no conteste da organização judiciária do período colonial era
designados Tribunais da Relação e que eram essencialmente tribunais
de recursos

Com a aprovação da actual LOJ, o país passou a contar com uma


organização judicial ideal, materializando o previsto no art.223 nº3 2ª
parte da CRM, fala-se aqui da introdução dos TSR, em sendo este um
tribunal intermédio entre o TS e TJP.

Segundo o art.114, nº2 al. a), b) e c), actualmente estão criados os TSR
de Maputo com jurisdição sobre os tribunais judiciais de província de
Maputo, Inhambane, Gaza; TSR da Beira com jurisdição sobre os
Tribunais Judiciais das províncias de Sofala, Manica e Tete; e os TSR de
Nampula com jurisdição sobre os tribunais judiciais das províncias da
Zambézia, Nampula Cabo Delgado e Niassa.

A composição do TSR varia consoante funcione como tribunal de


segunda ou primeira instância, como resulta das al. a) e b) do nº1 do
art. Neste sentido, como tribunal da 2ª instancia o TSR é constituído
por três juízes desembargadores, ou seja é constituído somente por
juízes profissionais, não integrando nenhum juiz eleito. E como
tribunal de 1ª instância, para além de um juiz desembargador, o TSR
integra também dois juízes eleitos pois, neste caso no exercício das
suas competências deverá conhecer não só da matéria de Direito
como também da matéria de facto.

88
TIMBANE Tomas. Lições de Processo Civil I. Maputo: escolar editora, 2010,
p.238
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

O volume, a complexidade dos casos submetidos ao conhecimento do


TSR e outras circunstâncias, determinam a sua organização em
secções de competência genérica ou especializada, e estando
organizado em secções no que refere a sua composição compreende
ainda os presidentes destas.89

c) Tribunais Judiciais de Província

O TJP funciona como tribunal de 2ª classe ou como tribunal 1ª classe e


a sua composição difere num e noutro caso. Como tribunal de 1ª
instância, pode funcionar como tribunal singular ou colegial, sendo
que quando funcione em 2ª instancia as suas deliberações e
julgamento têm lugar em conferência de colectivo de juízes que o
compõem, pois, neste caso funciona sempre como tribunal colectivo90.

Quanto a sua composição funcionando em 2ª instância integra


somente juízes profissionais, em número de três, e quando funciona
em 1ª instância é constituído por um juiz profissional e quatro juízes
eleitos, mas estes integram apenas quando funcionem como tribunal
colegial, doutro modo será constituído somente pelo juiz singular, é o
que resulta do previsto nas al. a) e b) do nº 1 do art.71 da LOJ.

A LOJ determina, o quórum de deliberação ou número de presenças


dos membros que constituem o TJP para que possa deliberar
validamente, sendo dois juízes eleitos para além do juiz profissional
quando funcione em 1ª instância e como tribunal colegial e dois juízes
profissionais quando funcione em segunda instância. Atendendo e
considerando que quando funcione em 2ª instancia temos número
par, pode acontecer empate, nesta caso a LOJ prevê a intervenção do
juiz presidente do tribunal.

A lei prevê a competência do TJP em razão da matéria, quando este


funcione como tribunal de 1ª instancia, nos art. 73 da LOJ e quando

89
Art. 60 e 61 nº2 da LOJ.
90
Art. 70 da LOJ
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

funcione em 2ª instancia, o TJP tem as competências previstas no art.


74 nº1.

d) Tribunais Judiciais de Distrito

Por regra os TJD’s são de competência genérica. Assim sendo a sua


organização em secções de competência especializada ocorre somente
quando o volume, a natureza e outras razoes ponderosas o justificar, e
de forma a dar melhor resposta nos casos em que são submetidos ao
seu conhecimento e decisão91.

Tal como o TJP, o TJD pode funcionar como tribunal singular


intervindo neste caso apenas o juiz profissional, ou como tribunal
colectivo, caso em que para além do juiz profissional intervêm
também os juízes eleitos.

Na sua composição o TJD integra um juiz profissional, que é o seu


presidente, e juízes eleitos, que são num número de quatro, pois, é
este o número de eleitos que intervêm no julgamento, alem do juiz
profissional, quando funcione em colectivo, como resulta do disposto
nos arts.82, nº1 e 83 nº1, ambos da LOJ. Para efeito de deliberação
basta que estejam dois juízes eleitos, para além do juiz profissional.

De acordo com a sua classificação, os TJD’s como primeira instância,


podem ser de 1ª e 2ª classe, sendo maiores ou menores as suas
competências previstas nos arts. 84 e 85, da LOJ, em função desta
classificação.

Sumário
Na década de 1980’, a FRELIMO vê-se obrigada a reconhecer o
fracasso do seu desempenho em termos económicos. Se os
efeitos da guerra não podiam ser subestimados, era impossível

91
Art. 80 da LOJ
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

continuar a acreditar na estratégia económica socialista nos


moldes que até então vinha sendo conduzida.

A tendência foi, então, aderir à ideologia que viria a tornar-se


dominante em termos globais: o neoliberalismo. Em 1984, o
governo aderiu às Instituições de Breton Woods,
nomeadamente ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário
Internacional. Ao novo modelo económico impunha-se um
modelo político assente na democracia representativa
multipartidária.

Em 1990 foi aprovada uma nova Constituição, que visava


adequar o quadro legal ao novo contexto económico e político,
reconhecendo o fim da República Popular e a substituição do
sistema de economia centralmente planificada pela economia
de mercado. Em 1994, decorreram as primeiras eleições
multipartidárias. É, pois, neste contexto que os papéis
atribuídos aos tribunais populares, nomeadamente aos de
base, e às autoridades tradicionais têm vindo a ser
reconfigurados

Exercícios de Auto-Avaliação
1. Quais as razoes de Moçambique a aderir o neoliberalismo e
abandono do paradigma socialista?

Resposta: Na década de 1980’, a FRELIMO vê-se obrigada a


reconhecer o fracasso do seu desempenho em termos
económicos. Se os efeitos da guerra não podiam ser subestimados,
era impossível continuar a acreditar na estratégia económica
socialista nos moldes que até então vinha sendo conduzida. A
tendência foi, então, aderir à ideologia que viria a tornar-se
dominante em termos globais: o neoliberalismo. Em 1984, o
governo aderiu às Instituições de Breton Woods, nomeadamente
ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional. Ao novo
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

modelo económico impunha-se um modelo político assente na


democracia representativa multipartidária.

2. a Luz da Constituição actual quais são os tribunais existentes.

Resposta: A luz da CRM vigente, em Moçambique os tribunais


existente são os seguintes: o TS, o TA e os tribunais judiciais, ainda
prevê também a possibilidade de existirem tribunais
administrativos, de trabalho, fiscais, aduaneiro, marítimo, arbitrais
e comunitários

Exercícios
1. Apresente as inovações da organização judiciária a luz da
constituição de 1999 e 2004.

2. Segundo Boaventura Sousa Santos os tribunais comunitários são


classificados como híbridos. Porque razão o autor assim afirmou?

3. Quais as atribuições dos tribunais superiores de recursos?

4. A luz da CRM de 1990 quais as atribuições do Tribunal Supremo?

5. Quais as atribuições dos tribunais de 1 e 2 classe?

6. Que avaliação pessoal faz a respeito da evolução da organização


judicial em Moçambique.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

TEMA XI – Crise da Historicidade Jurídica, Novos Paradigmas e


Teorias Criticas.
UNIDADE Temática 11.1. Questões paradigmáticas para se repensar a história

UNIDADE Temática 11.1. Questoes paradigmaticas para se


repensar a Historia

Introdução
O Século XX traz consigo varias crises nas ciências sociais a história é
uma das ciências que vai sofrer crise, e deve de traçar novos
paradigmas que deviam ser vencido, a historia jurídica não vai ficar
fora deste cenário, nesta unidade desenvolveremos a crise da
historicidade, novos paradigmas e teoria criticas.

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Descrever as razões da crise da historicidade jurídica.

 Caracterizar as principais teorias críticas


Objectivos

11.1.1. Questões paradigmáticas para se repensar a história

Examinar e problematizar as relações entre a História e o Direito


reveste-se hoje da maior importância, principalmente quando se
tem em conta a percepção da normatividade extraída de um
determinado contexto histórico definido como experiência
pretérita que consciencialize e liberta o presente. Naturalmente
esta preocupação dissocia-se de uma historicidade ao jurídico,
marcada por toda uma tradição teórico-empírica assentada em
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

proposições revesti das pela força da continuidade,


previsibilidade; formalismo e linearidade. Mas, para se alcançar
uma nova leitura histórica do fenómeno jurídico enquanto
expressão de ideias, pensamento e instituições, faz-se necessário
apurar uma distinção das especificidades inerentes a cada campo
científico, do que seja História, do que seja Direito, bem como o
sentido e a função de uma interpretação que se reveste do viés
tradicional ou crítico.

Antes de tratar de questões relativas à vinculação mais directa da


historiografia, historicidade e história ao Direito, passamos a
considerar a História como área de investigação. Com autonomia e
características próprias. Neste sentido, a História pode ser
visualizada como a sucessão temporal dos actos humanos,
dinamicamente relacionados com a natureza e a sociedade92.

A História expressa a complexa manifestação da experiência


humana, interagia no leque de fatos, acontecimentos e
instituições. O carácter mutável, imperfeito e relativo da
experiência humana permite proceder múltiplas interpretações
desta historicidade. Daí a formulação, ora de uma História oficial,
descritiva e personalizada do passado, e que serve para justificar a
totalidade do presente, ora da elaboração de uma História
subjacente, alternativa e problematizante que serve para
modificar recriar a realidade vigente.

A postura contrastante entre uma História tradicional e uma


História "alternativa" é perfeitamente sentida por historiadores
como Peter Burke, identificados com a "nova História". Utilizando-
se de categorias advindas da Filosofia da Ciência (Thomas Kuhn) e
da Escola dos Annales, Peter Burke observa que a percepção da

92
Cf. José Van Den Besselaar, Introdução aos Estudos Históricos, 3" ed., São Paulo.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

inconsistência do paradigma tradicional foi motivada por uma


ampla variedade de mudanças que levaram à redefinição dos
conceitos, das fontes, do método e da interpretação da História
escrita.93 A análise atenta leva o historiador inglês a indicar alguns
pontos essenciais que distinguem a "antiga" da "nova" História.

Primeiramente, há de se observar que a "nova" História começou


a privilegiar toda a actividade humana, desde os mínimos
detalhes, o trivial e o quotidiano. Tal preocupação explica um
relativismo cultura que destrói as tradicionais hegemonias
temáticas que distinguem acontecimentos que são importantes e
merecem ser narrados e outros que devem ser postos de lado e'
esquecidos.

Agora, "tudo tem uma História"94. Um segundo aspecto a


considerar é que a "nova" História não se ocupa mais da narração
de acontecimentos, mas, sobretudo, das mudanças estruturais
com destaque para o social e o económico.

A terceira constatação é que a História convencional parte de uma


perspectiva de cima, ou seja, tem destacado a obra dos "grandes
homens, estadistas, generais ou ocasionalmente eclesiásticos. Ao
resto da humanidade foi destinado um papel secundário no drama
da história".95

Trata-se agora de recuperar a experiência histórica das bases, das


pessoas comuns e das mentalidades colectivas que aspiram as
rupturas sociais. Um quarto ponto que cabe sublinhar é a
obrigatoriedade de se redefinir as fontes, ainda muito presas aos

93
Cf. Peter Burke (org.), A Escrita da História: Novas Perspectivas, São
Paulo, UNESP, 1993, p. 19-20.
94
Peter Burke, A Escrita..., op. cito 11.
95
Peter Burke, A Escrita..., op. cil. 12-13.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

registos oficiais e aos documentos preservados em arquivos,


buscando outros tipos de evidências confiáveis. Além da crítica
que pode ser feita ao modelo tradicional de interpretação e
explicação histórica, Burke assevera, por último, a presunção do
paradigma tradicional em se ater a uma suposta objectividade dos
fatos que não existe, pois a realidade é sempre visualizada através
de representações, preconceitos e estereótipos96.

11.1.2. Historiografia Jurídica Tradicional: Natureza é Função

Na trajectória da cultura jurídica moderna há um consenso de que


áreas de investigação como História do Direito, História das
Instituições Jurídicas e História das Ideias ou do Pensamento
Jurídico, estão todas identificadas, ora com um saber formalista,
abstracto e erudito. Ora com uma verdade extraída de grandes
textos legislativos. Interpretações exegéticas de magistrados,
formulações herméticas de jus filósofo e institutos arcaicos e
burocratizados.

Todavia, esta longa tradição foi interrompida nas últimas duas


décadas por um renovado interesse de natureza crítico ideológico
por questões metodológicas sobre a História do Direito.
Certamente que este "approch" reflecte também o esgotamento
de um certo tipo de historiografia jurídica embaçada em valores
liberal-individualistas. Esta retomada do viés historicista acerca
das ideias ou das instituições jurídicas busca superar a demasiada
crise que se abateu sobre este campo de pesquisa.

A pouca relevância da disciplina não se deve à falta de


especialistas ou Aficionados. Mas muito mais em função de uma
crise motivada por sua falta de significado e pela dificuldade de

96
Cf. Peter Burke, A Escrita..., op. cit., p. 14-15.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

encontrar uma função que realmente justifique sua existência.97

Na verdade uma análise mais atenta sobre as razões do


exaurimento da História do Direito realça o fato de que a
historiografia jurídica da modernidade constituída em grande
parte por princípios e valores liberais burgueses. Desempenham,
no dizer de António M. Hespanha, dois objectivos muitos claros:

a) Primeiramente, "relativizar e, consequentemente desvalorizar a


ordem social e jurídica pré-burguesa. Apresentando-a como
fundada na irracionalidade no preconceito e na justiça".

b) Segundo. Realizar "a apologia da luta da burguesia contra essa


ordem ilegítima (Ancien Régime) e a favor da construção de um
Direito e de uma sociedade' naturais' e harmónicos. Isto é
libertado da arbitrariedade historicidade antenores.98

Obviamente que a crítica burguesa empregada contra o antigo


Direito e as organizações políticas feudais gerou efeitos e foi eficaz
num primeiro momento histórico mas acabou perdendo
significado com a edificação da ordem e da hegemonia liberal-
individualista.

A missão da historiografia tornou-se um instrumento de


endeusamento da ordem jurídica, política e social do modo de
produção capitalista, na medida em que o espaço
institucionalizado passa a ser coberto por um "universo ideológico
apresentado como uma situação natural independente do dever
histórico."99 Daí a historiografia jurídica presa aos textos legais e à
exegese de seus corifeus orientar-se rumo, ora a um formalismo

97
Cf. Antônio M. Hespanha. A História do Direito na História Social, Lisboa, Livros
Horizontes, s/do p. 09.
98
idem
99
Antônio M. Hespanha, A História do Direito. op. cito
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

técnico-dogmático, ora a uma erudição antiquada da vida social.

O surto do historicismo tradicional, ocultando-se no suposto mito


da neutralidade do saber e da universalidade dos princípios da
ciência positivista, expressão da fase concorrencial do Capitalismo,
abnega o “problema crítico do conhecimento histórico “e ordena-
se por uma perspectiva linear, estática e conservadora. Forja-se,
assim, um conhecimento histórico elitista calcado na construção
mútua da "neutralidade da cultura e dos intelectuais, (...)
transformados numa espécie de instância arbitral colocada acima
dos conceitos de classe”100

Na medida em que a historiografia tradicional (liberal-burguesa)


passa a ser uma mera disciplina de justificação da ordem legal
imperante e da acumulação de conhecimentos para a chamada
"cultura superior", sem fins úteis para com a realidade, a História
do Direito perde sua significação e entra em um constante
descrédito, constituindo-se num campo do saber de pouca
utilidade, acabando, seus pressupostos, por sucumbir numa crise
de eficácia.

As profundas mudanças epistemológicas nas ciências humanas, os


novos interesses, a insurgência de conflitos sociais e as recentes
transformações por que vêm passando as formas de vida
contemporânea determinam uma renovação metodológica nos
estudos históricos das instituições jurídicas e políticas.

Desta feita, urge redefinir, na historicidade da crise, os novos


marcos teórico-metodológicos que possibilitam alcançar um novo
paradigma que envolva modalidades alternativas de
interpretação, pesquisa e investigação histórica. Não mais uma

100
Antônio M. Hespanha, A História do Direito. op. cit., p. 12-13.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

historicidade linear, elitista e acumulativa, mas problematizante,


desmistificadora e transformadora. Tendo em conta esse tipo de
preocupação, importa reflectir um pouco mais a questão das
mudanças sociais; a crise dos paradigmas e os novos referenciais
para se repensar a historicidade das ideias e das instituições no
Direito.

11.1.3. Novos marcos na historicidade do direito

A renovação crítica na historiografia do Direito - no âmbito de suas


fontes históricas, suas ideias e de suas instituições - começará a
aparecer em fins dos anos sessenta e ao longo da década de
setenta101. Trata-se de substituir os modelos teóricos construídos
de forma abstracta e dogmatizada por investigações históricas,
engendradas na dialéctica da produção e das relações sociais
concretas. Sendo assim, há de se apontar que tipo de influências
do pensamento filosófico e da teoria social contribuiu para que se
repensasse quer a compreensão historicista do universo jurídico,
quer o desenvolvimento crítico da historiografia do Direito.

Sem se ater a uma descrição pormenorizada e exaustiva, cabe


assinalar cinco "eventos epistemológicos" que tiveram e ainda
exercem uma significativa influência como marco de referência
aos novos estudos históricos do Direito na. O título exemplificativo
começa-se com o registo dos três primeiros "eventos", também já
mencionados pelo jurista historiador António M. Hespanha.

a) O primeiro deles é a emergência, principalmente na Europa


Ocidental, no final da década de sessenta, de uma corrente
progressista de cunho neomarxista, que desencadeou
profundas mudanças na teoria social em geral. Escreve

101
Cf. Antônio M. Hespanha, A História do Direito op. cit., p. 14-15.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

António M. Hespanha, a esse propósito, que a "renovação dos


estudos marxistas, possibilitada politicamente pelo fim da
guerra fria, consistiu na revalidação dos textos clássicos e na
descoberta das potencialidades teóricas da interpretação do
marxismo, mérito de G. DeUa Volpe e de L. Althusser e suas
escolas102.
b) Outro "evento epistemológico" é a proposta de uma "teoria
crítica" de inspiração neo-marxista-freudiana representada
pela Escola de Frankfurt e tendo como ideólogos T. Adorno, M.
Horkheimer, H. Marcuse J. Habermas. A grande contribuição
da escola alemã é propor uma filosofia histórico-social que
possibilite a mudança da sociedade a partir da constituição de
um novo tipo de homem.

De um homem emancipado de sua condição de alienado, da sua


reconciliação com a natureza não-repressora e com o processo
histórico por ele montado. A meta de alcance utópico está na
reconciliação entre o sujeito social, a natureza não-repressora e a
história Naturalmente, a teoria crítica revela-se como um
instrumental operante que permite a tomada de consciência dos
sujeitos na história e a ruptura de sua condição de opressão,
espoliação e marginalidade. Além desse aspecto relevante da
teoria crítica enquanto processo adequado ao esclarecimento e à
emancipação, recuperando todo um conteúdo utópico libertador
do pensamento ocidental, destaca-se, igualmente, como
contundente, "Crítica dos grandes mitos da 'objectividade' da
filosofia burguesa, nomeadamente, o positivismo e o
neopositivismo. Sendo assim, para efeito de uma filosofia da
História é, de um lado, a afirmação da "validade teórica do
subjectivismo e do idealismo 'humanistas "', de outro, sob o
aspecto prático, "traz para a experiência da investigação histórica

102
António M. Hespanha. A História do Direito..., op. Cit. p. 14-15.
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

novos domínios da realidade humana e social, com o que se


abrem novos problemas e se exigem novas sínteses explicativas.

c) O terceiro referencial para se tomar em conta como


contribuição à renovação da historiografia ocidental
(particularmente da periferia) é o conjunto de critérios de
investigação e análise posto pela Escola francesa dos"
Annales". Um recorte bem delineado de seus traços é
delineado na apresentação da obra colectiva publicada, na
França, em 1980, no magazine Littéraire:

“Gerada pelo grupo que dirigiu a revista francesa Annales - que


teve como figuras centrais Lucien Febvre, Marc Bloch e Fernand
Braudel -, a chamada Nova História sofreu um grande impulso nos
últimos quinze anos, a ponto de se tornar a expressão mais
característica da historiografia francesa dos nossos dias.

De facto, em França (e não só), a história das mentalidades, a


história-problema vieram ocupar o espaço da história-relacto. O
próprio facto histórico - durante tanto tempo um valor seguro da
ciência positivista passou a ser um material como qualquer outro,
tal como no caso da Economia Política, da Linguística, da
Demografia ou da Psicanálise.

Na verdade, desconstrói-se liames do paradigma tradicional da


narrativa histórica, envolto na complexidade de grandes
estruturas explicativas isoladas, marcadas ora por um idealismo
eclético, ora por um mecanicismo cientificista, optando-se, agora,
por uma História que inter-relaciona os diversos significados da
atividade humana. Deste modo, a renovação da História sob o
aspecto da "significação" interdisciplinar proposta pela Escola dos"
Annales", objectiva, segundo o preciso esclarecimento de António
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

M. Hespanha:

a) Ultrapassar o positivismo histórico, inclinado "para a pura


descrição de fatos isolados (...), através de um esforço no
sentido de surpreender as estruturas mais profundas e
mais estáveis (estruturas demográficas, económicas,
culturais, linguísticas, etc.) que explicam a verificação e o
encadeamento desses fatos";
b) Eliminar os obstáculos "que se levantam entre os diversos
sectores especializados da história (...) de modo a
estabelecer uma história global, restaurando a unidade
real da vida (...)"
c) Buscar uma História Social que "se socorra dos resultados
das Ciências humanas (sociologia, linguística, economia,
semiologia);
d) Finalmente, ter em conta a "história não só como ciência
do Passado (…) mas como ciência do presente, na medida
em que, em ligação com as ciências humanas, investiga as
leis de organização e transformação das sociedades
humanas.

Transpondo esses pressupostos da "Nova História" para o campo


das fontes, das ideias e das instituições jurídicas, chega-se à
proposta de alinhamento de um modelo metodológico que venha
redefinir as funções dos estudos históricos no âmbito do Direito.
Tal postura implica na adesão a uma estratégia interdisciplinar,
não uma interdisciplinaridade meramente formal, mas que tenha
presente a crítica e a transformação do conteúdo problematizado.

Se os três primeiros factores - emergência do neomarxista, da


teoria crítica e da "Nova História" - desempenharam uma grande
motivação e avanços na historiografia ocidental, importa
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

consignar outros dois movimentos que poderão exercer uma


incisiva contribuição para os estudos histórico-jurídicos na
América Latina, qual seja, o pensamento filosófico da libertação e
a corrente brasileira do direito alternativo.

d) A quarta "linha de força" é a existência de um pensamento


libertador latino-americano que se define por um luta teórico-
prática contra uma situação sociopolítica de dominação, opressão,
exploração e injustiça. É o combate à plena adversidade e a busca
incontida por mudanças radicais. Algumas formulações teóricas
têm desempenhado uma função essencial no desenvolvimento do
'pensamento libertador' florescente na América Latina, tais como,
a teoria da dependência (vertente económica/política: T. dos
Santos, F. H. Cardoso, Ruy M. Marini, A. Gunder Frank, Aníbal
Quijano, P. González Casanova), a teologia da libertação (G.
Gutierrez, L. Boff, H. Assman), a pedagogia libertadora do
oprimido (Paulo Freire) e a filosofia da libertação (E. Dussel, 1. C.
Scannone, Rodolfo Kusch, Arturo A. Roig, etc).

e) Por último, a presença mais recente e polémica do movimento


brasileiro designado de "direito alternativo". Não se trata
rigorosamente de uma escola homogénea, com uma proposta
acabada, mas muito mais de uma corrente que emerge, no final
dos anos oitenta e início dos noventa, por parte de alguns
magistrados (juízes gaúchos da AIURIS, como Amilton B. de
Carvalho) e de professores universitários (Edmundo L. Arruda
Ir.Roberto A. R. de Aguiar, José Geraldo de Souza Ir., etc). Implica
na estratégia de luta dentro da legalidade instituída (no âmbito
dos aparatos institucionalizados) e da legalidade a instituir (esfera
da plural idade dos grupos e movimentos sociais que têm seus
direitos negados e reprimidos). Explora-se as fissuras e
deficiências da ordem jurídica formal-individualista, buscando
ISCED CURSO: DIREITO; Disciplina: Historia do Direito i

recuperar (através de uma interpretação crítica e uma aplicação


humanista dos textos legais) a dimensão transformadora do
Direito pondo-o a serviço da libertação.

Ainda que não se tenha uma elaboração sistematizada e definitiva


de suas características, alguns critérios podem ser registados, em
função da proposta teórica de seus fundadores (Amilton B. de
Carvalho, Edmundo L. de Arruda Jr.). Senão, veja-se:

a) O Direito é um instrumento de luta a favor dos menos


favorecidos e injustiçados;
b) Rejeita-se a neutralidade e a politicidade dos agentes e das
instâncias de jurisdição;
c) Busca-se construir uma sociedade socialista e democrática;
d) Opção metodológica por um instrumental histórico-social
dialéctico;
e) Privilegia-se a legitimidade das maiorias e a justiça social.

Os efeitos inovadores da juridicidade alternativa podem


perfeitamente contribuir para estabelecer novos parâmetros de
fundamentação, conceituação e finalidade no estudo
historiográfico das ideias e das instituições jurídicas.

Esses "eventos epistemológicos" aqui destacados revelam-se


inesgotáveis subsídios para compor os novos referenciais
metodológicos de uma interpretação crítica e interdisciplinar no
estudo histórico das ideias e das instituições no campo do Direito.
Certamente que a meta é alcançar uma nova compreensão
historicista que rompa com o culturalismo elitista e o dogmatismo
positivista, permitindo que as múltiplas e diversas disciplinas
históricas do Direito (História do Direito, História das Ideias e/ou
do Pensamento Jurídico, História das Instituições) deixem de ter
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um sentido apologético e ilusório da ordem tradicional dominante,


adquirindo um sentido desmistificador e libertário. Libertador da
verdade engendrada pela prática social e sintonizado com o
"dever histórico" radicado na realização humana.

De um "dever histórico" em que o homem seja o ser privilegiado,


seu significado maior, o real sujeito da história. Com isso descarta-
se o falso modismo do "fim" da História e da "morte" do sujeito na
história. Repensa-se num novo sujeito (sujeitos colectivos) como
fonte de legitimação de uma nova historicidade normativa.

Enfim, para se fazer avançar uma nova concepção histórica das


fontes, das ideias e das instituições jurídicas faz-se obrigatório
rever criticamente as acções, os acontecimentos e as produções
do passado no que tange às práticas de regulamentação e controle
social.
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Sumário
Ao Examinar e problematizar as relações entre a História e o Direito
reveste-se hoje da maior importância, principalmente quando se tem
em conta a percepção da normatividade extraída de um determinado
contexto histórico definido como experiência pretérita que
consciencialize e liberta o presente. Naturalmente esta preocupação
dissocia-se de uma historicidade ao jurídico, marcada por toda uma
tradição teórico-empírica assentada em proposições revesti das pela
força da continuidade, previsibilidade; formalismo e linearidade. Mas,
para se alcançar uma nova leitura histórica do fenómeno jurídico
enquanto expressão de ideias, pensamento e instituições, faz-se
necessário apurar uma distinção das especificidades inerentes a cada
campo científico, do que seja História, do que seja Direito, bem como
o sentido e a função de uma interpretação que se reveste do viés
tradicional ou crítico.

Exercícios de Auto-Avaliação
1. Cinco "eventos epistemológicos" que tiveram e ainda exercem
uma significativa influência como marco de referência aos
novos estudos históricos do Direito. Aponte 3 principais?

Resposta: O primeiro deles é a emergência, principalmente na Europa


Ocidental, no final da década de sessenta, de uma corrente
progressista de cunho neomarxista, que desencadeou profundas
mudanças na teoria social em geral. Escreve António M. Hespanha, a
esse propósito, que a "renovação dos estudos marxistas, possibilitada
politicamente pelo fim da guerra fria, consistiu na revalidação dos
textos clássicos e na descoberta das potencialidades teóricas da
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interpretação do marxismo, mérito de G. DeUa Volpe e de L. Althusser


e suas escolas103.
Outro "evento epistemológico" é a proposta de uma "teoria crítica" de
inspiração neo-marxista-freudiana representada pela Escola de
Frankfurt e tendo como ideólogos T. Adorno, M. Horkheimer, H.
Marcuse J. Habermas. A grande contribuição da escola alemã é propor
uma filosofia histórico-social que possibilite a mudança da sociedade a
partir da constituição de um novo tipo de homem.
O terceiro referencial para se tomar em conta como contribuição à
renovação da historiografia ocidental (particularmente da periferia) é
o conjunto de critérios de investigação e análise posto pela Escola
francesa dos" Annales".

Exercícios
1. Emergência do neomarxista, da teoria crítica e da "Nova
História" - desempenharam uma grande motivação e avanços
na historiografia ocidental, importa consignar outros dois
movimentos que poderão exercer uma incisiva contribuição
para os estudos histórico-jurídicos na América Latina, qual seja,
o pensamento filosófico da libertação e a corrente brasileira do
direito alternativo. Comente?
2. Qual a importância de analisar o relacionamento entre a
história e o direito nos dias actuais?

3. Descreve as principais teorias críticas da história jurídica.

4. Caracterize em linhas gerais a crise do paradigma jurídico.

5. Apresente as principais soluções levantadas pelos teóricos em


face a problemática da historicidade jurídica.

103
António M. Hespanha. A História do Direito..., op. Cit. p. 14-15.
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Exercícios Geral

Identificar é apontar algo, não é pedida mais nenhuma actividade na resposta.

a) Recorde o que estudou sobre o Direito dos Povos sem Escrita e


identifique que tipo de propriedade surgiu primeiro: a «propriedade
móvel», ou a «propriedade imóvel».
b) Identifique os principais legisladores na Grecia antiga.
c) Identifique que «compilação de direito canónico» é constituída pelo
Decretum de Graciano, pelas Decretais de Gregório IX, pelo Livro VI,
pelas Constituições Clementinas e pelas Extravagantes do Papa João
XII?
d) Identifique a famosa compilação de direito romano mandada
elaborar pelo Rei Germânico Alarico II.
e) No Common Law identifique a «acção judicial de ordem real escrita
pelo Chanceler».
f) Identifique a classe social intermédia no direito Moçambicano no
período colonial.
g) Caracterize o principal código que foi aprovado na mesopotâmia.
h) Caracterize o direito Egpcio.

Explicar supõe Caracterizar cada elemento e estabelecer a relação entre os três


elementos.

1. Explique a diferença entre os três Regimes políticos que estiveram


em vigor em Roma (Realeza, República e Império) usando, para
demonstrar as diferenças, as instituições políticas de cada um dos
regimes.
2. A jurisprudência é uma das mais importantes heranças que nos
deixou o Direito Romano. Explique a diferença entre a Jurisprudência
Clássica, a Jurisprudência nos dois períodos pós-clássicos (antes e
depois de Justiniano).
3. Durante a monarquia limitada portuguesa havia três tipos de
administração territorial: o concelho, o senhorio e as terras da coroa.
Explique a diferença entre os três modelos de administração local.
4. No Direito colonial português, a aplicação do Direito era feita com
base no princípio de personalidade por via disto, existia três
estatutos de cidadãos: o indígena, assimilado e o colono. Explique a
diferença entre os três estatutos tendo por base, o referido principio.
5. Caracterize as Leis Ultramarinas no Direito colonial Português em
Moçambique.
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BIBLIOGRAFIA

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Ícone.
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