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Universidade Federal de São Paulo

Curso: Filosofia - Noturno


Vinícius César Barbosa Lima - Agosto 2021
UC: História da Filosofia I

Fichamento de leitura 1

Referência: GOLDSCHMIDT, Victor. Tempo lógico e tempo histórico na interpretação dos


sistemas filosóficos, in: A religião de Platão. São Paulo, Difel, 1979.
Tema: A relação entre dois modos de interpretar um sistema filosófico: genético e
dogmático, sendo o dogmático o método do historiador da Filosofia.
Introdução: O texto de Goldschmidt trata sobre a existência de duas maneiras de interpretar
os sistemas filosóficos e seus respectivos objetivos. O primeiro método, o dogmático
(considerado o método filosófico), é o método em que se segue os movimentos do
pensamento filosófico, adotando-se a atitude de um discípulo. Já o segundo método, o
genético, considera os argumentos como efeitos, sintomas, buscando causas para explicar o
sistema além ou por cima do autor.

Argumentos:

- O autor afirma que a filosofia é explicitação e discurso, isto é, a filosofia se evidencia


através de movimentos sucessivos, de teses que são ligadas umas às outras numa
ordem por razões. Esses movimentos ditam a estrutura da obra e encontram-se em um
tempo lógico, sendo a sua interpretação feita pelo seguimento desses movimentos
conforme a intenção do autor. (p. 2)
- A filosofia é explicitação, o que inicialmente é possível que se possua uma impressão
pessoal, porém a função do filósofo é seguir, de acordo com o autor, o
desenvolvimento das razões, sendo necessário se colocar como aprendiz. É preciso
estudar a estrutura do comportamento da obra, e referir cada asserção ao seu
movimento produtor, ou seja, a doutrina ao método. A função de analisar a obra,
colocando-se acima do sistema, é do intérprete. (p. 2 - 3)
- A doutrina e o método são elementos que não se separam. O método se encontra em
ato nos próprios movimentos do pensamento filosófico, e não se pode interpretar esse
método como um conjunto de normas dogmáticas. Para compreender a doutrina, não
basta apenas separar a léxis da crença, é preciso refazer os movimentos concretos,
aplicando as regras e chegando a resultados verdadeiros em razão desses movimentos.
(p. 3)
- Se encontrado na obra um método somente de exposição e não de descoberta, seria o
mesmo que separar a doutrina e o método. Segundo Goldschmidt, é preciso
reconhecer que um autor possui idéia antes de poder pensar em expô-las, mas a
descoberta somente estará concluída com o traço final da obra. A tese simplesmente
descoberta não estará inventada, realmente, até ser exposta — sendo desenvolvido um
raciocínio. (p. 3 - 4)
- Os movimentos do pensamento filosófico — método em ato — formam a estrutura da
obra. Ao falar dos movimentos de uma obra, supomos um tempo lógico. Para
contextualizar este novo termo (tempo lógico), o autor cita uma passagem de G.
Bachelard que diz: “o pensamento racional se estabelecerá num tempo total de
não-vida, recusando o vital. (...) Mas isso não suprime a possibilidade de retirar-se do
tempo vivido, para encadear pensamentos numa ordem de uma nova temporalidade”.
Significa que, em uma interpretação dogmática, existe um tempo próprio dentro da
obra, onde se desenvolve seu método. (p. 4 - 5)
- Assumir um tempo lógico, é assumir que ele é independente em relação aos outros
tempos ligados às pesquisas genéticas. O autor dá o exemplo da biografia para
mostrar como se aplica o sistema genético, que supõe um tempo vivido e
não-filosófico, porque é o autor da biografia, não o autor do sistema, que comanda o
desenrolar da obra. (p. 5)
- A interpretação metodológica pode ser considerada filosófica na medida em que se
preocupa em interpretar um sistema conforme à intenção do autor, e indo mais além
ela poderia dar indicações para a preocupação do problema da verdade formal de uma
doutrina — que os movimentos filosóficos aconteçam num tempo próprio, ou seja, a
filosofia é discurso, a verdade não pode ser dada em bloco ou de uma vez só, mas sim
progressivamente, em tempos e níveis diferentes. Sendo assim, não é possível que um
sistema possua essa interpretação simultânea dos dois tempos (histórico e lógico),
seria preciso unificar os dois tempos lógicos através de duas consciências (filosóficas)
para ter “o mesmo ritmo de duração”. Segundo Goldschmidt, "tais comparações,
instituí-las-à o historiador, sem levar, necessariamente, em conta o tempo histórico,
entre os pensadores cujo ‘comportamento’ filosófico ofereça estruturas aparentadas.”
(p. 5 - 7)
- Toda filosofia é uma totalidade, onde se juntam, indissoluvelmente, as teses e os
movimentos, afirma o autor. Esses movimentos, situados num tempo lógico, exige
memória e previsão, são feitos em conhecimento de causa. O que mede a coerência de
um sistema e o seu acordo com o real é a responsabilidade filosófica, e não o
princípio de não contradição. “O historiador não é, em primeiro lugar, crítico, médico,
diretor de consciência; ele é quem deve aceitar ser dirigido, e isso, consentindo
colocar-se nesse tempo lógico, de que pertence ao filósofo a iniciativa.” (p. 7)

Conclusão: Em vista dos argumentos apresentados, Goldschmidt consegue evidenciar que,


sobre os sistemas em questão, o método dogmático é o único capaz de suportar a
interpretação filosófica de um historiador da filosofia, sendo de máxima importância refazer
os passos do autor segundo a ordem das razões, inserido nesse tempo lógico.

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